Upload
lamanh
View
221
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
Mariade
LourdesLima
dosSantos * Contribuição para uma
análise sociográfica dafamília em Portugal
O desenvolvimento da sociedade portuguesacaracteriza-se por uma heterocronia interna,que se reflecte nas estruturas da família. Defacto, utilizando os dados demográficos dis-poníveis, verifica-se que em certas regiões osindicadores de estruturas e comportamentodas famílias apresentam valores equivalentesaos dos países industrializados, enquanto nou-tras correspondem aos que se encontram nassociedades tradicionais. As migrações internase externas deram, por outro lado, lugar aalterações no equilíbrio quantitativo entre ossexos, o que, em diversas regiões, se traduzpor uma elevada taxa de feminilidade da po-pulação. Esta situação não pode deixar deter incidências na nupcialidade e na nata-lidade.
I —INTRODUÇÃO
Procuramos neste trabalho analisar alguns aspectos da famí-lia na sociedade portuguesa a partir da utilização de dados colhi-dos nas estatísticas demográficas — nomeadamente no que respeitaà composição da população segundo a idade e o sexo; natalidade,nupcialidade e fecundidade; dimensão da família; ruptura doscasamentos por morte, divórcio e separação; legitimidade e ilegi-timidade dos nascimentos.
* A Autora realizou este estudo enquanto bolseira do Instituto de AltaCultura, agregada ao Gabinete de Investigações Sociais. Participaram nos tra-balhos preparatórios do texto que ora se publica o Dr. Carlos ANTUNES FILIPEe a Dr.a Maria João CADETE DE OLIVEIRA, O primeiro como programador dosapuramentos e cálculos estatísticos a efectuar, e a segunda como colaboradorana execução desses apuramentos e cálculos, os quais foram realizados em 1967sobre a informação estatística mais recente de que então se dispunha.
Esses dados foram objecto de uma análise orientada segundouma perspectiva de transição de uma estrutura social tradicionalpara uma estrutura social de tipo industrial-urbano. De acordocom esta perspectiva de transição pareceu-nos útil começar portranscrever o esquema dos dois «tipos ideais» (no sentido queMax WEBER deu a esta expressão) de sociedade apresentados porGino GERMANI na sua obra «Política y sociedad en una época detransición».
Transcrevemos parcialmente esse esquema, extraindo apenaso que nos parece apresentar particular interesse para o grupofamiliar. Obtivemos assim, o quadro A (págnas 43, 44), o qual,embora demasiado simplificado, tem a vantagem de destacaralguns aspectos-chave a ter presentes quando se fala de evoluçãoda família nos nossos dias.
à perspectiva de transição de uma estrutura social tradicionalpara uma estrutura social de tipo industrial-urbano, aliámos umaconcepção de heterocronia interna do desenvolvimento da sociedadeportuguesa. Considerámos o território nacional como um todoconstituído por determinadas áreas ecológicas. à diferenciaçãoentre essas várias zonas corresponderá uma diferenciação dos vá-rios níveis a que se processa o desenvolvimento \
Se reconhecemos a distinção entre aquelas áreas como signi-ficativa, restava-nos delimitá-las — tarefa cujas enormes exigên-cias não nos foi possível satisfazer, pelo que nos servimos dadelimitação das regiões de planeamento que o i n Plano de Fomentoconsiderou como ponto de partida para a sua definição de uma«política de harmonização do desenvolvimento à escala regional» 2.Utilizámos, também, a distinção por zonas rurais e centros urbanos(para o que aceitámos os respectivos conceitos estatísticos),quando nos pareceu que ela fazia sobressair particularmente deter-
1 Vários trabalhos de autores portugueses demonstraram já que a so-ciedade portuguesa se tem desenvolvido de forma muito parcial e localizadade tal modo que Portugal nos surge como uma sociedade dualista onde «àmargem e ao redor de algumas restritas áreas socialmente privilegiadas, nasquais os diverso® elementos utilitários da civilização moderna atingiram jáum grau notável de difusão, perdura e s>e estende toda uma zona socialmuito mais extensa-, imersa em condições de vida e formas de civilização tra-dicionais». Cfr, A. SEDAS NUNES, Sociologia e Ideologia do Desenvolvimento,1968.
2 Foi esta a única delimitação por regiões de que tivemos conhecimentoquando se fez a recolha de dados estatísticos. Só mais tarde surgiu o volumeRegiões homogéneas no Continente Português de CASTRO CALDAS e SANTOSLOUREIRO.
As regiões de planeamento são 4, cada uma contendo 2 sub-regiões — Re-gião Norte (Norte Interior: Bragança, Vila Real; Norte Litoral: Porto,Braga, Viana do Castelo), Região Centro (Centro Interior: Viseu, Guarda,Castelo Branco; Centro Litoral: Aveiro, Coimbra, Leiria), Região de LisboaInterior: Santarém; Litoral: Lisboa e Setúbal), Região Sul (Interior: Por-talegre, Évora e Beja; Litoral: Faro).
QUADRO A
O>uilA«aa
Sectores
Tecnologia
Energia
Procedimentos-de produção
Atitudes:
JZconomia
Unidades•económicastípicas
Actividadeseconómicastípicas
OrganizaçãoJSocial
tipos de esta-tuto
Gruposprimários
Pamília
Sociedadetradicional
Utensílios manuaisEnergia humana e animal
artesanal
procedimentos tradicionais
São as mesmas que corres-pondem à organização so-cial:— família extensa— oficina artesanal e acti-
vidade agrícola
ictividades primárias
Predomínio do primáriogrupo de parentescogrupo de idadegrupo de sexogrupo local
Estatuto definido pela idadesexo, parentesco, casta.
Estatuto adscrito
Importantes
Família extensa ou outrasformas semelhantes
Funções biológicas, econó-micas (produção e consu-mo) , educativas, recreati-vas, religiosas, etc.Posição central do grupo deparentesco na sociedade.
Sociedade Industrial «Liberal»Transformações recentes
Máquinas
produção em sérieautomação
procedimentosracionais
Empresa individual. Soe. de pes-soas. Empresa anónima. Soe.de capital. Empresa direc-torial. Separação da proprie-dade e do controle.
actividades secundáriasactividades terciárias
Predomínio do secundárioclasse socialocupaçãonacionalidade
Multiplicidade de grupos 'secun-dários'Estatuto definido pela classe,ocupação, pertença a grupos se-cundáriosEstatuto adquirido
Menos importantes
Família nuclear,Conjugal, menos estável, neo-
locaLFunções biológicas;socialização da criança;ajuste emocional do adulto;económicas; consumo.
•tf
Sectores
Aspectosdemográficos
Caracteres ge-rais da socie-dade, da cul-tura e da per-sonalidade
Grau de comu-nicação:acessibilidadesocial e ecoló-gica
Sistema de va-loresconteúdo:
Sociedadetradicional
Alto potencial demográficoAlta natalidade.Alta mortalidade.
População essencialmenterural
Pouca ou nula.
isolamento social e ecoló-gico.
A tradição, o sangue, a ter-ra, a divindade.
Sociedade Industrial «Liberal»Transformações recentes
'Transição demográfica'Alta natalidade (a baixar)Mortalidade decrescente.Taxas diferenciais —Classes médlias: baixa
natalidadeClasses baixas: alta
nataJidade
Diminuiçãodas diferençasdemográficasentre classes
População crescentementeurbana.
Multiplicação de contactos.Crescente comunicação.Crescente acessibilidade social
ecológica.
Afirmação da razão, o «progres-so», a liberdade, a tolerância*
Multiplicidade de valores. Am-biguidade e contradição.
minados desfasamentos característicos de uma assincronia na ur-banização do território.
Sempre que possível, foi posta de parte uma delimitaçãomeramente distrital, a mais afastada de uma realidade sócio--económica de que procurávamos aproximar-nos.
H — NUPCIALIDADE, NATALIDADE E FECUNDIDADE
1 Considerações prévias
Em cada sociedade, a família encontra-se, como é óbvio, inti-mamente ligada às características demográficas que aquela apre-senta. Da composição de uma população dependerá, em grandeparte, a possibilidade de se atingir um número de casamentos enascimentos capaz de assegurar o equilíbrio socialmente desejáveldas gerações futuras. Naturalmente que uma desproporção nossexos e nas idades afectará o crescimento da população, podendoocasionar baixas na nupcialidade, na natalidade e na fecundidade.
Mas a composição da população é ela própria afectada pelamudança social, na medida em que esta engendra novas motiva-ções que originam alterações nos comportamentos dos membrosda sociedade em causa, o que a instituição da família e, enfim,a estrutura demográfica não deixam de reflectir. Em regra, «umaalta potencialidade demográfica» aparece correspondendo às so-ciedades tradicionais e «uma baixa potencialidade demográfica»às sociedades desenvolvidas.
De acordo com a conhecida teoria das quatro fases da evoluçãodemográfica, a alta potencialidade traduzir-se-á por uma natalidadeelevada ligada a uma mortalidade também elevada, e a baixapotencialidade por uma fraca natalidade ligada a uma mortalidadetambém fraca. Entre a primeira e a última fases, verificar-se-áuma natalidade ainda elevada, mas já com a mortalidade em recuo,seguida de descida de natalidade., continuando a mortalidade arecuar.
Até há pouco, Portugal inseria-se, com outros países da Eu-ropa mediterrânica, num regime demográfico primitivo que, grossomodo, podemos fazer corresponder à l.a fase da teoria citada.Ultimamente, embora as suas taxas de natalidade e de mortalidadeinfantil sejam ainda das mais elevadas na Europa, verifica-se umatendência para o decréscimo. A descida da natalidade e a baixade mortalidade, conjugadas com uma elevada emigração que afectasobretudo as camadas de adultos jovens, começam a provocar umenvelhecimento na população, evidenciando uma fase de transição.
Concordantes com o carácter assíncrono da transição, encon-tramos, no nosso território, taxas diferenciais de natalidade emortalidade. O índice de envelhecimento da população, a nupciali-dade e a fecundidade 3 registam igualmente diferenças importantesconforme as regiões consideradas.
3Ver os índice® de Vitalidade ein Envelhecimento e vitalidade da popu-lação portuguesa: uma análise distrital, por M. J. CADETE DE OLIVEIRA e R.SILVIA PEREIRA, Análise Social, n.° 17, 1967.
Neste aspecto, a recente evolução demográfica da nossa Re-gião Sul é particularmente desconcertante, uma vez que apresentabaixa natalidade, família de dimensões reduzidas, os maioresíndices de envelhecimento, elevada percentagem de intervalos pro-togenésicos largos — características que são próprias do modelaindustríal-urbano e aqui surgem referidas a uma região com umaeconomia baseada em actividades do sector primário, acentuada-mente rural e com padrões de vida baixos (somente na sub-regiãodo Sul Litoral, constituída pelo distrito de Faro, as actividadesdo secundário Õ do terciário atingiram já um certo desenvolvi-mento.
Trata-se apenas de um exemplo muito particularizado, masserve-nos para apontar as reservas com que devemos encarar oproposto esquema de tipos extremos imaginários — sociedade tra-dicional por um lado, sociedade industrial por outro — e parasublinhar as limitações a que se fica necessariamente sujeitoquando se quer aferir uma determinada área por um determinadopadrão. Não só é inexistente uma teoria que englobe os váriostipos de sociedade tradicional ou uma teoria que englobe os váriostipos de sociedade industrial, mas as duas sociedades não vivemisoladas e do próprio confronto das áreas atrasadas com as áreasdesenvolvidas resultam interacções complexas e ambíguas onde,para além de muitos outros factores, o peso de um diferente cir-cunstancialismo histórico e de diferentes tradições culturais nãodeixará de se fazer sentir.
Essa complexidade de interacção pode aparecer traduzida,neste domínio da demografia, ou mais restritamente da natalidade,por comportamentos contraditórios na aparência.
2 Feminilidade da população e nupcialidade
Passamos à análise daqueles dados que se relacionam comos dois tipos de acontecimentos demográficos fundamentais paraa família: natalidade e nupcialidade.
Entre tais dados parece-nos importante começar por tomarem conta a relação da feminilidade ou seja o número de mulherespor 100 homens — proporção esta que, se registar grande desequi-líbrio, afectará a nupcialidade, elevando a percentagem do celibatofeminino ou masculino e repercutir-se-á na natalidade podendo,por exemplo, aumentar a taxa de ilegitimidade.
Procurámos averiguar em que medida o carácter urbanointroduz variações na proporção dos sexos e, de facto, encontrámosuma relação de feminilidade muito mais desequilibrada nos Cen-tros Urbanos do que nas Zonas Rurais —120 M por 100 H nosprimeiros, enquanto nas segundas 106 M por 100 H — desequilíbriopatente nos gráficos I e II.
Jf6
GRÁFICO I
DÊ MULHERES POR 1OO HOMENS— 196O —
4 46,4 H
GRÁFICO II
N2 DE MULHERES POR 1OO HOMENS— 1 9 6 0 —
Considerando esta relação por grupos de idade vemos esteexcedente de mulheres começar a verificar-se, nos Centros Ur-banos, logo para o grupo dos 10 aos 14 anos e ir aumentandoprogressivamente com a idade, numa intensidade muito superiorà dos excedentes femininos das Zonas Rurais que, aliás, só come-çam a fazer-se sentir para lá dos 20 anos.
Cremos que estas variações da relação da feminilidade seexplicam, em grande parte, pelos movimentos migratórios dapopulação feminina, especialmente atraída pelos Centros Urbanosonde espera encontrar melhores possibilidades de colocação (ofenómeno, de resto, verifica-se noutros países, aparecendo, nasgrandes cidades, um número de mulheres por 100 homens muitosuperior à média nacional).
Todavia, ao apurarmos a relação de feminilidade para osCentros Uubanos com mais de 20 000 habitantes (Quadro n.° 1),verificámos que essa relação em Moscavide, Barreiro, Almada,Amadora e Setúbal era muito inferior à achada para o totaldos Centros Urbanos.
Acontece que estes cinco Centros estão incluídos nos doisúnicos distritos — Lisboa e Setúbal — que no período de 1951 a1960 apresentaram saldos positivos do movimento de atracção erepulsão populacionais 4.
A perda de poder de atracção para os restantes CentrosUrbanos parece, pois, derivar sobretudo de uma quebra na afluên-cia da população masculina (a partir de 1961 a emigração parao estrangeiro sobrepor-se-á ao êxodo rural) mais do que na depopulação feminina. Àqueles cinco Centros acorre, ainda, umapreciável número de homens atraídos pelo desenvolvimento indus-trial do Barreiro e de Setúbal e pelas possibilidades de empregona capital. Homens que, na sua maioria, ao que parece, não sefazem acompanhar pela família5, alojando-se alguns, provavel-mente, em Almada e Amadora, porque a capital superlotada edispendiosa não os acolhe.
Não dispomos de dados que nos confirmem, mas julgamosque as mulheres que acorrem às cidades são na maioria solteiras.Isso contribuiria também para explicar a diferença de proporçãoentre mulheres solteiras e homens solteiros dos Centros Urbanospara as Zonas Rurais (117 mulheres solteiras por 100 homenssolteiros nos primeiros e 98 nas segundas).
4 Alberto de ALARCÃO, «Êxodo rural e atracção urbana no Continente»,Análise Social, 7-8, 1964.
5 Um estudo realizado pela Divisão de Investigação e Estudos do Ser-viço de Produtividade do INII sobre a Adaptação do Trabalhador de OrigemRural ao meio Industrial e Urbano, por FARIA MARTINS, Fernandes de AL-MEIDA e Henriques) VARA, revela que 79 % dos trabalhadores da amostra ti-nham vindo sós para Lisboa, ficando na terra as mulheres e os filhos.
49
Número de M por 100 H nos Centros Urbanos com mais de 20 000 pessoa»
QUADRO N.1 1 1960
Centros urbanos HM MM— X 100H
Centro urbano de Braga
» Guimarães . ...
» Covilhã . .
» Coimbra
» Évora ... .
» Amadora
» Lisboa ... .
» Moscavide .
» Matosinhos
» Porto
» Vila N. de Gaia
» Almada ... .,
» Barreiro
» Setúbal
Total do Continente
Total dos Centros Urbanos
40 977
23 229
23 091
46 313
24144
36 331
802 230
22 065
37 694
303 424
45 739
30 688
30 399
44 435
8 292 975
1 510 759
E:
18 569
10 597
10 688
19 521
10 963
17 593
361 694
10 985
17 910
133 650
21349
14 881
14 820
21442
3 971 316
6/84 6610
22 408
12 632
12 405
26 792
13181
18 738
440 536
11080
19 784
169 774
24 390
15 807
15 579
22 993
4 321 659
826099
120,7
119,2
116,1
137,2
120,2
121,8
100,9
110,5
127,0
114,2
106,2
105,1
107,2
108,8
119,5
FONTE: X Recenseamento, 1960. Tomo III, vol. 1.°
50
O exame do gráfico III, onde figura a repartição da populaçãopor idade, sexo e estado civil, mostra-nos que a população femininaligada às estruturas urbanas é muito mais afectada pelo celibato,viuvez e divórcio do que a população feminina dos meios rurais.
No entanto, nos Centros Urbanos como nas Zonas Rurais,para os vários grupos de idade a percentagem de solteiras começaa ser inferior à de casadas a partir do grupo de idade dos 25 aos29; depois dos 35 os efectivos de solteiras variam pouco; a per-centagem de casadas vai aumentando suavemente até aos 40-44e depois decrescendo também suavemente; a percentagem de viúvascomeça a ser superior à de casadas a partir dos 65-69 para osCentros Urbanos e dos 70-74 para as Zonas Rurais. As percentagensde divorciados são insignificantes nas Zonas Rurais, nos CentrosUrbanos apresentam-se superiores, embora muito ligeiramente, da-das as escassas possibilidades de divórcio em Portugal, onde aquase totalidade de casamentos é celebrada pela Igreja (voltar-se-áao problema do divórcio no capítulo relativo à dissolução do casa-mento). Os grupos de idade dos 45 aos 69 anos são os que acusammaiores percentagens para as divorciadas.
Passando agora a considerar a população masculina vemosque o celibato e particularmente a viuvez a afectam muito menosdo que à população feminina. Mas, tal como se verificava paraas mulheres, também para os homens os efeitos desses fenómenosse fazem sentir mais nos Centros Urbanos, embora agora empequena escala. Se analisarmos, no gráfico III, a população mas-culina paralelamente ao que fizemos para a a feminina por gruposde idade, vemos que, tanto nos Centros Urbanos como nas ZonasRurais, os solteiros se apresentam numa percentagem apenas li-geiramente inferior à dos casados no grupo dos 25 aos 29 anos,sendo no grupo seguinte que essa diferença se afirma (lembramosque a idade do casamento é mais tardia para os homens do quepara as mulheres); a partir dos 40-44 a percentagem de solteirosmantêm-se sem grandes alterações. Os casados vão aumentandodos 30 até aos 49 para depois decrescerem suavemente (nas ZonasRurais dos 50 aos 64 anos a percentagem de casados mantêm-sepraticamente inalterável). Quanto aos viúvos a sua percentagemsó é superior à dos casados depois dos 85 anos.
Para as percentagens de divorciados por idades não hádiferenças apreciáveis a registar relativamente ao que se dissepara a população feminina.
Perante os elevados contingentes de mulheres solteiras pare-ceu-nos de interesse analisar a proporção de solteiras para asmulheres dos 50 aos 54 anos que se considera como correspondendoao celibato feminino definitivo, e examiná-la (Quadro n.° 2) numaóptica regional não já exclusivamente fundada na dicotomia rural--urbano (em 1960 é de 21 % para os Centros Urbanos e de 14 %para as Zonas Rurais).
51
GRÁFICO III
REPARTIÇÃO OA POPULAÇÃOF E M I N I N A
SEGUNDO 0 ESTADO CIVIL, POR IDADES A PARTIR DOS 15
CENTROS URBANOS
20
15 20 25 $0 35 40 45 50 55 60 65 70
ZONAS RURAIS
80 85 90 95 100
15 20 25 30 35 40 45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 100
-CENSO 1 9 6 0 -
E222- SOLTEIRAS EZZII-WÚVAS
| ] - CASADAS HB-DIVORCIADAS
5O
GRÁFICO III (Cantinuação)
REPARTIÇÃO OA POPULACHOM A S C U L I N A
SEGUNDO 0 ESTADO CIVIL, POR IDADES A PARTIR DOS 15
CENTROS URBANOS
15 20 25 30 35 AO 45 50 55 €0 65 70 75 80 85 90 95 100
ZONAS RURAIS
15 20 25 30 35 AO 45 50 55 60 65 70 75 80 85 90 95 100
-CENSO 1960 -
V777X- SOLTEIROS
1-CASADOS
FTTTI-VIUVOS
^•-DIVORCIADOS
5$
Celibato feminino definitivo por regiões
QUADRO N.° 2
Regiões
ISTorte Litoral
Korte Interior
Centro Litoral
Centro Interior
Lisboa Litoral
Lisboa Interior
Sul Litoral
£ul Interior
Mulheresde 50 a 54 anos
(D
55 492
14 270
39 350
32 215
55 977
13 726
9 981
20 051
Mulheres solteirasde 50 a 54 anos
(2)
10 356
2 060
5 675
4193
11043
1308
1283
3 034
1960
(2)%
(D
18,7
14,4
14,4
13,0
19,7
9,5
12,9
15,1
FONTE: X Rec., 1960, Tomo III — vol. 1.°.
O celibato feminino apresenta-se mais elevado na RegiãoNorte e na Região de Lisboa ou, para ser mais exacto, nas sub--regiões do Litoral daquelas zonas, devendo destacar-se no LitoralNorte o distrito de Viana do Castelo com uma percentagem parti-cularmente alta de mulheres solteiras dos 50 aos 54 (25,2%,quando o valor para o Continente é de 16,2%). Dentro de cadaregião a parte litoral aparece com valores mais elevados do quea interior (excepção feita para a Região Sul). O desequilíbrioentre contingentes masculinos e femininos será a causa principaldestas variações que afectam especialmente as duas sub-regiõesque concentram maiores percentagens de população urbana. Oconfronto dos quadros n.os 3 e 4 faz ressaltar uma certa correspon-dência entre as variações da relação de feminilidade e as variaçõesdo celibato feminino. Neste aspecto constituem declarada excepçãoes distritos de Beja e Setúbal ao apresentar elevada percentagemde celibato feminino em contraste com valores mínimos para arelação da feminilidade. Deve contribuir para esclarecer este con-traste o facto de existir uma grande tendência para reuniões con-
Número de M por 100 H, por distritos
QUADRO N.o 3 1960
Distritos H M M/100H
Viana do Castelo
Coimbra
Lisboa
Porto
Aveiro
Viseu
Braga
Guarda
Castelo Branco
Santarém
Faro
Leiria
Portalegre
Vila Real
Évora
Bragança
Setúbal
Beja
Continente
Centro urbano do Porto
« « de Lisboa
123 706
201 647
650 700
562 940
248 493
229 463
284 656
135 251
223 256
152 959
154 175
198 638
92 705
160 420
108 781
116 327
188 238
138 961
3 971 316
133 650
361 694
154 042
232 009
732 259
630 428
276 099
252 953
312 112
147 355
< 238 451
163 577
160 666
205 862
95 777
164 938
111135
117 114
188 948
137 934
4 321 659
169 774
440 536
124,5
115,0
112,5
111,9
111,1
110,2
109,6
108,9
106,8
106,9
104,2
103,6
103,3
102,8
102,2
100,7
100,4
99,3
108,8
127,0
121,8
IflFONTE: X Recenseamento, 1960, Tomo III, vol. 1.°.
55
Celibato feminino definitivo por distritos
QUADRO N.° 4 1960
(2)Distritos
Mulheres de 50 a 54 anos(D
Viana do Castelo ...
Lisboa
Setúbal
Beja
Braga
Porto
Aveiro
Viseu
Évora
Vila Real
Coimbra
Bragança
Faro
Guarda
Portalegre
Leiria
Santarém
Castelo Branco
Mulheres solteiras de 50a 54 anoa
(2)
Continente
Centro urbano do Porto
Centro urbano de Lisboa
8 495
45 868
10109
7 839
14 424
32 573
14111
14 170
6 368
8 306
14 249
5 964
9 981
8 636
5 844
10 990
13 726
9 409
241 062
10 499
30 222
2144
9 095
1948
1431
2 586
5 626
2 403
2 345
983
1283
2 103
777
1283
995
620
1109
1308
853
38 952
2 482
6 645
25,2
19,8
19,3
18,3
17,9
17,3
17,0
16,5
15,4
15,4
15,2
13,0
12,9
11,5
10.6
10,1
9*5
9,1
16,2
23,6
22,0
FONTE: X Recenseamento, 1960, Tomo III, Vol. 1.°.
56
sensuais nestes distritos (no capítulo relativo à ilegitimidadeveremos que Beja e Setúbal são precisamente os distritos queapresentam maior percentagem de nascimentos ilegítimos), dondeo estado civil não traduzir uma situação real de celibato.
Nos últimos anos a nupcialidade apresenta tendência para aelevação (a taxa por 1000 habitantes passa de 6,04, em 1940, para7,76, em 1950, 7,82, em 1960, e 8,02 em 1966), no entanto, estasubida não encontra correspondência no fenómeno da natalidade(24,33 em 1940; 24,30 em 1950; 24, 13 em 1960 e 23,75 em 1966) 6.
3 Natalidade c restrição dos nascimentos
A taxa de fecundidade por idades conjugando a natalidadecom a estrutura da população feminina traduz melhor do que ataxa de natalidade, o comportamento dos cônjuges perante oproblema da procriação.
No conjunto a taxa de fecundidade decresceu de 1950 para1960; considerando a taxa de fecundidade por grupos de idade(número de nascimentos relativos a mulheres casadas dos 15 aos49 anos a dividir pelo número de mulheres casadas dos 15 aos49 anos, multiplicado por 1000), são os grupos dos 15 aos 19 e dos20 aos 24 que detêm maiores taxas 7.
Uma vez que a fecundidade é função de uma série de variáveisdemográficas interdependentes, reunimos, dentro das possibilidadesque as nossas estatísticas permitem, algumas dessas variáveisdenominadamente a idade da mãe, a idade no casamento e aduração do casamento, e conjugámo-las para ver em que medidaafectavam os nascimentos.
Tomámos ainda em conta a variável regional, distinguindoa população urbana e rural.
Em regra, considera-se que aquelas variáveis demográficasafectam a fecundidade das seguintes formas:
— Idade da mãe: A fecundidade aumenta a partir dos 15anos, atinge o máximo cerca dos 25 aos 30 e depois de-cresce até aos 50, tornando-se nula após esta idade.
— Idade no casamento: A descendência final das mulherescasadas varia na razão inversa da idade no casamento,
6 Anuário Demográfico 1906, dados retrospectivos e comparativos» pági-nas LXXIX e LXXXIII.
7 Diispensamo-nos de apresentar quadros com as taxas de fertilidade poridades das mães, visto que podem ser consultados num artigo de M. IsabelRoque de OLIVEIRA, Aspectos da evolução de fertiUdade da família portuguesa,na Informação Social, n.°6, 1967.
57
sobretudo para as mulheres de camadas sociais mais des-favorecidas, em que a restrição dos nascimentos é menosfrequente e menos eficaz.
— Duração do casamento: O decréscimo final está em corre-lação positiva com a duração do casamento.
Vamos ver como essas variáveis atingem a fecundidade nonosso país, através da representação (gráfico IV) das percenta-gens das mulheres não solteiras que não tiveram filhos, nos CentrosUrbanos e nas Zonas Rurais.
Fez-se a conjugação das idades das mulheres à data do Re-censeamento com as idades na altura do casamento.
Se começarmos por analisar a duração do casamento vemosque aos casamentos de menor duração corresponde obviamenteuma percentagem maior de mulheres sem filhos ou, por outraspalavras, uma menor fecundidade; para os casamentos com umalonga duração (pelo menos cerca de 10 anos) são mínimas as per-centagens de mulheres sem filhos correspondendo-lhes, pois, umafecundidade elevada; não podemos, contudo, fazer equivaler ummáximo de fecundidade a um máximo de duração — para uma idadede casamento de menos de 20 anos as mulheres com idades a partirdos 40 anos apresentam maiores percentagens dos contingentessem filhos do que, por exemplo, as de 35 a 39 anos de idadeícuja duração de casamento é, portanto, menor. Uma vez queaquela geração (hoje com idades dos 40 aos 49) se casou por alturada II Guerra Mundial, pode talvez interpretar-se o fenómeno comoum reflexo da quebra de natalidade que, mesmo no nosso país, severificou nesse período.
A variável idade da mãe parece-nos interferir na medida emque, para uma mesma duração do casamento, é entre as mulheresde 30 a 40 anos que se apresenta uma menor percentagem dasque não têm filhos (35 a 39 anos nas Zonas Rurais).
Quanto à idade no casamento (considerando uma mesma du-ração do casamento), varia naturalmente na razão inversa dafecundidade — quanto mais avançada é a idade da mulher ao casar,maior é a percentagem das que não têm filhos.
Os efectivos de mulheres sem filhos são, nos Centros Urbanos,sempre superiores aos das Zonas Rurais qualquer que seja a idadeno Recenseamento e no casamento8. Isto, juntamente com o pro-longamento da fecundidade máxima até ao grupo dos 35-39 anos
8 O número de filhos (para o total das mulheres não solteiras! com fi-lhos) é die 2,7 nos Centros Urbanos e d© 3,8 nas Zonas Rurais (o númeroniédlio para o Continente no mesmo Censo —1960 — é de 3,5, enquanto em1950 era de 3,9) —IX Recenseamento, l%0, Tomio I, Quadros 5 e 6; X Re-censeamento, 1960, Tomo III, Quadtto 3.
58
GRÁFICO IV
Mulheres não solteiras, sem filhos nos Centros Urbanos e nas Zonas Rurais,segundo a idade no Recenseamento e a idade no casamento
IDADE NO RECENSEAMENTO Menos de 20
JDADE NO RECENSEAMENTO 20 — 24
IDADE NO RECENSEAMENTO 25 — 29
4DADE NO RECENSEAMENTO 30 — 34
ÍDADE NO RECENSEAMENTO 35 — 39
ÍDADE NO RECENSEAMENTO 40 — 4 4
1DADE NO RECENSEAMENTO 45
IDADE NO CASAMENTO
A-Menos de 20B - 2 0 - 2 4 E -35 -39C-25-29 F-40-44ÍD -30 -34 G-45-49
49
1=
B 3Q
KlBO.
1
I
A
B
C
D
Pif
ABCD
E
HiKl
frzI j
Offerença d« percentagemdas Zonas Rurais para osCentro* Urbanos
59
nas Zonas Rurais, nos evidencia a influência do carácter urbano,no sentido da restrição da fecundidade.
No nosso país, a par da tendência para o recuo da mortalidadee a elevada emigração de adultos jovens, o decréscimo da fecundi-dade vem contribuir para o envelhecimento da população. Aliás,numa perspectiva regional, verifica-se já correspondência entreo índice de envelhecimento e os valores relativos à fecundidade.Estes são mais elevados na Região Norte onde a estrutura da po-pulação praticamente não registou envelhecimento nos últimosanos (excepção feita ao distrito de Viana do Castelo).
No polo oposto — Região Sul — aparece-nos um índice de en-velhecimento aumentado e as mais baixas taxas de fertilidade.
O Litoral da Região de Lisboa, embora com uma populaçãojovem apresenta valores muito baixos no que se refere à fecun-didade, traduzindo hábitos de vida Urbana favoráveis a uma res-trição de nascimentos. Por outro lado, as camadas mais jovensdevem em grande parte comportar imigrados atraídos por Lisboae Setúbal.
Em conclusão — Embora o nosso país, no conjunto, apresenteainda taxas de nupcialidade, natalidade e fecundidade bastanteelevadas para a Europa, regionalmente surgem áreas onde umcerto desenvolvimento e um mais marcado carácter urbano provo-caram já alterações na composição e no próprio comportamentopopulacional que, dentro do domínio tratado, afectaram negativa-mente a nupcialidade e a natalidade. A este mesmoi resultadose chega noutras áreas muito diversas onde, como vimos, a nata-lidade baixa e a população envelhece — neste caso, indícios deatonia da sociedade rural tradicional e não já adopção de ummodelo industrial moderno, como adiante voltaremos a constatar.
III —DIMENSÕES DA FAMÍLIA
1 Análise dos dados demográficos
Conforme deixámos explícito na Introdução, a família é con-dicionada pelo universo económico e social em que se insere.Todavia, deverá ter-se presente que, na relação família-sociedade,também a estrutura familiar pode considerar-se como actuantesobre a sociedade que a rodeia, constituindo, por exemplo, umobstáculo ao desenvolvimento na medida em que persista nasrelações familiares do tipo tradicional.
Nas sociedades modernas, a evolução das funções do grupofamiliar tem sido acompanhada de uma redução das suas dimen-sões; nas sociedades tradicionais, a família para além de ser uma
60
comunidade de vida, era uma comunidade de trabalho que reuniavárias gerações e necessitava de um elevado número de braços parapoder responder por si mesma às suas necessidades. Nestes termosde unidade económica auto-suficiente, a família aparece sobretudocomo fenómeno rural, remanescente ainda em áreas onde imperauma organização económica e social predominantemente agráriacom reduzidas possibilidades de comunicação com o exterior euma elevada estacionaridade. Na gama que vai da família extensapatriarcal à família nuclear de dimensões reduzidas, constituídapor duas gerações e residindo separadamente da família de pro-criação (pais e irmãos de cada cônjuge), nessa gama, com quegradações se apresenta a composição das famílias portuguesas?
O Censo de 1960 considera sete tipos de família:em relaçãoao n.° totalde famílias
1.° — casais sem filhos em relação ao n.° total def amilias —17,9 %
2.° — casais com filhos, sem outros parentes — 47,5 %3.° — casais com filhos e outros parentes —10,2 %4.°— pessoas com filhos sem outros parentes — 5,9%5.° — pessoas com filhos e outros parentes — 2,2 %6.° — outras pessoas — 4,8%7.° — pessoa isolada —11,5 %
No mesmo Censo se definiu a família como «o grupo depessoas ligadas por união ou parentesco, legítimo ou ilegítimo,que utilizassem habitualmente o mesmo alojamento, e a pessoaisolada que ocupasse um alojamento. Os empregados de serviçodoméstico das famílias e das pessoas isoladas que com elas resi-dissem foram consideradas como fazendo parte da família».
Desta definição resulta, para dois dos tipos considerados —casais com filhos e outros parentes; pessoas com filhos e outrosparentes — a impossibilidade de distinguir o número de filhos,o número de parentes propriamente ditos, o número de serviçaise o número de hóspedes (pessoas isoladas residindo com a família).
Para o estudo das dimensões da família, limitar-nos-emosa utilizar os três primeiros tipos citados, (casais sem filhos; ca-sais com filhos sem outros parentes; casais com filhos e outrosparentes), uma vez que os outros representam uma parte muitoreduzida das famílias.
Em relação ao total dos casais avoluma-se a percentagemdos casais com filhos sem outros parentes, seguindo-se os casaissem filhos e, só em último lugar, os casais com filhos e outrosparentes (Gráfico V). As percentagens destes últimos são maisaltas no Litoral da Região Norte e da Região de Lisboa, onde se
61
GRÁFICO V
REPARTIÇÃO DOS CASAIS SEGUNDO A EXISTÊNCIADE FILHOS E OUTROS PARENTES, POR REGIÕES,
EM RELAÇÃO AO TOTAL DOS CASAIS
REGIÃODO 4
NORTE NORTE INTERIOR
REGIÃO! C E N T R 0 LITORALDO <
CENTRO CENTRO , INTERIOR
REGIÃO f U S B 0 A • SETÚBALDE <
LISBOA SANTARÉM
f PORTALEGRE,REGIÃO ÉVORA c BEJA
DO «<
S U L | FARO
CONTINENTE0 10 20 30 AO 50 60 70 80 90 100
— Casais sem filhos
— Casais com filhos e outros par<znt<zs
— Casais com filhos sem outros parentes
€2
encontram os dois mais importantes focos de vida urbana dopaís — as cidades de Lisboa e Porto — em que a própria densidadede população a par da insuficiência das habitações e do seu ele-vado custo, compelem várias gerações a coabitar.
Aliás, em todas as sub-regiões do litoral, as percentagensdos casais com filhos e outros parentes são superiores às dassub-regiões do interior, o que mais uma vez vem confirmar anecessidade de distinguir litoral e interior, correspondendo o pri-meiro, em regra, a uma maior aproximação dos valores relativosàs zonas de maior concentração urbana.
No Quadro n.° 5 considerámos a categoria de casais comfilhos sem outros parentes, a única em que podemos, portanto,distinguir o número de filhos.
Uma grande frequência de filhos únicos, traduzindo um com-portamento de semi-esterilidade voluntária, predomina nitidamentenas Regiões de Lisboa e do Sul. Os casais com 2 filhos ocupamposições próximas daqueles (a tendência para os filhos únicos é,contudo, mais marcada no Litoral da Região de Lisboa).
Os casais com 3 ou 4 filhos representam o tipo de transiçãoentre a família restrita e a numerosa. A partir de 3-4 filhos aproporção de casais decresce acentuadamente, em particular nasregiões a sul do Tejo, como o mapa da pág. 65 ajuda a verificar*O gráfico VI onde figuramos a evolução dos casais sem filhospara um intervalo de 10 anos, é mais um indicador que nos vemacentuar uma tendência crescente para a esterilidade, a notar-seprincipalmente nas Regiões Sul, Centro e Lisboa Interior — aque-las em que a percentagem de casais sem filhos mais subiu de 1950para 1960.
Para o total dos tipos de família considerados no Censo, onúmero médio de pessoas por família baixou de 1950 para 1960(Quadro n.° 6) e distribui-se regionalmente de forma concordantecom a que se descreveu para os casais com filhos sem outrosparentes (Regiões Norte e Centro acima da média para o Conti-nente, Região de Lisboa e Região Sul com valores inferiores).
A tendência para a restrição da natalidade que se manifes-tava sobretudo entre os casais da Região de Lisboa em 1950,alarga-se em 1960 e vai afectar profundamente a Região Sul quepassa a ocupar posições a par das daquela, como vimos atrás.O Centro, na sua sub-região do Litoral, embora em muito menorgrau, começa a aderir também ao padrão da família restrita. Asfamílias numerosas só na Região Norte se conservam ainda relati-vamente preservadas. Em suma, a composição das famílias nonosso país apresenta uma tendência geral para a forma restrita;a Região Norte ocupa um lugar especial na medida em que apre-senta a mais elevada dimensão média da família e os maioresvalores, em relação às outras Regiões, para as famílias numerosas(a partir do tipo de 3 e 4 filhos),
63
Repartição percentual dos casais com filhos sem outros parentes,nas várias regiões, segundo o n.° de filhos
QUADRO N.° 5 1950 e 1960
^ • \ ^ Percentagens
^ ^ ^ ^Regiões ^ ^ ^ ^e Anos ^ ^
Continente19501960
Norte Litoral . ...19501960
Norte Interior . ...19501960
Centro Litoral . ...19501960
Centro Interior ...19501960
R. de Lx. Litoral19501960
R. de Lx. Interior19501960
Sul Litoral19501960
Sul Interior19501960
Cidade de Lisboa19501960
Cidade? do Porto19501960
Percentagens de casais com filhos semnas
1 filho
27,934,5
23,624,5
20,723,0
26,032,2
22,329,1
42,748,2
29,241,3
30,043,6
25,639,2
50,952,6
39,134,6
várias regiões, Í
2 filhos
24,527,3
22,123,9
21,024,5
24,928,3
23,227,3
26,828,3
26,9304
28,930,9
25,129,3
27,626,6
29,829,2
3
segundo o n.°
e 4 filhos
27,725,7
28,830,5
31,333,4
28,926,9
31,229,6
20,518,0
27,221,2
28,120,6
29,423,6
16,615,9
22,726,2
5
outros parentesde filhos
8 6 filhos
13,29,1
15,714,4
17,714,3
13,49,1
15,810,7
6,94,2
11,45,6
9,74,0
13,86,3
3,83,5
6,37,3
7 e + fi-lhos
6,73,4:
9,86,7
9,34,8
6,83,5
7,53,3
3,11,3
5,31,8
3,30,9
6,11,6
1,11,4
2,12,7
Total
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
100,0100,0
FONTE: X Recenseamento Geral da População, Tomos I e II.
GRÁFICO Va
•U DÊ CASAIS COM 1 ; ' 3 ê 4 ; 7 e * FILHOSEH RELAÇÃO AO TOTAL Dt CASAIS
COM FILHOS SEM OUTROS PARENTES
CASAIS COM 1 FILHO
CASAIS COM 3 * 4 FILHOS
CASAIS COM 7^4- FILHOS
GRÁFICO VI
CASAIS SEM FILHOS EM RELAÇÃO AO TOTAL DE CASAIS
l11 I 1
I
oo
LU <
cz oO H-
LU —
cc w
sss g
LUO
CC
o si S 5co ir
cc< 2CO LUCO H-
ccocc
- l LU
to ^
cc- j O=> • -00 *_j
•: - . ANO DE 1950 — ANQ DE 1960
Dimensão média das famílias por regiões
QUADRO N.° 6
Regiõea
Norte Litoral s ...
Norte Interior ...
Centro Litoral . ...
Centro Interior ...
R. Lx. Litoral . ...
R. Lx. Interior ...
Sul Litoral
Sul Interior
Continente
Cidade do Porto ...
Cidade de Lisboa .
Total das famílias(a)
1950
417 993
126 618
324 799
279 574
385 964
122 241
88 627
176 520
1 922 336
64 017
190 806
1960
492 708
137 192
360 693
291 575
518 992
135 223
93 914
192 453
2 222 750
81298
245 537
Total de pessoas(b)
1950
1 846 852
542 601
1 301 296
1113 356
1 486 087
452 193
325 230
702 357
7 769 972
265 859
741 326
1960
2 044 988
554 048
1 350 652
1 072 032
1 715 868
458 236
313 371
677 075
8 186 270
294 630
771 783
Dimensão médiadas famílias
(b) / (a)
1950
4,4
4,3
4,0
4,0
3,9
3J
4,0
4,0
4,2
3,9
1960
4,2
4,0
3,7
3,7
3,3
3,4
3,3
3,5
3,7
3,6
3,1
FONTE: X Recenseamento, Tomo II.
6?
2 Alguns elementos de explicação
Embora não esquecendo os limites impostos pelos instrumentosde trabalho que utilizamos, parece-nos necessário aludir a algunsfactores que podem contribuir para explicar as diferenças obser-vadas. Tais factores têm a ver com aspectos da estrutura agráriae da estratificação social. Em Portugal, onde as actividades ligadasac sector primário são ainda as que ocupam o maior contingenteda população activa, ganham naturalmente volume certos aspectosda: estrutura agrária que condicionam a evolução da sociedaderural dentro da qual vive a maior parte das famílias portuguesas.
Estas encontram-se em situações muito diversas conformeos seus membros participam ou não na posse da terra, conformeé grande ou pequena a dimensão dessa terra no caso de seremproprietários, conforme são «trabalhadores por conta própria»ou assalariados no caso de trabalharem em terra alheia.
É nos distritos contidos na Região Norte que a participaçãona posse da terra é mais elevada e mais elevada também a percen-tagem de trabalhadores familiares na população activa agrícola9.
A sul do Tejo, pelo contrário, é reduzidíssimo o número depatrões e muito mais alto o número de assalariados por patrão.Uma tão larga camada de assalariados poderá implicar um elevadograu de desequilíbrio familiar, na medida em que essa camada éa mais afectada pela instabilidade no trabalho e pelo baixo níveldos salários.
No Norte, pela própria importância que a mão-de-obra fami-liar representa, perdura a tendência para as famílias numerosas,necessárias para manter a terra que as mantém.
Os «casais»—tipo de exploração familiar característico dazona noroeste de Portugal — são pequeninas parcelas dissemina-das, onde a família, como um todo fortemente individualizado, seentrega a uma cultura intensiva e cria o seu gado em resguardo.
Nesta área, a elevada densidade de povoamento, a grandedivisão da propriedade e a disseminação da população têm pro-fundas raízes históricas que remontam à época da Reconquista 10.
No Norte Interior, a exploração da terra permanece até tarde«agrupada no auxílio mútuo dos vizinhos da aldeia e até tardese conserva a fruição comum de grandes tratos de monte, reservade pasto mato e lenha».
Hábitos arcaicos de vida comunitária mantêm-se ao longo dosanos, prolongando-se até aos nossos dias. A fraqueza da estruturaurbana e a escassez de meios de comunicação (o Norte Interior,
9 Ver A. SteDAS NUNES, Portugal, sociedade dualista em evolução, AnáliseSocial 7-8, 1964, Quadro n.° 13, pág. 449.
10 Portugal, o Mediterrâneo e o AtlânUco, Orlando KIBEIRO.
o Norte Litoral, especialmente no distrito de Viana do Castelo,e o Centro Interior são as Regiões mais deficitárias relativamentea meios de informação e comunicação) lx puderam preservar pa-drões tradicionais de que é exemplo a família numerosa, reflexode um comportamento não restritivo da natalidade.
As Regiões Norte (em especial o Norte Interior) e o CentroInterior representam, em Portugal, a persistência de um regimedemográfico primitivo caracterizado por uma natalidade elevadae uma mortalidade também alta (as taxas de mortalidade infantilmais elevadas localizam-se nos distritos incluídos naquelas Re-giões) .
IV — INDICADORES DE DESORGANIZAÇÃO FAMILIAR
1 Introdução
A família passa por várias etapas que constituem o seu ciclovital — formação, crescimento e dissolução.
De acordo com o objectivo deste trabalho, que consiste emfornecer informações que permitam esboçar um panorama socio-gráfico da família portuguesa, temos analisado algumas caracte-rísticas e acontecimentos demográficos ligados à formação e cres-cimento da família. Passamos a considerar a sua dissolução pormorte, divórcio ou separação — três tipos de desorganização fa-miliar que, embora apresentem diferenças fundamentais, acarretamcertas consequências comuns. Essas consequências consistem, se-gundo a enumeração de Goode12, em: perda de satisfação sexual;perda do afecto, do amor, da segurança; perda de um modeloadulto para as crianças; aumento da carga de trabalho domésticopara o cônjuge que permanece (particularmente no que respeitaao cuidado dos filhos); aumento de problemas económicos (emespecial nos casos de morte ou abandono do lar); redistribuiçãodas tarefas e responsabilidades familiares.
A partir dos dados das estatísticas, vamos examinar a ex-tensão, no nosso país, daqueles três tipos de desorganização fa-miliar.
11 Consultar indicadores de ambiente em Níveis de Desenvolvimento Agrí-cola no Continente Português, CASTRO CALDAS e SANTOS LOUREIRO, pági-nas 236-242.
12 William GOODE, The Family, Prentice HaiH, U. S. A., 19616
69
2 Dissolução por morte
No período de 1959 a 1966, Portugal ostenta, para o totaldos casamentos dissolvidos, uma proporção de 96,5% de casa-mentos dissolvidos por morte e apenas 2,4 % por divórcio e l l %por separação (Gráfico VII).
Uma vez que a mortalidade feminina é mais baixa do que amasculina, além de que a idade de casamento das mulheres étambém mais baixa, o número de viúvas é maior. Para os anosde 1957 a 1966 a percentagem de casamentos dissolvidos por morte•do marido atingia 66%; contudo, se analisarmos (Quadro n.° 7)as dissoluções por morte segundo as idades do cônjuge falecido,distinguindo o sexo, encontramos no grupo de menos de 20 anose no dos 20 aos 29 uma maior frequência por morte da mulherdo que do marido, facto que se relacionará provavelmente com asmortes provocadas por dificuldades de uma primeira gravidez oupartos prematuros. Ainda no mesmo Quadro (colunas 4, 5 e 6),em relação aos totais de dissolução por morte, respectivamente domarido e da mulher, vemos pesarem proporcionalmente mais paraos homens os grupos de idade a partir dos 50 anos.
Casamentos dissolvidos por morte de um dos cônjuges, segundo a idadedo cônjuge falecido
QUADRO N
Idades docônjugefalecido
— 20
20 a 29
30 a 39
40 a 49
50 a 59
60 a 69
70 e +
Total.. .
.° 7
Valores Absolutos(Continente e Ilhas)
Total(1)
173
6 889
18 439
30 846
57 956
84 936
128 115
327 354
do Marido(2)
21
3 339
11096
19 926
38 460
56 813
87 221
216 876
da Mulher(3)
152
3 550
7 343
10 920
19 496
28123
40 894
110 478
1957/1966
Percentagens
Total(4)
2,1
5,6
9,4
17,7
25,9
39,2
100,0
do Marido(5)
1,5
5,1
9,2
17,7
26,2
40,2
10030
da Mulher(6)
3,2
6,6
9,9
17,7
25,5
37,0
100,0
FONTES: Anuários Demográficos.
10
GRÁFICO VII
CASAMENTOS DISSOLVIDOS POR MORTE E DIVÓRCIOOU INTERROMPIDOS POR SEPARAÇÃO
EM RELAÇÃO AO TOTAL DOS CASAMENTOS DISSOLVIDOS E INTERROMPIDOS
DURAÇÃO DOCASAMENTO
liiii:<1 ano II * . *. •
1 - 4
5 - 9
IO-14
15-19
20 e +G ign.
1
• ••••«• ••••«• ••••<• ••••«^ H • • •^ H • • •
• « • • • • • 4
• • • • • • • 4
• • • • • • • 4
• • • • O • • 4
• • • • • • • •
• • • • • • • •
• • • • • • • • • • • • •
• • • • • • • • • • • • • •
• • • • • • • • • • • • •
• - • • • • • • • • • • • •
• • • • • • • • • • • • •
« • • • • • • • • • • • O
^ • • O * * « * 4 t 4 k 4 » « * #
• • • • • • • • • • • • •
H • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • •
• • • « «
« • « • •
• • • • • • • •
» • • • • • * • * • * <
• • 41 • • • • * • 4
• • • • • • • • • • • • • • • • • • • • •
O 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
INTERROMPIDOS POR SEPARAÇÃO
DISSOLVIDOS POR DIVORCIO
DISSOLVIDOS POR MORTE
11
È particularmente importante a proporção dos casamentosdissolvidos por morte da mulher ou do marido que deixam filhos —79,5% para o período 1959 a 1966. As viúvas ou os viúvos queficam com filhos representam, pois, o quádruplo dos sem filhos,o que é natural, uma vez que o contingente dos casamentos semfilhos inclui grande número de casais jovens que ainda não tive-ram uma duração de casamento suficiente para gerar descendência,e que, dada a sua própria juventude, são menos atingidos pelamorte.
Nos Quadros n.os 8 e 9 conjugamos a idade do cônjugesobrevivo 1 3 ea duração do casamento com a existência e o númerode filhos. Encontramos, obviamente, uma maior frequência deviúvas com filhos e um maior número destes conforme vai sendomais avançada a idade do cônjuge sobrevivo (viúvas) e maisicnga a duração do casamento. O número de viúvas com filhosé superior ao de viúvas sem filhos logo a partir dos 20 anos deidade e de uma duração de casamento a partir de quatro anos.
Predominam os contingentes de viúvas com 3 e 4 filhos eessa posição começa a verificar-se a partir dos 40 anos de idadee de uma duração de casamento excedendo os 10 anos. Para alémdaquele número de filhos, a frequência de viúvas é menor, o queestá de acordo com o reduzido número de casais que têm mais de4 filhos. Os casamentos que se dissolvem deixando um número defilhos demasiado elevado para a sua duração, implicam, é claro,a existência de filhos de uniões anteriores, legítimos ou ilegítimos,ou a existência de gémeos.
3 Dissolução por divórcio e interrupção por separação
A dissolução do casamento por vontade de um ou de ambosos cônjuges pode efectivar-se por divórcio ou separação judicialde pessoas e bens ou, ainda, por uma separação de naturezainformal.
Dada a ameaça que a dissolução do casamento representapara a estabilidade da família e as dificuldades que levanta rela-tivamente à socialização da criança, as sociedades desenvolveramvárias formas de sanção tendentes a evitá-la — no domínio dodivórcio legal, os obstáculos jurídicos são maiores ou menores
13 Escolhemos analisar a frequência de viúvas, dado que constituem umcontingente muito mais vasto do que os viúvos.
Viúvas, por grupos de idade, segundo a existência e o número de filhos(em milhareis)
QUADRO N.° 8
Idades
até 20 anos
20 aos 29
30 aos 39
40 aos 49
50 aos 59
60 aos 69
70 e +
Total
N.° de viúvas
0,06
1,6
4,3
7,9
15,4
20,5
20,3
14,1
Viúvas s/filhos
0,03
0,4
0,8
1,7
3,5
4,2
3,5
14,0
Viúvas com filhos
Total
0,03
1,2
3,5
6,3
11,9
16,3
16,8
56,0
l
0,03
0,6
1,0
1,2
2,1
2,2
2,1
9,2
2
0,4
1,0
1,0
2,6
3,1
2,8
111,5
3 e 4
—
0,2
1,0
1,8
3,5
4,9
5,0
16,4
5 e 6
—
0,03
0,4
1
2,0
3,3
3,6
10,3
78 +
—
—
0,2
0,8
1,7
2,8
3,1
1964/1966
Total defilhos
0,03
2,2
10,1
22,4
44,9
67,8
71,1
218,5
FONTES: Anuários Demográficos (1964, 65, 66).
Viúvas, por duração do casamento, segundo a existênc,a e o número de filhos(em milhares)
QUADRO N.0 9 1&64/W66
Duração do casamento
menos de 1 ano
1 a 4
5 a 9
10 a 14
15 a 19
20 e +
Total
0,7
2,1
3,1
3,7
4,6
55,9
70,1
0,5
1,0
1,2
1,2
1,2
1,0
14,1
Total
0,2
1,1
1,9
2,5
3,3
47,0
56,0
l
0,08
0,6
0,6
0,9
0,8
6,4
9,1
Viúvas com filhos
2
0,04
0,3
0,6
0,7
0,9
9,0
11,5
3 e 4
0,04
0,1
0,6
0,8
1,(0
14,0
16.5
5 e 6
0,03
0,04
0,1
0,3
0,5
9,3
10,2
7 e +
0,01
0,03
0,íH
0,1
0,3
8,2
8,7
Total defilhos
0,6
2,1
4,8
7,1
10,2
100,7
218,5
FONTE: Anuários Demográficos (1964, 65, 66).
conforme os países, chegando mesmo a interditá-lo completamente<;omo na Irlanda, Itália e Espanha.
Em Portugal, pela Concordata estabelecida em 1949 entreo Governo Português e a Santa Sé, os casamentos celebradoscatolicamente foram declarados indissolúveis. Uma vez que oscasamentos celebrados civilmente são em número muito reduzidoentre cós14, o índice de divórcio será forçosamente muito baixo.
Todavia, uma reduzida taxa de divórcio não significa, por sisó, um reduzido grau de dissolução conjugal e de desorganizaçãofamiliar, podendo outras formas de ruptura não legalizada tomaro lugar daquele.
Como não possuímos qualquer informação estatística sobre adissolução de natureza informal, limitamo-nos a fazer uma análiseda frequência do divórcio o da separação judicial de pessoas ebens15, segundo as idades dos cônjuges; a duração do casamento;a existência de filhos; as causas que levaram à ruptura e a suadistribuição pelas regiões que temos vindo a considerar.
Nos Quadros n.os 10 e 11, para os períodos que considerámos,vemos a frequência do divórcio e da separação apresentar os seusvalores máximos para as idades entre os 30 e os 39 anos para asmulheres; para os homens acontece o mesmo no caso da separaçãomas no do divórcio isso só se verifica a partir de 1963, sendoanteriormente dominante o grupo dos 40 aos 49. Na distribuiçãopelos vários grupos de idade, a concentração de percentagens maiselevadas regista-se em grupos de idade mais jovem para as mulhe-res do que para os homens, o que se relaciona com uma idade decasamento menor para a mulher do que para o homem. Dos 60aos 59 anos, se a percentagem de divórcios ainda é considerávelrelativamente aos outros grupos de idade, a de separações torna-seinsignificante.
Se analisarmos agora os divórcios e as separações segundoa duração do casamento, (Quadros n.os 12 e 13) encontramosalgumas diferenças na sua repartição.
14 De 1959 a 19<66 é dte 89,2 % a percentagem meda dos casamentos cele-brados catolicamente.
15 Relativamente à separação judicial de pessoas e bens publicam-se"dadas pela primeira vez no Anuário Demográfico de 1966 que inclui a infor-mação já apurada para os anos de 1959 a 1965.
75
Repartição percentual dos casamentos dissolvidos por divórciosegundo a idade à data do divórcio
QUADRO N.«
Total ...
menos de 20
20 aos 29
30 aos 39
40 aos 49
50 aos 59
60 aos 69
70 e +
10
H
100,0
—
12,9
26,8
32,6
19,7
6,3
1,7
1957-59(a)
M
100,0
1,3
20,3
29,2
28,3
15,0
5,1
0,8
H
100,0
0,1
11,9
27,4
30,0
21,2
7,8
1,6
1960-62(a)
M
100,0
0,8
19,5
28,5
27,2
17,9
5,2
0,9
H
100,0
—
13,3
30,0
23,8
22,0
9,3
1,6
1963-66(a)
M
100,0
1,6
21,3
28,9
23,3
17,3
6,4
1,2
H
—
17,7
29,6
21,6
20,2
8,9
1,9
1966
w
M
100,0
1 3
25,2
29,1
21,9
14,3
6,8
1,4
TOTAL(1957 a 1966)
H
100,0
—
28,2
28,4
20,8
7,7
1,7
M
100,0
1,3
20,7
28,8
26,0
16,4
5,7
1,1
FONTES: Anuários Demográficos (1957 a 1966).
(a) médias do período.
(b) por erro no Anuário Demográfico de 1966, as percentagens não somam 100,0 %.
Repartição percentual dos casamentos interrompidos por separaç&o judiciaisegundo a idade à data da separação
(Continente e Ilhas)
QUADRO N.° 11
Idades
menos de 20 anos
20-29
30-39
40-49
50-59
60-69
70 e mais
Total
H
0,2
12,3
45,3
28,7
7,9
3,9
1,0
1010*
1959-61
M
0,4
23,9
45,3
19,1
7,5
2,4
0,7
100*
H
—
11,0
44,6
30,7
9,2
3,4
1,1
100
1963-65
M
0,3
21,3
44,9
23,5
6,9
2,5
0,6
100
H
—
12,5
40,7
32,1
11,8
2,4
0,5
100
1966
M
0,7
22,8
41,4
24,7
7,3
2,9
0,2
100
H
0,1
11,7
44,2
30,2
9,2
3,4
1,0
100*
Total
M
0,4
22,5
44,4
22,0
7,2
2,5
0,6
100*
FONTES: Anuários Demográficos (1959, 50, 61, 63, 64, 65•De facto estas somas nâo apresentam um total 100 por
66).defeito dos números que figuram nos Anuários.
Repartição percentual dos casamentos dissolvidos por divórcio segundaa duração do casamento
QUADRO N.° 12
Duração do casamento 1957-59(«)
100
10,1
19,1
16,6
15,9
38,3
1960-62(a)
100
0,1
9,2
20,0
18,0
11,6
41,1
1963-65(a)
1966TOTAL
(1957-1966V
Total
menos de 1 ano
1 a 4
5 a 9
10 a 14
15 a 19
20 e +
100
11,4
20,4
17,4
13,4
37,4
100
11,9
24,5
16 ,1 j
12 .7 j
34.8 !
100
10,4
17,2
13,6
38,5
FONTES: Anuários Demográficos (1957 a 1966).
(a) Média do período
Até aos 4 anos de duração do casamento a repartição per-centual dos divórcios apresenta-se mais elevada do que a dasseparações; a partir de 5 anos de duração até 19, nota-se predo-mínio de divórcios para os casamentos com 5 a 9 anos; os casa-mentos de 20 e mais anos apresentam as maiores percentagensde dissolução por divórcio, o que não acontece para as separações,donde podermos talvez concluir que o divórcio, quando possível,é a solução preferida (nos casamentos com 20 e mais anos deduração estão incluídos os que foram celebrados ainda anterior-mente à Concordata e, portanto, susceptíveis de ser dissolvidospor divórcio 16.
36 Compare-se com as percentagens para o grupo de idade dos 50 aos 59nos quadras n.°s 10 e 11.
78
Repartição percentual dos casamentos interrompidos por separação judicialsegundo a duração do casamento
(Continente e Ilhas)QUADRO N.° 13
Duração do casamento
Total
menos de 1 ano
1-4 ano?
5-9
10-14
15-19
20 e mais anos
1959-61(a)
100,0
0,2
9,7
23,5
33,0
20,7
12,9
1963-65(a)
100,0
0,1
8,5
21,6
27,5
22,7
19,6
1966
100,0
0,2
7,3
22,9
22,1
21,5
26,0
Total
100,0
0,1
8,7
22,5
28,6
21,8
18,3
FONTES: Anuários Demográficos,(a) Médias do período.
Nos Gráficos VIII, IX e X figura a frequência dos divórciose das separações segundo a existência e o número de filhos, cor-rigidos os resultados de acordo com a proporção dos casais segundoo número de filhos. Verificamos que a existência de filhos seapresenta nitidamente como factor impeditivo de ruptura, a qualdiminui na razão inversa do número de filhos. Se distinguirmosos resultados dos divórcios e das separações, nota-se que é sobre-tudo naqueles que se faz sentir a pressão exercida pela existênciade filhos. Para os casais com filhos, a separação, interrupção docasamento, — mau grado a desorganização familiar que implica,parecerá menos ameaçadora do que o divórcio, dissolução defini-tiva? No entanto, a separação judicial, talvez ainda mais do queo divórcio, é um índice importante de desorganização familiarpelas dificuldades que pode criar a uma nova estabilização, umavez que impede outra união legal.
O estudo das causas do divórcio e da separação elucida-nosmais sobre o sistema legal do país onde o processo decorre doque nos permite conhecer os motivos que conduziram a uma tensãoinsustentável.
Provavelmente, os cônjuges desavindos escolhem as causasque, dentro do possível, permitem um processo mais fácil e rápidoou mais discreto.
79
GRÁFICO VIII
R E P A R T I Ç Ã O D O S DIVÓRCIOS E SEPARAÇÕESSEGUNDO A EXISTÊNCIA E O N- DE FILHOS
N i DE FILHOS POR CASAL
O —
1 —
2 —
3 c 4 —
5 e 6 —
7 c + —
- 49
-72
100,0
83
100,0
GRÁFICO IX
R E P A R T I Ç Ã O D O S DIVÓRCIOS
SEGUNDO A EXISTÊNCIA E O N- DE FILHOS
* DE FILHOS POR CASAL
O —
3 e 4 —
5 e 6 —
7 e
-54
-78
-BB
100,0
81
GRÁFICO X
REPARTIÇÃO DAS SEPARAÇÕES
SEGUNDO A EXISTÊNCIA E O N- DE FILHOS
DE FILHOS POR CASAL
0 —
1 —
2 —- 39
3 e 4 —
5 c 6
- 63
-81
7 e * —
'98
100,0-
- 1
100,0
82
Entre nós, figura em primeiro lugar a ruptura (divórcio ouseparação) com duas ou mais causas, seguindo-se as sevícias ouinjúrias graves 17.
As dissoluções ou interrupções do casamento por adultérioda mulher ocupam o terceiro lugar. Superior ao adultério do ma-rido, esta causa de ruptura aparece com mais elevada frequênciano divórcio do que na separação, enquanto o adultério do maridoapresenta o mesmo número nas duas formas. O abandono do domi-cílio conjugal aparece também como causa frequente.
Não há uma diferença sensível entre as causas de rupturapara os casamentos com filhos e sem filhos.
Ao observar os quadros n.os 14 e 15, que descrevem a distri-buição regional do divórcio e da separação, ressalta a elevadíssimapercentagem da Região de Lisboa ou, antes, da sub-região doLitoral de Lisboa, por efeito desta cidade que apresenta sempreos valores máximos para qualquer dos períodos considerados,absorvendo mais de metade da totalidade dos divórcios.
Quanto à cidade do Porto, se afecta de forma reduzidíssimaa percentagem de divórcios no Litoral Norte, o mesmo não acon-tece já para a percentagem de separações que se apresenta consi-derável. Aliás na cidade do Porto por 1000 casamentos há 31 sepa-rações (número médio para o período de 1964 a 1966) e na deLisboa 24, enquanto, por outro lado, há 16 divórcios por 1000 ca-samentos na cidade do Porto e 49 na de Lisboa supomos que estadiferença está relacionada com a mais elevada percentagem decasamentos católicos na cidade do Porto onde, portanto, o recursoà separação vem substituir a dissolução pelo divórcio.
Voltando a observar os quadros n.os 14 e 15, vemos ser oLitoral que, dentro de cada região, concentra um maior númerotanto de divórcios como de separações. Uma vez que, entre nós,são as regiões litorais as que concentram um maior número deCentros Urbanos com certa importância, aquela distribuição estáem conformidade com o predomínio de divórcios que, em regraos meios urbanos acusam sobre os rurais.
4 Ilegitimidade dos nascimentos
Não queremos terminar esta última parte sobre os aspectosde desorganização da família, sem aludir ao problema da ilegiti-midade.
17 As designações «duas ou mais causias» e «injúrias graves» são asmais vagas e por isso também as que mais facilmente englobam uma maior-variedade de casos.
Por loutro lado, a «separação livremente consentida» e o mútuo consenti-mento» apresentam números baixos que tanto podem traduzir atitudes bosti-lizantes da parte dos cônjuges como podem relevar de maiores obstáculos1 ju-rídicos postos a estas fórmulas.
85
Número médio e repartição percentual dos divórcios por regiões
QUADRO N.° 14
Regiões e sub-regiões
Região Norte . ...
Litoral
Interior
Região Centro . ...
Litoral
Interior
Região de Lisboa .
Litoral
Interior
Região Sul
Litoral
Interior
Cidade de Lisboa .
Cidade do Porto ...
Continente
Divórcios (n.° médio)
1954-56
136
122
14
118
87
31
639
612
27
58
30
28
500
92
951
1959-61
71
64
7
61
49
12
548
527
21
48
30
18
465
49
728
1964-66
56
53
3
44
37
7
539
526
13
34
21
13
413
43
673
Percentagem de divórcios emrelação ao Continente
1954-56
14,3
12,8
1,5
12,4
9,1
3,3
67,2
64,4
2,8
6,1
3,2
2,9
52,5
9,7
100
1959-61
9,8
8,8
1,0
8,4
6,8
1,6
75,2
72,3
2,9
6,6
4,1
2,5
63,7
6,7
100
1964-66
8,3
7,9
0,4
6,6
5,6
1,0
80,1
78,2
1,9
5,0
3,1
1,9
61,1
6,4
100
FONTES: Anuários Demográficos.
Número médio e repartição percentual de separações por regiões
QUADRO N.° 15
Regiões e sub regiõesN.° médio de separações
1969-61 1959-61
% em rei. ao Continente
1964-66 1964-66
Norte
Litoral
Interior
Centro
Litoral
Interior
Lisboa
Litoral
Interior
Sul
Litoral
Interior
Cidades
Cidade de Lisboa ... ..
Cidade do Porto
Continente
90
84
6
90
68
22
188
174
14
24
17
7
158
57
392
123
114
10
99
74
25
276
254
22
38
28
10
205
83
536
23,0
21,5
1,5
23,0
17,4
5,6
48,0
44,5
3,5
6,0
4,3
U
40,3
14,5
100
23,0
21,1
18,5
13,8
4,7
51,4
47,3
4,1
7,1
5,2
1,9
38,3
15,5
100
FONTES: Anuários Demográficos.
A ilegitimidade representa a contravenção das regras atra-vés das quais a sociedade, ao reprimir a união sexual extra-ma-trimonial, preserva a sua própria continuidade na medida em queprocura assegurar a existência de uma unidade familiar obrigato-riamente responsável pela sobrevivência biológica e cultural dasgerações.
O próprio reconhecimento da ilegitimidade contribui para quea socialização ou aprendizagem social dos ilegítimos apresentemais probabilidades de ser um processo precário e inadequado,muito embora se possa procurar, à face da lei, equiparar os seusdireitos aos dos filhos legítimos.
Todavia, a sanção social da ilegitimidade varia de grau con-forme as sociedades, conforme os próprios tipos de ilegitimidade(por exemplo, a união consensual é menos reprovada do que a uniãoadúltera e esta, por sua vez, menos reprovada do que a incestuosa)e conforme as classes que nela incorrem. Nas classes economica-mente desfavorecidas e nos meios rurais (onde se carece de meiospara exercer o controle e onde não existe uma posição social aherdar), as uniões não legitimadas não representam, necessaria-mente, casos de desorganização da família, antes parecendo com-portar-se de forma semelhante às legítimas no que respeita à coe-são e continuidade do núcleo familiar.
No nosso país, a proporção de ilegítimos pode parecer redu-zida se a compararmos, por exemplo, com a de certos países daAmérica do Sul onde se eleva, muitas vezes, a mais de 50 %. Noentanto, dentro da Europa, Portugal apresenta uma das mais ele-vadas percentagens de ilegitimidade, figurando em terceiro lugarde acordo com os dados do Anuário Demográfico das NaçõesUnidas —1959.
Na verdade, a elaboração dos índices de ilegitimidade sofrelimitações de vária ordem — de país para país podem variar tantoas definições jurídicas de ilegitimidade como o grau de desapro-vação social que esta suscita; a ocultação dos nascimentos ilegíti-mos é assim condicionada pelas atitudes de sociedade em que amãe vive.
A par dos meios de pressão social capazes de reprimir a ilegi-timidade compelindo a mãe solteira a casar-se, a par do temor quea interiorização religiosa da norma infunde perante uma infracçãode que resulta um comportamento identificado como pecaminoso,nos últimos anos a difusão do emprego de anticoncepcionais ga-nhou enorme importância como meio de evitar nascimentos extra--matrimoniais. A descida da ilegitimidade que, nos últimos anos,se vem a verificar praticamente em todos os países (inclusive Por*tugal) será talvez, em grande parte, uma consequência do desenvol-vimento e propagação de métodos anticoncepcionais mais eficazes.
Em Portugal surgem variações regionais surpreendentes quevale a pena apontar (Quadros n.os 16 e 17). Para o período de
S6
Repartição percentual dos nascimentos ilegítimos por distritos(para as médias do período de 1964 a 1966)
QUADRO N.° 16
Distritos
Porto
Braga
Viana do Castelo
Vila Real
Bragança ...
Aveiro
Coimbra
Leiria
Castelo Branco
Guarda
Viseu
Lisboa
Setúbal
Santarém
Beja
Évora
Portalegre
Faro
Cid. de Lisboa ...
Cid. do Porto
Continente
N".° médio de nados-vivos
37 560
20 874
6 452
8 714
5 256
14 873
8 205
8 809
5 250
5 248
11495
29 057
7 775
8 489
4 186
3 395
2 793
4 784
14 787
8162
193 221
ÍST.° médio de ilegítimos
2 095
634
335
672
472
600
378
547
147
132
579
4 431
1634
685
1013
546
272
778
2 203
993
16 023
«
5,6
3,0
5,2
7,7
8,9
4,0
4,6
6,2
2,8
2,5
5,0
15,0
21,0
8,0
24,2
16,1
9,7
16,3
14,9
12,1
8,3
FONTE: Anuários Demográficos (1964 a 1966).
87
1964 a 1966 encontramos uma percentagem média de ilegitimidademínima de 2,5 e máxima de 24,2 %, respectivamente para os distri-tos da Guarda e de Beja.
Repartição percentual dos nascimentos ilegítimos por regiões(para as médias do período de 1964 a 1966)
QUADRO N.° 17
Regiões e Sub-Regiõea de ilegítimos
Região Norte
Norte Litoral
Norte Interior
Região Centro
Centro Litoral
Centro Interior
Região de Lisboa
Região Lisboa Litoral
Região Lisboa Interior
Região Sul
Sul Litoral
Sul Interior
FONTES: Anuários Demográficos.
5,3
4,7
8,2
4,4
4,8
3,9
14,9
16,5
8,0
17,2
16,3
17,6
A Região Sul e o Litoral de Lisboa são as que apresentampercentagens mais elevadas de ilegitimidade, sendo Beja e Setúbalos distritos mais atingidos.
É interessante um confronto entre ilegitimidade e a legitima-ção dos casamentos ao nível regional (Quadros n.° 18 e 19).
88
Repartição percentual dos casamentos com legitimaçãode filhos por regiões
QUADRO N.o 18
Regiões e Sub-regiões
Litoral
Interior
Região Norte
Litoral
Interior
Região Centro . ...
Litoral
Interior
Região de Lisboa ...
Litoral
Interior
Região Sul
Cidade de Lisboa
Cidade do Porto
Continente
N.° de casamentosz/ legitimação de filhos
(D
511
266
777
514
310
824
1430
378
1808
870
1796
2 666
329
31
6 075
N.° de casamentoscelebrados
(2)
52 020
11269
63 289
34 949
24192
59 051
53 370
11407
64 777
8 190
16 370
24 560
25 538
8 011
211 767
1964/1966
%(l)/(2)
1,0
2,4
1,2
1,5
1,2
1,4
2,7
3,3
2,8
10,6
11,0
10,8
1,3
0,4
2,9
FONTES: Anuários Demográficos.
89
Percentagens de casamentos com legitimação de filhos segundo a idadeda mulher à data do casamento
(Continente e Ilhas)
QUADRO N.° 19
Idades
— 20 anos
20-29
30-39
40-49
50-59
60-69
70 e +
Total
N.° de casamentosc/ legitimação de
filhos(D
406
2 674
1774
767
360
124
32
6137
N.° de casamentoscelebrados
(2)
45 072
145 198
22 599
7 381
3 862
1514
366
255 992
«?»0,9
1,8
7,8
10,4
9,3
8,2
8,7
2,4
FONTES: Anuários Demográficos de 1964, 1965 e 1966.
Os casos de casamentos com legitimação de filhos são emnúmero muito mais elevado precisamente na Região Sul. Aliás,os distritos que apresentam maior percentagem de ilegitimidadesão, em regra, os mesmos que apresentam maior percentagem decasamentos com legitimação de filhos. Esta relação directa entreilegitimidade e legitimação pelo casamento não se verifica, con-tudo, para as cidades de Lisboa e Porto, onde a uma elevada per-centagem de ilegítimos (respectivamente 14,9 % e 12,1 %) corres-ponde uma baixa percentagem de legitimações (respectivamente1,0% e 0,3%),
Um controle social menos eficaz, o anonimato e o isolamentopossíveis na vida urbana, contribuem provavelmente para queuma situação não regularizada possa perdurar nas nossas duascidades mais densamente povoadas.
Por outro lado, no caso da Região Sul, a elevada ilegitimidadeé equilibrada por uma percentagem de casamentos com) legiti-mação de filhos superior à das restantes Regiões. Isto poderásignificar que, aqui, a ilegitimidade não corresponde precisamentea uma família provisória e precária dado que a presença dos filhosvai conduzir, em muitos casos, a uma legalização que, pelo menos,
90
traduzirá um interesse no sentido de garantir uma maior segurança(qualquer que seja a natureza desta) para os filhos.
Seria interessante saber quais as camadas sociais em que severifica o maior número de casamentos com legitimação (as jádetentoras de um património que estão interessadas em transmitiraos filhos?); mas, uma vez mais, não dispomos dos dados quepermitiriam considerar o fenómeno segundo uma variável de po-sição sócio-económica e não já somente segundo uma perspectivaregional.
Os casamentos com legitimação de filhos representam, entrenós, 2,4% do total dos casamentos (percentagem média para operíodo de 1964 a 1966), elevando-se essa percentagem nos casa-mentos à data dos quais a mulher tem 40 ou mais anos como pode-mos ver pelo Quadro n.° 20.
Uma vez que os nascimentos ilegítimos se concentram nosgrupos de 25 a 29 e 30 a 34 anos, é provável que grande númerodos filhos legitimados pelo casamento tenham já atingido apuberdade.
CONCLUSÃO
Com base no que foi apurado ao longo desta contribuiçãopara uma análise sociográfica da família portuguesa, é possíveldiferenciar as características encontradas em grupos de certomodo homogéneos, tendo em consideração as duas categoriasurbana e rural que se utilizaram e sobrepondo-lhes a variávellocalização geográfica.
Assim, definir-se-iam dois tipos extremos de família — umcom residência urbana, outro com residência rural — cada umdestes tipos, por outro lado, apresentando variações consideráveisconsoante as respectivas localizações geográficas. A partir dasRegiões de Planeamento adoptadas, é possível distinguir quatroestruturas familiares:
a) Uma estrutura familiar «urbana» dominante na Regiãode Lisboa (em particular na sub-região do litoral — Lis-boa e Setúbal);
b) Uma estrutura familiar «tradicional-rural» dominantenas sub-regiões interiores do Norte e Centro;
c) Uma estrutura familiar que, aproximando-se embora dea), está ainda consideravelmente ligada a b) e é caracte-rística das sub-regiões litorais do Norte, Centro e Sul;
d) Uma estrutura familiar muito específica do Sul Interior.
91
Estas formas, embora excessivamente esquemáticas e insufi-cientes, parecem-nos úteis na medida em que permitem ultrapassaro globalismo neutralizante de uma visão demográfica da famíliade acordo com as médias do Continente, e abordar apreciáveisdiferenças da sua estrutura e comportamento.
Vamos recordar os traços gerais que as estatísticas demográ-ficas relativas à família nos forneceram para o total do Continente,para depois apor a esta imagem global as mais destacadas carac-terísticas das formas de família atrás enumeradas.
De 1950 para 1960, a família tem vindo a restringir as suasdimensões e a manifestar acentuada preferência pelos filhosúnicos.
Aumenta a proporção de casais sem filhos ou com um ou doisfilhos, enquanto as probabilidades de constituir uma família commais de três filhos se tornam cada vez mais fracas.
O facto de, ultimamente, ter subido um pouco a nupcialidadepor um lado, e, por outro, ter baixado a mortalidade infantil, nãoevitou uma quebra nos nascimentos.
A fertilidade dos casais diminuiu e as mulheres tendem acessar as suas funções de reprodução numa idade mais jovem (aquebra da fertilidade de 1950 para 1960 torna-se particularmenteacentuada a partir dos 29 anos) 18.
Aparentemente esta imagem global tende a aproximar-sedo padrão da família das sociedades industriais e urbanas.
Contudo, sabemos que Portugal apresenta ainda caracterís-ticas demográficas próprias de uma sociedade tradicional.
Entre os países da Europa, é o nosso que idetém uma dasmais elevadas taxas de natalidade e mortalidade infantil e umadas mais elevadas dimensões médias da família.
É ainda o nosso país que apresenta um maior desfasamentoentre a fecundidade dos meios rurais e a dos meáos urbanos, oque poderá estar em correlação com o desfasamento entre os ritmosde desenvolvimento dos referidos meios. Também o grupo de idadede casamento dominante para o homem é mais elevado em Portu-gal, no que, aliás, está acompanhado pela Grécia, Espanha, Itáliae Irlanda (grupo dominante: 25-29 anos de idade de casamentopara o noivo. Nos restantes países da Europa: 20-24 anos). Rela-tivamente a este aspecto talvez possamos conjecturar que estamosperante uma atitude comum aos cinco países, atitude em cujaorigem estará a sobrevivência de um regime patriarcal em que ofilho prefere casar-se quando capaz de instalar casa própria, assu-mindo ele próprio, por sua vez, a posição de chefe de família.
18 Reportamo-nos ao já citado artigo Aspectos da evolução da fertilidadeda família portuguesa, em Informação Social n.° 6> 1967.
Temos uma taxa de divórcio mínima comparada com a dosoutros países. A ilegitimidade, pelo contrário, é das mais elevadasna Europa.
A mudança demográfica que se vem operando no nosso paísincide particularmente, como já vimos, sobre as estruturas fami-liares características do litoral da Região de Lisboa e do interiorda Região Sul.
Para uma Região como a de Lisboa cujo nível de urbanizaçãoé de longe o mais elevado no país 19, adivinhamos, através dosíndices que reunimos, um ambiente familiar onde começam a avo-lumar-se problemas não muito diferentes dos que têm vindo apreocupar as famílias nas sociedades desenvolvidas.
É precisamente na Região de Lisboa que predominam os casaisvivendo com filhos e outros parentes. A necessidade de coabitaçãode várias gerações, devida à escassez de alojamento, não deixaráde dar origem a problemas de certo modo similares aos que sepõem aos casais vivendo no meio urbano em qualquer modernasociedade ocidental onde a «ideologia da família conjugal» 20 ga-nhou raízes, impulsionando a modificação do modelo familiartradicional, a partir de uma valorização do individual com conse-quências tais como a exaltação do casamento por amor e a ten-dência para o «igualitarismo» dos sexos — ideologia dificilmenteconciliável com a de uma geração anterior muito ligada ainda aos\ralores da família patriarcal.
A predominância do filho único é outro aspecto peculiar dafamília urbana que, aliás, tende já a dissipar-se nos países ondeuma desenvolvida política familiar moderou o comportamentojnaltusiano, enfraquecendo o ideal do filho único.
A grande frequência de mulheres que se regista nos meiosjuais intensamente urbanizados é também fenómeno característicodas sociedades ditas modernas (em França, por exemplo, o númerode mulheres por 100 homens é de 108,3 para o total; para ascidades maiores é nitidamente superior, atingindo 126,3 em Bor-déus, 124,2 em Nice, 121,7 em Paris, etc.) 21, donde resulta umadesequilibrada repartição por sexo com elevado celibato femininoe prováveis incidências na alta ilegitimidade dos nascimentos.
Índices de divórcio e separação muito elevados na Região deLisboa, relativamente aos do resto do país, e a grande frequênciade filhos ilegítimos são sintomas de desorganização dos quadros
19 Ver Indicadores de penetração do meio urbano e industrial emPortugal, sociedade dualista em evolução, A. SEDAS NUNES, Análise Socialn.° 7-8, 1964, pág. 423.
20 W. GOODE, World Revolution and Family Patterns, The Free Press,New York, 1965.
21 Números recolhidos em Recherches sur Ia condition féminine dans Iasociété d'aujourd'hui, F, GUEL4UD-LERTDON, Travaux et DocumentSj Cahiern.° 48, 1967.
93
tradicionais e de dificuldades no estabelecimento e aceitação denovos quadros.
Na estrutura familiar tradicional do Norte e Centro interiores,pouco transparece desta mudança demográfica sintomática deuma transição.
Pelo contrário, permanece um número impressionante de famí-lias de grande dimensão com elevadíssimas taxas de natalidadee de mortalidade infantil, desconhecendo praticamente o divórcioe a separação e apresentando um reduzido número de nascimentosilegítimos.
Em grande parte dos casos, estamos perante famílias muitapouco afectadas pela influência da urbanização, dedicando-se ex-clusivamente a actividades primárias, produzindo para consumopróprio e através dos tradicionais processos de produção, fechadasem aldeias ou povoados onde uma vasta rede de parentesco envolvea quase totalidade dos habitantes.
Parece-nos lícito supor que estas famílias mantém um sistemade valores ligado ao sangue, à terra e à tradição, sistema dificil-mente penetrável pela multiplicidade e ambiguidade de atitudesde vida urbana.
Ê no litoral, nos meios mais abertos à comunicação, onde osurto do desenvolvimento industrial alterou a posição do grupofamiliar na sociedade, que dificilmente subsistirá a família de tipopatriarcal, alteradas que foram as capacidades requeridas, os horá-rios exigidos, os estatutos conferidos. Filhos e mulheres podemtrazer para casa um salário superior ao salário agrícola, traduzívelem novos bens de consumo capazes de criar necessidades diferentesque vão contribuir para modificar um estilo de vida e perturbarum fixa hierarquia dos membros da família.
Quanto aos dados demográficos relativos à família na RegiãoSul, se bem que pareçam, nas suas linhas gerais, sugerir uma ten-dência de evolução demográfica paralela à da Região de Lisboa,emanam, todavia, como já vimos, de estruturas muito diversas.
Não deixa de ser surpreendente que uma tal mudança demo-gráfica incida sobre uma estrutura familiar ligada a uma organi-zação social rural acentuadamente estática. O aumento do númerode casais sem filhos ou com um só filho, fenómeno pouco comumnos meios rurais tradicionais, aparece como tentativa desesperadade sobrevivência, num meio hostil onde o aumento de filhosnem sequer aparece como uma possibilidade de melhoria futuraatravés de um aumento de braços.
Aqui, a existência de um vasto proletariado rural, logo a exis-tência de inúmeras famílias desprovidas de terra e vivendo desalários agrícolas insuficientes e instáveis, poderá contribuir paraexplicar esta evolução demográfica tão particular.
Não se presuma, no entanto, que pretendemos estabelecerentre fenómenos económicos e demográficos uma relação de causa
H
e efeito. É nossa ideia, apenas, apontar certas concomitâncias entreuma evolução social e uma evolução da família e sublinhar varia-ções que ocultam uma complicada problemática impossível dedetectar num trabalho desta natureza.
Na verdade, as variações regionais que registámos, elas pró-prias representam médias, e útil seria considerar outras variáveisque permitissem um conhecimento mais satisfatório das estruturasfamiliares na nossa sociedade, conhecimento esse que julgamosinviável sem um trabalho interdisciplinar capaz de nos esclareceracerca da influência de diversos factores da mais variada ordem(económicos, sociais, culturais), sobre a instituição da família.
95