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Eixo Temático 1: Técnica e Métodos de Cartografia, Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto, Aplicadas ao Planejamento e Gestão Ambientais MAPEAMENTO DE ÁREAS ÚMIDAS ATRAVÉS DE DADOS DE SENSORIAMENTO REMOTO E TÉCNICAS DE GEOPROCESSAMENTO NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIBEIRÃO BOM JARDIM – MG BORGES, Raffaella Fernandes Graduanda em Geografia e bolsista CNPq/PIBIC pela Universidade Federal de Uberlândia e-mail: [email protected] BORGES, Fabiano Alves Mestrando em Geografia e bolsista CNPq pela Universidade Federal de Uberlândia e-mail: [email protected] BRITO, Jorge Luís Silva Professor Dr. do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia e-mail: [email protected] NISHIYAMA, Luiz Professor Dr. do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia e-mail: [email protected] Resumo A utilização de ferramentas de geoprocessamento constitui um importante instrumento de subsídio para execução de estudos ambientais e tomada de decisão. O intenso uso dos recursos naturais promovido pelas sociedades humanas concorre para uma degradação ambiental sem precedentes. Fato pelo qual se torna intangível a consecução de estudos que promovam uma avaliação das condições do meio ambiente para que seja possível a proposição de medidas corretivas de manejo dos recursos naturais. O presente estudo tem como objetivo avaliar o potencial de distintas imagens de satélite para a delimitação de áreas úmidas, tendo como área de estudo a bacia hidrográfica do ribeirão Bom Jardim, servindo assim como uma contribuição para a execução de tais estudos de cunho ambiental. Esta bacia hidrográfica localiza-se na mesorregião do Triângulo Mineiro, porção oeste do estado de Minas Gerais, onde abrange o sudeste do município de Uberlândia e noroeste de Uberaba, perfazendo uma área de aproximadamente 400 km². A metodologia utilizada faz uso dos softwares SPRING 5.0 e ArcGIS 9.2 para realizar a delimitação de áreas úmidas através da interpretação visual em tela de imagens de satélite HRC/CBERS-2B, Ortomosaicos do IBGE e imagem de satélite IKONOS colorida. Palavras Chave: Geoprocessamento, Sensoriamento Remoto, Áreas Úmidas. Abstract The use of geoprocessing tools constitutes an important instrument for development of ambient studies and decisions taken based on the data processed. The intense use of the natural resources promoted by the human societies lets ambiental degradation without precedents. Thus, it is necessary the development of studies that promote an evaluation of the environmental conditions in such way to suggest corrective policies of handling of the natural resources. The present work aims evaluate satellite imagering to delimitation of wet-areas in the drainage basin of ribeirão Bom Jardim developing, in this way, a contribution for those studies. The basin of Bom Jardim is localized on the microrregion of the Triângulo Mineiro, west portion of Minas Gerais state, enclosing the southeast of the city of Uberlândia and northeast of Uberaba, with an approximated area of 400 km².

MAPEAMENTO DE ÁREAS ÚMIDAS ATRAVÉS DE DADOS DE ... · equilíbrio ambiental e o bem-estar das populações humanas, está a preservação das áreas úmidas, que desempenham um

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Eixo Temático 1: Técnica e Métodos de Cartografia, Geoprocessamento e Sensoriamento Remoto, Aplicadas ao

Planejamento e Gestão Ambientais

MAPEAMENTO DE ÁREAS ÚMIDAS ATRAVÉS DE DADOS DE SENSORIAMENTO REMOTO E TÉCNICAS DE GEOPROCESSAMENTO NA BACIA HIDROGRÁFICA DO

RIBEIRÃO BOM JARDIM – MG

BORGES, Raffaella Fernandes Graduanda em Geografia e bolsista CNPq/PIBIC pela Universidade Federal de Uberlândia

e-mail: [email protected]

BORGES, Fabiano Alves Mestrando em Geografia e bolsista CNPq pela Universidade Federal de Uberlândia

e-mail: [email protected]

BRITO, Jorge Luís Silva Professor Dr. do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia

e-mail: [email protected]

NISHIYAMA, Luiz Professor Dr. do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia

e-mail: [email protected] Resumo A utilização de ferramentas de geoprocessamento constitui um importante instrumento de subsídio para execução de estudos ambientais e tomada de decisão. O intenso uso dos recursos naturais promovido pelas sociedades humanas concorre para uma degradação ambiental sem precedentes. Fato pelo qual se torna intangível a consecução de estudos que promovam uma avaliação das condições do meio ambiente para que seja possível a proposição de medidas corretivas de manejo dos recursos naturais. O presente estudo tem como objetivo avaliar o potencial de distintas imagens de satélite para a delimitação de áreas úmidas, tendo como área de estudo a bacia hidrográfica do ribeirão Bom Jardim, servindo assim como uma contribuição para a execução de tais estudos de cunho ambiental. Esta bacia hidrográfica localiza-se na mesorregião do Triângulo Mineiro, porção oeste do estado de Minas Gerais, onde abrange o sudeste do município de Uberlândia e noroeste de Uberaba, perfazendo uma área de aproximadamente 400 km². A metodologia utilizada faz uso dos softwares SPRING 5.0 e ArcGIS 9.2 para realizar a delimitação de áreas úmidas através da interpretação visual em tela de imagens de satélite HRC/CBERS-2B, Ortomosaicos do IBGE e imagem de satélite IKONOS colorida. Palavras Chave: Geoprocessamento, Sensoriamento Remoto, Áreas Úmidas.

Abstract The use of geoprocessing tools constitutes an important instrument for development of ambient studies and decisions taken based on the data processed. The intense use of the natural resources promoted by the human societies lets ambiental degradation without precedents. Thus, it is necessary the development of studies that promote an evaluation of the environmental conditions in such way to suggest corrective policies of handling of the natural resources. The present work aims evaluate satellite imagering to delimitation of wet-areas in the drainage basin of ribeirão Bom Jardim developing, in this way, a contribution for those studies. The basin of Bom Jardim is localized on the microrregion of the Triângulo Mineiro, west portion of Minas Gerais state, enclosing the southeast of the city of Uberlândia and northeast of Uberaba, with an approximated area of 400 km².

Were used SPRING® 5.0 and ArcGIS® 9.2 software to help in the delimitation of the wet-areas due visual interpretation of HRC/CBERS-2B satellite imagering, ortomosaics of IBGE and colorful IKONOS satellite imagering. Keywords: Geoprocessing, Remote Sensing, Wet-areas.

1 - Introdução

Uma das maiores preocupações das sociedades humanas no século XXI consiste na utilização

racional dos recursos hídricos pelo homem, uma vez que constituem uma substância finita, que leva

diversas regiões e países a enfrentar problemas crônicos. Neste contexto, têm-se o desenvolvimento

das técnicas de sensoriamento remoto e geoprocessamento como ferramentas eficazes no auxílio da

gestão de bacias hidrográficas.

Em razão da escassez de água já identificada em algumas regiões do país e dos problemas

relacionados com a qualidade das águas, o setor vem ganhando atenção e interesse da sociedade

brasileira. Isto pode ser verificado pelo crescente número de estudos na área e pela elaboração de leis

específicas para a sua gestão, nas quais a água passa a ser tratada como um recurso natural escasso e

limitado. Dentre as cartas legais, pode-se citar a Lei 9.433 de 07 de janeiro de 1997, que estabelece a

Política Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e a Lei 9.984 de 17 de julho de 2000, que

instituiu a Agência Nacional de Águas (ANA). O Órgão federal tem como função a implementação da

referida Política, assim como a coordenação do Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

Entre as ações de maior importância para a conservação dos recursos hídricos a fim de manter o

equilíbrio ambiental e o bem-estar das populações humanas, está a preservação das áreas úmidas, que

desempenham um papel fundamental no equilíbrio hidrológico dos cursos d’água, garantindo a sua

perenidade e oferta deste recurso com boa qualidade e constante disponibilidade para o suprimento

deste recurso para as atividades humanas. Entretanto, as formações vegetais destas áreas vêm sofrendo,

no decorrer das últimas décadas, alterações drásticas em suas condições naturais. Em razão do uso

excessivo da terra e expansão de fronteiras econômicas, muitas vezes inadequadas, houve uma intensa

supressão e descaracterização da vegetação nativa. A supressão de áreas úmidas e de vegetação ciliar

rompe um equilíbrio ecológico e impede essas áreas de executarem sua função hidrológica.

Neste contexto, insere-se a bacia do ribeirão Bom Jardim, importante afluente do rio

Uberabinha, que, segundo Nishiyama (2008), desde a década de 1970, vem passando por grandes

alterações decorrentes dos processos de uso e ocupação do meio físico que usualmente não são

realizados de maneira adequada. Como conseqüência disso, a área ocupada por esta bacia hidrográfica

sofreu intensas alterações de naturezas ambientais, econômicas e sociais.

De acordo com Brito (2001), a bacia do ribeirão Bom Jardim apresenta uma área expressiva de

solos afetados pelo hidromorfismo em associação com solos aluviais (áreas úmidas), correspondendo a

cerca de 80 Km2 (20,19% da área da bacia). Schneider (1996), ao realizar o mapeamento da ocupação

agrícola da bacia do rio Uberabinha, no período de 1964 a 1999, constatou uma diminuição de 6.244

Km2 nas áreas úmidas desta bacia. A supressão das áreas úmidas para o desenvolvimento de atividades

antrópicas também é comumente verificada na bacia do ribeirão Bom Jardim, demonstrando assim o

contínuo descumprimento das leis ambientais que indicam as normas de uso dos diversos ecossistemas

com fins a conservação dos mesmos, como por exemplo, as leis e resoluções que estabelecem os

parâmetros, definições e limites das Áreas de Preservação Permanente (APPs), que compreendem as

áreas que devem ser desprovidas de apropriação humana para alteração de uso da terra, devendo estar

cobertas com a vegetação original, se enquadrando nesta classe as áreas úmidas.

O sistema de mananciais responsável pelo abastecimento de Uberlândia é composto pelas

bacias hidrográficas do ribeirão Bom Jardim e do rio Uberabinha. A captação de água é feita pela

Estação de Tratamento de Água Bom Jardim (ETA Bom Jardim) e ETA Sucupira, as quais executam o

tratamento de, respectivamente, 2.715.650 m³ e 2.805.867 m³ de água por mês. Desta forma, verifica-

se a fundamental importância da bacia hidrográfica do Bom Jardim, uma vez que esta abastece cerca

de 50% da cidade de Uberlândia, fornecendo água para bairros como Jardim Brasília, Lídice, Vigilato

Pereira, Santa Luzia, Cidade Jardim, Nova Uberlândia, Tubalina, Planalto, Aparecida, Centro, Bom

Jesus, Martins, Luizote, entre outros (DEPARTAMENTO MUNICIPAL DE ÁGUA E ESGOTO, MG

– DMAE, 2009).

Desta forma, em função da representatividade desta bacia hidrográfica para o município e da

degradação contínua que vem ocorrendo nas áreas úmidas, não apenas no âmbito da bacia do ribeirão

Bom Jardim, mas no âmbito destes ambientes frágeis de forma geral, há a necessidade da realização de

estudos acerca desta temática, de forma a contribuir para possíveis ações de reabilitação e conservação

destas áreas. Neste sentido, o presente trabalho tem como objetivo identificar qual produto de

sensoriamento remoto é mais eficaz para este tipo de estudo por meio da comparação de diferentes

imagens, assim como mapear a bacia do ribeirão Bom Jardim utilizando-se do produto mais adequado

para este fim. Na pesquisa, avaliou-se o potencial do uso de imagem do sensor HRC do satélite

CBERS-2B, dos Ortomosaicos elaborados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e

das imagens do satélite IKONOS e, posteriormente, elaborou-se um mapa das áreas úmidas da bacia

do ribeirão Bom Jardim a fim de verificar as condições atuais das mesmas.

Portanto, a presente pesquisa objetiva fornecer subsídios para trabalhos de mapeamento de

áreas úmidas, bem como para a delimitação das APPs da bacia em questão. Desta forma, poderá ser

utilizada tanto pela comunidade, como por instituições públicas em programas de reabilitação de

APPs, na adequação do uso do solo e na gestão ambiental e dos recursos hídricos de bacias

hidrográficas, especialmente na do ribeirão Bom Jardim.

2.1 – Localização e Caracterização dos Aspectos Físicos da Área de Estudo

A Bacia Hidrográfica do ribeirão Bom Jardim localiza-se entre as porções sul do município de

Uberlândia e norte do município de Uberaba, na mesorregião do Triângulo Mineiro, porção oeste do

estado de Minas Gerais, balizada pelas coordenadas geográficas de 18°58’00’’ – 19°20’30’’ de latitude

sul e 48°04’00’’ – 48°18’00’’ de longitude oeste de Greenwich (Figura 01).

Figura 01: Localização da Bacia do Ribeirão Bom Jardim na Mesorregião do Triângulo Mineiro – MG. Fonte: Brito, J. L. S., 2001.

O ribeirão Bom Jardim é um dos principais afluentes do rio Uberabinha e drena uma área de

396,54 km², cujo perímetro é de 108,848 quilômetros. Sua nascente localiza-se nas proximidades da

Rodovia Uberlândia – Uberaba (BR-050), no município de Uberaba, e percorre cerca de 40

quilômetros até sua confluência com o rio Uberabinha, próximo ao perímetro urbano de Uberlândia

(BRITO, 2001). É nesta confluência que se encontra o ponto de captação da ETA Bom Jardim, a qual

produz cerca de 2.715.650 m³ de água potável por mês (DMAE, 2009).

Conforme Nishiyama (1989), a mesorregião do Triângulo Mineiro, em sua maior parte, está

inserida na Bacia Sedimentar do Paraná, representada por litologias de idade Mesozóica, tais como:

arenitos da Formação Botucatu, basaltos da Formação Serra Geral e rochas sedimentares do Grupo

Bauru. De acordo com o mapeamento geológico do município de Uberlândia, na escala de 1:100.000,

elaborado por Nishiyama (1998), a área da bacia do ribeirão Bom Jardim é constituída pelas seguintes

unidades: Formação Marília, Cobertura Detrítico-Laterítica Terciário-Quartenário, aluviões

holocênicos.

A Bacia do ribeirão Bom Jardim localiza-se na porção nordeste da Bacia Sedimentar do Paraná,

inserida na porção do Domínio dos Chapadões Tropicais do Brasil Central (AB’SABER, 1971),

denominada pelo Projeto Radam Brasil (1983) como área de Planaltos e Chapadas da Bacia

Sedimentar do Paraná. Nesta região destacam-se os chapadões separados por vales profundos e largos,

que atingem rochas pré-cambianas, com vertentes bastante dissecadas pelo entalhamento dos

principais rios da região, como o Paranaíba e o Araguari.

Baccaro (1990) propôs a compartimentação geomorfológica da região em quatro unidades

distintas, baseando-se na altimetria, estrutura geológica, nas formas e no nível de dissecação do relevo.

Na área de estudo podem ser encontradas duas destas unidades: áreas elevadas de cimeira e áreas de

relevo medianamente dissecado. As áreas elevadas de cimeira são caracterizadas por topos planos,

amplos e largos, com baixa densidade de drenagem e vertentes com declividades inferiores a 3°,

configurando, assim, as chapadas, entre 950 e 1050 metros de altitude. As áreas de relevo

medianamente dissecado constituem a transição entre a chapada e a unidade de relevo intensamente

dissecado, com uma altitude entre 750 e 900 metros e declividades entre 3° e 5°.

Segundo o levantamento de solos feito pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

(EMBRAPA, 1982), os tipos de solos que ocorrem na bacia do ribeirão Bom Jardim são: Latossolo

Vermelho-Amarelo, que desenvolvem-se em áreas de topos planos a suave ondulado das porções de

chapada, sobre cotas altimétricas superiores a 850 metros; Latossolo Vermelho-Escuro, encontrados

nas áreas de relevo plano e suave a ondulado; e Glei Húmico, que compreende as porções de fundo de

vales e aparecem também suspensos nas médias vertentes, sobre crostras lateríticas ou áreas de topo de

chapada.

O clima da região é o tropical, caracterizado pela alternância de estações úmidas e secas, por

influência sazonal de massas de ar. As condições climáticas predominantes na área de estudo são

bastante semelhantes às encontradas no Brasil Central Tropical, com duas estações bem definidas: uma

seca, com longo período de estiagem, que vai de março a outubro, e a outra chuvosa, que se estende de

novembro a fevereiro (FELTRAN FILHO, 1997).

A precipitação atmosférica média de Uberlândia é de 1.550 milímetros, sendo que os meses

mais chuvosos são dezembro e janeiro, representando cerca de 41% da precipitação média anual. Os

meses menos chuvosos são junho e julho (ROSA et al., 1991). A temperatura média anual é de 22° C,

sendo que os meses mais quentes são fevereiro (23,5° C), outubro e novembro (23,4° C) e os meses

mais frios junho e julho (18,8° C). A umidade relativa do ar é de 71,2% em média, sendo que há pouca

variação durante o ano (ROSA et al., 1991).

O Triângulo Mineiro está inserido no Domínio Morfoclimático dos Cerrados, segundo maior

domínio do Brasil, que ocupa originalmente uma área de 2.003.162 Km², porção equivalente a 23% do

território nacional (AB’SABER, 2003). Devido a sua posição geográfica central em relação aos demais

domínios brasileiros, o Cerrado em suas faixas de transição, compartilha espécimes com a maioria

destes, como a Amazônia, a Caatinga e a Mata Atlântica. Este fator, associado à grande diversidade de

ambientes existentes no Cerrado, denominados fitofisionomias, permite a ocorrência de uma vasta

riqueza biológica neste extenso domínio.

Na bacia do ribeirão Bom Jardim a cobertura vegetal natural era de cerrado e suas gradações

com maior tônica de floresta tropical higrófila de várzea e campo limpo, de comunidades hidrófilas

(veredas e campos de várzea); de comunidades higrófilas (veredas, campos de surgente), conforme

mapa elaborado por Brito (Figura 02).

Figura 02: Cobertura Vegetal e Uso da Terra na Bacia do Ribeirão Bom Jardim em 1964. Fonte: Brito, J. L. S., 2001.

2.2 – Geoprocessamento Aplicado ao Mapeamento de Áreas Úmidas

Conforme Rosa (2007), o Geoprocessamento compreende o conjunto de tecnologias destinadas

à coleta e ao tratamento de informações espaciais, assim como o desenvolvimento de novos sistemas e

aplicações com diferentes níveis de sofisticação. O termo Geoprocessamento aplica-se à Cartografia

Digital, que compreende a tecnologia destinada à captação, organização e desenho de mapas; ao

Processamento Digital de Imagens, que é o conjunto de procedimentos e técnicas destinadas à

manipulação de imagens digitais; e ao Sistema de Informação Geográfica (SIG).

O SIG representa o principal componente do Geoprocessamento, uma vez que oferece recursos

de processamento e análise de informações espacializadas que possibilitam o gerenciamento do espaço

de forma precisa e eficiente. É constituído por um conjunto de ferramentas especializadas em adquirir,

armazenar, recuperar, transformar e emitir informações espaciais. Esses dados geográficos descrevem

objetos do mundo real em termos de posicionamento, com relação a um sistema de coordenadas, seus

atributos não aparentes e das relações topológicas existentes. Portanto, um SIG pode ser utilizado em

estudos relativos ao meio ambiente e recursos naturais, na pesquisa da previsão de determinados

fenômenos ou no apoio a decisões de planejamento, considerando a concepção de que os dados

armazenados representam um modelo do mundo real (BURROUGH, 1986).

Associado aos produtos de sensoriamento remoto, o SIG constitui-se em um instrumento de

grande utilidade, pois permite, em curto espaço de tempo, a obtenção de informações a respeito de

registros de uso da terra. O estudo do uso da terra e ocupação do solo consiste em buscar

conhecimento de toda sua utilização por parte do homem ou, quando não utilizado pelo homem, a

caracterização dos tipos de categorias vegetação natural que reveste o solo, como também suas

respectivas localizações.

Desta forma, o geoprocessamento é uma importante ferramenta para a delimitação e

caracterização de áreas úmidas. As áreas úmidas são zonas resultantes de dois fatores correlacionados,

a geomorfologia e os recursos hídricos de um determinado ambiente. O relevo apresenta características

que favorecem o acúmulo de água que, por sua vez, condiciona a vida animal e vegetal deste ambiente.

Tais áreas compreendem os campos de murundus e as veredas, configurando um dos ecossistemas de

maior produtividade e, por isso, beneficiam a sociedade em aspectos sociais e econômicos,

principalmente pela disponibilidade de água doce (STEINKE; SAITO, 2008).

Os campos de murundus, comumente denominados como covoais, apresentam feições de

micro-relevos peculiares, constituídos por uma área de depressão preenchida por murundus.

Caracterizados por apresentar áreas relativamente planas e inundáveis no período das chuvas, os

murundus menores são cobertos por vegetação campestre e os maiores, por vegetação lenhosa do

Cerrado (Resende et al., 2004). A água armazenada nos covoais recarrega o aqüífero freático durante a

estação seca e abastece cursos d’água, garantindo a perenidade dos mesmos. As áreas com

hidromorfia, consideradas de Preservação Permanente, constituem um importante sistema original para

o equilíbrio do meio físico, sobretudo, hidrológico.

Conforme Nishiyama (2008), os murundus que se desenvolvem sobre superfícies planas dos

divisores de águas ocupam suaves depressões de dimensões e formas variáveis. Por outro lado, os

murundus de encostas desenvolvem-se nas vertentes fluviais dos principais cursos d’água que drenam

as superfícies da chapada. Independente da posição topográfica verifica-se uma intima relação com a

presença do lençol freático aflorante. No entanto, a distribuição irregular das chuvas ao longo do ano,

os tipos de materiais presentes no solo e no subsolo, as condições de pH, a temperatura média anual, a

oscilação sazonal do nível d’água freática, a ação biológica, são outros fatores que, em conjunto,

contribuíram para a gênese e evolução dos murundus.

Segundo Ribeiro e Walter (1998), a vereda é uma fitofisionomia de formação savânica que

apresenta a palmeira arbórea Mauritia flexuosa emergente em meio a agrupamentos mais ou menos

densos de espécies arbustivo-herbáceas, geralmente circundadas por uma faixa de campo limpo

caracterizada pela sua elevada umidade. Assim, as veredas se desenvolvem em regiões nas quais a

presença de um lençol freático raso produz a sua exposição em determinados pontos do terreno, como

ocorre, por exemplo, nos vales dos córregos de regiões mais dissecadas do Triângulo Mineiro.

Entretanto, a presença de saturação hídrica pode ser resultado de outras situações, tais como: existência

de um substrato rochoso relativamente pouco permeável, o qual mantém a água freática em condição

quase aflorante e ocorrência de uma camada pouco permeável em um nível mais elevado do relevo,

que mantém o lençol freático suspenso.

Para Carvalho (1991) as veredas são subsistemas úmidos que participam do controle do fluxo

do lençol freático, desempenhando um papel fundamental no equilíbrio hidrológico dos cursos d’água

no ambiente do cerrado. Constitui-se num sistema represador da água armazenada na chapada, sendo

importante para a perenização dos córregos, ribeirões e, até mesmo dos rios a jusante destes sistemas.

Representam também um ambiente de grande relevância dentro do cerrado, por serem responsáveis

pela manutenção e multiplicação da fauna terrestre e aquática. Esses ambientes, entretanto, são

sensíveis à alteração e de baixa capacidade regenerativa, quando perturbados.

As áreas úmidas, portanto, têm o seu papel reconhecido no equilíbrio geoecológico do bioma

Cerrado, protegendo nascentes e fornecendo água, alimento e abrigo para a fauna silvestre. No entanto,

elas estão sendo degradadas devido à exploração de argila e turfa, atividade agropecuária, avanço da

urbanização, construção de estradas e canais de drenagem. Em razão disso, as conseqüências têm sido

desastrosas para este ambiente, com os assoreamentos, ressecamento dos solos, diminuição do volume

hídrico, erosão e perda irreparável de sua beleza e biodiversidade (NISHIYAMA, 2008).

A partir disso, é necessário que ações para sua reabilitação e conservação sejam desenvolvidas,

partindo sempre do reconhecimento e diagnóstico do possível problema, adquiridos a partir de estudos

ambientais. Neste sentido, os SIGs se configuram como instrumentos muito eficazes na realização de

estudos ambientais, como o mapeamento de áreas úmidas e de APPs, pois permitem a interação dos

dados e métodos que possibilitam o armazenamento e inter-relação de informações, elaboração e

sobreposição de mapas georreferenciados, contabilização de áreas, análise de feições conseqüentes da

degradação do solo, mapeamento de áreas diversas e análises de modelagem que transcendem a

capacidade de métodos manuais, importantes para a execução de intervenções no meio físico e biótico.

Logo, os SIGs se constituem atualmente como ferramentas fundamentais nos estudos ambientais,

subsidiando a tomada de decisões e a gestão do território (ROSA, 2007).

3 - Material e Método

3.1 Material

Para elaboração do presente trabalho, foram utilizados os seguintes documentos cartográficos:

o Folhas Topográficas do Exército na escala 1:25.000 elaboradas pela Diretoria do Serviço

Geográfico do Exército (DSG) em 1984: Uberlândia, Cachoeira do Sucupira, Córrego do

Barbosa, Granja Planalto, Ribeirão Água Limpa, Córrego da Harmonia, Córrego Fortaleza,

Córrego Natureza, Córrego Formiga e Estação Buriti.

o Imagem do sensor HRC do satélite CBERS-2B, com resolução espacial de 2,5 metros, obtida

em julho de 2008 pelo Instituto Nacional de pesquisas Espaciais (INPE), disponível no sítio

eletrônico <www.inpe.br>;

o Ortomosaicos do IBGE, compatíveis com a escala 1:10.000, obtidos em julho de 2002 pelo

IBGE, disponíveis no sítio eletrônico <www.ibge.gov.br>;

o Imagem do satélite IKONOS, com resolução espacial de 1,0 metro, obtida em setembro de

2007.

3.2 – Método

O mapeamento das áreas úmidas na bacia do ribeirão Bom Jardim foi realizado a partir das

seguintes etapas:

1) Elaboração da Base cartográfica: A base cartográfica da área de estudo foi elaborada no

software SPRING 5.0 a partir das informações contidas na carta do Exército, na escala

1:25.000. Foram digitalizados os seguintes planos de informação: Rede de Drenagem, Rede

Viária, Curvas de nível, Pontos Cotados e Limite da Bacia.

2) Processamento Digital de Imagens: As três imagens em avaliação – CBERS-2B, Ortomosaico

do IBGE e IKONOS - foram importadas para o software SPRING 5.0, no qual foi feito o

georreferenciamento, aplicação de contrastes e a geração de composições coloridas,

composições estas executadas para os ortomosaicos e a imagem do satélite IKONOS, sendo

que a imagem do satélite CBERS-2B foi utilizada apenas em seu modo pancromático.

3) Seleção da Área Teste: Foi selecionada a microbacia do córrego da Enxada, pertencente à

bacia do ribeirão Bom Jardim, para a identificação do produto de sensoriamento mais

adequado para o mapeamento de áreas úmidas. A partir desta área teste foram mapeadas as

áreas úmidas desta microbacia separadamente em cada imagem, a fim de averiguar qual delas

tem maior potencial para este tipo de trabalho.

4) Trabalhos de Campo: Foram realizados trabalhos de campo para averiguar a consistência

deste método de interpretação, bem como para identificar possíveis alterações no meio físico

que não podem ser verificadas na imagem de satélite. Com o objetivo de avaliar o erro do

mapeamento foram obtidas as coordenadas UTM de 5 pontos localizados no limite das áreas

úmidas do córrego da Enxada. As coordenadas desses pontos foram também adquiridas

através das imagens, por meio das quais obteve-se os valores do Erro Quadrático Médio

(RMS) para cada um dos três produtos de sensoriamento remoto analisados. Tais valores,

juntamente com as observações feitas durante o trabalho de mapeamento em tela do

computador e as informações referentes a cada imagem permitiu identificar o melhor produto

para o referido objetivo.

5) Mapeamento das Áreas Úmidas da Bacia do ribeirão Bom Jardim: Após a identificação da

imagem mais adequada para o mapeamento das áreas úmidas foi utilizado o método de

interpretação visual em tela do computador para delimitação das áreas úmidas de toda a bacia

do ribeirão Bom Jardim, no software SPRING 5.0, interpretação esta que também passou por

verificações no campo.

6) Interpretação Visual Final da Imagem de Satélite e Elaboração de Mapas: Após a certificação

de campo, foi desenvolvida a interpretação visual final da imagem de satélite, a partir da

edição dos planos de informação referentes aos mapeamentos realizados no software SPRING

5.0; bem como o seu tratamento e manipulação por meio dos softwares SPRING 5.0 e

ArcGIS 9.2, executando procedimentos como mosaico de imagens, recorte de plano de

informação a partir de máscara, entre outros. A partir dos resultados obtidos foram produzidos

mapas no ArcGIS 9.2 estabelecendo a comparação entre as imagens, bem como o mapa das

áreas úmidas da bacia do ribeirão Bom Jardim para o ano de 2007.

4 - Resultados e Discussão

4.1 - Avaliação dos Produtos de Sensoriamento Remoto para o Mapeamento de Áreas Úmidas

A comparação entre as imagens por meio do mapeamento da área teste com cada produto de

sensoriamento remoto possibilitou identificar as diferenças entre as imagens e, assim, selecionar a de

maior potencial para a delimitação de áreas úmidas. A partir da análise das características de cada

imagem, como a sua resolução espacial, radiométrica, temporal, o custo, etc., levando-se em

consideração o objetivo em questão, constatou-se que a imagem do satélite IKONOS constitui-se no

melhor material para a delimitação de áreas úmidas. O mapeamento das áreas úmidas na microbacia do

Córrego da Enxada realizado nestes diferentes produtos para fins de comparação dos resultados pode

ser visualizado nas figuras 03, 04 e 05, com as imagens IKONOS, Ortomosaico/IBGE e HRC/CBERS-

2B, respectivamente.

Mediante a interpretação visual, as imagens IKONOS permitiram aquisição de informações a

um nível maior de detalhe em razão das resoluções radiométrica e espacial. A resolução espacial de 1,0

metro RGB e a resolução radiométrica de 11 bits (2048 níveis de cinza) demonstraram maior

capacidade para o analista na interpretação visual por meio da tela de computador. Além destes

aspectos, o RMS também foi considerado satisfatório, o que contribuiu com maior viabilidade com

relação aos outros instrumentos analisados. Os valores de RMS da imagem IKONOS estão muito

próximos da precisão do GPS de Navegação (Quadro 01), considerando assim, que as imagens

IKONOS possuem melhor precisão para o mapeamento de áreas úmidas. A resolução temporal de 2.9

dias no modo pancromático e 1.5 dias no multiespectral facilita a aquisição de imagens deste satélite.

As maiores desvantagens da obtenção de imagens IKONOS estão relacionadas ao custo relativamente

elevado e à necessidade de um computador com boa configuração para o seu processamento e

manipulação. O preço varia conforme a quantidade de informação contida na imagem, em torno de R$

45,00 a R$ 110,00 reais por km². Ressalta-se que a área mínima para efetuar o pedido da imagem é de

50 km² (5 km x 10 km). Desta forma o preço mínimo a se pagar, em média, seria de aproximadamente

R$ 3.500,00 no período atual.

O produto final obtido com os ortomosaicos/IBGE mostrou qualidade considerável no

mapeamento das áreas úmidas da microbacia do córrego da Enxada. Os ortomosaicos do IBGE

apresentaram valores intermediários para o RMS. A aquisição gratuita das áreas mapeadas com as

ortofotos do IBGE constitui um aspecto favorável para aplicação em delimitação de áreas úmidas com

escalas de até 1:10.000. Porém, apresentam a desvantagem de custos bastante elevados para as áreas

destituídas do mapeamento, maiores do que os das imagens IKONOS, bem como maior tempo para

obtenção dos ortomosaicos.

As imagens do sensor HRC/CBERS-2 com resolução espacial de 2.7 metros apresentaram boa

interpretação de dados, mesmo sendo analisadas no modo pancromático. A profundidade radiométrica

de 8 bits (256 níveis de cinza) não permite uma diferenciação de pixels a um nível de detalhe como o

da imagem IKONOS. O sensor HRC, por ter sido lançado recentemente em órbita (ano de 2007) e por

possuir resolução temporal de 130 dias, ainda ocasiona algumas dificuldades para utilização de suas

imagens. O período de revisita relativamente demorado em conjunto com a área de imageamento do

sensor de 27 km nadir, representam fatores que comprometam a disponibilidade das imagens, e

conseqüentemente, limitam sua aplicação. O RMS referente às imagens deste sensor é considerado

tolerável, porém os valores são bem mais elevados que o erro apresentado pela imagem IKONOS, não

sendo muito indicada para mapeamentos que demandam resultados de alta precisão.

Desta forma, em razão de sua maior precisão, importante para o mapeamento de áreas úmidas

com fins de planejamento e gestão ambiental, da maior agilidade na aquisição das imagens e custo

intermediário entre a imagem HRC e as Ortofotos, as imagens do satélite IKONOS são as mais

indicadas para este tipo de mapeamento entre os produtos avaliados, especialmente quando utilizada

por órgãos públicos na execução de programas de reabilitação de áreas degradadas e de APPs, uma vez

que é de relevante importância o mapeamento de precisão para a tomada de decisões quando da

intervenção no meio físico e também devido a maior disponibilidade de recursos financeiros que

podem ser destinados a projetos ambientais pela iniciativa do poder público.

Quadro 01 - Valores de RMS entre as diferenças das coordenadas UTM obtidas em campo e nas imagens.

Tipo de Imagem Coordenadas UTM

Desvio Leste (m) Desvio Norte (m)

IKONOS 4.7 5.8

ORTOMOSAICO/IBGE 9.8 10.9

HRC/CBERS-2B 12.7 18.9 Elaboração: BORGES, F. A., BRITO, J. L. S., 2009.

Figura 03: Mapeamento das Áreas Úmidas na Microbacia do Córrego da Enxada em Imagem do Satélite IKONOS. Fonte: Brito, J. L. S., 2001.

Figura 04: Mapeamento das Áreas Úmidas na Microbacia do Córrego da Enxada em Ortofotomosaico do IBGE. Fonte: Brito, J. L. S., 2001; IBGE, 2004.

Figura 05: Mapeamento das Áreas Úmidas na Microbacia do Córrego da Enxada em Imagem do Satélite CBERS-2B. Fonte: Brito, J. L. S., 2001; INPE, 2008.

4.2 - Mapeamento das Áreas Úmidas na Bacia do Ribeirão Bom Jardim

As figuras 08 e 09 (anexo 01 e 02) apresentam, respectivamente, a carta imagem IKONOS da

bacia do ribeirão Bom Jardim e o mapa de delimitação das áreas úmidas nesta bacia no ano de 2007.

Este mapa mostrou que a referida bacia possui uma área de 93,05 km² de áreas úmidas, o que

representa 23,35 % de sua área total . Com a utilização da imagem IKONOS foi possível realizar um

mapeamento de grande precisão, a partir do qual foram identificadas alguns aspectos de relevância

importância a respeito do uso e ocupação do solo na área de estudo, especialmente no que concerne às

áreas úmidas.

Foi possível perceber pelas imagens de satélite que em diversos trechos da bacia hidrográfica,

as atividades pastoris ou agrícolas avançam de forma parcial ou total sobre a faixa de domínio das

APPs, que compreendem as áreas úmidas e a partir de seu limite uma área com raio mínimo de 50

metros. Outros casos também evidenciam que as áreas úmidas estão sendo gradativamente suprimidas,

o que pode gerar diversos passivos ambientais, dificultando a manutenção do equilíbrio dinâmico

destes ambientes de grande fragilidade, tanto com relação aos seus elementos bióticos, quanto àqueles

abióticos. Um exemplo deste problema pode ser verificado em um dos trabalhos de campo realizados

para a consecução da presente pesquisa. As áreas úmidas do córrego da Enxada vem sendo

gradativamente suprimidas com o objetivo de incorporá-las para atividades agrícolas, ocorrendo a sua

expansão cada vez mais próximas as veredas existentes na microbacia, que, de acordo com a legislação

ambiental brasileira, não deveria ter nenhum tipo de ocupação antrópica, apenas sua vegetação natural

(Figuras 06 e 07).

Figura 06: Área Úmida em Processo de Supressão para Figura 07: Supressão da Vegetação Natural em Área de Incorporação de Área Agrícola Nascente. Autor: BORGES, F. A., 2009. Autor: BORGES, F. A., 2009.

As terras da região do Triângulo Mineiro e conseqüentemente dos municípios que integram a

bacia do ribeirão Bom Jardim estão inseridas no processo de expansão da fronteira agrícola para o

Cerrado, intensificada a partir da década de 1960. Até este período, as terras eram usadas

predominantemente para a pecuária extensiva, cujo manejo consistia em queima periódica para

renovação das gramíneas. Na década de 1970, a bacia do ribeirão Bom Jardim e superfícies das

chapadas foram ocupadas por imensas áreas de reflorestamento de pinus e eucalipto. Essa mudança

ocorreu graças aos incentivos concedidos por programas governamentais que objetivaram o

desenvolvimento econômico das áreas de Cerrado. Posteriormente, o “processo de modernização da

agricultura brasileira” promoveu a expansão da soja e do milho que recobriram áreas abandonadas pelo

reflorestamento, ocupando superfícies de latossolos e campos hidromórficos. Estes solos eram

considerados até então, como impróprios para a agricultura. Juntamente com o plantio da soja e milho,

vieram as técnicas de correções químicas do solo e o uso de herbicidas e inseticidas. Schneider (1996)

afirma que o uso destas substâncias agrícolas foi uma das principais causas que contribuíram para a

contaminação das águas da bacia do rio Uberabinha.

A expansão acelerada da agricultura resultou na supressão drástica de áreas de cerrado (lato-

sensu). No intento de ampliar a produção agrícola, uma porção significativa de áreas úmidas foram

incorporadas ao setor produtivo. Dentre os danos ambientais gerados desta prática, os problemas

relacionados aos agrotóxicos (como: toxicidade seletiva, persistência no ambiente, potencial de

bioacumulação e mobilidade) estão entre os mais graves. O aumento de susceptibilidade de

contaminação do solo e corpos hídricos por agrotóxicos pode ocorrer ao longo de todo o rio

Uberabinha quando os limites da mata ciliar não são respeitados.

Nas porções ocupadas pela pecuária, o pisoteio imposto pelo gado (bovino) também reduz o

nível de infiltração da água da chuva. Porém o impacto negativo de maior relevância decorre do

confinamento do gado em Áreas de Preservação Permanente. Esta situação decorre da total ocupação

de porções de relevo favorável para a agricultura mecanizada restando, assim, as áreas úmidas ou de

elevada declividade na área da bacia para tal prática. A invasão de áreas úmidas e de nascentes pelo

gado resulta na sua compactação e, até mesmo no desaparecimento de nascentes.

5 – Considerações Finais

O mapeamento das áreas úmidas é um passo importante e intangível para a delimitação das

APPs. O intenso e inadequado uso da terra na bacia do ribeirão Bom Jardim concorre cada vez mais

para um sistema desequilibrado, com intenso comprometimento dos recursos naturais. O

prevalecimento desta situação de desrespeito à faixa de domínio da APP (que poderia funcionar como

um filtro bioquímico) coloca em risco tanto a disponibilidade de água para suprir a demanda das

atividades antrópicas, quanto a qualidade da água para a cidade de Uberlândia.

Assim sendo, a execução de estudos a respeito de áreas úmidas são de fundamental

importância, pois constituem-se na primeira etapa para a efetiva conservação destas áreas. A aplicação

do geoprocessamento para a consecução desta pesquisa mostrou-se bastante eficiente, uma vez que

possibilitou uma maior compreensão da dinâmica pertinente às áreas úmidas, e a avaliação do produto

final adequado para seu estudo. Por fim, possibilitou também a identificação de impactos ambientais

pertinentes às áreas de interesse.

A utilização de imagens pagas de alta resolução ainda é um fator bastante restrito em virtude

dos custos relativamente elevados. Contudo, por intermédio de órgãos públicos e instituições de

pesquisa esse contexto possa se tornar mais viável. Outra alternativa é o investimento em tecnologias

para o fornecimento de produtos livres e/ou gratuitos, como é o caso do sensor HRC/CBERS-2B.

Embora este sensor tenha apresentado algumas restrições de uso, é uma ferramenta gratuita e que pode

viabilizar, de forma satisfatória, a realização de diversas pesquisas.

Figura 08: Carta Imagem da Bacia do Ribeirão Bom Jardim – Imagem IKONOS de 2007. Fonte: Brito, J. L. S., 2001; PMU, 2008.

Figura 09: Mapeamento das Áreas Úmidas da Bacia do Ribeirão Bom Jardim - 2007. Fonte: Brito, J. L. S., 2001; PMU, 2008.

6 - Referências

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