Memoria Historica Da Escola Guignard (1)

Embed Size (px)

Citation preview

Memria Histrica da Escola Guignard

Memria Histrica

da Escola Guignard

Antnio de Paiva Moura

Antnio de Paiva Moura

Memria histrica da

Escola Guignard

Usina de Livros

Ficha tcnica

Digitao e composio

Reviso

Superviso

Ilustraes internas e capa Carlos Wolney Soares

FICHA CATALOGRFICA

Catalogo na fonte

CDU. 869.03

C

MOURA, Antnio de Paiva

Memria histrica da Escola Guignard, Annimo de Paiva Moura- Usina de Livros, Belo Horizonte

1993

84p.

1. Literatura brasileira

1. Pesquisa

1. Ttulo

Sumrio

1 APRESENTAO

2 O LIBERALISMO DIDTICO E O MODERNISMO

2.1 Criao da Escola de Belas-Artes

2.2 O Papel da Guignard

3 O PERODO DISCENTE

3.1 A Escola de Belas-Artes de Belo Horizonte

3.2 Dificuldades financeiras e sede

3.3 O significado da Escola Guignard

4 PERODO DOCENTE

4.1 Escola Guignard

4.2 Os primeiros momentos sem Guignard

5 PERODO ESTATAL

5.1 Escola de Belas-Artes e Artes Grficas

5.2 Amparo governamental

5.3 Atividades

6 A EMPRESA DO RECONHECIMENTO

6.1 Fundao Escola Guignard

6.2 Pedido de autorizao de funcionamento

6.3 Ncleo experimental

7 A ESCOLA CONTEMPORNEA

7.1 Momento histrico

7.2 Administrao e pesquisa

7.3 Possibilidade e limites de uma escola de arte

7.4 Sede prpria.

7.5 Autorizao de funcionamento e reconhecimento

7.6 Extenso

7.7 Ps-Graduao

7.8 Realizaes artsticas

7.9 A Escola Guignard como objeto de pesquisa

Este livro foi editado pelo SISPRACE Sistema de Racionalizao de Custo Editorial do

Sindicado dos Escritores do Estado de Minas Gerais

Julho de 1993

Rua Tupinambs, 179 11 andar Fone 224-7330

Prefcio

O presente trabalho, certamente de carter polmico, merece um estudo detido que possa avaliar sua cientificidade, sua metodologia e principalmente as suas bases histricas. Acostumamo-nos com a segurana do trabalho histrico do autor e aqui, certamente, o leitor encontrar provas evidentes da pertinncia e seriedade da sua atual pesquisa.

Ocorre-nos salientar que, a despeito de qualquer apreciao contrria, o livro do professor Moura tambm merecedor de nossa diligente ateno pelo fato de vir ao encontro das atuais preocupaes de seus professores e alunos que se empenham numa reflexo sobre a realidade cultural da Escola Guignard, no momento mais agudo de sua crise institucional. com base num estudo do passado que ho de se descortinar as verdadeiras trilhas do futuro. Em tudo h de perdurar a vontade de ser fiel ao grande propsito de Alberto da Veiga Guignard, artista-mestre e mestre-artista.

Moacyr Laterza

1 Apresentao

A tarefa de escrever a Histria da Escola Guignard teve incio por volta de 1970, quando comecei a reunir a documentao constante de seus prprios arquivos, de arquivos pblicos, de bibliotecas e de pessoas ligadas entidade. Participando ativamente da vida da Escola desde 1966, percebi que ela comea a ser freqentada, envolvida e administrada por pessoas que nada conheciam de seu iderio. Foi assim que, em 1970, ocorreu-me a idia e a iniciativa de elaborar um folheto contento informaes bsicas sobre a trajetria social da Escola, desde sua fundao at aquele momento. A proposta de edio do referido opsculo com 48 pginas foi acatada pela diretoria da Escola que o denominou de A Projeo da Escola Guignard.

H muito, estudiosos, figuras da administrao pblica e outros interessados, reclamam e sugerem-me um novo trabalho de carter historiogrfico sobre a Escola Guignard. Compreendem a exata necessidade de uma descrio crtica dos fatos do passado em sintonia com a atualidade, como subsdio a outros analticos sobre a presena da Escola Guignard nas artes plsticas em Minas e no Brasil.

No presente relato histrico no me conduzi pela exaltao de personalidades importantes no mbito social e poltico. Ao contrrio, procurei abordar os acontecimentos de forma global, sem enfatizar a iniciativa individual. As pessoas so citadas no como agentes nicos e absolutos dos fenmenos, mas como protagonistas dos fatos. So os ex-alunos da Escola, desde sua fundao, os personagens principais desta memria histrica.

O critrio metodolgico da diviso do presente trabalho partiu da inteno de mostrar que toda vez que houve alterao no nome da entidade, tambm as suas estruturas pedaggicas e administrativas foram alteradas. Isso levou-me a sua histria a partir dos seus seis ttulos, ao longo do meio sculo: Escola de Belas-Artes, Escola de Belas-Artes de Belo Horizonte, Escola Guignard, Escola de Belas-Artes e Artes Grficas, Fundao Escola Guignard e, simplesmente, Escola Guignard.

2 O Liberalismo didtico e o modernismo

2.1 Criao da Escola de Belas-Artes

Criada em 1943, com o nome de Escola de Belas-Artes, pelo ento prefeito Juscelino Kubitschek. Isto , iniciativa de Juscelino, mas um ato traduzido pela sua caracterstica oratria e estilo de ao. No dizer de Gavino Mudado, a escola foi resultado de um convnio (contrato) entre Juscelino e o artista Alberto da Veiga Guignard, at ento inteiramente disponvel no Rio de Janeiro. As informaes das possibilidades da vinda de Guignard para Belo Horizonte, foram ventiladas nos contatos que o prefeito manteve com Oscar Niemeyer em 19423. Era desejo do prefeito ver a sua cidade como uma metrpole, que pudesse contar com um alto nome; que pudesse atrair as atenes e denominar as opinies; que viesse para ficar e no por emprstimo. Desejava um imigrante e no um passageiro contribuinte.(1)

Existia em Belo Horizonte tambm a Escola de Arquitetura, que funcionava como curso livre, porm com contedo de curso superior.

Pelo Decreto Municipal n 151, de 28 de fevereiro de 1944, os dois estabelecimentos foram reunidos no que se chamou de Instituto de Belas-Artes de Belo Horizonte, com a seguinte estrutura: o patrimnio da Escola de Arquitetura seria incorporado ao da prefeitura. No fez meno ao da Escola de Belas-Artes, porque ainda no o possua. Previa autonomia didtica para a Escola de Arquitetura na correspondncia com a da Escola Nacional de Belas-Artes do Rio de Janeiro, com o objetivo de ultimar a obteno de um reconhecimento pelo governo federal e de seus benefcios.(2)

1.Servio Pessoal P016-C301 Arquivo Fundao Escola Guignard.

2.Cpia do Decreto Municipal n 151/44-P001-C202-Arquivo da Fundao Escola Guignard.

Percebe-se aqui, perfeitamente, a presena de Guignard na elaborao do projeto, ao no aceitar o enquadramento da escola em qualquer estatuto ou regimento que eqivalesse ao da Escola Nacional de Belas-Artes. Na reunio das duas escolas da cidade, fica transparente a idia de uma Universidade de Arte. Mas uma das escolas se subordina ao sistema nacional de educao e a outra se insurge contra ele. Esta ambivalncia que vai forar o fracasso do Instituto de Belas-Artes, tomando cada escola o seu caminho desejado, sem que possamos contar com este e tambm saber qual foi a atuao do seu primeiro diretor Joo Kubitschek, primo do prefeito.

A Escola de Arquitetura foi incorporada Universidade de Minas Gerais, pelo Decreto Municipal n 179, de 26 de julho de 1946. Se no legalmente extinto, estava, pelo menos, paraltico o chamado Instituto de Belas-Artes.

Em 11 de novembro de 1947 , o ento prefeito da capital, Joo Franzen de Lima, atravs do Decreto Lei n 209, em reforma administrativa da prefeitura, conferia instituio e efmero nome de Curso de Belas-Artes , incluindo no quadro de pessoal do municpio, e cargos de professor de Arte (3). O professor Jos Martins Kascher, ocupante deste cargo, recebeu vencimento pela prefeitura at 1947. Os professores Alberto da Veiga Guignard e Edith Behring receberam at o incio de 1949 (4).

Em 1948 era prefeito de Belo Horizonte o Sr. Octaclio Negro de Lima. Antimodernista intransigente, investiu-se contra a Escola Guignard, revogando os atos do ex-prefeito Franzen de Lima. Revelando sua ojeriza arte moderna e, voltando as vistas para a Escola Guignard, que vinha funcionando em prdio da prefeitura, situado no Parque Municipal, (hoje IMACO), inventou destru-la: mandou avisar aos professores que a mesma tinha acabado, afixando porta do edifcio um intimao sumria de desocupao e, com isto, supor que havia estirpadoo gosto belorizontino pela pintura moderna. Mandou, ainda, dizer a Guignard que aguardasse a fundao de escola da municipalidade, onde seria aproveitado como professor de Desenho (5). A imprensa comentou o fato com muita nfase, como na coluna de Quirino Camporiorito, do Dirio da Noite do Rio de Janeiro, em 15 de maro de 1948, alertando o governo do Estado quanto necessidade de impedir o que considerava um crime contra o museu, o fechamento da Escola.

3-Oliva,Jero-Registro Civil das Pessoas Juridicas- Editora Forense, Belo Horizonte, 1969, pg.73

4-Oliva,Jero-ob.cit. pg.73

5-Oliva,Jero-ob.cit.pg.84

Com este ato ia comear um agitado captulo na histria da referida escola. A posio resoluta de Guignard e de seus companheiros deixa os adversrios em pnico. O primeiro passo foi o de retirar o material da escola, renegada pelo prefeito, que o levam a um salo nos pores do Instituto de Educao, com autorizao do Dr. Emlio Moura. Da, valendo-se da amizade de alunos com o presidente do Diretrio Acadmico o do Partido Socialista Brasileiro, mantiveram a mesma funcionalidade na sede desta agremiao poltica. Foi ento que os alunos Amilcar de Castro e Mrio Silsio pleitearam auxlio do governo do Estado, e em trabalho conjunto ao ento secretrio de Estado da Fazenda, Jos de Magalhes Pinto, conseguiram uma bubveno de Cr$15.000,00 mensais, pela Loteria do Estado. Com este recurso, instalou-se a escola no Edifcio Goitacases,

n 54, durante o ano de 1949, quando o prefeito Negro de Lima recusou reformar o contrato de Guignard como professor de Arte (6).

Em 1950 a subveno da Loteria chega ao fim. Sem o menor recurso, instala-se no esqueleto de concreto do Palcio das Artes.

2.2 O papel de Guignard

Este perodo que vai de 1950, caracterizar-se-ia pelo mais alto liberalismo didtico. A presena de Guignard, traduzida na sua extraordinria autoridade em assuntos artsticos de preparo notrio em todo pas, preenchia, por si s, um vazio infra-estrutural no ento chamado campo das belas-artes. No havia necessidade de uma estrutura burocrtica para o funcionamento da escola. Os caminhos pedaggicos eram traados como que de improviso, de acordo com a orientao do mestre. Os resultados deste liberalismo didtico foram rpidos e de alta positividade, mas circunscrito em momento histrico bem diferente do atual. quela poca, na cidade de Belo Horizonte, as artes plsticas no se incluam entre as atividades que possibilitavam a profissionalizao. Figuravam como disciplina que enriquecia o potencial cultural dos indivduos, entretanto no lhe permitia a dedicao plena. A funo deste liberalismo didtico a de proporcinar sociedade um salto histrico, possibilitando-lhe uma grande evoluo nas concepes estticas. No se

6-Oliva,Jero-ob.cit.pg.84/85

conheceriam os propsitos do modernismo sem o liberalismo didtico a partir de Guignard. Preferia cursos livres sem vnculo com os esquemas estatutrios e burocrticos. Seus cursos de art, dentro do momento histrico, significavam um movimento cultural e no a formao profissional. No se preocupou com expedio de diplomas, mas prontificou-se em apontar as qualidades positivas e negativas de seus alunos, expondo-lhes com seriedade e respeito, fazendo-lhes expor sem inibio.

Podemos perceber no catlogo de exposio coletiva de seus primeiros alunos em 1943, que buscou antes de tudo, a projeo humana destes revelando as potencialidades descobertas em cada um (7).

Diante disto, o mundo hierrquico e perfeccionista dos seus rivais academicistas iria aproveitar-se do vazio institucional em que se encontrava a Escola Guignard, para justificar o seu extermnio.

Denominava-se curso cada disciplina da escola, em face da opo que os alunos podiam fazer entre desenho, pintura e escultura. Nesta fase ela concluiu dois perodos de quatro anos. Embora perdida a documentao de matrcula da poca, podemos registrar os seguintes alunos: Amilcar de Castro, Aparecida Barbosa, Arlinda Corra Lima, Ariadna Bohomoletz, Chanina, Edith Bhering, Estevo, Franz Weissmann, Farnese Andrade, Heitor Coutinho, Holmes Neves, Ione Fonseca, Jeferson Lodi, Letcia Renault, Lizete Meinberg, Maria Helena Andrs, Marlia Giannetti, Mrio Silsio, Mary Vieira, Nely Frade, Petrnio Bax, Solange Botelho, Vicente de Abreu e Wilde Lacerda.

Os nomes acima ainda so testemunhas dos efeitos que o sistema pedaggico to avanado produziu em momento to difcil. No demais evocar o depoimento de Mrio de Andrade sobre este mtodo, que se baseava na no existncia de uma estrutura rgida de escola que levaria os alunos a um profissionalismo engajado, O processo desta escola contrrio ao do detestavelmente acadmico que consiste em jogar ao certo e, assim se ganha a vida. Seu ensino significa abrir a conscincia do iniciante para seus prprios potenciais, fundados no experimentar, criar e observar, isto , busca da aquisio da conscincia de poder criar.

Era visitada constantemente por artista renomados, que a consideravam um prottipo brasileiro, um modelo ideal. Portinari deixou gravado no livro de visitas, que esta era a melhor escola do Brasil. Os alunos, para espanto local, ganhavam nomes nacionais e prestgio no exterior. Eram chamados participao em murais e suas obras passaram

aos sales, bienais e museus importantes. Inquietos pesquisadores comeavam a questionar as posies universais do momento artstico, em direo vanguarda.

3 Perodo discente

3.1 Escola de Belas-Artes de Belo Horizonte

O seu segundo ttulo. Escola de Belas-Artes de Belo Horizonte foi dado pelo seu primeiro regulamento, estatudo em 21 de agosto de 1950 e que definia a sua personalidade jurdica at 1962.

Nesta fase, continua at as vsperas da morte de Guignard, o liberalismo didtico de iniciativa discente. Chamamos esta fase de Perodo Discente, de vez que os alunos esto profundamente mergulhados nos problemas e iniciativas da entidade Guignard atuava com prestgio, nome, fora, filosofia e os alunos com entusiasmo, dedicao, liberdade de participao e com firmeza na bandeira do modernismo.

3.2 Dificuldades financeiras e sede

Os problemas surgidos na fase anterior ganham complexidade e agravamento nesta fase: a precariedade e instabilidade da sede, perda das subvenes e proventos. Novamente, os alunos Amilcar de Castro e Mrio Silsio tiveram a idia de pleitear junto aos lderes das bancadas dos diversos partidos, na Assemblia Legislativa, uma subveno anual de Cr$500.000,00.

Tancredo Neves, apresentando o Projeto n 1302 na Assemblia Legislativa, justificava que todos os servios prestados; as conquistas conseguidas por Minas; todos os seu valores e pelas dificuldades do momento, a escola precisava dos recursos mnimos indispensveis manuteno dos seus cursos de Desenho, Pintura, Escultura, Artes

Decorativas e Aplicadas, alm daqueles outros tericos, paralelos aos fundamentais. No faltou apoio dos outros lderes de partidos como Oscar Corra, Andr de Almeida, Jason Albergaria e Czar Soraggi. (8). Aprovado, o Projeto foi transformado na Lei n 689 de 24 de novembro de 1950. Quando tudo estava tranqilo na Assemblia Legislativa, surge na esfera municipal um enorme e inslito problema: existia em Belo Horizonte, uma outra Escola de Belas-Artes, (hoje conhecida como FUMA Fundao Universidade Mineira de Artes), fundada em 1927, recebendo subveno federal desde 1934 e com o seu estatuto registrado desde 1939. Esta escola, orientada por Anbal Matos, era contrria evoluo modernista. Tornou-se ferrenha adversria da escola de Guignard e um ponto de concentrao das foras reacionrias dos academistas. Uma escola, que por sua natureza, no satisfazia queles desejos palpitantes da sociedade, de conferir capital uma idia de metrpole adiantada. Para conseguir o reconhecimento federal, precisava ter garantida a sua manuteno. Foi assim que resolveu pleitear a subveno conseguida pela escola na Assemblia Legislativa. Aproveitou-se do prestgio de sua administrao e Corpo Docente na rea municipal; das destituies efetuadas pelo prefeito Negro de Lima e da inexistncia da personalidade jurdica dela para iniciar a ao.

A tentativa de golpe teve um longo caminho: em agosto de 1950, pelo Decreto n . 81 do prefeito Negro de Lima, a escola foi incorporada de Anbal Matos, com o nome de Escola de Belas-Artes de Minas Gerais. Registando-se no carrio como sociedade civil, antes da fuso, Anbal Matos formulou convite a Guignard para participar da Reunio das Congregaes que iria decidir efetiv-la . Guignard recusa veementemente. Em carta sua ex-aluna Solange Botelho, em Alm Paraba, narra a situao, em uma s frase: gua no se mistura com azeite (9).

Evidentemente, que sem personalidade jurdica e tendo mesmo sido negada a sua existncia de fato, a escola no poderia receber a subveno estadual. Imediatamente, elaborou-se um estatuto, confirmando a sua existncia desde 1943, estabelecendo as primeiras normas de funcionamento, firmado por Guignard e publicado no Minas Gerais de 21 de agosto de 1950, com o nome de Escola de Belas-Artes de Belo Horizonte.

A escola de Anbal Matos entra na Justia tentando provar ser a

contemplada com a subveno estadual. Jero Oliva, no seu Registro Civil

contemplada com a subveno estadual. Jero Oliva, no seu Registro Civil

das Pessoas Jurdicas, no deixa escapar um s lance do processo de mais de sessenta folhas, desde a petio inicial at a sentena final do Supremo Tribunal Federal, onde a escola de Anbal Matos perdeu todas as questes. A subveno estadual de Guignard e as custas do processo, da escola de Anbal Matos.

O estatuto publicado era sucinto. Previa a formao de um conselho superior para administrar, e que seria composto do diretor da entidade mantenedora e de um representante da Congregao. A Congregao, rgo superior de didtica, era composta por todos os professores em exerccio. Estabelecia as cinco disciplinas bsicas, chamadas de curso de Pintura, Desenho, Gravura, Escultura e Histria da Arte. No final o estatuto abria um artigo para ressalvar que enquanto aqueles rgos no se constitussem com o preenchimento regular de seus membros, as sua atribuies ficariam delegada a Guignard, que vinha acumulando as funes de professor e diretor desde 1943. V-se, ento, que a elaborao deste estatuto teve a finalidade nica de constituir a sociedade, para salvar a escola das ameaas do momento, garantindo-lhe a existncia nos moldes que desejavam os alunos. (10)

Passou-se a uma entidade civil, quase particular, que a sociedade exigia fosse de responsabilidade do Estado. Guignard era o seu diretor natural, seu diretor moral. Todavia, ser diretor burocrata, era incompatvel com a sua condio de artista e professor. A partir de 1951, delegada a Artur Versiani Veloso a funo de diretor, na condio de seu procurador. Da a existncia de alguma organizao tanto na escrita dos cursos e na vida escolar dos alunos, quanto na escrita contbil.

No livro de matrculas, encerrado em cada exerccio pelo diretor-procurador, encontramos os seguintes apontamento: cento e quarenta e trs alunos no incio de 1951, quarenta no decorrer de 1952 e setenta e trs matrculas em 1953. O livro s voltar a ser escriturado em 1957. O mais antigo dirio de classe datado de 1953, comum a todos os cursos, com sessenta alunos no curso normal e doze no curso livre, perecendo nos Ter sido o nico em que Guignard registrou as freqncias e as ausncias dos alunos, com smbolos f e c. De abril a junho o total de faltas foi maior que o de comparecimento. O livro da escrita contbil mostra uma realidade muito diferente do estardalhao poltico e jurdico da vitria no pleito da subveno anual. Em 1951, a escola recebia da Secretaria de Estado da Fazenda, apenas Cr$ 10.000,00, ao invs de Cr$

10-Estatuto de 1959-P001-C 202 Arquivo da Fundao Escola Guignard

500.000,00, como havia pleiteado. Recebe doaes das mais diversificadas fontes como do Diretrio Acadmico da Universidade de So Paulo, de quadros vendidos em Salvador, de contribuies de alunos e simpatizantes em geral. (11)

De 1954 a 1961, Guignard passava a maior parte do tempo em Ouro Preto, no deixando de se preocupar com os dficit financeiros de sua escola.

Em 1951, organiza-se o Diretrio Acadmico. Estava esboada a idia de escola superior de belas-artes, mas de modo livre e no engajada ao sistema nacional de educao. Este diretrio era reconhecido pelas organizaes estudantis superiores, como se a escola fosse de nvel superior de ensino. Com a experincia dos alunos na participao dos problemas, o Diretrio, de 1951 a 1957, assume o papel de uma fundao mantenedora da escola. Atesta isto, a quase inexistncia da escrita da mesma e da existncia de uma bem organizada documentao do Diretrio Acadmico, nesse perodo. Na gesto de Arlinda Corra Lima, como presidente do Diretrio Acadmico, 1m 1951, encontramos os recibos de pagamento de vencimento a Franz Weissmann, como professor de Desenho, Pintura e Escultura, razo de Cr$ 2.000,00 mensais.(12)

No existe dirio de classe e as matrculas no so registradas no livro prprio, folhas 51 e 53. De modo muito vago, existem os requerimentos de matrculas dos alunos. O dirio de classe de 1957, destinado a Desenho, Histria da Arte, Desenho de Paisagens, Escultura, Pintura e Decorao, com quatorze alunos, constava o nome de Yara Tupinamb como aluna, que o assinou tambm como professora. Aos olhos do academicismo isto poderia significar uma heresia ou anarquia, mas de forma alguma no o foi. Era a soluo normal para os problemas de uma escola que dependia da responsabilidade dos alunos. No relatrio do exerccio de 1954 do Diretrio Acadmico, na gesto do presidente Gavino Mudado, consta que em face da fraca arrecadao daquele ano e tendo realizado excurses a So Paulo, Salvador e Ouro Preto, foram forados a suspender as aulas de Escultura com o professor Franz Weissmann e as aulas de Gravura, ficando somente as de Pintura e Desenho com Guignard, uma vez que o Diretrio nada pagava ao referido professor. O normal, ento, seria que o mesmo fosse experimentando alunos, na impossibilidade de contratar professores de nome.

11-Escrita Contbil-L101- C101 Arquivo da Fundao Escola Guignard

12-Escrita Contbil- P001- C204 Arquivo da Fundao Escola Guignard

De 1957 a 1960, a escola vivia crises agudas quanto as do final da dcada anterior. Diziam os alunos: Os professores abriram mo de seus vencimentos. Alunos e professores enfrentaram chuvas dentro do colosso de cimento armado. As autoridades continuam protelando os melhoramentos prometidos. (13) No governo de Bias Fortes o Estado atravessava uma terrvel crise financeira, devendo subvenes escola desde 1950, num montante de Cr$ 4.000.000,00. (14) Dez anos depois do despejo de Negro de Lima, o ento prefeito Amintas de Barros, desejoso de ver terminado o Teatro Municipal (Palcio das Artes), tenta novamente despej-la. Os alunos vo em comisso ao prefeito protestar, chamando a imprensa na divulgao da medida incabvel. Todos os jornais da capital, nos dias 17, 18 e 19 de maro de 1959, abriram manchetes seguidas de depoimentos de alunos, evidenciando os valores e as dificuldades da escola. O prprio Guignard iria afirmar dramaticamente: Nossa escola vive uma situao inteiramente surrealista. Se fssemos despejados e nos dessem pelo menos uma casa qualquer, ainda estaramos bem. Pois o arcabouo do Teatro Municipal, onde funcionamos, uma coisa pavorosa: chove por todo lado e muito mido. Ultimamente piorou, pois a polcia tem andado por l, chegando mesmo a colocar pessoa sob a escola.(15)

Me maio de 1957, o Diretrio Acadmico muda o nome para Grmio Acadmico Alberto da Veiga Guignard, registando seu estatuto e colocando-o sob a orientao da UEE e da UNE. Da por diante diminui sua participao nos negcios da escola, voltando-se para atividades polticas de cunho nacional, mas continuando atuaes indispensveis vida da mesma.

Com tudo isto, pde-se manter nos seus cursos um bom Corpo Docente, sendo lvaro Apocalipse, professor de Desenho Elementar, Wilma Martins de Desenho de Modelo, Vicente de Abreu de Decorao e Escultura, Gavino Mudado Filho de Desenho de Paisagem, Yara Tupinamb de Gravura, Nvia Frousar de Histria da Arte e Lizete Meinberg de Cermica.

Incluindo o curso de Belas-Artes da Escola de Arquitetura da UFMG, fundado em abril de 1957, a cidade contava com trs escolas concorrentes umas das outras. O mercado de arte crescia na proporo da passagem do tipo de sociedade tradicional para o tipo de sociedade industrial, acompanhando o aumento populacional da cidade. O

consumimos e o modernismo abriam fendas no comportamento da

sociedade. Slvio de Vasconcelos, proferindo conferncia na inaugurao do ano letivo de 1957, chamava a ateno para os enganos que se cometiam com respeito s vocaes artsticas e da a inconstncia e a flutuao das freqncias nas escola de belas-artes. A existncia de trs escolas numa cidade de meio milho de habitantes no se dava a funo de divergncia entre os seus condutores e clientes. Guignard, no meio deste clima, formulou uma questo a um jornalista: Caso que deve ser examinado o das alunas do Curso de Belas-Artes da Escola de Arquitetura. Por que as moas que freqentam aquele curso, repudiadas pelos outros alunos da faculdade no se unem a ns e passam a nossa escola?

A mdia de alunos matriculados por ano na primeira srie, era de quarenta. Na segunda essa mdia era de doze. Na terceira quatro e na ltima, 3,2 e 0. A mdia de idade era de dezenove anos. Do sexo feminino 60%, e masculino 40% das matrculas. Entre os alunos mais freqentes nesta poca figuravam os seguintes: lvaro Brando Apocalypse, Alberto de Castro, Eduardo de Paula, Gavino Mudado Filho, Jarbas Juarez Antunes, Sara vila de Oliveira, Yara Tupinamb e Wilma Martins.

Em 1960, Guignard nomeou o poeta e advogado Pierre Santos seu procurador, para represent-lo na administrao da escola. Da, uma srie de medidas, como a liberao de Cr$1.000.000,00 de subveno estadual; contratao do professor Herculano Campos para Pintura. Requereu do diretor da Imprensa Oficial, conseguindo por despacho do Dr. Jos Guimares Alves, duas prensas e um rico patrimnio em pedras litogrficas.(16)

Em 25 de junho de 1962 falecia Guignard. Iria comear uma nova fase na vida da escola.

3.3 O significado da Escola Guignard

Cabe ainda uma palavra sobre o significado da escola de Guignard. Susane Worcman, em recente estudo estabeleceu uma comparao entre o ensino da Bauhaus e desta. Afirmou que a Bauhaus no era um movimento. Tinha por misso formar uma nova gerao de

16-Prensas Litogrficas-P 008-C204-Arquivo da Fundao Escola Guignard.

Arquitetos. Ela se distinguiu dos movimentos de vanguarda pelo fato de que esses foram concebidos espontnea e empiricamente, em oposio ao poder das instituies acadmicas.As transformaes ocorridas no final do sculo XIX exigiam o surgimento de uma escola, no significando uma ruptura com a ideologia do passado.(17)

Fundada em Weimar pelo arquiteto Walter Gropius, em 1919, seis anos depois a Bauhaus foi transferida para Dessau. Em 1932 foi transferida para Berlim e fechada no ano seguinte pelo nazismo.

Guardando as devidas propores. Susane Worcman transpe a questo para a escola de Guignard e diz que, embora no tenha significado um movimento de vanguarda dentro da arte brasileira, ela foi importante para a formao daqueles artistas que por ela passaram. (18)

17-Worcman,Susane-O ensinar em Guignard-In: A modernidade em Guignard- Rio de Janeiro-Pontificia Universidade Catlica-1982-pgs.53/54

18-Worcman,Susane ob. Cit

4 Perodo docente

4.1 Escola Guignard

O seu terceiro ttulo, Escola de Belas-Artes de Belo Horizonte e o segundo do subttulo Escola Guignard, estabelecido pelo segundo regulamento, estatudos em 27 de dezembro de 1962. Caracterizava-se pelas dificuldades de preencher os vazios deixados pela morte de Guignard.

Os primeiros meses aps a morte de Guignard foram ocupados na discusso e na presena de um documento que traduzisse a filosofia e os princpios da escola. Isto , a procura da fixao de uma conduta coerente com o liberalismo didtico, agora, na ausncia de Guignard. No seria possvel atingir tal meta, sem um mnimo de burocratizao. O regulamento de dezembro de 1962 cria quatro rgos conjugados, no esforo de soluo do momento da crise da entidade, constitudos pela Congregao, Conselho de Representao, Conselho Tcnico-Consultivo e Diretoria. Com o funcionamento do organismo seria necessrio assegurar o liberalismo poltico interno, revelado na supremacia da congregao. O artigo 5 deste regulamento diz textual e taxativamente: A Congregao o rgo supremo da direo da escola. Ela era constituda pelos professores com mais de dois anos de exerccio, pelo presidente do Diretrio Acadmico e pelo diretor. Devido a ausncia de documentos ou de qualquer referncia, somos levados a crer que o Conselho Tcnico-Consultivo e o Conselho de Representantes, com vastas atribuies estatudas, tiveram pouca atuao.

As atribuies da Congregao, indo desde a fiscalizao didtica e administrativa at a nomeao e demisso do secretrio da escola, deixavam o diretor na condio de funcionrio burocrtico. Os efeitos deste liberalismo faziam emergir a seguinte contradio: no seria possvel, naquele momento, que uma congregao de professores que haviam dedicado as suas vidas aos seus trabalhos artsticos, se

responsabilizassem por todo o processo administrativo. No por falta de capacidade, e sim por falta de preparo, por falta de vivncia administrativa de seus membros. O que possibilitava o andamento precrio da escola era a experincia adquirida no perodo discente, quando fous sustentada pelo Diretrio Acadmico, havendo, portanto, consci6encia dos problemas gerais.

O novo estatuto estabelece o elenco de cursos que se constituiu de Desenho, Escultura, Gravura, Modelagem Cermica e Histria da Arte. Como o estatuto deixa em aberto contedo dos cursos, durante um ano foi discutida a estruturao necessria ao funcionamento. Na reunio do dia 6 de junho de 1963, a Congregao aprovou um projeto de organizao didtica da escola, definindo o que no estatuto vagamente chamou-se de curso. Adotam as denominaes de curso de graduao,

correspondendo a um longo ciclo bsico de trs anos. Curso de

aperfeioamento e especializao, de um ano, tendo como pr-requisito o curso de graduao, com carter estrito de trabalho, em atelier. Os cursos livres tinham carter de extenso, com aprovao da Congregao em cada realizao, sendo de curta durao. O elenco de disciplinas passou a ser de Desenho Artstico, Desenho de Paisagem, Desenho de Objeto, Desenho de Modelo Vivo, Histria Arte, Artes Decorativa, Modelagem , Escultura, Cermica, Pintura e Composio. Os programas das disciplinas do curso de graduao deveriam ser submetidos anualmente Congregao, constando de prelees, debates, argies, seminrios, exerccios de aplicao, projeto e excurses, dentro dos temas essenciais das disciplinas.

Entretanto esta organizao didtica tinha valor interno, sintetizando o desejo de harmonia, indispensvel a um andamento normal. verdade que houve uma preocupao como o reconhecimento oficial dos diplomas, mas no houve iniciativa no sentido de solicitar reconhecimento dos cursos, para no submet-los a outros padres estranhos aos da filosofia do Corpo Docente. A escola, agora, uma repblica dos professores. Permitindo a livre manifestao e os debates, consequentemente, iriam surgir as divergncias sobre o ideal da escola, passando a tomar conotao de partidos dentro da instituio. A soluo democrtica do momento iria deixar, positivamente, o hbito de aprofundar conhecimentos sobre a realidade do ensino e dos papis dos professores. A partir daqui os dirios de classe so preenchidos com mais regularidade e a escrita, em geral, preparada com a preocupao da aprovao de todos os atos da Congregao.

4.2 Os primeiros momentos sem Guignard

No primeiro aniversrio da morte de Guignard, a diretoria resolveu das mostra de muita vitalidade no ambiente da escola. No incio de agosto de 1963, o pintor Inim de Paula ministrou um curso de mural, tcnicas de afresco e mosaico. Oitenta e dois alunos inscreveram-se no curso de oito dias letivos, mas apenas quatorze tiveram freqncia total. A maioria compareceu apenas ao primeiro e ao segundo dia. Entre os alunos de maior assiduidade podemos citar os seguintes: Antnio Oliveira, Vnia Bernardes, Rilda Santos, Myrtes Barros, Maria do Cu Santiago, Amariles Teixeira, Francisco Falabela, Genoveva Gil, Luiz Santos Azevedo, Ione Fonseca, Sara vila de Oliveira, maria do Carmo Gonalves, Frei David Ruight, Jorge Santos, Jurandir Ribiero, Lotus Lobo e Vicente Sgrcia. Ainda em agosto de 1963, foi realizado um curso de Litografia, ministrado por Joo Garboggini Quaglia. Entre os alunos inscritos salientamos os seguintes: Lotus Lobo, Odila Fontes, Jarbas Juarez, Inim de Paula, varo Apocalypse e Juliana Gontijo.

As obrigaes da escola, com o currculo maior, aumentaram. O alto ndice inflacionrio e aumento do cursto de vida, pareciam anular qualquer esforo administrativo. A correspondncia do diretor Pierre Santos com as administraes pblicas estadual e municipal, no sento de conseguir liberao de subvenes, parecia consumir todo o seu tempo. A falta de recursos financeiros continuavam perseguindo o estabelecimento, que no podia ter um grande nmero de alunos para diminuir o custo dos cursos. Em 1963, os ex-alunos doaram quadros para serem sorteados entre as pessoas que adquirissem convites para um coquetel ao preo de Cr$1.000,00. Enquanto isto, o governo estadual sansionava lei transformando em fundao mantida pelo Estado, a ex-Escola de Belas-Artes de Minas Gerais, fundada por Anbal de Matos. Neste momento, as tentativas de organizao da Escola Guignard, com participao ativa da diretoria e de muita presena da Congregao, o Diretrio Acadmico tinha menos atuao. Mesmo assim, criou a biblioteca com o nome do ento diretor Pierre Santos, mantendo-a at 1968. Grande parte dos servidores administrativos foram executados por alunos, como o caso da tesoureira do Diretrio Acadmico, Maria do Carmo Gonalves, fazendo tambm os recebimento e pagamentos como contribuio em servios. A falta de documentao do Diretrio Acadmico desta poca parece indicar que ele pouco participava dos

assuntos internos da escola.

Percebendo as dificuldades de funcionamento e, ao mesmo tempos, a carncia de valores humanos da escola, em 1964, o diretor da Universidade Federal de Minas Gerais, props a fuso desta com o curso de Belas-Artes da Escola de Arquitetura, o que no foi aceito, preferindo continuar a luta para convencer as autoridades das necessidades de sua fixao, tal qual se propusera desde o incio de sua existncia. Verificando um aumento na procura dos cursos e na impossibilidade de atender toda a demanda de novos alunos, a Congregao e a diretoria resolveram aplicar um rigoroso exame de seleo entre os candidatos. Isto significativo, uma vez que o nome da escola era de tal forma valorizado, que dele jamais abririam mo. Caberia, sim, renovar sua orientao administrativa para sustentar o nus que este patrimnio cultural encerrava. Assim, em 1965, j exausto, deixa a diretoria o professor Pierre

Santos, assumindo a professora Maria Helena Andrs, cuja administrao foi de curto perodo, mas de muito proveito. Procurou manter contatos, atrair e sensibilizar as autoridades para todas as questes da escola. Dos seus entendimentos com a Congregao, surgiu a idia de colocar o Dr. Jos Guimares Alves como diretor, tendo em vista as sua qualidades pessoais, intelectuais, e por ter se revelado grande amigo da instituio.

Empossado em 30 de agosto de 1965, Guimares Alves, percebendo que no regime de subveno a escola viveria eternamente de pires na mo e que de acordo com as sucesses polticas poderia at sofrer perseguies, providenciou, inicialmente, o reconhecimento de utilidade pblica para facilitar os andamentos de todos os interesses da mesma, o que foi feito atravs de decreto do governador Magalhes Pinto, de 30 de novembro de 1965. Quatro meses depois, recebia uma subveno estadual no valor de Cr$46.000,00.Partiu, ento, decisivamente para o projeto de tornar a sociedade civil em uma escola pblica estadual. Aproveitou-se do bom relacionamento de deputado Murilo Badar no meio artstico para encaminhar o projeto. Em 27 de maio de 1966, era sancionada, pelo governador Israel Pinheiro, a lei estadual adotando-a como parte do servio pblico estadual. Em agosto do mesmo ano uma outra lei organizava todo o seu sistema, garantindo o funcionamento nos moldes do sistema estadual de administrao pblica. Os professores deveriam prestar concurso para serem nomeados e lotados no quadro de 2 grau do magistrio do Estado, tendo sido providenciado o concurso Venia legendi, com os cuidados necessrios para serem assegurados os direitos dos professores, at ento em exerccio. Providenciou a elaborao do Regime Interno, submetendo-o por inteiro Congregao, para posteriormente ser aprovado pelo governo do Estado, como estabelecia a Lei Orgnica da Escola. Estava encerrada a tarefa de Guimares Alves.

5 Perodo estatal

5.1 Escola de Belas-Artes e Artes Grficas de Belo Horizonte

Seu quarto ttulo. Escola de Belas-Artes e Artes Grfcas de Belo Horizonte, continuando o subttulo Escola Guignard foi levado a efeito pela Lei Estadual n 4181, de 27 de maio de 1966. Seus bens passam a pertencer ao patrimnio pblico do Estado, que assume a responsabilidade de seu funcionamento e de sua manuteno, ficando vinculada Imprensa Oficial, para efeitos administrativos. Para justificar este vnculo, a legislao previa a instalao e manuteno de um curso de artes grficas, mas que, na verdade, nunca funcionou.

Neste perodo a escola teve quatro diretores, nomeados pelo governador do Estado, que os escolhia em listra trplice fornecida pela Congregao e as solenidades de posse eram realizadas no gabinete do diretor da Imprensa Oficial. Vale notar que os diretores da Imprensa Oficial, Guimares Alves e Paulo Campos Guimares, cuidaram dos negcios referentes a ela, sempre com muita prestimosidade.

O primeiro diretor na fase estatal foi o Dr.Murilo Eugnio Rubio,

que dirigia tambm o Suplemento Literrio do Minas Gerais, tendo tomado posse em 24 de maro de 1967. Na mesma poca, foi eleito vice-diretor, o professor Wilde Dmaso Lacerda. O segundo diretor foi Alberto de Castro, professor de Modelagem, que tomou posse em 20 de agosto de 1968. O terceiro foi Antnio de Paiva Moura, professor substituto de Jorge Dantas na cadeira de Histria da Arte, que tomou posse em 27 de agosto de 1969. Finalmente, Helosa Selmi Dei Meinberg, professora de cermica e vice-diretora, tomou posse em 31 de agosto de 1972. A Congregao, em trs reunies, no havia chegado a um acordo sobre os trs nomes que comporiam a lista trplice a ser levada ao governador para nomeao do quarto diretor. Por ato do governador Rondon Pacheco, foi designada a vice-diretoria para ocupar o lugar do

diretor, at que fosse promovido regulamento.

5.2 O amparo governamental

Em 1966, a diretoria providenciou o encaminhamento do Regimento Interno para aprovao do governador e as nomeaes dos professores concursados. O Corpo Docente ficou constitudo da seguinte forma: de Desenho, os professores Solange Botelho, Maria Helena Andrs e Sara vila de Oliveira; de Pintura, Herculano Campos de Souza; de Gravura, Lotus Lobo Alvarenga, Yara Tupinamb e Paulo Frade Laender; de Escultura, Wilde Dmaso Lacerda; de Modelagem, Alberto de Castro; de Cermica, Heloisa Selmi Dei Meinberg; de Histria da Arte, Pierre Santos e Jorge Resende Dantas. Os professores nomeados ainda no preenchiam todo o quadro das disciplinas estabelecido no Regimento Interno, o que levou o diretor a tentar a contratao dos professores Davi Ruight, Antnio Eugnio Sales Coelho, Ana Amlia Moura Rangel, Nelo Nuno Moura Rangel e Antnio de Paiva Moura na forma de remunerao por aulas, que acabaram desistindo de continuar lecionando, em face das dificuldades para receberem os salrios.

As obras do Palcio das Artes avanavam com rapidez, alcanando o bloco B em que funcionava a Escola Guignard. Sendo escola do Estado, o tratamento ia ser bem diferente daqueles j mencionados nas pocas do prefeitos, Negro de Lima e Amintas de Barros. Providenciou-se a diviso do subsolo do bloco A do Palcio das Artes para a transferncia, com melhoria do piso, das divises e instalaes, concludas em 1968. (19)

Em 1968,o curso de Belas-Artes da Escola de Arquitetura passou a constituir-se numa unidade do sistema bsico da UFMG,transformando-se em Escola de Belas-Artes, que ampliando o seu campo, recrutou na Escola Guignard nmero considervel de professores, passando estes a representar a maior parte do Corpo Docente daquela escola. Este desfalque gerou um problema para a Guignard, j que a burocracia do sistema da administrao pblica estadual entravava a contratao de substitutos. Mesmo assim, ao longo deste perodo, foi possvel contratar professores como Amilcar de Castro, Beatriz Ramos de

19-Local de Funcionamento-P009-C.226-Arquivo da Fundao Escola Guignard

Vasconcelos Coelho, Carlos Wolney Soares, Eymard Moraes Brando, Ione Ferreira Fonseca, Ivone Etrusco Junqueira, Jos Amncio de Carvalho, Mary Lane Faria Amaral, Ruth Werneck Cortes, Vilma Rabello Machado e Zahira Souki Cordeiro.

As congregaes das escolas de nvel superior vinham perdendo as funes, sendo substitudas por outras estruturas de organizaes, chegando ao ponto de reunirem-se apenas uma vez por ano, apara nada de substancial decidirem. Na Guignard revelou-se o contrrio, tendo a Congregao uma participao muito grande em todas as questes. Nestes seis anos, reuniram-se trinta e seis vezes, na mdia de uma reunio por trimestre, tratando de assuntos como: alterao de currculo, aprovao de contas, aquisio de material escolar, assuntos artsticos, atividades de alunos, atividades de diretores, biblioteca, burocracia contbil, concluso de curso, concurso de habilitao ao curso de Belas-Artes, concurso de professores, contratao de novos professores, critrio de aprovao e promoo de alunos, curso livre, curso de recuperao, curso vocacional, encontro nacional de professores de artes, freqncia de alunos, instalaes da escola, monitores, planos de cursos, plebiscito sobre o reconhecimento da escola, quadros de classes, quadros de horrios, reconhecimento, reforma do ensino, reforma do regimento interno, regime de encaminhamento de assuntos, revezamentos semestrais, sistema estadual de ensino e voto de professor contratado na Congregao. (20)

De acordo com o currculo do Curso de Belas-Artes, o aluno que tivesse bom aproveitamento no cinco anos, poderia perfazer um total de 3.200 horas, enquanto o mnimo exigido para um nvel de ensino superior era de 2.700 horas-aula. Os dois primeiros anos eram considerados curso bsico. O terceiro ano de introduo nas matrias que compunham o conjunto de opes para especializaes. Isto , significava um preparo para as especializaes. O Regimento Interno, com 80 artigos, previa toda a forma de andamento dos cursos de belas-artes, artes grficas e vocacional. A administrao burocrtica, de certa forma, tornou-se simples, sem muito servio. O Departamento Administrativo da Imprensa Oficial cuidava da escrita, dos direitos e vantagens dos funcionrios e professores. A Tesouraria e a Contabilidade cuidavam somente de pequenas receitas e despesas, de modo muito elementar. A dificuldade maior era no se encaminhar, satisfatoriamente, os problemas administrativos a um escalo hierrquico superior e estranho aos interesses da escola.

20-Atas da Congregao L003-C220-Arquivo da Fundao Escola Guignard

Mas com a casa organizada, com os professores e funcionrios recebendo normalmente os vencimentos, as preocupaes estavam voltadas para o seu patrimnio dinmico, ou seja, conseguir equipamentos para acompanhar a evoluo das experincias e coloc-las no pice da matrcula anual para empregar nesta rea.

5.3 Atividades

De 1967 a 1973, o patrimnio didtico destinado a possibilitar ao aluno a ambientao com novas tcnicas, na busca da modernidade, teve um crescimento da ordem de 300% com relao ao at ento existente. Assim foram adquiridos projetores de slides, e cinematogrficos, episcpios, mquina fotogrfica para produo de slides e documentao, laboratrio fotogrfico bem equipado, esmeril eltrico, bigornas, mquina eltrica de furar, maarico para solda a oxignio, aparelho de solda oxiacetilncia completo para escultura, substituio de fornos de cermica eltricos, prensa para gravura em metal, compressor de tinta, secador de gravura, tornos de gravura, estantes, mesas, arquivos e fichrios para a biblioteca.

Para adapt-la no caminho da realidade do momento artstico, esta primeira providncia de ordem patrimonial, no era suficiente e nem nica. Urgia conciliar a transferncia da escola organizada, de cursos regulares, com a necessidade de iniciativas livres de alunos, de interesse pelo extra-classe. Cabia, ento, ao Diretor Acadmico, um papel importante: auxiliar a participao dos alunos nos certames que conferiam prmios e destaques. Os alunos reuniram-se sem a menor formalidade em volta do Diretrio Acadmico. Eymard Brando, Selma Weissman, Emiliana, Carlos Wolney, George Helt, Jos Amncio, Manoel Augusto Serpa, Dilermando Corra, Sandra Vasconcelos e outros alunos, ficaram conhecidos como turma do banquinho. Muitas vezes, durante o horrio de aula e at o dia inteiro, ficavam conversando sobre todos os assuntos, assentados em banquinhos na portaria, fazendo caricaturas de todos os funcionrios, professores e amigos. Colocadas nas paredes, as caricaturas provocavam o envolvimento de todos nas questes do momento. O fato da turma do banquinho s para ilustrar. Na verdade, no perodo estatal, os alunos tiveram uma conduta de livre participao. O diretrio

procurava levar os alunos ao contato com as novidades em diversas partes do pas, promovendo viagens e buscando as informaes. Com participao dos professores, reelaboravam as propostas levando-as aos sales.

Em 1968,Lotus Lobo,Dilton Arajo e Luciano Gusmo levaram na

Av. Afonso Pena, em Belo Horizonte, um happening com repercusses nacionais e internacionais, merecendo registro em livro sobre arte de vanguarda, editado em ingls para distribuio nos Estados Unidos da Amrica. (21)

Em 1969, no II Salo Nacional de Arte Universitria, os alunos Manoel Augusto Serpa e Beatriz Vasconcelos Coelho obtiveram os prmios de Desenho e Gravura. No Salo Jlio Koeber de Petrpolis, a aluna Ruth Werneck obteve meno honrosa. A Associao Crist de Moos promoveu o Salo do Artista Plstico Mineiro,com premiao para

os alunos Carlos Wolney, Manoel Augusto Serpa, Eymard Brando, Ana Maria Andrade, Sandra Vasconcelos e para os professores Lotus Lobo. Na relao dos artistas que se destacaram em 1969, do jornal Dirio da Tarde, figura a aluna Dora Montini. A aluna Ruth Werneck obteve o primeiro prmio de desenho no Salo do Museu da Prefeitura de Belo Horizonte, tendo sido conferida sala especial para a professora Sara vila de Oliveira.

Em 1970, Lotus Lobo foi classificada em 1 lugar do III Salo Nacional da Cultura Francesa, com prmio de bolsa de estudo na Sorbone. Os trabalhos concorrentes, tendo em vista um regulamento orientado para a arte de vanguarda e que, como nunca dava ao participante inteira liberdade, levaram ao jri dificuldades na seleo e premiao, que se manifestou surpreso com o interesse e a vitalidade das propostas, inseridas na linha de frente das pesquisas do momento. O Jornal do Brasil de 2 de junho de 1970 comentava que as propostas foram vlidas porque assumiram um interesse vital para a renovao da arte atravs de um retorno problemtica local.Ainda em 1970, foi levado a efeito o III Salo Nacional de Arte Universitria, certamente de carter didtico, promovido pela Universidade Federal de Minas Gerais. Vinte e cinco escolas de diversos Estados concorreram aos prmios (medalha, viagem e dinheiro),conferidos por um jri composto de mineiros, paulistas e cariocas.Walmir Ayala, no Jornal do Brasil de 23 de setembro de 1979 justificou o prmio Medalha de Ouro, conferido Delegao Mineira da Escola de Belas-Artes Guignard (melhor representao), afirmando que

21-Bardi,P.M. Profile ofthe New Brasilian Art So Paulo Livraria Cosmos.1970 pgs.120/121

esta mereceu o prmio tendo em vista uma riqueza de idias e imagens florescentes com interpretaes sobre arte popular(Lcia Milton Gontijo), tentativa de arte conceitual (percepo visual e pedaggica), crtica e autocrtica, enfim, sempre com um enfoque apaixonado do ato simples e grave de inventar formas diversas para um mesmo protesto.

Em 1971, com a modificao do regulamento da Bienal de So Paulo, realizou-se em Belo Horizonte a chamada pr-bienal, para escolher os artistas mineiros que comporiam a lista de 25 brasileiros que iriam participar da XI Bienal. Concorrendo com 168 candidatos, Manoel Augusto Serpa adquiriu o primeiro prmio de Desenho, viagem ao exterior, tendo sido classificado Antnio George Salgado Helt, enquanto as professoras Maria Helena Andrs e Sara vila de Oliveira obtiveram sala especial.

Em 1971, a Associao Crist de Moos realizou o III Salo Nacional do Artista Plstico Mineiro, tendo Vilma Rabello Machado recebido o prmio de melhor conjunto e apresentao de trabalhos.

Em 1972, na comemorao dos 10 anos da morte de Guignard,o Diretrio Acadmico, usando dos recursos de que dispunha, resolveu promover uma exposio dos alunos e ex-alunos, no Salo do Palcio das Artes. Nas primeiras reunies foi proposto que os ex-alunos que desejassem expor, fossem aceitos, bastando levar os trabalhos e que para os alunos em curso fosse feita uma seleo prvia. Esta proposta, embora vitoriosa na primeira reunio, foi motivo de debates ao longo das preparaes para a exposio. Uma faco queria liberdade irrestrita de exposio,no fazendo distino entre os ex-alunos e os alunos em curso na poca. A outra faco era chamada de grupo de liberdade seletiva. Preparou-se de um bom catlogo, Gerao Guignard, com orientao de Eduardo de Paula, de George Helt e da presidente do Diretrio Acadmico, Eliana ngelo. Diante da diverg6encias, o grupo da liberdade irrestrita acabou ganhando a questo, ficando definido que cada aluno levasse o seu trabalho j com a etiqueta pronta para o local. A imprensa e os cartazes anunciavam a abertura da exposio. Os alunos convidavam amigos para verem seus trabalhos expostos. Antes da abertura o grupo da liberdade seletiva havia retirado alguns quadros j colocados no salo, sem que o grupo da liberdade irrestrita percebesse. Tratando-se de um salo oficioso que no conferia prmios, a imprensa no lhe deu valor, parecendo tratar-se de coisa da juventude. Porm os cortes clandestinos dos quadros iriam provocar um abalo maior do que se esperava. O grupo da liberdade irrestrita tentou promover o Salo do Lixo, onde todos os descontentes apresentariam

seus trabalhos num lote vago em frente ao Palcio das Artes, de propriedade do aluno Orvile Conti. O Salo do Lixo, se levado a efeito, teria sido coerente com o que se discutiu na poca, sobre os privilgios dos sales oficiais. Tanto assim, que nada se notificou sobre o Salo Gerao Guignard, pois ele seria o retrato revelado dos sales oficiais, embora tivesse, inicialmente, a inteno de denunci-los, na forma proposta da exposio

Contudo, se conferida ao Diretrio Acadmico parte da responsabilidade de alimentar as revivescncias do liberalismo didtico e colocar a escola no pedestal davanguarda, era necessrio que se lhe oferecessem recursos e delegao de competncia para tal. Desta forma, em 1979, com a devida autorizao, foi entregue ao Diretrio Acadmico a administrao do Curso Livre, previsto no Regimento Interno com o nome de Curso Vocacional. Sendo uma escola pblica, com regimento interno definido e organismo bem integrado, o ingresso de alunos portadores de vocaes artsticas, mas que no podiam concorrer ao vestibular, tornou-se difcil. A poltica e a burocracia estadual no permitiam nada fora do sistema j definido. O Diretrio Acadmico, sociedade civil, com personalidade jurdica, seria a nica sada para adotar o Curso Livre, sem injunes burocrticas do momento. Desta forma, foi feito um convnio com a diretoria que levado Congregao, foi aprovado pela reunio do dia 7 de junho de 1970.(22) Cabia ao Diretrio, contratar e dispensar professores, distribuindo 70% da renda com os mesmos, que eram recrutados entre os alunos do Curso Estatutrio, 20% para a escola e 10% destinados de acordo com a presidncia do Diretrio Acadmico. O importante que o diretrio, com estes recursos, promoveu viagens de pesquisas a So Paulo, Rio, Salvador e Ouro Preto. Alm dos 20% destinados escola, pelo convnio, o Diretrio fez doaes em dinheiro e em bens. Antes do Curso Livre a instituio funcionava somente no turno da manh e partir da, passou a funcionar em trs turnos, aumentando os relacionamentos e as atividades. De setenta alunos do Curso Estatutrio em 1970, passoi para 280 at 1972, computando os dois cursos. Esta nova situao dividia as opinies: uns achavam que era a preferida.

Importante foi a participao dos alunos na questo do corte de eletricidade. Com a modificao do sistema eltrico do Parque Municipal e do Palcio das Artes, de rede de superfcie para rede subterrnea, em 20 de abril de 1972, a Cia Fora e Luz mandou retirar o poste com o

transformador que distribua energia eltrica para a escola, exigindo que esta providenciasse a construo de uma rede subterrnea desde a Av. Caranda at o Palcio das Artes. No dispunha ela do menor recurso para atender tal exigncia. A administrao reagiu alegando que a companhia deveria Ter avisado com antecedncia, no produzindo efeito. A Diretoria, trocando idias com alguns professores e alunos, resolveu suspender as aulas por falta de condies. Alguns alunos e a presidente do Diretrio Acadmico, Eliana ngelo, no concordaram com a suspenso das aulas e passaram a desenhar no Parque e no interior do edifcio, com luz de vela. Alegavam que se o caso se tornasse de conhecimento pblico, com o apoio da sociedade, as autoridades se sensibilizariam pelo problema, ganhando condio de resolv-lo em regime de urgncia. Todos os jornais de Belo Horizonte, seguidos de O Globo e Estado de So Paulo, noticiaram o acontecimento sem agredir as autoridades, conforme orientao do Diretrio Acadmico. Trs dias depois estava destinada a verba para a construo da rede subterrnea e em quatro dias foi concluda, tendo-se aproveitado a oportunidade para reformar as instalaes eltricas, at ento deficientes.

Na gesto do presidente Dilermando Corra Filho, foi extinta a biblioteca com o nome de Pierre Santos, formada pelo Diretrio Acadmico, cujo acervo foi somado aos doados por Inim de Paula e pelo MEC, formando a Biblioteca da Escola Guignard, aprovada pela Congregao na reunio do dia 6 de maro de 1968, com um total de 271 livros. No final da fase estatal,sendo ainda o Diretrio Acadmico o maior colaborador, o acervo da biblioteca chegou a 667 livros, correspondendo a um acrscimo da ordem de 107%.

Em 1972, em convnio com a Prefeitura de Diamantina, a escola levou para ministrar um curso os professores Eymard Brando, de Desenho; Wilde Lacerda, de Pintura; George Helt, de Gravura; Maria do Carmo Gonalves, de Cermica e Amncio de Carvalho, de Forma. O curso intensivo de um ms foi administrado por Antnio de Paiva Moura, ento diretor da Escola, e Teresa Antunes, secretria da prefeitura. No encerramento do curso, 360 pessoas, entre artistas e convidado, compareceram ao Hotel Tijuco para ver a exposio de trabalhos dos alunos. Antes de entregar os certificados aos participantes do curso, o ento prefeito municipal, Dr. Joo Antunes de Oliveira, em discurso entusiasmado afirmou que Diamantina iria se lembrar sempre de to expressivo acontecimento, pois a Escola Guignard acabava de descobrir o que a cidade tinha e no sabia: artistas. Era, para ele, incrvel aquilo que se via nos sorrisos constantes de pessoas que se descobriam como artistas.

O prefeito disse ainda que a semente plantada ali, pela Escola Guignard, havia nascido com muita rapidez e que no deveria morrer jamais. De 1972 a 1979, os alunos e professores passaram a freqentar a cidade numa constante busca de inspirao e experimentao, ora por iniciativa particular, ora por excurses promovidas pela administrao da escola.

Desde 1969, a Secretaria de Estado da Educao, interpretando-a como sede de nvel secundrio de ensino, tentou submet-la ao controle de sua burocracia, com o que no concordava. Em 1972 o Conselho Estadual de Educao respondendo a uma consulta da diretoria, emitiu parecer orientando-a no sentido de solicitar autorizao de funcionamento e posteriormente o reconhecimento pelo governo federal, sendo necessrio para tal, que optasse pelo sistema de fundao, deixando o de administrao direta. A escola expedia um certificado de concluso de curso, com base no Regimento Interno, aprovado pelo governo do Estado, atravs do Decreto n 10.409, de 17 de maro de 1967. Mas isto no significava uma autorizao de funcionamento dos cursos, o que deixava invalidado o certificado de concluso para efeitos profissionais. O mercado de trabalho, qualificado e especializado na rea das artes plsticas, na dependncia da apresentao de um certificado legal crescia, mas com impedimento dos alunos da Escola Guignard de participar deste mercado. A partir da Lei de Diretrizes e Bases de 1971, tornava-se obrigatria a disciplina Educao Artstica nas escolas de 1 Grau. Sem a habilitao legal, os alunos da Guignard perdiam este lance da ampliao do mercado de trabalho. Professores e alunos discutiam o assunto, sem definio de conduta, de vez que o pedido de reconhecimento implicaria na modificao da instituio, o que deixava alguma dvida.Em abril de 1972,foi feita uma consulta de opinio entre os alunos. O resultado do plebiscito foi levado reunio da Congregao do dia 24 de maio de 1972, revelando que 96% dos alunos concordavam em que a autorizao de funcionamento deveria ser solicitada, mesmo que implicasse em alteraes profundas no seu funcionamento. A Congregao, muito cautelosa, no se manifestava objetivamente sobre o assunto, pedindo tempo para que cada professor estudasse um questionrio apresentando posio, em outra reunio. Um ms depois, 26 de junho de 1972, poucos professores apresentaram opinies sobre o questionrio, o que impossibilitava o encaminhamento da proposta sobre o pedido de autorizao de funcionamento. Em agosto do mesmo ano props-se que fosse formada uma comisso de trs professores para estudar a situao do reconhecimento. Foi tal a hesitao em torno do assunto, que para escolher os trs nomes que comporiam a comisso,

foram necessrios cinco escrutnios, num clima tenso de votaes. O artista Mrio Cravo, de Salvador, proferindo conferncia para alunos e professores, tentou dissuadi-los da idia do reconhecimento, tendo a mesma terminado num clima agitado de debates. A idia de uma escola com reconhecimento do governo federal tinha para a maioria dos alunos uma soluo muito forte para que resistissem a ela.

Pelo clima reinante no ambiente, percebia-se que havia descortinado um novo caminho a ser tomado. Quando em 30 de outubro de 1973, foi publicada a Lei Estadual n 6.154, que transformava a escola pblica em fundao, as idias j estavam maduras. Na verdade, ainda houve surpresa, tendo em vista que muitos no acreditavam que das idias se passassem s aes em tempo to curto, ainda mais, que se manteve em relativo segredo, o teor e a tramitao do projeto. A nova fase ia iniciar-se diante de muita expectativa.

6 A empresa do reconhecimento

6.1 Fundao Escola Guignard

O quinto ttulo, Fundao Escola Guignard, acompanha a passagem da fase da administrao direta estadual para sociedade civil de responsabilidade do Estado, resultado da pretenso de elev-la ao nvel superior de ensino. A idia de uma fundao havia surgido antes do falecimento de Guignard, proposta por Lcia Machado de Almeida, a qual Guignard elegia como grande amiga da escola. A instituio proposta no a objetiva, e sim o artista Alberto da Veiga Guignard, o que no ficou justificada a sua concretizao.

A partir desta fase, a documentao sobre a vida da escola muito farta. Na medida que a historiografia interessar-se por qualquer tema, poder recorr-la. No momento, servimo-nos do essencial linha perseguida.

No incio de 1974 foram tomadas providncias necessrias para caracterizao da nova personalidade jurdica da instituio, bem como a formao do Conselho Curador, com a nomeao e posse de seus membros, elaborao, aprovao e registro do estatuto; registro da posse dos bens transferidos pela escola do Estado; correo do regime jurdico dos servidores. At o final de 1974, todas as suas reas sofreram modificaes substanciais.

O primeiro Conselho Curador, com mandato de maro de 1974 a maro de 1977 teve como presidente Orlando Magalhes de Carvalho, como vice-presidente Marcelo Vasconcelos Coelho e como membros, Dilson Camargos, Paulo Andr Rohrmann, Jos Luiz Andrade, Raul Pacheco de Medeiros, talo Gaetani, Renato Falci, Galba Magalhes Veloso e Eridson Madson. O segundo Conselho Curador nomeado tomou posse em 28 de abril de 1977 tendo como presidente, o professor Jos Eduardo Fonseca, como vice-presidente Ana Amlia de Faria e

membros, Lemzia Guimares Alves, Ney Octaviani Bernis, Marina de Oliveira Nazareth, Paulo Csar Vale, Raul Belm, Vera Chaves Pinheiro, Mrio Sampaio e Celma Alvim. (23)

No sistema de fundao, implantado em maro de 1974, tinha por continuidade a professora Heloisa Selmi Dei Meinberg como diretora at 2 de setembro de 1974,quando tomou posse o professor Amilcar Augusto de Castro, provido regularmente no cargo de diretor, na forma da nova legislao. Em 20 de maio de 1977, tomou posse como diretora, a professora Vilma Rabello Machado, que vinha substituindo eventualmente o diretor Amilcar de Castro, desde dezembro de 1976. A diretora teve suas atividades aumentadas em face da criao de servios, at ento dispensveis, tornando-se responsvel por todo o funcionamento burocrtico da fundao.

A legislao em vigor(1969) estabelece que a Congregao seja composta, basicamente, pelos professores titulares. Como a titularidade s ser dada pelo Conselho Estadual de Educao, juntamente com a aprovao do Regimento Interno e a autorizao de funcionamento, a Congregao funcionava com o nome de Reunio do Corpo Docente, debatendo, especialmente, as questes de ordem didtica, em face das alteraes dos currculos anteriores e numa preocupao com os nveis artsticos dos alunos. O Corpo Docente, sem contar os professores contratados para o Curso Livre, teve um crescimento extraordinrio, com a contratao de professores, tanto para a rea das novas disciplinas, quanto para as at ento existentes, objetivando titularidades e substuies, conforme enumeramos: Antnio George Salgado Helt, Jos Maria Caldas Gouveia, Jos Herculano Ferreira, Jorge de Oliveira Santos, Jurandir Ribeiro Faria, Inim de Paula, Ivanda Alveranga Bottrel, Marco Elzio de Paiva, Marco Tlio de Resende, Maria Aparecida de Mendona, Maria Eugnia O Garcia, Maria de Ftima Reis, Maria Gsica Valadares. Maria Therezinha Escobar, Marlia Andrs Paixo, Mnica Queiroz Alves, Paulo Henrique Amaral, Snia Viegas de Andrade e Sueli Imaculada de Castro Peixoto.

A legislao estabelecia que o estatuto do Diretrio Acadmico fosse alterado. As suas diretorias continuam sendo eleitas anualmente, mas as atividades caram a nvel nunca visto desde sua criao em 1951. Sua fonte de renda limita-se a uma precria cobrana de taxa de alunos. Deixou escapar de seu controle o Curso Livre, que foi socorrer as finanas da fundao. Suas atribuies limitam-se s de representar o

23 Decises do Conselho Curador L001 e P001 C 227 Arquivo da Fundao Escola Guignard.

Corpo Docente nas reunies do Corpo Docente, providenciar credenciais de cinema para estudantes e comunicaes internas.

A primeira dificuldade do momento , de novo, a financeira. A reao natural dos alunos, no momento da passagem da quase gratuidade de ensino pago, iria impedir a aplicao de uma taxa suficiente manuteno da escola. A Auditoria Geral do Estado procedia minuciosos levantamentos e rigorosas fiscalizaes em todos os assuntos da fundao. A burocracia estadual levou quatro anos para reconhecer as sua reais necessidades financeiras. Somente no final do Governo Aureliano Chaves, as transferncias de recursos financeiros so efetuadas regular e satisfatoriamente para a conta bancria da fundao.

Novas obrigaes so contradas como: ampliao do Corpo Docente, em face do aumento do nmero de alunos e do novo curriculo, colocado em prtica, para ajustamento do processo de autorizao de funcionamento; ampliao e melhoria da biblioteca, ao nvel exigido pelo Conselho Estadual de Educao; adaptao das instalaes da sede s exigncias de padres legais; aumento da complexidade e volume da burocracia contbil e do servio de pessoal; readaptao do sistema de escrita da vida escola dos alunos.

6.2 Pedido de autorizao de funcionamento

J na sesso de 10 de maio de 1974, o Conselho Curador indicava todas as providncias a serem tomadas pela Diretoria, para a montagem do processo de Autorizao de Funcionamento a ser encaminhado ao Conselho Estadual de Educao. A partir da uma srie de estudos de currculos de outras escolas, na busca de uma conciliao o sistema adotado pela Escola Guignard e as exigncias do MEC, tendo, neste caso, revelado a maior dificuldade para ela, mas que na verdade, traduziu-se numa constante de sua histria. Isto porque a proposta de conduta e os objetivos humanos que nortearam a sus existncia, s tm sido possveis em pases mais desenvolvidos, onde algumas contradies primrias foram superadas. Por uma viso acima dos valores comuns em nossa sociedade, que a Guignard foi mal compreendida, e muitas vezes, considerada intil. Apesar disto, sustentou heroicamente para manter-se na vanguarda e, ao mesmo tempo, no perder o amparo do poder pblico. O Regimento Interno deveria ser coerente com a sua filosofia e, ao

mesmo tempo, adaptar-se aos padres estabelecidos pelo Conselho Federal de Educao, requerendo, portanto, esforo e habilidade para sua redao. Somente 14 meses depois das primeiras providncias , o processo estava montado conforme comunicado da diretoria do Conselho Curador em sua sesso de 21 de setembro de 1975. Um metro cbico de papis, contendo todas as providncias solicitadas, foi protocolado no Conselho Estadual de Educao, onde permaneceu at o despacho final concedendo a autorizao de funcionamento.

Em 1969 as expectativas da comunidade da Escola Guignard voltavam-se para a conquista de uma sede prpria, que no um comodato do subsolo do bloco A do Palcio das Artes; concluso do processo de autorizao de funcionamento, bem como o reconhecimento federal e os meios para continuar proporcionando aos alunos as oportunidades de elevao de seus nveis artsticos.

A evoluo das concepes estticas de nossa sociedade, proposta pelo modernismo permitia abertamente o questionamento e a reviso constante de sua prpria conduta. Permitir a crtica e mudar de prtica foi uma poltica que teve como resultado a evoluo. Portanto, as mudanas de nome e regime jurdico longe de significarem perempes, foram adotadas como caminhos conscientes, tomados ao longo de sua existncia. Percebemos que a Guignard teve uma conduta poltica, alm de se utilizar desta antes que da burocracia. Teve-se sobretudo, por Ter surgido no momento de crise da transio da sociedade tradicional para a sociedade do tipo industrial. Momento em que a imobilidade deixava margem mobilidade social, como o que, no campo esttico-social, o academicismo no concordava. Da, Ter sido difcil, mas possvel, uma escola aberta. Percebemos ainda mais este momento crtico da transio, quando colocamos em anlise a coexistncia de cursos chamado Livre e Normal. Desde 1951. Ambos eram livres uma vez que nenhum deles se submeteu aprovao da burocracia. A diviso da clientela em categorias de cursos era puramente interna, como reflexo da contradio social do momento. A Guignard, sem sede prpria, sem reconhecimento e mesmo sem autorizao de funcionamento era um monumento histrico de Minas, por Ter sido fruto da abnegao de todos os participantes de sua construo, desde a pedra fundamental em 1943, at os nossos dias. Uma nova opo se fazia atravs das metas colocadas a efeito, no sentido de entrosamentos com outras entidades, para dinamizar sistemas artsticos e pedaggicos, a exemplo dos convnios firmados que possibilitavam a realizao de cursos extracurriculares.

6.3 Ncleo experimental

Passados cinco anos da fundao, reinava uma certa frustrao entre o professorado e o alunado. A criao da fundao era esperada e vista como uma instituio modernizadadora e desburocratizodora. Algumas chegavam mesmo a sonhar com modelos de grandes fundaes americanas e europias. Desde o incio de sua instalao, contudo, foi vtima de trs graves erros de seus dirigentes que contriburam para o desencanto dos sonhadores. O primeiro desses atos foi o de acabar com o Curso Livre. A Escola ficou sem nimo, sem capacidade de opo diante de seus problemas. O segundo erro foi o de atribuir Congregao um rgo de simples aconselhamento e debates, sem poder de deciso. Com isso o Corpo Docente, at ento, mentor, agora subordinado burocracia, tonava-se quase nulo. O terceiro erro, e talvez o pior de todos, foi a desativao do Diretrio Acadmico. Parece at ironia, pois uma instituio surgida no escudo da modernizao foi capaz de tornar afnica a voz do Corpo Discente.

Era necessrio fazer algo para suavizar ou anular tais erros. Bem administrada, poderia tornar-se um instrumento eficiente para descarrilar o trem da modernice e fazer trilhar uma entidade verdadeiramente moderna. Em 2 de maio de 1979, a diretora da escola, Vilma Rabello Machado, enviou ofcio a Murilo Rubio, presidente da Fundao de Arte de Ouro Preto, solicitando-lhe colocar o professor Amilcar de Castro disposio da Guignard, para organizar um Ncleo de Criatividade, capaz de dar uma nova dimenso escola.

Em 20 de setembro de 1979 a artista Marina Nazareth, juntamente com o professor Amilcar de Castro elaboraram um projeto envolvendo o Museu de Arte Moderna de Belo Horizonte. Ao justificar o projeto alegavam a preocupao com a profissionalizao que havia estrangulado o ensino de arte na escola. O contato do ncleo com o Museu possibilitaria formar um grupo homogneo quanto ao interesse no aprendizado da arte e desenvolvimento experimental do trabalho de criao. A idia de funcionamento do ncleo, no incio, no se concretizou. A Fundao havia conseguido dotao oramentria atravs da Coordenao de Cultura. A providncia mais urgente a ser tomada era a do aluguel de um imvel para a instalao do ncleo.

O imvel localizado Rua Gonalves Dias, 1871, foi encontrado com relativa facilidade, mas estava impedido de ser ocupado, uma vez que a prefeitura considerava o local apenas residencial. Foi necessrio apelar

ao prefeito Maurcio Campos para liberar o alvar de localizao do imvel. Desta forma, no dia 6 de novembro de 1979, a diretora Vilma Rabello Machado assinou uma portaria dando um mnimo de diretriz para a organizao do Ncleo Experimental. A mesma portaria inclua tambm a criao de um Centro de Documentao da Cultura Popular em Minas (este s em 1983 foi instalado).

Em 28 de dezembro de 1979, o professor Amilcar de Castro apresentou diretoria da escola uma longa lista de materiais e instrumentais a serem adquiridos para as oficinas do ncleo. Com a aquisio do referido material faltava s a inaugurao. Ao iniciar o ano letivo de 1980, no dia 6 de fevereiro, foi inaugurado o Ncleo Experimental, com o lanamento do livro de minha autoria A Projeo da Escola Guignard .

A maioria dos alunos do ncleo eram bolsistas. Isso contrariava a orientao governamental bem como o estatuto da Fundao que desprezavam o ensino gratuito. A Fundao deveria ser um rgo, antes, de tudo, arrecadador. Seus programas deveriam ser desenvolvidos com recursos prprios. Nada de onerar os cofres do Estado. Desta forma em 8 de julho de 1980, o diretor Jos Herculano Ferreira baixou portaria avisando que estavam suspensas as bolsas de estudo do ncleo e que a partir do mesmo ano o imvel da Rua Gonalves Dias deveria ser destinado a outra atividade.

O valioso material das oficinas do ncleo foi transferido para a Escola Guignard e suas atividades foram transferidas para o Museu de Arte Moderna, sob a orientao da artista Marina Nazareth. O imvel foi ocupado pelo Conselho Estadual de Cultura.

A durao do Ncleo Experimental foi efmera. Mas valeu pelo registro do esprito de abertura do presidente da fundao professor Jos Eduardo da Fonseca, significou um exemplo vivo do desinteresse do governo mineiro no trato com a produo cultural e, finalmente, evidenciou a presena de lamentvel atraso das elites polticas e administrativas do Estado. A Fundao Escola Guignard, no final da dcada de 70 e incio da de 80 foi elaborada por uma composio de vages repleta de interesses individuais e grupais.

7 Escola Contempornea

7.1 Momento histrico

No limiar do processo de abertura poltica do Brasil a Guignard viveu momento de intensa agitao, quando foram removidas as questes do reconhecimento. Alunos e professores mostraram-se preocupados com a perda do prestgio que a escola ostenta. Dizia o professor Jos Maria Gouvia. No importa que as causas fundamentais estejam ligadas a fatores estruturais. Fora da escola, necessrio fazer algo que aponte uma imediata retomada de posio.

No final do ano de 1979 foi marcado por um constante questionamento. Alunos e professores participavam de debates em assemblias, comisses e grupos de trabalho. Alguma coisa foi captada a partir da conscincia da necessidade de tomada de posio. Naquele momento os assuntos ventilados refletiam as idias de uma escola aberta s legtimas vocaes artsticas; melhoria das condies materiais; desburocratizao do sistema administrativo; reforma do mtodos pedaggicos, acelerao da marcha do processo de redemocratizao do ambiente; sensibilizao e reflexo sobre os problemas, papis e posies dos artistas.

A afirmao de que a arte brasileira encontrava-se estagnada, vinha aparecendo com freqncia nas entrevistas e artigos de jornais. Desde que em 1965, o pintor Frans Krajoberg atribuiu a suposta ditadura que o concretismo teria exercido sobre nosso movimento artstico ao fracasso da pintura, muita coisa aconteceu em matria de reflexo. O principal defensor do concretismo, Waldemar Cordeiro, afirmou que tal estagnao se devia m influncia do tachismo, que o Brasil serviu reaod artstica, que dele se valeu retomar ao paisagismo oitocentista e s receitas acadmicas. Uma opinio sucedida outra, sem deixar oportunidade de confronto ou debate.

As propostas apresentadas em certames como sales, bienais e trienais, passaram a mostrar o emprego de materiais inimaginados, de custo inacessvel a estudantes. Com a facilidade da comunicao internacional, mudaram todas as circunstncias. Antes, a circunstncia de que se destinava a visitao sossegada e meditativa, por parte do visitante, implicava em que o olho era o elemento fundamental. Como observa Arnaldo Pedroso dHorta. A obra devia permanecer esttica e ser, ela mesma, silenciosa. Com a habridao que aos poucos foi invadindo esse campo, passamos a ter obras mveis, transformveis cineticamente e emissoras de rudos. Desapareceu, com isso, a possibilidade de recolhimento para exame de determinada pea (24) A crtica deslumbrada voltou-se para os luzentes, para os giratrios e para os sonoros, decretando, desta forma, o estado de crise das artes propriamente plsticas. Parece Ter sido este, um mecanismo utilizado por alguns artistas ricos para facilitar a tarefa dos crticos, explorando o que estes tinham demais (ouvidos) e poupando-lhes o que tinha de menos (olhos). Assim, conseguiram encher alguns sales at ento reservados s convencionais artes plsticas. O reflexo de tal circunstncia atingiu a Guignard naquele momento. Como entidade que tem a sua histria fundamentada na pobreza material e na riqueza de contedo humano, no estava preparada para adaptaes to rpidas indicadas a pretexto de renovao das artes plsticas. O ambiente da escola teve sempre uma noo clara dos valores da criatividade, tendo suportado, como num desafio, as circunstncias externas.

Ainda em 1979 afirmava o ex-professor Haroldo Matos que havia uma alienao muito grande entre os alunos de arte. No sabia precisamente de quem seria a culpa, mas s constatava a alienao. Observava que havia tambm muito medo entre os estudantes. Uma busca de expresso livre deveria ser um fenmeno que abrangesse tudo no Brasil e no mundo inteiro. No se tratava apenas de liberdade poltica, mas de uma atitude livre diante dos acontecimentos, da realidade nacional e internacional. Insistia em que um dos fatores mais prejudiciais ao ensino de arte era o fato da ausncia de liberdade, que atrasou o desenvolvimento artstico do pas em favor da instituio quase generalizada de mediocridade. Uma sujeio no s da parte dos artistas, mas ainda da crtica, muito responsvel, em decorrncia de sua falta de formao e informao.(25)

24- Pedroso dHorta, Arnaldo- Bienal de que?-In Revista Argumento Rio de Janeiro. Civilizao Brasileira de 1974, n3, pg.108.

25-Oswaldo, ngelo- A Liberdade Volta In: Estado de Minas Belo Horizonte, 17 de julho de 1979.

Muitas vezes ouvimos clamores de professores quanto a uma passividade ou imobilidade dos alunos e, consequentemente, da Escola. Um mal-estar se verificava a cada instante em que se detectava ausncia da vitalidade que a caracterizou. Mas se esse intragvel marasmo existia, no se deve tribut-lo inteiramente ao ambiente escolar. Uma razo externa deveria existir no contorno de tudo que pulsava internamente. A constatao inquieta de um atraso ou inrcia era prova da vitalidade em potencial, na busca ansiosa da realidade escondida nos atos e pacotes institucionais.

Fernando de Azeredo, prefaciando um livro de Rui Martins, afirmou:Nas instituies em que a sociedade no encontra estmulos para uma participao calorosa em atividades de reconstruo, e em que esteja na ordem do dia no a grandeza mas a mediocridade, quase instintiva, nela, a fuga higinica para os sonhos e iluses romnticas. Se no a querem com as suas naturais conformidades, rebeldias e aspiraes, em largos planos de ao, o que lhe resta entrar em recesso, viver sua prpria vida, mais ou menos alheia ao que se passa em torno dela e no capaz de lhe agitar o esprito, conquistar-lhe o corao e despertar-lhe o entusiasmo(...) . Quando no lhes acena para grandes iniciativas e realizaes; quando os acontecimentos se arrastam, na confuso e no encontram lderes altura deles, e se tudo os remi, na incoerncia, ou nas perplexidades e hesitaes, a mocidade tende a procurar, em seus sonhos, o meio de fugir mediocridade e pasmaceira reinantes. Volta a si mesma, sem objetivo e com esprito conservador seno reacionrio, para viver a sua vida parte. (26)

Para o professor Carlos Wolney, o ideal seria que as escolas procurassem ser mais reflexivas, mais crticas. Faltava ainda uma viso crtica sobre o momento histrico. Entendia que a escola devia questionar permanentemente a idia do fazer artstico. Afirmou textualmente que arte no se ensina, todavia dentro de uma escola precisava haver possibilidade de reflexo, o que conduziria as pessoas a um processo mais dinmico e conseqente. A liberdade criadora s liberdade na medida em que as pessoas tm uma base. Aprender a ver, a saber ver, tudo isso torna-se essencial. Podem aprender a sentir, mas no a ver". (27)

Existia um certo receio quanto aos efeitos que o reconhecimento oficial poderia produzir. Segundo o artista e crtico de arte Mrcio Sampaio, a maioria das escolas passou a ser oficial, e em troca do status universitrio, adotou currculos que fecharam trabalho que deveria ser

26-Martins Rui- A rebelio romntica da jovem guarda- So Paulo, Fulgor 1966

27-Oswaldo, ngelo- ob. Cit.

essencialmente livre e aberto. Em sua opinio, a escola de arte deveria ser integrada universidade, mas com uma forma especial de funcionamento. A diviso das opinies na Escola Guignard, sobre a questo do reconhecimento, residia no fato de no se acreditar que o MEC viesse a adotar um programa especial para as escolas de arte.

7.2 Administrao

Na atual fase a primeira gesto do Conselho Curador foi composta por ato do governador Tancredo Neves, de 19 de abril de 1983, com os seguintes membros efetivos: Ana Amlia Faria, Bartholomeu Campos de Queiroz, Jos Eduardo da Fonseca, Ney Octaviani Bernis e Vera Chaves Pinheiro. Para suplentes foram designados Marina de Oliveira Nazareth, Mrcio Sampaio, Paulo Csar Valle, Raul Belm Machado e Celma Jorge Alvim. Para presidente foi eleito e empossado o conselheiro Dr. Ney Octaviani Bernis.

No governo Hlio Garcia, conforme ato de 13 de agosto de 1986, foram nomeados para a gesto seguinte o Conselho Curador, como membros efetivos: Ney Octaviani Bernis, Bartholomeu Campos de Queiroz, Jos Eduardo da Fonseca, Celma Jorge Alvim e Petrnio Bax. Para suplentes foram designados Paulo Csar Valle, Mrcio Sampaio, Marina de Oliveira Nazareth, Yara Tupinamb e Maria Helena Andrs. O Dr. Ney Octaviani Bernis foi reeleito e empossado como presidente.

Logo aps o trmino do seminrio Possibilidades e limites de uma escola de arte a Congregao foi convocada (29/04/1980) com a finalidade nica de eleger a lista trplice para escolha do novo diretor. Durante muito tempo foi discutida a questo da representao estudantil. O Regimento Interno, encaminhado ao Conselho Estadual de Educao, previa a proporo de 1/5. Isto , para cada cinco professores presentes deveria incluir um voto da representao discente. Mas uma faco alegava que o regimento ainda no havia sido aprovado pelo Conselho Estadual de Educao e que, portanto, deveria prevalecer a norma anterior que estabelecia apenas um voto para representao estudantil. Por mais longo tempo foi discutida a forma de votao. Foram necessrias trs votaes para conseguir o primeiro nome da lista. O terceiro nome s saiu depois de treze escrutnios e quatro horas de

reunio. Entre os nomes de George Helt e Amilcar de Castro foi escolhido, nomeado e empossado o professor Jos Herculano Ferreira. Para um mandato de trs anos.

De forma tempestuosa analisada acima. Conclumos que a Guignard vivia momento prprio de entidade em formao, sem definio dos processos de funcionamento.

J na eleio da lista trplice de 1983, o comportamento dela foi completamente diferente. Os candidatos George Helt, Carlos Wolney Soares e Jos Herculano Ferreira compareceram s assemblias de alunos e com eles debateram suas plataformas e problemas. Depois de votados pelos alunos e copo docente que a Congregao referendou a lista trplice. O professor Jos Herculano Ferreira foi reconduzido como diretor por mais um mandato.

Desde seu primeiro mandato o professor Herculano Ferreira procurou sustentar sua administrao a partir dos rgos coligados, que passaram a cumprir as tarefas de ordem regimental, a auxiliar a diretoria nas questes administrativas e didticas.

O Departamento A, de matrias tericas, teve como coordenadores os professores Antnio de Paiva Moura e Maria de Ftima Junqueira Fenati. O Departamento B, de Expresso Bi e Tridimensional e desenho foi coordenado pelos professores Marco Tlio Resende e Antnio Eustquio da Costa Dias. O Departamento C, de Pintura, Gravura, Cermica e Escultura, foi coordenado pelos professores Ltus Lobo, Vicente Abreu e George Helt.

O Conselho Departamental, rgo deliberativo em matria didtico-cientfica, bem como consultivo em matria administrativa e disciplinar, passou a Ter um papel muito importante no funcionamento. Composto pelo diretor, dos trs coordenadores de departamentos, assessor pedaggico e representao discente. O Conselho Departamental passou a ser convocado para estudo de todos os problemas escolares.

Com a reforma do Regimento Interno, para se conseguir a autorizao de funcionamento, a Congregao iria ser constituda pelos professores titulares (responsveis) das disciplinas, por representao dos professores auxiliares e representao estudantil. Como no havia definio das titularidades das disciplinas, no havia possibilidade de formar a congregao. Desta forma, a reunio de todo corpo docente passou a substitu-la. Somente a partir de 1983 que foram definidos os professores responsveis nas disciplinas do curso de Educao Artstica, o que possibilitou a formao e reinstalao da Congregao. Mas a

reunio do Corpo Docente, isto , da totalidade dos professores, no deixou de continuar no papel de um rgo planejado, orientador, deliberativo em matria de ensino, pesquisa e poltica educacional da escola.

Alm disso,foram realizados dois seminrios internos de avaliao, de extraordinrio proveito para a administrao.

O primeiro foi preparado com dois meses de antecedncia, atravs de trs comisses e levado a efeito no perodo de 3 a 7 de dezembro de 1983. A sesso plenria foi presidida pelo diretor Jos Herculano Ferreira. A relatora foi Alice de Cssia Ferreira da Silva, assessora pedaggica. O plenrio foi formado por todos os componentes das comisses.

A Comisso n 1, composta pelos professores Carlos Wolney Soares, Jorge de Oliveira Santos, Jos Maria Caldas Gouveia, Lotus Lobo, Marco Tlio de Resende, Solange Botelho, Zahira Souki Cordeiro e pela aluna Helenice Dornelas Fialho. O problema fundamental existente na Guignard era o fato de o curso de Educao Artstica ter sido estruturado com uma dupla preocupao a partir de 1975: habilitao de professor de educao artstica e a formao de artistas. Com a autorizao de funcionamento do curso de Educao Artstica, em 1983, era quase impossvel a continuidade de tal ambivalncia. O trabalho da Comisso n 1 foi o de estudar e apresentar estrutura do curso de Artes Plsticas. Levou em considerao que o referido curso deveria diversificar-se do curso de Educao Artstica em face da sua finalidade, devendo Ter a seguinte estrutura: Oficinas Bsicas, sob a direo de um nico professor, na formao de informao artstica do aluno. Elmentos de Linguagem Plstica, constituda de ponto, linha, plano, espao, volume e cor trabalhos especificamente em apoio aos trabalhos das oficinas bsicas; Histria da Arte, compreendendo curso de apoio para situar o trabalho das oficinas para o desenvolvimento de trabalhos especficos onde o aluno teria condies de aprofundar os conhecimentos do ofcio; cursos complementares por assunto, em que o aluno teria informaes e debates sobre arte; Complmentar, atividades extra-aula onde o artista-aluno teria orientao de artista-professor; Professor-agregado, que seria um artista credenciado pela escola para orientar o aluno na fase complementar.

A Comisso n2 foi composta pelos professores: Antnio da Costa Dias, Enezila Maria de Moura Campos, Maria de Ftima Junqueira Fenati, Ione Ferreira Fonseca, Terzinha Escobar Corra e pelos alunos Cristina Corradi Melo e Jos Eustquio de Oliveira. Teve como

atribuio o estudo para criao e implantao do Centro de Extenso e Pesquisa. Dezoito itens apresentados pela Comisso foram muito discutidos na sesso plenria, mas foram aprovados por unanimidade, tendo sido fundamental na criao do referido centro.

A Comisso n3 foi composta pelos professores: Antnio de Paiva Moura, Antnio George Salgado Helt, Giovani de Nazareth Fantauzzi, Vilma Rabello Machado e pelos alunos Domingos Svio Real Pereira e Silvana Viola Coppe.Estudou a estrutura administrativa da escola em seus mnimos detalhes, desde o oramento, programa, investimentos, semestralidade de alunos; construo de sede prpria; criao do Setor de Comunicao, ligado Assessoria Artstica e responsvel pelo jornal Risco, de circulao interna; elaborao de um organograma que posicionava na diretoria as coordenaes dos cursos de Artes Plsticas , Educao Artstica, bem como o Centro de Extenso e Pesquisa; aproveitamento de estudos realizados por alunos atravs de reivindicaes junto ao Conselho Federal de Educao.

Como vimos, a matria do seminrio foi muito extensa mas de um imenso proveito, tendo resolvido questes pendentes h vrios anos.

O seminrio interno de avaliao de 1984, realizado nos dias 6 e 7 de dezembro, desenvolveu estudo