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Anabela Gradim Manual de Jornalismo UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR

Manual de Jornalismo

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Manual de Anabela Gradim

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Anabela Gradim

Manual

de Jornalismo

UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR

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Manual de Jornalismo

Série - Estudos em Comunicação

Direcção: António Fidalgo

Design da Capa: Jorge Bacelar

Execução Gráfica: Serviços Gráficos da Universidade da Beira Interior

Publicado com o apoio do: Instituto da Comunicação Social

Tiragem: 800 exemplares

Covilhã, 2000

Depósito Legal Nº 156722/00

ISBN – 972-9209-74-X

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Índice

Prefácio................................................................9

Introdução..........................................................15

1. O papel do Jornal ..........................................17

2. O papel do jornalista ....................................32

3. Organização da redacção ..............................38

3.1. A Direcção ...................................................... 383.2. A Sub-direcção ................................................ 423.3. O Conselho Editorial ....................................... 423.4. A Chefia de Redacção .................................. 433.5. Editores de Área ou Secção ........................ 433.6. Redactores ........................................................ 443.7. Colaboradores ................................................... 453.8. Colunistas ......................................................... 463.9. Secretaria de Redacção ................................. 473.10. Arquivo ........................................................... 48

4. O percurso da Informação ...........................52

5. Os géneros .......................................................57

5.1.Notícia................................................................. 575.1.1.Lead ................................................................. 57

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Manual de Jornalismo5.1.2.Pirâmide Invertida .......................................... 615.1.3.Parágrafos: construção por blocos ............... 625.1.4. Norma e desvio ........................................... 635.1.5. Estilo codificado: vantagens e não só ....... 655.2.Títulos ................................................................. 685.3. Editorial ............................................................. 815.4. Reportagem ...................................................... 875.5. Fotojornalismo................................................... 895.6. A legenda ......................................................... 925.7. Faits-divers ...................................................... 945.8. Opinião.............................................................. 955.9. Crónica ............................................................. 965.10. Entrevista ........................................................ 975.11. Fotolegenda ..................................................... 99

6. A recolha de informação ............................ 102

6.1. As fontes ....................................................... 1026.2. Ética e deontologia ....................................... 1166.2.1.O código deontológico ................................. 1166.2.2. Outras normas deontológicas .................... 1186.2.3.Responsabilidade legal e moral ................... 1216.3. Regras para a recolha de informação ....... 1226.4. Regras para a realização de entrevistas ... 125

7. Utilização da Linguagem ............................ 136

7.1. Estilo ............................................................... 1387.2.Como escrever ................................................ 140

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7.2.1. Simplicidade e originalidade ....................... 145

7.2.2. Estrutura das frases .................................. 146

7.2.3. Adjectivação ................................................ 146

7.2.4. Verbos .......................................................... 147

7.2.5. Muletas linguísticas ..................................... 147

7.2.6. Repetições ................................................... 148

7.2.7. Lugares comuns ......................................... 148

7.2.8. Queísmo ....................................................... 149

8. A pontuação ................................................... 151

9. Convenções tipográficas ............................. 157

9.1. Caixa alta ou caixa baixa? ......................... 157

9.2. Numerais ........................................................ 162

9.3. Horas .............................................................. 164

9.4. Abreviaturas ................................................... 164

9.5. Aspas .............................................................. 165

9.6. Siglas............................................................... 166

9.7. Topónimos estrangeiros ................................. 167

10. O jornal digital – fazer

jornalismo para o novo medium ................. 178

10.1. A net e a profissão de jornalista ............. 184

10.2. Urbi digital ................................................... 189

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Manual de Jornalismo11. Enquadramento legalda actividade jornalística ................................. 194

11.2. Deveres dos Jornalistas .............................. 198

12. Sugestões de leitura ................................. 200

11.1. Direitos dos Jornalistas ............................... 195

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Prefácio

Em 1967, quando troquei a Faculdade deMedicina pela escrita nos jornais, não havia em Portugalescolas que ensinassem a profissão de jornalista.Aprendia-se fazendo, ouvindo críticas, corrigindoos erros. Era a tarimba a nossa escola.

Vinda da imprensa semi-legal das Associaçõesde Estudantes, após um ano de colaborações emvespertinos, tive a sorte de entrar na redacção daVida Mundial, em 68. Aí aprendi, para lá dasolidariedade e da alegria no trabalho - que, trintae dois anos depois, continuo a exigir - a fazer entrevistas,reportagens, artigos, títulos, legendas, até a paginar.Faltava-me, no entanto, a disciplina da notícia.

Essa, aprendi-a, depois de uma demissãocolectiva e vinte meses de prisão, nos finais de 1971,no Diário de Lisboa. De pouco me valia reivindicara minha experiência de um ano numa revista de prestígioe até ter concluído o Curso de Jornalismo que oSindicato dos Jornalistas levara a efeito entre 68e 69. O que interessava, sim, é que cada início denotícia respondesse, da forma mais clara e concisapossível, às perguntas Quem? fez o Quê? Quando?Onde? Como? Porquê? Com que consequências? eque a estrutura do texto se organizasse de acordocom a forma mais fácil para o leitor e para a paginação:a pirâmide invertida.

Cada notícia era, então, uma aula prática.Eu escrevia, aplicadamente, levava-a ao chefe maisdirecto, que a relia, para depois perguntar, quaseinvariavelmente: “E tu achas que isto é uma notícia?É uma trampa. Escreve outra vez!” Pensei váriasvezes assassiná-lo, até perceber que, no esforço detentar fazer tão bem que ele não pudesse criticar-

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me, era eu quem melhorava. E que ficara a dever-lhe ter aprendido que se pode cumprir as regras semperder a criatividade.

Foi há quase trinta anos, sei-o bem. Muitascoisas aconteceram entre tanto . Às redacçõescomeçaram a chegar, há muitos anos já, jovens formadosem Jornalismo ou, na maior parte dos casos, emComunicação Social. Ao conflito de gerações somou-se o de formações, a licenciatura contra a tarimba,ou vice-versa. Acontecia-me ver estagiários recém-chegados escreverem notícias definitivas. Alguns,mais velhos, queixavam-se: “Eles acham que já sabemtudo!” Até que uma vez, numa conversa sobre problemassalariais, uma jornalista muito jovem me disse: “Vocês(e este ‘vocês’ implicava ‘os mais velhos’, entreos quais me incluía) não se interessam nada pornós! Quando temos dúvidas, nem sabemos a quemperguntar!” Percebi então que também ela teria gostadode ter, como eu tinha tido a sorte de ter, alguémque lhe dissesse como melhorar o que fazia. Porquenão há escola que ensine, ou possa sequer ensinar,a variedade de situações com que se defrontam osjornalistas no dia a dia da profissão – e há sempreuma nova dúvida a esclarecer ou, simplesmente, adiscutir.

Ora bem, o que me parece muito interessanteno Manual de Jornalismo de Anabela Gradim é que,de algum modo – mas não avisa ela, logo de início,tratar-se de “um manual extremamente conservador”,em grande parte pensado para os que não têm, nasredacções, quem os oriente? – ecoam nele vozesdessa aprendizagem de tarimba, em que ao ensinodas regras se somava a referência ao uso judiciosodas palavras, aos desvios ao rigor, à própria deontologia.

Foi com alegria que deparei com a referênciaao “fascismo semântico” - que leva a que um

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toxicodependente “roube auto-rádios” e um gestor“desvie fundos”, ou um seja “réu” e o outro “acusadopelo Ministério Público” - e o alerta para que “dizer”,“afirmar”, “defender” e “contar” não significamexactamente o mesmo. (Acrescento, se tal me épermitido, o “admitir” e o “confessar” hoje muitoem voga.) Ou com o combate aos “lugares comuns”que enxameiam os jornais e, mais ainda, a rádioe a televisão.

Alegrou-me também que Anabela Gradimadmita que o jornalista que entrevista um físico sobrea cisão do átomo, sem que tenha formação científicabastante para garantir a não deturpação das explicaçõesdo entrevistado, peça a este que releia o texto antes dapublicação. E que defenda que, na situação de entrevista,um bloco de notas pode ser escolha mais acertadaque o gravador.

No Manual de Anabela Gradim, a este conselhosegue-se um outro, que deveria ser desnecessário- o de prestar a maior atenção ao entrevistado. Aser coincidência, é feliz: porque a certeza de queas palavras do entrevistado estão a ser gravadas epodem ser reproduzidas autorizam, muitas vezes, adesatenção do jornalista – e uma entrevista faz-setanto de gestos, sorrisos, reticências e silêncios comode palavras, o que obriga à atenção permanente.

Saliento ainda a tranquilidade com que a autorafala das fontes profissionais, relações públicas ouassessores de imprensa - sem as demonizar, comofazem alguns jornalistas, antes reconhecendo a suautilidade e lembrando que é ao jornalista que cabenão se deixar manipular por elas.

Mas, neste Manual em que tantas coisas meagradam, outras há que me merecem discordância.(Mas não é esta, também, uma velha e salutar práticadas redacções?) Por exemplo, sobre o faits divers

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e a sua utilização tenho reservas que Anabela Gradimnão contempla. Talvez por trabalhar num meio queabusa deles – a televisão – tendo a considerá-los,com Pierre Bourdieu, “coisas fúteis” que se tornamimportantes porque ocupam o espaço (ou o tempo)que deveria ser usado em outros temas. “Dando ênfaseaos faits divers, enchendo o tempo escasso com vazio,nada ou quase nada, afastam-se informações pertinentesque o cidadão deveria ter para exercer os seus direitosdemocráticos”, escreve Bourdieu, e julgo a análiseaplicável a alguns órgãos de informação em Portugal.

Em troca, sou menos negativa em relaçãoàquilo a que Anabela Gradim chama a “muito temidavolta”, em relação à qual fala de trabalho “humildee pouco criativo”. Discordo. “Humilde”, sim; “poucocriativo”, não necessariamente, já que dos telefonemasquotidianos dessa volta podem surgir temas dereportagens, crónicas, entrevistas. Como explicaAnabela Gradim, noutra passagem do seu Manual,“tudo pode ser notícia, dependendo da forma comofor perspectivado”.

Outra discordância, que não põe em causao meu apreço pelo Manual em causa: quando aautora refere o Conselho de Redacção a propósitodo enquadramento legal do exercício da profissão,preferiria vê-lo na organização da redacção, já quelhe cabe pronunciar-se sobre “assuntos que serelacionam com a actividade jornalística”, podendo– e devendo - contribuir para a resposta às dúvidasdo dia a dia.

Finalmente, regozijo-me com o optimismo daautora no que toca à relação entre velhas e novastecnologias e ao futuro da Imprensa. E solidarizo-me com ela quando afirma que “o maior capital deum jornal , e o único do jornalista, é o seu brandname , uma reputação profissional impoluta, a

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credibilidade junto dos leitores e a confiançaconquistada ao longo dos anos”.

Também por frases como esta, este é um Manualque se lê como quem ouve um profissional maisvelho que se aprendeu a respeitar. E nisso parece-me corresponder perfeitamente aos objectivosapontados pela autora na Introdução.

Razões que bastam para fazer do Manual deJornalismo de Anabela Gradim um trabalho bem vindo,numa altura em que o ritmo e as situações laboraisem muitas redacções não permitem a reflexão, adiscussão, sequer a re-escrita de uma notícia sobrea qual se tem dúvidas - e em que faltam, em muitosórgãos de informação, livros de estilo.

Lisboa, 31 de Julho de 2000

Diana Andringa

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Introdução

O presente trabalho começou por ser a modestaproposta de uma folha (ou poucas mais) de estilopara aplicar ao Urbi et Orbi, o jornal digital doCurso de Ciências da Comunicação da Universidadeda Beira Interior. Rapidamente se revelou, porém,que uma mera folha de estilo seria insuficiente paraos propósitos a atingir, e este trabalho acabou pormiscigenar essas características com as de um manualde jornalismo.

Porquê? São suficientes nos jornais as folhasou livros de estilo porque os jovens estagiários queos integram são imediatamente socializados, porjornalistas mais experientes, nas práticas comunsà profissão e na cultura da empresa. Ora no Urbi,que ainda se está fazendo, não existe nem este cimentoideológico, nem um cabedal de experiência acumulado,uma cultura própria, que pudesse ser distribuidoequitativamente pelos recém-chegados — todos osão.

Por outro lado, constata-se que uma boa partedos jovens formados na UBI têm sido integradosem órgãos de imprensa regional, onde constituem— apesar da sua falta de experiência — o capitalhumano com maior formação aí presente. Muitosarcam, dentro desses órgãos, com tremendasresponsabilidades; outros estão por conta própria,não dispondo de quem os oriente enquanto dão osprimeiros passos na tarimba. Este texto foi escritotambém a pensar nesses percursos.

Ao arrepio dos tempos, este é um manualextremamente conservador, tanto na forma de encarara imprensa e o seu papel, como na ideologia e propostasdeontológicas implícitas e explícitas ao longo do

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texto. Há lugar para tal numa altura em que os mediaes tão deba ixo de fogo , e a concor rênc ia eespectacularização das notícias têm propiciado práticasde natureza duvidosa. A ratio de publicações recentessobre o tema bem o demonstra: por cada dúzia deobras de f i losof ia , ep is temologia , aná l i se ,desconstrução, e literacia dos media, há uma sobrecomo fazer jornalismo. Ora a crítica cerrada podeter efeitos perversos, do cepticismo desencantado,síndroma de impotência, ao leilão dos princípiosem proveito próprio. Em face a isto, há que optar.

Faz sentido nos dias que correm formar jovenspor um figurino que nos Estados Unidos já datade meados do século que passou?

Muitas vezes a lógica das empresas não secompadece com atitudes quixotescas, é certo. Masnão há nenhuma em que a seriedade, o talento,a competência e o rigor não sejam valorizados. Istoparte de uma visão extremamente optimista. EmPortugal, felizmente, a imprensa está de boa saúdee recomenda-se. Consequentemente, as pressões sobreos jornalistas, internas e externas, não são tantasnem tão fortes assim. Manifestam-se, a maioria dasvezes, por uma sub-reptícia forma de contornarobstáculos: através de uma eficiente gestão de recursoshumanos, a qual se socorre de profissionais comdeterminada sensibilidade quando esta é a pretendida.Mil flores floresçam pois. Em jornalismo, como emtudo na vida, as primeiras experiências e impressõessão as que mais profundamente marcam, e poderãoditar toda a praxis futura. Para um profissional,uma postura eminentemente conservadora como aaqui perfilhada é, creio-o, preferível a qualquer outra.

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I. O papel do Jornal

O jornal serve para informar os seus leitores,podendo constituir, subsidiariamente, uma fonte dedistracção e entretenimento.

Se a função do jornal é informar os seus leitores,tal significa, em primeiro lugar, que a coisa maisimportante do jornal, a única coisa importante, sãoas suas notícias. Não são, pois, os jornalistas, asemoções dos jornalistas, os perigos que correu, asbatalhas que travou, bem como a sua pequena sedede fama e estrelato, assuntos que mereçam sernoticiados. O jornalista não é notícia, não é a notícia,e, pese embora a crescente pressão motivada poruma concorrência feroz entre os media, não devenunca confundir-se com ela.

Sendo o jornal uma empresa que produz e divulganotícias, não pode servir interesses criados, nemoutros interesses além do seu interesse de informar.O jornal não serve para dar cumprimentos, tecerloas, promover partidos, personalidades ou ideais,ganhar eleições, forjar mitos, arregimentar hostesou empreender guerras santas. Nem o inverso. Ojornal não serve para desacreditar pessoas ouinstituições, pagar favores, perseguir inimigos,encetar campanhas, comprometer-se com acções depropaganda ou servir de trampolim para se atingiremfins velados de natureza pessoal.

A única coisa que o jornal faz, de forma rigorosae fundamentada, é divulgar factos actuais de interessegeral – as notícias. Se, eventualmente, tais factosdesacreditam ou abonam a favor de pessoas ouinstituições, é algo que cumpre aos leitores concluira partir da leitura dos tais factos que o jornal noticia.

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Mas nem só. O jornal também veicula análisese opiniões. Algumas, como os editoriais , daresponsabilidade do director, ou os artigos de opiniãonão assinados, comprometem e obrigam todo o corporedactorial. Outras, da responsabilidade de jornalistasindividualmente identificados, colaboradores oucolunistas, exprimem os pontos de vista e as apreciaçõessubjectivas dos factos que são feitas pelos seus autores.

Entende-se como parte fundamental do serviçoprestado por um jornal o contributo que este prestapara a análise dos acontecimentos, o esclarecimentoe a formação dos seus leitores. E por isso a opiniãonão é parente pobre da informação, nem vice-versa.São produtos diferentes, que visam objectivosdiferentes e possuem igual estatuto e dignidade.

Com a publicação de textos de opinião visa-se proporcionar aos leitores análises e perspectivasdiversificadas sobre factos de relevância social,contribuindo para a sua formação e para umalargamento, através da análise de colunistas credíveise experientes, da percepção que estes têm dosfenómenos. Os artigos de opinião, que podem serpolémicos, servem ainda para lançar o debate públicosobre as questões que abordam, promovendo o diálogoe o intercâmbio de ideias, e são por isso fundamentaisà democracia e ao exercício de uma cidadania conscientee responsável. Aprende-se sempre com um bomcolunista, goste-se ou não dos seus textos e opiniões.

Daqui se depreende que o Urbi et Orbi acolheránas suas colunas o mais amplo leque possível deopiniões, e velará pela rigorosa separação destasdos conteúdos noticiosos. Assim sendo, e emconformidade com o seu estatuto editorial, o jornalestá aberto à participação da comunidade onde seinsere, e acolherá de igual forma, sem prejuízo doscritérios editoriais, opiniões diversificadas – sendo

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que tal pluralismo é considerado desejável porcontribuir para o debate público.

Todavia, tal não significa que toda a opiniãocaiba num jornal. Todos os dias, em todos os jornais,por dificuldades de expressão, deficiência de formaou irrelevância dos conteúdos, muitos textos acabampor ser rejeitados. Rejeitados liminarmente serãotambém os que visem servir interesses velados dosseus autores; contenham acusações sem provas;expressões desprimorosas; incitamento à violênciaou à discriminação racial, sexual, religiosa ou outra;e ainda aqueles que defendam a subversão da ordemdemocrática ou incitem à prática de quaisquer outroscrimes.

O Urbi et Orbi também defende a rigorosaseparação entre notícias – que se baseiam em factos- e opinião – que se baseia em impressões subjectivasfiltradas pela personalidade, crenças e formaçãocultural de quem analisa os factos. Nas notícias,não se misturam ou imiscuem as opiniões dosredactores. Mas também não se castram jornalistas.Isso será bom na ópera ou no harém, não no jornal.Se o jornalista sentir necessidade imperiosa de dara sua opinião, poderá fazê-lo num comentárioseparado identificado como tal.

Em conformidade, nenhum texto noticiosoincluirá, velada ou abertamente, manifestações daopinião do seu autor; e todos os textos de opiniãodeverão ser claramente identificados como tal, deforma a que não possa, quanto a isso, subsistir amínima dúvida no espírito de um leitor. Sempreque um texto, relativamente a este aspecto, não éidentificado, é porque se trata de um trabalho noticioso.

Excepções a ta i s p r inc íp ios são tãoextraordinariamente raras que nem deverão ser tomadasem linha de conta na definição dos critérios gerais

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que regem um jornal. Mas já aconteceram entre nós.Tome-se o recente caso do referendo sobre aindependência de Timor-Leste, e da campanha queos portugueses, media incluídos, encetaram pelaintervenção de uma força multinacional de paz noterritório. Não há ainda estudos sobre o materialnoticioso produzido durante os dias que antecederama entrada da força multinacional em Timor LoroSae, mas a havê-los mostrariam que parte dos mediaque noticiavam o acontecimento foram poderosamenteatingidos pelas circunstâncias de produção de taisnotícias, e pelas suas crenças e convicções pessoaisrelativamente ao que se estava a passar, que setransmitiam ao material noticioso produzido. É avelha questão da legitimidade do jornalismo de causas,que ainda hoje tem quem o ataque e defenda.

Aqui chegados não pode deixar de se abordara questão da objectividade jornalística1 . É impossívelnão a postular quando se pretende fazer informação;e postulá-la não como intenção pia, mas conferindo-lhe um conteúdo concreto. Objectividade significarealismo à boa maneira aristotélica: há o mundo,há factos e acções que ocorrem nesse mundo, eé possível descrevê-los, inventariando o máximo dedeterminações possíveis de tais factos2 .

As notícias não são espelhos rígidos e fiéis dosfenómenos, mas construções metonímicas que sedesenvolvem segundo formas de produção ritualizadase passam por patamares diversos de selecção: dassecretarias aos editores e chefias, passando pelosolhos, preconceitos, crenças e formação cultural dosjornalistas, para, no limite, produto pronto, teremde competir em visibilidade com todas as outrasnotícias do dia, submetendo-se ao espaço limitadodo jornal, onde um anúncio de última hora podesignificar peça no cesto dos papéis.

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A crítica da objectividade só será positiva nosentido em que despertar os jornalistas para o planoda reflexão metodológica. Não pode ser esgrimidacomo arma de arremesso contra milhares deprofissionais que todos os dias, com riscos e sacrifíciospessoais, produzem as notícias que nos chegam; nem,pior ainda, como esteio do vale tudo no big shownews3 . A obscenidade pós-moderna de declarar queo mercado seleccionará os deontologicamente maisaptos não passa disso mesmo - uma obscenidade.

Objectividade significa pois, que com todos oscondicionalismos subjacentes à actividade de informar,é possível produzir informação que relata de formarigorosa e isenta os acontecimentos que tem porbase. A própria multiplicação das instâncias de selecçãode notícias pode ser entendida não como condiçãorestritiva mas como garante dessa objectividade. NumaRedacção de dimensões razoáveis, dez gatekeepers,com toda a aleatoriedade, e mesmo erros, que oseu trabalho possa comportar, asseguram que éimpossível a um só manipular determinada informação,o ângulo como a notícia será dada e o espaço queocupa no jornal, na primeira página, e nas preocupaçõesdos leitores. O processo, se multiplicado por vinteredacções de dimensões razoáveis assegura quepodemos esperar ob te r uma representaçãoestatisticamente fidedigna dos acontecimentos maisimportantes da véspera quando lemos o jornal damanhã. Só isto. Mas já basta para nenhum profissionalpoder esperar demi t i r - se de cumpr i rconscienciosamente a sua função. E defenderciosamente o seu direito a fazê-lo.

É evidente que atingir uma objectividadepropriamente científica quando se pratica a actividadede informar, ou esperar obter uma fundamentaçãode tipo transcendental da mesma, é impossível.

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Acusações de ingenuidade epistemológica - elas sãosempre possíveis e, se se recuar o suficiente embusca de uma fundamentação, “irrespondíveis” - nãopodem todavia abalar a boa fé e firmeza de quemtenta informar. A objectividade em informação -como de resto em muitas outras actividades - existecomo princípio regulador para o qual se deve tender,que se tentará respeitar, e em torno do qual urgeestar vigilante, procurando constantemente aperfeiçoaros procedimentos utilizados.

A reflexão sobre os procedimentos é tanto maisimportante quanto esta é também uma profissão degrande exposição pública e pressão constante. Ojornalista pode passar 20 anos a construir uma reputaçãoe perdê-la em 20 segundos ao noticiar uma mentiraou cometer um erro grave. Cuidado, rigor, e ocumprimento estrito dos procedimentos deontológicossão a única forma de prevenir tais riscos.

Um jornalista também deve ter sempre presente,e não deixar que isso abale a sua capacidade dedecidir como e em que circunstâncias informar, quequando se noticiam situações em que há interessesem conflito agradar a gregos e troianos é impossível- e mesmo agradar, as mais das vezes, não é sequerdesejável. Se tal suceder, constitui pelo menos razãopara rever os procedimentos e opções tomadas, aindaque para concluir que foram adequados.

A escolha de um facto potencialmente noticiável,a disposição de notícias numa página ou a selecçãodos temas da primeira supõem opinião. Mas a únicaopinião que devem supor é a de que, para quemefectuou tal selecção, esses foram os factos maisimportantes de entre o conjunto dos que nesse diachegaram à Redacção. Para determinar o que são“factos importantes”, jornalisticamente relevantese potencialmente noticiáveis utilizam-se critérios

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de avaliação que passam pela proximidade, relevância,estranheza ou importância do acontecimento. ManuelPiedrahita4 sistematizou-os da seguinte forma:

Proximidade – um facto será ou não notíciaconsoante ocorreu numa zona mais ou menos próximada área de influência do jornal. Para um diárioportuguês, trinta mortos numa avalanche no Nepalsão menos importantes do que um, nas mesmascircunstâncias, na Serra da Estrela. A morte de umpedreiro por queda de um andaime em Madrid éum facto sem significado para os leitores lisboetas,mas não o será se o acidente ocorrer nas obras daponte sobre o Tejo. A proximidade é um valor relativoà dimensão e localização do jornal que relata oacontecimento. Por isso, acrescenta Ricardo Cardet5 ,“deve considerar-se igualmente notícia a chegadado primeiro homem à Lua, a morte de um vizinhomuito estimado numa aldeia, o falecimento de umPapa, o assassínio, por soldados americanos, de umamulher na Indochina, ou o massacre da populaçãode uma aldeia angolana por mercenários.( . . . )Geograficamente o interesse geral da notícia expande-se como as ondas na água: são intensas no lugaronde se produzem e tornam-se mais débeis à medidaque se afastam. Se atirarmos uma pedra num lagotranquilo, veremos o gráfico desta comparação”.

Importância – este princípio resume-se aoseguinte: as pessoas importantes são sempre notícia.Os leitores estão muito mais interessados no quesucede às figuras importantes do que ao homemde rua. É irrelevante se o sr. Silva, que é cleptómano,for apanhado shoplifting num supermercado; masjá não o será se o protagonista da história for oministro da Finanças, um conhecido banqueiro, ou

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o herdeiro de uma das coroas europeias. Para obem – Tony Blair vai ser pai do quarto filho –e para o mal. Neste último caso, diz Piedrahita,os leitores sentem uma espécie de regozijo democráticoao comprovar que as pessoas importantes não aparecemsó nos jornais para fazerem propaganda a si próprias.

Polémica – a polémica jornalística é um focode atracção dos leitores. Deve ser gerida com cautela,para não descambar no insulto, mas quando bemfundamentada é socialmente útil.

Estranheza – o estranho, o insólito, bizarro,surpreendente, é sempre notícia porque atrai os leitores.

Emoção – o interesse humano, as histórias quelidam com os sentimentos e emoções dos homens:grandes feitos, extraordinária coragem, sexo,corrupção, miséria, ascensões ou quedas vertiginosasna escala social, possuem um poder de atracçãoquase irresistível sobre os leitores. Eros e Tanatos,resumiria Freud a história das grandes emoçõeshumanas.

Repercussões – uma notícia é importante quandoas suas consequências se podem repercutir, a curto,médio ou longo prazo, na vida dos leitores. O crudesubiu lá longe na Arábia Saudita? Nada de especialse isso não significar aumentos na gasolina aquià porta. Parte da arte de avaliar e bem escolhernotícias consiste em conseguir prever as consequênciasque certos factos poderão vir a ter na área de influênciado jornal. A recusa do ministro em reforçar as verbaspara o funcionamento das universidades jamais seránotícia para a Gazeta da Soalheira, mas sê-lo-à nosjornais da Covilhã se estes estiverem atentos.

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Agressividade – O jornalismo pode e deve seragressivo, no sentido de lutar desassombradamentepelos anseios das populações. Não adoptando umapostura servil relativamente aos poderes instituídos,mas antes cultivando a sua independência face aestes – a voz do povo ao ouvido do monarca, enão a voz do dono.

Na mente de todo o editor, quando decide dodestaque a dar a determinada matéria, devem serformuladas, concomitantemente, as seguintesquestões: É importante? Afectará a maioria dosleitores? É interessante? É nova? Ocorreu longe ouperto? É verdadeira? É exclusiva? Está de acordocom a política editorial do jornal? – Quanto maisforte for a notícia em cada um destes critérios, maisprobabilidades terá de ser noticiada.

Nuno Crato6 considera como núcleo duro daselecção de um acontecimento noticiável os critériosda actualidade, significado, e interesse, sendo queo ênfase com que os jornais ponderam um ou outrodestes factores determina o estilo de publicação queproduzem.

Actualidade porque ninguém deseja ser informadodo que já é público e do conhecimento geral, nemnenhum jornal sobreviverá muito tempo se apresentarcomo destacada notícia aquilo que todos os outrosjá disseram há dias atrás.

O significado prende-se com a relevância socialde um acontecimento e as consequências que estecomporta para a colectividade. A ementa do quecomemos hoje ao almoço é certamente actual, penaque absolutamente irrelevante. Crato demonstra quemuitas vezes é difícil avaliar o real significado deum acontecimento, mas nenhum jornal pode demitir-se dessa função , nem dar -se ao luxo de ,

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sistematicamente, considerar irrelevante aquilo ondetodos os outros vêem factos de importância decisiva.

Interesse reporta-se à apetência do público porcertos acontecimentos, e está dependente da formaçãocultural e expectativas dos leitores, as quais variamde publicação para publicação. Interesse é um critérioque não coincide, as mais das vezes, com o significadode um acontecimento, de forma que a maneira comoos jornais ponderam o peso relativo de cada umdos critérios nas suas notícias determinará boa partedo carácter da publicação. Nenhum jornal pode alhear-se totalmente do interesse do público, mas tambémnenhum jornal que se preze poderá deixar-se escravizarpor ele.

Crato classifica os jornais, pela análise doscritérios de selecção de notícias, em imprensainformativa quando os três aspectos estão presentesnas notícias; imprensa sensacionalista quando osignificado dos acontecimentos é preterido em favordo interesse pelo escandaloso, insólito e fortementeemotivo; e jornalismo de opinião político, aqueleque noticia factos da actualidade perspectivados deacordo com determinadas balizas políticas que orientameditorialmente o jornal, e que poderão ser mais oumenos rígidas.

A construção de uma linha editorial não é linear,depende, entre outros factores, de quem lidera ede quem trabalha no jornal, dos objectivos dapublicação, da sua área de influência, e do públicoa que se destina. Certo é que ela implica semprecritérios valorativos de selecção do material noticioso.

A actividade de selecção é fundamental e inerenteao serviço que os jornais prestam aos seus leitores,e por isso deverá ser desempenhada sem complexos.Ninguém quereria um jornal onde se amontoassemtodas as informações que diariamente chegam às

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redacções – seria um tijolo muito indigesto. As pessoastêm um tempo limitado para despender no consumode notícias, e desejam ser informadas com rapideze eficiência. Por isso são absolutamente disparatadosos vaticínios de que a internet, enquanto espaçovirtualmente infinito de posting de informações poderáextinguir a profissão de jornalista. Procurar aí ainformação diária, prescindindo dos jornalistas, seriacomo ir à maior lixeira de Lisboa tentar encontraruma agulha e um dedal, e fazê-lo 365 dias por ano.Num mundo onde o volume de informação disponívelé cada vez mais difícil de gerir, a profissão de jornalistapode metamorfosear-se, mas não deixará de sernecessária.

Temos pois que a função do jornal é seleccionare produzir notícias, transmitindo-as de forma fidedignae objectiva. As notícias são, estruturalmente, tãoimportantes que não se pode conceber um jornalsem notícias, e no entanto este pode sobreviver,e muitos sobrevivem, por vários números, sem crónica,crítica, editorial, opinião ou reportagem.

Por notícia o dicionário, fantástico barómetrodo senso comum, entende “relatório ou informaçãosobre um acontecimento recente; aquilo que se ouvepela primeira vez; assunto de interesse; conhecimento,informação, resumo, exposição sucinta; breve relação,memória, biografia, escrito sobre qualquer assuntode interesse; nota histórica ou científica; lembrança;recordação; nova, novidade”.

É com base no relato de factos deste tipo, relatoesse que pode assumir a forma de qualquer um dosgéneros, que os jornais são elaborados. São ingredientesfundamentais da notícia aquilo que é novo ou estáoculto e que, ademais, é susceptível de interessara muitas pessoas.

Anunciar que Pêro da Covilhã foi um prócer

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dos descobrimentos portugueses, não é notícia, éridículo. Dizer que o Ministério da Saúde escolheuo nome do prócer dos descobrimentos para baptizaro novo hospital da Cova da Beira, isso, porque énovo, já é notícia. As notícias também servem muitasvezes como pretexto para actualizar certas informações.É o caso do jornal que, ao saber que Pêro da Covilhãvai de facto dar nome ao novo hospital, aproveitapara publicar um dossier aprofundado sobre apersonagem, e realizar uma sondagem entre oscovilhanenses para apurar, ao certo, quantos sabemquem foi.

Se nem tudo é notícia, porque nem tudo obedeceaos critérios da novidade e relevância; paradoxalmente,um bom jornalista também sabe que potencialmentetudo é notícia. Não refiro aqui, sequer, os pseudo-acontecimentos, acontecimentos semi-forjados pelosmedia devido à falta de notícias, e cuja importânciaé claramente exagerada; mas, simplesmente, que quasetudo pode ser notícia, dependendo da forma comofor perspectivado. Os dias sempre iguais do carteiroou da operária fabril que tem dois filhos não sãoordinariamente notícia – como poderiam? – mas podemconstituir um excelente tema da reportagem que abordea solidão urbana e a condição de vida nas sociedadesindustrializadas.

O jornalista vive mergulhado na actualidadee tem de estar em sintonia com o público e o ambientecultural da sua época. Nas Redacções fala-se de“faro jornalístico” para referir esta particular sintoniacom os tempos e o talento para descobrir notíciasonde outros nada vêem. É um talento tão importantequanto o escrever bem e dominar as técnicas deexpressão jornalística. Ducasse sabia como ninguémcomo manejar a língua francesa, mas vivia enclausuradonuma água-furtada, completamente alheio ao que

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o rodeava, e teria dado um péssimo jornalista.Jornalismo, na definição do escritor britânico

Chesterton, é dizer que Lord Jones morreu a pessoasque nunca souberam que ele estava vivo7 . É queo jornal reflecte a actualidade, mas também a cria,faz a sua própria agenda, e tem a obrigação de trazerpara o debate público questões que de outra formapoderiam passar despercebidas. O Governo aprovadiscretamente novas regras para as deduções do IRSque se vão traduzir num aumento efectivo da cargafiscal? É obrigação do jornal reparar nisso, traduzira informação em termos que todos compreendam,mostrar quais os mecanismos que conduzirão aoaumento da carga fiscal, e confrontar os responsáveiscom essas questões.

O jornal veicula notícias, mas é também umafonte de cultura, entretenimento e prazer para osseus leitores. As pessoas procuram o jornal paraestarem informadas do que se passa no mundo, nopaís e na sua aldeia. Mas não só. Quase todos osjornais admitem como parte da sua função esta vertentede entretenimento e por isso publicam nas últimaspáginas passatempos diversos, como palavras cruzadas,horóscopos, folhetins e vinhetas de banda desenhada.

Produzem também material informativo que, nãoobstante, se lê com outros fins que não exclusivamenteo de estar informado. É o caso da grande reportagem,entendida enquanto género literário, e cujo conteúdonoticioso estrito se poderia reduzir a dois parágrafosde um telex de agência; das páginas de cultura,que englobam crítica de cinema, teatro e livros;das páginas de divulgação de sites da internet ede crítica de jogos; das revistas de domingo e desuplementos temáticos diversos.

Um bom periódico saberá conciliar sem conflitoestes dois aspectos da actividade jornalística: informar

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rápida, fidedigna e eficientemente; e ser fonte deprazer e descoberta ao virar da página para os seusleitores.

Notas

1 . Sobre este aspecto, e ainda as pressões e constrangimentosa que a actividade de produçdas notícias está sujeita, veja-se Furio Colombo, 1995, Conhecer o Jornalismo Hoje -Como se faz Informação, Editorial Presença, Lisboa.2 . No limite, se inventariássemos todas as consequênciaspossíveis do objecto, teriamos o próprio objecto.3 . Colombo, novamente, sobre as relações entre informaçãoe espectáculo: “A alternativa, para os profissionais do jornalismo,é regressar ao espaço nobre do tabelião-garante dosacontecimentos averiguados, das fontes identificadas, dasrazões conhecidas, das reconstruções independentes. Talveztudo isto se venha a verificar em espaços de mercado maisrestritos, com modalidades mais modestas, com um grau deressonância menor. E pouco espectáculo. Mas, com o tempo,será possível restabelecer aquelas relações de respeito, aqueleinvestimento na confiança do público e na cautela dos poderes,que não são nesta época o aspecto mais típico e mais difundidodo modo de fazer jornalismo”, in Furio Colombo, 1995,Conhecer o Jornalismo Hoje - Como se faz Informação,Editorial Presença, Lisboa, p.24.4 . Piedrahita, Manuel, 1993, Periodismo Moderno - Historia,Perspectivas y Tendencias, Editorial Paraninfo, Madrid, p.32 e ss.5 . Cardet, Ricardo, sd, Manual de Jornalismo, col. NossoMundo, Editorial Caminho, Lisboa, p. 39 e ss.6 . Crato, Nuno, 1992, Comunicação Social - A Imprensa,Editorial Presença, Lisboa, p. 109 e ss..

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1. O papel do Jornal7 . In Piedrahita, Manuel, 1993, Periodismo Moderno -Historia, Perspectivas y Tendencias, Editorial Paraninfo,Madrid, p. 39.

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II. O papel do jornalista

Informar, segundo o dicionário universal daLíngua Portuguesa, é “dar conhecimento, noticiar,avisar, esclarecer; colher informações ou notícias,inteirar-se de”. Como tarefa, é das mais exigentes:requer atenção, perspicácia, vivacidade de espíritoe inteligência para a recolha da informação; e aindaum perfeito domínio da língua em ordem a transmitir,de forma adequada, essa mesma informação. Nãoé raro encontrar estas qualidades reunidas numcandidato a jornalista. Muito mais raro é encontrara outra grande qualidade do jornalista: humildadesuficiente para se apagar face ao acontecimento quese relata.

Salvo muito raras excepções, o papel que umjornalista desempenha num acontecimento, as emoçõesou dificuldades por que passou, não fazem parteda notícia. Os americanos sintetizam-no muito bemcom o newsmen is no news. O jornalista pode é,por vezes, informar os seus leitores das condiçõesde produção da notícia – como lhe foi vedado oacesso a certas áreas ou fontes, ou como certosefeitos resultaram precisamente da presença dos mediano local. É que neste caso a informação que eleaporta contribui para que o leitor ou espectadorpossa avaliar com outros olhos o acontecimento querelata

É ridículo o homem que vai cobrir o grandeincêndio na Serra da Estrela, do qual já resultaramvários mortos e dezenas de habitações destruídas,abrir a reportagem de forma descabidamente emotiva,e contando como quase se viu cercado pelo fogomas felizmente escapou ileso. Pese embora o exagerodo exemplo, o jornalista tem de perceber que o critério

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de proximidade se apl ica à proximidade doacontecimento com os seus leitores, e não com elepróprio.

Outra vertente da humildade necessária aoexercício da profissão prende-se com a capacidadede resistir a misturar factos com opiniões e, de algumaforma, manipular os leitores induzindo-os a retiraremdeterminado tipo de conclusões. As opiniões dojornalista são certamente muito importantes paraa namorada, o cão, os vizinhos e o seu círculo deamigos – serão até muito importantes em termosabsolutos - mas ele não tem o direito de se servirdo medium onde trabalha para tentar influenciar opúblico que espera dele seriedade, rigor e isenção.Misturar factos com opinião, aparência de rigor commanipulação , devem ser cons ideradas fa l tasprofissionais muito graves.

O papel do jornalista é fazer com que o jornalcumpra o seu dever de informar os leitores, e porisso muito do que já foi dito se aplica também àactividade de quem escreve para jornais. O jornalistanão é uma vivandeira que espalha boatos e devassaa intimidade e privacidade das figuras públicas1 ;não trafica influências; não paga nem presta favores;não promove nem desfaz a imagem de ninguém;não ameaça; não dá recados; não trai a confiançados leitores ou das fontes; não se arvora juiz ouautoridade moral das questões quando relata factos.Limitar-se-á a relatá-los.

Tudo o que fará se resume pois numa frase:o jornalista cumpre escrupulosamente o códigodeontológico e os princípios éticos que norteiama sua actividade. Por dever, mas também no seumelhor interesse.

Todo o jornalista que permaneça tempo suficienteem actividade descobrirá, mais cedo ou mais tarde,

2. O papel do jornalista

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que uma vez ou outra se enganou ou foi enganado- por pessoas hábeis ou desonestas, ou em questõesde peritagem que não pode dominar. O cumprimentode regras de equidade e distanciamento na apresentaçãodos factos assegura, mesmo em tais casos, quenem ele nem o leitor foram ludibriados. Para istoé preciso humildade e admitir sempre, como princípioheurístico, que as coisas podem não ser aquilo queparecem apesar de parecerem muito ser aquilo quesão. Nunca pode esperar não se enganar. Infalibilidade,só mesmo o Papa.

Em suma, o jornalista, enquanto trabalha, deveser um céptico radical. Se não souber como serum céptico radical, leia o Discurso do Método, eaplique-o, mas só até à parte pré-res cogitans.

Como corolário de todas estas característicasdo jornal e do trabalho dos jornalistas, mais algumasregras:

- Aceitar críticas fundamentadas, reflectir sobreelas, agradecê-las quando for caso disso; mas nunca,por nunca, ceder a pressões de qualquer tipo. Ojornalista na realização do seu trabalho é soberano.

- Não agir como um deslumbrado misturando-se com acontecimentos ou personalidades. Nuncaserá uma delas, e está a um passo de ser utilizado– como o tolo da aldeia que faz recados a todaa gente – provocando danos irreparáveis na suareputação profissional.

- O jornalista não é amigo dos seus entrevistados,nem parte nas causas que relata; quando o for, deverejeitar o serviço porque sabe que a proximidadeexcessiva prejudica a sua isenção.

- As fontes devem ser cultivadas, evitando porémcuidadosamente a promiscuidade. Em meios pequenosesta questão é muito sensível porque o jornalistase vê compelido a recorrer amiúde às mesmas fontes,

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criando inadvertidamente relações de familiaridadeque dificultam o seu trabalho. Deverá sempre preferirser respeitado a estimado.

O jornalista deve ainda ser inteligente, pensarpela sua própria cabeça, possuir uma dose suficientede sentido crítico, e auto-estima em níveis razoáveispara não se deixar influenciar indevidamente pelosoutros nem sucumbir a pressões. Num certo sentido,será um individualista. Gozando profissionalmentede grande autonomia e liberdade de movimentos,quando realiza um serviço, ele é juiz e soberanodo seu próprio trabalho; e quando toma decisões,deverá ter a certeza de que foram as melhores decisõespossíveis, quer quanto ao material noticioso, querquanto aos seus pares – que podem simplesmenteestar a fazer coisas diferentes ou de outra maneira.

É verdade que é natural a tendência para o“gregarismo”: fundir-se sistematicamente em poolcom outros jornalistas - mesmo quando o assuntonão o justifica – e avaliar e editar a informaçãorigorosamente da mesma maneira. E é natural porqueajuda a consolidar a imagem que o jornalista temde si, e a ilusão de que presta um bom serviçoe reporta os factos.

Só que esta política – que quando conduzidasistematicamente tem a ver com preguiça, comodismo,ou simplesmente falta de aptidão profissional -tem por resultado a médio e a longo prazo a criaçãode pesadas rotinas burocráticas; estereótipos emaneirismos na forma de veicular notícias; faltade imaginação, noticiários entediantes, cinzentismoe mediocridade.

Com o tempo, cria-se uma verdadeira fábricade lugares comuns onde a tendência é nivelar tudopelo mínimo denominador comum. Ora esta é umaprofissão em que é impossível acomodar-se. Para

2. O papel do jornalista

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manter o interesse pelo produto que se oferece, aindaque ligeiras, são necessárias alterações nos textose evolução. Os jornais (e os jornalistas) que estagnamno tempo – quando é sua obrigação, recorde-se,estar em sintonia com a actualidade - e não aprendemnada de novo, congelam, fossilizam. Poderão manteros seus fiéis leitores mas são incapazes de conquistarnovos, e quando essa geração desaparecer, estãocondenados também a extinguir-se. Foi o caso de“O Diário”, que fechou, apenas, porque os seus leitorescom o passar dos anos foram morrendo.

É pois desejável ser original, inovar e procurarmelhorar continuamente. O que nunca se pode esqueceré que leitor quer isso, quer novidade, mas tambémé um animal de hábitos e rotinas. Habituou-se aestimar e ler o seu jornal, diz até que não saberialer outro. Possui determinadas rotinas cognitivasem relação ao jornal que lhe dão segurança e garantemum acesso rápido e eficiente à informação que pretende.Habitua-se ao estilo, à paginação, ao aspecto gráfico,ao corpo de letra utilizado, a ir directamente à páginaonde escreve o seu colunista preferido ou às notíciasde desporto... enfim, a mil e um pormenores quegarantem a sua fidelização a um determinado produto.

Não se pode portanto impunemente violentaro perfil de um jornal. Intervenções demasiado radicaispodem ter custos elevados. Mas também não sesobrevive sem evolução. Inovar é inevitável, sobpena de, não o fazendo, pôr em risco a empresae os que nela trabalham.

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Notas

1. É claro que a profissão se presta ao mexerico eà bisbilhotice, mas uma boa parte das informações queos jornalistas obtêm, nunca chegam, por essa razão,a ver a luz do dia nos jornais.

2. O papel do jornalista

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III. Organização da Redacção

Em termos de organização interna da empresajorna l í s t ica , os jo rna is encont ravam-setradicionalmente divididos em quatro grandes áreas:Administração, Redacção, Sector Comercial, eOficinas (impressão e distribuição). Outros tempos,tempos em que as empresas jornalísticas erampraticamente auto-suficientes: possuíam rotativas esistemas de distribuição próprios. Hoje só muitoraramente tal sucede. A partir de meados da décadade 80 impressão e distribuição passaram a ser entreguesa firmas exteriores especializadas só nessas áreas,com ganhos consideráveis para as empresasjornalísticas ao nível dos custos de produção. Aquiocupamo-nos apenas da orgânica e funcionamentoda Redacção de um jornal, que é, de resto, dadasas suas características de jornal universitário emsuporte digital, a única secção do jornal tradicionalque o Urbi et Orbi possui.

3.1. A Direcção

A Direcção do jornal é composta pelo director,que pode ser coadjuvado por directores-adjuntos ousub-directores. São, em geral, tarefas do directordo jornal:

§ definir a orientação e a linha editorialda publicação, o que faz, entre outras formas,através dos editoriais que periodicamente escreve;

§ representar o jornal em ocasiõesimportantes para a vida da publicação;§ convidar e manter a ligação com os colaboradores

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3. Organização da Redacção

mais importantes do jornal;§ assumir as responsabilidades legais

decorrentes dos textos não assinados que sãopublicados no jornal; e co-responsabilizar-sepelos textos cujo autor está identificado;

§ promover a ligação - tarefa por vezesdelicada - entre a Administração do jornal, dequem tem a confiança, e a Redacção;§ executar as directivas da Administração - gestãode pessoal e de custos, por exemplo - esimultaneamente zelar pelo bom ambiente naredacção e pela integridade do produto final;

§ tendo responsabilidades na gestão depessoal, promoções e constituição das hierarquiasque coordena, deve avaliar os jornalistas quecom ele trabalham e esforçar-se por agir segundocritérios de justiça e equidade;

Na grande maioria dos jornais o director assumehabitualmente responsabil idades editoriais naprodução da publicação, nomeadamente:

§ supervis ionando a rea l ização dereportagens e trabalhos de maior fôlego eimportância para o jornal, ajudando a definiro ângulo de abordagem e os meios humanosque serão colocados ao serviço da peça;

§ auxiliando o chefe de redacção a definiro perfil dos números do jornal e da primeirapágina;

§ escolhendo, em conjunto com a chefiade redacção, destaques, títulos e textos queintegram a primeira página;

§ lendo as peças mais delicadas, já queterá de se responsabilizar por elas; podendo,ou não, ser informado pelo jornalista da identidade

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de fontes confidenciais.No entanto, por força das suas funções, o director

pode por vezes encontrar-se ausente da publicação,e, no caso dos órgãos que produzem materialinformativo diariamente, folga, como qualquertrabalhador, não podendo acompanhar todas as edições.É por isso que as chefias de redacção, na ausênciada Direcção, gozam de autonomia para cumprir taistarefas; sendo estas, por vezes, consoante a organizaçãodas empresas , maior i ta r iamente da suaresponsabilidade.

O director do jornal é nomeado pelosproprietários da publicação, ouvido o Conselho deRedacção, quando o haja. Se, no exercício das suasfunções, vier a sofrer mais de três condenações porcrimes cometidos através da imprensa é forçado aresignar.

Por determinação do Estatuto da ImprensaRegional, também quem exerce funções de direcçãonuma empresa jornalística tem direito ao título deequiparação a jornalista, mesmo que o não seja,a que corresponde um documento de identificaçãopróprio emitido pela Comissão da Carteira Profissional.

São impresc indíve is po is , a lém deprofissionalismo, inteligência e bom senso, qualidadesmorais e humanas. O director do jornal deverá seruma figura grata aos jornalistas que trabalham naRedacção, e, simultaneamente, possuir a confiançae poder negocial junto da Administração. Porinerência, devido ao poder de que goza, o directorde um jornal é também geralmente uma figura pública,e como tal deverá ter uma reputação impoluta, seruma figura credível e digna. Um director que jánão possua, junto da opinião pública, este perfil,abalará irremediavelmente o prestígio da publicaçãoque dirige.

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A Lei de Imprensa, no Artigo 20º, estabeleceem relação ao director de publicações periódicaso seguinte:

“1 - Ao director compete:a) Orientar, superintender e determinar o

conteúdo da publicação;b) Elaborar o estatuto editorial (...)c) Designar os jornalistas com funções de

chefia e coordenaçãod) Presidir ao Conselho de Redacçãoe) Representar o periódico perante quaisquer

autoridades em tudo quanto diga respeito amatérias da sua competência e às funções inerentesao seu cargo.

2 - O director tem direito a:a) Ser ouvido pela entidade proprietária

em tudo o que disser respeito à gestão dosrecursos humanos na área jornalística, assimcomo à oneração ou alienação dos imóveisonde funcionem serviços da Redacção quedirige;

b) Ser informado sobre a situaçãoeconómica e f inance i ra da en t idadeproprietária e sobre a sua estratégia emtermos editoriais”

Por outro lado, o Estatuto da Imprensa regional,relativamente à figura do director, acrescenta ainda,no Artigo 6º, o seguinte:

“1. Para além dos jornalistas profissionais queexerçam as suas funções em publicações daimprensa regional, são ainda consideradosjornalistas da imprensa regional os indivíduos

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que exerçam, de forma efectiva e permanente,ainda que não remunerada, as funções de director,subdirector, chefe de redacção, redactor ourepórter fotográfico (...)2. Os indivíduos referidos no número anteriortêm direito à emissão de um cartão de identificaçãopróprio”, emitido pela Direcção-Geral daComunicação Social.

3.2. A Sub-direcção

A sub-direcção do jornal, quando exista, tempor função coadjuvar o director na execução dastarefas que lhe incumbem. Em princípio um director-adjunto pode desempenhar todas as tarefas que cometemà Direcção, já que parte importante das suasatribuições é substituir o director na sua ausência,tomando decisões e preenchendo as funções que estenormalmente tomaria. O sub-director gozará,evidentemente, da confiança da Administração e dodirector e, tendo responsabilidades na definição dalinha editorial da publicação, deve actuar de formaconsentânea com o director do jornal, cujas opçõesaceita e partilha.

3.3. O Conselho Editorial

O Conselho Editorial, como o nome indica, éum órgão consultivo com responsabilidades nadefinição da linha editorial do jornal, e cujoselementos podem ser, igualmente, colaboradores dapublicação. Tendo por tarefa aconselhar a Direcção,reflectir sobre o produto e o cumprimento da linhaeditorial, e pugnar pela qualidade e aperfeiçoamentodo jornal, é um cargo que deverá ser ocupado por

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profissionais experientes e idóneos, ou figuras dereconhecido mérito que - para além das contribuiçõesconcretas que poderão prestar - ao avalizarem apublicação emprestam-lhe também algum do seuprestígio.

3.4. A Chefia de Redacção

A chef ia de redacção tem uma funçãomarcadamente executiva, competindo-lhe coordenare supervisionar todo o trabalho produzido naRedacção, organizar cada número do jornal eresponsabilizar-se - sozinha ou em colaboração coma Direcção - pela execução da primeira página.

Assim como o director reporta à Administração,que se subordina aos accionistas do jornal, a chefiade redacção reporta ao director do jornal. O chefede redacção pode ser coadjuvado por sub-chefesde redacção - na verdade nos diários esta estruturaé praticamente incontornável, já que é necessáriosubstituir o chefe de redacção durante as suas folgas.

3.5. Editores de Área ou Secção

Os editores ou chefes de secção têm por tarefacoordenar os trabalho dos redactores da sua área,editar as peças jornalísticas por eles produzidas,e definir, consoante o número de páginas que lhesforem atribuídas em cada edição, os textos queserão inseridos e a localização e paginação. Tal implicauma apreciação valorativa dos trabalhos que vãochegando à Redacção, e experiência suficiente paraajudar a definir ângulos de abordagem e rever peçasjornalísticas. Ao longo do dia, reúnem várias vezes

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com os jornalistas para saber do andamento dostrabalhos, e com a chefia de redacção, a quem informamda existência de trabalhos que poderão vir a integrara primeira página.

Compete-lhes a grande responsabilidade de“fechar” um número pré-determinado de páginas –haja muitas ou poucas notícias – e programar coma devida antecedência aqueles dias do calendárioem que o fluxo de informação que chega às redacçõesabranda significativamente – caso dos feriados deNatal e Ano Novo; ou do mês de Agosto, em quea política, os serviços dependentes do Estado, emuitas outras fontes do jornal, vão a banhos.

3.6. Redactores

São os jornalistas que elaboram os textos quecompõem o jornal. Normalmente estão ligados auma secção e editoria e especializam-se na áreaem que trabalham: Sociedade, Cultura, Educação,Política... Devem dominar todos os géneros poisserão solicitados para serviços muito diversos: notícia,crónica, reportagem, fait-divers, e por vezes mesmoopinião.

Aos jornalistas, ou redactores, são atribuídostrabalhos pelos editores ou chefias, dos quais estesse deverão inteirar através da consulta da Agenda.A partir desse momento, o jornalista diligente deveprovidenciar para a sua execução o mais rapidamentepossível, cumprindo rigorosamente as dead lines dapublicação onde labora, as quais variam de órgãopara órgão: é muito diferente, em termos temporais,produzir uma peça para uma agência noticiosa, umjornal diário ou um semanário.

No caso do jornalista de agência, este sabe de

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antemão que o trabalho que realiza tem de chegaràs redacções dos jornais a tempo de ainda vir aser utilizado pelos diários. Também nestes últimos,o fecho da edição é sagrado – só acontecimentosmuito excepcionais poderão levar a que se atrase,mas mesmo assim só por algumas horas, o fechode um jornal. As rotativas não vão é parar por causade uma reportagem sobre a caça ao pato bravo quenão ficou pronta para a edição aprazada. E sucessosdesses devem ser evitados pelo jornalista responsável,pois colocam dificuldades ao editor, à chefia deredacção, e mesmo aos outros redactores, que podemser chamados a preencher o espaço deixado em brancopelo colega.

3.7. Colaboradores

Os colaboradores são pessoas que colaboramcom uma publicação através da realização de trabalhojornalístico, e fazem-no numa base regular. O tipode colaboração prestada varia muito, consoante oacordo em vigor entre o prestador do serviço e aempresa, e pode ir desde o auxílio nas secções dedesporto ao fim-de-semana, até ao profissional quepropõe t rabalhos da sua lavra aos edi tores ,encarregando-se depois de os executar.

Também há colaboradores que asseguram rubricasfixas nas publicações – gastronomia, cinema, faits-divers, polícia, opinião – realizando exclusivamenteessas tarefas, e consequentemente não integrandoas rotinas de trabalho dos outros jornalistas daRedacção. Há até colaboradores que permaneceminvisíveis aos jornalistas, porque lidam directamentecom as chefias ou os editores de área, fazendo chegaros seus trabalhos à Redacção, onde raramente se

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deslocam.Os colaboradores, que podem ou não ser jornalistas

profissionais, não são funcionários da empresajornalística, onde não trabalham a tempo inteiro,e o seu trabalho pode ser remunerado ou não.

3.8. Colunistas

Colunistas são personal idades de peso ereconhecido mérito social, intelectual, ou outro, queasseguram rubricas de opinião fixas nos jornais ondecolaboram. Em geral é possível avaliar a pujança,qualidade, e mesmo a linha ideológica de um jornalatravés da análise do elenco de colunistas que integrama publicação. Ao contrário dos editoriais, e dos artigosde opinião não assinados, os trabalhos dos colunistasnão representam a linha editorial do jornal nemcomprometem toda a publicação e os que nelatrabalham.

Os colunistas exprimem e emitem opiniões emnome individual, sobre temas gerais ou áreasespecíficas, porque lhes é reconhecido mérito parao fazerem, mas as suas pos ições não sãonecessariamente partilhadas pela Direcção ou pelosjornalistas da casa. Muitos, funcionam comoverdadeiros opinion makers devido à profundidadedas suas análises e à justeza das suas conclusões.

Podem ser tomados como índice da saúde eaté mesmo da linha ideológica de um jornal, porqueum bom colunista já famoso não vai escolher umjornal que menospreza para publicar os seus trabalhos– preferirá um que garanta a maior circulação possíveldas suas ideias junto do tipo de público que prefere;e também porque aqui opera – como em tudo comexcepções - uma espécie de selecção natural: um

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militante comunista não escolhe ser colunista deO Dia – e mesmo que escolhesse o seu trabalhoprovavelmente seria rejeitado; nem o conhecidoeconomista de tendência ultra-liberal procuraria oextinto O Diário para publicar as suas crónicas.

Um jornal verdadeiramente pluralista, conseguiriaporém – e muitos fazem-no – conciliar colunistasdas mais variadas tendências, o que é positivo porqueaumenta a riqueza do jornal, a quantidade de informaçãoque este traz aos leitores, estimulando o debate ea livre circulação de ideias.

3.9. Secretaria de Redacção

A Secretaria vela pela parte logística do jornale pela organização do serviço da Redacção. É dasua responsabilidade a elaboração da Agenda e dosdossiers e elementos de background que o jornalistautilizará na elaboração do serviço.

Durante as deslocações dos jornalistas, é asecretaria quem trata das reservas de bilhetes e hotéis.Pode também - no caso dos jornais que dispõemde frotas automóveis - gerir a utilização dos carrose motoristas.

Tratam ainda de recuperar as “tarifas” - textosou imagens - enviadas pelos correspondentes.Encarregam-se da elaboração dos mapas de folgas;da gestão de pessoal para trabalhar durante os feriadose piquetes; de controlar, e justificar, as faltas dosjornalistas; e da elaboração dos mapas de férias,e das “folgas atrasadas” de cada jornalista.

Para além disso, colaboram ainda no trabalhoda Redacção, elaborando “recortes” de outros jornais,escuta de rádio e televisão; e distribuindo peloseditores e chefias os telexes de agência que vão

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chegando durante o dia.Poderão ainda ser responsáveis pela execução

de certas páginas: cinemas, televisão, telefones úteis;e encarregam-se - trabalho especialmente penoso- de “desgravar” os serviços que os correspondentesou enviados especiais fazem chegar à Redacção atravésdo telefone.

3.10. Arquivo

O Arquivo é uma das secções mais importantesdo jornal - só um bom serviço de arquivo permitereconstruir o background de um acontecimento, ourelacionar acontecimentos passados com casospresentes - aquilo que muitas vezes distingue umjornal que trata a informação em profundidade, daqueleque se limita a viver exclusivamente o presente.É evidente que a experiência e memória de um jornalistaconstitui um excelente arquivo - mas ele apenasguarda temas ou tópicos, não os dados concretosde ocorrências: isso compete ao Aquivo fornecer,quando solicitado.

Até há bem pouco tempo os arquivos1 eramperfeitamente artesanais: constituídos por dossiersde recortes indexados por assuntos, e estes, por suavez, catalogados por ordem alfabética. As desvantagenseram muitas: pesquisa morosa, dificuldades deindexação; e embora a notícia - vários recortes -pudesse ser arquivada em várias categorias o mesmonão sucedia com as fotografias - uma imagem, umassunto - o que limitava grandemente o potencialdo arquivo fotográfico.

A digitalização veio revolucionar as concepçõesde arquivo e a forma como este era realizado egerido. A maioria dos jornais optou por criar arquivos

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digitais dos seus textos e imagens; e algumaspublicações chegam mesmo a colocar, acompanhadode um motor de busca, a totalidade do arquivo online.

É evidente que o Urbi et Orbi possui um arquivodeste tipo, disponível para consulta pública nas suaspáginas. Todos os textos e imagens que forempublicados no Urbi passarão a fazer parte de umabase de dados onde a pesquisa poderá ser feita apartir dos critérios de indexação ou através da buscade palavras chave no interior do próprio texto.

Embora a possibilidade de pesquisar palavras-chave no interior dos textos ajude a colmatar eventuaiserros de que a indexação em base de dados possaenfermar, a verdade é que a realização de um arquivoexige preparação e sensibilidade da parte de quemdesempenha a tarefa.

Preparação porque os critérios de indexação deimagens ou textos são eminentemente jornalísticos:uma imagem cataloga-se não por ser interior ouexterior; natureza morta ou animada; a cores oua preto e branco; pela impressão ou tamanho; mas,sobre tudo , pe la re levânc ia jo rna l í s t ica doacontecimento que narra, e os usos potenciais quea publicação poderá vir a fazer dela no futuro. Assim,uma imagem do primeiro-ministro a ser apedrejadopor populares durante uma greve poderia ser indexadaem: Guterrres, Segurança, Violência, Manifestação,Greve...

Nunca é demais frisar que num arquivo éespecialmente necessária sensibilidade e bom senso.O editor de fotografia do mais antigo diário portuguêsdo continente costumava contar como salvara inextremis o acervo mais precioso do arquivo fotográficodo jornal. Certo dia ao entrar no Arquivo, que estavaem reestruturação (leia-se arrumações) depara com

3. Organização da Redacção

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um administrativo a rasgar fotografias do início doséculo que além de deslumbrantes constituiampreciosos documentos históricos. “Estas, Sr. X, sãovelhas, já não prestam...”

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Notas1. O Arquivo é uma secção específica do jornal, e não sepode confundir o trabalho que realiza com as “colecções”de jornais - capas onde se vão colocando por ordem cronológicaos jornais do dia - que todas as Redacções têm permanentementeà disposição dos jornalistas.

3. Organização da Redacção

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IV. O percurso da Informação

A notícia, antes de ser apresentada ao públicocomo produto acabado, passa por diversas fases deselecção e processamento que condicionam, em maiorou menor grau, o seu formato final e constituem,no seu conjunto, o trabalho que uma Redacção realizadiariamente.

Da mesma forma que uma Redacção não é compostasomente por jornalistas-redactores, também as notícias,antes de assumirem a sua forma definitiva, não passamsomente por uma mão, e isso é um factor positivoporque impede que razões meramente subjectivas– leia-se pessoais – determinem o seu conteúdo eo espaço que ocuparão na publicação.

É possível listar pelo menos seis instâncias deselecção e tratamento da notícia, que poderão,consoante os casos, multiplicar-se ou, pelo contrário,sofrer um afunilamento. Mas regra geral, toda anotícia:

1. Não importa a via pela qual chegue ao jornal,começa por ser seleccionada pela direcção, chefia,editores, secretários de redacção, durante oprocesso em que as informações são colocadasna Agenda, ou negligenciadas.

2. Seguidamente os editores, atendendo aosrecursos humanos e meios disponíveis nessedia, fazem a marcação da agenda, distribuindoos serviços pelos redactores. É também durantea marcação da agenda que se estuda o ângulode abordagem de um trabalho, o espaço quelhe poderá ser dedicado nessa edição, e se otrabalho terá ou não reportagem fotográfica.

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Todas estas operações de selecção dependemde cont ingências diversas como sejam aquant idade de jorna l i s tas d isponíve is , aquantidade de serviços agendados – e é tendoestes dados em conta que se determinará o ângulode abordagem do tema e os seus privilégiosde espaço. Normalmente nesta fase uma partedos serviços – aqueles que são avaliados comomenos pertinentes - “caem”1 em favor dos maisrelevantes.

3. O jornalista e os repórteres fotográficos tomamconhecimento dos serviços agendados e começama preparar a realização do trabalho, documentando-se sobre o assunto, preparando entrevistas,recolhendo dados, e, finalmente, deslocando-se ao sítio onde decorre o acontecimento elevantando o máximo de informações posssíveisa esse respeito. Tal levantamento passa pelaobservação directa e realização de entrevistas,que poderão depois ser complementadas commais contactos e novas entrevistas assim quese chegue à Redacção, e sempre que o assuntoo justifique. Nesta fase, de recolha de informação,os jornalistas fazem também muitas escolhas.Dos dados observados e recolhidos podem resultaralterações radicais no ângulo de abordagem edimensões do trabalho – o serviço mais anódinopode tranformar-se na machete do jornal, ouvice-versa, o trabalho mais promissor no chouriçomais entediante.

4. Quando dá por finda a recolha de informações,o jornalista passa à fase de criação, durantea qual deverá redigir o trabalho: notícia,entrevista, reportagem... elaborar “caixas” e

4. O percurso da Informação

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títulos, e ajudar o editor a escolher as imagensmais adequadas para ilustrar o acontecimento.

5. A notícia volta a sair das mãos do jornalistaque a elaborou quando passa à fase da edição.Assim que termina de redigir o seu trabalho,o jornalista entrega-o ao editor ou chefe desecção, o qual tem por tarefa editar a peça,isto é: lê-la integralmente (a atenção com quea lê é proporcional à experiência do redactore à importância do assunto); corrigi-la e modificá-la, conformando-a ao livro de estilo do jornal;proceder a cortes no texto sempre que este excedaem caracteres o espaço disponível; escolher odestaque que levará nas páginas da secção queo editor dirige - e isto tem de ser conjugadocom a inserção da publicidade; a forma comoe o local onde deverá ser paginado; as imagens,gráficos ou infografias que o ilustrarão; e ainda,eventualmente, a elaboração dos títulos e legendas,sempre que o redactor, como deveria, não seencarregou disso ele próprio.

6. O chefe de redacção, depois de reunir comos diversos editores e de se inteirar dos trabalhosimportantes que estes têm em mãos, escolheo tema que fará a manchete do jornal e as restanteschamadas à primeira página. Depois seleccionaas imagens necessárias e elabora os títulos etextos que constituirão esta “montra” do jornal– um resumo hierarquizado e apelativo do quede mais substancial a publicação tem para ofereceraos seus leitores.

Duas notas ainda sobre o percurso da informação:O ângulo de abordagem da notícia ou reportagem

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pode ser proposto pelo jornalista, pelos editores,chefia de redacção, ou pela direcção. Não é ummanifesto nem um programa político - normalmentetratam-se de decisões sensatas e ponderadas sobrea melhor forma de aproveitar o potencial de umanotícia. Mesmo quando não haja instruções explícitasnesse sentido, o ângulo de abordagem deve, quandoas circunstâncias o permitirem, ser debatido pelojornalista com os responsáveis editoriais.

De qualquer forma, e especialmente nos trabalhosde profundidade, ponderar o ângulo de abordagem- mesmo que este venha a ser alterado depois doconfronto com os factos - é em geral melhor doque o improviso e a tábua rasa.

4. O percurso da Informação

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Notas

10. “Deixar cair” uma notícia ou assunto é desinteressar-se dele, dando-lhe menos relevância que a que tivera emedições anteriores do jornal ou, pura e simplesmente, nãoo noticiando.

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V. Os géneros

5.1. A Notícia

Daniel Ricardo considera caracter ís t icasessenciais da notícia a veracidade, actualidade ea capacidade de interessar, sendo que os valoresque imprimem interesse a factos actuais e verdadeirossão a proximidade, a importância, o conteúdo humanoe a originalidade1 .

Notícia, é pois, em princípio, tudo aquilo queum jornal publica; mas em sentido técnico, enquantogénero, a definição de notícia é mais restrita. Refere-se a textos eminentemente informativos, relativamentecurtos, claros, directos, concisos e elaboradossegundo regras de codificação bem determinadas:título, lead, subtítulos, construção por blocos, e emforma de pirâmide invertida.

5.1.1.Lead

O lead é o primeiro parágrafo da notícia e neleo leitor deverá encontrar resposta a seis questõesfundamentais: O Quê, Quem, Quando, Onde, Porquêe Como; sendo que as duas últimas questões – Porquêe Como – podem as mais das vezes omitir-se dolead, guardando-se para o parágrafo subsequente.

A razão é que, antes de mais, os leads têmduas funções a cumprir: informar imediatamente oleitor das características mais importantes do factoque se noticia; e serem atraentes apelando à leiturado resto do texto. Leads muito pesados dificultama compreensão e desencorajam a leitura.

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Com bom senso e discernimento, o jornalistasaberá naturalmente quais as perguntas que sesacrificam no lead, ou se se incluem todas. Tambémhá casos onde algumas das questões - geralmente“quando” e “onde” - são desnecessárias. “A Câmarado Porto aprovou hoje, na sala de sessões dos Paçosdo Concelho , a l te rações ao P lano Direc torMunicipal...” é uma informação tautológica.

Quando, que é o caso mais comum, o lead deuma notícia é composto por apenas uma frase, éde extrema importância a escolha do verbo utilizado,que deverá se r d i rec to , for te , de acção , epreferencialmente no presente do indicativo, poisé este que dá o “tom” (leads) da notícia. Agoraatenção, o conteúdo semântico do verbo tem de respeitarrigorosamente o acontecimento.

Um lead bem construído dispensa o leitorapressado de se deter no resto da peça, porque ainformação básica mais importante já foi dada; masse retiver o carácter apelativo é, simultaneamente,o melhor anúncio publicitário que tal peça podeter – e o leitor quererá lê-la até ao fim. Neste sentido,todo o jornalista sabe da importância que tem aconstrução de um bom lead, e como, obedecendoàs regras, é possível investir tempo e cuidado emqualidade e originalidade. Leads preguiçosos - “chapaquatro” - marcam as peças e, com o tempo, marcarãotambém o jornalista.

A formulação “responder aos quatro Q’s” podeparecer artificial e forçada, mas a verdade é queos factos que devem constar do lead correspondemàs perguntas que a generalidade das pessoas colocaquando deseja inteirar-se de um acontecimento. Sãopois “naturais” no sentido em que estão intimamenteligadas à nossa forma de conhecer e narrar uma

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5. Os géneros

história. Isto para dizer que o jornalista, quandoconstrói um lead, não deve estar obcecado em amontoarnele a resposta a todos os Q’s da cartilha – apenasdizer de forma clara o que de mais importante sepassou. Com um pouco de prática a escrita passaráa fluir ligeira e sem esforço.

O Cônsul honorário dePor tugal em Marrocos(Quem) foi detido (O quê)ontem (Quando) no porto deCeuta (Onde) com mais de86 quilos de haxixe (Porquê).

É um perfeito lead informativo, que diz tudoquanto um leitor apressado necessita de saber sobreo assunto antes de decidir se prossegue a leitura.O parágrafo que segue o lead deverá depois conterprecisões dos factos aí narrados, o que se faz, nestecaso, precisando a identidade do protagonista e ascircunstâncias que rodearam a sua detenção:

“Ahmed B. de 54 anos, foi detidona terça-feira à tarde quandotentava embarcar ao volante deum veículo automóvel do corpodip lomát ico por tuguês , quetransportava, num fundo falso, adroga apreendida pe lasautoridades espanholas.”

A ordem pela qual as questões se seguem nolead depende apenas do assunto em causa e do que,num dado facto, é mais importante, de forma queum lead pode iniciar-se por qualquer uma das perguntas:

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O Quê – “Um aparatoso acidente rodoviário,do qual não resultaram vítimas, manteve fechadapor mais de 12 horas a Linha da Beira Baixa,impedindo a circulação do Sud Express”

Quem – “Francisco Verde substitui ArlindoCunha na pasta da Agricultura já a partir dapróxima segunda-feira...”

Quando – “A partir de Janeiro os taxistasvão ter de prestar mais atenção à forma comose comportam na presença de passageiros...”

Onde – “O Porto é hoje palco de mais20 concertos rock no âmbito...”

Como – “Armado de um saco de plásticoe três carrinhos de linhas, Luís Pinto escalouontem a Torre dos Clérigos, no Porto, um feitoque lhe valeu...”

Porquê – “Para pôr fim à greve dos médicose enfermeiros o Governo decidiu...”

Nem todos os leads obedecem as estas regrasde construção, e, no caso da reportagem ou faitdivers, tal não é sequer desejável. O lead directo,aquele que resume com brevidade um acontecimento,aplica-se sobretudo às notícias do tipo hard news;ao passo que as soft news2 , curiosidades, casos insólitos,fait divers, pedem um lead retardado, aquele quejá não tem a preocupação de transmitir informaçãodirecta, mas sim despertar imaginativamente o leitor

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para o assunto que aborda. Um bom exemplo delead retardado é o que abria, no Público, a incrívelhistória de Happi Bull:

“Na véspera de Natal, Patricia WhiteBull acordou mal disposta. Olhou paraas desconhecidas à sua volta e disse:“Não façam isso”. As enfermeiras que,num hospital do estado norte-americanode Albuquerque, lhe ajeitavam os lençóisda cama paralisaram. A índia Sioux como nome tribal de Happi acabava dedespertar de 16 anos de coma.”

O tipo de lead a utilizar depende, evidentemente,do carácter do acontecimento; sendo que só os leadsdirectos requerem depois a utlização da pirâmideinvertida e, eventualmente, a construção por blocos.

5.1.2. Pirâmide invertida

A pirâmide invertida é a técnica mais comumde construção das notícias e segue-se naturalmenteda elaboração de um bom lead directo. Significa,muito simplesmente, que numa notícia, a seguir aolead, todas as restantes informações são dadas porordem decrescente de importância, de forma que,à medida que se vai descendo no corpo da notícia,os factos relatados se vão tornando cada vez menosessenciais. Pirâmide invertida porque a base desta,aquilo que é noticiosamente mais importante, seencontra no topo – em ordem muito distinta à queseguem por exemplo a novela, o drama ou o conto.

5. Os géneros

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A pirâmide

5.1.3. Os parágrafos - construção por blocos

A construção por blocos é uma técnica que seassocia frequentemente à pirâmide invertida, emboracada uma possa subsistir de forma independente.Construir um texto “por blocos” significa que cadaparágrafo funciona na notícia como uma entidadelogicamente autónoma. Isto é, os parágrafos sãoconstruídos como blocos estanques, sem ligaçãonecessár ia , nem l inguís t ica nem semânt ica-informativa, com o parágrafo imediatamente anterior.Não é que os parágrafos não tenham, todos, ligaçãocom o acontecimento que narram, que funciona comofio condutor; simplesmente, eles são autónomos emrelação uns aos outros.

A vantagem deste tipo de construção é dupla:por um lado, se o leitor desiste da leitura da notíciaa meio, perde certamente informação, mas não édeixado com nenhuma ideia ou conceito pendentedo parágrafo seguinte; por outro, e esta muito maisimportante, o editor e o paginador sabem que sefor necessário diminuir apressadamente a extensãoda peça podem começar a cortar parágrafos a partirdo fim, sem que se perca informação essencial esem ser necessário emendar ou corrigir os parágrafos

Lead

1º parágrafo

2º parágrafo

3º parágrafo

Etc...

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5. Os géneros

que se mantêm. Num trabalho rigorosamenteconstruído, se o editor continuasse a cortar até sórestar o lead, ainda assim teríamos notícia - umabreve.

5.1.4. Norma e desvio

Não faltam críticos a esta técnica de escritajorna l í s t ica que é cons iderada res t r i t iva ,empobrecedora e l imi tada . Tais cr í t icas sãoinjustificadas. A técnica clássica de construção denotícias sobrevive porque tem provas dadas, e éde facto a que melhor serve quer o tempo de produçãodo jornal - em regra um dia - quer as necessidadese expectativas dos leitores que desejam ser informados.

Mesmo um fanático leitor de jornais, ou umprofissional de imprensa, não dedica mais de duashoras por dia à leitura de jornais3 . Possuimos, alémdisso, uma capacidade de memorização limitada,de maneira que as fórmulas uma frase-uma ideia,e primeiro o mais importante, aumentam a eficáciada comunicação e do acto de informar

É por isso indispensável para qualquer jornalistao domínio perfeito da técnica de construção de notíciasa partir de leads e pirâmides invertidas. Isso treiná-lo-á na distinção entre o essencial e o acessório,e a passar directamente dos pormenores ao coraçãodos acontecimentos. Apreendida a técnica, serviránão só na passagem dos acontecimentos à formaescrita, mas igualmente durante o processo de recolhade informação. O jornalista experiente é focused,sabe exactamente aquilo que pretende, o que é relevantenos factos em apreço, e por isso não se deixa conduzirpelos entrevistados nem permite que estes se esquivemàs questões incómodas.

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Permanecem mesmo assim por responder ascríticas que versam sobre as restrições que esta formade escrever impõe ao estilo. É verdade que aportalimitações incontornáveis, próprias da rigidez dasregras de escrita, só que todas elas podem ser supridasatravés dos restantes géneros jornalísticos e, porqueessencialmente informativa, especialmente pelareportagem ou nota de reportagem. A notícia nemsempre é o género adequado para narrar umacontecimento, e por isso existem os outros géneros,mas é perfeita para veicular certo tipo de informações.

Depois, mesmo aplicando todas as regras, nãohá limites para a criatividade de um jornalista naprodução de uma boa notícia, e pode passar-se umavida inteira a apurar e aperfeiçoar a riqueza, clareza,precisão e concisão da linguagem jornalística, sempreobedecendo às mesmas regras. Ou, de outras vezes,porque não, quebrá-las? Sem dúvida. Algumas. Sóque não é possível subverter, ultrapassar ou melhoraruma técnica sem antes a dominar perfeitamente.

É claro que nem todos os jornais, em todosos momentos, aplicam exclusivamente esta técnicade construção de notícias. O estilo é muito popularna imprensa anglo-saxónica; na continental,imprensa francesa por exemplo, é condimentadocom outras técnicas4 .

Outras estratégias podem ser seguidas naconstrução da notícia. Pode-se ir “alimentando” oleitor com dados importantes o longo de toda a peça,tentando manter vivo o seu interesse. Outra técnicaé poupar dados de grande interesse para o parágrafofinal da notícia, fechando como num soneto, com“chave de ouro”. Também é possível criar suspenseno lead, suspense que não se resolve imediatamenteno parágrafo a seguir, mas só depois de oportunamentese ter espicaçado a curiosidade do leitor. Especialmente

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5. Os géneros

cara à reportagem, mas não exclusiva, é a construçãodo texto na forma de sucessivas pirâmides invertidas,nas quais os temas se encontram ordenados logicamentee separados por subtítulos.

Com ou sem regras estritas, que podem ser umconvite à inovação e originalidade, a plasticidadeda linguagem permite a renovação interminável dasformas. A conformidade ao lead e à pirâmide invertidanão é incompatível com a pertinência, precisão delinguagem, estilo vivo e nervoso, prosa criativa eoriginal que devem caracterizar toda a notícia. Portudo isto, para concluir: no Urbi et Orbi nenhumjornalista faz notícias de outra maneira antes deas saber fazer desta.

5.1.5. Estilo codificado:vantagens e desvantagens

A estruturação das notícias de acordo com atécnica tradicional - lead, pirâmide invertida, blocos- apresenta vantagens e desvantagens, sendo quea maioria dos profissionais admite que as primeirassuplantam largamente as segundas.

As vantagens prendem-se com a “naturalidade”,devido à forma da narração estar muito próxima

Título

Lead

Subtítulo

Subtítulo

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da forma como conhecemos e contamos uma história;a facilidade de leitura e memorização dos elementosmais importantes da notícia; o facto de informareficientemente o leitor apressado e servir à captaçãodo seu interesse; e de se adaptar com facilidadeàs necessidades de edição e paginação de qualquerjornal.

Como instrumento de trabalho é um dispositivopoderoso nas mãos do jornalista. É uma técnica decodificar a realidade, mas também de a “descodificar”,de ler imediatamente os sinais importantes de umacontecimento e saber distingui-los do acessório.Também permite ao jornalista, por mais desfavoráveisque sejam as circunstâncias, narrar um facto comcorrecção jornalística, por maiores que sejam aspressões que enfrenta.

Essas pressões, no sentido de contingências queafectam a realização da notícia, podem ser muitase variadas. As mais comuns prendem-se com limitaçõesde ordem temporal - as rotativas têm horas paracomeçar a funcionar, os acontecimentos não. Acresceque a atribuição da impressão a empresas exterioresao jornal tende a agravar a inflexibilidade da “horade fecho” porque tais empresas não imprimem ummas muitos jornais e não podem pôr em perigo osinteresses dos restantes clientes.

Por tudo isto, 15 ou 20 minutos para redigiruma notícia de última hora - por exemplo um acidentede onde o jornalista acabou de chegar - não é, naRedacção de um diário, uma situação fora do normal.Mas há mais: extremo cansaço físico (na coberturade sinistros ou desastres naturais); uma noite embranco a caminho do local de um desastre depoisde um dia de trabalho; jet lag; situações de perigofísico ou stress de guerra; condições de alojamentoe alimentação deficientes — a lista é praticamente

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interminável. A técnica de redacção de notícias, quese torna um dispositivo quase automatizado, asseguraao jornalista que, mesmo em circunstâncias tãoadversas, ele consegue reportar os factos, se nãoda melhor forma possível, pelo menos de formaaceitável e jornalisticamente correcta.

E este é também o seu calcanhar de Aquiles.As rotinas e os automatismos podem facilmente resvalarpara uma forma “preguiçosa” de fazer jornalismo,que repete até à exaustão fórmulas que o tempodesgasta e já despojou de todo o interesse. É ocaso do lead cronológico reiterado ad infinitum,qualquer que seja o facto que lhe subjaz, uma falhamuito comum, que retém a aparência de notícia,mas não a sua essência:

“ Realizou-se ontem, pelas 19 horas,a segunda Assembleia Geral da SantaCasa da Misericórdia de Serrotes deBaixo ...”“Decorreu ontem...”“Os empresários da Região Centroreuniram ontem...”“O ministro X anunciou ontem...”

São aberturas de leads perfeitamente soporíferasque pretendiam relatar acontecimentos excitantes,cheios de vida e interesse: uma Assembleia Geralde uma Misericórdia em que os irmãos andaramà estalada por causa de dinheiro; a abertura de umcongresso de médicos sobre a dor crónica; o boicotede uma importante associação de empresários a medidasdo Governo; o anúncio de que o Serviço Nacionalde Saúde vai ser privatizado...

Uma boa parte dos defeitos que se assacam àtécnica da pirâmide invertida são acidentais, derivam

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do mau uso da técnica por maus profissionais, enão intrínsecos a esta forma de fazer jornalismo.Por isso o Urbi et Orbi adopta-a como forma básicade veicular notícias directas, sem prejuízo do cuidadoposto nos outros géneros.

“Por mais respeitáveis que sejam osargumentos dos seus detractores, a verdade éque o sistema do lead e da pirâmide invertidapossui potencialidades que seria um erromenosprezar. Trata-se de uma fórmula cujaaplicação não só imprime rapidez à transmissãode informações e clareza à exposição das ideias,como permite escrever depressa e ajustar ostextos aos espaços disponíveis nas páginas (...).Quando são elaboradas em conformidade comaquela técnica, as peças jornalísticas adquiremuma estrutura sui generis, que as distingue dageneralidade das obras de ficção literária: aopasso que, nestas, a narração se desenvolvecronologicamente e num crescendo de tensão,até ao clímax final, naquelas o relato começapelo desfecho da história ou pela condensaçãodo que nela há de inédito e interessante. Poroutro lado, o ritmo especial que a valorizaçãoda actualidade confere aos textos, torna-osimediatamente reconhecíveis como produto daactividade jornalística”5 .

5.2. Títulos

Os títulos anunciam o texto jornalístico queencabeçam, e são aquilo que em primeiro lugar oleitor apreende quando se debruça sobre as páginasde um jornal. O leitor típico vai viajando de título

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em t í tulo até encontrar algo que lhe prendadefinitivamente a atenção, ou corresponda aos seusinteresses quotidianos: aí detém-se, prosseguindoa leitura da notícia. Nenhum jornalista desconhecea importância da arte de titular e, também, asdificuldades que a construção de um bom títuloapresenta.

O título é sempre o mais delicado e o maisdifícil de obter numa peça jornalística. Um bomtruque consiste em deixá-lo para o fim, para depoisde se ter concluído a peça, altura em que o jornalistadomina perfeitamente o seu conteúdo. Por vezesisto basta. Ou então fazer uma pausa e pensar noutracoisa depois de terminado o trabalho — uma formade não menosprezar o poder e a permanente vigíliado subconsciente, que às vezes, surpreendentemente,oferece prendas inesperadas.

Descrever as funções e principais característicasdo título, e ainda fixar algumas das regras a quea sua construção deve obedecer é tudo quanto ummanual pode fazer pelo jornalista. A consecuçãode títulos brilhantes, bons, maus, razoáveis, péssimos,ou geniais é um acto criador solitário, com resultadosmuitas vezes desiguais, que cada jornalista tem deenfrentar sozinho.

Um título, se não necessita sempre de ser directoe imediatamente informativo, deve, mesmo nareportagem, reter algo dessa característica. O títulotem de ser concreto e estar relacionado com o assuntode que fala o texto, informando directamente,levantando pistas sobre o que vai ser revelado, ou,simplesmente, brilhando pela sua oportunidade ouoriginalidade.

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Morreu o escritor Graham Greeneou

Our man in heaven

título que abria a reportagem do Expresso sobreesse assunto, são respectivamente, um correcto títulonoticioso e um brilhante título de reportagem —atente-se que ambos dizem exactamente a mesmacoisa, e que o conteúdo informativo, que não o brilhoda fórmula, é idêntico.

Isto para dizer que, sem prejuízo da maisintensa liberdade e criatividade, o título tem de terrelação com aquilo que titula; aportar, pelo menos,vestígios de informação; e, sobretudo, ser perceptívelpara a generalidade do público a que se dirige. Istoé, os títulos não devem ser herméticos, enigmáticos,elucubratórios, pedantes, acessíveis apenas ao seuautor e ao Altíssimo.

“Consideramos bom o título que prende a atençãode todos os leitores, quaisquer que sejam os seusparticulares interesses, gostos e hábitos de cada um,ou seja: o que salta à vista e, ao mesmo tempo,se revela ‘suficientemente explícito para que todaa gente o compreenda com facilidade, e misteriosoq.b. para suscitar o desejo de obter mais informações’sobre a matéria que apregoa”, diz Daniel Ricardo6 .

Temos pois que os títulos, juntamente com asfotografias, são a primeira coisa, e por vezes a única,a que o leitor atenta no jornal. O título serve assimpara informar, cativar, prender o leitor, despertandoa sua atenção e curiosidade. Um mau título, comoum mau lead, pode matar a melhor peça jornalística.

As dificuldades de elaboração de um bom título

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emergem da necessidade de reunir numa única frasealguma informação, a “essência” do texto a quese reporta, e fazê-lo numa fórmula poderosa, cheiade ritmo, brilho e nervo, e que deve ainda permanecerfiel ao texto que titula. “O título deve possuir umritmo próprio e um equilíbrio interno que o tornem,simultaneamente, apelativo e esclarecedor” resumeSilva Araújo7 .

Apesar da intenção declarada de cativar o leitor,a regra de ouro de todo o título é nunca o enganar,prometendo em título mais do que aquilo que setem para lhe oferecer. O resultado disso são títulosgritantes e sensacionalistas que defraudam e frustramos leitores. O título deve respeitar rigorosamenteo texto a que se reporta, e nunca insinuar — porexemplo, através da descontextualização de uma frase— elementos que a peça não contemple.

Os títulos, antetítulos e subtítulos desempenhamainda uma função estética nas páginas dos jornais,ajudando a quebrar a monotonia das extensas colunasde texto, demarcando a arrumação dos próprios textos,e servindo ao equilíbrio gráfico da página.

No Urbi et Orbi os títulos não podem excederas duas linhas; excepto em chamadas da primeirapágina a uma coluna, nas quais o título pode ocuparaté quatro linhas. Todos os títulos são precedidosde um antetítulo, em corpo de letra menos destacado,o qual nunca pode exceder uma linha de texto. Nostextos em que a sua extensão o justifique serãocolocados subtítulos a negro, com um máximo de25 batidas por linha, e ocupando até duas linhas.

Além disso, para o Urbi et Orbi a primeirapalavra do título inicia com caixa alta, e as seguintes

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— observadas as regras sobre este tema do capítulo“Convenções tipográficas” — sempre que aplicávelcom caixa baixa.

Duas linhas é pois a extensão máxima permitidapara um título de uma peça, embora estes possamter só uma linha. No caso da primeira página, emque a apresentação gráfica dos trabalhos é outra,são admissíveis, quando paginados a uma coluna,títulos com até quatro linhas — mas em tal caso,isto é, sempre que se ultrapassem as duas linhas,deve prescindir-se de antetítulo.

Uma palavra para os antetítulos: tratam-se deuma linha de texto em corpo muito menos destacadoque o do título, e que o precede na abertura deuma peça. O antetítulo completa o título, fornecendoelementos preciosos para a sua inteligibilidade, jáque a condensação a que o título obriga nem semprepermite a contextualização imediata e o enquadramentodaquilo de que fala. O antetítulo retira ao títuloa obrigação de dizer tudo, permitindo a utilizaçãoneste de fórmulas mais breves, e portanto mais vigorosase expressivas. No Urbi et Orbi a sua utilização deveconstituir a regra, a ausência uma excepção.

O título deverá ser, em geral, eminentementeinformativo, condensando a informação incluída nolead. Todavia, nunca é demais dizê-lo, neste aspectoo seu carácter é essencialmente di tado peloacontecimento e pela forma que se escolheu parao narrar — leads retardados pedem títulos ondea criatividade e as preocupações estéticas brilhemmais que a informação.

“A brevidade e a vivacidade do título permitemcertas violências gramaticais. Todavia, deverá conter,expressos ou implícitos, sujeito, predicado e

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complemento (directo ou indirecto). Quanto a outroselementos da frase, nomeadamente algumas partículase artigos, devem ser retirados”, acrescenta SilvaAraújo8 .

Os títulos devem ser construções afirmativas,preferencialmente com o verbo colocado no presentedo indicativo. Por princípio desaconselha-se autilização de títulos negativos — o leitor quer sabero que aconteceu, e não o inverso — e interrogativos,que sugerem que o jornal veicula rumores ou boatos.

António não foi condenadopelo Tribunal da Boa Hora

uma construção negativa,não é a mesma coisa que

António Cunha absolvidopelo Tribunal da Boa Hora

A excepção que pode admitir-se ao empregoda forma negativa num título é quando este sereporta a situações em que a partícula não “causacomoção ou alívio”:

Portugal não entra na III GuerraTufão não atinge os Açores

mas este último título poderia igualmente serconstruído de forma positiva:

Tufão passa ao largo dos Açores

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Por regra, jamais se utiliza o ponto de interrogaçãonum título: o jornal informa, responde às perguntasdos leitores, tira a limpo rumores, e portanto nãoos veicula. A única possibilidade — sempre excepcional— de produzir um título interrogativo é quando oponto de interrogação, em vez de se reportar aoconteúdo informativo da notícia, assinalando dúvidaou desconhecimento, tem propósitos estéticos.

Sondagem revela: 80 desconhecem 2001Porto dois mil e quê?

mas jamais

Soares é candidato?

O jornal tem obrigação de saber se Soares éou não candidato, e em que pé estão as negociaçõesnesse sentido. Na eventualidade de nem o próprioSoares saber se é candidato, o título informará deforma positiva esse mesmo facto:

Contra a oposição da ala esquerda do PSGuterristas querem Soares

Da mesma forma que não se produzem leadsgenéricos, também não se fazem títulos demasiadogerais. Em vez de:

Conselho de Ministros toma medidas

deve escrever-se:

Por decisão do Conselho de MinistrosGasolina aumenta a partir de Janeiro

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Os títulos, da mesma forma que os períodose as frases, nunca podem iniciar por algarismos.Quando for necessário empregá-los dessa forma, onúmero deverá ser escrito por extenso. Assim:

Seis milhões de contos para ostêxteis

e nunca

6 milhões de contos para os têxteis

É proibido o uso de parêntesis, de ponto e vírgulae de ponto final nos títulos, bem como de reticências,as quais, mais uma vez, deixam em suspenso o quese quer dizer, como quem lança um boato, levantauma dúvida ou tem uma piada para contar. Os títulosinformam, agarram e atraem, não criam dúvidas,não são engraçados nem contam anedotas.

Águia mostrou... as garras

É título que poderia facilmente ser corrigidopor um editor atento — as reticências, como quasesempre, deveriam muito simplesmente ter sidoomitidas.

Nos títulos, os sinais de pontuação devem serreduzidos ao estritamente indispensável e, sempreque possível, eliminados. Em todo o caso, sãoadmissíveis, com conta, peso e medida, a vírgula,o travessão e os dois pontos.

Os títulos não fazem trocadilhos, não brincamcom as pessoas ou com os cargos que ocupam, nemservem para mandar recados. Ainda que pressionadopelo tempo o jornalista possa achar tais opções acertadasno momento, elas são de mau gosto, e é penoso

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que só venha a aperceber-se disso, e a arrepender-se, depois do texto publicado.

Há também regras para a partição dos títulos,que seguem o seguinte princípio: não devem ficarpartículas ou elementos lógicos “pendurados” numalinha de título. As linhas dos títulos não devemterminar em artigos definidos ou indefinidos,preposições ou locuções prepositivas — os elementosde ligação que sustentam a frase “caem” semprepara o início da linha seguinte, de forma que aanterior represente sempre uma unidade lógica, enão um dispositivo que apresenta ideias aos soluços.

“Agora vamos trabalhar paracompletar a reforma fiscal”

É um título errado porque “para” deveria tersido remetido para a linha seguinte.

Pela mesma razão, um título pode ser partidonum verbo, mas só em determinados casos. É sempreerrado proceder à partição dos títulos em verbosde ligação, também chamados copulativos. O verbode ligação por excelência é o verbo ser, mas existemmuitos outros, como tornar-se, estar, ficar, permanecer,parecer, aparecer, etc...

A partição dos verbos transitivos — aquelesque expressam uma acção que incide sobre um sintagmanominal que desempenha a função de complementodirecto — requer alguns cuidados: há casos em queé possível, outros em que resulta deselegante. Osverbos intransit ivos apresentam muito menosproblemas já que são sempre passíveis de partição— tratam-se dos verbos que não são acompanhadosde sintagma nominal, e cujo sentido é “pleno” assimque são enunciados: nasceu, chorou, morreu...

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Proibido igualmente é partir os títulos a meio denomes próprios:

Sofinca compra JardimPúblico da Covilhã

ouGomes critica Fernando

Lemos de Freitas

ouInvestimento do Banco

de Portugal cresce em 99

Outro erro a evitar é abrir o título com umverbo, deixando o sujeito subentendido:

Vão demolir o Coliseuou

Despediram cem trabalhadores

em vez de

Lisnave despede cem trabalhadoresou

IURDY projectademolir o Coliseu

Deve também, por razões estéticas, respeitar-se uma certa proporção entre as linhas que compõemo título, procurando que a sua extensão seja equilibradade forma que o conjunto não seja graficamente chocante.É errado escrever:

Inês Monteiro sagrou-se campeã da Europaem corta-mato

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Podendo dizer-se exactamente o mesmo daseguinte forma:

Inês Monteiro sagrou-secampeã europeia de corta-mato

É também um erro repetir palavras no mesmobloco antetítulo-título, bem como repetir palavrasem títulos que fiquem situados na mesma páginaou em páginas contíguas par-ímpar. O efeito desteerro, que cumpre ao editor não cometer já que éele quem centraliza todos os textos e os distribuinas páginas, é tornar a leitura monótona e mesmodesagradável.

Há duas razões para isto: devido ao corpo utilizadoao titular, que é de grande destaque, essas repetições“berram” de forma ensurdecedora na página, mesmoque atentemos apenas ao seu aspecto gráfico; e tambémdevido ao facto de o leitor, numa página, apreendertodos os títulos de relance — é o que lê em primeirolugar —, e só depois se deter então nas peças quelhe interessam.

Os títulos têm de evitar repetições de palavras,rimas, cacofonias ou sons chocantes, cujo efeitoem título é muito desagradável; e ainda chavões,lugares comuns e expressões com duplo sentido.

Igualmente, os títulos abster-se-ão de utilizargíria, calão, ou expressões desprimorosas e chocantes,excepto quando o conteúdo informativo de taisexpressões o justifique

“Bardamerda para o Estado”

da boca de um Presidente da República é umaexpressão deste género de conteúdo informativo

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riquíssimo. De igual forma a expressão:

“Até os comemos!”

de um candidato a um cargo político de sufrágiodirecto, referindo-se aos seus opositores, temindubitavelmente carácter noticioso e é de interessepúblicoreproduzi-la.

Agora, como é evidente, quando num título serecorre a uma citação ou opinião, o autor da mesmadeve ser identificado no antetítulo, sob pena de seprejudicar a credibilidade do jornal, que assumiriacomo seu o conteúdo de tal título.

Os títulos, como aliás os textos — embora emtítulo o erro seja mais grave porque lhe aumentaa visibilidade — não devem generalizar raças, etnias,nacionalidades ou profissões, excepto quando talse reporta a atitudes colectivas de tais grupos:

Espanhóis referendamregiões administrativas

Médicos anunciam greve de zelo

mas já não deve utilizar-se

Juiz mata mulher e amanteou

Cigano ateou incêndio da Capinha

Por mais brilhante que seja um título, ele deveestar de acordo e em harmonia com o estilo da peçajornalística que encabeça, e ainda, adequar-seperfeitamente à secção do jornal onde vai ser inserido.

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“Os títulos devem reflectir o tom das peças a quese referem: serão circunspectos, frios, emotivos,optimistas, jocosos, sarcásticos, etc., consoante aforma como os redactores abordam os acontecimentos,a natureza das declarações recolhidas pelosentrevistadores e as diversas personalidades daspessoas entrevistadas. As áreas de publicação àsquais se destinam os textos, representam, igualmente,referências indispensáveis a uma correcta titulação”9 .

Silva Araújo acrescenta ainda aos defeitos dostítulos, os efeitos perversos e o mau gosto dostrocadilhos, dando como exemplos:

Cardeal cai no conto do vigárioVida de bombeiro é fogo

A obrigação de nunca utilizar chavões genéricospara titular acontecimentos:

Lamentável acidenteChoque de veículos

Caso a esclarecer

E, não resisto a transcrever, o inigualável:“Títulos como:

Da burrice do Samoraà pulhice dos traidores

são de evitar”10 .

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5.3. Editorial

“Um jornal sem voznem voto é como umhomem sem ju ízo .Jornalismo que não sesente capaz ou não podedar or ien tação nemformular critérios é umjornalismo sem uso darazão”

Luiz Beltrão

O editorial é um texto da responsabilidade daDirecção do jornal, que deverá acompanhar cadanúmero da publicação, e que se debruça sobre osacontecimentos mais marcantes da actualidade oudessa edição do periódico, comentando, analisando,exortando - em suma, fazendo opinião; não uma opiniãoqualquer, mas a opinião do jornal.

E é esta característica que distingue o editorialdos restantes textos de opinião do jornal - ele exprimea opinião e a cultura da empresa como um todo,ao passo que os textos de colunistas, colaboradores,e as participações dos leitores do jornal comprometemapenas quem as emite, e não a Redacção em bloco.Está bem de ver que, só por isto, o editorial seconstitui como a secção mais nobre do jornal, edeve ser posto cuidado extremo na sua elaboração.

Há jornais que têm mais de um editorialista, eem tais casos, para além do editorial fixo do director,as notas, comentários e textos que acompanham outrassecções do jornal não são assinadas, assim se vincandoo carácter colectivo de tais tomadas de posição.

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Na imprensa portuguesa, regra geral, os jornaispublicam apenas um editorial, da responsabilidadedo director ou elementos da direcção, prevalecendo,e muito bem, a tradição de identificar o autor dessestextos.

Depois de ter corrido tanta tinta sobre a separaçãoentre notícias e opinião, é lícito perguntar: podeum jornal, tomado como entidade colectiva, ter opinião?A resposta é: não só pode, como deve absolutamentetê-la.

O jornal não serve só para relatar de forma isentafactos e acontecimentos, pode e deve pronunciar-se sobre esses factos, tentando extrair deles o seureal significado, as relações que estabelecem comoutros acontecimentos, e as consequências que poderãovir a ter na vida das pessoas — e isto é atribuir-lhes uma dimensão radicalmente nova em relaçãoao tratamento noticioso: a dimensão de profundidade.

Os leitores esperam que o seu jornal se pronuncie,num ou mais editoriais, sobre as grandes questõesque agitam o mundo, o País ou a sua aldeia, e porisso um editorialista deve assumir desassombradamenteessa tarefa — emitir opiniões e orientações rigorosase fundamentadas, de preferência num texto curtoe de leitura agradável.

Não há nada mais patético que o editorial umano cravo, outra na ferradura, que procura agradara gregos e troianos, se recusa a tomar qualquer posiçãoe, bem espremido, nada diz. Ou ainda o seu congénere,o editorial em órbita, aquele que já deixou há muitoa órbita terrestre, e fala de tudo menos do que interessaaos leitores e ao próprio jornal.

É certo que é difícil fazer opinião, e opiniãoinvestida das responsabilidades que um editorial lhecomete ainda mais, mas ela deve absolutamente serfe i ta . Edi tor ia i s s i s temat icamente fa lhados

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descredibilizam o jornal e atraem o ridículo sobrequem os assina e sobre a própria Redacção. Se umjornal não tem coragem para se pronunciar sobreo que se passa à sua volta, então não justifica asárvores abatidas por ano para que possa circular,e melhor fora que fechasse.

O editorial “tem sempre de tomar partido, poissua finalidade é aconselhar e dirigir as opiniões dosleitores. Não se pode reservar: tem de decidir-se.O jornal está, por essência, comprometido a dizerem voz alta o que pensa. Eis porque se deve culpá-lo pelo seu silêncio (...). Está-lhe vedado dar osilêncio por resposta ao interrogatório da actualidade,ou dar uma resposta ambígua. A ambiguidade é excusade mau pagador. Ou medo à verdade. O cepticismoda acomodação. O jogo bonito de não comprometer-se, de expor os prós e os contra, embora sem desataro nó da dúvida, pode resultar engenhoso, mas adoecede estéril... Há jornais que pelo seu afã de assepsiano critério permanecem muitas vezes em suspenso,sem saber ao que ater-se. Isto não vale; o jornalnão só tem que saber sempre ao que se ater comoainda de manifestá-lo. Os editoriais insignificantese fora de compasso são uma escamoteação à boafé dos leitores que os lêem com ânimo de encontrarem suas linhas o caminho”11 .

Piedrahita refere ainda como estratégia de muitoseditorialistas, na sua aversão pelo que está próximo,o que os americanos chamaram de “afganistanismo”:“El editorialista pontifica con tranquilidad y seguridadde algo que nadie sabe. Nada pasará. Ningunapersonalidad importante se dará por aludida”!12

É evidente que o jornal toma uma posição firme,e chega a conclusões fundamentadas que corroboramessa tomada de posição, mas essa firmeza deve seradoçada com o mais intenso respeito pelos leitores.

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Tal como na notícia, o editorialista sabe que o leitoracabará por chegar às suas próprias conclusões,concordando ou não com ele, e deve sempre atendera esse aspecto: são por isso totalmente desadequadosos editoriais dogmáticos, arrogantes, ou ainda osque de alguma forma insultam os leitores. Comoem tudo, a justa medida basta.

A realização de um editorial coloca ainda questõeséticas, por vezes delicadas, do ponto de vista dequem o redige. Afinal, que opinião pode um jornalter? Todas as que não violem os princípios contidosno seu estatuto editorial e que inspiram diariamenteo t rabalho da Redacção. Também, devido àsespecificidades deste tipo de texto, não pode, aocontrário do simples artigo de opinião, radicalizardemasiado as questões, evitando servir-se de muitosdos artifícios retóricos que tais opinion makersutilizam para dar força e vigor às suas prosas.

Por outro lado, o editorialista, quando escreve,sabe muito bem que não pode, ao contrário do cronista,dar largas a todas as suas opiniões: só algumas serãoaceitáveis do ponto de vista daquilo que um editorialdeve ser, e ele respeitará escrupulosamente esseslimites. Por exemplo, pode um editorialista ter opiniõesmuito sólidas, e radicais, sobre o que deveria tersucedido aos antigos funcionários da PIDE/DGS apóso 25 de Abril, mas deverá ter bom senso e presençade espírito suficientes para perceber que não podecomprometer todo um projecto editorial com taisopiniões. Neste sentido, ele produzirá um textoadequado aos valores que o jornal defende — e que,neste caso concreto, são bem mais tolerantes queos seus.

Outra questão pertinente, e já aqui aflorada, éo que escrever? Manuel Piedrahita insurge-se contrao editorial fóssil, o texto rebuscado cujo tema interessa

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ao próprio e mais dois. A este respeito, Santo Agostinhoconta uma anedota esclarecedora: “Catão, tendo sidoconsultado por um certo homem que desejava conhecero significado de os ratos lhe terem roído as polainas,respondeu: isso nada tem de extraordinário; portentosofora que as polainas tivessem roído os ratos”13 .

E é essencialmente isto que um editorial faz: procuraestabelecer de forma esclarecida o significado dosacontecimentos, mas não quaisquer uns. Aqui voltama cruzar-se as componentes subjectivas da selecçãoda notícia: deverá debruçar-se sobre acontecimentospertinentes, prenhes de consequências, com interesseinequívoco para a maioria dos leitores. O editorialsaberá tomar o pulso da opinião já formada, contradizê-la se for caso disso; mas ainda aperceber-se da opiniãoque se está formando, do clima cultural e expectativasque o seu público vive, e aí, nesse caldo de ideiasainda em formação, intervir com lucidez, inteligênciae rigor.

Quanto aos temas eles deverão ser de interessegeral, estar próximos do coração ou preocupaçõesdo público; deverão ser assuntos que o editorialistadomine bem, e sobre os quais possa emitir comsinceridade e convicção as opiniões que serão a opiniãode todo o jornal.

Ao texto propriamente dito, aplicam-se-lhe asmesmas regras que regem qualquer artigo de opinião:deverá ser claro, incisivo, vigoroso e assertivo. Emprincípio deverá ater-se a um único tema, ou umaúnica tese, expondo-o na abertura, argumentando nocorpo do texto, e concluindo, de forma lógica enecessária, pela posição inicialmente adoptada.

É de extrema importância o rigor da argumentação,a clareza das deduções, a lucidez da análise e ajusteza das conclusões. Falhas nestes aspectos sãoimperdoáveis num texto de tanta responsabilidade.

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Todos os jornalistas sabem que o tamanho nãoé proporcional à importância. O editorial deve serum texto relativamente curto, deverá ocupar sempresensivelmente o mesmo espaço, e ser escrito comgraça, ritmo e vivacidade, utilizando um vocabuláriorico e variado que não abuse das frases longas. Oeditorial não pode ser entediante, aborrecendo demorte os seus leitores; nem pedante, tratando-os comoretardados aos quais, do cimo da cátedra, é precisoensinar coisas tão óbvias como apertar os cordõesdos sapatos.

Relativamente à sua tipologia, Luiz Beltrão14

divide os editoriais, quanto à topicalidade, empreventivo, que se antecipa à realidade, avaliandos i tuações a inda esboçadas e conc lu indo asconsequências; de acção , que acompanha umaocorrência analisando as suas causas e desenvolvimentono preciso momento em que sucedem; e de consequência,quando se debruça , dedut ivamente , sobre asrepercussões e consequências de um facto.

Já quanto ao conteúdo, considera que o editorialpode ser informativo, esclarecendo o leitor sobrefactos ou situações e explicando aspectos que apenasficaram implícitos na notícia; normativo, que intentaconvencer e exortar o leitor a assumir um determinadorumo de acção; e ilustrativo, o que procura aumentara instrução dos leitores, chamando a atenção paraquestões do quotidiano que costumam passardespercebidas.

No que toca ao estilo, podemos estar perante umeditorial intelectual quando este apela à razão dosseus leitores, convidando-os a raciocinar e a seguiremuma determinada linha de argumentação; e emocional,quando apela à sensibilidade do leitor, procurandotocar os seus instintos, crenças e sentimentos maisarreigados, de uma forma emotiva e não totalmente

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racional.

5.4. Reportagem

A reportagem é o género jornalístico mais nobre,havendo até quem o considere sublime e literariamenteprivilegiado. Tal como na notícia, o propósito dareportagem é informar os seus leitores sobre algumtipo de acontecimento — a diferença é que a reportagemadopta uma estrutura diferenciada da notícia,procurando tratar o assunto exaustivamente, segundoo ponto de vista adoptado, e em profundidade.

Neste género de texto, o jornalista investehabitualmente muito mais tempo e recursos que narealização de uma simples notícia. Como se tratade reproduzir um assunto em profundidade, ele deveráser cuidadosamente investigado, sendo objecto decuidados diferenciados na apresentação.

A reportagem já não é uma notícia do tipo hardnews mas uma prosa de grande fôlego que contauma história com o máximo de pormenores possíveis,incluindo muitas notas de cor local, procurando levaros leitores o mais próximo possível do acontecimento,como se eles próprios o pudessem estar também aviver.

É evidente que pelas suas características asreportagens pedem títulos apelativos, leads retardados,e não se conformam à técnica da pirâmide invertida;antes são possíveis vários tipos de construção, entreos quais se contam a pirâmide normal, o encadeamentode pirâmides invertidas ou, até, pirâmide nenhuma.Tudo dependerá do talento e inspiração de quema redige.

A reportagem supõe sempre a recolha de informaçãoin loco por parte do jornalista — não se fazem

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reportagens pelo telefone —, permanece presa aosfactos e não admite nem a intromissão da opiniãode quem escreve15 , nem que o jornalista se tomede l iberdades poé t icas re la t ivamente aosacontecimentos.

Pelas suas características a reportagem é umtraba lho normalmente preparado com cer taantecedência nas redacções. É durante esta fase depreparação que o jornalista decide, em conjunto comeditores e chefias, o tema do trabalho, o ângulo deabordagem a utilizar, e ainda os passos que deverãoser seguidos durante a realização do trabalho de campo.Significa isto que a reportagem já está praticamentefechada ainda antes do jornalista pôr o pé fora daRedacção? É evidente que não. A observação directae a recolha de dados desempenham um papelfundamental na execução da reportagem, e são estesque ditarão essencialmente o seu carácter.

Por outro lado, ideias claras àcerca do tema edo ângulo de abordagem não significam de modoalgum que o jornalista quando sai em reportagemse prive da frescura do olhar fenomenológico. Pelocontrário, por mais difícil que isso possa parecer,os dois aspectos deverão ser conjugados: ângulo pré-definido e saber olhar para tudo como se tudo fossenovo, como se fosse a primeira vez que tais coisassão olhadas. Em caso de conflito insanável entreas previsões e o real, este último aspecto toma semprea dianteira dos acontecimentos, sendo que o ângulode abordagem do trabalho deverá, muito simplesmente,ser alterado em função dos novos dados.

Daniel Ricardo deixa alguns conselhos preciososao jornalista que se encontra a recolher informaçãopara uma reportagem. “Tente interessar-se, tãoprofundamente quanto possível, pelo tema dareportagem. Não receie embrenhar-se na história.

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Se for caso disso, meta-se na pele dos protagonistas,para compreender as razões que os levam a agirde uma forma e não de outra, a emocionar-se, asentir necessidade de esconder ou, pelo contrário,explicar os seus actos. Mas não se deixe enredarpelos acontecimentos ao ponto de confundir a realidadecom a fantasia. Nem tome partido. E recuse omaniqueísmo. Registe, com fidelidade, as declaraçõesde quem entrevistar, e ao tomar notas, esforce-sepor reproduzir, objectivamente, os factos quepresenciou”16 .

5.5. Fotojornalismo

As fotografias que acompanham os textos de umjornal são de importância extrema - estudos realizadossobre esta matéria provam que, depois dos títulose antetítulos, as fotos e respectivas legendas sãoa segunda coisa a que a esmagadora maioria dosleitores atentam no jornal.

Além de cumprirem propósitos estéticos, comoembelezar as páginas, e cortar a monotonia dosextensos blocos de texto, afirmando-se pela suaqualidade e beleza intrínseca, as fotografias devemser jornalisticamente relevantes, isto é, estaremrelacionadas com o acontecimento que ilustram,provando-o, comentando-o, ou revelando perspectivasnovas àcerca dele.

Uma boa foto fala por si (“vale mil palavras”- como é lugar comum dizer-se). Confirma, comprova,verifica os dados apresentados na notícia; e, se bemconseguida, deverá ser um objecto com valor estéticoautónomo.

Daqui se depreende que a reportagem fotográficaé uma missão altamente especializada: exige apurados

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conhecimentos técnicos: focagem, enquadramento,medições de luz, velocidade de obturação — decisõesque têm de ser tomadas num piscar de olhos; e aindaum elevado sentido jornalístico: escolher a melhorimagem possível para ilustrar um acontecimento.

A fotografia jornalística não é uma chapa quese insere no jornal para ocupar espaço; prima pelaoportunidade e saberá captar o acontecimento queilustra de forma nítida e expressiva. O repórterfotográf ico como que borboleteia à vol ta doacontecimento, captando imagens vívidas e reais domesmo. Tal significa, entre outras coisas, que nãofará — como nos álbuns de família ou casamentos— fotos de pose; nem pedirá aos entrevistados quedeixem de falar ou fazer o que quer que estejama fazer para serem fotografados, porque isso eliminade imediato a espontaneidade e expressividade quedevem pautar o seu trabalho.

Por todas estas razões a reportagem fotográficaé de vital importância no jornal, e o fotógrafo umjornalista com carteira profissional que se dedicaa uma tarefa altamente especializada, que exige talentoe dedicação, e não um bate chapas. Não basta carregarnum botão para produzir uma reportagem fotográfica:há que ter conhecimentos técnicos, sensibilidade eformação intelectual para fazê-lo.

Regra geral o repórter fotográfico, depois deexecutados os serviços do dia, procede à revelaçãodas suas próprias fotos no laboratório fotográficopara esse efeito instalado na Redacção, seleccionaas melhores e entrega-as ao editor ou jornalistacompetente na matéria. Isto aplicava-se a todos ost raba lhos fo tográf icos produzidos no jorna l ,exceptuando-se por vezes as fotografias a cor, quepoderiam ser reveladas em laboratórios exterioresà empresa - já que esse trabalho não é, como no

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caso do preto e branco, manual.Agora, bem recentemente, uma nova modalidade

de fotografia fez a sua aparição no mercado: a fotodigital, que tende, se bem que não em exclusivo,a ser cada vez mais utilizada. As vantagens são imensas:dispensa-se o complexo processo de revelação eimpressão, poupando muito tempo; e é possível —em Portugal já há jornais que o praticam — enviarimagens de um acontecimento para a Redacção aindadurante o decurso do mesmo da forma mais simples:através de um computador portátil ligado a umtelemóvel.

A fotografia digital também veio revolucionar otrabalho dos correspondentes do jornal, permitindoo envio através de e-mail das fotos produzidas, edispensando o complicado e moroso esquema dastarifas, que era a forma tradicional de fazer chegarimagens — rolos ou fotos — ao jornal.

Mas nem tudo são vantagens, como reconhecemos profissionais do ramo. As máquinas fotográficasdigitais ainda são menos sofisticadas que as tradicionais,e ainda estão bem longe de oferecer o potencialde uma máquina tradicional em lentes, possibilidadese efeitos relativamente ao produto final.

Neste sentido, são limitadoras do conteúdo equalidade do produto apresentado — há preciosismosque pura e simplesmente ainda não podem ser feitoscom uma máquina digital. Mas é quase certo quea evolução tecnológica venha a suprir estas — porora — desvantagens da câmara digital, e não faltamindicadores nesse sentido. A mítica marca que máquinasfotográficas Leica acaba de dar um sinal inequívocodisso mesmo, lançando no mercado a sua primeiracâmara digital. Indício de que, mesmo apresentandouma qualidade mais reduzida, a indústria já percebeuque nesta corrida ainda a procissão vai no adro.

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Uma palavra ainda sobre a paginação das fotografias:apesar da total liberdade de que os editores devemgozar na colocação das fotos numa página - tentandosimplesmente não desperdiçar o potencial de umaboa imagem, e produzir páginas visualmente atraentes— uma regra deve ser seguida: as fotografias, emrelação ao espaço delimitado do jornal, não devemser colocadas de forma a que os seus elementospareçam estar a cair da página.

Significa isto, muito simplesmente, que a fotonão pode ter pessoas ou coisas a olharem ou dirigirem-se para fora da página - como se estivessem ansiosospor fugir dela, prontos a saltar a qualquer momento.A foto poderá ser delimitada por uma coluna detexto, ou voltada para o corpo de peça, como formade evitar este defeito. Há muitas fotografias, quepela página onde vão ser colocadas, e pela paginaçãoescolhida, provocam inevitavelmente este efeito.Quando tal ocorra, depois de digitalizada, a fotodeverá muito simplesmente ser invertida.

5.6. A legenda

As legendas são pequeníssimos textos, normalmenteapenas uma frase, colocados na base inferior dafotografia, à qual fazem referência, ilustrando,explicando ou simplesmente chamando a atenção paraos aspectos mais interessantes da imagem. O carácterda legenda é eminentemente informativo, ou deveráconter traços disso. Ela comenta e contextualizadeterminado objecto gráfico, fornecendo precisõesque, por vezes, é impossível à imagem comunicarpor si só.

“Depois de oito horas de negociação ininterrupta,

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Guterres encontrava-se visivelmente cansado”. Afoto que acompanha tal legenda mostra de facto umGuterres com olheiras, e visivelmente abalado pelocansaço. Agora o que a foto não mostra, e aos leitoresseria impossível descobri-lo de outra forma que nãoatravés da legenda, é que Guterres, às 19 horas deum determinado dia, estava cansado depois de oitohoras de trabalho seguido. A mesma imagem poderiater sido captada durante o mesmo acontecimento,mas às nove horas da manhã, antes do início dostrabalhos, apresentando um Guterres igualmentecansado e olheirento devido a uma noitada numadiscoteca local.

Por i s so as legendas fazem jus t iça aosacontec imentos e imagens , expl icando-os ,contextualizando-os, e ajudando o leitor a descobriro real significado da imagem, significado esse que,de outra forma, lhe poderia passar despercebido.

Nada é absolutamente óbvio, por mais que assimnos possa parecer. Neste sentido, no Urbi et Orbi,mesmo uma fotografia do reitor Santos Silva,personagem sobejamente conhecida da maioria dosleitores, que integram a comunidade académica quea UBI é, deverá ser legendada. É que um jornalchega a sítios que aqueles que o produzem jamaispoderão prever, é lido, perto ou longe, por pessoascom as mais diversas formações e interesses; e muitosdesses, encontrando tal foto sem legenda, interrogar-se-iam justamente: “Mas afinal quem é este senhor?”

Poderá argumentar-se que as legendas são, porvezes, desnecessárias ou redundantes, porque as peças,o corpo do texto, ilustram perfeitamente aquilo deque a foto fala, mas nem este argumento colhe. Aindaque tal suceda, nem todos os leitores irão de factoler a peça. Muitos ficam pelos títulos e imagens,saltando imediatamente para o texto seguinte. Por

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isso a foto e respectiva legenda deverão semprefuncionar como uma unidade significativa autónoma;que pode depois ser associada ao texto que acompanha.

Exceptuam-se, na legendagem, as fotografias daprimeira página, que são acompanhadas de pequenostextos funcionando eles próprios como legendas; eas fotos de colunistas e cronistas de opinião, queem todos os números acompanham os seus escritos.Todas as outras deverão ser legendadas.

5.7. Fait-divers

Como o próprio nome indica, fait-divers sãopequenas notícias de temática muito diversificadaque relatam aspectos curiosos do quotidiano. Incluem-se nesta categoria os roubos, os acidentes, ascoincidências, os casos de polícia, e, regra geral,todo o facto suficientemente curioso, ou pela suaoriginalidade ou pelas coincidências que envolve,susceptível de gerar uma notícia.

O fait-divers, embora retenha traços informativose uma ligação estreita com o real, não é propriamenteuma notícia. Os factos descritos são-no por seremaberrantes, extraordinários, curiosos, exemplares, enão pelo seu carácter estritamente informativo. Ofait-divers é a pequena notícia de interesse humanoexemplar que apela ao lado voyeur e um pouco mórbidode todos os leitores.

Temos pois que o fait-divers é o pequeno factocurioso que funciona como uma unidade fechadae praticamente se basta a si próprio. O interessedestas pequenas notícias encontra-se muito mais ligadoao seu aspecto exemplar e arquetípico, que propriamenteao facto de terem ocorrido ao Sr. B às tantas horasde determinado dia.

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O que caracteriza assim os fait-divers é aoriginalidade, enquanto a sua inserção no jornal servefundamentalmente para distrair e desanuviar os leitores.“De uma maneira geral , considera-se que secaracterizam pela originalidade os factos raros,insólitos, extravagantes ou, simplesmente, burlescos.São os chamados fait-divers, a partir dos quais seelaboram as notícias de distracção”.17

5.8. Opinião

A opinião é um texto no qual o seu autor exprimepontos de vista subjectivos relativamente a assuntosque, por qualquer razão, despertaram o seu interesse.A amplitude dos estilos e temáticas ao fazer opiniãovaria muito, podendo ir desde o texto leve e bemhumorado sobre os costumes, ou a falta deles, atéà análise dura e r igorosa de acontecimentos,relacionando factos aparentemente díspares e delesretirando deduções e conclusões.

Tanto no estilo mais ligeiro como no mais lógicoe silogístico o objectivo de quem faz opinião continuaa ser o mesmo: afirmar determinadas posições pessoais,aduzindo argumentos a esse favor; e levar os outrosa aderirem a tais teses ou conclusões.

A opinião distingue-se muito claramente da notíciaporque não serve para fornecer informações novas,ou dar notícias. O seu objectivo é lançar o debate,e esclarecer o público. Por outro lado, através dautilização das capacidades de análise do opinante,muitas vezes tais textos procuram chamar a atençãopara determinados aspectos das notícias que tendema passar despercebidos, e que não podem, pela sua

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natureza, ser tratados na própria notícia.Os textos de opinião são pessoais e inteiramente

subjectivos, mas também trazem em si uma pretensãode va l idade se não universa l , pe lo menosintersubjectivamente alargada. Quem escreve opiniãoestá ciente da parcialidade das suas posições, massimultaneamente, admite e deseja que estas sejampartilhadas e adoptadas por um grande número dereceptores dessa opinião — é esse o sentido daargumentação: converter, convencer, arregimentar.

Quase não há regras para escrever um bom textode opinião, e já vimos que quer quanto à formaquer quanto à temática os textos podem variarmuitíssimo. Uma coisa porém convém ter em mente:quem a escreve deve ter algo importante para dizeraos leitores do jornal, e não deve contentar-se comgrafar um chouriço por esse ser, de todos, o géneromais fácil de manipular e falsificar, ao prescindirde investigação e entrevista. De resto as opiniõesvalem o que vale quem as enuncia, e os critérioseditoriais da publicação deverão, evidentemente, terisso em conta.

5.9. Crónica

A crónica é um género que é habitual amalgamarou confundir com a opinião. As razões são várias,sendo que a mais importante é que cronistas e opinionmakers praticam por vezes indistintamente as duasmodalidades, em rubricas que recebem sempre o mesmonome. Por outro lado, textos há que estão no limiteentre um e outro género, e são eles próprios difíceisde classificar.

Regra geral a crónica é um texto que, fazendoapelo à imaginação e às potencialidades estéticas

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da linguagem, conta uma história ou debruça-se sobrefactos curiosos do quotidiano. Já não é um textoque obedeça a um rigoroso encadeamento lógico,nem tem propósitos proselitistas — as crónicas sómuito raramente exprimem opiniões ou têm por fimconvencer um auditório. São normalmente textos deleitura leve e agradável, sem pretensões a grandesconsequências políticas.

Outra diferença fundamental entre opinião e crónicaé que ao passo que a primeira utiliza sempre dadossolidamente ancorados no real — pois visa informar,embora não ex novo, e convencer — a crónica apenastoma o real como pretexto, permitindo-se liberdadespoéticas, criadora e imaginativas que não são toleradasem nenhum outro género.

Praticamente não há regras para realizar uma crónica,e todavia um bom leitor reconhece imediatamentea presença de uma boa crónica: ela prende-o, propõe,sugere, diverte e é fonte de prazer e estímulo intelectual.

5.10. Entrevista

A entrevista é o género básico de toda a praxisjornalística. Em sentido lato, entrevista denominatodos os contactos com uma fonte que são efectuadospelo jornalista durante o processo de recolha deinformações. Significa isto que é a entrevista quefornece a matéria prima — os dados e informações— para quase todos os géneros jornalísticos: da notíciaà legenda, ou opinião ou reportagem.

Mas entrevista pode também ser entendida numsentido técnico mais restrito, quando designa o génerojornalístico autónomo conhecido como entrevistapergunta-resposta. Tratam-se das grandes entrevistasde fundo a uma personagem que são publicadas no

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jornal em forma de pergunta-resposta, ao invés desofrerem uma composição ou arranjo, como sucedena notícia ou reportagem.

Regra geral, para este tipo de trabalho, em quehá a preocupação de ser minuciosamente fiel, oentrevistador socorre-se não apenas do seu blocode notas, mas também de um gravador. Por outrolado, a própria entrevista foi cuidadosamente preparadacom a antecedência devida, já que neste género asquestões a colocar ao entrevistado têm de ser certeirase pertinentes, e se o não forem, tais falhas, na passagemà forma escrita, tornar-se-ão evidentes aos olhos detodos os leitores.

O número de vezes que o jornal recorre a estegénero jornalístico depende do seu tipo de público,do estilo da publicação e da sua área de influência.Todavia a entrevista pergunta-resposta deve serutilizada com parcimónia e só se justifica quandoo tema abordado, ou o perfil da personagem entrevistada,fazem parte dos interesses e preocupações jáestabelecidas dos leitores. Isto é, trata-se de um recursode que convém não abusar, que só deverá ser utilizadoquando for, por uma razão ou outra, verdadeiramenteoportuno. Quando não o resultado são duas ou maispáginas sem graça, cheias de densa prosa em quenenhum leitor se atreveria a tocar.

A entrevista de pergunta-resposta deverá seracompanhada por um lead, que pode explicar aoportunidade do trabalho, ou aspectos mais marcantesda própria entrevista; e ainda fornecer uma nota dotom e cor locais, fazendo referência ao ambientee ao estado de espírito dos participantes enquantodecorria o trabalho.

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5.11. Fotolegenda

É discutível se a fotolegenda constitui propriamenteum género, ou se é simplesmente o resultado doamalgamar de todas as técnicas anteriores, com especialênfase para as utilizadas na crónica e fait-divers.

Por fotolegenda entende-se aqui uma fotografia,sem título, comentada por um pequeno texto quese lhe segue imediatamente, e que não constitui umanotícia no sentido estri to do termo. Trata-se,normalmente, de aproveitar a felicidade de umapontamento fotográfico, destacando esse elementoao publicá-lo separadamente acompanhado de umcomentário.

Muitas podem ser as motivações e o teor dasfotolegendas. Consoante o material em apreço produzir-se-ão textos sérios, comoventes, ternos, rigorosos,exortativos, humorísticos, irónicos, surpreendidos...Sendo que o género que se tem vindo a tornar maiscomum na imprensa portuguesa é o que dela se servepara chamar a atenção para um facto ou acontecimentopouco natural, exortando os responsáveis a procurarem-lhe uma solução: o semáforo avariado, o buraco naestrada, as obras com falta de segurança... ou aindao tipo de notícia que serve de pequeno agrado aoherói local: o padre que trabalha na recuperaçãode toxicodependentes, o homem que tem 35 filhos,o bombeiro que salvou uma criança da casa em chamas.Enfim, os temas e os motivos da fotolegenda sãoinfinitos, sendo este um género que pelo seu aspectográfico, ligeireza e concisão quebra a monotonia dasextensas notícias atraindo sempre um elevado númerode leitores.

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Notas:

1 . Daniel Ricardo, pp. 12-132 . Hard e soft news é uma distinção com origem no jornalismoanglo-saxónico, utilizada também pelo Livro de Estilo daLusa.3. Em França a média de tempo dispendida na leitura detoda a imprensa é de 37 minutos. In Boucher, Jean-Dominique,1994, A Reportagem Escrita, col. Técnicas da Jornalismo,Editorial Inquérito, Mem Martins.4. Mais uma vez a origem histórica desta forma de construçãoparece ter a ver com razões técnicas. Os jornais que nãotratavam as notícias em forma de pirâmide invertida eramaqueles em que a maquete - diagramação das páginas - erafeita antes da chegada dos textos, e portanto o jornalistaantes de sair para um serviço sabia com toda a precisãoo número linhas que podia escrever, e nunca havia necessidadede “aparar” textos. Maior liberdade? Talvez sim, ou não,já que independentemente da qualidade que o acontecimentoviesse a revelar durante o trabalho de campo, o jornalistaestava limitado a um determinado espaço. Hoje a paginaçãoelectrónica, com a rapidez e flexibilidade que oferece, jánão obriga, por razões meramente técnicas, à utilização rígidada pirâmide invertida.5. In Daniel Ricardo, Op. cit., p. 20. Ricardo observa tambémque ao lead “ainda ninguém propôs uma fórmula alternativaconsistente“ e, citando Lago Burnett, “Não façamos a revoluçãoàs avessas para regredir aos velhos dogmas de uma escolasuperada”, no caso o regresso ao nariz de cera em uso noinício do século. Ibidem, p. 19.6. Op. cit., p. 53.7. Araújo, Domingos Silva, 1988, Vamos falar de Jornalismo,Direcção-Geral da Comunicação Social, Lisboa, p. 88.

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8. Ibidem, p. 88.9. Daniel Ricardo, Op. cit. p. 58.10. Silva Araújo, Op. cit., p. 109.11. In Beltrão, Luiz, 1980, Jornalismo Opinativo, Ed. Sulina,Porto Alegre, Brasil, p. 60..12. Piedrahita, Manuel, 1993, Periodismo Moderno - Historia,Perspectivas y Tendencias, Editorial Paraninfo, Madrid, p.60.13. Santo Agostinho, De doctrina christiana, Obras Completasde Santo Agostinho, vol. XV, BAC - Biblioteca de AutoresCristianos, La Editorial Catolica, Madrid, p. 129.14. Ibidem, p. 58 e ss.15. É extraordinariamente discutível, este ponto. Muito maisque na notícia, na reportagem podem ser perfeitamente sensíveisopiniões e valorações de fundo do jornalista, especialmentena forma como constrói a descrição das personagens ou descreveo local onde decorrem os acontecimentos. No interior daprópria reportagem há-as mais e menos opinativas, mas esteé sem dúvida o género onde todas as dificuldades objectividadeversus subjectividade se tornam sensíveis. Pode ainda assimutilizar-se o primeiro destes conceitos no sentido em quea reportagem permanece presa aos acontecimentos e ambientesque a motivaram, o que não sucede na fábula, novela ouconto. Isto é, há respeitar os factos, e há violentá-los, levando-os a dizer aquilo que, claramente, não dizem.16. In Daniel Ricardo, op.cit., p. 46.17. In Daniel Ricardo, op. cit. p. 14.

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VI. A recolha de informação

6.1. As fontes

Por fonte de informação entende-se qualquerentidade detentora de dados que sejam susceptíveisde gerar uma notícia1 . A internet, uma base dedados, o Instituto Nacional de Estatística, o carteiroou um polícia de giro são fontes de informação.Habitualmente, dividem-se as fontes de informaçãopela relação que estabelecem com o jornal: internasou externas; ou em relação ao seu próprio estatuto:oficiais ou oficiosas; e ainda em relação às suascaracterísticas: humanas ou documentais.

Nenhum jornal sobrevive sem fontes, e o perfildestas varia consoante a natureza e a área deimplantação da publicação. “No mais pequenopovoado ou aldeia há sempre dois lugares que sãoas melhores fontes de notícias: a taberna e a barbearia,óptimos locais de propagação das novidades davizinhança2 . Nas cidades e capitais as fontes denotícias de mais variada informação são, por exemplo,os partidos, as organizações populares, os ministérios,os hospitais, os bombeiros, as fábricas, as organizaçõessindicais, os aeroportos, etc.”3 .

Nuno Crato propõe uma excelente tipologiadas fontes, dividindo-as entre fontes internas eexternas à publicação. Por fontes internas entendeem primeiro lugar os jornalistas da publicação,que através da investigação e da observação directa,quando escrevem, se transformam eles próprios emfontes. O arquivo ou centro de documentação dojornal constitui igualmente uma fonte de informaçãode importância primordial, permitindo contextualizar

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acontecimentos, e mesmo dotar alguns deles deum sentido que, isoladamente, não teriam.

Por último, são fontes internas as delegaçõese correspondentes que a maioria dos jornais possuemem localidades importantes relativamente afastadasda sede, ou mesmo, dependendo da dimensão doórgão, no estrangeiro.

A delegação é como que uma sucursal do jornal,dispõe de sede e equipamento próprio e os jornalistasque nela trabalham fazem-no a tempo inteiro e têmum vínculo contratual sólido com a empresa. Oscorrespondentes são normalmente free-lancers quepodem trabalhar para uma ou mais publicações,não dispõem de instalações pertencentes ao jornalna cidade onde habitam, podem ou não serprofissionais, e só muito raramente pertencerão aosquadros da empresa.

Nas fontes externas ao jornal, Crato lista emprimeiro lugar as restantes empresas informativas:agências e outros órgãos de comunicação social.As agências são empresas especializadas na produçãode notícias e imagens que depois vendem aos seusclientes, dos quais os mais importantes são outrosmeios de informação: rádios, jornais, televisões.

De um órgão de comunicação social a agênciaretém sobretudo a Redacção e a forma de produziras notícias — embora o ritmo de agência seja maisacelerado do que qualquer outro —; simplesmente,o produto noticioso que fabricam nunca chega aser apresentado ao público autonomamente, é-o,sempre, através dos clientes da empresa, que sãolivres de tratar a informação recebida como muitobem entenderem, investigando-a em profundidadeou publicando-a como produto acabado.

Como fonte, as agências são de importânciafulcral para a vida de uma Redacção — quer pelas

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informações que aí fazem chegar, e que são publicadastout court, quer pelas pistas e auxílio que prestamna confecção de uma agenda rica e equilibrada.

Também os outros media se constituem comofontes de informação através das notícias quepublicam. Nenhuma Redacção que se preze deixaráde fazer, através da Secretaria, escuta de rádio,noticiários televisivos, e leitura dos restantes jornais.Daqui os secretários de redacção tiram ideias paranovos trabalhos, notícias e reportagens, e asseguramque nenhuma informação vital é perdida pelapublicação. Sempre que a importância de um assuntonoticiado noutro órgão o justifique, os jornalistasserão chamados a tratá-lo.

Fontes externas são também as entidades oficiais— Assembleia da República, ministérios, juntasde freguesia, câmaras municipais, forças policiais— que se constituem como fontes quer porqueproduzem de facto imensa informação, sob a formade press releases ou outra, que enviam para asredacções; quer porque nesses locais se sucedemacontecimentos potencialmente noticiáveis — casodas sessões de Câmara, Assembleias Municipais,votações na Assembleia da República; e que osjornalistas costumam acompanhar de perto.

As fontes não oficiais são as colectividades,s ind ica tos , empresas , assoc iações , c lubesdesportivos... em suma, todas as instituições nãoestatais que contribuem para a vida social e culturaldo País. Também as entidades não oficiais produzemum número apreciável de notícias, ou acontecimentos,que desejam ver divulgadas pelos media e quenormalmente mantém ocupados muitos jornalistas.

Os contactos pessoais do jornalista, as suasfontes privadas cuja confiança ele conquistou aolongo do tempo; e o público em geral, através de

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cartas, alertas, e telefonemas muitas vezes anónimos,contribuem também para o cabedal de informaçõesdiárias do jornal.

Nas empresas que produzem material informativodiário uma fonte indispensável é a muito temidavolta. A volta é uma lista de números de telefone,que pode facilmente chegar perto das duas centenas,e que contém os contactos de hospitais, corporaçõesde bombeiros, aeroportos e forças policiais — PSP,Brigada de Trânsito, Guarda Fiscal, GNR e PolíciaJudiciária — da região onde o jornal está implantado.A tarefa de quem faz a volta é ligar, três vezespor dia — manhã, princípio e final da tarde —para esses números, e indagar se há novidades.É na volta que se apanham a grande maioria doscasos do dia: apreensões, incêndios, acidentes deviação, intoxicações alimentares, rixas, rusgaspoliciais... e este trabalho, humilde e pouco criativo,fica normalmente a cargo da secretaria de redacção,ou dos jornalistas mais jovens.

A selecção e o acesso às fontes é de umaimportância fundamental para qualquer publicação.Como Daniel Ricardo explica, de forma lapidar:“O método fundamental de investigação em jornalismoconsiste em perguntar”4 , as coisas certas às pessoascertas. Para produzir trabalhos de qualidade ejornalisticamente relevantes é essencial saber comoe que fontes localizar, escolhendo-as criteriosamenteem função do trabalho que se tem para realizar.

Uma boa fonte deve ser, entre outras coisas,competente e qualificada para se pronunciar àcercado assunto sobre que é convidada a falar. Quemaquilata da competência, qualificação e relevânciade uma fonte é sempre o jornalista, e este sabeque não pode falhar sistematicamente na sua

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identificação. Um catedrático de Filosofia Medievalé uma fonte qualificada para falar da vida e percursointelectual de Santo António de Lisboa; mas nãoo é para se pronunciar sobre pormenores técnicosdo desabamento de um muro na igreja com o mesmonome. É claro que pode eventualmente forneceropiniões bem interessantes, mas a sua competênciano assunto é idêntica à de qualquer transeunte.

Aspecto importante a ter em conta quando sefala de fontes é que, à medida que a importânciae relevância social dos media foi crescendo,começaram a surg i r fontes “prof i ss iona is” ,especializadas em lidar com jornalistas. É o casodos profissionais de relações públicas, bem assimcomo dos assessores de imprensa — uns e outrosmuitas vezes recrutados entre ex-jornalis tasexperientes — os quais tudo farão para, aoconstituirem-se como fontes, passarem através dosmedia determinadas mensagens.

Se é certo que estes profissionais jogam quasesempre com os interesses do jornalista, o trabalhoque desempenham é fundamental para as redacções.Não podem é estas fontes oficiais serem tomadascomo únicas em assuntos que envolvamdesfavoravelmente as pessoas ou instituições deque estão a soldo — nesses casos o seu objectivoé sempre filtrar e de alguma forma manipular ainformação difundida. Agora, o jornalista sabe-o,e deverá saber igualmente muito bem como se defenderdisso. Além do mais, deve ter em mente que nenhumafonte, profissional ou não, é absolutamentedesinteressada. Todas falam a par t i r de umdeterminado lugar, que determina o seu ponto devista, e podem ser movidas pelas mais diversasmotivações. É excelente, em quaisquer circunstâncias,ter presente que nunca as fontes são desinteressadas,

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mesmo as não profissionais - os seus motivos podemser os mais variados: políticos, pessoais, profissionais,auto-promoção, conquista de benefícios directosou indirectos (nos casos de realojamentos, protestosem concursos públicos ou atribuição de subsídios...),ou ainda, pura e simplesmente, vaidade.

Se este aspecto é natural, e profundamente humano— também o jornalista quando procura as fontestem interesses e motivações que podem variar —ele recomenda alguma prudência ao lidar com asfontes. Nem se defende aqui a versão cínica —tudo se resumiria a uma troca de interesses quese materializam na forma de informações e notícias.Há pessoas, e jornalistas, genuinamente animadosde boas in tenções , como se jam informarcompetentemente e com verdade, e cumprirescrupulosamente as regras básicas da deontologiae escrita jornalísticas. No entanto, e mesmo semintenção directa de manipular (embora muitas vezeseste aspecto também esteja presente), muitas fontes,pelo lugar que ocupam relativamente ao acontecimentoque se quer no t ic ia r, t endem a produzi r,intencionalmente ou não, versões parciais do mesmo.O jornalista atento saberá constituir uma topologiadas fontes, isto é, avaliar friamente a posição apartir da qual estas dão informações, aquilatandoo seu peso e real valor.

E é por esta razão que em todos os assuntosque envolvam questões sociais, desacordos oucontrovérsia o jornalista não se pode limitar aosdados fornecidos por uma única fonte. Pelo contrário,deve ouvir o máximo de pessoas envolvidas nocaso, o que o ajudará a relativizar os primeirosdados recebidos, reproduzindo o máximo possívelde informações que conseguiu obter àcerca do caso.

Um motorista de táxi atropelou uma criança

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de seis anos porque seguia em excesso de velocidade,d iz um v iz inho? Essa in formação prec isanecessariamente de ser confirmada, falando commais testemunhas, com o próprio condutor, e aindacom a polícia, que no auto do acidente, e pelasmarcas de travagem no pavimento, já deve ter umaideia razoável do que se passou. É evidente quese a vítima estiver em condições de ser ouvida,também deverá sê-lo: pode muito bem dar-se ocaso de que a criança, que não devia andar a brincarna rua sem vigilância, se tenha literalmente atiradopara debaixo do carro quando perseguia uma bola...e que a família, em choque, se recuse a admiti-lo. Muito importante, também, é que este trabalhode confirmação de dados deve ser realizado comtacto e sensibilidade, para não perturbar injustamenteas pessoas na sua dor.

Outro caso paradigmático, e recorrente emPortugal, são as greves. Nenhum jornal pode nuncaacreditar e publicar somente uma versão dos númerosde adesão de trabalhadores a uma greve, simplesmenteporque os dados fornecidos pelos sindicatos nuncacoincidem com os que são apurados pelas entidadespatronais — e às vezes o desvio é uma diferençaabissal. É possível a um jornalista confirmar osnúmeros da adesão a uma greve dos trabalhadoresda Função Pública? Evidentemente que não. Paracomeçar, nem o próprio Estado Português temexactamente a certeza de quantas pessoas estãoao seu serviço. O que deve pois fazer é publicaros dados fornecidos por uma e outra parte da querela.

Depois há uma outra classe de informaçõesque é inútil confirmar, simplesmente porque sãooficiais. A Macintosh lançou um novo portátil edivulga as suas características num folheto? OsServiços Académicos da UBI emitem um comunicado

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alargando o prazo de pagamento das propinas? Nestescasos — e a não ser que houvesse razões fundamentadaspara suspeitar da autenticidade dos documentos —, nada há a confirmar, e é ridículo fazê-lo. O jornalistapode é tentar obter reacções ao que é anunciado,falando com alunos, professores e Associação deEstudantes, por exemplo, no caso das propinas.

Seleccionadas, localizadas e avaliadas as fontes,a lguns pr inc íp ios devem ser seguidos norelacionamento que o jornalista estabelecerá comelas.

Em primeiro lugar, a recolha de informaçãodeve ser sistemática, rigorosa, todos os dados —especialmente em assuntos delicados — devem sercuidadosamente verificados e, se possível, quandonão houver testemunho directo por parte do jornalista,confirmados por outras fontes.

O jornalista deve recolher sistematicamente ainformação de que vai necessitar na realização dotrabalho, e por isto, entende-se que deve ter jápré-definido quem, quando, e por que ordem contactarpara construir uma notícia. Mas não só. Tambémdeve saber do que anda à procura, e prepararcu idadosamente as en t rev is tas a rea l izar,documentando-se e esboçando mentalmente asperguntas que deseja ver respondidas, sob penade poder vir a ser manipulado. As fontes queinicialmente previu contactar podem depois remetê-lo para novos contactos, de que não se tinha lembradoou desconhecia. Não é hora entrar em greve dezelo. Deve, caso o assunto o justifique, realizartambém esses contactos.

As fontes, sem excepção, devem ser citadas,e todas as informações que prestam devem claramenteser-lhes atribuídas no corpo do texto, sob penade o jornalista, e o jornal, fazerem suas as afirmações

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produzidas.Sempre que uma fonte se recuse, por motivos

fundamentados, a ser identificada, o jornalista podeainda assim publicar essas informações, desde queestas sejam suportadas por documentos oficiais,fornecidos pela fonte, e cuja autenticidade foiverificada. Não pode é confiar cegamente numafonte deste tipo, e deve sempre confirmar asinformações recebidas. Casos destes, porém — peladelicadeza que envolvem — deverão ser discutidoscom as chefias, e constituirão sempre excepções.

Muito semelhante a isto é o off the record,em que a fonte não pode ser identificada, e asinformações que presta não podem ser publicadas.O off the record serve, por exemplo, para que ojornalista tente confirmar as informações recebidaspor meio de outras fontes — isto é, começar ainvestigar. Em todo o caso, deve ser rigorosamenterespeitado, quer a fonte passe para off the recordantes, ou depois de tornar a informação conhecida.

Rigorosamente respeitados, também, serão osembargos. As agências, e por vezes algumas fontes,enviam para as redacções certo tipo de informaçõescom a indicação de “embargo até às x horas”, etal significa que esse texto não pode ser utilizado,nem publicado, até a fonte que o emitiu levantaro embargo . Normalmente , t ra tam-se deacontecimentos que ainda não se produziram, e énecessário esperar pela hora em que ocorram parapoderem ser noticiados como tendo ocorrido. Aconcorrência feroz entre os media já levou, emPortugal, à quebra de embargos. Caso, por exemplo,do discurso de José Saramago na entrega do prémioNobel da Literatura, cujo texto foi distribuído antesda cerimónia. Independentemente das justificaçõesoportunistas e mais ou menos bem construídas que

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possam ser dadas para sucessos deste tipo, oincumprimento de um embargo deve ser consideradouma falta profissional grave, que queima e arruinaas relações com a fonte, e com os restantes profissionaisde comunicação; para, feitas as contas, magro ganho.

É necessário também um especial cuidado comas rotinas e as relações que se estabelecem comas fontes. Esses contactos nunca devem ser dedemasiada proximidade-promiscuidade. É terrível,mas estudado, ver o presidente de um GovernoRegional tratar na televisão o jornalista que o entrevistapor “tu”. Talvez este profissional não tenha culpa,talvez o político o conheça desde pequeno, masa imagem que fica nos espectadores é de imediatasuspeição e falta de credibilidade do jornalista.

As fontes devem ser tratadas com cordialidadee cortesia, num certo sentido, cultivadas; mas hábarreiras, e limites, que o jornalista deve imporna sua relação com elas, e não permitir nunca quesejam ultrapassadas. Isto é, por mais simpatia ebom relacionamento que um jornalista mantenhacom a fonte, esta deve saber claramente que a relaçãoé estritamente profissional, e que o jornalista, ouvindo-a, se reserva também no direito de ouvir quemmais bem entender, redigindo o seu trabalho comtotal autonomia e independência.

Em acontecimentos imprevisíveis, ou emcondições de reportagem difíceis, há a tendênciapara os profissionais de comunicação se fundiremem pool — as vantagens são imensas, e muitasvezes esta é a única maneira, pela partilha de meios,de conseguir not ic iar convenientemente umacontecimento. Mas não se deve, por preguiça, abusardisso. É injusto, mas é verdade: em acontecimentosimprevisíveis, o factor sorte pode ser crucial paraa realização de um bom trabalho. O jornalista que

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chegou atrasado a uma tragédia pode ser o únicoa chegar à fala com a testemunha crucial doacontecimento... ou não.

Um jornal is ta consciencioso, e um bomprof iss ional , não tem necess idade de secardeliberadamente uma fonte, ou seja, impedir, poralgum meio, que outros jornalistas a ela acedam.Este procedimento pratica-se algumas vezes,sobretudo em termos de imagem. É, por exemplo,chegar à Póvoa do Varzim, onde houve um naufrágio,e arrebatar todas as fotografias das vítimas, coma promessa de vir a devolvê-las à família. Seriamuito mais simples reproduzir simplesmente asimagens, ou levar só as melhores.

Proceder assim é errado por duas ordens derazões: é ser um péssimo colega para os jornalistasde outros media encarregues do caso — e eles nãovão esquecer-se disso; e é um pecado contra ojornalismo em si, porque informar é um serviçode utilidade pública e quem seca uma fonte impedeos outros jornais de informarem.

Uma outra forma, ainda menos inteligente, desecar fontes, é tratá-las indevidamente — quebrandoembargos, desrespeitando um off the record ,publicando uma conversa que se ouviu à socapanum restaurante, pedindo emprestados materiais quenão se devolvem, ou, por qualquer forma, enganandoa fonte na sua boa fé — fazendo com que jamaisvoltem a dar informações a esse jornalista, ou mesmoao órgão de comunicação social que representa.

Por outro lado, é evidente que o jornalismoé uma profissão competitiva, de grande pressãoe exposição pública. Um jornalista não é uma irmãzinhada caridade, e um bom profissional deve ser brioso,empenhar-se e lutar pelas suas cachas5 . Mas tambémdeve ser, sem excepção, cortez e prestável para

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com os colegas. Colaborar com eles sempre quetal não prejudique o trabalho que se está a realizar.A regra em tais casos — um pedido de auxíliode um colega — é fornecer toda a informação quejá é do domínio público, foi transmitida numaconferência de imprensa, por exemplo; e guardaras cachas, ou a ideia de uma boa fonte que sepensa contactar a posteriori. Também não faz qualquersentido ocultar informação que se sabe virá a serpública — um telex de agência que o jornalistajá tem, e a que sabe que o colega acederá quandochegar à sua Redacção.

A Lei de Imprensa estabelece alguns princípiosem relação às fontes, nomeadamente, garantindoaos jornalistas “a liberdade de acesso às fontesde informação, incluindo o direito de acesso a locaispúblicos e respectiva protecção”, bem como “o direitoao sigilo profissional”, que garante a possibilidadede, nem mesmo em juízo, o jornalista revelar assuas fontes confidenciais.

Estes aspectos são depois regulamentados empormenor no Estatuto do Jornalista. Este, no Artigo8º estabelece que:

“1. O direito de acesso às fontes deinformação é assegurados aos jornalistas:

a) Pelos órgãos da Administração Pública(...)

b) Pelas empresas de capitais total oumaioritariamente públicos, pelas empresascontroladas pelo Estado, pelas empresasconcessionárias de serviço público ou do usoprivativo ou exploração do domínio públicoe ainda por quaisquer entidades privadas queexerçam poderes públicos ou prossigaminteresses públicos (...)

6. A recolha de informação

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2. (...)3. O direito de acesso às fontes de

informação não abrange os processos em segredode justiça, os documentos classificados ouprotegidos ao abrigo de legislação específica,os dados pessoais que não sejam públicos, osdocumentos que revelem segredo comercial,industrial ou relativo à propriedade literária,artística ou científica (...)

4. (...)5. (...)

Artigo 9ºDireito de Acesso a locais públicos

1. Os jornalistas têm direito de acessoa locais abertos ao público desde que parafins de cobertura informativa.

2. O disposto no número anterior éextensivo aos locais que, embora não acessíveisao público, sejam abertos à generalidade dacomunicação social.

3. Nos espectáculos ou outros eventoscom entradas pagas em que o afluxo previsívelde espectadores justifique a imposição decondicionamentos de acesso poderão serestabelecidos sistemas de credenciação dejornalistas por órgão de comunicação social.

4. (...)

Artigo 10ºExercício do direito de acesso1. Os jornalistas não podem ser impedidos

de entrar ou permanecer nos locais referidosno artigo anterior quando a sua presença forexigida pelo exercício da respectiva actividadeprofissional, sem outras limitações além dasdecorrentes da lei.

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2. (...)3. Nos espectáculos com entradas pagas

em que os locais destinados à comunicaçãosocial sejam insuficientes, será dada prioridadeaos órgãos de comunicação de âmbito nacionale aos de âmbito local do concelho onde serealiza o evento.

4. Em caso de desacordo (...) qualquerdos interessados pode requerer a intervençãoda Alta Autoridade para a Comunicação Social(...)

5. Os jornalistas têm direito a um regimeespec ia l que permi ta a c i rcu lação eestacionamento de viaturas utilizadas noexercício das respectivas funções (...)

Artigo 11ºSigilo Profissional

1. Sem prejuízo do disposto na leiprocessual penal, os jornalistas não são obrigadosa revelar as suas fontes de informação, nãosendo o seu silêncio passível de qualquer sanção,directa ou indirecta.

2. Os directores de informação dos órgãosde comunicação social, bem como qualquerpessoa que nela exerça funções, não podem,salvo com autorização escrita do jornalistaenvolvido, divulgar as suas fontes de informação,incluindo os arquivos jornalísticos de texto,som ou imagem das empresas, ou quaisquerdocumentos susceptíveis de as revelar.

3 . Os jo rna l i s tas não podem serdesapossados do material utilizado ou obrigadosa exibir os elementos recolhidos no exercícioda profissão, salvo por mandado judicial e demaiscasos previstos na lei.

6. A recolha de informação

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4. (...)”

Todavia, apesar destas excelentes declaraçõesde intenções por parte do legislador, o que vigorade facto em Portugal na Administração Pública éo mais cerrado silêncio, e muitas vezes é extremamentepenoso, e difícil, obter informações perfeitamentebanais e anódinas junto de certos serviços públicos.Em largos casos por puro comodismo, ou aindapor existir uma estrutura hierárquica demasiadorígida dentro da instituição, o jornalista vai sendochutado para cima - chefe de serviço, director, director-geral, e por aí fora... de forma que, para saberas horas no Instituto de Emprego e FormaçãoProfissional, pode ser necessário telefonar aorespectivo ministro! Sempre que se verifiquemsituações deste tipo, a raiar o absurdo, o jornalistadeve fazer valer os seus direitos — e entre essesincluem-se o perguntar, e sugerir publicar, porqueé que o tal responsável que só ele pode prestaras informações, nunca está. Aparecerá imediatamenteou delegará a tarefa.

6.2. Ética e deontologia

6.2.1.O código deontológico

O código deontológico dos jornalistas foiaprovado pelo sindicato dos jornalistas. Concisoe bastante completo, estipula nos 10 pontos queo compõem, e de forma muito clara, os princípiosdeontológicos a atender pelos jornalistas e candidatosa jornalistas:

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1. O jornalista deve relatar os factoscom rigor e exactidão e interpretá-los comhonestidade. Os factos devem ser comprovados,ouvindo as partes com interesses atendíveisno caso. A distinção entre notícia e opiniãodeve ficar bem clara aos olhos do público.

2. O jornalista deve combater a censurae o sensacionalismo e considerar a acusaçãosem provas e o plágio como graves faltasprofissionais.

3. O jornalista deve lutar contra asrestrições no acesso às fontes de informaçãoe as tentativas de limitar a liberdade de expressãoe o direito de informar. É obrigação do jornalistadivulgar as ofensas a esses direitos.

4. O jornalista deve utilizar meios leaispara obter informações, imagens ou documentose proibir-se de abusar da boa-fé de quem querque seja. A identificação como jornalista éa regra e outros processos só podem justificar-se por razões de incontestável interesse público.

5. O jorna l i s ta deve assumir aresponsabilidade por todos os seus trabalhose actos profissionais, assim como promovera pronta rectificação das informações que serevelem inexactas ou falsas. O jornalista devetambém recusar actos que violentem a suaconsciência.

6. O jornalista deve usar como critériofundamental a identificação das fontes. Ojornalista não deve revelar, mesmo em juízo,as suas fontes confidenciais de informação,nem desrespeitar os compromissos assumidos,excepto se o tentarem usar para canalizarinformações falsas. As opiniões devem sempreser atribuídas.

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7 . O jornalista deve salvaguardar apresunção de inocência os arguidos até a sentençatransitar em julgado. O jornalista não deveidentificar, directa ou indirectamente, as vítimasde crimes sexuais e os delinquentes menoresde idade, assim como deve proibir-se de humilharas pessoas ou perturbar a sua dor.

8. O jornalista deve rejeitar o tratamentodiscriminatório das pessoas em função da cor,raça, credos, nacionalidade ou sexo.

9. O jornalista deve respeitar a privacidadedos cidadãos excepto quando estiver em causao interesse público ou a conduta do indivíduocontradiga, manifestamente, valores e princípiosque publicamente defende. O jornalista obriga-se, antes de recolher declarações ou imagens,a atender às condições de serenidade, liberdadee responsabilidade das pessoas envolvidas.

10. O jornalista deve recusar funções,tarefas e benefícios susceptíveis de comprometero seu estatuto de independência e a sua integridadeprofissional. O jornalista não deve valer-seda sua condição para noticiar assuntos em quetenha interesses.

6.2.2. Outras normas deontológicas

As regras propostas no código deontológico,que deverão ser seguidas na íntegra, podem aindaser complementadas com um conjunto de boas práticas,que mais não são do que especificações do própriocódigo, e particularizações do espírito do que aíestá consignado.

Assim, o jornalista deve recusar-se a noticiarsuicídios, excepto quando estes ocorreram em locaispúblicos, e sejam já do conhecimento da comunidade

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em geral. O que é um lugar público? Atirar-se daponte sobre o Douro, entrar em contramão numaauto-estrada, ou deixar-se apanhar por um comboioé distinto de ferir-se mortalmente em casa. Emtodo o caso, os familiares deverão sempre serrespeitados na sua dor, evitando-se perturbá-losinjustamente ou por motivos fúteis.

Corolário do princípio de presunção de inocênciados arguidos até ao trânsito em julgado da respectivasentença é que, por exemplo, em casos de polícia,os acusados não devem ser identificados de formaa poderem ser reconhecidos. Estes são processospouco mediáticos — se vier a ser considerado inocente,ou não for sequer acusado, o ladrão, carteirista,ou o que quer que seja, já não verá o caso noticiadonos jornais, e entretanto poderão ter-se produzidodanos irreparáveis na sua reputação.

Pelas mesmas razões, deve ser considerada muitograve a identificação de “menores delinquentes”,mas não só — deve recusar-se a identificação, atravésde informações ou imagens, de qualquer menorenvolvido em situações desfavoráveis, e cujaidentificação possa determinar negativamente o seufuturo, constituir uma invasão de privacidade ouuma humilhação pública. “António Pedro Bastos,de 13 anos, (segue-se a fotografia do dito), começoua cheirar cola aos 9, e hoje vive num carro abandonadona zona do Bairro S. João de Deus” ou “Pedrotem seis anos, vive com as irmãzinhas da caridade,estuda na segunda classe e é um excelente aluno.Mas teve um mau começo. Às duas semanas, amãe, prostituta e toxicodependente, abandonou-onuma casa de banho pública” são, passe o exagero,práticas abjectas: são-no em si, e ainda por umaoutra e subtil razão: estas crianças não têm quemas defenda e a violação do seu direito ao bom

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nome não vai ser alvo de queixa nem punida —isto é, não trará problemas. O jornalista jamaisse atreveria, e sabe-o muito bem, a noticiar umcaso semelhante ocorrido com um filho-família comum nome com 10 apelidos, o que torna tudo aindamais sórdido.

Também as vítimas de crimes sexuais, homensou mulheres, maiores ou menores de idade, nãodevem ser identificadas.

O jornalista deve igualmente evitar a todo ocusto as metonímias generalizadoras de etnias,religiões, grupos sociais ou profissionais: o cigano,africano, muçulmano, que realizou um assalto àmão armada, não deve ser referido dessa formadesprestigiante para toda a comunidade. Afinal,também não se diz “o traficante, lisboeta de raçabranca” quando é o caso.

O jorna l i s ta deverá sempre d is t ingui rcuidadosamente as pessoas, das ideias que defendemou dos actos que eventualmente praticaram

Absolutamente de parte está igualmente aincitação à violência, ao ódio racial, à subversãoda ordem pública ou à prática de quaisquer crimes,práticas que, ao abrigo da Lei de Imprensa, constituemelas próprias crimes.

Por outro lado, não se relacionam criminososcom pessoas públicas conhecidas, excepto quandotal tenha relevância no crime cometido ou na actuaçãodas pessoas em causa. Isto é, uma figura públicacom 50 anos de vida impoluta e dedicada não deveser ligada ao sobrinho toxicodependente que roubouum auto-rádio. Agora, se falamos do irmão de umministro, que ganhou de forma escusa o concursopara a realização de vultuosas obras públicas parao ministério tutelado por esse familiar, e que, apósinvestigações, foi acusado pelo Ministério Público;

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essa ligação, embora salvaguardando a presunçãode inocência dos envolvidos, pode ser realizada.Por último, não se divulgam cadastros de figuraspúblicas senão quando tal é de manifesto interessepúblico.

6.2.3.Responsabilidade legal e moral

Os jornalistas podem ser responsabilizadoslegalmente por crimes cometidos no exercício dasua profissão, sendo que os mais comuns, são oabuso de liberdade de imprensa, difamação e quebrado segredo de justiça.

Todavia, uma prática ética consequente e ocumprimento rigoroso da deontologia profissionalultrapassam quase sempre as responsabilidades legaisque lhe poderão ser imputadas.

Há práticas que são profundamente anti-éticas, ainda que não venham ou não possam seralvo de punição legal, e devem ser liminarmenterejeitadas. Caso, por exemplo, de violar o códigodeontológico relativamente a pessoas demasiadohumildes, ou simplesmente indefesas, para fazeremvaler os seus direitos. Ou, ainda, a pequena ficçãohumorística — atirar a pedra escondendo a mão— que é achincalhante para os visados, ou dealguma forma diminui qualquer dos seus direitos,mas que em juízo se revelaria impossível de provarcomo crime, pois não explicita quem são esses mesmosvisados — e por isso não é objecto de queixa.

O jornalista deve ter sempre presente que émoralmente responsável pelos seus trabalhos, e quepode pecar, por excesso ou omissão, mesmo quedaí não advenham consequências legais para apublicação.

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Deve pois ser o primeiro e o mais atento vigilantedas suas próprias práticas, porque um erro cometidonum jornal dificilmente poderá ser reparado. Aonoticiar uma falsidade, ou de alguma forma prejudicarinjustamente alguém, dificilmente poderá repararo mal feito. Nem todas as pessoas que leram anotícia falsa lerão o desmentido da mesma; e muitas,mesmo fazendo-o, não ficarão convencidas, eguardarão sempre uma na tura l suspe içãorelativamente a essa figura.

Por outro lado, no espaço que medeia entreum erro e a sua rectificação — ainda que estafosse eficaz a 100 por cento —, tudo o que sepassou, risos, ostracismo, ridículo, suspeição,desconfiança; já se passou, e jamais poderá serretirado da história pessoal da vítima e seus familiares.

6.3. Regras para a recolha de informação

A recolha de informação é um passo fundamentalpara a elaboração de qualquer notícia. Por maistalento e prática de escrita que o jornalista tenha,se falhou a recolha de dados coloca em perigotodo o trabalho, simplesmente porque sem informaçãocuidadosa e sistematicamente recolhida não possuimatéria prima para trabalhar.

Pelo contrário, se recolheu competente econscienciosamente os dados necessários para aelaboração do trabalho que tem em mãos, e se seencontrar em dificuldades durante a redacção domesmo, pode sempre ser auxiliado nessa tarefapor um editor ou um outro jornalista. Falhandoo propósito da recolha, ou passando ao lado danot íc ia , é que se encontrará numa s i tuaçãoirremediável, porque uma vez na Redacção, nem

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toda a boa vontade do mundo poderá auxiliá-lo.Algumas regras devem ser seguidas na recolha

de informações. A primeira, absolutamente óbvia,e tantas vezes negligenciada, é permanecer sempreno local até ao final dos acontecimentos. Porquê?Por mais previsível e entediante que o acontecimentopareça, podem sempre surgir imprevistos que serãoo mais importante da notícia. O jornalista que saiu10 minutos antes do final de um jogo de futebolpode perder as cenas de violência e as detençõesque se lhe seguiram. Depois, nada há a fazer, exceptoadmitir o erro. Não quererá, como o célebre RepórterX, que falhou o assassinato de Sidónio Pais, terde inventar que o presidente lhe morreu nos braçose que recolheu as suas últimas palavras: “Morroeu, mas salva-se a pátria”; quando é certo quePais expirou sem ter tido oportunidade de lançarsequer um suspiro.

Por razões semelhantes, isto é, porque osacontecimentos, por mais previsíveis que pareçam,podem não se produzir — quem pode garantir queo sol se levantará amanhã? — deverá respeitarescrupulosamente os embargos6 .

Sempre que tal for relevante para a históriaque tem para contar, deverá noticiar as circunstânciasde produção da notícia, ou mesmo do próprioacontecimento. Isto porque, embora esta tendênciaseja relativamente recente, cada vez mais a presençados media, especialmente das televisões, no localde um acontecimento pode influenciar, e isto semqualquer interferência dos jornalistas, o curso dopróprio acontecimento.

Consequência natural deste princípio é que ojornalista não deve provocar acontecimentos, quereficientemente, quer através das perguntas queformula. Isto é, se o corte de uma linha férrea

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por populares acaba por redundar numa manifestaçãopouco animada e sem convicção, não lhe competede todo incitar o povo a retirar carris da via etocar os sinos a rebate para chamar mais gente.Por outro lado, não pode dirigir-se a um secretáriode Estado informando-o que um ministro acharaa sua acção numa dada matéria pouco competente— o que é falso —; esperar que a vítima apelideo ministro de mentecapto; e a seguir informá-lodisso mesmo, criando um caso político.

Além disso, um profissional sabe o que andaa fazer. Não pode passar ao lado do coração dosacontecimentos, noticiando pormenores e esquecendoo essencial. Exemplos? Quando a Telepac lançouum pop de acesso à internet numa cidade do interiordo País — que permitiria obter ligações ao preçode uma chamada local, enquanto até aí os netófilosse ligavam a Coimbra, com custos incomportáveis— , teve o gesto simpático de realizar tambémum sorteio entre os então parcos utilizadores doserviço, oferecendo uma televisão, um telemóvel,e quinquilharia do género. Onde está aqui notícia?Não é certamente aquela que uma rádio local noticiavaem título: “O Sr. António Martins acaba de ganharum televisor!”.

Recentemente Portugal tem sido abalado porum vírus que prolifera incontrolavelmente: aconferencite de imprensa aguda. Por tudo, e pornada, políticos, empresas, associações, particulares,decidem convocar conferências de imprensa. Muitasvezes sem que se vislumbre qualquer assuntonoticiável, ou então encobrindo acções de propagandae promoção pessoal. O jornalista saberá seleccionar,entre as miríades de press releases e anúncios deconferências de imprensa , aqueles que sãoverdadeiramente importantes, negligenciando os

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demais.Regra de ouro que ninguém desconhece é que

é imprescindível ouvir sempre, com isenção e rigor,todas as partes envolvidas num conflito, e apresentaras suas versões de forma equidistante e sem emitirjuizos de valor, ou, de alguma forma, favoreceruma das partes.

6.4. Regras para a realização de entrevistas

A grande maioria das informações recolhidaspelo jornalista são-no através de entrevistas, quedepois, durante a fase de escrita, podem sert ransformadas em qualquer um dos génerosjornalísticos: notícia, reportagem, fait-divers... Porvezes não é fácil abordar tantas e tão diferentespessoas de entre os milhares que o jornalistaentrevistará ao longo da sua carreira, mas esse contactohumano tão diversificado constitui precisamenteum dos factores mais atractivos e de maior riquezada profissão.

§ O primeiro aspecto a atender durantea realização de uma entrevista é a proxémica— para todos os efeitos, o jornalista é umestranho, e deve evitar invadir o espaço doseu interlocutor, deixando-o desconfortável epouco à vontade.

§ As entrevistas são presenciais, exigemcontacto directo com a fonte, pela simples razãode que numa entrevista realizada por telefone,ou por escrito — as quais não estão vedadas,mas devem constituir excepção — se perdemtodos os pormenores que constituem a riquezapragmática do encontro.

§ A presença do jornalista é discreta

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e low profile, já que este evitará intimidaro entrevistado.

§ Por regra, não se apresentam questõesprévias, nem se aceitam entrevistas respondidaspor escrito. O entrevistado deve ser informadocom clareza do tema sobre o qual o trabalhoo versa, mas não das perguntas em concreto.É que ao utilizar este método, perde-se todaa espontaneidade, o efei to surpresa e apossibilidade de descobrir novas informaçõesdurante a entrevista.

§ Durante a fase de redacção do trabalho,o discurso do entevistado será forçosamentereescrito, por causa das diferenças entre aoralidade e a linguagem escrita — por maisculto que seja o entrevistado, o seu discursoterá de sofrer adaptações. O importante é queo texto seja fiel àquilo que o entrevistado revelou,não à letra do que foi dito.

§ Sempre que possível, as entrevistasdeverão ser preparadas com antecedência,devendo o jornalista documentar-se o maisposs íve l sobre o tema. I s to deverá sercomplementado com uma outra atitude: manter-se atento para o surgimento de novos temase questões na sequência das respostas dadaspelo entrevistado.

§ No caso dos jornalistas de imprensa,o uso do gravador deve ser excepcional,reservando-se para a entrevista pergunta-resposta, em que há a preocupação de reproduziripsis verbis as palavras do entrevistado. Emtodas as outras situações, o uso de um blocode notas revela-se uma escolha mais acertada,já que a informação assim recolhida é muitomais fácil de manipular, o jornalista deixa de

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estar sujeito a contingências técnicas, uma canetaintimida menos que um gravador, e durantea redacção do trabalho poupa-se muito tempoque pode vir a ser precioso para outras tarefas.Mesmo assim, quando for utilizado um gravador,deve, no final da entrevista, realizar-se umteste de som, ouvindo algumas palavras doentrevistado. Não raras vezes, pelas razões maisimprováveis — falha mecânica, falha de pilhas,um pause inconveniente — o jornalista verifica,ao chegar à Redacção, que a máquina não registouuma única palavra do que foi dito.

§ É necessário prestar a maior atençãoao que o entrevistado diz. Este, que normalmentefoi solicitado pelo jornalista, tem direito a cempor cento da sua atenção; não só por cortesiae boa educação, mas também por motivos práticos— muitas vezes as respostas do entrevistadosão ponte para novas perguntas, novos assuntos.O jornalista que registe desinteressadamente(“fale aqui para o gravador, enquanto eu vouali tomar um café e já venho”) o material querecolhe pode perder informação preciosa quedepois não consiga recuperar.

§ O jornalista deve expressar-se comsimplicidade, e apresentar-se de forma modestaperante os entrevistados. Deve deixar umaimpressão de segurança e tranquilidade, e deque não se deixará intimidar, ainda que intentemfazê-lo.

§ Particularmente, durante o seu trabalho,deve evitar expressões que ponham em causaa inteligência do entrevistado — “percebe?”,“está a acompanhar?”; e ainda definir termosque são de uso corrente, presumindo que ointerlocutor não os entende — se se presume

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que não os entende, devem obviamente escolher-se outros ainda antes de lançar a questão. Afinal,se o entrevistado é humilde e, efectivamente,não percebe, a responsabilidade é do jornalista,que falha ao não conseguir comunicar comele.

§ O interlocutor não deve ser interrompidoenquanto expõe uma ideia ou relata umacontecimento, porque isso pode levá-lo a perdero raciocínio que seguia. São também totalmentedesadequadas interrupções do jornalista comexpressões de incitamento, concordância ourepúdio (podem suceder em imprensa, masimagine o que sentiria se visse tal coisa numapeça de televisão: “Tem toda a razão sr. ministro”,“é claro”, “é evidente” “posso dar-lhe um beijinhosr. ministro?”)

§ Idealmente, se o jornalista tem opiniãosobre o assunto em causa, o entrevistado nãodeverá sequer aperceber-se dela. Se soubermanter as devidas distâncias, o entrevistadosentirá quão inconveniente seria sondá-lo.

§ Nunca se discute com um entrevistado.Esta é uma das consequências do distanciamento.Não quer dizer que não se lhe coloquem questõesprovocantes, que o levem a reagir com vivacidade.Mas essas questões serão colocadas de formaimpessoa l , ouvindo a respos ta comimparcialidade e registando o que é dito. Seo jornalista acha que, em determinado tema,pode não ser capaz de o fazer, então é porquenão possui distanciamento suficiente em relaçãoà causa e deve recusar o serviço.

§ Não se têm famil iar idades comentrevistados. Apesar da cordialidade e simpatiaque se recomendam, deve ficar sempre bem

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claro que aquele é um encontro com motivaçõesestritamente profissionais, e que o jornalistase reserva o direito de ouvir quem bem entendersobre o assunto, publicando a história da formaque achar mais conveniente.

§ Não se tratam os entrevistados por“tu”, excepto, nalguns casos, as crianças muitojovens. O jornalista também não deve, pelasua postura, admitir ou encorajar tal tratamento,excepto quando tal resulte de simplicidade ouingenuidade do interlocutor.

§ Ainda quanto aos tratamentos, ost i tu la res de cargos públ icos , quandoentrevistados nessa qualidade, tratam-se pelosnomes dos respectivos cargos: um ministro —que pode ser um académico de carreira, ouum antigo empregado de escritório — é sempresenhor ministro. A mesma regra segue-se quantoaos graus honoríficos, sempre que o jornalistadeles tenha prévio conhecimento, ou requisiteo entrevistado nessa qualidade, de forma queum arquitecto ou engenheiro é arquitecto ouengenheiro fulano de tal. Por fim, um corretorda bolsa, um empresário rico, o dono do jornal,um cigano, e um clochard arrumador de carros,são, respectivamente, senhor Pedro Caldeira,senhor António Mota, senhor Américo Quintas,senhor Nuno Mendes e senhor Joaquim Silvae deverão ser tratados exactamente da mesmamaneira e com o mesmo respeito. Lili Caneçase uma vendedora de peixe são D. Lili Caneçase D. Antónia Sousa, independentemente depreferirmos a companhia de uma ou de outra.

§ As entrevistas devem ser conduzidascom seriedade e honestidade, e tal significaque não se inventam nem se criam falsos

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acontecimentos — pode parecer extraordinário,mas ainda há lídimos crios de Reinaldo Ferreiraem actividade. O jornalista não quererá serum deles.

§ Pelas mesmas razões, não se colocampalavras na boca dos entrevistados, incluindonas perguntas todas as afirmações que o jornalistagostaria de ver a fonte debitar, e esperandopor um assentimento deste.

§ Por outro lado, não se formulam questõesque possam ser respondidas com “sim” ou “não”,porque é exactamente isso que um entrevistadolacónico ou intimidado fará, deixando o jornalistaem apuros. Uma entrevista é uma conversaque cumpre ao jornalista dirigir, deixando oentrevistado expressar-se à vontade.

§ Durante uma conversa deste género,interessa ouvir o entrevistado, não o própriojornalista. Demasiadas pessoas adoram o somda própria voz, o tilintar das suas opiniões.O jornalista não é uma delas.

§ A máxima cautela na recolha de dadosou a f i rmações que possam vi r a gerarcontrovérsia. Deve atender-se que, muitas vezes,as pessoas mais insuspeitas estão sempre prontasa retirar uma afirmação que claramente fizeram,assustadas pelas reacções ou consequências queprovocaram, e atirando as culpas para o jornalista,que percebeu mal ou publicou coisas que eunão disse. A prudência é uma grande virtude.A inversa é que não se devem descontextualizarafirmações de entrevistados, atribuindo-lhessentidos que não tinham quando foram proferidas.

§ Muitas e muitas vezes, especialmentese parece jovem e inexperiente, o jornalistaserá solicitado por entrevistados no sentido

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de os deixar ler o seu trabalho antes da publicação.Regra geral tais pedidos devem ser liminarmenterejeitados. O trabalho, bom ou mau, é da exclusivaresponsabilidade do jornalista. Por vezes admite-se que sejam abertas excepções em casos deperitagem que o redactor não domine — umtexto sobre a cisão do átomo em que a fonteé um físico famoso — ou quando o interessenoticioso das declarações suplante largamenteos inconvenientes disso. Em tais casos a opçãopode ser l eg í t ima, mas nunca é mui torecomendável7 . Agora, deixar um entrevistadoler uma entrevista sobre a apanha da batatanos Montes Hermínios mina a credibilidadedo jornalista e transforma-o numa espécie demoço de recados – o sr. publica aquilo queeu desejo que publique. Situações deste tipodevem ser evitadas. Informado das condiçõesdo trabalho, o entrevistado reservar-se-à o direitode conceder a entrevista ou não.

§ Sempre que se proponha entrevistaralguém, a primeira coisa que o jornalista tema fazer é identificar-se, identificar o órgão decomunicação social para onde trabalha, e explicaro tema da entrevista. Depois, no caso de vira ser marcado um encontro a posteriori, deverácuidar para ser rigorosamente pontual, por umaquestão de respeito pelo interlocutor; e quandoisso não for possível, justificar-se e pedirdesculpa.

§ Nunca se corrigem os entrevistados,ainda que dêem à gramática o mesmo uso quese dá a uma bola na final da Taça — issoofende-lo-à, é inútil pois não o ensinará a falarmelhor português, e pode perfei tamenteinviabilizar a entrevista. Eventuais correcções

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fazem-se na passagem do discurso oral à escrita,e sempre no sentido de melhorar a clareza doque foi dito permanecendo fiel às declaraçõesdo entrevistado.

§ As questões a colocar ao entrevistadodevem ser logicamente agrupadas por temasou áreas de interesse. Não se salta anarquicamentede um assunto para outro, voltando atrás abel-prazer, porque isso confunde o entrevistadoe tornará muito mais difícil a redacção do trabalhojornalístico.

§ A timidez é um defeito encantador,mas não num jornalista. Ele não pode ter vergonhade perguntar, ou insistir sobre pontos que lhepareçam obscuros. Deve, pelo contrário,perguntar tudo até ao fim, muito, as vezes queforem necessárias, até ter a certeza de quepercebeu e que pode transmitir competentementeo que lhe foi dito.

§ Colocar sempre todas as questões quese tinham previamente formulado. Por vezes,provocar o entrevistado pode ser uma boa técnicano sentido de espevitar o interlocutor. Masnunca co locar ques tões despr imorosas ,humilhantes ou com as quais o entrevistadose possa sentir justamente ofendido, nem asque violem a sua vida íntima. (A propósitode um trabalho sobre política, não se perguntaSr. ministro, é verdade que quando era pequenose vestia de mulher e gostava que lhe chamassemKátia Marlene?)

§ Não deixar o entrevistado fugir àsperguntas — e são mestres nisso os políticosprofissionais. Sempre que o entrevistado desviaro assunto e desatar cheio de coerência a falarde outra coisa qualquer, reconduzi-lo firmemente

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ao tema em foco. De outra forma o jornalistafoi manipulado.

§ Por último, o jornalista deve respeitaras convicções religiosas e mundividências dosentrevistados, mesmo que com elas não concorde,e fazê-lo de uma forma prática e não meramenteteórica. Se entrevista um bispo católico, nãodeve, enquanto faz sala, dissertar sobre as delíciasde uma vida sexual promíscua. Se convida umrabi para almoçar, pode muito bem, por cortesia,evitar pedir carne de porco à alentejana. Assimcomo, se se encontra num país islâmico, deveevitar sair para uma reportagem vestindo roupasou tendo comportamento que são chocantespara tais culturas. Essas atitudes podemjustamente ser tidas como provocações — eque outra coisa poderiam ser?

Mário Erbolato, citado por Silva Araújo8 ,acrescenta ainda, entre outras, as seguintes regras:

“1. Ajude o entrevistado, se necessário,a expor as suas opiniões. Conduza a entrevista.

2. Não corte as respostas. Espere quecada uma delas termine, antes de formular apróxima pergunta.

3. Não emita a sua opinião, a menosque seja solicitada, e assim mesmo com modéstiae humildade.

4. Não seja agressivo. Demonstrefranqueza, e não astúcia.

5. Faça as perguntas ao mesmo nívelde quem responde. Pode acontecer que aentrevista seja importante, por ter sido procuradauma pessoa que saiba bastante sobre o queocorreu , embora humi lde . Se e la f icaramedrontada, negar-se-á a dar esclarecimentos

6. A recolha de informação

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preciosos para o jornal.6. Não se mostre superentusiasmado se

ouvi r uma respos ta -bomba, porque oentrevistado, diante da sua reacção, poderá pedir-lhe que suprima o que disse, temeroso dasconsequências.

7. Prepare o terreno para cada pergunta.As coisas mais cruéis e indiscretas podem serindagadas se o jornalista tiver o cuidado dese ir conduzindo com habilidade”.

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Notas:1. Fonte de informação é um local onde habitualmentese produzem ou se concentram informações de interessegeral”, in Cardet, Ricardo, sd, Manual de Jornalismo,col. Nosso Mundo, Editorial Caminho, Lisboa, p. 32.2. Além destas, nas aldeias portuguesas existem aindaos utilíssimos postos públicos da Portugal Telecom -que podem coincidir com a mercearia, o café, ou seruma casa particular. Nunca ninguém está mais beminformado do que se passa na aldeia que o responsávelpelo posto público, além de que sabem o numero detelefone de todos os restantes habitantes da aldeia.3. Cardet, Ricardo, op. cit., p. 32.4. Daniel Ricardo, op. cit., p. 33.5. Cacha é uma informação - em breve notícia - quemais nenhum outro jornalista possui. Um exclusivo,portanto. A palavra entrou na gíria jornalística a partirdo francês, cacher, embora já seja possível encontrar,mesmo em publicações, a deturpação caixa.

6. Há, evidentemente, uma outra e excelente razão parao fazer, que é o respeito que lhe deve merecer a fonteque emitiu o embargo.7. Uma variante disto é solicitar as perguntas por escritoe exigir que as respostas sejam publicadas na íntegra.Poderá ceder-se no caso do Presidente da Repúblicaque fala sobre uma matéria de Estado muito delicada;mas nunca ao primeiro John Doe que gosta de se darares de prima dona. Aí o que há a fazer é entrevistarimediatamente um rival ou concorrente sobre o mesmoassunto.8. Silva Araújo, Op. Cit., p. 132.

6. A recolha de informação

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VII. Utilização da Linguagem

Barthes, num texto célebre, a lição inauguralproferida no prestigiado College de France, provaque a língua é fascista. “Um idioma define-se menospor aquilo que permite dizer, do que por aquiloque obriga a dizer” constitui a tese central destetrabalho. “A linguagem é uma legislação, e a línguaé o seu código. Não nos apercebemos do poder queexiste na língua porque nos esquecemos que qualquerlíngua é uma classificação, e que qualquer classificaçãoé opressora”1

Falamos a língua, mas, ao mesmo tempo, somosfalados por ela. A estrutura própria de cada línguapermite-nos dizer as coisas, mas também nos obrigaa dize-las de determinada maneira. “My languageis the sum total of myself”, proclamava Peirce quaseum século antes. Nomear é sempre constituir umsujeito, e um objecto, um enunciador, e um enunciado.Sendo a linguagem uma cristalização de formas euma ordem, estão sempre nela inscritas relaçõesde poder, e as “escritas brancas”2 preconizadas porBarthes são simplesmente impossíveis.

“A língua, como performance de toda a linguagem,não é nem reaccionária nem progressista; ela é purae simplesmente fascista; porque o fascismo não consisteem impedir de dizer, mas em obrigar a dizer”3 , concluiBarthes.

Ao linguista esta perspectiva, o carácter fascistada linguagem, interessa em termos estruturais, eo tema constitui um manancial inesgotável para osestudos empíricos da linguística comparada. E maisnão pode fazer que revelar, revelar obsessivamente.Dela não há fuga possível, e mudar de língua, mudar

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a língua, um projecto que não se pode cumprir.Ao jornalista o tema interessará sobretudo num

âmbito muito mais restrito — o do valor semânticode certas expressões que surgem associadas aa prioris culturais tão vastos de que nem chegabem a dar-se conta. Colombo provou, sem margempara dúvidas, que o jornalismo, por maior perfeiçãoque um país tenha atingido na forma como o pratica,está sempre sujeito a uma determinada atmosferacultural, a “certos dados impalpáveis das condiçõesem que os jornalistas trabalham”4 . Mais do que ascondições jurídicas e materiais, condições internase culturais, um omnipresente clima moral, podemcondicionar o que e como se diz.

Ora contra isto, é possível estar vigilante. Ofascismo semântico pode e deve ser combatido. Porque razão um toxicodependente “rouba auto-rádios”enquanto um gestor “deu um desfalque de meio milhão”,ou “desviou fundos”? João Com Fome é pura esimplesmente “o réu”, ao passo que, sentado nomesmo banco, um ex-governante é “o ex-ministroacusado pelo Ministério Público de...”? Os ciganos“burlam”, vendendo latão por ouro, gato por lebre,ao passo que os empresários “se envolvem em processosde facturas falsas”, ou “deixam de pagar à SegurançaSocial”; Maria é despejada por “não pagar a renda”,enquanto a empresa onde trabalha continua “comsalários em atraso”. E podem-se contornar taisarmadilhas da linguagem? Não é nada fácil. Maspode-se, pelo menos, estar atento.

O jornalista, para não ser como o comerciantedesonesto, deve usar sempre o mesmo metro, evitaras designações pejorativas; as generalizações de gruposétnicos, religiosos, profissionais ou outros; formularas suas perguntas de forma neutra, e usar da mesmaneutralidade na revelação dos factos. Posto isto,

7. Utilização da linguagem

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como se fazem então as notícias?

7.1 Estilo

Esta é a questão crucial para todos os jovensaspirantes a jornalista. Como escrever? Que tipode linguagem utilizar? Os textos jornalísticos gozamde uma identidade muito própria que permite identificá-los a um simples olhar entre muitos outros documentos.Tal identidade consegue-se observando as regras deprodução da notícia, mas também mediante um empregocuidadoso da linguagem, que é o que virá a conferirà peça o seu estilo.

A linguagem jornalística deve ser clara, precisa,concisa5 , ritmada e com vivacidade. A clareza derivada utilização de frases curtas; do uso preferencialde uma ideia por frase; de um rigoroso encadeamentológico entre as ideias explanadas no texto; e deuma utilização económica da linguagem: preferiras palavras mais curtas, e o número mínimo destasnecessário a veicular a informação sem perda decontúdo informativo. Depois, só pode escrever claroquem tem ideias claras sobre o assunto em causa,e estas obtém-se procedendo de forma rigorosa àrecolha da informação. Para o jornalista, não podemsubsistir dúvidas àcerca do assunto que está a noticiar.

A precisão prende-se com o rigor semânticona utilização da linguagem, que deverá ser ultra-cuidado. Muitas vezes, na pressa de escrever, eembalado por certos automatismos, o jornalistaesquece, por exemplo, que “dizer”, “afirmar”,“defender”, “denunciar”, “contar” - não significamrigorosamente a mesma coisa, nem podem ser aplicadosindistintamente. Quando uma palavra é utilizada comprecisão no interior de um texto, ela não é intermutável,

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nem pode impunemente ser substituida por outraUma outra vertente da precisão tem a ver com ariqueza de pormenores, a completa identificação dasfontes, a descrição precisa das coisas narradas. Épreferível dizer “corveta” a barco; “Range Rover”a jipe; “kalashnikov” a arma de fogo.

Também ligada à clareza está a concisão dalinguagem: se uma informação puder ser transmitidaem quatro palavras, não se utilizam seis; e se pudersê-lo em duas, não se utilizam quatro. Afinal, nãosão precisas muitas mais para dizer que começoua III Guerra Mundial.

Finalmente, e induzida pelo apuro semânticoe concisão, a escrita jornalística é ritmada, e asfrases, necessariamente curtas , evoluem comvivacidade e com brilho — algo que retiram tantoda forma como do conteúdo — contrastandoabsolutamente com a prosa monocórdica e soporíferaque a inversão destes termos se arrisca a produzir.

A língua é para o jornalista o que a enxadaé para o agricultor — um instrumento de trabalho— e precisa dominá-la perfeitamente, e aperfeiçoaresse domínio ao longo do tempo. Ortografia, gramática,e pontuação empregues com cor recção sãoimprescindíveis ao trabalho jornalístico. Mas nãosó. Sem prejuízo do que foi dito àcerca da clarezae concisão, o jornalista deve utilizar um vocabuláriorico; preciso, mas não rebuscado; e escrever comritmo, imaginação e originalidade. A simplicidadeé, por vezes, de todas as formas, a mais trabalhosade atingir.

7. Utilização da linguagem

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7.2. Como escrever

Para além das precisões gerais a imprimir aoestilo, algumas medidas práticas podem ser atendidasno sentido de o melhorar, uniformizar a escrita dapublicação, e não cometer erros jornalísticos. Sãoelas:

1. Não começar parágrafos sucessivoscom a mesma palavra;

2. Não utilizar repetidamente as mesmasestruturas frásicas;

3. Não repetir palavras no interior deuma frase ou de um mesmo parágrafo;

4. Não permitir a utilização de expressões,palavras e construcções sintácticas com sentidosduplos ou dúbios. “Navio português entrava noPorto navio espanhol”6 .

5. As rimas, repetições e cacofoniasproduzem invar iave lmente um efe i todesagradável. Este aspecto recomenda atençãoespecial, já que é o tipo de coisa que podesuceder aos melhores: “Alma minha gentil quete partiste” poetava Camões.

6. Na escrita jornalística é proibida autilização da primeira pessoa. Mesmo descrições,ou transes, pelos quais o jornalista passou, eque contaria de ordinário na primeira pessoa,deverão ser descritos de forma impessoal.

7. Os verbos deverão ser colocadospreferencialmente na voz activa, preferindo-seos de movimento aos que exprimem estados— imprimirão maior ritmo e dinamismo à frase.

8. Em regra o tempo verbal por excelênciautilizado nas notícias é o presente do indicativo;de tal forma que pode e deve mesmo utilizar-se também para referir o passado ou futuro

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próximo.9. O vocabulário será preciso e muito

rico, empregue sem cair na pedanteria ouexibicionismo.

10. Descrever com pormenor, não suprimirinformação, e enriquecer o trabalho com umgrande número de factos des ta ordem éperfeitamente compatível com tudo o que jáfoi enunciado. Imperdoável só mesmo gastarrios de palavras para nada dizer.

11. Aspecto fundamental da precisão erigor é uma correcta identificação das fontes7 .

11.1. As fontes não identificadas serãoexcepção, excepção essa que deverá serdiscutida com a direcção ou chefias. Emesmo quando tal suceda, deverão serdeterminadas com o máximo de precisãopossível. “Um elemento da tripulaçãodo Sagres” é melhor que “fonte ligadaao projecto”; “um dos elementos presentesna reunião”, é preferível a “fontespróximas de S . Bento” — ta i sde te rminações são impor tan tes ,conquanto se preserve a identidade quese acordou preservar.11.2. No caso de o jornal estar a utilizarfontes duplas, deverá citá-las sempre.“Mário Soares, em declarações à RádioComercial, reconheceu entretanto que...”11.3. Num determinado órgão, as fontesdeverão ser identificadas coerentemente,obedecendo sempre às mesmas regras.Uma das formas possíveis de o fazeré utilizar o nome completo da primeiravez que uma pessoa é nomeada, e a partirdaí tratá-la pelo primeiro e último nome.

7. Utilização da linguagem

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11.4. Deverão ainda ser claramentenomeadas determinações como o cargoque ocupa ou a sua idade, se, no âmbitoda notícia, falar em alguma qualidadeespecial.11.5. Nomear as fontes que são figuraspúblicas pelo nome pelo qual são maisconhecidas. O director dos ServiçosAcadémicos da UBI, por exemplo, deseu nome Carlos Alberto Melo Gonçalves;deverá ser identificado como Carlos Melo,e não Carlos Gonçalves — este últimoum per fe i to desconhec ido para ageneralidade da Academia.11.6. No caso de se estarem a noticiarfatalidades, acidentes, ou actos heróicosprotagonizados por desconhecidos, aidentificação das fontes deve conter omáximo de dados possíveis: nome, idade,profissão, estado civil, naturalidade eresidência.11.7. Os graus académicos e honoríficossó se utilizam na identificação das fontesquando estas falarem com o jornal nessaqualidade, e portanto o título for umainformação noticiosamente relevante: oengenheiro que comenta um desabamentode terras numa obra; o médico que falada contaminação de um bloco operatório;ou o arquitecto que comenta o embargode uma obra pela Câmara Municipal.Nestes casos, a fonte é identificada apenasuma vez: “António Pedro, engenheirodos se rv iços técn icos da CâmaraMunicipal da Covilhã...... de acordo comAntónio Pedro...na opinião daquele

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7. Utilização da linguagem

técnico camarário”.12. Devem evitar-se certas redundâncias

algo ridículas, como a expressão “fontes beminformadas”, “fonte segura” — afinal quejornalista utiliza fontes que não estão beminformadas ou inseguras?

13. É necessário identificar rigorosamenteos lugares de onde se fala – eles podem seróbvios para o jornalista, mas não para quemlê o jornal em Paris ou no Congo. Por isso,são totalmente desadequadas expressões como“nesta universidade”, “aqui”, “nesta cidade”,“neste País” — neste País é o país onde o leitorse encontra nesse momento, e é impossível preverqual seja.

14. As identificações geográficas exigemuma medida de bom senso: basta dizer Porto,Lisboa ou Setúbal para estes locais seremcorrectamente identificados; mas não no casode terras pequenas ou pouco conhecidas:“Torrozelo, uma aldeia da Covilhã” — alémde que a toponímia em Portugal é traiçoeirae há nomes que se repetem obsessivamente denorte a sul do País. Celorico tanto pode serda Beira como de Basto; aldeias do Bispo existempelo menos uma boa meia dúzia...

15. As datas incorporadas nas peçasjornalísticas reportam-se sempre à data docabeçalho do jornal, de forma que, num diário,por exemplo, hoje é ontem, ontem anteontem,e amanhã hoje. No caso de um semanário,amanhã é o dia a seguir à saída do semanário,e esta data até pode estar a uma semana dedistância do dia em que o jornalista escreve.

16. O uso dos artigos definidos (o, a,os, as) deve ser exclusivamente reservado para

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referir assuntos já conhecidos do público oupara indicar implicitamente exaustividade.“Greve da CP paraliza acessos a Lisboa”; mas“Foi desconvocada a greve da CP que onteminstalou o caos nos acessos à cidade de Lisboa”— a greve já é do domínio público, sendo notícianão a greve, mas o facto desta ter terminado.«As viagens-fantasma dos deputados» é um títuloque indica que o jornal falará exaustivamentede todas as viagens-fantasma que se apurou teremos deputados feito. “Viagens-fantasma sobinvestigação” um título que indica que a PGRcontinua a investigar o assunto, e que o jornalnão dispõe da totalidade da lista.

17. Salvo por vezes em citações, nuncase utilizam artigos definidos junto de nomespróprios, por duas ordens de razões: se o jornalistade facto conhece intimamente a personagem,está a excluir deliberadamente o leitor; se nãoconhece e se lhe refere dessa forma é bacoco.Depois, o emprego de artigos definidos destaforma é também uma maneira de trazer àenunciação o enunciador; ora um dos primeirosdeveres do jornalista é apagar-se deliberadamenteface ao acontecimento.

18 . São desadequadas , e es tãoperfeitamente em desuso, a utilização, em textosescritos, de expressões como “a uma perguntanossa”, “disse ao repórter”, “disse à nossareportagem”, “perguntamos”, “inquirido sobre”— se temos a resposta, é evidente que foiperguntado e respondido.

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7. Utilização da linguagem

7.2.1. Simplicidade e originalidade

A escr i ta jo rna l í s t ica deve pr imar pe las impl ic idade , sem abdicar da or ig ina l idade .Simplicidade porque um dos objectivos de queminforma é, necessariamente, atingir a faixa maisalargada de público possível e assim, idealmente,seria desejável que um mesmo texto pudesse serlido por um cientista e um pescador, e ficassemigualmente bem informados. Por outro lado, a rapidezda vida quotidiana também não convida, mesmo oleitor culto, a aventurar-se em enunciados intrincados— que por vezes pouca informação têm para dar— ou à decifração de charadas e enigmas.

Simplicidade significa rapidez e eficiência natransmissão de informação, mas não facilidade nemsimplismo. É difícil produzir textos com estascaracterísticas, e especialmente produzir textossimples, mas precisos e rigorosos, que tratam deassuntos complexos. A falta de simplicidade numanotícia é um defeito que pode dever-se ao factodo jornalista pura e simplesmente não conseguirdominar a complexidade da matéria que transmite,a insuficiência vocabular, ou, pior ainda, a um certonarcisismo que o leva a exibir as preciosidades doseu intelecto, à boleia de uma notícia qualquer.

Há mil e uma maneiras de cultivar a simplicidade,e tal significa que se pode fazê-lo sendo original,quer através da utilização da linguagem, quer atravésda perspectiva pela qual o assunto é encarado, eda forma que se escolhe para contar uma história.

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7.2.2. Estrutura das frases

As frases, na linguagem jornalística, devem sercur tas , pouco complexas , ve icu landopreferencialmente apenas uma ideia. Claro está quea construção gramatical que segue a ordem sujeito-predicado-complemento não é a única que pode serutilizada, mas dá geralmente bons resultados. Agora,ções como as que em tempos idos se dividiam nosLusíadas é que são absolutamente desadequadas numjornal. Também não vale a pena poupar nos pontosfinais, construindo frases intermináveis, com muitasorações intercalares. Sempre que chegar ao fim deuma ideia, faça ponto e inicie outra frase.

7.2.3. Adjectivação

Devido às carac te r í s t icas da l inguagemjornalística, os adjectivos devem ser utilizados comextrema parcimónia e, nas notícias, quase semprepodem ser suprimidos sem prejuízo de maior. Quandonão, devem ser preferidos os adjectivos descritivos— que indicam estados — aos valorativos — queemitem juízos de valor.

Sub-capítulo da adjectivação é a necessidadede vigiar o emprego de palavras com carga ideológica,política ou étnica que possam indiciar juizos devalor em relação aos acontecimentos. Mesmo quenão sejam adjectivos, pela conotação de que estãoimbuídos, também adjectivam. É profundamenteincorrecto designar as pessoas por elementos nãoneutros: o cigano, o monhé; afinal, também nãose diz: o vendedor ambulante branco e portuguêsdos quatro costados.

Além disso, em geral, os advérbios e adjectivos,

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são dispensáveis na notícia, porque este génerohabitualmente não se alonga em descrições.

7.2.4. Verbos

Os verbos devem ser utilizados preferencialmenteno presente do indicativo, mesmo quando se referema um futuro próximo. Verbos de acção e movimentoconstroem frases mais fortes, mas é necessário muitocuidado relativamente à carga semântica quecomportam: “dizer” não é o mesmo que “denunciar”,“acusar”, ou “revelar”.

O tempo por excelência da notícia é o presentedo indicativo, por vezes o passado. Por esta razão,o condicional só deve ser utilizado em casos especiais:é um tempo verbal que inspira no leitor dúvidaquanto aos factos ou à credibilidade da fonte, epor isso só se utiliza quando o jornalista pretendemarcar precisamente essa dúvida. Ora tal procedimentosó é admissível em casos excepcionais, pois os jornaisnão noticiam dúvidas, boatos ou rumores.

7.2.5. Muletas linguísticas

Demasiadas vezes, para promover a ligação entrefrases, parágrafos, ou mesmo assuntos, os jornalistassocorrem-se de muletas linguísticas, de que sãoexemplos as expressões “por outro lado”, “com efeito”,“aliás”, “efectivamente”, “entretanto”, “recorde-seque”. Não que o seu uso seja proibido, mas o abusoarrisca tornar os textos pesadamente cinzentões eanormalmente uniformes. Na maioria dos casos, taisexpressões são simplesmente supérfluas, e seeliminadas do texto verifica-se que não fazem láfalta alguma, nem alteram o seu sentido.

7. Utilização da linguagem

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7.2.6. Repetições

Mais do que em qualquer outro tipo de escrita,na linguagem jornalística devem evitar-se as repetições,que tornam os textos pesados e perturbam o ritmo.Tal far-se-á quer recorrendo a sinónimos, quandofor imprescindível designar muitas vezes o mesmoobjecto ou ent idade: “Câmara”, “autarquia”,“edilidade”; quer, no caso de pessoas, designando-as alternadamente pelo nome, cargo ou função queocupam, idade, ou qualquer outra característicapertinente no caso em apreço.

7.2.7. Lugares comuns

São uma sequela das muletas linguísticas, masde consequências ainda mais danosas para a prosado jornalista. O pior é que o cliché ou lugar comummanifesta capacidades adaptativas que suplantamas de qualquer vírus conhecido. Uma coisa torna-se lugar comum quando exaustivamente repetida,nas mesmas circunstâncias, de forma que a listado início do século já nada tem a ver com a quepoderiamos publicar hoje, e muitas vezes estas modasespalham-se de forma epidémica numa dada região— de tal modo que o que é um estafadissimo eirritante lugar comum na Beira Interior, não o seriapor exemplo em Leiria. Exemplos de lugarescomuns universais são “o esférico”, “rematou à figura”,“espectáculo dantesco”, “soldados da paz”, “abnegadamãe”, “opíparo repasto”, “violento incêndio”, “pastode chamas”, “aparatoso acidente”. Lugares demasiadocomuns em algumas rádios desta região são “palavras

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ditas”, “candeias às avessas”, “já se sabe”, “polémicasinstaladas”, entre outros.

Como os lugares comuns, como aliás as gralhas,aparecem nos sítios mais insuspeitos, pousando ondemenos se espera, o melhor profiláctico é mesmoa vigilância atenta.

7.2.8. Queísmo

É uma falha que ataca os profissionais que escrevemfrases demasiado longas — aqueles, precisamente,que economizam no ponto final. Constroem entãofrases mostruosas, com ligações improváveisefectuadas mediante o abuso da partícula “que”,promovendo o desagradável e inestético “queísmo”.

7. Utilização da linguagem

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Notas:

1. Roland Barthes, A Lição, col. Signos, Edições 70, 1988,Lisboa, p. 15.2 . Barthes, Roland, O Grau Zero da Escrita, Edições 70,1988, Lisboa.3. Ibidem, p. 16.4. Furio Colombo, op. cit, p. 27.5. “Claro, preciso e conciso” eram os adjectivos que o jornalistaCosta Carvalho, de quem fui aluna, utilizava para caracterizaro estilo da linguagem jornalística, no seu excelente manual“O Mundo na Mão”. Infelizmente a citação e atribuição decréditos não pode passar daqui já que os dois volumes quecompunham esse manual desapareceram completamente decirculação, e nem nas bibliotecas públicas foi possível localizarexemplares.6. Exemplo muito feliz retirado de Silva Araújo, op. cit.7. É evidente que ela também se recomenda por motivoséticos. Mas no caso dos muito jovens estagiários, verifica-se que muitas vezes não conseguem identificar completa ecorrectamente uma fonte não porque esta se recusasse a fazê-lo, mas por pura inexperiência.

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VIII. A pontuação 1

O uso correcto dos sinais de pontuação éfundamental para a produção de textos jornalísticosclaros e precisos, já que o significado e portantoa interpretação correcta de uma frase dependem muitasvezes da qualidade e oportunidade da forma comoé pontuada.

Também a concisão, outra das característicase qualidades que um texto jornalístico deve ter, dependedo uso adequado dos sinais de pontuação. Um textopadrão utiliza frases curtas, orações directas; e cortaos parágrafos de forma cirúrgica, proporcionandoa construção por blocos que tantas vantagens podetrazer à notícia.

O texto jornalístico deve ser rapidamente acessívelao leitor de cultura média. Para tal é importante,entre outros factores, evitar ambiguidades, duplasinterpretações ou sentidos dúbios: a linguagemjornalística deve ser unívoca, para que possa esclarecero leitor em vez de semear a dúvida no seu espírito,ou, pior ainda, induzi-lo em erro. E essas duas coisaspodem decorrer apenas do mau uso da pontuação.

A este respeito, são excelentes os exemplosapontados por Silva Araújo no seu manual deJornalismo2 . “Maria, tomando banho, na água quente,sua mãe, por obséquio diz: traz água fria” e “Maria,tomando banho na água quente, sua. Mãe, por obséquio– diz - traz água fria.” são frases lexicalmente idênticasmas, devido à pontuação, com sentidos totalmentedistintos. É também o caso do conhecido “MorraSalazar. Não faz falta à Nação” e “Morra Salazar?Não!! Faz falta à Nação”.

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A pontuação serve para reproduzir, quandolidamos com a forma escrita, os movimentos, aspausas, entoação e ritmo da linguagem falada. Parteda descodificação de uma enunciação depende deaspectos de pragmática que qualquer falante treinadosabe perfeitamente interpretar. A pontuação destina-se a surprir os recursos pragmáticos da enunciaçãona linguagem escrita, fornecendo a “boa leitura”de entre todas as possíveis a que um texto se presta.

Os sinais de pontuação dividem-se entre aquelesque se destinam fundamentalmente a marcar as pausas:

- a vírgula ( , )- o ponto e vírgula ( ; )- o ponto final ( . )

A vírgula marca pausas de pequena duração,e emprega-se para separar os elementos de uma oração,orações de um só período; separar orações coordenadas,e isolar orações intercaladas.

O ponto e vírgula é um sinal que serve deintermediário entre a vírgula e o ponto, podendoaproximar-se mais de um ou de outro de acordocom o tipo de pausa que representa no texto. Utiliza-se, num período, para separar orações da mesmanatureza com alguma extensão; para separar partesde um período das quais uma esteja subdivididapor vírgula; e para separar items de enumerações.

O ponto assinala a pausa máxima da voz depoisde um grupo fónico. Emprega-se para indicar o termode uma oração declarativa; períodos que se sucedemuns aos outros na mesma linha; e períodos que encerramuma ideia ou raciocínio, caso em que se deixa oresto da linha em branco e se continua o texto nalinha seguinte: é o ponto parágrafo.

Representando valores melódicos, é possível

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utilizar correctamente a pontuação de forma intuitiva.Celso Cunha e Lindley Cintra sintetizam da seguinteforma as características melódicas dos sinais de pausa:“O ponto corresponde sempre à final descendentede um grupo fónico; a vírgula assinala que a vozfica em suspenso, à espera de que o período secomplete; o ponto e vírgula denota em geral umadébil inflexão suspensiva, suficiente, no entanto,para indicar que o período não está concluído”3 .

O segundo grupo de sinais de pontuaçãocompreende aqueles que se destinam a marcar oritmo, melodia e entoação do enunciado:

- dois pontos ( : )- ponto de interrogação ( ? )- ponto de exclamação ( ! )- reticências ( ...)- aspas ( « » )

- parênteses ( ( ) )- travessão ( - )

Os dois pontos empregam-se para anunciar: umaci tação; uma enumeração; uma s ín tese ; umesclarecimento, ou uma consequência do que foianunciado.

O ponto de interrogação utiliza-se no final deuma pergunta directa para assinalar o seu carácterinterrogativo. Nas notícias e títulos de jornal deve,sempre que possível, evitar-se a sua utilização. Ojornal afirma acontecimentos positivos, não noticianão-acontecimentos, nem serve para espalhar dúvidas,rumores ou insinuações. Utiliza-se pois sobretudonas questões das entrevistas pergunta-resposta, esob a forma de citação, para dar corpo às declaraçõesde uma fonte.

O ponto de exclamação serve para diferenciar

8. A pontuação

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os enunciados de entoação exclamativa, empregando-se depois de interjeições, apóstrofes, ou do imperativo.Tratando-se de um sinal de pontuação que veiculaordens ou uma forte carga emotiva nunca deve serutilizado pelos jornalistas em textos noticiosos ourespectivos títulos, excepto se se tratar de uma citação.

As reticências empregam-se fundamentalmentepara reforçar o valor de uma interrogação; quandose quer mostrar que uma enumeração não está completa;ou para deixar em suspenso algo que não foi ditomas apenas implicado. É bem de ver, dadas ascaracterísticas da escrita jornalística, que o seu usose reveste de carácter excepcional, devendo, sempreque possível, evitar-se a sua utilização. É importante,também não confundir as reticências com o sinaltipográfico de três pontos, apresentados entreparênteses – (...) – que se utilizam para indicarque foram suprimidas palavras numa citação.

As aspas , no Urbi e t Orbi , u t i l i zam-seexclusivamente para marcar o início e o fim de citações.Nas restantes situações que poderiam implicar oseu uso – para marcar estrangeirismos ou ironia– deve optar-se por outras soluções tipográficas,como o uso de itálico.

Os parênteses utilizam-se para intercalar numtexto indicações acessórias. Na escrita jornalísticadevem, em regra, ser evitados, substituindo-se portravessões. A excepção são as nomeações de siglas,que devem, a primeira vez que são mencionadasnum texto, sê-lo por extenso, seguindo-se a siglaentre parênteses. Desta forma, daí por diante, podeutilizar-se apenas a sigla no decurso desse mesmotexto. Por exemplo: «A Organização Mundial deSaúde (OMS) revelou dados preocupantes relativosàs doenças infecto-contagiosas nos países do terceiromundo (...). Segundo o relatório da OMS os grandes

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laboratórios da indústria farmacêutica têm bloqueadoa produção maciça de vacinas...»

O travessão emprega-se para indicar, nos diálogos,a mudança de interlocutor; ou para isolar, numdeterminado contex to , pa lavras ou f rases ,correspondendo aqui, grosso modo, aos parênteses,aos quais deve ser preferido visto ser graficamentemenos agressivo. Também pode utilizar-se o travessãopara destacar, com grande ênfase, a parte final deum enunciado.

8. A pontuação

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Manual de Jornalismo

Notas:

1 . Segue-se aqui de perto o que sobre este tema dizemCelso Cunha e Lindley Cintra, 1993, Breve Gramática doPortuguês Contemporâneo, Ed. Sá da Costa, Lisboa, pp.429-434.2 . Araújo, Domingos Silva, 1988, Vamos falar de Jornalismo,Direcção-Geral da Comunicação Social, Lisboa, p. 66 e ss.3. Celso Cunha e Lindley Cintra, 1993, Breve Gramáticado Português Contemporâneo, Ed. Sá da Costa, Lisboa, p.434.

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IX. Convenções tipográficas

9.1 Caixa alta ou baixa?

Caixa alta e caixa baixa são as expressõesutilizadas em gíria para referir palavras grafadas,respectivamente, com maiúscula ou com minúsculainicial. Há razões históricas para o nascimento detais expressões. No tempo em que os jornais eramcompostos a chumbo os tipógrafos, quando compunhamas páginas, tinham junto de si caixas de madeiracontendo os caracteres necessários ao seu trabalho,sendo que as letras minúsculas, mais utilizadas, ficavamnuma prateleira inferior em relação às maiúsculas.Donde, a maiúscula de um caracter encontrava-sena caixa alta, e a respectiva minúscula na caixabaixa.

É da máxima importância a determinação daquiloque, num jornal, é caixa alta ou caixa baixa, nãosó por razões de uniformidade no estilo da publicação,mas também porque está associado ao uso da caixaalta uma forte conotação simbólica, e todo o leitor,ainda que inconscientemente, é sensível a essas marcas.

No Urbi et Orbi, grafam-se em caixa alta:

§ As palavras País, Nação, Hino, Governoe Presidente da República, quando tais palavrasse reportam a Portugal. Assim, escreve-se “oPres idente da Repúbl ica faz ho je umacomunicação ao País”; mas “Marrocos é umpaís em vias de desenvolvimento”.

§ A palavra Estado se tomado como figurade Direito Público: o Estado Russo; Portugal

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continua em litígio com o Estado Espanhol devidoao negócio do Totta.

§ Os nomes dos órgão de soberania:Pres idente da Repúbl ica , Assembleia daRepública, Governo, Conselho de Ministros,Tribunal da Relação de Coimbra, Provedoriada República; e ainda as instituições públicasque dependem de tais poderes, como Ministériodos Negócios Estrangeiros, Secretaria de Estadoda Cultura, Alta Autoridade para a ComunicaçãoSocial, Direcção Geral de Ensino, Comissãode Coordenação da Região Norte. Agora, muitoimportante , à excepção de Presidente daRepública, que é sempre grafado com maiúscula,o nome das instituições escreve-se com caixaalta, mas não a designação das pessoas queocupam tais cargos: Ministério da Igualdade,mas: a ministra da Igualdade; Secretaria de Estadoda Cultura, mas: secretário de Estado da Cultura,fulano de tal; Direcção-Geral da Educação, mas:o director-geral de Educação; o ministro AntónioCosta e o primeiro ministro António Guterres.

§ Os nomes dos partidos políticos ecoligações: Partido Social Democrata, PartidoSocialista, Os Verdes, Plataforma de Esquerda,Coligação Democrática Unitária.

§ Os nomes das ins t i tu ições daadministração local: Câmara Municipal daCovilhã, Junta de Freguesia de Massarelos,Assembleia Municipal de Penamacor.

§ Os nomes próprios: José, Maria, JoãoPaulo Mendes, Joaquim Fernandes...

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§ Os nomes das estações do ano, quandoutilizados em sentido próprio e não figurado,caso em que se utiliza caixa baixa. “Chegouo Inverno”, e “quatro risonhas primaveras”.

§ Os nomes das corporações policiais,militares ou outras: Polícia de Segurança Pública,Polícia Judiciária, Guarda Nacional Republicana,Guarda Fiscal, Exército, Armada, Marinha,Aviação...

§ Os nomes de empresas: ConfecçõesPaulo Oliveira, Malhas Ameal, Fábrica deChocolates Regina, Radiotelevisão Portuguesa.

§ Os nomes de países, bem assim comonomes geográficos: Beira Interior, Cova da Beira,Pirinéus, Riff, Ásia Menor, Sahara, Teneré.

§ Os nomes dos oceanos e dos continentes:Atlântico, Índico, Europa, América, África.

§ Os nomes de factos, e períodos históricose geológicos: Reforma, Restauração, I GuerraMundia l , Renasc imento , Idade Média ,Descobrimentos, Quatrocentos, Glaciário.

§ Os nomes de cursos superiores, médios,técnicos, profissionais ou outros, bem como asdisciplinas ou cadeiras de qualquer nível deensino. Assim, escreve-se: Licenciatura emCiências da Comunicação, Desenho Técnico,Técnico de Marketing; mas “aquele licenciado”,“fulano de tal, técnico de marketing”; e aindaFilosofia, Geometria Descritiva, Latim, Física...

9. Convenções tipográficas

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§ Escrevem-se com maiúscula os nomesde instituições de ensino: Instituto Politécnicoda Guarda, Universidade do Minho, Escola C+ S de Nave de Haver

§ Universidade e Politécnico escrevem-se com caixa alta quando designam, em geral,a instituição universitária. Como no exemplo:“‘A Universidade não pode continuar a sofrercortes orçamentais’ avisa o CRUP”; mas “Carladirigia-se à universidade para assistir às aulasda manhã quando o carro que conduzia perdeuos travões”.

§ Professor grafa-se com caixa alta paradesignar um doutorado, podendo ser abreviado— Prof. —, ou com caixa baixa para designarum professor do ensino primário, e neste últimocaso nunca há lugar a abreviatura.

§ Deus grafa-se com caixa alta quandose utiliza para designar o Altíssimo; grafando-se igualmente com caixa alta todas as expressõesque se lhe referem, como “então Sebastião viu-O a pousar numa leira”, ou “‘É d’Ele esta forçaque me anima’, conta o padre Inácio”.

§ Os nomes de cargos dentro da hierarquiada Igreja Católica (que é caixa alta quando designaa instituição, e baixa nas outras situações:“Excomungando-o, o Papa expulsou-o da Igreja”,mas “Ana ia à igreja confessar-se”), grafam-se com caixa baixa, excepto Papa, ou suasvariações, como Sumo Pontífice, e aindaMonsenhor. Mas padre, diácono, bispo, escrevem-se com minúscula.

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§ Santa Sé, Cúria Romana, Sínodo, Cabido,Nuncia tura , Cúr ia Diocesana , Tr ibunalEclesiástico, Sé, Diocese, Clero, e ainda os nomesdas ordens religiosas: Beneditinos, Dominicanos,Jesuítas, Cistercienses.

§ Maiúscula levam ainda os nomes doslíderes de outras religiões que não a católica,que possam, por analogia, comparar-se ao Papa:Dalai Lama, Xá,

§ Grafam-se com maiúscula os nomesde entidades religiosas como Pai, Filho, EspíritoSanto, Virgem, Alá, Paraíso, Inferno, Purgatório,Demónio, Diabo, Anjo, Graça, Mistér io ,Revelação.

§ Nomes mitológicos como Dionísio,Afrodite, Minotauro, Júpiter, Morfeu.

§ Cognomes ou apelidos, os quais deverãografar-se entre aspas, como: Pedro, “O Cru”;“Manitas de Plata” (nome de um músico espanhol);D. Dinis, “O Lavrador”; José “Foquinha” (alcunhade um delinquente).

§ Substantivos que pertencem a nomespróprios: Rio Douro, Igreja da Lapa, MuseuSoares dos Reis, Faculdade de Letras, Paláciode Belém, Convento de Mafra, Mosteiro daBatalha, Torre dos Clérigos.

§ Os nomes de ruas, praças, largos oulugares: Rua do Covêlo, Travessa Escura, Praçada República, Largo Marquês de Pombal, JardimPúblico, Lugar da Freixiosa.

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§ São igualmente caixa alta os nomesde festas públicas muito conhecidas, religiosasou profanas: Natal, Páscoa, Carnaval, Ano Novo,S. João, Hannukah

§ Designações para certos períodos detempo dos calendários religiosos: Advento,Quaresma, Ramadão.

§ Os nomes de obras literárias, obrasde arte e correntes: Memorial do Convento,Os Lusíadas, Os Ciprestes, O Grito, Vénus deMilo, Vitória de Samotrácia, Impressionismo,Romantismo, Simbolismo, Futurismo.

§ Os nomes de escolas ou correntesf i losóf icas : Tomismo, Marxismo,Existencialismo, Pragmatismo, Teoria Crítica.

§ As des ignações de prémios econdecorações: Grã-Cruz da Ordem de Cristo;Medalha de Bronze; Prémio Nobel da Literatura;Prémio Pessoa.

9.2. Numerais

§ Os números até dez escrevem-se por extenso,e a partir daí utilizam-se algarismos. Exceptuam-se as datas do calendário, as quais se escrevem semprecom algarismos, bem como os números que integremmoradas. Assim: sete anões, uma Branca de Neve,12 toneladas, 53 litros, 7 de Março, três milhõesde contos, 12 milhões de contos

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§ Empregam-se sempre algarismos para designara idade das pessoas, bem como as datas do calendário:6 anos, 54 anos, 23 de Agosto, 4 de Julho.

§ As temperaturas grafam-se igualmente comalgarismos, sendo que para designar grau, e sinal,não se utilizam os símbolos (+; -) mas escreve-se por extenso: estão 6 graus negativos na Serrada Estrela.

§ Cem escreve-se sempre por extenso: cem milescudos, cem anos...

§ Escreve-se por extenso: mil, milhar, milhares,milhão, milhões, bilião, biliões; sendo que não podemusar-se de forma composta: não se diz um milhãode milhões, mas sim um bilião.

§ Para nomear dinheiro utilizam-se como unidadesescudos, milhares de escudos e contos. Assim, diz-se um escudo e não cem centavos; dez escudos enão dez mil réis.

§ A numeração romana utiliza-se para designarséculos, monarcas e papas: Séc. XX, Séc. XII,Frederico I, Afonso IV, João Paulo II, Leão XXIII.

§ No caso de eventos, adoptam-se as designaçõesde origem, isto é, aquelas que forem empreguespelos organizadores: V Congresso de Saúde Mentalda Beira Interior; 3ªs Jornadas sobre Pragmatismo;2º Encontro das Ciências da Comunicação; III ColóquioSaber Mais.

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9.3 Horas

§ As horas, quando certas, grafam-se da seguinteforma: 22 horas, 9 horas; sendo preferíveis asexpressões meio-dia e meia-noite a 12 horas e 00ou 24 horas. Quando, além das horas, for necessárioindicar também os minutos, escrevem-se da seguinteforma: 22h30; 12h25; 13h42.

9.4 Abreviaturas

Por razões de clareza, o uso de abreviaturasserá reduzido ao mínimo indispensável. Aplicam-se apenas em casos excepcionais, quando sãosobejamente conhecidas, e o uso da expressãoequivalente por extenso perturbaria a fluência daleitura.

Podem abreviar -se de te rminados grausacadémicos, bem como títulos profissionais: Prof.(para um doutorado); arqº, engº — mas não méd.,ou jor. para referir um médico ou um jornalista,simplesmente porque não são de uso corrente.

Podem abreviar-se igualmente as designaçõesde pesos e medidas: kms, ha, kg, cm; mas não litros,metros e graus; e mesmo assim só quando tais expressõesaparecem associadas a um numeral: “Sortelha distado Sabugal uns 50 kms”; mas não “as plantaçõesde tabaco estendem-se por kms a perder de vista”.

Século pode ser abreviado quando seguido denumeral romano: “séc. XV”.

Sr. e Srª, Exª, Exmº, Exmª podem ser abreviados,embora o seu uso só se registe em citações.

As designações de diplomas legais, quandoseguidas dos elementos que permitem identificá-los como tal: “DL 189/99”, mas não: “o regime

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de transmissão de propriedade horizontal passa areger-se por um novo DL”. “O artº 4 da Lei deBases do Ensino Superior”, mas não “e trata-se deum artº especialmente polémico”.

Número pode abreviar-se, por exemplo, nasmoradas, quando seguidos de um numeral: “Rua daGraça, nº3”, ou “Jardel, envergando a camisola nº11”; mas não “as cheias em Moçambique provocaramum nº indeterminado de mortos”

Fora estes casos, ou na dúvida, o bom sensorecomenda que se prescindam das abreviaturas.

9.5 Aspas

As aspas servem para, num texto, introduzirem discurso directo as informações prestadas poruma fonte, e são portanto utilizadas em todos osgéneros — notícia, reportagem... — excepto naentrevista de pergunta-resposta, onde o discurso doentrevistado já está sobejamente identificado comodiscurso directo proveniente de determinada fonte.

§ Quando se utilizam aspas a seguir adois pontos, a citação deve iniciar-se em caixaalta, como no exemplo: Descontente, AntónioSoares acusa: “A companhia de seguros estáa fugir às suas responsabilidades”.

§ Se as aspas são utilizadas no meiode uma frase, a citação segue-se em caixa baixa,como no exemplo: Agora, diz António Soares,“é tempo de trabalhar para reconstruir as casaslevadas pelas cheias”.

§ Nunca se utilizam aspas para grafar

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palavras estrangeiras; quando estas tiverem deser utilizadas, colocam-se em itálico: overdosee não “overdose”.

§ Também não se utilizam aspas paraassinalar que determinada palavra é empreguenão em sentido próprio mas figurado, nem paraassinalar ironia. Quando o sentido que a palavratoma no texto não for claramente perceptívelsem as aspas, então é porque essa opção nãoé a correcta e deve escolher-se outra palavra.Precisão e rigor são fundamentais na linguagemjornalística.

§ Ao introduzir uma citação no decursode uma frase, é preciso atender à forma de “partir”o texto citado — este deve funcionar, em relaçãoà frase, como uma unidade lógica autónoma.Assim, pode escrever-se: Joaquim Fernandesacredita que “o estacionamento planeado parao novo mercado é claramente insuficiente”; masnão: Joaquim Fernandes acredi ta “que oestacionamento planeado para o novo mercadoé claramente insuficiente”.

9.6 Siglas

Para as siglas utiliza-se a designaçãoportuguesa: Sida e não Aids; ONU (Organizaçãodas Nações Unidas) e não UN (United Nations).

Ao grafá-las, as siglas não se separam porpontos: UBI, e não U.B.I.; PSP e não P.S.P.

Ao introduzir uma sigla, se esta não for dodomínio público – e domínio público quer dizermesmo muito conhecida (TAP, RTP, Sida) — nomeia-

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se primeiro por extenso, escrevendo a sigla a seguirentre parênteses; e a partir daí poderá passar a usar-se a sigla sem mais precisões.

É preciso atender, também, que a capacidadede memorização dos leitores é limitada, de formaque não se deve abusar das siglas, construindoparágrafos perfeitamente herméticos que mesmo umprofissional treinado teria dificuldade em apreender.Acima de tudo, o leitor quer ser informado comrapidez e eficiência, não dedicar-se à decifraçãode enigmas. Como no seguinte — e muito exagerado— exemplo, em que o segundo parágrafo é praticamenteininteligível:

“De acordo com a Comissão de Trabalhadores(CT) a Associação dos Profissionais de TurismoHotelaria e Similares (APTHS) não se esforçou osuficiente para chegar a um acordo com o Conselhode Administração (CA) pelo que vai ser necessáriaa intervenção do Ministério das Obras Públicas,Transportes e Comunicações (MOPTC) no sentidode regularizar a situação, tendo já sido apresentadaqueixa à Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Segundo a OIT o CA não responde às aspiraçõesdo CT por culpa do MOPTC, que falhou as negociaçõescom a APHTS...”

9.7 Topónimos estrangeiros

No caso dos topónimos, bem como de outrosvocábulos estrangeiros que já integrem a língua,devem usar-se preferencialmente as formas maisaproximadas do português, ou o seu aportuguesamento.Mas sem fundamentalismos, nem exageros. É ridículoescrever Oxónia por Oxford, ou em linha por on

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line; mas futebol, e não football. É evidente quea lista de topónimos mais comuns que se apresentaé puramente convencional, mas é precisamente poressa razão que deve ser respeitada — ela garantea coerência do produto final. Eis alguns topónimosestrangeiros, e a forma como deverão ser utilizados:

AAbijã Amazonas ÁrcticoAbissínia Amazónia ÁrcticaAcapulco Ambrizete ArdenasAdis Abeba Ambundo ArgelAdriático América ArgéliaAfeganistão Amsterdão ArgentinaAgadir Anatólia ArizonaAgrigento Ancara ArméniaAix-la-Chapelle Andaluz ÁsiaAlabama Andaluzia Ásia MenorAlbacete Andes AssíriaAlbânia Andorra AssuãAlberta Angola AstúriasÁlbion Antárctico AtenasAlemanha Ocidental Antárctida AtlasAlemanha Oriental Antilhas AustralásiaAlexandria Antioquia AustráliaAlicante Antuérpia AustrásiaAlgeciras Apalaches ÁustriaAlmendra Apeninos ÁvilaAlmeria Aquitânia AvinhãoAlpes Arábia AzerbaijãoAlsácia Arábia SauditaAlto Volta AragãoAmã Arkansas

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BBaamas Benim BornesBabilónia Beócia BornéuBaçorá Berberia BósforoBacu Berlenga BósniaBadajoz Berlengas BostonBaden Berlim BotãoBaden-Baden Bermudas BotswanaBagdad Berna BrabanteBaía Besançon Brandeburgo BaionaBetânia BrasilBalcãs Bétis BrasíliaBaleares Betlém BratislavaBálticoBiafra BrazavileBaltimore Biarritz BretanhaBamaco Bié BrístolBangladeche Bielorrússia BrugesBanguecoque Bijagós BruxelasBarbados Bilbau BucaresteBarcelona Birmânia BudapesteBasileia Biscaia Buenos AiresBatávia Bissau BúfaloBatemberga Bizâncio BulgáriaBavária Bogotá BurgesBaviera Bolívia BurgosBeirute Bolonha BuritiBelfastBombaim Burkina Faso BélgicaBona BurundiBelgrado Bordéus ButãoBenguela Borgonha Burma

CCabinda Carolina do Sul ConacriCabora Bassa Cárpatos CongoCabo Verde Cartagena Copacabana

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Cabul Cartago CopenhagaCáceres Casaquistão CorcovadoCádis Cáspio CórdovaCafarnaum Cássia CoreiaCaiena Castela Coreia do NorteCairo Castela-a-Nova Coreia do SulCalábria Castela-a-Velha CorfuCalatrava Catalunha CorintoCalcutá Catânia CornualhaCalecut Catmandu CórsegaCaledónia Cáucaso Costa do MarfimCalifórnia Cazaquistão Costa do OuroCamarões Ceará Costa RicaCamberra Ceilão CracóviaCamboja Cesareia CretaCampinas Checa CrimeiaCampos Elíseos Checoslováquia CroáciaCanaã Cherburgo Croácia-EslovéniaCanadá Chicago CuambaCananeia Chile CuandoCanárias China Cuando-CubangoCanaveral Chipre CuangoCandelária Cidade do Cabo Cuanza do NorteCantuária Cidade do Vaticano Cuanza do SulCapadócia Cidade Rodrigo CubaCápri Cleveland CubangoCápua Coblença CuítoCaracas Cochim CuneneCarachi Cochinchina CuraçauCaraíbas Colômbia CurdistãoCarcassona Colorado CuritibaCarolina Colúmbia Carolina do NorteCompostela

DDabul Damasco Dniepre

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Dacar Danúbio DniestreDácia Danzigue DominicanaDacota do Norte Delfos DresdenDacota do Sul Deli DublimDalas Díli DusseldórfiaDalmácia Dinamarca EEdelberga Escandinávia EstocolmoEdimburgo Escócia EstóniaÉfeso Eslávia EstrasburgoEgeu Eslavónia EstugardaEgipto Eslováquia EtiópiaElba Eslovénia EubeiaElêusis Esmirna EufratesÉlida Espanha EveresteEmirados A.U. Esparta Ext.OrienteEólia ÉssenEquador ÉssexEritreia Estados UnidosEritreu Estalinegrado

FFederação Russa Finlândia FrancoforteFenícia Flandres FrancóniaFez Florença FreibergaFidji Florianópolis FriburgoFiladélfia Flórida FrísiaFinisterra Formosa

GGabão Geórgia GréciaGalápagos Germânia GrenobleGales Gibraltar GronelândiaGália Glasgow GuadalaxaraGalileia Goa Guadalquivir

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Galiza Gólgota GuadalupeGâmbia Gomorra GuernicaGana Gotemburgo GuianaGanges Gotinga Guiné-BissauGarona Grã-Bretanha Guiné-ConacriGasconha Granada Guiné EquatorialGaza G. Deserto de Areia GuipúscuaGenebra G. Deserto Vitória GuruéGénova Grão-Pará Guzarate

HHabsburgo Havana HiroximaHaia Havre HolandaHaifa Heidelberga HondurasHaiti Hélade HonoluluHalicarnasso Helesponto HorneHamburgo Hélicon HuamboHanói Helsínquia HudsonHanôver Helvécia HuelvaHarlém Herzegovina HuescaHavai Himalaias Hungria

IIbéria Inhambane Irlanda do NorteIémen Insbruque IrumIémen do Sul Ínsua IslamabadIlinóis Ipanema IslândiaÍndia Ío IsraelIndiana Iorque IstambulIndianápolis Ipiranga ÍtacaÍndico Ipres ItajibaIndochina Irão ItacoatiaraIndonésia Iraque ItamaracáIndostão Irlanda Iucatão

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JJacarta Jericó JordâniaJafa Jérsia JordãoJamaica Jerusalém JugosláviaJapão Joanesburgo JutlândiaJava Jónia

LLacedemónia Líbano LovainaLa Paz Libéria LuandaLapónia Líbia LubangoLas Vegas Ligúria LubequeLatrão Lituânia LugoLaos Liverpool LuisianaLausana Livorno LundaLeninegrado Lobito Lunda NorteLérida Logronho Lunda SulLesbos Lombardia LurdesLesoto Lomé LusacaLetónia Londres LusamboLevante Lorena LuxemburgoLião Lourenço Marques Luxor

MMacau Mântua MiletoMacedónia Maputo MindanauMadagáscar Mar da Palha MinesotaMadrid Mar Morto MiróbrigaMagdeburgo Mar Vermelho MississípiMagna Grécia Marburgo MissouriMagrebe Marquesas MitileneMaine Marraquexe MoçambiqueMaiorca Marrocos MoçâmedesMalabar Marselha MogadíscioMalaca Martinica MoldáviaMálaga Mauritânia Molucas

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Malange Meca MónacoMalásia Medelim MongóliaMalawi Médio Oriente MonrealMaldivas Mégara MonróviaMali Melanésia MontanaMalvinas Melbourne Montanhas RochosasManágua Melilha Monte CarloManaus Mênfis MontenegroManchester Mérida MontevideuMancha Mesopotâmia MoráviaManchúria Messina MoscóviaMandimba México MoscovoManila Micenas MuniqueMansabá MichiganMansoa Milão

NNagasáqui Nicarágua Nova GoaNairobi Nice Nova GuinéNamibe Nicósia Nova HolandaNamíbia Níger Nova Inglaterra

Nampula Nigéria Nova IorqueNantes Nilo Nova JérsiaNápoles Norfolque Nova LimaNassau Normandia Nova LisboaNatal Nortúmbria Nova OrleãesNavarra Noruega Nova SibériaNavas Tolosa Nova Amsterdão Nova ZelândiaN’Dalatando Nova Bretanha Novo HorizonteN’Djamena Nova Caledónia Novo HamburgoNebrasca Nova Deli Novo MéxicoNeerlândia Nova Escócia NúbiaNepal Nova Friburgo NurembergaNiágara N. Gales do Sul

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OOceania Orão OsacaOclaoma Oregão OsloOhio Orense OtavaOmã Oriola OviedoOntário Orleães OxfordOrange Ormuz

PPádua Paros PlacênciaPaíses Baixos Patagónia PlasençaPalença Peloponeso PolinésiaPalermo Pensilvânia PolónoaPalestina Pequim Pólo NortePamplona Pérgamo Pólo SulPanamá Perpinhão PompeiaPapua Pérsia PontevedraPapuásia Perú PragaPaquistão Perúsia PretóriaPará Petersburgo ProvençaParaguai Petrogado Próximo OrienteParaíba Piemonte PrússiaParis Pirenéus PunjabeParnaso Pisa

QQuala Lumpur Quiefe QuissangaQuebeque Quilimanjaro QuitoQuelimane QuinxasaQuénia Quioto

RRabat Rodes RossilhãoRagusa Roma RoterdãoRangum România RovumaReino Unido Romélia Ruanda

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Reiquiavique Roménia RússiaRiga Rondónia

SSabá Saragoça SídneiSabóia Sardenha SilésiaSaigão Saxónia SinaiSalamanca Segóvia SingapuraSalamina Seicheles SiracusaSalamonde Sena SíriaSalerno Senegal SófiaSalisburgo Serajevo SomáliaSalisbúria Serra Leoa SorbonneSalonica Sérvia Sri LancaSamotrácia Seúl SuazilândiaSampetersburgo Sevilha SudãoSantander Sevres SiéciaS. de Compostela Sião SuezSantiago de Cuba Sibéria SuíçaSantiago do Chile Sicília Suriname

TTadziquistão Tessália ToscanaTailândia Tessalonica TrafalgarTaipa Tete TráciaTaipé Tetuão TransilvâniaTamisa Texas TransvalTanganhica Tibete TrentoTânger Tibre TriesteTanzânia Timor Loro Sae Trópico de CâncerTarento Tirana T. de CapricórnioTarragona Tiro TubingaTarso Tirol TulheriasTartária Tobago TunesTartesso Togo Tunísia

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Tasmânia Toledo TurimTebas Tolosa TuríngiaTeerão Tombuctu TurquelTelavive Tóquio TurquestãoTenerife Tordesilhas TurquiaTenessee Toronto

UUcrânia Úlster UralesUganda Úmbria UruguaiUíje Upsália UzbequistãoUl Ur UtáUlisseia Ural Utreque

VValhadolid Vestefália VoltaVancôver Viena VosgosVarsóvia Vietname VratisláviaVerona Vladivostoque VurtembergaVersalhes Volga

XXangai Xantum Xetlândia

ZZagrebe Zambézia ZelândiaZaire Zâmbia ZimbabuéZambeze Zanzibar Zurique

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X. O jornal digital.Fazer jornalismo para o novo medium

“Agradecemos à imprensa o trabalho desenvolvidoao longo destes últimos 200 anos. Agora adeus.”,é o texto-choque do spot publicitário do EstrellaDigital, o primeiro jornal em suporte exclusivamentedigital a surgir em Espanha. Será mesmo adeus?Alguns entusiastas, apoiados pelos resultados de certosestudos, parecem pensar que sim. A questão estálonge de ser linear, e os resultados dos estudos quesobre esta matéria têm vindo a lume demasiadocontraditórios para permitirem conclusões definitivas.“Newspapers said Monday that reports of their deathby internet were greatly exagerated”, noticiava pelamesma altura a Reuters.

Assim, a par de trabalhos, sobretudo nos EstadosUnidos , que avançam números preocupantesrelativamente à perda, e seu previsível aumento, deleitores dos jornais tradicionais, em favor dos digitais,outros afirmam, pasme-se, precisamente o contrário.

Duas coisas parecem certas: a indústria podemudar muito, de formas imprevisíveis, mas não vaidesaparecer. Para começar, quem marca neste momentopresença nas redes, com jornais, são precisamenteas empresas tradicionais, que trataram já, e bematempadamente, de reservar um lugar ao sol nummercado cujo potencial de crescimento é enorme,que já é impossível ignorar, mas cujas formas deevolução concreta não podem ainda prever-se.

Em vez de futorologizar, a sensatez recomendaque se atente na história, que esta sim tem dadosbem concretos para oferecer. Sempre que surge um

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novo medium os habituais profetas da desgraçaprofetizam quantos dos antigos media estão condenados— e no entanto, a história prova que, depois deuma breve fase de predação de públicos, estes tendema estabilizar. O livro, um dos mais antigos meiosde comunicação de massas aí está de boa saúdeprecisamente para prová-lo - sobreviveu aos jornais,à rádio, à televisão, às redes, e, esta bem real epredatória, à ameaça das fotocopiadoras.

A situação assemelha-se muito às eufóricasprevisões da década de 80, que garantiam que ofuturo estava no asséptico paperless office. Naverdade o que se verificou foi precisamente o contrário— os computadores trouxeram uma maior dependênciado papel, e os escritórios passaram a produzi-lo emquantidades muito mais significativas que nopassado.

Menos papel como se esperava? Não. Mais, masdiferente. Um estudo de finais de 1999 realizadopelo Boston Consulting Group1 revela que, nospróximos cinco anos, os hábitos de consumo de papelvão continuar a mudar. O e-mail poderá provocarum decréscimo no consumo de envelopes da ordemdo milhão de toneladas; esperando-se ainda descidasnos impressos, formulários, fine papers, papéis dequalidade mais requintada, e nos trabalhos de tipografia.Em contrapartida, até 2003, o consumo de papelde escritório — utilizado nos prints domésticos —deverá duplicar. Globalmente a produção e consumode papel continuará a crescer.

Em sentido semelhante, em relação aos jornaisdigitais, apontam outros trabalhos. Um estudoencomendado pela Newspaper Association of America(NAA), entidade que representa mais de dois miljornais dos Estados Unidos e Canadá concluiu que82 por cento de online readers liam a edição impressa

10. O jornal digitalFazer jornalismo para o novo medium

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do seu jornal, tantas vezes, ou ainda mais vezes,do que antes de estarem online2 . Cinquenta e umpor cento dos consumidores de notícias haviam, nosúltimos seis meses, acedido a jornais online. Boasnotícias para a indústria, especialmente porque entreas conclusões da NAA se confirma que a confiançano produto e o valor que lhe é dado continua intimamenteligado à reputação e ao brand name do jornal, umcapital de valor inestimável que não é destruído pelosimples aparecimento de uma nova tecnologia.

Atenta, a indústria esforça-se agora por explorarsinergias e complementaridades entre os dois media,e não perder a dianteira nas novas áreas de negócioentretanto surgidas. John Sturme, presidente da NAA,comenta o estudo, garantindo que “the internet isone of the few media to come along that providea perfect partnership for traditional newspapers. It’sa natural extension of our business, giving newspapersthe space, immediacy and expanded audience thatflow so nicely from the printed product. This studydemonstrates not only the success newspapers havehad in leveraging the internet, but also the tremendouspotential that online represents”3 .

Simbiose, e exploração das complementaridadese potenciais pode muito bem ser o futuro. Nada indicaque os jornais na versão ink-stained venham adesaparecer. Poderão transformar-se, adaptando-se— e isso muitas vezes implica custos materiais ehumanos, mutações e sobrevivência dos mais aptos— mas permanecerão também nesse formato. E osdigitais — que presentemente marcam sobretudo lugar,mas deverão nos próximos anos entrar em fase derendibilidade, nomeadamente através dos classificados,publicidade, e oferta de serviços pagos — conquistarãoo seu lugar ao sol.

São muitas as vantagens de um jornal impresso.

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Em primeiro lugar, não se pode falar de dumping,mas a verdade é que o custo da maioria — entreos 100 e os 400 escudos — não oferece grandeslucros em relação ao papel e a tinta oferecidos aoconsumidor. Portanto, tal como os digitais, é umproduto que não incorpora o real custo de produção.A consequência é que fazer home printing da totalidade,ou mesmo só metade de um jornal digital, sai muitíssimomais caro do que comprar a versão impressa.

Esta, por seu turno, é mais facilmente transportávele manuseável; leva-se para a praia, o café, o autocarro,o emprego. O jornal de papel continua a ser — pormuito que a velocidade dos processadores e a largurade banda das redes se velocize, de consulta maisrápida que um jornal digital. A leitura em frentea um monitor é também mais difícil, e susceptívelde produzir cansaço visual.

Intervém ainda para o sucesso dos jornais depapel razões de ordem afectiva e sentimental. O papelcheira bem. O papel suja as mãos. O papel servepara embrulhar sardinhas e castanhas. Pode ser lidoao pequeno almoço, num jardim, na praia ou numsofá em desalinho. Folheado, sublinhado, recortado,emprestado e relido.

Os digitais também têm os seus argumentos, eum potencial enorme em matéria de novidades. Sãointeractivos, permitindo reagir imediatamente àsnotícias publicadas, ou contactar directamente, pore-mail, a maioria dos autores dos textos. As peçaspodem, por hiperlinks, remeter directamente paraartigos relacionados, arquivo, ou background dosdados fornecidos. Possibilitam a realização deinquéritos on-line — que, não tendo valor propriamentecientífico, são todavia um meio de tomar o pulsoaos leitores da publicação. Podem organizar debates,dossiers, temas de discussão sustentados por mailing-

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lists e canais de IRC. Alguns possuem arquivos online,e mesmo motores de busca capazes de aceder a todoo espólio digital. O webcasting permite a selecçãoe entrega personalizada de notícias. A busca de emprego,casa ou carro nos classificados pode ser aceleradaatravés de motores de pesquisa. Além disso, apublicidade pode ser inserida de forma a que nãopossa ser ignorada pelos utilizadores, ao contráriodo que sucede por exemplo na televisão, que, maugrado o dot, ainda não sabe muito bem como lidarcom o homo zappiens. Impressão e distribuição,actividades caras e morosas, são, nas publicaçõesdigitais, coisa do passado.

Tudo isto já está em curso, e nalguns jornaistodos estes meios disponíveis simultaneamente. Masmuito mais se adivinha. Não são destituídas defundamento as visões que antecipam a fusão do telefone,hi-fi, vídeo, televisão e computador pessoal num únicoelectrodoméstico. E os jornais digitais serão osprimeiros, ainda antes do nascimento do novo hardware,a antecipar esta convergência, nomeadamente atravésdos privilégios concedidos à imagem, do aumentoda interactividade, da introdução de vídeo e áudioclips, e da possibilidade de transmissão de vídeoem tempo real.

E o fundamental é que, mesmo com a aquisiçãode meios multimédia, e com a convergência de recursosque antes pertenciam exclusivamente a outros media,as publicações digitais não deixarão de ser jornais.

Sturm tem mesmo razão: a internet, em relaçãoaos jornais, é o medium da perfeita complementaridade.Porquê? A passagem das rádios e das televisões àinternet, à parte a globalização, não traz nada denovo — continuam a apresentar-se tal e qual comoantes, e a imediatidade que a net possibilita aosjornais é um recurso de que estes media já antes

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gozavam. Não há nenhuma diferença entre uma emissãode rádio tradicional, e uma transmitida pela internet,e quando a houver — um produto não exclusivamentesonoro, por exemplo — deixaremos de estar peranteuma rádio.

O caso dos jornais é radicalmente diferente. Aestes, a internet permite a incorporação (pilhagem)de todos os recursos antes exclusivos das rádios etelevisões — pela inclusão de som e imagem emmovimento — sem com isso perderem a sua identidade,isto é, deixarem de ser jornais. A net acrescentaaos jornais acidentes novos e cheios de potencial,sem contudo tocar a sua essência: a de um interfaceque não prescinde do texto para apresentação domaterial noticioso que tem para oferecer. E vão levantar-se preementes questões de identidade e definiçãono futuro. O site da CNN é uma televisão? Dificilmente.É um site, mas que se assemelha muito mais a umjornal que a qualquer outra coisa.

E se pretendem ser os jornais a explorar asvirtualidades da complementaridade, será nestesque, em primeiro lugar, se produzirão mutações emtermos de produto. É previsível que as formas deapresentação, e mesmo a escrita, venham a sofreralterações significativas. Como se escreve uma notíciaque está acompanhada por um clip áudio, ou vídeo?A complementaridade é certamente diversa da queos textos gozavam junto da fotografia. Em termoscognitivos, qual a lógica e ordem de apreensão donovo produto? Que alterações vai sofrer a escritajornalística? Que protocolos de apresentação surgirãoentretanto?

Os jornais digitais de informação geral começarampor ser transposições dos textos e imagens da versãoimpressa para a internet. Rapidamente, porém, trataramde enriquecer-se com outros serviços: subscrições

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online, inquéritos, arquivos de edições passadas, correiodos leitores. Não é inocente que hoje, o grosso dascartas dos leitores publicadas na versão ink-stainedde um diário de grande tiragem como o Público —verificando-se expressões mais modestas disso tambémnos jornais regionais — sejam recebidas por e-mail.O sistema é rápido, barato, extremamente fiável, eestá acessível a um número cada vez maior de leitores.

Com o surg imento de jo rna is d iá r iosexclusivamente digitais, de que são exemplos o Estrellae o Diário Digital, já não há um modelo prévioque, até por razões de economia, possa ser transpostoipsis verbis para o seu mais modesto sósia na internet.Os jornalistas de tais órgãos de comunicação escrevemexclusivamente para a sua publicação digital, e poderãorapidamente encontrar formas de o fazer melhor doque a comum apresentação dos jornais tradicionais.A verdade é que se poderão vir a fazê-lo, aindanão o fizeram: tais publicações não representam parajá inovações de monta, nem modelos de rupturacom as formas tradicionais de fazer jornalismo, quecontinuam como matriz do material produzido. Oque não significa que o novo medium, a internet,não esteja a ter profundo impacto no trabalho diáriodos jornalistas.

10.1. A net e a profissão de jornalista

Se ainda não existe propriamente uma escritadigital, também é certo que o novo medium járevolucionou a forma como os jornalistas trabalham,e hoje não é mais possível a nenhum profissionalignorá-lo.

Em primeiro lugar a internet constitui-se comofonte privilegiada de consulta para o background

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dos mais variados temas. Hoje a informação éverdadeiramente global, e as limitações que se prendiamcom meios periféricos e aspectos de distribuição,inexistentes — é possível aceder ao site da CNN,mas também a jornais da remota cidade da Guarda,ou do Nordeste brasileiro. O uso maioritário do inglês,e os programas de tradução, como o babelfish, umdos primeiros a surgir, ajudam a tornear as dificuldadesda língua.

A notícia, atributo divino, tornou-se ubíqua —está em toda a parte, instantaneamente. E a reportagemvive também com mais preemência o preço dessainstantaneidade: é preciso noticiar sobretudo depressa,e eventualmente, se possível, bem. Interessa cadavez mais a velocidade com que os conteúdos sãodisponibilizados. Os antigos manuais de jornalismoensinavam aos estudantes a máxima de que “nadaé tão velho como jornal do dia anterior”. Agorajá não é precisamente assim — podemos muito bemestar a falar da novidade de há poucas horas atrás.

Este desmultiplicar vertiginoso de meios temsido fascinante para os jornalistas, mas não está isentode perigos. Por um lado, hoje é possível a um únicoindivíduo, armado de um computador e de um modeme recorrendo ao clássico, mas agora digital, cortae cola, produzir um jornal inteiramente sozinho edistribui-lo para todo o mundo. Dadas as característicasda rede, não há praticamente meios para detectarum plagiador e apontá-lo4 . Sobretudo se dominarlínguas e proceder a traduções da sua lavra.

E isto levanta questões assustadoras, como ada autenticidade dos conteúdos e, princípio sagradodo jornalismo ocidental, verificação de dados econfirmação da fidedignidade das fontes. A par dademocratização dos conteúdos e do livre acesso amuitas fontes, as notícias podem, por esta via, estar

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mais permeáveis a manipulações ou erros.O open source, que teve o seu parto com o

aparecimento do sistema operativo Linux, desenvolvidonas suas grandes linhas mestras por um criador, edepois aberto à comunidade para aperfeiçoamento,finalização, bug fixing e criação de software específico,rapidamente fez a sua entrada triunfante em sitesde áreas muito distintas: da fabricação de dicionários,a sites de tremendo sucesso como o slashdot.org,que se dedica à classificação valorativa e divulgaçãode sites na internet, e ao posting de notícias relacionadascom as novas tecnologias. Há voluntários para trabalhargratuitamente no negócio dos outros, pode perguntar-se? Numa comunidade com mais de 275 milhõesde utilizadores em todo o mundo, dos quais 136se encontram na América do Norte5 , para o slashdoto drama tem sido seleccioná-los e geri-los.

A questão que muitos hoje colocam, e porqueo mundo inteiro parece estar sedento dos seus cincosegundos (já não minutos) de fama — também souimportante: alguém que me escute, por favor — ése o open source poderá entrar também no newsbusiness,e em tal caso que efeitos teria.

Se as notícias não vierem a transformar-se numaespécie de talk show do bizarro, misto de factoscom ficção, rumores com revelações, mitos comincontinência verbal, de onde se poderão, no limite,extrair apenas meta-dados de interesse puramentesociológico, então o open source não pode fazercarreira no universo das notícias.

Um jornal digital de informação geral — sobrefactos reais ocorridos no mundo, testemunhados,comprovados ou averiguados por quem os narra —em formato de open source nunca pode ser maisdo que uma banca de rumores e boatos, por muitase excelentes razões.

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Em primeiro lugar, torna-se obviamente impossívelverificar a credibilidade das fontes. O site é vulnerávela todo o tipo de ataques: do mitómano, ao impostor,passando pelo mentiroso compulsivo, até aosprofissionais de imagem e de marketing no legítimocumprimento das suas funções. Fazer notícias exigetambém alguma preparação, intelectual, deontológica,e prática — e presumir possuir tais virtudes nãoé o mesmo que ser capaz de efectivamente as exercer.

Além de tudo isto fazer notícias implica presenciaracontecimentos, o que é sempre dispendioso em termosde logística e requer, as mais das vezes, uma organizaçãoburocrática de rectaguarda algo rígida. E já que sefala em burocracia, aceder às fontes também é umprocesso que conhece a lgumas , inc lu indo aindispensável credenciação dos jornalistas, e aidentificação, sem margem para dúvidas, dos órgãosonde exercem a sua actividade.

Exceptuando restritas áreas tecnológicas,recensões, crítica de arte, software, ou cinema —aquelas precisamente onde nenhuma destas condiçõesé absolutamente necessária — e onde parecem estara resultar alguns projectos de open source, o formatonão se afigura adequado à transmissão de hard news.O jornalismo, como bem se depreende da primeiraà última página deste manual, é um artesanato. Omaior capital de um jornal, e o único do jornalista,é o seu brand name, uma reputação profissionalimpoluta, a credibilidade junto dos leitores e a confiançaconquistada ao longo dos anos. Não basta entusiasmoe vontade de protagonismo. Fontes anónimas,jornalistas de ocasião, nada disto têm para oferecer.

É humorístico o subtítulo do cabeçalho do Slashdot— News for Nerds, mas também muito apropriado.É que o site funciona da seguinte forma. Depoisdos postings das notícias, os leitores comentam-nas,

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complementam-nas e precisam-nas.À partida, pensar-se-ia que esta é uma forma

democraticamente inovadora de controlar a veracidadee fidedignidade dos relatos. Só que os resultadosdesmentem-no. Raras são as notícias que não geraramperto da centena de comentários, os quais em casosmais raros podem chegar às três centenas. Congestão,info-glut? Dada a enormidade do acontecimento, taisexpressões nem se aplicam. Estamos perante umaespécie de Fátima Lopes, realizado no Estádio deAlvalade com lotação completa, e onde todos, incluindoo apresentador, são os convidados. Todos falam, masninguém pode ouvi-los.

Mesmo que fosse possível ler uma notícia, eos 300 comentários que a precedem, no final damaratona o que poderia um leitor concluir de tantas,tão díspares e contraditórias informações senão umsocrático só sei que nada sei?

Estes números também atestam, evidentemente,o indesmentível sucesso do slashdot. O News forNerds não está condenado. Pelo contrário, representaum mercado em crescimento. Só que procurar obterinformação geral, do tipo da que oferecem os jornais,numa página com tal formato é absolutamenteimpossível. A imagem que um site deste tipo evocaé a de um imenso buraco negro — uma zona ondea densidade da matéria é tão elevada que dela nadapode escapar, nem a luz.

Problemas semelhantes coloca a questão dasrelações entre bases de dados e jornalismo. São demeados da década de 90 as primeiras previsões deque a disponibilização de conteúdos na internet iriatornar obsoleta a profissão de jornalista. Hojecomplementam-nas asserções de que as bases de dados,pelas possibilidades de pesquisa e cruzamento deinformações de acordo com infinitas variáveis, que

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serão as que melhor servem os interesses do pesquisador,acabarão por ter o mesmo efeito.

O que se defende aqui é que todas estas formasde acessar informação fazem sent ido, e vãonaturalmente coexistir. Mas não ameaçam nem osjornalistas, nem as suas publicações. Os jornalistas,como profissionais altamente treinados, serão é osseus primeiros e mais directos beneficiários. Agoraas antevisões de que as novas formas canibalizamas antigas esquecem que o jornalismo é antes demais actualidade, e complementarmente descoberta.Face aos campos de pesquisa em branco de umabase de dados, se não se souber clara e precisamenteo que pesquisar, o exercício redundará em purafrustração. Depois, há muitos assuntos dos quaissó se toma conhecimento porque um jornal osseleccionou e conseguiu apresentá-los de uma formasuficientemente atractiva para captar a atenção dosleitores. Isto, é descoberta, e também a essênciada informação: trazer novidades de interesse gerala um público vasto. Um motor de busca ou umabase de dados não podem substituir este serviçoinestimável que um jornal presta aos seus leitores.Podem, e muito bem, complementá-lo. E continuarãoa fazê-lo cada vez mais no futuro. Mas tão só.

10.2. Urbi digital

Encont rando-se aber to a um cer toexperimentalismo, dadas as suas características dejornal universitário, e não comercial, o Urbi et Orbiadoptará, enquanto sedimenta rotinas, procedimentose conteúdos, uma postura que não é de ruptura faceà forma tradicional de fazer jornalismo.

Como instrumento ao serviço da vasta comunidade

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académica que a UBI é, procurará informar correcta,fidedigna e imparcialmente os seus leitores àcercade todos os assuntos de interesse para a universidade.

Como laboratório para os alunos do curso deCiências da Comunicação que optaram por jornalismo,procurará que pratiquem, ainda que com limitações,o tipo de trabalho que desempenharão mais tardecomo estagiários e profissionais de comunicação social.

Mas também tem a pretensão de atender àespecificidade do meio em que é produzido, e aquiinves te preferenc ia lmente no potenc ia l deinstantaneidade; no privilegiar da imagem; nos textoscurtos; no entabulamento de diálogo com outras fontes,através de hiperlinks; e no desdobramento de páginaspor forma a obviar aos incómodos da leitura facea um monitor.

Assim, ao contemplar a instantaneidade, permitee encoraja alterações aos temas tratados na ediçãodo jornal, sempre que os novos desenvolvimentosda notícia se verifiquem depois da saída de um númeroe antes da publicação dopróximo.

Tais alterações devem todavia assumir a formade uma nova e distinta notícia, que coexiste coma editada na publicação original, e ainda serinequivocamente assinaladas, de forma a que o leitorcompreenda quando foram fe i tas e porquê .

Introdução de desenvolvimentos sob a forma denotícias de última hora é um mecanismo que nãoexiste num jornal tradicional em papel. O mais próximoque estes chegam é, em casos raros — a Guerrado Golfo, por exemplo — à tiragem de edições especiais;mas banal em televisão, com a interrupção de emissõespara especiais de informação sempre que o peso deuma notícia o justifica.

As notícias de última hora no Urbi et Orbi equivalemassim, grosso modo, aos especiais das televisões,

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e deverão ser realizadas tendo em conta os mesmoscritérios editoriais: sempre, mas também apenas esó , quando a impor tância da not íc ia e dosdesenvolvimentos ulteriores o justificarem. Deverãoalém disso ser reeditadas na edição subsequente dojornal, já que alguns leitores, que concluiram a leiturada publicação antes da introdução das novidades,podem não se ter apercebido do seu aparecimento.

Sempre que os meios técnicos o permitirem, oUrbi et Orbi privilegiará a imagem e a fotolegenda,concedendo-lhe o merecido destaque face aos textosque a acompanham. Além disso, publicará por vezesreportagens fotográficas, à semelhança de port-folios,onde o texto desempenhará um papel perfeitamentesecundário.

Devido ao bombardeamento sensorial a quediariamente os leitores estão sujeitos, e também aocansaço visual que a leitura num monitor propicia,acolherá preferencialmente textos vigorosos, curtos,apelativos e de grande riqueza informativa. O mesmovale para os títulos que acompanham tais textos.Quando o assunto o permitir, será desenvolvido, àmargem do corpo da peça, textos independentes emcaixas a uma coluna que ladeiam o texto principal.

As reportagens mais desenvolvidas serão paginadasde forma peculiar: a um título e foto apelativos empágina de rosto, segue-se um lead mais desenvolvidoque o tradicional — pode falar-se de um texto curto— que sumariza e apresenta os assuntos sobre queversa o trabalho. Os subtítulos de tais textos serãoapresentados como hiperlinks no final desta página,remetendo cada um deles para uma nova página,onde um texto curto e autónomo, acompanhado deuma foto, desenvolve o assunto a que se refere. Devidoa esta peculiar forma de paginação, o domínio datécnica de construção por blocos é muito valorizado.

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Nos trabalhos em que tal for possível, o redactoresforçar-se-á por promover o entabulamento de diálogocom outras fontes, através de hiperlinks inseridosno corpo do texto, e que podem remeter para outrasnotícias, outros órgãos de comunicação social, sites,dados de background, arquivo do próprio jornal, dadosgeográficos ou estatísticos, e informações biográficassobre os protagonistas.

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Notas1. O estudo envolveu pesquisas nos EUA, Grã Bretanha,França, Alemanha e Japão, responsáveis por mais de 50por cento do mercado mundial de papel.2. Quinze por cento dos utilizadores afirmaram ler menosfrequentemente a edição impressa dos jornais a que acedemonline; 8 por cento passaram a lê-la mais; a grande maioria,74 por cento, afirmou que a leitura de publicaçõess digitaisnão alterou em nada os seus hábitos de consumo de jornaistradicionais.3. In Wired News, “Newspapers Ding the Web”.4. Por vezes, anedota ou não, dizia-se in the old eightiesque determinados tipos de análise, sobretudo nas áreas dacultura, crítica e espectáculos, eram inspiradas por revistasestrangeiras que poucos ou nenhuns, à excepção do autor,liam. E também os estudantes já descobriram o potencialde fornecimento e impunidade do novo medium.

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XI. Enquadramento legalda actividade jornalística

Em Portugal a actividade jornalística encontra-se regulamentada pela Lei de Imprensa, Lei 2/99de 13 de Janeiro, a qual consagra a liberdade deimprensa e de empresa, e define as regras para acriação de empresas jornalísticas; pelo Estatuto doJorna l i s ta ; Es ta tu to da Imprensa Regiona l ;Regulamento da Carteira Profissional, e CódigoDeontológico. Os crimes cometidos através da imprensaremetem para as disposições legais contidas na leigeral: Código Penal e Código Civil.

Nas convenções internacionais de que Portugalé signatário, Declaração Universal dos Direitos doHomem, e Convenção Europeia dos Direitos do Homem,consagra-se o direito à liberdade de criação, expressãoe empresa. Também a Constituição da República reitera,em linhas muito gerais, esses princípios.

A Declaração Universal dos Direitos do Homemproclama, no seu artº 19º, a liberdade de expressão,de opinião e de informação, as quais implicam “odireito de não ser inquietado pelas suas opiniões,e o de procurar, receber e difundir, sem consideraçãode fronteiras, informações e ideias por qualquer meiode expressão.

A Convenção Europeia dos Direitos do Homem,salvaguardando embora o direito dos estados asubmeterem alguns media a um regime de autorizaçãoprévia, consagra no seu artº 10º que “qualquer pessoatem direito à liberdade de expressão. Este direitocompreende a liberdade de opinião e a liberdadede receber ou transmitir informações ou ideais semque possa haver ingerência de quaisquer autoridadespúblicas e sem consideração de fronteiras”.

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Salvaguardada fica igualmente a possibilidade deregulamentação — condições, restrições ou sanções— que visem “proteger a segurança nacional, aintegridade territorial, a defesa da ordem e prevençãodo crime, a protecção da saúde ou da moral, a protecçãoda honra ou dos direitos de outrém, ou para impedira divulgação de informações confidenciais...”.

Na Constituição da República Portuguesa sãodefinidos princípios gerais respeitantes à liberdadede imprensa, opinião, expressão e empresa, bem comoas responsabilidades decorrentes desses direitos.

11.1. Direitos dos Jornalistas

São direitos dos jornalistas, consignados na Lei deImprensa:

- A liberdade de expressão e criação;- A liberdade de acesso às fontes de informação,incluindo o direito de acesso a locais públicospara fins de cobertura informativa;- O direito ao sigilo profissional;- Garantia de independência e cláusula deconsciência;- O direito de participação na orientação doórgão onde trabalha;Este direito de participação materializa-se, nas

empresas com mais de cinco jornalistas profissionais,através da eleição do Conselho de Redacção, umórgão que in te rvém na v ida da publ icação ,nomeadamente através de:

- O direito de se pronunciar sobre a nomeaçãoou destituição dos elementos da direcção;- Colaborar com a direcção na elaboração doestatuto editorial e emitir parecer sobre asalterações que eventualmente lhe venham a ser

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introduzidas;- Emitir parecer, quando solicitado, sobre aconformidade de textos ou imagens com o estatutoeditorial da publicação;- Pronunciar-se sobre assuntos que se relacionemcom o exercício da actividade jornalística;- Ser ouvido nos casos de admissão ouresponsabilidade disciplinar dos jornalistasprofissionais da casa;

O Estatuto do Jornalista, Lei nº 1/99, aprovadapela Assembleia da República a 13 de Janeiro, regulamentae explicita os direitos consignados na Lei de Imprensa,nomeadamente:

- Garantindo o direito de acesso às fontes pelosÓrgãos da Administração Pública, empresas compar t ic ipação major i tá r ia do Es tado , ouconcessionárias de serviço público;- Em caso de recusa de acesso, assegurandoque gozam de regime de urgência as reclamaçõesapresentadas por jornalistas à Comissão de Acessoaos Documentos Administrativos;- Os jornalistas não podem ser impedidos deaceder a locais públicos ou abertos à generalidadeda Comunicação Social, e no âmbito do exercíciodesse direito — que pode ser limitado pelaexigência de credenciação prévia — são abrangidospor um regime especial que permite a circulaçãoe estacionamento de viaturas utilizadas noexercício da profissão.- O direito ao sigilo implica que os jornalistasnão podem ser obrigados a revelar as suas fontesde informação, não podendo sofrer quaisquersanções pelo seu silêncio. De igual modo, os

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elementos do órgão de informação que tiveremconhecimento da identidade de tais fontes, nãopodem revelá-las sem o consentimento por escritodo jornalista.- Apenas por mandado judicial podem os

jornalistasser obrigados a exibir, revelar ouentregar os elementos recolhidos durante oexercício da profissão.

Para proteger a independência dos jornalistas,e regulamentar a cláusula de consciência, o Estatutodo Jornalista assegura que estes profissionais “não podemser constrangidos a exprimir ou subscrever opiniões,nem a desempenhar tarefas contrárias à sua consciência,nem podem ser alvo de medidas disciplinares em virtudede tal recusa”. No caso de alteração profunda da linhaedi tor ia l da publ icação , da qua l sobrevenhamincompatibilidades com as convicções ou consciênciado jornalista, este pode rescindir o contrato de trabalhoque o liga à empresa invocando justa causa, e tendoconsequentemente direito à respectiva indemnização.Além disso, todo o jornalista profissional pode recusarordens ou instruções com incidência em matéria editorial,quando emitidas por alguém não habilitado com títuloprofissional.

Na Imprensa Regional, os jornalistas ou os órgãosque representam têm ainda direito a:

- Acesso especialmente favorável aos produtosinformativos da agência noticiosa nacional;- Contribuição da Administração Central paraa formação de jornalistas e colaboradores daimprensa regional, nomeadamente através deapoios a conceder à realização de estágiosprofissionalizantes, especialização e reciclagem.

11. Enquadramento legalda actividade jornalística

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11.2. Deveres dos Jornalistas

Constituem deveres dos jornalistas, de acordocom o artº 14º do respectivo estatuto:

- Respe i ta r escrupulosamente o códigodeontológico dos jornalistas- Exercer a actividade com respeito pela éticaprofissional, informando com rigor e isenção;- Respeitar a orientação e os objectivos definidosno estatuto editorial do órgão onde exerçam asua actividade profissional;- Não formular acusações sem provas e respeitara presunção de inocência- Não identificar, directa ou indirectamente, asvítimas de crimes contra a liberdade e auto-determinação sexual; nem menores objecto demedidas tutelares sancionatórias;- Não tratar discriminatoriamente pessoas emfunção da cor, raça, religião, nacionalidade ousexo;- Não recolher declarações ou imagens que atinjama dignidade das pessoas;- Respeitar a privacidade;- Não falsificar ou encenar situações, abusandoda boa-fé do público;- Não recolher imagens ou sons por meios nãoautorizados, a não ser em caso de manifestointeresse público;

Para a imprensa Regional, o respectivoestatuto acrescenta ainda o seguinte:- Respeitar escrupulosamente a verdade, o rigore a objectividade da informação;- Observar os limites ao exercício da liberdade

de imprensa nos termos da lei.

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Pela Constituição da República, são deveres dosmedia do sector público, e dos jornalistas que nelestrabalham, “salvaguardar a independência peranteo Governo, a Administração e demais poderes públicos,bem como assegurar a possibilidade de expressãoe confronto de diversas correntes de opinião”.

Outros deveres do jornalista são habilitar-secom o título legal necessário, de acordo com ascircunstâncias, ao exercício da profissão, normalmentea Carteira Profissional de Jornalista; e ainda abster-se de desempenhar tarefas incompatíveis com oexercício da profissão.

As incompatibilidades — actividades que pelasua natureza são susceptíveis de comprometer osrestantes deveres profissionais — encontram-sedescritas no Estatuto do Jornalista pela seguinte ordem:

- Funções de angar iação , concepção ouapresentação de mensagens publicitárias;- Funções de marketing, relações públicas,assessoria de imprensa e consultoria emcomunicação ou imagem;- Orientação ou concepção de estratégiascomerciais;- Exercício de funções em organismo ou corporaçãopolicial;- Serviço militar;- Funções de membro do Governo da Repúblicaou de governos regionais;- Funções de presidente ou vereador em autarquialocal.Considera-se igualmente actividade publicitária,

que o jornalista deverá consequentemente rejeitar,o recebimento de ofertas ou benefícios não identificadosclaramente como patrocínios concretos de actosjornalísticos, e que visem, através do jornalista, divulgarprodutos, serviços ou entidades.

11. Enquadramento legalda actividade jornalística

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XII. Sugestões de Leitura

AA.VV, Livro de Estilo da Lusa, ed. policopiada.

AA.VV., 1998, Livro de Estilo do Público, Público- Comunicação Social, SA,

Araújo, Domingos Silva, 1988, Vamos falar deJornalismo, Direcção-Geral da Comunicação Social,Lisboa.

Beltrão, Luís, 1980, Jornalismo Opinativo, Ed. Sulina,Porto Alegre, Brasil.

Boucher, Jean-Dominique, 1994, A ReportagemEscrita , col. Técnicas da Jornalismo, EditorialInquérito, Mem Martins.

Cardet, Ricardo, sd, Manual de Jornalismo, col.Nosso Mundo, Editorial Caminho, Lisboa.

Colombo, Furio, 1995, Conhecer o Jornalismo Hoje- Como se faz Informação, Editorial Presença, Lisboa.

Crato, Nuno, 1992, Comunicação Social - A Imprensa,Editorial Presença, Lisboa.

Cunha , Celso, e Cintra , Lindley, 1993, BreveGramática do Português Contemporâneo, Ed. Sá daCosta, Lisboa.

Mendes, Victor, 1999, Legislação sobre ComunicaçãoSocial, Legis Editora, Porto.

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Piedrahita, Manuel, 1993, Periodismo Moderno -Historia, Perspectivas y Tendencias , EditorialParaninfo, Madrid.

Ricardo, Daniel, 1989, Manual do Jornalista, Edições“O Jornal”, Publicações Projornal, Lisboa.

Rodrigues, Adriano Duarte, 1997, As Técnicas daComunicação e da Informação, Editorial Presença,Lisboa.

Saperas, Enric, 1987, Os Efeitos Cognitivos daComunicação de Massas, col. Comunicação/Acção,Edições Asa, Rio Tinto, Porto.

12. Sugestões de Leitura

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títulos publicados:

1 - Semiótica: A Lógica da ComunicaçãoAntónio Fidalgo

2 - Jornalismo e Espaço PúblicoJoão Carlos Correia

3 - A Letra: Comunicação e ExpressãoJorge Bacelar

4 - Estratégias de Comunicação MunicipalEduardo Camilo

5 - A Informação como UtopiaJ. Paulo Serra

6 - Escrita teleguiadaGuiões para audiovisuaisFrederico Lopes