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Hardening processes constitute powerful tools to confer to metals mechanical properties tailored to the exact needs of every use.This document details the phenomena and mechanisms associated with such processes.In Portuguese language.
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Alexandre José da Costa Velhinho
Mecanismos de endurecimento
de materiais metálicos
FCT, Abril de 2008
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
2
A primeira versão deste texto foi elaborada em Outubro de
2007 para apresentação ao concurso nº 708/2007 para provimento de uma vaga de Professor Coordenador na Área Científica de Engenharia Mecânica do Grupo de
Disciplinas de Tecnologia Mecânica do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
3
ÍNDICE
1. Conceitos de base .............................................................................................4
1.1. Estrutura dos materiais metálicos ....................................................................4
1.2. Deformação plástica ..........................................................................................5
2. Endurecimento ...................................................................................................7
2.1. Endurecimento por redução do tamanho de grão ..........................................9
2.2. Endurecimento por deformação plástica ....................................................... 11
2.3. Endurecimento por solução sólida ................................................................. 16
2.4. Endurecimento por precipitação .................................................................... 19
2.4.1. Sequência de precipitação ............................................................................ 22
2.4.2. Endurecimento devido às zonas Guinier-Preston ....................................... 27
2.4.3. Endurecimento químico ................................................................................. 28
2.4.4. Endurecimento de por dispersão – Mecanismo de Orowan ...................... 30
3. Importância dos mecanismos de endurecimento nas tecnologias mecânicas .................................................................................................................. 32
4. Conclusão......................................................................................................... 33
5. Bibliografia ........................................................................................................ 34
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
4
1. Conceitos de base
1.1. Estrutura dos materiais metálicos
A esmagadora maioria dos materiais metálicos utilizados em engenharia, e
certamente aqueles com os quais todos contactamos no quotidiano, apresenta-se
numa forma policristalina. Este qualificativo significa que um componente
metálico é constituído por um grande número de cristais – designados grãos – de
pequenas dimensões (as quais usualmente se situam, em termos de ordem de
grandeza, entre a dezena de micrómetros e o milímetro), que se justapõem de
modo a preencher completamente o volume da peça. Esses cristais podem
corresponder a uma ou mais fases sólidas, casos em que o material é designado
respectivamente como monofásico ou polifásico. No componente, o conjunto de
cristais da mesma fase apresenta a mesma estrutura cristalina; a orientação
espacial dessa estrutura face a um referencial exterior varia no entanto de grão
para grão, o que tem como consequência que o grau de anisotropia apresentado
pelos materiais policristalinos é normalmente inferior ao que caracteriza os
materiais equivalentes na forma monocristalina.
Deve porém recordar-se que, em condições reais, a estrutura cristalina dos
materiais apresenta um número significativo de defeitos de vários tipos, com
especial relevância, no que a este tema diz respeito, para os defeitos lineares ou
deslocações. Estas, que podem ser originadas durante a solidificação do
material, causadas pelas tensões de origem térmica decorrentes do subsequente
arrefecimento, ou motivadas pela deformação plástica do material (um aspecto
com particular interesse que será analisado posteriormente em maior detalhe)
correspondem a desalinhamentos dos átomos que constituem o cristal,
desalinhamentos esses que se organizam em torno de uma linha mais ou menos
extensa – linha de deslocação – capaz de percorrer amplas regiões do cristal.
Por corresponder a um desalinhamento relativamente às posições de
equilíbrio dos átomos, à presença de uma deslocação está sempre associada
uma distorção da rede cristalina. Uma vez que a configuração de equilíbrio
corresponde a um estado de energia mínima do sistema, os átomos desalinhados
são sujeitos a forças reactivas por parte dos seus vizinhos, o que tem por
consequência gerar um campo de tensões mecânicas em torno da linha de
deslocação, aspecto que a Fig. 1 ilustra para o caso de uma deslocação cunha.
Deve notar-se que as tensões associadas à deslocação cunha não são uniformes,
sendo compressivas acima do plano de escorregamento (correspondendo à
inserção de um semi-plano atómico adicional na rede) e de tracção abaixo do
mesmo plano. Já no caso de uma deslocação parafuso, as tensões geradas são
estritamente compressivas, e a sua intensidade decresce radialmente à medida
que nos afastamos da linha de deslocação.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
5
a) Deslocação cunha Figura 1 – Cálculo do campo de
tensões associado à presença
de uma deslocação cuja linha de
acção seja perpendicular ao
plano da figura. a) Deslocação
de tipo cunha, correspondendo à
inserção de um semi-plano
atómico na região superior da
rede. b) Deslocação de tipo
parafuso.
Vide nota 1
b) Deslocação parafuso
1.2. Deformação plástica
As deslocações presentes na rede cristalina estão fortemente implicadas na
capacidade que os materiais metálicos apresentam para se deformarem
plasticamente. Com efeito, a mobilidade das deslocações através da rede, sob a
acção de tensões resultantes de esforços aplicados ao material, constitui a chave
que permite compreender de que forma as alterações da configuração local da
rede cristalina resultam, à escala macroscópica, em alterações da forma e/ou das
dimensões do componente.
A mobilidade das deslocações presentes num cristal é condicionada pelas
interacções que, por intermédio dos campos de tensões que lhe estão
associados, se estabelecem entre deslocações vizinhas, bem como entre estas e
outros agentes – limites de grão, átomos de espécies químicas diferentes,
segundas fases – eventualmente presentes na rede cristalina e igualmente
susceptíveis de nela causar uma distorção local. No sentido de atingir mínimos
1 - As figuras não creditadas são da responsabilidade do autor. Para a sua elaboração foram
aproveitados elementos gráficos gerados pelo programa Matter – Materials Teaching Educational Resources, ed. Chapmann-Hall (1997).
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
6
locais de energia mínima, o movimento das deslocações sob a acção de tensões
aplicadas far-se-á sempre de modo a favorecer a configuração correspondente à
menor distorção possível da globalidade da rede cristalina. Esse comportamento
está exemplificado nas Figs. 2 e 3 para o caso da simples interacção entre
deslocações cunha. Consoante a orientação relativa das deslocações (paralelas
ou anti-paralelas) e a distância que inicialmente as separe, as deslocações
tenderão a atrair-se ou a repelir-se, até atingirem posições de equilíbrio.
Figura 2 – Cálculo do campo de
tensões associado à presença de
duas deslocações cunha, cuja linha
de acção seja perpendicular ao
plano da figura, situadas sobre o
mesmo plano de escorregamento
numa vizinhança próxima.
a) Deslocações paralelas. A tensão
na região entre deslocações é
superior (em módulo) à que
ocorreria na presença de uma única
deslocação: as deslocações tendem
a repelir-se.
b) Deslocações anti-paralelas. A
tensão na região entre deslocações
é inferior (em módulo) à que
ocorreria na presença de uma única
deslocação: as deslocações tendem
a atrair-se.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
7
Figura 3 – Cálculo da força que actua cada uma das deslocações da figura anterior, em função da
distância que as separa. Apesar de a longa distância a força ser claramente repulsiva ou atractiva,
de acordo com as afirmações constantes da legenda da Figura 2, observa-se neste gráfico que
essas tendências se invertem a curta distância, pelo que em cada caso existirá uma distância de
equilíbrio, correspondente à menor distorção da rede e ao estado de energia mínima do sistema.
2. Endurecimento
Do que ficou dito pode depreender-se que, através da alteração do estado de
tensões que vigora na rede cristalina é possível afectar o grau de mobilidade das
deslocações e, por essa via, controlar a aptidão do material para se deformar
plasticamente.
Ao conjunto de fenómenos capazes de tornar um material menos susceptível à
deformação plástica é dado o nome de endurecimento. Esta designação
corresponde ao facto, de fácil observação mediante um ensaio mecânico
apropriado, de que a dureza do material aumenta nessas situações. Na realidade,
o ensaio de dureza reflecte a resistência que o material opõe a ser deformado
plasticamente, e a dureza, fisicamente, está directamente relacionada quer com a
tensão de cedência [Dieter (1976)] – a qual corresponde à tensão que,
macroscopicamente, há que aplicar ao material para que se inicie a deslocação
plástica, i.e., para que as deslocações presentes sejam mobilizadas – quer com a
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
8
resistência à tracção 2 [Callister Jr. (2005)] – o nível de tensão até ao qual a
deformação plástica permanece uniforme.
Efectivamente, na generalidade dos casos, o endurecimento do material causa
um incremento simultâneo nos três parâmetros – dureza, tensão de cedência e
resistência à tracção – acompanhado de um decréscimo da ductilidade, ou seja,
da capacidade de o material se deformar antes de fracturar.
A razão última do endurecimento corresponde sempre à inibição, em maior ou
menor grau, da mobilidade das deslocações. Estas, através do equilíbrio dinâmico
entre o seu próprio campo de tensões e os restantes campos de tensões
presentes na rede cristalina, poderão ficar ancoradas na vizinhança de um
determinado obstáculo. Pode mesmo acumular-se na região do obstáculo um
elevado número de deslocações, constituindo um emaranhado designado por
floresta de deslocações – Fig. 4. A ancoragem de uma deslocação requer uma
elevação significativa do nível de tensão aplicada localmente à rede cristalina
para que seja restaurada a sua mobilidade. É a tradução à escala macroscópica
dessa elevação da tensão que implica que o material endurecido seja mais difícil
de deformar plasticamente.
Figura 4 – Floresta de deslocações
observada na região do emissor de um
transístor. Pode igualmente observar-se uma
fenda, com uma geometria oblonga, devida à
intensificação de tensões causada nesta
região limitada pela ancoragem das
deslocações, que terá permitido que se
ultrapassasse a tensão de fractura do
material.
[ Extraído de www.tf.uni-
kiel.de/matwis/amat/def_en/kap_6/backbone/r6_3_2.html]
São quatro os modos de endurecimento que iremos analisar: endurecimento
por redução do tamanho de grão 3, endurecimento por deformação plástica 4, endurecimento por solução sólida 5 e endurecimento por precipitação 6.
2 - Igualmente designada tensão de ruptura.
3 - A redução de tamanho de grão é também designada refinamento, pelo que este modo de
endurecimento poderá ser chamado endurecimento por refinamento.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
9
Em todos os casos, a razão para o endurecimento é comum, tendo já sido apontada: corresponde à ancoragem das deslocações. O que varia consoante os casos é a natureza dos agentes que contribuem para essa ancoragem, a qual procurará ser esclarecida na continuação do texto.
2.1. Endurecimento por redução do tamanho de grão
O efeito do tamanho de grão de uma liga metálica policristalina na tensão de
cedência da mesma foi estudado por E.O. Hall e N.J. Petch, que no inicio da
década de 50 do séc. XX propuseram separadamente uma equação empírica que
assume a forma [Meier (1950)]:
2
1
0 dkYY (Eq. 1)
Equação de Hall-Petch
Y – tensão de cedência
d – tamanho médio de grão
kY, 0 – constantes do material
A representação gráfica desta relação, para o caso particular de um latão
70/30, consta da Fig. 5.
A equação de Hall-Petch traduz a possibilidade de promover um aumento da
tensão de cedência (ou seja, um endurecimento em sentido lato do material)
mediante um refinamento de grão, o qual poderá resultar das condições de
arrefecimento vigentes durante a solidificação ou posterior tratamento térmico da
liga ou, em alternativa, de uma deformação plástica severa, como sucede, por
exemplo, no processo ECAP (Equal Channel Angular Pressing) [Valiev et al.
(2006)].
O mecanismo subjacente à equação de Hall-Petch repousa na capacidade dos
limites de grão de actuarem como barreiras ao escorregamento das deslocações,
em virtude das desorientações dos planos cristalinos que através deles ocorrem –
Fig. 6.
O escorregamento de uma deslocação através de um tal obstáculo, para ser
efectivo, implica um acréscimo da energia de deformação plástica, o que constitui
uma das razões pelas quais a deformação de uma liga metálica policristalina é
sempre mais difícil que a de um monocristal equivalente [Callister Jr. (2005)].
4 - O endurecimento por deformação plástica é igualmente designado como encruamento ou
endurecimento por trabalho a frio; a última designação alude ao facto de o fenómeno ocorrer numa gama de temperatura reduzida. 5 - Trata-se da solução sólida de elementos de liga.
6 - No caso de alguns tipos de material, de que são exemplo algumas ligas de alumínio, este
modo de endurecimento é designado por envelhecimento, o que alude à intervenção do parâmetro tempo na determinação do resultado do processo.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
10
Figura 5 – Representação gráfica da equação de Hall-Petch para o caso de um latão 70/30.
Adaptado de Callister Jr. (2005)
Figura 6 – Esquema exemplificativo do papel desempenhado pelos limites de grão de um material
policristalino como barreira ao escorregamento de uma deslocação.
Adaptado de Callister Jr. (2005)
O endurecimento resultante de um refinamento de grão é assim de fácil
compreensão, atendendo a que a redução do tamanho de grão corresponde, para
um volume de material constante, à multiplicação do número de grãos, e
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
11
consequentemente a um aumento da densidade de limites de grão, com um
reflexo negativo na mobilidade das deslocações.
Há no entanto que referir que o domínio de aplicabilidade da Eq. 1 exclui
tamanhos de grão demasiado reduzidos, da ordem de 10-9 m ou inferior (à escala
nanométrica os materiais policristalinos exibem comportamentos mais complexos,
que não podem ser correctamente explicados apenas pelos mecanismos
intervenientes à escala microscópica), bem como demasiado elevados (acima de
10-3 m, quando o efeito dos limites de grão pode ser considerado desprezável,
face às possibilidades existentes de escorregamento intra-granular das
deslocações).
2.2. Endurecimento por deformação plástica
O endurecimento por deformação plástica, também designado
encruamento ou endurecimento por trabalho a frio, corresponde a um
fenómeno susceptível de ocorrer perto da temperatura ambiente na maior parte
das ligas metálicas, e consiste num progressivo aumento da resistência mecânica
e da dureza à medida que o material é deformado plasticamente a uma
temperatura significativamente reduzida face ao valor da sua temperatura solidus
(ou seja, quando o contributo da difusão atómica possa ser desprezado). Por
outras palavras, o material, à medida que vai sendo deformado plasticamente,
oferece uma resistência cada vez maior a qualquer incremento dessa mesma
deformação. Isto mesmo está esquematizado na Fig. 7 segundo a qual a
cedência do material, que intervém para um nível de tensão aplicada y0 durante
uma primeira deformação (trajecto a), verá essa tensão aumentar para níveis
sucessivamente mais elevados (y1, y2, ...) à medida que vá sendo sujeito a
deformações plásticas cada vez mais extensas (1, 2, ...).
A propensão do material para encruar é expressa pelo coeficiente de
encruamento n da Lei de Hollomon (Eq. 2), que expressa o andamento, em
regime elasto-plástico, da curva de tracção do material:
nK (Eq. 2)
Lei de Hollomon
- tensão
- extensão
K – coeficiente de resistência
n – coeficiente de encruamento
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
12
Figura 7 – Esquema exemplificativo do fenómeno de encruamento: a resistência que o material
opõe à deformação plástica eleva-se progressivamente à medida que prossegue o nível dessa
mesma deformação.
A extensão do fenómeno de encruamento pode ser apreciada, no caso de
diferentes ligas metálicas, através da análise das curvas apresentadas na Fig. 8
Da observação das referidas curvas se conclui que, tal como anteriormente
afirmado, um incremento da tensão de cedência ou da resistência à tracção
corresponde a uma redução simultânea da ductilidade, sendo igualmente
observável o facto de metais substancialmente distintos apresentarem um
comportamento similar.
Os gráficos da Fig. 8 fazem intervir uma grandeza – a percentagem de
trabalho a frio – que procura quantificar a quantidade de deformação plástica a
frio sofrida pelo material, em termos da variação da área da secção recta do
componente:
100%0
0
A
AAw
f
c (Eq. 3)
wc % – Percentagem de trabalho a frio
A0 – Área inicial da secção recta
Af – Área final da secção recta (após
deformação plástica a frio)
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
13
Figura 8 – Gráficos ilustrativos das variações
da tensão de cedência (a), resistência à tracção
(b) e ductilidade (c) em função da percentagem
de trabalho a frio, para os casos de um aço
1040, de um latão e do cobre.
Adaptado de Callister Jr. (2005)
O mecanismo subjacente ao encruamento está relacionado com dois reflexos
complementares da deformação plástica sobre a população de deslocações
presentes na rede cristalina do material.
Em primeiro lugar, há que considerar o facto de a deformação plástica ocorrer
em virtude da mobilização das deslocações pré-existentes na rede. Esta
mobilização tende a causar uma aglomeração dessas deslocações junto de
eventuais obstáculos ao seu movimento, com consequente interacção dos
respectivos campos de tensão. Este efeito surge patente na sequência de
micrografias obtidas por microscopia electrónica de transmissão de uma lâmina
de cobre sujeita a diferentes níveis de deformação plástica – Fig. 9. Aí se observa
uma evolução gradual [Argon (1996)]: inicialmente as deslocações organizam-se
segundo fileiras paralelas regularmente espaçadas, numa tentativa de
minimização da energia de distorção da rede cristalina resultante das interacções
mútuas dos seus campos de tensão (Fig. 9a)); à medida que a deformação
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
14
prossegue, as deslocações vão sendo forçadas a aproximar-se e a entrelaçar as
suas linhas de deslocação, definindo desse modo paredes intra-granulares que
permanecem abertas (Fig. 9b)); numa etapa posterior, em virtude de uma
aproximação ainda maior das deslocações, tais paredes tendem a fechar-se,
constituindo os chamados limites de sub-grão, e definindo células de
deslocações (Fig. 9c)) cuja dimensão média se reduzirá posteriormente caso a
deformação prossiga.
Figura 9 – Observação em microscopia óptica
de transmissão de microestruturas de
deslocações resultantes da deformação plástica
de lâminas de cobre. a) Arranjo regular de
fileiras de deslocações regularmente
espaçadas. b) Paredes intra-granulares
abertas. c) estrutura de células de deslocações.
Extraído de Argon (1996)
A progressiva redução das células de deslocação tem consequências na
tensão necessária para deformar um material cristalino, a qual corresponde
[Argon (1996)] a:
D
bGK (Eq. 4)
– resistência à deformação plástica
K – constante de proporcionalidade
G – módulo de elasticidade transversal
b – módulo do vector de Burgers
(parâmetro da deslocação)
D – dimensão média das células de
deslocações
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
15
Por outro lado, em virtude da presença de fontes de deslocações, durante a
deformação plástica assiste-se à criação de um importante número de novas
deslocações [Smallman (1999)] – Fig. 10 – as quais fornecem uma importante
contribuição adicional para a redução da mobilidade da população de
deslocações e, consequentemente, para a elevação do nível de tensão
necessário para promover essa mesma mobilidade.
Figura 10 – Fonte de Frank-Read, consistindo numa linha de deslocação ancorada em dois nós.
Quando, por acção de uma tensão aplicada, a deslocação é compelida a mover-se por
escorregamento, a sua linha tende a assumir uma configuração com um raio de curvatura
progressivamente decrescente (pontos 1 e 2) . Para lá do ponto 2, a expansão da deslocação
prossegue rapidamente, numa tentativa de alcançar uma nova configuração de equilíbrio, o que
leva, entre os pontos 4 e 5, à criação de uma nova deslocação fechada, que continua em
expansão, enquanto a deslocação original regressa a uma configuração de equilíbrio, disponível
para encetar um novo processo análogo. As fontes de Frank-Read constituem apenas um de
diferentes tipos de fontes de deslocação activas num material cristalino durante a deformação
plástica.
Extraído de Smallman (1999)
Por conseguinte, em virtude da acção das fontes de deslocações, assiste-se
durante a deformação plástica a um aumento da densidade de deslocações, o
qual é igualmente responsável por uma elevação da resistência à deformação
plástica [Argon (1996)]:
bG (Eq. 5)
– constante de proporcionalidade
G – módulo de elasticidade transversal
b – módulo do vector de Burgers
(parâmetro da deslocação)
– densidade de deslocações
É a elevação do nível de tensão necessária para assegurar a deformação
plástica, que ressalta das equações 4 e 5, que precisamente permite entender o
fenómeno do encruamento.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
16
2.3. Endurecimento por solução sólida
É amplamente conhecido o facto de os metais de elevada pureza serem
frequentemente mais macios do que as suas ligas. Este fenómeno, que se
encontra na base do interesse da adição de elementos de liga à maior parte dos
materiais metálicos utilizados em engenharia, é demonstrado, para o caso
particular do sistema cobre-níquel, pelos gráficos da Fig. 11, onde é possível
verificar que, à medida que ocorre um aumento do teor de níquel, a tensão de
cedência e a resistência mecânica se elevam, ao mesmo tempo que ocorre uma
deterioração da ductilidade do material.
Figura 11 – Efeito do teor de níquel em solução
nas ligas do sistema cobre-níquel nas
propriedades mecânicas do material:
a) tensão de cedência;
b) resistência à tracção;
c) ductilidade.
Adaptado de Callister Jr. (2005)
No entanto, um tal efeito apenas se verifica nos casos em que o elemento de
adição seja capaz de se comportar como soluto numa solução sólida,
dissolvendo-se na rede cristalina do elemento maioritário (solvente). Nessa
eventualidade, à distorção da rede cristalina do solvente que se gera em torno de
cada átomo do soluto – ilustrada na Fig. 12 para o caso de soluções sólidas
substitucionais, mas igualmente presentes quando o soluto seja de natureza
intersticial – está associado um campo de tensões (de carácter compressivo
quando o raio atómico do soluto seja superior ao do solvente, e de tracção no
caso oposto).
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
17
Figura 12 – Distorção da rede do solvente
associada à presença de um átomo
substitucional de soluto. No caso do átomo
azul, o raio atómico do soluto é superior ao do
solvente, gerando um campo de tensões
compressivas na sua vizinhança. Quanto ao
átomo laranja, o raio atómico do soluto é inferior
ao do solvente, gerando em seu redor um
campo de tensões de tracção.
É justamente a indução desses campos de tensões que permite explicar o
mecanismo de endurecimento, uma vez que, ao interagirem com os campos de
tensão intrínsecos das deslocações, os mesmos irão contribuir para reduzir a
mobilidade destas, como forma de minimizar a energia do sistema, de acordo com
o esquema da Fig. 13.
Figura 13 – Interacção entre uma deslocação e uma atmosfera de átomos em solução na rede
cristalina, mediante os respectivos campos de tensão. a) A energia de distorção da rede cristalina
associada à dissolução da segunda espécie atómica é moderada, pelo que a deslocação conserva
alguma mobilidade. O efeito endurecedor é limitado. b) Efeito endurecedor mais efectivo, graças à
energia de distorção da rede mais elevada por parte dos átomos de soluto, susceptível de limitar
mais amplamente a mobilidade da deslocação.
Adaptado de Naylor (2007)
O efeito de ancoragem das deslocações devido ao aumento do teor de soluto
encontra-se ilustrado na Fig. 14 onde se comparam simultaneamente as curvas
de tracção e a população de deslocações de uma liga de alumínio de alta pureza
(99,5 wt%) com outra contendo 5 wt% de magnésio.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
18
Figura 14 – Comparação das curvas de tracção de uma liga de alumínio de elevada pureza e de
outra liga contendo 5 wt% Mg. Simultaneamente ilustra-se a densidade e o arranjo das
deslocações presentes nos dois materiais após deformação, constatando-se existir, para o mesmo
nível de deformação, uma multiplicação do número de deslocações quando o elemento de liga
está presente.
Diferentes abordagens teóricas têm procurado esclarecer em detalhe o efeito
de endurecimento por solução sólida, tendo em vista o estabelecimento de
previsões para as variações das propriedades mecânicas em diferentes
situações. Uma das mais frequentemente empregues no caso das soluções
sólidas diluídas preconiza que a tensão necessária para que uma deslocação
consiga ultrapassar, mediante o encurvamento da sua linha de acção, uma
atmosfera de átomos de soluto pode ser calculada através da equação [Dieter
(1976)]:
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
19
cdc
da
aG
3
4
15,2
(Eq. 6)
Mott-Nabarro
G – módulo de elasticidade
transversal
a – espaçamento interatómico da
rede do solvente
c – concentração de soluto
2.4. Endurecimento por precipitação
A dureza dos materiais metálicos pode ser incrementada através da formação
de uma rede uniforme de nano-precipitados disseminados por toda a rede
cristalina, no que se designa como endurecimento por precipitação ou
envelhecimento.
Ao contrário dos mecanismos de endurecimento anteriormente abordados,
capazes de operar em materiais cristalinos indistintamente mono- ou polifásicos, o
endurecimento por precipitação apenas pode ser posto em jogo em ligas
metálicas polifásicas com características bem determinadas do ponto de vista da
sua constituição. Essas características podem ser resumidas como:
uma solubilidade máxima apreciável do soluto (componente B) no
solvente (componente A);
um limite de solubilidade de B em A rapidamente decrescente com a
diminuição da temperatura do sistema;
teor de B na liga inferior ao seu limite máximo de solubilidade.
Estas características, representadas esquematicamente na Fig. 15,
correspondem por exemplo às ligas dos sistemas alumínio-cobre , cobre-berílio,
cobre-estanho, magnésio-alumínio e ainda a algumas ligas ferrosas, bem como
as superligas à base de níquel.
O endurecimento por precipitação é normalmente desencadeado mediante
uma sequência de tratamentos térmicos a que a liga é sujeita, globalmente
designados como envelhecimento artificial, por oposição ao envelhecimento
natural, susceptível de ocorrer à temperatura ambiente, mas envolvendo uma
escala de tempo significativamente mais alargada.
O ciclo térmico característico do envelhecimento artificial está representado na
Fig. 16. Corresponde a um estágio inicial a uma temperatura pertencente ao
domínio monofásico , ao qual se segue um arrefecimento rápido, e terminando
num novo estágio a uma temperatura mais baixa do que a primeira, e localizada
no interior do domínio bi-fásico + .
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
20
Figura 15 – Comparação entre os
diagramas de equilíbrio de três
sistemas binários, revelando distintas
aptidões ao endurecimento por
precipitação.
O sistema 1 apresenta um reduzido
limite máximo de solubilidade (à
temperatura eutéctica), limitando
consideravelmente a gama de
composições capazes de endurecer
por precipitação.
O sistema 3, por outro lado, permite
solubilizar teores substancialmente
mais elevados de soluto.
Contudo, a solubilidade praticamente não varia durante o arrefecimento desde a temperatura
eutéctica, inviabilizando a possibilidade de endurecer por precipitação.
Apenas o sistema 2 conjuga as duas características, possibilitando que todas as ligas a ele
pertencentes com um teor de soluto inferior ao limite máximo de solubilidade sejam endurecíveis
por precipitação.
Contudo, em virtude da forte dependência térmica da solubilidade no estado
sólido, o sistema terá tendência, no decurso do seu arrefecimento até à
temperatura ambiente, a exibir segregação do soluto, com consequente
precipitação de grãos de fase , os quais ocorrerão indistintamente nos limites de
grão ou no interior dos grãos da fase , conforme se ilustra na Fig. 17a).
Figura 16 – Sequência de tratamentos térmicos correspondentes ao envelhecimento artificial, com
indicação da localização das temperaturas pertinentes no diagrama de equilíbrio do sistema
bifásico A-B.
Adaptado de Callister Jr. (2005)
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
21
Porém, essa tendência termodinâmica pode ser contrariada, uma vez que a
formação dos precipitados de , comandada por um mecanismo de difusão,
apresenta uma cinética lenta. Através de um arrefecimento rápido, é possível
prevenir a segregação, mantendo a estrutura monofásica até à temperatura
ambiente – Fig. 17b).
Figura 17 – Estrutura
cristalina e microestrutura
resultantes do arrefecimento
de uma liga solubilizada.
a) Arrefecimento lento: em
virtude da segregação da
espécie B através de um
mecanismo difusivo, formam-
se precipitados,
cristalograficamente distintos
da fase-mãe, de uma nova
fase .
b) Arrefecimento rápido: em
virtude da velocidade de
arrefecimento elevada, a
difusão permanece
inoperante; os átomos de B
permanecem em solução na
rede da fase ; não há
precipitação de qualquer nova
fase, e a solução sólida
permanece sobressaturada.
A solução sólida encontra-se agora em estado de sobressaturação, o que
corresponde a uma situação metaestável, susceptível de evoluir para uma
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
22
configuração energética mais favorável assim que sejam criadas as condições
para ultrapassar a correspondente barreira de activação para a difusão. Sendo
esta um mecanismo termicamente activado, tais condições prevalecem
justamente durante o tratamento térmico de precipitação que se segue à obtenção
da solução sobressaturada.
2.4.1. Sequência de precipitação
A cinética de precipitação da fase continua contudo a ser lenta,
correspondendo a sua formação a um processo gradual, durante o qual se forma
uma sucessão de fases metaestáveis intermédias. Essa sucessão está
esquematizada na Fig. 18, contendo a Tabela 1 uma breve caracterização das
diferentes fases.
a) Solução
sólida
sobressaturada
Figura 18 – Sequência evolutiva da precipitação da fase a partir da solução sólida
sobressaturada. a) Solução sobressaturada: os átomos de soluto (B) encontram-se dissolvidos
na rede cristalina do solvente (A); registe-se a abundância de lacunas resultantes do
arrefecimento rápido.
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23
b) Zonas GP
c) Estruturas de
transição I
Figura 18 – Sequência evolutiva da precipitação da fase a partir da solução sólida
sobressaturada. b) Zonas de Guinier-Preston (GPZ): concentrações localizadas de átomos de
soluto em planos específicos da rede cristalina da solução saturada. As tensões induzidas na rede
cristalina são essencialmente devidas à diferença entre os raios atómicos das duas espécies. c)
Estruturas de transição I: as GPZ previamente formadas actuam como locais de nucleação para
uma fase intermédia perfeitamente coerente com a rede da fase . Em seu redor, surgem tensões
na rede cristalina devidas à importante distorção criada.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
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d) Estruturas de
transição II
Figura 18 (cont.) – Sequência evolutiva da precipitação da fase a partir da solução sólida
sobressaturada. c) Estruturas de transição I: as GPZ previamente formadas actuam como locais
de nucleação para uma fase intermédia perfeitamente coerente com a rede da fase . Em seu
redor, surgem tensões na rede cristalina devidas à importante distorção criada. d) Estruturas de
transição II: à medida que a dimensão dos precipitados aumenta, algumas das tensões são
aliviadas, devido à perda de coerência com a rede da fase , com concomitante formação de
deslocações na interface. Os precipitados são agora semi-coerentes, i.e., mantêm a coerência
segundo algumas direcções mas perdem-na segundo outras. e) Fase de equilíbrio : separados
da matriz de fase a por uma fronteira bem definida, estes precipitados, resultantes da coalescência
de vários precipitados de transição de menores dimensões, são completamente incoerentes, daí
resultando uma relaxação das tensões de distorção da rede cristalina.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
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e) Fase de equilíbrio
Figura 18 (cont.) – Sequência evolutiva da precipitação da fase a partir da solução sólida
sobressaturada. e) Fase de equilíbrio : separados da matriz de fase a por uma fronteira bem
definida, estes precipitados, resultantes da coalescência de vários precipitados de transição de
menores dimensões, são completamente incoerentes, daí resultando uma relaxação das tensões
de distorção da rede cristalina.
Tabela 1 – Principais características das fases observadas na sequência de precipitação durante
o envelhecimento.
Tipo Características
Solução sólida sobressaturada
Metaestável
Átomos de soluto dispersos na rede cristalina do
solvente
Zonas de Guinier-Preston
Metaestáveis
Morfologia discóide
Diâmetro: ~ 100 Å; Espessura: ~ 2 planos atómicos
Coerentes [alinhamento perfeito dos seus planos
atómicos (consequentemente, dos planos de
escorregamento das deslocações) com os da matriz ]
Campos de tensões associados devem-se às diferentes
dimensões de ambas as espécies atómicas
Muito pequenas e dispersas; porém, os seus campos
de tensões estendem-se muito para além das suas
fronteiras
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
26
Tabela 1 (cont.) – Principais características das fases observadas na sequência de precipitação
durante o envelhecimento.
Tipo Características
Estruturas de transição I
Metaestáveis
Coerentes
Campos de tensões associados devem-se
fundamentalmente à distorção induzida na rede no
sentido de acomodar a coerência dos precipitados
Estruturas de transição II
Metaestáveis
Semi-coerentes (há continuidade entre planos atómicos
segundo algumas direcções, mas não segundo outras)
Campos de tensões associados relaxam devido à perda
parcial de coerência
Precipitados de equilíbrio
Estáveis
Dimensões micrométricas
Incoerentes
Relaxação motivada pela perda de coerência conduz a
uma diminuição significativa da tensão de distorção da
rede
Das diferentes características apresentadas pelos diversos tipos de
precipitados decorre uma variação das características mecânicas ao longo da
duração do tratamento térmico de precipitação, de acordo com o que se observa
na Fig. 19. A cada tipo de precipitado está associado um determinado mecanismo
de ancoragem das deslocações presentes no cristal, e o comportamento global do
material resulta, em cada momento, das diferentes contribuições desses
mecanismos.
A curva 1 da figura corresponde à redução do teor de soluto que se verifica
com o início da sequência de precipitação e que se traduz num amaciamento da
solução sólida. Contudo, esse amaciamento é muito cedo compensado pela
formação das GPZ, a que corresponde a curva 2, e que causa um endurecimento
devido à sua natureza coerente. Este efeito é amplamente suplantado numa fase
mais avançada do processo – curva 3 – com a formação das fases intermédias (I
e, posteriormente, II), que corresponde a um aumento do número e dimensão de
precipitados coerentes, potenciadores do chamado endurecimento químico. Os
mecanismos até aqui referidos possuem um carácter aditivo. O mesmo não
sucede com o aumento do número e dimensão dos precipitados incoerentes (fase
intermédia II, seguida da fase ), apenas capazes de endurecimento por
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
27
dispersão, a que corresponde a curva 4. A curva global exibe assim um valor
máximo, correspondente à dureza mais elevada susceptível de ser alcançada
durante o envelhecimento. A duração ideal do tratamento de precipitação
corresponde à posição desse máximo, considerando-se que ocorreu um
sobreenvelhecimento quando esse ponto é ultrapassado e as propriedades do
material se começam a degradar.
Figura 19 – Evolução da
dureza do material ao longo
da sequência de
precipitação. As curvas
numeradas representam:
1 – Perda de soluto na
solução sólida;
2 – Formação das GPZ;
3 – Formação de
precipitados incoerentes;
4 – Formação de
precipitados coerentes.
A importância relativa da contribuição dos vários tipos de precipitado para o
comportamento global do material deve-se à forma diferenciada como inibem a
mobilidade das deslocações.
2.4.2. Endurecimento devido às zonas de Guinier-Preston
As zonas de Guinier-Preston, em virtude da sua reduzida extensão,
constituem apenas ligeiras perturbações da rede cristalina. Em virtude desse
facto, podem ser percorridas pelas deslocações durante o seu movimento; este
apenas é dificultado pelos campos de tensões associados à distorção sofrida pela
rede para acomodar a coerência – Fig. 20 – numa situação bastante semelhante
à anteriormente descrita para o endurecimento por solução sólida.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
28
Figura 20 – Movimento de
uma deslocação, ao longo do
seu plano de
escorregamento, através de
uma zona de Guinier-
Preston. O acréscimo de
tensão necessário para
promover este movimento é
devido à distorção da rede
cristalina.
2.4.3. Endurecimento químico
Já no caso dos precipitados coerentes (fases de transição I) e em menor
medida dos semi-coerentes (fases de transição II), as deslocações, embora
capazes de se mover através deles, só o fazem mediante a deformação plástica
dos mesmos, o que requer um significativo acréscimo da tensão que lhes é
imposta – endurecimento químico (Fig. 21).
Esse acréscimo de tensão corresponde, no caso mais simples, ao acréscimo
da área da interface precipitado/matriz, de acordo com o esquema da Figura 22.
a)
Figura 21 – a) Movimento de
uma deslocação, ao longo do
seu plano de
escorregamento, através de
um precipitado coerente,
tendo resultado a
deformação plástica do
precipitado.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
29
b)
Extraído de Haasen (1996)
Figura 21 (cont.) –b)
Deformação plástica de
precipitados coerentes numa
liga Al – 19 Ni – 6 Cr
envelhecida durante 540 h a
750 ºC e sujeita a uma
deformação de 2%.
Figura 22 – Deformação plástica de um precipitado coerente, resultante do seu atravessamento
por uma deslocação. A deformação é acompanhada pela criação de uma nova região interfacial
precipitado/matriz, cuja área total é dA.
A tensão necessária para promover o escorregamento da deslocação na
presença destes precipitados corresponde a [Marshall (1997)]:
2
2
12
3
bG
rfI (Eq. 6)
- constante do material
I – energia de superfície da interface por
unidade de área
f – fracção volumétrica de precipitados
r – raio médio dos precipitados
G – módulo de elasticidade transversal
b – módulo do vector de Burgers (parâmetro
da deslocação)
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
30
2.4.4. Endurecimento de por dispersão – Mecanismo de Orowan
Por último, a presença de precipitados incoerentes (Fase ) requer que as
deslocações, para prosseguirem o seu movimento, os contornem, seja através de
uma mudança de plano de escorregamento (mediante um movimento de trepa ou
de escorregamento cruzado) ou de uma variação da curvatura da sua linha de
deslocação, que lhes permita passar entre dois precipitados – Fig. 23.
O último caso, ilustrado em maior detalhe na Fig. 24, corresponde ao
denominado mecanismo de Orowan, A eficácia deste mecanismo é
inversamente proporcional à dimensão dos precipitados e à distância média entre
os mesmos, razão pela qual apenas se torna efectivo quando os precipitados
assumem dimensões bastante reduzidas, tipicamente inferiores a 1 m.
Figura 23 – Mecanismos disponíveis para que uma deslocação possa contornar um precipitado
incoerente.
A tensão de Orowan, necessária para que a deslocação ultrapasse o
obstáculo mediante o encurvamento da sua linha de acção é dada por [Dieter
(1976)]:
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
31
bG
(Eq. 7)
Orowan
- constante do material
G – módulo de elasticidade transversal
b – módulo do vector de Burgers (parâmetro
da deslocação)
– espaçamento entre precipitados
Há que notar que, quando uma deslocação passa através de um obstáculo de
Orowan, permanece em torno de cada precipitado um anel de deslocação. Este
anel, de que um exemplo pode ser apreciado na Fig. 25, tem por efeito
incrementar o diâmetro efectivo do precipitado, pelo que o espaçamento da Eq.
7 diminui gradualmente à medida que o material é deformado, o que constitui um
contributo adicional para o encruamento do mesmo.
Figura 24 – Sequência do mecanismo de Orowan, através do qual uma deslocação é
forçada a variar a curvatura da sua linha de acção para progredir para além de um
alinhamento de precipitados incoerentes de reduzidas dimensões. É apresentado um
gráfico da variação da tensão com o espaçamento médio entre precipitados. Adaptado de Ashby (1996)
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
32
Figura 25 – Anel de deslocação resultante da passagem de uma deslocação em torno
de um precipitado incoerente, numa liga de cobre. Extraído de Argon (1996)
A terminar, deve referir-se que estes diferentes mecanismos podem ocorrer de
modo simultâneo numa liga metálica, pelo que a estratégia mais acertada para o
endurecimento deverá passar pela criação de condições, durante o tratamento de
envelhecimento, para aproveitar o máximo potencial de cada mecanismo, de
modo a optimizar as propriedades do material.
3. Importância dos mecanismos de endurecimento nas tecnologias
mecânicas
O conhecimento dos mecanismos de endurecimento assume uma importância
fundamental no que respeita à utilização dos diferentes materiais metálicos nos
vários domínios da engenharia, seja na determinação dos métodos de
processamento aplicáveis a um determinado material, na escolha das condições
de processamento conducentes ao equilíbrio mais adequado para o conjunto de
propriedades que o material virá a apresentar em serviço, ou ainda na previsão do
modo como as mesmas eventualmente evoluirão ao longo do ciclo de vida do
componente.
No domínio particular das tecnologias mecânicas, o nível de dureza do
material na fase ciclo produtivo em que é submetido a um determinado método de
processamento, condiciona significativamente os resultados obtidos. Por maioria
de razão, a variação, no decurso do processamento, desse mesmo nível de
dureza (porque por exemplo o material apresenta encruamento, ou porque as
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
33
temperaturas a que é sujeito condicionam a sua constituição [tamanho de grão,
solubilidade, número, natureza e distribuição das fases presentes]) pode
influenciar, por vezes a ponto de comprometer, a viabilidade da aplicação de uma
determinada tecnologia ao material em questão para produzir o componente
pretendido. A esse título, a susceptibilidade do material ao endurecimento
constitui uma variável a ter presente na definição do método e das condições de
processamento mais adequadas ao fim em vista.
Por exemplo, no que se refere às tecnologias de enformação de chapa, é
desejável, sempre que as deformações a aplicar sejam extensas, que o material a
trabalhar apresente um coeficiente de encruamento elevado, condição em que a
uniformidade da deformação e a resistência à fractura são melhor garantidas
[Marciniak (2002)].
Por outro lado, durante as operações de maquinação uma dureza elevada é
normalmente considerada prejudicial, uma vez que o incremento das forças de
atrito dela resultante tende a instabilizar a apara formada (degradando o nível de
acabamento superficial e a precisão dimensional do componente produzido),
causa uma elevação das temperaturas atingidas durante o processamento e
contribui para um mais acentuado desgaste da ferramenta de corte. Contudo,
neste domínio, o que importa conhecer não é o comportamento do material à
temperatura ambiente e com velocidades de deformação reduzidas, e sim o modo
como se comportará, no que ao endurecimento diz respeito, quando sujeito a
temperaturas e velocidades de deformação elevadas, características daquele tipo
de operações [Childs (2000)] .
4. Conclusão
No decurso deste texto, procurou-se fornecer ao aluno os elementos
necessários à compreensão da importância dos mecanismos de endurecimento
dos materiais metálicos no que se refere à determinação das propriedades dos
mesmos e ao comportamento que são susceptíveis de exibir durante o
processamento e em serviço.
Nesse sentido, foram apresentados quatro diferentes modos de endurecimento:
endurecimento por redução do tamanho de grão (refinamento);
endurecimento por deformação plástica – encruamento;
endurecimento por solução sólida;
endurecimento por precipitação – envelhecimento.
Mecanismos de Endurecimento de Materiais Metálicos
34
Em cada caso, após descrição fenómeno, procedeu-se à apresentação do
mecanismo que lhe está subjacente, com ênfase para o facto de que, pese
embora a diversidade dos agentes contributivos (limites de grão, restantes
deslocações, átomos de soluto ou nano- e micro-precipitados), a explicação
última do endurecimento é comum à totalidade dos casos estudados, residindo na
limitação da mobilidade das deslocações (mobilidade que constitui a principal
razão da deformação plástica destes materiais).
A terminar procurou chamar-se a atenção para a pertinência do conhecimento
destes mecanismos quando se pretende proceder, com maior nível de detalhe, a
uma abordagem das tecnologias mecânicas de processamento dos materiais
metálicos.
5. Bibliografia
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Media: Deformation at Low Temperatures in R.W. Cahn, P. Haasen (Eds.)
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Callister Jr. W. (2005) Fundamentals of Materials Science and Engineering
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Childs T., Maekawa K., Obikawa T., Yamane Y. (2000) Metal Machining –
Theory and Applications (1st ed.) Butterworth-Heineman pp. 416
Dieter G.E. (1976) Mechanical Metallurgy (2nd ed.), McGraw-Hill pp. 776
Meier M. (2004) The Hall-Petch Relationship, Department of Chemical
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Marciniak Z., Duncan J.L., Hu S.J. Mechanics of Sheet Metal Forming (2nd
ed.) Butterworth-Heinemann pp. 228
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incluído no programa “Matter – Materials Teaching Educational Resources”,
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Naylor D., Cochrane R., The Steel University, International Iron & Steel
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Smallman R.E., Bishop R.J. (1999) Modern Physical Metallurgy and
Materials Engineering – Science, Process, Applications (6th ed.)
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Valiev R.Z., Langdon T.G. (2006). Principles of Equal-Channel Angular
Pressing as a Processing Tool for Grain Refinement. Progress in Mater.
Sci. 51: pp. 881-981