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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS MORFOLÓGICAS (PCM) MESTRADO FORA DE SEDE - UFBA MARIA PENHA OLIVEIRA BELÉM CONTRIBUIÇÃO DO ENSINO DA ANATOMIA À FORMAÇÃO DO MÉDICO Salvador 2008

MARIA PENHA OLIVEIRA BELÉM CONTRIBUIÇÃO DO …livros01.livrosgratis.com.br/cp068405.pdf · O ensino de Anatomia Humana tem sido considerado um dos pilares da formação médica

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS MORFOLÓGICAS (PCM) MESTRADO FORA DE SEDE - UFBA

MARIA PENHA OLIVEIRA BELÉM

CONTRIBUIÇÃO DO ENSINO DA ANATOMIA À

FORMAÇÃO DO MÉDICO

Salvador 2008

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MARIA PENHA OLIVEIRA BELÉM

CONTRIBUIÇÃO DO ENSINO DA ANATOMIA À

FORMAÇÃO DO MÉDICO

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Morfológicas do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em parceria com Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Bahia no Programa Mestrado fora de sede.

Orientador: Prof. Dr. Vivaldo Moura Neto Co-orientador: Prof. Dr. Roberto Paulo Correia de Araújo

Salvador 2008

Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca do Instituto de Ciências da Saúde da UFBA – Salvador – Bahia

B428 Belém, Maria Penha Oliveira, Contribuição do ensino da anatomia à formação do médico / Maria Penha Oliveira Belém. – Rio de Janeiro, Salvador, 2008. xii, 84 f. : il.

Orientador: Prof. Dr.Vivaldo Moura Neto Co-orientador: Prof. Dr. Roberto Paulo Correia de Araújo

Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Ciências Biomédicas, Programa de Pós-Graduação em Ciências Morfológicas; Universidade Federal da Bahia, Instituto de Ciências da Saúde, Programa de Pós-Graduação Fora de Sede, 2008.

2. Educação médica. 2. Anatomia – Educação. 3. História da medicina. 4. Educação Superior. I. Moura Neto, Vivaldo, II. Araújo, Roberto Paulo Correia de, III. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Ciências Biomédicas. IV. Universidade Federal da Bahia. Instituto de Ciências da Saúde. V. Título.

CDU: 61:378

ii

MARIA PENHA OLIVEIRA BELÉM

Contribuição do ensino da Anatomia à Formação do Médico Salvador, 04 de julho de 2008.

Orientador: Prof. Dr. Vivaldo Moura Neto /UFRJ

Avaliador: Prof. Dr. Francisco Prado Reis /UNIT-SE

Avaliador: Prof. Dr. José Garcia Ribeiro Abreu Júnior / UFRJ

Avaliadora: Profa. Dra. Denise Rocha Corrêa Lannes / UFRJ

Revisora e Suplente: Profa. Dra. Maria Eugênia Leite Duarte

iii

• Aos meus pais, Raimundo e Vicência (in memoriam), sempre presentes

em minha vida.

• Aos meus filhos, Lucile e Gustavo, razões maiores do meu afeto e motivos

do meu entusiasmo e paixão pela vida.

Aos meus irmãos Dalveniza, Alzir, Zélia, José e Almir (in memoriam),

suportes de afeto e estímulo constante.

Aos mestres, tantos de ontem e de hoje, de dentro e de fora do meio

acadêmico.

iv

AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, Prof. Dr. Vivaldo Moura Neto, pelo incentivo, pela confiança e

pela orientação segura e competente;

Ao Prof. Dr. Roberto Paulo Correia Araújo pela sua co-orientação. O meu

reconhecimento;

À Profa. Dra. Telma Sumie Masuko, por todo apoio e por sua valiosa contribuição

num momento decisivo deste trabalho;

Aos Profs. Dr. Carlos Alberto Lima da Silva e Ailton dos Santos Silva pelas

sugestões e contribuição na análise estatística e na elaboração do grupo focal desta

dissertação;

Às Profas. Lourdes Bernadete Rocha de Souza e Marilene Batista Colaço Costa,

pelas contribuições dadas na elaboração deste trabalho;

Aos professores de Anatomia dos Cursos de Medicina das Universidades Públicas

que aceitaram colaborar com esta pesquisa;

Aos estudantes de Medicina das Universidades Federais da Bahia e do Rio de

Janeiro e da Universidade de São Paulo e aos monitores da disciplina ICS 062

Anatomia II A da UFBA por aceitarem participar desta pesquisa;

Aos colegas professores e funcionários do Departamento de Biomorfologia, pelo

apoio recebido;

A todos os amigos que me apoiaram e incentivaram durante o desenvolvimento

deste trabalho.

v

"Ao te curvares com a rígida lâmina de teu bisturi sobre o cadáver

desconhecido, lembra-te que este corpo nasceu do amor de duas

almas, cresceu embalado pela fé e pela esperança daquela que em seu

seio o agasalhou. Sorriu e sonhou os mesmos sonhos das crianças e

dos jovens. Por certo amou e foi amado, esperou e acalentou um

amanhã feliz e sentiu saudades dos outros que partiram. Agora jaz

na fria lousa, sem que por ele se tivesse derramado uma lágrima

sequer, sem que tivesse uma só prece. Seu nome, só Deus sabe. Mas o

destino inexorável deu-lhe o poder e a grandeza de servir à

humanidade. A humanidade que por ele passou indiferente."

(Karl Rokitansky, 1876)

vi

LISTA DE QUADROS

Quadro I - Distribuição da disciplina Anatomia Humana na grade curricular dos

Cursos de Medicinas (Bahia e Rio de Janeiro) do Brasil na primeira metade do

século XIX.

Quadro II - Comparação da distribuição da disciplina Anatomia com as demais

matérias básicas e profissionalizantes no Ensino Médico da Bahia na primeira

metade do século XIX.

Quadro III - Estudo comparativo das disciplinas da área básica com as da área

profissionalizante entre a grade curricular de 1854 e a de 2006 no Curso Médico da

UFBA.

Quadro IV - Variação do percentual das disciplinas da área básica e da área

profissionalizante no Curso de Medicina da UFBA concernente aos anos de 1854 e

de 2006.

vii

LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Percepção dos professores de Anatomia de Curso de Medicina em

Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil quanto à importância da dissecação no

ensino da Anatomia.

Tabela 2 – Percepção de professores de Anatomia de Curso de Medicina quanto à

importância das aulas com modelos vivos e por imagem no ensino da Anatomia em

Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil.

Tabela 3 – Percepção de professores de Curso de Medicina quanto à importância da

participação dos monitores nas aulas práticas no ensino da Anatomia em Instituições

Públicas de Ensino Superior no Brasil.

Tabela 4 – Percepção de professores de Curso de Medicina quanto à importância das

avaliações teóricas e práticas no ensino da Anatomia em Instituições Públicas de Ensino

Superior no Brasil.

Tabela 5 – Percepção de professores de Curso de Medicina quanto à importância da

integração do ensino de anatomia com outras disciplinas em Instituições Públicas de

Ensino Superior no Brasil.

Tabela 6 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições

Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à importância das

aulas práticas no ensino da Anatomia.

Tabela 7 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições

Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à importância da

dissecação no ensino de anatomia.

Tabela 8 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições

Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à substituição do

cadáver por imagens virtuais no ensino da Anatomia.

viii

Tabela 9 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições

Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto ao ensino

integrado da Anatomia e a sua importância para as especialidades.

Tabela 10 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições

Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à distribuição dos

conteúdos de Anatomia em vários semestres.

Tabela11 – Comparação da percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três

Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à

importância do ensino da Anatomia.

ix

LISTA DE FIGURAS

Fig. 1. Reprodução da figura do sistema arterial e órgãos internos, incluindo os intestinos marcados com textos, que faz parte do Tratado ilustrado de Anatomia Humana, intitulado Tashrih-i badan-i insan, de Mansur ibn Ilyas, reproduzido a partir do site <http://www.nlm.nih.gov/hmd/arabic/images/p1828a.jpg>. Fig. 2. O esqueleto de criança da obra Osteographia de CHESELDEN, 1733, reproduzido a partir do site <http://www.nlm.nih.gov/exhibition/historicalanatomies/ Images/1200_pixels/cheselden_t32.jpg>.

Fig 3. Prancha XX da obra The anatomy of the human gravid uterus exhibited in figures, de HUNTER, 1774, evidenciando um feto em fase final de gestação no útero, com placenta e cordão umbelical - reproduzido a partir de <http://www.nlm.nih.gov/exhibition/historicalanatomies/ hunterw_bio.html>.

Fig. 4. Representação do Teatro Anatômico de Pádua da obra A History of Medicine, de MAJOR, 1954, reproduzido a partir do site <http://clendening.kumc.edu/dc/rm/major_16th.htm> Fig. 5. Decisão do Príncipe Regente Dom João VI, de 18 de fevereiro de 1808, que manda criar uma Escola de Cirurgia no Hospital Real de Salvador, Bahia, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/Legimp-A2_2 .pdf>

Fig. 6. Representação do Terreiro de Jesus, em Salvador, Bahia, de 1808, reproduzido do Esboço histórico dos acontecimentos mais importantes da vida da Faculdade de Medicina da Bahia (1808-1946) de TORRES, 1946, mostrando da esquerda para a direita: a Torre da Igreja do Colégio (hoje Catedral Basílica); o Colégio dos Jesuítas; o Hospital Real Militar; a Casa Colonial na esquina da Rua Portas do Carmo, hoje Alfredo Britto. Fig.7. Decreto do Príncipe Regente Dom João VI, de 2 de abril de 1808, que estabelece uma cadeira de Anatomia no Hospital da Misericórdia no Rio de Janeiro, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/Colecoes Legislacao/Legimp-A1_5.pdf > Fig. 8. Representação da primeira sede do Real Hospital Militar, no Morro do Castelo, no Rio de Janeiro, no período de 1808. In: MAIA, George Doyle. Biografia de uma Faculdade: História e Estórias da Faculdade de Medicina da Praia Vermelha. São Paulo: Ed. Atheneu, 1996, reproduzido de <http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/iah/P/verbetes/botrealmil.htm> Fig. 9. Decreto do Príncipe Regente Dom João VI, de 1 de abril de 1813, que aprova o plano de estudos de Cirurgia no Hospital da Misericórdia do Rio de Janeiro, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/Colecoes/Legislacao/Legimp-C_23.pdf> Fig. 10. Carta Régia do Príncipe Regente Dom João VI, de 29 de dezembro de 1815, que cria um curso completo de Cirurgia da Bahia, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/Colecoes/Legislacao/Legimp-C_62.pdf>

x

Fig. 11. A Regência Trina, em nome do Imperador Pedro II decretou e sancionou, Lei de 3 de outubro de 1832 que dá nova organização às atuais Academias Medico-cirúgica do Rio de Janeiro e da Bahia reproduzido de <http://www.camara.gov.br/ Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/legimp-15/Legimp-15_10.pdf>.

Fig. 12. Decreto nº 1387 de 28 de abril de 1854, assinado pelo Ministro e Secretário do Estado dos Negócios do Império com a rubrica do Imperador D. Pedro II de Estado, dá novos Estatutos às Escolas de Medicina, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/1854%20pronto/leis%201854/ dec%20n°1387%20à%201387-pg12-p24.pdf>

xi

RESUMO O ensino de Anatomia Humana tem sido considerado um dos pilares da formação médica. Nos últimos tempos, porém, vem sendo afetado por diferentes fatores, tais como a nova realidade sócio-educacional e o surgimento de novas tecnologias. Como resultado, chega-se a observar uma perda de espaço dessa disciplina, seja pela redução da carga horária, seja pelas formas de abordagem, algumas das quais propõem a adoção de recursos provenientes das tecnologias da informática e da comunicação em substituição ao uso do cadáver nas aulas práticas de anatomia. Neste estudo, nosso objetivo mais amplo foi avaliar a contribuição do ensino de Anatomia Humana para a formação do Médico. A pesquisa foi desenvolvida em três etapas com abordagens metodológicas distintas. Fizemos inicialmente uma retrospectiva histórica, com base em documentos de natureza diversa (decretos, leis, memórias etc.), descrevendo a participação do ensino de Anatomia, em termos de disciplinas e de carga horária, desde a criação do primeiro curso médico na Bahia, em 1808, até 1854, estabelecendo uma comparação da grade curricular de 1854 com a de 2006 na UFBA. Numa segunda etapa, procuramos identificar e avaliar, por meio da aplicação de questionários a professores de Anatomia do curso de medicina, os instrumentos didáticos de que se valem: aulas teóricas e práticas, emprego ou não do cadáver, utilização de tecnologias da informática e da comunicação. Buscamos igualmente detectar, a forma como os alunos de Medicina recebe a disciplina e o grau de importância que lhe conferem na sua formação acadêmica. Com esse intuito, aplicamos um questionário a 422 alunos de três Instituições Publicas de Ensino Superior UFBA, UFRJ e USP. A fim de complementar as informações obtidas nesse questionário, realizamos, na terceira etapa, um grupo focal com dez alunos de medicina da UFBA que atuavam como monitores da disciplina. A esses aplicamos um questionário com cinco perguntas abertas, retomando as questões básicas abordadas no questionário anterior. Os resultados da pesquisa atestam que a disciplina Anatomia teve sua carga horária diminuída ao longo dos anos, deixando até de compor o ciclo profissional do curso médico. Além disso, constatamos que em alguns cursos ela é oferecida de forma isolada em relação às demais. As respostas aos questionários permitem ainda concluir que o uso do cadáver continua sendo o preferido para os estudos anatômicos, sem prejuízo do uso de outros instrumentos de estudo que são disponibilizados pelas tecnologias da informática e da comunicação. As constatações a que chegamos nos permitem sugerir a continuação do uso do cadáver nas aulas práticas de Anatomia, além da busca de uma real integração do ensino dessa disciplina não só com as demais disciplinas do nível básico, mas também com as disciplinas do nível profissional.

Palavras – chave: Anatomia - Educação . Educação Médica. História da Medicina

xii

ABSTRACT Teaching Human Anatomy has been considered one of the pillars of medical education. However, this process has been affected by different factors, such as a new socio-educational reality and the development of new technologies. Consequently, there seems to be a loss of space for this discipline, either from a reduction in curricular time, or from the different approaches, some of which propose to adopt resources from computer and communication technology in substitution for practical anatomical teaching using cadavers. In the present study, our general objective was to evaluate the contribution of teaching Human Anatomy to the education of the Medical Doctor. The research was developed in three stages with different methodologies. We performed initially a historical retrospective, based on various document sources (decrees, laws, memories and so on), describing the participation of teaching Anatomy, regarding the disciplines and curricular time, from the creation of the first medical course in Bahia, in 1808, until 1854, comparing with the current curriculum in 2006 in UFBA. In a second stage, we aimed to identify and evaluate, though questionnaires applied to Anatomy professors from the medical course, the educational instruments they apply: practical or theoretical classes, use or not of a cadaver, use of computer and communication technologies. Finally, we aimed to detect the way the medical students receive the discipline and the importance they confer it in their medical formation. With this objective, we applied a questionnaire to 422 students from three public institutions (UFBA, UFRJ and USP). To complement the information obtained from this last questionnaire, we interviewed ten medical students who acted as monitors of the discipline, applying five open questions with the same basic questions as the last questionnaire. The results of the present research show that the discipline Anatomy had its curricular time diminished progressively throughout the years, reaching the point of leaving the Professional cycle of the medical curriculum. Furthermore, we found that in some courses it is offered separately in relation to other disciplines. The response to the questionnaires allows us to conclude that the use of the cadaver remains the preferred methodology for the anatomical studies, notwithstanding the use of other instruments from computer and communication technologies. The data we collected allow us to suggest continuing with the use of cadavers in practical Anatomy classes, and to persue the integration of this discipline not only with other disciplines from the basic level, but also with disciplines from the Professional level. Key-words: Anatomy - Education. Medical Education. Medicine History.

xiii

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 1

Considerações Iniciais ................................................................................. 1

Estado da Arte ............................................................................................. 2

Objetivos ...................................................................................................... 4

Justificativa e relevância do estudo ............................................................. 5

Questões de pesquisa ................................................................................. 6

Abordagem metodológica ............................................................................ 7

Estrutura do trabalho ................................................................................... 7

1. O ENSINO DA ANATOMIA ........................................................................ 8

1.1. Panorama histórico ................................................................................... 8

1.1.1. Os Tratados Anatômicos ........................................................................ 8

1.1.2. Os Atlas Anatômicos .............................................................................. 10

1.1.3. Os Modelos Anatômicos......................................................................... 13

1.1.4. O cadáver ............................................................................................... 14

1.2. Anatomia no Brasil: das origens ao Império .............................................. 19

1.2.1. Ensino da Anatomia antes da instalação das Escolas de Medicina ....... 19

1.2.2. Instalação das primeiras Escolas de Medicina no Brasil ........................ 20

1.2.3. Reforma do ensino médico do Rio de Janeiro (1813) e da Bahia (1816)

– Lineamento do ensino médico ............................................................

24

1.2.4. Reforma de 1832 – Organização das escolas médicas do Império........ 26

1.2.5. Reforma do ensino médico de 1854 – Modelo francês........................... 27

1.2.6. Reformas do ensino médico após 1854 ................................................. 28

1.3. Novos Métodos de Ensino de Anatomia ................................................... 29

2. MATERIAIS E MÉTODOS........................................................................... 32

3. RESULTADOS ............................................................................................ 37

4. DISCUSSÃO................................................................................................ 58

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................... 72

REFERÊNCIAS................................................................................................. 77

ANEXOS ........................................................................................................... 87

INTRODUÇÃO

Considerações Iniciais

O ensino da disciplina Anatomia Humana no Curso de Medicina, considerada

fundamental para a formação do profissional médico no passado, tem sido objeto de

diversas adaptações decorrentes do desenvolvimento tecnológico e das

descobertas científicas. Isso pode ser constatado observando-se os estudos

desenvolvidos por vários pesquisadores de Instituições estrangeiras do ensino

médico, tais como McLaghlan e Patten (2006), Reidenberg e Laitman (2002)

Vázquez, Riesco e Carretero (2005).

Além disso, foram incorporadas ao ensino médico outras disciplinas que

incluíam em seu conteúdo novas descobertas científicas, principalmente aquelas

ocorridas a partir do século XIX, com os trabalhos de Louis Pasteur (1822 - 1895),

de Robert Koch (1843-1910), do anátomo-patologista Rudolf Ludwig Virchow (1821-

1902), entre tantos outros que precederam a revolução da genética mendeliana, a

genética molecular de Jacques Monod (1910-1976) e François Jacob (1920 - ) e

James Watson (1928 - ) e Francis Crick (1916 – 2004) com a descoberta da

estrutura do DNA.

A incorporação dos resultados dessas novas descobertas tem operado

constantes mudanças nas disciplinas ministradas no Curso Médico. Dentre os temas

atualmente discutidos destacam-se: o uso do cadáver nas prossecções1 e nas

dissecações2 (LEMP, 2005; AZER, EIZENBERG, 2007; LEUNG e cols., 2006); as

reações emocionais dos estudantes ao manejo do cadáver (VIJAYABHASKAR, 1 Peças anatômicas previamente dissecadas 2 Palavra de origem latina que do ponto de vista etimológico significa dis- separadamente e secare cortar e é o equivalente latino do grego anatome

2

SHANKAR, DUBEY, 2005); a integração da anatomia com a prática médica (BOON, e

cols., 2001; PRINCE e cols., 2003; ABU-HIJLEH e cols., 2005; LEUNG e cols., 2006;

MOXHAM, PLAISANT, 2007); a introdução de novos procedimentos pedagógicos

(LEUNG e cols., 2006) e a análise da anatomia no currículo por professores dessa

matéria (HEYLINGS, 2002).

Além disso, as mudanças decorrentes das reformas da estrutura curricular

têm evidenciado a necessidade da implantação de novos procedimentos

pedagógicos para o ensino nas Escolas de Medicina. Para tanto, tem-se promovido

a redução de carga horária da disciplina Anatomia, uma nova forma de abordá-la,

sem a dissecação do cadáver, o uso da aprendizagem baseada no estudo de

problemas (PBL3) e a integração do ensino da Anatomia com a Clínica Médica

(LEUNG e cols., 2003; VÁZQUEZ e cols., 2005; LEUNG e cols., 2006).

Estado da Arte

O ensino de anatomia tem sido objeto de muitos trabalhos de pesquisa. No

entanto, relativamente poucos são os trabalhos que contemplam uma reflexão mais

cuidadosa acerca desse ensino numa perspectiva integrada e centrada na realidade

do futuro profissional. Algumas pesquisas têm enfocado aspectos particulares

relacionados à abordagem metodológica, incluindo-se aí tanto o uso das técnicas de

ensino como a relação entre professor e aluno. Passando em revista essa literatura,

relacionamos aqui alguns exemplos representativos de pesquisas nessa área.

VÁZQUEZ e cols. (2005) analisaram as causas da perda de importância

dessa disciplina no último século, como, a estagnação no ensino da Anatomia, o

3 Sigla de Problem-based learning (Ensino baseado em problemas).

3

declínio na dissecação, o uso métodos pedagógicos inadequados, dentre outras, e

forneceram argumentos em defesa da melhoria do seu ensino nos currículos

médicos, como, aplicação de avanços tecnológicos na educação médica, aumento

do tempo utilizado na dissecação, uma compilação de terminologia médica comum e

um maior “dinamismo” em Sociedades Anatômicas e Federações, como também

implementação da pesquisa anatômica. DA NOVA e cols. (2000) diagnosticam a

falência do modelo pedagógico/assistencial na formação médica, evidenciado,

dentre outros sintomas, pela ideologia da frieza e distanciamento que perpassa a

prática médica, modelo de relação médico-paciente que reproduziria a relação

estudante-cadáver. Visando modificar tal ideologia, foram criados na Universidade

Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em atividade interdisciplinar com a Anatomia,

grupos de reflexão com os alunos do primeiro período da Faculdade de Medicina,

cujo trabalho resultou na criação de um vídeo didático, “Lição de Anatomia”, a ser

utilizado como ferramenta para a melhoria do ensino e da prática médica,

introduzindo a discussão de questões éticas.

BASTOS e PROENÇA (2000) abordam a prática anatômica na perspectiva da

formação médica, detendo-se na análise de como a reação do aluno ao contato com o

cadáver pode ser determinante do comportamento do futuro profissional com seu

paciente. BABINSNKI e cols. (2003), em aulas práticas de Anatomia, procuram

identificar as reações dos alunos da área de Saúde ao contato com o cadáver.

Analisaram também a influência dessa atividade no processo de ensino/aprendizagem

de Anatomia.

FORNAZIERO e GIL (2003) apontam inovações tecnológicas, como,

microcomputadores, telas de monitor sensível ao toque, disco laser, fibras ópticas,

dispositivo de multimídia e videodisco, que podem ser utilizadas para tornar o

4

aprendizado de anatomia humana mais interessante e contribuir para a qualidade do

ensino, preocupando-se também em refletir e reavaliar a prática educacional, com

vistas a oferecer alternativas para introduzir a realidade social de um profissional de

saúde no processo ensino/aprendizagem.

ELIZONDO-OMAÑA e cols. (2005) mostraram uma visão geral da dissecação

como um auxiliar de ensino, através da História. Consideram ainda o relacionamento

da dissecação com outros recursos de ensino, que poderiam determinar uma

importante mudança na história do ensino da Anatomia.

McLACHLAN (2004) introduziu a discussão sobre o uso dos recursos

audiovisuais, em substituição ao uso do cadáver, no ensino da Anatomia

argumentando que na prática clínica, os médicos encontram a anatomia, de um lado

do vivente e de superfície e, de outro, pela imagenologia médica, concluindo que

parece fazer sentido ensinar anatomia sem a utilização do cadáver. McLACHLAN e

PATTEN (2006) discorrem brevemente sobre a história da dissecação, mas abordam

também os debates atuais sobre as vantagens e desvantagens do uso de

cadáveres, da prossecção versus dissecção, e do uso da anatomia do vivente e da

imagem em vez de cadáveres.

Objetivos

Nosso objetivo geral é investigar a contribuição do ensino de Anatomia

Humana para a formação do médico no Brasil. Para tanto, estabelecemos os

seguintes objetivos específicos:

a. Comparar a carga horária da disciplina de Anatomia nos cursos de

Medicina no Brasil, em especial, no período entre a sua fundação em 1808

e das sucessivas reformas até a de 1854;

5

b. Detectar a percepção dos professores de Anatomia e dos estudantes do 1º

e 2º ano do Curso de Medicina em instituições públicas têm acerca do

ensino da Anatomia na atualidade.

c. Avaliar a importância da dissecação no ensino prático da disciplina de

Anatomia Humana no Curso Médico tendo em vista a possibilidade de

substituição do uso do cadáver nas aulas práticas por imagens virtuais;

d. Examinar, de forma exploratória, algumas propostas alternativas de

abordagem do ensino da Anatomia e sua adequação à realidade

educacional.

Justificativa e relevância do estudo

Nosso trabalho se justifica, em primeiro lugar, pela relativa escassez de

trabalhos que enfoquem o ensino da Anatomia numa perspectiva mais reflexiva, o

que nos impele a tentar aprofundar a reflexão sobre o seu papel na formação do

médico, tanto no aspecto do domínio desse conteúdo quanto em relação a questões

de natureza humanística e ética.

Pela necessidade de melhorar o nosso próprio trabalho docente em

Anatomia, adotando procedimentos didático-pedagógicos calcados nos avanços das

tecnologias de informação e da comunicação e em novas perspectivas educacionais

que levem em conta a participação ativa do aluno no processo formativo.

Por fim, oferecer uma colaboração à discussão do assunto e apontar possíveis

caminhos para o aprofundamento da reflexão sobre o ensino de anatomia dentro da

realidade educacional de nossos dias.

6

Questões de pesquisa

Com vistas a orientar o nosso trabalho investigativo acerca do ensino da

Anatomia Humana no Curso de Medicina, estabelecemos as seguintes questões de

pesquisa:

a. Qual a participação formativa do ensino de anatomia nos cursos de

Medicina de 1808 até a reforma de 1854;

b. Quais as estratégias de ensino dos professores de Anatomia utilizadas nas

Faculdades de Medicina das universidades públicas no País;

c. Qual o grau de reconhecimento dos alunos do Curso de Medicina sobre a

importância da disciplina de Anatomia Humana na sua formação

profissional;

d. Qual a importância dada pelos alunos do Curso de Medicina a dissecação

no ensino de Anatomia Humana;

e. Qual a opinião dos alunos do Curso de Medicina sobre a substituição do

cadáver por imagens virtuais no ensino da Anatomia humana?

Estas são algumas das perguntas que nos colocamos tendo em vista uma

situação em que cada vez mais é discutido e se avalia o papel da anatomia na

formação profissional e a necessidade de adequar o seu ensino à realidade

educacional hodierna. A resposta a estas e a outras questões de igual natureza terá,

então, que considerar a função que essa disciplina desempenha na formação do

profissional médico e as possibilidades que as reflexões contemporâneas sobre o

tema e os avanços tecnológicos oferecem para um redimensionamento de suas

práticas pedagógicas e para uma redefinição do seu papel formativo.

7

Abordagem metodológica

A pesquisa é de natureza qualitativa e quantitativa e se vale de documentos

de origem diversa, complementares entre si, bem como de questionários, como

fontes de informação. O tratamento analítico desses instrumentos nos proporcionou

suporte à reflexão sobre o ensino da Anatomia na formação profissional do médico.

O corpus que utilizamos se compõe de: 1) documentos históricos; 2) artigos

constantes da literatura especializada (revistas científicas e livros); 3) questionários

aplicados a professores e alunos do curso de medicina de instituições públicas.

Os documentos históricos têm como função ilustrar e fundamentar as

informações apresentadas. Os artigos da literatura especializada contribuem com

diferentes reflexões acerca do ensino da Anatomia que servem de suporte à nossa

própria reflexão.

Estrutura do trabalho

O trabalho está dividido em quatro partes. Na primeira parte abordamos o

ensino da Anatomia numa perspectiva histórica, oferecendo um panorama sobre o

seu ensino no Brasil, das origens ao Império, e uma breve notícia sobre novas

abordagens e sobre o uso de tecnologias em nossos dias. Na segunda parte

definimos a abordagem metodológica e descrevemos os instrumentos de pesquisa

utilizados. Na terceira, descrevemos os resultados dos questionários aplicados aos

alunos e professores objeto da pesquisa. Na última parte analisamos os dados

obtidos da literatura especializada sobre o ensino de anatomia nos cursos de

Medicina e dos questionários aplicados a alunos e professores. Nas considerações

8

finais, retomamos as questões examinadas ao longo do trabalho e apresentamos as

nossas conclusões.

1 O ENSINO DA ANATOMIA

1.1. Panorama histórico

1.1.1. Os Tratados Anatômicos

Os registros mais antigos de observações anatômicas remontam à Grécia

antiga (séc. VIII ao séc. IV a.C.). Ainda na Antiguidade, Sorano de Éfeso (98-138

d.C.) descreveu a anatomia do útero e sua obra é considerada como uma das

melhores da antiga anatomia descritiva4. Por sua vez, Galeno de Pérgamo (131-200

d.C.), conhecido como “Príncipe dos Médicos”, escreveu a primeira edição de sua

obra composta por 22 volumes, o equivalente à metade da literatura médica grega e

romana (MARGOTTA, 1998). VAN DE GRAAFF (2001). Galeno chegou a produzir

cerca de 500 escritos médicos, dos quais 83 ainda são utilizados na atualidade. No

entanto, para os estudiosos da história da anatomia, o primeiro registro importante

de tratados descritivos ocorreu somente na Renascença, com a obra de Andreas

Vesalius (1514-1565) De humani corporis fabrica, libri septem5 , impressa em 1543 e

reimpressa em 1555, por Andrés Oporino (VESALIUS, 1543, 1555; GUERRA, 1969;

GOYANES, 1995).

As ilustrações da Fabrica de Vesalius foram feitas por vários artistas,

destacando-se entre eles, J. Stephan van Calcar, aluno de Ticiano, que desenhou as

primeiras figuras. Apesar de Vesalius não desenhar, auxiliou na preparação inicial 4 Estudo da anatomia por sistemas orgânicos, ou seja, pelo conjunto de órgãos que atuam para desempenhar uma mesma função 5 Sete livros sobre a estrutura do corpo humano

9

desses desenhos (GUERRA, 1969; GOYANES, 1995; LYONS e PETRUCELLI,

1997; MARGOTTA, 1998). Fazem parte da obra de Vesalius, 22 ilustrações grandes

e 187 pequenas, compreendendo osteologia, ligamentos, músculos, veias, artérias,

sistema nervoso periférico, órgãos do abdome, órgãos do tórax, cérebro e órgãos

dos sentidos (VESALIUS, 1543). Um fato interessante foi que Vesalius, na primeira

edição de sua obra, cometeu um erro situando um feto humano dentro do útero de

uma cadela, erro que corrigiu na segunda edição, de 1555, provavelmente por ter

encontrado e dissecado o cadáver de uma mulher grávida (VESALIUS, 1543, 1555;

ASSIS Jr., 2007). A investigação deste autor contribuiu para que o ensino dogmático

dos livros antigos fosse transformado no ensino por meio da observação direta (AZIZ

e cols.. 2002).

Os ensinamentos de Vesalius suscitaram a atenção de médicos, de artistas e

de diversos estudiosos, dentre os quais Fabrizio d’Acquapendente e Gabriele

Fallopio (THOMAZ e cols. 1994; LYONS e PETRUCELLI, 1997; VAN DE GRAAFF,

2001; MAGNER, 2005) que escreveu a obra Observationes anatomicae6 publicada

em Veneza em 1561 (THOMAZ e cols. 1994; MARGOTTA, 1998; HUNTER; LIMA,

2003; MAGNER, 2005).

Outro anatomista italiano do período de Vesalius, Bartholomeus Eustachius,

escreveu a obra Tabulae Anatomicae7, em 1552, descrevendo as tubae auditivae8,

e em 1564, os Opuscula anatomica9, reconhecendo as glândulas adrenais como

órgãos independentes dos rins (CATALDI, 1998).

Em 1762, Gianbattista Morgagni (1682-1771), tido como o verdadeiro

fundador da Anatomia patológica, publicou a obra De sedibus et causis morborum 6 Observações anatômicas 7 Tábuas anatômicas 8 Tubas auditivas 9 Opúsculos anatômicos

10

per anatomen indagatis10 (CATALDI, 1998; MAGNER, 2005). Já o estudo

sistematizado dos tecidos, de acordo com suas funções, foi proposto por Marie

François Xavier Bichat (1771-1802) no tratado Anatomie Generale11 (1801), que é

considerado um marco da anatomia moderna (ADLER, 2006).

1.1.2. Os Atlas Anatômicos

No final do século XIV, em 1390, um autor persa, Mansur ibn Muhammad

ibn Ahmad ibn Yusuf ibn Faqih Ilyas, compôs um tratado ilustrado de Anatomia

Humana intitulado Tashrih-i badan-i insan12, também conhecida como Tashrih-i

Mansur-i13,no qual resumiu muitas das observações de Galeno (Figura 1).

Embora este tratado não tenha sido o primeiro a ser escrito no mundo

islâmico, foi o primeiro a ser acompanhado por desenhos do corpo humano com

detalhes anatômicos. Todas as seis ilustrações desta obra continham algumas

similaridades, como a cabeça arredondada, as mãos nas coxas e as coxas

abduzidas (WUJASTYK, 2007). O tratado consistia de uma introdução seguida de

cinco capítulos versando sobre cinco sistemas corpóreos: esquelético, nervoso,

muscular, circulatório com artérias e circulatório com veias.

Durante o Renascimento, o desenvolvimento das artes e das ciências

contribuiu para pôr em evidência o corpo humano. Pintores como Michelangelo di

Ludovico Buonarroti Simoni e Leonardo di ser Piero da Vinci estudaram a anatomia

dos cadáveres, que contribuiu para a criação de trabalhos de arte impressionista

(CALKINS e cols., 1999).

10 Sobre a localização e causas das doenças anatomicamente verificadas 11 Anatomia geral 12 Anatomia do corpo humano 13 Anatomia de Mansur

11

Da Vinci (1452–1519), considerado um gênio do Renascimento, destacou-se

não só como um grande pintor, mas também como anatomista. Participou de

dissecações de cadáveres com o professor Marcantonio Della Torre no intuito de

publicar um livro-texto. Com a morte de Della Torre, Da Vinci desistiu de levar

adiante a preparação do livro. Assim, somente 200 anos após a sua morte, foram

descobertas as ilustrações que seriam usadas na elaboração do livro (O’MALLEY e

SAUNDERS 1997; CIANCHI, 1998; VAN DE GRAAFF, 2001).

Fig. 1. Reprodução da figura do sistema arterial e órgãos internos, incluindo os intestinos marcados com textos, que faz parte do Tratado ilustrado de Anatomia Humana, intitulado Tashrih-i badan-i insan, de Mansur ibn Ilyas, reproduzido a partir do site <http://www.nlm.nih.gov/hmd/arabic/images/p1828a.jpg>.

Em 1733, William Cheselden (1688-1752) publicou a obra Osteographia14 em

duas séries, com 56 pranchas (Figura 2), dedicada ao estudo do sistema ósseo.

14 Osteografia

12

Fig. 2. O esqueleto de criança da obra Osteographia de CHESELDEN, 1733, reproduzido a partir do site <http://www.nlm.nih.gov/exhibition/historicalanatomies/ Images/1200_pixels/cheselden_t32.jpg>.

Fig 3. Prancha XX da obra The anatomy of the human gravid uterus exhibited in figures, de HUNTER, 1774, evidenciando um feto em fase final de gestação no útero, com placenta e cordão umbelical - reproduzido a partir de <http://www.nlm.nih.gov/exhibition/historicalanatomies/ hunterw_bio.html>.

13

As aplicações do conhecimento anatômico à cirurgia foram propostas por William

Hunter em seu Atlas intitulado The Anatomy of The Human Gravid Uterus exhibited in

figures 15 (1774), fundamental para o estudo da obstetrícia (Figura 3).

1.1.3. Os Modelos Anatômicos

Entre os séculos XVII e XIX foram muito difundidos os modelos anatômicos

em cera, em madeira e em papel maché. Embora confeccionados por artistas

plásticos, sua produção, qualidade e emprego eram orientadas por médicos

anatomistas. Esta orientação gerou conflitos entre os médicos e os artistas da

época, dentre eles, Paul Zeiller (1820–1893) que, juntamente com sua esposa, se

posicionou contra esta imposição que denominou de “anatomia da faca”. O casal

usou cera para a confecção dos seus modelos e os expunha em seu próprio museu

de antropologia, usando os modelos anatômicos para se popularizarem e não com o

objetivo de divulgar a anatomia (HOPWOOD, 2007).

No século XX, o ensino da Anatomia foi revolucionado com a técnica da

plastinação preconizada pelo Professor Gunther von Hagens da Universidade de

Heidelberg, na Alemanha, segundo a qual os modelos anatômicos eram criados a

partir dos próprios cadáveres. A técnica consiste basicamente em substituir a água

presente nos tecidos do cadáver por uma mistura de resina, que, impregnando o

material humano, permite obter peças plastinadas, bastante resistentes e inodoras,

além de preservar todos os detalhes da dissecação.

15 A anatomia do útero humano grávido mostrada em 12 figuras

14

A exposição pública de modelos plastinados de corpos humanos ou de partes

deles, como uma forma de exibição de “arte anatômica”, é em parte responsável

pela difusão da técnica de Von Hagens (WEIGLEIN, 1997; JONES, 2006).

No Brasil, a Universidade Federal do Rio de Janeiro dispõe de uma coleção

de mais de 800 peças anatômicas inteiras e segmentadas, plastinadas com a

técnica de Von Hagens, possibilitando uma melhor associação com as imagens

tomográficas (CORREIA e cols., 1998). Essas peças são utilizadas tanto para o

ensino, como para demonstração, no museu do Departamento de Anatomia do

Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ.

REINDENBERG e LAITMAN (2002) consideram que, apesar do trabalho

exaustivo na preparação de uma boa peça dissecada e plastinada, o produto final é

de grande utilidade para o estudo da anatomia, já que o material apresenta uma boa

resistência e pode ser usado constantemente por alunos e professores.

1.1.4. O cadáver

Os primeiros escritos sobre a dissecação e a descrição desses procedimentos

práticos foram de Alcmeon de Crotona (... - 550 a.C) e de Hipócrates de Cós (460 -

370 a.C.), ambos da Grécia antiga. Alcmeon realizou várias observações

anatômicas, no século VI a.C., apesar dos tabus que envolviam o estudo com o

corpo humano.

Outros gregos, como Empédocles (490–430 a. C), Anaxágoras (500–428

a.C), Esculápio e Aristóteles (600 e 350 a.C.), o mais conhecido filósofo da Grécia

antiga, também se dedicaram a dissecações, sendo este último considerado por

alguns estudiosos como o fundador da Anatomia Comparada (LYONS e

PETRUCELLI, 1997; MARGOTTA, 1998; VAN DE GRAAFF, 2001; MAGNER, 2005).

15

Os estudos práticos da Anatomia avançaram consideravelmente na Escola de

Alexandria, no século III a.C., destacando-se nomes como Herófilo e Erasístrato.

Herófilo dissecava cadáveres de condenados à morte, tendo inclusive sido acusado

de ter realizado seus estudos em condenados vivos. O uso de cadáveres de

condenados à morte foi empregado até o século XVI (MARGOTTA, 1998; VAN DE

GRAAFF, 2001; MAGNER, 2005).

Galeno de Pérgamo (c. 131-, c. 200 d.C.) aperfeiçoou seus estudos

anatômicos em Alexandria e sua grande obra anatômica baseou-se na dissecação

de macacos e porcos, o que o levou a cometer alguns erros em seus estudos,

devido à transposição errônea para o corpo humano de observações feitas em

animais (SINGER, 1996).

Segundo Van de Graaff (2001), Galeno chegou a dissecar apenas dois ou

três cadáveres humanos. Entretanto, ele provou, através de seus estudos

experimentais, que o coração do porco continuava a funcionar, mesmo após a

secção dos nervos espinais. Além disso, ele demonstrou, após a retirada dos

ureteres do carneiro, que a urina era produzida no rim e não na bexiga urinária.

Outra colaboração importante foi a constatação de que as artérias continham

sangue e não ar como se acreditava anteriormente

Na Idade Média, entre o século V e o século X, o domínio da Igreja Católica

foi um empecilho ao desenvolvimento da anatomia, criando grandes dificuldades

para o uso do cadáver. A dissecação anatômica foi considerada uma blasfêmia e,

por isso, foi proibida (GREGORY, COLE, 2002).

A prática do estudo de anatomia com o corpo humano é retomada com o

surgimento do Cânon de Medicina, do filosofo árabe Avicena (980-1037), da

tradução de textos médicos gregos do árabe para o latim por Constantino, o Africano

16

(1022 - 1087) e da Escola Médica de Salermo (século X), despertando o interesse

dos sábios da época por essa prática (MARGOTTA, 1998).

Neste contexto ganha força a idéia de que o conhecimento de anatomia é

fundamental para o exercício da cirurgia; entretanto, somente em 1240 é que

Frederico II obriga a escola de Nápoles a introduzir em seu currículo o treinamento

prático de anatomia, acontecimento decisivo para o desenvolvimento dessa ciência.

A Bula Pontifícia De sepulturis16 de Bonifácio VIII, publicada em 1299,

excomungava da Igreja aqueles que ousassem desmembrar um cadáver ou tirar-lhe

pela cocção a ossada. Esta Bula, no entanto, nada tinha a ver com as atividades

anatômicas como se pensava, pois não proibia a dissecação (LYONS e

PETRUCELLI, 1997).

Em 1315, Mondino de Liuzzi dissecou pela primeira vez cadáveres humanos

com a finalidade de ensino na escola anatômica de Bolonha, publicando em 1316

um manual sobre autópsia (SINGER, 1996).

Durante o Renascimento, a Igreja tornou-se mais condescendente com a

dissecação dos cadáveres, permitindo um grande progresso nos estudos

anatômicos. Neste período, as dissecações iniciavam-se sempre pela cavidade

abdominal, seguida da cavidade torácica, cabeça e membros e durava

provavelmente cerca de quatro dias, pois as técnicas de conservação das peças

anatômicas eram muito precárias (VAN DE GRAAFF, 2001).

Andreas Vesalius (1514-1565) revolucionou o ensino da Anatomia com suas

demonstrações práticas através de dissecações e com explicações orais sobre as

estruturas anatômicas, que até então eram pautadas pelos escritos de Galeno que

perduravam por 14 séculos (LYONS e PETRUCELLI, 1997). Em Paris, Vesalius se

16 As sepulturas

17

popularizou também pelo hábito de adquirir cadáveres especialmente do Cemitério

dos Inocentes, mantendo-os em seu quarto para dissecá-los durante a noite.

Outro fato curioso sobre Vesalius ocorreu quando ele foi chamado em 1559

para atender Henrique II da França, ferido no olho em um combate amistoso com o

conde de Montgomery. Para planejar a cirurgia de Henrique II ele recorreu,

juntamente com Ambroise Paré, à dissecação de cabeças de criminosos

executados. Apesar de realizar esta cirurgia, o soberano morreu de complicações

cranianas (O’MALLEY e SAUNDERS, 2003).

Nessa época, as dissecações de cadáveres foram consideradas como livros,

nos quais os estudantes aprendiam pela observação. Assim, as dissecações

anatômicas - lições de anatomia - eram eventos públicos realizados em anfiteatros

ou Teatros Anatômicos onde compareciam tanto profissionais da classe médica

como leigos e artistas, convocados para documentar os eventos.

O primeiro Teatro Anatômico foi construído em Pádua, em 1594, por um

professor de Anatomia, Alexandre Benedetti, seguindo um modelo do circo romano

(Figura 4). Esses Teatros Anatômicos foram construídos a princípio próximos de

hospitais e posteriormente no interior das escolas médicas.

No Reino Unido, até o século XIX, a dissecação só era permitida em corpos

de condenados à morte por enforcamento. Estes criminosos tinham como pena não

poderem ser sepultados em terreno santificado pela Igreja. A insuficiência desse tipo

de criminoso para suprir as necessidades do ensino da Anatomia deu lugar ao

aparecimento de um mercado negro de cadáveres. Surgiram então os ladrões de

cemitérios que vendiam os cadáveres às escolas médicas logo após o

sepultamento. Esses ladrões, quando acusados, não podiam ser condenados por

falta de amparo legal, pois não havia lei prevendo este tipo de crime e a violação da

18

sepultura não se enquadrava como roubo, já que o cadáver não era considerado

propriedade de ninguém (TWARD e PATTERSON, 2002).

Fig. 4. Representação do Teatro Anatômico de Pádua da obra A History of Medicine, de MAJOR, 1954, reproduzido a partir do site <http://clendening.kumc.edu/dc/rm/major_16th.htm>.

Em 1825, para evitar o roubo de corpos dos túmulos, a Universidade de Harvard

e a Sociedade Médica de Massachusetts (EUA), iniciaram um movimento para legalizar

a dissecação nas escolas médicas. Em 1831, foi aprovado o Ato Anatômico de

Massachusetts, estabelecendo que os corpos não reclamados pudessem ser utilizados

para a dissecação anatômica (DYER e ETHORNDIKE, 2000). Uma lei similar foi

aprovada um ano depois na Inglaterra pelo Parlamento Inglês.

No Brasil, somente no final do século XX é que foi sancionada a Lei n° 8.501,

de 30 de novembro de 1992, que dispõe sobre a utilização de cadáver não

reclamado para fins de estudos ou pesquisas científicas, garantindo às Escolas

Médicas o seu uso.

19

1.2. Anatomia no Brasil: das origens ao Império

1.2.1. .Ensino da Anatomia antes da instalação das Escolas de Medicina

Os primeiros registros do ensino da Anatomia no Brasil surgiram no início da

colonização, com o jesuíta Pero de Castilho, que elaborou uma lista de termos das

estruturas anatômicas em tupi e em português, o que pareceu ser a primeira nomina

publicada no Brasil. Tal vocabulário bilíngüe constituiu um subsídio para o estudo de

ambas as línguas, faladas logo após o descobrimento do Brasil e representa um

documento de caráter religioso que contribuiu para a história da anatomia e da

medicina (BEZERRA e cols., 2000).

No período colonial, os cursos superiores que existiam no Brasil eram os de filosofia e

teologia, oferecidos pelos jesuítas, pois, Portugal impedia o desenvolvimento do ensino

superior nas suas colônias, temendo que pudessem contribuir com os movimentos de

independência (TORRES, 1946).

A Medicina era estudada e praticada pelos jesuítas no próprio Colégio dos Jesuítas.

Entre os anos de 1654 e 1681 foram feitas várias tentativas por parte dos religiosos e das

autoridades locais para transformar o Colégio da Bahia situado em Salvador, em

Universidade, tentativas essas rechaçadas pela coroa portuguesa (TORRES, 1946; LOBO,

1964 apud DICIONÁRIO, 2007).

Após a expulsão dos jesuítas, no século XVIII, o aprendizado para obter a

licença para o exercício da Medicina na colônia geralmente se dava nos hospitais da

Misericórdia ou nos hospitais militares, ou ainda nas residências dos mestres das

principais cidades e vilas. Na Bahia, durante o ano de 1799, o Cirurgião-mor do 4º

Regimento de Milícias José Xavier de Oliveira Dantas ministrava um curso de

20

anatomia e cirurgia em sua própria casa solicitando, sem sucesso, as prerrogativas

de "aula régia" (LOBO, 1964 apud DICIONÁRIO, 2007).

1.2.2. Instalação das primeiras Escolas de Medicina no Brasil

Com a vinda da família real portuguesa para o Brasil em 1808, devido à

invasão de Portugal pelas tropas de Napoleão, a sociedade brasileira ganha uma

nova fisionomia e uma nova configuração social. Os portos foram abertos às nações

amigas, o Brasil foi elevado à condição de Reino Unido a Portugal (1815) e,

juntamente com estas transformações, Dom João VI cria as primeiras Escolas de

Medicina em Salvador e no Rio de Janeiro, iniciando assim, o ensino oficial de

Medicina no Brasil e, consequentemente, o ensino da Anatomia (JESUS, 2004;

MOURA NETO e cols. 2005).

Fig. 5. Decisão do Príncipe Regente Dom João VI, de 18 de fevereiro de 1808, que manda criar uma Escola de Cirurgia no Hospital Real de Salvador, Bahia, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/Legimp-A2_2 .pdf>.

De acordo com a Decisão de 18 de fevereiro de 1808 (Figura 5), do Príncipe

Regente D. João VI, foi criada a primeira Escola de Cirurgia no Hospital Real de

21

Salvador, no Terreiro de Jesus (Figura 6), a pedido do Cirurgião-Mor José Correia

Picanço, que foi autorizado a escolher os professores, que eram denominados

lentes, na época.

Fig. 6. Representação do Terreiro de Jesus, em Salvador, Bahia, de 1808, reproduzido do Esboço histórico dos acontecimentos mais importantes da vida da Faculdade de Medicina da Bahia (1808-1946) de TORRES, 1946, mostrando da esquerda para a direita: a Torre da Igreja do Colégio (hoje Catedral Basílica); o Colégio dos Jesuítas; o Hospital Real Militar; a Casa Colonial na esquina da Rua Portas do Carmo, hoje Alfredo Britto.

De acordo com o Decreto de 2 de abril de 1808 (Figura 7) foi criada uma

cadeira de Anatomia no Real Hospital Militar do Rio de Janeiro, no Morro do Castelo

(Figura 8). Muitos historiadores admitem que esta data seja a verdadeira data da

fundação da Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro. Entretanto, a

criação oficial se deu somente com a Carta Régia de 05 de novembro de 1808

(SANTOS FILHO, 1991).

22

Fig.7. Decreto do Príncipe Regente Dom João VI, de 2 de abril de 1808, que estabelece uma cadeira de Anatomia no Hospital da Misericórdia no Rio de Janeiro, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/ InfDoc/conteudo/Colecoes Legislacao/Legimp-A1_5.pdf >

Fig. 8. Representação da primeira sede do Real Hospital Militar, no Morro do Castelo, no Rio de Janeiro, no período de 1808. In: MAIA, George Doyle. Biografia de uma Faculdade: História e Estórias da Faculdade de Medicina da Praia Vermelha. São Paulo: Ed. Atheneu, 1996, reproduzido de <http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/iah/P/verbetes/botrealmil.htm>

23

Para a Escola de Cirurgia da Bahia, o Cirurgião-Mor do Reino, José Correia

Picanço, nomeou o Cirurgião-Mor José Soares de Castro, natural de Portugal, para

a cadeira de Anatomia e Operações Cirúrgicas, e o Cirurgião-Mor Manuel José

Estrela, natural do Rio de Janeiro, para a cadeira de Cirurgia Especulativa e Prática

(OLIVEIRA, 1992). Para a cadeira de Anatomia do Rio de Janeiro foi indicado

Joaquim da Rocha Mazarém, de acordo com o decreto de 2 de abril de 1808.

Nessa época o Curso Médico tinha duração de quatro anos, obedecia aos

estatutos da Universidade de Coimbra e seguia a orientação francesa, exigindo por

parte dos estudantes o conhecimento da língua francesa. Assim foi adotado o

compêndio de Monsieur de La Fay para o estudo dos Princípios Cirúrgicos

(CARVALHO FILHO, 1909 apud DICIONÁRIO, 2007).

De acordo com o relato do primeiro memorialista da Faculdade de Medicina

da Bahia em 1854, Malaquias Alvares dos Santos (apud DICIONÁRIO, 2007), o

ensino médico da Escola de Cirurgia da Bahia foi inicialmente precário. Prova disso

é que havia necessidade de pedir emprestado “ferros velhos” como instrumentos de

cirurgia para as aulas de anatomia. Além disso, alguns alunos que haviam cursado a

Escola desde 1808 e que estavam insatisfeitos com o seu próprio conhecimento

médico voltaram a se matricular em 1816 quando começou a funcionar o Colégio de

Cirurgia, após a primeira reforma do ensino médico.

Pereira (1923) relata que o ensino médico na Bahia nesse período consistia

somente de lições teóricas de anatomia humana e de elementos de fisiologia. Além

disso, o curso tinha duração de quatro anos e possuía somente dois professores. As

cadeiras eram distribuídas em: Anatomia e as Operações Cirúrgicas no 1º ano;

Elementos de Fisiologia no 2º ano; Elementos de Patologia no 3º ano; e Clínica

24

Cirúrgica Especulativa e Prática no 4º ano. Não há referências a aulas práticas

naquele período.

1.2.3. .Reforma do ensino médico no Rio de Janeiro (1813) e na Bahia (1816) –

Lineamento do ensino médico

De acordo com o Decreto de 1º de abril de 1813, que visava melhorias no

ensino médico, ocorreu no Rio de Janeiro a primeira reforma baseada em um plano,

de autoria de Manoel Luiz Álvares de Carvalho, que consistiu na ampliação do curso

para cinco anos, bem como no aumento do número de professores e na criação de

novas cadeiras (Figura 9), que estavam assim distribuídas: Anatomia Geral: 1º ano;

Anatomia e Fisiologia: 2º ano; Higiene, Estesiologia, Patologia e Terapêutica: 3º ano;

Instruções Cirúrgicas e Operações: 4º ano; e Clínica Médica e Obstetrícia: 5º ano.

Na Bahia, esta reforma foi adotada somente em 1816, através da Carta Régia de 29

de dezembro de 1815 (Figura 10), que criou um curso completo de Cirurgia.

Fig. 9. Decreto do Príncipe Regente Dom João VI, de 1 de abril de 1813, que aprova o plano de estudos de Cirurgia no Hospital da Misericórdia do Rio de Janeiro, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/ InfDoc/conteudo/Colecoes/Legislacao/Legimp-C_23.pdf>

25

Para Pereira (1923), somente com a primeira reforma de 1816 é que houve

um esboço de organização regular do ensino médico na Bahia. Dessa época datam

os primeiros arquivos do Colégio Médico Cirúrgico constituídos de cinco livros: o de

registro de atas, o de lançamento de matrículas, o de termos de exames, o de atos

dos estudantes e o de registro de títulos e diplomas.

Fig. 10. Carta Régia do Príncipe Regente Dom João VI, de 29 de dezembro de 1815, que cria um curso completo de Cirurgia da Bahia, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/ Colecoes/Legislacao/Legimp-C_62.pdf>

26

1.2.4. Reforma de 1832 – Organização das escolas médicas do Império

A segunda Reforma do ensino médico denominava-se "Plano de Organização

das Escolas Médicas do Império" e foi proposta pela Sociedade de Medicina do Rio

de Janeiro, em 7 de outubro de 1830, tendo sido aceita tanto na Câmara como no

Senado e assinada pela Regência Trina Permanente em 03 de outubro de 1832

(Figura 11).

Fig. 11. A Regência Trina, em nome do Imperador Pedro II decretou e sancionou, Lei de 3 de outubro de 1832 que dá nova organização às atuais Academias Medico-cirúgica do Rio de Janeiro e da Bahia reproduzido de <http://www.camara.gov.br/ Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/legimp-15/Legimp-15_10.pdf>.

Esta reforma foi considerada de orientação liberal e apresentou modificações

das quais se destacaram: a organização idêntica e mesma denominação - Escola ou

Faculdade de Medicina - nos dois estabelecimentos (Rio de Janeiro e Bahia),

27

duração do curso de 6 anos, com 14 cadeiras ministradas por 14 lentes e seis

substitutos, e sistematização em três seções (Lei de 03 de outubro 1832):

- Ciências acessórias: física, botânica e zoologia, química e mineralogia;

- Ciências médicas: fisiologia, patologia interna, matéria médica e farmácia,

higiene e história da medicina e clínica interna;

- Ciências cirúrgicas: Anatomia geral e descritiva, patologia externa, partos,

medicina operatória e aparelhos e clínica externa.

Esta reforma de outubro 1832 fez com que o ensino teórico melhorasse

consideravelmente, porém a parte prática do curso ainda era deficiente.

1.2.5. Reforma do ensino médico de 1854 – Modelo francês

Uma terceira reforma do ensino médico, aprovada pelo Ministro do Império

Luiz Pedreira do Couto Ferraz, foi instituída pelo decreto de nº 1.387, de 28 de abril

de 1854 (Figura 12). Esta reforma seguia o modelo francês adotado na época de

Napoleão Bonaparte, sendo considerada de orientação conservadora por

recrudescer o código de penas disciplinares e os processos dos exames, além de

reduzir a autonomia concedida pela lei anterior, abolindo a eleição do diretor e a

elaboração do regulamento pela Congregação. O número de cadeiras aumentou

para 18, sendo criadas as cadeiras de Química Orgânica, de Anatomia Geral e

Patológica, de Patologia Geral, de Terapêutica, de Matéria Médica, associando

assim o ensino da Anatomia Topográfica17 à cadeira de Medicina Operatória e

aparelhos. A Anatomia Descritiva do 2º ano era ensinada com dissecação. As

cadeiras de Medicina Legal e de Farmácia foram incorporadas à seção de ciências

acessórias. 17 Estudo da anatomia por regiões orgânicas

28

Fig. 12. Decreto nº 1387 de 28 de abril de 1854, assinado pelo Ministro e Secretário do Estado dos Negócios do Império com a rubrica do Imperador D. Pedro II de Estado, dá novos Estatutos às Escolas de Medicina, reproduzido de <http://www.camara.gov.br/Internet/InfDoc/conteudo/colecoes/Legislacao/ 1854%20pronto/leis%201854/dec%20n°1387%20à%201387-pg12-p24.pdf>

Nesta reforma foi proposta também a criação de um horto botânico, de um

laboratório de química, dos gabinetes de Física, de História Natural, de Anatomia e

de Matéria Médica, de Material Cirúrgico e de uma oficina farmacêutica.

1.2.6. Reformas do ensino médico após 1854

Inspirada nas universidades alemãs, em 1879, foi feita uma reforma no ensino

superior em todo o Império através do decreto n° 7.247, que estabelecia a liberdade

de freqüência nas faculdades e a permissão ao estudante de repetir os exames das

matérias em que não tivesse conseguido habilitação em época apropriada. O

decreto previa também o acréscimo de mais duas cadeiras de clínica geral e quatro

de clínicas especiais (a obstétrica, a psiquiátrica, a oftalmológica e a de moléstias

sifilíticas e da pele), além da criação de três institutos para o ensino prático um dos

quais era o Instituto Biológico, formado pelos laboratórios de Anatomia, Fisiologia,

29

Botânica e Zoologia, Medicina Legal e Toxicologia. Essas modificações só foram

efetivadas a partir da regulamentação da Lei n° 3.141 de 30 de outubro de 1882 e do

Decreto n° 9.311 de 25 de outubro de 1884, referendado pelo Ministro do Império

Filippe Franco de Sá.

Com a proclamação da República, em 1889, várias tentativas de reformas do

ensino foram feitas. Nenhuma delas, no entanto, representou um avanço

significativo que pudesse ser considerado marcante.

No início do século XX, acontece a Reforma Rivadávia Correa (1911)

retomando a orientação positivista, pregando a liberdade de ensino, a abolição do

diploma, que é substituído por um certificado de assistência e aproveitamento, e

transferindo os exames de admissão ao ensino superior para as faculdades.

Nos anos 60 foi aprovada a Lei da Reforma Universitária nº. 5.540/68,

baseada nos estudos do Relatório Atcon18 e no Relatório Meira Matos19. Esta

reforma extingue a cátedra, unifica o vestibular, que passa a ser classificatório,

aglutina as faculdades em universidades e cria o sistema de créditos, permitindo a

matrícula por disciplina. A universidade brasileira passa a ser estruturada em

centros, com a agregação dos departamentos.

1.3. Novos Métodos de Ensino de Anatomia

Para Mattos (1997, p. 193) “na maioria das escolas médicas tem predominado

o “método tradicional de ensino” centrado, principalmente, no professor”. Ainda

segundo esta autora. 18O nome deriva de Rudolph Atcon, consultor norte-americano em cujos princípios se baseou esta Reforma. 19 Relatório produzido pelo então coronel da Escola Superior de Guerra Carlos Meira Matos, que apresentava dados completos sobre o problema universitário brasileiro.

30

A tendência atual do ensino da Anatomia nas escolas mais inovadoras é o

emprego de métodos em que o ensino/aprendizagem está centrado no

aluno. A busca do conhecimento é feita pelo próprio aluno, o auto-

aprendizado facilitado pelo ensino em pequenos grupos e assistido por

computadores, propiciando o desenvolvimento da auto-avaliação (MATTOS,

1997, p. 193).

Não é de hoje a preocupação com o ensino/aprendizagem da anatomia

humana. Nos últimos tempos, porém, a questão tem aflorado com maior freqüência

e mais intensidade. Dentre os temas atualmente discutidos destacam-se: o uso ou

não do cadáver, o impacto emocional causado nos estudantes pelo manejo do

cadáver; a integração interdisciplinar da Anatomia com a Clínica Médica e a adoção

de novos métodos e recursos tecnológicos educacionais.

Atualmente, uma das inovações mais consideradas por algumas escolas é o

PBL (Problem-Based Learning)20, introduzida pela Universidade McMaster, no

Canadá, na década de 1960 com a finalidade de promover a melhoria da assistência

à saúde e do ensino, conferindo-lhes eficiência e qualidade (CAMP, 1996). Este

método se caracteriza principalmente por estar centrado no aluno, desenvolver-se

em pequenos grupos orientados por um tutor e focalizar os problemas dentro de um

contexto clínico. Além disso, trata-se de um processo ativo e integrado que promove

a interdisciplinaridade e está orientado para aprendizagem do adulto.

Segundo Camp (1996), o PBL, que foi criado para o ensino médico, logo se

estendeu para outras escolas de ciências da saúde, atingindo também, hoje, outras

áreas como arquitetura, administração, direito, engenharia, ciências políticas,

assistência social e educação. O PBL é uma inovação que tem se difundido em

20 Aprendizagem baseada em problema

31

algumas escolas médicas e seu uso tende a ser majoritário, valendo-se do modelo

puro ou de adaptações adequadas a cada realidade.

A anatomia topográfica ganha mais evidência a partir de 1989, quando a

National Library of Medicine 21(NLM) realizou um projeto intitulado o Homem Visível

ao criar um atlas digital do corpo humano a partir de um cadáver masculino de 76

anos e depois, em 1995, a partir de um cadáver feminino de 79 anos. Este projeto

baseou-se em cortes transversais fotografados simultaneamente com a realização

de tomografia computadorizada e de ressonância magnética. Foi feita também a

criossecção em intervalos de 1 mm no cadáver masculino e 1/3 mm no feminino

gerando imagens em três dimensões.

21 Biblioteca Nacional de Medicina, a maior biblioteca médica do mundo, situada em Bethesda, Maryland, EUA. (http://www.nlm.nih.gov/pubs/factsheets/nlm.html)

32

2 MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Carga horária de anatomia no curso médico da Bahia na primeira metade do

século XIX (1808-1854).

• Grades curriculares que foram tabeladas e comparadas

• Comparação entre a grade curricular de 1854 e a de 2006 da Faculdade de

Medicina da Bahia.

2.2. Questionário dirigido a professores da disciplina Anatomia Humana de Cursos

de Medicina em Universidades Públicas Brasileiras:

• Universidades consultadas: 16 Faculdades de Medicina de 12 estados do

Brasil (seis do Nordeste, um do Centro-Oeste, três do Sudeste e dois do Sul),

sendo as Federais, Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade

Federal do Ceará (UFCE), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

(UFMS), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade

Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal do Rio de Janeiro

(UFRJ), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade

Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), Universidade Federal de Santo

Catarina (UFSC), Universidade Federal de Sergipe (UFSE), Universidade

Federal de São Paulo (UNIFESP) e as Estaduais: Universidade Estadual de

Ciências da Saúde de Alagoas (UECSAL), Universidade Estadual de Feira de

Santana (UEFS), Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ),

Universidade de Campinas (UNICAMP), Universidade São Paulo (USP).

33

• Professores Consultados: foram distribuídos questionários a 52 professores

de Anatomia Humana do Curso de Medicina em Universidades Públicas,

sendo que somente 22 responderam.

• Questionário aos professores de anatomia humana de medicina: com 17

(dezessete) perguntas fechadas e um quadro onde poderiam ser feitas

observações complementares. Este visou produzir informações

generalizadas, que possibilitasse fazer alguma inferência sobre a percepção

dos professores acerca:

- do ensino integrado da anatomia com outras disciplinas básica;

- do auxilio dos monitores nas aulas práticas;

- do uso da dissecação;

- de que forma a dissecção era usada;

- se atividade de dissecção era obrigatória ou opcional;

- se ao final do exercício de dissecção o aluno era argüido;

- se havia aula de anatomia de superfície ou palpatória com modelos vivos;

- se havia aula de anatomia por imagens;

- se as avaliações eram realizadas através de provas teórica, teórica/

práticas;

- se as avaliações práticas eram realizadas em regime de gincana22.

2.3. Questionário dirigido a 422 estudantes do primeiro e segundo ano de

medicina que estudaram anatomia, sendo assim distribuídos 116 da UFBA,

153 da USP e 153 da UFRJ.

22 Sistema de avaliação da parte prática aplicado na área de saúde, em que o aluno faz um rodízio por diversas mesas, onde as estruturas estão previamente marcadas com tempo específico para a sua identificação.

34

• Questionário aos alunos do primeiro e segundo ano de medicina: com 08

(oito) perguntas fechadas relacionadas com a percepção dos mesmos, sobre:

- a importância das aulas práticas de anatomia;

- se as aulas práticas poderiam ser ministradas por professores ou auxiliadas

por monitores;

- a possibilidade de substituir o estudo da anatomia com cadáver pelo estudo

através das imagens computadorizadas onde o estudante poderia ou não

intervir;

- a importância da dissecação para estudar anatomia e para a formação

acadêmica do futuro profissional médico;

- possibilidade de se estudar a disciplina de forma integrada com outras

disciplinas básicas;

- a relação da anatomia com seis especialidades médicas apresentadas no

questionário, com possibilidade de múltiplas respostas;

- a necessidade de distribuição dos conteúdos de anatomia por mais

semestres, sendo que esta questão foi destinada apenas para os alunos

que já tinham cursado o primeiro semestre letivo.

2.4. Tratamento estatístico das respostas aos questionários:

As informações obtidas dos questionários dos professores e dos alunos foram

catalogadas e analisadas no programa EPI-INFO 6.03 (CDC, Atlanta, GA) e Stata

9.0 (STATA Corporation, College Station, TX).

A análise dos dados foi iniciada com a caracterização da população do

estudo, de acordo com suas características sócio-demográficas. Neste caso, foi

35

empregado o teste do qui-quadrado de Mantel-Haenszel, considerando-se

significativo na comparação das proporções (freqüências simples) valores de

p<0,05. As variáveis contínuas foram analisadas levando-se em conta sua

distribuição. Em seguida, foram categorizadas utilizando-se informações da literatura

para definição dos pontos de corte.

2.5. Grupo Focal

Nesta etapa, foi realizado um estudo qualitativo na UFBA, tendo sido

convidados 10 alunos que atuavam como monitores da disciplina de Anatomia. Os

critérios de inclusão no grupo focal foram: ser aluno do curso de medicina; estar

estudando em uma universidade da rede pública e já ter cursado a disciplina. A

operacionalização da técnica grupo focal, foi precedida por uma fase de preparação

composta da elaboração de um roteiro de temas para a discussão e da assinatura

do termo de consentimento livre e esclarecido (anexo).

Durante a realização do grupo focal, todos os depoimentos foram gravados e

posteriormente transcritos para servir de base às análises, que constaram de: leitura

compreensiva de todas as perguntas buscando ter uma visão de conjunto;

construção de uma matriz de análise onde foram distribuídos os trechos, frases ou

fragmentos relativos aos conceitos e idéias chaves referentes ao tema investigado;

identificação das recorrências de palavras e expressões contidas nos discursos dos

participantes do grupo e distribuição das idéias chave e conceitos construídos pelos

participantes do grupo (linguagem êmica) na estrutura textual, como forma de

mapear os sentidos e significados identificados em relação ao tema investigado. Ao

final da análise, os principais sentidos contidos nos depoimentos foram inseridos na

36

estrutura textual, dando espaço a polivocalidade dos sujeitos envolvidos no

processo.

• Grupo focal realizado com os alunos de medicina, monitores de anatomia, da

UFBA: com 07 (sete) perguntas abertas baseadas nas respostas do

questionário distribuído aos alunos, sobre:

- a importância do uso de cadáver nas aulas práticas de anatomia;

- a importância do uso de imagens no ensino da Anatomia;

- a importância do estudo de anatomia para a prática da medicina;

- as aulas práticas de anatomia ministradas por professores ou auxiliadas por

monitores;

- o que poderia mudar no ensino da Anatomia.

37

3 RESULTADOS

No presente estudo inicialmente foi analisado a carga horária da disciplina de

Anatomia dentro do currículo do curso médico na Bahia no período entre 1808 e

1854, comparando-o com atual, bem como a interpretação dos professores de

Anatomia sobre métodos de ensino e a percepção dos alunos sobre o ensino que

recebem ou que gostariam de receber.

3.1. Estudo evolutivo da disciplina Anatomia Humana no período de 1808 a 1854.

O Quadro I ilustra a inserção da anatomia no curso médico na sua criação em

1808, comparativamente à grade curricular e após as reformas de 1816, 1832 e

1854.

Em 1808 a disciplina de Anatomia era ministrada somente no primeiro ano do

curso médico de quatro anos. Em 1816 a disciplina foi desdobrada em Geral e

Topográfica ministrada, respectivamente, no primeiro e no segundo ano de um curso

de cinco anos. Em 1832 a disciplina de Anatomia era ministrada em três dos seis

anos totais do curso, sendo que no segundo e no terceiro anos era ministrada a

Anatomia Geral e Descritiva e no quinto, Anatomia Topográfica. O ensino da

Anatomia com dissecação foi iniciado somente no ano de 1854 sendo ministrada

anualmente em quatro dos seis anos (Descritiva, Descritiva com dissecação, Geral e

Topográfica respectivamente).

As reformas que aconteceram na primeira metade do século XIX promoveram

o aumento do tempo de duração dos cursos médicos na Bahia e no Rio de Janeiro,

que passaram, em 1808, de quatro anos, com o ensino de poucas disciplinas, para

38

cinco anos, em 1816, e para seis anos, em 1832, ocorrendo um aumento

significativo quanto ao número de disciplinas a cada reforma.

Nas reformas de 1832 e 1854 a Anatomia foi desdobrada em suas

especificidades: Geral, Descritiva e Topográfica ministrada em dois períodos letivos

(Quadro I). Enquanto que algumas disciplinas da área básica foram introduzidas nos

períodos seguintes, como Física Médica, Botânica e Zoologia, mas não continuaram

no fluxograma, porém disciplinas como Patologia Geral e Fisiologia permaneceram

(Quadro III).

Em 1808 as disciplinas da área básica incluindo a Anatomia, representava

75,0% da grade curricular total, em relação às disciplinas profissionalizantes

(Quadro II). Com a reforma de 1816, houve uma diminuição deste percentual para

60,0%, apesar do aumento de um ano do curso médico. Após a reforma de 1832,

houve uma diminuição ainda mais acentuada das disciplinas básicas para 40,0%.

Essa redução foi acompanhada pelo aumento da carga horária das disciplinas da

área profissionalizante, que cresceram em número devido às especialidades

médicas que surgiram depois da reforma de 1832. Em contrapartida, em 1854, as

disciplinas da área básica passaram a constituir 48,1% do total.

Comparando a presença da disciplina Anatomia em relação às demais

disciplinas básicas e específicas do curso médico ao longo das três reformas

curriculares (Quadro II), verificamos que a Anatomia correspondia inicialmente a ¼

do total. A relação da disciplina Anatomia acompanhou a relação de todas as

matérias básicas, ou seja, diminuiu seu percentual nos anos de 1816 e 1832 e

aumentou no ano de 1854.

39

Quadro I - Distribuição da disciplina Anatomia Humana na grade curricular dos Cursos de Medicina (Bahia e Rio de Janeiro) do Brasil na primeira metade do século XIX.

Em azul: disciplinas da área básica, exceto a anatomia

Ano 1808 1816 1832 1854

1º ano Anatomia e as Operações Cirúrgicas

Anatomia Geral Chimica Pharmaceutica

Phisica Medica Botanica Medica e Princípios Elementares de Zoologia

Phisica em Geral e Medica Chimica e Mineralogia Anatomia Descriptiva

2º ano Elementos de Fisiologia Anatomia Topográfica Physiologia

Química Medica e Princípios Elementares de Mineralogia Anatomia Geral e Descriptiva Clínica Externa Anatomia Pathologica

Botânica e Zoologia Chimicar Orgânica Physiologia Anatomia Descriptiva com dissecação

3º ano Elementos de Patologia

Higiene Estiologia Patologia Terapêutica

Anatomia Geral e Descriptiva Physiologia Clínica Externa Anatomia Pathologica

Physiologia Anatomia Geral Anatomia Pathologica Farmacologia Pathologia Geral Clínica Externa

4º ano Clínica Cirúrgica Especulativa e Prática

Instruções Cirúrgicas e Operações e Pratica da Arte Obstetrícia

Patologia externa Patologia interna Pharmacia, Materia Medica. especialmente a Brazileira Terapêutica e Arte de Formular Clínica Externa e Anatomia Pathologica

Patologia externa Patologia interna Partos, Moléstias de Mulheres Pejadas e de Recém-Nascidos Clínica externa

5º ano

Exercício Pratico de Medicina e Obstetrícia

Anatomia Topographica, Medicina operatória e Aparelhos Partos, Moléstias de Mulheres Pejadas e Paridas e de Meninos Recém-Nascidos Clínica Externa e Anatomia Patológica Clínica Interna e Anatomia patológica

Pathologia interna Anatomia Topographica, Medicina Operatória e Aparelhos Matéria Medica e Terapêutica Clínica interna

6º ano

Higiene Medicina legal História da Medicina Clínica externa e Anatomia Patológica Clínica interna e Anatomia Patológica

Higiene, História da Medicina Medicina Legal Farmácia Clínica interna e Anatomia Patológica

Em preto: disciplinas profissionalizantes

Quadro II - Comparação da distribuição da disciplina Anatomia com as demais matérias básicas e profissionalizantes no Ensino Médico da Bahia na primeira metade do século XIX.

Ano Anatomia Demais Matérias Básicas

Matérias Profissionalizantes

1808 1816 1832 1854

25,0% 20,0% 12,0% 14,8%

50,0% 40,0% 28,0% 33,3%

25,0% 40,0% 60,0% 51,9%

A proporção entre o ensino de disciplinas da área básica e da área

especializada no curso médico na Bahia no período de 1854 e 2006 está ilustrada

no Quadro III. Neste período surgiram novas disciplinas da área básica e da área

40

profissionalizante e houve redução aproximada de 15% para 4% na carga horária da

disciplina Anatomia.

Quadro III - Estudo comparativo das disciplinas da área básica com as da área profissionalizante entre as grades curriculares de 1854 e a de 2006 no Curso Médico da UFBA.

DISCIPLINAS/1854* CÓDIGO e DISCIPLINAS/2006**

1º ano Física em Geral (particularmente suas aplicações em medicina) Química e Mineralogia Anatomia Descritiva (demonstrações anatômicas)

BIO158 ICS038 ICS058 ICS062 MED208 ICS003 ICS059 ICS063 ICS064 MED194

1º SEMESTRE Biologia Celular e Molecular Histologia II Bioquímica Médica I Anatomia II-A Deontologia e Disceologia Médica I 2º SEMESTRE Biofísica III Bioquímica Médica II Anatomia III-A Fisiologia Médica Geral Imunologia

2º ano Botânica e Zoologia Química Orgânica Fisiologia Anatomia Descritiva (com dissecação anatômica)

ICS016 ICS039 ICS065 MED209 MED100 MED212 MED216

3º SEMESTRE Parasitologia II Microbiologia V Fisiologia Médica dos Sistemas Introdução à Medicina Social 4º SEMESTRE Epidemiologia Clínica Propedêutica Médica I Patologia Aplicada I

3º ano

Fisiologia (continuação) Anatomia Geral Anatomia Patológica Farmacologia Patologia Geral Clínica Externa

ICS014 MED103 MED213 MED217 ISC003 MED176 MED204 MED214

5º SEMESTRE Farmacologia III Técnica Operatória e Cirúrgica Experimental Clínica Propedêutica Médica II Patologia Aplicada II 6º SEMESTRE Biofísica III Doenças Infecciosas e Parasitárias Pediatria Clínica e Pediatria Preventiva Social Clínica Médica I

4º ano Patologia externa Patologia interna Partos, moléstias de mulheres pejadas e de recém-nascido Clínica externa

MED191 MED205 MED215 MED190 MED206 MED207 MED218

7º SEMESTRE Psicologia Médica e Psicopatológica II Clínica Cirúrgica I Clínica Médica II 8º SEMESTRE Psiquiatria I-A Clínica Cirúrgica II Toco-Ginecologia Medicina Legal I-A

5º ano

Patologia interna (continuação) Anatomia topográfica Medicina operatória e aparelhos Matéria médica e Terapêutica Clínica Interna

MED229 MED230 MED231 MED232 MED229 MED230 MED231

9º SEMESTRE Internato Rotatório – Clínica Médica Internato Rotatório – Toco-Ginecológico Internato I em Pediatria Internato Rotatório – Cirurgia 10o SEMESTRE Internato Rotatório – Clínica Médica Internato Rotatório – Toco-Ginecológico Internato I em Pediatria

6º ano

Higiene História da Medicina Medicina Legal Farmácia Clínica Interna e Anatomia Patológica

MED233 MED234 MED235 MED236 MED233 MED234 MED235 MED236

11o SEMESTRE Internato Rotatório – Clínica Médica Internato Rotatório – Cirurgia Internato II em Pediatria Internato Rotatório – Toco-Ginecológico 12o SEMESTRE Internato Rotatório – Clínica Médica Internato Rotatório – Cirurgia Internato II em Pediatria Internato Rotatório Toco – Ginecológico

* Carga horária de anatomia 14,8% do total ** Carga horária de anatomia 4,3% do total

41

Nos primeiros anos da grade curricular de 1854, a carga horária era exclusiva

para todas as disciplinas básicas, incluindo a anatomia. A partir do 3º ano iniciava-se

o ensino das disciplinas com conteúdo profissionalizante e as disciplinas básicas

retornavam no final do curso.

Em 2006, o ensino das disciplinas profissionalizantes iniciava-se no primeiro

ano do curso e permaneciam até a sua conclusão e o ensino das disciplinas básicas

não era mais oferecido a partir do 4º ano (Quadro IV).

Quadro IV - Variação do percentual das disciplinas da área básica e da área profissionalizante no Curso de Medicina da UFBA nos anos de 1854 e 2006.

1854 Tipo de disciplina % 2006 Tipo de disciplina % Básica 100% Básica 90% 1ºano

Profissionalizante 0% 1ºano

Profissionalizante 10% Básica 100% Básica 40% 2ºano

Profissionalizante 0% 2ºano

Profissionalizante 60% Básica 80% Básica 25% 3ºano

Profissionalizante 20% 3ºano

Profissionalizante 75% Básica 0% Básica 0% 4ºano

Profissionalizante 100% 4ºano

Profissionalizante 100% Básica 20% Básica 0% 5ºano

Profissionalizante 80% 5ºano

Profissionalizante 100% Básica 20% Básica 0% 6ºano

Profissionalizante 80% 6ºano

Profissionalizante 100%

3.2. Interpretação dos questionários

Inicialmente foram interpretados os resultados dos questionários aplicados

aos 22 (vinte e dois) professores de Anatomia (Tabelas 1 a 5) de 16 (dezesseis)

Instituições Púbicas, e a seguir, os dos alunos de Medicina de três instituições

UFBA, UFRJ e USP (Tabelas 6 a 11).

Em relação às atividades de dissecação de cadáveres, treze professores

(59,1%) de sete Instituições Públicas distintas (UFBA, UFCE, UFPE, UFRJ, UFSE,

UEFS e UNICAMP) informaram que não havia aulas de dissecação e nove professores

(40,9%) de nove Instituições (UFMG, UFMS, UFSC, UFRN, UFRS, UNIFESP,

42

UECSAL, UERJ e USP) informaram que havia (Tabela 1) e que eram utilizadas em

média cinco horas-aula para esta dissecação

Dessa forma, considerando nove a totalidade das Instituições que praticavam

a dissecação, em oito destas (88,9%), a prática era realizada somente por alunos

(UFMG, UFMS, UFRN, UFRS, UFSC, UFSE, UNIFESP, UECSAL e UERJ) e em sete

destas (77,8%) ela era obrigatória (UFMS, UFRN, UFRS, UFSC, UNIFESP, UECSAL

e UERJ). Além disso, em seis Instituições (66,7%) a dissecação era topográfica

(UFMS, UFRN, UFRS, UFSC, UNIFESP e UECSAL) e em duas (22,2 %) era apenas

em regiões superficiais (UFMG e UERJ). Em seis destas instituições (66,7%) era

feita avaliação no final das dissecações (UFMS, UFRS, UFSC, UNIFESP, UECSAL e

UERJ), em uma (11,1%) não era feita avaliação (UFMG) e em uma delas (11,1%) era

feita às vezes a avaliação no final das dissecações (UFRN).

Tabela 1 – Percepção dos professores de anatomia do Curso de Medicina em Instituições Públicas quanto à importância da dissecação no ensino da Anatomia. DISSECAÇÃO n % Há aulas de dissecação de cadáveres? Sim 9 40,9 Não 13 59,1 No caso afirmativo, a dissecação é realizada por: a Professor 0 0,0 Monitores 0 0,0 Professores/Monitores 0 0,0 Alunos 8 88,9 No caso afirmativo, o modelo em que é realizada dissecação: a Topográfico (ou Segmentar) 6 66,7 Regiões Superficiais 2 22,2 Sistemas 0 0,0 No caso afirmativo, o aluno é avaliado ao final da dissecação? a Sim 6 66,7 Não 1 11,1 Às vezes 1 11,1 No caso afirmativo, a dissecação é uma atividade: a Obrigatória 7 77,8 Opcional 1 11,1 Nota: a) dados ignorados=1

Com relação às aulas de anatomia de superfície ou palpatória com modelos

vivos, onze professores investigados (64,7%) de oito Instituições Públicas distintas

43

responderam que não havia (UFCE, UFMG, UFMS, UFRJ, UFSE, UERJ, UECSAL e

USP) e seis professores (35,3%) de cinco Instituições responderam que havia (UFBA,

UFPE, UFRN, UFRS e UNIFESP), como mostra a Tabela 2, embora dezessete

professores utilizassem imagens nas aulas (77,3%) de treze Instituições distintas

(UFBA, UFCE, UFMG, UFMS, UFPE, UFRJ, UFRS, UFSC, UEFS, UNIFESP,

UECSAL, UNICAMP e USP), especialmente as radiográficas (68,8%)

Tabela 2 – Percepção de professores de Anatomia de Curso de Medicina quanto à importância das aulas com modelos vivos e por imagem no ensino da Anatomia em Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil. AULAS COM MODELOS VIVOS E POR IMAGEM n % Há aulas de Anatomia de superfície ou palpatória com modelos vivos? a Sim 6 35,3 Não 11 64,7 Há aulas de Anatomia por imagens? Sim 17 77,3 Não 5 22,7 Nota: a) dados ignorados=5

Quase a totalidade dos entrevistados (95,4%) relatou que as aulas práticas

eram auxiliadas por monitores (Tabela 3), sendo que somente na UEFS estas aulas

práticas não eram auxiliadas por monitores (4,5%).

Tabela 3 – Percepção de professores de Anatomia de Curso de Medicina quanto à importância da participação dos monitores nas aulas práticas no ensino da Anatomia em Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil. AULAS PRÁTICAS COM MONITORES n % Aulas práticas são auxiliadas por monitores? Sim 21 95,4 Não 1 4,5

As avaliações de aprendizagem eram realizadas sob a forma de provas

teóricas e práticas (95,4%), sendo que as avaliações práticas eram realizadas

geralmente em forma de ‘gincana’ (81,8%) (Tabela 4).

44

Tabela 4 – Percepção de professores de Curso de Medicina quanto à importância das avaliações teóricas e práticas no ensino da Anatomia em Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil. AVALIAÇÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS n % As avaliações são realizadas através de provas: Teóricas 1 4,6 Teóricas e Práticas 21 95,4 As provas práticas são realizadas sob tipo ‘gincana’? Sim 18 81,8 Não 2 9,1 Às vezes 2 9,1

Além disso, dezessete professores (77,3%) de doze Instituições Médicas

(UFBA, UFCE, UFPE, UFRJ, UFRN, UFRS, UFSC, UEFS, UNIFESP, UECSAL, UERJ

e UNICAMP) responderam que as aulas de Anatomia eram integradas à outras

disciplinas (Tabela 5) e cinco professores (22,7%) de quatro Instituições

responderam que não eram interligadas (UFMG, UFMS, UFSE e USP).

Tabela 5 – Percepção de professores de Curso de Medicina quanto à importância da integração do ensino de anatomia com outras disciplinas em Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil. ANATOMIA INTERLIGADA COM OUTRAS DISCIPLINAS n % As aulas de Anatomia são integradas com outras disciplinas? Sim 17 77,3 Não 5 22,7

A análise dos resultados dos questionários dos alunos foi feita primeiramente

com as três instituições (UFBA, UFRJ, USP) e depois individualmente.

Na primeira análise, do total de 422 estudantes, 55,2% eram do sexo masculino

e 44,8% eram do sexo feminino com idade média de 20,4 anos (17-38) para os

homens e 20,1 anos (17-30) para as mulheres. Cerca de 60% dos alunos tinham

idade entre 20 e 29 anos e quase 73% cursavam o primeiro semestre.

A quase totalidade dos quatrocentos e dezessete alunos (98,8%) considerara

que as aulas práticas de anatomia eram essenciais para a sua formação acadêmica

(Tabela 6) e 73,7% dos alunos considerava que as aulas práticas poderiam ser

45

ministradas por professores, auxiliadas por monitores, e 12,3 % somente por

professores.

Tabela 6 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à importância das aulas práticas no ensino da Anatomia.

AULAS PRÁTICAS n % Considera essenciais as aulas práticas de Anatomia? Sim 417 98,8 Não 0 0,0 Talvez 5 1,2 Considera que as aulas práticas podem ser ministradas somente por: Professores 52 12,3 Professores e/ou monitores 370 73,7

Similarmente, estes alunos consideraram essencial a dissecação para o

estudo da Anatomia (78,0%) e para a formação acadêmica do estudante de

medicina (78,1%) (Tabela 7).

Tabela 7 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à importância da dissecação no ensino de anatomia.

IMPORTÂNCIA DA DISSECAÇÃO NO ENSINO DE ANATOMIA n %

Considera essencial a dissecação para estudar Anatomia? Sim 329 78,0 Não 20 4,7 Talvez 73 17,3 Considera que a dissecação de cadáveres é essencial para a formação acadêmica do estudante de Medicina?

Sim 325 78,1 Não 31 7,4 Talvez 60 14,4

Os alunos não consideraram válido substituir o estudo com cadáver pelo

estudo da anatomia por imagens virtuais, sem interatividade (96,2%) e com

interatividade (87%) (Tabela 8).

46

Tabela 8 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à substituição do cadáver por imagens virtuais no ensino da Anatomia. SUBSTITUIÇÃO DO CADÁVER POR IMAGENS VIRTUAIS n % Considera válido substituir o estudo com cadáver por imagem? (imagens virtuais, sem interatividade)

Sim 5 1,2 Não 406 96,2 Talvez 11 2,6 Considera válido substituir o estudo com cadáver por imagem? (imagens virtuais, com interatividade)

Sim 5 1,2 Não 367 87,0 Talvez 50 11,8

Do total dos alunos, 68,2% consideraram relevante a integração da anatomia

com as outras disciplinas básicas, como por exemplo, Histologia, Embriologia,

Bioquímica e Farmacologia (Tabela 9).

A relação da Anatomia com as especialidades médicas apresentadas no

questionário ficou assim representada: Cirurgia (74,2%), Ortopedia (19,0%),

Neurologia (12,8%), Radiologia (11,4%), Clínica Médica (10,9%), Cardiologia (7,3%),

Obstetrícia (6,6%) e Dermatologia e Psiquiatria (1,4%).

Tabela 9 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto ao ensino integrado da Anatomia e a sua importância para as especialidades. ENSINO INTEGRADO DA ANATOMIA E SUA IMPORTÂNCIA PARA AS ESPECIALIDADES n %

Gostaria de estudar Anatomia de forma integrada com outras disciplinas (Histologia, Embriologia, Bioquímica, Farmacologia etc.)

Sim 283 68,2 Não 34 8,2 Talvez 98 23,6 Qual ou quais especialidades médicas estão mais relacionadas com a Anatomia Cirurgia 313 74,2 Ortopedia 80 19,0 Neurologia 54 12,8 Radiologia 48 11,4 Clínica Médica 46 10,9 Cardiologia 31 7,3 Obstetrícia 28 6,6 Dermatologia 6 1,4 Psiquiatria 6 1,4

47

A questão relacionada a distribuição do conteúdo de Anatomia por mais

semestres foi respondida apenas pelos alunos que já tinham cursado o primeiro

semestre letivo. Do total de 106 alunos que já tinham cursado o primeiro semestre

letivo, 57 alunos (53,8%) consideraram que a distribuição dos conteúdos de Anatomia

deveria ser por mais semestres letivos (Tabela 10).

Tabela 10 – Percepção dos estudantes do Curso de Medicina de três Instituições Públicas de Ensino Superior no Brasil (UFBA, UFRJ e USP) quanto à distribuição dos conteúdos de Anatomia em vários semestres. DISTRIBUIÇÃO DOS CONTEÚDOS DA ANATOMIA EM VÁRIOS SEMESTRES n % Acha que os conhecimentos deveriam ser distribuídos por mais semestres? Sim 57 53,8 Não 15 14,2 Talvez 34 32,1 O resultado da análise das respostas dos alunos aos questionários,

individualizados por instituição (UFBA, UFRJ e USP) está ilustrado na Tabela 11.

Observou-se uma similaridade entre os alunos no que se refere à importância das

aulas práticas de Anatomia para a formação acadêmica. No entanto, esta similaridade

não aconteceu quando os alunos responderam sobre as aulas práticas colaboradas por

monitores. Para os estudantes da Universidade Federal da Bahia, a colaboração dos

monitores nas aulas práticas era menor, sendo esta diferença estatisticamente

significante quando comparada com as outras instituições (p = 0,001).

Além disso, houve discordância entre os estudantes das três Universidades,

quanto à importância da dissecação para o estudo da Anatomia, sendo que para os

estudantes da Universidade Federal da Bahia a dissecação de cadáveres denotava

uma importância estatisticamente significante (p = 0,001) e que também a dissecação

é essencial para a sua formação médica (p=0,02).

Também houve discordância entre as três universidades quanto à integração da

disciplina Anatomia com outras disciplinas básicas, sendo que para os estudantes da USP

esta integração era menos importante sendo estatisticamente significante (p = 0,001).

48

49

3.3. Apresentação e interpretação dos dados qualitativos

A utilização da estratégia do grupo focal na segunda etapa dessa pesquisa se

justifica tendo em vista que foram observadas diferenças estatisticamente

significativa em algumas respostas dos estudantes da Universidade Federal da Bahia

quando comparadas com as respostas dos estudantes da Universidade Federal do

Rio de Janeiro e da Universidade de São Paulo (Tabela 11; questões 02, 06 e 07).

As seguintes narrativas foram produzidas a partir da técnica do grupo focal, já

descrita no capítulo da metodologia. Obedecendo aos ditames da análise de

conteúdo, as narrativas deram origem às categorias analíticas, através das quais

foram organizados momentos interpretativos diferenciados, considerando a essência

discursiva de cada categoria.

O grupo focal oportunizou o aprofundamento de questões subjetivas

vivenciadas pelos alunos e diretamente relacionadas ao processo de

ensino/aprendizagem da disciplina Anatomia.

A análise de conteúdo possibilitou evidenciar os significados e sentidos

atribuídos pelos sujeitos à temática investigada, dando ênfase às suas narrativas

com os seus diferentes pontos de vista.

O cadáver é indispensável para o ensino da Anatomia.

Todos os discursos dos participantes do grupo focal a respeito do uso do

cadáver no ensino da Anatomia se concentram na sua extrema importância,

afirmando mesmo ser impossível o ensino desta disciplina sem este elemento.

50

...Honestamente eu não consigo imaginar aprender Anatomia sem um

cadáver, porque eu acho que a diferença é estúpida quando você pega o

Atlas...

...É isso que torna imprescindível o uso do cadáver nas aulas de

Anatomia pra gente ver a peça em si, com toda a noção de volume e

sensações táteis...

...O uso do cadáver é importante no sentido que nos deixa em contato

com as variações anatômicas (...) a gente não vai ta lidando em termos

de Anatomia, na nossa profissão com pessoas iguais. Todos são

diferentes e eu acho que o cadáver contribui nesse sentido...

Entretanto, não é todo tipo de cadáver que é visto pelos informantes como

ideal para o ensino da Anatomia. Segundo as suas falas, o cadáver ideal seria

aquele que estivesse em bom estado de conservação.

...Depende muito do cadáver. Por exemplo, existem cadáveres que não é

nem um pouco didáticos, então eles podem confundir muito mais a

gente...

Entre o cadáver e o modelo anatômico

A discussão sobre o uso do modelo anatômico nas aulas de Anatomia gerou

uma profusão de opiniões que graduavam entre o uso complementar do modelo e o

não uso deste.

“Eu já fiz outra faculdade que tinha o boneco para olhar as coisas assim,

e é uma diferença enorme, não consegue fazer o desenho exato da

realidade do que a gente vê lá na hora (...). Acho que boneco de jeito

nenhum ia conseguir recriar isso, essa realidade”.

“O boneco pode vir com erros humanos na confecção, o cadáver é

assim, não tem como o cadáver estar ali errado. Ele pode vir com

variações anatômicas, mas que é importante conhecer também.”

51

Tocar e dissecar: uma Anatomia de superfície e de profundidade

Os alunos relataram o desejo de poder tocar nos cadáveres e poder dissecá-

los, afirmando que através dessas técnicas o processo de ensino/aprendizagem

seria mais produtivo e integrado. Para eles, somente observar o cadáver, ou parte

dele, não é suficiente para esclarecer suas dúvidas.

(...) “a gente deveria ter oportunidade, todos os alunos, de manusear as

peças também, porque a gente vai ter a conservação de toda a memória

visual, quanto a memória tátil também no processo e sentir a

consistência das coisas, mesmo sabendo que é mais enrijecido no

cadáver”(...)

“[Quando] você passa a ter um contato maior com a peça manusear e até

você descobrir músculos que estavam escondidos”.

Entretanto os alunos demonstram uma grande preocupação com a

conservação das peças, por reconhecerem a sua fragilidade.

“(...) Eu acho que tem que tomar cuidado também, porque senão se todo

aluno for poder manusear, tem muitos alunos que não vão ter cuidado”.

“Até os próprios monitores que podem não ter cuidado, e aí vão

acabando ainda mais as peças, acho que não pode ser assim: qualquer

um pra manusear, porque se não acaba estragando mais.”

A dissecação dos cadáveres aparece nas falas como uma prática - síntese

dos conhecimentos adquiridos nas aulas teóricas. Dissecar o corpo é penetrar e

conhecer a sua estrutura.

52

“(...) seria ideal também, na minha opinião, trabalhar com a dissecação

de cadáver, a dissecação de peças, além do cadáver, só peça que já

está pronta pra gente (...)”

“(...) Então, ter uma peça a mais dissecada também é super necessário, ter

um curso que possa ensinar os alunos, ter um acesso a dissecação (...)”

Os alunos apontaram a necessidade de que seja oferecido durante o curso de

medicina, possivelmente como conteúdo da anatomia, um curso de dissecação

visando capacitá-los para a sua execução.

O uso de imagens no ensino de Anatomia

A reflexão sobre o uso de imagens nas aulas de Anatomia demonstrou o

caráter complementar que este recurso representa para os alunos. Para eles,

imagens, modelos anatômicos ou quaisquer outras tecnologias em 3D podem, e

devem ser utilizados, porém sempre como um elemento para maior aprofundamento

da aprendizagem, sem prescindir do uso do cadáver.

“(...) A gente vai trabalhar com pessoas vivas, que vão sofrer um

acidente, e a gente vai ter que tirar imagens, fazer um estudo da imagem,

mas só a imagem é claro que não é suficiente (...), acho que seria um

complemento (...)

“Você vê a prática, vê o cadáver, e depois ir para a imagem é muito bom,

como um complemento (...), você acabou de estudar a vísceras

abdominais, e depois estudar as imagens radiológicas, em ultra-som, um

raio X, seria muito válido sim, mas como complementar.”

Os relatos dos alunos apontam pelo menos duas formas, nas quais o uso de

imagens seria mais produtivo ainda que continuasse, sendo visto como recurso

53

ilustrativo complementar. O uso das imagens poderia começar nas aulas práticas,

como estratégia de comparação, ou nas aulas teóricas, como ilustração.

Anatomia: qual a carga horária ideal?

Os participantes do grupo focal concordam no uso complementar de imagens

na disciplina de Anatomia, mas não chegaram a um consenso sobre a carga horária

mais adequada para a mesma. Suas opiniões variavam entre o uso excessivo de

imagens e conteúdo clínico, e a necessidade de centrar o ensino da disciplina em

questões mais específicas.

“(...) Porque se a gente for pegar Anatomia, a carga horária já é pequena,

e (...) se a gente for botando imagens e muita parte clínica para os alunos

do primeiro semestre”...

“(...) Se a carga horária já é pequena pra dar o que tem que ser dado,

então vamos retirar essa carga horária, que já é pequena, para dar uma

coisa que outras matérias vão dar depois (...)

Os alunos concordam que, dependendo do assunto que é ensinado na aula, a

carga horária parece não se adequar. Todos também relataram que o

aproveitamento da carga horária depende da didática do professor da disciplina.

“(...) Às vezes depende do assunto, às vezes pra aquele assunto a aula

poderia ser menor, mas para outro assunto que a gente julga mais

importante foi muito curto. Acho que poderia balancear um pouco esse

tempo (...)”

“(...) O professor e o método de ensino são coisas extremamente

relacionadas, até porque, se o professor não quiser, não segue o método

de ensino (...)”

54

Ao serem questionados sobre quais seriam as mudanças necessárias para

melhorar a aprendizagem e o ensino no curso de Anatomia, os alunos sugeriram

diferentes propostas que versavam de mudanças na carga horária, e distribuição da

disciplina na matriz curricular à atualização didática dos professores, pelo menos no

que diz respeito ao uso de imagens e dissecação.

“(...) Acho que cabia agora implantar a dissecação, pra alunos

dissecarem, eu acho que isso seria muito válido (...)”

“(...) Tentar fazer alguma associação com o IML, para que se assistisse

uma autópsia ao vivo, e nessa autópsia, junto com o professor que fosse

mostrando as estruturas que se estudou no curso, mostrando o que à

gente está estudando no momento que se faz a autópsia (...)”

(...) É isso, a atualização dos professores. É isso que estou falando. Se

for preciso mudar o professor, fazer novos concursos (...)

Durante todas as discussões a idéia-chave que perpassava nos relatos era a

de que a Anatomia é uma disciplina imprescindível aos cursos de Medicina. Os

alunos admitiram não conceber a formação médica sem o ensino/aprendizagem

aprofundado e completo desta disciplina,

(...) A Anatomia pra mim é a base de tudo, a base do Curso de Medicina,

a base mesmo (...)

(...) Você não entende nada de fisiologia se você não souber quais as

estruturas que você vê na Anatomia. Não tem como ser médico

independente se você vai ser cirurgião, se vai ser clínico. Sem saber

Anatomia, é impossível isso (...)

(...) A clínica médica depende do estudo da patologia, a patologia

depende do estudo da fisiologia, a qual depende amplamente do estudo

da Anatomia (...)

(...) Medicina é como aprender uma nova língua. A Anatomia é

justamente a matéria que vai ensinar a aprender medicina (...)

55

Aprender a Ensinar Anatomia: Professores e Monitores

Nas universidades públicas investigadas a monitoria de alunos nas aulas

práticas de Anatomia é muito utilizada como estratégia de ensino/aprendizagem. Os

monitores não atuam sozinhos, na maioria dos casos, são supervisionados pelos

professores da disciplina. Os participantes do grupo acreditam que a monitoria não

somente aproxima o aluno do professor, mas também facilita o aprendizado da

anatomia através do compartilhamento de linguagem e experiências entre pares.

(...) Já que não existe ponte entre o aluno e o professor, vai existir ponte

entre o aluno e o monitor (...)

(...) Às vezes a turma é muito grande e não tem como o professor dar

aquela atenção a todos os alunos. O uso de monitores é uma alternativa

pra isso (...)

(...) O monitor é aquela pessoa que estaria mais próxima do que é o

professor, até porque a idade semelhante causa maior aproximação com

o aluno (...)

(...) A monitoria é importante, mas é fundamental a presença do

professor nas aulas práticas, porque o monitor é uma pessoa qualquer

que erra também (...). Então, o professor não pode de modo algum estar

ausente, tem que estar ali pra tirar dúvidas e esclarecer as questões que

ficam complicadas e o monitor não está sabendo (...)

PBL: Uma forma diferente de ensinar e aprender Anatomia

A universidade na qual o grupo focal foi realizado não adota o PBL. Os alunos

demonstraram dúvidas, e mesmo resistência quanto a real aplicabilidade deste

método, e sugerem algumas mudanças nos componentes teóricos e práticos da

disciplina de Anatomia, se a instituição deseja adotar este método de ensino.

56

(...)Eu já tive essa experiência ... eu estudei em uma outra instituição

estudei anatomia, sobre essa forma de PBL também ele tava começando

a implantar, acho que não tava ainda bem firmado e agora estou tendo a

experiência da anatomia, de uma forma um pouco mais tradicional e

realmente eu vi a diferença absurda, o método PBL foi muito

insatisfatório para minha aprendizagem eu vendo agora parecia que eu

não tinha visto nada de anatomia praticamente que tava aqui aprendendo

tudo de novo. (...)

(...) O método PBL ele exige para ser eficiente, uma disponibilidade dos

professores, permanência dos professores para tirar dúvidas. Os

professores têm que ser médicos, completamente a par dos assuntos

todos discutidos no caso, porque no PBL não se discute apenas

Anatomia, mas Fisiologia, Histologia. (...)

(...) Eu acho que este método está funcionando em algumas faculdades

da Europa, mas é outro nível. Eles têm recursos materiais e humanos,

que aqui, sinceramente... não existe como aplicar isto nas universidades

públicas (...)

(...) A gente não precisa de um método PBL para lidar com os casos

clínicos na aula, por experiência própria, quando eu fui aluna de

Anatomia II, eu tive como método de aprendizagem discussões de casos

clínicos. Tinha um dia determinado que a gente vinha após ter visto o

assunto, ter aula teórica, depois ter visto as peças anatômicas, os

professores ofereciam casos clínicos. A gente passava horas discutindo

e era uma forma muito boa de complementar o assunto (...)

Ensino de anatomia e avaliação da aprendizagem

Esta categoria analítica emergiu do trabalho de campo, como uma demanda

dos participantes do grupo focal em aproveitar esta oportunidade para discutir o

processo de avaliação da disciplina e fazer algumas reflexões.

(...) Eu achei ótimo o método de gincana. Eu até me divertia nas provas,

mas, às vezes, os professores têm que ter cuidado, porque muitos deles

colocam o alfinete bem na transição entre uma estrutura e outra (...)

(...) Os professores têm que saber alfinetar no lugar certo e não colocar

em estruturas ambíguas (...)

57

(...) Quando misturam a prova teórica e a prática na gincana, a

experiência que eu tive não foi boa, também misturar a integração das

disciplinas em uma única prova (...)

(...) A faculdade nessas horas de avaliação precisa ter cuidado porque

não pode formar uma pessoa sem conhecimento (...)

(...) Todo método de avaliação tem que ter bastante cuidado com o que é

importante realmente ser avaliado, e de como será feito isso (...)

Todos concordaram que, seja ele tradicional ou inovador, o método de

avaliação deve dar conta de tornar evidentes as deficiências e avanços no

conhecimento dos alunos a respeito do conteúdo teórico-prático de Anatomia.

58

4 DISCUSSÃO

Neste trabalho procuramos avaliar a contribuição da disciplina de Anatomia

na formação do médico. Numa primeira etapa examinamos a distribuição da carga

horária da disciplina na grade curricular da primeira escola médica brasileira, criada

em 1808 na Bahia. Analisamos a evolução da inserção da disciplina de Anatomia

nas grades curriculares desde que surgiram com as primeiras reformas do ensino

médico no Brasil durante a primeira metade do século XIX comparando com tempos

atuais. Nesta avaliação comparamos a carga horária da Anatomia com as demais

disciplinas das áreas básica e profissional, que surgiam com o progresso cientifico.

Numa segunda etapa avaliamos a prática do ensino de Anatomia em algumas

universidades públicas do País. Foram considerados nesta avaliação os recursos

didáticos e pedagógicos empregados na transmissão do conhecimento aos

estudantes de Medicina.

Por fim avaliamos a percepção do aluno de Medicina quanto ao aprendizado

de Anatomia, por meio da aplicação de um questionário a 422 alunos de medicina

de três universidades públicas brasileiras.

Do conjunto de nossas observações e resultados chamou-nos a atenção a

abrangência do tema do nosso trabalho. A vasta literatura existente atesta a

atualidade e importância do tema, veiculado em diversos periódicos de elevado

índice de impacto e de grande relevância para essa área do conhecimento.

Constatamos ainda que a preocupação com o ensino de Anatomia para formação do

médico é tão antiga quanto a própria prática médica (HEYLINGS, 2002) remontando

à Escola de Alexandria (FRENCH, 1979).

59

A disciplina de Anatomia

A relação entre a Anatomia e a Cirurgia no currículo das primeiras escolas

médicas do Brasil teve uma longa duração. Tal relação inclusive se confirmou com o

nome de uma delas, a Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro,

reforçando a idéia de que a anatomia é o pilar principal da formação do médico

(HEYLINGS, 2002).

Na época de sua criação, em 1808, o conhecimento científico de base

tomava consistência. A microbiologia de R. Koch teria complementação em Louis

Pasteur somente na segunda metade do século XIX (FACURE, 1999). As leis

mendelianas de Gregor Mendel (1822-1884) surgiram em 1856, mas só ganharam

reconhecimento no início do século XX. Em 1835 foi introduzida a teoria celular do

botânico Matthias Jakob Schleiden (1804-1881) e do médico histologista e

embriologista Theodor Schwann (1810-1882). A seguir, em 1854, o patologista

alemão Rudolph Virchow, descreve pela primeira vez a origem de uma célula a partir

de outra célula e os tumores gliais. Embora o início das descrições detalhadas do

sistema nervoso tenha se iniciado nos séculos XVII e XVIII, foi apenas no final do

século XIX que Camilo Golgi (1843-1926) e Santiago Ramon e Cajal (1853-1934)

descreveram a celularidade do sistema nervoso (FINGER, 1994; MOURA-NETO,

LENT, 2008).

Embora os conhecimentos anatômicos já fossem avançados para a época na

Escola de Alexandria, foi somente com a obra de Andréas Vesalius que estes

conhecimentos passam por importantes mudanças (AZIZ e cols., 2002). A circulação

sanguínea e a organização anatômica dos vasos, as estruturas musculares e ósseas

assim como o desenvolvimento fetal humano, como descrito nas obras dos obstetras

60

do século XVIII, nos mostram a evolução do conhecimento da anatomia como

ciência de base para os procedimentos cirúrgicos, especialidade eixo da formação

médica na época. Até o surgimento da anestesia através de inalação de éter

descoberto por William Thomas Green Morton (1819-1868), em 1845, os

procedimentos cirúrgicos necessitavam ser precisos e rápidos. Atenuar a dor através

da redução dos tempos cirúrgicos dependia da experiência do cirurgião e dos seus

conhecimentos anatômicos.

A grade curricular das primeiras escolas médicas do Brasil foi pautada pela

Anatomia. As reformas curriculares subseqüentes da primeira metade do século XIX

demonstraram o surgimento de novas disciplinas, tanto de cunho profissional como

da área básica. Nestes novos quadros de formação, o tempo do curso médico foi

ampliado, passando de quatro para cinco e depois para seis anos.

Se por um lado a duração dos cursos foi ampliada, o mesmo não ocorreu com

Anatomia, que teve sua carga horária reduzida em relação às outras disciplinas

(REIDENBERG e LAITMAN, 2002; VASQUEZ e cols., 2004).

Atualmente, a carga horária da Anatomia é menor do que no passado,

provavelmente, essa redução se deve ao desenvolvimento científico que fez com

que surgissem novas disciplinas, tanto da área básica como da área profissional,

bem como a formação de disciplinas que a princípio eram ministradas junto com a

Anatomia e que nada mais são do que ramos da Anatomia, e hoje são ministradas

separadamente, como a Embriologia, a Teratologia, a Histologia, a Biologia Celular e

a Anatomia Radiológica.

Outro aspecto a ser considerado foi o surgimento do PBL há cerca de mais de

trinta anos que vem sendo aplicado aos cursos médicos. O PBL trazia a novidade de

integrar o conhecimento científico em torno de um problema eminente médico a um

61

estudo de caso (McCOURT, THOMAS, 2001; CAMP, 1996). Ao longo destes 30

anos houve algumas dificuldades na aplicação e universalização do PBL

(McCOURT; THOMAS, 2001).

Apesar das universidades consultadas não adotarem o método PBL um dos

alunos do grupo focal, e que havia tido uma experiência anterior com este método

em outra universidade relatou que o método PBL foi muito insatisfatório para o seu

aprendizado e que reestudando no método tradicional, praticamente parecia que

estava aprendendo tudo de novo.

Entretanto, para Collins e cols. (1994) e Prince e cols. (2003) os estudantes

de PBL têm o mesmo nível de percepção do conhecimento de anatomia que os

estudantes em outras escolas médicas de não PBL e que as diferenças estavam

somente entre as escolas.

Apesar dos argumentos a favor do PBL (CAMP, 1996; BOON e cols., 2001,

CERQUEIRA, 2004; McLACHLAN, 2004; ABU-HIJLEH e cols., 2005; MORAES,

MANZINI, 2006), Moraes e Manzini (2006) observaram alguns aspectos negativos

do PBL na Faculdade de Medicina de Marília – Famema, onde os estudantes se

concentraram na falta de conteúdos teóricos das ciências básicas e explicitaram a

dificuldade inicial de aprender a estudar sozinhos esses conteúdos, ou seja, de

encontrar recursos para superar suas dificuldades na auto-aprendizagem.

Na nossa interpretação, a estratégia do PBL não nos parece conveniente.

Trazer o aluno precocemente para a interpretação clínica de problemas médicos

pode acarretar na superficialização do conhecimento das disciplinas básicas, cujo

conteúdo é imprescindível ao entendimento do caso clínico.

Uma proposta alternativa ao PBL e que nos parece mais consistente seria a

integração, ao menos entre as disciplinas da área básica, em torno da Anatomia. Ela

62

possibilitaria um ensino de Anatomia não apenas morfológico, mas morfofuncional,

relacionando a estrutura com a função. Um ensino estruturado desta forma permitiria

a formação básica integrada de uma complexa relação entre gene-molécula-célula-

embriogênese-tecido-órgão-sistema. Neste modelo de ensino é possível oferecer ao

aluno o conhecimento no seu todo e não nas suas partes fragmentadas, haveria

uma integração horizontal das disciplinas.

A recuperação da Anatomia como uma disciplina associada àquelas do ciclo

profissional poderia ser uma alternativa ao ensino de hoje. Depreende-se dos

quadros curriculares dos cursos médicos exemplificados aqui, que a Anatomia já foi

disciplina também do ciclo de disciplinas profissionais. Assim, verifica-se a oferta de

uma disciplina Anatomia Cirúrgica, nos primeiros anos do curso médico, (1808)

gradativamente substituída nas reformas subseqüentes e eliminada dos currículos

atuais.

Considerando-se que Anatomia é oferecida no primeiro e/ou segundo ano,

utilizando principalmente métodos de memorização, é de se esperar que alguns

detalhes anatômicos sejam esquecidos na época do ingresso no ciclo profissional.

Daí nos parecer importante que ela reapareça no ciclo profissional da grade

curricular. A associação com a Cirurgia não precisaria estar restrita apenas à

Obstetrícia ou Ortopedia, como indicam os alunos nos seus questionários, podendo

estar presente no ensino de Neuroanatomia associada à Neurocirurgia, Neurologia e

mesmo à Psiquiatria ou ainda à Radiologia.

A Neuroanatomia em especial sempre foi organizada, em escolas européias

pelo menos, separadamente da Anatomia Geral, o que lhe permitiu reforçar as

chamadas neurociências nos dias de hoje (McLACHLAN, PATTEN, 2006).

63

As aulas práticas de Anatomia e o desenvolvimento de habilidades

Um dos assuntos mais controvertido no ensino de anatomia na atualidade é o

uso ou não de cadáveres. O cadáver deve ou não ser usado no ensino de

anatomia? Os modelos anatômicos de hoje substituem as esculturas do passado,

como as de Paul Zeiller (HOPWWOD, 2007)? Devem ser usadas radiografias,

imagens de ressonância magnética e de tomografia computadorizada ou peças

anatômicas plastinadas, como as de Gunther Von Hagens (WEIGLEIN, 1977)?

Imagens virtuais com as reconstruções em três dimensões, vídeos e filmes podem

substituir o cadáver (McLACHLAN, e cols., 2004)?

Os resultados dos questionários dirigidos aos docentes e aos discentes

demonstraram que a maioria dos consultados optou pelo uso do cadáver.

Entretanto, uma parcela importante dos professores (59,1%) informou que não há

aulas de dissecação. Autores como Nnodim (1990), Skidmore (1995) e Topp (2004)

concordam com aulas práticas de anatomia só com prossecção. Entretanto para

Ellis (2001), Aziz e cols. (2002), Cahill (2002), Rizzolo (2002), Granger (2004) e

Pawlina e Lachman (2004) a dissecação é o melhor modo para ensinar. Em

contrapartida, para Finkelstein e Mathers (1990), Miller (2000), Dinsmore e cols.

(2001), Hubbell e cols. (2002) e McLachlan e cols. (2004) a dissecação é

dispensável.

Tanto professores como alunos consideraram a aula prática é essencial e

indicaram que as avaliações das mesmas devam ser feitas. Isto pode significar um

reconhecimento desta aula prática no desenvolvimento de habilidades para a

atividade médica.

64

Desde o início das escolas médicas no Brasil o cadáver tem sido utilizado nas

aulas de Anatomia. José Maurício Nunes Garcia Júnior (1808 – 1884), Lente

proprietário da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, em seu livro “Curso

Elementar de Anatomia Humana ou Lições de Anthropotomia” de 1854, no correr

das 37 lições de Anatomia salienta a importância do uso dos cadáveres e os

cuidados com a dissecação, como procedimentos que desenvolvem as habilidades

médicas. Nessa época, nos anos de 1830-50, a cirurgia era a principal formação

profissional dos médicos. Em sua aula de despedida, quando solicita seu

jubilamento, ele ressalta a importância do uso do cadáver e, como nós, nos dias de

hoje, aponta para a dificuldade de obtenção de peças anatômica para as aulas

práticas23. Este relato nos mostra que o problema em obter cadáver para as aulas

de anatomia, embora antigo, ainda continua sendo atual.

A dificuldade de obtenção de cadáver é comum a muitas das escolas médicas

européias e americanas. Uma legislação brasileira para doação de corpos já existe,

há mais de 20 anos, entretanto não parece ter resolvido o problema.

Inúmeras preocupações envolvem o emprego de cadáveres: a dificuldade de

obtenção, o custo operacional para manter um anatômico em condições corretas de

higiene e cuidados éticos e os riscos de saúde na manipulação de peças anatômicas

embebidas em solventes, como o formol. No entanto, a tônica maior (da NOVA e

cols., 2000) parece ser o cuidado do estado psicológico dos alunos no contato com a

morte ali representada pelo cadáver (TSCHERNIG e cols., 2000).

Bastos e Proença, em 2000, realizaram um trabalho de pesquisa junto aos

mais de 200 alunos dos primeiros anos do curso de Medicina da UFRJ, durante o

aprendizado de Anatomia, e salienta quão traumático psicologicamente pode ser 23 Último Acto Escolar do Lente de Anatomia Descriptiva, da Faculdade de Medicina da Corte em 17 de março de 1857

65

este contato com a peça anatômica, via de regra, já seccionada em partes. Este

problema apontado no estudo está presente também em outras escolas na Europa

(McLACHAN e cols. 2004), na Ásia (LEUNG e cols., 2006) e na Nigéria (NMADU

1996), embora haja os defensores do estudo com o cadáver (ELLIS, 2001, GARVEY

e cols., 2001, AZIZ e cols., 2002, GRANGER, 2004, PAWLINA, LACHMAN, 2004 ).

Embora existam dificuldades inerentes à obtenção de cadáveres e condições

ideais para instalação dos Laboratórios de Anatomia, concordamos que o mesmo é

fundamental para o ensino da disciplina, e com os resultados da aprendizagem

adquiridos por meio da dissecção apontadas por LEMPP (2005) como: o trabalho de

equipe, respeito ao cadáver, familiarização com o corpo, aplicação das habilidades

práticas, integração da teoria e prática, preparação para a clínica e apreciação da

dissecção dentro da história da medicina.

O estudo com cadáver implica no desenvolvimento de habilidades e no

contato com o corpo que seria como o de seu futuro paciente, permitindo ao

estudante estabelecer um sentimento de cuidado, de respeito com o corpo humano,

dispensando uma maior atenção à prática (REIDENBERG, LAITMAN, 2002).

Collins e cols. (1994) analisaram a prática anatômica de 112 diferentes

Departamentos de Anatomia nos USA (102/123) e Canadá (10/16) constatando que

um grande número delas tem algum tipo de prática em Laboratório de Anatomia.

Cerca de 97% das Escolas Médicas nos USA usam a dissecação nos seus cursos,

associada ao trabalho com modelos anatômicos, ossos, multimídia e a prossecção.

No Reino Unido (HEYLINGS, 2002), 76% (16/21) das escolas pesquisadas tinham a

prática de dissecção, sendo que 12 delas tinham a dissecação associada com

outros procedimentos e as restantes 4 utilizavam apenas dissecção (ELIZONDO-

OMAÑA e cols., 2005; COLLINS e cols., 1994; HEYLINGS, 2002).

66

Esta observação se confirmou no nosso estudo através do depoimento de

alguns alunos como “ ..

“(...) seria ideal também, na minha opinião, trabalhar com a dissecação

de cadáver, a dissecação de peças, além do cadáver, só peça que já

está pronta pra gente (...)”

“(...) Então, ter uma peça a mais dissecada também é super necessário, ter

um curso que possa ensinar os alunos, ter um acesso a dissecação (...)”

Monitoria

O curso com a colaboração do aluno monitor é uma prática de muitas das

nossas escolas médicas. Os alunos que cursaram Anatomia e demonstram ou uma

dedicação maior à disciplina, ou um domínio maior da Anatomia, avaliados ou por

prova de seleção ou por outros critérios, passam a exercer a função de monitor e

colaboram com os professores nas aulas práticas. Em alguns casos sabemos que

são preparados para o trabalho de monitoria, com cursos complementares

(comunicação pessoal Dra. Sandra Konig, UFRJ). Na escola de Medicina Monte

Sinai (Monte Sinai Medical Schooll, USA) o emprego de tutores, professores que

auxiliam os alunos nas práticas tem sido uma rotina, mas a monitoria, realizada por

alunos mais experimentados é uma novidade de poucos anos e considerada de

grande importância para o ensino (NMADU, 1996). De fato entre nossos alunos

havia um reconhecimento da importância da presença dos monitores observado no

questionário distribuído aos alunos e no grupo focal. Além disso, o monitor serviria

de uma ponte no relacionamento entre o aluno e o professor e poderia suprir a

carência do número de docentes nas aulas práticas em turmas numerosas, sendo

que a presença do professor seria indispensável nestas aulas.

67

Substitutos do cadáver na aula prática de Anatomia

A substituição do cadáver já foi uma verdadeira batalha entre médicos,

professores de anatomia e artistas. O exemplo da crise de Munique, na Alemanha,

com Paul Zeiller, escultor renomado que se insurgiu contra os anatomistas propondo

o uso de esculturas do corpo humano em cera, madeira ou gesso em substituição ao

cadáver (HOPWOOD, 2007).

Uma das alternativas empregadas em algumas escolas médicas é utilização

do cadáver junto com as imagens virtuais, que a tornam uma ferramenta

complementar a mais neste aprendizado.

Observamos que tanto os alunos questionados como os do grupo focal não

concordavam com a substituição do uso do cadáver por imagens virtuais, sendo que

no grupo focal, os alunos destacaram que estas imagens poderiam ser utilizadas

como uma complementação no seu estudo:

“Você vê a prática, vê o cadáver, e depois ir para a imagem é muito bom,

como um complemento (...), você acabou de estudar a vísceras abdominais,

e depois estudar as imagens radiológicas, em ultra-som, um raio X, seria

muito válido sim, mas como complementar.”

O mesmo observado por AZIZ e cols. (2002) e VASQUEZ e cols. (2005). Acreditamos

que o contato com a peça anatômica, mesmo alterada pelo formol ou pelo tratamento

com o glicerol, é fundamental, pois inicia o contato do aluno com o corpo humano.

Os professores se manifestaram, em sua maioria, favoráveis ao uso das

imagens durante as aulas e apenas 1/3 dos professores consultados se valem da

anatomia palpatória. Esta prática que nos parece importante e em grande parte

complementar pelo uso do cadáver mereceria melhor atenção. Ela tem sido

negligenciada por muitos anos, como diz McLachlan e Patten (2006), defensores do

68

ensino de Anatomia sem o uso de cadáveres, embora reconheçam que a

dissecação tem sido a base do ensino de anatomia desde a Renascença.

Entretanto, a Anatomia Palpatória, o modelo vivo para o estudo de formas

anatômicas nas escolas de Belas Artes, foi implementada na primeira metade do

século XX (McLACHLAN, PATTEN, 2006).

A Anatomia Palpatória permite ao estudante desenvolver habilidades médicas

no que tange ao ato médico, ao contato com o paciente e ao reconhecimento do

corpo do paciente. Este procedimento poderá trazer problemas subjacentes, com o

modelo vivo a ser utilizado para a demonstração ou manuseio pelos estudantes,

visto às implicações éticas deste exercício.

Porém, um curso prático de Anatomia centrado no cadáver, tendo

complementarmente a observação das imagens internas da peça em estudo, ou

ainda a análise da superfície da peça em modelo vivo, gerando inclusive

movimentos que expressem uma anatomia biomecânica, nos parece uma boa

integração.

A integração da Anatomia em todos os níveis, como proposta acima,

horizontal, incluindo as diferentes disciplinas de área básica, Fisiologia, Bioquímica,

Histologia e Embriologia seriam fundamentais. A integração vertical com a área

profissional específica pode aparecer para os estudantes como uma oportunidade

de melhor aplicação dos seus conhecimentos na sua formação profissional.

Naturalmente que a cada profissão o ensino de Anatomia deve apresentar um

perfil mais específico. Mas acreditamos que já está sendo aplicado nas diferentes

universidades no Brasil e no Exterior. A integração, como a que propomos, nos dois

níveis, é que pode representar um diferencial de qualificação do ensino da

Anatomia.

69

Baseada nas questões dirigidas aos alunos surgiram estas nossas propostas.

A primeira delas no que se refere às especialidades médicas mais afins com a

Anatomia, ou seja, Cirurgia e a Ortopedia. A integração vertical permitirá aos

estudantes encontrarem importância, por exemplo, na Anatomia Palpatória para a

Clínica Médica, ou ainda a sua importância para a Cardiologia, ou mesmo a

Neurologia e a Psiquiatria vinculada à formação em Neuroanatomia.

No grupo focal também observamos que isto figura como um pensamento do

aluno, integrar horizontalmente e verticalmente:

(...) A clínica médica depende do estudo da patologia, a patologia depende do

estudo da fisiologia, a qual depende amplamente do estudo da Anatomia (...)

A segunda observação dos estudantes que nos pareceu relevante no

contexto da nossa proposta é o fato de cerca de 86% deles (54% sim e 32% talvez)

consideraram que o ensino de Anatomia poderia ser distribuído por mais semestres

letivos, o que vem, de certa forma, ao encontro do que propomos nesta dissertação,

que é incluir no curso médico novas disciplinas de anatomia, durante o ciclo de

formação profissional, numa integração vertical.

A posição dos professores referente a essa mesma questão coincide com a

dos alunos, onde observamos que a maioria ministra aulas de Anatomia integradas

com outras disciplinas (77%). É possível, neste caso, que a nossa proposta venha a

contribuir para estimular a integração, aproximando os conteúdos das ementas num

plano horizontal e ainda vertical.

70

Conclusões

Acreditamos que os questionamentos que foram feitos na análise dos

resultados desta pesquisa nos permitirão sugerir uma frente de investigação. A

modificação constante das grades curriculares do ensino médico, afastando a

Anatomia das disciplinas da área profissional e a busca de novas estratégias para o

ensino de Anatomia são dois elementos de reflexão.

Naturalmente que não foi esgotada a análise da contribuição do ensino da

Anatomia para a formação médica, mas podemos apontar algumas conclusões de

nosso trabalho que acreditamos poderem ser colocadas na prática do ensino como

uma constante.

1- Introdução de uma disciplina de Anatomia associada – Anatomia Cirúrgica

ou Clínica - às disciplinas do ciclo profissionalizantes;

2- Aplicação desta integração da Anatomia com o ciclo profissional -

integração vertical - do ensino de anatomia;

3- Integração horizontal da Anatomia com as disciplinas da área básica, que

nos parece ser fundamental, pois traria um perfil morfofuncional para a Anatomia,

dando-lhe o destaque necessário como disciplina eixo da formação médica;

4- As aulas práticas de Anatomia com cadáver precisam ser garantidas,

sempre que possível, com dissecção.

5- O uso de diferentes meios audiovisuais, como as imagens virtuais em 3D

do corpo humano, imagens radiológicas em geral, devem ser incrementado no curso

de Anatomia associadas à prática com cadáver, como subsídio complementar à

formação do médico;

71

6- O monitor de Anatomia é um elemento auxiliar no ensino da disciplina,

portanto, a sua preparação para esta função deve ser assegurada pelo professor

que o orientará durante o exercício da prática.

72

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ponto de partida para a escolha do tema e o posterior desenvolvimento

desta dissertação foi a constatação de que o ensino da Anatomia vem passando por

mudanças profundas e perdendo espaço, com o surgimento de novas disciplinas e

de novos recursos tecnológicos. A anatomia chega até a ser considerada por

estudiosos do assunto como uma ciência esgotada, sem nenhum futuro na

investigação.

Fatores de ordem diversa contribuíram para que a situação chegasse a esse

estado. Preocupados com a questão, muitos profissionais da área têm promovido

ações no sentido de encontrar respostas adequadas para a solução do problema.

Essas ações têm resultado no desenvolvimento de reflexões críticas sobre a forma

como esse ensino é ministrado, no oferecimento de propostas alternativas para o

ensino da Anatomia bem como na utilização dos recursos oferecidos pela mídia

eletrônica.

Como docente dessa disciplina, a questão nos afeta diretamente e isso

explica o motivo de havermos escolhido o ensino da Anatomia como o foco deste

trabalho. Tivemos como propósito contribuir de alguma forma para o

equacionamento da questão, por meio da reflexão sobre as causas do declínio do

ensino da Anatomia e sobre suas práticas.

Nesse sentido, estabelecemos algumas questões de pesquisa como:

identificar a representação acadêmica do ensino da Anatomia; saber até que ponto

esse ensino tem acompanhado as mudanças no campo da educação; investigar o

papel que o estudo dessa disciplina poderia desempenhar na formação do

73

profissional médico e observar que campos de saber poderiam oferecer apoio

teórico para o redimensionamento de sua prática didática.

Para tanto, realizamos em primeiro lugar uma pesquisa documental buscando

investigar como ocorreu a sistematização do ensino da Anatomia no Brasil, através

de documentos existentes no Memorial de Medicina da Universidade Federal da

Bahia, como leis, atas, decretos e os memoriais do inicio do século XIX, quando foi

criada a primeira Escola de Medicina.

Em um segundo momento, buscamos levantar dados de natureza quantitativa

e qualitativa através da elaboração de dois tipos de questionários. O primeiro, com

oito questões fechadas, foi aplicado a estudantes de primeiro e segundo ano de

Medicina em três universidades públicas (UFBA, UFRJ e USP), que estavam

cursando a disciplina Anatomia Humana. Um outro questionário foi direcionado a

professores de Anatomia do curso de Medicina em universidades públicas, com

dezessete questões fechadas e uma aberta, permitindo esta última que fossem

feitas observações que se julgassem pertinentes.

Os questionários visavam produzir informações que pudessem ser

generalizadas sobre as características dos sujeitos envolvidos em relação às

técnicas de ensino de anatomia e sobre a percepção de estudantes e professores

em relação ao ensino de Anatomia em cursos de Medicina em instituições públicas

de ensino superior.

Os dados da pesquisa qualitativa foram produzidos por meio da técnica de

grupo focal, o que possibilitou o aprofundamento de questões subjetivas vivenciadas

pelos alunos diretamente relacionadas ao processo de ensino/aprendizagem da

disciplina Anatomia Humana.

74

A análise dos dados obtidos através desses procedimentos investigativos nos

proporcionou elementos para estabelecermos algumas conclusões. Os depoimentos

colhidos nos estudos dos autores pesquisados acerca do ensino da Anatomia nas

Universidades demonstraram não existir uma linha única de pensamento, tanto no

que diz respeito à dissecação dos cadáveres, quanto à metodologia de abordagem e

aos recursos tecnológicos empregados. Possibilitaram-nos ainda obter uma visão de

como o ensino de Anatomia está sendo abordado atualmente, no Brasil e no

Exterior, no que diz respeito às discussões acerca do uso ou não do cadáver nas

prossecções e nas dissecações, à introdução de novas abordagens pedagógicas, à

integração da Anatomia com a Clínica Médica e ao uso de tecnologias da

informática e da comunicação.

Também nos foi possível detectar que, apesar de todas as inovações

tecnológicas, a dissecação, que vem sendo alvo de discussão em Escolas de

Medicina do País e do Exterior e, às vezes, considerada até como dispensável no

ensino da Anatomia humana, continua sendo para os alunos das instituições

pesquisadas um recurso importante para este aprendizado, juntamente com o uso

das novas tecnologias.

A análise dos dados mostrou igualmente que a Anatomia é considerada de

grande importância para a formação do profissional médico. No entanto, as

respostas aos questionários apontaram também para a existência de um

descompasso entre o ensino de Anatomia e a realidade atual, fator que provoca um

desvirtuamento do seu papel ocasionando sérios problemas a sua didatização.

As constatações a que a análise dos dados da pesquisa nos conduziu nos

levam a assumir as seguintes posições em relação à disciplina Anatomia, em si, e

ao processo de didatização:

75

1. Aos estudantes deve ser oferecida à possibilidade de conhecer em sua

formação ambos os modos de aproximação da disciplina – a tradicional e a

tecnológica - garantindo que estes tenham condições de desenvolver plenamente as

habilidades necessárias a pratica médica.

2. Consideramos indispensável à integração do ensino da Anatomia com o de

outras disciplinas básicas e com a clínica, de modo a proporcionar um maior

aproveitamento no aprendizado ao estudante.

3. Entendemos ainda que é imprescindível e urgente repensar a forma de

abordagem da disciplina, levando-se em conta as mudanças da realidade sócio-

histórica que vêm ocorrendo, de modo a adaptá-la às exigências que essas

mudanças acarretam, sem abandonar, no entanto, práticas fundamentais ao ensino

da Anatomia, como a dissecação. Nesse sentido, é indispensável que todos os

envolvidos no processo ensino/aprendizagem estejam conscientes do papel

primordial que ela desempenha na formação profissional médica e assumam a

tarefa de conduzi-la nessa perspectiva.

O trabalho está concluído. Acreditamos haver alcançado os objetivos a que

nos propusemos, mas as reflexões desenvolvidas ao longo de sua feitura nos

apontaram inúmeras outras questões que merecem ser investigadas. Na verdade,

lidar com a formação acadêmica supõe um exercício constante de reflexão sobre a

nossa prática que, por sua vez, em um movimento dialético, deve realimentar a

teoria de onde partimos. Assim, a conclusão deste trabalho deixa a sensação de

obra inacabada. E não poderia ser diferente. Primeiro, pela impossibilidade de

esgotar-se um assunto em um breve espaço de tempo e obedecendo a um recorte

tão específico; depois, por ser essa mesma a natureza da investigação científica,

que à medida que faz novas descobertas descortina novos caminhos a serem

76

investigados. É assim que se constrói o conhecimento. É assim que se desenvolve a

ciência. Esperamos haver contribuído positivamente para a reflexão em torno do

ensino de Anatomia e para a reafirmação de sua importância na formação

acadêmica em Medicina.

77

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ANEXOS

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ANEXO 1 – QUESTIONÁRIO DOS PROFESSORES

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ANEXO 2 – QUESTIONÁRIO DOS ALUNOS ANEXO 2 – QUESTIONÁRIO DOS ALUNOS

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ANEXO 3 – PERGUNTAS DO GRUPO FOCAL

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ANEXO 4 – TERMOS DE CONSENTIMENTO ANEXO 4 – TERMOS DE CONSENTIMENTO

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