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PEQUENO MANUAL DE REDAÇÃO: ARGUMENTAÇÃO 1 Introdução No desenvolvimento do meu trabalho como professor de Língua Portuguesa e Redação, tanto no Ensino Médio quanto no Ensino Superior tenho percebido que, observadas as diferenças de grau, as dificuldades demonstradas pelos alunos na produção / recepção de textos escritos são sempre as mesmas. Essas dificuldades parecem ser decorrentes de uma outra dificuldade, situada na base do problema: de modo geral, os alunos demonstram enfrentar problemas sérios na percepção da articulação e das “relações lógicas existentes entre as várias partes de um texto”. A produção de textos sem uma estrutura adequada, sem organização e sem coesão é uma constante em qualquer nível de escolaridade. Essa constatação, que não é só minha, tem motivado a elaboração de muitos trabalhos que objetivam contribuir para a amenização do problema. Várias publicações têm surgido com novas propostas, novos métodos, novas estratégias, no intuito de levar o aluno a melhorar sua competência na produção / recepção de textos escritos. A respeito desse problema, pode-se dizer também que a dificuldade demonstrada pelos alunos é maior quando se trata de textos ditos argumentativos. É comum, por exemplo, nas atividades em que se propõe a redação de um texto argumentativo, o aluno produzir um texto claramente narrativo. Embora não se pretenda, aqui, discutir as causas do problema, vale fazer essa referência por se tratar de um fato que, certamente, já foi observado por todos os professores que lidam com a prática da produção e interpretação de textos. 1

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MANUAL DE REDAÇÃO PARA CONCURSO DE QOAA MARINHA.

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PEQUENO MANUAL DE REDAÇÃO: ARGUMENTAÇÃO

1 Introdução

No desenvolvimento do meu trabalho como professor de Língua Portuguesa e Redação, tanto no

Ensino Médio quanto no Ensino Superior tenho percebido que, observadas as diferenças de grau, as

dificuldades demonstradas pelos alunos na produção / recepção de textos escritos são sempre as mesmas.

Essas dificuldades parecem ser decorrentes de uma outra dificuldade, situada na base do problema: de

modo geral, os alunos demonstram enfrentar problemas sérios na percepção da articulação e das “relações

lógicas existentes entre as várias partes de um texto”. A produção de textos sem uma estrutura adequada,

sem organização e sem coesão é uma constante em qualquer nível de escolaridade. Essa constatação, que

não é só minha, tem motivado a elaboração de muitos trabalhos que objetivam contribuir para a

amenização do problema. Várias publicações têm surgido com novas propostas, novos métodos, novas

estratégias, no intuito de levar o aluno a melhorar sua competência na produção / recepção de textos

escritos.

A respeito desse problema, pode-se dizer também que a dificuldade demonstrada pelos alunos é maior

quando se trata de textos ditos argumentativos. É comum, por exemplo, nas atividades em que se propõe a

redação de um texto argumentativo, o aluno produzir um texto claramente narrativo. Embora não se

pretenda, aqui, discutir as causas do problema, vale fazer essa referência por se tratar de um fato que,

certamente, já foi observado por todos os professores que lidam com a prática da produção e interpretação

de textos.

Em sua dissertação de mestrado, Costa Val (1999, p.121), na análise do corpus, constituído por

redações elaboradas por candidatos ao Curso de Letras, no vestibular de 1983 da UFMG, constatou que

(1) As falhas que se mostraram mais relevantes, dos pontos de vista quantitativo e qualitativo, dizem respeito à informatividade e a dois requisitos de coerência (a não-contradição externa e a articulação) e têm a ver, mais propriamente, com os aspectos cognitivos da macroestrutura.

Entre os fatores considerados por Costa Val (1999), a informatividade parece ser o único que

ainda não mereceu um estudo mais cuidadoso, que fornecesse subsídios para um trabalho destinado a

melhorar a competência do falante como produtor de textos escritos. O trabalho que aqui se propõe não

busca, em primeiro lugar, apresentar nenhuma contribuição específica nesse sentido. Entretanto, por

entender que o que se chama de informatividade deve ser avaliado de maneiras diferentes conforme o

gênero textual e, mesmo, conforme o tipo de texto, entendo também que, de certa forma, o estudo dos

mecanismos lingüísticos envolvidos no processamento do texto argumentativo, objetivo deste trabalho,

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poderá trazer alguma contribuição para o assunto, fornecendo subsídios que possibilitem ao aluno

perceber o jogo de relações e articulações que compõem o texto argumentativo.

A decisão de se trabalhar aqui com o texto dito argumentativo se deve, em grande parte, ao fato de

que esse tipo de texto tem sido, nos últimos anos, muito prestigiado nos vários níveis de ensino, desde o

Fundamental até o Superior. Além disso, em quase todo concurso público e praticamente em todo

vestibular realizado no País, vem sendo cobrada a redação de texto argumentativo. Ainda que assim não

fosse, a verdade é que, na prática do dia-a-dia, saber argumentar é um trunfo importante para qualquer

pessoa. Assim, como professor de Língua Portuguesa em um Curso de Letras e em um Curso de Direito e

sabendo o que pode significar para a vida profissional de um professor ou de um advogado a competência

argumentativa, entendo ser minha obrigação buscar subsídios para ajudar os alunos a melhorar sua

capacidade de produzir e interpretar textos argumentativos.

Sabendo que a maior dificuldade demonstrada pelos alunos na produção de textos é o baixo nível

de informatividade que seus textos apresentam, acho necessário fazer algumas considerações sobre o

problema. Em primeiro lugar, é importante dizer que o desempenho do aluno nesse quesito varia bastante

conforme esteja desenvolvendo um texto narrativo, descritivo ou argumentativo. No texto narrativo, que,

na maioria das vezes, baseia-se apenas em fatos fictícios, o aluno tem muito o que dizer, já que sua

imaginação possibilita criar situações, fatos, argumentos, eventos, e, assim, alimenta a capacidade

informativa do aluno. No texto dissertativo ou argumentativo, porém, a informatividade vai resultar do

conhecimento sobre o assunto, da opinião a ser defendida e da sua competência para construir e

desenvolver argumentos capazes de provocar a adesão à sua tese. Por isso, a informatividade nesses tipos

de textos é geralmente baixa. Somente com um certo conhecimento prévio do assunto, um conhecimento

geral satisfatório, uma vivência significativa, aliados a uma razoável competência textual, pode-se

conseguir um texto argumentativo com um bom nível de informatividade. Aliás, neste trabalho, entende-

se que informatividade não é o termo mais adequado quando se trata de texto dissertativo ou

argumentativo. Principalmente quando se trata deste último, o termo mais apropriado seria

argumentatividade, já que a finalidade do texto argumentativo não é, primordialmente, informar, mas

convencer, persuadir, pela argumentação.

Em segundo lugar, é importante lembrar também o seguinte: mesmo quando o aluno tem muita

coisa a dizer, ou seja, quando a informatividade poderia ser alta, é comum ouvir-se do aluno um lamento

do tipo “Professor, eu sei o assunto, mas não sei como passar para o papel”. De fato, esse é um problema

real vivido por alunos e professores. Na verdade, a produção de qualquer gênero ou tipo de texto esbarra

em duas grandes dificuldades: o que dizer e como dizer. Como se afirmou anteriormente, o grau de

informatividade varia conforme o tipo de texto. Nos textos narrativos, tem-se muito mais o que dizer do

que nos textos argumentativos. A dificuldade, porém, na produção do texto continua, uma vez que o como

dizer é outro sério desafio a ser enfrentado. Em se tratando de textos argumentativos, não basta dizer.

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Nesse tipo de texto adquire importância fundamental o como dizer. A informatividade em um texto

argumentativo está em tornar forte um argumento aparentemente fraco. Na argumentação, é preciso levar

o alocutário a enxergar um outro aspecto do assunto, aquele aspecto cujo valor se quer que seja tido como

decisivo para a aceitação do argumento. Conseguir isso, entretanto, exige muita habilidade na articulação

dos argumentos que sustentam o texto. Muitas vezes, o falante pensa em desenvolver certos argumentos e

não consegue tecê-los de forma a conduzir o alocutário a perceber a importância que possam ter para o

assunto.

2 O texto argumentativo de um único parágrafo: o parágrafo-padrão

A estrutura do texto argumentativo de um único parágrafo é a mesma do parágrafo-padrão de um

texto argumentativo de vários parágrafos. Isso significa que quem sabe estruturar adequadamente um

parágrafo-padrão sabe também estruturar um texto argumentativo de um único parágrafo. Esse parágrafo

apresenta a seguinte estrutura:

1. Frase-tese (Tópico frasal, frase-núcleo, frase-introdução)

2. Frase-argumento

3. Frase(s)-comentário

4. Frase-conclusão

2.1 A frase-tese

Embora todos os tipos de frases que compõem a estrutura do parágrafo-padrão sejam importantes,

é preciso ressaltar a importância maiúscula da frase-tese. A partir do momento em que o aluno perceber,

de verdade, que a frase-tese funciona como uma espécie de guia, como um projeto do texto a ser

desenvolvido, certamente encontrará mais facilidade no desenvolvimento do seu texto.

O primeiro grande problema enfrentado pelo aluno na hora de produzir um texto argumentativo é

como começar esse texto. É muito comum o aluno dirigir-se ao professor e dizer: “Professor, como é que

começa?” ou então: “Professor, começa pra mim.” De modo geral, ele sabe que o texto deve constituir-se

de introdução, desenvolvimento e conclusão. Ou início, meio e fim. Afinal, ele ouve isso desde quando

começou a produzir seus primeiros textos escolares. O problema é que, na prática, ele não consegue

distinguir muito bem essas partes em seu próprio texto. Ou seja, ele tem dificuldade de apontar, no

próprio texto, até onde vai a introdução; onde começa e onde termina o desenvolvimento; onde é a

conclusão. O aluno que sabe apontar cada uma dessas partes no próprio texto dá uma demonstração

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inequívoca de que tem o texto sob domínio. Por isso, é fundamental saber formular corretamente cada

uma dessas partes. É isso que se verá a seguir.

2.1.1 A formulação da frase-tese

Se o professor, ao propor a produção de um texto argumentativo, pedir que o aluno fale, por

exemplo, sobre namoro, estará dificultando, e muito, o trabalho do aluno. Observe-se que o assunto

namoro é muito amplo, e isso pode levar o aluno a sentir uma certa dificuldade na delimitação desse

assunto. Falar o quê, sobre namoro? Esse é, realmente, um grande desafio para o aluno.

Observe-se, agora, como essa tarefa se torna mais fácil se o professor, em vez de mandar falar

sobre namoro, fizer uma pergunta como esta: Você acha que um namoro aos quinze anos de idade pode

ser levado a sério? Sem dúvida, qualquer um responde a uma pergunta dessa sem maiores dificuldades.

Você já reparou como os bebês aprendem a falar? Geralmente, ele é induzido a isso: a mãe (quase

sempre) pega a criança nos braços, encara-a e diz: - Fala: mamãe! E insiste nisso diariamente, até que, um

dia, a criança balbucia: - Papai. É claro que pronunciar papai, cujos sons são todos orais, é mais fácil que

pronunciar mamãe, palavra repleta de sons nasais, mais difíceis de articular que os orais.

Brincadeira à parte, o certo é que, induzida, a criança articula suas primeiras palavras. Depois que

a criança está mais desenvolvida, ainda nos primeiros anos de vida, a mãe já lhe faz perguntas do tipo: -

Neném qué dedeira? Neném tá com soninho? Neném gosta mais papai ou gosta mais mamãe? Nessa fase,

a criança ainda não sabe responder, mas já sabe repetir. E repete a parte final da pergunta: Qué dedeira!

Tá com soninho! Gosta mais mamãe! Daí em diante, sempre induzida pelos adultos, a criança vai

aprendendo a falar e a produzir seus próprios discursos.

O que se quer demonstrar com tudo isso é que, por meio de perguntas, facilita-se muito para

qualquer um a tarefa de produzir um texto, seja ele oral ou escrito. Tome-se, também, como exemplo, a

velha prática do questionário, ainda bastante utilizada pelos professores em sala de aula. Às vezes,

naquelas disciplinas em que a quantidade de informação é muito grande, o aluno costuma pedir ao

professor que passe um questionário. Será por quê? Ora, é fácil entender: se o professor não dá o

questionário, o aluno ficará sem saber o que o professor pode querer dentro de um assunto tão amplo. O

questionário mostra ao aluno o rumo a seguir. A pergunta delimita o assunto e, ao mesmo tempo, estipula

o objetivo. Assim, o aluno sente-se mais seguro para produzir o texto como resposta.

Ora, se a pergunta facilita a produção do texto, facilita também a formulação da frase-tese, que é a

introdução do texto. Na verdade, a frase-tese pode ser a resposta a uma pergunta do tipo das seguintes:

1. Qual sua opinião sobre a idéia de...? proposta

intenção

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decisão sugestão realização

etc.

2. O que você acha da idéia de... ? proposta intenção decisão sugestão realização etc.

3. Você concorda com a idéia de... ? proposta intenção decisão sugestão realização etc.

4. Você acha oportuna a idéia de... ? viável proposta adequada decisão apropriada sugestão exeqüível intenção inteligente realização etc. etc.

Na resposta a qualquer uma dessas perguntas, deve-se assumir uma posição favorável ou contrária

ao que está sendo colocado em julgamento: a idéia de..., a proposta de..., a decisão de..., a sugestão de..., a

intenção de..., a realização de..., etc. É claro que se pode assumir uma posição neutra, mas não é essa a

atitude aconselhável. É importante ter em mente que não existe opinião certa nem opinião errada. Uma

opinião não pode ser considerada falsa ou verdadeira. Cada um defende a que lhe interessa defender. Na

verdade, ninguém é, aprioristicamente, favorável ou contrário a nada. Dependendo da situação e do

interesse, cada um defende ora uma ora outra opinião. Quem diz, por exemplo, que é a favor da pena de

morte ou contra o aborto diz isso sem se encontrar realmente diante do problema. Quase sempre, porém,

sua opinião varia conforme o caso concreto o afeta de uma forma ou de outra.

É importante observar também que a própria pergunta já orienta o aluno quanto a dois pontos

fundamentais na produção do texto; a delimitação do assunto e o objetivo proposto. Suponha que você

tenha que produzir um parágrafo argumentativo em resposta à seguinte pergunta:

Qual sua opinião sobre a decisão da equipe econômica do governo de aumentar a taxa de juros?

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Ora, o que está em julgamento é a decisão da equipe econômica do governo de aumentar a taxa

de juros. Se é isso que está em discussão, é isso que deve constituir o assunto do seu texto. Então, na

formulação do da frase-tese, que deve ser a resposta à pergunta formulada, use como sujeito o assunto que

está em discussão. A frase-tese poderia, então, começar da seguinte maneira:

A decisão da equipe econômica do governo de aumentar a taxa de juros é...

Observe que a frase poderá ser completada com um sintagma adjetivo ou substantivo, que

constituirá a essência da tese que se vai defender. Esse termo explicita o objetivo, que, no caso, é

posicionar-se favorável ou contrariamente ao assunto em discussão. Conforme o objetivo do autor, a

frase-tese poderia ficar assim:

A decisão da equipe econômica do governo de aumentar a taxa de juros é insensata. um absurdo uma atitude sábia oportuna inoportuna etc.

Uma frase-tese assim formulada deixa claro qual é o assunto (A decisão da equipe econômica do

governo), o objetivo (defender ou contestar essa decisão), e a tese (insensata, um absurdo, uma atitude

sábia, oportuna, inoportuna, etc.). Dessa forma, estará feita a introdução do texto. Tudo o que vier a ser

desenvolvido a partir daí deverão ser argumentos que demonstrem a validade do que foi declarado na

frase-tese.

Veja algumas sugestões de respostas às perguntas formuladas na página anterior:

1. É claro que a idéia de ... é oportuna. óbvio decisão adequada indubitável sugestão inadequada evidente intenção viável lógico proposta inviável etc. realização exeqüível etc. um absurdo um achado equivocada etc.

2. Indubitavelmente, a idéia de ... é oportuna. Obviamente decisão adequada Insofismavelmente sugestão inadequada Indiscutivelmente intenção viável

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Etc. etc. etc.

3. Talvez a idéia de ... seja oportuna. Pode ser que decisão adequada É possível que sugestão inadequada Etc. etc. etc.

4. Muitos acham que não, mas a verdade é que a idéia de ... (não) deveria ser apoiada. decisão abandonada sugestão esquecida intenção posta em prática proposta concretizada

etc. etc.

5. Embora muitos achem que não, a verdade é que a idéia de ... sugestão intenção proposta etc.

6. Não há como negar que a idéia de ... sugestão intenção proposta etc.

7. Jamais se deveria admitir a idéia de ... aceitar sugestão apoiar intenção pôr em prática proposta etc. etc. 8. Não há como negar que a idéia de... sugestão intenção proposta etc.

É preciso ter em mente que não existe uma forma única de estruturação de texto. As frases acima

são apenas sugestões e como tais devem ser consideradas. A grande vantagem de empregar frases desse

tipo como frases-tese é que elas servem de guia para o desenvolvimento do texto e não deixam que o

autor se desvie do assunto e do objetivo.

Às vezes, a proposta de redação não vem em forma de uma pergunta. É comum ser apresentada

em uma frase imperativa tal quais as seguintes:

1. Redija um texto argumentativo, defendendo a idéia de... condenando sugestão explicando intenção justificando proposta

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explicitando decisão etc. opinião etc.2. Redija um texto argumentativo, confrontando as opiniões de... fazendo um paralelo entre decisões relacionando propostas etc. etc.

Observe-se que, também nesse tipo de proposta, é dado o assunto (a idéia de..., a sugestão de..., a

proposta de..., a decisão de..., as opiniões..., as decisões..., as propostas..., etc.) e o objetivo, que é

expresso por um verbo no gerúndio (defendendo..., condenando..., explicitando..., justificando...,

confrontando..., fazendo um paralelo..., relacionando..., etc).

Para redigir o texto, você não pode, em hipótese alguma, mudar nem o assunto nem o objetivo. A

frase-tese do seu texto, também nesse caso, pode ser elaborada de forma semelhante às anteriormente

sugeridas.

Tenha sempre em mente o seguinte: quando a proposta manda, por exemplo, redigir um texto

argumentativo, explicando..., ou justificando..., ou explicitando..., etc., a idéia de..., a decisão de..., a

proposta de..., etc., a explicação, ou a justificativa, ou a explicitação, etc., não deve vir na frase-tese. Deve

vir no desenvolvimento do texto. A frase-tese deve apenas sugerir que a explicação, ou a justificativa, ou

a explicitação será apresentada em seguida.

Observe-se como poderia ser formulada a frase-tese nesse caso:

Proposta 1: Redija um texto argumentativo, explicando a teoria defendida pela oposição sobre as eleições

para presidente da República.

Frase-tese: A teoria defendida pela oposição sobre as eleições para presidente da República é explicável. pode ser explicada é bem simples é de fácil compreensão é fácil de entender não tem mistério etc.

Proposta 2: Redija um texto argumentativo, justificando a decisão do governo federal de vetar o aumento

do funcionalismo público.

Frase-tese: A decisão do governo federal de vetar o aumento do funcionalismo público justifica-se. tem seus motivos é justificável é compreensível etc.

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Proposta 3: Redija um texto argumentativo, confrontando as opiniões defendidas pelo governo e as

defendidas pela oposição sobre a Previdência Social.

Frase-tese: As opiniões defendidas pelo governo e as defendidas pela oposição são conflitantes. são opostas são até parecidas têm pontos em comum apresentam divergências etc.

Formulada a frase-tese, em que o autor expressa sua opinião sobre o assunto que está em

julgamento, é preciso que o autor apresente o motivo que o levou a defender aquela opinião. Às vezes, o

motivo é um só. Nesse caso, o texto será desenvolvido com base em um único argumento. Outras vezes,

há mais de um motivo. O texto será desenvolvido, então, com base em mais de um argumento.

É através de frase-argumento que o autor deve introduzir no texto o motivo de estar sustentando a

opinião apresentada na frase-tese. Mas, é preciso saber fazer essa introdução. A articulação dessa frase

com a frase-tese deve ser bem evidente. Conforme se verá mais adiante, essa articulação exige maiores

cuidados quando o texto é desenvolvido com base em vários argumentos.

2.2 A frase-argumento: formulação e articulação com a frase-tese

Um sério problema detectado na maioria dos textos produzidos por alunos de curso médio e até

por uma grande parte de alunos de curso superior é a dificuldade demonstrada por eles para articular, em

duas frases distintas, a relação lógica de causa e conseqüência. Geralmente o fazem em uma só frase. O

articulador de causa quase sempre usado pela maioria é a conjunção subordinativa causal porque ou as

suas equivalentes: pois, já que, visto que, uma vez que, e até mesmo a expressão haja visto que,

condenada pela gramática normativa. Outras vezes, usam sintagmas adverbiais de causa introduzidos por

locuções prepositivas do tipo por causa de..., por motivo de..., em face de..., em razão de..., etc, ou usam

orações adverbiais com verbo no infinitivo precedido pela preposição por. A relação lógica de

conseqüência é expressa por esses alunos, na maioria das vezes, por meio de um verbo no gerúndio. É

comum ainda o uso abusivo de itens lexicais como onde e o que como articuladores.

Ora, é claro que o uso comedido e adequado desses articuladores não é incorreto. O problema é

que eles são mais apropriados para ligar elementos de uma mesma frase. Ao utilizá-los abusivamente, os

alunos desenvolvem o vício de construir frases muito longas, que dificultam a compreensão do texto e são

causa constante de ambigüidade. Na verdade, o grande problema está no seguinte: por não ter o hábito de

empregar elementos de coesão adequados, notadamente substitutos textuais anafóricos, tais como

pronomes demonstrativos, hipônimos, hiperônimos, sinônimos, nominalizações, elipses e várias outras

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pró-formas, a maioria dos alunos exagera no emprego dos articuladores mencionados no parágrafo

anterior e não sabe o momento certo de colocar um ponto final para encerrar a frase. O resultado são,

quase sempre, parágrafos inteiros construídos em uma única frase, sem uma estrutura adequada. Quase

sempre, o aluno tenta resolver tudo numa frase só. Ele declara, apresenta motivo e conseqüência e conclui

em uma mesma frase. Às vezes, o texto é todo estruturado em uma única frase. E a explicação para isso é

uma só: ele não sabe usar articuladores de frase; usa apenas articuladores de sintagmas.

Interessante é que todo aluno ouve, desde as primeiras experiências de produção de texto, o

professor dizer-lhe que faça frases curtas. O problema é saber como fazer esse tipo de frase. Fazer frases

curtas implica saber onde colocar um ponto final e iniciar outra frase, articulando-a corretamente com

uma frase anterior. Isso é, sem dúvida, uma dificuldade constantemente detectada na maioria dos textos

escolares. Contribui muito para agravar o problema o pouco uso que a maioria dos alunos faz de

substitutos textuais adequados. Conforme se afirmou anteriormente, o emprego consciente de elementos

anafóricos e catafóricos; de pró-formas nominais,verbais e adverbiais; de hipônimos e hiperônimos; de

conectivos e operadores argumentativos diversos, responsáveis, em grande parte, pela coesão do texto, é

uma prática pouco freqüente na produção textual acadêmica.

Para ilustrar o que se disse acima, veja-se o seguinte parágrafo muito parecido com tantos outros

encontrados em textos produzidos por pré-vestibulandos:

(2) A situação econômica do Brasil é muito complicada, pois uma grande parte da população ganha mal e não tem condições de sustentar a família, levando muita gente a buscar outros meios às vezes até desonestos para aumentar a renda deles, onde faz crescer a criminalidade do país, o que por sua vez gera mais violência para toda a sociedade, tornando nosso país um lugar cada vez mais difícil de viver.

Observe-se que o texto, fundamentado a partir de uma relação de causa / conseqüência, foi

estruturado em uma única frase. A tese, ou seja, a opinião defendida, é a de que “A situação econômica

do Brasil é muito complicada”. A causa, introduzida pelo conector pois, é, segundo o texto, que “uma

grande parte da população ganha mal e não tem condições de sustentar a família”. Isso, ainda de acordo

com o texto, gera uma conseqüência, introduzida por um verbo no gerúndio: “levando muita gente a

buscar outros meios às vezes até desonestos para aumentar sua renda”. Essa situação leva a outra

conseqüência, introduzida pelo item lexical onde: “faz crescer a criminalidade”. Esse fato traz outra

conseqüência, introduzida pela expressão o que: “gera mais violência para toda a sociedade”. Essa

violência produz uma outra conseqüência, introduzida por outro verbo no gerúndio: “torna o nosso país

um lugar ainda mais difícil de viver”.

Veja-se, abaixo, que o texto poderia ser estruturado em seis frases curtas em vez de em uma única

frase longa:

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(3) A situação econômica do Brasil é muito complicada. Uma grande parte da população ganha muito mal e não tem condições de sustentar a família. Essa situação leva muita gente a buscar outros meios, às vezes até desonestos, para aumentar sua renda. A prática de atos ilícitos para conseguir algum dinheiro faz crescer a criminalidade no País. Esse fato, por sua vez, gera ainda mais violência para toda a sociedade. A violência incontrolável torna o País um lugar cada vez mais difícil de se viver.

Essa versão é muito mais bem estruturada do que a original. Mas, então, por que o aluno não

costuma usar esse tipo de estrutura? O grande problema é, sem dúvida, a dificuldade de encontrar os

elementos de coesão adequados. Conforme se afirmou anteriormente, a maioria dos alunos usa, quase

sempre, para fazer a articulação, as conjunções causais, o verbo no gerúndio, as palavras e expressões

onde, o que, fato este que. Como a característica sintática marcante desses articuladores é ligar elementos

de uma mesma frase, o aluno não sabe onde encerrar a frase, a não ser quando diz tudo quanto pensa

sobre o assunto. Eis aqui, portanto, um trabalho importante a ser desenvolvido pelo professor: ensinar o

aluno a fazer frases curtas. Para tanto é preciso treinar o aluno a usar adequadamente os elementos de

coesão textual.

Conforme já se explicitou, a frase-argumento expressa, geralmente, o motivo que leva o autor a

defender a opinião expressa na tese. Constitui, assim, a prova ou a demonstração do que se afirma na tese.

Em razão disso, a articulação da frase-argumento com a frase-tese é feita, geralmente, por meio de

articuladores que expressam relação lógica de causa ou explicação adequados para articular frases. Eis

alguns deles:

. A razão disso é...

. A causa disso... dessa situação... desse fato... de se pensar assim.... Motiva isso o fato de.... Explica isso.... Justifica isso.... Isso é fácil de entender.. Basta dizer o seguinte: .... A explicação é simples: .... Explica-se: .... Justifica-se: .... Isso tem explicação: .... Isso tem seus motivos: .... Motivo existe para isso.. Existe explicação para isso.. Tome-se como explicação o seguinte: .... Tal atitude pode ser explicada.. Essa situação pode ser explicada da seguinte forma: .... Não é difícil entender por quê.. Veja-se por quê.. Observe-se o seguinte:. Uma prova disso é.... Uma demonstração clara disso é.... Demonstra isso o fato de...

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. Prova isso o fato de que...

. Etc.

Pode ser, também, que a articulação se dê simplesmente pela justaposição, sem a presença de

qualquer um desses articuladores sugeridos. É o que se observa entre as duas primeiras frases do texto (3),

reapresentadas abaixo:

(3) A situação econômica do Brasil é muito complicada. Uma grande parte da população ganha muito mal

e não tem condições de sustentar a família.

Observe-se que a segunda frase expressa a causa ou explicação do que se declara na frase anterior.

Por isso, para articular essas duas frases, poderia ser empregada qualquer uma das expressões

articuladoras relacionadas anteriormente. O trecho poderia ficar, por exemplo, assim:

(3b) A situação econômica do Brasil é muito complicada. Uma prova clara disso é que grande parte da Uma demonstração evidente disso Uma evidência indiscutível disso Etc.população ganha muito mal e não tem condições de sustentar a família.

2.3 As frases-comentário

Até aqui, já se falou da frase-tese (a declaração que contém a opinião a ser defendida) e o

argumento (o motivo, a prova, ou a demonstração do que foi declarado na tese). A seguir, pretende-se

enfatizar que o argumento apresentado deve ser explicitado, desenvolvido, demonstrado, amplificado.

Deve ser trabalhado de tal forma que o leitor acabe por aceitá-lo como evidência da validade da

declaração feita na frase-tese. Quem argumenta tem de acreditar sempre no seguinte: não existe

argumento forte ou fraco por si mesmo. A capacidade de argumentar de cada um é que torna forte ou

fraco o argumento escolhido. Quando se apresenta um argumento sem desenvolver comentários sobre ele,

sem explicá-lo, sem demonstrar sua importância, a argumentação não tem o poder de convencer nem de

persuadir. O argumento não tem consistência. Torna-se o que normalmente se chama de declaração

gratuita. Todo argumento deve ser, portanto, cuidadosamente comentado, exemplificado, ilustrado,

amplificado, para se tornar convincente. As frases usadas para essa finalidade são as frases-comentário.

Observem-se os textos (4) e (5), abaixo:

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(4) Horário eleitoral gratuito

Deveria ser extinto, para sempre, do rádio e da televisão, o horário eleitoral gratuito. A razão disso é bastante simples: essa praga que invade diariamente os lares brasileiros transformou-se no maior tormento para as pessoas que têm, no rádio ou na tevê, sua principal fonte de lazer. É irritante ter que se privar, por culpa dessa monstruosidade inventada pelos políticos, do prazer de se sentar diante da televisão e poder, livremente, escolher o seu programa predileto. O grande prazer do telespectador está em poder assistir a um programa à sua escolha. Poder criticá-lo, elogiá-lo, xingá-lo se tiver vontade. Mudar de canal como forma de protesto. Reclamar da ruindade da programação. Renovar a promessa de, dessa vez, fazer, de verdade, aquela assinatura de tv a cabo ou , quem sabe, aquela sensacional programação via satélite, tão divulgada ultimamente. Enfim, exercer seu democrático direito de navegar pelos vários canais e encontrar, em cada um, alguma coisa diferente: um filme velho, ou um desenho surrado, ou ainda um maçante programa de entrevista, uma novela em reprise, quem sabe um intragável programa humorístico, ou até mesmo um filme de monstros japoneses. Não importa, desde que o direito de escolha se manifeste. O telespectador já não pode, entretanto, usar desse livre arbítrio. Nos horários mais nobres do rádio e da tevê, ninguém tem como fugir a esse massacre audiovisual que sofre dentro do próprio lar. Esse verdadeiro assédio só pode ser evitado quando se pressiona a tecla “off” do aparelho. É o que faz a maioria. Isso, porém , não alivia o tormento imposto à família brasileira em ano eleitoral. Assim, melhor seria se aparecesse alguém descompromissado com a politicagem e com bom-senso bastante para livrar o telespectador de tão grande castigo. (Valdemar Carlos de Deus. Texto inédito, [sd])

(5) Tempo perdido e irritação em cada esquina

Os semáforos em Sete Lagoas parecem coisa de maluco. Em todos os cruzamentos onde estão presentes, esses sinais luminosos ficam, a maior parte do tempo, fechados para todas as direções. Exagero? Claro que não! Basta pegar o carro e fazer a experiência: inclua no seu trajeto o maior número possível de locais onde eles existem. Não será nenhuma surpresa se, em cada dez, a luz vermelha estiver acesa em, pelo menos, sete deles. Dificilmente se encontra um sinal aberto. E isso não é, definitivamente, uma questão de sorte, azar ou coincidência. É puramente matemática O mesmo sinal que timidamente se apresenta verde durante uns acanhados quinze ou vinte segundos escancara pernosticamente seu farol vermelho por quase dois minutos em cada esquina. E isso é feito de forma a interromper o trânsito em qualquer sentido ou direção. A irritação é crescente quando se tem de permanecer, em cada esquina, durante tanto tempo parado. Torna-se maior ainda quando a fila de carros diante do sinal é grande . Nesse caso, a paciência tem de ser inesgotável: quando se consegue arrancar, o sinal já está outra vez fechado. E o pior é que, devido ao pouco tempo em que o sinal permanece aberto, a fila de carros é sempre enorme. Além de irritante, é também incompreensível. Pode-se até teorizar com a alegação de que a disparidade de tempo para o verde e o vermelho visa a garantir o fluxo de veículos e a harmonia do trânsito. A prática, porém, tem mostrado justamente o contrário: a cada dia, o trânsito da cidade está mais lento e confuso. E a sinalização só faz dificultar ainda mais as coisas. Há casos em que realmente se torna necessário manter o sinal fechado por um tempo maior. Mas esses casos não são uma regra; são uma exceção. Deve ser muito bem avaliada a possibilidade de sua utilização. A lógica torna forçoso admitir que, se houvesse equilíbrio na distribuição do tempo nos semáforos, o trânsito se tornaria bem mais ágil, sem comprometimento da segurança. Se a lógica faz supor, a prática o comprova: nos locais onde esse equilíbrio é percebido, tudo funciona de forma muito mais tranqüila. Seria muito oportuno, portanto, que o responsável pelo assunto mostrasse um interesse maior e competência bastante para resolver o problema. (Valdemar Carlos de Deus. Texto inédito, [sd])

No texto (4), aparece a frase-tese: Deveria ser extinto, para sempre, do rádio e da televisão o

horário eleitoral gratuito. A seguir, vem a frase-argumento: A razão disso é bastante simples: essa praga

que invade diariamente os lares brasileiros transformou-se no maior tormento para as pessoas que têm,

no rádio ou na tevê, sua principal fonte de lazer. Observe-se que essa frase está articulada com a tese por

meio da expressão articuladora de causa: A razão disso é bastante simples. Essa frase poderia vir

justaposta à frase-tese, ou seja, sem a presença da expressão articuladora.As frases seguintes, com

exceção da última, são as frases-comentário, destinadas a demonstrar o tormento em que se transformou a

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vida dos ouvintes de rádio e dos telespectadores, em virtude do horário eleitoral gratuito. A última frase

constitui a conclusão do parágrafo.

O texto (5) apresenta estrutura semelhante. A primeira frase é a frase-tese: Os semáforos em Sete

Lagoas parecem coisa de maluco. A segunda é a frase-argumento: Em todos os cruzamentos onde estão

presentes, esses sinais luminosos ficam, a maior parte do tempo, fechados para todas as direções . A

articulação dessa frase com a frase-tese apresenta uma diferença em relação à do texto (4): aqui não

aparece nenhuma palavra ou expressão articuladora. A articulação se dá por justaposição. A seguir, vêm

as frases-comentário, que tentam demonstrar a veracidade do que se afirmou sobre os sinais luminosos e

as conseqüências que isso traz para o trânsito da cidade. Assim como no texto anterior, a última frase

constitui a conclusão do parágrafo.

2.4 A frase-conclusão

A frase que funciona como conclusão do parágrafo não passa de uma frase-tese que não será

desenvolvida. É preciso ter em mente que uma frase de conclusão não é, como muitos pensam, uma

repetição da frase-tese. Na verdade, a frase de conclusão deve estar articulada com a frase-tese. Essa

articulação deve ser percebida pela referência que se faz novamente ao assunto e à tese. Além disso, a

frase de conclusão é, geralmente, introduzida por palavras ou expressões apropriadas para estabelecer a

relação lógica de conclusão, conseqüência, dedução, constatação, confirmação, exortação, síntese, etc.

Por isso, são bastante empregadas na conclusão palavras ou expressões como portanto, então, assim,

como se vê, dessa forma, etc.

É muito comum, na conclusão, a apresentação de uma sugestão, ou advertência, ou conselho, ou

declaração de apoio ou de contestação em relação ao assunto debatido. É por isso que uma frase-tese

pode, perfeitamente, ser usada como conclusão. Observem-se as duas frases abaixo, sugeridas como

frases-tese:

(6) A idéia do prefeito municipal de proibir o trânsito de veículos em torno da Lagoa Paulino nos finais de

semana é inexeqüível.

(7) A idéia do prefeito municipal de proibir o trânsito de veículos em torno da Lagoa Paulino nos finais de

semana deveria ser esquecida.

A primeira afirma que a idéia do prefeito é... A segunda afirma que a idéia do prefeito deveria

ser... A primeira expressa um julgamento definitivo; a segunda apresenta uma atitude a ser (ou não)

assumida. Observe-se que, se uma delas for usada como tese, a outra pode, perfeitamente, ser usada como

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conclusão. Basta usar adequadamente um dos articuladores de conclusão e reafirmar, com outras

palavras, o que foi declarado na tese.

Observem-se as duas possibilidades abaixo:

(8) A idéia do prefeito municipal de proibir o trânsito de veículos em torno da Lagoa Paulino nos finais de semana é inexeqüível. ......................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................... Dessa forma, essa idéia deveria ser esquecida.

Portanto, essa proibição Melhor seria, então, que tal idéia fosse Como se vê, essa idéia Etc.

(9) A idéia do prefeito municipal de proibir o trânsito de veículos em torno da Lagoa Paulino nos finais de semana deveria ser esquecida. ...................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................... ............................................ Como se vê, essa idéia é inexeqüível. Vê-se, portanto, que essa idéia Etc.

É claro que há outras formas de conclusão, mas o que não se pode esquecer é que a conclusão do

texto não é conclusão do desenvolvimento. Ela é decorrente da tese e com ela deve estar articulada. Isso

não significa, porém, que ela não esteja articulada com o desenvolvimento. É claro que está: todas as

partes do texto devem estar articuladas entre si. No texto (5), por exemplo, a conclusão está articulada

com a tese por intermédio do articulador portanto e principalmente pelo emprego das palavras assunto e

problema, que remetem ao que se declara na frase-tese.

Pode-se dizer que um texto argumentativo apresenta uma estrutura semelhante a um sanduíche. A

frase-tese e a frase de conclusão correspondem às duas partes em que se divide o pão. A argumentação,

formada pelas frases-argumento e pelas frases-comentário, constituem o recheio. Embora a qualidade do

pão seja muito importante, o sanduíche se torna melhor ou pior de acordo com o recheio. No caso da

argumentação, se o recheio é fraco, o texto torna-se insosso, sem substância, não convence, não persuade,

não agrada. A argumentação bem feita é a alma do texto argumentativo, é a sua substância. Como já foi

dito anteriormente, a informatividade no texto argumentativo corresponde à argumentatividade.

De tudo isso, deve ficar claro, para quem escreve, que a introdução (frase-tese) e a conclusão de

um texto devem se articular de tal maneira, que formem um todo, ainda que seja retirada a parte

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Page 16: Manual de Reda o

correspondente ao desenvolvimento. Observe-se como, nos textos (4) e (5), a frase-tese e a frase-

conclusão se completam como um todo:

(4) Deveria ser extinto, para sempre, do rádio e da televisão, o horário eleitoral gratuito. Assim,

melhor seria se aparecesse alguém descompromissado com a politicagem e com bom-senso bastante para

livrar o telespectador de tão grande castigo.

(5) Os semáforos em Sete Lagoas parecem coisa de maluco. Seria muito oportuno, portanto, que o

responsável pelo assunto mostrasse um interesse maior e competência bastante para resolver o problema.

2.5 O parágrafo argumentativo de vários argumentos

Quando se desenvolve um parágrafo argumentativo com base em mais de um argumento, é preciso

deixar bem claro, ao se introduzir um novo argumento, que isso está sendo feito. Para isso, é

indispensável o uso de mecanismos discursivos que evidenciem a mudança. Palavras como também,

ainda, outro, um segundo, um terceiro, etc. podem demonstrar claramente que se vai tratar de um novo

argumento. Além disso, é importante fazer a articulação com a tese. Essa articulação é conseguida quando

se faz nova referência ao assunto e à essência da tese, ou seja, quando se retorna à frase-tese,

reafirmando-a com outras palavras. O esquema apresentado a seguir dá uma idéia de como isso se realiza:

A estrutura do parágrafo dissertativo de vários argumentos

1. Frase-tese:

Para a própria sobrevivência do futebol brasileiro, é fundamental que se proíba a presença de torcidas

organizadas nos estádios.

2. Argumentos:

predisposição para a violência;

indução à violência dentro de campo;

obscenidades;

afastamento das pessoas de bem;

formação de gangues;

vandalismo;

etc.

3. Formas de introduzir um novo argumento, fazendo a articulação com a frase-tese:

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Page 17: Manual de Reda o

Uma outra justificativa para a proibição de torcedores uniformizados dentro dos estádios é que ...

Proibir de vez a presença de torcidas organizadas nos campos brasileiros é importante, também, pelo

fato de que esse tipo de torcedor...

Banir, para sempre, dos estádios brasileiros, esses fanáticos torcedores seria, também, uma forma de ...

Outra razão fundamental para se impedir que essa massa uniformizada tome conta dos campos de

futebol no País é o fato de que, quando juntos, esses torcedores...

É importante, ainda, o afastamento das várias facções das torcidas organizadas de todos os estádios

brasileiros pelo fato de que...

4. Conclusão:

Como se vê, se não for tomada uma atitude drástica...

Urge, portanto, que...

A solução talvez esteja, portanto, em...

A realidade mostra, no entanto, que...

Tudo isso, entretanto, não parece preocupar aqueles que...

O problema só poderá ser resolvido, contudo, se...

Diante desse quadro, não se pode adiar...

5. Montagem do parágrafo:

(10) Para a própria sobrevivência do futebol brasileiro, é fundamental que se proíba a presença de torcidas organizadas nos estádios. Essa massa de torcedores fanáticos demonstra, quase sempre, uma incomum predisposição para a prática da violência. Raro é o fim de semana em que não se vêem, nos principais noticiários, os tristes números da estatística da violência nos campos de futebol. O fato de estarem uniformizados, seja com a camisa de seu time, seja com a da própria torcida, parece fanatizar, ainda mais, essas pessoas e torná-las dispostas a enfrentar qualquer desafio, quaisquer que sejam as conseqüências. Em grupo, pessoas assim tornam-se irresponsavelmente corajosas, ousadas, irreverentes e chegam facilmente à selvageria, quando a paixão clubística se sobrepõe à razão e ao bom-senso. Uma outra justificativa para a proibição de torcedores uniformizados dentro dos estádios são as obscenidades em que se transformaram seus gritos de guerra. Vestidos com as cores de seu time e incentivados pelo anonimato proporcionado pela multidão, esses bárbaros irresponsáveis e indecentes deliram freneticamente e se inebriam com os sonoros palavrões com que parecem alimentar seu instinto sanguinário. É deprimente o espetáculo proporcionado por esse tipo de torcedor àqueles que vão ao estádio pelo puro prazer de estar ali, com a família ou com amigos, à procura de uma diversão sadia e relaxante. Proibir de vez a presença de torcidas organizadas nos campos brasileiros é importante, também, pelo fato de que esse tipo de torcedor afasta dos campos as pessoas de bem. Indignados com tanta demonstração de brutalidade e impotentes para impedir tudo o que de mau ocorre nos estádios, os torcedores pacatos, verdadeiros amantes do futebol e admiradores do grandioso espetáculo que esse esporte pode proporcionar, abandonam, pouco a pouco, o hábito de assistir, ao vivo, aos jogos do seu time. Afinal, é muito mais cômodo e seguro acompanhar as partidas pela televisão. É claro que a emoção não é a mesma, mas, em casa, fica-se a salvo de grosserias, agressões e de outras atitudes inconvenientes, que, incompreensivelmente, infestam os campos de futebol. Como se vê, se não for tomada uma atitude drástica, os clubes brasileiros poderão se tornar vítimas dessa paixão doentia que lhes nutrem essas torcidas (des)organizadas e correrão o risco de até mesmo desaparecer como entidades capazes de despertar no povo a simpatia, a emoção, o amor e o orgulho, que o verdadeiro torcedor cultiva por eles.

É importante notar que cada argumento deve ser desenvolvido, explicado, demonstrado,

amplificado, detalhado pelas frases-comentário.

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3. O texto argumentativo de vários parágrafos

O que vai determinar se um texto vai ser constituído de um ou mais parágrafos é a tese. Explica-

se. Pode-se fazer com que a tese seja apenas uma frase-tese ou um parágrafo-tese. Se ela for apenas uma

frase de um parágrafo, o texto deverá ser todo desenvolvido em apenas um parágrafo. Se, ao contrário, a

tese for apresentada como um parágrafo à parte, o texto deverá ser desenvolvido em vários parágrafos.

Nesse caso, cada argumento deverá constituir um parágrafo. O mesmo ocorrerá com a conclusão, que

constituirá, também, um parágrafo à parte.

Tome-se, como exemplo, o texto (10). Nesse texto, optou-se pelo desenvolvimento em um único

parágrafo. A tese foi usada apenas como uma frase do parágrafo. Trata-se, assim, de uma frase-tese.

Observe-se, ainda, que, nesse caso, cada argumento é apresentado como uma frase do mesmo parágrafo.

Trata-se, então, de frases-argumento. Finalmente, a conclusão é também apresentada como uma frase do

mesmo parágrafo. É a frase-conclusão. As frases-comentário, é claro, acompanham os argumentos a que

se referem. Entretanto, esse mesmo texto pode ser desenvolvido em vários parágrafos. Usa-se a frase-tese

como parágrafo-tese; cada frase-argumento, como parágrafo-argumento; e a frase-conclusão, como

parágrafo-conclusão.

Nada impede que o parágrafo de introdução (parágrafo-tese) e o de conclusão sejam constituídos

de uma só frase cada um. Os parágrafos de desenvolvimento (parágrafos-comentário), porém, devem

apresentar uma estrutura mais complexa, pois só se consegue convencer ou persuadir o leitor através dos

argumentos que ali devem ser desenvolvidos. Embora não seja obrigatório, o ideal seria que cada

parágrafo-argumento fosse um parágrafo-padrão, isto é, que cada um deles tivesse sua própria tese,

argumentos, comentários e conclusão. Veja-se como o texto (10) ficaria se estivesse desenvolvido em

cinco parágrafos:

(10b) Para a própria sobrevivência do futebol brasileiro, é fundamental que se proíba a presença de torcidas organizadas nos estádios.

Essa massa de torcedores fanáticos demonstra, quase sempre, uma incomum predisposição para a prática da violência. Raro é o fim de semana em que não se vêem, nos principais noticiários, os tristes números da estatística da violência nos campos de futebol. O fato de estarem uniformizados, seja com a camisa de seu time, seja com a da própria torcida, parece fanatizar, ainda mais, essas pessoas e torná-las dispostas a enfrentar qualquer desafio, quaisquer que sejam as conseqüências. Em grupo, pessoas assim tornam-se irresponsavelmente corajosas, ousadas, irreverentes e chegam facilmente à selvageria, quando a paixão clubística se sobrepõe à razão e ao bom-senso. De fato, esse tipo de torcedor tem causado muitos problemas de violência nos dias de grandes jogos.

Uma outra justificativa para a proibição de torcedores uniformizados dentro dos estádios são as obscenidades em que se transformaram seus gritos de guerra. Vestidos com as cores de seu time e incentivados pelo anonimato proporcionado pela multidão, esses bárbaros irresponsáveis e indecentes deliram freneticamente e se inebriam com os sonoros palavrões com que parecem alimentar seu instinto sanguinário. É deprimente o espetáculo proporcionado por esse tipo de torcedor àqueles que vão ao estádio pelo puro prazer de estar ali, com a família ou com amigos, à procura de uma diversão sadia e relaxante. Infelizmente, as obscenidades tornaram-se marca registrada de grande parte das torcidas organizadas.

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Proibir de vez a presença de torcidas organizadas nos campos brasileiros é importante, também, pelo fato de que esse tipo de torcedor afasta dos campos as pessoas de bem. Indignados com tanta demonstração de brutalidade e impotentes para impedir tudo o que de mau ocorre nos estádios, os torcedores pacatos, verdadeiros amantes do futebol e admiradores do grandioso espetáculo que esse esporte pode proporcionar, abandonam, pouco a pouco, o hábito de assistir, ao vivo, aos jogos do seu time. Afinal, é muito mais cômodo e seguro acompanhar as partidas pela televisão. É claro que a emoção não é a mesma, mas, em casa, fica-se a salvo de grosserias, agressões e de outras atitudes inconvenientes, que, incompreensivelmente, infestam os campos de futebol. Assim, o melhor mesmo é manter distância dos estádios, onde pessoas assim mandam e desmandam impunemente.

Como se vê, se não for tomada uma atitude drástica, os clubes brasileiros poderão se tornar vítimas dessa paixão doentia que lhes nutrem essas torcidas (des)organizadas e correrão o risco de até mesmo desaparecer como entidades capazes de despertar no povo a simpatia, a emoção, o amor e o orgulho, que o verdadeiro torcedor cultiva por eles.

É claro que, se o texto é muito longo, deve-se preferir o desenvolvimento em vários parágrafos,

tomando-se o cuidado para que a estrutura seja a adequada.

4. Como desenvolver bem os argumentos

Garcia (1982: 214-230)1 sugere as seguintes estratégias para o desenvolvimento do parágrafo:

enumeração ou descrição de detalhes, confronto, analogia e comparação, citação de exemplos, causação

e motivação, razões e conseqüências, causa e efeito, divisão e explanação de idéias “em cadeia”,

definição. O tipo de desenvolvimento do parágrafo e, logicamente, dos argumentos, entretanto, vai

depender muito do objetivo proposto na frase-tese. É preciso ter em mente que os argumentos são

apresentados como comprovantes ou demonstração do que se declarou na tese. Assim, num mesmo texto

ou até num mesmo parágrafo, pode-se empregar uma ou mais dessas estratégias. O importante é que cada

argumento deve ser bem trabalhado para que seja aceito pelo alocutário.

Apontadas por Garcia (op.cit.: 185-189) como práticas a serem adotadas para o

enriquecimento do vocabulário, a amplificação e a paráfrase constituem recursos importantíssimos da

produção textual: a primeira, como estratégia muito eficaz no desenvolvimento do texto; a segunda, como

recurso indispensável na contestação de opiniões. É o que se pretende demonstrar a seguir.

4.1 Amplificação

Criticada, às vezes, como figura de retórica, não se pode negar, entretanto, que a amplificação seja

um ótimo recurso para desenvolver um argumento. “Ela consiste em repetir, alongar, estirar uma idéia ou

tema, por meio de circunlóquios, de diferentes torneios de frases, definições sinonímicas, metáforas, ou

símiles excessivos e ociosos, além de outros adornos de linguagem que se esgotam em si mesmos”. (Op.

cit.: 187). Vejam-se alguns exemplos de amplificação selecionados pelo autor (Op. cit.: 187-189):

1 GARCIA, Othon Moacir. Comunicação em prosa moderna: aprenda a escrever, aprendendo a pensar. 10 ed. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas: 1982.

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(11) A vida

A vida é o dia de hoje,A vida é o ai que mal soa,A vida é nuvem que voa,A vida é sonho tão leve,Que se desfaz como a neve.A vida dura um momento.Mais leve que o pensamento, A vida, leva-a o vento. A vida é folha que cai.A vida é flor na corrente,A vida é sopro suave, A vida é estrela cadente, Voa mais leve que a ave.Nuvem que o vento nos mares,Uma após outra lançou,A vida – pena caídaDa asa de ave ferida –De vale em vale impelida,A vida, o vento a levou. (João de Deus, “A Vida”, Campos de flores)

(12) A pátria não é ninguém, são todos; e cada qual tem no seio dela o mesmo direito à idéia, à palavra, à associação. A pátria não é um sistema, nem uma seita, nem um monopólio, nem uma forma de governo; é o céu, o solo, o povo, a tradição, a consciência, o lar, o berço dos filhos e o túmulo dos antepassados, a comunhão da lei, da língua, da liberdade. Os que a servem são os que não invejam, os que não infamam, os que não conspiram, os que não sublevam, os que não delatam, os que não emudecem, os que não se acobardam, mas resistem,mas esforçam, mas pacificam, mas discutem, mas praticam a justiça, a admiração, o entusiasmo. (Rui Barbosa)

(13) A pátria não é a terra; não é o bosque, o rio, o vale, a montanha, a árvore, a bonina: são-no os atos,

que esses objetos nos recordam na história da vida; é a oração ensinada a balbuciar por nossa mãe, a

língua em que, pela primeira vez, ela nos disse: - Meu filho!” (Alexandre Herculano)

Vejam-se outros textos em que a amplificação está presente:

(14) Mudar é preciso

Às vezes, as mudanças podem ser benéficas para um grupo. A mesmice, a rotina, a pasmaceira levam à acomodação, ao enfado e, conseqüentemente, à estagnação. O pior é que quem faz sempre a mesma coisa passa a fazê-la sem refletir, sem analisar o que está sendo feito e como está sendo feito. Acha que o faz da melhor maneira possível. Afinal, já o fez tantas vezes daquela mesma forma, que não consegue imaginar ser possível haver outra maneira de fazê-lo. Por isso, resiste a mudanças. Mudar traz sofrimento. Incomoda. Deixa sempre a impressão de que o trabalho feito não está agradando. Mudar implica assumir uma certa deficiência. Implica reconhecer que alguma coisa não vai bem. Mudar implica reavaliar, reprogramar, alterar cursos, fixar novos objetivos. Reciclar, enfim. Mudar é sempre um recomeço. A adoção de uma nova filosofia de vida. Mudar dói, mas, na mudança, pode estar a salvação de um trabalho. Pode estar a salvação de um projeto de vida.

Talvez seja essa a atitude que pode salvar o Cruzeiro. Pode ser que não, mas a impressão que se tem é que ali falta motivação para vôos mais altos. Motivação ou coragem. Talvez a segunda. Talvez falte a

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coragem de acreditar mais na própria capacidade. Talvez falte a coragem de acreditar que se trata de um clube grande. Talvez falte a coragem de agir como um dos grandes do futebol brasileiro. Se isso é verdade, está na hora de mudar. E nem será tão difícil assim. Umas quatro ou cinco contratações de peso poderiam resolver o problema. Na verdade, umas quatro mudanças em posições estratégicas poderiam fazer do Cruzeiro, outra vez, um clube vencedor. E não venham dizer que, a essa altura, é impossível contratar. E não venham dizer que não se podem cometer loucuras, que não se pode concorrer com o mercado europeu. E não venham dizer que, no mercado nacional, não se encontram nomes capazes de tirar o Cruzeiro dessa situação vexatória. Quatro mudanças apenas seriam o bastante. Quatro contratações para as posições mais carentes: um presidente, um vice-presidente, um diretor de futebol e um assessor de imprensa. Será que é pedir muito?

Ou se mudam os nomes ou se muda a mentalidade, mas urge que se mude, drasticamente, a perigosa trajetória seguida pelo Cruzeiro. (Carlos de Deus. Tribuna do Torcedor. Estado de Minas. Belo Horizonte: 2005).

(15) [...] Manter-se firme e constante em seus ideais. Manter-se firme e constante em seus propósitos. Manter-se firme e constante em sua crença. Manter-se firme e constante na busca de uma base sólida para a construção do interminável edifício do saber. Isso é perseverar. Isso é perseverança.

E é a perseverança dos que não se abatem diante dos obstáculos. É a perseverança dos que crescem diante dos problemas. É a perseverança dos fazem das adversidades um motivo maior para a superação, que não se nega, que não se omite, que não se esconde, mas mostra-se em sua plenitude, fruto que é do trabalho de gente comprometida com o propósito de vencer.

E é a mesma perseverança que, em certo momento, espantou as incertezas. A mesma perseverança que, em certo momento, desfez as dúvidas. A mesma perseverança que, em certo momento, afastou o medo de um fracasso tão doloroso quanto real. Mais que ninguém, vocês sabem que a jornada nem sempre foi feita só de sucessos. Houve desencontros. Houve desvios. Houve desacertos. Houve momentos em que a insegurança fez surgir a dúvida quanto à concretização de um ideal. Não foram raros os momentos de desânimo, de intranqüilidade, de quase desespero. A perseverança encarregou-se de dissipar as dúvidas, de demarcar o caminho e de trazer a retomada de rota, que conduziu à vitória [...] (Valdemar Carlos de Deus. Trecho de discurso proferido na solenidade de formatura do Curso de Letras da Fafisete em dezembro de 2005)

O desenvolvimento por meio de apresentação de exemplos ou ilustração também é forma de

amplificação. Garcia considera exemplos os fatos típicos ou representativos de uma determinada situação.

Um exemplo típico da insegurança das pessoas diante da crescente criminalidade é a também crescente

instalação de equipamentos de proteção como alarmes e cercas elétricas nas residências. Assim, um

parágrafo que tivesse como frase-tese a declaração de que as pessoas sentem-se cada vez mais inseguras

diante da crescente criminalidade poderia apresentar como exemplo, no desenvolvimento, a crescente

procura e instalação de equipamentos de proteção como alarmes e cercas elétricas nas residências. A

amplificação ficaria por conta das frases-comentário, usadas para demonstrar a veracidade do fato

apresentado como exemplo e apontar conseqüências possíveis ou prováveis desse fato.

É importante ressaltar que o fato apontado como exemplo não precisa ser obrigatoriamente um

fato real. Pode ser hipotético. Nesse caso, será mostrado o que poderia ocorrer ou certamente ocorreria se

uma determinada situação ocorresse. É claro que, embora hipotético, o fato teria de ter verossimilhança e

estar de acordo com a idéia que se quer defender.

A introdução de um fato hipotético como argumento deve ser feita com o uso de expressão que

deixe claro tratar-se de uma hipótese. Podem ser empregadas frases como as seguintes: Imagine-se a

seguinte situação..., Suponha-se o seguinte..., Considere-se a seguinte hipótese..., etc.

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Nem é preciso dizer que o parágrafo ou o texto assim desenvolvidos devem apresentar uma

conclusão que expresse a lógica de ter sido apresentada aquela situação hipotética para comprovação do

que foi declarado na tese.

Garcia chama de ilustração o desenvolvimento feito com base em exemplo que se “alonga em

narrativa detalhada e entremeada de descrições.” (Op. cit.: p. 372)

É evidente que existem incontáveis outras formas de desenvolvimento do parágrafo. Quase sempre

a escolha de uma ou de outra vai depender do objetivo que se tem em mente ao se produzir um texto.

Conforme demonstrado anteriormente, a frase-tese já deve ser preparada de acordo com esse objetivo.

4.2 Paráfrase

Segundo Garcia (1982, p. 185) a paráfrase consiste no desenvolvimento explicativo (ou

interpretativo) de um texto. Para o autor,

(16) [...] paráfrase corresponde a uma espécie de tradução dentro da própria língua, em que se diz, de maneira mais, clara num texto B o que contém um texto A, sem comentários marginais, sem nada acrescentar e sem nada omitir do que seja essencial, tudo feito com outros torneios de frases e, tanto quanto possível, com outras palavras, de tal forma que a nova versão, que pode ser sucinta sem deixar de ser fiel – evidencie o pleno entendimento do texto original. (Op. cit., p.185)

É importante destacar que, ao parafrasear um texto, a pessoa pode fazê-lo assumindo como suas as

declarações feitas no texto original ou atribuí-las a quem, de fato, é responsável por elas. Observe-se, por

exemplo, o texto abaixo:

(17) 2 000 reais por segundo

O computador da mesa de trabalho de Michel Klein, comandante-em-chefe das Casas Bahia, tem um medidor mostrando on line o faturamento das 460 lojas do grupo. O “velocímetro” roda em média a incríveis 2 000 reais por segundo. Isso mesmo: por segundo. Ou seja, no tempo em que você leu esta nota, as Casas Bahia já faturaram 50 000 reais.” (Veja, 14-09-2005)

Assumindo como suas as declarações presentes no texto acima, a pessoa poderia apresentar a

seguinte paráfrase:

(18) 2 000 reais por segundo

No escritório de Michel Klein, comandante-em-chefe das Casas Bahia, um computador provido de um medidor mostra on line que o faturamento das 460 lojas do grupo gira em torno de 2 000 reais por segundo. Ou seja, a empresa fatura uns 50 000 reais durante o tempo que se gasta para ler esta nota.

Caso não se queira assumir a responsabilidade por tais declarações, deve-se atribuí-las ao

verdadeiro responsável por elas. Nesse caso, a paráfrase poderia ficar assim:

(19) 2 000 reais por segundo

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De acordo com uma nota publicada na edição de 14-09-2005 de Veja, um computador provido de um medidor instalado no escritório de Michel Klein, comandante-em-chefe das Casas Bahia, mostra on line o faturamento das 460 lojas do grupo. Segundo a revista, o faturamento alcança a incrível marca de 2000 reais por segundo. “Ou seja, no tempo em que você lê esta nota, as Casas Bahia já faturaram 50 000 reais”, admira-se o repórter.

Observe-se aí o uso das formas dicendi. Isto é, de verbos, nomes ou expressões usadas para

indiciar a voz de outrem no texto. Conforme se afirmou anteriormente, às vezes é vantajoso assumir como

próprias as declarações. Outras vezes, porém, é preferível ou até mesmo necessário deixar claro que elas

devem ser atribuídas a outrem. Nesse caso, deve-se fazer uso das formas dicendi e torna-se

importantíssimo saber escolher a forma adequada a ser empregada. De acordo com Garcia (op.cit., p.131),

os verbos dicendi pertencem a nove áreas semânticas:

a) de dizer: afirmar, declarar; e) de concordar: assentir, anuir;

b) de perguntar: indagar, interrogar; f) de exclamar: gritar, bradar;

c) de responder: retrucar, replicar; g) de pedir: solicitar, rogar;

d) de contestar: negar, objetar; h) de exortar: animar, aconselhar;

i) de ordenar: mandar, determinar

Existem outros, entretanto, mais específicos, mais caracterizadores da fala: acrescentar, acudir,

ajuntar, ameaçar, arriscar, aprovar, atalhar, balbuciar, berrar, bramir, cochichar, concluir, contrapor,

comentar, consentir, convidar, continuar, cumprimentar, desculpar, dissentir, esclarecer, escusar-se,

estranhar, explicar, insistir, intervir, inquirir, justificar-(se), lembrar, murmurar, opor-(se), propor,

prosseguir, protestar, questionar, repetir, rosnar, sussurrar, segredar, sugerir, soluçar, etc.

Além de verbos, há outras formas dicendi, tais como: segundo (afirma) Fulano..., na opinião de...,

Para Fulano..., No entendimento de Fulano..., De acordo com as palavras de Fulano..., etc.

Conforme se verá a seguir, o uso de formas dicendi é indispensável quando se desenvolve uma

contestação.

5 Contestação

Às vezes, o texto argumentativo não se limita a defender um ponto e vista. É o que acontece, por

exemplo, quando se tem de contestar a opinião ou as alegações de alguém. Quando se trata de refutar uma

23

Page 24: Manual de Reda o

opinião, é fundamental expor para o leitor o que pensa sobre o assunto a pessoa cuja opinião vai ser

contestada. A partir daí, faz-se uma declaração em que se deixa claro que tal opinião não pode ser aceita.

Suponha-se, por exemplo, que o presidente Lula tenha expressado a seguinte opinião sobre a existência

do mensalão:

(20) “A existência do mensalão é uma invenção das elites para desestabilizar o governo.”

Quem quisesse contestar essa opinião poderia fazê-lo assim:

(21) A declaração do presidente Lula segundo a qual a existência do mensalão é uma invenção das elites para desestabilizar o governo não merece consideração. não procede não tem cabimento não pode ser aceita é descabida etc.Ou então:

(22) O presidente Lula acredita que a existência do mensalão é uma invenção das elites para desestabilizar o governo. Esse entendimento, porém, não tem lá muita lógica. não merece consideração não procede não tem cabimento etc.

A partir daí, devem ser desenvolvidos os argumentos que demonstrem o equívoco do presidente de

pensar assim.

Conforme se afirmou anteriormente, a opinião a ser contestada deve vir expressa na contestação.

Para que isso seja possível, há de ser empregada uma forma dicendi que deixe claro tratar-se de uma

opinião alheia:

Dizem que... Na opinião de alguns...

Fulano afirmou que... Há quem diga que...

Muitos acreditam que... Segundo Fulano...

Às vezes, para contestar uma opinião, pode-se concordar em parte com ela ou fingir concordar

com ela para, em seguida, mostrar que ela é equivocada. Garcia (op. cit.) chama isso de concordância

parcial. Funciona mais ou menos assim:

24

Page 25: Manual de Reda o

(23) Muitos afirmam que a decisão do governo de proibir o jogo no Brasil sustenta-se em uma concepção totalmente ultrapassada de como se deve governar um país. Pode ser que, em parte, tenham razão. De fato, nos países mais desenvolvidos, o jogo costuma ser livre. Isso, entretanto, não significa que a proibição do jogo seja uma atitude incorreta ou ultrapassada.

A partir daí, desenvolvem-se os argumentos contrários à liberação do jogo.

Outras vezes, a contestação não se restringe a atacar uma simples opinião ou declaração. Às vezes,

a opinião a ser contestada vem acompanhada de argumentos e de outras declarações. Nesse caso, cada

argumento e cada declaração devem ser contestados individualmente. Suponha-se que alguém expresse a

seguinte opinião sobre a reserva de vagas:

(24) É um absurdo a reserva de vagas nas universidades brasileiras para alunos egressos de escola pública. Nada justifica privilegiar esses alunos e dispensá-los de uma seleção mais rigorosa. O sistema mais justo é o vestibular, nos moldes tradicionais. Na verdade, se alguém deve ter direito a uma reserva desse tipo, são aqueles que estudaram em escolas particulares. Os outros já tiveram estudo gratuito no ensino fundamental e no ensino médio; por isso, não há por que garantir-lhes compulsoriamente a vaga no ensino público superior, a não ser que enfrentem a concorrência em igualdade de condições com os demais. O sistema de quotas proposto pelo governo deveria ser esquecido. (João Silva, O Globo, 24-09-2005)2

Suponha-se, agora, que se queira contestar essa opinião. Nesse caso, uma boa técnica é ir

relatando o que é alegado pelo autor e sucessivamente ir refutando cada uma das alegações ou

argumentos apresentados. No relatório devem ser empregados os verbos ou outra forma dicendi; na

contestação devem ser usadas frases que demonstrem o equívoco das alegações ou argumentos

apresentados.

No relatório: Na contestação:

Formas dicendi Frases de contestação

Diz Engana-se.Alega É um erro pensar assim.Afirma Ledo engano.Sustenta Equivoca-se.Entende Triste equívoco.Considera Foi infeliz, entretanto, o autor em pensar assim.Julga Nada mais errôneo.Pensa Não merece consideração, entretanto, esse entendimento.Declara Pura ilusão do autor.Para o autor Na verdade, porém, trata-se de um grande engano.Segundo Fulano Não se pode aceitar tamanho equívoco.No entender de Fulano Etc.Etc.

Obs.: Palavras como também e ainda podem acompanhar essas formas dicendi quando se quer deixar

claro que se trata de mais uma declaração.

2 Autor e edição fictícios. Citados apenas para introduzir a voz que será contestada.

25

Page 26: Manual de Reda o

Observe-se como poderia ser contestada a opinião acima defendida por João Silva:

(25) O senhor João Silva afirma, na edição de 24-09-2005 do jornal O Globo, que é um absurdo a reserva de vagas para alunos egressos de escola pública nas universidades brasileiras. Puro engano. Na verdade, a reserva de vagas é uma medida das mais justas e eficazes para tentar dar às classes sociais menos favorecidas a oportunidade de lutar pela sobrevivência com uma possibilidade um pouquinho maior de sucesso. Considera o senhor João Silva que nada justifica privilegiar esses alunos e dispensá-los de uma seleção mais rigorosa. É um erro pensar assim. Se a vida não lhes oferece condições de se preparar adequadamente para concorrer com aqueles a quem a sorte já forneceu as melhores armas para buscar a vitória, cabe ao governo equilibrar um pouco a disputa e proporcionar-lhes uma chance real de ser bem sucedidos.

Segundo o autor, o sistema mais justo ainda é o vestibular nos moldes tradicionais. Nada mais errôneo. Essa forma tradicional de seleção privilegia os já privilegiados socialmente. É excludente. Não dá a menor chance a quem não tem meios materiais de se preparar adequadamente. Por mais que a escola pública tente dar ao aluno um ensino de qualidade, uma série de fatores que fogem ao seu controle atua de modo decisivo para impedir a concretização das melhores propostas defendidas pela escola.

No entender ainda do autor, se alguém tem direito a uma reserva de vaga, são os provenientes de escola particular. Alega ele que os outros já tiveram estudo gratuito no ensino fundamental e no ensino médio e que, por isso, sua vaga só pode ser garantida através da concorrência em igualdade de condições com os demais. Ora, tal argumento não merece maiores considerações. O fato de terem estudado em escolas particulares, em que o ensino é reconhecidamente melhor, é prova inequívoca de que os alunos oriundos do ensino particular já são privilegiados pela vida, e a eles já costumam ser reservados os melhores lugares. Reservar-lhes compulsoriamente um lugar nas universidades públicas seria tripudiar sobre a desventura dos mais humildes, que concorrem em condições desumanas.

Assim, ao contrário do que alega o senhor João Silva, o sistema de cotas proposto pelo governo deve ser levado adiante e executado com todo o rigor.

6 A pontuação do texto

Um problema que merece uma atenção maior por parte dos professores que desenvolvem o ensino

de produção de textos escritos é a dificuldade demonstrada por grande parte dos alunos para encontrar

elementos articuladores adequados na retomada e na progressão textual. Os manuais de redação em geral

alertam para os problemas de referenciação advindos do uso de frases muito longas. Por isso, esses

manuais sempre aconselham o emprego de frases curtas.

De fato, a preferência pelas frases longas vem-se constituindo numa característica de textos

produzidos por pessoas pouco experientes na prática de produção de textos. Muitas vezes, essas pessoas,

ao redigir, tentam, em uma única frase, declarar, justificar, explicar, apontar causas e conseqüências e, às

vezes, até tirar conclusões. É claro que, embora não seja impossível fazer isso tudo em uma só frase, o

resultado dificilmente será satisfatório. Quase sempre o texto assim estruturado se torna confuso e pouco

ou nada convincente. Construindo-se várias frases mais curtas em vez de uma longa, dá-se mais clareza

ao texto, facilita-se a leitura e a compreensão. Por isso, é comum os professores pedirem aos alunos que

façam frases curtas. O problema é que, geralmente, o aluno demonstra muita dificuldade em aprender a

fazer esse tipo de frase. Fazer frase curta implica saber usar ponto final. Implica saber iniciar uma nova

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Page 27: Manual de Reda o

frase, articulando-a corretamente com uma anterior. Um dos fatores responsáveis por essa dificuldade é a

pouca ou nenhuma prática demonstrada pelos alunos no uso de substitutos textuais; elementos anafóricos

e elementos catafóricos adequados; elementos dêiticos apropriados; pró-formas nominais, verbais,

adverbiais; hipônimos; hiperônimos; conectivos e operadores argumentativos diversos; responsáveis, em

grande parte, pela coesão do texto.

Saber usar ponto final implica dominar algumas noções básicas do processo de coordenação e do

processo de subordinação, conforme se demonstrará a seguir.

6.1 Coordenação X Subordinação

Pode-se atribuir à palavra texto o significado de tecido. Isso porque, na tessitura de um texto,

entrelaçam-se palavras, sintagmas, orações, frases e até parágrafos. Pode-se dizer que, num texto, haverá

sempre a articulação entre as palavras, que formam os sintagmas; entre os sintagmas, que formam as

orações; entre as orações, que formam o período; entre os períodos, que formam os parágrafos; e até entre

os parágrafos, que formam o texto complexo3. Essa articulação, que constitui o tecido do texto, pode ser

de elementos temáticos ou de elementos estruturais.

Sintaticamente ou estruturalmente falando, a articulação entre as palavras, entre os sintagmas,

entre as orações, entre as frases e também entre os parágrafos de um texto é feita por dois processos:

coordenação e subordinação.

Tome-se, como exemplo, a palavra casa. Sozinha, essa palavra não se articula com nenhuma

outra. Acrescente-se, agora, uma outra palavra que se articule com ela, como nos exemplos (26) e (27):

(26) casa, carro

(27) casa branca

Observe-se que, em (26), a palavra acrescentada (carro) não especifica o tipo de casa. Nem a

palavra (casa) especifica o tipo de carro. Na verdade, as duas palavras formam uma lista de duas coisas

distintas: casa e carro.

Em (27), a palavra acrescentada (branca) especifica o tipo de casa. Não se trata de uma casa

qualquer, mas de uma casa branca. Observe-se que, nesse caso, as duas palavras não formam uma lista,

não falam de duas coisas distintas, mas de uma só: uma casa branca.

Em (26), a articulação entre as duas palavras se dá por coordenação. Em (27), a articulação se dá

por subordinação.

3 É claro que se está falando aqui do texto que apresenta uma estrutura mais complexa, constituído por um ou mais parágrafos. Essa observação se justifica pelo fato de que há textos constituídos por apenas uma palavra ou por apenas uma frase.

27

Page 28: Manual de Reda o

6.2 O processo de coordenação

Pelo que se viu acima, pode-se dizer que ocorre o processo de coordenação entre dois elementos

(duas palavras, dois sintagmas, duas orações, duas frases, dois parágrafos) quando esses elementos

formam uma lista. Essa lista, que deve ter, no mínimo, dois elementos, pode ser formada por vários

elementos, como se pode ver em (28):

(28) Casa, carro, moto, jóias...

Nesse exemplo, os quatro elementos são sintaticamente independentes e coordenados entre si.

6.2.1 Coordenação assindética X coordenação sindética

Às vezes, a coordenação entre dois elementos é feita sem o uso de síndeto (palavra apropriada de

ligação), usando-se apenas os sinais de pontuação. Nesse caso, ocorre a coordenação assindética. É o

caso do exemplo (28), retomado abaixo:

(28) Casa, casa, moto, jóias... coordenação assindética

Outras vezes, a coordenação é feita com o uso de síndetos, que, no caso, são as conjunções

coordenativas, como em (29), abaixo:

(29) Casa e carro coordenação sindética

síndeto: conjunção coordenativa aditiva

6.2.1.1 Coordenação assindética: pontuação

Ao contrário do que muita gente imagina, a pontuação nada tem a ver com a ocorrência de pausas

na frase. Na verdade, a pontuação tem a ver com a entonação. Não é por acaso que, na gramática

gerativo-transformacional, a frase é descrita pela fórmula F T + P, em que F = Frase; T = Tipo e P =

Proposição ou conteúdo proposicional.

28

Page 29: Manual de Reda o

De acordo com essa gramática, são quatro os tipos de frase: declarativo, interrogativo,

exclamativo e imperativo. A distinção entre os diversos tipos está na entonação com que cada frase é

pronunciada.

Observe-se, por exemplo, a proposição abaixo, pronunciada, primeiramente, com uma entonação

ascendente, que sugere uma frase inacabada:

(30) Vocês fizeram um bom trabalho

Nesse caso, essa proposição não chega a constituir uma frase. Falta-lhe a entonação característica.

Por isso, não tem também a pontuação necessária.

Observe-se, agora, essa mesma proposição pronunciada com entonações descendentes:

(30b) Vocês fizeram um bom trabalho.

(30c) Vocês fizeram um bom trabalho?

(30d) Vocês fizeram um bom trabalho!

(30e) Façam um bom trabalho!

Nos exemplos acima, a proposição constituirá frases diversas, uma vez que, em cada situação,

contará com o tipo, que se caracteriza pela entonação e é representado, na escrita, pelo sinal de pontuação

adequado. É com base nisso que se afirma, aqui, que a pontuação não é determinada pela ocorrência de

pausa, mas pela entonação. Também a vírgula e o ponto e vírgula não são guiados pela ocorrência de

pausa, mas pela entonação, conforme se mostrará a seguir. Observe-se o exemplo (31):

(31) O aluno faz o trabalho.

A pronúncia dessa frase revela que existem nítidas pausas entre o SN [o aluno] e o verbo [faz] e

entre esse verbo e o SN [o trabalho]. Além das pausas de início e de fim de frase. Se o uso de vírgulas

estivesse vinculado à existência de pausas, a frase acima teria de apresentar a seguinte pontuação:

(31b) O aluno, faz, o trabalho.

Essa pontuação, entretanto, é inadmissível.

29

Page 30: Manual de Reda o

Mas, se o uso da vírgula é um caso de entonação, em que situações a vírgula deve ser usada? É o

que se mostrará a seguir.

6.2.1.1.1 Tipos de entonação

Os sintagmas de uma oração são pronunciados com três tipos de entonação: entonação

ascendente, entonação descendente e entonação ondulada. Compare-se a pronúncia dos exemplos

abaixo:

(32) A noite

(33) A noite.

(34) A noite, a manhã, a tarde têm encantos distintos.

Em (32), a pronúncia deve indicar que a frase ainda não acabou. É como se houvesse reticências:

A noite...

Nesse caso, a entonação é ascendente. Essa entonação não admite nenhuma pontuação.

Em (33), a pronúncia deve indicar que a frase foi encerrada. A entonação é, então, descendente e

deve ser marcada, na escrita, por um ponto final, ou por um ponto de interrogação, ou por um ponto de

exclamação, conforme o tipo da frase.

Já em (34), a seqüência A noite, a manhã, a tarde forma um sintagma, pronunciado com uma

entonação ascendente e descendente, que se propaga como uma onda. Daí, a denominação de entonação

ondulada.

Quando ocorre a entonação ondulada, as vírgulas devem ser usadas para separar os elementos

constituintes da seqüência em que ela ocorre. Esse tipo de entonação pode ser percebido nos seguintes

casos:

1. Quando ocorre uma lista ou enumeração de elementos (processo de coordenação). Exemplo (35),

abaixo:

(35) Quem não almeja uma casa, um carro, uma moto?

2. Quando ocorre a presença de qualquer elemento explicativo. Exemplo (36):

30

Page 31: Manual de Reda o

(36) Os dinossauros, animais pré-históricos, ainda despertam atenção.

3. Quando ocorre a presença de sintagma adverbial deslocado. Observe a posição e a pontuação do

sintagma adverbial, com dedicação, nas diversas variações do exemplo (37), abaixo:

(37) O aluno faz o trabalho com dedicação.

Nesse exemplo, o sintagma adverbial, com dedicação, vem no final da frase, que é seu lugar

natural. Nesse caso, a vírgula não é necessária. Acontece que esse sintagma pode deslocar-se para

qualquer pausa natural da frase, incluindo-se a pausa inicial. Ocorrendo qualquer deslocamento, ocorrerá,

também, uma entonação ondulada, que deverá ser marcada por vírgulas. É o que se vê nas variações

abaixo:

(37b) Com dedicação, o aluno faz o trabalho.

(37c) O aluno, com dedicação, faz o trabalho.

(37d) O aluno faz, com dedicação, o trabalho.

4. Quando ocorre a presença de alguma expressão de chamamento (vocativo).

(38) Patrão, o jantar está servido.

É preciso deixar claro que não se deve usar uma vírgula apenas. As vírgulas devem ser usadas aos

pares: a primeira vírgula vem antes do elemento a ser isolado; a segunda vem depois desse elemento. Se a

primeira vírgula coincidir com o início da frase, é claro que só a segunda deve ser usada. Se a segunda

coincidir com o final da frase, somente a primeira deve ser usada. No interior da frase, as duas vírgulas

são obrigatórias.

6.2.1.2 A coordenação sindética: pontuação

No processo de coordenação, sempre se estabelece uma das seguintes relações lógicas: adição,

oposição, opção, alternância, explicação ou conclusão. Isso, tanto na coordenação sindética quanto na

coordenação assindética. A coordenação sindética se dá pela presença dos seguintes síndetos (conjunções

coordenativas):

1. Coordenação sindética aditiva (relação lógica de adição): e, nem, não só...mas também, tanto...quanto,

etc.

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Page 32: Manual de Reda o

2. Coordenação sindética adversativa (relação lógica de oposição): mas, porém, contudo, todavia,

entretanto, no entanto, etc.

3. Coordenação sindética alternativa (relação lógica de opção ou de alternância): ou, ou...ou, ora...ora,

quer...quer. já...já, seja...seja, etc.

4. Coordenação sindética explicativa (relação lógica de explicação, motivo): porque, pois, que

(= porque), porquanto (= porque), etc.

5. Coordenação sindética conclusiva (relação lógica de conclusão, dedução, inferência): portanto, pois

(= portanto), logo (= portanto), então, (= portanto), por conseguinte, etc.

Sobre esses casos de coordenação sindética, é importante esclarecer o seguinte: quando ocorre um

sintagma composto, a entonação descendente será sempre possível entre os elementos coordenados. Se

esse sintagma está em posição pré-verbal, não se deve empregar o ponto final para separar esses

elementos. Mas, se o sintagma vier em posição pós-verbal, é perfeitamente possível o uso do ponto final.

Observem-se os exemplos abaixo:

(39) Alguns artistas inconformados e um bando de políticos participaram das solenidades.

(39b) Participaram das solenidades alguns artistas inconformados e um bando de políticos.

Em (39), não pode ocorrer nenhuma pontuação para separar os elementos coordenados. Em (39b),

é perfeitamente possível o uso do ponto final para separar esses elementos, como se faz em (39c):

(39c) Participaram das solenidades alguns artistas inconformados. E um bando de políticos.Vejam-se outros exemplos:

(40) Prepare-se para a vida ou enfrente dificuldades mais significativas.

(40b) Prepare-se para a vida. Ou enfrente dificuldades mais significativas.

(41) Ele lutou bravamente, mas não conseguiu a vitória.

(41b) Ele lutou bravamente. Mas, não conseguiu a vitória.

6.2.1.2.1 Deslocamento das conjunções coordenativas

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Page 33: Manual de Reda o

As conjunções coordenativas porém, contudo, todavia, no entanto, entretanto e as coordenativas

conclusivas portanto, logo (= portanto), então (= portanto), e por conseguinte podem deslocar-se na

oração que elas introduzem. Vejam-se os exemplos a seguir:

(42) Ele lutou bravamente, porém não conseguiu a vitória.

(42b) Ele lutou bravamente; não conseguiu, porém, a vitória.

(42c) Ele lutou bravamente; não conseguiu a vitória, porém.

(42d) Ele lutou bravamente. Porém, não conseguiu a vitória.

Sobre a pontuação dessas conjunções, cumpre esclarecer o seguinte:

1. Se estiver iniciando uma oração, a conjunção coordenativa não será isolada por vírgula. Exemplo (42).

2. Se estiver deslocada para o interior da oração, a conjunção deve vir entre vírgulas. Exemplo (42b).

3. Se estiver deslocada para o final da frase, a conjunção coordenativa deverá vir entre uma vírgula e o

ponto final. Exemplo (42c), acima.

4. Se a conjunção coordenativa estiver iniciando uma nova frase, deverá ser isolada por vírgula. Exemplo

(42d), acima.

É interessante notar que a conjunção adversativa mas e a conclusiva logo não têm a mobilidade

das demais. Só podem aparecer no início da oração. Vejam-se os exemplos (43) e (44):

(43) Sou pobre, mas sou feliz.

(44) Sou homem, logo sou mortal.

Já a conjunção pois só será conclusiva se vier deslocada para o meio ou para o final da oração,

como se pode ver pelos exemplos (45) e (45b):

(45) Foi decretado ponto facultativo municipal. Não haverá, pois, expediente na prefeitura.

(45b) Foi decretado ponto facultativo municipal. Não haverá expediente na prefeitura, pois.

6.2.1.2.2 Transformação da coordenação sindética em coordenação assindética

Transforma-se a coordenação sindética em assindética quando se retira ou se omite a conjunção

coordenativa. É claro, porém, que não basta retirar simplesmente a conjunção. É preciso também observar

a pontuação a ser usada. Essa pontuação dependerá da relação lógica que se estabelece entre as duas

33

Page 34: Manual de Reda o

orações. Assim, quando se omite ou se retira a conjunção coordenativa, pode ser empregada a seguinte

pontuação:

1. na relação lógica de adição: vírgula, ponto e vírgula ou ponto final.

(46) Os carros pararam e esperaram a passagem dos pedestres. (46b) Os carros pararam, esperaram a passagem dos pedestres.

(46c) Os carros pararam; esperaram a passagem dos pedestres.

(46d) Os carros pararam. Esperaram a passagem dos pedestres.

2. na relação lógica de oposição: ponto e vírgula ou ponto final.

(47) Os políticos fazem muitas promessas, mas não cumprem a maioria delas.

(47b) Os políticos fazem muitas promessas; não cumprem a maioria delas.

(47c) Os políticos fazem muitas promessas. Não cumprem a maioria delas.

3. na relação lógica de explicação: ponto e vírgula, ponto final ou dois pontos.

(48) Não houve expediente bancário hoje, pois foi feriado municipal.

(48b) Não houve expediente bancário hoje; foi feriado municipal.

(48c) Não houve expediente bancário hoje. Foi feriado municipal.

(48d) Não houve expediente bancário hoje: foi feriado municipal.

4. na relação lógica de conclusão: ponto e vírgula, ponto final ou dois pontos.

(49) Nada foi provado contra o réu, portanto não haverá condenação.

(49b) Nada foi provado contra o réu; não haverá condenação.

(49c) Nada foi provado contra o réu. Não haverá condenação.

(49d) Nada foi provado contra o réu: não haverá condenação.

Um dos grandes problemas na produção de textos é que as pessoas menos experientes demonstram

uma certa dificuldade de usar, conscientemente, o ponto final e, conseqüentemente, de construir frases

34

Page 35: Manual de Reda o

curtas. Mas, conforme se procurou demonstrar aqui, o ponto final é possível entre elementos

coordenados.

6.3 O processo de subordinação

Ocorre o processo de subordinação entre dois elementos (duas palavras, dois termos, duas orações,

duas frases, dois parágrafos) quando esses elementos não formam uma lista. Nesse caso, um dos

elementos completa, explica, resume ou especifica o outro. Ou, então, indica uma circunstância ou

intensidade a este relacionada.

Considerados apenas no âmbito da frase, esses elementos constituem sintagmas de uma mesma

frase. A natureza de cada um desses sintagmas está vinculada à função que eles exercem. Os que

funcionam como sujeito ou complemento têm natureza substantiva. Sua pró-forma é algo ou alguém. O

sintagma de natureza substantiva pode ser um SN (Sintagma Nominal) ou um SP (Sintagma

Preposicional). Observem-se os exemplos (50) e (51), abaixo:

(50) O carro arrancou a árvore.

Nesse exemplo, os sintagmas [o carro] e [a árvore] têm natureza substantiva, já que funcionam,

respectivamente, como sujeito e complemento. Cada um deles é um SN.

(51) O carro precisa de reparos.

Nesse exemplo, o sintagma [de reparos] tem natureza substantiva e constitui um SP (Sintagma

Preposicional), já que funciona como complemento preposicionado.

Os sintagmas explicativos e os especificadores podem ter natureza substantiva ou adjetiva e

podem ser constituídos de um SN (Sintagma Nominal), de um SA (Sintagma Adjetival) ou de um SP

(Sintagma Preposicional). É o que se vê pelos exemplos abaixo:

(52) Barcelona, cidade espanhola, atrai muitos turistas. (Sintagma Nominal explicativo)

(52b) A menina, paupérrima, comoveu o mundo. (Sintagma Adjetival explicativo)

(52c) A menina paupérrima comoveu o mundo. (Sintagma Adjetival especificador)

(53) A Rua da Bahia é muito movimentada. (Sintagma Preposicional especificador)

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Page 36: Manual de Reda o

Os sintagmas que indicam circunstância de tempo, modo, lugar, causa, finalidade, afirmação,

condição, etc., relacionada a verbo, ou que indicam intensidade relacionada a verbo, adjetivo ou advérbio

têm natureza adverbial. Exemplos (54) a (64), abaixo:

(54) O sol nasce de manhã. (Sintagma Preposicional de natureza adverbial: circunstância de tempo)

(55) A telefonista falava calmamente. (Sintagma Adverbial: circunstância de modo)

(56) Guardei os livros na estante. (Sintagma Preposicional de natureza adverbial: circunstância de lugar)

(57) O pássaro morreu de fome. (Sintagma Preposicional de natureza adverbial: circunstância de causa)

(58) A atriz conquistou, deveras, o coração de todos. (Sintagma Adverbial: circunstância de afirmação)

(59) As autoridades já estão reunidas para a realização da cerimônia. (Sintagma Preposicional de natureza adverbial: circunstância de finalidade)

(60) Iremos ao cinema se não chover. (Sintagma Adverbial: circunstância de condição ou hipótese)

(61) A equipe trabalhou bem. (Sintagma Adverbial: intensidade relacionada a verbo)

(62) O trabalho ficou muito bom. (Sintagma Adverbial: intensidade relacionada ao adjetivo bom)

(63) A equipe trabalhou muito bem. (Sintagma Adverbial: intensidade relaciona ao advérbio bem) Na constituição de um sintagma pode estar presente uma palavra, um termo, uma locução, uma

expressão ou uma oração. Observem-se os exemplos abaixo:

(65) Todos estão presentes.

Nesse exemplo, os SN [todos] e o SA [presentes] são constituídos, cada um, por uma palavra: um

pronome e um adjetivo respectivamente.

(66) Os carros novos chegaram.

Nesse exemplo, o SN [os carros novos] é constituído por um termo formado por um artigo, um

substantivo e um adjetivo.

(67) A água de chuva não é boa para beber.

Aqui, o SN [a água de chuva] é constituído por um artigo, um substantivo e um SP, formado por

uma locução adjetiva.

36

Page 37: Manual de Reda o

(68) A água de chuva que cai sobre o telhado não é boa para beber.

Nesse exemplo, o SN [a água de chuva que cai sobre o telhado] é constituído de um artigo, um

substantivo, um SP, formado por uma locução adjetiva, e de um SA, formado por uma oração

subordinada adjetiva.

(69) Espero que vocês voltem breve.

Em (69), o SN [que vocês voltem breve] é constituído de uma oração subordinada substantiva.

(70) Estarei aqui quando você chegar.

Aqui, o SAdv é constituído de uma oração subordinada adverbial.

6.3.1 Pontuação das orações subordinadas

Das orações subordinadas, as únicas que não se separam da matriz por meio de vírgulas são as

subjetivas, as completivas e as especificadoras. As explicativas, sejam elas substantivas ou adjetivas, são

sempre separadas por vírgulas ou sinais equivalentes. As circunstanciais, se estiverem deslocadas, serão

obrigatoriamente separadas por vírgulas; se estiverem em posição natural, as vírgulas são opcionais.

Confiram-se os exemplos abaixo:

(71) Quem quer vai.

O SN [quem quer], constituído de uma oração subjetiva, não se separa da matriz por vírgulas.

(72) O governo pede que o povo economize combustível.

O SN [que o povo economize combustível], constituído de uma oração completiva, não se separa da

matriz por vírgulas.

(73) Receba as flores que lhe dou.

O SA [que lhe dou], constituído de uma oração especificadora, não se separa da matriz por vírgulas.

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(74) Peço-lhe uma coisa: que lute sempre.

O SN [que lute sempre], constituído de uma oração explicativa de natureza substantiva, vem separada da

matriz por meio de dois pontos, correspondentes a vírgula.

(75) A luz solar, que é fonte de energia, é também agente de destruição.

O SA [que é fonte de energia], constituído de uma oração explicativa de natureza adjetiva, vem separada

da matriz por meio de vírgulas.

(76) Quando chove, a cidade enche-se de buracos.

(76b) A cidade, quando chove, enche-se de buracos.

(76c) A cidade enche-se de buracos, quando chove.

(76d) A cidade enche-se de buracos quando chove.

Em (76) e (76b), o SAdv, constituído de uma oração adverbial, está deslocado de sua posição natural, por

isso vem obrigatoriamente separado por vírgulas.

Em (76c) e (76d), esse SAdv está em sua posição natural, por isso ele pode vir separado da matriz por

meio de vírgula, como em (76c), ou sem vírgula, como em (76d).

Geralmente, essas orações não se separam da matriz por meio de ponto final. Mas, às vezes, essa

separação é possível e até aconselhável. Decat4 chama esse fenômeno de desgarramento da cláusula

subordinada. Esse desgarramento é mais comum nas orações adverbiais e nas adjetivas explicativas e

ocorre, geralmente, quando se deseja enfatizar uma idéia. Observem-se os exemplos abaixo:

(77) As pessoas devem procurar sempre uma vida mais saudável. Para que não corram riscos desnecessários.

(78) Todos esperam com ansiedade o Natal. Que é uma festa de alegria e recordações da infância.

Nos exemplos (77) e (78), a ênfase justifica o uso do ponto final para separar da matriz as orações

subordinadas em itálico.

4 DECAT, Maria Beatriz. Por uma abordagem da (in)dependência de cláusulas à luz da noção de”unidade informacional”. In SCRIPTA, Belo Horizonte, v. 2, n.4, p. 23-38, 1º sem. 1999.

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O desgarramento da cláusula subordinada, seja ela substantiva, adjetiva ou adverbial, é quase

natural quando ocorrem cláusulas subordinadas coordenadas entre si, formando uma lista.

(79) O governo espera que a economia mantenha-se estável. Que os juros caiam. E que a inflação esteja sob controle.

(80) O crescimento da violência no País é, sem dúvida, um fator que inibe empreendimentos. Que atrasa o desenvolvimento. E que desestimula a entrada do capital estrangeiro.

(81) As pessoas devem procurar uma vida mais saudável, quando sentirem que a vida sedentária que levam traz-lhes problemas de saúde. Quando sentirem que lhes falta um pouco mais de vigor físico. Quando sentirem que a inércia torna-os cada vez mais sem resistência.

Observe-se que o desgarramento não se dá a partir da primeira cláusula subordinada, mas a partir

da segunda.

6.3.1.1 Relações lógicas e pontuação

É importante ressaltar que as relações lógicas expressas pelas orações subordinadas adverbiais em

uma só frase podem ser expressas em duas frases. Comparem-se os exemplos a seguir:

1. relação lógica de temporalidade:

(82) As pessoas devem preocupar-se mais com a saúde quando sentirem que já não possuem o mesmo

vigor físico da juventude.

(82b) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde. Isso, quando sentirem que já não

possuem o mesmo vigor físico da juventude.

2. relação lógica de causalidade:

(83) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde porque o risco de uma morte prematura aumenta consideravelmente com a idade.

(83b) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde. A razão é que o risco de uma morte prematura aumenta consideravelmente com a idade.

3. relação lógica de finalidade:

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(84) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde para que não venham a correr riscos desnecessários.

(84b) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde. A finalidade é que não venham a correr riscos desnecessários.

4. relação lógica de condicionalidade ou hipótese:

(85) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde se querem se querem ter uma vida longa e feliz.

(85b) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde. Isso, na hipótese de quererem ter uma vida longa e feliz.

5. relação lógica de proporcionalidade:

(86) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde à medida que vão envelhecendo.

(86b) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde. Isso, à medida que vão envelhecendo.

6. relação lógica de comparação:

(87) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde como aquelas que evitam o estresse e o sedentarismo.

(87b) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde. O parâmetro são aquelas que evitam o estresse e o sedentarismo.

7. relação lógica de conseqüência:

(88) Algumas pessoas adultas preocupam-se tanto com a saúde, que, às vezes, tornam-se hipocondríacas.

(88b) Algumas pessoas adultas preocupam-se demais com a saúde. Em conseqüência disso, tornam-se, às vezes, hipocondríacas.

8. relação lógica de conformidade:

(89) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde conforme alertam os médicos.

(89b) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde. Isso, conforme alertam os médicos.

9. relação lógica de concessão:

(90) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde, ainda que não cometam excessos.

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(91b) As pessoas adultas devem preocupar-se mais com a saúde. Isso, ainda que não cometam excessos.

Evidentemente, os casos de pontuação não se restringem aos apresentados nesse estudo, mas o

domínio destes já garante ao texto uma pontuação equilibrada e eficaz.

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