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Microbiologia

MicrobiologiaAlexandre Verzani Nogueira Germano Nunes Silva Filho

Florianpolis, 2010.

Governo FederalPresidente da Repblica Luiz Incio Lula da Silva Ministro de Educao Fernando Haddad Secretrio de Ensino a Distncia Carlos Eduardo Bielschowky Coordenador Nacional da Universidade Aberta do Brasil Celso Costa

Comisso Editorial Viviane Mara Woehl, Alexandre Verzani Nogueira

Projeto Grfico Material impresso e on-lineCoordenao Prof. Haenz Gutierrez Quintana Equipe Henrique Eduardo Carneiro da Cunha, Juliana Chuan Lu, Las Barbosa, Ricardo Goulart Tredezini Straioto

Universidade Federal de Santa CatarinaReitor Alvaro Toubes Prata Vice-Reitor Carlos Alberto Justo da SilvaSecretrio de Educao Distncia Ccero Barbosa

Equipe de Desenvolvimento de MateriaisLaboratrio de Novas Tecnologias - LANTEC/CED Coordenao Geral Andrea Lapa Coordenao Pedaggica Roseli Zen Cerny Material Impresso e HipermdiaCoordenao Laura Martins Rodrigues, Thiago Rocha Oliveira Adaptao do Projeto Grfico Laura Martins Rodrigues, Thiago Rocha Oliveira Diagramao Laura Martins Rodrigues, Grasiele Pilatti Ilustraes Alexandre dos Santos Oliveira, Amanda Cristina Woehl, Talita vila Nunes, Liane Lanzarin, Maiara Ornellas Ario, Grazielle S. Xavier, Jean H. de O. Menezes, Tarik Assis Pinto, Maicon Hackenhaar de Araujo, ngelo Bortolini Silveira Reviso gramatical Ana Carolina de Melo Martins

Pr-Reitora de Ensino de Graduao Yara Maria Rauh Mller Pr-Reitora de Pesquisa e Extenso Dbora Peres Menezes Pr-Reitora de Ps-Graduao Maria Lcia Camargo Pr-Reitor de Desenvolvimento Humano e Social Luiz Henrique Vieira da Silva Pr-Reitor de Infra-Estrutura Joo Batista Furtuoso Pr-Reitor de Assuntos Estudantis Cludio Jos Amante Centro de Cincias da Educao Wilson Schmidt

Curso de Licenciatura em Cincias Biolgicas na Modalidade a DistnciaDiretora Unidade de Ensino Sonia Gonalves Carobrez Coordenadora de Curso Maria Mrcia Imenes Ishida Coordenadora de Tutoria Zenilda Laurita Bouzon Coordenao Pedaggica LANTEC/CED Coordenao de Ambiente Virtual Alice Cybis Pereira

Design Instrucional Coordenao Vanessa Gonzaga Nunes Design Instrucional Cristiane Felisbino Silva,Marisa Campos Santana, Joo Vicente Alfaya dos Santos

Copyright 2010 Universidade Federal de Santa Catarina. Biologia/EaD/UFSC Nenhuma parte deste material poder ser reproduzida, transmitida e gravada sem a prvia autorizao, por escrito, da Universidade Federal de Santa Catarina. N778m Nogueira, Alexandre Verzani Microbiologia / Alexandre Verzani Nogueira, Germano Nunes Silva Filho. Florianpolis : Biologia/EaD/UFSC, 2010. 213 p.: il., grafs., tabs., plantas ISBN 978-85-61485-26-9 1. Microbiologia. 2. Ensino. 3. Biologia. I. Silva Filho, Germano Nunes. II. Ttulo. CDU: 576.8 Catalogao na fonte elaborada na DECTI da Biblioteca Universitria da Universidade Federal de Santa Catarina.

Sumrio

Apresentao....................................................................................... 9 1. Introduo Microbiologia.........................................................111.1 Histrico .......................................................................................................................13 1.2 Posio dos microrganismos na rvore da vida .................................................17

2. Bactrias.........................................................................................232.1 Morfologia e estrutura bacteriana ....................................................................... 25 2.1.1 Formas das bactrias ...................................................................................27 2.1.2 Arranjos bacterianos....................................................................................27 2.2 Estruturas externas e internas das clulas bacterianas ................................... 28 2.2.1 Estruturas externas ......................................................................................28 2.2.2 Estruturas internas .......................................................................................33 2.3 Gentica bacteriana................................................................................................. 36 2.3.1 Material gentico da bactria ...................................................................37 2.3.2 Replicao do DNA ......................................................................................37 2.3.3 Transcrio, traduo e sntese de protenas .........................................37 2.3.4 Mutao e Recombinao do material gentico ................................ 40 2.3.5 Gentica e Biotecnologia ...........................................................................45

3. Reino Protista ...............................................................................513.1 Introduo .................................................................................................................. 53 3.2 Algas ............................................................................................................................ 53 3.2.1 Introduo ....................................................................................................53 3.2.2 A importncia das algas ............................................................................55 3.3 Protozorios............................................................................................................... 58 3.3.1 Classificao ..................................................................................................59 3.3.2 Importncia ..................................................................................................61

4. Fungos ............................................................................................634.1 Introduo .................................................................................................................. 65 4.2 Caractersticas ........................................................................................................... 65 4.3 Morfologia ................................................................................................................. 66 4.3.1 Sistema somtico ........................................................................................ 66 4.3.2 Sistema reprodutivo ....................................................................................69 4.4 Sistemtica de fungos ............................................................................................. 72 4.4.1 Reino Protista ................................................................................................73 4.4.2 Reino Stramenopila .....................................................................................75 4.4.3 Reino Fungi ....................................................................................................77 4.5 Disseminao ............................................................................................................ 82 4.6 Importncia ............................................................................................................... 83

5. Vrus ................................................................................................875.1 Introduo .................................................................................................................. 89 5.2 Caractersticas gerais dos vrus ............................................................................. 91 5.3 Taxonomia viral......................................................................................................... 96 5.4 Ciclo de vida dos bacterifagos ............................................................................ 96 5.5 Cultivo dos vrus ....................................................................................................... 99 5.6 Outros agentes infecciosos .................................................................................... 99 5.7 Viroses ......................................................................................................................... 99

6. Interaes com microrganismos ...............................................1036.1 Introduo ................................................................................................................ 105 6.2 Interaes positivas ............................................................................................... 105 6.3 Interaes negativas.............................................................................................. 107 6.4 Outras interaes ................................................................................................... 109

7. Microbiologia do Solo ................................................................1137.1 O solo ..........................................................................................................................115 7.2 Microrganismos do solo .........................................................................................116 7.3 Efeitos dos fatores ambientais ..............................................................................117 7.3.1 Fatores primrios ........................................................................................118 7.3.2 Fatores secundrios ...................................................................................119 7.4 Funes dos microrganismos no solo................................................................ 121 7.5 Rizosfera.................................................................................................................... 125

8. Microbiologia da gua ...............................................................1318.1 Introduo ................................................................................................................ 133 8.2 Microrganismos e aspectos de sade ............................................................... 134 8.3 Coliformes ................................................................................................................ 136 8.4 Mtodos de anlises microbiolgicas de gua ............................................... 137 8.4.1 Mtodo dos tubos mltiplos ou nmero mais provvel....................138 8.4.2 Mtodo da membrana de filtro ..............................................................139 8.4.3 Outras anlises .......................................................................................... 140

9. Microbiologia do Ar ....................................................................1439.1 Introduo ................................................................................................................ 145 9.2 Fontes de contaminao ...................................................................................... 145 9.3 Fatores que afetam a populao ........................................................................ 147 9.4 Mtodos de avaliao............................................................................................ 147 9.5 Controle da populao.......................................................................................... 148 9.6 Utilidade ................................................................................................................... 149

10. Ciclo dos elementos qumicos .................................................15110.1 Introduo .............................................................................................................. 153 10.2 Ciclo do Carbono .................................................................................................. 153 Decomposio dos compostos adicionados ao solo...................................155 10.3 Ciclo do Nitrognio .............................................................................................. 156 10.3.1 Mineralizao ...........................................................................................157 10.3.2 Nitrificao ................................................................................................158 10.3.3 Desnitrificao..........................................................................................159 10.3.4 Imobilizao..............................................................................................159 10.3.5 Fixao de nitrognio .............................................................................161 10.4 Ciclo do Enxofre .................................................................................................... 166 10.5 Ciclo do Fsforo .................................................................................................... 167 10.6 Ciclo do Potssio................................................................................................... 169

11. Patogenicidade .........................................................................17311.1 Introduo .............................................................................................................. 175 11.2 Etapas do desenvolvimento da doena .......................................................... 176

12. Controle de microrganismos ...................................................18312.1 Introduo .............................................................................................................. 185 12.2 Fatores que afetam os microrganismos .......................................................... 186 12.3 Agentes fsicos ...................................................................................................... 187 Calor........................................................................................................................187 Calor seco ..............................................................................................................187 Calor mido ......................................................................................................... 188 Pasteurizao ...................................................................................................... 189 Filtrao ................................................................................................................ 189 Frio ....................................................................................................................... 190 Radiao ............................................................................................................... 190 Presso osmtica .................................................................................................192 Ressecamento .......................................................................................................192 12.4 Agentes qumicos ................................................................................................. 193 Fenol e compostos fenlicos............................................................................. 194 Halognios ........................................................................................................... 194 lcool ......................................................................................................................195 Modo de ao dos agentes qumicos ..............................................................195 Avaliao dos agentes qumicos ..................................................................... 196

13. Microbiologia Industrial - Biotecnologia ...............................19913.1 Introduo .............................................................................................................. 201 13.2 Substratos em biotecnologia ............................................................................204 13.3 Produtos e processos da biotecnologia ..........................................................204 Indstria de alimentos ....................................................................................... 204 Indstria de bebidas alcolicas ....................................................................... 206 Indstria farmacutica ...................................................................................... 207 Indstria agropecuria ...................................................................................... 208 13.4 Aplicaes em meio ambiente ..........................................................................209

Apresentao

O contedo apresentado neste livro de Microbiologia representa um esforo dos professores autores em procurar transmitir aos alunos conhecimentos adquiridos ao longo de anos de ministrao de cursos na modalidade presencial. No uma obra acabada, mas o incio de uma tentativa de uma nova forma de ensinar. Portanto, caro aluno, voc parte importante deste processo. Ningum melhor do que voc para nos ajudar a melhorar este material ao longo do nosso curso. Durante a leitura deste material voc encontrar informaes sobre o histrico da microbiologia e dos organismos que so objeto de estudo dos microbiologistas: bactrias, algas, protozorios, fungos e vrus. Tambm sero discutidos: a presena dos microrganismos nos mais diferentes ambientes como o solo, a gua e o ar, bem como as atividades desenvolvidas por eles e que representam importantes funes na manuteno da vida do planeta. Em adio, os microrganismos apresentam uma intensa vida social em relacionamentos com outros seres vivos e com o meio ambiente. Algumas destas interaes so positivas e outras negativas, como as relacionadas patogenicidade. Por fim, importante conhecer as formas de controlar os microrganismos e os produtos microbianos que utilizamos no cotidiano e que muitas vezes nos passam despercebidos e parecem ser de pouca importncia. Na verdade, ningum vive sem os microrganismos que esto ao nosso redor e dentro da gente. Alexandre Verzani Nogueira Germano Nunes Silva Filho

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Introduo MicrobiologiaNeste captulo sero apresentados os principais personagens e suas contribuies para o desenvolvimento da microbiologia. Tambm ser discutido ao longo do tempo o posicionamento dos microrganismos na rvore da vida.

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1.1 HistricoDesde a antiguidade havia a suspeita de que deveriam existir organismos menores do que aqueles que se podia observar. Alguns aventuravam a dizer que nas costas de um animal maior existia um menor, e neste menor existia um ainda menor e assim, sucessivamente. Tambm havia a ideia de que as doenas se propagavam por sementes. Mas quem pela primeira vez convenceu o mundo de que os microrganismos existiam foi Antony Van Leeuvenhoek, sendo, portanto, considerado o pai da Microbiologia. Novo impulso s foi dado na microbiologia com o desenvolvimento da indstria tica na Alemanha com a produo de microscpios compostos. O primeiro perodo ureo da microbiologia teve incio no final do sculo XIX, com a derrubada da teoria da abiognese, o estabelecimento dos processos de fermentao como produto da atividade de microrganismos, o da relao de microrganismos com as doenas e o desenvolvimento da microbiologia agrcola e ambiental. A teoria da abiognese teve origem junto com a humanidade. Ela era inclusive defendida por grandes filsofos. Mas medida que o conhecimento sobre biologia evolua, ela ia paulatinamente sendo derrubada. O ponto final foi dado por Redi, em 1668, quando demonstrou que as larvas que surgiam na carne em putrefao eram um estgio da vida das moscas, e que as mesmas no surgiam na carne se a mesma estivesse devidamente protegida.

teoria da abiogneseHiptese que se baseava na crena de que os seres vivos poderiam ser originados a partir da matria bruta.

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Leeuvenhoek era um holands, comerciante de tecidos. Para no ser enganado na compra, comeou a utilizar lentes para verificar os produtos que adquiria. Isto despertou o seu interesse na produo destes instrumentos. Ele passou a produzir lentes com tal acuidade que permitiam aumentos de at 400 vezes. Com estas lentes comeou a investigar o mundo que o cercava. Como ele no era um cientista, passou a comunicar suas descobertas atravs de cartas. Em 1674 escreveu para a Sociedade Real Inglesa que tinha ficado maravilhado ao descobrir em uma gotcula uma srie de animlculos. Ele descreveu com tal preciso o que tinha observado que hoje possvel identificar os microrganismos visualizados. No entanto, como no era da rea da cincia, no deixou discpulos. Com a sua morte, a tcnica de polimento das lentes foi perdida, e seu trabalho interrompido.

Figura 1.1 Retrato de Antony Van Leeuvenhoek. (Disponvel em: Acesso em: 19/01/2010).

No entanto, com a descoberta dos microrganismos, esta teoria ressurgiu, pois preparados aparentemente isentos de microrganismos, em pouco tempo apresentavam abundncia dos mesmos. Logo, duas correntes de pensamento foram estabelecidas: a da biognese e a da abiognese, cada qual produzindo experimentos tentando provar sua teoria ou derrubar a do outro. Os partidrios da teoria da biognese comearam com o conhecimento de que o calor matava os microrganismos, assim, meios de cultura submetidos fervura por longos perodos, mostravam a ausncia de microrganismos. Mas, com o passar do tempo, os microrganismos surgiam. Logo, eles podiam estar aparecendo de algum lugar e, o mais lgico, era o ar. Trataram, ento, de aquecer o material em recipientes fechados, e assim o mantinham estril. Os adeptos da teoria da abiognese contra atacaram, argumentando que em ambientes fechados os microrganismos no teriam acesso ao oxignio que era considerado na poca essencial a todo o tipo de vida. Foi quando entrou em cena Louis Pasteur. Ele resolveu o problema utilizando um balo de vidro cujo pescoo fora esticado e encurvado na forma de um pescoo de cisne. O frasco,

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A

contendo no seu interior meio de cultura era ento aquecido e fervido. Com este procedimento, o meio de cultura ficava isento de microrganismos por longos perodos. S surgiam microrganismos, quando o gargalo era quebrado ou quando se fazia o lquido vir at a borda do pescoo e retornar para dentro do frasco (Figura 1.2). Na realidade, pode-se dizer que Pasteur teve muita sorte, pois, outro pesquisador, Tyndall, tambm realizava experimentos semelhantes, utilizando-se de uma caixa selada. Quando ele passava atravs da caixa um raio de luz e verificava que no havia partculas em suspenso no ar, o meio de cultura permanecia estril. Seu experimento foi repetido diversas vezes com sucesso. De repente, o meio comeou a apresentar crescimento. Ao investigar o problema, ele descobriu que o que estava crescendo era um microrganismo que produzia endsporos, capazes de resistir a vrias horas de fervura. Outra participao de Pasteur foi quando do estabelecimento dos processos de fermentao. Pasteur era qumico, e na sua poca as fermentaes eram consideradas reaes qumicas. Ao estudar este processo, Pasteur descobriu que em boas produes de vinhos e cervejas, ocorria a presenas de microrganismos conhecidos hoje como leveduras. Sugeriu ento que estas leveduras deveriam ser inoculadas nos mostos ou sucos de uva para a produo de um bom produto. Mas havia um problema, estes materiais j apresentavam uma microbiota oriunda do campo, da prpria uva, dos processos de transporte e processamento. Como eliminar estes organismos, para introduzir somente os microrganismos desejveis? O aquecimento eliminava os microrganismos, mas tambm alterava as caractersticas do produto. Foi quando Pasteur desenvolveu um procedimento conhecido por pasteurizao. Este procedimento utilizado at hoje na preservao de alimentos como sucos, cervejas e leite. Outro pesquisador que teve participao destacada no desenvolvimento da microbiologia, notadamente na rea mdica, foi Robert Koch. Ele era um mdico que vivia no interior da Alemanha e ganhou de presente de aniversrio de sua esposa um microscpio com o qual comeou a pesquisar o mundo microbiano. Ao investigar a morte de animais por uma doena conhecida por carbnculo, verificou que nas lminas preparadas com esfregao

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Figura 1.2 (A) Vidro com forma de um pescoo de cisne e (B) vidro com o gargalo quebrado mostrando o crescimento microbiano. (Adaptado de: . Acesso em: 29/03/2010).

pasteurizaoAquecimento do produto a baixas temperaturas, e por longos perodos, de forma a destruir os microrganismos indesejveis sem alterar as caractersticas do produto.

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do sangue encontrava um microrganismo em forma de basto. Comeou ento a relacionar a presena deste microrganismo ao desenvolvimento da doena. Como provar isto? Bom parecia ser fcil. Bastava inocular este microrganismo em um animal sadio e ver se este desenvolvia a doena. Mas para isso era necessrio obter este organismo em cultura, em uma cultura contendo apenas este microrganismo, ou seja, uma cultura pura. Foi necessrio, ento, o desenvolvimento de metodologia de isolamento, de cultivo de microrganismos e de identificao. A partir da, Koch elaborou quatro postulados, conhecidos como Postulados de Koch, que so utilizados at hoje para relacionar doenas ao seu agente, ou seja: O microrganismo deve estar presente em todos os casos da doena; isolar o microrganismo em cultura pura; ao ser inoculado em um organismo sadio e susceptvel, deve desenvolver os sintomas da doena e por ltimo obter novamente o microrganismo em cultura pura. Com estes postulados, em questo de duas dcadas (1880 a 1900) as doenas mais importantes para a espcie humana, incluindo a de outros animais e as de plantas, tiveram o seu agente identificado. Isto abriu as portas para o controle das infeces, possibilitando a preveno, o tratamento e a cura. Pasteur participou, ainda, no entendimento do processo de imunizao e desenvolvimento de vacinas. Certa vez, ao tentar demonstrar que havia identificado o agente causador de uma doena de aves, verificou que bactrias quando submetidas ao cultivo continuado podiam ficar atenuadas, ou seja, perdem a capacidade de produzir a doena, mas no perdem a capacidade de induzir a imunidade. Na demonstrao, Pasteur inoculou um lote de galinhas com a bactria isolada e outro lote permaneceu como testemunha. Para seu espanto, ambos os lotes permaneceram vivas. Avaliando o que poderia ter ocorrido, descobriu que a cultura utilizada no experimento, era uma cultura velha, ou seja, de vrios dias de incubao. Resolveu ento repetir o experimento, inoculando um novo lote de galinhas e o lote que tinha sido inoculado anteriormente. Ao avaliar o experimento, verificou que as galinhas inoculadas com a cultura jovem haviam morrido. As que receberam a cultura jovem, mas que anteriormente haviam sido inoculadas com a cultura velha, e as que no foram inoculadas, conti-

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O termo foi uma homenagem a Jenner que teria utilizado material de vacas com varola para imunizar humanos.

nuaram vivas. Desta forma, foi sugerido que a imunidade poderia ser obtida inoculando-se microrganismos atenuados e deu o nome desta tcnica de vacinao. Enquanto que a maioria dos microbiologistas da poca estava preocupada com as questes de patogenicidade, em descobrir quem provoca o que, alguns se questionavam indagando: existem tantos microrganismos no ambiente, no solo, na gua, na superfcie de planta e animais, qual o papel destes microrganismos, o que eles fazem? Neste questionamento tiveram grande participao Winogradsky e Beijerinck. Eles demonstraram a importncia dos microrganismos na ciclagem dos nutrientes e descobriram microrganismos quimiolitotrficos e fixadores de nitrognio.

So microorganismos que obtm energia a partir da oxidao de compostos inorgnicos. A maioria destas bactrias autotrfica e utilizam CO2 como fonte nica de carbono, so, portanto quimioautotrficas.

Nas dcadas de 40 e 50 inicia o segundo perodo ureo da microbiologia. Os microrganismos so utilizados como modelos, como ferramentas, na sntese de compostos orgnicos, no desenvolvimento da gentica e tecnologia de DNA recombinante. Estes conhecimentos vieram a culminar com o desenvolvimento da biotecnologia, ou seja, o uso de organismos ou partes destes na obteno de produtos e servios. Qual ser o futuro da microbiologia? Quem tiver a resposta para esta questo, por favor, divulgue, pois, precisamos nos manter atualizados.

1.2 Posio dos microrganismos na rvore da vidaNo incio da biologia, devido a diferenas marcantes, os organismos foram divididos em dois grupos (Figura 1.3). De um lado estavam os animais que apresentavam, entre outras caractersticas: mobilidade, crescimento limitado, clulas sem parede celular e eram heterotrficos. J as plantas, imveis, apresentavam clulas com parede celular, crescimento ilimitado e eram autotrficas. Na medida em que os microrganismos foram descobertos, iam sendo distribudos entre os dois grupos. Desta forma, Linnaeus props, em 1753, a incluso de todos os organismos nos reinos Plantae e Animalia. Sendo as bactrias,

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algas e fungos includos com as plantas e os protozorios com os animais. No entanto, como os microrganismos apresentam caractersticas que no os classificavam perfeitamente em cada reino, controvrsias comearam a surgir. A maioria das bactrias heterotrfica e apresenta parede celular, sendo algumas espcies mveis. Algas unicelulares so mveis, e determinados grupos no apresentam parede. Os fungos so heterotrficos. Os organismos euglenoides so tratados por alguns como algas flageladas e por outros como protozorios clorofilados. Para resolver o problema Haeckel props em 1866 a criao de um terceiro reino denominado de Protista, ou seja, os primeiros. Nele deveriam ser includos todos os organismos (microrganismos) que no fossem caracterizados como pertencentes aos reinos Plantae e Animalia. No entanto, verificou-se que estes organismos apresentavam uma caracterstica em comum. So organismos unicelulares, isto , no apresentam diferenciao de clulas formando tecidos ou rgos. Com o desenvolvimento da microscopia, verificou-se que dentro do reino Protista havia microrganismos com caractersticas muito distintas. Um grupo apresentava clulas em que o material gentico estava em contato com o citoplasma e foram denominadas de clulas procariticas. Outro apresentava clulas com um ncleo contendo o material gentico envolto por uma membrana e foram denominadas de clulas eucariticas. Tal tipo de clula tambm caracterstica de plantas e animais. Surge ento a ideia da diviso dos protistas em superiores e inferiores. Os pro-

Perodo

Proposta

Antiguidade

1753 Linnaeus

An

Animal

Vegetalge Ve tal

im

al

An1866 Haekel

im

alProtista

g Ve

eta

l

An

Fungiim al

1969 Whittaker

g VeProtista Monera

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Figura 1.3 Evoluo da rvore da vida.

Archaea

1977 Woese

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ria

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tistas superiores eram constitudos dos organismos que apresentavam clula do tipo eucaritica como algas superiores, fungos e protozorios. As bactrias e as algas inferiores, que apresentam clula do tipo procaritica foram denominadas de protistas inferiores. As algas inferiores foram depois denominadas de algas verde-azuladas, cianofceas e mais recentemente denominadas de cianobactrias. Em 1969, Whittaker, baseado na ideia de que os organismos evoluram segundo trs formas de nutrio (absoro, ingesto e fotossntese), props a criao de cinco reinos: Monera, Protista, Fungi, Plantae e Animalia. Os organismos procariticos, como as bactrias, foram includos no reino Monera e os eucariticos unicelulares, como algas e protozorios, no reino Protista. Os eucariticos que se nutrem por absoro foram colocados no reino Fungi, os fotossintticos no Plantae e os organismos que se nutrem por ingesto no Animalia. Com o surgimento das tcnicas de sequenciamento gentico, verificou-se que os organismos evoluram a partir de um ancestral em trs diferentes direes. Com base nisto Woese props em 1977 a criao de trs domnios: Archaea - Incluindo organismos procariticos, denominados genericamente de arqueobatrias, que vivem em condies extremas de temperatura, presso osmtica ou so produtoras de metano. Bactria - Incluindo organismos procariticos denominados de bactrias. Eukarya - Incluindo organismos eucariticos como os reinos Protista (algas e protozorios), Fungi, Animalia e Plantae. Esta nova proposta inclui ainda a teoria da endossimbiose, segundo a qual as organelas existentes nas clulas eucariticas, tais como as mitocndrias e cloroplastos seriam oriundos de bactrias. Esta teoria suportada pelas evidncias estruturais, tipo de ribossomo, alm de apresentarem genoma prprio. Se a clula eucaritica perde suas mitocndrias e/ou cloroplastos, no capaz de reconstitu-las, pois no possui informaes completas no seu genoma para faz-la. A figura 1.1 sumariza a evoluo da rvore da vida.

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ResumoA minuciosa descrio dos organismos observados atravs de uma lente por Leeuvenhoek convenceram o mundo da existncia dos microorganismos, abrindo um novo campo para estudo e pesquisas. No incio, os estudos se concentraram nos microrganismos patognicos com os trabalhos de Pasteur e Koch, particularmente o ltimo na demonstrao de que as doenas eram provocadas por microrganismos especficos. Com a identificao do agente ficou mais fcil o controle, o tratamento e a preveno das doenas. No entanto, as atividades dos microrganismos no se restringem a provocar doenas. Eles so responsveis por inmeras atividades essenciais a vida no planeta e produtos utilizados pela nossa sociedade. A luz do conhecimento atual, os microrganismos apresentam a maior diversidade entre todos os organismos. Dos trs Domnios existentes, em dois (Archaea e Bacteria) eles so componentes exclusivos e no terceiro (Eukarya) participam com pelo menos dois reinos (Protista e Fungi).

RefernciasMADIGAN, M. T.; MARTINKO, J. M; PARKER, J. Microbiologia de Brock. 10. ed. So Paulo: Pearson Prentice Hall, 2004. 608p. PELCZAR JR, M. J.; CHAN, E. C. S.; KRIEG, N. R. Microbiologia. Conceitos e Aplicaes. 2. ed. So Paulo: Makron Books, 1996. 524p. v. 1. ZINDLER, Frank. Como a vida comeou. Disponvel em: . Acesso em: mar. 2010. Acesso em: 19/01/2010.

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BactriasNeste captulo sero estudadas as bactrias, com destaque para as suas morfologias, estruturas e arranjos das clulas. Sero tambm abordados aspectos de gentica e engenharia gentica desses microrganismos que habitam praticamente todos os ambientes do planeta Terra.

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Bactrias

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2.1 Morfologia e estrutura bacterianaCom certeza, a grande maioria das pessoas que voc conhece j ouviu falar sobre as bactrias. H, no geral, um grande medo da presena delas, pelo seu potencial de causar doenas, mas poucos sabem que elas so mais benficas do que malficas para as pessoas, os animais e o meio ambiente. Pouca gente tem ideia em que ambientes elas existem e, principalmente, de que tamanho elas so. Pare um pouco e reflita! No seu dia a dia, onde voc encontra as bactrias e qual o tamanho delas? As bactrias so seres vivos muito interessantes, pois vivem em praticamente todos os lugares e ecossistemas. Elas esto no ar, na gua, no solo, nos alimentos, nos animais e em muitas partes do nosso corpo. Alguns desses lugares, talvez, voc jamais imaginou, como, por exemplo, em geleiras, a mais de 50 metros de profundidade e em guas vulcnicas com mais de 100 graus Celsius. Recentemente, as bactrias foram encontradas em nuvens e participam at do tipo de clima. Veja que interessante, um organismo to pequeno poder ter uma influnMas qual o tamanho desses organismos to incia em escala to grande, global. Outro exemplo teressantes? Pegue uma rgua comum, dessas curioso a presena de algumas clulas bacteescolares, e veja os risquinhos menores, os mirianas vivendo no estmago de certas pessolmetros, que so as divises dos centmetros. Pois bem, as bactrias so, em linhas gerais, mil as, causando lceras. Vale lembrar que nesse vezes menores do que um milmetro. Esse taltimo ambiente a predominncia dos cidos manho um micrmetro (m) ou micra como seria, em teoria, totalmente desfavorvel prealguns chamam e isso faz com que elas, as bacsena de vida. Mas elas esto l realizando um trias, sejam apenas vistas pelo microscpio. interessante trabalho.

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Existem diferentes tipos de bactrias, como vamos ver mais para frente, elas podem variar, normalmente, de 1 a 10m. Mas, em casos extremos, podem ser de 0,2m como nas espcies pertencentes ao gnero Chlamidia a 250m em clulas de espiroquetas. Curiosamente, 0,2m a medida do limite de resoluo do microscpio tico. Para termos uma ideia do tamanho da bactria que vemos no microscpio ptico comum, que aumenta mil vezes, comparativamente, se pudssemos ver uma mosca domstica nesse mesmo microscpio ela teria o tamanho de 10 metros, aproximadamente. Podemos dar outro exemplo que ajuda a entender o tamanho desses microrganismos, fazendo um exerccio mental, em um milmetro cbico pode haver nove trilhes de clulas de bacilos, que so as de formas alongadas. Outra curiosidade que em um grama de fezes humanas frescas podem existir 1011 bactrias. Muitas dessas, com um potencial incrvel de contaminar uma praia ou um alimento. Veja que a expresso: tamanho no documento, se aplica bem para as bactrias que so pequenas, sim, mas muito importantes no nosso cotidiano Mas, j que sabemos o porte delas, vamos estudar a seguir o que uma clula bacteriana, suas estruturas e funes. Como voc sabe, as bactrias so clulas procariticas, de estrutura bastante simples, se comparadas com as clulas eucariticas das plantas, animais e fungos. As clulas das bactrias apresentam apenas um cromossomo que no envolto por membranas. Outra caracterstica interessante que a reproduo delas assexuada, no envolvendo a presena de gametas e os processos tradicionais de mitose e meiose que voc j estudou em outras disciplinas desse curso. As mitocndrias e cloroplastos, que so organelas mais evoludas, no ocorrem nas bactrias, esses organismos, no entanto, apresentam parede celular, membrana plasmtica e ribossomos mergulhados no citoplasma. Algumas tm flagelos, que so estruturas ligadas locomoo e outras possuem pili. Essas diferenas veremos a seguir quando ressaltaremos as diferentes estruturas desses microrganismos.

So bactrias em forma de espiral. Alm desta particularidade so relativamente longas, finas, flexveis e se movimentam por rotao e flexo. As espiroquetas so bactrias anaerbias Gram-negativas.

Bactrias

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2.1.1 Formas das bactriasH cinco formas de clulas bacterianas: cocos, bacilos, espirilos, espiroquetas e vibries (Figuras 2.1 e 2.2). Os cocos so, em geral, redondos ou levemente ovais e achatados. Como exemplos dessas formas podemos citar os gneros Streptococcus e Staphylococcus, que possuem grande importncia mdica e alimentar. Os bacilos so formas alongadas, parecendo bastes ou bastonetes, que so nomes usados para descrev-los tambm. H vrios exemplos de microrganismos nesse grupo como Escherichia coli que uma das bactrias mais estudadas no mundo pelas questes ambienAntraz tais, em anlises de gua, e pelo seu potencial de O antraz uma doena infecciosa aguda causer patognica. As dimenses de E.coli so 1m sada pelo Bacillus anthracis, formador de esporos. Ocorre mais frequentemente em anide largura por 3m de comprimento. O gnero mais selvagens e domsticos, porm, o antraz Bacillus possui vrias espcies importantes na pode tambm ocorrer em humanos que so microbiologia. Voc j deve ter ouvido falar no expostos aos animais infectados ou pele de antraz, que uma doena causada por Bacillus animais infectados. Como uma arma biolgica, pode ser facilmente espalhada atravs da anthracis, e perigoso na fabricao de armas pulverizao de plantaes, sistemas de disbiolgicas.tribuio de ar e espaos fechados.

Vibrio choleraeA clera uma doena infecciosa aguda, transmissvel e perigosa, caracteriza-se por uma infeco intestinal grave, podendo levar morte em decorrncia da desidratao. A bactria causadora o vibrio colrico ou Vibrio cholerae, em forma de vrgula, mvel, que se desenvolve no intestino humano e produz a toxina responsvel pela doena. O vibrio colrico foi descoberto em 1883 por Robert Koch, cientista ingls, um dos pais da microbiologia. O agente etiolgico da clera encontrado nas fezes das pessoas infectadas. O contgio direto, atravs da gua e dos alimentos contaminados. As moscas e outros insetos podem funcionar como vetores mecnicos, transportando o vibrio para a gua e para os alimentos. O homem chega a eliminar milhes de bactrias por grama de fezes.

As formas espiraladas e espiroquetas, menos comuns do que as de cocos e bacilos, so alongadas e so importantes em estudos de meio ambiente. Um exemplo de espirilo Rhodospirillum rubrum e de espiroqueta temos Spirochaeta stenostrepta. Uma forma interessante, que parece um chapu de cangaceiro nordestino, e muito importante na rea da sade o vibrio, que parece um bacilo arredondado. Vibrio cholerae a causadora da clera, que mata milhares de pessoas em reas com baixa estrutura sanitria.

2.1.2 Arranjos bacterianosAs bactrias podem estar isoladas ou em arranjos. Os principais arranjos ocorrem em co-

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Microbiologia

cos. Quando dois cocos coexistem chamamos esse agrupamento de diplococos. o caso de Streptococcus pneumoniae, causadora da pneumonia em seres humanos. Uma fileira ou cadeia de cocos chamada de estreptococos e acontece em Streptococcus pyogenes, outra bactria que causa infeces em pessoas. Um cacho de cocos, os estafilococos, aparece em Staphylococcus aureus, por exemplo, que muito importante em estudos de infeco hospitalar e em intoxicao alimentar. Outras formas menos comuns de cocos so as ttrades, com quatro cocos, e as sarcinas, que parecem uns cubos ou caixas de oito clulas. Em bacilos, quando da diviso celular, podem ocorrer diplobacilos. Os estreptobacilos so fileiras de bacilos. Como na natureza existem curiosidades e excees s regras, h formas e arranjos de clulas em estrelas, como o caso do gnero Stella. Clulas quadradas ocorrem no gnero Haloarcula. Em geral, as formas e arranjos das bactrias so caractersticas hereditrias e apresentam o seu prprio tipo. Entretanto, h casos no muito comuns em que uma espcie pode ter vrias formas, modificadas por questes ambientais. Os gneros Rhizobium e Corynebacterium, por exemplo, apresentam pleomorfismo e podem variar na natureza. Essas duas bactrias so importantes na rea de microbiologia do solo e assuntos ligados agronomia e biologia.

Pleomorfismo A bactria que no apresenta uma morfologia nica, mesmo que se encontre em condies favorveis sua sobrevivncia.

2.2 Estruturas externas e internas das clulas bacterianasPodemos distinguir em uma bactria estruturas externas, que sero descritas a seguir, e as estruturas internas, que voc ver posteriormente. A figura 2.3 mostra o desenho bsico de uma bactria contendo o nome de suas estruturas.

2.2.1 Estruturas externasNa parte externa h os flagelos, pili, fmbrias e a cpsula ou glicoclix.

Bactrias

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Plano de diviso Diplococos MEV A

2 m

Estreptococos MEV 3 m

B

Ttrade

C MEV 0,1 m

Sarcina MEV 2 m

D

Estalococos Figura 2.1 Arranjos de cocos. (Adaptado de TORTORA et al.; 2000, p. 78).

MEV

2 m

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Bacilo nico

Microbiologia

Vibrio MEV 2m MEV 4 m

Diplobacilos

Estreptobacilos Espirilo MEV 5m MEV 2m

Cocobacilos Espiroqueta MEV 1m MEV 1,5m

Figura 2.2 Outras formas de bactrias. (Adaptado de TORTORA et al.; 2000, p. 79).

Bactrias

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Citoplasma Ribossomos Incluses Cromossomo (ncleo sem membrana) Plasmdeo

Cpsula Parede celular Membrana plasmtica Fmbrias

Flagelos

Figura 2.3 Estruturas da bactria. (Adaptado de TORTORA et al.; 2000, p. 80).

Flagelos Voc j pensou que uma bactria pode nadar? Os flagelos (Figura 2.4) so compostos de protenas chamadas flagelinas e tm tamanhos de 5-20m x 0,01-0,02m. Sua funo de locomoo, fazendo com que as clulas nadem em meio lquido, atravs da rotao de uma base e que se propaga pelo flagelo. Quando a clula bacteriana vai ao encontro da luz e de alguma substncia qumica dizemos que ela tem fototaxia e quimiotaxia positivas, respectivamente. Pode ocorrer o contrrio e elas fugirem de luz ou qumicos e, nesse caso, dizemos que esses efeitos so negativos. Nem todas as bactrias tm e algumas apresentam at mais do que um flagelo por clula. Os flagelos monotrquios so os do tipo de apenas um polar, os anfitrquios tm duas unidades polares, os lofotrquios tm dois ou mais flagelos em um plo e os peritrquios so os distribudos em toda a clula. Exemplos de bactrias que tm flagelos so algumas espcies dos gneros Pseudomonas e Vibrio. Helicobacter pylori, uma bactria

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Microbiologia

que pode formar lceras no estmago humano, Caulobacter crescentus, que hoje em dia estudada na fabricao de colas cirrgicas e Escherichia coli so outros exemplos interessantes de microrganismos que tm essas estruturas. Pili e fmbrias So tambm filamentos proteicos, Parede celular bastante finos, e de tamanhos que variam de 0,1-5m x 2-10nm. Pili so maiores e menos numerosos que as fmbrias. Em geral essas estruturas ocorrem principalmente em clulas Gram negativas. As funes dessas peMembrana quenas estruturas (pili) esto associaplasmtica Citoplasma das reproduo, atravs da passagem de material gentico de uma clula para outra, no processo chamado conjugao. Outra funo a de aderncia (fmbrias), que ajuda na fixao celular em um tecido que vai infectar ou causar doena, como no caso de Neisseria gonorrhoea, agente da gonorreia, bastante importante em pases tropicais e de baixas condies de higiene. A Salmonella typhi, uma bactria que causa infeces e intoxicaes alimentares tambm apresenta muitas fmbrias. A Escherichia coli que muito numerosa no intestino de seres humanos e de animais de sangue quente pode ter pili e fmbrias (Figura 2.3). Cpsula ou Glicoclix Em algumas clulas ocorre essa camada de constituio aquosa e de polissacardeos. As suas funes esto associadas proteo (dessecao e barreira contra metais pesados, por exemplo), reserva de alimentos e aderncia em alguma superfcie que seja do interesse da bactria. Exemplos de microrganismos que tm cpsulas so Bacillus anthracis, j citada anteriormente por ser utilizada na fabricao de armas biolgicas, e Xanthomonas campestris, que secretam polissacardeos com grande potencial na indstria de alimentos, como agentes solidificantes e espessantes naturais.

Flagelo

Filamento

Gancho

Corpo basalPeptideoglicana

Membrana externa

Figura 2.4 Partes do flagelo. (Adaptado de TORTORA et al.; 2000, p. 83).

Os espessantes naturais so carboidratos naturais (goma microbiana xantana entre outras) responsveis pelo aumento da viscosidade de solues em alimentos. A goma xantana quando associada com outras gomas proporciona textura lisa e cremosa, sendo utilizadas para a fabricao de molhos para saladas, bebidas, geleias, produtos crneos, enlatados e sopas.

Bactrias

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2.2.2 Estruturas internasParede celular Essa camada de grande importncia para a clula apresenta uma espessura de 10 a 100nm e corresponde a cerca de 10 a 40% do peso bacteriano. Sua constituio de uma rede macromolecular chamada de peptideoglicana, tambm conhecida como murena. O peptideoglicano um polmero insolvel rgido, composto de acetilglicosamina, cido acetilmurmico e peptdeo. A funo bsica da parede celular proteo e sustentao da clula. H tambm vrias enzimas localizadas nela que so de suma importncia no metabolismo celular.As clulas Gram negativas (rosas) so descoloridas pela ao do lcool e acetona por apresentarem uma camada menor de peptidioglicano do que as Gram positivas (violetas). Em adio, h mais membranas plasmticas nas Gram negativas, fazendo com que esses dois solventes de membranas penetrem e retirem o primeiro corante do processo, o cristal violeta. Elas so posteriormente coradas por safranina ou fucsina.

Em 1884, um cientista dinamarqus chamado Christian Gram descreveu um mtodo de colorao celular que separa as clulas em dois grandes grupos de bactrias: Gram positivas e Gram negativas. A parede celular das bactrias Gram positivas so mais grossas (30-100nm) e apresentam uma aparncia mais uniforme no microscpio eletrnico. Exemplos de clulas Gram positivas so as dos gneros Streptococcus e Staphylococcus, cocos, j citados anteriormente. A parede celular das clulas Gram negativas tem espessuras que variam de 20 a 30nm e apresentam camadas bastante distintas no microscpio eletrnico, uma de peptidioglicano mais fino e outra de uma membrana celular externa, que no tem nas Gram positivas. Exemplos de bactrias Gram negativas so Escherichia coli e Pseudomonas aeruginosa, esta ltima muito ligada a estudos de microbiologia ambiental e da sade, j que pode tambm ser patognica para seres humanos. Membrana citoplasmtica A membrana citoplasmtica tem uma espessura de apenas 7-8nm e composta de unidades de lipdeos com fsforo e protenas (Figura 2.5). Suas funes so ligadas permeabilidade seletiva da clula e a localizao de enzimas do metabolismo celular. Vale lembrar o que significa a palavra osmose, que a passagem do meio menos concentrado para o mais concentrado. Em outras palavras, a membrana plasmtica, atravs de mecanismos internos

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Microbiologia

onde entram os ons sdio e potssio, faz com que haja um controle do que entra ou sai da clula. Se uma bactria estiver mergulhada numa soluo muito concentrada a tendncia essa clula murchar. Se ela estiver numa soluo com poucos sais, ela tende a inchar com o aumento de gua. Esses controles so fundamentais na clula e funcionam at certo ponto. Citoplasma

Voc sabia que o Mar Morto, na divisa de Israel e Jordnia, no totalmente morto? Nesse inspito lugar, numa depresso geolgica, e que quase no chove, h poucas espcies de bactrias que esto ainda vivendo, quase chegando aos seus limites de sobrevivncia. Vale lembrar que a gua desse mar est diminuindo e ficando mais salgada, pela grande utilizao de fontes que o abastecem para irrigao, e intensa evaporao. At quando essas bactrias vo resistir?

Abaixo da membrana citoplasmtica tem o citoplasma que um meio aquoso, com cerca de 80% de gua, contendo mergulhados os ribossomos, o cromossomo, ons, nutrientes, grnulos e compostos diversos produzidos no metabolismo celular. Em algumas clulas h cristais que so

Camada dupla de fosfolipdeo da membrana plasmtica Peptdeoglicana Membrana externa A Membranas plasmaticas na clula

Fora da clula Canal Proteina integral Camada dupla de fosfolipdeo

~7 nm Protena perifrica

Dentro da clula B Camada dupla de fosfolipdeos na membrana

Figura 2.5 Detalhes da membrana celular. (Adaptado de TORTORA et al.; 2000, p. 90).

Bactrias

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txicos para alguns insetos, o caso da bactria Bacillus thuringiensis que bastante estudada no controle biolgico de pragas na agricultura. Outro exemplo curioso a presena de partculas de magnetita, compostos de ferro, em certas bactrias aquticas que podem ser atradas pelo campo magntico. Essas estruturas so chamadas de magnetossomos. Cromossomo A clula bacteriana tem apenas um cromossomo que, em linhas gerais, uma longa fita ou molcula enrolada. Esse material, tambm chamado de nucleoide, contm os genes, que so pequenos segmentos ou fraes, onde esto localizadas as informaes genticas da bactria. Diferentemente dos organismos eucariontes, o cromossomo bacteriano no tem membrana nuclear, como voc j estudou anteriormente, e tem DNA em sua constituio. Em adio ao cromossomo nico h, em certas bactrias, um pequeno DNA circular, que chamado de plasmdeo. Eles apresentam de 5 a 100 genes que so ligados sobrevivncia a certos fatores ambientais. Esses plasmdeos so tambm importantes na reproduo celular, como apresentado na parte de gentica desse livro. RibossomosSvedberg (S) Svedberg (S) uma medida da taxa de sedimentao de uma partcula em uma centrfuga, onde a taxa de sedimentao associada com o tamanho da partcula e sua forma tridimensional. Antibitico Substncia qumica produzida por um microrganismo para controlar outro microrganismo, podendo elimin-lo ou inibi-lo.

So estruturas arredondadas de cerca de 0,0025 m de dimetro e compostos de RNA e protenas. So locais onde so sintetizadas as protenas da clula, a partir de informaes contidas no material gentico, o cromossomo, e esto tambm mergulhados no citoplasma. Os ribossomos so descritos pela sua taxa de sedimentao em centrfugas, atravs da unidade Svedberg (S). Os ribossomos de clulas procariticas so denominados 70S e os de clulas eucariticas 80S. Vrios antibiticos atuam na inibio na sntese proteica, atravs da fixao dessas substncias nas unidades 30S. o caso de estreptomicina e gentamicina. Endsporos Algumas bactrias dos gneros Clostridium e Bacillus, por exemplo, formam estruturas de repouso chamadas de esporos ou endsporos. Elas so bastante resistentes e podem permanecer vivas at mesmo em gua fervente por alguns minutos. Por apresentarem

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Microbiologia

material gentico, podem germinar e produzir novas clulas que foram parcialmente destrudas pela ao de algum fator fsico ou qumico. Por essa razo, esses microrganismos so muito importantes na indstria de alimentos, onde, em alimentos enlatados ou vidros, podem resistir e contaminar pessoas que consumiram tais produtos. No caso do Clostridium botulinum, h uma doena associada chamada botulismo e que pode matar pessoas pelo efeito de sua toxina, que ataca os msculos e deixa os que ingeriram essa substncia com aparncia retorcida. Curiosamente, essa mesma toxina que pode matar, pode ser usada na fabricao de botox, que um produto feito de baixas concentraes, e que so aplicados na regio da face de pessoas. O seu efeito o de esticar a pele, dando uma aparncia mais jovial a quem a recebeu.

2.3 Gentica bacterianaA gentica a cincia que estuda as caractersticas herdadas de um organismo para outro, bem como as mudanas que ocorrem nessas informaes e que podem ser transmitidas para outros descendentes. Como voc j estudou na disciplina especfica desse curso, a gentica aborda o gentipo, que a composio gentica de um organismo e o fentipo, que o conjunto de caractersticas observveis em dado momento, podendo ser modificado pelo meio ambiente. A gentica uma das reas do conhecimento biolgico que mais cresce atualmente e tambm abordada em vrias outras disciplinas como, por exemplo, a biotecnologia e a bioinformtica. Com certeza, voc j ficou maravilhado com os produtos e potencialidades da engenharia gentica em nosso cotidiano. O estudo da gentica tem se desenvolvido muito graas aos microrganismos que, em linhas gerais, crescem muito mais rpido que outros organismos maiores. Vale lembrar que muitos dos princpios de gentica de uma bactria, por exemplo, podem ser extrapolados para outros seres vivos mais evoludos, incluindo clulas humanas. Por essa razo, em termos aplicados, a gentica bacteriana ser abordada nesse captulo, salientando e relembrando alguns conceitos que voc j estudou em outras disciplinas.

Bactrias

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2.3.1 Material gentico da bactriaA clula bacteriana, um organismo procarionte de estrutura bastante simples, se comparado com clulas eucariontes, de fungos, animais e vegetais, por exemplo, tem apenas um cromossomo enrolado, parecendo um fio de telefone, haploide (n), e mergulhado no citoplasma, formando uma fita dupla, tipo escada. O DNA da bactria Escherichia coli, que a mais estudada no mundo, tem cerca de 4 milhes de pares de bases e teria cerca de 1 mm de comprimento se alongado, o que representa, aproximadamente, mil vezes o tamanho de sua clula e tem ao redor de 10% do peso microbiano. Algumas bactrias podem ter um cromossomo circular extra, menor, chamado de plasmdeo e que tem vrios genes de resistncia da clula.

2.3.2 Replicao do DNAAntes de a clula se dividir, a bactria precisa replicar o material gentico contido nos genes, que so fragmentos do cromossomo (Figura 2.6, Figura 2.7 e Figura 2.8). A replicao bacteriana um processo semiconservativo em que uma nova fita vai sendo produzida, a partir de uma mais velha. Na primeira etapa da replicao, as duas fitas se separam e so desenroladas pela enzima DNA girase. Depois, outra enzima chamada DNA polimerase vai adicionando novas bases nitrogenadas aos pedaos e nova fita vai sendo formada at o final do processo. As bases nitrogenadas que se ligam so: Timina (T) com Adenina (A), e Citosina (C) com Guanina (G). A enzima DNA ligase a ltima a atuar e faz com que a fita nova seja contnua. Cada molcula de DNA de fita dupla ter uma fita vinda da bactria me (original) e outra da filha (fita nova formada).

2.3.3 Transcrio, traduo e sntese de protenasComo j vimos, gene um fragmento do DNA que contm uma sequncia de nucleotdeos para sintetizar uma protena. A partir da informao do DNA, ocorrem dois processos que vo culminar na sntese de protenas: a transcrio e a traduo.

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Microbiologia

DNA Girase

Forquilha de replicao

C C ADNA polimerase

G A T T A A G T C G C A T A T GDNA polimerase Fita velha DNA (parental)

A

T A G C G T C G C A A T C G A TForquilha de replicao DNA girase A Fitas novas de DNA

T

C G T

Fita velha DNA (parental)

Extremidade desoxirribose (3)

A

B

Extremidade fosfato (5)

Figura 2.6 Processo de diviso do cromossomo. (Adaptado de PELCZAR et al.; 1996).

Bactrias

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Parede celular Alongamento da clula e replicao do DNA

Membrana plasmtica DNA (rea nuclear) Cromossomo circular (molcula de DNA de dupla ta)

Incio da diviso da parede celular e da membrana plasmtica

Origem da replicao

Formao das paredes em torno das regies contendo o DNA replicado Separao das clulas

Forquilha de replicao Fita velha Fita nova Forquilha de replicao

Figura 2.7 Diviso da bactria. (Adaptado de TORTORA et al.; 2000, p. 169).

Figura 2.8 Duplicao do cromossomo. (Adaptado de PELCZAR et al.; 1996).

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Na transcrio, a enzima RNA polimerase, de forma semelhante ao que ocorre na replicao do DNA, sintetiza uma fita de RNA a partir de uma de DNA. A diferena, nesse caso, que a base nitrogenada Timina (T) se liga com outra base chamada Uracila (U). A ligao das bases Citosina (C) e Guanina (G) ocorrem de forma parecida na duplicao do DNA. Dessa forma, a informao do gene copiada para uma molcula de RNA mensageiro (mRNA), no processo de transcrio. Esse mRNA transporta as informaes para os ribossomos, no citoplasma, onde so feitas as protenas. Os ribossomos so constitudos de protenas e RNA ribossmico (rRNA). Outro termo estudado nessa parte o do RNA transportador (tRNA), que carrega os aminocidos para o ribossomo. O cdigo gentico formado por unidades chamadas cdons. Cada cdon constitudo de trs letras, correspondentes s bases nitrogenadas. AUG, por exemplo, um cdon que codifica o aminocido metionina e d incio ao processo da mensagem. Mais de um cdon pode codificar um aminocido. H 64 cdons, sendo que 61 codificam aminocidos e 3 no, esses do sinais de interrupo da traduo. Em resumo, a traduo o processo em que a informao codificada do mRNA orienta a sequncias dos aminocidos e as respectivas protenas.

2.3.4 Mutao e Recombinao do material genticoNormalmente, quando voc ouve falar em gentica logo vem mente as informaes hereditrias que so passadas de uma gerao para outra. Essa primeira parte foi abordada at aqui. Mas, como vimos na definio, a gentica tambm estuda as variaes ou alteraes nas clulas microbianas. H dois tipos bsicos de alteraes celulares: as fenotpicas, que so causadas por algum fator do meio ambiente e as genotpicas, no material gentico. Um exemplo interessante de alterao fenotpica o causado pela sacarose em bactrias do gnero Azomonas. Quando o meio est rico em sacarose as suas colnias so grandes e viscosas. Na sua ausncia, elas so pequenas e no so viscosas.

Bactrias

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As mudanas genotpicas, mais complexas, podem ocorrer de duas formas: mutao e recombinao. As mutaes so alteraes na sequncia de bases nitrogenadas do DNA, dando um produto que pode ser muito diferente do material gentico original. Elas podem ser benficas ou malficas, dependendo do caso. As recombinaes, como o prprio nome diz, um processo que leva a uma nova combinao de genes de um cromossomo. Agentes mutagnicos so aqueles que causam alteraes no DNA e que podem ser transmitidos para os descendentes das clulas afetadas. Alguns exemplos desses agentes so: substncias qumicas nitrogenadas, compostos em fumaas de cigarro, antibiticos e radiaes UV (ultravioleta) e ionizantes; estas ltimas de comprimentos de onda menores como os raios-x e raios gama. Alguns agentes mutagnicos podem ser tambm, cancergenos, desencadeando crescimento desordenado de clulas. O teste de Ames um exame para identificar possveis agentes carcinognicos em bactrias sensveis. As recombinaes genotpicas, conforme j mencionado, so rearranjos de material gentico dando novas combinaes aos produtos obtidos. H em bactrias, trs tipos bsicos de recombinao: transformao, conjugao e transduo. A transformao ocorre quando um fragmento de material gentico de uma clula passa para outra, sendo incorporada no cromossomo da segunda (Figura 2.9). Na natureza, pedaos de um cromossomo de clula que foi lesada, por exemplo, podem ser reabsorvidos por uma clula viva, passando a fazer parte do cromossomo da segunda. Esse processo pode ocorrer naturalmente em vrias bactrias dos gneros: Bacillus, Streptococcus, Staphylococcus, Acinetobacter e Neisseria. A Escherichia coli bastante usada em processos de transformao laboratorial, que iro fornecer condies para trabalhos de engenharia gentica. A conjugao ocorre quando o material gentico de uma clula bacteriana transferido para outra (Figura 2.10). Este processo ocorre pela ao de pilis sexuais que aproximam as clulas, que uma vez aderidas formam um canal atravs do qual transferida a informao gentica. Normalmente, o material vem de plasmde-

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os e feito entre clulas doadoras e receptoras. A Escherchia coli um bom exemplo de organismo onde so realizados experimentos de transferncia de genes. O termo fator F (fator de fertilidade) aquele que apresenta a capacidade de transferir material de um organismo para outro. F+ (doador), F (receptor). O termo Hfr o que descreve uma alta frequncia de recombinao. A transduo o processo de transferncia de material gentico de uma clula para outra atravs da ao dos bacterifagos estudados na parte de vrus (Figura 2.11). O material gentico dos vrus injetado na clula hospedeira da bactria e esses so incorporados pelas clulas descendentes.

Molcula de DNA circular de ta dupla Clula bacteriana doadora Lise celular por mtodos qumico ou mecnico

Extrao de DNA

Fragmentos de DNA doador

Clula receptora competente

Fragmentos de DNA doador ligam-se na superfcie da clula receptora.

DNA doador absorvido pela clula receptora. Ocorrncia de recombinao DNA doador integrado no cromossomo da clula receptora.

Clula Transformada

Figura 2.9 Transformao bacteriana. (Adaptado de PELCZAR et al.; 1996, p. 346).

Bactrias

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F+ Clula doadora Pelo sexual da clula F+ Plasmdio F Cromossomo bacteriano

F Clula receptora

O pelo sexual da clula F+ se liga a uma clula F .

O pelo sexual se retrai, colocando a clula F em contato com a clula F+. As membranas das clulas se fundem, formando um canal entre as duas clulas .

Uma ta do plasmdio F comea a se deslocar para a clula F .

Fita complementar Fita complementar Quando a ta passa para a clula F , tas de DNA complementar so sintetizadas.

O plasmdio transferido torna-se circular e a clula F torna-se uma clula F+ porque apresenta um plasmdio F. F+ F+

Figura 2.10 Conjugao bacteriana. (Adaptado de PELCZAR et al.; 1996).

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Bacterifago Fixao na clula hospedeira

DNA hospedeiro Injeo do DNA fgico no hospedeiro

Replicao do DNA fgico Degenerao do DNA hospedeiro Fago com fragmentos de DNA da clula hospedeira

Fagos com DNA fgico

Lise celular

Fago transduzido Fago transduzido liga-se nova clula hospedeira e injeta o DNA

Novo hospedeiro Recombinao Clula com genes transduzidos Figura 2.11 Transduo bacteriana. (Adaptado de PELCZAR et al.; 1996, p. 346).

Bactrias

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2.3.5 Gentica e BiotecnologiaDesde os tempos remotos, os microrganismos tm sido teis para a humanidade na fabricao de pes, cerveja, vinho, queijos, iogurtes e vrios outros produtos. O termo biotecnologia, no passado, englobava os processos fermentativos das clulas microbianas, com o passar do tempo, selecionadas. Estirpes mais adaptadas e produtivas foram desenvolvidas com o auxlio de mecanismos naturais de alteraes genticas discutidos aqui: mutaes e recombinaes (transformao, conjugao e transduo). A biotecnologia moderna ampliou esse conceito e hoje em dia utiliza-se de novas ferramentas como, por exemplo, a do DNA recombinante, que, artificialmente, manipula genes de origens diferentes para criar novos organismos. Os estudos de plasmdeos foram intensificados e hoje possvel pegar genes de uma bactria, com uma determinada caracterstica interessante, e introduzi-los no material gentico de uma planta. A soja transgnica, hoje resistente a aplicao de fungicida graas introduo de genes de bactrias do solo, um exemplo dessa ideia bastante revolucionria. Outros exemplos interessantes na agricultura so bactrias do gnero Rhizobium e Bradyrhizobium que fixam melhor o nitrognio do ar e so inoculadas em plantas leguminosas. A bactria Pseudomonas foi modificada para produzir uma toxina de outra bactria Bacillus thuringiensis, que combate insetos em plantas. Outros exemplos de grande aplicao na indstria farmacutica da engenharia gentica so: insulina humana por Escherichia coli, interferon por E. coli e Saccharomyces cerevisiae, vacina contra hepatite B, por S. cerevisisiae, taxol, por E. coli, hormnios de crescimento humano, por E. coli, entre tantos outros. Ferramentas in vitro de modificaes genticas podem ser utilizadas para complementar as tcnicas in vivo, como as mutaes e recombinaes. As mais modernas so: enzimas de restrio, sequenciamento e sntese de DNA, clonagem molecular, plasmdeos e bacterifagos como vetores de clonagem (Figura 2.12), amplificao de DNA e mutagnese. As enzimas de restrio so as que reconhecem e quebram em locais especficos do DNA. Os vetores de clonagem so aqueles em que os genes podem ser recombina-

Fungicida Agente que controla fungos. Interferons Protenas expressas por diferentes clulas humanas e sintetizadas como resposta a muitos agentes qumicos e biolgicos, eles atuam na proteo do organismo contra patgenos. taxol Produto vegetal utilizado no combate de cncer de ovrio.

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Microbiologia

As bactrias possuem um DNA principal e um pequeno DNA circular, o plasmdeo. Com o auxlio de uma enzima de restrio, possvel abrir o plasmdeo e introduzir nele um fragmento de DNA de outra espcie, que pode ser de uma clula humana responsvel por determinada protena. Depois que recebe o novo fragmento de DNA, o plasmdeo torna-se um DNA recombinante, isto , uma molcula formada pela unio de duas ou mais molculas de DNA no encontradas juntas na natureza. Esse DNA recombinante introduzido na bactria, que passa a produzir, por exemplo, uma protena humana, como a insulina, hormnio secretado pelo pncreas que controla a utilizao da glicose pela clula. Esse hormnio est ausente nos indivduos portadores de diabetes, que por isso apresentam deficincia na utilizao da glicose, com srias consequncias para a sade.DNA

Plasmdeo

Bactria

Enzima de restrio corta o plasmdeo

Clula humana Gene para insulina

Gene para insulina combinado ao DNA da bactria com a DNA-ligase

Bactria com DNA recombinando

Insulina

Multiplicaes sucessivas de bactrias e produo de insulina

Figura 2.12 Esquema simplificado da produo de insulina humana por bactrias. (Adaptado de . Acesso em: 28/03/2010).

Bactrias

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Bactria Agrobacterium tumefaciens

T-DNA portador do gene exgeno inserido no cromossomo

4 O plasmdeo reinseridoem uma bactria. T-DNA Stio para clivagem de restrio.

5 A bactria utilizada parainserir o T-DNA portador do gene exgeno em um cromossomo de uma clula da planta.

6 1 O plasmdeo removidoda bactria e o T-DNA clivado com uma enzima de restrio. O plasmdeo Ti recombinante

As clulas vegetais so multiplicadas em cultura

3 O DNA exgeno inserido no T-DNA do plasmdeo.

2 O DNA exgeno clivadocom a mesma enzima.

7 A planta gerada a partir de umclone de clulas. Todas as suas clulas so portadoras do gene exgeno e podem express-lo como uma nova caracterstica.

Figura 2.13 Processo de engenharia gentica utilizando plasmdeo Ti. (Adaptado de TORTORA et al.; 2000, pg. 261).

dos e replicados. O termo transposon bastante usado e significa um segmento de DNA que pode se mover de uma molcula para outra. Mutagnese uma tcnica onde um determinado gene de mutao pode ser sintetizado, de forma dirigida. Novas tcnicas bastante empregadas, recentemente, na clonagem de DNA, so as de sequenciamento de DNA pelos processos de Southern blotting, DNA fingerprinting e PCR (polimerase chain reaction). As duas primeiras so importantes para se localizar um determinado gene, num material biolgico. Isso poderia ajudar na preveno de doenas em estgios iniciais de desenvolvimento ou at mesmo antes de ela aparecer.

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Microbiologia

Em adio identificao, a terapia gnica pode ser utilizada, substituindo genes defeituosos ou ausentes por outros melhores. Outra aplicao interessante a da medicina forense, onde se tem como objetivo desvendar crimes com o auxlio gentico, atravs de anlises de restos humanos e animais. As anlises de PCR so usadas para amplificar amostras de DNA a partir de fragmentos de materiais biolgicos. A partir dessa amplificao, uma quantidade maior de material pode ser produzida para identificar microrganismos em amostras ambientais, por exemplo. Sondas moleculares podem ser utilizadas, tambm, nas indstrias de alimentos e farmacutica, para identificar possveis patgenos e produtores de toxinas humanos. Atravs de tcnicas moleculares, entre tantas aplicaes, h o potencial de se construir mapas genticos dos cromossomos de microrganismos. O objetivo geral seria identificar cada gene do organismo e sua respectiva funo, aumentando as possibilidades de utilizao do potencial gentico, nas mais variadas atividades humanas. Essa ideia geral, definida como projeto genoma, est sendo estudada para outros organismos. Num futuro prximo conheceremos os genes e as suas respectivas funes, em vrios seres vivos, inclusive os seres humanos. Um novo e surpreendente admirvel mundo novo est para surgir, afetando, radicalmente a vida no nosso planeta.

ResumoAs bactrias so microrganismos muito interessantes e habitam praticamente todos os ambientes terrestres. So seres procariontes e apresentam uma clula mais simples comparada com as dos organismos eucariontes. As clulas bacterianas, isoladas ou em arranjos, podem se apresentar numa das seguintes formas: cocos, bacilos, espirilos, vibries e espiroquetas. As estruturas da clula so: flagelo, pili, fmbria, cpsula, parede celular, membrana citoplasmtica, mesossoma, ribossomo, grnulos, citoplasma, esporo, cromossomo e plasmdeo. A bactria tem reproduo assexuada e se divide aps realizar duplicao do material gentico e sntese de

Bactrias

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protenas. Mutaes e recombinaes podem ocorrer com destaque para os processos de transformao, conjugao e transduo. A gentica bacteriana uma das reas que mais cresce na biologia, dando origem a novos organismos geneticamente modificados, produtos e processos de biotecnologia.

RefernciasMADIGAN, M. T.; MARTINKO, J. M; PARKER, J. Microbiologia de Brock. 10. ed. So Paulo: Pearson Prentice Hall, 2004. 608p. PELCZAR JR, M. J.; CHAN, E. C. S.; KRIEG, N. R. Microbiologia. Conceitos e Aplicaes. 2. ed. So Paulo: Makron Books, 1996. 524p. v. 1. PRESCOTT, L. M.; HARLEY, J. P.; KLEIN, D. A. Microbiology. 2. ed. Dubuque: W. C. Brown, 1993. 912p. SINGLETON, P. Introduction to bacteria. 2. ed. Chichester: Wiley, 1992. 221p. TORTORA, G. J.; FUNKE, B. R.; CASE, C. L. Microbiologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2000. 827p. . Acesso em: 15.03.2010.

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Reino ProtistaNeste captulo sero estudados os protistas, com destaque para as algas e os protozorios.

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3.1 IntroduoOs protozorios e as algas pertencem ao reino Protista, que incluem os organismos eucariticos unicelulares. No entanto, desde o inicio da biologia, houve a tendncia de os organismos deste reino, que apresentavam mobilidade e heterotrofismo, serem estudados pelos zoologistas, enquanto que os fotoautotrficos foram assumidos pelos botnicos. Desta forma, organismos do mesmo reino so discutidos e disputados como dois grupos. Isto muitas vezes cria certa confuso. Os organismos euglenoides, por exemplo, so considerados pelos botnicos como uma alga flagelada e pelos zologos como um protozorio clorofilado.

3.2 Algas3.2.1 IntroduoUm dos grupos de organismos mais interessantes e estudados em microbiologia o das algas. Muita gente faz confuso sobre o que, de fato, so as algas e iremos abordar sobre quem so e qual a rea de importncia delas no meio ambiente e alimentao. Voc sabia que as algas j foram antigamente descritas e estudadas totalmente como plantas? Elas j fizeram parte do Reino Plantae e, curiosamente, o termo alga vem de uma palavra em latim que significa planta marinha. As algas so, tambm, estudadas na botnica, como voc j viu em outra disciplina (Sistemtica Vegetal I). Claro que existem algas que parecem com plantas, pois

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muitas possuem cloroplastos, onde realizada a fotossntese, mas h tambm outras que so muito diferentes dos vegetais. O estudo das algas chamado ficologia. Em geral, as algas podem ser microscpicas (microalgas) e macroscpicas (macroalgas) e apresentam pigmentos fotossintticos. H uma grande diversidade desses organismos e a classificao delas bastante complexa e polmica. Em linhas gerais, os ficologistas trabalham com dois grupos de organismos: os procariontes e os eucariontes. As dos procariontes fazem parte do antigo Reino Monera, com destaque para as cianofceas, ou algas azuis, hoje chamadas de cianobactrias. Elas so do domnio Bactria, so unicelulares ou filamentosas e so fototrficas. O tamanho delas pode ser o de uma bactria normal, com dimetro de aproximadamente 0,5 a 1m at clulas maiores de 10m. Elas apresentam, em geral, clorofila a, que verde, e outros pigmentos como a ficocianina (azul) e ficoeritrina (vermelha ou marrom). Em geral habitam ambientes tanto terrestre como aquticos, podendo este ltimo ser de gua doce ou salgada. Exemplos de gneros de cianobactrias so: Oscillatoria, Spirulina, Anabaena, Nostoc, Nodularia e Microcystis. Vale destacar que a Anabaena, que tem um carter endoftico e fixa o nitrognio do ar, faz associao simbitica com uma samambaia aqutica de nome Azolla, que pode ser importante, nutricionalmente, em sistemas de produo de arroz irrigado. Mycrocystis um importante organismo que causa floraes em guas, produzindo toxinas e contaminando os ambientes aquticos. O segundo grande grupo de algas, as eucariontes, fazem parte dos Reinos Protistas e Plantae. Elas apresentam cloroplastos, fazem fotossntese, e so classificadas em filos: Clorophyta (algas verdes), Rhodophyta (algas vermelhas), Phaeophyta (algas marrons), Euglenophyta (euglenas), Dinophyta (dinoflagelados) e Bacilariophyta (diatomatceas). As Clorophytas (verdes) podem ser unicelulares e multicelulares, apresentam clorofila a e b, amido e lipdios como substncia de reserva e habitam ambientes midos e aquticos (principalmente gua doce). Um exemplo interessante de microalga verde a Chlorella que usada na alimentao humana e tem aproximadamente

carter endofticoSituado ou que ocorre dentro de tecidos de plantas, sem causar aparentemente dano a seus hospedeiros.

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10m de dimetro. Exemplos de filamentosas verdes so dos gneros Spirogyra, Ulothrix e Cladophora. As Rhodophytas (vermelhas) tm clorofila a e d e apresentam amido das flordeas como substncia de reserva. Apresentam pigmentos chamados ficoeritrinas, so aquticas e bastante empregadas na alimentao oriental para fazer sushi. Um exemplo desse tipo tem o nome de Nori, que uma alga vermelha do gnero Porphyra. As Phaeophytas (marrons) so marinhas, apresentam clorofila a e c, pigmentos carotenoides e xantofilas, variam de tamanho, podendo apresentar formas microscpicas at os Kelps que podem chegar a 60 metros. Exemplos desse grupo so as Wakame (Undaria e Sargassum) e Kombu (Laminaria), importantes na culinria oriental. As Dinophytas (dinoflagelados) so unicelulares, tm clorofila a e c, apresentam como pigmento carotenoides e como substncia de reserva amido e gordura. Podem produzir toxinas que matam peixes e outros animais. As Euglenophyta (euglenas) so unicelulares com flagelos, tm clorofila a e b, carotenoides e xantofila como pigmento, tm como substncia de reserva grnulos de paramilo. As Bacilariophyta (diatomatceas) so unicelulares, aquticas e terrestres, tm clorofila a e c, a substncia de reserva a crisolaminarina e tm tambm carotenoides e xantofila. Apresentam uma carapaa dura, com grande quantidade de slica e tm uma diversidade de formas. A partir dos antigos depsitos das frstulas, podem formar rochas denominadas diatomito, com essa estrutura dura e rgida, podendo ser usadas na fabricao de filtros e pedras de raspagem de calos em pessoas.

KelpsCoberturas extensas de algas (florestas de algas). Os kelps, so constitudos por algas da ordem Laminariales.

3.2.2 A importncia das algasPelo fato j salientado que fazem fotossntese, a maior importncia das algas, em termos ecolgicos no planeta, est na produo global de oxignio. H estimativas de que mais de 50% do O2 est ligada s algas, que habitam uma vasta rea de superfcie dos oceanos. Outra importante funo desse grupo de organismos que fazem parte, atravs do fitoplncton, da cadeia alimentar de

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muitos seres vivos, incluindo grandes animais. de se esperar que, num grande vazamento de petrleo, como, por exemplo, do navio Exxon Valdez, em 1989, uma imensa rea e um grande nmero de espcies sejam afetados. Alm de serem alimentos, as algas podem tambm se nutrir de bactrias, equilibrando o meio ambiente. As algas, juntamente com as plantas, participam dos processos de formao de muitos solos. Por serem produtores primrios, as algas se fixam nas rochas e, com o passar do tempo, tendo umidade e calor, comeam a liberar substncias orgnicas que quebram a estrutura das rochas formando os solos. Voc j deve ter visto, quando em viagem, uma rocha exposta, contendo muitos organismos verdes limosos na sua superfcie. De forma lenta e contnua essa rocha vai se desgastando, num processo chamado intemperismo, e os solos so formados de forma bem superficial. Com o passar do tempo, outros organismos chegam e as camadas vo ficando maiores nesses ambientes desbravados pelas algas. Um aspecto negativo das algas, do ponto de vista humano, que muitas delas, conforme j mencionado na introduo, podem se reproduzir em grande escala e contaminar as guas, atravs da produo de toxinas. Alm desse aspecto biolgico, que pode contaminar peixes, moluscos e crustceos, e inclusive o ser humano, h a poluio visual

Figura 3.1 Florao de algas verdes no lago Titicaca, Peru. (Fotografia de Viviane Mara Woehl arquivo pessoal julho de 2005).

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pela enorme produo de massa verde. Normalmente isso ocorre pelo desequilbrio nutricional nas guas pela descarga de esgotos ou fertilizantes, com destaque para os elementos nitrognio e fsforo. A eutrofizao esse fenmeno de crescimento desordenado de algas e plantas que pode atingir nveis preocupantes no ambiente. Com o excesso de massa verde, h uma grande deposio de matria orgnica, que exigir uma quantidade elevada de oxignio para a sua decomposio. A consequncia natural, em muitos casos, a mortalidade de peixes e outros seres vivos. Com certeza, voc j deve ter lido sobre isso em vrias partes do pas, como, por exemplo, na lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro e em muitas represas do estado de So Paulo, principalmente no vero. Como voc pode notar, a microbiologia uma importante disciplina que, apesar de estudar microrganismos, tem uma dimenso maior pelo efeito desses no meio ambiente. No geral, os problemas esto todos envolvidos e atuando paralelamente. A poluio por fertilizantes pode causar um problema maior, pelo desbalanceamento nutricional nas guas, afetando muitos seres vivos. No aspecto biotecnolgico, estudado com mais detalhe em outro captulo desse livro, podemos ver a importncia das algas em vrias reas de atuao humana. Vrios produtos so feitos de algas como, por exemplo, na indstria farmacutica com a produo de cosmticos e medicamentos. H vrios produtos, como cremes para a pele e pasta de dentes, que so feitos a partir desses organismos. As algas podem tambm fazer parte de filtros, como vimos na introduo para as algas diatomatceas. Na indstria de alimentos h uma gama de produtos na culinria oriental que se destaca e que cresce a cada dia. Em macroalgas temos os exemplos de Nori, Wakame e Kombu, que podem ser utilizados para fazer o sushi e para o consumo em saladas e sopas. Derivados de algas, como, por exemplo, o alginato, pode ser utilizado na indstria de cerveja, estabilizantes e espessantes, e na preservao de frutas. A carragenina outra substncia que atua no clareamento de cerveja e , tambm, espessante e estabilizante. Outro produto de grande destaque o gar, um polissacardeo, extrado de algas marinhas do gnero Gelidium, e outros, e tem a

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Microbiologia

funo de solidificar o meio, atuando como gelatinas. Esse gar bastante usado na produo de meios de cultura, em microbiologia e outras reas, como cultura de tecidos vegetais e animais. A agarose um produto mais refinado e que utilizada na composio do gel de anlises de biologia molecular. Curiosamente, quando algum vai fazer um exame de paternidade, as algas podem participar dessa importante atividade. Na microbiologia forense, para tentar desvendar crimes, materiais biolgicos so analisados e podem tambm utilizar a agarose. As microalgas podem ser utilizadas na dieta humana, com exemplos dos gneros Chlorella, Spirulina e Dunaliella. Alm de fornecerem vrias vitaminas, as algas so ricas em protenas, substncias antioxidantes, como o Omega-3, e apresentam vrios minerais, usualmente, no muito consumidos no cotidiano. Esses produtos, em forma de cpsulas, so encontrados em farmcias e supermercados, no mercado de produtos naturais e esto em franco crescimento, j que muitas pessoas esto aderindo a essas dietas alternativas. Em vrias partes do mundo h a produo dessas algas em tanques oxigenados, principalmente em pases com grande exposio ao sol, como o caso de Israel e nos Estados Unidos, na Califrnia. Nessa linha de produo de biomassa, recentemente, tem sido bastante estudado o potencial de algas na indstria de combustveis, os biocombustveis, muito na mdia mundial. A biomassa das algas, como ocorre em muitas partes do mundo, pode tambm ser utilizada para a fabricao de rao, adubos orgnicos e na produo de pigmentos como, por exemplo, a ficobiliprotena, empregada nas anlises de imunofluorescncia. Em resumo, a importncia das algas muito grande e est em fase de expanso, em diversas reas do conhecimento humano.

3.3 ProtozoriosAlm das caractersticas que os incluem no reino Protista (clulas eucariticas e unicelulares), os protozorios so heterotrficos, geralmente mveis e sem parede celular. So unicelulares unos,

Reino Protista pseudpodesEm grego: falsos ps - pseudo + podes) um termo para as extenses fludas do citoplasma de seres unicelulares, utilizadas para a alimentao e a locomoo. So evaginaes da membrana plasmtica que surgem por meio de deslocamentos do citoplasma e que movimentam a clula e englobam partculas.

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ou seja, no formam agrupamentos ou filamentos, se apresentam sempre de forma celular isolada. A caracterstica de mobilidade foi responsvel pela sua denominao de primeiros animais (protos = primeiro, zoom = animal). Podem se locomover por pseudpodes, flagelos ou clios. Como heterotrficos podem atuar como saprgenos decompondo a matria orgnica, parasitas e predadores, incluindo os prprios protozorios (holozoicos) e simbiontes. Protozorios flagelados que vivem em associao com cupins, degradam a celulose (ingerida, mas no digerida) em substncia glicognica que assimilada pelo inseto. Apresentam dimenses variveis. Leishmania donovani, 10 m, Amoeba proteus, 400 m e alguns ciliados chegam a 2.000 m.

Eles podem produzir cistos, envoltrios temporrios que aumentam a proteo contra as agresses externas. Falta de alimento e desidratao favorece o encistamento. Ele tambm pode ocorrer durante a reproduo, como Fisso Binria forma de proteo quando transmitido de um Nome dado ao processo de reproduo assehospedeiro para outro.xuada dos organismos unicelulares que consiste na diviso de uma clula em duas por mitose, cada uma com o mesmo genoma da clula-me (com o mesmo DNA ou material gentico da clula-me).

Fisso MltiplaO ncleo se divide mltiplas vezes antes da clula se dividir. Aps a formao de vrios ncleos, uma pequena poro do citoplasma se concentra ao redor de cada ncleo e ento, uma nica clula se separa em clulas-filhas.

A reproduo pode ser sexuada ou assexuada. A reproduo assexuada pode ser por diviso ou fisso (binria ou mltipla) e gemulao. A sexuada pode ser por conjugao (unio temporria de dois indivduos para troca de material gentico) ou fuso de gametas (comparvel aos espermatozoides e vulos). Os protozorios possuem capacidade de regenerao de partes perdidas.

3.3.1 ClassificaoDevido ao fato de serem heterotrficos e necessitarem buscar alimento, a principal caracterstica utilizada o modo de locomoo. Apesar de existirem inmeras espcies, as mais citadas so as causadoras de problemas para o homem. So divididos em quatro grandes grupos:

GemulaoA gemulao, tambm chamada de gemiparidade ou brotamento, caracteriza-se pelo aparecimento de brotos ou gemas, que surgem e crescem ligados ao organismo inicial e que podem, ou no, dele se desprender em certa poca da vida.

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Mastigophora Locomoo por flagelos. O nmero, a posio e o tamanho so importantes na classificao. Exemplos: Trichonympha collaris - Simbionte de cupins. Trichomonas buccalis, T. hominis, T. vaginalis - Causadores de gengivites, inflamao no intestino e trato urogenital, respectivamente. Trypanossoma cruzi - Causador da doena de Chagas. O agente transmissor o barbeiro (Triatoma). Giardia lamblia - Causa diarreia, principalmente em crianas. um dos eucariotos mais antigos. No apresenta mitocndrias, no se sabe, entretanto, se nunca a tiveram ou se a perderam. Sarcodina Locomoo por pseudpodes. So conhecidos como amebas. Alm da locomoo os pseudpodes, servem para a ingesto. A Entamoeba histolytica a espcie caracterstica deste grupo. Ciliophora Locomoo por clios. Os clios tambm auxiliam na alimentao, conduzindo o alimento para o poro bucal. O grupo tem representantes como Paramecium, um ciliado comum na gua e o Balantidium coli, nico ciliado patognico ao homem. Sporozoa So pequenos, parasitas obrigatrios, formam esporos e as formas adultas no apresentam organelas de locomoo. Exemplos: Plasmodium vivax - Causador da malria e tem como agente transmissor os mosquitos. Coccdios que atacam a parede intestinal como as nosemoses. A Nosema apis ataca as abelhas, destruindo as colmeias. Alm de ocasionar problemas na produo de mel, prejudica outras atividades agrcolas pela falta de polinizao.

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3.3.2 ImportnciaGrande importncia dada aos protozorios pelos problemas de sade causados ao homem. No entanto, outros atributos to ou mais importantes so normalmente esquecidos. A grande maioria dos protozorios no patognica ao homem. Alguns podem ser predadores, ou parasitas de outros organismos. Outros so decompositores de matria orgnica. H ainda os simbiontes, como os que vivem no rmen de determinados mamferos realizando a digesto da celulose. Como grupo um dos principais formadores do plncton, que a base da cadeia alimentar dos ambientes aquticos.

ResumoProtistas so organismos eucariticos unicelulares, tradicionalmente divididos em fototrficos (algas) e heterotrficos (protozorios). As algas fazem fotossntese, produzindo uma significativa quantidade de oxignio para o planeta, e so divididas em dois tipos: as macroalgas e as microalgas. As algas so tambm muito importantes ecologicamente, por participar dos processos de formao do solo, ciclagem de nutrientes e fazem parte da alimentao de vrios seres vivos, incluindo o homem. Podem ser utilizadas na indstria em vrios produtos e, quando em desequilbrio ambiental, podem contaminar a gua e produzir toxinas. Os protozorios so microrganismos que apresentam reproduo sexuada ou assexuada e podem ser mveis ou no. Em termos ecolgicos so importantes por fazerem parte da cadeia de alimentao de vrios seres vivos, alguns so simbiontes, ajudam nos processos de dec