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1 MEDIAÇÕES DOS SIGNIFICADOS DA ESCOLHA E AVALIAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS DIGITAIS DE PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR EM PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA KATIA ALEXANDRA DE GODOI E SILVA 1 MARIA CRISTINA LIMA PANIAGO 2 Resumo: Este estudo apresenta o recorte do primeiro momento de pesquisa realizada com professores do ensino superior participantes de um grupo de estudo definido como Análise das Mediações dos Significados da Escolha e Avaliação de Materiais Didáticos Digitais de Professores do Ensino Superior em Processo de Formação Continuada. A fundamentação teórica provém das abordagens de formação de professores que os orientam para a utilização de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) e suscitam a questão da escolha dos materiais no formato digital. Metodologicamente, o trabalho caracteriza-se como pesquisa de abordagem qualitativa e utiliza a entrevista como instrumento de produção dos dados, no intuito de criar um espaço de interlocução, escuta atenta, reflexão e decisão compartilhada. A organização e elaboração de significados levaram à proposição de duas temáticas. A primeira, à qual se deu o nome de Reflexão sobre a Escolha e Avaliação de Material Didático Digital, desvelou-se como referência para a segunda, que reflete as experiências dos professores participantes, denominada Reflexão sobre a Ressignificação da Prática Pedagógica. Nesse processo reflexivo dos professores, foi possível pensar em parâmetros para a construção de projetos futuros no contexto de escolha, utilização e avaliação dos materiais didáticos digitais em suas práticas pedagógicas. Palavras-chave: Formação continuada de professores do ensino superior. Escolha e avaliação de materiais didáticos digitais. Mediação de significados. INTRODUÇÃO - O CONTEXTO DA PESQUISA Esta pesquisa tem como contexto um Grupo de Pesquisa e Estudos em Tecnologia Educacional e Educação a Distância (Geted) 3 que se propõe a divulgar, socializar e partilhar pesquisas, estudos, teorias e práticas vividas, experienciadas e desenvolvidas por pesquisadores, professores e alunos, estudiosos envolvidos com temática da utilização das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) na Formação de Professores e Práticas Docentes e as suas implicações no contexto educacional. O Geted reúne atualmente 12 pesquisadores (Universidade Católica Dom Bosco UCDB; Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul UEMS; Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS e Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais CEMRI, da Universidade Aberta) e oito estudantes (Graduação, Mestrado e Doutorado) da 1 PNPD/Capes. Universidade Católica Dom Bosco, PPGEducação, Brasil. E-mail: [email protected]. 2 Universidade Católica Dom Bosco, PPGEducação, Brasil. E-mail: [email protected]. 3 O grupo, certificado pelo CNPq, foi criado em 2006, pelas pesquisadoras professora Dra. Maria Cristina Lima Paniano e professora Dra. Arlinda Cantero Dorsa.

MEDIAÇÕES DOS SIGNIFICADOS DA ESCOLHA E … · Adotamos a metodologia qualitativa, pois, de acordo com Chizzotti (2006), a pesquisa qualitativa assume, hoje, multiparadigmas de

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MEDIAÇÕES DOS SIGNIFICADOS DA ESCOLHA E AVALIAÇÃO DE

MATERIAIS DIDÁTICOS DIGITAIS DE PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR

EM PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA

KATIA ALEXANDRA DE GODOI E SILVA 1

MARIA CRISTINA LIMA PANIAGO 2

Resumo: Este estudo apresenta o recorte do primeiro momento de pesquisa realizada com

professores do ensino superior participantes de um grupo de estudo definido como Análise

das Mediações dos Significados da Escolha e Avaliação de Materiais Didáticos Digitais de

Professores do Ensino Superior em Processo de Formação Continuada. A fundamentação

teórica provém das abordagens de formação de professores que os orientam para a utilização

de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) e suscitam a questão da

escolha dos materiais no formato digital. Metodologicamente, o trabalho caracteriza-se como

pesquisa de abordagem qualitativa e utiliza a entrevista como instrumento de produção dos

dados, no intuito de criar um espaço de interlocução, escuta atenta, reflexão e decisão

compartilhada. A organização e elaboração de significados levaram à proposição de duas

temáticas. A primeira, à qual se deu o nome de Reflexão sobre a Escolha e Avaliação de

Material Didático Digital, desvelou-se como referência para a segunda, que reflete as

experiências dos professores participantes, denominada Reflexão sobre a Ressignificação da

Prática Pedagógica. Nesse processo reflexivo dos professores, foi possível pensar em

parâmetros para a construção de projetos futuros no contexto de escolha, utilização e

avaliação dos materiais didáticos digitais em suas práticas pedagógicas.

Palavras-chave: Formação continuada de professores do ensino superior. Escolha e avaliação

de materiais didáticos digitais. Mediação de significados.

INTRODUÇÃO - O CONTEXTO DA PESQUISA

Esta pesquisa tem como contexto um Grupo de Pesquisa e Estudos em Tecnologia

Educacional e Educação a Distância (Geted)3 que se propõe a divulgar, socializar e partilhar

pesquisas, estudos, teorias e práticas vividas, experienciadas e desenvolvidas por

pesquisadores, professores e alunos, estudiosos envolvidos com temática da utilização das

Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) na Formação de Professores e

Práticas Docentes e as suas implicações no contexto educacional.

O Geted reúne atualmente 12 pesquisadores (Universidade Católica Dom Bosco –

UCDB; Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS; Universidade Federal de

Mato Grosso do Sul - UFMS e Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais

– CEMRI, da Universidade Aberta) e oito estudantes (Graduação, Mestrado e Doutorado) da

1PNPD/Capes. Universidade Católica Dom Bosco, PPGEducação, Brasil. E-mail: [email protected]. 2Universidade Católica Dom Bosco, PPGEducação, Brasil. E-mail: [email protected]. 3 O grupo, certificado pelo CNPq, foi criado em 2006, pelas pesquisadoras professora Dra. Maria Cristina Lima Paniano e

professora Dra. Arlinda Cantero Dorsa.

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UCDB e outras instituições cadastrados no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico

e Tecnológico (CNPq). Esses pesquisadores e estudantes reúnem-se em encontros presenciais,

a cada 15 dias, e a distância, por meio de encontros utilizando a ferramenta Hangout, além de

manterem um grupo fechado na rede social Facebook (PANIAGO; GODOI, 2015a, 2015b).

Recentemente, os encontros presenciais estão direcionados aos orientandos de uma das

criadoras do grupo. Os participantes são pesquisadores e professores de diferentes áreas,

oriundos de universidades públicas e privadas, todos em processo de formação continuada.

A cada semestre, esses pesquisadores optam por estudar determinada temática. No

decorrer do primeiro semestre de 2015, a temática estava relacionada à escolha e avaliação de

Materiais Didáticos Digitais (MDD)4.

Para Godoi (2009, 2013), essa temática constitui-se um dos múltiplos temas das TDIC

na educação e conta com pesquisa extensa, de mais de 20 anos, com propostas de diversos

autores.

Embora essa temática seja discutida por diversos autores, observamos ausência de

conhecimento sobre o assunto por parte de alguns pesquisadores, neste caso, os pesquisadores

que compõem o Geted. Nesse sentido, este estudo objetiva apresentar, para reflexão, um

recorte do primeiro momento de pesquisa realizada com professores do ensino superior,

definida como Análise das Mediações dos Significados da Escolha e Avaliação de Materiais

Didáticos Digitais de Professores do Ensino Superior em Processo de Formação Continuada.

Para responder a essa questão, adotamos a abordagem metodológica qualitativa

(CHIZZOTTI, 2006). E como instrumentos de produção de dados utilizamos as entrevistas

reflexivas (SZYMANSKI, 2004).

Entende-se que as estratégias metodológicas facilitam o entendimento do estudo, por

meio de um olhar atento, despretensioso e atitude investigativa que analisa o que está por trás

do que emerge como dado de pesquisa (YUNES; SZYMANSKI, 2005). No caso deste estudo,

nosso olhar de pesquisadoras focou os significados das leituras sobre a escolha e avaliação de

MDD.

Nesse sentido, a seguir, problematizamos a formação continuada para a escolha e

avaliação de MDD e apresentamos a metodologia da pesquisa, discutindo as entrevistas

reflexivas. Por fim, consideramos algumas inquietações que emergiram no contexto deste

estudo.

4Consideramos como MDD: recurso digital cujos elementos permitem a inserção de novas informações; a expressão do

pensamento; o estabelecimento de relações; desenvolvimento da interação social; compartilhamento de produções, trabalho

em colaboração; a modelação, simulação, animação, combinação multimídia; possibilitando estratégias de ensino e modos

de aprendizagem diversificados.

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2 FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES PARA A ESCOLHA E

AVALIAÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO DIGITAL

No Brasil, a preocupação com a formação de professores não é recente. De modo geral, tem

sido sempre discutida por alguns autores (NÓVOA, 1995; PACHECO, 1995; GIMENO

SACRISTÁN; PÉREZ GOMES, 1998, GARCÍA, 1999; TARDIF; LESSARD, 2005;

IMBERNÓN, 2009, 2010).

Nossa intenção, neste estudo, não é analisar os momentos históricos pelos quais

passou e/ou tem passado a formação de professores, nem tampouco suas perspectivas. Nosso

propósito é tecer considerações sobre o conceito de formação continuada de professores,

especialmente de pesquisadores universitários do Geted, para a escolha e avaliação de MDD.

Utilizamos a expressão “formação continuada de pesquisadores para a escolha e

avaliação de MDD”, que ocorreu no primeiro semestre de 2015, visando a compreender as

concepções, contribuições e implicações dessa temática para os pesquisadores.

Primeiramente, pontuamos nosso entendimento de formação, que nesse contexto

assumiu o sentido de transcender a visão do

[...] ensino que pretende uma mera atualização científica, pedagógica e didática e se

transforma na possibilidade de criar espaços de participação, reflexão e formação

para que as pessoas aprendam e se adaptem para poder conviver com a mudança e a

incerteza. (IMBERNÓN, 2010, p. 15).

Em uma análise geral, a formação continuada ocorre quando os professores estão em

pleno exercício de sua profissão. Essa modalidade constitui-se com atividades planejadas por

instituições ou até pelos próprios professores, de modo a permitir o desenvolvimento

profissional e aperfeiçoamento do ensino que ministram (GARCÍA, 1999).

Nessa perspectiva, também consideramos ser fundante para o processo de formação

“[...] abrir caminho para a verdadeira autonomia profissional compartilhada, já que a profissão

docente deve compartilhar o conhecimento com o contexto” (IMBERNÓN, 2010, p. 15).

Ao retomar o contexto das formações voltadas para o uso das tecnologias na educação

no Brasil, especialmente as formações que ocorrem no âmbito das políticas dos programas e

projetos governamentais para a implantação e formação das TDIC na educação, ao longo dos

últimos trinta anos, as quais passaram a ter como referência a abordagem centrada na

aprendizagem e a concepção pedagógica subjacente ao uso dessas tecnologias, o

construcionismo (PAPERT, 1985), observamos que, no decorrer desses anos, outros

conceitos, outras teorias educacionais e abordagens de formação foram relacionados a esse

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conceito com a finalidade de ajudar a compreender, principalmente, por que, como, para que e

quando incorporar as tecnologias à prática pedagógica.

Desta forma, diferentes abordagens de formação foram adotadas: a mentorial;

reflexiva e contextual; estar junto virtual. (VALENTE, 1999; ALMEIDA, 2000a, 2004;

PRADO, 2003). Essas abordagens de formação ainda coexistem, integram-se,

complementam-se e completam-se.

A partir da retomada dessas abordagens e pensando no contexto em que este estudo

está inserido, assim como na diversidade, no aumento da oferta, nos avanços e na

disponibilidade de MDD, provenientes dos setores privado e público, Godoi (2013) propôs e

viabilizou uma formação continuada, voltada para o contexto de atuação e baseada na

reflexão sobre a escolha e avaliação de MDD, por professores envolvidos na elaboração de

um Plano de Avaliação Contextual (SHAGHNESSY, 2002; RAMOS et al., 2004). Godoi

(2013) explica que essa abordagem objetiva preparar o professor para ter autonomia,

capacidade seletiva, avaliativa e da utilização desses materiais pertinentes à sua prática

pedagógica.

Para Almeida (2000b, p. 111): “A formação adequada para promover a autonomia é

coerente com um paradigma de preparação de professores críticos-reflexivos [...]”. Portanto,

nesse processo, são necessárias reflexões sobre as potencialidades desses materiais no formato

digital na formação pedagógica, numa perspectiva centrada na aprendizagem. E também que

sejam analisados seu potencial e seus limites, de forma a dar condições ao professor de

desenvolver autonomia para decidir com qual MDD trabalhará.

Nos anos de 1992 e 1993, na Coordenação de Informática na Educação Superior

(Cies)/Educom da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), identificamos apenas uma

formação de professores para a escolha de MDD5. Desta forma, a pesquisa direcionada para a

escolha e avaliação de MDD dentro desses programas e projetos aparece, especificamente,

nos trabalhos de Guimarães, Araujo e Erber (1985) e Campos (1989). E a formação de

professores para escolha e avaliação de material no formato digital, dentro desses programas e

projetos, emerge a partir dos estudos de Campos (1994).

Além desses programas e projetos governamentais brasileiros, há outras pesquisas, no

Brasil e em outros países, segundo diferentes autores (CAMPOS, 1994; REEVES;

HARMON, 1996; SQUIRES; PREECE, 1996; GAMEZ, 1998; COSTA, 1999; SQUIRES;

5 Metodologia de Avaliação da Qualidade do Software Educativo (MAQSE).

5

PREECE, 1999; MARQUES GRAELLS, 2001; SILVA, 2002; ISTE, 2002; SHAGHNESSY,

2002; RAMOS et al., 2004).

No intuito de viabilizar um processo de formação para professores do ensino superior

e pesquisadores de um grupo de estudo e pesquisa, apresentamos um recorte do primeiro

momento desta pesquisa realizada. Para isso, recorremos e utilizamos a entrevista reflexiva,

como instrumento de produção dos dados, no intuito de criar um espaço de interlocução,

escuta atenta, reflexão e decisão compartilhada.

3 METODOLOGIA – A ABORDAGEM E O INSTRUMENTO DE PRODUÇÃO DE

DADOS

Adotamos a metodologia qualitativa, pois, de acordo com Chizzotti (2006), a pesquisa

qualitativa assume, hoje, multiparadigmas de análise; adota multimétodos de investigação

para o estudo de um fenômeno em determinado contexto; além de procurar tanto encontrar o

sentido desse fenômeno quanto interpretar os significados que os sujeitos dão a eles.

Como instrumento de produção de dados, utilizamos a entrevista reflexiva

(SZYMANSKI, 2004), por caracterizar-se como processo interativo e de busca da

horizontalidade nas relações entre todos os participantes da entrevista.

Antes de prosseguir com as explicações sobre o recorte, vale destacar e justificar que

contamos, neste estudo, com dois pesquisadores entrevistados, os quais foram identificados

conforme codificações constituídas por uma letra referente ao mnemônico da palavra

pesquisador, seguido de um algarismo que identifica o número de participante, tal como: P1 =

Pesquisador 1 e P2 = Pesquisador 2.

Desta forma, as entrevistas ocorreram após um semestre de estudo com o Geted, a

partir da seguinte indagação: Qual o significado das leituras sobre a escolha e avaliação de

MDD, realizadas no decorrer dos encontros do 1o semestre de 2015 no Geted?

A entrevista como prática reflexiva, proposta por Szymanski (2004), supõe um

encontro interpessoal, no qual todos são protagonistas. Esse processo inclui a reflexão sobre a

fala de ambos, tanto das entrevistadoras que elaboram as perguntas e, no decorrer da

entrevista, expressaram as suas compreensões aos entrevistados, para, finalmente, juntos,

construir um novo conhecimento, numa condição de horizontalidade (SZYMANSKI, 2004).

Essa horizontalidade demanda alguns momentos da entrevista. Neste estudo foram

realizados dois encontros, para que os pesquisadores mantivessem uma relação reflexiva.

Nessa interação, abrimos um diálogo para que o tema em questão pudesse ser aprofundado.

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Nesse sentido, o primeiro encontro com os pesquisadores resumiu-se à exposição dos

objetivos da pesquisa e ao convite para que refletissem sobre o significado das leituras sobre a

escolha e avaliação de MDD.

O segundo encontro foi agendado após a transcrição dos dados construídos na

primeira entrevista, os quais foram colocados à disposição dos entrevistados, que puderam

concordar, discordar ou acrescentar novos dados.

Yunes e Szymanki (2005, p. 4) explicam que, na entrevista reflexiva:

[...] o primeiro momento da pesquisa (o encontro inicial) pode propiciar uma

estruturação de ideias, que pode ser modificada diante da exposição organizada do

momento seguinte (o segundo encontro). Essa consideração mostra o dinamismo das

informações que obtemos em nossas pesquisas e aponta para o cuidado de não

apresentá-las como algo definitivo, mas como possibilidades de transformações.

Essas transformações estão sendo construídas com os pesquisadores do grupo e têm

agregado muitas informações.

Antes de iniciarmos as problematizações sobre a formação continuada para a escolha e

avaliação de MDD, vale esclarecer que, para as interpretações dos dados, elaboramos dois

agrupamentos, a saber: (1) Reflexão sobre a escolha e avaliação de MDD; (2) Reflexão sobre

a ressignificação da prática pedagógica.

4 DISCUSSÕES DOS RESULTADOS – SIGNIFICADOS DA ESCOLHA E

AVALIAÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS DIGITAIS PELOS PESQUISADORES

Conforme explicado, a avaliação de MDD constitui-se como um dos múltiplos temas das

TDIC na educação. Para Costa (2004), Ramos et al. (2011) e Godoi (2013), essa temática

permanece atual, principalmente pela crescente oferta de MDD, entre eles os que estão

disponíveis on-line, tornando-se um desafio à formação de professores, particularmente os

que desejam integrar as TDIC nas práticas pedagógicas.

Constitui uma necessidade cada vez mais premente na atualidade refletir sobre

processos de formação, tanto inicial, quanto continuada, que preparem os professores para

uma análise crítica e reflexiva desse material no formato digital, voltada para a escolha e

avaliação desses materiais no contexto de utilização.

A partir dessas reflexões com professores, Godoi (2007, 2013) vem pesquisando

processos de formação sobre a escolha e avaliação de MDD. Para Costa (2004), é necessário

trabalhar em profundidade com eles, a partir da sua prática pedagógica. É importante

oferecer-lhes a oportunidade de serem, eles próprios, a descobrir e a concluir sobre o valor

pedagógico dos MDD, ajudando-os a conhecê-los detalhadamente, a decidir sobre a escolha e

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o posterior uso com seus alunos e a encontrar um espaço de reflexão sobre a avaliação de

qualquer tipo de material no formato digital.

A partir dessa perspectiva, iniciamos as problematizações com os pesquisadores do

Geted, especificamente, para o recorte deste artigo, dos significados da escolha e avaliação de

MDD de professores do ensino superior em processo de formação continuada.

As entrevistas com esses pesquisadores possibilitaram constatar uma variedade de

significados atribuídos aos estudos sobre a escolha e avaliação de MDD, que caracterizaram

principalmente as reflexões dos pesquisadores sobre a formação da escolha e avaliação de

MDD e reflexões sobre a ressignificação da prática pedagógica dos pesquisadores.

Essas reflexões estão articuladas nas falas dos pesquisadores e, por isso, optamos por

mantê-las na íntegra para facilitar a compreensão da pesquisa.

A seguir, trazemos trechos das entrevistas produzidas pelos pesquisadores a respeito

de tais reflexões. Uma das pesquisadoras afirma:

Quando eu tive contato com o material, na disciplina, eu confesso que eu fiquei um

pouquinho... não é perdida, mas... é como se eu não tivesse muito bem a noção do

que era, do que era esse material didático digital e esse processo de avaliação desse

material. Então, foi no grupo de estudo que a gente começou e a gente já começou

com a leitura dos textos... [...] E aí começou a fazer mais sentido pra mim. Eu

consegui entender um pouco melhor, apesar de também, nesse processo das

leituras, eu ter tido bastante dificuldade de compreender o processo de avaliação...

[...] E depois, pra minha prática, eu achei muito importante, muito interessante,

porque a gente compreende que a gente tem uma infinidade de material pronto, que

a gente não sabe muito bem onde está, a gente não sabe muito bem de que forma

que está armazenado e nem se ele tem algum rigor, ou se ele é alguma coisa que foi

produzida sem nenhum tipo de preocupação, de cuidado para o fim educativo e, às

vezes, a gente pega esse material e utiliza sem saber muito bem a fonte. [...] Então,

a gente conhece alguns repositórios, por meio das leituras, onde buscar, a gente

começa a entender que existem alguns termos que ajudam a busca... Então, eu acho

que tudo isso foram aprendizagens que a gente fez a partir das discussões dos textos

no grupo. [P1]

Esse extrato revela que os estudos sobre a escolha de MDD tiveram um significado

para a formação continuada da pesquisadora, que relata desconhecer os conceitos pertinentes

ao MDD e ao processo de escolha e avaliação desses materiais.

O conceito de MDD está relacionado ao avanço do desenvolvimento das TDIC e, em

consequência, ao aumento considerável da disponibilidade, multiplicidade, diversidade e a

própria noção de conteúdo educativo que são desenvolvidos para diversas áreas do

conhecimento. Ramos (2013, p. 88) explica que “[...] não apenas pelos avanços dos saberes

científicos (e de outra natureza), mas também pelo impulso do próprio desenvolvimento

tecnológico”.

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Adotamos, portanto, o termo MDD como recurso digital com potencialidades para

contribuir para a prática pedagógica do professor. Para Almeida e Valente (201, p. 9), os

recursos que sobressaem nessa direção são os softwares mais abertos, ou seja, “aqueles que

permitem inserir novas informações, expressar o pensamento, estabelecer relações,

desenvolver a interação social, compartilhar produções, trabalhar em colaboração [...]”.

No entanto, Godoi (2013) esclarece que, para além da definição e distinção dos

recursos, o foco precisa estar no contexto de uso do MDD. Desta forma, qualquer que seja o

tipo de material no formato digital, o professor precisa estar preparado para sua integração,

utilização, mediação e intervenção pedagógica.

Essa ação, em contexto associado com o domínio e a compreensão das potencialidades

pedagógicas do MDD, segundo Ramos et al. (2011), auxiliará os professores a escolher de

forma criteriosa os materiais. Essa escolha poderá ser feita por meio da sua avaliação em

contexto (SHAGHNESSY, 2002; RAMOS et al., 2004). Apesar da complexidade desse tipo

de avaliação, essa análise realizada pelo professor permite compreender o que cada material

pode oferecer e/ou possibilitar como potencial para o processo de ensino e aprendizagem.

Após constatar a complexidade que envolve o conceito de MDD e compreender como

se estabelece o processo de avaliação desses materiais no contexto de sua utilização, a

pesquisadora revela que ressignificou sua prática pedagógica, pois começou a ser mais

criteriosa na escolha desses materiais.

Outra pesquisadora revela:

Bom, pra mim, inicialmente, por ter sido um assunto que eu não tinha domínio, teve

um significado relacionado à minha própria formação. E como professora do curso

de Pedagogia, os estudos possibilitaram reconhecer a importância de discutir com

os acadêmicos oportunamente critérios para avaliação de material didático digital.

Outro aspecto diz respeito ao encaminhamento dos textos organizados e discutidos

durante o estudo, pois com as leituras pude me aproximar mais do que se tratava a

questão da avaliação dos materiais didáticos digitais. E é fundamental! Porque

estamos acostumados a discutir critérios de avaliação de materiais didáticos de

modo geral, mas não na perspectiva somente da avaliação de materiais didáticos

digitais, mais do que isso, é preciso analisar, utilizar, criar condições para

utilização dos materiais. Entendo que foi de fundamental importância, para minha

formação. [P2]

Esse extrato retrata que os estudos sobre a escolha e avaliação de MDD tiveram um

significado para a formação continuada da própria pesquisadora, no sentido de que era uma

temática fora de seu domínio e, que, a partir da aproximação e apropriação dessa temática,

conseguiu compreender a sua relevância.

A pesquisadora também ponderou sobre a ocorrência de discussões, no âmbito das

políticas públicas, de iniciativas que tratam da avaliação de livros, com o objetivo de subsidiar

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o trabalho pedagógico dos professores e, ao mesmo tempo, a ausência de discussões na

perspectiva do MDD.

Mais do que a ausência, a pesquisadora considera importante trazer à baila essa

reflexão no âmbito da formação inicial de professores, a partir do uso pedagógico que dele se

faz. Desta forma, o relato revela, ainda, que a pesquisadora atribui outro significado à sua

prática pedagógica. Em outras palavras, ela a ressignifica, na medida em que pretende discutir

e problematizar essa temática com seus alunos de um curso de Pedagogia.

CONSIDERAÇÕES

O objetivo deste estudo foi apresentar, para reflexão, um recorte do primeiro momento de

pesquisa realizada com professores do ensino superior, participantes de um grupo de estudo,

definido como Análise das Mediações dos Significados da Escolha e Avaliação de Materiais

Didáticos Digitais de Professores do Ensino Superior em Processo de Formação Continuada.

Para atingi-lo, adotamos a metodologia qualitativa e como instrumento de produção de

dados utilizamos a entrevista reflexiva, a qual possibilitou um processo interativo e de

horizontalidade nas relações entre todos os participantes da entrevista.

Dentre os resultados da pesquisa, ficaram evidentes as reflexões realizadas pelos

pesquisadores sobre a escolha e avaliação do MDD e, consequentemente, sobre a

ressignificação da prática pedagógica.

Finalmente, como resultado, acreditamos que contribuímos para a formação

continuada dos pesquisadores, no sentido de compreender a complexidade que envolve o

conceito de MDD e as implicações sobre a integração desses materiais na prática pedagógica,

tanto no âmbito da formação inicial como continuada de professores.

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