Martha Abreu - Ensino de História

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    ABREU, Martha e SOIHET, Raquel. (Orgs) Ensino de Histria: conceitos, temticas e

    metodologia. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2003. - 10) Metodologia e Ensino de

    Histria: vises e prticas pedaggicas

    GONTIJO, Rebeca.Identidade Nacional e Ensino de Histria: a diversidade como

    patrimnio sociocultural (p. 55-73)

    - Identidade nacional: construo histrica oriunda de um processo de atribuio

    de sentidos a uma comunidade imaginada. No caso brasileiro, este processo sempre

    esteve ligado ao tema da diversidade, atravs de noes como miscigenao racial,

    hibridismo cultural, pas plural, etc., compreendido geralmente em termos de raa,

    cultura e etnicidade.

    - Sc. XIX: esforo em lidar com as diferenas, submetidas a um eixo

    centralizador, o Estado. Neste momento a diversidade surge como um problema a ser

    enfrentado, no excluindo as hierarquizaes.

    - A partir de 1870: constatou-se a inautenticidade da cultura brasileira, pois s se

    imitavam os costumes estrangeiros. Segundo Silvio Romero, todo brasileiro um

    mestio, quando no no sangue, nas ideias. Diversidade era compreendida

    principalmente em termos raciais. A partir de teorias cientficas europeias justificava-se

    o atraso do pas. Diferenas socioculturais eram naturalizadas atravs dos

    determinismos geogrfico (meio) e biolgico (raa). Discursos fatalistas e pessimistas

    proliferaram (miscigenao = degenerao), e indagava-se sobre os meios de viabilizar

    o progresso do pas. Falava-se em desigualdade das raas, o mal da miscigenao e da

    superioridade branca. A soluo seria eliminar as diferenas raciais atravs do

    embranquecimento da populao.

    - A proposio que prevaleceu propunha o convcio harmonioso das diferenascomo particularidade nacional.

    - O novo regime republicano, associado a ideais modernos, promoveu uma

    redescoberta do Brasil. Ocorre uma mudana epistemolgica que pensa o povo como

    sujeito da histria (ex: Capistrano de Abreu e Joo Ribeiro), possibilitando uma

    alternativa ao nacionalismo naturalista em prol de um nacionalismo politico-social.

    Apesar disso ainda vigorava a ideia de que existiam fatores maiores e anteriores ao

    indivduo, que tornavam o povo passivo.

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    - Incio do sc. XX: Crena no carter nacional disposio natural de um povo,

    expressa pela cultura e regida por fatores psicolgicos e raciais (natureza humana

    predeterminada; naturalizao dos fenmenos sociais). Aps a 1 Guerra: crtica ao

    modelo europeu de civilizao atravs de discursos xenfobos (antilusitanos

    principalmente). Diversidade passou a ser vista como uma peculiaridade brasileira.

    - Com os movimentos modernistas na dc. de 1920, consolidou-se um discurso

    positivo da nacionalidade e da mestiagem. O Brasil seria um caldeiro de culturas,

    sem segregao. Esta dcada tambm foi marcada por vises pessimistas, apoiadas em

    princpios da eugenia, pressupondo que o progresso estaria restrito s sociedades

    puras, livres de miscigenao. Aceitao da tese do branqueamento.

    - Dc. 1930: Gilberto Freyre, com Casa-grande e Senzala (1933) e a poltica do

    Estado Novo, confirmaram, cada uma a seu modo, o mito da democracia racial.

    Freyre definiu o Brasil como o pas da plasticidade, pois capaz de absorver influncias

    culturais diversas. criticado por ter criado uma imagem do pas que oculta conflitos e

    discriminaes. O Estado Novo, em busca de legitimidade, props o redescobrimento

    do Brasil, buscando unidade atravs do reconhecimento do povo brasileiro. Diversidade

    = mestiagem + regies geoculturais. Esta perspectiva foi criticada a partir da dc.1950.

    - Ps-1950: A nova explicao para o atraso nacional passa a se basear na

    anlise econmica, enquanto o povo permanece como questo no resolvida.

    O Brasil dos Parmetros Curriculares Nacionais: a diversidade como patrimnio

    sociocultural

    - PCNs 1996: Pluralidade ou diversidade aparecem como tema transversal, como

    patrimnio sociocultural do Brasil, correspondendo a caractersticas tnicas e culturais

    dos diversos grupos que convivem no territrio nacional. A justificativa que o Brasil

    desconhece a si mesmo, precisando romper com os esteretipos. Assim, a escola seria

    o espao privilegiado para o estudo da pluralidade, pois comporta em si pessoas de

    diferentes origens, costumes e vises de mundo.

    - Apoiados nas propostas da ONU de cultura da paz, tolerncia,

    solidariedade e respeito mtuo, os PCNs propem o reconhecimento dos grupos

    sociais que compem uma coletividade, a partir do entendimento de que o direito a

    diferena pode ser universal. Criticam o mito da democracia racial, que seria base deum racismo difuso e discriminatrio, posicionando-se contra a diluio da cultura dos

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    grupos minoritrios. Contudo, parece que reproduzem a criticada noo das 3 raas

    (brancos, negros e ndios), disfarada na forma de povos indgenas (povo),

    sociedades europeias (sociedade) e continente africano (sem identidade).

    - O modelo dos PCNs, no que tange pluralidade cultural, coincide com os

    movimentos de ao afirmativa norte-americanos (affirmative action), e atualmente se

    aproximam da globalizao, com o relaxamento do sentimento nacional e o

    comprometimento individual com causas humanitrias, ecolgicas, das minorias, etc.

    Esse afrouxamento das relaes nacionais e afirmao da heterogeneidade

    fundamentado pela doutrina do multiculturalismo (reconhecimento das diferenas,

    atravs da equivalncia em direitos entre os diversos grupos). Igualdade pela afirmao

    das diferenas identitrias. Multiculturalismo implica reconhecimento ou ausncia

    deste, j que uma relao dialgica.

    - Os PCNs possuem abordagem interdisciplinar, que engloba: fundamentos

    ticos, jurdicos, histricos e geogrficos, sociolgicos, antropolgicos, populacionais,

    psicolgicos e pedaggicos. Com relao ao ensino de Histria, espera-se que a

    disciplina estimule a formao pelo dilogo, pela troca, pela construo de relaes

    entre o presente e o passado e pelo estudo das representaes. Alm disso, explicitao

    dos mecanismos de resistncia dos grupos dominados; diversidade cultural marcada

    pela desigualdade social. (diversidade cultural desigualdade social).

    - PCNs so criticados pela questo do multiculturalismo ser colocada de forma

    superficial e ingnua. Encobre desigualdades mais amplas, no d conta dos conflitos e

    no se apontam meios de ultrapassar a desigualdade; identidade nacional brasileira no

    aparece como produto de embates sociais; risco de se isolar uma parte da humanidade

    de seu contexto mais amplo (Hobsbawm)

    - importante que se lute contra a naturalizao dos fenmenos sociais, que so

    historicamente construdos, e no podem perder esse teor. Recuperar o interesse pelosistema de relaes que ligam as pessoas, centralizando a anlise no processo social.

    MATTOS, Hebe Maria. O ensino de histria e a luta contra a discriminao racial

    no Brasil (p.127-135)

    - Segundo a autora, o tema transversal da pluralidade cultural e a nfase dadanos PCNs formao do cidado podem ser ferramentas para a luta contra a

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    discriminao racial no Brasil. O texto dos PCNs enfatiza o papel homogeneizador da

    formulao de um Brasil mestio ainda presente nas escolas, que em mitos casos

    silencia uma realidade de discriminao racial reproduzida h muito no ambiente

    escolar.

    - Em vez de reforar culturas e identidades de origem, resistentes mudana, a

    autora prope uma educao para a compreenso e o respeito dinmica histrica das

    identidades socioculturais. Assim, a Histria se apresenta como disciplina chave.

    Identidades Negras, racismo e a memria da escravido no Brasil

    - A identidade sociocultural dos negros no Ocidente se fundou geralmente a

    partir da memria da escravido e coo resposta experincia do racismo e sua difuso.

    A construo das identidades nacionais nas Amricas implicou um processo de

    racializao de suas populaes, engendrando a segregao vigente durante dcadas nos

    Eua, ou transformando as reflexes sobre a mestiagem e/ou projetos de branqueamento

    racial e cultural em obsesses do pensamento social latino-americano.

    - O Brasil, aps se tornar nao independente no sc. XIX, forjou sua

    comunidade imaginada a partir de uma populao tnica, lingustica e culturalmente

    heterognea. Para Paul Gilroy, a discusso efetiva sobre uma identidade negra teria

    surgido principalmente por volta da dc. 1960, 70, com o movimento Black Power nos

    Eua, e seu impacto em sociedades altamente misturadas e hierarquizadas da Am. Latina.

    Histria temtica, pluralidade cultural e livro didtico

    - A opo nos PCNs pela Histria Temtica, atravs de eixos, deve se pautar em

    questes norteadoras, no sentido de histria-problema. Para isso necessrio umaconexo prxima e permanente entre ensino de histria e pesquisa e discusso

    historiogrfica nas universidades.

    - Histria da frica: por ser campo novo nas universidades, no espao escolar

    um conhecimento que ainda engatinha, e que impe um grande esforo pedaggico para

    se romper com o europocentrismo que ainda estrutura os programas de ensino nas

    escolas.

    - Prioridades para a formao de professores de histria: 1) abordagem dahistria da frica no mesmo nvel de profundidade que se estuda a histria europeia; 2)

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    historicizar o processo de racializao do negro nas Amricas; 3) incorporar na

    formao de professores a historiografia mais recente sobre a histria da escravido no

    Brasil; 4) trazer formao as novas pesquisas que abordam experincias concretas de

    criao e transformao culturais e identitrias na dispora africana.

    MAGALHES, Marcelo de Souza. Histria e cidadania: por que ensinar histria

    hoje? (p. 168-180)

    - No Brasil a histria tornou-se disciplina escolar obrigatria na primeira metade

    do sc. XIX, momento de afirmao do Estado Nacional, com a criao do Colgio

    Pedro II (1837). Histria da civilizao norteada pela histria da Europa.

    - 1838: Criao do IHGB, que buscava identificar as origens do Brasil,

    delimitando uma identidade nacional homognea; e insero do pas numa tradio de

    progresso.

    - 1895: Histria do Brasil aparece como disciplina distinta. Caracterizada pela

    cronologia poltica, biografia de brasileiros ilustres, acontecimentos relevantes para a

    afirmao da nacionalidade.

    - Europa, perodo entre-guerras, descolonizao: relativizao da histria.

    - Academia: Annales (1929), crtica histria centrada nos acontecimentos e

    personagens.

    - Dc. 1920 e 30, Brasil: Escola Nova, histria deveria se ocupar com as

    sociedades contemporneas; crtica a enorme importncia dada histria poltica e

    memorizao excessiva.

    - Ps- 2 Guerra, Brasil: expanso da escola secundria. Abertura da histria

    para a interdisciplinaridade.- Ditadura Militar: Histria desaparece como disciplina autnoma. Surgem os

    Estudos Sociais; uso da histria como instrumento de formao de um esprito cvico.

    - Ps-ditadura: emergncia de novas propostas curriculares.

    - Disputas em torno do que ensinar - Dc. 1980: Brasil passa por um momento

    de reforma curricular em alguns estados. Destaques: MG e SP. A de SP gerou

    polmicas com a mdia jornalstica, que considerava a proposta com teor ideolgico

    marxista-leninista; a mdia chamava de escola da revoluo, pois politizava ocurrculo escolar.

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    - Propostas curriculares de Histria na dc. 1990: preocupao em formar

    cidados crticos, construo de identidade, para alm da questo nacional, no intuito de

    se enfrentar a relao entre o nacional e global.

    - Significado de cidadania nos PCNs: o ensino de histria favorece a formao

    do estudante como cidado, no sentido de ter uma atitude crtica diante da realidade.

    Hoje: questo da incluso de novos direitos. Temas e problemas listados pelos PCNs no

    que tange cidadania: desemprego, segregao tnica e religiosa; reconhecimento da

    especificidade cultural indgena; novos movimentos sociais; desrespeito pela vida e

    sade; preservao do patrimnio histrico-cultural; preservao do meio ambiente;

    falta de tica nos meios de comunicao de massa; crescimento da violncia e da

    criminalidade. Para os PCNs a questo da cidadania est ligada questo da

    democracia. Pressupem que a educao, para efetivar o direito cidadania, deve estar

    comprometida com: a dignidade da pessoa humana; a igualdade de direitos; a

    participao; a co-responsabilidade pela vida social.

    - 2 perspectivas sobre o conceito de cidadania presentes nos PCNs: 1) via da

    ampliao dos direitos (civis, polticos, sociais, humanos); 2) via do direito a diferena

    (multiculturalismo).

    - Postura ambgua dos PCNs: (...)a escola deve ser local da aprendizagem de

    que as regras do espao pblico democrtico garantem a igualdade, do ponto de vista

    da cidadania, e ao mesmo tempo a diversidade, como direito. (p. 180)