Matrizes Raven - Validacao Portugal

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Faculdade de Psicologia e de Cincias da Educao Universidade de Coimbra

Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven:Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Slvia Manuela dos Reis Brites

Professores Orientadores: Professor Doutor Mrio Rodrigues Simes Professora Doutora Maria Joo Seabra-Santos

Mestrado em Psicologia, rea de especializao em Avaliao Psicolgica

Faculdade de Psicologia e de Cincias da Educao

Universidade de Coimbra

Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven:Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Slvia Manuela dos Reis Brites

Dissertao de Mestrado em Psicologia, rea de especializao em Avaliao Psicolgica apresentada Faculdade de Psicologia e de Cincias da Educao da Universidade de Coimbra e realizada sob a orientao do Prof. Doutor Mrio Rodrigues Simes e da Prof. Doutora Maria Joo Seabra-Santos

Coimbra, 2009

Na linha do horizonte sonhei!Sentada na linha do horizonte, desta vida Olhei volta e nada parecia o que era Pensei, por momentos estar perdida Envolta no sufoco de uma outra esfera Fechei os olhos, para deixar de ver a minha ferida Deixar de sentir, esta vida assim austera Que irradia um pr-do-sol na despedida Para me fazer crer, numa outra quimera! Abri o meu corao e acreditei Feliz comigo e com tudo aquilo que amei Que tudo isto um dia iria passar Um dia, sei que irei compreender Que a razo de todo este meu perder Anuncia um castelo onde reina o meu sonhar!(Por Ftima Martins, 2005)

Dedico este trabalho aos nossos dois anjos e a ti, Pit

III

AGRADECIMENTOSAgradeo a todas as pessoas que, de forma significativa, fizeram com que este trabalho fosse possvel:

Ao Professor Doutor Mrio Rodrigues Simes e Professora Doutora Maria Joo SeabraSantos pela orientao, doutrina, dedicao, rigor, incentivo, pacincia e amizade; Professora Doutora Maria Salom Pinho pelo ensinamento, preocupao e amizade; Dra. Teresa Urbano pela simpatia e amabilidade; Aos meus colegas pela entreajuda; minha famlia pelos valores, carinho e amor; Aos meus amigos pelo apoio e incentivo, especialmente s 5M, ngela Moreira, ao Lus Simes, ao Nuno Santos e Ana Sofia Canio; Carla Botas pelo companheirismo, encorajamento e amizade incondicional; Ao Professor Doutor Carlos Lopes Pires e colegas pela fora, afeio e altrusmo; Ao Dr. Rui Nogueira pela ininterrupta ajuda e estima; Ao Eng. Chaves pela humildade e conhecimento; Ao Dr. Artur Costa e Escola Social pelo alento e nimo; Expectativa, especialmente Carina Nunes e Susete Rasteiro, pela incessvel compreenso, reforo, ternura e suporte; Clia Vieira por tornar sempre tudo to especial; Ftima Teixeira pelos ensinamentos de vida e pela luz que constantemente transmite; A todas as Escolas, Educadores e Crianas pela disponibilidade e colaborao.

Muito Obrigada!

IV

RESUMOA Inteligncia inclui a capacidade mental de raciocinar, resolver problemas, planear, compreender ideias e aprender, sendo tradicionalmente examinada por instrumentos de avaliao fundamentados do ponto de vista terico, psicomtrico e normativo. O incremento de instrumentos disponveis que possibilitem precocemente, em idades pr-escolares, a avaliao da inteligncia corresponde no nosso pas a uma necessidade sentida pelos profissionais. O teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR; Raven, 1947; Simes, 2000) um dos instrumentos de avaliao da inteligncia no verbal mais utilizados neste contexto. Porm, em Portugal no existem estudos publicados com esta prova em idade pr-escolar. Na presente investigao foi observada uma amostra de 210 crianas, de ambos os sexos, com desempenho escolar normal e frequncia do pr-escolar e primeiro ciclo, oriundas de 8 agrupamentos de escolas do Distrito de Leiria, maioritariamente provenientes de escolas pblicas, com o objectivo de estudar as caractersticas psicomtricas e obter dados normativos numa faixa etria entre os 4 anos e 0 meses e os 6 anos e 11 meses. Para efeitos de estratificao da amostra consideraram-se adicionalmente as percentagens nacionais relativas s reas de residncia (urbana/rural). Os estudos psicomtricos incluram o exame da preciso: (i) a estabilidade temporal testereteste com um intervalo de 3 semanas (r = .75); e (ii) a anlise da consistncia interna (alfa de Cronbach = .73). Os estudos de validade com o teste das MPCR foram realizados com base numa amostra de 25 crianas e no recurso a 2 subtestes da WPPSI-R (Quadrados e Vocabulrio) (Wechsler, 2003), ao teste do Desenho da Figura Humana (DAP; Naglieri, 1988) e ao Rivermead Behavioural Memory Test for Children (RBMT-C; Wilson, Ivani-Chalian & Aldrich, 1991). As correlaes mais elevadas foram observadas entre pontuaes nas MPCR e os subtestes de Vocabulrio (r = .65) e Quadrados (r = .56) da WPPSI-R, tendo sido obtidas correlaes relativamente baixas com as pontuaes no RBMT-C (r = .39) e DAP (r = .20). Do ponto de vista normativo e de acordo com o esperado observado um incremento sistemtico e progressivo dos resultados com a idade. Considerados globalmente, os resultados da presente investigao apontam para valores de preciso e validade aceitveis, sugerindo que o teste das MPCR pode ser utilizado com utilidade nestas faixas etrias.

PALAVRAS-CHAVE: Inteligncia; Avaliao Psicolgica; Idade Pr-Escolar; Matrizes Progressivas Coloridas de Raven; Estudos psicomtricos; Normas.

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ABSTRACTIntelligence includes the mental ability to think, to solve problems, to plan, to understand ideas and to learn, traditionally examined using assessment instruments funded from a theoretical and psychometric point of view. Nevertheless, the need of available instruments that enable the early assessment of intelligence in preschool children is strongly felt by professionals in our country. The Ravens Coloured Progressive Matrices Test (RCPM; Raven, 1947; Simes, 2000) is one of the most used instruments of assessment instruments of non-verbal intelligence in this context. In Portugal there arent any published studies with this instrument in preschool children. In this research a sample of 210 children of both genders was observed, with normal school attendance of in preschool and first grade, from eight school groups of the District of Leiria, mostly from public schools, with the aim of getting information on children aged between 4 and 0 months and 6 years and 11 months. The national percentages concerning the areas of residence (urban/rural) were also taken into account in the samples selection. The psychometric studies included reliability check: (i) test-retest with a three week interval (r=.75); and (ii) the analysis of internal consistency (Cronbach Alpha =.73). Validity studies with the RCPM were accomplished with a sample of 25 children and the following tests were used as criteria: WPPSI-R Block Design and Vocabulary subtests (Wechsler, 2003); Draw a Person Test (DAP; Naglieri, 1988); and the Rivermead Behavioural Memory Test for Children (RBMT-C; Wilson, Ivani-Chalian & Aldrich, 1991). The highest correlations were observed between the scores obtained in RCPM and in the Vocabulary subtest (r=.65) and Block Design subtest (r= .56) of WPPSI-R and relatively low correlations were obtained with RBMT-C (r=.39) and DAP (r= .20). In what standardization is concerned and as expected, a systematic and progressive increase of results with age was observed. Globally considered, the results of this research point to acceptable values of reliability and validity, suggesting that RCPM test is useful in these ages.

KEY-WORDS: Intelligence; Psychological Assessment; Preschool Children; Ravens Coloured Progressive Matrices; Psychometric studies; Norms.

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RESUMLintelligence consiste la capacit mentale de penser, de rsoudre des problmes, de planifier, de comprendre des ides et dapprendre, traditionnellement examine par des instruments dvaluation fonds sur un point de vue thorique, psychomtrique et normatif. Laugmentation du nombre dinstruments disponibles, qui permettent tt en ge prscolaire, lvaluation de lintelligence correspond un besoin ressenti par les professionnels. Le test des Matrices Progressives Couleurs de Raven (MPCR; Raven, 1947; Simes, 2000) est, dans ce contexte, lun des instruments dvaluation de lintelligence non-verbale les plus utiliss. Au Portugal, il nexiste aucune tude publie avec ce test en ge prscolaire. Dans la prsente recherche, il ft observ un chantillon de 210 enfants des deux genres, avec une performance scolaire normale du prscolaire et de la primaire, venant de 8 groupes scolaires de la rgion de Leiria, en majorit provenant dcoles publiques, avec lobjectif dtudier les caractristiques psychomtriques et dobtenir des donnes normatives pour les enfants gs de 4 ans et 0 mois 6 ans et 11 mois. Dans le but de stratifier lchantillon, on a considr aussi les pourcentages nationaux relatifs aux rgions de rsidence (urbaine/rurale). Les tudes psychomtriques incluent l examen de la fiabilit/prcision: (i) la stabilit temporelle test-retest avec un intervalle de 3 semaines (r=.75); et (ii) une analyse de la consistance interne (Alpha de Cronbach=.73). Les tudes de validit du test MPCR ont t ralises avec un chantillon de 25 enfants et laide de 2 tests (Carrs et Vocabulaire) de la WPPSI-R (Wechsler, 2003), du test Draw a Person (DAP; Naglieiri, 1988) et du Rivermead Behavioural Memory Test For Children (RBMT-C; Wilson, Ivani-Chalian & Aldrich, 1991). Les corrlations les plus leves ont t observes entre les rsultats des MPCR et des tests de Vocabulaire (r=.65) et des Carrs (r=.56) de la WPPSI-R et on a obtenu des corrlations relativement faibles avec le RBMT-C (r=.39) et le DAP (r=.20). Dun point de vue normatif et selon les attendus on observe une augmentation systmatique et progressive des rsultats avec lge. Considrs globalement, les rsultats de la prsente recherche indiquent des valeurs de fiabilit/prcision et validit acceptables, suggrant que le test des MPCR peut tre utile dans ces ges.

MOTS-CLEFS: Intelligence; valuation psychologique; ge prscolaire; Matrices Progressives Couleurs de Raven; tudes Psychomtriques; Normes.

VII

NDICEINTRODUO .................................................................................................................. 1 PARTE I ENQUADRAMENTO TERICO....................................................................... 9 CAP. 1: AVALIAO DA INTELIGNCIA DE CRIANAS EM IDADE PR-ESCOLAR ....................... 9 1.1 PRINCIPAIS TESTES DE AVALIAO DA INTELIGNCIA PARA CRIANAS EM IDADE PRESCOLAR ....................................................................................................................... 16 1.1.1 TESTES DE INTELIGNCIA NO-VERBAL ............................................................... 26 CAP. 2: O TESTE DAS MATRIZES PROGRESSIVAS COLORIDAS DE RAVEN ............................... 33 2.1 FUNDAMENTAO TERICA: HISTRIA DA PROVA ....................................................... 34 2.2 COMPOSIO E DIMENSES AVALIADAS ...................................................................... 35 2.3 POPULAO-ALVO.................................................................................................... 37 2.4 ESTUDOS REALIZADOS EM PORTUGAL ........................................................................ 38 2.4.1 DADOS QUANTITATIVOS DOS ITENS ..................................................................... 38 2.4.2 ESTUDOS RELATIVOS PRECISO ....................................................................... 39 2.4.2.1 CONSISTNCIA INTERNA ................................................................................. 39 2.4.2.2 ESTABILIDADE TEMPORAL TESTE-RETESTE ...................................................... 39 2.4.3 ESTUDOS RELATIVOS VALIDADE....................................................................... 40 2.4.3.1 VALIDADE DE CONSTRUCTO ............................................................................ 40 2.4.3.2 VALIDADE CONCORRENTE .............................................................................. 40 2.4.4 ESTUDOS NORMATIVOS ...................................................................................... 44 2.5 AVALIAO CRTICA ................................................................................................. 44 2.5.1 VANTAGENS E POTENCIALIDADES ....................................................................... 44 2.5.2 LIMITAES ..................................................................................................... 45 PARTE II ESTUDOS DE NATUREZA EMPRICA ......................................................... 47 CAP. 3: ESTUDOS DO TESTE DAS MATRIZES PROGRESSIVAS COLORIDAS DE RAVEN COM CRIANAS DE IDADE PR-ESCOLAR ................................................................................. 47 3.1 OBJECTIVOS............................................................................................................. 47 3.2 METODOLOGIA ........................................................................................................ 48 3.2.1 AMOSTRA ......................................................................................................... 48 3.2.2 PROCEDIMENTO ................................................................................................ 51 3.2.3 INSTRUMENTOS ................................................................................................ 52 3.3. APRESENTAO, ANLISE E DISCUSSO DE RESULTADOS ............................................. 55 3.3.1 ANLISE DOS ITENS........................................................................................... 56 3.3.1.1 NDICES DE DIFICULDADE E DE DISCRIMINAO ................................................ 57 3.3.1.2 ANLISE DOS DISTRACTORES ........................................................................... 60 3.3.2 ESTUDOS RELATIVOS PRECISO ....................................................................... 62 3.3.2.1 CONSISTNCIA INTERNA ................................................................................. 63 3.3.2.2 ESTABILIDADE TEMPORAL TESTE-RETESTE ...................................................... 64 3.3.3 ESTUDOS RELATIVOS VALIDADE....................................................................... 66 3.3.3.1 VALIDADE DE CONSTRUCTO ............................................................................ 66 3.3.3.2 VALIDADE CONCORRENTE .......................................................................... 72 3.3.4 ESTUDOS NORMATIVOS ...................................................................................... 74 CONCLUSO .................................................................................................................. 78 BIBLIOGRAFIA............................................................................................................... 84

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NDICE DAS FIGURASFigura 1. Mapa do Distrito de Leiria (figuras extradas do Sistema Nacional de Informao Geogrfica). ................................................................................................................................................................................. 48 Figura 2. Scree Test de Cattell apontando para a reteno de 4 componentes............................................. 67

NDICE DOS QUADROSQuadro 1. Estrutura da ECCOS 4/7 e 4/10 ................................................................................................................... 20 Quadro 2. MPCR: Estudos de validade em Portugal (Adaptado de Simes, 2008) ..................................... 43 Quadro 3. Percentagens nacionais e da amostra segundo a rea de residncia (extradas do Sistema Nacional de Informao Geogrfica) ............................................................................................................................... 49 Quadro 4. Caracterizao sociodemogrfica da amostra ....................................................................................... 51 Quadro 5. Classificao da Inteligncia segundo as pontuaes finais da MPCR (adaptado de Raven, Court & Raven, 1998) ............................................................................................................................................................. 53 Quadro 6. MPCR: ndice de Dificuldade e ndice de Discriminao................................................................... 58 Quadro 7. Percentagens das alternativas de resposta da Srie A....................................................................... 60 Quadro 8. Percentagens das alternativas de resposta da Srie Ab .................................................................... 61 Quadro 9. Percentagens das alternativas de resposta da Srie B....................................................................... 61 Quadro 10. MPCR: Coeficientes de consistncia interna (por idade e para a amostra total) ................ 64 Quadro 11. MPCR: Estabilidade temporal teste-reteste ......................................................................................... 65 Quadro 12. MPCR: Anlise de Componentes Principais ......................................................................................... 69 Quadro 13. MPCR: Validade Concorrente com os subtestes Quadrados (WPPSI-R), Vocabulrio (WPPSI-R), RBMT-C e DAP .................................................................................................................................................. 73 Quadro 14. MPCR: Resultados em percentis segundo a idade ............................................................................ 75 Quadro 15. MPCR: Comparao entre os dados normativos em estudos portugueses de crianas com idades pr-escolares sobreponveis ...................................................................................................................... 76

NDICE DOS ANEXOSANEXO A. Principais aspectos a considerar na avaliao de crianas em Idade pr-escolar (Adaptado de Brassard & Bohem, 2007) .................................90 ANEXO B. Pedido de Autorizao aos Agrupamentos e aos Directores dos Jardins-de-Infncia 91 ANEXO C. Pedido de consentimento informado entregue aos Pais.93 ANEXO D. Modelo do Protocolo utilizado97

IX

Introduo 1

INTRODUOA Avaliao Psicolgica tem como objectivo a anlise cientfica do comportamento do sujeito, ou grupos de sujeitos, que se concretiza a partir de um processo que envolve tomada de decises. Tal processo tem implcita a formulao de hipteses, sendo estas, por sua vez, operacionalizadas atravs de um conjunto de procedimentos cientficos e de recolha de informao tais como testes, entrevistas e questionrios. A opo por tais procedimentos implica a quantificao dos comportamentos e a considerao das caractersticas ou propriedades do(s) sujeito(s) em causa, bem como do seu contexto (Fernndez-Ballesteros, 2005). Na verdade, a Avaliao Psicolgica um processo complexo de resposta a questes, composto por vrias fases e que utiliza vrios mtodos de anlise do comportamento do indivduo de forma a tentar resolver problemas. Pode ser utilizada em diferentes contextos e aplicada a populaes especficas constituindo um ponto de partida para a interveno, prolongando-se nesta. Vrias consideraes nos remetem para o relevante papel da avaliao psicolgica e, dentro desta, do recurso a testes, no exerccio da Psicologia. O uso dos testes foi, durante muito tempo, a nica actividade dos psiclogos numa rea em que eram considerados especialistas inquestionados (Simes, 1983). Inegavelmente, a avaliao psicolgica possibilita a obteno de informaes teis para a planificao, implementao e medida da interveno. Contudo, no um processo isento de crticas, que so teis numa perspectiva de preveno, mas no muito convincentes, pois limitam-se muitas vezes, a indicar argumentos resolvidos e ultrapassados, possuem falta de informao consistente, so repetitivas e simplistas. Por outro lado, algumas crticas so perfeitamente vlidas, uma vez que do consistncia a algumas dificuldades ou limites do mtodo dos testes e surgem como um foco de aperfeioamento dinmico, activo e produtivo. So, nomeadamente, crticas tecidas s insuficientes qualidades psicomtricas dos testes, s utilizaes abusivas dos mesmos e s consequncias sociais das constataes por vezes, feitas a partir dos resultados (Simes, 1994; Simes, 2005). importante salientar que, habitualmente, medir no constitui uma subjugao da qualidade quantidade (Pinho, 2002) e, por isso, os testes psicolgicos avaliam sistematicamente variveis ou diversos atributos psicolgicos que se pensa serem fundamentais na caracterizao ou compreenso do comportamento do indivduo (Simes, 2000). Estes instrumentos devem apresentar um conjunto de garantias cientficas, quer na sua construo, quer no seu uso (Fernndez-Ballesteros, 2005).

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Introduo 2

A ateno ao papel da avaliao e interveno psicolgica no pr-escolar revelouse crescente ao longo das ltimas dcadas. Este interesse est relacionado com o facto de a investigao verificar que a interveno deve ocorrer o mais cedo possvel na vida de qualquer criana, com o intuito de se minimizarem os efeitos das dificuldades diagnosticadas. Este corrente e popular foco da interveno nos primeiros anos de vida resultou na necessidade dos psiclogos e outros profissionais qualificados se tornarem familiarizados com testes de avaliao aplicados a crianas em idade pr-escolar (Kenny & Culbertson, 1993, cit. por Saye, 2003). O interesse dos educadores de infncia e investigadores no impacto dos primeiros anos de vida da criana e no seu posterior desenvolvimento no se verifica apenas actualmente. Foi por volta de 1960 que se iniciou o interesse pela interveno precoce, documentada na dcada de 60 do Sc. XX por vrios investigadores (Bruner, 1960; Hunt, 1961 e Bloom, 1964 cit. por Brassard & Boehm, 2007). Uma vez reconhecida e comprovada a importncia dos primeiros anos de vida no desenvolvimento futuro da criana seguiram-se os trabalhos de Bandura (1978, 1976), Hobbs (1975) e, mais recentemente, Sameroff e MacKenzie (2003) (todos cit. por Brassard & Boehm, 2007) como uma chave para a compreenso da interaco recproca entre a criana e o adulto, no contexto de vrios ambientes e situaes. Estes ltimos autores propuseram um modelo (ecolgico) que defende a interaco ente o adulto, a criana, o ambiente e factores situacionais como determinantes para a compreenso do estdio de desenvolvimento da criana e do seu comportamento. Posteriormente, este modelo ecolgico da avaliao tem sido reforado por inmeros autores (Bailey & Rose, 1989, Bagnato, 1982, Bracken, 2000, Barnett & Carey 1992, Boehm & Sandberg, 1982, Boehm & Weinberg, 1997, Lichtenstein & Ireton, 1984, Lidz, 1983, 1991, 2003, Nagle, 2000, Paget, 1985, 1990, Paget & Nagle, 1986, Turman & Widerstrom, 1990, cit. por Brassard & Boehm, 2007). Neste modelo assume-se que o avaliador necessita de recolher informao sobre todas as pessoas e ambientes relevantes para a criana. Neste contexto, Brassard e Boehm (2007) sugerem um modelo multifactorial e ecocultural da avaliao pr-escolar. Especificamente, neste modelo a avaliao vista como uma tarefa contnua de resoluo de problemas com o objectivo de se compreender a criana juntamente com o ambiente em que se insere diariamente. Tal possibilitar o planeamento de intervenes apropriadas. Os mesmos autores optaram pela designao de avaliao ecocultural ao invs de simplesmente ecolgica considerando a nfase na etnia da criana, reas culturais e lingusticas e o seu efeito no desenvolvimento e interaco desta com os avaliadores. Paralelamente, defendem a necessidade de uma srie de parmetros a considerar para que o modelo multifactorial ecocultural possa serTeste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Introduo 3

aplicado (cf. Anexo A). Esta perspectiva implica que a avaliao no pr-escolar seja entendida como um processo de resoluo de problemas com vista a uma adequada interveno. Neste processo, ter de se ter em conta a criana e a sua interaco com os adultos, a famlia, a escola, o examinador, a comunidade e as estruturas de apoio social. De igual forma, o examinador necessita de ser sensvel diversidade, de modo a que defina as suas questes de avaliao claramente e use abordagens adequadas s necessidades da criana e da sua famlia. A informao dever ser recolhida atravs de fontes mltiplas e em diversos contextos e momentos. ainda importante considerar a criana e as suas estratgias de aprendizagem. Assim, o examinador do pr-escolar ter de ter em conta que nada poder substituir a combinao de experincia, treino e conhecimento. Deste modo, a avaliao ser, em grande parte, um produto do profissional e do que este traz para cada situao, incluindo competncias de observao, conhecimento de procedimentos de diagnstico e capacidade para planear intervenes e para trabalhar com outras pessoas (Brassard & Boehm, 2007). A avaliao psicolgica no pr-escolar pode ocorrer por inmeras razes, nomeadamente para despistar, diagnosticar, tomar decises e planear intervenes (Nagle, 2000, cit. por Saye, 2003). Desta forma, torna-se necessrio medir atributos psicolgicos como o caso da inteligncia, atravs de instrumentos validados em termos cientficos, e com rigor psicomtrico, em crianas nesta faixa etria. Os testes de inteligncia constituem amostras do comportamento que se associam a este constructo. Metaforicamente, este processo de avaliao equivale a uma faca que corta uma fatia de bolo, partindo do pressuposto de que a textura e o sabor associado fatia equivalem ao restante bolo. Esta analogia pode assim ser aplicada a estes testes, assumindo-se que a amostra avaliada nos informa acerca das capacidades cognitivas da criana (Cohen & Spenciner, 1994). De facto, os testes de inteligncia so usados para o estabelecimento de um diagnstico ou, por exemplo, para avaliar os efeitos de um programa de interveno, medindo capacidades verbais e no-verbais. Quando utilizados em crianas, os testes de inteligncia podem fornecer informaes relevantes por exemplo nos casos de dificuldades de aprendizagem, perturbaes do comportamento, deficincia mental e psicose (Trad, 1989). Pese embora a pertinncia desta avaliao, o conceito de inteligncia foi sempre um conceito difcil de definir (Flanagan, Genshaft & Harrison, 1997, cit. por Kaufman & Lichtenberger, 2000). Ainda assim, considera-se que a definio mais conhecida foi a proposta por Boring (1923, cit. por Sternberg, 2000) num artigo para a The NewTeste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Introduo 4

Republic, no qual atestou que a inteligncia aquilo que um teste de inteligncia mede. No entanto, esta definio , claramente, imperfeita, permitindo-nos vrias inferncias: (i) actualmente, no totalmente claro aquilo que mede determinado teste de inteligncia e, consequentemente, no claro, com base nesta definio o significado de inteligncia; (ii) os testes de inteligncia no se inter-relacionam totalmente, assim como tambm no representam uma entidade singular imposta por uma definio; (iii) esta definio poder ser demasiado restrita no sentido em que no nos permite compreender a inteligncia de uma forma que v para alm dos testes tradicionais (Sternberg, 2000). No esquecendo a dificuldade em definir este complexo constructo, Sternberg (2000) considera que o estudo mais famoso relativo a definies de inteligncia foi concretizado pelos editores do Journal of Educational Psychology (Intelligence and its measurements, 1921) onde, tendo em conta inmeras definies, pareceu ser consensual a um conjunto representativo de especialistas que a inteligncia compreende a capacidade de adaptao ao meio ambiente e a capacidade para aprender (Sternberg, 2000). Neste contexto, Sternberg, Conway, Ketron e Bernstein (1991, cit. por Candeias, 2007) identificaram 3 dimenses de inteligncia distintas, num estudo bastante conceituado. As duas primeiras esto relacionadas com as capacidades intelectuais gerais como o caso da resoluo de problemas e raciocnio verbal, e a terceira, de natureza social. Na verdade, ainda que o conceito de inteligncia possa ser visto em funo de aspectos mais lgicos ou acadmicos, a resoluo de problemas quotidianos ou inteligncia social associada aceitao dos outros como so, a curiosidade, o interesse pelo mundo, o interesse entre o contexto envolvente, entre outros, tambm fazem parte deste constructo. A histria da avaliao intelectual manifestamente uma histria de medida da inteligncia de crianas ou de adultos com dfice cognitivo. Galton (1869, 1883, cit. por Kaufman, 1990) estudou adultos e desenvolveu trabalhos considerados precursores no domnio da avaliao da inteligncia (Kaufman, 1983, cit. por Kaufman, 1990). No entanto, apesar de Galton ser considerado o pai do movimento dos testes (Shouksmith, 1970, cit. por Kaufman, 1990) no foi bem sucedido na construo de um teste de inteligncia exmio. Posteriormente, as escalas de Binet-Simon, os testes usados no exrcito durante a primeira guerra mundial e a criatividade de Wechsler ditaram o que caracteriza a maior parte dos testes de inteligncia usados at actualidade. Apesar das atenes estarem direccionadas para as crianas em idade escolar e com o objectivo de se discriminarem vrios nveis de funcionamento, com o desenvolvimento dos anteriores instrumentos o interesse comeou a estender-se a crianas mais novas. Contudo, muitos dos testes de inteligncia consideravam este constructo como uma manifestao comportamental esttica.Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Introduo 5

Assistiu-se desta forma nos ltimos anos do sculo passado a mudanas relacionadas com a concepo terica da inteligncia, com a avaliao das competncias cognitivas e, consequentemente, com a interpretao dos resultados desta avaliao. Actualmente, existem abordagens diversas, desde aquelas que enfatizam a inteligncia enquanto capacidade nica e global at s que associam a este constructo mltiplos factores. A literatura revela que as teorias mais antigas tm vindo a evoluir num processo integrativo tornando os testes de avaliao da inteligncia cada vez mais sofisticados. As concepes sobre a inteligncia no so to extremas e um exemplo disso o modelo Cattel-Horn-Cattel (Teoria CHC). Esta teoria enfatiza a natureza multidimensional da inteligncia ao invs da viso unidimensional. Reconhece a existncia do factor g, contudo, reala as capacidades abrangentes (Flanagan & Ortiz, 2001, cit. por Primi, 2003). um modelo composto por 10 factores ligados a reas amplas do funcionamento cognitivo, associadas aos domnios da linguagem, raciocnio, memria, percepo visual, recepo auditiva, produo de ideias, velocidade cognitiva, conhecimento e rendimento acadmico (Carroll, 1997, cit. por Primi, 2003). Desta forma, o estudo da avaliao da inteligncia tornou-se alvo de bastante ateno sendo que, especialmente durante as ltimas dcadas, se tem verificado um aumento do interesse na avaliao da inteligncia de crianas em idade pr-escolar (Kelley & Surbeck, 2004). O perodo de desenvolvimento dos 3 aos 6 anos de idade compreende uma etapa importante do crescimento do indivduo, tratando-se, portanto, de um perodo de transio rpido, que engloba mudanas significativas ao nvel fsico, socioafectivo e cognitivo. Para alm disso, tal como atrs ficou dito, a demonstrao da eficcia de programas de interveno pr-escolar, a importncia desta fase escolar na preparao para o primeiro ciclo e o aumento do nmero de investigaes com crianas mais novas contribuem para o interesse despertado pela avaliao de crianas nesta faixa etria (Nagle, 2004). Segundo Kelley e Surbeck (2004), com os avanos na medicina e mais especificamente com o conhecimento do crebro humano redescobriu-se a importncia dos primeiros estdios de vida. A formulao de um diagnstico conseguida combinando a informao proveniente da histria clnica com os sinais e sintomas obtidos atravs da observao e da avaliao psicolgica. Neste contexto, a inteligncia surge como uma rea relevante a avaliar (Akiskal, 1986, cit. por Trad, 1989). Efectivamente, quanto maior a capacidade cognitiva da criana para formar uma representao interna do mundo e das suas consequncias nas relaes por ela estabelecidas, maior a sua capacidade para evitar nveis de frustrao que possam conduzir a sentimentos de incontrolabilidade eTeste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

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agressividade. Porm, a capacidade cognitiva desenvolve-se por etapas, ou seja, tal como em todas as reas de desenvolvimento, a criana necessita de transitar de padres de pensamento indiferenciados e desregulados para sistemas de transformao da informao mais sofisticados. A tarefa mais desafiante para o desenvolvimento da cognio distinguir os elementos de percepo internos daqueles que so externos criana (Trad, 1989). Assim, de entre as diversas reas de avaliao nesta faixa etria, a inteligncia uma rea de eleio, o que remete para a importncia da utilizao de instrumentos de avaliao especficos neste campo. Em Portugal, a avaliao psicolgica e, principalmente, a avaliao da inteligncia correspondem a uma parte substancial da tarefa dos psiclogos (Ribeiro, Almeida & Cruz, 1993, cit. por Seabra-Santos, 1998). De acordo com Seabra-Santos (1998) esta tarefa tornou-se mais consistente e vlida no nosso pas a partir da dcada de 70 do sc. XX com a aferio de dois importantes instrumentos de avaliao da inteligncia: em 1970, a aferio portuguesa da Escala de Avaliao da Inteligncia de Wechsler para crianas (WISC) por Ferreira Marques e, em 1976, a aferio da Nova Escala Mtrica da Inteligncia (NEMI), por Bairro Ruivo. Posteriormente, outras aferies nacionais de instrumentos de avaliao se destacaram neste campo, mais precisamente: a Escala Colectiva de Nvel Intelectual (ECNI, Miranda, 1983); a Bateria de Provas da Raciocnio Diferencial (BPRD, Almeida, 1992); a General Aptitude Test Battery (GATB, Pinto, 1992); as Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR, Simes, 1994); as Provas de Avaliao da Realizao Cognitiva (PARC, Ribeiro & Almeida, 1993); e, mais recentemente, a Forma Revista da Escala de Avaliao da Inteligncia de Wechsler para crianas em Idade PrEscolar (WPPSI-R, Wechsler, 2003b); a terceira edio da Escala de Avaliao da Inteligncia de Wechsler para Crianas (WISC-III, Wechsler, 2003a) e a terceira edio da Escala de Inteligncia de Wechsler para adultos (WAIS-III, Wechsler, 2008). fundamental sublinhar que, actualmente, ainda se verifica uma escassez de estudos psicomtricos que validem para a populao portuguesa muitos dos instrumentos de avaliao da inteligncia mais utilizados noutros pases, principalmente em crianas mais novas (Seabra-Santos, 1998). Torna-se, desta forma, impretervel fundamentar a importncia da avaliao psicolgica, colmatar a falta de estudos que contemplem idades precoces, contribuir para ultrapassar o problema da escassez de estudos normativos e psicomtricos para a populao portuguesa e para crianas em idade pr-escolar e complementar estudos j existentes com alguns instrumentos, em Portugal. No seguimento destas linhas de orientao, o objectivo primordial deste estudo consistiu em oferecer um modesto contributo para se ultrapassar esta escassez de estudos psicomtricos e normativos em Portugal e, mais especificamente, contribuir para aTeste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Introduo 7

evoluo da avaliao da inteligncia em idade pr-escolar. A partir daqui, foi necessrio escolher, de entre os diversos instrumentos de avaliao da inteligncia disponveis para esta faixa etria, aquele que seria mais til e urgente tendo em considerao que a Forma Revista da Escala de Avaliao da Inteligncia de Wechsler para crianas em Idade Prescolar (WPPSI-R, Wechsler, 2003b) estava j aferida em Portugal. De entre as hipteses existentes, o teste das Matrizes Coloridas de Raven (MPCR) foi o instrumento seleccionado, havendo vrias razes, que justificam esta opo. A escolha deste instrumento no foi, naturalmente, difcil, na medida em que o teste das MPCR dotado de inmeras qualidades. Trata-se de um instrumento internacionalmente reconhecido, com diversos estudos em Portugal e com uma amplitude mtrica que possibilita a incluso de crianas com idades entre os 4 e os 6 anos. De aplicao e cotao fceis e rpidas, composto de um material colorido e atractivo. Sendo um teste no verbal, e considerado como uma boa medida do factor g, o teste das MPCR pode ser aplicado individual ou colectivamente, podendo ser uma boa prova de rastreio cognitivo e com carga cultural reduzida. Segundo McCallum, Bracken e Wasserman (2001), as MPCR destinam-se a medir a componente edutiva, definida pela teoria da capacidade cognitiva de g de Spearman. Esta capacidade edutiva tem implcita a capacidade de produo de novos insigths, a capacidade para compreender, identificar relaes e extrair significados. A componente base da eduo consiste na capacidade para gerar conceitos que possibilitaro pensar de forma clara. Os testes das Matrizes Progressivas so provavelmente a mais conhecida e investigada medida cognitiva no-verbal (Jensen, 1980, cit. por McCallum, Bracken & Wasserman, 2001), tendo aparecido em mais de 1500 estudos publicados at ao ano de 2000 (McCallum, Bracken & Wasserman, 2001). Em Portugal, o teste das MPCR referenciado em inmeros estudos e, uma vez que foi aferido para a populao portuguesa dos 6 aos 11 anos (Simes, 1994), considermos fazer todo o sentido estender este trabalho populao pr-escolar. Em suma, esta investigao tem como objectivo realizar estudos psicomtricos e normativos com o teste das MPCR junto de crianas em idade pr-escolar. Procurou-se primeiramente fundamentar o projecto da avaliao da inteligncia em crianas com idade pr-escolar, bem como caracterizar os principais instrumentos de avaliao da inteligncia (verbais e no-verbais) que podem ser aplicados em crianas mais novas (Captulo 1), dando especial destaque ao Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven, sobre o qual este estudo incidiu (Captulo 2). Seguidamente, pretendeu-se analisar o teste do ponto de vista da qualidade dos seus itens, da sua preciso e validade, tendo em considerao os principais mtodos empregues para avaliar as qualidades de uma provaTeste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Introduo 8

psicolgica, por forma a facilitar a tomada de deciso relativa sua seleco para um processo de avaliao psicolgica (Captulo 3). Neste captulo so igualmente, apresentados dados preliminares de natureza normativa. Na anlise do Teste das Matrizes Coloridas de Raven optou-se por uma caracterizao quantitativa dos seus itens, considerando-se os ndices de dificuldade e de discriminao. Paralelamente, procedeu-se anlise da sua preciso na tentativa de se inferir o grau de confiana da informao obtida atravs de dois mtodos tradicionalmente utilizados: a consistncia interna (recorrendo ao alfa de Cronbach) e a estabilidade temporal teste-reteste. Na tentativa de averiguar se os resultados no teste possuem validade, isto , se medem o que se propem medir, neste caso a Inteligncia, optou-se por considerar dois tipos de validade: a validade de constructo e a validade concorrente, tradicionalmente utilizadas neste tipo de estudos. No primeiro caso, recorreu-se ao mtodo de anlise factorial e, no segundo, correlacionou-se o desempenho nas Matrizes com quatro testes, nomeadamente dois subtestes da WPPSI-R (Quadrados e Vocabulrio) (Wechsler, 2003b), o teste do Desenho da Figura Humana (DAP; Naglieri, 1988) e o Rivermead Behavioural Memory Test for Children (RBMT-C; Wilson, Ivani-Chalian & Aldrich, 1991). Procedeu-se, igualmente, comparao com estudos efectuados noutros pases com esta faixa etria fazendo-se, a partir desta, uma avaliao crtica da prova.

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Enquadramento Terico 9

PARTE I ENQUADRAMENTO TERICOCAP. 1: AVALIAO DA INTELIGNCIA DE CRIANAS EM IDADE PR-ESCOLARA avaliao psicolgica em crianas com idade pr-escolar compe-se de um conjunto de procedimentos que permite a obteno de informao relevante compreenso do funcionamento de crianas pequenas. reconhecida por especialistas em educao pr-escolar (psiclogos, educadores, assistentes sociais, terapeutas da fala, educadores de educao especial, enfermeiros, pediatras e terapeutas ocupacionais) que sublinham a importncia da avaliao psicolgica como um passo decisivo para a interveno pr-escolar (Brassard & Boehm, 2007). Neste captulo, procurar-se- clarificar os objectivos da avaliao psicolgica na idade pr-escolar e, mais especificamente, da avaliao da inteligncia. Seguidamente, farse- aluso s desvantagens e vantagens da avaliao da inteligncia em idades precoces, bem como caracterizao das competncias do examinador necessrias avaliao psicolgica em crianas pequenas. Por ltimo, pretende-se descrever os principais instrumentos verbais e no-verbais de avaliao da inteligncia, aplicados a crianas nesta faixa etria.

Com o intuito de definir os objectivos da aplicao de instrumentos estandardizados, a National Association for the Education of Young Children (NAEYC, 1988, cit. por Brassard & Boehm, 2007) determinou que a finalidade da aplicao de testes seria a melhoria de servios prestados a estas crianas, no sentido de se assegurar que as mesmas beneficiariam das suas experincias educacionais. Este objectivo s pode ser concretizado numa avaliao encarada como um processo dinmico que:

1. Seja multifacetado, isto , que use uma variedade de medidas e abordagens. 2. Se foque no exclusivamente na criana mas tambm no ambiente que a rodeia (casa, escola e comunidade). 3. Permita a obteno de informao acerca das capacidades de aprendizagem da criana, reas emergentes de desenvolvimento, estilo pessoal e estratgias de resoluo de problemas. 4. Informe acerca de estratgias comportamentais, institucionais e de interveno. 5. Promova objectivos educacionais que possam ser avaliados e

reestruturados ao longo do tempo.Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

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6. Se baseie no princpio de que a criana pode alterar o seu comportamento, sendo que quanto mais precoce for a interveno melhores sero os seus benefcios. 7. Respeite a diversidade das experincias e o meio da criana.

Encarada deste modo, a avaliao psicolgica em idade pr-escolar permite assegurar mltiplas finalidades, tais como: (i) descrever as potencialidades e necessidades da criana nas diversas reas de desenvolvimento; (ii) predizer um possvel atraso no desenvolvimento e preparao para a entrada na escola primria; (iii) determinar a legibilidade da educao especial (incluindo possveis causas de determinado comportamento e recomendaes especficas na interveno); (iv) aconselhar os educadores e professores de modo a ajustarem os seus objectivos e actividades curriculares; (v) planear actividades de interveno familiar e (vi) avaliar a eficcia de programas de interveno (Brassard & Boehm, 2007). Para concretizar estes diferentes objectivos necessria a utilizao de diferentes mtodos de avaliao. Existem diversos e, muitas vezes, inter-relacionados mtodos de avaliao que podem ser usados individualmente ou combinados, dependendo do objectivo da mesma. Nestes mtodos incluem-se a entrevista, mtodos de observao formais e informais, testes referenciados a normas e testes referenciados a critrios, anlise do desempenho curricular, avaliao do brincar e recurso ao portflio (FernndezBallesteros, 2005). Com base na informao recolhida atravs destes mtodos a avaliao psicolgica no pr-escolar, poder desempenhar um papel determinante na tomada de decises e no desenvolvimento de experincias ou possibilidades curriculares que integrem a criana e as suas necessidades familiares. Assumindo assim, a avaliao psicolgica como uma forma de actuao do psiclogo com crianas nesta faixa etria, reas como o desenvolvimento, o comportamento adaptativo, a linguagem, os conceitos bsicos, o funcionamento visual e auditivo, a criatividade, o comportamento, o brincar e a inteligncia, constituem os principais aspectos a avaliar. Contudo, a questo da avaliao da inteligncia na idade prescolar tem vindo a ser debatida h vrios anos. Os defensores da avaliao da inteligncia em crianas mais pequenas alegam que esta favorece um diagnstico, ajuda a identificar crianas com algumas necessidades de ensino especial e promove oportunidades de mbito educacional. Por sua vez, os crticos defendem que os testes limitam as oportunidades da criana e as rotulam (Sattler, 1992). Consequentemente, podemos analisar vantagens e desvantagens no que concerne aplicabilidade de testes de inteligncia em idades to precoces.Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Enquadramento Terico 11

Considerando as desvantagens, verificam-se limitaes quanto s propriedades psicomtricas destes instrumentos de avaliao. Assim, regista-se um nmero insuficiente de pesquisas abrangendo a preciso e validade dos instrumentos, ausncia de estudos normativos e caractersticas psicomtricas pobres. Por outro lado, factores como a ineficcia relativa produo de informaes relevantes para o diagnstico, o tempo de aplicao excessivo e o nmero exagerado de conceitos bsicos includos nas instrues de alguns testes que colidem com as dificuldades das crianas na linguagem receptiva, encontram-se entre as crticas mais apontadas. Sabe-se, ainda, que a maior parte dos instrumentos de avaliao de inteligncia foram concebidos para crianas mais velhas e, posteriormente, adaptados para idades mais precoces, o que em parte explica as limitaes anteriormente apontadas (Seabra-Santos, 2000). Muitos educadores e interventores na educao pr-escolar so claramente cpticos relativamente ao uso de testes estandardizados de avaliao cognitiva para crianas nesta faixa etria, pois partem do princpio que estes testes exigem capacidades de processamento de informao que as crianas em idade pr-escolar no possuem. Paralelamente, argumentam a negativa influncia dos resultados destes testes na percepo que os pais e os professores tm da criana. Uma objeco mais particular est relacionada com o facto destes procedimentos, muitas vezes considerados de rastreio exclurem crianas de entrarem no ensino primrio ou at no prprio jardim-de-infncia, bem como comprometerem a transio de ano. Tais argumentos so justificados por autores como Genishi (1992), Kim e Kagan (1999), Martim (1988), Meisels (1989, 1999) e Shepard e cols. (1998) (todos cit. por Brassard & Boehm, 2007), que apontam problemas criados pela categorizao de crianas com base neste mtodo. Os mesmos autores alegam que as decises so baseadas em pequenas amostras de comportamento e, muitas vezes, apoiadas no uso de tarefas que no so familiares criana. A verdade que a aplicao de testes estandardizados de avaliao cognitiva a crianas pequenas sempre foi alvo de discusso e controvrsia considerveis. Num inqurito feito a psiclogos com experincia em avaliao psicolgica no pr-escolar, 43% responderam que os testes de inteligncia eram inteis para estas crianas, propondo mtodos alternativos (Bagnato & Neisworth, 1994, cit. por Brassard & Boehm, 2007). Lidz (1991) acrescenta que os investigadores que objectam ou que expressam reservas acerca da avaliao cognitiva em crianas mais novas esto preocupados com os problemas que a rotulagem e o diagnstico precoce comportam. De acordo com esta autora, a idade pr-escolar representa um perodo de transio entre as predies pobres e a possibilidade de predizer de uma forma mais vlida o futuro funcionamento cognitivo.Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Enquadramento Terico 12

Assim sendo, se as crianas examinadas forem estveis e consistentes (frequentemente no o so), e se as ferramentas utilizadas forem apropriadas (frequentemente tambm no so) (Bracken, 1997, cit. por Lidz, 1991), a autora considera que, quanto muito, o diagnstico e a rotulagem podem ser bons descritores actuais do nvel de funcionamento da criana, j que dificilmente serviro para uma previso futura. De um modo geral, os testes de avaliao do funcionamento intelectual no prescolar tm sido criticados devido s suas normas inadequadas, ao tecto e gradiente dos itens, aos materiais inapropriados e a alguns procedimentos adoptados na sua administrao (Bagnato & Neisworth, 1994, cit. por Brassard & Boehm, 2007). Da mesma forma, as caractersticas da criana desta faixa etria (perodos curtos de ateno e tendncia para comportamentos de oposio) tambm tm sido descritas como barreiras utilizao de testes nestas idades (Brassard & Boehm, 2007; Lidz, 1991). Analisando agora as vantagens da avaliao cognitiva em crianas mais novas e apesar de parecem inmeras as desvantagens da aplicao dos testes de inteligncia, organizaes profissionais como a National Association for the Education of Young Children (2003, cit. por Brassard & Boehm, 2007) e a National Association of School Psychologyst defendem que a avaliao simplesmente um meio de responder a questes acerca do conhecimento, comportamento, capacidade ou personalidade da criana em idade prescolar (Meisels & AtkinsBurnett, 2005, cit. por Brassard & Boehm, 2007) e um procedimento que necessita de ser conduzido no contexto de uma relao com objectivos especficos. Os testes devem ser usados exclusivamente quando se trata de melhorar o apoio criana assegurando que esta beneficia das suas experincias educacionais (NAEYC, 2003, cit. por Brassard & Boehm, 2007). Para Sattler (2001), a avaliao de crianas em idade pr-escolar vantajosa na medida em que legitima as decises de diagnstico e de interveno. No caso da interveno, a avaliao psicolgica possibilita o controlo da sua eficcia. Considerando que estes testes possuem propriedades psicomtricas adequadas aos seus objectivos, a sua contribuio depende do tipo de informao que se obtm, da forma como esta informao usada para guiar uma instruo ou uma interveno comportamental, e como usada para acompanhar a evoluo da situao. Apesar das crticas, o uso dos testes em crianas mais novas incentivado por muitos especialistas. Bracken (1994) e Gyurke (1994) (ambos cit. por Brassard & Boehm, 2007) determinaram que os testes de avaliao cognitiva e outras formas de avaliao alternativa tais como o portflio no so mutuamente exclusivos e que estes mtodos alternativos no so empiricamente validados. Na verdade, a avaliao tradicional permite obter o mximo de informao num perodo curto de tempo. Gyurke (1994, cit. porTeste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

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Brassard & Boehm, 2007) sugere ainda que uma observao minimamente estruturada acaba por abranger tarefas equivalentes aos testes estandardizados. Pelo facto de a avaliao da inteligncia ser fundamental para a compreenso do funcionamento da criana e das suas interaces com o meio, e porque os testes psicolgicos so dotados de objectividade e normas, so de destacar os esforos realizados mais recentemente no sentido de melhorar as suas propriedades psicomtricas, o que contribui para a eficcia da sua utilizao. Lidz (1991) defende que a avaliao cognitiva em idade pr-escolar ser til se os instrumentos utilizados forem capazes de identificar crianas que, do ponto de vista educacional, se encontram em risco, e, se os profissionais conseguirem com base nos dados obtidos, prescrever um programa de interveno eficaz. Segundo Seabra-Santos (1998), avaliar crianas em idade to precoce permite desde cedo a implementao de estratgias remediativas, limita as dificuldades e potencia o desenvolvimento. Avaliar a inteligncia destas crianas implica compreender no s o seu funcionamento, como tambm as interaces entre esta e o seu meio. Paralelamente, a utilizao de testes para avaliar a inteligncia de crianas em idade pr-escolar permite objectividade e o recurso a normas, possibilitando a comparao do desempenho da criana avaliada com um grupo de referncia, constitudo por sujeitos da mesma idade. A avaliao da inteligncia em idade pr-escolar contribui, assim, para o processo de deliberaes que facilitam a eficcia da interveno. Para alm disso, pode ser extremamente til na tomada de deciso acerca da entrada da criana no 1 ciclo do ensino bsico (Nagle, 2004). Naturalmente, no se pode negar que a avaliao cognitiva uma componente essencial de uma avaliao multidisciplinar. O grande desafio para o examinador ser usar instrumentos que sejam multiculturais e linguisticamente apropriados, que sejam sensveis s prioridades e preocupaes da famlia e que incorporem abordagens de avaliao adequadas sob o ponto de vista do desenvolvimento da criana. No sentido de se obter uma avaliao cognitiva que represente genuinamente a criana, o examinador dever (Brassard & Boehm, 2007):

1. Possuir conhecimentos acerca do desenvolvimento e comportamento infantil, tal como est fundamentado por certas normas. 2. Adquirir conhecimentos acerca das perturbaes do desenvolvimento e as suas caractersticas durante a idade pr-escolar. 3. Pensar acerca da criana no seu contexto familiar e incluir estes elementos no processo de avaliao.Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Enquadramento Terico 14

4. Usar uma combinao de testes estandardizados e outras formas de avaliao. 5. Considerar aspectos clnicos e usar de adequao tcnica na seleco de um teste. 6. Utilizar os resultados da avaliao cognitiva com o intuito de planear uma interveno adequada e realista, de acordo com as necessidades da criana e da sua famlia.

Se de facto estes princpios forem tidos em conta, a avaliao cognitiva resultar num verdadeiro benefcio para a criana em idade pr-escolar (Brassard & Boehm, 2007). No que concerne aos testes de avaliao cognitiva, Alfonso e Flanagan (1999) descreveram uma srie de aspectos que devem ser tidos em conta na seleco de um teste. De facto, no que diz respeito construo e ao formato de um teste de avaliao cognitiva deve-se atender ao manual, aos materiais de que composto, aos procedimentos de administrao e ao tipo de linguagem expressiva requerida. Relativamente administrao, deve-se considerar a durao das instrues, o nmero e complexidade de conceitos bsicos, a incluso de oportunidades que possam guiar a tarefa, a incluso de critrios de interrupo, no sentido da frustrao da criana ser minimizada quando esta j no est a acertar a resposta. Acresce igualmente referir que a avaliao cognitiva em idade pr-escolar requer competncias especficas por parte do examinador. Imaginemos duas crianas: a primeira responde eficazmente a todas as questes abordadas, enquanto que a segunda permanece sentada no cho, respondendo apenas a uma tarefa de construo de cubos. Relativamente primeira criana, podemos assegurar um ndice elevado de funcionamento cognitivo, no entanto, a incerteza prevalece no caso da segunda criana, pois a sua no colaborao pode no estar relacionada com a falta de capacidades cognitivas, mas sim com a falta de cooperao. Tendo em conta este aspecto, Scrarr (1981, cit. por Gregory, 2000) acrescenta que sempre que se avaliam as funes cognitivas de uma criana, essa avaliao equivale a medir tambm a cooperao, a persistncia, a capacidade da criana se manter quieta e a ateno. Segundo Seabra-Santos (2000), so diversas as caractersticas da criana em idade pr-escolar que podem condicionar a avaliao psicolgica, nomeadamente, a dependncia em relao ao adulto, as competncias verbais reduzidas, a actividade motora intensa, o limiar baixo de ateno, a baixa resistncia frustrao e a labilidade do humor. De acordo com Bracken (2004), existem quatro fontes principais susceptveis de influenciar ou condicionar os resultados de uma avaliao em crianas mais novas, sendo estas respectivamente: (i) as caractersticas do examinado; (ii) as caractersticas do examinador; (iii) o ambiente em que ocorre a avaliao e (iv) o prprio instrumento deTeste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Enquadramento Terico 15

avaliao. No caso do examinado, aspectos como a sade, a fadiga, o medo ou ansiedade, a motivao e o temperamento so factores que devero ser tidos em conta na avaliao de crianas em idade pr-escolar. Para que os resultados da avaliao sejam vlidos, tambm importante que o examinador crie proximidade e afecto com a criana; tenha presena fsica no sentido de estar preparado para ter de se sentar no cho ou estar de joelhos, ao nvel da criana; tenha controlo sobre o comportamento da criana, reforando constantemente o seu desempenho, tenha sintonia e adeqe a sua linguagem da criana, brinque, utilize o humor; tenha experincia com crianas em idade pr-escolar e possua capacidades de destreza no manuseamento dos materiais dos testes, nas instrues e na cronometragem. Tambm o ambiente em que ocorre a avaliao dever estar munido de mobilirio adequado criana, com uma decorao atractiva, isento de distractores e com temperatura amena (Kamphaus, 1993). Por ltimo, e reforando aspectos j sugeridos por outros autores, o prprio teste dever ser dotado de boas propriedades psicomtricas. Na realidade, os testes de inteligncia transmitem-nos uma parte daquilo que pretendemos saber acerca da criana, fornecendo-nos indicadores. Contudo, importante mencionar que a avaliao da criana no est somente dependente de um teste, mas de outras tcnicas como o caso da entrevista, amostras de trabalhos escolares, inventrios e de informaes provenientes de outros informadores como pais, educadores, entre outros. Por sua vez, pertinente referir que os resultados dos testes de inteligncia variam medida que a criana cresce, no medindo uma capacidade inata e esttica (Cohen & Spenciner, 1994). Em suma, o objectivo da avaliao das capacidades cognitivas em idade precoce ser o de adquirir informao e compreender quais as variveis que facilitam o desenvolvimento e as competncias funcionais, juntamente com a famlia e comunidade (Greenspan & Meisels, 1996, cit. por Meisels & Atkins-Burnett, 2000). Segundo Kaufman (1994), se a avaliao se centrar no examinando e no no teste e se o prprio examinador for dotado de conhecimentos acerca da psicometria e da fundamentao terica relativa ao desenvolvimento cognitivo da criana, os testes podero ser usados de forma inteligente. A inteno , pois, avaliar e identificar precocemente os problemas, de modo a que se possam definir desde cedo estratgias remediativas de eventuais problemas detectados, ou seja, avaliar para intervir.

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Enquadramento Terico 16

1.1 PRINCIPAIS TESTES IDADE PR-ESCOLAR

DE AVALIAO DA INTELIGNCIA PARA

CRIANAS

EM

Apesar dos instrumentos de avaliao psicolgica usados na populao pr-escolar e aferidos em Portugal serem escassos, estes existem em maior nmero noutros pases. Ainda que alguns destes instrumentos no se apliquem exclusivamente idade prescolar, Schakel (1986, cit. por Gregory, 2000) designou The Big 4 os quatro principais instrumentos de avaliao da inteligncia: (i) a WPPSI-R - Escala de Inteligncia de Wechsler para a Idade Pr-Escolar e Primria (Wechsler, 1989, 2003b); (ii) a SB-FE Stanford-Binet 4 edio (S-B IV, Thorndike, Hagen & Sattler, 1986); (iii) o K-ABC Bateria de Avaliao de Kaufman (K-ABC, Kaufman & Kaufman, 1983) e; (iv) a MSCA Escala de Avaliao das Capacidades das Crianas (MSCA, McCarthy, 1972). Em 1979, Horn (cit. por Kaplan & Saccuzzo, 1989) anteviu que seria possvel que em 2000 se usassem os mesmos testes que eram referenciados 40 anos antes, levando-nos a concluir que a importncia reside na utilizao correcta dos testes e no tanto na construo de novos instrumentos de medida. Tal ideia justifica que, actualmente, estes continuem a ser os instrumentos de avaliao da inteligncia mais utilizados, o que confirma a previso de Horn no final dos anos 70, no sculo passado. Na literatura alusiva avaliao cognitiva (Siegel, 1987; Kamphaus, 1993; Cohen & Spenciner, 1994; Aiken, 1996; Alfonso & Flanagan, 1999; Anastasi & Urbina, 2000; Reynolds & Kamphaus, 2003; Saye, 2003; Bracken, 2004 e, mais recentemente, Brassard & Boehm, 2007), encontram-se normalmente referenciados os seguintes instrumentos: a WPPSI-R Escala de Inteligncia de Wechsler para a Idade Pr-Escolar e Primria (Wechsler, 1989/2003b), a SB-FE Stanford-Binet 4 edio (S-B IV, Thorndike, Hagen & Sattler, 1986), o K-ABC Bateria de Avaliao de Kaufman (K-ABC, Kaufman & Kaufman, 1983) e o K-BIT Teste de Inteligncia Abreviado (K-BIT, Kaufman & Kaufman, 1990), as MSCA Escalas das Capacidades das Crianas de McCarthy (MSCA, McCarthy, 1972), as DAS Escalas de Capacidades Diferenciais (DAS, Elliott, 1990) e a Bateria Cognitiva de Woodcock-Johnson III: Testes de Capacidade Cognitiva (WJ-III Cog, Woodcock, McGrew & Mather, 2001). Concomitantemente, apesar de no se tratar de instrumentos tradicionais de medida da inteligncia, alguns dos autores anteriormente referenciados tambm apontam outros instrumentos como por exemplo as BSID-II Escalas de Desenvolvimento Infantil de Bayley (BSID-II, Bayley, 1993) e a BBCS-R Escala de Conceitos Bsicos de Bracken Revista (Bracken, 1998), entre outros, como sendo teis neste contexto.

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Enquadramento Terico 17

Em Portugal, os instrumentos de avaliao cognitiva disponveis para a idade prescolar so a WPPSI-R - Escala de Inteligncia de Wechsler para a Idade Pr-Escolar e Primria Revista (Wechsler, 1989, 2003b) e ECCOS: Escala de Competncias Cognitivas para Crianas dos 4 aos 10 anos (Brito & Almeida, 2003, 2009). Neste trabalho procurou-se, deste modo, descrever os instrumentos de avaliao cognitiva que podem ser utilizados com crianas em idade pr-escolar e que surgem como denominador comum na reviso da literatura, sendo, portanto, os mais referenciados e, consequentemente os mais utilizados. Em primeiro lugar destacamos os instrumentos de avaliao cognitiva disponveis para a populao portuguesa seguidos pelos restantes. Vejamos, de forma resumida, em que consiste cada um destes instrumentos.

A)

ESCALA

DE

INTELIGNCIA

DE

WECHSLER

PARA A

IDADE PR-ESCOLAR

E

PRIMRIA REVISTA (WPPSI-R; WECHSLER, 1989/2003B)Wechsler compreendia a inteligncia como o resultado de um nmero especfico de funes ou elementos inter-relacionados. Desta forma, medindo cada um desses elementos seria possvel obter uma medida geral somando as capacidades individuais relativas a cada elemento. Desenvolveu as suas escalas de inteligncia partindo desta premissa, identificando 11 elementos ou funes, sendo que seis se relacionam com a inteligncia verbal e cinco com a inteligncia no-verbal (Kaplan & Saccuzzo, 1997). Estas escalas estendem-se da infncia idade adulta, dividindo-se em 3 grupos: a WPPSI Escala de Inteligncia de Wechsler para a Idade Pr-Escolar e Primria (dos 3 aos 7 anos), a WISC Escala de Inteligncia de Wechsler para Crianas (dos 6 aos 16 anos) e a WAIS Escala de Inteligncia de Wechsler para Adultos (dos 16 aos 89 anos). Atravs da sua aplicao podemos obter medidas de Q.I. Verbal, de Q.I de Realizao e Q.I. referente Escala Completa. No caso particular da WPPSI-R, e considerando a faixa etria alvo deste estudo, aplicvel s crianas com idades compreendias entre os 3 e os 7 anos e 3 meses. Deve ser administrada individualmente, demorando cerca de 1 hora e 15 minutos a sua aplicao. Representa uma extenso da WISC para idades mais baixas, sendo que 9 dos seus 12 subtestes provm, de forma adaptada, das Escalas destinadas a crianas mais velhas ou a adultos. De facto, a estrutura deste instrumento semelhante s outras escalas da autoria de Wechsler, sendo constituda por 12 testes, distribudos por uma subescala de realizao, composta por 6 testes e por uma subescala verbal, que inclui outros 6 testes. Os testes de realizao so: Composio de Objectos, Figuras Geomtricas, Quadrados, Labirintos, Completamento de Gravuras e Tabuleiro dos Animais (teste opcional). Os testesTeste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Enquadramento Terico 18

verbais englobam: Informao, Compreenso, Aritmtica, Vocabulrio, Semelhanas e Frases Memorizadas (este ltimo opcional). Relativamente verso anterior (WPPSI), esta forma revista (WPPSI-R) composta por materiais mais variados e mais atraentes visualmente, aplica-se a um maior leque etrio, permite na maioria dos testes a demonstrao dos itens iniciais, comporta um novo teste (Composio de Objectos) que facilita o inicio da administrao da escala, adopta o Tabuleiro dos Animais como teste suplementar, possui alteraes nos procedimentos de administrao e cotao de alguns testes e permite a atribuio de pontos de bonificao pelas execues rpidas nos testes dos Quadrados e na Composio de Objectos (Seabra-Santos, 1998). A WPPSI-R foi adaptada populao portuguesa, em 1998, por Seabra-Santos e implicou a introduo de algumas alteraes ao nvel dos contedos (especialmente nos testes verbais) e o ajustamento de procedimentos de administrao e cotao. Tais alteraes prenderam-se com a necessidade de se adaptar a escala realidade das crianas portuguesas. A Escala foi aferida para a populao portuguesa entre os 3 e os 6 anos e meio (Wechsler, 2003b). No que respeita s propriedades psicomtricas e consistncia interna, verificouse adequao nas escalas de realizao (.93), verbal (.94) e completa (.97), com valores superiores a .90 (ainda que nos testes individuais muitos dos coeficientes encontrados para as diversas provas e nas variadas faixas etrias fossem inferiores a .80) (SeabraSantos et al., 2006). Relativamente aos coeficientes de estabilidade teste-reteste, para os QIs de realizao, verbal e da escala completa encontraram-se valores de .89, .91 e .93, respectivamente. Estes valores representam ndices de preciso elevados, sendo complementados pelo acordo inter-avaliadores, igualmente elevado, variando os coeficientes de vrios subtestes entre .97 e .99. No que concerne validade, as correlaes entre os subtestes e os totais das respectivas subescalas demonstraram um grau elevado de relao dando suporte diviso em duas subescalas, uma de Realizao e uma Verbal. A anlise factorial confirmou os 2 factores presentes, um Verbal e um de Realizao, onde saturam devidamente os subtestes associados a cada subescala. Paralelamente, realizaram-se estudos, em que se compara o desempenho entre a WPPSI-R e outros instrumentos, tais como a WISC-III, as MPCR e a Escala de Desenvolvimento de Griffiths, tendo-se encontrado correlaes moderadas e significativas. Por ltimo, os estudos com grupos especiais, mais precisamente em crianas com dificuldades escolares e crianas com inteligncia superior, demonstraram que a WPPSI-R sensvel nestes dois casos, isto , consegue discriminar o desempenho destes

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Enquadramento Terico 19

dois grupos de crianas comparativamente ao desempenho mdio das crianas da amostra de aferio (Seabra-Santos et al., 2006). Actualmente, apesar de no estar aferida para a populao portuguesa, j existe a terceira verso da WPPSI (WPPSI-III). Esta verso apresenta alteraes comparativamente s verses anteriores, nomeadamente, a introduo de seis novos subtestes, com diferentes anlises para as idades dos 2 anos e 6 meses at aos 3 anos e 11 meses, e dos 4 anos e 0 meses aos 7 anos e 3 meses (uma nova subdiviso etria). Os novos subtestes (Nomeao de Imagens, Vocabulrio Receptivo, Matrizes-Raciocnio, Conceitos em Imagens, Pesquisa de Smbolos e Cdigo) destinam-se a avaliar o raciocnio fluido verbal e noverbal, bem como o vocabulrio receptivo e expressivo e a velocidade de processamento. Os subtestes podem ser combinados como medidas de QI verbal, QI de realizao (fluido), quociente de velocidade de processamento, compsito de linguagem geral e QI da Escala completa. Comparativamente s verses anteriores estes indicadores fornecem informaes clnicas mais teis para o diagnstico e, consequentemente, para a interveno (Kaufman & Lichtenberger, 2000).

B) ESCALA DE COMPETNCIAS COGNITIVAS PARA CRIANAS (ECCOS; BRITO & ALMEIDA

2003, 2009)

A Escala de Competncias Cognitivas para Crianas (ECCOS, Brito & Almeida 2003, 2009) uma bateria de provas que avalia as capacidades intelectuais em crianas. Foi primeiramente desenvolvida para crianas com idade entre os 4 e 7 anos e, posteriormente alargada at faixa etria dos 10 anos de idade. Possui a particularidade de ser construda originalmente para a populao portuguesa e de no diferir substancialmente de outras disponveis (Brito & Almeida, 2003). A ECCOS composta por material apelativo e agradvel, de carcter ldico e com itens que recorrem ao quotidiano da criana. Possui itens exemplificativos e o tempo de aplicao total da prova de aproximadamente 60 a 90 minutos (Brito & Almeida, 2003). Esta escala, construda ao longo de 3 anos, apresenta um conjunto de 10 provas que avaliam 5 processos cognitivos: avaliados atravs de contedos verbais e no-verbais Inicialmente, destinada a crianas entre os 4 e os 7 anos de idade, a ECCOS foi sujeita a estudos normativos e psicomtricos. Foi testada numa amostra de 400 crianas pertencentes aos distritos de Aveiro, Braga, Bragana, Coimbra, Guarda, Porto Viana do Castelo, Vila Real e Viseu, sendo que os resultados evidenciaram uma progresso no desempenho cognitivo aumentando com a idade (Brito & Almeida, 2003).

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Enquadramento Terico 20

No que respeita aos estudos psicomtricos, relativamente consistncia interna, os resultados variaram entre .55 e .90. Em termos da sua estrutura factorial verificou-se um factor explicativo de 47.1% de varincia em provas associadas ao factor g. Um outro factor explicando 10.5% da varincia, saturou em provas que exigiam maior concentrao e ateno na tarefa. Os ndices obtidos mostraram-se adequados face aos objectivos da avaliao (Brito & Almeida, 2003).Quadro 1. Estrutura da ECCOS 4/7 e 4/10 Contedos VerbalElementos de histrias Frases Absurdas Concluso de Frases Situaes Quantitativas Antnimos ____________________ Elementos em frases Frases Absurdas Frases Incompletas Situaes Quantitativas Construo de Histrias

Prova

ProcessosMemria Compreenso

No-verbalElementos em rvores Desenhos Absurdos Excluso de Imagens Construo de Padres Comparao de Figuras Comparao de Figuras Elementos em rvores Desenhos Absurdos Figuras Incompletas Composio de Padres Construo de Figuras

ECCOS 4/7

Raciocnio Resoluo de Problemas _______________________ Percepo Memria

ECCOS 4/10

Compreenso Raciocnio Resoluo de Problemas Pensamento Divergente

De 2003 at a presente data, a ECCOS tem sofrido alteraes no que diz respeito aos processos cognitivos avaliados, s faixas etrias que abrange e tipologia de itens nas suas provas. Atravs do Quadro 1 podemos obter uma melhor compreenso da estrutura e modificaes da ECCOS de acordo com o alargamento da faixa etria (Brito, 2009). No caso particular dos processos cognitivos, esta prova abrange agora provas de avaliao do pensamento divergente (passando de 10 a 11 provas). A faixa etria passou a ser alargada at aos 10 anos permitindo a incluso de crianas que frequentam o primeiro ciclo do ensino bsico (Brito, 2009). Nesta fase de estudos estatsticos tomou-se uma amostra de 539 crianas provenientes uma vez mais do Norte do pas. Tais estudos permitiram encontrar resultados satisfatrios relativos ao alfa de Cronbach, que se situou num valor de .97 (Brito, 2009). Quanto validade de constructo correlacionaram-se os resultados das diferentes provas entre si e com os totais da escala. De salientar que os valores obtidos foram todos estatisticamente significativos ao longo das diferentes faixas etrias. Considerando agora a validade de constructo, destacou-se um factor que explica a maior parte da varincia no

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Enquadramento Terico 21

qual saturam todas as provas excepto as relativas ao pensamento divergente. No que respeita validade emprica, a ECCOS 4/10 apresenta correlaes positivas e significativas entre a prova de Aritmtica e a prova de Situaes Quantitativas, entre os Quadrados/Cubos com as provas de Resoluo de Problemas, Raciocnio, Prova Perceptiva e, por ltimo, entre a prova Completamento de Gravuras com a Comparao de Figuras. Estes estudos conduziram ainda criao de normas que tornam possvel a comparao de cada criana com o seu grupo de referncia (Brito, 2009).

C) STANFORD-BINET: 4TH EDITION (S-B IV; THORNDIKE, HAGEN & SATTLER, 1986)

A Escala de Inteligncia Stanford-Binet: 4 Edio (S-B IV, Thorndike, Hagen & Sattler, 1986) foi desenvolvida a partir da Escala Inteligncia Stanford-Binet: L-M (Terman & Merill, 1973) sendo o objectivo principal desta actualizao o de tornar mais clara a interpretao do instrumento e rever a investigao acerca do seu uso com crianas em idade pr-escolar (McCallum & Whitaker, 2004). As reas avaliadas por esta escala abrangem o raciocnio verbal, o raciocnio abstracto, o raciocnio quantitativo e a memria a curto prazo. Os resultados obtm-se para estas quatro reas e para o conjunto da escala (Gregory, 2000). A S-B IV composta por 15 subtestes: quatro de raciocnio verbal (Vocabulrio, Compreenso, Incongruncias, Relaes Verbais), quatro de raciocnio abstracto (Anlise de Padres, Cpia, Matrizes, Corte e Dobragem de Papel), trs de raciocnio quantitativo (Quantidade, Sries de Nmeros e Construo de Equaes) e quatro de memria de curto prazo (Memria de Frases, Memria de Dgitos, Memria de Objectos e Memria Ambgua). De salientar que apenas oito destes subtestes so administrados a crianas em idade pr-escolar, neste caso: Vocabulrio, Memria Ambgua, Quantidades, Memria de Frases, Anlise de Padres, Compreenso, Incongruncias e Cpia (McCallum & Whitaker, 2004). Os materiais incluem quatro cadernos, blocos, tabuleiro, contas multicoloridas e de vrias formas, um desenho grande de um boneco, um caderno de registo das respostas e um manual, requerendo grande experincia na sua aplicao (Anastasi & Urbina, 2000). Esta verso apresenta algumas limitaes, nomeadamente o tempo de administrao longo e a falta de atractividade que tambm era caracterstica das anteriores verses (Seabra-Santos, 1998).

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Enquadramento Terico 22

D) KAUFMAN ASSESSMENT BATTERY FOR CHILDREN (K-ABC; KAUFMAN & KAUFMAN, 1983) E KAUFMAN BRIEF INTELLIGENCE TEST (K-BIT;

KAUFMAN & KAUFMAN, 1990)

O KAB-C Bateria de Avaliao para Crianas de Kaufman (Kaufman & Kaufman, 1983) uma bateria de testes de inteligncia e de desempenho escolar destinada a crianas dos 2 anos e meio aos 12 anos e meio (Seabra-Santos, 1998). Trata-se de um instrumento com bastante popularidade na sua aplicao a crianas em idade pr-escolar (Kamphaus & Kaufman, 1991, cit. por Kamphaus, 1993). Na verdade, pode dizer-se que os seus autores tinham muito presente as caractersticas das crianas com estas idades, uma vez que tornaram este instrumento bastante til e atractivo para este pblico-alvo (Kamphaus, 1993). Destina-se a avaliar o Processamento Simultneo atravs de 7 subtestes, o Processamento Sequencial atravs de 3 subtestes e contm ainda uma Escala de Realizao, compreendendo 6 subtestes (Anastasi & Urbina, 2000). O Processamento Simultneo avalia o raciocnio no-verbal e a deteco de padres, sendo que os subtestes incluem desenhos, a reproduo de objectos numa grelha, a organizao de uma srie de fotos numa ordem cronolgica e, para crianas mais novas, o reconhecimento de faces e a identificao de uma figura atravs de um espao que fecha e abre (janela mgica). O Processamento Sequencial avalia a memria a curto prazo sendo constitudo por subtestes que incluem o reconhecimento de nmeros, a repetio de uma sequncia e a repetio de movimentos com as mos. Os subtestes das Escalas de Realizao incluem a nomeao de pessoas e lugares famosos atravs do recurso a fotos, quebra-cabeas, um teste de aritmtica, a leitura de letras e palavras isoladas, compreenso verbal e, para crianas mais novas a nomeao de objectos a partir de figuras (Anastasi & Urbina, 2000). Estes 16 subtestes no se aplicam simultaneamente a todas a idades. De acordo com Kamphaus (1993), o K-ABC, comparativamente a outros testes, difere no seu carcter atractivo, composto por materiais coloridos e muito reais. O seu tempo de aplicao pode ir dos 35 minutos, no caso das crianas mais pequenas, at aos 75 minutos, para crianas mais velhas (Cohen & Spenciner, 1994). A pontuao obtida no K-ABC pode ser convertida em percentis. uma escala muito usada na avaliao de dificuldades de aprendizagem, da deficincia mental e tambm na deteco de casos de sobredotao (Cohen & Spenciner, 1994). Actualmente j se encontra disponvel noutros pases a segunda edio desta bateria (K-ABC II, Kaufman e Kaufman, 1994, cit. por Brassard & Boehm, 2007).Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Enquadramento Terico 23

O K-BIT Teste de Inteligncia Abreviado (Kaufman & Kaufman, 1990) um teste de aplicao individual, que pode ser administrado a sujeitos dos 4 aos 90 anos de idade. Constitui uma medida de inteligncia verbal e no-verbal, sendo formado por 2 subtestes, Vocabulrio (composto por itens de vocabulrio expressivo e por definies) e Matrizes. facilmente administrado em 15 a 30 minutos (Cohen & Spenciner, 1994). O K-BIT foi concebido como um instrumento de triagem rpida para estimar o nvel de funcionamento intelectual (Anastasi & Urbina, 2000). Nenhuma das verses da bateria de Kaufman se encontra aferida para a populao portuguesa.

E) MCCARTHY SCALES OF CHILDRENS ABILITIES (MSCA; MCCARTHY, 1972)

As MSCA Escalas das Capacidades de Crianas (McCarthy, 1972) foram desenvolvidas a partir de 1970 e avaliam o funcionamento intelectual de crianas entre os 2 anos e meio e os 8 anos e meio. Consistem num instrumento construdo para avaliar a capacidade cognitiva, constitudo por 18 subtestes que examinam uma diversidade de funes relacionadas com a inteligncia (Kaplan & Saccuzzo, 1997). Permitem ao examinador inmeras oportunidades de observar a criana, usando vrios problemas e estmulos (Anastasi & Urbina, 2000), integrando as seguintes tarefas: Verbal, Desempenho-Perceptiva, Quantitativa, Cognitiva Geral, Memria e Motora (Anastasi & Urbina, 2000), caracterizando-se da seguinte forma (Kaufman, 1993; Aiken, 1996): Construo de Blocos, Resoluo de Puzzles, Memria de Figuras, Conhecimento do Mundo, Questes Numricas, Sequncia de Batidas, Memria Verbal, Orientao EsquerdaDireita, Coordenao das Pernas, Coordenao dos Braos, Desenho, Desenho de uma Criana, Memria Numrica, Fluncia Verbal, Contagem e Ordenao, Analogias Opostas, Imitao de Aces e Grupos Conceptuais. O tempo de aplicao da prova oscila entre os 60 a 90 minutos, contudo, os seus materiais so do tipo jogo, permitindo s crianas mais novas uma maior ateno e por perodos mais longos (Seabra-Santos, 1998). De acordo com Anastasi e Urbina (2000), consensual entre os diversos autores que revem estas escalas que apesar de terem algumas limitaes, so teis e eficazes.

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Enquadramento Terico 24

F) DIFFERENTIAL ABILITY SCALES (DAS; ELLIOTT, 1990)

As DAS Escalas de Capacidades Diferenciais (Elliott, 1990) foram concebidas por Elliott (1990, cit. por Anastasi & Urbina, 2000) e representam uma reviso e extenso das British Abilities Scales (BAS, Elliott & Colin, 1978). Consistem numa prova que se aplica individualmente, constituda por itens que avaliam a capacidade cognitiva e reas de desempenho escolar de crianas e jovens entre os 2 e os 17 anos (Cohen & Spenciner, 1994). As DAS so compostas por 20 subtestes organizados em 3 componentes principais: 12 subtestes Centrais (Construo com Blocos, Compreenso Verbal, Semelhanas entre Figuras, Vocabulrio, Conceitos Numricos Bsicos, Cpia, Construo de Padres, Memria de Desenhos, Definio de Palavras, Matrizes, Semelhanas e Raciocnio Sequencial e Quantitativo), 5 subtestes de Diagnstico (Memria de Dgitos, Memria de Objectos, Reconhecimento entre Figuras, Velocidade de Processamento e Combinao de Formas Semelhantes) e 3 subtestes de Realizao (Capacidades Bsicas com Nmeros, Ortografia e Leitura de Palavras), dividindo-se em nveis pr-escolar e escolar (Anastasi & Urbina, 2000). Segundo Alfonso e Flanagan (1999) e no que respeita sua aplicao a crianas em idade pr-escolar, as DAS para crianas em idade pr-escolar dividem-se em 2 nveis etrios (Baixo - 2 anos e 6 meses a 3 anos e 5 meses e Alto 3 anos e 6 meses a 5 anos e 11 meses). No nvel Baixo, a Escala contm 4 subtestes centrais: Construo com Blocos, Compreenso Verbal, Semelhanas entre Figuras e Vocabulrio. No nvel Alto, as DAS contm 6 subtestes centrais: Compreenso Verbal, Semelhanas entre Figuras, Vocabulrio, Construo de Padres, Cpia e Conceitos Numricos Bsicos). As DAS permitem, ainda para esta faixa etria, a avaliao separada das capacidades Verbais e No-verbais. Consideram-se um instrumento particularmente til para crianas com dificuldades de aprendizagem e que, dependendo da idade dos examinandos, ser ou no administrado na sua totalidade (Anastasi & Urbina, 2000). Estas escalas devem ser aplicadas por um examinador experiente, demorando a sua aplicao a crianas dos 3 aos 5 anos cerca de 35 minutos. No caso das crianas com mais de 6 anos, a aplicao da prova pode estender-se at aos 85 minutos (Cohen & Spenciner, 1994).

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Enquadramento Terico 25

G)

WOODCOCK-JOHNSON PSYCHO-EDUCATIONAL BATTERY III: TESTS OF COGNITIVE

ABILITY (WJ-III COG; WOODCOCK, MCGREW & MATHER, 2001)

A Bateria Cognitiva de Woodcock-Johnson III: Testes de Capacidade Cognitiva (WJ-III Cog, Woodcock, McGrew & Mather, 2001) actualmente considerada como a bateria mais completa para explicar o funcionamento intelectual (Wechsler & Schelini, 2006). Trata-se de uma reviso da Woodcock-Johnson Psycho-Educational Battery Revised: Tests of Cognitive Ability (WJ-RCog, Woodcock & Johnson, 1989) e destina-se avaliao cognitiva de sujeitos com idades compreendidas entre os 2 e os 90 anos (Saye, 2003). Tal como outros testes de avaliao cognitiva, a WJ-III COG pode ser usada no sentido de se identificarem capacidades e/ou dificuldades, para auxiliar o diagnstico, para o planeamento de um programa educacional e para orientar a investigao cientfica, entre outros propsitos. fcil de administrar, contendo tambm um programa de cotao computorizado. constituda por duas verses, sendo que a primeira se destina a avaliar as capacidades cognitivas e a segunda o rendimento acadmico (Mather & Gregg, 2002, cit. por Wechsler & Schelini, 2006). Cada uma dessas verses apresenta duas formas: a standard e a ampliada. A forma standard constituda por dez subtestes (Compreenso Verbal, Aprendizagem Visuo-Auditva, Relaes Espaciais, Sons No-Ambguos, Formao de Conceitos, Labirintos, Nmeros Invertidos, Palavras Incompletas, Memria de Trabalho Auditiva, Aprendizagem Visuo-Auditiva no imediata) e a forma ampliada comporta outros dez (Informao Geral, Fluncia Informativa, Reconhecimento de Figuras, Ateno Auditiva, Anlise-Sntese, Velocidade de Deciso, Memria de Palavras, Nomeao Rpida de Figuras, Planeamento e Cancelamento de Pares). Esta verso ampliada dever ser usada quando existe uma necessidade de maior compreenso do sujeito numa rea especfica (Schrank, 2006).

Efectivamente, existe uma diversidade de testes de avaliao da inteligncia, que podem ser aplicados a crianas mais novas, tal como acabmos de descrever. No sendo este o objectivo primordial deste trabalho, tratou-se consequentemente, de uma breve descrio, que no esgota toda a informao acerca destes testes, bem como todos os tipos de testes de avaliao de inteligncia que podem ser utilizados com crianas em idade prescolar. Todavia, os sete instrumentos descritos representam as provas de avaliao mais utilizadas e mais referenciadas no campo da avaliao cognitiva em idades precoces.

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Enquadramento Terico 26

Sublinha-se que, destes sete, somente a WPPSI-R e a ECCOS (construda especificamente em Portugal) se encontram aferidos para a populao portuguesa. Apresentamos, de seguida, um outro conjunto de instrumentos de avaliao cognitiva, referentes s medidas de inteligncia no-verbais.

1.1.1 TESTES DE INTELIGNCIA NO-VERBALOs testes de inteligncia no-verbais incluem materiais que no requerem o uso da linguagem escrita ou falada. Essencialmente, so testes de realizao que invocam que o sujeito concretize algo, como um desenho ou a resoluo de problemas de matrizes, por exemplo, com recurso mnimo linguagem. Podem ainda ser testes de papel e lpis com itens no-verbais impressos, que induzem o sujeito a escolher uma entre vrias opes de resposta (Kaplan & Saccuzzo, 1997). Este tipo de teste mede um constructo designado de inteligncia no-verbal. Contudo, os seus itens variam de teste para teste quanto aos materiais utilizados, modo de apresentao da tarefa e tipo de resposta requerida. Por exemplo, alguns itens no-verbais requerem construes com blocos, de acordo com um modelo (e.g., os cubos da WISC), a cpia de um desenho geomtrico (e.g., testes de cpia na escala de Stanford-Binet), a concretizao de um puzzle (e.g., teste de resoluo de um puzzle nas Escalas de McCarthy), a resoluo de matrizes (e.g., Matrizes Progressivas de Raven) ou a elaborao de um desenho (e.g., Desenho da Figura Humana). Naturalmente, estas tarefas diferem quanto ao grau de envolvimento motor, estrutura, natureza do contedo no-verbal (abstracto ou concreto) e imposio de limites de tempo. No obstante, foram desenvolvidas para que as directrizes verbais na sua administrao sejam mnimas e para que, nem as capacidades de leitura nem o facto do sujeito usar uma lngua diferente, interfiram nos resultados. importante salientar que estes testes podem ser usados como partes de uma escala de inteligncia (tal como acontece nas escalas revistas anteriormente), ou isoladamente, e podem fazer parte de uma bateria ou ser utilizados enquanto instrumento isolado de despiste. neste sentido que encontramos testes no-verbais na maioria das provas de avaliao da inteligncia. Os testes de avaliao cognitiva no-verbais so extremamente teis para populaes excepcionais, devido ao contedo no-verbal e no acadmico e facilidade de administrao (Naglieri & Bardos, 1978; Bardos, Softas & Petrogiannis, 1989, cit. por Naglieri & Prewett, 1990). Existem inmeros testes de medida da inteligncia no-verbal enunciados na literatura, contudo, semelhana do que fizemos anteriormente, destacamos apenas os

Teste das Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Estudos psicomtricos e normativos com crianas dos 4 aos 6 anos

Enquadramento Terico 27

que so mais referenciados e utilizados com crianas em idade pr-escolar: O Draw a Person: Quantitative Scoring System (DAP; Naglieri, 1988), o Teste de Inteligncia NoVerbal 3 Edio (TONI-III, Brown, Sherbenou & Johnsen, 1997), a Leiter-R Escala de Performance Internacional de Leiter Revista (Roid & Miller, 1997), o Teste Universal de Inteligncia No-Verbal (UNIT, Bracken & McCallum, 1998), o Teste de Capacidades Cognitivas (CogAT, Lohman, 1954) e as Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR, Raven, 1947) (Naglieri & Prewett, 1990; Kamphaus, 1993; Cohen & Spenciner, 1994; Aiken, 1996; Alfonso & Flanagan, 1999; Anastasi & Urbina, 2000; McCallum, Bracken & Wasserman, 2001; Reynolds & Kamphaus, 2003; Bracken, 2004; Brassard & Boehm, 2007). Vejamos seguidamente a descrio sucinta destes instrumentos, sendo importante salientar que apenas dois destes testes apresentam estudos para a populao portuguesa: o Desenho da Figura Humana (DAP, Naglieri, 1988) e as Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (MPCR, Raven, 1947).

A) DRAW A PERSON: QUANTITATIVE SCORING SYSTEM (DAP; NAGLIERI, 1988)

O Draw a Person: Quantitative Scoring System (DAP; Naglieri, 1988) um sistema de avaliao dos de