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MARÇO / 2011 34 REVISTA PROTEÇÃO CÂNCER E TRABALHO MARÇO / 2011 34 REVISTA PROTEÇÃO BETO SOARES/ESTÚDIO BOOM

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CÂNCER E TRABALHOCÂNCER E TRABALHO

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REVISTA PROTEÇÃO 35MARÇO / 2011MARÇO / 2011 REVISTA PROTEÇÃO 35

Reportagem de Cristiane Oliveira ReimbergReportagem de Cristiane Oliveira Reimberg

PREVENIRSEMPREO trabalho pode ser determinante para a ocorrência de câncer.Proteger a saúde humana até que se tenham informaçõesseguras de que não há risco é o mais indicado.

Ao folhear as páginas amareladas de um velho cader-no, *José Antonio Domingues, 72 anos, e *Eliezer Joãode Souza, 69 anos, vão se lembrando dos amigos queperderam. Ao ver a ficha de José Alves de Souza, Eliezerconta que esse amigo morreu de mesotelioma, câncerdiretamente relacionado ao amianto e que atinge apleura, espécie de camada de revestimento do pulmão,ou ainda o pericárdio ou peritônio. Lembram-se de ou-tras vítimas. Quatro eram diretores da Abrea (Associa-ção Brasileira dos Expostos ao Amianto). Desses, trêsmorreram por câncer. Valmir Felonta teve câncer delaringe. Aldo Vicentino e José Roncadin tiveram me-

sotelioma. Outros nomes são recordados. Sebastião Apa-recido da Silva, ex-trabalhador da Brasilit, de São Caeta-no do Sul, teve câncer em um dos pulmões e asbestose nooutro. Também morreu. Outros três amigos que se forameram de São José dos Campos, ex-trabalhadores daAvibras, dos quais dois tiveram mesotelioma.

O relatório traz nome, endereço e resultados de exa-mes médicos de trabalhadores do amianto e, junto comos dados, as memórias. Eles procuram os registros de JoséDomingues, o sobrevivente. Para se livrar do tumor, tirouum pulmão em 2002.

*foto na página seguinte*foto na página seguinte*foto na página seguinte*foto na página seguinte*foto na página seguinte

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CÂNCER E TRABALHO

Berenice: prevenção

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Ubirani: registros

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José Domingues (D) e Eliezer Souza (E): resgatam dados dos trabalhadores expostos, alguns já falecidos

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A cirurgia de José Domingues foi reali-zada às pressas no Instituto do Coraçãodo Hospital das Clínicas de São Paulo, as-sim que o câncer de pulmão foi diagnosti-cado. “Fiquei sem um pulmão, mas fiqueicom a vida”, celebra o homem de 72 anos,que confessa ainda ter medo de algo apa-recer no pulmão que restou. Com o mes-mo medo, convive Eliezer, que não tevecâncer, mas já fez cirurgia por causa deplacas pleurais. “Hoje estamos bem, masde um dia para o outro pode aparecer al-guma coisa. A nossa luta agora é pela pre-venção. Não queremos que as pessoas secontaminem. O amianto tem que ser bani-do para não continuar matando. Muitosamigos morreram contaminados. Pior ésaber que muitos ainda vão morrer e queoutros se foram sem saber que o amiantoé cancerígeno”, lamenta Eliezer, que pre-side a Abrea.

A história de Domingues com o amian-to começou em 6 de agosto de 1976. Nessadata, foi admitido pela Eternit em Osasco/SP. Na empresa, ficou 15 anos, saindo a-penas em 1991. “Quando entrei não haviacomentários sobre os riscos, só soubemosquando a fábrica já estava para deixarOsasco”, conta José. O seu primeiro rela-tório médico, arquivado na Abrea, data de1997. Na época ele tinha 59 anos e foi de-tectada uma limitação crônica ao fluxoaéreo. A Associação funcionava como elode ligação entre os trabalhadores expos-tos, o Hospital das Clínicas e a Fundacen-tro. Foi esse acompanhamento médicoque permitiu a descoberta do câncer em2002. “O médico me disse, após a opera-ção, que se eu não tivesse feito a cirurgia,não duraria 15 dias. Quando fui internado,

fiquei apavorado, pois eununca tinha sido internadona vida”, relembra. Passa-do o período de adaptação,esse baiano de nascimento,que vivia em Osasco, aca-bou mudando-se para o in-terior de São Paulo, ondepoderia respirar um ar maispuro.

COMPLEXIDADECOMPLEXIDADECOMPLEXIDADECOMPLEXIDADECOMPLEXIDADEAssim como José e Elie-

zer desconheciam o risco da exposição,muitas pessoas não sabem que váriassubstâncias carcinogênicas para os sereshumanos estão presentes nos mais dife-rentes ambientes de trabalho. “A Agên-cia Internacional de Pesquisa em Câncer(IARC 2010) aponta pelo menos 64 agen-tes ocupacionais e ambientais, grupos deagentes, e misturas, como reconhecida-mente cancerígenos para seres humanos– Grupo 1, dentre os 107 listados”, afirmaa epidemiologista e gerente da Área deVigilância do Câncer Relacionado ao Tra-balho e ao Ambiente do Instituto Nacio-nal do Câncer (INCA), Ubirani Otero.

A relação entre câncer e trabalho temum cenário complexo. O adoecimento,quando acontece, aparece muito tempodepois da primeira exposição e nem sem-pre se faz o nexo ocupacional. Além disso,a ocorrência do câncer depende de fatoresgenéticos, ambientais – que inclui ques-tões como o ar, a água, o local de trabalho- e do estilo de vida. Uma estimativa daOIT de 2000 apontou que de 2.256.335mortes relacionadas ao trabalho, 634.984foram causadas por neoplasias malignas.

Já a Organização Mundial da Saúde(OMS), em 2007, destacou que cerca de200 mil pessoas morrem de câncer rela-cionado ao trabalho a cada ano. A preo-cupação com a questão é tanta que nestemês, em Astúrias, na Espanha, será reali-zada a “Conferência Internacional da OMSsobre Determinantes Ambientais e Ocu-pacionais de Câncer - Intervenções paraPrevenção Primária”. O objetivo é revisarpolíticas e incentivar ações para reduzira exposição ambiental e ocupacional a a-gentes cancerígenos.

“A prevenção primária, ou seja, evitar aexposição é a abordagem mais importan-te. Exames para diagnóstico são essenci-ais, para fins de tratamento - particular-mente a detecção precoce - e de compen-sação. Porém, não podem mudar o fatode que o trabalhador já tem câncer. Ostomadores de decisão em vários níveis de-vem estar cientes de que o custo do cân-cer em sofrimento humano é incomensu-rável, e em termos econômicos, imenso.É muito melhor e mais humano gastar emprevenção do que em tratamento”, avaliaa higienista ocupacional, Berenice Goelzer.

ESTUDOSESTUDOSESTUDOSESTUDOSESTUDOSA discussão em torno do câncer relaci-

onado ao trabalho, apesar de atual, temlonga data. Um clássico estudo de PercivalPott já descrevia no século XVIII a pre-sença de câncer de escroto em limpado-res de chaminés. Evidências clínicas eepidemiológicas que relacionam o amian-to com o câncer remontam ao início doséculo XX. Já em relação ao benzeno, nadécada de 30, foram identificados os pri-meiros casos de câncer. Mais recentemen-te, em 1998, especialistas reunidos peloPrograma Internacional de Segurança dasSubstâncias Químicas (IPCS) concluíramque a exposição ao asbesto crisotila acar-reta riscos aumentados para o câncer dopulmão e mesotelioma, não havendo limi-

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CÂNCER E TRABALHO

Nesse cenário complexo, amianto e ben-zeno não são os únicos agentes canceríge-nos presentes nos ambientes de trabalho.Sílica, metais pesados como o níquel e ocromo, radiação ionizante e alguns agro-tóxicos também trazem riscos. A AgênciaInternacional para Pesquisa em Câncer(IARC), órgão da OMS, conduz estudossobre as causas do câncer e os mecanis-mos da carcinogênese. Para tanto, produzmonografias listando os agentes. Uma no-va pesquisa - Monografia Volume 100, “U-ma Revisão dos Cancerígenos Humanos”- está sendo produzida pela IARC e serádisponibilizada em breve pelo site da ins-tituição.

A classificação da Agência divide os a-gentes como Grupo 1 - Cancerígeno parahumanos; Grupo 2A - Provavelmente can-cerígeno para humanos; Grupo 2B - Possi-velmente cancerígeno para humanos;Grupo 3 - Não classificáveis quanto à car-cinogenicidade em humanos; Grupo 4 -Provavelmente não cancerígeno para hu-manos.

Dos mais de 100 agentes, substâncias emisturas comprovadamente cancerígenaspara humanos, mais de 30 são associadasespecificamente ao câncer ocupacional.Até mesmo algumas ocupações, como ade pintor, ambientes industriais como aindústria moveleira devido à poeira de ma-deira, e a indústria coureiro-calçadistacom a poeira proveniente do couro, sãoclassificados no Grupo 1.

Cenário a desvendarExposição e desconhecimento sobre os fatores de risco agravam a situação

MAIS COMUNSMAIS COMUNSMAIS COMUNSMAIS COMUNSMAIS COMUNSSegundo documento produzido pelo

INCA (Instituto Nacional do Câncer), ostipos mais frequentes de câncer relacio-nado ao trabalho são o câncer de pulmão,os mesoteliomas, o câncer de pele, o debexiga e as leucemias. Já os principais fa-tores de risco no trabalho são as poeiras(sílica e amianto), agrotóxicos, solventes(benzeno, tolueno e xileno), radiação ioni-zante e radiação solar. O material aindaestimou a ocorrência de 489.270 casos no-vos de câncer para 2010 no Brasil. No casodo câncer de pulmão, a OMS reconheceque 10% das mortes estão diretamenterelacionadas aos riscos ocupacionais. Ou-tra estimativa da Organização é que os ca-sos de câncer de origem ocupacional va-riem entre 5 e 25%. Um estudo clássicosobre a questão, realizado pelos epidemio-logistas ingleses Richard Doll e RichardPeto em 1981, avaliou que 4% de todasas mortes por câncer podem ter sido cau-sadas por carcinógenos de origem ocupa-cional.

“Existem muitos agentes cancerígenose vários deles podem encontrar-se em lo-cais de trabalho. É importante enfatizarque esta é uma área em que pesquisas eestudos geram continuamente novos co-nhecimentos. Tal foi o caso do cloreto devinila, que era considerado moderada-mente tóxico até 1974, quando estudosde Maltoni associaram-no com angiosar-coma do fígado, o que foi posteriormente

Poeira de sílica: frequente em processos no setor cerâmico

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tes permitidos de exposição para os riscosde carcinogênese.

“O trabalho pode se configurar determi-nante para a ocorrência do câncer, na me-dida em que utiliza em seu processo agen-tes, grupos de agentes e misturas reco-nhecidamente cancerígenas para os sereshumanos e quando é possível estabelecernexo causal entre exposição e doença.Tem como dificultador o período de latên-cia - tempo decorrido entre o início da ex-posição ao carcinógeno e a detecção clíni-ca do tumor, que para alguns tumores só-lidos pode superar 30 anos. A falta de re-gistro da exposição no histórico ocupacio-nal do trabalhador e o desconhecimentodas substâncias que manipulou ou a queesteve exposto dificultam a investigaçãoretrospectiva do risco”, explica a epide-miologista Ubirani Otero, do Inca.

CAUSALIDADECAUSALIDADECAUSALIDADECAUSALIDADECAUSALIDADEO professor da Faculdade de Saúde Pú-

blica da USP, Victor Wünsch, destaca ain-da que o câncer é uma doença complexaem sua causalidade. Também há variaçãode pessoa para pessoa e depende da expo-sição. É possível a pessoa estar com o tu-mor e não ter sintomas, pois o câncer co-meça antes das manifestações clínicas.

“O problema é que nem sempre é fácilo estabelecimento de nexo causal entreexposição ocupacional e câncer. Muitasvezes não restam dúvidas, por exemplo,angiosarcoma de fígado (um câncer raro)que aparece em trabalhador exposto acloreto de vinila, ou mesotelioma, em tra-balhador exposto a amianto; porém, nemsempre o nexo é evidente”, continua a hi-gienista Berenice Goelzer.

“O câncer é uma doença multicausal.Há fatores genéticos, hereditários e ambi-entais. Dentro dessa óptica, o câncer ocu-pacional não é uma doença ocupacionaltípica e sim relacionada ao trabalho. Utili-zamos o conhecimento da lista de agentescancerígenos e fazemos a relação entretrabalho e câncer. Podemos chegar ao ne-xo causal, que não é cabal. Do ponto devista epidemiológico, certos trabalhadorestêm a incidência de determinados tiposde câncer. O longo período de latência difi-culta. Quando você faz o histórico do tra-balhador, ele não se lembra dos detalhesdas atividades que fazia há 30 ou 40 anos.O médico, tendo experiência, pode ajudaro trabalhador a se lembrar”, aconselha omédico pneumologista da Fundacentro,Eduardo Algranti.

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CÂNCER E TRABALHOconfirmado por outros cientistas. Outroexemplo é o formaldeído, considerado nãocancerígeno, depois, classificado comoum suspeito e, em 2004, confirmado comocancerígeno. O amianto, reconhecida-mente cancerígeno em todas as suas for-mas (actinolita, amosita, antofilita, criso-tila, crocidolita, tremolita), era considera-do como causador de câncer do pulmão emesotelioma; recentemente foi declara-do que pode causar também câncer da la-ringe e dos ovários”, relata a higienistaocupacional Berenice Goelzer.

SILÊNCIOSILÊNCIOSILÊNCIOSILÊNCIOSILÊNCIOA todas essas questões soma-se ainda

o desconhecimento do trabalhador. “Omaior fator de risco é a ignorância e a piorforma de ignorância é aquela alimentadapor interesses que não os do bem-estar eda saúde das populações. Há muito maisconhecimento científico sobre riscos paracâncer em ambientes de trabalho do queaquele que chega até os trabalhadores quese expõem a esses riscos e para a socie-dade em geral. O desconhecimento do ris-co leva ao não reconhecimento da relaçãoentre doença e trabalho, o que gera sub-diagnóstico e subnotificação, caracteri-zando o chamado silêncio epidemiológi-co”, acredita Vera Salerno.

Para a médica, assim se desenvolve uma“lógica perversa”, na qual “a ausência decasos oficialmente notificados acaba ser-vindo como argumento para a manuten-ção da exposição de trabalhadores ao ris-co, uma vez que não há diagnósticos decâncer reconhecidamente relacionados aotrabalho notificados entre os trabalhado-res daquele ramo de atividade”.

Outros complicadores são as substân-cias químicas não analisadas, o desenvol-vimento de novos agentes e das nanotec-nologias. “As partículas nanos são muitopequenas e podem se translocar atravésdas células. Não precisam da correntesanguínea. Ninguém sabe o que vai acon-tecer. No caso do nanotubo de carbono jáhá estudo mostrando relação com o cân-cer”, alerta a química e pesquisadora daFundacentro, Arline Arcuri.

Existem 56 milhões de substâncias, dasquais 248 mil são regulamentadas com po-tencial para entrar no mercado. Desse uni-verso, a IARC possui apenas 900 substân-cias químicas e físicas estudadas. “Hojeos instrumentais de pesquisas são diferen-tes do passado. Não se justifica colocarno mercado uma substância sem testar e

sem o mínimo de cuidados básicos. A cadadia 12 mil substâncias são registradas noCAS [Chemical Abstracts Service]. Esta-mos submetidos a coisas desconhecidase o pior é que não conseguimos controlara exposição nem do que já é conhecido”,continua a química.

“Com novas substâncias a cada ano vocênão tem uma aferição completa. A maiorianão é estudada suficientemente antes douso. Posteriormente se descobrem as evi-dências. Além disso, muitas exposições nãoprovocam o aumento de câncer, mas pro-vocam outras alterações relacionadas à fer-tilidade, qualidade de esperma, tireóide ea outros órgãos endócrinos. O câncer éum aspecto, não o único’, conclui o médicopneumologista e coordenador do Programade Pós-Graduação em Saúde Pública e MeioAmbiente da Fiocruz, Sergio Koifman.

Quadro 1

CANCERÍGENOS

PARA HUMANOS

Abaixo, alguns itens da IARCcomprovadamente

cancerígenos para humanosencontrados no ambiente de

trabalho (Grupo1):

- Alcatrão da hulha

- Amianto (todas as formas)

- Certas aminas aromáticas (p.ex.,orto-toluidina e ß-naftilamina)

- 4-aminodifenil,

- Arsênico

- Benzeno, benzidina, benzo-o-pireno (um doshidrocarbonetos policíclicos aromáticos HPAs),

- Berílio,

- 1,3-butadieno,

- Cádmio,

- Cloreto de vinila,

- Cromo VI e cromatos hexavalentes (como cromatos dechumbo, cálcio, potássio e zinco; dicromato de amônia),

- Dioxina,

- Emissões de coquerias (benzeno, HPAs),

- Éter bis-clorometílico,

- Formaldeído,

- Fuligens (como as encontradas em limpadores dechaminés), fumaça de cigarro (fumante passivo),

- Compostos de níquel, nitrodifenil, óleosminerais (não tratados ou pouco tratados),

óleos de xisto, óxido de etileno,

- Poeira de couro, pós de madeiras duras (comocarvalho), sílica livre e cristalina,

- Materiais radioativos variados, radiação ionizantes(todos os tipos).

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CÂNCER E TRABALHO

A variedade de agentes cancerígenosfaz com que diversos ambientes de traba-lho possam influenciar no aparecimentodo câncer. É o caso da sílica que está pre-sente na indústria cerâmica, na mineraçãode subsolo, em fundições, na construçãode fachada e assentamento de piso. Nes-ses ambientes, há o risco de silicose crôni-ca, que, por sua vez, aumenta o risco decâncer de pulmão. “Os casos de silicosesempre têm histórico ocupacional. A me-lhor prevenção para o câncer é prevenira silicose controlando devidamente a ex-posição à sílica”, explica o médico pneu-mologista da Fundacentro Eduardo Al-granti.

Outra área com risco de câncer de pul-mão é a galvanoplastia (foto), que tam-bém pode ter relação com câncer sinusale afetar todo o sistema respiratório. “Oproblema é sério em pequenas galvânicas.O risco depende do agente usado e existea partir do uso de névoas ácidas e cromo6”, afirma o professor da Faculdade deSaúde Pública da USP Victor Wünsch. Osetor metalúrgico também tem um histó-rico de risco de câncer em outras ativida-

Ambientes diversosCancerígenos estão presentes na indústria, no campo e nos serviços

des, que podem abranger fundições e si-derúrgicas. O níquel e cádmio são outroselementos de risco.

“Um dos produtos que combatemos foio amianto, que era usado para fazer freiode carro. Conseguimos a proibição no se-tor, mas ainda temos casos de câncer por-que a doença demora 30 anos para se mani-festar. O uso descontrolado de óleos mine-rais para refrigerar ferramentas na usina-gem pode gerar dermatites e depois cân-cer de pele, mas não é tão comum”, afirmao diretor de Saúde, Segurança e Meio Am-biente do Sindimetal (Sindicato dos Meta-lúrgicos de Osasco), Gilberto Almazan.

O câncer também está entre as preocu-pações dos químicos. “Na indústria quími-ca, há o manuseio de produtos desconhe-cidos. Sempre ficamos sabendo de pes-soas que morreram de câncer. A questãoatinge o trabalhador no chão de fábrica,mas, também, o meio ambiente. No setorplástico é comum. Já vimos casos de cân-cer em trabalhadores que lidavam comPVC. Nem sempre se faz o nexo com otrabalho e se investiga a fundo. É umamorte lenta”, alerta o coordenador da Se-

cretaria de Saúde e Meio Ambiente do Sin-dicato dos Químicos/SP, Lourival Batista.

O sindicalista ainda destaca o uso doantioxidante químico banox para fabrica-ção de pneus, o manuseio de amônia, ouso do amianto e do benzeno. “Temos queestancar essas fibras cancerígenas, dei-xando de produzi-las. Estamos no séculoXXI e é possível, com as novas tecnologias,substituir esses produtos”, defende. Paraorientar os trabalhadores, o sindicato che-gou a produzir uma cartilha com carátereducativo sobre o câncer no trabalho.

ABRANGÊNCIAABRANGÊNCIAABRANGÊNCIAABRANGÊNCIAABRANGÊNCIAO problema do câncer relacionado ao

trabalho, no entanto, não se restringe aosambientes industriais. A agricultura tam-bém é atingida. Além do risco de câncerde pele devido à exposição à radiação ul-travioleta, há o risco trazido por algunstipos de agrotóxicos. É o caso dos pestici-das que contêm arsênio e derivados. O ris-co abrange tanto quem aplica o produtocomo aqueles que o produzem.

“O arsênio leva a lesões da naso-faringee sinusais. Além dos pesticidas, ele estána indústria da madeira e na manufaturade vidro. Ainda pode contaminar a água eo alimento”, mostra o professor da USPVictor Wünsch.

Existe a possibilidade dos agrotóxicoscontribuírem para vários tipos de câncerdevido a uma ação sistêmica. “Os herbici-das, fungicidas e inseticidas são solúveis.Assim, a capacidade de penetração é mui-to grande. Entram na corrente sanguínea ese espalham”, explica a química Arline Ar-curi.

Ainda são fontes de preocupação as ra-diações ionizantes que podem estar pre-

Galvânicas: vias respiratórias são mais afetadas

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Quadro 2

Câncer de Pele não Melanoma Frequentemente associado ao trabalho aoar livre, exposição à radiação solar.

Mesotelioma de Pleura , dePeritônio e o de Pericárdio. Exposição ao Amianto.

Câncer de Pulmão

- Poeiras de sílica, amianto, carvão, madeira.- Radiação Ionizante.- Metais como arsênico, cádmio, chumbo, cromo, manganês e níquel.- Emissão de forno de coque, emissão de gases combustíveis, fumosquímicos, e gases.- Solventes orgânicos.- Hidrocarbonetos policíclicos aromáticos.

Neoplasiasde Bexiga

Aminas aromáticas, hidrocarbonetos policíclicos aromáticos,azocorantes, benzeno, cromo/cromatos, exaustão de diesel,fumo e poeira de metais, óleos, tintas e solventes.

Neoplasias das CavidadesNasais e Seios Paranasais

Poeira de madeira, poeira de couro, poeiras de cimento, óleo decorte e solventes.

Cânceres da Cavidade Oral,Faringe e Laringe,

Exaustão de motores, formaldeído, hidrocarbonetos policíclicosaromáticos, níquel, poeiras da indústria têxtil, poeiras da indústria docouro, poeira de madeira, sílica, solventes, solventes orgânicos.

LeucemiasExposição a campos eletromagnéticos, à radiação ionizante e a solventes. Aexposição ao benzeno e à Radiação Ionizante está fortemente relacionada aodesenvolvimento de Leucemia Mielóide Aguda e Mielodisplasia.

Fonte: Revisão bibliográfica 1980 - 2010 Pubmed - palavras-chave: cancer, occupation e exposure

TIPO DE CÂNCER EXPOSIÇÃO COMO FATOR DE RISCO

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CÂNCER E TRABALHO

“Já existe substitutivo para ele e é viáveltambém do ponto de vista econômico”,defende Algranti. “Há vários países comoa França em que o uso foi abolido. Não hájustificativa para a sua continuidade nemdúvida sobre a sua ação danosa”, comple-ta o médico epidemiologista da Fiocruz,Sergio Koifman.

Para o Instituto Brasileiro do Crisotila(IBC), o amianto crisotila é usado com rí-gidos padrões de segurança. A organiza-ção ressalta que atualmente o Brasil é oterceiro maior produtor mundial desse mi-neral.

“Desde a década de 1980, não há regis-tros de casos de doenças relacionadas aoamianto no Brasil. O País desenvolveu me-didas para o controle da poeira nos locaisde trabalho, resultado dos investimentoscontínuos em segurança. Em pesquisa

sentes em raio x, abrangendo trabalhado-res da área hospitalar, em atividades nu-cleares, no beneficiamento de urânio e namineração. “A tireóide e a medula óssea(leucemia) são particularmente sensíveis,mas estas radiações podem também cau-sar outros tipos de câncer como o de pul-mão e o de pele. Muito depende do tipode exposição e condições individuais”, ob-serva a higienista Berenice Goelzer.

Já as radiações não ionizantes estão pre-sentes nos campos magnéticos das redeselétricas, havendo suspeita de relaçãocom leucemia e câncer de cérebro. A pro-dução de alumínio é reconhecida pela IARCcomo carcinogênica, e os campos magnéti-cos são suspeitos de contribuir com o risco.

Em certos ambientes de trabalho, comominas profundas, serviços de saúde e la-boratórios de pesquisa, há o risco do radô-nio. A Agência Norte-Americana de Pro-teção ao Meio Ambiente (US EPA) calculaque o radônio é a segunda causa de mortepor câncer pulmonar nos Estados Unidos,precedido por tabagismo e seguido pelafumaça passiva.

MAIS FREQUENTEMAIS FREQUENTEMAIS FREQUENTEMAIS FREQUENTEMAIS FREQUENTE“O câncer de pulmão entre todos os tu-

mores é o mais frequentemente vincula-do ao trabalho. O aparelho respiratório éuma grande via de entrada para tóxicos.

Temos o risco, por exemplo, em atividadesde pintura envolvendo solvente e pinturaà pistola. Outras ocupações listadas são obeneficiamento de couro, na área de cur-tumes, pois há um emaranhado de subs-tâncias na atividade que levam a um au-

mento de incidência. Já no caso das indús-trias de móveis, há casos de câncer dosseios nasais. O câncer de bexiga tem inci-dência baixa, mas é grave. Vemos relaçãocom atividades envolvendo aminas earomáticos – pigmentação de tintas”,complementa o professor da Faculdadede Medicina da Bahia e coordenador doDepartamento de Medicina Preventiva eSocial, Marco Rêgo.

Por fim, existe o risco do câncer de pele,presente entre os pescadores, agriculto-res e outros trabalhadores que atuam aoar livre, expostos à radiação ultravioleta,como garis, guardas, carteiros e profissio-nais da construção civil.

“É importante estudar a possibilidadede ocorrência dos agentes cancerígenosem cada local de trabalho. Trabalhadoresem ocupações das mais variadas podemestar expostos: na indústria química (co-rantes, tintas, borracha, plásticos, etc.) efarmacêutica; indústria do petróleo; in-dústria de ferro e aço; coquerias; agricul-tura; salões de beleza (cabeleireiros); hos-pitais (raios X, radioterapia, quimiotera-pia); usinas nucleares; laboratórios depesquisa; certas minas; marcenarias (con-forme a madeira); curtumes; produção dealumínio; construção civil; qualquer traba-lho com amianto; atividade em restauran-tes, bares e boates, se não for proibidofumar”, exemplifica Berenice.

Certamente uma das fibras canceríge-nas mais polêmicas no Brasil é o amianto.O País conta com uma mina na cidade deMinaçu/GO e utiliza a substância na fabri-cação de telhas, caixas d’água e na indús-tria de cloro-soda. De um lado, estão osque defendem o banimento e do outro,os que querem o seu uso controlado.

“Metade dos casos de câncer de pulmãorelacionados ao trabalho são devido ao as-besto. A outra metade devido ao arsênio,ao cromo, ao berílio, ao cádmio, aos ácidosfortes, ao níquel e à sílica, entre outros. Acarcinogenicidade do amianto é muitomaior do que a da sílica”, afirma o pneumo-logista da Fundacentro, Eduardo Algranti.

O amianto tem relação direta com o me-sotelioma e alguns estudos apontam rela-ção com câncer de laringe e de ovário emmulheres.

Alvos de discussõesAmianto e benzeno geram contestações cada vez mais pertinentes

Quadro 3

Câncer de Pele não MelanomaAgricultura, construção civil,

atividades ao ar livre.

Mesotelioma de Pleura , dePeritônio e o de Pericárdio.

Indústrias de fibrocimento, isolamentoacústico e térmico.

Câncer de Pulmão

Construção Civil, Fundição de Cobre, Ferro e Aço, Indústria da Borracha,Indústria de Cimento e Gesso, Indústria Gráfica e de Papel, IndústriaTêxtil, Indústria Metalúrgica, Produção de Fertilizantes, Maquinaria eTransporte, Mineração, Trabalho Rural.

Neoplasiasde Bexiga

Indústria da Borracha e de Plásticos e Sintéticos, Indústria de TinturasCorantes, Indústria do Couro, Indústria Gráfica, Indústria de Metais,Indústria do Petróleo, Indústria Química e Farmacêutica, Indústria deSapatos, Indústria do Tabaco, Indústria Têxtil.

Neoplasias das CavidadesNasais e Seios Paranasais

Indústria da Madeira, Indústria do Couro, Indústria Têxtil, Indústria de Calçados,Indústria do Papel, Serrarias, trabalho em Salão de Beleza e Lavanderias.

Cânceres da Cavidade Oral,Faringe e Laringe,

Agricultura e Criação de Animais, Indústria Têxtil, Indústria do Couro,Indústria Metalúrgica, Indústria do Papel, Indústria da Borracha,Construção Civil, trabalho em Salão de beleza e Lavanderias.

Leucemias

Campos magnéticos – redes elétricas.Radiação ionizante, trabalhadores da área hospitalar, de atividadesnucleares, no beneficiamento de urânio e na mineração.Benzeno - petroquímicas, coquerias, siderurgias, postos de gasolina.

Fonte: Revisão bibliográfica 1980 - 2010 Pubmed - palavras-chave: cancer, occupation e exposure

TIPO DE CÂNCER SETORES/ATIVIDADES ASSOCIADOS

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REVISTA PROTEÇÃO 45MARÇO / 2011

firma o professor da USP,Victor Wünsch.

SEM LIMITESEM LIMITESEM LIMITESEM LIMITESEM LIMITE“Para os cânceres ocupa-

cionais causados por agen-tes como amianto e radia-ção ionizante não há limiteseguro de exposição”, acre-dita Fernanda Giannasi. “Agrande prevenção é o bani-mento. Não há limite de to-lerância seguro para subs-tância carcinogênica. No caso do amianto,defendo que não se deva trabalhar comele”, diz o professor da UFBA, Marco Rêgo.

Apenas no Cerest de Campinas/SP, dejaneiro de 2008 a julho de 2009, foramidentificados 13 casos de câncer relacio-nado ao trabalho. Eram situações comocâncer de tireóide em trabalhadores ex-postos a múltiplas substâncias químicasna fabricação de pesticidas; leucemias emexpostos a benzeno; câncer de pulmão epleura em trabalhadores expostos ao ami-anto. Nesse meio, há vítimas da região dePaulínia/SP, conhecida pela disputa entretrabalhadores e as empresas Shell/Basf.

“Os três casos de câncer de tireóideocorreram em ex-trabalhadores da Shell.O critério para o estabelecimento da rela-ção causal foi epidemiológico, além de seconsiderar a bibliografia médica. A douto-ra June Rezende encontrou um risco 166vezes maior para a ocorrência de câncerde tireóide entre os ex-trabalhadores emrelação à população masculina de Campi-nas, o que está detalhado na tese dedoutoramento defendida por ela na Uni-camp”, relata a médica sanitarista, MirianSilvestre.

PETROQUÍMICAPETROQUÍMICAPETROQUÍMICAPETROQUÍMICAPETROQUÍMICAOutra substância cancerígena que tem

sido alvo de discussões é o benzeno, queconta com comissões tripartites, tanto na-cional quanto estaduais. No caso de sol-ventes, a presença de benzeno por conta-minação pode ser de no máximo 0,1%. Jáa ACGIH apresenta limite de 0,5 ppm.Mas, segundo a química Arline Arcuri eVictor Wünsch, isso não significa que otrabalhador possa se expor ao benzenosem risco. Na gasolina, a ANP (AgênciaNacional de Petróleo) aceita presença deaté 1% de benzeno na comum e 1,5% naespecial. Por outro lado, já existem gru-pos estudando a presença de leucemiaentre frentistas.

Fernanda: período de latência

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Marina: seguro

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“Como a indústria petroquímica não po-de eliminar o agente, estamos discutindoboas práticas tecnológicas para evitar queo trabalhador se exponha. São soluçõesde engenharia para evitar vazamentos econtroles médicos dos trabalhadores, hábombas herméticas, coletas de amostrasem sistemas fechados. Há um trabalho daComissão Nacional. O Acordo tem 15 a-nos, fora os 10 anos anteriores de mobili-zação”, conta a química da Fundacentro.

O médico e auditor fiscal da SRTE/SP,Danilo Costa, explica que os tipos de cân-ceres relacionados ao benzeno são os li-gados ao sistema hematopoiético: leuce-mia, linfoma e mieloma múltiplo. Pesqui-sas recentes apontam relação com cân-cer de mama e de cérebro. “A correlaçãomais forte é com a leucemia e o linfoma.Hoje as concentrações tendem a diminuir,mas as doenças podem ocorrer mesmocom exposições em níveis mais baixos”,afirma Costa.

(IN)FORMAÇÃO(IN)FORMAÇÃO(IN)FORMAÇÃO(IN)FORMAÇÃO(IN)FORMAÇÃOEm São Paulo tem sido feito um traba-

lho para estimular a participação dos tra-balhadores na prevenção. O objetivo é queeles conheçam o risco para intervir. Sãocursos de formação que envolvem a CIPAe encontros regionais. “Também acompa-nhamos o que foi implantado da legisla-ção. Algumas empresas têm experiênciasbem sucedidas. Naquelas em que há desa-justes, o MPT entra com ação civil públicapara que haja mudanças ambientais e deproteção”, diz o auditor.

Ainda falta saber a situação real das do-enças. Poucos casos são mapeados. De2004 a 2007, cinco casos de leucemia fo-ram relacionados ao benzeno no Estadode São Paulo - três da Cosipa e dois daRefinaria Presidente Bernardes Cubatão.“Certamente o número é muito maior. Al-guns eventos sentinelas sinalizam situa-ções graves como casos de aplasia de me-

intitulada ‘Exposição Ambiental ao Asbes-to – Avaliação do Risco e Efeitos na Saú-de’, conduzida pelos professores MárioTerra Filho (USP), Ericson Bagatin (Uni-camp) e Luiz Eduardo Nery (Unifesp), foiconcluído que não há riscos à saúde dapopulação que reside em casas cobertascom telhas de fibrocimento com amianto,assim como aos trabalhadores da minera-ção que estão sujeitos a condições segu-ras de trabalho”, garante a presidente doIBC, Marina Júlia de Aquino.

As informações são questionadas pelaauditora fiscal da SRTE/SP FernandaGiannasi, para quem mesmo os trabalha-dores admitidos após os anos 80, que nãoadoeceram, ainda podem ficar doentes,pois o período de latência varia de 25 a50 anos. O IBC rebate que o período variade 15 a 20 anos, citando o pesquisadorJacques Dunnigan, do Canadá, País quetem também uma mina de amianto.

“O período de latência é variável. Algunsestudos sobre tabagismo e tumores sóli-dos como câncer de pulmão apontam 20anos, mas pode ser de 30, 40 e até 50 anos.O período de latência é menor para a ex-posição ao benzeno e a leucemia, varian-do entre 10 e 15 anos. Mas, nem sempreé possível detectar a primeira exposição,o que faz com que os estudos sofram, àsvezes, alguma inconsistência. Outro pon-to é o período de indução que vai da expo-sição ao início do processo de carcinogê-nese. Com diagnósticos mais avançados,poderemos reduzir o período de latênciae aproximá-lo do período de indução”, a-

Nas refinarias: exposição deve ser reduzida

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CÂNCER E TRABALHO

Quando se trata de produtos cancerí-genos, a melhor prevenção é evitar a ex-posição. Ela pode ocorrer com a substi-tuição do agente ou impedindo que o tra-balhador seja exposto. Algumas medidasde controle são, por exemplo, o enclausu-ramento bem vedado da operação, comventilação local exaustora incluindo cole-tores de alta eficiência, no caso de con-taminantes atmosféricos.

“Temos medidas bem sucedidas no Es-tado como o uso de bombas herméticaspara evitar vazamentos. Avançamos combombas magnéticas e de duplo selo. Anti-gamente era comum encontrarmos bom-bas corroídas, sem conservação”, relata omédico e auditor fiscal da SRTE/SP DaniloCosta, sobre o benzeno em São Paulo.Com relação ao mesmo agente, o auditorainda destaca o uso de teto flutuante eselagem de nitrogênio nos tanques, o usode analisador de linha que permite a aná-lise interna do produto e diminui a neces-sidade de abrir a tubulação para coleta deamostras, além de medições de tanquecom radar.

A Petrobras, por sua vez, afirma desen-volver o Programa de Prevenção da Expo-sição Ocupacional ao Benzeno em todas

Atenção à prevenção e ao controleSe substituir não é possível, vigilância e proteção são fundamentais

as todas Unidades Operacionais que pro-duzem, transportam, armazenam, utilizame manipulam o benzeno ou suas misturaslíquidas contendo 1% ou mais em volume.Já para as atividades operacionais em queo benzeno está presente em concentra-ções inferiores a 1% em volume, a empre-sa utiliza o Programa de Prevenção de Ris-cos Ambientais (PPRA).

No caso da Refinaria Presidente Ber-nardes Cubatão – RPBC, foi assinado umTermo de Compromisso com o Sindicatodos Petroleiros do Litoral Paulista - Sin-dipetro LP em 2005, com acompanhamen-to do Ministério Público do Trabalho. Oobjetivo foi estabelecer ações para a me-

dula em trabalhadores de postos de gaso-lina e voltamos a ter casos de leucemias”,avalia Costa.

“Como não existem níveis seguros paraexposição a substâncias cancerígenas, hámaior risco de desenvolvimento de cân-cer, em particular, leucemia para os traba-lhadores que se expõem à gasolina. Se-gundo as estatísticas disponíveis no sítioeletrônico da Previdência Social, entre ou-tubro de 2008 e agosto de 2009 foram con-

cedidos 170 benefícios a tra-balhadores do comércio va-rejista de combustíveis paraveículos automotores(CNAE 47.3) por doençasenquadradas nos capítulosC e D da CID 10, onde estãoincluídas todas as formas deneoplasia (benignas e malig-nas). Três desses casos es-tavam relacionados ao tra-balho. Infelizmente, não te-mos acesso ao banco de da-

dos da Previdência Social para que pos-samos detalhar melhor quais os tipos decâncer que têm atingido essa categoria detrabalhadores”, completa a médica do Ce-rest, Mirian Silvestre.

Para o auditor, é possível diminuir obenzeno da gasolina. Atualmente, a políti-ca do benzeno prevê substituição quandopossível. A substância também é geradacomo subproduto na produção de coqueno caso da siderurgia.

Costa: eventos sentinelas

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Mirian: leucemia

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O lhoria das instalações em relação à prote-ção dos trabalhadores, como novas tec-nologias para redução das emissões fugiti-vas e um plano específico de acompanha-mento da saúde de todos os funcionáriosda Refinaria pelas áreas de Saúde e Higi-ene Ocupacional. Os investimentos foramde 50 milhões de reais.

CONTROLECONTROLECONTROLECONTROLECONTROLEA sílica, por sua vez, segundo o médico

Eduardo Algranti, requer o controle de e-missão de poeira na fonte de produção,sistemas de exaustão, umidificação e en-clausuramento do processo. Por último,uso de proteção respiratória individual,quando os outros métodos não são capa-zes de evitar a exposição.

No caso da exposição à radiação ultra-violeta, recomenda-se o uso de protetorsolar, além de roupas e chapéu pensandona proteção do trabalhador. No Rio de Ja-neiro, por exemplo, houve alteração dohorário de trabalho para períodos com ex-posição solar menos intensa para traba-lhadores de Correios e da coleta de lixodomiciliar.

Para a prevenção, Ubirani Otero, doINCA, destaca a importância de se substi-tuir os agentes cancerígenos por outrosnão cancerígenos ou menos nocivos. Ouso de tecnologias mais modernas no pro-cesso de trabalho é outro aspecto impor-tante, assim como a implementação demedidas de controle e monitoramento pa-ra evitar exposição do trabalhador a agen-tes cancerígenos.

Os trabalhadores devem ser informadossobre os riscos. O número de potencial-mente expostos a cancerígenos deve serdiminuído, a duração da jornada limitadae os níveis de exposição monitorados aomínimo compatível com a saúde.

A gestão de risco deve priorizar o moni-toramento e a redução da exposição e nãoapenas o diagnóstico precoce do câncer.

Fátima: marcadores biológicos

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Algranti: na fonte

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Margarida: tolerância zero

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CÂNCER E TRABALHO

Umidificação: reduz emissão de poeira

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Ventilação local exaustora: recomendadaD

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A CIPA também deve ser palco para a dis-cussão dos múltiplos fatores envolvidosna carcinogênese. Já as áreas de trabalhoque podem, potencialmente, apresentarrisco de exposição devem ser delimitadase monitoradas. O fornecimento de EPIs eEPCs deve ser adequado.

PRECAUÇÃOPRECAUÇÃOPRECAUÇÃOPRECAUÇÃOPRECAUÇÃOO médico do Trabalho René Mendes,

por sua vez, destaca a importância de seplanejar e implementar o PCMSO na lógi-ca de um sistema de vigilância da saúdedos trabalhadores, articulado com um sis-tema de vigilância das condições e ambi-entes de trabalho. As interrelações e arti-culações entre o PCMSO (NR 7), o PPRA(NR 9) e o PGR (NR 22) são estreitas efortes. Os programas devem caminharjuntos. As avaliações ambientais, qualitati-vas ou quantitativas, orientam o PCMSO,como também devem ser concebidas, pla-nejadas e implementadas com finalidadesverificadoras no ciclo do PDCA (Plane-jar, Fazer, Verificar e Ajustar).

“O PCMSO é uma regulamentação ne-cessária e importante, mas insuficientepara o controle do câncer. Faz-se necessá-rio mudar a legislação para focar indicado-res de exposição ambiental e, no caso dosexames médicos, os indicadores biológi-cos de exposição. Posto que cada ambien-te é singular no tocante aos seus riscos.Além disso, a Saúde Ocupacional precisaincorporar o “Princípio da Precaução” eassumir que para muitas situações não háconhecimento científico disponível e, por-tanto, deve-se trabalhar com o máximode prevenção. Ou seja, proteger a saúdehumana até que se tenham informaçõesseguras de que não há risco em curto oulongo prazo”, complementa a epidemiolo-gista do INCA e professora adjunta da Uni-versidade do Estado do Rio de Janeiro

(UERJ), Fátima Sueli Ribeiro.Sobre os exames ocupacionais, a epide-

miologista destaca que “na perspectiva docâncer, os marcadores biológicos de expo-sição devem ser priorizados em relaçãoao diagnóstico precoce”. Isso porque “aidentificação da exposição permite a im-plementação de mudanças capazes de mi-tigar o desfecho, ao passo que o diagnósti-co é bastante tardio para qualquer medi-da”. O médico deve estar atualizado sobreas mudanças que se implementam no pro-cesso de trabalho, e os exames devem secuidadosamente planejados.

AMBIENTEAMBIENTEAMBIENTEAMBIENTEAMBIENTEJá em relação ao PPRA, a higienista ocu-

pacional Maria Margarida Lima, da ABHOe da Fundacentro, aponta que a elabora-ção deve visar à eliminação da exposiçãoem curto prazo. As medidas de HigieneOcupacional vão depender dos agentes edas formas de exposição.

“A abordagem da questão do câncer re-lacionado ao trabalho, como efeito de ex-posição a agentes químicos ou físicos, temde ser realizada dentro dos princípios daHigiene Ocupacional, com maior ênfaseao reconhecimento do risco e do seu con-trole em níveis de tolerância zero. A ava-liação dos ambientes de trabalho deve serconsiderada já como avaliação das medi-das de controle aplicadas, e não restrita àcaracterização apenas da exposição ou dainsalubridade. Deve-se buscar sempre apossibilidade de eliminação do agentecancerígeno. Não sendo praticável, o con-trole tem de ser o mais eficaz possível paraque a exposição seja nenhuma, uma vezque a dose-resposta, na maioria dos casos,não é estabelecida”, explica MargaridaLima.

Outro ponto a ser considerado é a desa-tualização da NR 15 diante dos estudos

toxicológicos existentes e as referênciasmais conceituadas. Assim, não permiteum controle adequado da exposição dostrabalhadores. A própria ABHO produziuuma moção pedindo a revisão da Norma.

“As empresas devem saber como reco-nhecer o risco de câncer ocupacional, issodeve ser feito pelo PPRA. O reconheci-mento envolve a consulta a referênciasconfiáveis e dedicadas ao assunto. Alémde envolver pesquisa à literatura de refe-rência de entidades ocupacionais impor-tantes como OMS, OIT, NIOSH. Existe areferência simplificada que é dada no li-vreto da ACGIH, e o mais importante, asinformações e referências dadas peloIARC”, defende o higienista ocupacional,Mário Fantazzini, da ABHO.

HOJEHOJEHOJEHOJEHOJEA complexidade do câncer relacionado

ao trabalho exige das empresas uma pos-tura pró-ativa. Uma das bases para isso éo princípio da precaução, no qual as dúvi-das em relação aos riscos do agente fazemcom que a exposição seja evitada. Outroponto importante é a prevenção, que in-clui as medidas de Higiene Ocupacional eas que acabam com a exposição às subs-tâncias cancerígenas. Também não se po-de esquecer o direito de saber do trabalha-dor, que deve ser informado sobre os fato-res de risco. As descobertas científicas de-vem ser divulgadas de forma democráti-ca para a sociedade. Nesse cenário, o Bra-sil teve alguns avanços.

Mas ainda há um longo caminho a serpercorrido. O amianto ou asbestos, proi-bido em 63 países, é vedado em apenasquatro estados brasileiros. A proibição dasílica livre cristalina em operações de ja-teamento de areia e corte de pedras a seconem sempre impede que as atividadesocorram. O benzeno ainda é utilizado comosolvente. No âmbito industrial, as coque-rias das siderúrgicas e o refino de petróleoainda são fontes de exposição ocupacionale ambiental e já se percebe a ocorrênciade leucemia e aplasia de medula em traba-lhadores de postos de gasolina. Os agrotó-xicos, por sua vez, são usados de forma in-discriminada, sendo o Brasil, o maior con-sumidor mundial dessas substâncias, pre-sentes não só na agricultura, como tambémnos conservantes de madeira e produtosdomissanitários. O País ainda tem muito afazer para evitar a exposição do trabalha-dor, protegendo-o dos fatores de risco dostemíveis agentes cancerígenos.