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Material Didático - Pedagógico Curso de Melhoramento Participativo e Conservação On Farm
Prof. Dr. Cláudio Lúcio Fernandes Amaral Profª. DSc. Tiyoko Nair Hojo Rebouças
Plantas Medicinais: Conservação On Farm e Melhoramento Participativo
Cláudio Lúcio Fernandes Amaral, Doutor em Genética e Melhoramento pela Universidade Federal
de Viçosa (UFV), Professor do Departamento de Ciências Biológicas (DCB) da Universidade
Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) e da Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC).
1) - CONSIDERAÇÕES:
No Brasil, há pouca, ou mesmo, falta literatura disponível acerca da conservação
on farm e melhoramento participativo de plantas medicinais, o que foi motivo de
inspiração para se ousar escrever sobre esta temática, no intuito de suprir tal deficiência;
tarefa árdua que enche de orgulho quem a realiza, no sentido de poder estar contribuindo
para ampliar o conhecimento nesta área de estudo tão excitante que é as plantas com
propriedades terapêuticas.
O melhoramento de plantas medicinais tem por objetivo melhorar o teor e a
composição de princípios ativos por métodos clássicos e modernos. Porém, há uma
abordagem alternativa que é a conservação on farm e o melhoramento participativo.
A produtividade é expressa pelos caracteres quantitativos envolvendo o teor e,
pelos qualitativos, a composição de princípios ativos e seus principais constituintes
químicos, tais como: os alcalóides (Vincristina e Vimblastina) de Catharanthus roseus
(Vinca), os flavonóides de Calendula officinalis (Calêndula), os glicosídeos (Digoxina e
Digitoxina) de Digitalis spp. (Dedaleiras), as mucilagens de Aloe spp. (Babosa), os óleos
essenciais (Chavicol, Eugenol, Estragol e Timol) de Ocimum spp. (Alfavaca, Manjericão) e
(Mentol) de Mentha spp. (Hortelã) e os taninos de Stryphnodendron spp. (Barbatimão).
Neste texto, abordam-se as perspectivas, os avanços, os desafios e as
oportunidades desta relevante área para a conservação e utilização das espécies que
além de serem medicinais, podem ser aromáticas e condimentares; das quais os produtos
comerciais obtidos são, respectivamente, fármacos, perfumes/cosméticos e temperos.
Em se tratando de conservação on farm e melhoramento participativo tem-se que
os agricultores experimentam suas populações, escolhendo as superiores e fazem
experiência de selecioná-las, separando-as das inferiores, colhendo as sementes das
plantas - alvo ou obtendo propágulos vegetativos a partir delas, cultivando-as, geração
após geração, em suas fazendas, sítios, chácaras, hortas, jardins e quintais.
Neste processo, a tomada de decisão envolve as ações de cultivar, manejar,
colher, processar, utilizar, transportar, armazenar, distribuir e comercializar, as quais
refletem direta ou indiretamente no o que, como, onde, quando, quanto e porque fazer o
plantio de uma ou outra espécie, população, variedade, cultivar e híbrido? Estas
atividades são essenciais para a pesquisa e o desenvolvimento, a extensão e a
implementação e o monitoramento e a avaliação.
A conservação racional e a utilização sustentável da biodiversidade devem
envolver o levantamento florístico regional, bem como a preservação da diversidade
biológica remanescente, além da restauração daquela em extinção ou ameaçada, seguido
pela promoção da agricultura alternativa e do desenvolvimento sustentado e ainda a
criação da riqueza a partir dos produtos biológicos.
Deste modo, espera-se que as plantas medicinais retornem ao arsenal terapêutico,
recebendo a devida importância científica para contribuir com o equilíbrio da saúde
humana. Apesar de não ser possível relatar todas os casos, exemplos criteriosamente
selecionados com plantas encontradas na composição florística das matas, campos,
hortas e jardins, serão abordados por representarem interesse popular ou comercial, tanto
em nível empresarial, quanto industrial.
2) - PERSPECTIVAS:
O repertório dos genes aproveitados pelo fitomelhoramento por meio de
sucessivos ciclos de seleção e hibridação e, pela biotecnologia, via transgenia,
compreende, em última instância, as espécies cultivadas e silvestres aparentadas
encontradas dispersas pelos países ou nações. Assim, deve-se preocupar em recolher e
preservar este germoplasma.
Trata-se de atividade essencial, pois com o avanço da agricultura e pecuária, as
raças ou variedades crioulas, primitivas ou tradicionais tendem a desaparecer,
principalmente, devido à exploração irracional de certas áreas de ocorrência, o que leva a
perda de material genético de maneira irreversível, com prejuízos e efeitos perigosos para
o futuro da manipulação genética das espécies de interesse agronômico e,
conseqüentemente, da humanidade.
As espécies agrícolas são frutos da mutação, fluxo gênico, deriva genética e
seleção natural. Em alguns destes fenômenos, é possível demonstrar a importância da
participação humana direta ou indireta, o que influencia os processos de desenvolvimento
das culturas, de maneira que as opiniões, decisões e ações dos agricultores fazem com
que a variedade seja cultivada ou desprezada. No caso de plantas medicinais, o melhor
termo seria etnovariedades, abrangendo vários morfotipos que podem ou não
representarem os diversos quimiótipos.
Os produtores, geralmente, preferem o policultivo, isto é, a diversidade genética
inter e intraespecífica significando, respectivamente, muitas culturas com uma variedade
ou uma cultura com muitas variedades ao monocultivo, ou seja, a ausência de
variabilidade genética, representando uma cultura com uma variedade. Assim, conservam
a biodiversidade por ser uma questão de sobrevivência e perpetuação da própria espécie.
A escolha dos agricultores pela opção de diversificar suas espécies nos cultivos de
suas lavouras visa atender as diferentes exigências dos consumidores pelos recursos
genéticos para suprirem suas necessidades face à alimentação, saúde, moradia,
vestimenta, lazer etc. Além disto, permite restringir as limitações impostas aos cultivos por
fatores bióticos (Pragas, Doenças, Ervas Daninhas) e abióticos (Cheia, Seca, Calor, Frio,
Salinidade, Metais Pesados, etc).
Os fatores que afetam as opiniões, decisões e ações dos produtores são: aceitação
dos consumidores, produtividade, valor dos produtos, derivados e insumos agrícolas e
perdas causadas por fatores ambientais estressantes. Eles interferem na estrutura
genética das culturas e no meio onde as lavouras encontram-se inseridas de tal forma
que, ao abandonar, substituir ou eliminar variedades, ocorre a perda de genes, em
conseqüência, a erosão genética, culminando na redução da biodiversidade, afetando
funções ecossistêmicas vitais para a saúde ambiental.
A conservação on farm é o contínuo plantio pelos agricultores de suas culturas,
safra após safra, no campo, sob a forma de lavouras. A cada ano, os produtores guardam
uma parte de suas sementes para a próxima safra e a outra parte é destinada à
subsistência, sendo que, em alguns casos, o excedente é utilizado para troca e/ ou venda.
No local de plantio, a cultura está constantemente sendo submetida à seleção por
ação antrópica ou da própria natureza, portanto em evolução dirigida ou não pelo homem.
A seleção é feita no local onde a variedade será cultivada, o que implica em dizer que a
interação genótipo x ambiente é positiva.
O melhoramento do germoplasma é no e, não; para o local de cultivo.
Efetivamente, conserva-se o meio ambiente, isto é, os processos ecológicos de suporte à
vida e ao agroecossistema, as espécies, ou seja, a unidade de seleção evolutiva natural
ou artificial, representando a própria cultura agronômica e, finalmente, os genes, os
fatores que codificam para as características de interesse agronômico, conduzindo à
sobrevivência, bem como à reprodução pelo cultivo e replantio através de gerações.
Os materiais vegetais utilizados possuem adaptação às condições locais de plantio,
além de serem amplamente empregados pelos produtores, aumentando a aceitabilidade
dos produtos pelos consumidores. A adaptação é no tempo e espaço, pois ano após ano
a variedade é testada na área utilizada.
Este processo constitui-se na preservação sítio - específica de recursos genéticos,
permitindo resgatar o germoplasma tradicional, revitalizando a biodiversidade agrícola na
comunidade regional, refletindo no registro do conhecimento etnobotânico sobre o
material cultivado no que tange a valorização da memória cultural do povo. Os produtores
são os verdadeiros guardiões dos recursos genéticos vegetais. Sendo, portanto, a estreita
ligação entre conservação e utilização das culturas agronômicas pelos agricultores,
podendo ter a interativa participação efetiva com os pesquisadores. Suas ações focam-se
em conservar parte, isto é, a agrobiodiversidade (Conservação On Farm) e/ ou em
preservar todo o sistema agrícola tradicional, ou seja, a valorização do homem, da
lavoura, da prática agrícola e do manejo cultural (Gerenciamento On Farm).
O melhoramento participativo é a inclusão dos conhecimentos, preferências,
habilidades, experiências, práticas e vivências dos agricultores aos programas de
melhoria genética qualitativa (Mais Freqüente) e quantitativa (Menos Freqüente) dos
pesquisadores.
É fruto de ações colaborativas que envolvem o efetivo envolvimento de agricultores e
pesquisadores, sendo feito ao evocar a participação ativa dos lavradores no processo de
melhoramento do início ao fim, o qual compreende selecionar a espécie, estabelecer o
objetivo, hibridizar as gerações parentais e obter-s as filiais com ou sem
retrocruzamentos. Por outro lado, o que se verifica na prática, é a atuação dos
colaboradores em, apenas e tão somente, algumas fases, mas não em todas as etapas.
O trabalho em conjunto ocorre, pois a maior parte dos recursos genéticos vegetais
está sob a custódia dos agricultores e de seus familiares que os manejam nem sempre de
maneira adequada, alterando-lhes ao longo de séculos e séculos de contínuo plantio de
suas lavouras. Os agricultores passam de usuários dos processos, serviços e produtos
gerados para parceiros, enquanto os pesquisadores, de produtores de ciência, tecnologia
e inovação para colaboradores. Esta labuta envolve várias atividades, dentre elas tem-se:
a) - Identificação pelos pesquisadores dos principais critérios de seleção das variedades
adotados pelos agricultores que decidem se elas serão mantidas e utilizadas ou
descartadas e não conservadas,
b) - Incorporação dos parâmetros elencados e ranqueados pelos agricultores aos
programas de melhoria genética dos pesquisadores,
c) - Promoção do envolvimento dos agricultores no processo de seleção das variedades
oferecidas pelos pesquisadores,
d) - Apropriação mais rápida, por parte dos agricultores, das variedades geradas pela
associação com os pesquisadores,
e) - Redução do tempo despendido entre a geração e a adoção das novas cultivares,
f) - Difusão das variedades entre os vizinhos por meio da compra, venda ou troca de
germoplasma sob a forma de sementes ou mudas,
g) - Avaliação dos pesquisadores junto com os agricultores da utilidade das cultivares já
desenvolvidas,
h) - Validação da adaptação geral e específica de um de dado genótipo em particular, sob
os diversos sistemas de cultivo existentes,
i) - Absorção de melhor conhecimento por parte dos pesquisadores dos sistemas de
produção em uso pelos agricultores,
j) - Criação de um canal efetivo de intercâmbio de experiências entre agricultores e
pesquisadores,
l) - Multiplicação pelos lavradores com ampliação da variação de fenótipos / genótipos dos
cultivos regionais e condução dos trabalhos de pesquisa participativa com diversas
variedades em vários ecossistemas locais.
Na conservação on farm e no melhoramento participativo, os agricultores são o
alvo das atenções, participam de forma ativa desenvolvendo suas próprias tecnologias
com a ajuda dos pesquisadores que atuam como colaboradores ativos. As culturas
agronômicas são manejadas com baixo aporte de insumos agrícolas, de modo que
modifica-se a variedade para que ela possa se adaptar ao local de plantio e não se altera
o meio para ajustá-lo ao cultivar, portanto, a interferência do homem no sítio de cultivo é
menor, causando menos impacto ambiental.
Os agricultores são profundos conhecedores de suas culturas agronômicas,
avaliando constantemente suas lavouras e cultivando diversos materiais de várias
procedências. Assim, são fontes de informações preciosas para os pesquisadores. Eles
reconhecem, por suas experiências em decorrência de suas vivências no campo,
variedades com diversas performances em variados meios de cultivo sob uma gama
enorme de condições agroecológicas.
Eles permitem que ocorra a livre polinização entre plantas, favorecendo a produção
de híbridos com enriquecimento da agrobiodiversidade ou, para impedir a mistura, a
evitam; separando um indivíduo de outro, ao afastá-los, estimulando a autopolinização,
promovendo a formação de linhagens, constituindo novas populações de parentais para
futuros cruzamentos. Como exemplo de plantas predominantemente autógamas, tem-se:
Catharanthus roseus (Vinca), Ocimum basilicum (Manjericão) e Ocimum selloi (Alfavaca)
e, de alógamas, tem-se: Apium graveolens (Aipo), Cynara scolymus (Alcachofra),
Foeniculum vulgare (Funcho), Helianthus annuus (Girassol), Petroselinum crispum
(Salsa), Rheum officinale (Ruibarbo) e Rosmarinus officinalis (Alecrim).
A seleção é realizada quando as sementes que foram obtidas de uma safra e
guardadas, são, em outra, cultivadas. A intensidade seletiva é alta se poucas plantas são
escolhidas e, baixa, se muitas plantas são selecionadas.
Os pesquisadores podem documentar o fluxo de sementes que entram e saem do
campo via coleta, troca, compra e venda de material vegetal entre agricultores de várias
áreas e de diversas localidades. Não se pode deixar de mencionar que além das
variedades tradicionais, há as modernas, cujas sementes são obtidas livremente em
mercados locais.
Serão escolhidos pelos pesquisadores, os agricultores que demonstrarem
predisposição em colaborar e possuirem conhecimento sobre a prática agrícola e o
manejo cultural (Destaca - se o Ser Humano); os locais de plantio que apresentarem
diversidade intra e interespecífica (Enfatiza-se o Ecossistema) e as culturas agronômicas
que apresentarem valores sócio - econômicos para os membros da comunidade e não
tendo sido ainda alvo de programas de conservação (Valoriza-se as Espécies e os
Genes).
Com a ajuda dos cientistas, os lavradores vão agregar valor a seus produtos,
portanto gera-se renda e melhora a sua qualidade de vida e a de seus familiares. Cabe
evidenciar que para isto devem ser considerados os seguintes fatores, quais sejam: tipo
genérico, faixa etária, grau de escolaridade, classe social, posse da propriedade e opção
religiosa dos atores colaboradores. É muito importante também destacar o sentido de
pertença, a noção de envolvimento verdadeiro e a visão de informação compartilhada
entre eles.
3) - DESAFIOS:
A biodiversidade constituída por, principalmente, os recursos genéticos, está a
cada dia se tornando um dos elementos mais promissores para a sobrevivência dos seres
humanos, o que sobremaneira justificaria sua preservação. Esta pode ser feita por meio
de unidades de conservação, as quais são de uso direto, se representadas por áreas de
proteção ambiental e reservas extrativistas e, de uso indireto, se representadas por
parques federais, estaduais e municipais, reservas biológicas e estações ecológicas.
A conservação do germoplasma de plantas medicinais é, extremamente, relevante,
pois garante a sobrevivência de espécies ameaçadas de extinção devido à erosão
genética causada pelo desmatamento exacerbado, extrativismo desenfreado, aculturação
dos povos e vulnerabilidade genética.
A importância dos recursos genéticos vegetais, em especial as plantas medicinais,
é reconhecida nacional e internacionalmente, e sua preservação pode ajudar a solucionar
problemas de saúde humana e ambiental. O material vegetal pode ser mantido por
conservação ex situ e in situ. A primeira corresponde à manutenção do germoplasma fora
do seu ambiente original, longe da comunidade à qual pertence, principalmente, por ação
do homem. A decisão de se retirar à espécie de seu habitat natural, levando - a para o
meio com condições artificiais é baseada na estimativa de seu valor potencial e depende
de conhecimento suficiente sobre seu manejo para garantir sua sobrevivência em
situações controladas. Nela é exercida, a ação antrópica, com os métodos empregados
de cultivo e tratos culturais, condicionados a espaço e tempo disponíveis para executar
este manejo.
A segunda se traduz na manutenção das populações no ambiente em que estão
adaptadas, dentro da comunidade à qual pertencem. Envolve a proteção do habitat, além
de permitir a manutenção da diversidade genética e a evolução das espécies. A decisão
de não se retirar à espécie de seu habitat natural é para garantir a proteção de seus
genes, pois, às vezes, faz-se necessário para tal fim, preservar todo o seu ecossistema,
tendo como força seletiva atuando sobre ela, fatores diversos e adversos.
Esta modalidade de conservação é feita por meio de “reservas genéticas” que são
unidades dinâmicas que permitem o manejo adequado do germoplasma. São os
seguintes os critérios utilizados para a determinação se uma espécie é alvo deste tipo de
conservação: distribuição ecológica restrita, baixas densidades populacionais, reduzida
capacidade de regeneração natural, alto nível de exploração econômica e inexistência de
cultivos estabelecidos, além do habitat está vulnerável ou ameaçado.
Os recursos genéticos são representados pelas espécies cultivadas mais as
silvestres que oferecem genes às lavouras, por hibridação, via fluxo gênico, as doenças e
pragas que forçam a expressão de novas combinações alélicas e mutantes resistentes e,
finalmente, as ervas daninhas que pressionam a adaptação fenotípica à competição;
podendo estimular a co - evolução. Enfatiza-se ainda, a atuação de componentes
ambientais estressantes.
Dentro deste contexto, insere-se a conservação on farm, uma vez que a espécie
cultivada está sendo mantida em seu habitat original, ou seja, seu local de plantio;
experimentando tanto a seleção natural quanto a artificial, portanto em evolução
permanente. Assim, caracteriza-se por ser o contínuo plantio das culturas ou sua
manutenção, safra após safra, no campo, sob a forma de lavouras, pastagens e florestas.
Os agricultores podem descartar ou preservar suas variedades. Se ela é útil, de
forma direta ou indireta, é mantida; caso contrário, se não traz qualquer benefício ou
vantagem; é eliminada. Portanto, se ela tem produtividade associada à estabilidade de
rendimento, ela é conservada (Adoção). Se ela não tem nem produtividade, nem
estabilidade de rendimento, ela não é preservada (Rejeição). Por outro lado, às vezes,
para os pequenos agricultores, principalmente, aqueles envolvidos na agricultura familiar,
que primam sobretudo, pela sobrevivência, estabilidade é preferida à produtividade.
Uma cultura somente é conservada sob cultivo safra após safra se ela for mais
competitiva que outra, contribuindo para a segurança alimentar de produtores e
consumidores, pois se há demanda pelos produtos deve haver oferta e, obviamente,
verifica-se a possibilidade de novos mercados.
De acordo com as tradições, costumes e hábitos dos agricultores uma variedade /
cultivar com alto rendimento pode ser descartada se não atender às preferências dos
produtores / consumidores locais. Ao não se eliminar uma planta que não produz bem ou
que não tenha forma, sabor, volume, aroma e textura aceitáveis no mercado, está
diminuindo-se o risco das perdas por extinção e garantindo a segurança alimentar dos
agricultores e de seus familiares.
A importância das espécies que não foram abandonadas é dada pela intensidade,
tipo e multiplicidade de uso, grau de facilidade ou dificuldade de substituição de uma
cultura por outra, memória e persistência de uso em relação a mudanças culturais, papel
em ritual, cerimônia, folclore ou como simbolismo. Portanto, cabe enfatizar a influência do
componente sócio - político - econômico e cultural na preservação da agrobiodiversidade.
Um problema a ser enfrentado é a manutenção de genótipos inferiores pelos
agricultores e o outro é substituição de uma variedade primitiva ou obsoleta por outra
moderna. O primeiro, reduz a resposta genética resultante da seleção, pois indivíduos não
eliminados mantêm sua contribuição ao fluxo gênico, essencialmente, reduzindo a
intensidade de seleção, isto explicaria a domesticação ser tão lenta, justificando assim a
colaboração dos pesquisadores aos agricultores. O segundo conduz a erosão genética
pela perda de variabilidade genética, a matéria - prima básica da evolução e do
melhoramento vegetal por seleção seguida de hibridação e vice - versa.
Os pesquisadores devem interferir o mínimo possível junto aos agricultores, os
melhoristas podem simplesmente monitorar as práticas de cultivo e manejo dos recursos
genéticos, para garantir a manutenção da variabilidade genética, somente intervindo se
houver risco de abandono do germoplasma com conseqüente erosão genética; fazendo o
que for possível para contornar está situação.
As exigências dos agricultores podem diferir das prioridades dos pesquisadores,
pois os melhoristas freqüentemente não incluem a precocidade como uma característica
essencial no desenvolvimento dos ideótipos, porque ela está geralmente associada à
baixa produtividade, mas os camponeses sim, principalmente, os produtores com menor
poder aquisitivo com uma área reduzida de cultivo que produz pouco, porém rápido e
mais vezes.
Na pesquisa descentralizada e na participativa, há seleção dos agricultores nos
campos (A Igualdade). Já na descentralizada, há seleção dos pesquisadores nos campos
e, na participativa, há seleção dos agricultores em área experimental representada pela
estação de pesquisa institucional (A Diferença).
A seleção pode ser feita ou não no local onde a variedade será cultivada, o que se
verifica é que o germoplasma é melhorado em um sítio e cultivado em outro, o que implica
em interação genótipo x ambiente negativa.
Uma vez que a interação genótipo x ambiente constitui-se fator complicador ao
fitomelhoramento, as variedades com altas médias de produtividade a múltiplos sítios de
cultivo são selecionadas. Assim, variedades com uma performance relativamente “boa” a
alguns, mas nem todos locais onde foram testadas, são eliminadas juntos com as de
desempenho “ruim”.
Variedades com “boa” performance em locais desfavoráveis e “ruim” desempenho
em sítios favoráveis são também descartadas devido a baixas produtividades, sendo que
podem ser ideais para os pequenos agricultores em áreas marginalizadas de países em
desenvolvimento, especialmente, aqueles que associam-se à agricultura familiar.
Há interesses comuns entre os agricultores nas comunidades rurais. Entretanto, as
condições sócio - econômicas e culturais não são iguais entre eles. Portanto, seus
conhecimentos sobre a prática agrícola e o manejo cultural são variáveis. Contudo, as
soluções para os problemas comunitários devem resultar de consensos entre os seus
membros. Desta forma, o projeto de conservação on farm e melhoramento participativo
deve ser elaborado com o envolvimento de todos os atores, sendo baseado em soluções
a serem dadas aos problemas fitotécnicos da comunidade trabalhada.
A identificação pelos pesquisadores em conjunto com os agricultores dos
problemas como o desemprego elevado e a pobreza acentuada que podem ser
solucionados pela geração de emprego e renda, por meio da utilização de espécies mais
produtivas sob condições adversas, poderá levar ao compartilhamento entre ambos das
decisões relativas às características das novas variedades a serem produzidas conforme
as necessidades das populações negligenciadas pela sociedade em geral, composta por
pequenos agricultores marginalizados pelo sistema capitalista vigente.
Para ocorrer à cooperação, devem existir laços de confiança mútua estabelecidos
pelos atores locais e profissionais envolvidos, via análise conjunta dos problemas
existentes na comunidade agrícola e de suas possíveis soluções, de modo a atender as
necessidades prioritárias dos agricultores.
As dificuldades em se obter a participação efetiva dos agricultores são devidas a
diferentes pontos de vista, níveis de conhecimento, métodos e técnicas, necessidades,
instrumentos, equipamentos e ferramentas, etc. Para reverter esta situação é preciso
identificar os prováveis colaboradores em potencial, justificar a importância dos
procedimentos metodológicos para os diferentes atores envolvidos no processo de
tomada de decisão, realizar uma discussão ampla sobre o projeto com os seus co-
executores, definir os níveis de participação dos parceiros do trabalho e conduzir
exercício participativo com os colaboradores.
O conhecimento tradicional configura-se em vários planos, sendo fragmentado,
difuso e resultante de interações descontínuas entre atores internos quanto externos às
comunidades. Os pesquisadores enquanto agentes externos são participantes efetivos,
iniciadores, estimuladores, facilitadores, mediadores e catalizadores. Os agricultores
como agentes internos são participantes ativos, experientes, criativos e inovadores.
Acomodações, negociações e conflitos entre participantes surgem, normalmente,
devido a interesses distintos dos envolvidos, portanto, a intervenção deve ser
administrativa com aprendizagem dinâmica e adaptativa planejada com recursos
negociáveis, a partir do trabalho colaborativo com diálogo responsável, permitindo
negociar propostas; melhorando a qualidade das decisões, uma vez que as pessoas
envolvidas conhecem de perto, via convívio com a cultura, suas principais características.
O processo de ensino - aprendizagem encontra-se sempre em aberto, sendo que a
compreensão das ações, causas e efeitos da pesquisa se dá pela interação entre os
diferentes atores envolvidos.
Para que se chegue a um futuro melhor, devem ser enfrentados, os seguintes
desafios, quais sejam: o de gerar tecnologia que nos aproxime dos países prósperos. E,
não menos importante, é o de diminuir a desigualdade social e a concentração de
renda. O que a questão do melhoramento genético de plantas medicinais pode contribuir
nestes desafios? Como fonte para pesquisas e geração de tecnologias para produção de
substâncias que servirão de matéria-prima para a indústria farmacêutica a partir de
cultivos racionais, evitando o extrativismo puro e simples.
O uso de plantas medicinais produtivamente mais estáveis, aumentando a
confiabilidade da fitoterapia nas diferentes regiões do país, constitui-se também em um
grande desafio a ser superado. Portanto, cabe salientar que a formação de centros de
pesquisa no desenvolvimento de cultivares adaptadas às necessidades de cada região é
uma realidade a ser alcançada, uma vez que a produção de princípios ativos é
imensamente variável em função do local de cultivo.
As plantas medicinais são encontradas por todo o Brasil, tendo o cultivo facilitado
em locais com comunidades mais pobres, como por exemplo o Nordeste; não
necessitando, por conseguinte, de grande dispêndio para esta cultura; além do que, a
maioria das espécies estão próximo ao estado silvestre, o que possibilita a seleção de
cultivares para estas condições. Consequentemente, à utilização dos recursos vegetais,
tais como: as plantas medicinais, deve-se seguir a conservação.
4) - AVANÇOS:
A seleção varietal implica na tomada de decisão pelos agricultores em manter,
incorporar ou descartar os cultivares, como resultado, tem-se a diversidade das
variedades no campo, sob a forma de lavouras. Assim, a variabilidade genética poderia
aumentar se houvesse mais adoção do que rejeição de germoplasma. As variedades
podem ser adquiridas pela compra ou via troca de sementes entre produtores, sendo
mantidas por cultivo.
Os produtores continuamente avaliam suas lavouras. Em um momento, procuram
saber como as culturas agronômicas desempenham-se com base em um único critério de
seleção, em outro, ranqueiam a performance destas, face a cada um dos diferentes
parâmetros escolhidos. Finalmente, testam uma contra a outra. Assim, é para toda e
qualquer espécie agrícola, inclusive as plantas medicinais.
Os interesses dos fazendeiros variam com base em seus perfis sócio - econômico
e culturais e nas condições agroecológicas de suas fazendas, sítios, chácaras, etc. Desde
que as ansiedades, desejos, necessidades e prioridades dos agricultores alteram-se no
tempo e modificam-se no espaço, tem-se que a performance de uma variedade para um
traço pode ser “ótima” e para outro “péssima”. Portanto, é sabido que diversas variedades
são mantidas sob cultivo, de tal forma que umas complementariam as outras.
Esta variabilidade genética constitui-se em fonte estratégica de germoplasma,
entretanto, seu valor apresenta-se aparentemente reprimido pelo desconhecimento de
suas possibilidades sócio - econômicas para o agronegócio loco - regional, o que remete
a necessidade de se realizar pesquisas nesta área de infinitas possibilidades e
oportunidades.
Os produtores selecionam as variedades a serem cultivadas e destas escolhem as
sementes que irão compor a próxima safra. Eles as mantêm separadas para garantir a
integridade da espécie, a qual pode ser perdida por hibridação, o que não é problema
para as autógamas e as de propagação vegetativa, mas sim para as alógamas. Cabe
enfatizar que há plantas que são intermediárias entre auto (fecundação) polinização e
polinização (fecundação) cruzada.
No melhoramento, busca-se com a reprodução sexuada a variabilidade genética,
que é explorada na tentativa de se selecionar genótipos superiores em detrimento dos
inferiores. Para fixação dos genótipos desejáveis, usa-se a reprodução assexuada, no
intuito de se evitar a perda dos caracteres desejados, caso fossem sexualmente
propagados; portanto, ambos os modos de reprodução têm sua devida importância para a
melhoria genética de plantas.
As espécies medicinais que apresentam reprodução sexuada são: Artemisia annua
(Artemísia), Bauhinia forficata (Pata-de-Vaca), Calendula officinalis (Calêndula),
Foeniculum vulgare (Funcho) e Plantago major (Tanchagem); sexuadas e assexuada são:
Ocimum spp. (Alfavaca, Manjericão), Rosmarinus officinalis (Alecrim) e Ruta graveolens
(Arruda) e assexuada são: Achillea millefolium (Mil - Folhas), Aloe vera (Babosa), Mentha
pulegium (Poejo) e Mikania glomerata (Guaco). Há espécies que se reproduzem por
apomixia, tais como: Cymbopogon citratus (Capim-Cidreira) e Hypericum perforatum
(Hipérico).
As variedades desenvolvidas pelos agricultores são distintas das que foram criadas
pelos melhoristas, pois não podem ser patenteadas, o que também é válido para as
plantas aromáticas, condimentares e medicinais. Para serem oficialmente registradas,
elas teriam que possuir estabilidade, uniformidade e homogeneidade genética. Estes
critérios dificilmente são preenchidos para as variedades tradicionais com suas sementes
crioulas por terem ampla variabilidade genética, portanto, seu uso legal torna-se
praticamente impossível, o que é lamentável em neste país.
A informação é, geralmente, transmitida de um agricultor para o outro através das
gerações. A comunicação entre produtores é fundamental para a manutenção da
biodiversidade agrícola, pois facilita a determinação de práticas mais eficientes de manejo
do germoplasma disponível, ao difundir os conhecimentos tradicionais obtidos para fins
tanto conservacionistas quanto utilitaristas.
5) - OPORTUNIDADES:
No processo de conservação on farm e melhoramento participativo, toda a atenção
é voltada para o desenvolvimento tecnológico e sócio - econômico dos agricultores com
parcos recursos financeiros, os quais apresentam as seguintes características em
comum: realizam agricultura familiar, ocupam áreas marginais, dedicam-se às culturas de
subsistência, dispõem de pequenas áreas, usam pouca ou nenhuma tecnologia, têm difícil
acesso a novas variedades adaptadas a seus sistemas de cultivo e são resistentes à idéia
de mudanças em seus sistemas de produção.
A pesquisa genética participativa serve para garantir o acesso ao germoplasma
disponível e maior controle pelos agricultores do material vegetal sob a forma de
variedades e / ou cultivares por eles utilizadas; melhorando, sobremaneira, as condições
de vida destes em áreas marginais, proporcionando-lhes inclusão social e cidadania pela
independência econômica; preservando a diversidade biológica em todos os seus níveis,
quais sejam: espécies, genes e ecossistemas, estimulando a adaptação das culturas aos
locais de plantio e mantendo a contínua evolução das espécies - alvo que sofrem
paulatinamente as pressões seletivas por parte de fatores bióticos e abióticos.
A melhor estratégia para a conservação racional e utilização sustentável da
agrobiodiversidade é investir no “empowerment” da comunidade local, afim de se obter
sistemas agrícolas mais produtivos, estáveis e sustentáveis, pois os métodos científicos
convencionais e os arranjos institucionais obsoletos nem sempre são eficientes para se
lidar com a complexidade embutida nos fatores biofísicos e sócio - políticos que resultam
na erosão genética pelo extrativismo do germoplasma.
Atualmente, tem-se observado uma crescente confiança das sociedades
industrializadas nos remédios naturais, baseados nos conhecimentos tradicionalmente
difundidos pela medicina popular, fato que aumenta a demanda destes insumos
sem que se observem, no entanto, iniciativas de cultivo daquelas espécies mais
utilizadas.
Vários são os exemplos de espécies medicinais brasileiras, em que laboratórios
internacionais possuem domínio da tecnologia de produção, como é o caso do jaborandi,
dos quais se extraem a pilocarpina. Este princípio ativo não pode ser sintetizado, por sua
síntese não ser economicamente viável, sendo assim, como acontece com diversos
outros fármacos, ele deve ser extraído diretamente das plantas.
A exploração de recursos genéticos de plantas medicinais no país encontra-se
relacionada, em grande parte, a atividades extrativistas baseadas em coleta extensiva de
material silvestre, com baixo aproveitamento e considerável desperdício. Muitas plantas
até hoje são extraídas de florestas e matas.
Este extrativismo pode levar muitas das espécies medicinais à extinção, isto é, no
futuro diversas plantas que os ancestrais conheciam poderão não existir mais. Também,
plantas obtidas desta forma, em geral, apresentam grande variação na sua constituição
química de suas substâncias, dadas as diferentes condições ambientais em que são
coletadas.
A proibição da importação de ervas e seus derivados gerou enorme pressão sobre
os laboratórios farmacêuticos que manipulam estes compostos. Esta pressão, por sua
vez, incentivou o surgimento de pequenos empreendimentos agrícolas de plantas
medicinais. Entretanto, estes agricultores têm encontrado dificuldades tanto na obtenção
de mudas e sementes para o plantio, como na obtenção de informações sobre o cultivo
das diferentes espécies.
A improvisação a que foram obrigados estes produtores tem sido a causa de
inúmeros erros, até mesmo na determinação do nome científico das espécies que
cultivam. O cultivo das plantas medicinais é uma alternativa viável tanto para conservá-las
quanto para utilizá-las, garantindo um fornecimento com qualidade adequada e na
quantidade apropriada.
Um passo importante que é preciso para se estabelecer uma proposta racional de
trabalho é definir localmente as espécies medicinais a serem estudadas, em seus
diferentes níveis de prioridades, dadas às necessidades das populações mais carentes.
Outro passo relevante é estabelecer o cultivo seguido do manejo das culturas
agronômicas para a distribuição dos produtos fitoterápicos. Cabe destacar a importância
da medicina tradicional do ponto de vista sócio-econômico-político e cultural bem como
ambiental, ao permitir formulações mais simples dos remédios obtidos a partir de plantas,
uma vez que estes, normalmente, não apresentam efeitos colaterais, sendo amplamente
acessíveis, com baixos custos de obtenção e/ou sem ônus adicional de produção por
parte das comunidades de baixa renda.
Neste sentido, a constituição de pomares domésticos comunitários como
verdadeiros bancos de germoplasma viabilizaria a efetiva conservação das plantas
medicinais, ao passo que as boticas da natureza, os jardins da saúde e as
farmácias-vivas difundem a utilização dos produtos fitoterápicos nas classes menos
privilegiadas, promovendo assim valorização da cidadania pela inclusão social. Portanto,
como impacto dos estudos com plantas medicinais na sociedade, tem-se:
1) Valorização dos conhecimentos tradicionais das comunidades assistidas, na busca por
saúde e bem estar social,
2) Ampliação do conhecimento etnofarmacológico de educadores, pesquisadores e
extensionistas sobre as plantas medicinais mais utilizadas nas áreas estudadas,
3) Promoção da melhoria da qualidade de vida das populações carentes por meio da
criação de farmácias-vivas, as quais são instrumentos efetivos de promoção da
inclusão social,
4) Diminuição do impacto ambiental advindo da atividade coletora extrativista, pela
implementação dos jardins da saúde como boticas da natureza, que se tornarão
bancos de germoplasma ativos,
5) Formação de cooperativas para comercialização dos produtos fitoterápicos, fomentada
pela ação integradora entre comunidade e universidade,
6) Geração de renda complementar para pequenos produtores e suas famílias, com base
na venda de produtos e serviços das cooperativas, proporcionando desta forma o pleno
exercício da cidadania,
7) Promover o conhecimento para a conservação e a utilização sustentável da
biodiversidade e dos recursos genéticos e a repartição justa e eqüitativa dos
benefícios derivados de seu uso direto e / ou indireto.
O extrativismo é a principal atividade econômica dos povos tradicionais, o que tem
se mostrado instável por estar apoiado em um número bastante restrito de espécies
vegetais, apesar da alta diversidade florística regional e de suas potencialidades. A
seleção de germoplasma com reconhecido potencial de uso pelas comunidades locais,
visando à diversificação dos sistemas de produção regional e de ações em conservação,
manejo e utilização das culturas agronômicas é fundamental para a estabilidade desta
economia.
No enfrentamento da perda de variabilidade genética, torna-se necessária uma
abordagem integrada, capaz de combinar ensino, pesquisa e extensão com valores
humanísticos da sociedade organizada em prol das comunidades carentes.
Os grupos sociais rurais apartados da modernização são, essencialmente,
preservacionistas no que tange à manutenção da biodiversidade agrícola, face à
combinação secular, ou mesmo, milenar de adaptação cultural e valores éticos superiores
aos da sociedade urbana e industrial. O gerenciamento da pesquisa em conjunto leva ao
senso de pertencimento ao projeto, o que resulta em “empowerment”.
A conservação on farm e o melhoramento participativo surgem como uma proposta
de desenvolvimento sinérgico e não hierárquico, que se estabelece através de relações
mútuas de poder entre o pensar e o agir, o decidir e o executar, assumindo como princípio
que a efetividade de um processo está na capacidade de entender que o poder emana da
responsabilidade de cada um e da coletividade e não da posição hierárquica que ocupa
na organização.
Os pesquisadores retornam os achados, as descobertas e os resultados de suas
pesquisas à sociedade civil, representada pelos consumidores e produtores, agregando
valor aos produtos gerados por diversificar o uso dos produtos e de seus derivados,
aproveitar os seus subprodutos e transformar um produto em outro. No caso de plantas
com princípios ativos, pode-se participar de feiras livres, implantar hortas populares,
promover as boticas da natureza, oferecer farmácias vivas e estimular jardins de saúde.
Atualmente, também tem-se os bancos de sementes comunitárias.
Os melhoristas e seus colaboradores ao exercerem o poder de forma cooperativa
potencializam o grupo, o que se estabelece a partir da identificação de objetivos comuns e
/ ou complementares, efetivando-se com a participação de todos os envolvidos no
processo, possibilitando uma maior coerência entre a teoria pelo discurso e a prática pela
experiência, pois as comunidades locais exploram, preservam e enriquecem a
biodiversidade agrícola, contudo é preciso reforçar e, sobretudo, revitalizar os sistemas
tradicionais de produção e os processos sócio - político e culturais que estimulam e
favorecem o desenvolvimento e o aprimoramento do conhecimento sobre os recursos
genéticos vegetais.
Um bom caminho para que se possa valorizar as plantas medicinais é treinar
multiplicadores ética e moralmente comprometidos com a sociedade e com o bem - estar
da humanidade. Prima-se por trabalhos em espécies amplamente utilizadas em todo
território nacional, dando enfoque loco - regional, bem como as que constam das listas
oficiais. Nestas espécies pode se priorizar o óleo essencial, como por exemplo em
Artemisia annua (Artemísia), Calendula officinalis (Calêndula), Chamomilla recutita
(Camomila), Mentha spp. (Hortelãs) e Ocimum spp. (Alfavaca e Manjericão); a produção
de alcalóides como por exemplo em Catharanthus roseus (Vinca), Datura spp. e Solanum
spp. (Trombeteiras), Pilocarpus spp. (Jaborandi), dentre outras substâncias
fármaco - ativas.
Das espécies utilizadas, umas são nativas, dentre as quais se destacam:
Achyrocline satureioides (Macela), Ageratum conyzoides (Mentrasto), Cephaelis
ipecacuanha (Ipecacuanha), Lippia sidoides (Alecrim-Pimenta), Maytenus ilicifolia
(Espinheira-Santa), Mikania glomerata (Guaco), Pilocarpus jaborandi (Jaborandi),
Pilocarpus microphyllus (Jaborandi) e Stevia rebaudiana (Estévia) e outras exóticas, quais
sejam: Achillea millefolium (Mil-Folhas), Calendula officinalis (Calêndula), Chamomilla
recutita (Camomila), Foeniculum vulgare (Funcho), Melissa officinalis (Erva-Cidreira),
Phyllanthus niruri (Quebra-Pedra), Plantago major (Tanchagem), Ruta graveolens
(Arruda), Salvia officinalis (Sálvia), Taraxacum officinale (Dente-de-Leão), Thymus
vulgaris (Tomilho), Bauhinia forficata (Pata-de-Vaca), Chrysanthemum parthenium
(Artemísia), Cnicus benedictus (Cardo-santo), Cymbopogon citratus (Capim-Cidreira),
Leonurus sibiricus (Macaé), Polygonum acre (Erva-de-Bicho), Symphytum officinale
(Confrei), Aloe vera (Babosa), Catharanthus roseus (Vinca), Vernonia condensata (Boldo),
Bidens pilosa (Picão), Chenopodium ambrosioides (Erva-de-Santa-Maria) e Tropaeolum
majus (Capuchinha).
No país, em geral, as plantas exóticas estão em processo de melhoramento mais
avançado que as nativas, no entanto, ambas possuem germoplasma que pode ser
explorado com sucesso. Deve-se estudar, prioritariamente, as espécies nativas para que
se possa validar suas propriedades terapêuticas antes que outros o façam, de modo a
desenvolver as indústrias farmacêuticas nacionais, pois se esta tarefa não se iniciar
imediatamente, os fortes concorrentes internacionais sairão na frente e pode-se não
alcançá-los mais! Portanto, as ações conservacionistas e utilitaristas que recaem sobre os
recursos genéticos vegetais são a bandeira da conservação on farm e do melhoramento
participativo, traduzindo o ato de conservar em seu meio e o de utilizar o seu fim. Vamos
à luta melhoristas!
Principais Literaturas Consultadas
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