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MIGRAÇÃO E URBANIZAÇÃO NO BRASIL: ALGUNS DESAFIOS METODOLÓGICOS ...

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 3-20, out./dez. 2005

N

Resumo: A partir de um olhar demográfico, este artigo tem por objetivo apresentar algumas reflexõessobre questões relevantes para a análise de migração e urbanização, considerando os avanços e lacunasexistentes e, principalmente, as possibilidades analíticas propiciadas pelo uso criativo dos CensosDemográficos brasileiros mais recentes. Pretende-se contribuir não apenas para a ampliação da agendade estudos, mas também para uma reflexão teórico-metodológica sobre os fenômenos em questão.Palavras-chave:Urbanização. Migração interna. Censo demográfico.

Abstract: Based on a demographic perspective, this article presents a discussion on important issues foranalyses of migration and urbanization, considering the existent advances and gaps and, especially, theanalytic possibilities propitiated by creative use of the most recent Brazilian Demographic Censuses.The article is intended as a contribution not only to a broadening of the agenda for research, but also totheoretical and methodological discussions on the phenomena in question.Key words: Urbanization. Internal migration. Demographic census.

JOSÉ MARCOS PINTO DA CUNHA

MIGRAÇÃO E URBANIZAÇÃO NO BRASILalguns desafios metodológicos para análise

as últimas décadas, a questão migratória no Bra-sil deixou de concentrar-se apenas no clássicomovimento rural-urbano que, nos anos 50 e 60,

preocupou e mobilizou a maior parte dos estudos. As mi-grações inter-regional, intra-regional, internacional e a mo-bilidade pendular (commuting) e a sazonal são cada vezmais reconhecidas como faces distintas desse fenômenodemográfico que aflora e ganha importância qualitativa equantitativa em função das modificações ocorridas nasdimensões econômica, social e política em nível nacional einternacional.

Da mesma forma, a questão da urbanização – que vinhasendo concebida como algo irreversível e inexorável, de-vido à evolução dos indicadores até então moldados paraeste fim – também passa a ser, se não contestada, ao me-nos questionada quanto ao seu real significado, uma vez

que novas formas de assentamentos humanos passam asurgir, como fruto de mudanças nas relações econômicase sociais entre o campo e a cidade. O mais interessante anotar é que tais preocupações, que surgem no Brasil emalguns estudos, também encontram seus correspondentesno plano internacional (CHAMPION, 2003).

É inegável que o conhecimento adequado dos tipos eetapas da migração, suas características, significados econdicionantes são requisitos fundamentais para entendernão apenas a dinâmica demográfica atual, mas também paraprever suas tendências futuras. Há, no entanto, quemquestione se a rede urbana brasileira e suas áreas ruraisrealmente estariam passando por uma percepção maisadequada do que seriam suas verdadeiras características,definindo as necessidades e vocações do urbano e,sobretudo, do rural brasileiro – e, como conseqüência, suas

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JOSÉ MARCOS PINTO DA CUNHA

implicações sobre políticas sociais, demográficas eeconômicas. Há que se considerar a grande dificuldade degeração de dados para a mensuração da migração, devidoà sua peculiaridade com relação às demais variáveis demo-gráficas. Tratando-se de um fenômeno com múltiplas ex-pressões espaciais e temporais, a migração não possui umaúnica definição – fato que constrange qualquer tentativade sistematização e levantamento de dados e estimativas.Do lado da urbanização, também se percebe que os dadosexistentes que, via de regra, rendem-se às definições ofi-ciais, da mesma forma podem deixar a desejar quando o quese deseja é mensurar a sua real dimensão. Além disso, oscritérios usados para classificar alguma localidade como“urbana” ou “rural”, longe de serem consensuais, parecemtambém carecer de reflexão crítica – e alguns deles serãodiscutidos neste texto.

O atual estado de conhecimento e os avanços nos es-tudos migratórios e sobre a urbanização brasileira revelama riqueza de estudos até então desenvolvidos. Da mesmaforma, refletem os esforços sistemáticos no sentido dageração e contínua evolução dos dados específicos e téc-nicas de análise, bem como novos enfoques sobre comoconceber e analisar ambos os fenômenos.

Assim sendo, nos dias de hoje, tem-se uma boa visãoda questão migratória e do processo de urbanização brasi-leiro no sentido de que se tem consciência das principaistendências e processos ocorridos e ainda vigentes no país.Contudo, muitos aspectos ainda carecem de estudos – oque abre uma agenda bastante extensa para os estudiososdessas áreas.

Assim, no presente momento, se por um lado nos depa-ramos com várias modalidades de deslocamentos popula-cionais que carecem não somente de uma reflexão inter-pretativa, mas também de uma tarefa sistemática demensuração e caracterização, por outro, desenvolveu-setoda uma discussão sobre o significado, dimensão e im-portância do rural brasileiro e de suas relações com o ur-bano.

No caso da migração, pode-se dizer que muitos des-ses fenômenos dificilmente poderiam ser estudados a par-tir das informações recolhidas nos Censos ou na Pesqui-sa Nacional por Amostras Domiciliares – PNAD. Tal é ocaso, por exemplo, das migrações sazonais, uma vez queos levantamentos têm o cuidado de acontecerem justa-mente em momentos em que esse tipo de movimentação émenos significativo. O mesmo ocorre com certas facetasdos movimentos migratórios que aparentemente não po-deriam ser estudadas com as informações tradicionalmen-

te disponíveis – como seriam os casos das “redes”, astrajetórias migratórias, as estratégias familiares para mi-gração, etc.

Embora tenha havido avanços quanto à urbanização,ao que parece, os estudos ainda estão distantes deapresentar claros consensos e um conjunto de infor-mações que possam dar conta da complexidade queenfrenta o estudioso sobre dinâmicas sociais, econômicase demográficas do ponto de vista da “situação do domicílio”da população.

Ao contrário dos anos 80, a presente década presen-ciou um aumento significativo dos estudos migratórios eda abordagem de questões emergentes. Pode-se dizer quenos últimos cinco anos as análises sobre migração apre-sentaram uma grande dinamização, pondo fim no quaseestado de letargia a que esteve fadada no decênio 1980/90, quando nem a grande riqueza dos dados censitáriossobre o tema foi suficientemente capaz de motivar os estu-diosos. Guardadas as devidas proporções, já que o casoda migração parece ter sido mais grave, também o fenôme-no da urbanização pôde beneficiar-se de importantes es-tudos realizados no final da década de 90.1

Hoje, devido à série invejável de fontes de dados, ointeressado em migração tem à sua disposição enormespossibilidades de contribuir para completar as váriaslacunas dessa área temática. Contudo, deve estar preparadopara enfrentar as limitações analíticas, via de regra impostaspelas coletas censitárias, as quais, possivelmente, podemdesmotivar o uso desses ricos bancos de dados. Por outrolado, a urbanização também não deixa de impor desafiossignificativos aos que dela se ocupam, por ser muito maiscomplexa no Brasil atual, apesar de todas as discussõesteóricas e conceituais desenvolvidas até aqui e as reflexõesdelas decorrentes, inclusive no que tange à forma de coletade dados.

O presente artigo visa a resgatar algumas questõesinstigantes que surgem dos debates em torno da migraçãoe da urbanização. Sem a pretensão de ser conclusivo ouexaustivo, este trabalho, com um claro viés demográfico,tem por objetivo refletir sobre algumas problemáticas deinteresse, a forma como elas têm sido abordadas e, princi-palmente, suas possibilidades de análise a partir das in-formações provenientes particularmente dos CensosDemográficos brasileiros mais recentes. Portanto, este tex-to tem a clara opção de privilegiar os dados censitários,por considerar que estes são os dados mais completos erepresentativos, em termos espaciais, de ambos os fenô-menos.

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ANÁLISE DE MIGRAÇÃO A PARTIR DOSDADOS CENSITÁRIOS

Identificação dos Fluxos Migratórios

Trabalho recente apontou as principais característicase mudanças da migração nas últimas décadas no Brasil(CUNHA; BAENINGER, 2005). Tais transformações dizemrespeito não apenas às tendências históricas, mas tam-bém à emergência e/ou intensificação de certos proces-sos que, mesmo presentes, até a década de 70 eramencobertos pela grande importância dos movimentos migra-tórios interestaduais e, em particular, aqueles do tiporural/urbano.

Tal é o caso da migração de retorno, que se intensifi-cou significativamente a partir dos anos 80; dos movimen-tos intra-regionais que afloraram nesse período, revelan-do novas lógicas e “espaços de migração” (BAENINGER,1999); os fluxos migratórios intra-estaduais, que refletemas relações existentes entre as áreas metropolitanas (ougrandes aglomerações urbanas) e o interior; finalmente, osintrametropolitanos, que se reproduzem com formas seme-lhantes em praticamente todas as áreas metropolitanas dopaís, muito embora não necessariamente com os mesmoscondicionantes. A essas modalidades não se poderia dei-xar de agregar os movimentos migratórios internacionaisque, a partir dos anos 90, assumiram uma importância nu-mérica que obrigou os demógrafos a reconsiderar a hipó-tese de “Brasil como uma população fechada”.2 A mensu-ração e interpretação de todas essas formas de migração,sejam elas as mais tradicionais, recrudescentes ou emer-gentes, representam uma condição necessária – emboranão suficiente – para se avançar na compreensão de parteconsiderável da dinâmica demográfica e da hetero-geneidade socioespacial existente no país. De fato, deve-se considerar que “... além das grandes tendências em ter-mos dos fluxos migratórios interestaduais, não se podenegligenciar a importância das dinâmicas intra-regionais eespecialmente intra-estaduais para se compreender o pro-cesso de redistribuição da população no Brasil” (CUNHA;BAENINGER, 2005).

É indiscutível que um dos grandes obstáculos a sertransposto pelo estudioso de migração são as fontes dedados. No Brasil, a não ser que se possa contar com umapesquisa específica – o que, em geral, não ocorre devidoao seu alto custo – o pesquisador dispõe basicamente dosCensos Demográficos e, para os anos 90, das PNADs.3

Nesse último caso, as informações são praticamente as

mesmas disponíveis nos Censos, motivo pelo qual, a par-tir daqui, o texto restringe-se a eles.4

Na verdade, os Censos Demográficos brasileiros, prin-cipalmente os três últimos (1980, 1991 e 2000), apresentamgrandes potencialidades em termos de análise do fenôme-no migratório. Além da representatividade e alcance espa-cial, característicos desses levantamentos, os três censosdispõem de um grande número de itens especificamentevoltados a apreender diferentes facetas do fenômeno. En-tre eles, destacam-se os que permitem estabelecer fluxosmigratórios a partir da identificação do município de resi-dência anterior do indivíduo ou de sua residência em ummomento no passado.5

É importante frisar, contudo, que as oportunidades ofe-recidas pelos Censos Demográficos crescem ainda mais seconsideramos as possibilidades dos inúmeros cruzamen-tos dos quesitos sobre migração entre si, e desses com asdemais informações levantadas a respeito das caracterís-ticas demográficas e socioeconômicas da população.

Como mostram os trabalhos de Carvalho (1985), Martine(1984), Carvalho e Machado (1992), Carvalho e Rigotti,(1998) e Rigotti (1999), a correta utilização dos dadoscensitários sobre migração permite enfrentar uma série dequestões relativas ao fenômeno. Tendo em vista a clarezae amplitude dos trabalhos acima mencionados, considera-se desnecessário reproduzir aqui, em detalhes, as váriaspossibilidades oferecidas pelos Censos Demográficos.Sendo assim, o que se apresenta à continuação é apenasuma visão geral da questão.

Grosso modo, pode-se dizer que, a partir desses dados,seria possível identificar três modalidades de migração:- a interestadual;

- a intermunicipal;

- a migração entre situações de domicílio (rural-urbano,urbano-urbano, etc.).

Nos dois primeiros casos, os quesitos sobre “lugar denascimento”, “residência anterior” (conhecida como “úl-tima etapa”) e “residência 5 anos antes do Censo” (conhe-cida como “data fixa”), seriam as possibilidades ofereci-das, muito embora conceitualmente as três informaçõessejam significativamente distintas: no primeiro caso, cap-ta apenas os migrantes acumulados (lifetime migrants)sem, portanto, estabelecer um período de migração; nosegundo, apenas o último movimento do indivíduo dentrodo período intercensitário; quanto à última informação, estatem a vantagem de combinar espaço (município e UF) etempo (cinco anos atrás), determinando a residência em uma

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JOSÉ MARCOS PINTO DA CUNHA

data fixa no passado – o que especifica, ao contrário doquesito sobre “última etapa”, um período exato e local ine-quívoco para a migração.

Nos Censos de 1980 e 2000, também se levantou o quese convencionou chamar de “movimento pendular” – apartir da pergunta sobre “lugar de trabalho” e “estudo”.Contudo, dado suas características – movimento diário semcaráter permanente – tal fenômeno não deveria ser catalo-gado como migração, mas sim, genericamente, como um tipode mobilidade populacional.

Mesmo atreladas a esses recortes espaciais, variaçõesdas modalidades de migrantes poderiam ser obtidas a par-tir da combinação entre as perguntas anteriores entre si ecom outras, como aquela que se refere ao “tempo de resi-dência” – o que ampliaria ainda mais as possibilidades deinformação censitária. Nesse sentido, há que se destacarque a definição mais detalhada da trajetória dos indivíduospermitiria a construção de tipologias mais complexas dosmovimentos – o que, sem dúvida, contribuiria para o enri-quecimento da compreensão dos processos migratórios,seus condicionantes e conseqüências.

Como se adiantou, várias sugestões sobre cruzamen-tos possíveis a partir dos quesitos censitários sobre mi-gração foram propostas por outros autores, em particularpara o Censo de 1991, no qual, pela primeira e única vez, oInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE man-teve duas informações sobre migração em nível municipal– “a última etapa” e “data fixa” – o que hoje se percebe tersido um momento de transição para a consolidação noscensos da pergunta sobre “data fixa”, utilizada há muitotempo nos censos de outros países.

O que é importante na contribuição desses autores,além, é claro, da forma didática como apresentam as possi-bilidades dos dados censitários, são as alternativas que ocruzamento de quesitos censitários pode dar ao pesquisa-dor no sentido de criar novas modalidades de migração.Esse é o caso específico da identificação de outros pon-tos nas trajetórias municipais, a partir do uso conjunto dodado sobre “data fixa” e “última etapa”, ou a identificaçãodos migrantes de retorno com o uso combinado de “localde residência” e “local de nascimento”.

Infelizmente, essas possibilidades, pelo menos em ní-vel municipal, não podem ser aproveitadas no caso doCenso Demográfico 2000, que levantou apenas a informa-ção sobre “data fixa”. De qualquer forma, ao menos paraas Unidades da Federação – UFs, ambas as perguntas fo-ram reproduzidas, – o que permitiria a aplicação dos es-quemas sugeridos, muito embora estes fossem muito mais

interessantes para os processos migratórios intra-estaduaise intra-regionais.

Considera-se que a inclusão da UF de nascimento naspossibilidades de combinações dos quesitos censitáriospode implicar em significativos aportes analíticos, sobre-tudo se considerarmos que, em alguns estudos concretos,a simples identificação de um ou dois pontos na históriamigratória individual pode escamotear parte importante doprocesso.6

Esse tipo de ganho é típico, por exemplo, de estudos deprocessos de metropolitanização ou, mais especificamente,dos de crescimento e expansão urbana nas grandes cidades.Neste último caso, muitas vezes o peso da mobilidade intra-regional pode mascarar o real processo migratório respon-sável pelo fenômeno que, via de regra, iniciou-se em outrasregiões ou estados (MATOS, 1994; CUNHA, 1994). O mes-mo ocorre com a migração para áreas de fronteiras, comomostram Cunha (2004) e Salim (1992). Segundo esse últimoautor, para o Centro-Oeste, pode-se observar “uma migra-ção concentrada regionalmente, mas caracterizada pelarazoável mobilidade interestadual, antes de situar-se naRegião”. Nesse caso, é bastante clara a necessidade de seconhecer mais detalhadamente a trajetória dos migrantespara que se possa chegar a uma adequada interpretação dascausas dessa migração.

Um detalhe metodológico importante, no que se refereà migração interestadual, é que a informação sobre “resi-dência anterior” que consta nos Censos de 1980 e 1991 é,de certa forma, de natureza distinta daquela contida noCenso de 2000. Isso porque, nos dois primeiros casos, a“UF anterior” declarada pelos migrantes está atrelada aomunicípio anterior declarado – e não seria, portanto, ne-cessariamente a residência prévia real, em termos dessaunidade espacial. Em 2000, esse problema foi sanado, namedida em que a pergunta foi feita diretamente sobre a “UF”e não sobre o “município de residência anterior”.

É sempre bom lembrar que uma solução para o problemados Censos de 1991 e 1980, no que diz respeito a uma melhorestimativa de migração interestadual intercensitária, temsido um ajuste com base na distribuição proporcional dosindivíduos que migraram dentro dos estados onde foramrecenseados, mas residiam na UF há menos de 10 anos.Pelos critérios censitários, esses indivíduos, embora inequi-vocamente migrantes interestaduias, não são computadoscomo tal, uma vez que sua residência anterior está atreladaao município que, no caso, encontra-se dentro do Estadode recenseamento. Dessa forma, o procedimento adotadoé assumir que a distribuição desses migrantes segundo UF

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de residência anterior é a mesma observada para aquelesque migraram diretamente de suas UF de origem.7

Nos Censos de 1991 e 2001, a informação específicasobre “município de residência em uma data fixa nopassado” (no caso, 1986 e 1995, respectivamente) nãoapenas permite a reconstituição da população no meio doperíodo intercensitário – e, portanto, que possam serobtidas estimativas de saldos migratórios para doisintervalos distintos de tempo (CARVALHO; MACHADO,1992) – como também elimina um problema de referênciaespacial intrínseco à informação sobre o “município deresidência anterior”.

De fato, como o município anterior pode não ser o mes-mo, por exemplo, que a microrregião anterior ou Estadoanterior, não é possível estudar, de maneira adequada, flu-xos em um nível espacial mais agregado que os municípios.Contudo, a informação sobre a residência em uma “datafixa” determina sem ambigüidade o local onde o indivíduoresidia, seja qual for o recorte espacial utilizado (há cincoanos a pessoa vivia no mesmo bairro que pertence a umúnico município, que pertence a uma única região, etc.).

Deve-se lembrar ainda, conforme Rigotti (1999), que, aofixar exatamente um período de migração, essa informaçãoé a mais adequada para a construção de taxas de migração– tão úteis não apenas para mensurar a intensidade do fe-nômeno, mas também nos procedimentos de projeção de-mográfica.

No entanto, esse tipo de informação possui também algu-mas limitações, sendo que duas delas mereceriam destaque:- não permite identificar a migração de menores de 5 anos.Essa lacuna tem que ser preenchida por métodos indiretos– como é o caso das relações que envolvem a migraçãolíquida de mulheres em idade fértil e a relação crianças/mulheres,8 ou por meio de estimativas, também indiretas,da fecundidade das mulheres migrantes;

- não contempla os movimentos ocorridos dentro do pe-ríodo transcorrido entre o levantamento e a data fixada nopassado. Esse é um dos motivos pelos quais essa infor-mação é qualitativa – e quantitativamente – distinta daque-la derivada do item “residência anterior” para pessoas commenos de cinco anos de residência;

- em particular, essa última limitação tem importantes im-plicações nos estudos sobre a dinâmica intrametropolitana,uma vez que os movimentos migratórios internos são visi-velmente subestimados a partir dessa informação.9

Por último, seria importante fazer algumas ponderaçõessobre as dificuldades de comparação entre os Censos

Demográficos, em particular entre os três últimos (1980,1991 e 2000), em função da retirada do quesito referente à“ultima etapa” do indivíduo em nível municipal, no Censode 2000. Não seria possível, por exemplo, uma análise tem-poral que envolvesse o Censo de 1980. Afinal, ao contrá-rio do de 1991, aquele somente conta com a informação so-bre “última etapa” migratória, em nível municipal – e o de2000 somente apresenta o item “data fixa”.

Assim, uma forma de aproximação que vem sendo aceitapelos estudiosos do assunto10 seria o uso da “última eta-pa” combinada com o tempo de residência menor de 5 anos.Ou seja, tenta-se com isso delimitar também para o Censode 1980 um período temporal semelhante ao item “data fixa”coletado em 1991 e 2000 – muito embora se saiba que, pornão se tratar de um período exato de tempo, tal comparaçãofique teoricamente comprometida. Na verdade, ainda quedelimitado por um corte temporal, não é possível saber a queperíodo se refere o conjunto de migrantes de “última eta-pa”, uma vez que estes são enumerados segundo distintosmomentos de chegada (dado pelo tempo de residência).11

Análises sobre as Característicasda Migração

Como se observou, a periodicidade pode comprometero acompanhamento desse fenômeno tão dinâmico que é amigração. Além dela, várias outras limitações cercam osdados censitários – e talvez uma das mais importantes sejaseu caráter não-retrospectivo.

Assim, tirando algumas poucas exceções, como é o caso,por exemplo, do “município de residência anterior”, não secoleta informação sobre a vida passada do informante –sendo essa fonte praticamente uma “fotografia” da datareferencial censitária. Em termos de estudos migratórios,tal característica representa uma grande limitação, poisimpossibilita, por exemplo, qualificar os migrantes no mo-mento de suas mudanças. Nesse particular, algumas alter-nativas podem ser levantadas no sentido de resolver ou,no mínimo, de paliar tais problemas.

Do ponto de vista de algumas das variáveis demo-gráficas com claros significados analíticos para o estudoda migração, a idade, tipo de família, ciclo vital e estadocivil seriam passíveis de modificação com o tempo e/ou coma migração. Portanto, poderiam não refletir a situação nolocal de origem. A seguir, apresentam-se algumas suges-tões de manuseio desses dados:- (i) Idade: um procedimento bastante aceitável paratransformá-la em “idade ao momento da migração” seria

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subtrair seu valor do “tempo de residência no município”do indivíduo;12

- (ii) Tipo de Família: tendo como referencial o chefe dafamília, pode-se cotejar a “condição migratória” (origem domovimento e tempo de residência no destino) deste e dosoutros membros como forma de se obter pistas aproxima-das sobre a situação dessa família no momento da migra-ção (se já existia, se era tal como captada pelo Censo, etc.).Essa tentativa foi feita com relativo sucesso por Cunha,(1994), para analisar o processo de fragmentação e recom-posição das famílias de migrantes intrametropolitanos comorigem em outros Estados, e por Ribeiro (1997), para esti-mar os efeitos diretos e indiretos da migração de retorno.

- (iii) Ciclo Vital: tomando como um indicador aproxima-do dessa variável a idade média do casal,13 o mesmo pro-cedimento descrito em i poderia ser utilizado nesse caso;

- (iv) Estado Civil: assim como em ii, o estado civil dochefe da família poderia ser inferido a partir da compara-ção entre a sua condição migratória e a de seu cônjuge.14

Comentários semelhantes poderiam ser feitos para al-gumas características socioeconômicas:- (i) Educação: como lembra Martine (1980), para a popu-lação mais adulta, esta variável estaria muito menos afeta-da pelo tempo e pela mudança de residência – o que a tor-na uma escolha interessante para os estudos migratóriosque visem conhecer o perfil do migrante na origem domovimento;

- (ii) Ocupação: como se sabe, essa variável pode ser afe-tada pela simples mudança de quadro domiciliar (rural paraurbano ou vice-versa) ou de contextos socioeconômicos.Contudo, uma vez que a análise seja feita com cautela, deforma a tomar em conta as áreas de origem dos migrantes(por exemplo, se é urbano ou rural, se vem de uma áreaindustrial ou agrícola, se é originário de uma cidade peque-na, média ou grande, etc. ), podem ser obtidas algumas in-dicações sobre a situação ocupacional anterior do indiví-duo.

No Censo, também são captadas as informações ape-nas das pessoas “sobreviventes” (à mortalidade ou reemi-gração), o que equivale dizer que, para um determinadolocal, os dados com o quais se trabalha refletem apenas asituação daqueles que aí residiam no momento censitário,independentemente se lá estavam uma semana, ou mesmoum dia antes da data de referência.

Por esse motivo, as análises sobre seletividade,15 quecomparam, por exemplo, migrante versus não-migrante comrelação a tais variáveis, devem ser tomadas com cautela e

critério – sobretudo, porque, para os migrantes mais anti-gos, as características levantadas na data do Censo po-dem diferir daquelas vigentes na época do movimento.Nesse caso particular, parece não haver uma solução acei-tável; contudo, o problema poderia ser menor com relaçãoà análise de variáveis que pouco alterem com o tempo.16

A Questão da Migração de Retorno: suaInterpretação e Mensuração

Um dos fenômenos migratórios que mais chamaram aatenção nas análises dos dados dos Censos Demográficode 1991 e 2000 foi o crescimento sem precedente do volumeda migração de retorno, em particular para os Estados con-siderados tradicionalmente como “de emigração” (CUNHA;BAENINGER, 2005).

[...] o volume de migração de retorno incrementou-se

enormemente no país nos últimos 30 anos; na década de 90

houve incremento relativo da ordem de 221% em relação aos

volumes dessa migração comparado com a década de 70.

Este elevadíssimo incremento contribuiu para que o número

de pessoas retornadas a seus estados de nascimento passasse

de 1,1 milhão, nos anos 70, para quase 3,8 milhões, nos 90;

estes volumes indicam a importância que, nos anos mais

recentes, este tipo de mobilidade – sempre presente, porém

em menor intensidade – passou a adquirir no cenário das

migrações nacionais (CUNHA; BAENINGER, 2005).

Dessa forma, esse fenômeno surge como um tema impor-tante para se entender o processo migratório da década de80, momento em que, como se sabe, o país atravessou umagrande crise econômica, sobretudo no primeiro qüinqüênio.

Pode-se pensar que o retorno estaria condicionado aum fator de “sucesso” na região de destino, e que, portan-to, não necessariamente todos os que deixaram suas áreasde origem estariam propensos a voltar para lá. Na verdade,nos anos 80, a probabilidade de “sucesso” parece ter-sereduzido ainda mais, na medida em que as transformaçõesprodutivas ocorridas no Brasil e, em especial nos Estadosreceptores, como São Paulo, tornaram a incorporação domigrante no mercado de trabalho muito mais frágil que nasdécadas anteriores.17

Na verdade, a análise desse tipo de migração vai alémdos números e suscita algumas questões substantivassobre a interpretação dos dados: afinal, qual seria o signi-ficado de retornar ao Estado de nascimento?

Como mostra Ribeiro (1997), com esses dados é pos-sível definir vários tipos de retorno: para uma determina-

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da Região Geográfica, para o Estado e, finalmente, para omunicípio de nascimento. Restaria, contudo, saber quaisdessas modalidades, a princípio, puramente estatísticas,fariam sentido analítico e, mesmo assim, em que condi-ções.

Na verdade, haveria que se discutir conceitualmente oque seria e qual o significado da “migração de retorno”,tarefa ainda pouco enfrentada pelos demógrafos e estudio-sos de população.18

Pode-se dizer, por exemplo, que o retorno estaria carac-terizado apenas nos casos em que a migração se justifi-casse pelo “desejo” do indivíduo, ou das famílias, de re-cuperarem as raízes, a cultura ou, em termos mais genéricos,o “modo de vida” da área de origem?

Nesse sentido, parecem ser bastante promissoras asidéias de Domenach e Piconet (1990), que discutem a no-ção de espaço de vida ou residência-base e residênciaexterior,19 ao contrário da mudança pura e simples de re-sidência. Esse conceito, segundo os autores, permitiriadefinir diversos tipos de fluxos, superando a dicotomiautilizada até agora entre mudanças definitivas e desloca-mentos temporais, numa tentativa de explicar também astendências de reversibilidade desses deslocamentos.

Na verdade, a existência de uma residência-base pareceocorrer no caso do fluxo migratório de retorno, sobretudoaqueles envolvendo o Nordeste e Sudeste, pois os mi-grantes mudam-se para os grandes centros urbanos dopaís, mas, idealmente, desejam voltar e, culturalmente, pro-curam não se desligar de sua região de origem, tentandorecriar alguns desses eventos culturais originais.20

A partir da tipologia proposta por Domenach e Piconet(1990),21 pode-se, portanto, enquadrar os fluxos migrató-rios de retorno apenas como um momento final do proces-so tipificado pelos autores como “uma residência-base euma ou mais residências exteriores sucessivas antes doretorno”. Nesse caso, a primeira geração dos migrantesteria alta probabilidade de retorno, sendo que a geraçãonascida no lugar de destino teria menos chances deretornar, já que seriam socializados nos grandes centrosurbanos.

Assim, esses autores trabalham com a idéia do caráterde reversibilidade dos movimentos que é dado pela pré-orientação do objetivo do retorno, em certo tempo. Assim,além dos elementos puramente econômicos, a manutençãode uma solidariedade familiar e social, o investimento emterras ou bens imóveis na região de origem, e o apoio fi-nanceiro acidental aos que ficaram são medidas culturaisque organizam e fazem possível o retorno do migrante.

Em geral, ainda segundo os autores, a duração da“expatriação” marcaria um ciclo familiar completo. Duran-te esse ciclo, as relações com as famílias ou com a regiãode origem seriam mais ou menos freqüentes. O isolamentoseria dado pelo custo e as dificuldades de transporte. Asvisitas tenderiam a ser mais curtas e mais freqüentes – oque significa a debilitação da transmissão de valores cul-turais. A situação de retorno diria respeito, sobretudo, aomigrante – e muito menos a seus descendentes. Além dis-so, a maneira como os filhos se adaptariam na sociedadede destino influenciaria a eventual decisão de retorno dospais.

Como se nota, ao se conceituar o retorno da maneiraanteriormente apresentada, fica claro que os dadoscensitários não apenas seriam insuficientes para delimitaro fenômeno, mas poderiam ser utilizados apenas como umareferência, na medida em que nada garante que o que seestá medindo reflita o retorno real ou apenas uma parte doprocesso de “residências sucessivas no exterior”.22 Cer-tamente que, para uma resposta mais precisa, seriam ne-cessárias informações que somente poderiam ser captadaspor entrevistas em profundidade com os atores.

Portanto, é fundamental que exista uma preocupação emdar sentido aos dados sobre migração de retorno, comoforma de diferenciá-los dos demais deslocamentos popu-lacionais. Apenas para exemplificar, considere-se o casode retornados mineiros provenientes de São Paulo. Nessecaso, seria importante compreender e mostrar em que sen-tido o retorno daqueles nascidos no sul ou nordeste deMinas Gerais e que, no retorno, migraram para o TriânguloMineiro (ao Oeste) seriam distintos dos paulistas (ou ou-tra naturalidade) que fizeram o mesmo movimento. Faria al-gum sentido diferenciá-los?

Assim, algumas questões metodológicas poderiam sermencionadas no sentido de, a partir dos dados censitários,darem contornos mais claros para o fenômeno da migraçãode retorno. Em primeiro lugar, quanto à própria mensuração.Como mostra Ribeiro (1997), o volume estimado a partir dainformação censitária direta não corresponde à real dimen-são do fenômeno, na medida em que não considera seusefeitos indiretos, particularmente, aqueles relacionados aosfamiliares (não naturais) que o retornado “acumulou” du-rante o tempo que esteve fora de sua área natal.

Uma segunda questão refere-se a certas desagregaçõespossíveis para o fenômeno. Assim, a não ser no caso doretorno para o próprio município, que daria muito menosmargem para uma discussão sobre o seu significado, ou-tras formas de mensuração desse tipo de movimento, por

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JOSÉ MARCOS PINTO DA CUNHA

exemplo, em nível estadual, poderiam ser mais bem qualifi-cadas se algumas discriminações fossem feitas.

A possibilidade de cruzamentos das informações per-mite especificar melhor os movimentos. Assim, pode-seobservar, por exemplo, se a migração deu-se para a RegiãoMetropolitana – RM ou principal aglomeração urbana dorespectivo Estado, para uma área vizinha ao Estado deúltima residência, etc. – sendo que esses novos elementospermitiriam melhor balizar a reflexão sobre o caráter do“retorno” captado. Também a utilização do tempo deresidência seria um bom indicador para reconhecer aquelescujo retorno aparentemente já tivesse um caráter maisdefinitivo.

Sobre o Papel das Redes

Questão cada vez mais recorrente nas discussões eestudos sobre migração internacional (MASSEY, 1987;TILLY, 1990; BOYD, 1989) entre outros, o papel das redesfamiliares – ou, de maneira mais genérica, das redes sociaisno direcionamento, incremento e manutenção dos fluxosmigratórios – tem sido reconhecido como elemento impor-tante para o entendimento do processo migratório.

[...] the vast majority of potential long-distance migrants...

draw their chief information for migration decisions... from

members of their interpersonal networks, and rely on those

networks for assistance both in moving and in settling at the

destination. Their activity then reproduces and extends the

networks, specially to the extent that by migrating they acquire

the possibility and the obligation to supply information and

help to other potential migrants. Constrained by personal

networks, potential migrants fail to consider many

theoretically available destinations, and concentrate on those

few localities with which their place of origin has strong links

(TILLY, 1990, p. 84).

Na verdade, pode-se considerar que, no caso dos mo-vimentos migratórios internos, essa mesma importânciadeveria ser transferida. Afinal, não há razões para se su-por que esses deslocamentos se estruturariam de maneiramuito distinta. Talvez algumas das peculiaridades da mi-gração interna estivessem relacionadas ao fato de que,nesse caso, também movimentos de mais curta distânciaestivessem em jogo. Além disso – e talvez o que é maisimportante – as mudanças culturais, sobretudo com rela-ção ao idioma, assim como os riscos da migração, não se-riam fatores tão acentuados e possivelmente tão decisivospara a decisão de migrar.

Não obstante seu significado analítico, pelo que se sabe,no Brasil são escassos os estudos, em particular nos anosmais recentes, que recuperam essa dimensão sobre a mi-gração interna. Dessa forma, seria imprescindível que fos-sem empregados esforços no sentido de incorporar essaproblemática, sob pena de se deixar de entender parte sig-nificativa do processo migratório – o qual, via de regra, estáassociado a mudanças estruturais ou, sob outro enfoque,a diferenciais regionais em termos de oferta de empregos,salários, etc.

Para captar adequadamente esse mecanismo, seria ne-cessário promover pesquisas específicas que recuperas-sem as trajetórias migratórias das famílias ou indivíduos, apartir do levantamento de pontos como “contatos estabe-lecidos”, “informações previamente obtidas”, “formas deinserção em termos de moradia”, e “existência de parentesou amigos no destino”, etc. – o que nem sempre é simples.

Assim, quase sempre, a utilização de dados censitáriosacaba sendo a única possibilidade concreta – o que talvezexplique a pouca atenção que tem sido dada a essa ques-tão. Talvez, e com razão, a falta de estudos nessa linha sejao reflexo das poucas alternativas visualizadas nos censospara enfrentar esse tema tão intrincado com um mínimo deprecisão.

Na verdade, explicitamente, o Censo Demográfico nãocontempla quesito algum que permita captar diretamentealgum aspecto relativo às redes migratórias.

Contudo, mesmo correndo o risco de estar cometendoalguma heresia metodológica, acredita-se que, mesmo deforma muito indireta, a questão das redes poderia ser tra-tada a partir dos dados censitários. Com alguma cria-tividade e, principalmente, cautela e critério, sempre sepodem extrair do Censo Demográfico pistas sobre váriostemas e, nesse caso, não poderia ser diferente.

Nesse sentido, a análise da composição das famílias (oudomicílios)23 nas áreas de destino dos migrantes, poderiaser pensada como uma forma de detectar indícios sobre aoperação das redes no processo migratório. Nesse caso,seria necessário referenciar a análise apenas aos migranteschefes de famílias já que, dada a estrutura das informaçõescensitárias, somente seria possível recompor a formaçãodo grupo doméstico a partir da relação de parentesco comesse indivíduo.

Seria o caso, pois, de recuperar a composição das famí-lias em termos de seus componentes, visando obter algu-ma indicação das redes a partir da existência de outrosmembros que não estritamente do núcleo familiar, tais como,parentes, agregados, etc. Além disso, seria também possí-

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vel avaliar a composição do domicílio com relação à exis-tência, ou não, de famílias conviventes, fato que, compro-vada a condição migratória de uma ou de todas elas, seriauma evidência a mais para amparar a análise.

Contudo, somente isso não seria suficiente. Na verda-de, de nada valeria identificar, por exemplo, “famílias es-tendidas” sem que se tivesse alguma indicação de que asmesmas tenham se formado a partir do estabelecimento dasredes requeridas para uma primeira acomodação nas áreasde destino.

Assim, seriam necessários outros procedimentos adi-cionais para cercar ainda mais a questão. Cotejar a con-dição migratória (origem e, sobretudo, tempo de residên-cia) do chefe da família com os parentes e agregados, porexemplo, seria uma forma interessante de reconhecer emque medida o grupo doméstico migrou com a formaçãodetectada pelo Censo (ao menos das pessoas nativas daárea de destino), ou foi-se formando aos poucos. De cer-to modo, esse fato configuraria a existência das redes –principalmente quando a origem fosse a mesma. É inte-ressante notar que essa metodologia poderia até mesmoser utilizada para captar tendências à fragmentação e re-composição da família em função da migração (CUNHA,1994).

Claro está que essas sugestões padecem de várias limi-tações para abordarem a questão das redes, dentre as quaisdestaca-se:- como as informações dizem respeito às famílias referidasno momento do Censo, nada se pode saber das trajetóriasdas mesmas antes de terem sido recenseadas – o que podesignificar, para muitas delas, a não-recuperação da açãodas redes no momento de suas chegadas. Assim, os da-dos obtidos indicariam apenas uma parcela de indivíduosou famílias que se valeram desse expediente em suas che-gadas ao destino;

- nada poderá ser dito com relação à outra “ponta” doprocesso, ou seja, as áreas de origem, já que todas as rela-ções familiares ou sociais somente poderiam ser captadasno local de destino. Assim, ficaria prejudicada, por exem-plo, toda e qualquer análise que pretendesse resgatar oslaços (familiares, por exemplo) existentes antes da migra-ção – e que perdurariam mesmo após a mudança comoelementos que poderiam motivar fenômenos como a“circularidade” e o retorno futuro;

- finalmente, pela natureza da informação censitária, váriasoutras questões relativas às redes sequer poderiam sertangenciadas, tal como seu papel no processo de adapta-ção e socialização do migrante.

Sobre a Migração Rural-Urbana

A questão da migração rural-urbana ocupou por muitotempo a agenda migratória nacional, sobretudo nos anos70. Como lembra Martine (1990), a partir de meados dos anos60, iniciou-se uma progressiva e sem precedentes desrura-lização e concentração urbana derivadas de transformaçõesradicais no campo. A tecnificação, os mecanismos de cré-dito adotados, a especulação e concentração fundiáriarestringiram de forma impiedosa o acesso à terra pelospequenos produtores e reduziram a demanda por mão-de-obra, gerando um grande êxodo rural.

Segundo Martine e Camargo (1984), nos anos 60 e 70,o país registrou uma perda de população rural sem prece-dentes em sua história. Segundo os autores, no primeiroperíodo cerca de 13,5 milhões de pessoas deixaram o cam-po – volume que aumentou para 15,6 milhões nos anos70. Além disso, nas décadas de 70/80, o Brasil, pela pri-meira vez, registrou uma diminuição absoluta de sua po-pulação rural.

Na verdade, a migração a partir das áreas rurais em dire-ção às urbanas perdeu significativamente sua intensida-de, uma vez que o Censo de 1991 já mostrava que poucomais de 18% dos indivíduos que mudaram de município nadécada de 80 fizeram esse tipo de movimento.

Em contrapartida, os dados mostram que, no mesmoperíodo, parte cada vez mais significativa da migração inter-municipal tinha origem e destino urbano. Assim, a partirdesses dados, pode-se dizer que o êxodo rural já teria so-frido importante arrefecimento e, portanto, que a proble-mática migratória ou, de forma mais geral, da dinâmicasocioeconômica e demográfica estariam cada vez mais cir-cunscritas ao contexto das cidades.

Considerando, contudo, a natureza dos dados censi-tários utilizados para a obtenção dessas estimativas e,principalmente, as novas formas de relações que têm sidoobservadas entre campo e cidade, algumas questões seriamfundamentais para uma utilização mais apropriada dainformação:- a informação sobre a última residência: uma vez que oCenso pergunta sobre a situação da última residência doindivíduo, é muito provável que, dada a incidência de múl-tiplos deslocamentos, a migração tipo rural-urbano, porexemplo, seja subestimada. Isso pode ser explicado por umatendência dos migrantes de buscarem centros urbanosmenores antes de se dirigirem para as áreas de destino,onde terão mais tempo de permanência ou fixarão suasresidências com um caráter mais definitivo24 ;

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- a informação sobre “data fixa”: no caso do Censo de2000, os movimentos rurais-urbanos são captados a par-tir da informação sobre a residência cinco anos antes.Nesse caso, portanto, o problema mencionado tenderia aser atenuado, muito embora tampouco são captados aque-les que mudaram a situação do domicílio há mais de cin-co anos;

- o problema da classificação das áreas: se essa ques-tão – que se refere a um procedimento administrativo atri-buído ao município – não for devidamente considerada,pode causar transtornos interpretativos. Afinal, a chama-da “reclassificação”, ou seja, a transformação da condiçãode áreas rurais em urbanas, via de regra, leva a avaliaçõesincorretas sobre a evolução da população segundo a situa-ção de domicílio. Acredita-se que, muito provavelmente,para algumas regiões do país, parte dos movimentos mi-gratórios do tipo urbano-rural possa ser, por exemplo, sim-plesmente uma migração para áreas que de fato seriam ur-banas e que, no momento do Censo, ainda não tinham sidoreclassificadas como tal.

Portanto, é importante levar em conta que os dadoscensitários sobre situação de domicílio anterior e atual (ouem uma data fixa no passado) parecem ter, hoje em dia,menor significado analítico quando analisados isoladamen-te. Por isso, para passarem a ganhar nova força inter-pretativa, tais movimentos deveriam ser avaliados à luz dasrealidades, em termos da articulação entre os espaços, dosmercados de trabalho, etc.

As reflexões apresentadas a seguir poderão sugerir al-gumas das dificuldades que podem ocorrer – não apenaspara entender os fluxos migratórios entre situação de do-micílio, mas também a complexidade para se analisar o pro-cesso brasileiro de urbanização.

URBANO E RURAL NO BRASIL: ASDIFICULDADES DE SUA DELIMITAÇÃO

A análise de uma realidade tão complexa como é aurbanização nos tempos de globalização e reestruturaçãoprodutiva (e particularmente em um país com a extensão ediversidade territorial do Brasil) sempre esbarra em dificul-dades metodológicas – em especial aquelas relacionadasàs características das informações utilizadas.

Além disso, com as novas relações que têm sido obser-vadas mais recentemente entre campo e cidade, acredita-se que a questão dos deslocamentos campo-cidade, ouvice-versa, passou a ganhar novos contornos, tanto em

termos de seus significados, quanto dos volumes e inten-sidades envolvidos.

Discutindo as dificuldades teórico-metodológicas parao estudo da urbanização no Brasil no período da industria-lização, Faria (1978, p. 100) já considerava que a diversifi-cação e ampliação da divisão social do trabalho que sedelineava no país impunham-se

para o conjunto da economia e da sociedade, refazendo ou

desfazendo as diferenças genéricas entre o campo e a cidade,

unificando os mercados de trabalho urbano e rural.

Da mesma forma, Silva (1997) enfatizava a dificuldadecrescente de se delimitar o que é rural e o que é urbano noBrasil, e que “o rural hoje só pode ser entendido como umcontinuum do urbano, do ponto de vista espacial”, posi-ção também defendida por Champion e Hugo (2003). Se-gundo Silva (1997, p. 43)

do ponto de vista da organização da atividade econômica,

as cidades não podem mais ser identificadas apenas com a

atividade industrial, nem os campos com a agricultura e a

pecuária.

Preocupada com o significado do recorte urbano/ruralpara o entendimento do processo de urbanização, Patarra(2000, p. 34) alerta para os problemas metodológicos deri-vados das definições censitárias:

de um lado, são definições montadas a partir da visão

dicotômica da realidade social, entre o rural e o urbano [...];

em segundo lugar, por tratar-se de definições ancoradas em

critérios administrativos e definidas no nível local de poder,

suscitando, muito facilmente, injunções políticas.

A mesma autora, citando o trabalho de Abramovay (1999,p. 39), reconhece que, no Brasil,

a dicotomia rural-urbana [...] é rompida [...] durante os anos

60, pela noção de continuum rural-urbano, significando a

não existência de diferenças fundamentais nos modos de vida,

na organização social e na cultura, determinadas por sua

vinculação espacial.

Em outra linha de argumento, Veiga (2002) sustenta queo rural brasileiro é muito maior do que o apontado pelosdados do IBGE. De fato, para o autor, esta superestimaçãodo volume de população urbana no Brasil deve-se ao fatode que a definição de urbano vigente no Brasil – que é amesma desde 1938, com apenas algumas modificações –

transformou em cidades todas as sedes municipais existentes,

independentemente de suas características estruturais e

funcionais.

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Com isso, ainda segundo o autor, “foram consideradasurbanas todas essas sedes, mesmo que não passassem deínfimos vilarejos ou povoados” (VEIGA, 2002, p. 3), fatoque levaria a um inchamento do setor urbano e, com isso,a profundas distorções da rede urbana brasileira.

Em termos empíricos, umas das primeiras dificuldadesadvêm das bases conceituais a partir das quais os dadossão levantados. De fato, o problema do analista já se apre-senta pelo fato de que a definição das categorias “urba-no” e “rural” são prerrogativas dos municípios. Por essemotivo, podem não apenas variar de uma região para ou-tra, como também depender de injunções e interesses que,como se sabe, nem sempre obedecem a uma lógica racio-nal ou funcional.

Egler (2001, p. 11) enfatiza

a fragilidade do conceito político-administrativo de população

urbana adotado para fins estatísticos no Brasil, que faz com

que assentamentos humanos de pouco mais de 100 habitantes

sejam considerados como cidades, independente das funções

que desempenhem ou dos serviços coletivos que disponham.

Essa opinião é compartilhada por Veiga (2002), que éainda mais incisivo em sua crítica ao caráter “normativo”da definição do rural e urbano.

Embora sem ainda avançar significativamente no senti-do de captar aspectos importantes da divisão social dotrabalho, do consumo coletivo, da acessibilidade,25 do estilode vida, etc. (PATARRA, 2000), as novas categorias uti-lizadas pelo IBGE a partir do Censo de 1991 permitiram, pelaprimeira vez, uma maior desagregação da informação, pos-sibilitando que a análise dos dados pudesse ir mais alémda simplificada dicotomia rural-urbano.

Essas categorias representam basicamente um “gradien-te” entre a grande área urbanizada e o rural isolado e, por-tanto, mesmo ainda limitado – já que mantém a distinçãonormativa de urbano e rural e as fronteiras “infra-munici-pais” (VEIGA, 2002) –, permite uma melhor apreensão daheterogeneidade espacial existente, representando, portan-to, um grande avanço.26

A verdade é que, em um país de tanta diversidade, umadefinição mais consistente e possível de ser comparada seriamuito importante. Mesmo critérios usados por outros paí-ses como, por exemplo, o tamanho de localidade, sua den-sidade demográfica, etc. (CHAMPION; HUGO, 2003) po-deriam ser problemáticos no caso do Brasil, tendo em vistaque os significados desses indicadores certamente seriamdistintos, dependo do contexto regional em que são men-surados. Vários autores (SAWYER, 1986; EGLER, 2001;

VEIGA, 2002) concordam que, se por um lado o volume edensidade populacional são importantes para a configu-ração do urbano, também questões funcionais desempe-nhariam papel fundamental para chegar-se a tal definição.

Por exemplo, tanto Sawyer quanto Veiga defendem o usode um critério funcional para a definição de “urbano” e“rural”. No entanto, esse último ainda advoga a necessi-dade de se considerar um tamanho mínimo de cidade e den-sidade. Por sua vez, Sawyer tem uma visão um pouco dis-tinta de Veiga com relação à necessidade de se estabelecerum patamar de tamanho e densidade já que, segundo ele,

ao adotar critérios de tamanho...deve-se levar em conta que

nas condições de fronteira, com grande distância, alguns

núcleos pequenos em termos populacionais podem exercer

funções urbanas importantes ao nível local (SAWYER, 1986,

p. 43).

Como se nota, sequer nos critérios demográficos existeum consenso.

É sabido que há grandes diferenças entre as zonasgeográficas brasileiras – tanto em termos de seus ecos-sistemas (que variam da floresta amazônica – no Norte –ao pampa gaúcho – no Sul – passando por áreas semi-ári-das – no Nordeste – e de cerrado – no Centro-Oeste), quan-to em termos de seus processos de ocupação econômica edemográfica, sem contar a dimensão cultural. Assim, énatural que em todo o país, o rural também seja diferen-ciado regionalmente, como locus de um modo de vida e deprodução peculiares.

Assim, pode-se considerar, por um lado, “o modernorural paulista” e, por outro, o remoto e às vezes inóspitorural do Estado do Mato Grosso, particularmente na suaporção norte.

O primeiro é praticamente “desabitado”, particulamentena sua porção norte, ocupada por grandes propriedadesde cana-de-açúcar ou de laranja integradas tecnológica efuncionalmente a complexos agroindustriais. É um espaçodotado de total acessibilidade aos centros e mercados ur-banos, onde a figura do pequeno agricultor – e, por con-seguinte, das pequenas propriedades – foi praticamentesubstituída pelo típico “trabalhador rural urbanizado”: o“bóia-fria”. Nesse caso, além da população dita “rural” terínfimo peso relativo, parte dela está claramente ligada aatividades urbanas ou tem relações bem definidas com acidade.

Já em Mato Grosso, cerca de 21% da população aindaviviam em áreas rurais em 2000. Embora também com a pre-dominância de grandes propriedades dedicadas ao gado

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ou à agricultura temporária (soja, milho e algodão), a den-sidade demográfica é muito baixa, o grau de acessibilidadeé pequeno (quando não quase inexistente), as distânciase dificuldades de inter-relação com os centros urbanos sãomuito maiores. Nesse caso, a figura do agricultor familiarainda aparece como um caso típico do “ser rural”. Afinal,o campo é o lugar onde ele vive e de onde retira sua sobre-vivência e, quando possível, seus excedentes. Contudo,as relações com o “urbano imediato” existem – sob a for-ma de trabalhos e permanências temporárias daqueles quenecessitam obter algum tipo de ganho financeiro – mesmoque sejam mais difíceis, em função das distâncias a per-correr e, sobretudo da precariedade das estradas.27

Outra situação encontra-se nas terras áreas semi-áridasdo Nordeste brasileiro, onde as constantes secas, a máqualidade do solo e outros fatores transformaram o espa-ço rural num verdadeiro “celeiro” de migrantes em poten-cial que devem a todo instante decidir entre permanecerna miséria total, ou tentar a sorte nas zonas urbanas, emgeral localizadas no Sudeste do país ou nas capitais dospróprios Estados.28

Assim, acredita-se que tanto o tamanho quanto a den-sidade têm significados bem distintos, dependendo daregião do Brasil da qual se trate. Nesses termos, é um gran-de desafio para os estudiosos buscar o melhor critério declassificação.

Observando esse tema pelo mundo, em um semináriorecentemente realizado,29 ficaram claras algumas questõesbásicas:- a necessidade de se repensar a “ruralidade” e seu signi-ficado no sistema de assentamentos humanos;

- a diversidade de formas de apreensão do que seria “ur-bano” e “rural”;

- como corolário do anterior, a dificuldade de se analisaro processo de “urbanização” de forma comparativa entreos diversos países.

Além dos critérios de “tamanho” e “densidade”, que sãomuito utilizados em países como a Indonésia, por exemplo,há outros bem mais complexos, que envolvem não apenasquestões como infra-estrutura e facilidades urbanas, mastambém composição da força de trabalho.

Pelo menos no caso do Brasil, acredita-se que as con-fusões ou imprecisões sobre a configuração do urbano edo rural levam a pelo menos duas problemáticas distintas:A primeira está relacionada à nova realidade das relaçõesentre urbano e rural, como resultado das transformaçõeseconômicas, das mudanças na estrutura de preferências

pessoais ou familiares, das novas formas de uso e ocupa-ção do solo, etc. Tal realidade tem sido claramenteescamoteada pelo uso da ultrapassada dicotomia urbano-rural.

Pensada do ponto de vista do processo de metropo-litanização, a questão do rural e do urbano reveste-se deum significado ainda mais interessante. Ao reconheceremque a distinção da população urbana e rural tem-se torna-do cada vez mais nebulosa, Champion e Hugo (2003, p.11)alertam para as dificuldades de determinar os limites(boundaries) desses assentamentos, entre outros motivos,porque, segundo eles:

people are moving about more and dividing their lives between

areas conventionally designated urban and rural, to a large

extent on a daily basis but also in terms of weekly or seasonal

movements [...] The result is the emergence of zones of

transition around large urban centers where urban and rural

functions are mixed together.

De fato, no caso do Brasil, tais “áreas de transição” entreo meio rural e urbano são percebidas com muita clareza nocontexto das grandes aglomerações urbanas. Isso ocorreem particular nas áreas metropolitanas, em função do cres-cimento de áreas cada vez mais distantes do centro princi-pal e pela intensificação dos deslocamentos populacionaisno sentido urbano-rural – ou seja, na direção inversa dosque são tradicionalmente estudados no Brasil.

Como se percebe pelos dados obtidos das PNADs dosanos 90,30 o crescimento demográfico da área rural de vá-rias regiões metropolitanas brasileiras foi bastante signifi-cativo, superando, na maioria dos casos, o crescimento dopróprio setor urbano – o que contradiz o “padrão urbano”de crescimento das grandes aglomerações.

Assim, é importante notar que, em muitas áreas do país,o crescimento da população rural é, em boa medida, umfenômeno intimamente ligado à expansão urbana. De fato,dados analisados em outro estudo (CUNHA, 2004) mos-tram que a categoria censitária “aglomerado rural de exten-são urbana” apresentou um incremento relativo em prati-camente todas as áreas metropolitanas brasileiras entre1991 e 1996. No entanto, em função da informação censitáriadisponível, esse processo de expansão urbana acaba sen-do escamoteado, como se pôde mostrar em maior detalhepara o Estado de São Paulo (CUNHA; RODRIGUES, 2001).

Ainda nesse caso, percebe-se a importância que osmovimentos do tipo “urbano-rural” tenderiam a adquirir,segundo a classificação do Censo Demográfico. Não sepode negar que, embora ainda sejam numericamente pou-

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co expressivos, esses movimentos representam, como pro-cesso social, um elemento importante para o entendimentodas dinâmicas das metrópoles – já que envolvem pessoasdos variados estratos sociais, cada qual com motivaçõesdistintas.

A segunda questão, que não necessariamente contra-diz a primeira, refere-se ao sobredimensionamento do ur-bano brasileiro. Mesmo discordando de certos aspectos(em particular no que se refere à menor importância dadaao critério funcional), não podemos deixar de consideraros argumentos de Veiga (2001) sobre a subestimação do“rural real” – que pode ser constatada ainda hoje – e suasconseqüências sobre as políticas de desenvolvimento ru-ral para o país.

Apenas para recordar, listamos alguns de seus argumen-tos sobre o que Veiga chama de “ficção estatística” sobreo tamanho do urbano. A partir de uma quantificação “al-ternativa” do rural (baseada em tamanho e densidade, ouseja, observando-se aspectos como rarefação demográfica)o autor afirma que, além de uma normatização caduca queleva em conta o caráter administrativo, é confundido tam-bém o setor primário da economia com o “lado rural do ter-ritório”.

Segundo Veiga, pode-se observar claramente que es-sas duas questões distanciam-se cada vez mais, já que jus-tamente as áreas mais especializadas (como as que produ-zem commodities) são exatamente as menos dinâmicas –

tanto em termos demográficos, como em termos de diver-sificação e oportunidades para a população. Para ele – enisso seu argumento concorda com o de Silva (1999) –, oterciário também “invadiu” o mundo rural, e o que se ob-serva cada vez mais é a pluriatividade e o caráter multis-setorial da composição de renda dos agricultores. De fato,pode-se constatar que boa parte da população “urbana”no interior do Brasil também está ligada, pelo menos emparte, a atividades rurais.

Mesmo considerando as dificuldades anteriores, é pos-sível pensar em novos dados ou metodologias que melho-rassem a apreensão da realidade urbana em um país comoo Brasil. Nesse sentido, considera-se fundamental que fon-tes como os Censos Demográficos avancem na apreensãodas novas formas de inserção produtiva ou outras ativi-dades corriqueiras do indivíduo (sociais, educacionais, deconsumo, etc.), que reflitam a interação entre os setoresurbano e rural, ou entre áreas integradas.

Se, como já se observou, por um lado, os dados levan-tados pelo IBGE a partir do Censo Demográfico 1991 abri-ram possibilidades de análise que ultrapassaram a dicotomiapura e simples de “rural” e “urbano”, por outro, o enges-samento a limites predeterminados pela legislação brasi-leira ainda os torna muito vulneráveis.

Por onde avançar, então? Pode-se pensar em dados quepermitissem um conhecimento a respeito do tipo de ativi-dades desenvolvidas pelos indivíduos, assim como o lo-

TABELA 1

Taxas de Crescimento Médio Anual da População Rural e Urbana, segundo Unidades da Federação Selecionadas

Brasil – 1992/99

Em porcentagem

Unidade daTaxas de Crescimento Médio Anual

Federação Região Metropolitana Resto do Estado

Urbano Rural Total Urbano Rural Total

Ceará 2,25 0,50 2,20 2,56 -0,50 0,86

Pernambuco 1,00 2,17 1,07 1,25 -0,88 0,44

Bahia 1,37 5,01 1,48 1,39 0,39 0,90

Minas Gerais 1,57 6,99 2,01 1,39 -0,30 0,91

Rio de Janeiro 0,77 -0,09 0,76 1,51 1,27 1,47

São Paulo 1,41 1,57 1,42 1,66 1,86 1,69

Paraná 2,92 9,68 3,35 2,03 -2,58 0,71

Rio Grande do Sul 1,05 4,33 1,19 1,80 -0,84 0,99

Brasília 2,13 9,84 2,67 – – –

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 1992 e 1999 (tabulação especial – Nepo/Unicamp).

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cal onde acontecem e o tempo dedicado a cada uma delas,por exemplo. Além disso, seria desejável obter informaçõessobre os locais de consumo e/ou satisfação de necessida-des básicas,31 assim como dados espacialmente mais de-sagregados sobre “mudanças residenciais” e “mobilidadependular”. Afinal, esses últimos elementos são fundamen-tais para uma análise demográfica mais precisa das rela-ções “urbano-rurais”, particularmente nas grandes aglo-merações urbanas.

Com o desenvolvimento dos Sistemas de InformaçãoGeográfica e da diversificação dos dados espaciais (ima-gens de satélites, fotos aéreas, mapeamento via GPS, etc.),pode-se pensar em importantes avanços analíticos. Seriapossível imaginar uma situação em que os dados coletadosem nível domiciliar pudessem ser associados a uma basecartográfica com atributos físicos que completassem acaracterização dos espaços, de modo que fosse obtida umamelhor classificação dos mesmos (como tipo de uso e ocu-pação do solo, relevo, localização, etc). Combinando in-formações de distintas naturezas, seria possível chegar auma melhor configuração dos assentamentos humanos e,quem sabe, ir muito além da velha dicotomia rural/urbanoe da visão da expansão urbana a partir do uso das“engessadas” divisões administrativas municipais.32

CONCLUSÃO

O objetivo deste trabalho é apresentar reflexões sobrealgumas das questões e dificuldades que advêm do estu-do da migração e urbanização no Brasil. Embora com umapreocupação metodológica claramente voltada para a uti-lização mais intensa e cuidadosa dos dados secundários –em particular dos Censos Demográficos – também foramresgatadas várias discussões de cunho teórico que cer-cam as duas temáticas.

Nesse sentido, no que tange à migração, tentou-se sen-sibilizar o leitor para as várias possibilidades que se abremquando se faz um uso criativo e menos convencional dosvários quesitos censitários, sobretudo a partir da combi-nação deles.

Na verdade, embora com clara preocupação de mostraras limitações dessas fontes, tratou-se de advogar em favordo uso mais intenso das mesmas e alertar para o seu grandepotencial que, muitas vezes não é reconhecido, seja pelapouca familiaridade, seja pela dificuldade de acessos a essesdados.

Procurou-se abordar o que se consideram alguns dostemas mais candentes na atual agenda dos estudos migra-

tórios, tentando dar-lhes um tratamento que permitisse nãoapenas contextualizar as questões, mas também, e princi-palmente, mostrar como estas poderiam ser exploradas,mesmo que tangencialmente, a partir do uso dos dadoscensitários.

No caso da urbanização, embora a temática sugira umaenorme amplitude de temas, o foco também foi dado aoselementos mais operacionais relativos à mensuração ou aodimensionamento da população urbana e rural. No entan-to, isso não seria possível sem um esforço de resgatar, aomenos em parte, o debate que se instalou em torno do sig-nificado e delimitação do “rural” e do “urbano” brasileiro.

Além de apresentar a preocupação de vários autoressobre o tema e, em particular, a falta de um consenso sobreo assunto, buscou-se mostrar como os dados disponíveispoderiam ser usados para uma melhor compreensão dasnovas e complexas relações que vêm sendo estabelecidasentre o campo e a cidade.

O leitor, sobretudo o especialista, terá notado que essetrabalho não teve a pretensão de esgotar qualquer tipo dediscussão sobre os temas migratórios – muito menos so-bre a urbanização – tendo em conta a amplitude das ques-tões que esses fenômenos suscitam. Por exemplo, muitopouco se tratou da relação entre eles – tema que certamen-te daria material para um outro texto.

De qualquer forma, o que se espera é que este artigotenha propiciado uma reflexão sobre algumas das dificul-dades impostas para o estudo dos fenômenos considera-dos, além de certos caminhos metodológicos e de análiseque poderão contribuir para um melhor conhecimento des-sas questões.

No entanto, mais que isso, espera-se que esta contri-buição sirva para instigar outros estudiosos na busca deproposições analíticas alternativas, de novas (ou comple-mentares) investigações e, particularmente, para alertaros “produtores de informação” para as necessidades dedados que melhor espelhem as novas realidades da dinâ-mica sóciodemográfica do país. Não há dúvida de quedois fenômenos tão multifacetados e complexos como amigração e a urbanização demandam (e merecem) maio-res investimentos, tanto em pesquisas quanto em novasinformações.

Por último, é sempre bom lembrar que os Censos, assimcomo as PNADs, são fontes cada vez mais acessíveis etalvez as únicas com as quais muitos de nós poderemoscontar ao longo de nossas vidas profissionais. Cabe a nós,portanto, “usar e abusar” dessas fontes – mas sempre commuito critério.

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NOTAS

1. No caso da migração, destacam-se os trabalhos publicados nosAnais do Encontro Nacional sobre Migração, ocorrido em 1997 e2003. Já para a urbanização, apenas para citar um estudo recente eque já se tornou um clássico, pode-se mencionar a análise da RedeUrbana Brasileira desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Econô-mica Aplicada – IPEA, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatís-tica – IBGE e Núcleo de Economia Social, Urbana e Regional –NESUR (1999).

2. De fato, nas projeções mais recentes, o IBGE já incorpora emseus cálculos estimativas da migração internacional. Para maioresdetalhes sobre as tendências de migração internacional no Brasil,ver, por exemplo, Patarra e Baeninger (1995).

3. Embora com dados similares e comparáveis aos CensosDemográficos, um dos problemas dessa fonte é que sua re-presentatividade é restrita às Unidades de Federação e RegiõesMetropolitanas, o que faz que os dados sobre migração levantadoscontenham informações apenas sobre os movimentos interesta-duais, deixando de contemplar, por exemplo, os deslocamentosintermunicipais que, como se sabe, estão ganhando cada vez maissignificado numérico e analítico. De qualquer maneira, embora agrande ênfase do texto seja nos Censos Demográficos, a maior partedos comentários aqui realizados poderão ser considerados tambémquando do uso dessa fonte.

4. Este texto, originalmente escrito para refletir sobre os CensosDemográficos, foi adaptado também para o caso da Pesquisa Nacio-nal por Amostras Domiciliares – PNAD e encontra-se em Cunha(2002).

5. As informações são as seguintes: 1. Nacionalidade; 2. Condiçãode Naturalidade (natural ou não-natural do município de residên-cia); 3. Migração intramunicipal (situação do domicílio anterior –rural ou urbano – dentro do município de residência atual); 4. Situa-ção do domicílio (rural ou urbano) no município de residência an-terior; 5. Tempo de residência na Unidade de Federação; 6. Tempode residência no município; 7. Município de residência anterior.Apesar de comparáveis, apenas dois quesitos diferenciam os Cen-sos de 1980 e de 1991: enquanto o primeiro apresenta informaçãoacerca do “município de trabalho ou estudo”, no segundo esse que-sito foi retirado, mas acrescentou-se informação sobre o “municí-pio de residência em 1986”. No caso do Censo Demográfico 2000,praticamente as mesmas informações se repetem. Contudo, ape-sar da manutenção do quesito sobre “UF de residência anterior” omesmo não ocorreu com o “município de residência anterior”,estando presente apenas a informação sobre “município de resi-dência em 1995”. Este mesmo ano (1995) também foi utilizadopara captar a situação domiciliar prévia à residência onde o indiví-duo foi recenseado.

6. Há que se considerar que o município de residência anterior, porexemplo, pode ser, inclusive, um ponto “espúrio” na, às vezes,complexa história dos migrantes.

7. Aqui vale uma referência especial ao mentor da solução, o pro-fessor José Alberto Magno de Carvalho do Cedeplar/UFMG.

8. Método proposto por Everet Lee, cujos detalhes podem serencontrados em Shryock e Siegel (1976).

9. Para que se tenha uma idéia, para o Censo Demográfico 1991, ovolume de migrantes intrametropolitanos na Região Metropolita-na de Campinas – RMC, com menos de cinco anos de residênciacaptados pela “última residência”, é cerca de 26% maior que amesma cifra captada pela “data fixa” (65,6 mil contra 51,9 mil).Tal diferença deve-se não apenas à característica de cada uma dasinformações, mas também em parte porque, no segundo caso, nãosão computados os menores de 5 anos de idade que, obviamente,não haviam nascido cinco anos antes do levantamento censitário.

10. Ver por exemplo o trabalho de Brito (2004).

11. Como já foi explicitado na nota 9, o número de migrantes es-timado pelos itens “data fixa” e “última residência” para um perío-do de cinco anos serão distintos, mesmo que delimitado por ummesmo lapso de tempo. Isso porque, além de computar criançasmenores de 5 anos de idade, a primeira informação captura movi-mentos de pessoas ocorrido nos cinco anos considerados – o quenão é feito pelo item “data fixa”.

12. Obviamente esta aproximação seria adequada apenas para osmigrantes com tempo de residência menor ou igual a cinco anos, jáque apenas para essas durações tem-se a informação desagregadapor anos simples. Mesmo assim, no caso do Censo Demográfico2000, tal operação somente seria possível para a migração inte-restadual, uma vez que nesse levantamento não mais se coleta ainformação sobre “tempo de residência no município”.

13. Na verdade, esta é apenas uma das formas possíveis de aproxi-mação do ciclo vital da família, já que outras poderiam ser sugeridasutilizando não apenas a idade dos cônjuges, mas também a idade enúmero de filhos, etc.

14. Se o cônjuge tiver a mesma origem e tempo de residência dochefe, pode-se supor que aquele tenha migrado com este. Contudo,não se tem a garantia de que isso seja verdadeiro, sem contar que,para chefes viúvos ou separados, é impossível saber o estado civilanterior.

15. A noção de seletividade nos estudos migratórios tem sempreuma conotação comparativa: um grupo é seletivo com relação aoutros de referência; portanto, não se trata de um conceito abso-luto.

16. O mesmo deve ser dito com relação às comparações entremigrantes com distintos tempos de residência. Em geral, as dife-renças encontradas entre os recém-chegados e os mais antigos –que, a princípio, podem ser atribuídas ao que se consagrou chamarde processo de adaptação – na verdade parecem refletir outro pro-cesso que diz respeito à “sobrevivência” dos migrantes, não ape-nas com relação à morte, mas sobretudo à reemigracão, que costu-ma ser importante. Maiores detalhes sobre esse tema podem serencontrados em Martine (1980).

17. Para uma reflexão mais aprofundada, ver Cunha e Baeninger(2005).

18. Vale a pena mencionar alguns estudos conhecidos sobre o tema,como os de Scott (1995), Rigamonte (1997) e Amaral e Nogueira(1993).

19. Residência-base seria o lugar, ou o conjunto de lugares, a par-tir do qual os deslocamentos têm uma determinada probabilidadede retorno mais elevado, qualquer que seja a duração da estadia emoutro lugar. O migrante em sua residência exterior teria como re-ferência a sua residência-base, matriz de seu universo cultural,incluindo a maneira de organizar sua família, valores morais e re-ligiosos, entre outros.

20. A aplicação desse esquema analítico foi feita em artigo com-parando dois grupos distintos de migrantes: os nordestinos e ossulistas. Para maiores detalhes, ver Cunha e Azevedo (2001).

21. Domenach e Piconet (1990) propõem uma tipologia dos deslo-camentos, segundo a probabilidade de reversibilidade, com as seguin-tes categorias: a) uma residência-base sede dos deslocamentos tem-porários; b) uma residência-base e uma ou mais residências exterio-res sucessivas antes do retorno; c) residências-bases sucessivas.

22. Alguns especialistas, entre eles o próprio autor desse texto,têm debatido a idéia de circularidade para conceituar os movimen-tos de idas e vindas que ocorrem, principalmente, entre o Nordestee Sudeste.

23. Tendo em vista o reconhecimento da importância das famílias(ou unidades domésticas, para ser mais preciso) no processo mi-

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gratório, acredita-se ser mais recomendável usar essa unidade deanálise e não o domicílio que, como se sabe, pode abrigar mais deuma família. Contudo, às vezes, como na Contagem de 1996, porexemplo, essa informação não está disponível, o que leva à neces-sidade de se considerar o domicílio.

24. Propositalmente, foi-se pouco enfático sobre assumir o cará-ter definitivo da migração, já que cada vez mais as evidênciasempíricas, como aumento da migração de retorno, circularidadeetc. levam a pensar que essa característica deve ser cada vez maisrelativizada.

25. Neste momento de grande mudança e desenvolvimentotecnológico, a questão da acessibilidade deverá ser repensada comocritério, já que os significados de tempo, distância, integração, etc.necessariamente estão se redefinindo. Por exemplo: tendências dedeslocamentos de pessoas em idade ativa e de certas atividadesprodutivas para áreas periféricas ou mesmo dos próprios locais detrabalho para o domicílio podem depender mais do acesso “virtual”do que de acessos facilitados, como grandes rodovias ou avenidas.

26. As novas categorias utilizadas pelo IBGE são as seguintes: Áreaurbanizada, Área não-urbanizada, Área urbana isolada, Aglomera-do rural de extensão urbana, Aglomerado rural isolado ou povoa-do, Aglomerado rural isolado ou núcleo, Outros aglomerados e Árearural (exclusive aglomerado rural).

27. Para uma referência sobre esta questão em Mato Grosso, verCunha (2004).

28. Para citar apenas dois estudos mais recentes que tocam de al-guma forma essa questão, ver Lyra (2003) e Oliveira (2003).

29. Trata-se do seminário “New Forms of Urbanization:Conceptualizing and Measuring Human Settlement in the Twenty-first Century”, organizado pelo Grupo de Trabalho sobre Urbani-zação da IUSSP. Bellagio, Itália, 11 a 15 de março de 2002.

30. Vale lembrar que as PNAD’s dos anos 90 adotaram a divisãoadministrativa rural-urbano existente em 1991, sem modificá-lanos vários levantamentos da década. Se por um lado tal procedi-mento implica em uma distorção da realidade de cada momento,por outro, favorece a análise aqui proposta. Isso porque que os da-dos diriam respeito sempre à mesma área territorial, evitando in-terpretações equivocadas sobre a evolução das populações urbanae rural que, como se sabe, podem sofrer modificações através deprocessos de reclassificação.

31. Nessa linha de análise, vale mencionar o estudo feito pelo IBGEsobre a “Região de Influência das Cidades – REGIC” (IBGE, 1987),que justamente utiliza dados sobre fluxo de pessoas em função dabusca de serviço ou consumo para estabelecer critérios decentralidade dos municípios e seus respectivos “hinterlands”.

32. Uma aplicação muito interessante dessas possibilidades dogeoprocessamento pode ser encontrada em Alves (2004).

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JOSÉ MARCOS PINTO DA CUNHA: Demógrafo, Professor do Instituto deFilosofia e Ciências Humanas e do Núcleo de Estudos de População,ambos da Unicamp.

Artigo recebido em 17 de março de 2005.Aprovado em 6 de abril de 2005.

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

A

Resumo: Baseada nas tendências observadas dos movimentos migratórios em São Paulo, o texto caracteriza operfil dos fluxos migratórios dentro do tecido metropolitano, assim como as mudanças observadas nestes per-fis nas últimas décadas. Analisa também as diferenças entre os migrantes residentes na capital e os que vivemnas outras municipalidades, de acordo com especificidades de cada município.Palavras-chave: Migração. Perfil dos migrantes. Estrutura intrametropolitana.

Abstract: Based on observed tendencies of migrational movements in São Paulo area, the text characterizesthe profiles of the migrant’s flows in this specific metropolitan region, as well as the observed changes inthese profiles through the last decades. Furthermore, it analyzes the differences between capital resident migrantsand those living in other metropolitan municipalities, according to each municipality’s specificities regardingthe working resident population characteristics and the specific influence of migration.Key words: Migration. Metropolitan structure. Migrants, profile.

SUZANA PASTERNAK

LUCIA M. MACHADO BÓGUS

MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

o longo das últimas décadas, a metropolizaçãoconstituiu o fenômeno mais marcante da urbani-zação brasileira. Exercendo forte poder de atra-

ção populacional, as regiões metropolitanas concentravam,em 1980, 43% da população urbana do país, e apresenta-vam, em geral, uma expansão acentuada de suas peri-ferias, com elevadas taxas de crescimento populacional(TASCHNER; BÓGUS, 1986). O peso das regiões metro-politanas fazia-se sentir de modo mais acentuado nosEstados do Rio de Janeiro e São Paulo, concentrando 79%e 50% da população de cada estado, respectivamente, oque conduzia à previsão do surgimento de “megame-trópoles”, com tendências de concentração cada vezmaiores.

Os resultados do Censo de 1991 e 2000 mostraram, en-tretanto, que a proporção da população urbana que viviaem áreas metropolitanas, além de menor, se comparada à

década de 70, manteve-se relativamente estável nas déca-das seguintes, representando 38,56% da população, em1991, e 37,33%, em 2000.

Considerando-se as taxas de crescimento populacional,

no período 1991-2000, as regiões metropolitanas com

maiores taxas de crescimento foram Curitiba (3,5% a.a.),

Belém (3,4 a.a.), Fortaleza (2,6% a.a), Belo Horizonte (2,5%

a.a.) e Recife (2,3% a.a.) (BAENINGER, 2004, p. 4).

Em São Paulo, essas taxas caíram a partir dos anos 70:de 4,5% ao ano para 1,7%, no período 1980-1991; e 1,7%ao ano, entre 1991 e 2000.

Essa queda na taxa de crescimento refletiu um impor-tante processo de mudança na estrutura produtiva e, demodo especial, a desconcentração industrial a partir dametrópole para o interior do Estado – onde passaram a selocalizar importantes pólos de industrialização. A Região

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

Metropolitana perdeu empregos industriais em escalaimpressionante. Segundo Torres (2004, p. 2), “os empre-gados na indústria passaram de 36% da população ocupa-da em 1985 para 19% em 2001, segundo dados da PED”.Em termos de geração de empregos, São Paulo deixou deser definida como a locomotiva industrial do Brasil. Deacordo com Baeninger (2004), os deslocamentos popula-cionais para o interior foram de tal ordem que essa regiãopassou de um saldo migratório negativo de 450 milmigrantes, nos anos 60, para um saldo positivo de maisde 1 milhão de pessoas, nos anos 90.

Frente a esses dados, conforme Lencioni (2003), pode-se ter a impressão de que a diminuição da atividade in-dustrial na capital teria ocorrido devido à transferênciapara o interior de muitas indústrias ali instaladas.

Ledo engano, [completa a autora] pois a maioria das

indústrias do interior não diz respeito às indústrias que se

transferiram da capital ou da região metropolitana [...] A

importância de São Paulo como centro industrial ainda se

mantém e as indústrias paulistas teriam passado por um

processo de cisão territorial. Como decorrência disso, o

maior contingente da população economicamente ativa

ocupada na indústria encontra-se no município da capital

e, sobretudo, nos municípios da região metropolitana: São

Bernardo do Campo, Diadema e Guarulhos [...] e vale ainda

lembrar que a concentração territorial da indústria se dá,

sobretudo, na região metropolitana, que responde por 50%

da área industrial construída no Estado de São Paulo

(LENCIONI, 2003, p. 466).

Assim sendo, o que ocorreu no Estado de São Paulofoi um espraiamento das atividades industriais pelo entornometropolitano e para alguns municípios do interior, semque, no entanto, se instalasse um novo centro industrialque ameaçasse a supremacia da Metrópole de São Paulo.Nesse processo, a metrópole reafirmou sua primazia

concentrando os centros de poder e direção do capital

industrial e financeiro e, ainda, uma série de atividades

relacionadas ao terciário superior, fundamentais para a

direção do processo de reprodução do capital em geral. [...]

São Paulo, a capital, reúne cerca de 80% das sedes de

empresas com cisão territorial. Considerando-se os demais

municípios da região metropolitana, essa cifra passa para

86,5%, e, se levarmos em conta a área compreendida em

um raio de pouco mais de 250 quilômetros de extensão a

partir do centro metropolitano, esse índice passa para

93,1%. Esse conjunto formado pela região metropolitana e

seu entorno, com fortes vínculos internos, é denominado

aglomerado metropolitano. Nesse aglomerado é que o

movimento de desconcentração e de reconcentração pro-

dutiva atua com todo seu dinamismo, pois aí estão instalados

os novos requisitos locacionais da atividade industrial, tais

como: ciência e tecnologia, informação, mão-de-obra

especializada e instituições de desenvolvimento (LENCIONI,

2003, p. 467).

De qualquer modo, o Município de São Paulo – e oentorno metropolitano dinâmico que o cerca, oferecendoequipamentos e serviços que algumas vezes o municípiojá não comporta, como é o caso do Aeroporto Internacio-nal de Guarulhos – constituem hoje o mais importante cen-tro de conexão da economia nacional com os fluxosglobalizados de capital presentes no país. Assim, São Pauloagregou a condição de centro de modernos serviços auxi-liares à produção à sua tradicional função polarizadoracomo produtora e consumidora de insumos e bens indus-triais, passando a comandar as áreas da economia com voca-ção competitiva internacional (SCHIFFER, 2004, p. 191).

De qualquer modo, as atividades industriais interio-rizadas tiveram um efeito multiplicador em termos de ge-ração de novas atividades – ligadas tanto ao próprio setorindustrial como ao comércio e aos serviços –, fato quegerou uma quantidade importante de empregos não-agrí-colas e produziu impactos sobre os deslocamentospopulacionais.

Entre 1980 e 1991, mais da metade (53%) dos municí-pios paulistas havia registrado taxas negativas de migra-ção. A maioria situada na região Noroeste e Norte do Es-tado, e uma menor parcela, ao Sul, na faixa ocupada peloVale do Paraíba. Contudo, os municípios localizados aOeste caracterizavam-se como áreas de perdas migratóriase os municípios à Leste, como áreas de atração popu-lacional. Entre 1980 e 1991, havia 180 municípios comtaxas positivas de migração: entre 0 e 15 migrantes pormil habitantes (PERILLO, 2002).

No período que se estende de 1991 a 2000, verificou-se a diminuição do número de municípios com taxas ne-gativas de migração em São Paulo – embora 42% aindase apresentassem nessa condição. A análise aponta que,durante o período 1980-2000, 188 municípios do Estado(33%) continuaram exibindo taxas negativas de migração.Em condição contrária, 39% dos municípios paulistasmantiveram taxas positivas de migração nas duas déca-das consideradas, enquanto 163 municípios registraramreversão das tendências migratórias, passando de taxasnegativas para taxas positivas ou vice-versa, durante operíodo 1980/2000 (PERILLO, 2002). Portanto, a mo-

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

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bilidade espacial da população no interior do Estado foibastante acentuada nesse período.

No caso dos anos 90, essas tendências migratórias fo-ram, de maneira geral, reafirmadas pelos dados – tanto daPesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD1995, como da Contagem Populacional de 1996, além doCenso de 2000. De fato, nos cinco primeiros anos da dé-cada de 90, cerca de 5 milhões de brasileiros deslocaram-se de um estado a outro do país, e a migração de retornoàs áreas de origem representou cerca de 20% do total da-queles movimentos. Nos últimos 4 anos, 3,7 milhões debrasileiros migraram entre estados. Nesse período, SãoPaulo continuou a comportar-se como principal área, tan-to de atração como de evasão de migrantes e o Estado deSão Paulo reafirmou seu papel de grande receptor demigrantes, aumentando seu saldo migratório anual de 77mil pessoas por ano, na década de 80, para 123 mil pessoasanuais, na década de 90. Mas a maior mobilidade obser-vada no Estado, ao longo das duas décadas, foi mesmo amigração intrametropolitana, que tinha como destino osmunicípios da periferia.

Uma hipótese anteriormente apresentada por algunsestudiosos do tema foi a de que a Região Metropolitanade São Paulo teria se transformado numa área de passa-gem, tanto em direção ao interior do próprio Estado comopara outras regiões metropolitanas e/ou cidades de outrosestados brasileiros. De fato, nos anos 80, aquela regiãometropolitana apresentava saldo migratório negativo de26 mil pessoas por ano. Já entre 1991 e 2000 observou-sea reversão desse saldo negativo para um saldo anual posi-tivo de 24 mil pessoas.

No período 1981-1991, a Região Metropolitana de São Paulo

recebeu 1.575.585, correspondendo a 58,8% do total da

imigração para o Estado de São Paulo; entre 1991-1996,

canalizou 58,5% (666.467) do total dos 1.139.638 que se

dirigiram para o Estado. [...] Em relação aos movimentos

oriundos de outros estados, a Região Metropolitana de São

Paulo continuou como o principal destino estadual, embora

essa distribuição da imigração no Estado seja, em parte,

compartilhada com o interior, que canalizou importantes

volumes de imigrantes interestaduais: 589.285, no período

1986-1991, e 473.171, no de 1991-1996 (BAENINGER,

2000, p. 145).

Vale lembrar que a metrópole paulista ainda mantémcerto vigor demográfico, devido sobretudo ao crescimentodos outros municípios que não a capital, uma vez que ataxa de incremento anual dos municípios periféricos da

Grande São Paulo foi de 2,89% entre 1991 e 2000 – maisde três vezes maior que a da capital para o mesmo período.

Esse fenômeno – o de periferização da população resi-dente nas metrópoles – pode ser observado também emoutras áreas metropolitanas brasileiras: Belém, Recife,Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre registra-ram taxas inferiores a 1% no seu núcleo, com taxas supe-riores na periferia. Em Curitiba, o crescimento dos muni-cípios periféricos alcançou 5% anuais entre 1991 e 2000.

Quanto à metrópole de São Paulo, percebe-se a conti-nuidade do processo de crescimento demográfico radio-concêntrico, que agora ultrapassa os limites do municípioe espraia-se pelos municípios vizinhos. Mesmo na capi-tal, o crescimento foi essencialmente periférico, ainda quemais reduzido, com acréscimo de 824.887 pessoas e549.069 domicílios entre 1991 e 2000. As áreas centraisda região apresentam queda no número de residentes e dedomicílios, enquanto as periféricas responsabilizam-se portodo o incremento demográfico.

A partir desse quadro, colocam-se algumas questões:- Quem são esses migrantes que vêm residir na GrandeSão Paulo? Qual o seu perfil? Esse perfil tem mudado aolongo do tempo?

- O peso da migração é distinto, por tipo de município daregião metropolitana?

- Há diferenças entre os migrantes residentes na capitale nos demais municípios metropolitanos? Há diferençasentre migrantes residentes por tipo de município perifé-rico?

QUEM ERAM E QUEM SÃO OS MIGRANTESQUE RESIDEM NA METRÓPOLE

Migrantes em 1991

Observando-se algumas características demográficasdos migrantes recentes que residiam na metrópole em 1991,pode-se notar:

Em Relação à Estrutura Etária – A população migranteapresenta diferenças sensíveis em relação à não-migrante.Entre os migrantes recentes – ou seja, com tempo de resi-dência inferior a dez anos – o percentual de pessoas entre15 e 29 anos atingia, em 1991, 43,23% do total. Já entreos não-migrantes essa proporção era de 25,36% e tantojovens como idosos aparecem com grande peso: 31,59%e 7,90%, respectivamente. Entre os migrantes não-recen-

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

tes, esses grupos populacionais têm menor expressão:24,27% para os jovens e 3% para os idosos.

Esta situação é explicada pelas teorias correntes sobremigração, que colocam como a população propensa a mi-grar as faixas jovens e em idades produtivas, que mudamde município/região de residência em busca de melhorescondições de vida e de maiores oportunidades de traba-lho e emprego. De fato, 66,39% dos migrantes recentesque viviam na metrópole em 1991 estavam nas faixasetárias entre 15 e 34 anos.

Em Relação ao Sexo – Embora a razão de sexo entre osmigrantes favorecesse, em 1991, as mulheres (50,56% dosmigrantes são do sexo feminino), esta razão era menor quena população não-migrante, onde 52,34% da populaçãoera do sexo feminino.

TABELA 1

Migrantes e Não-Migrantes Residentes, segundo Grupos de Idade

Região Metropolitana de São Paulo – 1991

Grupos de IdadeMigrantes Não-Migrantes

Nos Absolutos % Nos Absolutos %

Total 2.672.547 100,00 12.772.392 100,00

0 a 14 Anos 648.677 24,27 403.445 31,59

15 a 29 Anos 1.155.237 43,23 3.239.208 25,36

30 a 44 Anos 618.913 23,16 2.902.115 22,72

45 a 59 Anos 169.443 6,34 1.587.698 12,43

60 Anos e Mais 80.277 3,00 1.008.425 7,90

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 1991.

Em Relação à Cor – A proporção de pretos e pardos napopulação migrante era 36% mais alta que entre os não-migrantes. Entre os migrantes, esta proporção atingia37,19% do total populacional, em 1991, enquanto para osnão-migrantes, era de 27,34%.

Em Relação à Escolaridade – Os migrantes recentes queresidiam na metrópole em 1991 tinham, na sua maioria,entre um e quatro anos de instrução (38%). A instruçãomédia dos migrantes residentes foi de 4,83 anos de estu-do, com coeficiente de variação de 84,94%.

Entre os não-migrantes, foram observados níveis maiselevados de instrução, com 5,16 anos de estudo em mé-dia, e coeficiente de variação de 85,63%.

Analisando a Tabela 2, percebe-se a maior concentra-ção dos migrantes nas classes entre um e oito anos de es-

TABELA 2

Migrantes e Não-Migrantes Residentes, segundo Anos de Estudo

Região Metropolitana de São Paulo – 1991

Anos de EstudoMigrantes Não-Migrantes

Nos Absolutos % Nos Absolutos %

Total 2.672.547 100,00 12.772.391 100,00

Sem Instrução e Menos de 1 Ano 568.589 21,28 3.105.814 24,32

Alfabetização de Adultos 6.423 0,24 30.635 0,24

1 a 4 Anos 1.015.557 38,00 4.209.177 32,96

5 a 8 Anos 638.764 23,90 2.796.892 21,90

9 a 11 Anos 279.977 10,48 1.604.760 12,56

12 Anos e Mais 161.547 6,04 1.019.716 7,98

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 1991.

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

TABELA 3

Migrantes e Não-Migrantes Residentes, segundo Faixas de Renda Individual

Região Metropolitana de São Paulo – 1991

Faixas de Renda Migrantes Não-Migrantes

(em salários mínimos) Nos Absolutos % Nos Absolutos %

Total 2.672.550 100,00 12.772.391 100,00

Menos de 1 984.340 36,83 4.598.935 36,01

De 1 a 3 730.761 27,34 2.322.087 18,18

Mais de 3 a 5 255.470 9,56 1.165.611 9,13

Mais de 5 a 10 173.879 6,51 1.079.268 8,45

Mais de 10 a 20 66.331 2,48 489.573 3,83

Mais de 20 35.004 1,31 253.987 1,99

Sem Declaração 426.765 15,97 2.862.930 22,41

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 1991.

tudo (61,9% dos migrantes têm esse perfil, contra 54,86%dos não-migrantes). Por outro lado, a proporção de indi-víduos com escolaridade “de 12 anos e mais” é maior en-tre os não-migrantes. Outro dado relevante é que a pro-porção de migrantes “com baixa instrução” (sem instruçãoou com menos de um ano) é menor que a dos não-migrantes. Pode-se concluir que os fluxos migratórios quevêm instalar-se na metrópole apresentam instrução aomenos primária, com média de 4,8 anos de estudo, e comdistribuição ligeiramente mais homogênea do que a ob-servada para os não-migrantes.

Em Relação à Renda – Os migrantes apresentaram ren-da média menor que os não-migrantes: a renda indivi-dual era de 2,74 salários mínimos, com enorme variabi-lidade (148%), enquanto para os não-migrantes a rendamédia individual foi de 3,37 e com variabilidade seme-lhante.

A Tabela 3, acima, mostra que os migrantes situavam-se em patamares de renda mais baixos (com 64,17% comrendimentos inferiores a três salários mínimos mensais),enquanto para o mesmo patamar a proporção de não-migrantes foi de 54,2%. Por outro lado, entre os mais ri-cos, com 20 e mais salários mínimos, a porcentagem demigrantes era, em 1991, nitidamente inferior à de não-migrantes.

Em Relação à Procedência – Selecionou-se como variá-vel para verificação da procedência o local de residência

dos migrantes cinco anos antes do Censo. Assim, para1991, tabulou-se o local de residência em 1986. A Tabela4 mostra o local de moradia dos migrantes nos anos 80,considerando os residentes na Região Metropolitana deSão Paulo em 1991.

Percebe-se que entre os 2.547.499 migrantes, 44,29%já moravam no mesmo município onde foram recensea-dos e 1.403.816 residia em outro município brasileiro(55,10%). Entre estes, destacam-se os residentes no Nor-deste: 560.967, que constituem 39,96% dos residentes emoutros municípios brasileiros, sobretudo na Bahia ePernambuco. A maioria (738.530) é oriunda da RegiãoSudeste (52,61%), com destaque para os procedentes dosEstados de São Paulo e Minas Gerais.

TABELA 4

Migrantes Residentes, segundo Local de Moradia Anterior (1)

Região Metropolitana de São Paulo – 1991

Local de Moradia Anterior Nos Absolutos %

Total 2.547.499 100,00

No Município de Moradia

Atual na RMSP 1.128.231 44,29

País Estrangeiro ou Maldefinido 14.652 0,58

Local Ignorado 800 0,03

Outro Município no

Interior de São Paulo 597.667 23,46

Outro Estado 806.149 31,64

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 1991.

(1) Local de residência em 1986.

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26 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

Migrantes em 2000

Observando-se algumas características demográficasdos migrantes recentes que residiam na metrópole em 2000pode-se notar:

Em Relação à Estrutura Etária – Em 2000, as popula-ções migrante e não-migrante apresentavam diferença equi-valente a 1991: na população migrante recente, a propor-ção de pessoas entre 15 e 29 anos atingiu 41,11%, enquantona não-migrante foi de 26,13%. Percebe-se a diminuiçãodesse grupo etário em relação a 1991 tanto entre não-migrantes como entre migrantes – o que atesta um enve-

TABELA 6

Migrantes e Não-Migrantes Residentes, segundo Grupos de Idade

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Grupos de IdadeMigrantes Não-Migrantes

Nos Absolutos % Nos Absolutos %

Total 3.119.459 100,00 14.760.535 100,00

0 a 14 Anos 669.054 21,45 4.054.784 27,47

15 a 29 Anos 1.282.376 41,11 3.856.684 26,13

30 a 44 Anos 811.733 26,02 3.347.240 22,68

45 a 59 Anos 251.353 8,06 2.160.115 14,63

60 Anos e Mais 104.943 3,36 1.341.712 9,09

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

lhecimento populacional, que é maior entre os não-migrantes. Em 2000, o crescimento da proporção de ido-sos na população favoreceu o aumento do peso do con-junto formado por jovens e idosos nos dois grupos. Assim,a proporção de idosos aumentou de 7,90%, em 1991, para9,09%, em 2000, entre os não-migrantes. E de 3% para3,36% entre os migrantes. De modo geral, o aumento naproporção de idosos foi de mais de 20%, embora esta sejaconsiderada ainda bastante reduzida.

Cabe salientar que a diferença de estrutura etária entremigrantes e não-migrantes, em 2000, é notável em rela-ção à população em idades produtivas: no grupo etárioentre 15 e 59 anos encontravam-se 63% dos não-migrantese 75% dos migrantes.

As pirâmides etárias para 2000 mostram com clareza odiferencial entre os dois grupos estudados: a pirâmide dosnão-migrantes apresenta forma arredondada, enquanto ados migrantes apresenta “saídas” nas idades produtivas,para ambos os sexos.

Em Relação ao Sexo – A razão de sexo entre os migrantesfavorece as mulheres (51,79% dos migrantes são do sexofeminino). Nota-se, entretanto, que desaparece a diferen-ça observada entre migrantes e não-migrantes, em 1991,em relação ao sexo. Em 2000, as duas populações apre-sentam a mesma razão de sexo: 51,79% de mulheres en-tre os não-migrantes e 51,79% entre os migrantes. Aoque tudo indica, houve um aumento da migração femi-nina para a metrópole, provavelmente para o trabalho nocomércio e serviços de baixa qualificação/remuneraçãoe, em muitos casos, sujeita ao desemprego e/ou à deso-cupação.

TABELA 5

Migrantes Residentes, segundo Regiões e Principais

Estados Brasileiros de Moradia Anterior (1)

Região Metropolitana de São Paulo – 1991

Regiões e Estados Nos Absolutos %

Total 1.403.816 100,00

Região Norte 14.922 1,06

Região Nordeste 560.967 39,96

Bahia 195.017 13,89

Pernambuco 131.110 9,34

Região Sudeste 738.530 52,61

Minas Gerais 102.051 7,27

São Paulo 597.667 42,36

Região Sul 64.775 4,61

Região Centro-Oeste 12.545 1,53

Brasil Não Especificado 2.393 0,22

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 1991.

(1) Região ou Estado de moradia em 1986.

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

Em Relação à Cor – A proporção de pretos somada à depardos na população migrante é mais alta que entre os não-migrantes: entre os migrantes, atinge 40,08% do totalpopulacional, enquanto para os não-migrantes é de30,12%. Assim, tanto entre os migrantes como entre osnão-migrantes houve um aumento da proporção de pretose pardos, passando de 27% para 30%, entre não-migrantes,e de 37% para 40%, entre os migrantes. Para os dois sub-conjuntos, o aumento foi de cerca de 3%.

Em Relação à Escolaridade – Os migrantes recentes queresidiam na metrópole em 2000 apresentaram escolarida-de distinta dos de 1991, que, na sua maioria, tinham entreum a quatro anos de instrução (38%). Para os migrantesdo ano 2000 aparece como instrução modal tanto a classeentre um e quatro anos de escolaridade (29,90%), como aseguinte, entre cinco e oito anos de instrução (29,86%).A instrução média dos migrantes residentes na Região Me-tropolitana de São Paulo foi de 5,94 anos de estudo, comcoeficiente de variação de 71%. Percebe-se uma melhoriano nível de escolaridade dos migrantes – já que a médiaem 1991 foi de 4,10 e com variabilidade maior. Assim, osmigrantes em 2000 apresentam escolaridade melhor e maishomogênea.

Por outro lado, a instrução dos não-migrantes perma-nece mais elevada: com 6,22 anos de estudo em média, ecoeficiente de variação de 74%. Em comparação com osníveis de escolaridade observados em 1991, também houvemelhora, já que ela era, em média, de 5,16 anos, com va-riabilidade de 85%.

Nota-se que a melhoria de escolaridade foi maior en-tre os migrantes que entre os não-migrantes: para aque-les, o incremento na média foi de 44,88%, enquanto paraos não-migrantes, atingiu 20,54%. Além disso, nos doiscasos, a escolaridade tem menor variância.

Analisando a Tabela 7, percebe-se maior concentra-ção de migrantes nas classes de estudo (59,77% dosmigrantes têm este perfil, contra 49,05% dos não-migrantes). Por outro lado, a proporção dos não-migrantes com escolaridade de 12 anos e mais é maiorque entre os migrantes. Outro dado interessante é que aproporção de migrantes com baixa instrução (sem ins-trução e menos de um ano) é menor que a dos não-migrantes, tal como em 1991. Pode-se concluir que osfluxos migratórios que se instalaram na metrópole nosanos 90 apresentam pelo menos oito anos de instrução,na sua maioria, com média de 5,94 anos de estudo, ecom distribuição ligeiramente mais homogênea que

GRÁFICO 1

Pirâmide Etária da População, por Sexo e Condição de Migração

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

0 2 4 6 8

Mulheres

%

024680 a 4 Anos5 a 9 Anos10 a 14 Anos15 a 19 Anos20 a 24 Anos25 a 29 Anos30 a 34 Anos35 a 39 Anos40 a 44 Anos45 a 49 Anos50 a 54 Anos55 a 59 Anos60 a 64 Anos65 a 69 Anos70 a 74 Anos75 Anos e +

Homens

%

Total

024680 a 4 Anos5 a 9 Anos10 a 14 Anos15 a 19 Anos20 a 24 Anos25 a 29 Anos30 a 34 Anos35 a 39 Anos40 a 44 Anos45 a 49 Anos50 a 54 Anos55 a 59 Anos60 a 64 Anos65 a 69 Anos70 a 74 Anos75 Anos e +

Homens

%

Migrantes

0 2 4 6 8

Mulheres

%

0 2 4 6 8

Mulheres

%

024680 a 4 Anos5 a 9 Anos10 a 14 Anos15 a 19 Anos20 a 24 Anos25 a 29 Anos30 a 34 Anos35 a 39 Anos40 a 44 Anos45 a 49 Anos50 a 54 Anos55 a 59 Anos60 a 64 Anos65 a 69 Anos70 a 74 Anos75 Anos e +

Homens

%

Não-Migrantes

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

TABELA 7

Migrantes e Não-Migrantes Residentes, segundo Anos de Estudo

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Anos de EstudoMigrantes Não-Migrantes

Nos Absolutos % Nos Absolutos %

Total 3.119.463 100,00 14.760.532 100,00

Sem Instrução e Menos de 1 Ano 445.562 14,28 2.870.847 19,45

Alfabetização de Adultos 2.549 0,08 11.380 0,08

1 a 4 Anos 932.985 29,91 3.649.338 24,72

5 a 8 Anos 931.586 29,86 3.591.085 24,33

9 a 11 Anos 562.032 18,02 3.089.175 20,93

12 Anos e Mais 232.169 7,44 1.503.188 10,18

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

TABELA 8

Migrantes e Não-Migrantes Residentes, segundo Faixas de Renda Individual

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Faixas de Renda Migrantes Não-Migrantes

(em salários mínimos) Nos Absolutos % Nos Absolutos %

Total 3.119.465 100,00 14.760.534 100,00

Menos de 1 1.305.081 41,84 5.574.191 37,76

De 1 a 3 710.639 22,78 2.375.204 16,09

Mais de 3 a 5 316.773 10,15 1.443.725 9,78

Mais de 5 a 10 238.822 7,66 1.522.402 10,31

Mais de 10 a 20 99.323 3,18 686.964 4,65

Mais de 20 67.313 2,16 422.572 2,86

Sem Declaração 381.514 12,23 2.735.476 18,53

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

entre os não-migrantes. Houve melhora no item esco-laridade em relação a 1991, e essa melhora foi mais sig-nificativa entre os migrantes que entre os não-migrantes.

Em Relação à Renda – A Tabela 8 mostra que os migrantessituam-se em patamares de renda mais baixos (com 64,62%com rendimentos inferiores a 3 salários mínimos mensais),enquanto para o mesmo patamar a proporção de não-migrantes foi de 53,85%. Já entre os mais ricos, com ren-da de 20 e mais salários mínimos, a porcentagem demigrantes mostra-se nitidamente inferior à de não-

migrantes. Mas, de maneira geral, a distribuição da rendaindividual não mudou muito entre 1991 e 2000.

Percebe-se que a renda média aumentou para os doisgrupos entre 1991 e 2000: 12,5% para os não-migrantes(de 3,37 para 3,79 salários mínimos) e 10,6% para osmigrantes (de 2,74 para 3,03 salários mínimos). Observa-se que o aumento foi ligeiramente maior e mais homogê-neo para os não-migrantes. Isso pode significar não sómelhores oportunidades no mercado de trabalho, comocondições de acesso mais homogêneas a essas oportuni-dades para o grupo dos não-migrantes.

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

TABELA 9

Migrantes Residentes, segundo Local de Moradia Anterior (1)

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Local de Moradia Anterior Nos Absolutos %

Total 3.119.463 100,00

Outro Município da RMSP 585.897 18,78

Interior do Estado de São Paulo 172.134 5,52

Mesmo Município de Moradia Atual 1.643.942 52,70

Outro Estado 717.490 23,00

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

(1) Local de residência em 1995.

Em Relação à Procedência – Escolheu-se como variá-vel para verificação da procedência o local de residênciados migrantes cinco anos antes do Censo. Assim, para2000, foi informado o local de residência em 1995.

Entre os 3.119.463 que migraram para a RMSP nos anos90, 52,70% moravam no mesmo município e 18,78% emoutro município da região metropolitana. Assim, 71,48%dos migrantes já residiam na região, em 1995 (Tabela 9).

Apenas 7,23% dos migrantes na década residiam emzona rural em 1995: 1,24% no próprio Município de SãoPaulo e 5,99% em outros municípios. O maior contingen-te de migrantes já morava em zona urbana, quer no pró-prio município de residência em 2000 (46,87%), quer emoutros municípios (41,31%). A migração internacional

TABELA 10

Migrantes de Fora da Região Metropolitana,

segundo Região de Moradia Anterior (1)

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Região de Moradia Anterior Nos Absolutos %

Total 1.475.521 100,00

Região Norte 14.530 0,98

Região Nordeste 526.508 35,68

Bahia 204.893 13,87

Pernambuco 99.029 6, 71

Região Sudeste 860.383 58,31

Minas Gerais 71.994 4,88

São Paulo 758.031 51,37

Região Sul 39.068 2,65

Região Centro-Oeste 35.032 2,37

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

(1) Região de moradia na década de 90.

apresenta queda, e apenas 0,73% dos migrantes recentesmorava no exterior em 1995. Cerca de 4% dos migrantesrecentes em 2000 ainda não haviam nascido em 1995 – oque denota a presença, entre os migrantes, de jovens queconstituem família e iniciam seu ciclo reprodutivo, no lo-cal de destino migratório.

Destaca-se também que quase 19% dos migrantes ti-nham como moradia anterior outro município da metró-pole, o que demonstra a importância dos fluxos intra-metropolitanos.

Por outro lado, em 1991, 23,46% dos migrantes de ou-tros municípios eram procedentes do interior do Estado,proporção que caiu para 5,2% em 2000. Isso mostra que aimigração do interior para metrópole vem diminuindo. Em1986, mais de 800 mil migrantes residiam no interior doestado, cifra que se reduziu para cerca de 172 mil em 1995.Ao que tudo indica, o interior do Estado de São Paulo temoferecido melhores condições de absorção de contingen-tes populacionais nos últimos anos, refletindo o processode desconcentração das atividades econômicas – sobretu-do as da indústria de transformação – além da dinamizaçãodos setores de comércio e serviços.

Comparando a procedência dos migrantes de 2000 comos de 1991, a cifra que mais chama a atenção é o aumentorelativo da proporção de oriundos da Região Sudeste: em2000, 58% dos migrantes e, em 1991, 53% – e esse nú-mero deve-se, sobretudo, à participação de moradores daRegião Metropolitana de São Paulo.

A Tabela 11 mostra claramente a importância da mi-gração intrametropolitana na última década, a qual con-centrou a maioria dos fluxos para a metrópole.

Comparando-se os dados de 1991 sobre os residentesem outra UF em 1986 com os moradores em 1995,coletados em 2000, percebe-se que esse tipo de migraçãodiminuiu em termos absolutos. Em 1986, 806.149migrantes residiam em outro Estado, enquanto em 1995,

TABELA 11

Migrantes Paulistas, segundo Local de Moradia Anterior (1)

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Local de Moradia Anterior Nos Absolutos %

Estado de São Paulo 758.031 100,00

RMSP 585.897 77,29

Interior 172.134 22,71

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

(1) Região de moradia na década de 90.

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

esse número reduziu-se para 717.490 migrantes. Por ou-tro lado, o total de migrantes aumentou 1,73% nos anos90: de 2.672.550 para 3.119.464 pessoas. Grande partedesse aumento foi devido ao maior número de migrantesque já moravam na metrópole cinco anos antes do recen-seamento: 1.128.231 migrantes moradores da Grande SãoPaulo, em 1986, e 1.643.942 residentes, em 1995.

Percebe-se, também, que 42% do fluxo migratório nosanos 80 ocorreu na primeira metade da década. Na décadade 90, houve movimentação de 53% deste fluxo nosprimeiros cinco anos, podendo-se falar de um crescimentode mobilidade, se considerados os dez anos em seuconjunto.

Em Relação à Ocupação – Para caracterizar a ocupaçãode migrantes e não-migrantes em 2000, foram utilizadasas categorias socioocupacionais, conforme detalhado nametodologia, a seguir. A Tabela 12 mostra a distribuiçãodas grandes categorias ocupacionais, entre os migrantes eos não-migrantes na década de 90.

Comparando-se a ocupação de migrantes e não-mi-grantes, chama a atenção a relação entre a população ocu-pada e a total, para os dois subconjuntos. Entre os migran-tes recentes, essa proporção atinge 45,78%, enquanto paraos não-migrantes é de 38,53%, reflexo da estrutura etáriadiferencial entre os dois segmentos.

O perfil socioocupacional dos migrantes e não-mi-grantes é bastante distinto: entre os migrantes, há maiorconcentração nas categorias hierarquicamente inferio-res. Assim, a proporção de “trabalhadores da sobrevi-

vência”, que entre os migrantes chega a 15,86%, é de9,70% entre os não-migrantes. E, considerando-se es-ses trabalhadores, percebemos que a maior porcentagemestá inserida no trabalho doméstico – cerca de 12% dototal de ocupados.

No que se refere ao proletariado secundário, a propor-ção de migrantes é maior: 28,13% dos ocupados migrantes,contra 22,97% dos ocupados não-migrantes. Analisandoa distribuição interna do proletariado secundário, nota-seque os porcentuais diferem sobretudo em relação aos ope-rários da construção civil, onde se alocam 9,74% do totalde migrantes e 5,46% dos não-migrantes.

Também no proletariado terciário, a proporção demigrantes é maior que dos não-migrantes: 27,48% dos ocu-pados migrantes aí estão, versus 23,82% dos ocupados não-migrantes. Nota-se ainda que, na categoria trabalhadoresdo comércio, os porcentuais são praticamente iguais, sen-do responsáveis pela diferença as categorias “serviçosespecializados” e “não-especializados”.

Já nas categorias hierarquicamente superiores, a rela-ção se inverte: as proporções de não-migrantes superamas de migrantes. Entre as categorias médias, estão quase18,76% dos migrantes e 29,13% dos não-migrantes; napequena burguesia, 2,6% dos migrantes e 4% dos não-migrantes; nas elites, quase 10% dos não-migrantes e 6,5%dos migrantes. De outro lado, os migrantes são maioriaentre os trabalhadores agrícolas.

Assim, a metrópole tende a absorver os migrantes emocupações pior situadas nas hierarquias ocupacional esocial – ligadas a serviços pessoais, serviços especializados

TABELA 12

Migrantes e Não-Migrantes Ocupados, segundo Categorias Socioocupacionais (1)

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

CategoriasMigrantes Não-Migrantes

Socioocupacionais Nos Absolutos % Nos Absolutos %

Total 1.428.185 100,00 5.687.070 100,00

Agricultores 10.123 0,71 25.767 0,45

Elite Dirigente 13.206 0,92 84.228 1,48

Elite Intelectual 79.249 5,55 477.766 8,40

Pequena Burguesia 36.968 2,59 229.587 4,04

Categorias Médias 267.947 18,76 1.656.578 29,13

Proletariado Terciário 392.423 27,48 1.354.873 23,82

Proletariado Secundário 401.766 28,13 1.306.492 22,97

Trabalhadores da Sobrevivência 226.503 15,86 551.775 9,70

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Pesquisa Pronex/CNPq (RIBEIRO, 1998).

(1) Migrantes na década de 90.

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

e não-especializados, construção civil e comércio ambu-lante. Nessas rubricas encontram-se 44% dos migrantesrecentes da RMSP.

Mudanças Significativas no Perfil dos Migrantes

A análise da migração por idade e sexo é ferramentademográfica importante, dado que permite inferir o cará-ter familiar ou individual da migração, bem como o mo-mento do ciclo vital das pessoas ou famílias que migra-ram (CUNHA et al., 2000).

Entre as décadas de 80 e 90, o perfil dos migrantespara a RMSP apresenta algumas diferenças. No que dizrespeito à estrutura etária, os que chegaram à RMSP nosanos 90 eram mais velhos que os que chegaram na décadaanterior.1

Dentre os migrantes na década de 80, 43,23% tinhamentre 15 a 29 anos e 23,16% tinham entre 30 e 44 anos. Aidade dos migrantes da década seguinte no Censo de 2000apresentava-se de forma distinta: 41,11% dos migrantesda década de 90 tinham entre 15 e 29 anos em 2000, e26,02%, entre 30 a 44 anos. Nas faixas etárias mais bai-xas – entre 0 e 14 anos – situavam-se 21,45% dos migrantesda década de 90 e 24,27% dos migrantes da década de 80.A idade média dos migrantes subiu de 25,24 anos em 1991para 26,81 anos em 2000. Entre os não-migrantes, a ida-de média – sempre maior que entre os migrantes – tam-bém subiu de 27,83 para 29,65.

A análise da pirâmide etária dos migrantes, para o ano2000, mostra a predominância da migração feminina, so-bretudo nas faixas entre 15 e 19 anos, 20 e 24 anos e 25 e29 anos. Aliás, o predomínio feminino ocorre em todas asfaixas, com exclusão da mais jovem, de um a quatro anos.Esse fato levanta a hipótese de migração de mulheres sós– o que explicaria o diferencial da razão de sexo, que fa-vorece as mulheres em quase todas as faixas etárias. Oplus de mulheres jovens parece indicar que, além da mi-gração de casais jovens, observa-se uma migração demulheres sem companheiro em direção à RMSP. “SãoPaulo continua como chamariz para parte da populaçãono começo de sua idade ativa” (CUNHA, 2000, p. 87). Aobservação da razão de sexo para 1991 e 2000 mostra a“feminização” da imigração para a RMSP.

A proporção de pretos e pardos (considerados em con-junto) também aumentou entre os migrantes das duas dé-cadas: foi de 37,2%, em 1991, e 40,1% no Censo de 2000.

Os migrantes estão mais velhos, entre eles há maismulheres, pretos e pardos e apresentam escolaridade maior:

na década de 80, sua média de escolaridade era de 4,10anos de estudo e subiu para 5,94 na década seguinte – umamelhora de quase 2 anos, ou seja, mais de 40%. Destaca-se que a variância da escolaridade, em 1991, era maiorque em 2000, mostrando uma escolaridade mais homogê-nea que em 1991.

A distribuição de renda mostra que a maioria dos mi-grantes das duas décadas concentra-se nas faixas maisbaixas (menos de 1 a 3 salários mínimos): 64,17% dosmigrantes de 80 e 63,62% dos migrantes de 90. A rendamédia aumentou pouco mais de 10%, de 2,74 para 3,03salários mínimos, no período considerado. Mas osmigrantes possuem condição mais heterogênea quanto àrenda, pois a variância da renda em 2000 é maior que em1991.

Em relação à procedência e volume da migração, pode-se observar:- o volume total de migrantes aumentou em quase 580mil pessoas entre as duas décadas, passando de 2,55 mi-lhões na década de 80 para 3,12 milhões na de 90;

- o volume de migrantes de outros Estados da federaçãodiminuiu em mais de 88 mil pessoas entre as duas déca-das, passando de 806 mil migrantes inter-estaduais nosanos 80 para 717 mil nos anos 90 – em termos relativos, opeso da migração intra-estadual caiu de 31% do total para23% do total. Há, portanto, redução significativa dos flu-xos inter-estaduais;

- os procedentes da Região Nordeste eram cerca de 560mil na década de 80 e 527 mil na de 90. Embora existadiminuição em termos relativos – já que o volume demigrantes foi maior na década de 90 que na de 80 – per-cebe-se uma certa manutenção do volume migratório vin-do daquela região;

- em 1991, os migrantes procedentes do próprio Estadode São Paulo totalizaram 597.667. Este número incluiumoradores em outros municípios da RMSP, não discrimi-nados pelo Censo de 1991. Em 2000, os procedentes doEstado de São Paulo foram 758.031. Assim, o volume demigrantes paulistas subiu em mais de 160 mil pessoas. Eentre estes, mais de 77% já residiam na região metropoli-tana. Percebe-se, dessa forma, a importância crescente damigração intrametropolitana.

Em síntese, os migrantes da década de 90 são menosjovens, com maior número de mulheres e menor númerode brancos que os da década anterior. O volume demigrantes oriundos do Nordeste mantém certa estabilida-de. Os migrantes são, de maneira geral, mais intrametro-

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

politanos, com escolaridade maior e mais homogênea. Seusníveis de renda são maiores que os da década anterior,embora com maior variabilidade.

ESPACIALIZAÇÃO DOS MIGRANTES NOTECIDO METROPOLITANO

Este item analisa em que municípios da metrópole re-sidem preferencialmente os migrantes e a diferença en-tre seus locais de moradia em 1991 e 2000. Para realizartais análises, procedeu-se à construção de uma tipologiade municípios, com base nas categorias socioocupacio-nais e que será apresentada na sessão dedicada à metodo-logia.

Espaços da Migração: Quais Municípios?

No contexto metropolitano, observa-se que o municí-pio-núcleo, embora ainda receba forte volume migrató-rio, tem deixado de ser o local de residência preferencial,nas últimas décadas. Em 1991, 58,79% dos migrantes re-centes residiam nos municípios periféricos e, em 2000,essa proporção subiu para 61,46%.

A Tabela 13 mostra a manutenção da proporção demigrantes recentes na população metropolitana. Entretanto,observando-se as taxas anuais de crescimento da popula-ção total e da população migrante, nota-se que a taxa dapopulação migrante é 5,5% maior que a da população to-tal, com 1,73% e 1,64% ao ano, respectivamente.

O incremento de migrantes entre 1991 e 2000, para acapital, foi de mais de 100 mil pessoas; e, para a perife-ria, de 346 mil. A taxa de crescimento dos migrantes parao município-núcleo atingiu 0,98% ao ano e para a perife-ria, 2,24% anuais.

Nesse processo, evidencia-se uma associação entre astaxas de crescimento dos municípios e a proporção demigrantes – o que mostra a migração como responsávelmaior pelo crescimento demográfico em muitos municí-pios periféricos. Em 1991, todos os municípios com ta-xas de crescimento no período 1980-1991 maiores que5,5% a.a. possuíam proporção de migrantes maior que30%: Arujá, Barueri, Embu-Guaçu, Francisco Morato,Itapevi, Jandira, Itaquaquecetuba e Santana de Parnaíba.Outros 13 municípios também apresentavam porcentuaisde migrantes maiores que 30%: Barueri, Biritiba Mirim,Caieiras, Carapicuíba, Cotia, Embu, Ferraz de Vasconce-los, Franco da Rocha, Pirapora, Poá, Rio Grande da Ser-ra, Suzano, Taboão e Vargem Grande Paulista.

Em 2000, essa associação entre altas taxas de cresci-mento demográfico e alta proporção de migrantes conti-nua presente. Agora, são 15 municípios com porcentagemde migrantes superior a 30%: Arujá, Barueri, Caieiras,Cajamar, Cotia, Ferraz de Vasconcelos, Francisco Morato,Itapecerica da Serra, Itapevi, Itaquaquecetuba, Jandira,Mairiporã, Pirapora do Bom Jesus, Santana de Parnaíba eVargem Grande Paulista. Destes, apenas Cajamar, Ferrazde Vasconcelos, Itapecerica, Itapevi, Jandira e Mairiporãapresentaram taxas anuais menores que 5% no período1991-2000.

A Tabela 14 mostra que, entre os 13 municípios quemantiveram a proporção de sua população migrante aci-ma de 30% em 1991 e 2000, as taxas de crescimentodemográfico mantiveram-se altas. A exceção é Cara-picuíba, que apesar de apresentar proporção de migrantesligeiramente acima de 30% nas duas datas, tem taxas decrescimento relativamente menos elevadas que as dosoutros municípios mencionados: 3,92% entre 1980 e 1991;e 2,19% entre 1991 e 2000 – o que pode ser devido ao

TABELA 13

População Total e Migrantes Residentes no Núcleo e na Periferia

Região Metropolitana de São Paulo – 1991-2000

Áreas1991 2000

População Total Migrantes População Total Migrantes

Nos Absolutos % do Total Nos Absolutos % do Total

Total 15.444.942 2.672.550 17,30 17.878.703 3.119.464 17,45

Núcleo 9.646.185 1.101.394 11,42 10.434.252 1.202.220 11,52

Periferia 5.789.757 1.571.156 27,09 7.444.451 1.917.244 25,75

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

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TABELA 14

Municípios com Mais de 30% de Migrantes e Taxa de Crescimento

Região Metropolitana de São Paulo – 1991-2000

Em porcentagem

MunicípiosMigrantes Taxas de Crescimento

1991 2000 1980-91 1991-2000

Arujá 38,47 37,10 7,21 5,16

Barueri 38,97 32,46 5,14 5,31

Biritiba Mirim 31,42 - 2,65 3,36

Caieiras 32,85 37,21 4,08 6,90

Carapicuíba 30,90 30,36 3,92 2,19

Cotia 35,71 32,81 4,98 3,70

Embu 31,81 - 4,53 3,23

Embu-Guaçu 34,51 - 5,08 5,13

Ferraz de Vasconcelos 40,85 35,55 5,20 4,46

Francisco Morato 47,77 38,60 10,30 5,32

Franco da Rocha 33,42 - 4,85 2,64

Itapecerica da Serra - 33,02 4,01 3,75

Itapevi 35,63 33,24 6,60 4,64

Itaquaquecetuba 47,59 39,03 7,68 5,75

Jandira 33,37 32,09 5,16 4,33

Mairiporã - 30,03 3,44 4,65

Pirapora do Bom Jesus 40,27 37,37 4,67 5,05

Poá 32,80 - 3,41 2,56

Rio Grande da Serra 32,74 - 3,68 2,42

Santana de Parnaíba 39,70 52,76 12,74 7,89

Suzano 32,62 - 4,20 4,13

Taboão da Serra 34,88 - 4,60 2,37

Vargem Grande Paulista 36,95 32,32 - 8,36

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

aumento dos preços dos terrenos numa área anteriormen-te acessível à população de menor renda.

Em 2000, muitos municípios que apresentavam propor-ção elevada de migrantes em 1991, viram esse porcentualdiminuir. Observando suas taxas de incremento demo-gráfico, percebe-se ligeira queda: é o caso de Embu, Francoda Rocha, Poá, Rio Grande da Serra e Taboão da Serra,cujas taxas, no intervalo entre 1991-2000, caíram sensi-velmente em relação às anteriores. As exceções foramBiritiba Mirim e Suzano.

Além desses, alguns municípios que não possuíamporcentual de população migrante superior a 30% em 1991,apresentam esse fenômeno em 2000: Itapecerica da Serra,que teve altas taxas de crescimento nas duas décadas,embora em declínio; e Mairiporã, com taxa crescente noperíodo.

Estes municípios também estavam dentre aqueles doconjunto metropolitano que apresentavam altas taxas decrescimento anual da população migrante recente entre asdécadas de 80 e 90: Caieiras (8,39%), Cajamar (8,73%),Itapecerica da Serra (5,54%), Mairiporã (5,25%), Santanade Parnaíba (11,36%) e Vargem Grande Paulista (6,76%).

Dessa forma, percebe-se a migração como fator impor-tante no crescimento de alguns municípios da periferia.Esses 13 municípios com elevada proporção de migrantes,em 2000, possuíam 34,30% dos migrantes que residemna periferia, embora representem apenas 26,13% da po-pulação dessa periferia.

As perguntas que se colocam em relação a esses dadosdizem respeito à especificidade desses municípios. Inda-gam por que eles foram escolhidos como locus preferen-cial de residência dos migrantes recentes e se há alguma

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

especificidade, conforme o tipo de município onde resi-dem.

Para Mairiporã e Santana de Parnaíba, em particular,pode-se formular a hipótese da migração de população derenda média e alta, em virtude da proliferação de cháca-ras e condomínios residenciais, no caso do primeiro; e,no caso de Santana de Parnaíba, pela expansão de umconjunto de condomínios de luxo que se seguiu à instala-ção de Alphaville e Tamboré – o que atraiu profissionaisliberais e empresários, além de outros grupos altamentequalificados, que conferem um novo perfil à migração, so-bretudo do tipo intrametropolitano.

Distribuição dos Migrantes no Município-Pólo

O volume de migrantes para o município da capital foide 1.101.394 pessoas no período 1980-1991 – represen-tando 11,42% da população total do município, em 1991– e de 1.202.220 pessoas entre 1991 e 2000 – represen-tando 11,52% da população total em 2000.

Depreende-se daí que o volume de migrantes aumen-tou em mais de 100 mil pessoas e que a taxa de cresci-mento da população migrante para o pólo foi de 0,98% aoano entre as duas décadas – número maior que a taxa dapopulação não-migrante da capital. Cabe também mencio-nar que a localização espacial desses migrantes noMunicípio de São Paulo difere por anéis (BÓGUS;PASTERNAK, 2004), com características distintas emrelação à sua configuração histórica, aos equipamentossociais e às condições de infra-estrutura, aloja grupos so-ciais que incluem migrantes com perfis distintos.

TABELA 15

Migrantes e População Total, segundo Localização Espacial

Município de São Paulo – 2000

Anel (1)Migrantes População Total

A/B % Migrantes(A) (B)

Total 1.202.220 10.435.545 11,52 100,00

Central 66.609 318.599 20,91 5,54

Interior 82.435 583.956 14,12 6,86

Intermediário 139.566 1.316.367 10,60 11,61

Exterior 309.068 3.212.970 9,62 25,71

Periférico 604.542 5.003.653 12,08 50,29

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

(1) Para detalhamento dos distritos que compõem cada anel, ver Pasternak e Bógus (1998, p. 78).

A Tabela 15 aponta a distribuição espacial dos migran-tes recentes nas diferentes áreas da cidade e mostra que onúmero de migrantes é bastante expressivo no anel peri-férico, no qual o volume populacional também é elevado.Entretanto, em termos relativos, em 2000, os locais commaior porcentual de migrantes recentes foram os anéis cen-tral e interior. As porcentagens de migrantes caem nos anéisintermediário e exterior, tornando a subir no anel perifé-rico. A hipótese que se coloca é a de que os migrantesalocam-se no tecido urbano inicialmente nas áreas cen-trais, em cortiços, pensões e hotéis populares; alguns de-les, após algum tempo de residência, compram terrenosou casas na periferia, muitas vezes em invasões. Essa ex-plicação encontra novas evidências quando a situação es-pecífica dos chefes de família migrantes é analisada.

A tabulação realizada apenas para os chefes migrantesde 1991 e 2000 trouxe informações interessantes sobre essegrupo (aqui a tabulação foi realizada por origem, e não porprocedência, nos últimos 10 anos). A Tabela 16 mostra quetanto em 1991 como em 2000 os chefes migrantes residiampreferencialmente nos anéis central e periférico; ospaulistanos que já moraram em outro município e retornaramà capital estavam em maior proporção no anel interior; e osnativos, que sempre moraram na cidade, residiam mais for-temente nos anéis interior e intermediário.

O local preferencial de residência dos chefes não nati-vos são os anéis extremos do tecido urbano municipal: ocentral e o periférico. A hipótese explicativa plausível vin-cula-se, uma vez mais, à questão da moradia: chefesmigrantes recentes procuram o centro, fixando-se em pen-sões, cortiços, hotéis e “quitinetes”. Posteriormente,

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

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MAPA 1

Proporção de Migrantes

Região Metropolitana de São Paulo – 1991

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 1991.

MAPA 2

Proporção de Migrantes

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

alocam-se em favelas e/ou casas próprias na periferia, mo-radias que seu poder aquisitivo permite comprar.

Cabe ainda ressaltar que havia, em 1991, 1.033.017 che-fes nascidos em outros estados; em 2000 esse número su-biu para 1.299.961. Dentre eles, predominaram os oriun-dos da Região Nordeste: 63%, em 2000; e 60%, em 1991.E, tanto em 1991 como em 2000, os nordestinos residiamprincipalmente no anel periférico, onde grupos demigrantes chegados anteriormente ao pólo metropolitanotêm garantido a acolhida aos recém-chegados, por meiode redes de solidariedade e sociabilidade. A existência des-sas redes tem sido essencial para a sobrevivência dosmigrantes em seus primeiros tempos na metrópole.

Em que Tipos de Município Residem os Migrantes?

Metodologia – Tendo em vista analisar as formas e con-dições de inserção dos migrantes na maior região metro-politana brasileira, procedeu-se à construção de umatipologia de municípios com base nas categorias socio-ocupacionais elaboradas e utilizadas no âmbito da pes-quisa “Metrópole, desigualdade socioespacial e gover-nança urbana: Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte”(RIBEIRO, 1998). Para tanto, procedeu-se a uma análisefatorial da distribuição da população ocupada residentenos 38 municípios da RMSP – excluindo-se a capital – deacordo a tipologia adotada.

A variável síntese “categoria socioocupacional” cons-titui um sistema de hierarquização social obtido com acombinação das variáveis censitárias “renda”, “ocupação”

e “escolaridade” e que fornece uma proxy da estrutura so-cial. Como resultado dessa hierarquização chegou-se atipologia composta de oito grandes categorias (cats) agru-padas segundo a existência simultânea de certas caracte-rísticas no que diz respeito à ocupação, escolaridade, ren-da, posição na ocupação e ramo de produção/atividade.São elas:- elite dirigente – formada principalmente por empre-sários, dirigentes do setor público e dirigentes do setorprivado;

- elite intelectual – inclui profissionais liberais de nívelsuperior, professores universitários e trabalhadores porconta própria, de nível superior;

- pequena burguesia – constituída principalmente por pe-quenos empregadores, comerciantes por conta própria;

- camadas médias – constituída, entre outros, por traba-lhadores em atividades de supervisão, técnicos e artistas,trabalhadores das áreas de saúde e educação, segurançapública, justiça e correios;

- proletariado secundário – inclui operários da indústriamoderna, operários da indústria tradicional e operários daconstrução civil;

- proletariado terciário – constituído por prestadores deserviços, trabalhadores do comércio e trabalhadores au-tônomos em ocupações manuais com capacitação especí-fica;

- trabalhadores da sobrevivência – inclui ambulantes,empregados domésticos e biscateiros;

TABELA 16

Chefes de Família, por Origem, segundo Local de Residência (por Anel)

Município de São Paulo – 1991-2000

Em porcentagem

1991 2000

Anel (1) Nasceu em São Paulo Não Nasceu em São Paulo Não

Sempre Morou Nasceu Sempre Morou NasceuMorou Fora Morou Fora

Total 37,23 2,27 60,49 37,15 2,16 60,68

Central 29,49 2,86 67,66 30,04 3,60 66,36

Interior 41,50 4,13 54,30 42,80 4,05 53,16

Intermediário 43,83 2,87 53,31 45,41 2,96 51,63

Exterior 39,69 2,02 58,29 41,07 1,96 36,98

Periférico 32,19 1,69 66,12 31,58 1,63 66,79

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

(1) Para detalhamento dos distritos que compõem cada anel, ver Pasternak e Bógus (1998, p. 78).

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

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- trabalhadores agrícolas – formada por todas as ocupa-ções agrícolas com renda abaixo de 20 salários mínimos.2

A variável “ocupação” foi construída a partir de 400diferentes tipos de ocupação utilizados pelo IBGE e ascategorias socioocupacionais (cats) constituíram o pontode partida para classificação dos tipos de área, através darealização de análise fatorial por correspondência biná-ria.3

A análise fatorial realizada em 37 municípios da peri-feria da Região Metropolitana de São Paulo em 1991 e 38municípios em 2000 resultou em dois eixos que explicam75% e 74% da variância, respectivamente. O primeiro eixoopõe estratos superiores e médios a operários e trabalha-dores da sobrevivência, exprimindo as relações de poderpela qualificação profissional. O segundo eixo mostra aoposição entre trabalho qualificado e não-qualificado, co-locando, de um lado, as ocupações que requerem algumtipo de treinamento e, de outro, as de baixa qualificação eque quase não necessitam de adestramento – como cons-trução civil, serviços domésticos, ambulantes e biscateiros.Esse eixo explica 23,1% da variância, em 1991, e 24,7%,em 2000.

A partir desses eixos foram estabelecidos os clustersque resultaram em cinco grandes aglomerados ou tipos deáreas, a saber:- cluster popular, que reúne os municípios com grandeproporção de trabalhadores da sobrevivência e da cons-trução civil. Esses municípios, tanto em 1991 quanto em2000, apresentam uma distribuição bastante semelhantedas categorias socioocupacionais e das suas densidadesrelativas – sendo que a maior densidade para os dois perío-dos (1,54 em 1991 e 1,36 em 2000) seria a dos trabalha-dores da sobrevivência. Pertencem ao tipo popular os mu-nicípios de Arujá, Cotia, Embu-Guaçu, Guararema,Itapecerica da Serra, Juquitiba, Mairiporã, Mogi das Cru-zes, Pirapora do Bom Jesus (apenas em 1991), Santa Isa-bel, Santana de Parnaíba, São Lourenço (apenas em 2000),Suzano e Vargem Grande Paulista;

- cluster agrícola, que reúne os municípios com forte pre-sença de trabalhadores rurais. Tal como no caso anterior,a similaridade das distribuições de 1980 e 1991 permiteestabelecer a mesma tipologia para os dois anos conside-rados. Os municípios agrícolas de Biritiba Mirim e Sale-sópolis distinguem-se pela alta porcentagem de trabalha-dores agrícolas residentes: 35,2% em 1991 e 16,7% em2000. Também é significativa a presença, nesses municí-pios, de trabalhadores da sobrevivência;

- cluster operário tradicional, que reúne os municípiosde residência operária, sobretudo de moradia de operáriosda indústria tradicional e de serviços. Em 2000, esses mu-nicípios apresentam densidades relativas elevadas do pro-letariado terciário, do proletariado secundário e de traba-lhadores da sobrevivência. Dentre os 18,4% dos ocupadosque pertenciam ao operariado secundário, 3,4% eram daindústria tradicional e 5,9%, da construção civil. Alémdisso, 7,8% eram trabalhadores da sobrevivência. Assim,cerca de 17% da população ocupada residente no clusterera composta de operários tradicionais, operários da cons-trução civil e trabalhadores da sobrevivência. Em 1991,os municípios de tipo “operário tradicional” possuíam 31%da sua população ocupada no proletariado secundário(Cajamar, Carapicuíba, Ferraz de Vasconcelos, Francis-co Morato, Franco da Rocha, Itapevi, Itaquaquecetuba eJandira). Em 2000, os municípios deste cluster eram:Ferraz de Vasconcelos, Francisco Morato, Itapevi, Itaqua-quecetuba, Jandira, Pirapora do Bom Jesus, Santa Isabel,Poá e Rio Grande da Serra;

- cluster operário moderno, que, em 2000, reúne muni-cípios com densidade elevada de trabalhadores residen-tes do proletariado secundário (1,03), sobretudo da indús-tria moderna (1,06). Também possuem presença expressivaos trabalhadores de serviços auxiliares. Em 1991, a den-sidade relativa dos trabalhadores da indústria moderna al-cançava, nesse grupo, 1,03; e a de serviços auxiliares, 1,14– o que tornou possível a comparação desse tipo nas duasdatas consideradas. Fazem parte deste cluster, em 1991,os municípios de: Barueri, Caieiras, Diadema, Guarulhos,Mauá, Poá, Osasco, Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra,Taboão da Serra. Em 2000, Poá e Rio Grande da Serrapassam a fazer parte dos municípios do tipo “operário tra-dicional”, devido a alterações no perfil de sua populaçãoocupada residente. Por outro lado, passam a fazer partedo grupo os municípios de Cajamar e Carapicuíba, antespertencentes ao tipo “operário tradicional”, também emrazão das características de sua população residente, se-gundo a categoria socioocupacional;

- cluster elite industrial, que reúne municípios com den-sidades elevadas de residentes pertencentes à elite inte-lectual (1,79 em 1991 e 1,59 em 2000) e à elite dirigente,que atingiu 1,73 em 2000. Este cluster distingue-se tam-bém por apresentar densidades elevadas para a pequenaburguesia (1,17 em 1991 e 1,26 em 2000). Embora a den-sidade do proletariado secundário seja inferior à unidade,ela é expressiva para os trabalhadores da indústria mo-

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

MAPA 3

Tipologia dos Municípios

Região Metropolitana de São Paulo – 1991

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 1991; Pesquisa Pronex/CNPq (RIBEIRO, 1998).

MAPA 4

Tipologia dos Municípios

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Pesquisa Pronex/CNPq (RIBEIRO, 1998).

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

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derna, tanto em 1991 (1,13) como em 2000 (1,10). Fazemparte desse tipo, em 1991, os municípios de Santo André,São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, que cons-tituíram o berço da indústria metalúrgica, automobilísticae metal-mecânica do Estado de São Paulo. A esses muni-cípios somou-se, em 2000, Santana de Parnaíba – impor-tante área de expansão de serviços ligados à indústria eonde se localizam os maiores condomínios de alta renda,residência de empresários e profissionais pertencentes àselites dirigente e intelectual.

Tipologia de Municípios e Migração4 – Tanto em 1991como em 2000, os municípios com maior proporção demigrantes são os do tipo “operário tradicional” e “popu-lar”. São tipos que se caracterizam por constituírem o lo-cal de moradia de camadas bastante pobres da população.A proporção de migrantes na população total manteve-seentre as duas datas: a redução em todos os tipos de muni-cípios da metrópole viu-se compensada pelo ligeiro au-mento do porcentual no município-pólo. A maior redu-ção da proporção de migrantes ocorreu nos municípios detipo “elite industrial” (mais de 28% de redução), seguidapela diminuição de 17,5% na migração nos municípios detipo “operário tradicional”.

Em 2000, os municípios de tipo “popular” caracteriza-vam-se por densidades maiores que a unidade tanto paraos trabalhadores por sobrevivência como para os traba-lhadores do proletariado secundário e terciário. Suas maio-res densidades relativas são para os ambulantes (1,24),domésticos (1,45) e operários da construção civil (1,28).Nessas quatro categorias ocupacionais concentraram-se

quase 13% dos trabalhadores ocupados residentes. Alémdisso, destacaram-se algumas densidades também altas emcategorias hierarquicamente superiores, como na elite di-rigente (1,11), elite intelectual (1,02) e pequena burgue-sia (1,22). Embora essas categorias representem menosde 5% dos ocupados residentes, sua presença talvez ex-plique as rendas médias do chefe mais elevadas que as doconjunto de municípios do tipo operário tradicional. Es-sas cidades são também conhecidas como cidades-dormi-tório, e apresentam um movimento pendular diário casa/trabalho, bastante expressivo. Nelas, a oferta de terras éainda abundante e com preços relativamente inferiores. Arelação emprego/população (o total da oferta de empregoem relação à população em idade ativa, expresso pela re-lação empregos para cada 100 membros da PIA) é baixaneste tipo de municípios, assim como a renda. (São Lou-renço, Vargem Grande Paulista e Juquitiba possuem rela-ção emprego/população elevada, mas com renda bastantebaixa; Cotia tem renda mais alta, mas oferta de empregomédia; já Mairiporã e Mogi das Cruzes apresentam rendamais alta, mas com pouca oferta de empregos).

Os municípios do subconjunto “operário tradicional”possuem perfil socioocupacional distinto dos do subcon-

TABELA 18

Relação Emprego/PIA, Renda do Chefe de Família e Proporção de

Migrantes, segundo Municípios do Tipo Popular

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Municípios do Emprego/ Renda do Chefe (2) Proporção de

Tipo Popular PIA (1) (reais de dez. 2000) Migrantes (%)

Total 897,11 26,94

Arujá 20,09 962,38 37,10

Cotia 32,97 1.202,11 32,81

Embu-Guaçu 15,57 699,73 22,21

Guararema 17,78 818,97 28,23

Itapecerica da Serra 15,28 720,14 33,02

Juquitiba 48,34 602,99 27,26

Mairiporã 18,70 1.035,36 30,03

Mogi das Cruzes 19,75 1.005,01 17,85

São Lourenço 76,88 626,29 24,12

Suzano 18,33 751,78 29,78

Vargem Grande Paulista 41,95 839,55 32,32

Fonte: Meyer, Gronstein e Biderman (2004, p. 53).

(1) Número de empregos por 100 pessoas em idade ativa.

(2) A renda média do cluster é a média ponderada das rendas dos chefes.

TABELA 17

Migrantes Residentes, segundo Tipos de Município

Região Metropolitana de São Paulo – 1991-2000

Em porcentagem

Tipos de Municípios 1991 2000

Total 17,30 17,45

Agrícola 26,95 26,19

Popular 28,62 26,94

Operário Tradicional 37,09 31,57

Operário Moderno 26,15 25,53

Elite Industrial 27,77 21,60

Pólo 11,42 11,52

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

junto “popular”, embora também alojem as camadas hie-rarquicamente inferiores. As densidades relativas mais al-tas observadas nesse conjunto de municípios foram as dosempregados domésticos (1,28), ambulantes (1,39), ope-rários da construção civil (1,43) e da indústria tradicional(1,35). Quase 17% da sua população ocupada encontra-se nessas categorias. A Tabela 19 apresenta a renda mé-dia do chefe e a relação emprego/população (total da ofertade emprego em relação à população em idade ativa) des-ses municípios.

A Tabela 19 mostra que as rendas médias dos chefesnos municípios do tipo operário tradicional são, em ge-ral, inferiores às do tipo popular. E, com exceção de Poá,Embu e Santa Isabel, o índice de empregos é muito baixo.

Meyer, Gronstein e Biderman (2004) chamam grandeparte desses municípios de “dormitório renda-baixa”.Observa-se que, mesmo possuindo perfil específico emrelação às categorias socioocupacionais, os municípios dotipo popular e operário tradicional apresentam grande se-melhança: nos dois casos, há forte proporção de trabalha-dores por sobrevivência (8,24% e 7,82%, para os popula-res e tradicionais, respectivamente), além de 5,29% e5,92% respectivamente, de trabalhadores da construçãocivil. Sua maior distinção está na presença de operáriosda indústria tradicional, para este último grupo, e na

presença de elites e pequena burguesia, em alguns muni-cípios do cluster popular (no popular, 4,75% dos ocupa-dos pertencem às categorias elites e pequena burguesia;já no tipo operário tradicional, esse porcentual não al-cança 3%).

Pode-se inferir que a presença de forte proporção demigrantes vincula-se à renda média baixa – presente nosdois subconjuntos – e denota que os migrantes mais po-bres têm como uma das únicas opções de residência asáreas mais afastadas e desprovidas de infra-estrutura,mesmo tendo que arcar com elevado custo e maior tempode deslocamento para o trabalho, já que a oferta de em-pregos é bastante reduzida nesses tanto municípios comonos municípios populares. Fundamentalmente, quem abri-ga a população de baixa renda são os municípios-dormi-tório. Nos municípios populares, a renda média do chefefoi de aproximadamente R$ 897,00; e, nos municípios dotipo operário tradicional, de R$ 622,00 (relativos a de-zembro de 2000). A maior renda do cluster popular vemacompanhada de maior variância, justificada pela presen-ça de casas de campo em Cotia (onde está situada a Gran-ja Viana, com seus condomínios de luxo) e Itapecerica daSerra; e de chácaras de lazer em São Lourenço, VargemGrande Paulista e Mairiporã.

A presença da estrada de ferro ajuda a explicar a loca-lização da moradia das camadas populares, uma vez queesse meio de transporte possibilita o deslocamento paraoutras áreas da metrópole onde haja oferta de trabalho ouemprego. O trem interliga municípios ao norte: Caieiras,Franco da Rocha e Francisco Morato; a oeste: Osasco,Carapicuíba, Barueri, Jandira e Itapevi. Em direção aosudeste, passa por São Caetano do Sul e Santo André; emdireção ao Porto de Santos, passa por Mauá e RibeirãoPires. No sentido leste, atravessa Ferraz de Vasconcelos,Poá, Suzano, Itaquaquecetuba, Mogi das Cruzes eGuararema. A rede ferroviária metropolitana, embora pre-cária e insuficiente, ainda é a garantidora da mobilidadeno espaço da metrópole para a população de baixa renda.

Entre os 11 municípios do agrupamento operário tra-dicional, apenas Embu, Pirapora do Bom Jesus e SantaIsabel não apresentam ligação ferroviária com a capital –o que dificulta a circulação dos residentes e os condena aum certo isolamento. Como nesses municípios ainda exis-tem áreas onde são desenvolvidas atividades rurais, a car-roça e o cavalo são meios de transporte bastante utiliza-dos, além das viagens a pé.

No que diz respeito à origem dos moradores, os muni-cípios do tipo operário moderno apresentaram uma pro-

TABELA 19

Relação Emprego/PIA, Renda do Chefe de Família e Proporção de

Migrantes, segundo Municípios do Tipo Operário Tradicional

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Municípios doEmprego/ Renda do Chefe (2) Proporção de

Tipo OperárioPIA (1) (reais de dez. 2000) Migrantes (%)

Tradicional

Total 622,89 31,57

Embu 37,16 663,28 28,49

Ferraz de

Vasconcelos 11,40 594,44 35,55

Francisco Morato 4,09 508,40 38,60

Franco da Rocha 8,72 640,78 28,53

Itapevi 12,89 602,44 33,24

Itaquaquecetuba 12,72 571,58 39,03

Jandira 13,22 775,72 32,09

Pirapora do

Bom Jesus 15,44 598,30 37,37

Poá 55,25 753,53 27,92

Rio Grande da Serra 7,84 590,04 26,11

Santa Isabel 28,06 654,13 22,90

Fonte: Meyer, Gronstein e Biderman (2004, p. 53).

(1) Número de empregos por 100 pessoas em idade ativa.

(2) A renda média do cluster é a média ponderada das rendas dos chefes.

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

porção de migrantes semelhante, tanto em 1991 como em2000 (26,15% e 25,45%, respectivamente).

A oferta de empregos dos municípios do grupo operá-rio moderno é bem superior à do operário tradicional. Onível de renda é maior (renda média de cerca de R$ 838,00)e a proporção de migrantes é menor, associando-se inver-samente a renda e a oferta de empregos. Como exceção,destaca-se Carapicuíba que provavelmente tem boa partede seus moradores trabalhando em indústrias de São Pau-lo e Osasco, dada a contigüidade territorial e o expressi-vo número de indústrias instaladas nos limites dos três mu-nicípios.

Os municípios do tipo elite industrial apresentam pro-porção ainda menor de migrantes, tanto em 1991 comoem 2000. A renda média sobe para R$ 1.342,00 – maisque o dobro da renda média dos chefes no cluster operá-rio tradicional. A migração para estes municípios – comexceção de Santana de Parnaíba, com migração de perfilespecífico – reduziu-se muito entre as duas datas. No casode Santana de Parnaíba, a renda média dos chefes resi-dentes no município é a mais alta da metrópole: maior in-clusive que a da capital (R$ 1.479,69). Meyer, Gronsteine Biderman (2004) mostram que, em 1991, os 10% maisricos de Santana de Parnaíba ganhavam em média 50% amais que os 10% mais ricos residentes na capital. Este fe-nômeno está ligado, como já afirmado, ao crescimento de

condomínios fechados na periferia de São Paulo. EmSantana de Parnaíba e Barueri estão Tamboré e Alphaville,e o aumento de renda média está ligado à migração dacamada mais rica da população.

O fato de Santana de Parnaíba passar para o grupo maisrico de municípios e Barueri não, pode ser explicado porter menor população (74.828, em 2000, enquanto Baruerichegava a 208.281) e pela presença de condomíniosfechados com baixa densidade populacional – o queinfluencia bastante seus indicadores de renda, instrução eocupação.

O município-pólo apresenta uma proporção de migran-tes de 11,60%, com renda média do chefe de R$ 1.479,69e oferta de 40,96 empregos por cada 100 pessoas na popu-lação em idade ativa. Os municípios agrícolas, BiritibaMirim e Salesópolis, possuem proporção de migrantes de26,19% e oferta muito baixa de empregos (9,93 para 100pessoas em idade ativa, em Biritiba; e 17,47, em Sale-sópolis). A renda média do chefe assemelha-se à dos che-fes do grupo operário tradicional: R$ 623,73.

Vale ressaltar a associação negativa entre proporçãode migrantes na década e renda dos chefes: os municípiospobres, com pequena oferta de empregos são os que apre-sentam as mais altas taxas de migração.

Santana de Parnaíba é a grande exceção – pelas razõesjá apontadas e, sobretudo, pela concentração de migrantesde alta renda. Outro fator explicativo é a ferrovia, favore-cendo a moradia de migrantes recentes em áreas afasta-das dos centros de emprego e trabalho, pela facilidade dedeslocamento para áreas de concentração de oportunida-des de trabalho.

TABELA 20

Relação Emprego/PIA, Renda do Chefe de Família e Proporção de

Migrantes, segundo Municípios do Tipo Operário Moderno

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Municípios doEmprego/ Renda do Chefe (2) Proporção de

Tipo OperárioPIA (1) (reais de dez. 2000) Migrantes (%)

Moderno

Total 838,46 25,53

Barueri 91,61 1254,04 32,46

Caieiras 21,06 809,20 37,21

Cajamar 112,82 746,73 30,36

Carapicuíba 7,43 729,72 24,67

Diadema 28,66 717,09 22,42

Guarulhos 26,38 882,05 25,36

Mauá 12,67 720,81 22,46

Osasco 20,60 934,36 19,98

Ribeirão Pires 17,46 888,38 22,42

Taboão da Serra 43,15 849,08 27,69

Fonte: Meyer, Gronstein e Biderman (2004, p. 53).

(1) Número de empregos por 100 pessoas em idade ativa.

(2) A renda média do cluster é a média ponderada das rendas dos chefes.

TABELA 21

Relação Emprego/PIA, Renda do Chefe de Família e Proporção de

Migrantes, segundo Municípios do Tipo Elite Industrial

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Municípios doEmprego/ Renda do Chefe (2) Proporção de

Tipo ElitePIA (1) (reais de dez. 2000) Migrantes (%)

Industrial

Total 1.342,37 21,60

Santana de Parnaíba 56,86 2.583,57 52,76

Santo André 23,23 1.201,13 16,83

São Bernardo

do Campo 18,88 1.206,07 23,00

São Caetano do Sul 24,04 1.711,89 20,09

Fonte: Meyer, Gronstein e Biderman (2004, p. 53).

(1) Número de empregos por 100 pessoas em idade ativa.

(2) A renda média do cluster é a média ponderada das rendas dos chefes.

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SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

Concluindo, o lócus possível de residência dos mi-grantes são os municípios mais afastados, com pequenaoferta de empregos e possibilidade de deslocamentospendulares pela presença da ferrovia, embora também pre-cária face às demandas existentes. Em termos da tipologia,esses municípios correspondem ao conjunto de tipo ope-rário tradicional.

CARACTERIZAÇÃO DOS MIGRANTESPOR TIPO DE MUNICÍPIO

O texto mostrou claramente a associação entre migra-ção recente e municípios mais pobres, com pouca ofertade empregos e com ligação ferroviária a outras áreas dametrópole. Restam ainda as seguintes questões: “Existemcaracterísticas que diferenciam os migrantes que residemnos municípios dos aglomerados mais pobres e os quetêm por local de residência municípios agrupados em ou-tros tipos?” “A localização espacial seria um fator quereforça a segregação dos migrantes na trama intrametro-politana?”.

Trabalho anterior (BÓGUS; PASTERNAK, 2004) mos-trou que a localização espacial na capital paulistana eraimportante fator de usufruto de renda: chefes com nenhu-ma escolaridade, quando residentes no anel central,auferiam o dobro da renda dos residentes no anel perifé-rico. Morar na periferia, sobretudo para os mais desfavo-recidos, traduz-se, assim, em menores chances de ganhos,escolas de pior qualidade, além de maior tempo e maio-res custos de locomoção. Além disso, o espaço reafirmaredes de relações sociais importantes na estratégia de so-brevivência das famílias.

Características dos Migrantes por Cluster:Elementos para Análises Comparativas

Em Relação ao Sexo – Em 1991, os clusters com popu-lação ocupada em funções hierarquicamente inferiores ti-

TABELA 22

Homens Migrantes Recentes, por Tipos de Município e no Município-Pólo

Região Metropolitana de São Paulo – 1991-2000

Em porcentagem

Anos Agrícola PopularOperário Operário Elite

Município-PóloTradicional Moderno Industrial

1991 52,42 50,13 50,72 50,33 49,29 48,41

2000 49,49 49,38 49,90 49,11 48,45 46,60

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

nham maior proporção de homens. Esta proporção só seinvertia no grupo elite industrial e no município-pólo.

Já em 2000, as mulheres são maioria em todos os aglo-merados, ainda que o porcentual do sexo masculino sejamais elevado nos inferiores que nos superiores. No muni-cípio-pólo a proporção de homens é menor que 47%, comalta concentração no anel periférico.

Pode-se concluir que continua a existir um diferencialna razão de sexo em 2000, mas menor que em 1991: ocluster agrícola, por exemplo, em 1991 tinha 4 pontosporcentuais a mais que o pólo, enquanto em 2000 estadiferença é de menos de 3 pontos porcentuais. A migra-ção feminina se fez presente em todos os clusters, confor-me apontam as diferenças das porcentagens entre 1991 e2000. Essas diferenças foram maiores no cluster agrícolae no município-pólo.

Em Relação à Cor – A proporção de pretos e pardos, con-siderados em conjunto, aumentou em todos os tipos demunicípio, com exceção dos municípios do conglomera-do agrícola. Neste cluster a porcentagem de amarelos em1991 era notável, mostrando a presença japonesa na agri-cultura do entorno metropolitano, e diminuiu fortementeem 2000. É provável que a miscigenação tenha sido res-ponsável por parte do aumento de brancos nos clustersagrícolas, com a conseqüente diminuição dos amarelos.Outra hipótese plausível é a do deslocamento desse gru-po de orientais e seus descendentes para outras áreas agrí-colas situadas além dos limites metropolitanos, em muni-cípios do interior, no primeiro entorno metropolitano, queainda preserva atividades rurais. Isso se deve ao desloca-mento sucessivo das áreas ocupadas pelo chamado“cinturão-verde” e sua substituição, nas antigas áreas ru-rais da metrópole, por chácaras de recreio e condomíniosresidenciais (Tabela 23).

Quanto aos clusters operários, estes apresentavammenor proporção de brancos em 2000 que 1991. No mu-nicípio-núcleo a proporção de brancos diminuiu bastante

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

entre 1991 e 2000, denotando que a migração de não-bran-cos tem como destino também a capital e não apenas osmunicípios do cluster operário tradicional. No agrupa-mento elite industrial há maior porcentagem de brancos,tanto em 1991 como em 2000.

Em Relação à Estrutura Etária – A Tabela 24 e o Grá-fico 2, correspondentes a cada cluster, mostram que a es-trutura etária dos migrantes difere, por tipo de município.Os migrantes de 2000 são, em todos os clusters, menos

jovens que os de 1991. Mas, tanto em 1991 como em 2000,há maior proporção de jovens nos conglomerados agrí-cola, popular e operário tradicional. Famílias com filhosmigram mais para os municípios mais pobres, o que difi-culta ainda mais a inclusão dessas crianças. Nesses con-glomerados mais pobres, as escolas têm menor qualida-de, as oportunidades culturais e de lazer são mais restritas,as possibilidades de desfrutar um ambiente mais estimu-lante diminuem e as chances de mobilidade social são mi-nimizadas.

TABELA 23

Migrantes Recentes, por Raça/Cor, segundo Tipos de Município

Região Metropolitana de São Paulo – 1991-2000

Em porcentagem

Tipos de MunicípioBrancos Pretos + Pardos Amarelos

1991 2000 1991 2000 1991 2000

Total 60,95 57,79 37,19 40,08 1,25 1,06

Agrícola 63,96 74,66 29,14 23,06 6,74 1,50

Popular 61,24 58,67 36,86 38,79 1,54 1,52

Operário Tradicional 52,84 50,58 46,27 48,23 0,25 0,28

Operário Moderno 59,90 57,47 38,76 40,86 0,85 0,58

Elite Industrial 72,51 67,36 25,49 30,56 1,61 1,22

Município-Pólo 61,08 57,56 36,55 39,72 1,60 1,52

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

TABELA 24

Distriuição dos Migrantes Recentes, por Tipos de Município, segundo Grupos Etários

Região Metropolitana de São Paulo – 1991-2000

Em porcentagem

Grupos Etários Agrícola PopularOperário Operário Elite

Município-PóloTradicional Moderno Industrial

1991 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00

0 a 14 Anos 32,41 30,13 32,08 26,87 23,84 18,80

15 a 29 Anos 30,44 33,41 33,29 39,21 38,62 52,56

30 a 44 Anos 20,40 24,66 24,95 24,34 26,94 20,57

45 a 59 Anos 11,55 8,03 6,83 6,53 7,01 5,41

60 Anos e Mais 5,20 3,77 2,85 3,04 3,39 2,66

2000 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00

0 a 14 Anos 27,95 24,80 25,91 22,85 21,73 17,90

15 a 29 Anos 27,90 32,93 35,32 38,42 35,71 48,73

30 a 44 Anos 23,76 27,07 26,84 27,14 29,14 23,83

45 a 59 Anos 13,55 10,37 8,62 8,28 9,39 6,71

60 Anos e Mais 6,84 4,82 3,32 3,31 4,04 2,83

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

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44 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

Nos clusters operários, ocorre uma importante mudançana estrutura etária dos migrantes entre 1991 e 2000. Tan-to para o agrupamento operário tradicional, como para ooperário moderno, nota-se um aumento na proporção demigrantes entre 15 e 35 anos, o apogeu da idade ativa. Oporcentual menor de crianças entre os migrantes recentespara estes aglomerados insinua a hipótese de migraçãode pessoas sós e casais sem filhos. De fato, observandoas pirâmides etárias para 2000, nota-se que a dos migrantesrecentes no cluster agrícola apresenta formato distinto dasoutras, com maior presença de jovens e crianças. As pi-râmides dos clusters popular e operário tradicional sãosemelhantes, enquanto a do grupo operário moderno des-taca as faixas etárias entre 20 e 34 anos, para os dois se-xos. Em todos os casos, é marcante a presença de indiví-duos que demandam inserção num mercado de trabalhojá bastante saturado e sem possibilidades de expansão, anão ser através de atividades informais com baixa remu-neração, ligadas aos serviços não especializados e ao co-mércio ambulante. Muitos desses migrantes engrossam,na metrópole, o grupo de ocupados na categoria dos tra-balhadores da sobrevivência.

Na pirâmide da elite industrial, pode-se observar umincremento da porcentagem de migrantes na faixa etáriaentre 30 e 44 anos. Esse fato pode ser interpretado comomigração de pessoas com maior escolaridade e mais apti-dão para competir no mercado de trabalho metropolita-no. Finalmente, no município-pólo, as faixas etárias maisdestacadas são as entre 20 e 29 anos, com certa predomi-

TABELA 25

Média de Anos de Escolaridade dos Migrantes Recentes,

segundo Tipos de Município

Região Metropolitana de São Paulo – 1991-2000

Em anos

Tipos de Município 1991 2000

Total 5,03 5,94

Agrícola 3,84 4,82

Popular 4,50 5,61

Operário Tradicional 3,99 5,01

Operário Moderno 4,72 5,68

Elite Industrial 5,86 6,65

Município-Pólo 5,47 6,35

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

nância feminina. Trata-se, muito provavelmente, de po-pulação absorvida por mercado de trabalho específico deserviços pessoais, típico de uma cidade de serviços, quecada vez mais acentua esse traço identitário.

Em Relação à Escolaridade – Tanto em 1991 como em2000 a escolaridade medida em anos de estudo formal cres-ceu entre os migrantes para o cluster agrícola, subindono agrupamento operário tradicional, popular, operáriomoderno, município-pólo e elite industrial. Essa ordemse mantém nas duas datas.

TABELA 26

Renda Média (1) dos Migrantes Recentes, Desvio-Padrão e Coeficiente de Variação, segundo Tipos de Município

Região Metropolitana de São Paulo – 1991-2000

Tipos de

1991 2000

Município Renda Desvio-Coef. de

Renda Desvio-Coef. de

Média PadrãoVariação

Média PadrãoVariação

(%) (%)

Total 6,81 7,30 96,84 9,87 8,78 101,07

Agrícola 4,36 6,28 69,43 5,96 6,24 95,61

Popular 5,97 6,80 87,84 8,33 8,55 7,82

Operário Tradicional 4,66 4,11 113,34 6,05 5,62 107,04

Operário Moderno 5,95 5,44 109,45 7,76 7,26 106,84

Elite Industrial 7,84 6,97 112,41 11,16 10,05 111,09

Município-Pólo 7,98 8,30 96,20 10,82 9,87 109,64

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

(1) Em salários mínimos (SM).

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

GRÁFICO 2

Pirâmides Etárias da População Migrante, por Sexo, segundo Tipos de Município

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Pesquisa Pronex/CNPq (RIBEIRO, 1998).

0 2 4 6 8 10

Mulheres

%

02468101 a 4

10 a 14

20 a 24

30 a 34

40 a 44

50 a 54

60 a 64

70 a 74

80 e +

Homens

%

0 2 4 6 8 10

Mulheres

%

02468101 a 4

10 a 14

20 a 24

30 a 34

40 a 44

50 a 54

60 a 64

70 a 74

80 e +

Homens

%

0 2 4 6 8 10

Mulheres

%

02468101 a 4

10 a 14

20 a 24

30 a 34

40 a 44

50 a 54

60 a 64

70 a 74

80 e +

Homens

%

0 2 4 6 8 10

Mulheres

%

02468101 a 4

10 a 14

20 a 24

30 a 34

40 a 44

50 a 54

60 a 64

70 a 74

80 e +

Homens

%

0 2 4 6 8 10

Mulheres

%

02468101 a 4

10 a 14

20 a 24

30 a 34

40 a 44

50 a 54

60 a 64

70 a 74

80 e +

Homens

%0 2 4 6 8 10

Mulheres

%

02468101 a 4

10 a 14

20 a 24

30 a 34

40 a 44

50 a 54

60 a 64

70 a 74

80 e +

Homens

%

Agrícola Popular

Elite Industrial Operário Tradicional

Operário Moderno Município-Pólo

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46 SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

SUZANA PASTERNAK / LUCIA M. MACHADO BÓGUS

Há, de um modo geral, um aumento de escolaridadeentre 1991 e 2000. Esse aumento foi maior nos gruposagrícola popular e operário tradicional (da ordem de25%), enquanto nos clusters onde os migrantes já tinhammaior escolaridade em 1991, o aumento foi de cerca de20%. O aumento da escolaridade média total foi de 18%entre 1991 e 2000, para toda a RMSP.

Em Relação à Renda – Nota-se que houve um aumentona renda média dos migrantes em todos os tipos de muni-cípio. Para o total dos migrantes recentes na Grande SãoPaulo, esse aumento foi ligeiramente superior a 30%. Omaior aumento foi justamente no grupo elite industrial,tendo atingido 42% entre as duas datas. E o menor foi jus-tamente no agrupamento com menor renda média, o ope-rário tradicional, com incremento de 29,8%.

A renda média dos migrantes segue um gradiente, ini-ciando-se no grupo operário tradicional nas duas datas.A média mais alta em 1991 foi no município-pólo e, em2000, no conjunto de municípios que alojam a elite in-dustrial. Em 2000, a renda dos migrantes no município-pólo aumentou sua variância em relação à média de 1991,mostrando maior heterogeneidade na migração.

SÍNTESE

Existe certa especificidade entre os migrantes recentesque residem na metrópole. Aqueles do cluster operáriotradicional são mais pretos e pardos, mais jovens e maisdo sexo masculino que os migrantes de outros agrupamen-tos. Além disso, têm escolaridade média mais baixa, em-bora seja nesse grupo que se observou o maior ganho deescolaridade entre as duas datas. Nele, a renda média tam-bém é a mais baixa e a que menos subiu entre 1991 e 2000.

Depreende-se, assim, que o espaço mais desprovido éo que recebe os migrantes mais pobres, num círculo per-verso de localização dos menos qualificados e com maiorproporção de jovens em áreas onde qualquer melhora, ain-da que do ponto de vista físico-espacial, torna-se apenasuma remota possibilidade. Nesse sentido, o espaço atuareforçando a mobilidade social descendente; e a chamada“mobilidade circular”, que é apresentada por alguns au-tores (PASTORE; HALLER, 1993) como a alternativapossível de mobilidade social, hoje, na sociedade brasi-leira, apresenta-se, na verdade, apenas para a minoria maisqualificada, com alguma chance de substituir aqueles tra-balhadores que, por morte, aposentadoria, promoção oudemissão, liberem alguma vaga no mercado de trabalho.5

Em termos mais gerais, no âmbito de um país marcadopelos efeitos positivos e (mais fortemente) negativos dareestruturação produtiva, as perspectivas da mobilidadeespacial ter como corolário a mobilidade social, não pas-sam de meras conjecturas. Afinal, conforme Jannuzzi(2000, p. 30) a única mobilidade social possível hoje, noBrasil, é a mobilidade circular,

cujos efeitos finais sobre a mobilidade ascendente são muito

menores que os da mobilidade estrutural. Além disso, a

própria mobilidade circular ascendente está restrita a

segmentos de trabalhadores muito específicos, de pessoas

mais qualificadas, que só podem ascender pelo descenso de

outros menos qualificados.

Esse processo atinge a todos, independente da origem,situação ocupacional e qualificação profissional. No casodos migrantes, entretanto, as chances de mobilidade socialrestringem-se a uma parcela ainda menor e mais restritada população – o que os coloca frente a uma situação deimobilidade ou mesmo de mobilidade descendente, con-trariando as expectativas que os moveram a mudar de ci-dade, município e/ou de região, em busca de novas opor-tunidades já quase inexistentes na grande metrópolenacional.

NOTAS

1. É importante lembrar que o dado censitário refere-se à idade no mo-mento do Censo e não no da migração. Assim, a estrutura etária “real”ao migrar é mais jovem que a registrada para fins de análise.

2. Maior detalhamento das categorias socioocupacionais pode ser en-contrado em Pasternak e Bógus (1998, p. 73-75).

3. No que se refere à classificação ocupacional, foram utilizadas asinformações fornecidas pelo IBGE para os anos de 1980,1991e 2000.A mudança na forma de classificação das ocupações para o Censo de2000 introduziu uma dificuldade comparativa, que foi superada atra-vés de alguns ajustes e compatibilizações. Para esse ano, modifica-ram-se os critérios de classificação das ocupações: foi introduzido ouso da Classificação Brasileira de Ocupações – CBO. Além disso, foitambém modificado o critério temporal: em 1991, entendia-se por “ocu-pação” o exercício de cargo ou função, emprego, profissão, etc., exer-cidos durante a maior parte dos doze meses anteriores à data de refe-rência do Censo; em 2000, esse intervalo temporal foi reduzido parasete dias. A realização dos ajustes necessários possibilitou a utiliza-ção da mesma metodologia para a construção de tipologias de áreaspara 1991 e 2000.

4. Na construção da tipologia, a capital, como município-pólo, foi se-parada dos demais pela sua especificidade e por já ter sido objeto deanálises recentes. Ver: Bógus e Pasternak (2004).

5. Veja-se também, a respeito, Scalon (1999).

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MIGRAÇÃO NA METRÓPOLE

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 21-47, out./dez. 2005

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SUZANA PASTERNAK: Professora Titular da Faculdade de Arquitetura eUrbanismo da USP. Vice-Coordenadora do Observatório das Metrópo-les/São Paulo.LUCIA M. MACHADO BÓGUS: Professora Titular do Departamento deSociologia da Faculdade de Ciências Sociais da PUC/SP. Coordenadorado Observatório das Metrópoles/São Paulo.

Artigo recebido em 27 de junho de 2005.Aprovado em 2 de agosto de 2005.

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FAUSTO BRITO / JOSEANE DE SOUZA

A

Resumo: O objetivo primeiro deste artigo é analisar a simultaneidade do processo de urbanização e deconcentração da população urbana nos grandes aglomerados metropolitanos na segunda metade do séculopassado no Brasil. Como decorrência, também será estudado o processo de redistribuição da populaçãodentro dos aglomerados na perspectiva da metropolização da pobreza, tendo como referência a RegiãoMetropolitana de Belo Horizonte.Palavras-chave: Urbanização. Metrópoles. Migrações.

Abstract: The main purpose of this paper is to analyze the simultaneity of the urbanization and urbanpopulation concentration process in big metropolitan cities occurred in last century’s second half inBrazil. As a result, will be analyzed the population redistribution process inside the metropolitan areasusing the idea of poverty redistribution. In this paper Belo Horizonte’s Metropolitan Area will be usedas reference.Key words: Urbanization. Metropolitan areas. Migrations.

FAUSTO BRITO

JOSEANE DE SOUZA

EXPANSÃO URBANA NAS GRANDES METRÓPOLESo significado das migrações intrametropolitanas e da

mobilidade pendular na reprodução da pobreza

grande expansão urbana no Brasil é relativamen-te recente. Seu início articula-se com um conjun-to de mudanças estruturais na economia e na so-

ciedade brasileira a partir da década de 30 do século 20,mas somente em 1970 os dados censitários revelaram umapopulação urbana superior à rural.

Isso não quer dizer que as cidades já não fizessem par-te da paisagem social do país desde os períodos da colô-nia e do Império, apesar de suas restritas dimensõesdemográficas. Na República Velha (1889/1930), com a gran-de expansão da economia cafeeira, e com o primeiro e ex-pressivo surto de industrialização, ampliaram-se as rela-ções mercantis entre as diferentes regiões brasileiras – atéentão, meros arquipélagos regionais – e começaram a seintensificar as migrações, principalmente as internacionais.Estas, fortemente financiadas pelo Estado, impunham li-mites à expansão dos deslocamentos populacionais inter-

nos – que começavam a dirigir-se, prioritariamente, paraos Estados onde a economia mais se expandia, ou seja, SãoPaulo e Rio de Janeiro.

Esses arquipélagos regionais, fundamentalmente arti-culados em torno das atividades agrícolas, mantinham umsistema de cidades polarizadas, geralmente, pelas capitaisdos Estados. A população urbana distribuía-se pelos dife-rentes sistemas regionais de cidades, fundamentalmentelitorâneos e fortemente concentrados na região Sudeste.Somente então, a partir da República Velha, é que essesarquipélagos regionais começaram a articular-se, nacio-nalmente, dentro de um processo de integração mercantilcomandado pelo complexo da economia cafeeira capitalista.

A partir dos anos 30 e 40, a urbanização incorporou-seàs profundas transformações estruturais por que passa-vam a sociedade e a economia brasileira. Ela assume, defato, uma dimensão estrutural: não é só o território que

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EXPANSÃO URBANA NAS GRANDES METRÓPOLES: O SIGNIFICADO DAS MIGRAÇÕES...

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 48-63, out./dez. 2005

acelera o seu processo de urbanização, mas é a própriasociedade brasileira que se transforma cada vez mais emurbana. Essa grande transformação urbana acompanharáo acelerado processo de industrialização da economia bra-sileira, que tem como marco inicial mais importante a se-gunda metade da década de 50, quando vai-se tornandocada vez mais intensa com a expansão dos sistemas detransportes e dos meios de comunicação de massas. Essagrande transformação deve ser entendida como a constru-ção irreversível da hegemonia do urbano, não só como olocus privilegiado das atividades econômicas mais relevan-tes e da população, mas também como difusora dos novospadrões de relações sociais – inclusive as de produção –e estilos de vida.

O Brasil arcaico, fortemente vinculado a uma estruturaagrária em profunda transformação, desarticulava-se atémesmo nas regiões de expansão da fronteira agrícola, onde,rapidamente, a economia camponesa cedia lugar ao gran-de capital. Essa grande mudança da sociedade brasileira,na segunda metade do século 20, incorporava como um dosseus principais vetores de transformação o chamado “gran-de ciclo de expansão das migrações internas”. As migra-ções internas faziam o elo maior entre as mudanças estru-turais por que passavam a sociedade e a economia brasileirae a aceleração do processo de urbanização (BRITO; HOR-TA, 2002).

Essa tendência a um crescente aumento no grau de ur-banização não constituiu uma novidade histórica. Os paí-ses capitalistas de primeira geração – como a Inglaterra –e os de segunda geração – como os do continente euro-peu, os Estados Unidos e o Japão – apresentaram, todos,a mesma tendência, ou seja, uma maciça transferência dapopulação do campo para as cidades, chegando a grausde urbanização que variam entre 85,0% a 95,0%.

A grande novidade, no caso brasileiro, semelhante aalguns outros países em desenvolvimento, foi a velocida-de do processo de urbanização, muito superior à dos paí-ses capitalistas mais avançados. Somente na segundametade do século 20, a população urbana passou de 19milhões para 138 milhões, multiplicando-se 7,3 vezes, comuma taxa média anual de crescimento de 4,1%. Ou seja, acada ano, em média, nessa última metade de século,2.378.291 habitantes eram acrescidos à população urbana.

No auge da expansão urbana, as altas taxas de fecun-didade ainda tiveram grande importância para esse excep-cional crescimento demográfico, pois somente a partir dasegunda metade da década de 60, quando ela se acelera ese generaliza, há o declínio dos níveis de fecundidade.

Contudo, a maior parte do crescimento demográfico urba-no deve ser explicada pelo intenso fluxo migratório rural-urbano, dentro do contexto do grande ciclo de expansãodas migrações internas. Somente entre 1960 e o final dosanos 80, o auge do ciclo, estima-se que saíram do campoem direção às cidades quase 43 milhões de pessoas – totalque inclui o chamado “efeito indireto da migração”, ou seja,os filhos tidos pelos migrantes rurais nas cidades. Trata-se de um deslocamento populacional gigantesco, num bre-ve espaço de tempo, o que bem qualifica a dimensão dasgrandes transformações pelas quais passava a sociedadebrasileira (CARVALHO; GARCIA, 2003).

Como foi mencionado, a migração interna em geral – enão só a rural-urbana – constituiu um dos elos mais impor-tantes entre as profundas mudanças estruturais e a gran-de transformação urbana. O intenso crescimento da eco-nomia urbano-industrial – que se deu depois do Plano deMetas e se estendeu até o final dos anos 70 – foi, do pontode vista espacial e social, extremamente desequilibrado.Muito concentrado no Estado do Rio de Janeiro e, maisainda, em São Paulo, o desenvolvimento da economia am-pliou os desequilíbrios regionais, inclusive entre a cidadee o campo, uma vez que este não conseguia gerar o núme-ro de empregos que atendesse ao crescimento da sua for-ça de trabalho. As migrações internas redistribuíam a po-pulação do campo para as cidades, entre os Estados e asdiferentes regiões do Brasil, inclusive onde se expandia afronteira agrícola. Mas elas se dirigiam, principalmente, paraas regiões metropolitanas, muito especialmente as do Su-deste – e, principalmente, a de São Paulo. Apesar do gran-de crescimento da economia e da oferta de empregos até ofinal da década de 70, as migrações internas, frutos dosdesequilíbrios econômicos e sociais nas regiões de origem,acabavam por reproduzi-los nas regiões de destino.

Essa maciça redistribuição da população favorável àscidades e, em destaque, às cidades metropolitanas, contri-buiu para definir um novo perfil para a sociedade brasilei-ra. Desde a sua criação, no início dos anos 70, até os diasatuais, as regiões metropolitanas sofreram inúmeras trans-formações, com a incorporação de novos municípios. Comoessa decisão é da competência das Assembléias Legisla-tivas, freqüentemente a delimitação de uma região metro-politana obedece muito mais a critérios políticos do queaos sociais, econômicos e demográficos.

Com o propósito de analisar mais fidedignamente a rea-lidade dos aglomerados metropolitanos, neste artigo seráutilizado o estudo desenvolvido pelo Instituto de Pesqui-sa Econômica Aplicada – Ipea, e do conjunto formado pelo

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FAUSTO BRITO / JOSEANE DE SOUZA

Núcleo de Economia Social, Urbana e Regional/Institutode Economia da Universidade de Campinas – Nesur/IE-Unicamp e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística– IBGE, no qual foram identificados os grupos de cidadesque realmente constituíam o verdadeiro aglomerado metro-politano (IPEA/IBGE/NESUR, 1999). Para definir o espaçourbano que realmente pudesse ser considerado um aglo-merado metropolitano, foram empregados indicadoresdemográficos e econômicos, assim como dos fluxos de bense serviços. Nesse artigo, optou-se por selecionar, dentreos grupos de cidades estabelecidos, aqueles que foramconsiderados aglomerações metropolitanas globais – SãoPaulo e Rio de Janeiro – e as aglomerações metropolitanasnacionais – Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Hori-zonte, Campinas, Curitiba, Porto Alegre, Goiânia e Brasília(Tabela 1).

A tendência à concentração populacional nos grandesaglomerados metropolitanos já era bastante nítida nos anos70 e 80, como resultado do fantástico fluxo migratório ve-rificado no período. Em 1970, contabilizava-se uma popu-lação de cerca de 93 milhões de habitantes para o país e

aproximadamente um terço desse total tinha como resi-dência municípios pertencentes às aglomerações metro-politanas. Considerando-se somente a população urba-na, essa proporção chega a quase 50%. Levando em contaque foi somente na década de 60 que a população urbanasuperou a rural, pode-se afirmar que a transformação ur-bana no Brasil foi tão acelerada que fez coincidir, no tem-po, a urbanização e a metropolização.

Como conseqüência dessa característica estruturalmarcante da sociedade brasileira, no final do século pas-sado um terço de sua população residia nos aglomera-dos metropolitanos selecionados. Quanto à populaçãourbana – cuja metade já era metropolitana em 1970 – háum relativo declínio. No final do século, apesar de ter maisdo que dobrado nas três últimas décadas, passando de25 milhões para 56 milhões, a participação relativa dapopulação metropolitana no total da população urbanapassa para 41,0% (Tabela 1). Essa redução foi resultantedo redirecionamento de parte das migrações internas,depois de 1980, para as cidades médias não metropolita-nas (BRITO; HORTA, 2002).

TABELA 1

População, segundo Aglomerados MetropolitanosBrasil – 1970-2000

Aglomerados Metropolitanos 1970 1980 1991 2000

Belém 669.768 1.021.486 1.401.305 1.794.981Fortaleza 1.070.114 1.627.042 2.339.538 2.901.040Recife 1.755.083 2.347.005 2.874.555 3.272.322Salvador 1.135.818 1.752.839 2.474.385 2.988.610Belo Horizonte 1.619.792 2.570.281 3.385.386 4.161.028Rio de Janeiro 6.879.183 8.758.420 9.796.649 10.847.106São Paulo 8.113.873 12.552.203 15.395.780 17.768.135Campinas 644.490 1.221.104 1.778.821 2.215.027Curitiba 809.305 1.427.782 1.984.349 2.634.410Porto Alegre 1.590.798 2.307.586 3.029.073 3.495.119Goiânia 424.588 807.626 1.204.565 1.606.955Brasília 625.916 1.357.171 1.980.432 2.746.747

Total dos Aglomerados 25.338.728 37.750.545 47.644.838 56.431.480População do Brasil 93.134.846 119.002.706 146.825.475 169.544.443Aglomerado/Brasil (%) 27,21 31,72 32,45 33,28População Urbana 52.097.271 80.436.409 110.990.990 137.697.439Aglomerado Urbano (%) 48,64 46,93 42,93 40,98Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970 a 2000.

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EXPANSÃO URBANA NAS GRANDES METRÓPOLES: O SIGNIFICADO DAS MIGRAÇÕES...

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 48-63, out./dez. 2005

O crescimento demográfico das aglomerações metropo-litanas tem sido declinante. Para melhor compreendê-lo, seráfeita a distinção entre o núcleo, que é a capital, e os demaismunicípios, que formam a periferia metropolitana. As capi-tais têm tido uma redução bastante acentuada em seu rit-mo de crescimento. As maiores cidades brasileiras, comoSão Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, na última déca-da do século 20, tiveram um crescimento anual extremamen-te baixo. Deve ser sublinhado que, em função do tamanhoda população dessas cidades, seu pequeno crescimentorepresentou 40,0% do total da população dos aglomeradosmetropolitanos. Nessa direção da redução da velocidadedo seu crescimento demográfico, caminham todos os nú-cleos dos aglomerados metropolitanos. Isso ocorre, emparte, pelo acentuado declínio das taxas de fecundidade,mas sobretudo pela redução de seus saldos migratórios(Tabela 2).

As periferias tiveram nos anos 70 e 80 um crescimentoespetacular que ainda se mantém bastante alto, apesar dedeclinante, pois elas também sofrem o impacto da reduçãoda fecundidade e das migrações. Mesmo assim, nas duasúltimas décadas, a velocidade de seu crescimento perma-neceu em torno de 3,0% ao ano. A crise econômicavivenciada pelo país provocou grande redução da ofertade empregos e somou-se à profunda crise social urbana,que tem afetado, em particular, os grandes aglomerados

metropolitanos. Assim, juntas, funcionaram como “freio”a uma possível tendência de hipermetropolização. Entre-tanto, um fato não pode deixar de ser sublinhado: na déca-da de 90, houve uma substancial desaceleração na quedadas taxas de crescimento do conjunto de aglomeradosmetropolitanos – o que possibilitou até mesmo um aumen-to do incremento médio anual de sua população: de 899.481habitantes, na década anterior, para 985.418.

De qualquer modo, os dados reafirmam a grandeespecificidade do processo de urbanização no Brasil – asimultaneidade da urbanização com a metropolização –acrescentando ainda uma nova característica: dentro dosaglomerados metropolitanos, há uma notável tendência aum maior crescimento dos municípios periféricos em rela-ção às capitais. Isso pode ser melhor observado quandose utiliza como indicador a contribuição relativa do núcleo,ou das capitais, para o crescimento absoluto dos aglome-rados metropolitanos.

Quando se analisa a contribuição do núcleo para o cres-cimento do aglomerado, nota-se que nos anos 80 ela já erainferior a 50,0% – e isto significa que as periferias começa-vam a ter o comando do crescimento demográfico metro-politano (Tabela 3). Na década de 90, o peso dos núcleosmetropolitanos continua a se reduzir, e os demais municí-pios passam a responder por 62,0% do incremento total dapopulação metropolitana – proporção maior do que a do

TABELA 2

Taxas de Crescimento Anual do Núcleo e da Periferia dos Aglomerados MetropolitanosBrasil – 1970-2000

AglomeradosNúcleo Periferia

1970/80 1980/91 1991/2000 1970/80 1980/91 1991/2000

Total dos Aglomerados 3,49 1,50 1,21 5,32 3,28 2,99Belém 3,95 2,65 0,31 9,26 5,36 14,29Fortaleza 4,30 2,78 2,15 4,18 5,42 3,31Recife 1,27 0,69 1,03 5,11 2,96 1,82Salvador 4,08 2,98 1,84 6,91 4,31 3,62Belo Horizonte 3,73 1,15 1,11 7,45 5,11 3,97Rio de Janeiro 1,82 0,67 0,74 3,39 1,49 1,66São Paulo 3,67 1,16 0,85 6,37 3,22 2,81Campinas 5,86 2,24 1,50 7,56 4,79 3,33Curitiba 5,34 2,29 2,13 7,24 4,72 5,15Porto Alegre 2,43 1,06 0,83 5,30 3,71 2,16Goiânia 6,54 2,31 1,90 7,48 10,94 7,01Brasília 8,15 2,84 2,77 7,38 7,00 7,18Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970 a 2000.

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FAUSTO BRITO / JOSEANE DE SOUZA

núcleo na década de 70. As únicas aglomerações metro-politanas que ainda apresentavam maior contribuição donúcleo, em 2000, eram Fortaleza, Salvador e Brasília. Entre-tanto, em consonância com as demais, ao longo do perío-do considerado, elas têm diminuído sua importância relati-va. Os dados indicam que o processo de metropolizaçãotem sido marcado pela redistribuição da população metro-politana favorável aos municípios periféricos, certamenteestimulada pela emigração da capital em direção às demaiscidades das aglomerações metropolitanas.

Assim, este artigo vai tomar como referência a RegiãoMetropolitana de Belo Horizonte – RMBH para estudar overdadeiro significado dos processos intrametropolitanos– principalmente os de migração e mobilidade.

Nos aglomerados metropolitanos, tem havido uma ten-dência ao deslocamento das atividades econômicas, prin-cipalmente as industriais, das capitais para os outros mu-nicípios, como decorrência das pressões do capitalimobiliário pelo uso dos espaços urbanos mais nobres epela ação do Estado – o que promove a regionalizaçãoeconômica e facilita as economias de aglomeração. Essarealocação espacial das atividades econômicas e a açãoconcomitante do capital imobiliário proporcionaram uma re-distribuição espacial da população através de uma inten-sa migração – prioritariamente, entre a capital dos aglome-rados urbanos e os municípios vizinhos. Finalmente, asmudanças econômicas e as conseqüentes migrações têm

implicado num grande movimento pendular da população:entre os residentes nos municípios vizinhos e a capital; eentre essa última e os primeiros, ainda que numa propor-ção menor (BRITO; SOUZA, 2005).

A RMBH está inserida na dinâmica demográfica e eco-nômica dos grandes aglomerados metropolitanos. Sendouma cidade relativamente recente, com pouco mais de cemanos, Belo Horizonte foi criada e planejada com o objetivoexplícito de manter regulada a distribuição espacial e so-cial da população. No decorrer de sua breve história, Es-tado e capital imobiliário promoveram uma permanenteredistribuição espacial da população, de acordo com asexigências do padrão de expansão urbana – que tem comouma de suas características básicas a segregação espacialda população mais pobre. Com o tempo, a expansão urba-na da capital extrapolou seus limites, invadindo os muni-cípios vizinhos e metropolizando a segregação social dosmais pobres (BRITO; SOUZA, 2005).

Em 2000, a RMBH tinha cerca de 4,4 milhões de habi-tantes, sendo que 51,5% deles ainda residiam na capital –proporção essa com nítida tendência decrescente (Tabela4 e Gráfico 1). Como o núcleo do aglomerado metropolita-no também obedece às mesmas características das maio-res capitais brasileiras, suas taxas de crescimento demo-gráfico têm apresentado considerável desaceleração.Atualmente, seu ritmo é muito inferior à média do conjun-to dos outros municípios metropolitanos (Gráfico 2).

TABELA 3

Participação do Núcleo no Incremento Populacional Médio Anual do AglomeradoBrasil – 1970-2000

Em porcentagem

Aglomerados Metropolitanos 1970/80 1980/91 1991/2000Total dos Aglomerados 58,50 45,10 37,93Belém 85,27 81,99 8,93Fortaleza 80,73 64,71 65,82Recife 24,19 17,88 31,10Salvador 80,19 79,45 71,10Belo Horizonte 57,43 29,36 27,01Rio de Janeiro 44,63 37,57 35,20São Paulo 57,87 40,55 32,03Campinas 50,07 32,82 27,58Curitiba 67,25 52,12 41,82Porto Alegre 33,47 19,12 20,71Goiânia 87,92 51,57 41,84Brasília 87,44 68,06 57,69Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970 a 2000.

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TABELA 4

Evolução da PopulaçãoRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 1940-2000

Anos BH RRMBH (1) RMBH1940 211.377 157.407 368.7841950 352.724 170.195 522.9191960 693.328 237.955 931.2831970 1.235.030 484.460 1.719.4901980 1.780.855 895.537 2.676.3921991 2.020.161 1.494.840 3.515.0012000 2.238.526 2.108.158 4.346.684Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1940 a 2000.(1) Municípios metropolitanos menos Belo Horizonte.

GRÁFICO 1

Evolução da PopulaçãoRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 1940-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1940 a 2000.(1) Municípios metropolitanos menos Belo Horizonte.

GRÁFICO 2

Taxas de Crescimento da PopulaçãoRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 1940-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1940 a 2000.(1) Municípios metropolitanos menos Belo Horizonte.

A participação relativa da capital mineira no incremen-to do total da população da RMBH tem diminuído, comgrande evidência, desde a década de 40. Nesse período,Belo Horizonte contribuía com 92,0% do crescimento dapopulação metropolitana e, em 2000, essa proporção caiupara apenas 26,3% (Tabela 5). Esse fenômeno de inversãoespacial do crescimento demográfico mostra como o co-mando do crescimento da RMBH não está mais nas mãosda capital mineira.

Esses indicadores expressam o padrão da expansãourbana metropolitana, no qual a inversão espacial docomando do crescimento populacional é uma das suas

dimensões mais importantes. O declínio generalizado dastaxas de fecundidade, verificado em todo o país – maisacentuadamente nas grandes cidades –, também teve umpapel relevante na redução das taxas de crescimentodemográfico das regiões metropolitanas, e de suas capitaisem particular. Porém, o papel das migrações foi muito maisimportante.

Belo Horizonte nunca foi o destino preferencial dos mi-grantes de outros Estados: ela atraía, de fato, aqueles quese deslocavam do interior de Minas Gerais. Atualmente,porém, seus emigrantes em direção ao interior também têmaumentado e, conseqüentemente, seu saldo migratório como interior mineiro tem diminuído (Tabela 6). Como seria dese esperar, os saldos com as outras regiões brasileiras têmsido negativos – à exceção do Nordeste, no caso a Bahia –e pouco expressivos. Para o objetivo deste artigo, o maisimportante é o grande saldo migratório negativo da capitalem relação aos outros municípios metropolitanos. Essagrande emigração da capital, extremamente superior àimigração, tem gerado saldos negativos crescentes, que sãoos grandes responsáveis pelas baixas taxas de crescimentopopulacional da capital. Na segunda metade da décadapassada, o saldo migratório negativo chegou a quase 124mil pessoas: cerca de 65% do incremento absoluto dapopulação de Belo Horizonte (Tabela 4). Esse fenômeno,vale a pena sublinhar, tem sido o maior responsável peloprocesso de inversão espacial do comando do crescimentodemográfico na RMBH e um dos traços marcantes do seupadrão de expansão urbana.

0

500.000

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1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000

Belo Horizonte RRMBH (1)

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1940/50 1950/60 1960/70 1970/80 1980/91 1991/00

Belo Horizonte RRMBH (1) RMBH

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FAUSTO BRITO / JOSEANE DE SOUZA

Esse padrão de expansão urbana da RMBH tem obede-cido às mesmas direções espaciais da expansão da cidadede Belo Horizonte, seguindo, regra geral, seu rígido siste-ma viário. Historicamente, foram se formando os seis gran-des Vetores de Expansão Urbana Metropolitanos (Veum):oeste, norte-central, norte, leste, sul e sudoeste (Mapa 1).1

O vetor oeste começa a se constituir, definitivamente,na década de 40: segue a rota da Avenida Amazonas até oBarreiro e se desdobra em direção, principalmente, às ci-dades de Contagem e Betim. Em 1941, o Governo do Esta-do criou, em Contagem, a Cidade Industrial, com o intuitode atrair novas indústrias, entretanto, não teve muito êxi-to.2 A implantação da siderúrgica Mannesmann, noBarreiro, na primeira metade dos anos 50, contribuiu parapotencializar a capacidade de atração industrial da região,fortemente limitada pela insuficiência de energia e trans-

porte. Posteriormente, no final da década e início dos anos60, superados os entraves da infra-estrutura, a Cidade In-dustrial inicia seu processo de consolidação. Em 1967, coma implantação da Refinaria Gabriel Passos, da Petrobras,Betim integra-se ao processo de expansão do vetor oesteda RMBH. Mas somente na década de 70, o municípioconsolida-se como região privilegiada para investimentosindustriais, devido à implantação da fábrica de automó-veis Fiat em 1976, e de um amplo setor industrial metal-mecânico (BRITO; SOUZA, 1996).

Esse importante corredor industrial estimulou tanto aconstrução de vários conjuntos habitacionais, por inicia-tiva governamental, quanto a construção de loteamentospara a população de baixa renda, pelo capital imobiliário.Essa intensa ocupação demográfica deu origem ao proces-so de conurbação de Belo Horizonte com o município de

TABELA 5

Taxas de Crescimento e Participação Relativa no Incremento PopulacionalRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 1940-2000

Em porcentagem

PeríodosTaxas de Crescimento Participação Relativa

BH RRMBH (1) RMBH BH RRMBH (1) RMBH

1940/50 5,25 0,78 3,55 91,70 8,30 100,001950/60 6,99 3,41 5,94 83,41 16,59 100,001960/70 5,94 7,37 6,32 68,73 31,27 100,001970/80 3,73 6,34 4,52 57,04 42,96 100,001980/91 1,15 4,77 2,51 28,54 71,46 100,001991/2000 1,16 3,93 2,41 26,26 73,74 100,00Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1940 a 2000.(1) Municípios metropolitanos menos Belo Horizonte.

TABELA 6

Imigrantes, Emigrantes e Saldos Migratórios, segundo a Origem e o DestinoRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 1986-2000

Regiões de Origem1986-1991 1995-2000

e Destino Imigrantes EmigrantesSaldo

Imigrantes EmigrantesSaldo

Migratório MigratórioR M B H 8.689 120.576 -111.887 17.092 140.836 -123.744Belo Horizonte 135.577 230.060 -94.483 142.069 249.660 -107.591Norte 3.352 3.718 -366 2.784 3.065 -281Nordeste 9.476 6.230 3.246 11.172 6.712 4.460Sudeste 21.487 29.966 -8.479 20.766 24.057 -3.291Sul 2.372 2.891 -519 2.781 2.673 108Centro-Oeste 4.305 6.214 -1.909 4.026 6.306 -2.280Interior de Minas Gerais 69.102 44.106 24.996 83.448 66.011 17.437Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 a 2000.

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Contagem, e deste com o de Betim. Apesar da realizaçãode investimentos estatais necessários à implantação doparque industrial, a fragilidade do controle público sobreo uso e a ocupação do solo permitiu ampla liberdade deatuação ao capital imobiliário – fato que gerou assentamen-tos sem a necessária infra-estrutura urbana. A incorpora-ção definitiva de Ibirité ao vetor oeste, com um crescimen-to populacional acelerado, nas duas últimas décadas, éexemplar dessa expansão imobiliária desordenada. A grandeexpansão urbana metropolitana por intermédio do vetoroeste tem sua identidade na combinação entre crescimen-to industrial e urbanização desordenada, fortemente impul-sionada pelo crescimento demográfico ativado pelas mi-grações intrametropolitanas (BRITO; SOUZA, 1996; 1998).

O vetor norte de expansão teve sua origem em BeloHorizonte, nas regiões da Pampulha e Venda Nova, e de-

senvolveu-se a partir dos eixos das Avenidas AntônioCarlos e Cristiano Machado. Para melhor compreensão desua dinâmica, esse vetor pode ser divido nas regiões nor-te-central e norte propriamente dita. O norte-central, maisdensamente povoado e com maior importância para a di-nâmica da RMBH, abrange os municípios de Santa Luzia,Vespasiano e Ribeirão das Neves. E o norte tem como prin-cipais municípios: Pedro Leopoldo e Lagoa Santa.

No vetor norte-central, o caso do município de Ribei-rão das Neves é clássico. Segundo Costa (2004), havia umconsiderável número de pequenas propriedades de terraque ocupavam apenas 13% do município. O restante doterritório era constituído por grandes propriedades, carac-terizadas, principalmente, pela baixa produtividade. Asterras do município eram pouco férteis, havendo, em algu-mas áreas, processos erosivos acentuados. Mesmo com

MAPA 1

Vetores de Expansão UrbanaRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 2002

Fonte: Fundação João Pinheiro.

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FAUSTO BRITO / JOSEANE DE SOUZA

terras de tão baixa qualidade, a principal atividade econô-mica era a produção de hortigranjeiros para atender o mer-cado da capital mineira.

Considerando a baixa produtividade de sua terra e aproximidade espacial de Ribeirão das Neves e Belo Hori-zonte – em franca expansão nas décadas de 60 e 70 – osloteamentos para assentamentos populares passaram arepresentar uma alternativa econômica mais atraente paraos grandes proprietários de terras. A possibilidade de in-dustrialização esbarrava na inexistência de uma infra-es-trutura adequada para a expansão do capital industrial, alémde uma reduzida oferta de mão-de-obra, já que sua popula-ção era extremamente escassa até os anos 60. Foram jus-tamente os loteamentos populares – e não qualquer pos-sibilidade de crescimento de oferta de empregos – osresponsáveis pelo notável crescimento demográfico domunicípio na década de 60 até os dias atuais.

Outros municípios, como Santa Luzia e Vespasiano,também situados no vetor norte-central, apresentavam –além dos loteamentos populares – condições mais favorá-veis para a instalação de plantas industriais, devido a es-tímulos governamentais por meio da criação de distritosindustriais. Entretanto, esses municípios não conseguiramreproduzir o crescimento industrial do vetor oeste. Com apredominância demográfica de Ribeirão das Neves e suasaltas taxas de crescimento demográfico, o vetor norte-cen-tral acabou se tornando um verdadeiro “pólo de atraçãode pobreza”.

O vetor norte, no extremo da RMBH, teve seu cresci-mento vinculado à criação de algumas indústrias de cimen-to e derivados, desde a década de 60, no município de PedroLeopoldo. Lagoa Santa, além de ser uma base da Aeronáu-tica, também se distingue como uma área de condomíniose sítios para a classe média e alta. A construção do aero-porto de Confins, nos anos 80, até o momento, não foisuficiente para viabilizar sua maior expansão. A interaçãodemográfica desse vetor com o núcleo da RMBH é bas-tante inferior à do vetor norte-central.

Constituído dos municípios de Caeté e Sabará, o vetorleste, assim como boa parte da Região Norte da RMBH,também teve origem na expansão da Avenida CristianoMachado e do bairro Cidade Nova. Apesar de apresentaruma importância demográfica menor que a dos dois vetoresanalisados anteriormente, ele também se integra ao espaçourbano metropolitano com loteamentos para a populaçãode baixa renda que praticamente criaram uma cornubaçãode Sabará com a capital mineira. Note-se que esta cidadecolonial tem-se transformado em município-dormitório para

muitos que trabalham em Belo Horizonte (BRITO; SOUZA,1998).

Os municípios de Nova Lima e Brumadinho são osprincipais do vetor sul, e o primeiro situa-se em áreacontígua à zona sul de Belo Horizonte. A expansão dessevetor foi potencializada pela construção do BH Shopping,na década de 70, e pela expansão da Avenida NossaSenhora do Carmo e da BR-040. A instalação desseshopping constitui um marco no processo de ocupação daárea, pois acelerou o crescimento da metrópole sobre NovaLima (COSTA, 2004). Além disso, a criação e o rápidodesenvolvimento do bairro Belvedere III provocou umasupervalorização dos terrenos nessa região, que foi deter-minante para a consolidação desse vetor.

Essa região é caracterizada fundamentalmente pelaeficiente atuação combinada do mercado imobiliário e dascompanhias mineradoras, ambas articuladas, distinguindo-se dos outros vetores pela ocupação dos loteamentos poruma população de renda mais elevada, em boa parte sob aforma de condomínios. A construção desses condomíniosiniciou-se no começo na década de 60 com o Retiro dasPedras, em Brumadinho, e o Serra Del Rey, em Nova Lima,e proliferou-se nos últimos 20 anos. Vale ressaltar que opreço do solo – regulado pelo mercado imobiliário, comosalienta Cardoso (2001) – tem um forte componenteespeculativo, pois aposta na formação de estoques paraadministrar a valorização do preço da terra urbana. Assim,este preço torna-se uma poderosa ferramenta para sele-cionar o acesso dos emigrantes às diversas áreas oumunicípios metropolitanos. O grande monopólio dapropriedade de terra em Nova Lima, por exemplo, possibilitaque o mercado imobiliário disponibilize seus estoquessegundo suas necessidades de valorização, para diferentesfins. Esse fato contribui para selecionar os emigrantessegundo as exigências da expansão urbana que mais lhesinteressa.

O crescimento do vetor sudoeste tem sido produto nãosó da sua interação com o núcleo da RMBH – o municípiode Belo Horizonte –, mas também com o vetor oeste. A suaexpansão é recente e, até os anos 80, era comandada pelomunicípio de Mateus Leme que, dividido, deu origem ao deJuatuba. A existência de uma indústria de cerveja na regiãonão foi suficiente para garantir o crescimento sustentadoda região. Igarapé, outro município do vetor, faz parte docinturão de produção de hortigranjeiros para a populaçãoda RMBH, principalmente a de Belo Horizonte. Na últimadécada, o município que mais cresceu demograficamente,sem nenhuma contrapartida econômica satisfatória, foi o de

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Esmeraldas, onde residiam, em 2000, mais de um terço dapopulação do vetor sudoeste.

Os indicadores demográficos são significativos paramostrarem a dinâmica desses vetores entre 1970 e 2000. Háuma grande concentração populacional, ainda que decres-cente, no núcleo da RMBH, a partir do qual os vetores seexpandiram: em 2000, nele residia pouco mais da metade dapopulação metropolitana (Tabela 7). Essa concentraçãotorna-se ainda mais notável quando se acrescentam os doisprincipais vetores de expansão – o oeste e o norte-central –e então a população residente chega a quase 90,0%.Acrescentando-se os vetores leste (principalmente Sabará)e sul (em particular Nova Lima), esse espaço urbano,construído em função dos dois principais vetores de ex-

pansão cujo ponto de partida foi a própria capital, constituijunto com ela o verdadeiro aglomerado metropolitano.

O crescimento demográfico do vetor norte-central temsido o mais acelerado desde os anos 70, seguido pelo oes-te – ainda que ambos estejam passando por uma expressi-va desaceleração. Ao contrário deles, outros vetores – cujaexpansão tem sido mais recente – mantiveram seu cresci-mento, mesmo que numa proporção muito menor. Dentrodo processo de redistribuição e inversão espacial do cres-cimento populacional, o núcleo da RMBH tende a uma certaestagnação demográfica (Tabela 8).

Os dados sobre a velocidade do crescimento popula-cional devem ser analisados acompanhados da participa-ção relativa no crescimento absoluto da população. São

TABELA 7

População, segundo Vetores de Expansão UrbanaRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 1970-2000

Vetores de Expansão 1970 1980 1991 2000

R M B H 1.719.490 2.676.392 3.515.001 4.346.684Belo Horizonte 1.235.030 1.780.855 2.020.161 2.238.526Oeste 168.558 404.630 713.198 1.002.649Norte-Central 47.437 152.198 336.545 523.180Norte 77.057 97.295 130.177 165.408Leste 70.315 94.838 122.989 151.761Sul 81.361 90.332 108.148 128.896Sudoeste 39.732 56.244 83.783 136.264Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970 a 2000.

TABELA 8

Taxas Anuais de Crescimento e Participação Relativa no Incremento Populacional, segundo Vetores de Expansão UrbanaRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 1970-2000

Em porcentagem

Vetores de ExpansãoTaxas de Crescimento Participação Relativa

1970/80 1980/91 1991/2000 1970/80 1980/91 1991/2000

R M B H 4,52 2,51 2,43 100,00 100,00 100,00Belo Horizonte 3,73 1,15 1,17 57,04 28,54 26,26Oeste 9,15 5,29 3,93 24,67 36,80 34,80Norte-Central 12,36 7,48 5,12 10,95 21,98 22,44Norte 2,36 2,68 2,75 2,11 3,92 4,24Leste 3,04 2,39 2,41 2,56 3,36 3,46Sul 1,05 1,65 2,01 0,94 2,12 2,49Sudoeste 3,54 3,69 5,66 1,73 3,28 6,31Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970 a 2000.

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justamente a capital e os vetores, que tem desacelerado oseu crescimento, os grandes responsáveis pelo incremen-to populacional da RMBH, ou seja, pela ordem, vetor oes-te, Belo Horizonte e vetor norte. Como já foi dito, o notá-vel é que, recentemente, o comando do crescimentopopulacional da RMBH – diferentemente da década de 70– tem sido responsabilidade dos dois vetores menciona-dos: quase 60,0%. Considerando-se os outros vetores,essa proporção chega perto dos 74,0%. Trata-se, sem dú-vida, de uma redistribuição espacial da população muitomarcante – e este é um dos traços do processo da expan-são urbana recente da RMBH (Tabela 8).

MIGRAÇÕES INTRAMETROPOLITANAS EMOBILIDADE PENDULAR NA RMBH

A migração intrametropolitana, ou seja, a mobilidade dapopulação entre os seus diferentes municípios, é um bomindicador do grau de interação entre eles e, portanto, dadensidade social do espaço metropolitano construído pormeio dos vetores de expansão. No caso da RMBH – assimcomo nos principais aglomerados metropolitanos no Bra-sil – essas migrações têm sido resultantes, principalmen-te, do movimento do capital imobiliário junto com o Esta-do, com o objetivo de redistribuir social e espacialmente apopulação.

A análise da migração intrametropolitana levará emconsideração a direção de seu fluxo mais importante, ouseja, o dos emigrantes de Belo Horizonte para os diferentesvetores de expansão urbana, não só pela sua dimensão,mas também pela importância para testar a hipótese daredistribuição espacial da pobreza. Chama a atenção, de

imediato, a grande concentração dos emigrantes nos doisqüinqüênios. Já havia sido mostrado que essa grandeevasão populacional da capital, junto com o declínio dastaxas de fecundidade total, têm sido os grandes res-ponsáveis pela redução das taxas de crescimento demo-gráfico (Tabela 9).

Os municípios pertencentes aos vetores oeste e norte-central têm sido os que mais recebem os emigrantes: nasegunda metade dos anos 80, representavam cerca de87,0% do total do fluxo. Há uma grande consistência nessesresultados; afinal de contas, são os vetores que mais cres-cem demograficamente, ainda que tenham característicaseconômicas muito distintas. Comparado com o anterior, operíodo mais recente analisado mostra um acréscimo nonúmero de emigrantes para todos os vetores – ainda que,no caso do oeste, esse número tenha se mantido pratica-mente estável. Houve uma redução relativa dos doisgrandes vetores de expansão, e esse fenômeno foi favorá-vel aos outros: o sul e o sudoeste mais do que dobraramo número dos seus imigrantes originários de BeloHorizonte.

As emigrações de Belo Horizonte têm alimentado a ex-pansão urbana na RMBH e são fundamentais na consti-tuição do espaço social metropolitano que se articula pormeio dos vetores de expansão. É no espaço metropolitanoque essa migração reproduz as desigualdades sociais ine-rentes às características dos seus diferentes vetores, dan-do sentido à expansão urbana metropolitana. De fato, umaevidência mais precisa sobre a reprodução das desigual-dades reivindica uma análise dos atributos dos emigran-tes. Como não houve mudanças substanciais entre os doisperíodos (1986/1991 e 1995/2000), a reflexão se desenvol-

TABELA 9

Emigrantes, segundo Vetores de Expansão UrbanaRegião Metropolitana de Belo Horizonte – 1986-2000

1986-91 1995-2000Vetores de Expansão

Nos Absolutos % Nos Absolutos %

Belo Horizonte 120.574 100,00 140.836 100,00Oeste 58.126 48,21 58.541 41,57Norte-Central 46.076 38,21 51.844 36,81Norte 3.664 3,04 7.005 4,97Leste 5.425 4,50 7.686 5,46Sul 2.470 2,05 5.354 3,80Sudoeste 4.813 3,99 10.406 7,39Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000.

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verá, exclusivamente, sobre os emigrantes mais recentes(BRITO; SOUZA, 1998).

A estrutura etária é aquela prevista pela teoria das mi-grações, pois ela é seletiva por idade: encontra-se umagrande concentração de emigrantes entre 15 e 39 anos(55,0%, aproximadamente), e, nessa faixa, observa-se pre-dominância de mulheres (Gráfico 3). Deve ser mencionadoque os dados de migração de data fixa não incluem,logicamente, os nascidos no período mencionado. Como

se sabe, o Censo Demográfico 2000 pergunta aos residen-tes: “Em qual município residia em 1995?”.

Segundo as respostas dadas sobre a renda de sua ocupa-ção principal, a maioria dos emigrantes intrametropolitanosvindos de Belo Horizonte é pobre. Considerando inicialmenteo salário mediano dos emigrantes, constata-se que a metadedeles recebe menos do que 2,2 salários mínimos. O saláriomédio é quase o dobro – fato resultante da grande dispa-ridade entre os salários dos emigrantes para os diferentesvetores de expansão. A variação entre os salários medianos,segundo os diferentes destinos, não é muito grande: fica emtorno de 2 a 2,5 salários mínimos. A grande diferença é ovetor sul, onde a metade dos emigrantes recebe, pelo menos,7,3 salários mínimos. É a região que concentra condomíniospara a população de nível de renda mais alta – o que justificaessa discrepância (Tabela 10).

A tese de que a emigração intrametropolitana promoveuma substancial redistribuição da população mais pobrede Belo Horizonte em direção aos principais vetores deexpansão urbana metropolitana parece confirmada pelosdados. Os salários médios e medianos dos emigrantes paraos vetores oeste e o norte-central (que são os que rece-bem o maior número deles, quase 80,0%) estão entre os maisbaixos e com as menores diferenças entre eles. Este fatosugere uma distribuição mais homogênea dos salários –ou, em outras palavras, uma grande homogeneização dapobreza. Por outro lado, a maior diferença entre os saláriosmédios e medianos ocorre justamente no vetor sul, ondeeles têm os maiores valores – o que sugere maior disper-são na distribuição dos salários, certamente acompanha-da de maior concentração.

Com certeza, a distribuição dos salários poderá colocarmais luz nas reflexões. Consistentemente com os indica-

GRÁFICO 3

Estrutura Etária dos Emigrantes para os OutrosMunicípios Metropolitanos, por Sexo

Belo Horizonte – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

TABELA 10

Salário Médio e Mediano dos Emigrantes Maiores de 10 Anos, segundoVetores de Expansão Urbana

Belo Horizonte – 2000

Em salários mínimos

Vetor de Expansão Média MedianaBelo Horizonte 4,1 2,2Oeste 3,7 2,5Norte-Central 2,8 2,0Norte 5,1 2,5Leste 3,3 2,0Sul 13,9 7,3Sudoeste 6,0 1,9Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

-10 -5 0 5 10

0 a 45 a 9

10 a 1415 a 1920 a 2425 a 2930 a 3435 a 3940 a 4445 a 4950 a 5455 a 5960 a 6465 a 6970 a 7475 a 79

80+ MulheresHomens

%%

-10 -5 0 5 10

0 a 45 a 9

10 a 1415 a 1920 a 2425 a 2930 a 34

35 a 3940 a 4445 a 4950 a 5455 a 5960 a 6465 a 6970 a 7475 a 79

80 +

% %

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FAUSTO BRITO / JOSEANE DE SOUZA

dores sintéticos, ela mostra quase a metade dos emigrantescom salários inferiores a dois mínimos, e apenas 5,5% commais de dez – o que confirma a predominância dos maispobres. Mas as diferenças entre as distribuições dossalários dos emigrantes para os vários vetores são maisesclarecedoras. Mais de 56% dos que se mudaram para onorte-central, um dos que mais recebe emigrantes, têm umaremuneração da ocupação principal inferior a dois saláriosmínimos, e há apenas 2,1% com mais dez. Em situaçãosemelhante, encontram-se os emigrantes para os vetoresleste e sudoeste. Nesse último, a proporção dos maispobres chega a mais de 62%. Os emigrantes que semudaram para o vetor oeste, o destino preferencial deles,apresentavam uma distribuição de salários mais próxima damédia (Tabela 11).

A grande especificidade é a dos emigrantes para o vetorsul: os mais pobres são pouco mais de 21%, enquantoaqueles com mais de 10 salários mínimos de remuneraçãochegam a quase 42%. Tal distribuição, muito distinta damédia, acontece nas regiões com os terrenos mais valori-zados, como os condomínios, em que uma população maispobre é necessária para a prestação de serviço e para ocomércio, indispensáveis à reprodução das famílias de ren-da mais alta (BRITO; SOUZA, 1998).

Sabe-se que o número de mulheres emigrantes é maiordo que o dos homens. Desse modo, uma informação adicio-nal para a análise seria a distribuição do salário da ocupa-ção principal segundo o sexo (Gráfico 4). A porcentagemde mulheres com uma remuneração igual a ou menor do quedois salários mínimos é muito superior à dos homens. Nasremunerações mais altas, a proporção relativa dos homens

é sempre superior. Não se trata de algo surpreendente:apenas reflete o padrão de organização da sociedade e daeconomia, no qual há discriminação por sexo desfavorá-vel às mulheres – até mesmo na escala de remuneração dotrabalho. Mais ainda: o mercado de trabalho reserva paraas mulheres grande parte das atividades do setor serviços– em particular, dos serviços domésticos – com uma remu-neração extremamente baixa.

O nível educacional é outro atributo dos emigrantes quepoderá ampliar a análise sobre as migrações e o processode segregação social e espacial no aglomerado metropoli-tano de Belo Horizonte. Somente a população adulta, com

TABELA 11

Distribuição dos Emigrantes Maiores de 10 Anos, por Renda da Ocupação Principal (1), segundo Vetores de Expansão UrbanaBelo Horizonte – 2000

Vetores de ExpansãoRenda da Ocupação Principal em SM (%) Total de

Até 1 SM Mais de 1 Mais de 2 Mais de 3 Mais de 5 Mais de 10 Mais de Emigrantesa 2 SM a 3 SM a 5 SM a 10 SM a 15 SM 15 SM (Nos Abs.)

Belo Horizonte 15,68 33,42 15,94 17,15 12,28 2,63 2,90 64.042Oeste 12,80 31,34 16,39 19,70 14,99 2,94 1,85 28.432Norte-Central 17,53 38,71 17,16 16,09 8,37 1,13 1,01 22.877Norte 21,40 25,15 10,94 15,76 16,31 4,85 5,61 2.907Leste 18,16 34,59 14,93 15,34 13,52 2,31 1,15 3.469Sul 6,51 14,50 9,58 9,39 18,23 12,61 29,18 2.704Sudoeste 26,42 36,03 14,43 12,51 6,82 0,85 2,96 3.653Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1940 a 2000.(1) Em salários mínimos (SM).

0,00

5,00

10,00

15,00

20,00

25,00

30,00

35,00

40,00

45,00

Até 1 SM Mais de 1 a 2SM

Mais de 2 a 3SM

Mais de 3 a 5SM

Mais de 5 a10 SM

Mais de 10 a15 SM

Mais de 15SM

Homens Mulheres

Em %

GRÁFICO 4

Distribuição dos Emigrantes para os Outros Municípios Metropolitanos,por Sexo, segundo Renda da Ocupação Principal (1)

Belo Horizonte – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.(1) Em salários mínimos(SM).

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EXPANSÃO URBANA NAS GRANDES METRÓPOLES: O SIGNIFICADO DAS MIGRAÇÕES...

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 48-63, out./dez. 2005

20 anos ou mais, será objeto das reflexões: ao estudá-la,será utilizada a informação sobre os anos de estudo. Osanalfabetos e aqueles com menos de quatro anos de estu-do serão considerados “analfabetos funcionais” – o queparece razoável, levando em conta a idade da populaçãoescolhida, a qualidade insuficiente do sistema de ensino eas exigências educacionais atuais do mercado de trabalho.Como seria de se esperar, em função da análise dos anosde estudo, a proporção de analfabetos funcionais é alta:36,2%. Em alguns vetores, como o norte-central, a porcen-tagem chega a cerca de 42%; e no sudoeste ultrapassa ametade dos emigrantes. O vetor sul – de acordo com osdados sobre os salários e com suas próprias característicasanalisadas anteriormente – é o que apresenta a menor pro-porção de analfabetos funcionais (Tabela 12 e Gráfico 5).

As desigualdades encontradas entre as característicasdos emigrantes mostram a relação entre a redistribuiçãoespacial da população e o processo de segregação socialexistente segundo os diferentes vetores de expansão ur-bana metropolitana. Em grande medida, o padrão de segre-gação é comandado pelo capital imobiliário, com a colabo-ração dos investimentos públicos estatais quanto àdefinição do diferencial de preços do solo urbano. Entre-tanto, esse padrão promove uma redistribuição social dapopulação, mas não homogênea. Isso é fundamental naconstituição do espaço urbano metropolitano. Os fluxosmigratórios para os vetores onde a população é mais po-bre tendem a ser mais homogêneos: o norte-central e o oeste– que é o destino de cerca de 80,0% dos emigrantes – sãoexemplares. Há rigidez nas fronteiras espaciais e sociais,uma delimitação territorial notável. Por outro lado, os emi-

TABELA 12

Distribuição dos Emigrantes com 20 Anos ou Mais, por Anos de Estudo, segundo Vetores de Expansão UrbanaBelo Horizonte – 2000

Anos de Estudo (%) Total dosVetores de Expansão 0 a 4 5 a 8 8 a 11 11 a 17 Mais de Emigantes

Anos Anos Anos Anos 17 Anos (Nos Abs.)Belo Horizonte 36,18 33,97 23,13 6,03 0,69 97.833Oeste 30,86 35,36 27,14 5,96 0,68 42.027Norte-Central 41,68 36,29 19,84 1,65 0,55 35.160Norte 35,34 24,13 29,06 11,01 0,46 4.779Leste 34,02 36,06 22,50 6,09 1,32 5.382Sul 19,31 12,85 20,90 45,65 1,29 3.790Sudoeste 52,59 30,43 12,67 3,47 0,85 6.695Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

0,00

5,00

10,00

15,00

20,00

25,00

30,00

35,00

40,00

0 a 4 Anos 5 a 8 Anos 8 a 11 Anos 11 a 17 Anos Mais de 17 Anos

Homem MulherEm %

GRÁFICO 5

Distribuição dos Emigrantes para os OutrosMunicípios Metropolitanos, por Sexo, segundo Anos de Estudo

Belo Horizonte – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

grantes para o vetor sul, mesmo tendo a maior proporçãode pessoas com alto nível de renda e educação, constituemum fluxo mais heterogêneo.

Mesmo que em função da profunda crise urbana existamfavelas ou condomínios, onde o território é fortemente deli-mitado, retratando, de um lado e de outro, um espaço socialimpenetrável, a estrutura social e espacial urbana requeruma maior flexibilidade social na distribuição da populaçãoem função das necessidades do mercado de trabalho. Amão-de-obra exigida pela população mais rica para ofereceras mercadorias e os serviços indispensáveis à sua repro-dução, no caso brasileiro, ainda estão distante de dispensar

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FAUSTO BRITO / JOSEANE DE SOUZA

a proximidade de uma parcela da população mais pobre.Para melhor elucidar a relação entre a residência e o lo-

cal de trabalho dentro do padrão de urbanização, torna-senecessário analisar a mobilidade pendular – ou seja, aque-la realizada por quem reside em um determinado municípioe realiza suas atividades em outro, com regularidade.

Neste artigo, os pendulares são aqueles que residem emoutro município da RMBH e trabalham em Belo Horizonte,ou, ao contrário, moram em Belo Horizonte e trabalham emoutro município metropolitano. A mobilidade pendular éuma função, principalmente, da migração intrametropolitanadeterminada pela expansão dos vetores urbanos e metro-politanos. Ela – mais do que as migrações – é uma evidên-cia do vigor do tecido social construído sobre o espaçometropolitano, onde o modo de expansão urbana cria umadistância necessária entre o lugar de residência e o de tra-balho. Isso pode se dar porque a população mais rica es-colheu residir em lugares onde as externalidades positivascompensam os custos adicionais da distância, ou, no casodos mais pobres, pela coerção do mercado imobiliário e,em menor proporção, em função do mercado de trabalho.

Segundo a pesquisa “Origem e Destino”, 212.397 pes-soas residem em outros municípios metropolitanos e tra-balham em Belo Horizonte, sendo que a maioria procededos vetores oeste e norte-central – o que faz sentido comodecorrência do tamanho da população dos vetores e dovolume da emigração de Belo Horizonte. O movimento em

TABELA 13

Movimentos Pendulares por Motivo de Trabalho,segundo Vetores de Residência

Região Metropolitana de Belo Horizonte – 2002

Vetores deResidem na RRMBH (1)

Residem em

Residênciae Trabalham em

Belo Horizonte

Belo Horizontee Trabalham

na RRMBH (1)R M B H 212.397 76.404Oeste 100.000 56.221Norte-Central 79.975 9.059Norte 3.450 2.221Leste 19.904 1.984Sul 7.949 6.086Sudoeste 1.119 833Fonte: FJP. Pesquisa Origem e Destino, 2002.(1) Municípios metropolitanos menos Belo Horizonte.

sentido contrário é bem menor e concentrado no vetoroeste, em função das possibilidades de seu mercado detrabalho (Tabela 13).

A desigualdade na construção do tecido social do espa-ço metropolitano pode ser mais uma vez compreendida quan-do se observa que quase 70,0% dos que fazem o movimen-to pendular para trabalharem em Belo Horizonte residiamantes nessa mesma cidade, sendo que em alguns municí-pios essa proporção ultrapassa essa média, como é o caso

TABELA 14

Movimentos Pendulares por Motivo de Trabalho, de Alguns Municípios da RMBH para Belo Horizonte,de Pessoas que Residiam Anteriormente em Belo Horizonte

Região Metropolitana de Belo Horizonte – 2002

Municípios da Residem na RMBH e Trabalham Residem na RMBH e Trabalham ParticipaçãoRMBH em Belo Horizonte (origem BH) na RRMBH (1) (%)R M B H 143.768 212.397 67,69Contagem 38.699 59.177 65,40Ribeirão das Neves 28.314 40.332 70,20Santa Luzia 20.350 29.391 69,24Sabará 15.056 18.762 80,25Ibirité 13.876 20.027 69,29Betim 9.080 16.725 54,29Vespasiano 7.266 9.818 74,01Nova Lima 3.556 5.706 62,45Esmeraldas 1.259 1.904 66,12Outros Municípios 6.312 10.555 59,80Fonte: FJP. Pesquisa Origem e Destino, 2002.(1) Municípios metropolitanos menos Belo Horizonte.

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de Sabará (Tabela 14). Ou seja, provocada em grande partepelo movimento do capital imobiliário, a migração intrame-tropolitana leva à mudança de residência, entretanto, devi-do à forte seletividade da migração, obriga os cidadãos aretornarem diariamente a Belo Horizonte para trabalhar.

Concluindo, os fenômenos observados dentro da expan-são dos vetores urbanos metropolitanos da RMBH certa-mente têm muito em comum com o padrão de outros aglo-merados metropolitanos, pelo menos no fundamental – ametropolização da pobreza. No contexto da grande desi-gualdade social, assim como dos graves desequilíbriosregionais – marcas históricas da sociedade brasileira – asgrandes mudanças estruturais ocorridas na segunda me-tade do século 20 tornaram simultâneas a urbanização e ametropolização. Como conseqüência, o padrão de expan-são urbana dos aglomerados metropolitanos, com um cres-cimento demográfico extremamente acelerado, transferiu ocomando desse crescimento para os municípios periféri-cos à capital, por meio de intensa migração intrame-tropolitana. Na verdade, essa transferência do comando docrescimento populacional foi resultante da redistribuiçãoespacial da população mais pobre, sob o comando do ca-pital imobiliário e supervisão do poder público. Em sínte-se, resultante da estrutura social e espacial desses gran-des aglomerados metropolitanos, que é alinhavada por umagrande desigualdade social.

NOTAS

1. Os municípios que formam os vetores são os seguintes: vetoroeste: Betim, Contagem, Ibirité, Mario Campos e Sarzedo; vetornorte-central: Ribeirão das Neves, Santa Luzia,Vespasiano e SãoJosé da Lapa; vetor norte: Baldim, Capim Branco, Lagoa Santa,Confins, Jaboticatubas, Matosinho, Nova União, Pedro Leopoldo;vetor leste: Caeté e Sabará; vetor sul: Nova Lima, Brumadinho, Ra-posos, Rio Acima, Rio Manso; vetor sudoeste: Florestal, Igarapé,São Joaquim de Bicas, Mateus Leme, Juatuba, Esmeraldas.

2. Essa análise da formação dos Vetores de Expansão Urbana Me-tropolitanos encontra-se em Brito e Souza (2005).

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IPEA/IBGE/NESUR. Caracterização e tendências da redeurbana no Brasil. Campinas: IE/Unicamp, 1999.

FAUSTO BRITO: Doutor em Demografia, Professor e Pesquisador doCedeplar e do Departamento de Demografia da UFMG.

JOSEANE DE SOUZA: Mestre em Demografia pelo Cedeplar da UFMG.

Artigo recebido em 3 de junho de 2005.Aprovado em 1 de julho de 2005.

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MARIA CÉLIA SILVA CAIADO

N

Resumo: O objetivo do artigo é avaliar as alterações na distribuição e mobilidade espacial da população,que podem ser associadas ao processo de urbanização e estruturação intra-urbana na Região Integrada deDesenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – Ride. A região apresenta especificidades relacionadasao processo de desenvolvimento econômico, à ocupação territorial e à gestão urbana, que a diferenciadas demais regiões metropolitanas nacionais. Contudo, assemelha-se a elas no que se refere às desigualdadesno processo de distribuição da população.Palavras-chave:Deslocamentos intra-urbanos. Distribuição socioespacial da população. Estruturaçãointra-urbana.

Abstract: The objective of this paper is to evaluate the alterations in the distribution and in the sociospatial mobilite of the population that may be associated to the urbanization process and to the intraurban structuring in the Ride – Integrated Region of Development of Federal District and Adjacency.The Ride presents specific characteristics related to the process of economical development, to theterritorial occupation and to the urban administration, which differs it from the other urban agglomerationsand from the national metropolitan areas, resembling itself however, as for the inaqualities in the processof socio spatial distribution of the population.Key words: Socio spatial distribution of the population. Population mobility. Functional organizationof the metropolitan regions.

MARIA CÉLIA SILVA CAIADO

DESLOCAMENTOS INTRA-URBANOS EESTRUTURAÇÃO SOCIOESPACIAL NA

METRÓPOLE BRASILIENSE

o Brasil pós-industrialização, as migrações inter-nas refletem processos complexos, com transfor-mações sucessivas das áreas de atração e da

natureza dos fluxos, que vão se transformando de rural-urbano para urbano-urbano.

Os movimentos migratórios internos assumiram carac-terísticas diferenciadas, relacionadas às diversas fases doprocesso de desenvolvimento brasileiro. No período 1940-1980, eles foram alimentados por fortes desequilíbrios re-gionais e estruturaram-se para atender às necessidades detransferência regional do excedente de força de trabalho,cumprindo importante papel como mecanismo de integração

social e cultural do território nacional (PACHECO;PATARRA, 1997).

Após a década de 80, o contexto de crise e recessãocontribuiu para alterar as trajetórias principais dosmigrantes internos. Os movimentos de longa distânciaderam lugar aos de curta distância, e a trajetória rural-ur-bano cedeu espaço para movimentos do tipo urbano-ur-bano.

Entre as alterações nos movimentos migratórios, ocor-ridas nas últimas décadas, com impacto no processo de dis-tribuição da população no espaço intra-urbano, destacam-se:

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DESLOCAMENTOS INTRA-URBANOS E ESTRUTURAÇÃO SOCIOESPACIAL...

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 64-77, out./dez. 2005

decréscimo nos fluxos migratórios de longa distância;

intensificação da migração de retorno; consolidação da

migração intrametropolitana; aumento dos movimentos

migratórios intra-regionais e de curta distância; predomínio

das migrações do tipo urbano-urbano; aumento dos

movimentos pendulares da população (BAENINGER, 2000,

p. 8).

Na análise sobre os movimentos do tipo urbano-urba-no, é importante ressaltar a negação da associação entremobilidade espacial e mobilidade social, que são caracte-rísticas dos movimentos tipo rural-urbano e foram predo-minantes durante o período mais intenso do processo deurbanização brasileiro. As transformações na estruturaeconômica, ligadas à crise e ao processo de reestruturaçãoprodutiva, introduzem a percepção sobre a noção de es-tratégia de sobrevivência da população como motivaçãopara os deslocamentos intra-urbanos (BRITO, 1999).

Assim, a nova face dos movimentos migratórios inter-nos apresenta uma tipologia de movimentos bem mais com-plexos que as regularidades encontradas nas migrações delonga distância.

Os deslocamentos populacionais de curta distância as-sumem papel preponderante na estruturação1 do espaçointra-urbano. O espaço nas cidades e metrópoles contem-porâneas se estrutura a partir das mediações dos conflitosentre as vantagens e desvantagens, ou seja, da apropria-ção diferenciada da localização no espaço urbano. Aotimização dos gastos com o tempo despendido nos deslo-camentos intra-urbanos assume papel fundamental na gera-ção do diferencial entre as localizações urbanas, em funçãodas condições de acessibilidade, interferindo no processode apropriação diferenciada das vantagens e recursos doespaço urbano. Nesse sentido, as condições de acessibili-dade são decisivas para a otimização das localizações noespaço intra-urbano, constituindo-se em objeto principal dosconflitos pela posse da terra urbana (VILLAÇA, 2001).

A configuração socioespacial resultante deste proces-so de estruturação espacial, marcada pela formação de ex-tensas periferias desassistidas social e economicamente,evidencia de forma indiscutível as desigualdades sociaisentre segmentos populacionais do espaço intra-urbano pre-sentes no processo de desenvolvimento nacional. Essasdesigualdades são agravadas pela intensificação dos des-locamentos populacionais intra-urbanos, representadospelos fluxos migratórios intrametropolitanos em direção àperiferia regional. Além disso, elas revelam a existência deuma relação de causalidade entre esses fluxos e a intensi-ficação dos movimentos pendulares.

No caso da metrópole formada por Brasília e municípiosgoianos e mineiros localizados no entorno, os efeitos des-sa configuração socioespacial foram definidos no âmbitodo processo de exclusão e segregação espacial da popu-lação que marcou a ocupação territorial.

No período de construção e implantação, como tam-bém no período de consolidação urbana da nova capital,o Estado foi o grande promotor da ocupação do solo,atuando como planejador, construtor e financiador daocupação, e também como grande proprietário de terras.Tornou-se, assim, o principal agente do processo de ur-banização da região, o que diferencia a ocupação em re-lação às demais cidades brasileiras em alguns aspectosda gestão do solo urbano.2

A especificidade da atuação estatal no processo deocupação territorial do Distrito Federal – DF deve-se maisàs condições excepcionais de posse pública da terra e àspossibilidades de controle sobre o uso e ocupação do solodo que à sua atuação efetiva na mediação ou atenuaçãodos conflitos gerados nas disputas pelo acesso à terraurbana entre os diferentes segmentos populacionais.

Sem dúvida, a questão da posse pública da terra foi uminstrumento decisivo da atuação estatal no processo deocupação urbana do DF – o que certamente não impediuas desigualdades no acesso às localizações urbanas. Aquestão relativa à multiplicidade de regimes de proprieda-de das terras3 constituiu-se em prerrogativa para a ilegali-dade no acesso à terra urbana, que passou a ser utilizadacomo instrumento pelo mercado imobiliário, em respostaàs tentativas de controle da ocupação por parte do Esta-do. Destarte, no período de construção e implantação doDF, o Estado manteve o monopólio sobre a terra, caben-do-lhe a decisão sobre a oferta e o parcelamento de áreasdisponíveis para ocupação.

A ocupação inicial efetiva-se a partir da premissa bási-ca que irá determinar a atuação estatal no processo deocupação territorial: a preservação do núcleo central, for-mado pelo Plano Piloto. No entanto, como resposta às ten-tativas de controle do poder público, ao mesmo tempo emque se implantava o Plano Piloto, a pressão populacionalexercida principalmente pelos operários que construíam anova capital, obrigava o Estado a reconhecer a força dosmovimentos sociais. Como resposta, formava-se a perife-ria, constituída pelas cidades-satélites implantadas a par-tir da oferta de lotes pela Companhia Urbanizadora da NovaCapital – Novacap, com o objetivo de abrigar não só o con-tingente de população operária migrante, mas também partedos funcionários públicos com posições mais baixas na hi-

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MARIA CÉLIA SILVA CAIADO

erarquia funcional, sem acesso às terras localizadas noPlano Piloto.

No processo de ocupação periférica surgem inicialmenteas Regiões Administrativas – RA de Taguatinga (1958),Sobradinho (1960), Gama (1960), Guará (1966) e Ceilândia(1970), inaugurando, assim, o polinucleamento caracterís-tico da estruturação urbana inicial da região. Esses núcle-os, denominados cidades-satélites, foram previstos noprojeto urbanístico para serem implementados a partir dasaturação do limite populacional estabelecido para o Pla-no Piloto. A antecipação de sua implantação em áreas dis-tantes do núcleo principal gerou grandes vazios urbanose deu início ao processo de ocupação gerenciado pela atu-ação pública com clara divisão social do espaço urbano.

A configuração socioespacial resultante desse proces-so concentra a população de renda mais elevada e maiorpoder político em áreas mais centrais e privilegiadas emtermos de empregos,4 infra-estrutura básica e serviçossociais. Ao mesmo tempo, redistribui a população menosfavorecida quanto a esses aspectos, constituindo umaocupação periférica que se estende até os municípioslimítrofes. Neles, as condições de acesso às áreas maiscentrais são agravadas pelas grandes distâncias e pelasdificuldades relacionadas à eficiência do sistema de trans-porte (grandes vazios urbanos), implicando em intensosdeslocamentos diários.5

Assim, mais do que o distanciamento físico, a reprodu-ção do crescimento periférico gera o distanciamento socialentre os segmentos populacionais que habitam os diferen-tes segmentos espaciais da estrutura intra-urbana.

DISTRIBUIÇÃO E DINÂMICA DEMOGRÁFICA

A Região Integrada de Desenvolvimento do DistritoFederal e Entorno – Ride é composta por uma rede de cida-des que, em sua maioria, são de médio e pequeno porte.Além do DF, apenas dois municípios apresentaram popu-lação superior a 100 mil habitantes (Águas Lindas de Goiáse Luziânia), segundo o Censo Demográfico 2000. Seis ou-tros municípios tinham população entre 50 e 100 mil (For-mosa, Novo Gama, Planaltina de Goiás, Santo Antônio doDescoberto, Valparaíso de Goiás e Unaí), seis entre 20 e 50mil habitantes (Alexânia, Cidade Ocidental, Cristalina, Pa-dre Bernardo, Pirenópolis e Buritis) e oito municípios ti-nham menos de 20 mil habitantes (Abadiânia, Água Fria,Cabeceiras, Cocalzinho de Goiás, Corumbá de Goiás, Mi-moso de Goiás, Vila Boa e Cabeceira Grande), sendo o me-nor deles Mimoso de Goiás, com apenas 2.801 habitantes.6

A distribuição espacial da população na Ride expressaa forte polaridade exercida pelo DF, que concentrava maisde 70% da população regional, em 2000. Os municípios queapresentam as maiores participações no total da popula-ção regional são: Luziânia (4,8%), Águas Lindas de Goiás(3,6%) e Valparaíso de Goiás (3,2%) – todos diretamenteenvolvidos no processo de expansão urbana do DF. Estateve como principal eixo a direção Sudoeste, constituindoum entorno regional a partir das RAs e dos municípiosgoianos limítrofes, localizados naquela direção.

Ao longo do processo de metropolização da região, omunicípio de Luziânia e seus desmembramentos – CidadeOcidental, Novo Gama, Valparaíso de Goiás, Santo Antô-nio do Descoberto e Águas Lindas de Goiás (desmembradode Santo Antônio do Descoberto em 1997) – , todos loca-lizados a sudoeste do DF; e o município de Planaltina deGoiás, localizado na direção nordeste, têm-se caracteriza-do como o entorno mais imediato, fortemente impactadopela expansão do DF. Em conjunto com o DF, esses muni-cípios apresentam as maiores participações no total dapopulação regional e também as mais elevadas densida-des demográficas, sendo o mais denso deles Valparaíso deGoiás, com 1.555,63 habitantes por km2.

A população da Ride é eminentemente urbana, com umataxa de urbanização7 de 93,3%, segundo os últimos dadoscensitários. Apenas três municípios apresentaram taxas deurbanização inferiores a 50,0%: Água Fria de Goiás, Mi-moso de Goiás e Cocalzinho de Goiás. Os municípios loca-lizados no entorno imediato e o DF apresentam as maiorestaxas: todas acima de 85,0%.

O crescimento demográfico da Ride tem-se reduzido nasúltimas décadas, apesar de apresentar uma taxa média anualde 3,5% para o período 1991/2000, considerada elevada secomparada às médias nacional ou das grandes metrópolesnacionais.8

A heterogeneidade dos municípios que compõem a Ridepode ser observada também através das estatísticasdemográficas, principalmente pelo crescimento popu-lacional e pelo processo migratório. Estes evidenciam queparte significativa do crescimento está associada à expan-são do DF, uma vez que os municípios limítrofes apresen-tam dinâmicas diferenciadas dos demais.9

Os demais municípios não influenciados por esse pro-cesso, e que possuem como base econômica o setoragropecuário, apresentam taxas de crescimento10 e densi-dades demográficas11 menores. Alguns, como Pirenópolise Mimoso de Goiás, apresentaram taxas de crescimentonegativas, no período mais recente (1991-2000).

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Entre 1970 e 2000, o entorno aumentou sua participaçãono total da região, sendo o Entorno Imediato12 o principalresponsável por esse incremento (Tabela 1). Na média, alémde aumentar sua participação no total da população da Ride,o entorno apresentou elevação de 5,5% na taxa de cres-cimento médio anual no último período. Apesar da reduçãono ritmo de crescimento do Entorno Imediato para 8,3% noperíodo 1991-2000, essa taxa é significativamente elevada,quando comparada à média regional.

O DF apresentou forte arrefecimento no ritmo do cres-cimento, principalmente em relação ao período 1970-1980,quando os fluxos migratórios dirigidos às grandes cida-des foram intensificados e o processo de urbanização na-cional tornou-se mais acelerado.

O incremento populacional da região no período totalfoi de 2.193.235 habitantes – 1.513.654 localizados no DF e682.581 no entorno – sendo que, desses, 79,2% estão lo-calizados no entorno imediato.

Principais Fluxos Migratórios13

O estudo sobre a dinâmica migratória nacional na últi-ma década revela que algumas tendências apontadas peladinâmica das décadas passadas concretizaram-se, taiscomo a recuperação da Região Sul e a perda de dinamismodas fronteiras agrícolas, com o enxugamento das áreasantigas e o surgimento de novos espaços da migração. Noentanto, outras tendências não previstas puderam ser ob-servadas. Entre elas, o incremento da emigração nordesti-na, apesar das transformações produtivas que sugeriam umarrefecimento desses fluxos, e a intensificação dos proces-sos redistributivos no interior das regiões metropolitanasconsolidadas (BAENINGER, 2004).

Na última década, a região de Brasília e entorno – a exem-plo da dinâmica migratória de outras metrópoles nacionais– apresentou tendência de incremento da imigração denordestinos que se dirigiram prioritariamente para o DF e,numa escala menor, para os municípios do entorno. Alémdisso, houve intenso processo redistributivo interno, for-temente determinado pela emigração originária do DF, emdireção aos municípios do entorno metropolitano.

Os municípios que compõem a Ride apresentam dinâ-micas migratórias diferenciadas. A análise dos Índices deEficácia Migratória – IEM14 para a migração interestadualrevela que alguns municípios são absorvedores líquidosde população, enquanto outros assumem característicasde áreas de evasão populacional, ainda que essas locali-dades apresentem tendência à reversão desse quadro.

Entre 1975 e 2000, o Distrito Federal consolidou-se comoárea de rotatividade migratória, apresentando valores se-melhantes nos volumes de imigração e emigração. Essefato está relacionado à capacidade de atração da capitalfederal e ao processo de redistribuição desses imigrantespara os demais municípios da região. No final do período,a maioria dos municípios registrou índices que os caracte-rizam como áreas de forte absorção migratória, com IEMentre 0,51 e 1,00.

A Ride, estruturada a partir de uma cidade planejada paraser a capital nacional e pólo de integração nacional, teveseu processo de consolidação como metrópole marcadopela migração de longa distância, principalmente duranteas décadas de 60 e 70. Fatores associados à abertura defrentes de trabalho para a construção da cidade e à trans-ferência da capital fizeram com que a migração interesta-dual fosse predominante no processo de implantação danova cidade.

TABELA 1

Evolução da População e Taxas de Crescimento

Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – 1970-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970, 1980, 1991 e 2000.

(1) O entorno imediato é formado pelos municípios de Águas Lindas de Goiás, Cidade Ocidental, Luziânia, Novo Gama, Planaltina de Goiás, Santo Antônio do Descoberto e Valparaíso de Goiás.

1970 1980 1991 2000 1970 1980 1991 2000 1970-1980 1980-1991 1991-2000

Total da Ride 761.961 1.519.981 2.161.709 2.958.196 100,00 100,00 100,00 100,00 7,15 3,25 3,55

Brasília 537.492 1.176.908 1.601.094 2.051.146 70,54 77,43 74,13 69,47 8,15 2,84 2,79

Total Entorno 224.469 343.073 560.615 907.050 29,46 22,57 25,87 30,53 4,33 4,57 5,49

Entorno Imediato (1) 40.971 107.530 283.384 582.056 5,38 7,07 13,06 19,72 10,13 9,21 8,33

Demais Municípios 183.498 235.543 277.231 324.994 24,08 15,50 12,81 10,81 2,53 1,49 1,78

Taxas de Crescimento (% a.a.)Números Absolutos Participação (%)Região

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O processo de formação e consolidação da Ride, nadécada de 80, foi fortemente influenciado pela expansãoda mancha urbana do DF. Os movimentos migratórios re-gionais confirmam esse processo, no qual a migraçãointrametropolitana15 adquire expressão no total dos fluxosmigratórios, ainda que os fluxos interestaduais continuempredominantes.

Desde o início do processo de migração para Brasília, osfluxos de nordestinos, goianos e mineiros foram predo-minantes.16 Além da atratividade exercida pela existência degrande número de empregos durante a construção da capital,a condição de vida naqueles Estados contribuiu para aconsolidação dos fluxos. Holston (1993), baseado em infor-mações do Censo Demográfico 1960, aponta que 96,0% dosmigrantes vindos para Brasília vinham daquelas regiões (deEstados do Nordeste; do Sudeste, principalmente de MinasGerais; e do Centro-Oeste, principalmente de Goiás).17

Segundo aquele autor, a migração, já naquele período, erapredominantemente urbana, sendo que quatro em cada cincomigrantes residiam anteriormente em área urbana.

Entre 1970 e 1980, período de maior dinamismo do pro-cesso de urbanização da região, os principais fluxos damigração interestadual continuaram sendo aqueles origi-nados em Estados nordestinos (212 mil), em Goiás (167 mil)e em Minas Gerais (90 mil). Entre os Estados nordestinos,destacam-se os fluxos vindos do Maranhão, Piauí, Ceará eBahia, que apresentaram, em conjunto, o maior volume (155mil migrantes).

Entre 1981 e 1991, o volume de migrantes arrefeceu (605,8mil), mas a taxa de migração18 permaneceu expressiva(3,04%). O fluxo de nordestinos continuou elevado (207,7mil) e os Estados que mais contribuíram para esse movi-mento (MA, PI, CE e BA) enviaram, em conjunto, 157,8 milmigrantes – contingente maior que o do período anterior.Maior, também, foi o contingente vindo das Regiões Nor-te e Sul – o que demonstrava a ampliação da atratividadeexercida pela capital federal. A situação se mantém no pe-ríodo 1991-2000, e os fluxos originados nos quatro Esta-dos nordestinos (MA, PI, CE e BA) e na Região Norte am-pliam-se ainda mais.

O fluxo de migrantes com residência anterior no DF cres-ceu significativamente, passando de 49 mil, entre 1970 e1980, para 121,6 mil no período 1981-9; e para 136,7, entre1990 e 2000 – fato que denotou ampliação do fluxo migra-tório intra-regional. Em síntese, a Ride caracteriza-se pelopredomínio de migrantes provenientes principalmente dosEstados do Maranhão, Piauí, Ceará e Bahia, cuja taxa mé-dia anual de migração ainda é a mais elevada na região

(1,44%, no período 1970-1980; e 0,86%, entre 1990 e 2000).É importante salientar que, a exemplo do ocorrido no DF,apesar da tendência de queda da taxa para o total da re-gião ao longo do período 1970-2000, a imigração origináriadaqueles Estados nordestinos apresentou elevação no pe-ríodo mais recente, enquanto os demais fluxos registra-ram redução ou mantiveram constantes as taxas médiasanuais de migração interestadual.

Além de apresentar elevação, a migração originária da-queles Estados nordestinos manteve-se, e como o fluxomais importante ao longo do período. Isto indica a prová-vel existência de redes sociais de migração atuando nessefluxo e mantendo-o com relativa intensidade, apesar do arre-fecimento das migrações no país e na região, nos períodosmais recentes.

O fluxo originário do DF apresentou elevação na déca-da de 80 – período de consolidação do processo de cres-cimento periférico em direção aos municípios goianos.Apesar de ligeira queda no período mais recente, ele aindase mantém como o segundo fluxo de migração para o totalda região.

De 1970 a 1980, quando o processo de crescimento pe-riférico ainda era incipiente, a participação dos fluxos vin-dos do DF representava 7,7% do total, enquanto o fluxototal de nordestinos para a região respondia por 33,5%. Noperíodo 1981-1991, quando o crescimento dos municípiosgoianos intensificou-se e o entorno regional se consoli-dou, a participação dos fluxos originários do DF passou arepresentar 20,3% do total e a de nordestinos se manteve(34,7%). Entre 1990 e 2000, a migração de nordestinos e avinda do DF aumentaram suas participações para 41,6% e22,0%, respectivamente (Gráfico 1).

Quando analisado todo o período (1970-2000), obser-va-se que os fluxos migratórios originários nos demaisEstados do Nordeste diminuíram; e aqueles provenientesde Minas Gerais, Goiás e demais Estados do Sudeste, queforam bastante significativos no período inicial, perderamintensidade.

A partir da década de 80, o Distrito Federal passou aexpulsar população para os demais municípios da região,elevando a participação da migração para o total da região,enquanto os demais fluxos sofreram retração.

Na verdade, os volumes de migrantes interestaduais paraa região demonstram seu grande peso, devido aos fluxosdirecionados ao DF. Houve redução nos fluxos de minei-ros e goianos ao longo do período – a exemplo do ocorri-do para o total de região – e manutenção do volume demigrantes nordestinos, apesar da redução dos volumes

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totais de imigrantes. Na última década, a elevação do fluxode Maranhão, Piauí, Ceará e Bahia retoma a importância emrelação à década de 70, período de maior intensidade mi-gratória nos contextos regional e nacional (Tabela 2).

A distribuição da migração interestadual para o total daregião é semelhante à do Distrito Federal, em função dopeso que aquela população assume no total regional (emtorno de 70,0%, desde 1970 até 2000).

A Tabela 3 mostra duas tendências em relação ao fluxode migrantes nordestinos para a região. Ao longo do perío-do 1970-2000, o peso da migração de nordestinos para oDF diminui, passando de 95,1% entre 1970 e 1980 para41,5% de 1990 a 2000, aumentando a participação dessefluxo na migração interestadual para o total da região.

Outra tendência observada nesse fluxo é a elevação daparticipação de Maranhão, Piauí, Ceará e Bahia no total damigração de nordestinos para o total da região.

Na verdade, essa elevação da participação está relacio-nada ao aumento do fluxo em direção aos municípios queintegram o entorno imediato da Ride. Os volumes médiosanuais da migração para os municípios elevaram-se de 455,no período 1970-1980, para 5.556, entre 1990 e 2000 (Tabe-la 4).

A migração vinda do DF, no período inicial (1970-1980),já apresentava participações elevadas no total da migra-ção interestadual de vários municípios. Além dos municí-pios que integram o entorno imediato (naquele período,Planaltina e Luziânia), outros como Alexânia, Corumbá deGoiás, Formosa, Padre Bernardo e Pirenópolis tinham nosfluxos vindos do DF a maior participação na migração en-tre UFs – embora os volumes de população migrante se-jam numericamente pouco significativos. Naqueles muni-cípios, o segundo principal fluxo vem de municípiosmineiros que não integram a Ride. Como eles apresentambase econômica na agropecuária, é possível que a migra-ção de mineiros tenha sido motivada pela expansão da fron-teira agrícola ocorrida na região (aumento do plantio de sojano serrado, naquele período).

A migração de nordestinos para outras regiões do paístem sido bastante estudada. No entanto, os dados sobrenaturalidade e local de residência anterior dos imigrantesque chegam à Ride possibilitam uma visão mais ampla dofenômeno da re-migração da população originária dos Es-tados nordestinos, e indicam, principalmente, a não-absor-ção de parte desse contingente de imigrantes pelo DF. Noperíodo 1986-1991, o fluxo de migrantes vindo do DF parao entorno era composto de 51,8% de naturais dos Estadosdo Nordeste, dos quais 38,1% nascidos no Maranhão,

GRÁFICO 1

Participação da Imigração Interestadual

Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal

e Entorno – 1970-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1980, 1991 e 2000 (tabulações especiais do Nepo/

Unicamp).

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MARIA CÉLIA SILVA CAIADO

TABELA 2

Volume e Taxa Média Anual de Migração Interestadual, segundo Região de Última Residência

Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – 1970-2000

Região de Residência 1970-1980 1981-1991 1990-2000

Anterior Volume Taxa (%) Volume Taxa (%) Volume Taxa (%)

Total da Ride 483.212 3,52 354.917 2,35 378.304 2,51

Goiás 88.468 0,64 53.433 0,35 58.225 0,39

Outros do Centro-Oeste 4.956 0,04 4.698 0,03 5.921 0,04

Minas Gerais 77.518 0,56 49.048 0,32 47.608 0,32

Rio de Janeiro 53.404 0,39 22.856 0,15 19.086 0,13

Outros do Sudeste 25.962 0,19 17.097 0,11 20.772 0,14

MA/PI/CE/BA 147.425 1,07 129.653 0,86 153.363 1,02

Outros do Nordeste 53.281 0,39 40.774 0,27 33.001 0,22

Região Norte 10.467 0,08 20.778 0,14 22.492 0,15

Região Sul 14.326 0,10 10.850 0,07 10.723 0,07

Outros 7.405 0,05 5.730 0,04 7.113 0,05

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1980, 1991 e 2000 (tabulações especiais do Nepo/Unicamp).

Nota: Foram consideradas migrantes as pessoas com mais de dez anos de idade e com menos de dez anos de residência na UF, incluindo a migração de retorno e os não-naturais.

TABELA 4

Principais Volumes de Migração de Nordestinos para o Entorno Imediato, segundo Local de Residência Atual

Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – 1970-2000

Local de Residência Atual1970-1980 1981-1991 1990-2000 Média Anual

Nos Abs. % Nos Abs. % Nos Abs. % 1970-1980 1981-1991 1990-2000

Luziânia (1)

Migrantes de MA/PI/CE/BA 4.226 71,1 14.523 76,6 30.867 82,0 423 1.452 3.087

Total de Nordestinos 5.944 100,0 18.956 100,0 37.659 100,0 594 1.896 3.766

Planaltina de Goiás

Migrantes de MA/PI/CE/BA 319 53,5 2.897 76,2 6.735 82,4 32 290 674

Total de Nordestinos 596 100,0 3.800 100,0 8.176 100,0 60 380 818

Santo Antônio do Descoberto (1)

Migrantes de MA/PI/CE/BA - - 3.393 - 17.954 - - 339 1.795

Total de Nordestinos - - 4.528 - 20.531 - - 453 2.053

Total Entorno Imediato

Migrantes de MA/PI/CE/BA 4.545 69,5 20.813 76,3 55.556 83,7 455 2.081 5.556

Total de Nordestinos 6.540 100,0 27.284 100,0 66.366 100,0 654 2.728 6.637

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1980, 1991 e 2000 (tabulações especiais do Nepo/Unicamp).

(1) Desconsiderados os desmembramentos de 1997.

Nota: Foram consideradas migrantes as pessoas com mais de dez anos de idade e com menos de dez anos de residência na UF, incluindo a migração de retorno e os não-naturais.

TABELA 3

Migração de Nordestinos, segundo Local de Residência Atual

Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – 1970-2000

Local de Residência Atual1970-1980 1981-1991 1990-2000 Média Anual

Nos Abs. % Nos Abs. % Nos Abs. % 1970-1980 1981-1991 1990-2000

Distrito Federal

Migrantes de MA/PI/CE/BA 147.425 95,1 129.653 82,3 153.363 41,5 14.743 12.965 15.336

Total de Nordestinos 200.706 94,7 170.427 82,8 186.364 41,0 20.071 17.043 18.636

Total da Ride

Migrantes de MA/PI/CE/BA 155.014 73,0 157.457 75,6 369.119 81,3 15.501 15.746 36.912

Total de Nordestinos 212.015 100,0 205.848 100,0 454.013 100,0 21.201 20.585 45.401

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1980, 1991 e 2000 (tabulações especiais do Nepo/Unicamp).

Nota: Foram consideradas migrantes as pessoas com mais de dez anos de idade e com menos de dez anos de residência na UF, incluindo a migração de retorno e os não-naturais.

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Piauí, Ceará ou Bahia. No período mais recente (1995-2000),a população natural desses Estados representou 49,8% dofluxo de migrantes do DF em direção a outros municípiosda Ride.

Deslocamentos Intra-urbanos e Consolidação daExpansão Urbana no Entorno Regional

A migração interestadual teve papel preponderante naformação do entorno, uma vez que foi responsável porgrande parte do incremento populacional do DF (princi-palmente nas décadas de 70 e 80, quando ocorreu a inten-sificação do processo de periferização), o que potencializouo processo de redistribuição para os municípios do Entor-no Imediato.

No caso da Ride, a mobilidade intra-urbana teve comoprincipal elemento definidor da intensidade e direção dosfluxos a busca por moradias dos segmentos populacionaisque ocupam posições menos privilegiadas na estruturasocial, em áreas onde existe menor pressão para ocupaçãopor parte dos segmentos de rendas mais elevadas, queconseguem se apropriar das localizações urbanas otimi-zadas, com acessibilidade ao centro e atividades socioeco-nômicas privilegiadas.

Os instrumentos utilizados para viabilizar a apropriaçãodiferenciada das acessibilidades eram fruto, principalmen-te, da atuação do Estado. Este utilizou os mecanismos decontrole do uso e ocupação do solo, sob a prerrogativa dapreservação do meio-ambiente. E também, no caso do DF,valeu-se da preservação do projeto arquitetônico epaisagístico do Plano Piloto – ambos associados à políti-ca habitacional que conduziu à ocupação periférica.

Além da atuação estatal, o mercado imobiliário tambémteve papel fundamental na estruturação da Ride, principal-mente no que se referiu à ocupação do entorno do quadri-látero, constituída por municípios goianos limítrofes. Paratanto, atuou nas lacunas deixadas pela ação estatal na ofer-ta de moradias para a população de baixa renda.

Esses condicionantes da estruturação intra-urbana fun-cionaram como uma estrutura de pressões ou motivações,e atuaram tanto nos lugares de destino como nos de ori-gem. Assim, levaram a população a se deslocar no espaçointra-urbano e estabeleceram trocas entre municípios daregião (CUNHA, 1994).

A não-absorção de grande parte do contingente migra-tório com destino ao DF fez com que a migração intrametro-politana ganhasse importância relativa no total dosmigrantes que chegam à região, impactando a expansão do

entorno regional. A participação dos migrantes internos àregião ampliou-se: de 15,7% para 28,0% do total, ao longodo período 1975-2000.

Essa elevação deu-se não só pelo aumento de volumede migrantes intrametropolitanos – que passaram de 66.584para 119.769, no período 1975-2000 – mas também em fun-ção da redução da chegada de migrantes vindos dos de-mais municípios de Goiás e Minas Gerais. A elevação daparticipação da emigração do DF em direção aos municí-pios da região, inclusive os que não integram o EntornoImediato, reduziu as participações das migrações entre mu-nicípios vizinhos que até então predominavam naquelesnão diretamente envolvidos no processo de expansão ur-bana, indicando a intensificação das relações entre o DF eo Entorno Distante.

As participações das imigrações segundo o local deorigem e de destino se alteraram ao longo do período 1975-2000. Os dados desagregados para os três recortes espa-ciais demonstraram que a elevação da participação da mi-gração intrametropolitana pode ser atribuída à sua elevaçãopara os municípios do entorno que não integram o Entor-no Imediato (Gráfico 2).

Como já foi dito, o fluxo de migração intrametropolitanamais significativo foi representado pelos que deixam o DFem direção ao Entorno Imediato. No período 1975-1980,33.866 pessoas deixaram o DF para municípios que inte-gram este recorte, principalmente para os localizados nosudoeste da Ride (Santo Antônio do Descoberto, Luziâniae seus desmembramentos: Águas Lindas de Goiás, CidadeOcidental, Novo Gama e Valparaíso de Goiás). Nos perío-dos seguintes, os volumes desse fluxo se elevaram para46.162 (1986-1991) e 80.942 (1995-2000).

Nos demais municípios do entorno, ocorreu a reduçãoda imigração vinda dos outros municípios vizinhos e foiaumentada a participação da migração vinda do DF e dosmunicípios do Entorno Imediato. Outra tendência obser-vada para o período foi a intensificação das trocas entremunicípios do Entorno Imediato e os demais da região.

Para os três recortes espaciais, foi possível observar aelevação da participação da migração vinda de municípiosdo Entorno Imediato (ainda que os números sejam poucoexpressivos), indicando um novo aspecto da redistribuiçãopopulacional na região, associado à capacidade de absor-ver população por parte daqueles municípios.

Nas trocas populacionais intra-regionais, foram signi-ficativos apenas os fluxos representados pela emigraçãodo DF em direção aos municípios que integram o EntornoImediato – ainda que fosse possível identificar outras ten-

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dências redistributivas de população no interior da Ride(Mapa 1).

No período mais recente (1995-2000), saíram de Brasília78.002 habitantes, enquanto no Entorno Imediato entraram75.257 – destes, 34.907 passaram a residir em Águas Lin-das de Goiás.

Apesar da participação da migração vinda do DF paraos municípios do Entorno Imediato ter apresentado ligeiraqueda na emigração intrametropolitana, isto não significaredução, mas sim ampliação das trocas entre municípiosdesse recorte espacial. Tanto a participação quanto o nú-mero de pessoas que deixam o DF em direção ao entorno

continuaram apresentando elevação no período mais re-cente. Dos 89.376 emigrantes intra-regionais que deixaramno DF no período 1995-2000, 90,6% dirigiram-se para aque-les municípios.

No período 1995-2000, intensificou-se a migração emdireção aos demais municípios da região, até então nãodiretamente envolvidos no processo de expansão perifé-rica. As trocas entre municípios do Entorno Imediato tam-bém apresentaram elevação, indicando que suas inter-re-lações ganham intensidade. Isso se dá pela melhora em suasdinâmicas econômicas e pelo processo de valorização imo-biliária, em função das melhorias em infra-estrutura.

GRÁFICO 2

Evolução da Migração Intrametropolitana

Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – 1975-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1980, 1991 e 2000 (tabulações especiais do Nepo/Unicamp).

Total da Ride

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1975-1980 1986-1991 1995-2000

Intrametropolitana Interestadual GO e MG Interestaduais

Distrito Federal

1975-1980 1986-1991 1995-2000

Entorno Imediato

1975-1980 1986-1991 1995-2000

Entorno Distante(exclui o Entorno Imediato)

1975-1980 1986-1991 1995-2000

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Migração Intrametropolitana e Mobilidade Pendular – Amobilidade pendular apresenta estreita relação com oprocesso de estruturação urbana: principalmente no quese refere aos diferenciais entre as localizações das ativi-dades no espaço urbano regional e a intensificação da mi-gração intrametropolitana. No processo de estruturaçãointra-urbana, a necessidade de deslocamento de pessoasem direção ao entorno (migração intrametropolitana) certa-mente gerou a intensificação desses fluxos pendulares, nabusca pelo atendimento das demandas por emprego e/ouatividades geradoras de renda para essa população que nãoconsegue inserir-se no espaço do DF. A ligação entre os

dois tipos de movimentos populacionais é estreita: aocorrência do primeiro gera a do segundo. Ou seja, ao semudar para o entorno, a população passa a depender dasviagens diárias em direção ao antigo local de moradia, comoforma de obter renda e serviços que lhe permitam sobreviver.

O volume de pessoas que se movem diariamente nointerior da Ride cresce de 13.328 em 1980, para 132.909 noano de 2000.19 Das 132.914 pessoas que se movem diaria-mente no interior da região, 119.916 (90,2%) deixam muni-cípios localizados no Entorno Imediato em direção ao Dis-trito Federal, onde estão concentrados os empregos e asatividades que possibilitam geração de renda.

MAPA 1

Principais Fluxos de Emigrantes do Distrito Federal

Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – 1995-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1980, 1991 e 2000 (tabulações especiais do Nepo/Unicamp).

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A intensidade e a direção da mobilidade pendular na Riderevelam os diferenciais no acesso ao solo urbano pelosdiferentes segmentos sociais da população, implicando emdeslocamento na busca pelo atendimento das demandasbásicas por trabalho, serviços sociais, lazer e atividadesde consumo, com o agravamento gerado pelas grandesdistâncias e pelo deficiente sistema de transportes.

Entre estes, a demanda por trabalho ou educação, alémde assumir peso maior entre as demais em função do seucaráter de movimentação diária, pode ser mensurada a partirdos dados censitários, estabelecendo diferenciais entre aspessoas que realizam mobilidade pendular, segundo suacondição migratória e residência anterior.

Grande parte da população que realiza movimentospendulares já realizou algum movimento migratório em dire-ção ao atual município de residência. Cerca de 42,4% do totaldas pessoas que realizavam movimentos pendulares em 2000tinham menos de cinco anos de residência no município emque residiam; e, destas, 50,3% declararam como residência,em 31/7/1995, o Distrito Federal. Assim, fica confirmada aestreita ligação entre migração intrametropolitana, processode periferização e intensificação dos deslocamentos diários.

Desagregados para os diferentes recortes espaciais, osdados revelam que 58,5% das pessoas que realizam movi-mentos pendulares residem no Entorno Imediato; e as queresidiam a menos de cinco anos no município vieram do DF.

No entanto, se comparamos com os dados de 1980,podemos observar que o porcentual de pessoas que reali-zam movimentos diários em direção a Brasília, que residemno Entorno Imediato e declaram residência anterior no Dis-trito Federal caiu de 72,3 %, em 1980, para 59,3, em 2000.Essa redução do peso dos emigrantes do DF em relação àspessoas que realizam a mobilidade pendular ocorre em fun-ção da elevação da participação dos fluxos interestaduaisno total da migração em direção ao Entorno Imediato.

Apesar de o Distrito Federal continuar concentrandoas oportunidades de emprego e geração de renda, os mu-nicípios do Entorno Imediato – principalmente Novo Gama,Cidade Ocidental e Valparaíso de Goiás – vêm aumentan-do sua participação como receptores de pessoas que rea-lizam mobilidade pendular. Eles recebem 32% das pessoasresidentes em Brasília que realizam este movimento: maisespecificamente nas Regiões Administrativas do Gama ede Santa Maria, cujas distâncias são menores em direção aesses municípios do que em direção às regiões onde seconcentram os empregos no DF (como o setor comercialsul no Plano Piloto ou o centro da Região Administrativade Taguatinga, por exemplo).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste texto foi contribuir para o estabeleci-mento de relações entre o processo de estruturação intra-urbana e os deslocamentos intra-urbanos, na região me-tropolitana formada pelo DF e municípios goianos emineiros do entorno.

Entre as grandes cidades e metrópoles nacionais,Brasília destaca-se não tanto pelas especificidades relacio-nadas ao seu processo de criação e construção, mas prin-cipalmente pelas possibilidades de gestão urbana geradaspela quase inexistência de antecedentes relacionados àocupação territorial urbana, e pela propriedade pública degrande parte da terra destinada à nova capital.

No decorrer de seu processo de construção e consoli-dação, Brasília tornou visíveis as contradições inerentes àorganização social brasileira: passou de cidade que pre-tendia ser socializante na distribuição de pessoas e ativi-dades para uma estrutura intra-urbana fortemente marcadapelo processo de segregação socioespacial da população.Ao invés de constituir-se em um instrumento distributivo,a propriedade pública da terra urbana passa a funcionarcomo instrumento de ocupação seletiva, instituindo a “se-gregação planejada” e transformando Brasília na “capitaldo controle e da segregação social”.20

Outra especificidade da estrutura intra-urbana na regiãoé a ausência da conurbação entre as localidades periféri-cas. Este fato deu origem a uma estrutura fragmentada,composta por vários núcleos de ocupação urbana, sepa-rados por grandes glebas sem ocupação – o que torna ain-da mais distantes as localidades periféricas, e mais difíceisas condições de deslocamento da população residentenesse segmento espacial.

Evidentemente, apesar das especificidades, o proces-so de estruturação urbana e distribuição populacional doDistrito Federal e entorno não pode ser dissociado dos pro-cessos de urbanização e desenvolvimento nacional. Aconfiguração socioespacial resultante do processo de ur-banização não poderia ser muito diferente daquelas encon-tradas nas demais metrópoles nacionais, uma vez que estásubmetida ao mesmo processo econômico (regime de acu-mulação) e à mesma formação social.

A análise sobre os dados dos deslocamentos intra-ur-banos demonstrou a estreita relação entre intensificaçãodos fluxos e crescimento periférico, e à existência de umarelação de causalidade entre a migração intra-urbana e aintensificação dos movimentos pendulares. A análise dosdados sobre os deslocamentos intra-urbanos diários indi-

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cou que 42,4% das pessoas que realizavam movimentospendulares residiam há menos de cinco anos no município– destas, 50,3% declararam como residência anterior o Dis-trito Federal.

A possibilidade de gestão urbana integrada que a defi-nição da Ride traz certamente será um importante instru-mento para a amenização dos problemas atuais. Entre ascontradições a serem enfrentadas pela gestão urbana naregião destacam-se a questão dos conflitos gerados pelapropriedade da terra destinada ao uso urbano e a ilegali-dade na ocupação intra-urbana.

O não atendimento da inesgotável demanda por mo-radias, gerada pelo crescimento urbano, que, apesar doarrefecimento na década de 80, deu indícios de novodinamismo nos anos 90, inclusive em função da manutençãoda intensidade dos fluxos migratórios para a região nessaúltima década, gera novas ocupações em áreas centrais,demandando soluções que não alimentem o crescimentoperiférico.

A questão do emprego assume particularidades queagravam o processo de exclusão da população periférica.A economia regional baseia-se nas transferências de ren-das, conformando um grande mercado consumidor. A ele-vada renda que potencializa esse mercado consumidor nãoprovém de uma inserção produtiva regional, mas sim daocupação de parte da população na administração públi-ca, gerada em função dos altos salários pagos ao funcio-nalismo federal.

A evolução crescente do desemprego na região temevidenciado a insuficiência da economia local na geraçãode empregos. O crescimento populacional – mais especifi-camente a expansão da população economicamente ativa– PEA – associado à retração na oferta de postos de traba-lho, vem-se traduzindo num quadro social problemático,com tendências agravantes.21

Nesse sentido, a dinamização econômica do entorno,com novas possibilidades de diversificação de atividadeseconômicas que possam gerar emprego e renda é de extre-ma importância para a redução das desigualdades socioes-paciais, amenizando, assim, os problemas gerados pelocrescimento periférico.

NOTAS

1. O conceito de “estrutura intra-urbana” tem por base as for-mulações de Bastide (1971) elaborada por Villaça, e parte da con-sideração de que o termo estrutura “corresponde a um todo cons-

tituído de elementos que se relacionam entre si de tal forma que aalteração de um elemento ou de uma relação altera todos os demaiselementos e todas as demais relações” (VILLAÇA, 2001, p. 12).

2. A análise do processo de ocupação do DF e entorno teve porbase as conclusões da pesquisa “Gestão do Uso do Solo e Disfunçõesdo Crescimento Urbano”, realizada em 1997 (IPEA, 2001).

3. A constituição de 1891 estabeleceu que as terras devolutas daUnião passariam a pertencer aos Estados, exceto as áreas incluídasno perímetro de 14.400 km2 destinado à implantação da capitalno Planalto Central, a serem demarcadas futuramente. Um Decre-to-Lei promulgado em 1967 determinou que fossem respeitados osdireitos dos proprietários particulares, cujas posses constassem nosregistros paroquiais, ou fossem baseadas em ações de usucapião até1/1/1917, ou em documento de venda ou doação feitas pela Uniãoapós a constituição de 1891. Assim, a implantação do DF não ex-tinguiu a propriedade privada da terra. O resultado foi a existênciade diferentes naturezas de propriedade: terras públicas, via desa-propriação; terras particulares; e terras públicas e particulares emcomum.

4. A estruturação intra-urbana da região tem como especificidadeo aumento do uso residencial nas regiões periféricas sem o cresci-mento paralelo de atividades geradoras de empregos, fazendo comque o DF concentre cerca de 95% dos empregos formais da região,dos quais 76,4% estão na RA de Brasília, que abriga o centro prin-cipal (Dados Rais/MT 1999 – apud HOLANDA et al. 2000).

5. Algumas cidades-satélites chegam a distanciar-se mais de 30 kmdo Plano Piloto, como é o caso de Brazilândia (43 km), do Gama(38 km) e Ceilândia (30 km).

6. O município de Cabeceira Grande, desmembrado de Unaí em 1997,não integra a Ride oficialmente, apesar de ser limítrofe ao DF. Noentanto, acreditando que este é um erro que deverá ser corrigido,ele foi incluído na área de análise.

7. Porcentual da população urbana em relação à população total.É calculado, geralmente, a partir de dados censitários, segundo afórmula: Taxa de urbanização = população urbana / população to-tal x 100 (população urbana dividida pela população total, multi-plicado por 100).

8. A taxa média anual de crescimento demográfico do Brasil, entre1991 e 2000, foi de 1,63%. As Regiões Metropolitanas de São Paulo,Rio de Janeiro, Porto Alegre, Recife e Fortaleza tiveram taxasmédias de 1,64%; 0,73%; 1,56%; 1,50%; e 2,44%, respectivamen-te. A maior taxa média anual de crescimento dentre as grandes me-trópoles foi a da Região Metropolitana de Curitiba, com 3,11%.No Centro-Oeste, a Região Metropolitana de Goiânia teve taxa de3,21% ao ano, no mesmo período.

9. No final da década de 70 e início dos anos 80, a dificuldade deocupação de terras pertencentes ao DF incentivou a intensifica-ção de parcelamentos em municípios limítrofes, localizados prin-cipalmente na direção sudoeste a partir do DF, onde os lotes eramoferecidos a preços mais baixos e com maiores facilidades de paga-mento, conforme mostra Paviani (1987; 1989; 1991; 1996).

10. Essas taxas expressam, em termos porcentuais, o crescimentomédio da população em um determinado período de tempo. Geral-mente, considera-se que a população experimenta um crescimentoexponencial também denominado geométrico.

11. Número de habitantes residentes de uma unidade geográfica emdeterminado momento, em relação à área dessa mesma unidade. Adensidade demográfica é um índice utilizado para verificar a inten-sidade de ocupação de um território. Unidade: Habitante por metroquadrado (hab./m2).

12. Com o intuito de expressar a divisão funcional estabelecida noprocesso de estruturação interna da região, serão utilizados nesteartigo três diferentes recortes espaciais, abrangendo os municípiosque compõem a Ride. Será denominado Entorno Imediato o con-

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junto de municípios goianos vizinhos ao DF que tiveram seus pro-cessos de ocupação e crescimento demográfico diretamente rela-cionados à expansão urbana do DF – Águas Lindas de Goiás, SantoAntônio do Descoberto, Planaltina, Valparaíso de Goiás, Luziânia,Novo Gama e Cidade Ocidental. Os demais municípios que com-põem a Ride, e que não sofreram impacto direto do processo deexpansão urbana periférica do DF, serão denominados EntornoDistante.

13. Na análise sobre a migração foi necessária uma opçãometodológica diferenciada para os dados dos Censos Demográficosrealizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGEem 1980 e 1991, e o Censo de 2000. Nos casos em que não foipossível identificar a residência anterior (origem por municípios),foi feita a opção pela adoção da informação referente à data fixa.Para efeito de comparabilidade, nesses casos foi utilizada para osCensos de 1980 e 1991, a informação referente à residência an-terior, para os migrantes com menos de cinco anos de residência;e, para o Censo de 2000, a informação referente ao município deresidência em 31/7/1995. Apesar de reconhecer que as informa-ções não são comparáveis em termos de volumes – principalmentenos casos de múltiplos movimentos no período intercensitário – aopção foi feita em função de ser essa a única possibilidade de iden-tificar o município de origem dos fluxos migratórios para o Censode 2000. A informação referente à data fixa tem como vantagemformal, nos dados demográficos, a determinação clara do períodoreferente à migração. No entanto, no caso da migração intra-metropolitana, movimento em que são mais freqüentes asreimigrações de curto prazo, a informação de data fixa tem comodesvantagem a perda dos movimentos ocorridos no primeiroqüinqüênio, além do fato de essa informação considerar apenas aspessoas maiores de cinco anos. Para maiores detalhes sobre as di-ferenças entre esses dois tipos de informação, ver Carvalho e Rigotti(1998).

14. O Índice de Eficácia Migratória é calculado a partir do quoci-ente entre migração líquida e migração bruta, sendo que os valorespositivos próximos a um (1) indicam áreas de atração de popula-ção, e os valores negativos próximos a (-1) indicam áreas de eva-são de população. Valores próximos a zero indicam área de grandecirculação de população (imigração próxima à emigração). Naanálise desse índice foi utilizada a tipologia estabelecida porBaeninger (1999), sendo os diferentes espaços regionais classifi-cados, segundo os IEM, em: área de forte evasão migratória (-1,00a -0,51); área de média evasão migratória (-0,50 a -0,30); área debaixa evasão migratória (-0,29 a -0,01); área de rotatividade mi-gratória (0,00 a 0,09); área de baixa absorção migratória (0,10 a0,29); área de média absorção migratória (0,30 a 0,50) e área deforte absorção migratória (0,51 a 1,00).

15. Na verdade, mesmo os fluxos intra-regionais mais significati-vos – emigração do DF para os municípios da região – são interes-taduais, uma vez que a região é constituída por três UFs (DF, Goiáse Minas Gerais). No entanto, para melhor compreensão da migra-ção intra-regional, esses fluxos serão denominados intra-regionais,ou intrametropolitanos, ainda que envolvam diferentes UFs.

16. Antes mesmo da inauguração da capital, durante o processo desua construção, o recrutamento de trabalhadores que iriam tornarrealidade o projeto do Governo Federal deu origem a um intensofluxo migratório, baseado em expectativas supervalorizadas deempregos e melhores condições de vida. As condições especiais demercado de trabalho e salários eram o principal atrativo para apopulação que não encontrava condições satisfatórias de vida emseus Estados de origem. As expectativas de melhoria das condiçõesde vida fundamentavam-se na grande oferta de empregos, em salá-rios mais elevados que nos locais de origem, na não-limitação detrabalho em horas extras e no fato de o treinamento ser realizadono próprio local de trabalho – o que dispensava experiência ante-rior e possibilitava rápida ascensão profissional, em função dashabilidades recém-adquiridas (HOLSTON, 1993).

17. Goiás havia recebido grande fluxo de imigrantes na década an-terior, pela expansão da fronteira agrícola – o que certamente fa-voreceu nova etapa migratória em direção a Brasília.

18. A taxa de migração estabelece uma relação entre o volume dofluxo migratório e a população média da região.

19. Infelizmente, os dados censitários não nos permitem medir osfluxos pendulares entre as Regiões Administrativas de localizaçãoperiférica e o Plano Piloto, o que certamente elevaria os volumesverificados.

20. Termos utilizados como títulos de textos escritos por Campose Gouvêa (apud PAVIANI, 1989).

21. Segundo os dados da PED para julho de 2003, a taxa de desem-prego era de 23% da PEA, sendo o volume de desempregados esti-mado em 263,1 mil pessoas.

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DESLOCAMENTOS INTRA-URBANOS E ESTRUTURAÇÃO SOCIOESPACIAL...

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MARIA CÉLIA SILVA CAIADO: Arquiteta, Doutora em Demografia,Pesquisadora do Núcleo de Economia Social Urbana e Regional doInstituto de Economia da Unicamp e pós-doutoranda pelo CNPQ noNúcleo de Estudos da População da Unicamp ([email protected])

Artigo recebido em 16 de setembro de 2005.Aprovado em 17 de novembro de 2005.

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MARIA DE LOURDES JARDIM / TANYA M. DE BARCELOS

E

Resumo: Este texto avalia as tendências da mobilidade populacional na Região Metropolitana de PortoAlegre – RMPA nos anos 90, em relação com seu perfil econômico recente. Para tanto, explora osdados do Censo de 2000, em termos de origem/destino da migração intrametropolitana e fluxos pendulares.Palavras-chave: Migração. Mobilidade pendular. Metrópoles.

Abstract: This paper analyses the main trends of evolution of the population movements in the PortoAlegre Metropolitan Area, and its relationships with recent economic changes. It is based on the 2000Demographic Census, and it focuses the origin and destination of population flows.Key words: Migration. Population mobility. Metropolitan areas.

MARIA DE LOURDES JARDIM

TANYA M. DE BARCELLOS

MOBILIDADE POPULACIONAL NAREGIÃO METROPOLITANA DEPORTO ALEGRE NOS ANOS 90

ste trabalho integra-se ao campo de estudos sobreas mudanças que acompanham o processo dereestruturação econômica e globalização que inci-

dem sobre as configurações urbanas, especialmente nasáreas metropolitanas. Harvey (1992) chama a atenção paraalgumas características da globalização, como a “com-pressão espaço/tempo”, que flexibiliza as escolhas delocalização das atividades econômicas, promovendo umacompetição maior entre lugares. As possibilidades de des-concentração que se divisam alteram substancialmente osmovimentos dos capitais e das populações. Observa-se osurgimento de novas territorialidades, que emergem derearticulações na produção industrial e agrícola e naorganização das atividades de prestação de serviços eprovocam uma nova dinâmica migratória. Nesse contexto,a grande cidade

tem que ser entendida levando-se em conta os nexos que seestabelecem com as cidades do entorno, alcançando às vezesoutras regiões, que se traduzem em aglomerações regionais,

uma vez que os complexos urbanos extravasam as cidades,conectando-se de maneira integralizada (BAENINGER,1997).

O texto trata especificamente da mobilidade populacio-nal – particularmente da intrametropolitana enquanto ele-mento crucial na compreensão da formação e consolida-ção de novos espaços urbanos. O foco volta-se para aRegião Metropolitana de Porto Alegre – RMPA nos anos90, para examinar o fenômeno da mobilidade em sua rela-ção com as recentes transformações do perfil econômicoda região. Trata-se mais especialmente do movimento dereconcentração da indústria no espaço metropolitano – fatoque se verifica nos anos 90, após um período em que eraperceptível uma tendência à desconcentração das ativida-des econômicas, sobretudo da indústria. Também levou-se em consideração o aumento da importância do comér-cio fora da sede metropolitana.1 A partir dos dados doCenso Demográfico 2000, foram dimensionados e caracte-rizados em termos de origem/destino: a imigração para a

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metrópole, os fluxos intrametropolitanos e os movimentospendulares. Desse modo foi possível formar um panoramada dinâmica demográfica e de seu papel na conformaçãodo espaço metropolitano.

SOBRE A FORMAÇÃO E EXPANSÃO URBANA

É importante demarcar alguns pontos relativos à forma-ção histórica da área que hoje constitui a RMPA, que sãoimportantes para a compreensão das características bási-cas assumidas pela configuração metropolitana no perío-do recente.

Primeiramente, é necessário voltar ao final do século18 e início do 19, quando Porto Alegre já se ressalta comoporto de saída dos excedentes produzidos pela agricul-tura de subsistência dos colonos açorianos localizadosem Viamão, Gravataí e Santo Antônio da Patrulha e aolongo dos vales dos rios Taquari e Jacuí, em Cachoeira,Rio Pardo, Triunfo, Santo Amaro2 e Taquari (CARRION,1989; ORTH; ALVES, 2001). A partir de 1824, a imigraçãoalemã foi o centro de formação de novos núcleos de pro-dução colonial, tendo por base São Leopoldo, ao nortede Porto Alegre, no vale do rio dos Sinos, e representouum momento fundamental no processo de constituiçãoda região.

Entre Porto Alegre e as colônias, estabeleceu-se inten-so comércio – fato que, segundo Singer (1968), criou asbases de forte processo de industrialização, que levou acidade a assumir a liderança industrial do Estado a partirde 1920. A indústria que aí se desenvolveu apresentoudesde cedo uma estrutura diversificada e voltada para omercado local.

Nesse comércio, predominou o transporte fluvial atéo fim do século 19, quando surgiu outro fato relevanteque marcou o desenvolvimento da região: a construçãode uma ferrovia, que pretendia responder à grande expan-são da produção local. Em 1874, foi concluído o trechoentre Porto Alegre e São Leopoldo, que, em 1876, alcan-çou Novo Hamburgo; em 1903, Taquara; e, em 1924, Ca-nela (CARRION, 1989).

Assim, formou-se um eixo em direção ao norte, que se-guia a via férrea e depois a BR-116, concluída no final dosanos 40, ligando São Leopoldo e Novo Hamburgo a PortoAlegre. Desta forma, desde meados do século 20 até o iní-cio dos anos 70, esse eixo concentrou a ocupação urbana eindustrial da atual RMPA. O desenvolvimento industrialque se estendeu para fora de Porto Alegre, seguindo a di-reção das antigas colônias, deu lugar a uma expansão ur-

bana com formato distinto do clássico “centro-periferia” quecaracteriza grande parte das metrópoles brasileiras (Mapa1). De tal modo ocorreu a expansão urbana que se configu-rou uma conformação “multipolar”, até hoje claramenteidentificável, com Porto Alegre no centro da parte sul daregião e São Leopoldo e Novo Hamburgo polarizando onorte (CASTELLO BRANCO, 2003).

Além desse vetor, foram importantes na conformaçãoda região os núcleos urbanos antigos em Viamão e Gravataí,situados respectivamente a leste e nordeste de PortoAlegre.

Em termos econômicos, além de Porto Alegre e de NovoHamburgo e São Leopoldo, no Vale dos Sinos, começarama se sobressair outros centros industriais, como Canoas.Nesse caso, foi fundamental a instalação da Refinaria AlbertoPasqualini, que ensejou o desenvolvimento de um parqueindustrial já diversificado em 1970 e que cresceu com a pre-sença de vários ramos dinâmicos, como química, materialelétrico e de comunicações, metalurgia e mecânica. Já NovoHamburgo e São Leopoldo formaram uma estrutura indus-trial muito especializada no ramo coureiro-calçadista, juntocom outras localidades do norte metropolitano – muito em-bora já tenham atualmente ampliado as atividades de comércioe serviços, constituindo-se em pólos regionais.

Na década de 70, a construção da BR-290 – que ligaPorto Alegre à BR-101 – também configura um fator a serdestacado no processo de expansão da metrópole, poisfavoreceu a implantação de indústrias no eixo leste-nor-deste, em Gravataí e Cachoeirinha (Mapa 1).

Um dos efeitos dessa dinâmica foi um movimento cres-cente de concentração populacional na RMPA: em 1940,nela estavam 12% da população do Estado – proporçãoque alcançou os 23% em 1970, 29% em 1980, atingindo 33%em 1991 (CARRION, 1989; BARCELLOS, 2002). Na últimadécada, o incremento já não foi tão significativo, estabili-zando a participação da RMPA na população do RS em 34%(BARCELLOS, 2002).

Mesmo com menor crescimento e perdendo peso de-mográfico, a sede metropolitana ainda concentra grandeparcela da população da região, numa proporção que foide quase 40% em 2000. Em contraposição, os demais mu-nicípios ampliaram sua fatia na composição da populaçãoda metrópole, passando de 13% para 15% (BARCELLOS,2002).

Há pelo menos duas décadas, o crescimento demográ-fico metropolitano já vem se concentrando no entorno ime-diato de Porto Alegre e em algumas localidades pequenassituadas no Vale dos Sinos, na região da produção coureiro-

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calçadista do Estado. Entre 1991 e 2000, a população me-tropolitana aumentou em média 1,7% ao ano – taxa quealcança os 2,2% quando se exclui o núcleo. Nas localida-des periféricas da capital, o crescimento superou os 5% aoano em Nova Santa Rita, município desmembrado de Ca-noas, e quase alcançou os 5% em Eldorado do Sul. EmAlvorada e Viamão, tradicionais cidades-dormitório, as taxaforam superiores a 2,5%. Ainda no entorno de Porto Ale-gre, deve ser destacado o incremento populacional deGravataí, sede do complexo automotivo da General Motors,que foi de 2,9% ao ano, bem acima da média metropolitana.Na região do Vale dos Sinos, as cifras são igualmente im-pressionantes em alguns casos, muito embora se trate demunicípios de pequeno porte, como Nova Hartz e Dois Ir-mãos, onde a taxa de incremento também se aproximou dos

5%; e Parobé, Ivoti e Araricá (desmembrado de Sapiranga),onde foi superior a 3% ao ano (Mapa 2).

Porto Alegre perdeu peso demográfico e reduziu seuritmo de incremento populacional. Sua contribuição àformação da população urbana gaúcha diminuiu de 21,43%,em 1980, para 18,06%, em 1991, e para 16,36%, em 2000. Ataxa de crescimento demográfico, que era de 2,4% ao anona década de 70, ficou em apenas 1,1% entre 1980 e 1991(BARCELLOS, 2002), caindo para 0,9% ao ano entre 1991 e2000: bem abaixo, inclusive, da taxa de incremento popu-lacional média do Rio Grande do Sul, que na última décadafoi de 1,2% ao ano (Mapa 2). A dinâmica demográfica dacapital reflete as transformações relacionadas aos pro-cessos de desconcentração da produção industrial comoparte da redução das vantagens locacionais nas grandes

MAPA 1

Principais Rodovias da Região Metropolitana de Porto Alegre

Fonte: Secretaria da Coordenação e Planejamento, Metroplan, Daer.

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aglomerações e de periferização da moradia da força detrabalho.

Os municípios da RMPA que apresentaram taxa de cres-cimento demográfico inferior ao incremento médio obser-vado na região entre 1991 e 2000 (1,7% a.a.) foram, além dePorto Alegre: Arroio dos Ratos, Campo Bom, Canoas, Es-teio, Novo Hamburgo, Santo Antônio da Patrulha, SãoJerônimo e São Leopoldo (Mapa 2). Deve-se ressaltar quetambém os pólos da área coureiro-calçadista, São Leopoldoe Novo Hamburgo, estão reduzindo a intensidade de seuincremento demográfico, enquanto grande parte dos mu-nicípios da região cresce a um ritmo mais acentuado, indi-cando talvez um movimento semelhante ao que já vemocorrendo na capital, que expulsa população para municí-pios limítrofes.

A ECONOMIA METROPOLITANANO PERÍODO RECENTE

A concentração demográfica da RMPA expressa umaconcentração econômica, que pode ser avaliada pela parti-cipação da região na composição do Valor Adicionado Bruto– VAB do Estado. Embora tenha caído entre 1990 e 1998, opeso do produto metropolitano no VAB gaúcho aumentouno final da década, superando os 40%. Na indústria, a con-tribuição de 51,3% à formação desse setor, em 1990, caiuaté 1998, recuperando-se depois disso, quando alcançouos 54,7%, em 2000. No que se refere ao setor terciário (co-mércio e demais serviços), a economia metropolitana repre-sentou em torno de 41% do produto gerado no Rio Grandedo Sul por esse segmento naqueles anos. O comércio teve

MAPA 2

Taxa Média de Crescimento Anual da PopulaçãoRegião Metropolitana de Porto Alegre – 1991/2000

Fonte: IBGE.

21 Portão22 Dois Irmãos23 Triunfo24 São Jerônimo25 Nova Santa Rita26 Ivoti27 Nova Hartz28 Arroio dos Ratos29 Glorinha30 Araricá

1 Porto Alegre2 Canoas3 Novo Hamburgo4 Gravataí5 Viamão6 São Leopoldo7 Alvorada8 Sapucaia do Sul9 Cachoeirinha

10 Guaíba

11 Esteio12 Sapiranga13 Montenegro14 Campo Bom15 Taquara16 Parobé17 Santo Antônio da Patrulha18 Estância Velha19 Charqueadas20 Eldorado do Sul

Número Município Número Município Número Município

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TABELA 1

Participação do Valor Adicionado Bruto (VAB) no VAB Total, por Setor da EconomiaRegião Metropolitana de Porto Alegre – 1990-2000

Em porcentagem

Anos Agropecuária Indústria Comércio Demais Total dos VAB TotalServiços Serviços

1990 4,9 51,3 47,3 38,3 40,5 40,9

1996 3,4 48,5 49,6 37,7 40,2 38,2

1997 3,5 47,6 51,3 37,8 40,6 38,8

1998 3,7 47,9 50,7 37,5 40,1 38,0

1999 3,5 50,7 51,0 37,8 40,5 39,4

2000 3,3 54,7 54,3 38,4 41,6 42,4

Fonte: FEE/Núcleo de Contabilidade Social.

forte incremento de participação no período, passando de47,3%, em 1990, para 54,3%, em 2000 (Tabela 1).

No interior do espaço metropolitano, podem ser identi-ficados alguns diferenciais importantes no que diz respei-to às características da atividade econômica, de modo apermitir sua organização em sub-regiões (Mapa 3). Alonso(2003, p. 5), em estudo preliminar sobre os efeitos da rees-truturação nas formações metropolitanas de Porto Alegree Curitiba, compõe o seguinte conjunto:3

A RMPA 1 ocupa, predominantemente, a parte norte da RMPA,ao longo da BR – 116. Tem uma estrutura econômica comforte presença industrial, que pode ser considerada espe-cializada na cadeia coureiro-calçadista. A rede urbana desterecorte é polarizada por dois centros, São Leopoldo e NovoHamburgo. A RMPA 2, localizada na parte sul da RMPA,sedia a capital do Estado e tem uma formação econômicadistinta da anterior, na medida que apresenta um setorindustrial diversificado e de maior porte, tanto no agregado,quanto no número de grandes plantas. Diferencia-se aindapor reunir uma oferta maior de serviços, mais complexa emais sofisticada. A RMPA 3 está localizada na parte sudesteda RMPA, não tem relevância econômica nem urbana, sendoconstituída por apenas três pequenos centros. É metro-politana apenas por estar fisicamente muito próxima damancha metropolitana. A RMPA 4 é formada por trêsmunicípios localizados na parte oeste da RMPA. Sua principalcaracterística é sediar a planta do Pólo Petroquímico do Sul(Triunfo). Faz parte deste recorte também o município deMontenegro que possui um parque industrial mais diver-sificado situado no principal eixo de expansão da RMPA, nocaminho para Lajeado, Estrela, Teutônia, Santa Cruz do Sul

e Venâncio Aires. Por fim, a RMPA 5 é constituída somentepelo município de Santo Antônio da Patrulha, um dos quatroprimeiros criados no RS. Localiza-se na parte leste da RMPA,não tem expressão econômica. Tem uma estrutura econômicapeculiar para o padrão metropolitano, baseada na históricaprodução de cana de açúcar, produção de bens a partir desteproduto agrícola.

Na última década, observam-se algumas mudanças im-portantes na estrutura produtiva metropolitana. Entre 1990e 1998, houve uma redução significativa da participaçãorelativa do setor industrial no conjunto da produção, ten-do como contrapartida um avanço do setor de serviços.Já no período que vai de 1999 a 2001, a produção indus-trial recuperou posição, e verificou-se uma queda do se-tor de serviços na composição da produção metropolita-na (ALONSO, 2003).

Em termos do comportamento do emprego, embora nes-sa última década tenha havido um saldo positivo no con-fronto entre a queda do emprego industrial e o crescimen-to dos postos de trabalho nas atividades terciárias,verificou-se um crescimento da população economicamen-te ativa – PEA, que ultrapassou esses excedentes, redun-dando em índices relevantes de desemprego (FEE, 2003).

A indústria sofreu profundo processo de ajuste (fusões,terceirização de serviços e introdução de inovações tec-nológicas), tendo em vista a reestruturação produtiva in-ternacional, com seus desdobramentos no país, e a políti-ca econômica interna que, adequando-se às exigências doFundo Monetário Internacional – FMI, passou a priorizaros princípios liberais de abertura comercial e redução dotamanho do Estado (ALONSO, 2003).

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Esse quadro de mudanças estruturais apresentou efei-tos no território. Após um período em que se podia obser-var uma tendência à desconcentração das atividades eco-nômicas – principalmente as industriais – a década de 90trouxe sinais de um movimento de reconcentração da indús-tria no espaço metropolitano. Desde o início da década, jáse percebia que, quando fosse iniciado um novo ciclo deinvestimentos industriais, as formações metropolitanas de“tamanho médio” (Porto Alegre, Curitiba e Belo Horizonte)ganhariam espaço nas escolhas locacionais. Também no casodo Rio Grande do Sul, havia indícios de uma possível reto-mada do processo de concentração industrial no âmbito daaglomeração metropolitana. Nos anos 90, mais especifica-mente a partir de 1999, houve efetivamente uma reversão natendência à desconcentração industrial (ALONSO, 2003).

O aumento da concentração industrial na RMPA nãofoi generalizado para os diferentes segmentos da indús-tria. Na verdade, ele se deve ao crescimento de algumaspoucas divisões, afetando sobretudo alguns espaços den-tro da metrópole.

No complexo agroindustrial,4 há duas divisões que ele-varam sua produção na RMPA: a de Bebidas (cervejas erefrigerantes), que se concentra na RMPA 2, sobretudo emPorto Alegre, e passou por profundo ajuste nas suas em-presas; e a cadeia de Couro e Calçados, que volta a ampli-ar sua produção no Vale dos Sinos, depois do movimentode dispersão para fora dos limites da RMPA durante osanos 80 (ALONSO, 2003).

As divisões de Material de Transporte e Material Ele-trônico e de Aparelhos e Equipamentos de Comunicações

MAPA 3

Divisão da Região Metropolitana de Porto Alegre em Sub-Regiões

Fonte: Alonso (2003).

21 Portão22 Dois Irmãos23 Triunfo24 São Jerônimo25 Nova Santa Rita26 Ivoti27 Nova Hartz28 Arroio dos Ratos29 Glorinha30 Araricá

1 Porto Alegre2 Canoas3 Novo Hamburgo4 Gravataí5 Viamão6 São Leopoldo7 Alvorada8 Sapucaia do Sul9 Cachoeirinha

10 Guaíba

11 Esteio12 Sapiranga13 Montenegro14 Campo Bom15 Taquara16 Parobé17 Santo Antônio da Patrulha18 Estância Velha19 Charqueadas20 Eldorado do Sul

Número Município Número Município Número Município

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também apresentaram expansão na RMPA. A primeira ex-perimentou o maior avanço na produção industrial metro-politana, como resultado, em grande parte, do início dasoperações do Complexo Automotivo de Gravataí (GeneralMotors), em meados de 2000.

A divisão de Produtos Químicos, cuja cadeia na RMPAsofre forte influência das atividades de “refino de petróleo”,aumentou consideravelmente sua produção na RMPA (Ca-noas e Triunfo). Deve ser mencionada, por fim, maior presen-ça, na RMPA, de Produtos Farmacêuticos e Veterinários, quejá apresentava forte concentração na região, particularmenteno município de Porto Alegre (ALONSO, 2003).

Nas sub-regiões que compõem a metrópole gaúcha, ve-rificou-se que a RMPA 1 – onde a produção de artigos decouro e calçados é predominante em todos os municípios– manteve sua participação no conjunto do Estado, emtodos os setores, nos anos 90. Na década de 90, persistiua tendência à perda relativa da função industrial exercidahistoricamente por São Leopoldo e Novo Hamburgo. Ou-tras localidades, como Dois Irmãos e Ivoti, elevaram suaparticipação na produção industrial do Estado, absorven-do, em certa medida, a produção industrial antes concen-trada naqueles dois municípios.

A RMPA 2,, que abrange a parte sul da RMPA e tem Por-

to Alegre como centro principal, secundada por Canoas eGravataí, tem um perfil econômico diversificado tanto doponto de vista industrial quanto de serviços. A produçãoindustrial, o movimento comercial e o de serviços dessa sub-região é muito superior ao da RMPA 1. É nela que apare-cem mais nitidamente as mudanças do ajuste procedido nosanos 90. A indústria dessa parcela da RMPA, que tevequeda de participação no produto industrial do Rio Grandedo Sul entre 1985 e 1998, voltou a crescer – o que indica umprocesso de reconcentração geográfica de suas atividades.Esse resultado derivou de alguns grandes investimentoslocalizados nessa área, especialmente em Canoas e Gravataí.Foi ainda muito importante, nessa sub-região, o incremen-to do setor de serviços, capitaneado pelas atividades docomércio de mercadorias – o que expressa a centralidadeexercida por Porto Alegre e ainda a ampliação da capacida-de polarizadora de Canoas, cidade antes muito dependentedo comércio da capital. Avanços menores, mas importan-tes do ponto de vista local, registraram-se no comércio deEsteio, Cachoeirinha e Alvorada (ALONSO, 2003).

A RMPA 3, assim como a RMPA 5, não experimentoumudanças significativas nos anos 90. Constituída por trêsmunicípios (Arroio dos Ratos, Charqueadas e São Jerô-nimo), situa-se numa área “quase deprimida” do ponto de

vista econômico. Embora o município de Charqueadas sejasede de um “enclave industrial” representado pela antigaplanta da empresa estatal Aços Finos Piratini, que foiprivatizada pelo Grupo Gerdau e sofreu reestruturação, oempreendimento não trouxe reflexos relevantes para a ren-da local (ALONSO, 2003).

A RMPA 4, onde se verifica predominância das ativi-dades industriais na estrutura econômica, foi a sub-regiãoque apresentou o maior aumento de participação no pro-duto estadual. Triunfo – município que sedia o PóloPetroquímico, empreendimento que recebeu investimentosnos anos 90 – duplicou sua capacidade instalada; eMontenegro – que tem certa tradição industrial – ganhouespaço no contexto industrial do Rio Grande do Sul – es-pecialmente em função do crescimento do segmentoprocessador de aves para consumo interno e exportação(ALONSO, 2003).

A RMPA 5, constituída pelo município de Santo An-tônio da Patrulha, tem um peso pequeno na economia es-tadual e não apresentou grandes alterações na participa-ção do seu produto na formação do Produto Interno Bruto– PIB gaúcho. Não obstante, deve ser mencionada a re-dução da importância das atividades agropecuárias naeconomia local, em função da desarticulação da produ-ção de cana-de-açúcar, que se concentrava nesse muni-cípio. No setor industrial, houve queda na produção dealimentos e aumento relevante na presença do ramocoureiro-calçadista, praticamente inexistente até os anos80 – o que significa uma transformação estrutural no par-que industrial local.

CARACTERÍSTICAS DA MOBILIDADEPOPULACIONAL NO ESPAÇO DA METRÓPOLE

Durante a década de 90, a migração com destino à RMPAoriginou-se majoritariamente na própria região ou no inte-rior do Rio Grande do Sul, ou seja, ela foi predominante-mente de caráter interno. Os fluxos vindos do resto do paísnão tiveram grande significado na dinâmica demográficada metrópole gaúcha e diminuíram no período 1991-2000:representavam cerca de 14% do total de migrantes compu-tados pelo levantamento censitário de 1991, reduzindo-separa 13% em 2000.5 Os deslocamentos intrametropolitanos,em detrimento dos procedentes de outras localidades doEstado, vêm aumentando sistematicamente seu peso, pas-sando de 34% do total, em 1980, a 42% em 1991, e a 47% em2000, seguindo a tendência encontrada em outras metró-poles nacionais (Gráfico 1).

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GRÁFICO 1

Migrantes de Cinco Anos ou Mais (1),segundo Local de Residência Anterior

Região Metropolitana de Porto Alegre – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.(1) Foram consideradas migrantes as pessoas com cinco anos ou mais que, na data daentrevista, residiam há menos de cinco anos no município.

tino de fluxos populacionais. Durante os anos 90, caiu de79,4% para 74,2% a proporção de migrantes que se deslo-caram para a RMPA 2, em favor da RMPA 1, indicando queos fatores atrativos naquela área estavam se ampliando.Provavelmente esse fenômeno se relaciona com a dinâmicada indústria coureiro-calçadista, que é grandemente absor-vedora de mão-de-obra e manteve sua fatia na economiagaúcha. A diferença entre emigração e imigração, nesse caso,foi positiva (Tabela 2).

As trocas líquidas entre imigração e emigração nos mu-nicípios da RMPA mostram aspectos da realidade metro-politana que acompanham tendências identificadas emoutras metrópoles brasileiras – como é o caso da sede me-tropolitana, que pela segunda vez apresenta saldo negati-vo nas trocas entre chegada e saída de migrantes. Essaperda ocorrida na capital decorre especialmente da relaçãocom os municípios de seu entorno – fato que aponta paraum processo de periferização de sua população.6 É interes-sante notar que, dentre os municípios envolvidos, encon-tram-se não somente aqueles que são tradicionalmentedormitórios, especialmente para trabalhadores em serviçosmal remunerados na capital, como Viamão e Alvorada, mastambém localidades com dinamismo industrial, comoGravataí e, de certo modo, Cachoeirinha. Canoas, segundacidade da região em tamanho populacional, e que teve sal-do positivo nas trocas entre emigração e imigração comPorto Alegre, apresentou saldo negativo no total das tro-cas, indicando que estão em curso processos de valoriza-ção imobiliária, que dificultam o acesso à moradia (Mapa 4).Essa conclusão ancora-se em estudo recente que consta-tou que essa localidade estava recebendo fluxos popu-

Quando a migração intra-metropolitana é desagregadaem sub-regiões, sobressai a concentração de fluxos proce-dentes da e dirigidos à sub-região polarizada por PortoAlegre – a RMPA 2 – que supera, nos dois casos, os 70%.Essa sub-região, com a concentração não só de indústrias,mas especialmente de comércio e de serviços, constitui oespaço que apresenta as maiores condições de atrativida-de na RMPA. No balanço entre saída e entrada de migran-tes, essa sub-região terminou por apresentar um saldo ne-gativo, em função dos resultados de Porto Alegre e Canoas.A RMPA 1 aparece em segundo lugar como origem e des-

Residentes na RMPA

47%

Residentes no Rio Grande do Sul Fora

da RMPA39%

Residentes Fora do País

1%

Residentes no Brasil Fora do

Rio Grande do Sul 13%

TABELA 2

Migrantes de Cinco Anos ou Mais (1), por Sub-Região de Residência AnteriorRegião Metropolitana de Porto Alegre – 2000

Sub-Região de Sub-Região de Residência AnteriorResidência Atual 1 2 3 4 5 Total

Total 36.790 125.449 3.173 2.292 1.272 168.976

1 25.635 11.518 220 512 338 38.223

2 9.634 106.941 1.834 1.118 898 120.425

3 432 3.991 878 202 36 5.539

4 703 1.925 241 451 - 3.320

5 386 1.074 - 9 - 1.469

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da amostra.(1) Foram consideradas migrantes as pessoas de cinco anos ou mais que, na data da entrevista, residiam há menos de cinco anos no município.

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lacionais compostos por camadas médias e categorias so-ciais de renda mais alta (BARCELLOS, 2002). Alvorada eViamão expandiram-se como continuidade das áreas peri-féricas de Porto Alegre. Embora algumas mudanças este-jam se verificando nessas localidades – como a instalaçãode indústrias e o incremento da moradia de camadas mé-dias – elas ainda se mantêm como “dormitório”, caracterís-tica que se confirma no estudo dos fluxos pendulares, comose verá mais adiante. Gravataí está passando por um mo-mento de incremento significativo de seu dinamismo eco-nômico, capitaneado pelo complexo automotivo da Gene-ral Motors, que, justifica a atração de população.

A análise da migração com destino à RMPA, incluindoos fluxos originados em localidades que não integram aregião, evidenciam que as forças centrípetas nela atuan-

tes atingem um raio maior de extensão. Se nos fluxos in-trametropolitanos foram verificados saldos positivos ele-vados – sobretudo no entorno de Porto Alegre –, quandoé computada a totalidade da imigração/emigração, não so-mente amplia-se a atração nesse entorno imediato que en-volve os municípios de Guaíba e Eldorado do Sul, comotambém passam a se destacar outros municípios. É o casode São Leopoldo e de localidades pequenas da RMPA 1,que se encontram na área de influência dos municípios-pólos do Vale dos Sinos, de Triunfo – município industri-al que faz parte da sub-região 4 – e de Charqueadas –localidade sem importância urbana, que integra a sub-re-gião 3, mas que, como visto antes, apresentou diferencialpositivo nas trocas entre emigração e imigração com Por-to Alegre (Mapa 5). Essas duas sub-regiões apresenta-

MAPA 4

Trocas Líquidas nos Fluxos MigratóriosRegião Metropolitana de Porto Alegre – 1995/2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da Amostra.

21 Portão22 Dois Irmãos23 Triunfo24 São Jerônimo25 Nova Santa Rita26 Ivoti27 Nova Hartz28 Arroio dos Ratos29 Glorinha30 Araricá

1 Porto Alegre2 Canoas3 Novo Hamburgo4 Gravataí5 Viamão6 São Leopoldo7 Alvorada8 Sapucaia do Sul9 Cachoeirinha

10 Guaíba

11 Esteio12 Sapiranga13 Montenegro14 Campo Bom15 Taquara16 Parobé17 Santo Antônio da Patrulha18 Estância Velha19 Charqueadas20 Eldorado do Sul

Número Município Número Município Número Município

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ram resultado positivo nas trocas entre saída e chegadade fluxos migratórios.

O perfil dos imigrantes na origem e no destino é uma in-formação fundamental para acrescentar conteúdo social àanálise do fenômeno migratório metropolitano. Isso porque,como as mudanças das últimas décadas interferem na or-ganização e localização da atividade econômica, também al-teram a estrutura social e provocam rearticulações nas re-lações sociais.7

Para abordar essa problemática, utilizaram-se indicado-res que analisam a distribuição por sexo, idade, faixas derenda e de instrução dos migrantes na RMPA.

Considerando o conjunto da população migrante e apopulação da RMPA como um todo, vê-se que, em linhasgerais, os perfis não são muito diferentes para os dois gru-

pos, à exceção da estrutura etária, que aponta para umaconfiguração bastante carregada nas faixas de idade maisativa (15 a 24 anos e 25 a 44 anos) entre os migrantes. Issoera evidentemente esperado e é compreensível, tendo emvista a correlação entre migração e mercado de trabalho –o que explica, também, a existência de uma razão de sexomais masculina no grupo dos migrantes.

Comparando os níveis de instrução e renda, encontra-se uma relativa proximidade entre os dois grupos, compequena vantagem para os migrantes na instrução (maiorproporção nas faixas de 8 a 10 e de 11 a 14 anos de estu-do), o que se reflete na média de anos de estudo dos mi-grantes, que é um pouco superior. Já em relação à renda, apopulação metropolitana em conjunto está melhor situa-da, com uma média mais alta e maior proporção nas faixas

MAPA 5

Trocas Líquidas nos Fluxos Migratórios IntrametropolitanosRegião Metropolitana de Porto Alegre – 1995/2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da Amostra.

21 Portão22 Dois Irmãos23 Triunfo24 São Jerônimo25 Nova Santa Rita26 Ivoti27 Nova Hartz28 Arroio dos Ratos29 Glorinha30 Araricá

1 Porto Alegre2 Canoas3 Novo Hamburgo4 Gravataí5 Viamão6 São Leopoldo7 Alvorada8 Sapucaia do Sul9 Cachoeirinha

10 Guaíba

11 Esteio12 Sapiranga13 Montenegro14 Campo Bom15 Taquara16 Parobé17 Santo Antônio da Patrulha18 Estância Velha19 Charqueadas20 Eldorado do Sul

Número Município Número Município Número Município

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de 5 a 10, de 10 a 20 e mais de 20 salários mínimos (Tabela3). Isso, de certo modo, indica que os problemas de inser-ção do migrante no mercado de trabalho são maiores, em-bora apresentem, em média, melhor qualificação.

Observando esses mesmos indicadores e consideran-do a origem e destino dos migrantes, constata-se que aspessoas que saíram da capital apresentam uma estruturaum pouco mais envelhecida, em especial se comparada coma dos que vieram do interior do Rio Grande do Sul. Os mi-

grantes que saíram da capital, e, em especial, os que paraela se dirigiram, apresentam uma situação melhor em rela-ção à instrução e à renda (Tabela 3). O fato de haver umaparcela da população com boas condições sociais quedeixa Porto Alegre para viver em municípios que consti-tuem uma extensão de seus bairros periféricos é umindicativo de mudança no conteúdo dos deslocamentosda capital para municípios de seu entorno, que eram ma-joritariamente de exclusão de camadas muito pobres do

TABELA 3

População Total e Migrantes de Cinco Anos ou Mais (1), por Local de Residência Anterior, segundo Variáveis PessoaisRegião Metropolitana de Porto Alegre – 2000

Migrantes

População RMPA RSVariáveis PessoaisTotal exceto Outros Total

Porto Alegre Exceto Total RMPAPorto Alegre

Sexo 3.708.746 60.512 108.458 168.970 131.141 51.237 351.348Mulheres 1.916.289 29.902 53.517 83.419 63.861 25.845 173.125Homens 1.792.457 30.610 54.941 85.551 67.280 25.392 178.223

Idade 3.708.745 60.511 108.459 168.970 131.140 51.236 351.346De 0 até 9 Anos 645.903 5.977 11.785 17.762 11.482 4.996 34.240De 10 até 14 Anos 325.505 5.564 9.834 15.398 10.825 4.573 30.796De 15 até 24 Anos 687.154 11.191 24.566 35.757 41.610 13.119 90.486De 25 até 44 Anos 1.154.467 25.836 44.607 70.443 49.087 21.126 140.656De 45 até 64 Anos 660.650 9.481 14.089 23.570 13.768 6.008 43.34665 Anos ou Mais 235.066 2.462 3.578 6.040 4.368 1.414 11.822

Renda (em saláriosmínimos) 3.061.435 54.473 96.624 151.097 119.583 46.229 316.909Até 1/2 SM 38.157 649 1.772 2.421 1.727 594 4.742Mais de 1/2 a 1 SM 273.294 4.236 8.285 12.521 10.901 2.999 26.421Mais de 1 a 2 SM 510.348 7.938 17.401 25.339 27.148 8.243 60.730Mais de 2 a 5 SM 645.430 12.450 21.379 33.829 26.207 7.902 67.938Mais de 5 a 10 SM 323.964 6.509 9.516 16.025 9.141 5.225 30.391Mais de 10 até 20 SM 149.830 2.414 3.227 5.641 4.360 3.236 13.237Mais de 20 SM 84.960 1.298 1.337 2.635 2.107 2.222 6.964Sem Renda 1.035.452 18.979 33.707 52.686 37.992 15.808 106.486

Anos de Estudo 3.686.390 60.118 107.742 167.860 130.297 50.878 349.035De 1 a 3 e Alfab. Adulto 488.256 7.374 16.794 24.168 16.333 5.967 46.468De 4 a 7 Anos 1.142.031 19.119 39.241 58.360 46.202 13.799 118.361De 8 a 10 Anos 580.099 11.794 18.933 30.727 23.399 8.749 62.875De 11 a 14 Anos 609.387 13.068 18.141 31.209 24.791 12.811 68.81115 Anos e Mais 216.541 3.226 3.530 6.756 8.006 5.584 20.346Sem Instrução 650.076 5.537 11.103 16.640 11.566 3.968 32.174Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da amostra.(1) Foram consideradas migrantes as pessoas com cinco anos ou mais que, na data da entrevista, residiam há menos de cinco anos no município.

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acesso à moradia, em função da valorização fundiária.Nessa constatação, pode-se identificar um novo proces-so, no qual são protagonistas as camadas de renda mé-dia e alta que, mais recentemente, optam pela moradia emcondomínios fechados, também nas localidades próximasdo centro metropolitano (LAGO, 2000; MATOS; LOBO;STEFANI, 2003).

Quando os municípios são estratificados por sub-regiãoe o perfil sociodemográfico é examinado, podem ser obti-dos alguns resultados que permitem avançar um pouco maisna abordagem das especificidades sociais dos espaços dametrópole, as quais são configuradas e expressas nas tro-cas populacionais.8

Primeiramente, constata-se que existem algumas espe-cificidades na análise da composição social dos diferentesgrupos. Somente na variável “idade” não se encontram di-ferenciais significativos: a concentração nas faixas maisativas se mantém, em especial no intervalo dos 25 aos 44anos, que caracteriza a estrutura dos migrantes em geral.As particularidades evidenciam-se em relação à instruçãoe à renda. É o caso dos migrantes cujo destino foi a RMPA2, polarizada por Porto Alegre, que se destaca com níveisbastante mais elevados de instrução e com a menor inci-dência nas faixas mais baixas de renda. Mesmo sem apre-sentar o maior percentual nos intervalos mais elevados, essasub-região distingue-se por uma distribuição mais equili-brada. A sub-região 1 tem um perfil semelhante, embora umpouco mais “pobre”. As demais mostram perfis bem menosqualificados e mais empobrecidos. Isso reflete as maioresoportunidades existentes nas áreas onde se concentram asatividades e o dinamismo econômico é maior.9

A MOBILIDADE PENDULAR

Os dados levantados pelo Censo Demográfico 2000 so-bre o “deslocamento da população do município de resi-dência para trabalhar ou estudar em outro município” – achamada “mobilidade pendular” – mostram que existe umfluxo considerável de pessoas que diariamente se deslo-cam para outro município, onde trabalham ou estudam, uti-lizando, portanto, muito mais a infra-estrutura deste do quea daquele de residência.

No Brasil, 7,4 milhões de pessoas trabalham ou estu-dam fora do município de residência – o que representa 6,7%das pessoas que trabalham ou estudam. No Rio Grande doSul, essa proporção é de 8,0% (JARDIM, 2003). Quandosão consideradas as regiões metropolitanas brasileiras,esse porcentual sobe para 10,6%. Na RMPA, esse fenô-

meno é ainda mais significativo, pois o porcentual de pes-soas que se deslocam para trabalhar ou estudar é de 14,8%.Esse porcentual é bastante representativo, mesmo sendouma característica das regiões metropolitanas, em funçãoda grande ligação entre os seus municípios – o que envol-ve um movimento constante de pessoas.10

Embora a informação levantada pelo Censo não separeos fluxos entre trabalho ou estudo, considera-se que amaior parte deles seja para trabalhar. Isso significa que umaparcela relevante da população passa a maior parte dohorário comercial fora do município. De fato, examinandoa condição de ocupação das pessoas em mobilidade,11

observa-se que o porcentual de pessoas que só trabalhamé muito elevado, principalmente entre os que moram naperiferia da RMPA e trabalham em Porto Alegre.12

Quando são comparados os perfis da população quetrabalha ou estuda no próprio município e da que se des-loca para outro município (Tabela 4), podemos detectardiferenciais interessantes em algumas características. Osdados mostram que a população que trabalha ou estudaem outro município é mais masculina, mais velha e, apesarde ter menor instrução, possui uma renda média mais ele-vada. Quando se comparam os perfis da população que sedesloca do município de residência para Porto Alegre e osda que se desloca para os outros municípios da RMPAverifica-se que a população que tem como destino a capi-tal tem traços distintos. Ela é menos masculina do que aque sai para a periferia da Região Metropolitana e, apesarde a idade média ser mais elevada, possui menor escolari-dade e menor rendimento médio. Tais características sãocondizentes com a absorção de mão-de-obra em serviçospredominante na capital, ficando as atividades industriaisconcentradas nos municípios periféricos.

A dinâmica da mobilidade pendular da Região Metro-politana de Porto Alegre pode ser sintetizada por meio dadistribuição geográfica dos fluxos, considerando-se osvolumes no município de origem (o local de residência), osvolumes no município de destino (o local onde trabalha ouestuda) e os saldos (ganhos populacionais do municípiopelos movimentos pendulares).

A partir da análise dessas informações, pode-se ver queos municípios com volume significativo de população quese desloca para trabalhar ou estudar formam uma área con-tígua. Já naqueles mais distantes do núcleo, os volumesdos que saem são mais baixos.13 O destino desses movi-mentos pendulares, por sua vez, está concentrado tantono município de Porto Alegre – que reúne grande parte docomércio e de serviços mais especializados – e nos de Ca-

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noas e Novo Hamburgo,14 que são centros industriais re-levantes na região.

Quando se avaliam os saldos da mobilidade pendular,as diferenças são ainda mais contrastantes. Somente Por-to Alegre e Novo Hamburgo possuem saldos dos fluxospendulares superiores a 10 mil habitantes, sendo que adistância entre o resultado da capital – 188 mil pessoas –,e o de Novo Hamburgo – 10 mil – é abismal. Também é dig-no de nota o saldo de Triunfo – 4 mil – que foi o terceiromaior em volume. Apesar de ser menos da metade do al-cançado por Novo Hamburgo, está muito acima dos ou-tros três municípios do grupo dos que possuem saldospositivos menores que 10 mil, que são: Nova Hartz, com109 habitantes; São Jerônimo, com 36 habitantes, e Ivoti,com 28 habitantes (Mapa 6). Com relação a Triunfo, deve-se destacar a presença do Pólo Petroquímico, que utilizatrabalhadores residentes em outros municípios.

Quando se consideram os vínculos inter-regionais quepodem ser representados pela mobilidade pendular, segun-do as sub-regiões da RMPA, evidenciam-se os pólos deatração e a sua relação com os municípios da sub-região.Muito embora grande parte dos municípios que as integramtenham apresentado saldos negativos no cômputo entrequanto recebem de fluxos para trabalho ou estudo e quan-to liberam de fluxos pendulares, a capacidade de atraçãode Porto Alegre, no caso da RMPA 2, e de Novo Hambur-go, na RMPA 1, acabou por gerar um saldo positivo nãodesprezível em nível desses espaços sub-regionais. Tam-bém os fluxos recebidos por Triunfo, que é o município maisimportante da RMPA 4, compensaram as saídas de popu-lação da sub-região para trabalhar ou estudar fora. Somenteas sub-regiões 3 e 5 – que na verdade são caudatárias de

outros centros urbanos mais importantes – tiveram saldosnegativos nessas trocas (Tabela 5).

Quando são analisados os saldos sub-regionais consi-derando-se apenas os fluxos intrametropolitanos, obser-va-se que os resultados da RMPA 2 refletem, na verdade,a mobilidade pendular de fora da região metropolitana – jáque, sem esses números, seu saldo é negativo. Vê-se por-tanto que, mesmo com o saldo positivo muito elevado dePorto Alegre, as diferenças negativas de outras localida-des como Alvorada e Viamão – onde é muito grande a saí-da de pessoas para trabalhar ou estudar na capital –15 tor-nam a RMPA 2 deficitária nos fluxos intrametropolitanos.

Em grande parte, esses movimentos entre Porto Alegree seu entorno ficam mais claros quando se examina a dis-tribuição da população que trabalha ou estuda na capital,segundo o local de residência em 1995 (Tabela 6). Ela mos-tra que mais da metade das pessoas que trabalham ou es-tudam em Porto Alegre eram residentes em 1995, revelan-do, portanto, que apesar de emigrarem da capital, continuammantendo vínculo com aquele município. Assim, fica com-provado que, para uma grande parte das pessoas, a pro-cura por trabalho ou estudo não foi a motivação para a mu-dança de local de moradia.16

Outro indicador importante para a análise dos movimen-tos pendulares é o porcentual de acréscimo populacionalque eles geram em relação à população que trabalha ouestuda. Esse indicador mede o plus populacional, que deveser considerado na formulação de políticas públicas de aten-dimento dessa parcela da população no município de tra-balho ou estudo e, em contrapartida, na formulação de po-líticas de geração de emprego no município de origem – jáque a grande maioria se desloca para trabalhar.

TABELA 4

População Residente Total e População que se Desloca do Município de Residência para Trabalhar ou Estudar,por Lugar de Trabalho ou Estudo, segundo Variáveis Pessoais

Região Metropolitana de Porto Alegre – 2000

Local de Deslocamento para Trabalho ou EstudoTrabalha ou

Variáveis RMPA RSEstuda no

TotalPessoais Porto Alegre Exceto Total exceto Outros Total

Próprio MunicípioGeral

Porto Alegre RMPA

Razão de Sexo 140,4 179,4 155,0 199,4 123,1 154,7 117,4 122,2Idade Média 34,7 32,5 33,8 34,2 28,0 33,6 27,3 28,2

Renda Média(em saláriosmínimos) 4,1 5,1 4,5 6,1 5,0 4,6 3,8 3,9Média de Anos de Estudo 5,4 6,3 5,8 6,0 8,7 5,9 6,0 6,0Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da amostra.

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MOBILIDADE POPULACIONAL NA REGIÃO METROPOLITANA DE PORTO ALEGRE...

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MAPA 6

Trocas Líquidas nos Fluxos PendularesRegião Metropolitana de Porto Alegre – 1995/2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da Amostra.

21 Portão22 Dois Irmãos23 Triunfo24 São Jerônimo25 Nova Santa Rita26 Ivoti27 Nova Hartz28 Arroio dos Ratos29 Glorinha30 Ararica

1 Porto Alegre2 Canoas3 Novo Hamburgo4 Gravataí5 Viamão6 São Leopoldo7 Alvorada8 Sapucaia do Sul9 Cachoeirinha

10 Guaíba

11 Esteio12 Sapiranga13 Montenegro14 Campo Bom15 Taquara16 Parobé17 Santo Antônio da Patrulha18 Estância Velha19 Charqueadas20 Eldorado do Sul

Número Município Número Município Número Município

TABELA 5

Mobilidade Pendular, segundo Sub-RegiãoRegião Metropolitana de Porto Alegre – 2000

Sub-Região

Total Intrametropolitana

Lugar de Lugar de Lugar de Lugar deTrabalho ou Estudo Residência

SaldoTrabalho ou Estudo Residência

Saldo

RMPA 1 63.113 58.473 4.640 55.373 53.396 1.977

RMPA 2 291.372 276.462 14.910 269.842 271.779 -1.937

RMPA 3 2.505 4.086 -1.581 1.858 3.713 -1.855

RMPA 4 6.516 3.367 3.149 5.152 2.696 2.456

RMPA 5 407 1.749 -1.342 222 863 -641Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da amostra.

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TABELA 6

População que se Desloca do Município de Residência para Trabalhar ou EstudarRegião Metropolitana de Porto Alegre – 2000

Município de Porto RMPA exceto RS exceto Participação deResidência Alegre Porto Alegre RMPA Outros Total Porto Alegre (%)Total 18.780 8.253 7.652 2.343 37.028 50,7RMPA 17.721 7.847 6.959 2.180 34.706 51,1Viamão 4.648 891 1.379 486 7.403 62,8Alvorada 3.864 1.041 1.404 335 6.644 58,2Gravataí 2.325 1.594 756 333 5.008 46,4Cachoeirinha 2.159 883 585 226 3.853 56,0Canoas 1.789 839 1.178 347 4.151 43,1Guaíba 925 377 305 58 1.665 55,5Eldorado do Sul 549 279 324 101 1.254 43,8Outros Municípiosda RMPA 1.462 1.944 1.028 294 4.728 30,9RS Fora da RMPA 1.059 407 693 163 2.322 45,6Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da amostra.

21 Portão22 Dois Irmãos23 Triunfo24 São Jerônimo25 Nova Santa Rita26 Ivoti27 Nova Hartz28 Arroio dos Ratos29 Glorinha30 Araricá

1 Porto Alegre2 Canoas3 Novo Hamburgo4 Gravataí5 Viamão6 São Leopoldo7 Alvorada8 Sapucaia do Sul9 Cachoeirinha

10 Guaíba

11 Esteio12 Sapiranga13 Montenegro14 Campo Bom15 Taquara16 Parobé17 Santo Antônio da Patrulha18 Estância Velha19 Charqueadas20 Eldorado do Sul

Número Município Número Município Número Município

MAPA 7

Acréscimo Populacional devido aos Movimentos Pendulares, em Relação ao Total da População que Trabalha ou EstudaRegião Metropolitana de Porto Alegre – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; Microdados da Amostra.

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Na RMPA, os municípios que têm um acréscimo de maisde 10% na sua população, em função dos deslocamentospendulares, são: Triunfo (28,9%) e Porto Alegre (20,6%). Oplus migratório pendular de Novo Hamburgo representa oterceiro maior, com 6,6% de acréscimo em sua população.As maiores perdas relativas de população são as dos mu-nicípios de Alvorada (-38,7%), Viamão (-33,1%), Araricá17

(-22,8%), Sapucaia do Sul (-22,3%), Eldorado do Sul (-21,6%),e Guaíba (-20,7%). Note-se que, à exceção de Araricá, sãotodos municípios do entorno de Porto Alegre (Mapa 7) quenão apresentam grande dinamismo econômico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Refletindo sobre os resultados da análise da mobilida-de populacional na RMPA durante os anos 90, na sua re-lação com as mudanças econômicas que a região experi-mentou, alguns pontos que dizem respeito à dinâmica desseespaço, em várias dimensões, devem ser ressaltados:- seguindo a tendência encontrada em outras metrópolesnacionais, o aumento da importância dos deslocamentosintrametropolitanos frente aos fluxos provenientes do in-terior do Estado significa que, como pólo privilegiado decrescimento populacional e econômico, a RMPA recebe osefeitos da reestruturação econômica e da crise que esseprocesso tem engendrado – cujos impactos se fazem sen-tir na redução em geral dos movimentos migratórios e noaprofundamento dos vínculos sociais e econômicos entreas localidades que integram a metrópole;- a sub-região polarizada por Porto Alegre – com concen-tração não só de indústrias, mas especialmente do comér-cio e dos serviços – constitui o espaço que apresenta asmaiores condições de atratividade na RMPA, que se re-forçaram nos anos 90 com o processo de reconcentraçãoda atividade industrial;- ao mesmo tempo, nesse período, persiste uma tendên-cia de ampliação do peso da migração para a RMPA 1 – oque indica que os fatores atrativos naquela área crescem,provavelmente, como resposta à dinâmica da indústriacoureiro-calçadista que é grandemente absorvedora demão-de-obra;- na análise das trocas líquidas entre imigração e emigra-ção nos municípios da RMPA, mais uma vez se destaca osaldo negativo da sede metropolitana, que perde nas rela-ções com os municípios de seu entorno – fato que apontapara um processo de expulsão da sua população. Novo éo fato de que os municípios envolvidos não se restringemaos tradicionais dormitórios, como Viamão e Alvorada, mas

abrangem também localidades com dinamismo industrial –como Gravataí e, de certo modo, Cachoeirinha;- na metrópole gaúcha, o perfil identificado nos migrantesexplicita uma realidade ainda adversa para esse grupo nomercado de trabalho, pois, embora com qualificação um poucomelhor, têm rendimento médio mais baixo, já os que saíramda capital – e, em especial os que para ela se dirigiram –apresentam melhores condições em relação à instrução e àrenda. No que se refere aos que saíram de Porto Alegre, amobilidade para localidades de seu entorno tem outroscomponentes além do já conhecido conteúdo de exclusão esegregação de camadas muito pobres. É possível que nessefato se manifeste a escolha crescente das camadas de rendamédia e alta pela moradia em condomínios fechados, naslocalidades próximas do centro metropolitano;- em termos de diferenças sociais no interior do espaçometropolitano, pode-se salientar que há melhor condiçãona estrutura de renda e instrução dos migrantes da RMPA2, polarizada por Porto Alegre, e, de certo modo, dos quetiveram por destino a RMPA 1, embora nela o perfil sejaum pouco mais “pobre”. As demais mostram perfis bem me-nos qualificados e mais empobrecidos, que refletem asmaiores oportunidades existentes nas áreas onde se con-centram as atividades e o dinamismo econômico é maior;- na mobilidade pendular, outras relações se evidenciam.De um lado, o movimento moradia-trabalho mostra a de-pendência de áreas menos dinâmicas em relação ao centrometropolitano, quando revela que a população que se des-loca para Porto Alegre, apesar de ter a idade média maiselevada, possui menor escolaridade e menor rendimentomédio. De outro, a melhor situação dos que se dirigirampara outras localidades da região indica as alternativas forada capital propiciadas pela concentração da produção in-dustrial em outros municípios;- a análise da mobilidade pendular aponta, ainda, para aimportância do dinamismo econômico na configuração dosdeslocamentos, ao mostrar que o destino desses fluxos estáconcentrado nos municípios de Porto Alegre, Canoas eNovo Hamburgo;- por fim, ao examinar os dados, o fato de cruzar a mobili-dade pendular com a migração de data fixa torna mais cla-ros os conteúdos dos movimentos entre Porto Alegre e seuentorno. Constatou-se que mais da metade das pessoasque trabalhavam ou estudavam em Porto Alegre em 2000moravam na capital em 1995, revelando que os vínculos coma cidade se mantêm, apesar da migração – o que comprovaque, para uma grande parte das pessoas, a motivação paraa mudança de local de moradia não foi a procura por traba-lho ou estudo.

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MARIA DE LOURDES JARDIM / TANYA M. DE BARCELOS

NOTAS

Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de EstudosPopulacionais – Abep, realizado em Caxambu – MG – Brasil, de 20a 24 de setembro de 2004. O estudo foi elaborado no contexto doprojeto de pesquisa Desigualdades Socioespaciais na RMPA, inte-grado ao Núcleo de Estudos Regionais e Urbanos da FEE. O projetorecebeu recursos do Programa Pró-Guaíba e da Fapergs e, em termosinstitucionais, estava integrado ao Projeto “Metrópole, Desi-gualdades Socioespaciais e Governança Urbana: Rio de Janeiro, SãoPaulo, Belo Horizonte e Porto Alegre”, coordenado pelo IPPUR/UFRJ, inserido no Programa de Apoio a Núcleos de Excelência(Pronex). As autoras incorporaram as interessantes sugestões doparecerista, que acrescentaram clareza e qualidade ao texto.

1. A abordagem da economia baseou-se em estudo sobre a dinâmi-ca recente da economia metropolitana (ALONSO, 2003), e naspesquisas sobre o mercado de trabalho, realizadas pela FEE/PED.

2. Santo Amaro é atualmente o município de General Câmara.

3. É importante esclarecer que essa regionalização, como em ge-ral são tais construções, é provisória e encontra-se em discussão.Ela procura demarcações relacionadas com a estrutura e a dinâmi-ca da economia metropolitana, que está passando por um momen-to de profundas transformações.

4. Esse complexo inclui as divisões: Produtos Alimentícios e Be-bidas, Produtos do Fumo, Preparação de Couros e Fabricação deArtefatos de Couro, Artigos de Viagem e Calçados, Produtos Têx-teis, Confecção de Artigos do Vestuário e Acessórios.

5. Utilizou-se a variável 3211 do Censo Demográfico 1991 e avariável 4250 do Censo de 2000, ambas dando conta da origem domigrante em uma data fixa (cinco anos antes do levantamentocensitário).

6. Sobre o processo de periferização da população de centros me-tropolitanos, ver livro organizado por Maricato (1982) e, maisrecentemente, o trabalho de Matos (2003), sobre Belo Horizonte.

7. Muitos estudos apontam tendências de polarização social nasgrandes metrópoles, com auto-segregação das elites, camadas po-pulares “enguetadas” e alterações no tamanho, papel e estilo devida das camadas médias (RIBEIRO, 2000; LAGO, 2000).

8. As informações sobre o perfil dos migrantes nas sub-regiões fo-ram obtidas a partir dos microdados do Censo Demográfico 2000.

9. A sub-região 5 – que, como já se mencionou antes, é compostapelo município de Santo Antônio, incorporado à região em 2000 –apresenta movimentos populacionais muito reduzidos, o que se somaà sua pequena importância na dinâmica econômica da RMPA. ARMPA 3, que reúne São Jerônimo, Arroio dos Ratos e Charqueadas,tem também características urbanas pouco expressivas. À exceçãode Charqueadas, que apresentou saldo positivo significativo nas tro-cas dos fluxos intrametropolitanos, os demais municípios parecemnão manter vínculos muito importantes com a região. Na verdade,uma parte considerável desses fluxos tem origem e destino exterio-res à região, o que leva a pensar que sua integração não responde aoscritérios propostos pelo órgão metropolitano para avaliar os pro-cessos de incorporação de novos municípios à área. Esses critériosdizem respeito a aspectos funcionais (vínculos existentes entre acidade-núcleo da região e o município postulante, medidos pelos des-locamentos moradia-trabalho ou, genericamente, pelos fluxos depessoas, bens e comunicação); demográficos (características do cres-cimento populacional comparadas com o comportamento da regiãoe do Estado, examinando-se, principalmente, componentes de cres-cimento populacional); econômicos (complementaridade de ativi-dades econômicas entre o município em análise e outros da região,ou o compartilhamento do mercado de trabalho urbano por parte demoradores de vários municípios); físico-territoriais (existência outendência significativa de continuidade da urbanização entre o mu-

nicípio em análise e o pólo regional, direta ou indiretamente, atra-vés de outros municípios); institucionais (referidos à posição do mu-nicípio em outras regionalizações existentes no Estado e ao proces-so de planejamento metropolitano); e, finalmente, critériosambientais (desenvolvimento sustentável regional) (METROPLAN,1999).

10. Somente nas Regiões Metropolitanas de Grande Vitória (com17,8%) e Florianópolis (15,8%) os porcentuais são maiores do quena Região Metropolitana de Porto Alegre.

11. Informação obtida através do cruzamento de variáveis de ins-trução e trabalho.

12. As pessoas residentes em Porto Alegre distribuem-se em rela-ção à condição de ocupação na seguinte proporção: 5,7% só estu-dam; 83,2% só trabalham; e 11,2% estudam e trabalham (confor-me microdados da amostra do Censo Demográfico 2000).

13. Os municípios maiores também concentram os maiores volu-mes de migração pendular.

14. As cifras dos municípios de Canoas e Novo Hamburgo são bas-tante distintas das de Porto Alegre: enquanto esta recebe mais de200 mil migrantes pendulares, o volume de imigração pendular paraCanoas e Novo Hamburgo não chega a 30 mil.

15. O porcentual de pessoas que saem de Alvorada e Viamão paratrabalhar ou estudar em Porto Alegre e que em 1995 residiam emPorto Alegre é de 62,8% e de 58,2%, respectivamente.

16. Matos, Lima e Braga (2003) também chegaram a esses resulta-dos, quando estudaram o caso de Belo Horizonte.

17. Cuja população total é de menos de 5.000 habitantes.

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MOBILIDADE POPULACIONAL NA REGIÃO METROPOLITANA DE PORTO ALEGRE...

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MARIA DE LOURDES JARDIM: Estatística, Mestre em Demografia, Técnicada Fundação de Economia e Estatística.TANYA M. DE BARCELLOS: Socióloga, Mestre em Sociologia, Técnica daFundação de Economia e Estatística.

Artigo recebido em 30 de maio de 2005.Aprovado em 29 de agosto de 2005.

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VALMIR ARANHA

O

Resumo: O trabalho identifica, na Região Metropolitana de São Paulo, as principais tendências dos deslo-camentos de pessoas que residem em um município e trabalham ou estudam em outro. Destaca o Municípiode São Paulo como principal área de destino dos deslocamentos metropolitanos e faz o mapeamento decinco subáreas de deslocamentos pendulares nos demais municípios metropolitanos.Palavras-chave: Demografia. Deslocamentos populacionais. Acessibilidade. Urbanização.

Abstract: The work identifies, in the Metropolitan Region of São Paulo, the main trends of the mobilityof people who inhabit in a city and work or study in another one. It detaches the City of São Paulo asmain area of destination of the displacements metropolitans and makes the mapping of five sub-areasof commuting in the too much cities metropolitans.Key words: Demography. Population mobility. Accessibility. Urbanization.

VALMIR ARANHA

MOBILIDADE PENDULAR NAMETRÓPOLE PAULISTA

s deslocamentos diários da população ocorremnas mais variadas direções e são orientados pordiversos motivos: trabalho, estudo, saúde, con-

sumo, lazer, negócios, etc. Esse ir-e-vir constitui elementointegrante da realidade das grandes cidades e reflete, por-tanto, suas desigualdades sociais e espaciais. Mensurarvolume, sentido e direção desses deslocamentos é indi-cativo não apenas das trajetórias que as pessoas realizamno espaço, mas também das oportunidades e/ou dos obs-táculos existentes nessas cidades.

Os dados do Censo Demográfico 2000 registraram que,no Brasil, mais de 7,4 milhões de pessoas trabalham ouestudam em municípios diferentes daqueles onde residem.Em alguns países, esse processo também é bastante pre-sente, sendo que nos Estados Unidos o commuting, porser considerado um bom indicador de relacionamento en-tre as cidades, constitui um dos critérios utilizados pelo

Bureau do Censo para definir áreas metropolitanas(U.S.CENSUSBUREAU, s.d.).

Do ponto de vista demográfico, os deslocamentospendulares modificam provisoriamente o volume popu-lacional do município e aumentam ou diminuem seu tama-nho dependendo das características de cada área. Assim,se o município for mais concentrador ou mais dispersor,os deslocamentos podem gerar maior ou menor demandapor serviços ou bens ou aumentar sua oferta para a popu-lação residente.

O objetivo deste artigo é retratar as tendências dosdeslocamentos pendulares na Região Metropolitana de SãoPaulo – RMSP a partir de informações recentes. A fontede dados utilizada para tanto são os microdados da amos-tra do Censo Demográfico 2000. Essa pesquisa define des-locamento como o “trajeto dos indivíduos que trabalhamou estudam em um município diferente daquele em que

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MOBILIDADE PENDULAR NA METRÓPOLE PAULISTA

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residem”. A abordagem utilizada tem como foco os indiví-duos com 15 anos ou mais que realizaram deslocamentosno âmbito intermunicipal e intrametropolitano. Morar emum município e trabalhar ou estudar em outro – em sínte-se, é do que trata esse artigo.

DESLOCAMENTOS PENDULARES NA RMSP

Vários estudos têm mostrado o impacto dos desloca-mentos pendulares no mercado de trabalho, suas relaçõescom as tendências migratórias e como eles contribuem paraa estruturação do espaço metropolitano. Bógus e outros(1990) vincularam os deslocamentos pendulares com osprocessos de Metropolização/Periferização da RMSP ca-racterizando-os como um dos mais importantes processosna dinâmica populacional da metrópole. Observou-se que,em quase 1/3 dos municípios que compunham a RMSP,mais da metade da população economicamente ativa (PEA)trabalhava em local diferente daquele em que residia. Essamobilidade era mais intensa nos municípios caracterizadoscomo “dormitórios”, com PEA ocupada em atividades in-dustriais; de modo intermediário, nos industrializados, in-dependentemente da inserção da PEA; e, menos significa-tiva para os “agrícolas”.

Em outro estudo, Cunha (1993) relaciona os deslo-camentos pendulares com os movimentos migratóriosintrametropolitanos e mostra como o Município de SãoPaulo constituiu simultaneamente a principal de origem dosmovimentos migratórios rumo aos demais municípiosmetropolitanos e a principal área de destino dos desloca-mentos pendulares ocorridos no interior da RMSP. Dessaforma, São Paulo tinha um duplo papel na mobilidadepopulacional metropolitana. Se por um lado o municípioexpulsava parcela de sua população em direção aosmunicípios do entorno metropolitano contribuindo para aintensificação do processo de periferização e de cresci-mento da metrópole, por outro, São Paulo permanecia como

o principal local de destino dos seus ex-residentes que paraaí continuavam se deslocando para trabalhar.

Suas principais observações são que: em 1/3 dos muni-cípios da RMSP, mais da metade da população migrantecuja residência anterior foi a capital continuava trabalhan-do ou estudando em São Paulo; muitos desses municípiosreceberam os maiores contingentes populacionais da ca-pital nos anos 70; a mobilidade pendular dependia nãoapenas das características socioeconômicas dos municí-pios de residência, mas também da distância até a capital;os deslocamentos pendulares estavam menos presentesnos municípios agrícolas e nos industrializados, enquan-to que nos de industrialização crescente e nos caracteriza-dos nitidamente como “dormitórios” os índices eram maiselevados.

Ântico (2004) abordou os deslocamentos pendularespara a RMSP em diferentes recortes espaciais e tambémapontou o Município de São Paulo, e principalmente suaárea central, como o principal destino dos deslocamentos.Detectou também o crescimento do número de deslocamen-tos intra-regionais nos demais municípios da metrópole,revelando a importância e a consolidação de subcentrosregionais.

Esses trabalhos fazem um bom retrato dos deslocamen-tos populacionais e da discussão sobre os processos ocor-ridos na RMSP nas décadas anteriores. Entretanto, o Cen-so Demográfico 2000 apresenta novas informações, queserão destacadas a seguir.

TENDÊNCIAS RECENTES

Os resultados do Censo de 2000 revelam que, na RMSP,cerca de 1 milhão de pessoas trabalham ou estudam em ummunicípio diferente daquele que residem – o que representa12,2% do total dos residentes na Metrópole (Tabela 1). Essevolume populacional que se movimenta diariamente nametrópole paulista é extremamente significativo e equivale

TABELA 1

Pessoas com 15 Anos ou Mais, segundo Local de Trabalho ou Estudo

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Local de Trabalho ou Estudo Números Absolutos %

Total 8.330.261 100,0

Trabalham ou Estudam no Município de Residência 7.315.039 87,8

Trabalham ou Estudam em Município Diferente do de Residência 1.015.222 12,2

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000 (tabulações especiais).

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VALMIR ARANHA

TABELA 2

Pessoas com 15 Anos ou Mais, que Entram e Saem nos Municípios de Trabalho ou Estudo

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Entradas Saídas

Trabalham ou Residem no

Municípios Estudam no Município % Município e Trabalham %Diferença

e Residem em Outro ou Estudam em Outro(a-b)

(a) (b)

RMSP 1.015.221 100,0 1.015.221 100,0 -

Arujá 4.921 0,5 7.240 0,7 -2.319

Barueri 43.018 4,2 20.981 2,1 22.037

Biritiba Mirim 342 0,0 1.695 0,2 -1.353

Caieiras 3.412 0,3 11.562 1,1 -8.150

Cajamar 2.062 0,2 2.118 0,2 -56

Carapicuíba 6.111 0,6 63.908 6,3 -57.797

Cotia 10.781 1,1 14.820 1,5 -4.039

Diadema 28.093 2,8 43.382 4,3 -15.289

Embu 4.886 0,5 29.189 2,9 -24.303

Embu-Guaçu 623 0,1 4.192 0,4 -3.569

Ferraz de Vasconcelos 4.235 0,4 26.074 2,6 -21.838

Francisco Morato 1.114 0,1 25.230 2,5 -24.116

Franco da Rocha 3.842 0,4 16.069 1,6 -12.227

Guararema 287 0,0 897 0,1 -610

Guarulhos 31.644 3,1 82.916 8,2 -51.272

Itapecerica da Serra 2.977 0,3 17.017 1,7 -14.040

Itapevi 3.270 0,3 25.765 2,5 -22.495

Itaquaquecetuba 7.268 0,7 38.353 3,8 -31.085

Jandira 4.923 0,5 18.295 1,8 -13.372

Juquitiba 338 0,0 718 0,1 -380

Mairipora 746 0,1 5.280 0,5 -4.534

Mauá 12.515 1,2 56.617 5,6 -44.103

Mogi das Cruzes 11.893 1,2 16.839 1,7 -4.946

Osasco 35.113 3,5 102.600 10,1 -67.487

Pirapora do Bom Jesus 140 0,0 1.412 0,1 -1.272

Poá 4.159 0,4 17.967 1,8 -13.809

Ribeirão Pires 7.092 0,7 15.380 1,5 -8.288

Rio Grande da Serra 804 0,1 6.831 0,7 -6.027

Salesópolis 315 0,0 642 0,1 -327

Santa Isabel 739 0,1 1.862 0,2 -1.123

Santana de Parnaíba 4.319 0,4 10.533 1,0 -6.214

Santo André 51.282 5,1 85.340 8,4 -34.059

São Bernardo do Campo 70.824 7,0 72.856 7,2 -2.032

São Caetano do Sul 38.244 3,8 26.215 2,6 12.029

São Lourenço da Serra 108 0,0 643 0,1 -535

São Paulo 591.042 58,2 82.415 8,1 508.627

Suzano 12.356 1,2 20.840 2,1 -8.484

Taboão da Serra 8.646 0,9 37.485 3,7 -28.838

Vargem Grande Paulista 737 0,1 3.044 0,3 -2.308

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000 (tabulações especiais).

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ao conjunto da população de Campinas, que é o maiormunicípio do interior do Estado de São Paulo. Esse númerodá a dimensão da importância do processo para a dinâmicametropolitana.

As primeiras informações apresentadas a seguir são ossaldos dos deslocamentos pendulares.1 Esse indicadorreflete a diferença entre os volumes de entradas e de saí-das dos indivíduos que trabalham e estudam em um muni-cípio diferente daqueles em que residem.

Dos 39 municípios que compõem a RMSP, apenas trêsapresentam saldos positivos nas diferenças entre entra-das e saídas dos deslocamentos populacionais: São Pau-lo, Barueri e São Caetano do Sul. O Município de São Pau-lo registra o maior acréscimo populacional devido aosdeslocamentos pendulares: da ordem de 508 mil. Caracte-rizando-se como o principal receptor da pendularidademetropolitana, São Paulo é destinatário de 591 mil indiví-duos ou 58,2% dos deslocamentos regionais (Tabela 2).No sentido inverso – ou seja, seguindo o movimento da-queles que residem em São Paulo e deslocam-se para ou-tros municípios – o total é bem menos expressivo: 82 milindivíduos, que correspondem a 8,1% dos deslocamentosmetropolitanos.2 Verifica-se que São Paulo é a principalporta de entrada dos deslocamentos metropolitanos. Alémde o município concentrar a maior população da metrópo-le, as maiores parcelas dos empregos, dos negócios, dosserviços, ele tem ainda na atração dos deslocamentospendulares um fator a mais que contribui para a concen-tração e o adensamento de sua população.

Barueri é o município com o segundo maior saldo dedeslocamentos na RMSP. Observa-se um aumento de 22mil indivíduos em seu volume populacional, decorrenteda entrada de 43 mil pessoas e da saída de 21 mil paratrabalhar ou estudar em outros municípios da metrópole.São Caetano do Sul é o terceiro: o acréscimo registradoé da ordem de 12 mil indivíduos com entrada de 38 milpessoas e a saída de 26 mil. Esses dois municípiostambém se configuraram como áreas de atração dedeslocamentos populacionais, mas suas participaçõesrelativas nos deslocamentos metropolitanos são bas-tante reduzidas se comparados com a da capital, corres-pondendo a 4,2% e 3,8%, respectivamente. Prova-velmente, o direcionamento e a atração dos deslocamentospara esses dois municípios apresente causas diferentes,pois, enquanto São Caetano do Sul caracteriza-se comomunicípio industrial e com boa infra-estrutura no comércioe serviços, Barueri concentra um parque industrial menosexpressivo, mas conta com um centro de comércio e

serviços bastante moderno, localizado nos empreen-dimentos de Alphaville e Tamboré.

Portanto, a maior parte dos municípios metropolitanos (36)registra perda nas diferenças entre entradas e saídas. Den-tre esses, Osasco é aquele com a maior diferença negativacom um decréscimo temporário de -67.487 pessoas. Enquanto35.113 indivíduos dirigem-se a esse município – ou seja, 3,5%da mobilidade da RMSP –, mais 102 mil residentes saem paratrabalhar ou estudar em outros. Carapicuíba e Guarulhosregistram a segunda e a terceira maior diferença negativaentre entradas e saídas, apresentando respectivamente umadiminuição populacional temporária de -57.797 e -51.272 in-divíduos. Em Carapicuíba entram 6.111 indivíduos, mas saem63.908 residentes, enquanto que, em Guarulhos, entram31.644 e saem 82.916. Ressalte-se que esses dois municípiossão bastante distintos, pois Carapicuíba vem sendo carac-terizada como cidade-dormitório e Guarulhos configura-secomo município industrial que concentra a segunda maiorpopulação do Estado de São Paulo.

O município de São Bernardo do Campo também se des-taca por registrar saldo negativo, porém pequeno, de -2.032indivíduos. Essa tendência é o resultado de uma dinâmicade compensação da entrada de 70.824 pessoas e da saídade 72.856, o que faz com que São Bernardo do Campo apre-sente um “equilíbrio” entre os sentidos de saídas e entra-das em seus deslocamentos e permaneça com seu volumepopulacional praticamente inalterado devido aos desloca-mentos pendulares.

Com relação aos demais municípios da RMSP, seus sal-dos estão apresentados na Tabela 2. A partir das diferen-tes intensidades da mobilidade populacional, observa-seque existe na dinâmica metropolitana uma tendênciacentrípeta que direciona a população para o Município deSão Paulo, onde ela se mantém concentrada temporariamen-te, e em menor escala, em Barueri e São Caetano do Sul –ao passo que, para a maioria dos municípios (36) ocorre oinverso.

MAPEAMENTO DOS DESLOCAMENTOSPENDULARES

Uma outra forma de analisar os deslocamentos na RMSPé por meio dos trajetos (fluxos) que apontam simultanea-mente os deslocamentos estabelecidos entre os municípiosde residência (origem) dos indivíduos e o os municípiosde trabalho ou estudo (destino). No total, foram detecta-dos mais de 731 trajetos com origens e destinos nos muni-cípios da RMSP e que estão majoritariamente direcionados

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para determinados municípios em detrimento de outros. Omapeamento desses trajetos mostra o grau de relacionamentoexistentes nos municípios e indica a relevância de dinâmi-cas localizadas em subáreas que coexistem com a mobilida-de metropolitana centralizada no Município de São Paulo.

Como visto anteriormente, São Paulo exerce uma “hege-monia” nos deslocamentos pendulares, uma vez que atraimais da metade dos deslocamentos metropolitanos. Optou-

se por isso por apresentar seus trajetos separadamente dosdemais municípios destacando assim sua tendênciapolarizadora e, ao mesmo tempo, ressaltando as espe-cificidades dos demais municípios metropolitanos.

O Mapa 1 destaca os deslocamentos em direção a SãoPaulo e indica que esse município constitui-se como áreade destino para grande parcela de residentes de todos osoutros da RMSP. São 38 trajetos com classes de volumes

MAPA 1

Deslocamentos Populacionais para o Município de São Paulo

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: Fundação Seade; IBGE. Censo Demográfico 2000.

Nº Município Nº Município1 Arujá 21 Mairiporã2 Barueri 22 Mauá3 Biritiba Mirim 23 Mogi das Cruzes4 Caieiras 24 Osasco5 Cajamar 25 Pirapora do Bom Jesus6 Carapicuíba 26 Poá7 Cotia 27 Ribeirão Pires8 Diadema 28 Rio Grande da Serra9 Embu 29 Salesópolis10 Embu-Guaçu 30 Santa Isabel11 Ferraz de Vasconcelos 31 Santana de Parnaíba12 Francisco Morato 32 Santo André13 Franco da Rocha 33 São Bernardo do Campo14 Guararema 34 São Caetano do Sul15 Guarulhos 35 São Lourenço da Serra16 Itapecerica da Serra 36 São Paulo17 Itapevi 37 Suzano18 Itaquaquecetuba 38 Taboão da Serra19 Jandira 39 Vargem Grande Paulista

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MOBILIDADE PENDULAR NA METRÓPOLE PAULISTA

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diferentes e com o mesmo sentido que conecta e inter-relaciona São Paulo com toda a área metropolitana, inde-pendentemente de tamanho, função na divisão social dotrabalho, infra-estrutura de transportes, distância, etc.

Desses deslocamentos, os maiores superam 20 mil pes-soas e têm origem em 11 municípios metropolitanos. Des-tacam-se os trajetos com origem em Osasco (80.762 indi-víduos), Guarulhos (78.949) e São Bernardo do Campo(37.706). Trata-se dos três municípios com maior volumepopulacional da RMSP, exceto a capital, e estão entre osque apresentam os maiores índices de produto internobruto – PIB do Estado de São Paulo (FUNDAÇÃO SEADE,2005). Somados os fluxos desses três municípios comdestino a São Paulo totalizam quase 200 mil pessoas – oque representa 20% de todos os deslocamentos metro-politanos. Os demais municípios com trajetos acima de20 mil pessoas rumo a São Paulo são: Carapicuíba,Diadema, Embu, Ferraz de Vasconcelos, Francisco Mo-rato, Itaquaquecetuba, Santo André e Taboão da Serra.Os trajetos de 10 mil até 20 mil indivíduos têm origem emnove municípios: Barueri, Cotia, Franco da Rocha,Itapecerica da Serra, Itapevi, Mauá, Poá, São Caetano doSul e Suzano. Os trajetos de 3 mil até 10 mil indivíduospartem de oito municípios: Arujá, Caieiras, Embu-Guaçu,Jandira, Mairiporã, Mogi das Cruzes, Ribeirão Pires eSantana de Parnaíba.

Nessas três classes de deslocamentos numericamen-te mais consideráveis, os municípios que destinam po-pulação para São Paulo apresentam características geo-gráficas e de acessibilidade semelhantes, pois ou sãocircunvizinhos ou estão interligados por importantessistemas de transportes públicos, como é o caso da Com-panhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) parao ABC, Região de Osasco, Francisco Morato e Mogi dasCruzes.3

Nas duas classes seguintes de fluxos, os municípios queoriginam deslocamentos pendulares com relação a SãoPaulo são bem menos populosos e mais distantes do nú-cleo metropolitano. Três municípios compõem o grupo queorigina fluxos entre mil até 3 mil pessoas; e outros oito, ode fluxos menores que mil. O primeiro é formado porCajamar, Rio Grande da Serra e Vargem Grande Paulista; eo segundo agrega os municípios de Pirapora do Bom Je-sus, São Lourenço da Serra, Juquitiba, Santa Isabel,Guararema, Biritiba Mirim e Salesópolis. Muitos dessesmunicípios possuem suas atividades econômicas voltadaspredominantemente para a produção agrícola e alguns es-tão localizados a quase 60 km do marco central da cidade

de São Paulo – como é o caso de Santa Isabel, Salesópolis,Guararema, Juquitiba e São Lourenço da Serra.

O Mapa 2 ilustra os deslocamentos para o sentido con-trário, ou seja, partindo de São Paulo em direção aos de-mais municípios da RMSP. Do principal núcleo catalisadordos deslocamentos metropolitanos originaram-se 37 traje-tos em direção a todos os lugares da metrópole – com ex-ceção de Rio Grande da Serra, o único município que nãorecebe residentes da capital. Trata-se de um dos menoresmunicípios em termos populacionais da RMSP e situa-sena parada final da Linha D da CPTM, praticamente no topoda Serra do Mar.

Os deslocamentos numericamente mais significativosque partem de São Paulo são aqueles com classes de volu-me superiores a 10 mil pessoas e têm como destinoGuarulhos e São Bernardo do Campo. Vale destacar queesses dois trajetos são importantes contrafluxos, uma vezque Guarulhos e São Bernardo do Campo são também osprincipais municípios de destino de deslocamentos emdireção a São Paulo.

As demais trajetórias com origem na capital foram sub-divididas em três classes de volume: de 3 mil a 10 mil; demil a 3 mil; e menos de mil indivíduos. As duas primeirasclasses são compostas por deslocamentos numericamen-te intermediários e tiveram como destinos cinco e setemunicípios que estavam preferencialmente localizados nacircunvizinhança de São Paulo e nas porções Oeste, Lestee na Região do ABC. Os deslocamentos numericamentemenos significativos, com menos de mil indivíduos, estãomais pulverizados pela extensão da RMSP e têm como des-tino 23 municípios situados principalmente ao Norte de SãoPaulo e no extremo entorno da metrópole.

A intensa mobilidade em direção ao Município de SãoPaulo, e, em contrapartida a saída de trajetos com menorintensidade para toda área metropolitana reforça a idéia deque São Paulo exerce uma importante centralidade na metró-pole, processo esse que se traduz não apenas do ponto devista da oferta de emprego e da disponibilidade de serviçosna área de educação – para não se falar nos equipamentose instituições de saúde, de cultura, hotéis e restaurantes,etc. – mas também com o fato do município estar interligadopor um importante sistema viário e de ferrovia orientadopara praticamente todas as direções da área metropolitana.

As trajetórias para os demais municípios metropolita-nos (RMSP, exceto São Paulo) estão destacadas em trêsmapas, segundo as classes de volumes: mais de 10 mil in-divíduos; de 3 mil até 10 mil; e de mil até 3 mil. Esses trêsníveis de deslocamentos formam camadas que indicam a

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MAPA 2

Deslocamentos Populacionais do Município de São Paulo para os Demais Municípios da RMSP

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: Fundação Seade; IBGE. Censo Demográfico 2000.

configuração de cinco subáreas com diferentes intensida-des de pendularidade.4

O Mapa 3 apresenta os trajetos com maior intensidadenos demais municípios metropolitanos (mais de 10 milindivíduos) e destaca as dinâmicas duas subáreas nu-mericamente mais importantes: o ABC Paulista e a porçãoOeste Metropolitana. A subárea do ABC Paulista apre-senta seis trajetórias que inter-relacionam cinco muni-

cípios. O trajeto numericamente mais significativo é aqueleestabelecido entre Santo André e São Bernardo doCampo, com mais de 28 mil pessoas. De Santo Andrétambém se origina outro fluxo composto por mais de 10mil indivíduos com destino a São Caetano do Sul, masSanto André também é destinatário de deslocamentosoriginários em Mauá e em São Bernardo do Campo.Diadema, que também integra essa subárea, recebe

Nº Município Nº Município1 Arujá 21 Mairiporã2 Barueri 22 Mauá3 Biritiba Mirim 23 Mogi das Cruzes4 Caieiras 24 Osasco5 Cajamar 25 Pirapora do Bom Jesus6 Carapicuíba 26 Poá7 Cotia 27 Ribeirão Pires8 Diadema 28 Rio Grande da Serra9 Embu 29 Salesópolis10 Embu-Guaçu 30 Santa Isabel11 Ferraz de Vasconcelos 31 Santana de Parnaíba12 Francisco Morato 32 Santo André13 Franco da Rocha 33 São Bernardo do Campo14 Guararema 34 São Caetano do Sul15 Guarulhos 35 São Lourenço da Serra16 Itapecerica da Serra 36 São Paulo17 Itapevi 37 Suzano18 Itaquaquecetuba 38 Taboão da Serra19 Jandira 39 Vargem Grande Paulista

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MAPA 3

Deslocamentos Populacionais nos Demais Municípios da RMSP

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: Fundação Seade; IBGE. Censo Demográfico 2000.

Nº Município Nº Município1 Arujá 21 Mairiporã2 Barueri 22 Mauá3 Biritiba Mirim 23 Mogi das Cruzes4 Caieiras 24 Osasco5 Cajamar 25 Pirapora do Bom Jesus6 Carapicuíba 26 Poá7 Cotia 27 Ribeirão Pires8 Diadema 28 Rio Grande da Serra9 Embu 29 Salesópolis10 Embu-Guaçu 30 Santa Isabel11 Ferraz de Vasconcelos 31 Santana de Parnaíba12 Francisco Morato 32 Santo André13 Franco da Rocha 33 São Bernardo do Campo14 Guararema 34 São Caetano do Sul15 Guarulhos 35 São Lourenço da Serra16 Itapecerica da Serra 36 São Paulo17 Itapevi 37 Suzano18 Itaquaquecetuba 38 Taboão da Serra19 Jandira 39 Vargem Grande Paulista

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deslocamentos originários apenas do município de SãoBernardo do Campo.

A subárea Oeste apresenta três trajetos acima de 10 milpessoas, que interligam os municípios de Carapicuíba,Osasco e Barueri. De Carapicuíba saem dois fluxos, sendoum em direção a Osasco e outro a Barueri. Entre Osasco eBarueri, verificam-se deslocamentos com a mesma inten-sidade.

Além desses fluxos, destacam-se aqueles com classede volume entre 3 mil até 10 mil indivíduos, apresentadosno Mapa 4. Observa-se novamente a polarização no ABCe nos municípios localizados no Oeste Metropolitano, con-comitantemente com o surgimento de mais duas subáreas.No ABC, além dos municípios anteriormente citados,soma-se Ribeirão Pires, que estabelece deslocamentos comMauá e Santo André. Na subárea Oeste somam-se os

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MAPA 4

Deslocamentos Populacionais nos Demais Municípios da RMSP – Fluxos Selecionados (> 3.000 e < 10.000)

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: Fundação Seade; IBGE. Censo Demográfico 2000.

Nº Município Nº Município1 Arujá 21 Mairiporã2 Barueri 22 Mauá3 Biritiba Mirim 23 Mogi das Cruzes4 Caieiras 24 Osasco5 Cajamar 25 Pirapora do Bom Jesus6 Carapicuíba 26 Poá7 Cotia 27 Ribeirão Pires8 Diadema 28 Rio Grande da Serra9 Embu 29 Salesópolis10 Embu-Guaçu 30 Santa Isabel11 Ferraz de Vasconcelos 31 Santana de Parnaíba12 Francisco Morato 32 Santo André13 Franco da Rocha 33 São Bernardo do Campo14 Guararema 34 São Caetano do Sul15 Guarulhos 35 São Lourenço da Serra16 Itapecerica da Serra 36 São Paulo17 Itapevi 37 Suzano18 Itaquaquecetuba 38 Taboão da Serra19 Jandira 39 Vargem Grande Paulista

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municípios de Jandira e Itapevi, que registram deslo-camentos com destino a Barueri.

As duas novas subáreas aparecem no Sudoeste e noLeste da RMSP. A primeira interliga o município de Embucom Taboão da Serra; e a segunda, Suzano e Mogi das Cru-zes, por intermédio de seus fluxos e contrafluxos. Aparen-temente, as subáreas Sudoeste e Leste, diferentemente dassubáreas do ABC e Oeste, representam papel menos ex-

pressivo nos deslocamentos pendulares metropolitanos,uma vez que o volume de seus trajetos são menos signifi-cativos.

O Mapa 5 apresenta trajetos com classe de volume entremil até 3 mil indivíduos. A partir dele, observa-se o aumentodo número de municípios envolvidos com deslocamentospendulares. Esse maior número de áreas interligadasintensifica o grau de relacionamento desses municípios,

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ao mesmo tempo em que se observa a configuração de maisuma subárea: a Norte.

Na subárea do ABC, soma-se Rio Grande da Serra, queorigina deslocamentos para Ribeirão Pires e para SantoAndré; na subárea Oeste, aparece Cotia, que é um municí-pio destinatário de deslocamentos de Itapevi e de Osasco;na subárea Sudoeste, interliga-se Itapecerica da Serra, queorigina um fluxo para Embu; e na subárea Leste acrescem-

se Ferraz de Vasconcelos, Poá, Itaquaquecetuba, Arujá eBiritiba Mirim.

Os municípios de Caieiras, Franco da Rocha e Fran-cisco Morato estão interligados pelos deslocamentospendulares com essa classe de volume e constituem asubárea Norte. Do mesmo modo que as subáreas doSudoeste e a Leste, a subárea Norte não apresenta amesma intensidade nos volumes de deslocamentos pen-

MAPA 5

Deslocamentos Populacionais nos Demais Municípios da RMSP – Fluxos Selecionados (> 1.000 e < 3.000)

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: Fundação Seade; IBGE. Censo Demográfico 2000.

Nº Município Nº Município1 Arujá 21 Mairiporã2 Barueri 22 Mauá3 Biritiba Mirim 23 Mogi das Cruzes4 Caieiras 24 Osasco5 Cajamar 25 Pirapora do Bom Jesus6 Carapicuíba 26 Poá7 Cotia 27 Ribeirão Pires8 Diadema 28 Rio Grande da Serra9 Embu 29 Salesópolis10 Embu-Guaçu 30 Santa Isabel11 Ferraz de Vasconcelos 31 Santana de Parnaíba12 Francisco Morato 32 Santo André13 Franco da Rocha 33 São Bernardo do Campo14 Guararema 34 São Caetano do Sul15 Guarulhos 35 São Lourenço da Serra16 Itapecerica da Serra 36 São Paulo17 Itapevi 37 Suzano18 Itaquaquecetuba 38 Taboão da Serra19 Jandira 39 Vargem Grande Paulista

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dulares entre municípios que as subáreas do ABC eOeste.

Por fim, ressalte-se o caso de Guarulhos que, mesmosendo destinatário de deslocamentos de até 3 mil pessoascom origem em Arujá, aparentemente não polariza nenhu-ma subárea. Na verdade, do ponto de vista de deslocamen-tos, Guarulhos relaciona-se predominantemente com oMunicípio de São Paulo. Destaca-se que apesar da impor-tância em termos populacionais de Guarulhos, da intensi-ficação de sua industrialização ao longo da Via Dutra –rodovia que corta o município e liga São Paulo ao Rio deJaneiro – e do papel exercido pelas atividades relaciona-das com o Aeroporto Internacional localizado em seu ter-ritório, alguns autores associam seu crescimento e suaestruturação urbana como extensão dos processos ocor-ridos na zona leste da capital caracterizando-o como umaárea contígua a essa e podendo a ela ser somada (VILLAÇA,2005).

Os deslocamentos populacionais inferiores a mil in-divíduos somam mais de 597 fluxos que interligam os di-versos eixos no espaço metropolitano. Do ponto de vistade volume populacional, esse grupo de fluxos representacerca de 78 mil indivíduos, mas, devido à imensa quan-tidade de combinações entre municípios de residência emunicípios de trabalho e estudo, não é possível apre-sentar aqui um mapa temático que faça a síntese de suastendências.

A configuração das subáreas no entorno metropoli-tano indica que existem outras possibilidades de inser-ção no mercado de trabalho e nos serviços de educaçãoque não esteja localizada no centro principal, ou seja, oMunicípio de São Paulo. Ressalte-se que a principal di-ferença entre o núcleo principal, São Paulo e as demaissubáreas reside no fato de o Município de São Paulo sercapaz de atrair e de deslocar pessoas de e para todos ospontos da Metrópole, ao passo que as subáreas o fa-zem apenas de uma parte dela, geralmente no seu entor-no próximo.

O TRABALHO É O PRINCIPAL MOTIVODOS DESLOCAMENTOS

A maior parcela de deslocamentos ocorridos na RMSP(84,1%) foi motivada pelo trabalho (Gráfico 1). Os efetuados“para estudo” também representam parcela significava dapendularidade (11%); e os deslocamentos “para trabalhare estudar” representam 4,9% da mobilidade metropolitana.5

Serão destacados aqui somente os “para trabalho”, por

representarem a principal parcela dos deslocamentos me-tropolitanos.

Nota-se que o trabalho mobiliza mais de 850 mil pes-soas, fazendo que se desloquem diariamente de seusmunicípios de residência para outros da RMSP (Tabela3). Esse volume representa 13,8% dos ocupados com maisde 15 anos e aponta que os deslocamentos contribuemsignificativamente para a composição do mercado de tra-balho metropolitano.

As informações sobre deslocamentos e trabalho foramseparadas – para todos os municípios – em três grupospopulacionais distintos: os que trabalham no município eresidem em outro; os que trabalham fora do município deresidência; e os que trabalham e residem no mesmo muni-cípio – ou seja, os que não se deslocam para trabalhar. Ospercentuais calculados relacionam cada grupo que se des-loca com os ocupados (residentes ou não-residentes),estimando o impacto dos deslocamentos – tanto de saídacomo de entrada – em âmbito municipal.

São Paulo é novamente a principal área em termos devolume dos deslocamentos e recebe diariamente a maiorparcela dos ocupados residentes de outros municípios daRMSP – 509 mil indivíduos. Esse volume é extremamenteelevado; entretanto, como o total de trabalhadores residen-tes no município é da ordem de 3,7 milhões, a entrada detrabalhadores representa 12% do total dos ocupados nomunicípio. No sentido contrário, o volume é bem menosexpressivo, pois trabalham fora do município 67 mil pesso-as – que equivale a somente 1,8% dos residentes.

Em São Caetano do Sul, registrou-se a mais significativaparticipação de trabalhadores não residentes da RMSP:48,5% dos indivíduos que aí trabalham. Essa parcela deaproximadamente 30 mil indivíduos divide o mercado de tra-balho municipal com outros 32 mil que residem e trabalhamno próprio município. Assim, o mercado de trabalho de SãoCaetano do Sul é formado praticamente por dois grupos: umreside e trabalha no próprio município; e outro, que aí traba-lha, reside fora. Para aumentar ainda as possibilidades dosdeslocamentos de trabalhadores em São Caetano do Sul, maisde 20 mil indivíduos que aí residem deslocando-se para tra-balhar em outros municípios da RMSP.

A elevada concentração de trabalhadores residentes emoutros municípios e a concomitante saída de residentespara trabalhar em outras áreas também foi registrada emBarueri – porém em um patamar pouco menos elevado.Enquanto 42,4% dos que trabalhavam no município resi-diam em outros da RMSP – 35.975 indivíduos –, os que re-sidiam e trabalhavam no próprio município totalizavam

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48.785. Por outro lado, os residentes que saíam para traba-lhar em outros municípios da RMSP representavam 26,4%,totalizando 17.455 pessoas.

O município de São Bernardo do Campo, que já haviasido caracterizado pela compensação entre as entradas eas saídas, apresenta a mesma tendência quando observa-dos apenas os deslocamentos “para trabalho”. Diferente-mente, porém de São Caetano do Sul e Barueri, o mercadode trabalho de São Bernardo do Campo consegue absor-ver uma parcela bem maior de residentes: mais de 76% dosocupados ou cerca de 178 mil pessoas. A entrada dos queresidem em outros municípios soma 56.397 indivíduos e asaída residentes que trabalham em outros municípios é daordem de 58.557.

De modo geral, as informações sobre entradas e saídasde trabalhadores nos municípios da RMSP indicam umadiferença importante quando comparadas com as tendên-cias apresentadas pelos deslocamentos pendulares nasdécadas anteriores. Apesar de ainda se caracterizaremcomo importantes áreas de destinos dos deslocamentosmetropolitanos, os municípios industriais também regis-tram importantes deslocamentos de saída de população –o que mostra que analisar apenas suas “funções” nãogarante o entendimento de suas tendências pendulares.6

A elevada mobilidade de trabalhadores não residentesconcomitantemente à elevada saída de residentes para tra-balhar em outros municípios, sugere ainda a hipótese de

que as trajetórias de entradas e as de saídas podem ser com-postas por grupos sociais distintos, e que devem ocupartambém postos distintos no mercado de trabalho – o queconformaria um caráter bastante seletivo dos deslocamen-tos pendulares metropolitanos.

Outra característica marcante dos deslocamentosmetropolitanos é o expressivo número de municípios comelevada proporção de saída de população. Observandoa participação dos residentes que trabalham fora domunicípio verifica-se que em seis deles mais da metadedos seus residentes trabalham em outras localidades dametrópole, a saber: Carapicuíba, Ferraz de Vasconcelos,Francisco Morato, Jandira, Poá, Rio Grande da Serra.Destacam-se os municípios de Francisco Morato e RioGrande da Serra, com respectivamente 60,4% e 57,4% desaída de residentes para trabalhar em outros municípios.Outro grupo com elevado percentual de residentes quetrabalhavam em outros municípios, porém em um patamarinferior, é composto por 14 municípios que apresentavamsaídas entre 30% e 50% dos trabalhadores residentes.Esses dois grupos configuram-se, quase em sua tota-lidade, como “dormitórios”, pois funcionam basicamentepara atender às necessidades de moradia, obrigandoparcela significativa de sua população a deslocar-sediariamente para trabalhar em outros municípios.

Entretanto, observa-se também que os municípioschamados “dormitórios” não são apenas áreas de saídade residentes para outros municípios. Caracterizam-setambém como áreas de chegada de população ocupada– o que parece ser bastante significativo para o enten-dimento da complexidade dos processos metropolitanosde ir-e-vir. Em Carapicuíba, 9,1% dos ocupados que aítrabalham residem em outros municípios; em FranciscoMorato, 5,9%; em Rio Grande da Serra, 13,8%; emJandira, 22,8%; e em Poá, 18,7%.

Ressaltem-se ainda os três municípios com os menorespercentuais de mobilidade pendular da RMSP: Guararema,Juquitiba e Salesópolis. Trata-se de três municípioslocalizados no limite geográfico da RMSP e que fazemdivisas com outras regiões do Estado de São Paulo.Caracterizados por apresentarem uma população urba-nizada, mas com um perfil agrícola no maior centro urbanoindustrial do país, eles também registram participação nosdeslocamentos populacionais. Menos de 10% dos resi-dentes dessas áreas trabalham em outros municípios daRMSP; ao mesmo tempo, 10% dos que aí trabalham residemem outros lugares.

Trabalham Estudam Trabalham e Estudam

84,1%

11,0%4,9%

GRÁFICO 1

Indivíduos com 15 Anos ou Mais, segundo Motivos

dos Deslocamentos Pendulares

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000 (tabulações especiais).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As informações apresentadas retratam as tendênciasdos deslocamentos pendulares na RMSP e confirmam queo ir-e-vir entre os municípios constitui processo signifi-cativo para a dinâmica populacional da RMSP. Mais de 1milhão de pessoas locomovem-se diariamente entre os mu-nicípios metropolitanos – sobretudo em direção ao Muni-cípio de São Paulo, que é o principal aglutinador dessesdeslocamentos. Observou-se também a configuração deoutras cinco subáreas que, de forma secundária, atraem econcentram temporariamente população em seus municí-pios. O trabalho é o principal fator que desloca os indiví-duos entre os municípios na RMSP.

Os deslocamentos ocorrem de forma generalizada emtodos os municípios da RMSP – o que mostra que os cha-mados municípios “industriais”, apesar de continuarematraindo parcela significativa dos deslocamentos metro-politanos, são também ponto de partida para pessoas quetrabalham em outros locais da RMSP. No sentido inverso,os conhecidos como “dormitórios” destinam importantesparcelas de seus residentes para outros municípios, mastambém recebem ocupados residentes em outros lugares.Esse intenso deslocamento populacional – que independede função, distância e volume – pode estar indicando umatendência segundo a qual tanto a compensação e a comple-mentaridade do mercado de trabalho, por um lado, quantoa seletividade, por outro, fazem dos deslocamentospendulares um importante fator no processo de estru-turação do espaço urbano metropolitano.

NOTAS

1. Algumas nomenclaturas utilizadas aqui foram emprestadas dosestudos migratórios, porém há um certo consenso de que os deslo-camentos pendulares não devem ser considerados como migração.Ver Ântico (2003).

2. O aumento temporário da população de São Paulo devido a des-locamentos é ainda maior se considerados também 80 mil indiví-duos residentes no interior do Estado de São Paulo (outros muni-cípios do Estado exceto a RMSP) que trabalham ou estudam naRMSP. Ver Aranha (2004).

3. A CPTM atende 22 municípios da Região Metropolitana de SãoPaulo com 87 estações e possui extensão de 270 km de linhas.Para visualizar a abrangência do seu sistema ver: <http:www.cptm.com.br>. Acesso em 28 jun. 2005.

4. As subáreas destacadas a seguir também foram identificadas porÂntico (2003) na análise da mobilidade pendular feita a partir da

pesquisa Origem e Destino (O/D) – 1997 da Companhia do Metro-politano de São Paulo – Metrô.

5. A variável do Censo Demográfico 2000 que identifica quemtrabalha ou estuda em um local diferente daquele em que reside éa v4276. Da forma como foi elaborada, essa variável engloba osdois motivos na mesma condição de deslocamento. Para separarcada motivo específico, é necessário verificar a condição deocupado e a condição de freqüência à escola de cada indivíduo.Dessa forma, é possível associar as três informações e identificarse o indivíduo trabalha, estuda ou ainda trabalha e estudasimultaneamente. Se o indivíduo declarou trabalhar ou estudar emoutro município e declarou também estar somente na condiçãode ocupado, o motivo relacionado ao deslocamento é o trabalho.O mesmo ocorre com a condição de quem apenas freqüenta a escola,pois, se o indivíduo declarou que trabalha ou estuda em outromunicípio, o motivo do deslocamento é o estudo. A diferença épara o indivíduo que trabalha e estuda simultaneamente, pois podetrabalhar em um município e residir em outro, ou estudar em ummunicípio e residir em outro, ou ainda residir em um município etrabalhar e estudar em outro: nesses casos, não é possível separaro motivo do deslocamento.

6. Vale destacar também os municípios de Santo André e Diadema,que também são áreas industriais da RMSP onde, respectivamente,21,7% e 23,2% de ocupados residem em outros municípios e 31%e 31,3% de residentes trabalham em outros municípios dametrópole.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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MOBILIDADE PENDULAR NA METRÓPOLE PAULISTA

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 96-109, out./dez. 2005

CUNHA, J.M.P. da. Migração pendular, uma contrapartida dosmovimentos populacionais intrametropolitanos: o caso doMunicípio de São Paulo. Conjuntura Demográfica, São Paulo,Fundação Seade, n. 22, jan./mar. 1993.

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SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 110-120, out./dez. 2005110

CLÁUDIA ÂNTICO

O

Resumo: O principal objetivo deste trabalho é analisar os deslocamentos pendulares ocorridos na RegiãoMetropolitana de São Paulo como um indicativo de desigualdades e da heterogeneidade espacial e socialexistentes na região. A abordagem do tema foi feita em diferentes recortes espaciais para analisar ostipos de fluxos pendulares estabelecidos nos diversificados contextos sub-regionais. A principal fonte dedados utilizada foi o Censo Demográfico 2000.Palavras-chave: Deslocamentos pendulares. População. Região Metropolitana de São Paulo.

Abstract: This study has aimed at analysing the commutings in the metropolitan area of São Paulo as anindication of inequalities and of social and spacial heteregoneity in the area. The theme has beenapproached in different spacial units to analyse the types of commutings established among the diversifiedsubregional contexts. The main source of data used in this study was Demographic Census 2000.Key words: Commutings. Population. Metropolitan Area of São Paulo.

CLÁUDIA ÂNTICO

DESLOCAMENTOS PENDULARES NAREGIÃO METROPOLITANA

DE SÃO PAULO

s dados do Censo Demográfico 20001 revelaramque, no Brasil, 7,4 milhões de pessoas trabalha-vam ou estudavam em municípios diferentes da-

queles onde residiam. Esse tipo de deslocamento era rea-lizado, principalmente, por residentes nos Estados de SãoPaulo e Rio de Janeiro, que registraram 29,2% (2,1 milhões)e 13,2% (980 mil), respectivamente, do total do país. ARegião Metropolitana de São Paulo – RMSP concentrava54,8% (1,1 milhão) dos que trabalhavam ou estudavam forado município e residiam no Estado, e entre seus municí-pios, Osasco (116 mil), São Paulo (114 mil), Santo André(95 mil) e Guarulhos (94 mil) apresentaram os maiores con-tingentes, caracterizando, assim, esse deslocamento popu-lacional como um fenômeno urbano concentrado em gran-des cidades.

Entre os residentes na RMSP que trabalhavam ou estu-davam fora do município de residência, 91% o faziam em

municípios situados na própria RMSP, 6% em outras Uni-dades da Federação – UFs ou países e 3% em outros mu-nicípios do interior do Estado de São Paulo, revelando ogrande dinamismo interno metropolitano.

Os deslocamentos pendulares, caracterizados como umtipo de mobilidade populacional intra-urbana, mais inten-sos em áreas de maior concentração da população, torna-ram-se um importante aspecto a ser considerado na dinâ-mica urbana metropolitana. Constituem uma dimensão daorganização e da alocação das atividades econômicas, sãomediatizados pela confluência dos processos de transfor-mação do espaço urbano, e derivados, em grande parte,da sua forma de expansão e de ocupação pela população,além da distribuição das funções urbanas.

Desse modo, destaca-se a importância de seu estudo,especialmente em áreas metropolitanas, como a da GrandeSão Paulo, caracterizada tanto pela intensidade e riqueza

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DESLOCAMENTOS PENDULARES NA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 110-120, out./dez. 2005

MAPA 1

Sub-Regiões e VetoresRegião Metropolitana de São Paulo – 1997

Fonte: Companhia do Metropolitano de São Paulo – Metrô. Pesquisa Origem-Destino 1997.

de seu dinamismo econômico e populacional, como pelasfortes desigualdades sociais e heterogeneidade espacial.A RMSP concentra polaridades e processos contraditó-rios, apresenta diferentes faces em sua dinâmica intra-ur-bana e em sua configuração espacial, e é composta tantopela multiplicidade e diversidade de territórios como pelacomplexidade de diferentes espaços.

Nesse sentido, o principal objetivo deste trabalho é ana-lisar os deslocamentos pendulares ocorridos na RMSP nosanos 90, em espaços sub-regionais diversos existentes nametrópole. Quantificar e qualificar esses movimentospopulacionais explicita grande parte das tendências de dis-tribuição da atividade econômica e da localização da mora-dia no território dessa área metropolitana. Isso possibilitatraçar suas relações com o processo de desenvolvimentometropolitano, que reproduz e se expande através de desi-gualdades sociais.

A principal fonte de dados utilizada para a análise dosfluxos pendulares da população pendular foi o Censo Demo-gráfico 2000. Ressalte-se que os movimentos pendularesabordados no presente trabalho são os deslocamentos rea-lizados pela população residente na RMSP entre o municípiode residência e o município de trabalho ou estudo.

Os dados selecionados foram explorados em diferentesrecortes espaciais, envolvendo distintos tipos de agrega-ções. Assim, em alguns momentos, os fenômenos foramanalisados por meio de limites administrativos municipais,e, em outros, através da regionalização da RMSP em sub-regiões e vetores adotada pela Cia. do Metropolitano de SãoPaulo – Metrô, segundo critérios de acessibilidade. Nessaregionalização, o espaço metropolitano é dividido em seissub-regiões, formadas por conjuntos de municípios do en-torno metropolitano, e por nove vetores, formados pelo agru-pamento de distritos do Município de São Paulo (Mapa 1).

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CLÁUDIA ÂNTICO

DESLOCAMENTOS PENDULARES EEXPANSÃO DA REGIÃO

O espaço urbano contemporâneo está revestido por umacrescente complexidade e por múltiplos aspectos. É carac-terizado por processos contraditórios e conflitos inerentes,marcado por transformações nas relações sociais e proces-sos produtivos em escala mundial. A RMSP é marcada pelapresença do contraste social e pela constituição de espa-ços fragmentados. Em partes específicas de seu território,ocorre o surgimento de áreas separadas, condomínios fe-chados, como Alphaville, Tamboré e Granja Viana, que po-dem ser considerados exemplos de suburbanização de al-tas e médias rendas na RMSP, assim como a expansão dapopulação em condições bastante precárias de vida em áreascentrais e deterioradas do Município de São Paulo. Nesseespaço diferenciado e desigual, as maneiras como os gru-pos sociais resolvem a relação habitar-trabalhar, as estra-tégias utilizadas, tornam-se diferenciadas, atingindo-os demodo distinto.

Nesse contexto, os deslocamentos pendulares na RMSPrelacionam-se a aspectos ligados à espacialização das ati-vidades econômicas e dos locais de moradia, gerando aconfiguração de locais com funções distintas, permeadospelo acesso diferenciado à terra e pela divisão regional dotrabalho metropolitano.

Logo, os movimentos pendulares estão relacionados aum processo mais amplo de ocupação, estruturação e ex-pansão da RMSP. Nele, as questões relacionadas à mora-dia e ao emprego colocam-se como importantes dimensõesde análise para o entendimento do papel e implicaçõesdesses deslocamentos diários no processo de configura-ção e estruturação da área metropolitana – como resulta-do, surgem dinamismos diferenciados. De um lado, estãoas questões relativas à transformação das atividades eco-nômicas da RMSP: redução do emprego industrial; cresci-mento e diversificação das atividades terciárias; tendên-cia à desconcentração dos locais de trabalho; enfim,combinações de mudanças na forma de absorção da forçade trabalho pelo mercado com precarização das relaçõesde trabalho e elevados índices de desemprego. Do outrolado, podem ser citadas as questões relativas às modali-dades de ocupação e parcelamento do solo, à especula-ção imobiliária, às políticas públicas, situadas num contextode valorização de áreas centrais e da falta de alternativashabitacionais acessíveis para os grupos sociais em piorescondições de vida. Nesse sentido, o deslocamento pendular,

além de registrar a movimentação cotidiana no espaçometropolitano, é a evidência mais clara de como se constituio mercado de trabalho na Região Metropolitana e a seg-mentação dos locais de moradia e de trabalho, que seestabelecem por lógicas distintas neste aglomerado urbano(MONTALI, 1991, p. 8).

Desde os anos 50, a forma de ocupação da RMSP –através da expansão das periferias (BÓGUS; TASCHNER,1986) – é indicativa de desigualdades internas nos proces-sos de formação e transformação espaciais e urbanas. Essefenômeno também pode ser constatado pelos níveis decrescimento populacional, que são mais elevados nosmunicípios que compõem o entorno metropolitano do queno município central, e também pelo movimento migratóriointrametropolitano que segue na mesma direção. Taisprocessos, associados à concentração de empregos na áreacentral, resultam no distanciamento crescente entre os lo-cais de residência e de trabalho, e na necessidade de longospercursos diários a diferentes parcelas da populaçãometropolitana.

Tais processos ainda podem ser observados com cer-ta intensidade durante os anos 80 e 90, quando a configu-ração de espaços regionais se consolida, e estes são des-tacados como subcentros locais, em termos de suaimportância na redistribuição populacional e da localiza-ção de empregos. O fortalecimento dessas áreas afeta osdeslocamentos casa-trabalho da população residente naRMSP, intensificando a diversificação de movimentos e degrupos sociais envolvidos.

Em termos de expansão e absorção dos movimentosmigratórios intrametropolitanos, a importância das áreasdo entorno metropolitano no processo de redistribuiçãointerna da população2 indica a relação existente entre osdeslocamentos pendulares e a constituição espacial daRMSP.

A intensificação dessa mobilidade (intrametropolitana)certamente foi um dos condicionantes do surgimento e/oucrescimento das formas de movimentação populacionalbastante típicas de regiões com grande nível de integração,como é o caso da migração pendular. Esta não só reflete odistanciamento progressivo entre o lugar de moradia e ode trabalho, fruto da não-coincidência dos padrões de distri-buição da população e da atividade econômica e socialdentro da Região Metropolitana, mas também elementosligados à forte segregação espacial da população (CUNHA,

1994, p. 122).3

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DESLOCAMENTOS PENDULARES NA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 110-120, out./dez. 2005

No atual contexto de redistribuição espacial da popu-lação, marcado pela diversidade de deslocamentos popu-lacionais, várias dimensões urbanas passam a ter um sig-nificativo papel na decisão de migrar, podendo-seconsiderar desde valores difundidos na sociedade em re-lação à busca de uma qualidade de vida melhor, até estra-tégias e arranjos ligados à proximidade e à acessibilidadeao local de trabalho, ou à possibilidade de aquisição demoradia, mesmo que em áreas mais afastadas do trabalho,evidenciando diferenças qualitativas entre grupos popu-lacionais. Assim, os movimentos pendulares tornam-seuma dimensão importante a ser considerada tanto para adinâmica urbana regional, como também para a decisão demigrar (BAENINGER, 2000).

PRINCIPAIS DESLOCAMENTOS PENDULARES

As distâncias diárias a serem percorridas, a acessibili-dade e o tempo de deslocamento necessário para satisfazeras necessidades de trabalho e consumo podem influenciardiretamente a permanência da população na região – e issovem ocorrendo no processo de redistribuição demográficainterna na RMSP desde a década de 80, com a incorpora-ção de municípios mais distantes.

O Censo Demográfico 2000 registrou um total de1.184.881 pessoas com o local de trabalho ou estudo dife-rente do município de residência na RMSP – o que repre-sentava 10,1% do total de trabalhadores/estudantes. Den-tre os municípios que compõem a RMSP, pode-se destacarOsasco e o Município de São Paulo, com volumes de po-pulação pendular acima de 100 mil pessoas, além de SantoAndré, Guarulhos, São Bernardo do Campo, Carapicuíba,Mauá e Diadema, com volumes entre 50 e 100 mil pessoas(Tabela 1). Entretanto, observa-se que o impacto da pro-porção da população pendular é bastante diferenciado noconjunto de municípios: revelam-se especificidades relacio-nadas a cada um deles quanto a sua inserção na divisãosocial do trabalho metropolitano.

Entre os residentes na RMSP que trabalhavam ou estu-davam fora do município de residência, 91% o faziam emmunicípios situados na própria RMSP (1.074.407 pessoas).No contexto regional metropolitano, considerando apenaso montante de fluxos pendulares ocorridos entre os muni-cípios da RMSP, verifica-se que o Município de São Pauloconcentrou, em seu território, o maior número absoluto dedeslocamentos. Em 2000, recebia 612.222 pessoas residen-tes em outros municípios da área metropolitana – cifra quesignificava 57% do total de movimentos pendulares de toda

a região. Portanto, configurava-se como principal destinodas pessoas que trabalhavam fora do município de residência(Tabela 2).

No sentido inverso a esse fluxo, ou seja, do Municípiode São Paulo em direção aos demais municípios da RMSP,a participação sobre o total de movimentos pendulares foide 8,4% (90.157 pessoas).

Finalmente, excluindo o Município de São Paulo, osdeslocamentos pendulares realizados entre municípiosvizinhos pertencentes à mesma sub-região (“movimentopendular intra-regional”) representavam 30,6% (329.176pessoas) do total de movimentos em 2000. E os fluxosregistrados entre municípios pertencentes a diferentessub-regiões (movimento pendular inter-regional) tiveramuma participação de 4% (42.852 pessoas), como pode-seobservar na Tabela 2. Os fluxos pendulares intra e inter-regionais são importantes para o entendimento da dinâmicados movimentos pendulares da metrópole, uma vez queindicam a tendência de um potencial de crescimento dessefenômeno, pela configuração de novas trajetórias pen-dulares.

As pesquisas Origem-Destino,4 realizadas pela Compa-nhia do Metropolitano de São Paulo – Metrô em suas edi-ções de 1987 e 1997, indicaram, na evolução temporal dosfluxos numericamente mais significativos, a manutenção eo engrossamento de trajetórias pendulares já existentes em1987 não apresentavam mudanças importantes no sentidodos movimentos pendulares ou dos tipos de deslocamen-tos, mas sim a continuação da tendência de concentraçãodos fluxos em direção ao Município de São Paulo. Entre-tanto, excluindo-se o Município de São Paulo, a crescentetendência de aumento da participação dos deslocamentospendulares – ocorridos entre os municípios da RMSP tan-to entre municípios vizinhos pertencentes à mesma sub-re-gião como entre municípios pertencentes às diferentes sub-regiões – vem revelando a configuração e consolidação desub-centros regionais.

Dentre os municípios mais dinâmicos no contexto daRMSP, pode-se observar a intensidade de deslocamentospendulares provenientes de Osasco e Guarulhos em dire-ção ao Município de São Paulo, além de fluxos ocorridosentre os municípios pertencentes às sub-regiões Sudoeste (próximos a Osasco), Sudeste (ABC) e Leste (Ita-quaquecetuba, Ferraz de Vasconcelos). A intensificaçãodesses movimentos vem ocorrendo em áreas incorpora-das pela expansão do crescimento metropolitano desde osanos 80.

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CLÁUDIA ÂNTICO

TABELA 1

População, por Local de Trabalho ou Estudo, e Participação da População PendularRegião Metropolitana de São Paulo – 2000

Municípios Local de Trabalho ou Estudo % da Populaçãode Residência No Município Em Outro Total Pendular

de Residência Município ou País

RMSP 10.534.403 1.184.881 11.719.284 10,11Osasco 312.148 116.763 428.911 27,22São Paulo 6.815.854 114.414 6.930.268 1,65Santo André 316.638 95.498 412.136 23,17Guarulhos 591.376 94.823 686.199 13,82São Bernardo do Campo 388.137 83.134 471.271 17,64Carapicuíba 143.256 72.603 215.859 33,63Mauá 164.574 62.551 227.125 27,54Diadema 180.715 51.720 232.435 22,25Itaquaquecetuba 120.963 44.713 165.676 26,99Taboão da Serra 89.130 43.711 132.841 32,90Embu 98.967 35.584 134.551 26,45Ferraz de Vasconcelos 58.661 28.800 87.461 32,93São Caetano do Sul 65.755 28.524 94.279 30,25Itapevi 71.055 28.507 99.562 28,63Franscisco Morato 53.206 28.140 81.346 34,59Barueri 114.723 24.501 139.224 17,60Suzano 118.953 23.750 142.703 16,64Jandira 40.058 20.791 60.849 34,17Poá 40.825 20.546 61.371 33,48Itapecerica da Serra 64.447 20.466 84.913 24,10Mogi das Cruzes 192.118 19.800 211.918 9,34Franco da Rocha 46.667 18.305 64.972 28,17Ribeirão Pires 48.706 17.847 66.553 26,82Cotia 83.720 17.303 101.023 17,13Santana de Parnaíba 35.510 13.617 49.127 27,72Caieiras 33.827 12.775 46.602 27,41Arujá 29.406 8.322 37.728 22,06Rio Grande da Serra 14.384 7.970 22.354 35,65Mairiporã 33.925 6.368 40.293 15,80Embu-Guaçu 29.290 5.084 36.125 14,07Vargem Grande Paulista 25.185 3.962 22.069 17,95Cajamar 13.141 3.356 32.646 10,28Santa Isabel 6.207 2.377 27.562 8,62Biritiba Mirim 13.141 1.986 15.127 13,13Pirapora do Bom Jesus 6.207 1.724 7.931 21,74Guararema 12.731 1.622 14.353 11,30Juquitiba 16.406 1.063 17.469 6,09São Lourenço da Serra 6.383 1.026 7.409 13,85Salesópolis 8.210 833 9.043 9,21Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000.

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DESLOCAMENTOS PENDULARES NA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 110-120, out./dez. 2005

TABELA 2

População Pendular, segundo Direção dos Fluxospara Trabalho ou Estudo

Região Metropolitana de São Paulo – 2000

Direção dos Fluxos Nos Absolutos %

Total 1.074.407 100,00

De Outros Municípios para São Paulo 612.222 56,98

De São Paulo para Outros Municípios 90.157 8,39

De Outros Municípios paraOutros Municípios (Intra-Regional) 329.176 30,64

De Outros Municípios paraOutros Municípios (Inter-Regional) 42.852 3,99Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000 (tabulações especiais – Nepo/Unicamp).

DESLOCAMENTOS PENDULARES NOSESPAÇOS SUB-REGIONAIS

Considerando os deslocamentos pendulares ocorridosnas seis sub-regiões já apresentadas (Mapa 1) em termosdos tipos de movimentos, verifica-se que estas podem seragrupadas segundo características comuns à composiçãode seus fluxos.

Observou-se uma proporção variada e diferenciada dapopulação que trabalhava ou estudava em municípiosdiferentes do de residência, resultando num impactodistinto para os que compunham cada sub-região. Osmaiores destaques foram apresentados por algunsmunicípios situados em diferentes sub-regiões: Norte(Caieiras, Franco da Rocha e Francisco Morato), Sudoeste(Taboão da Serra, Embu e Itapecerica da Serra), Leste(Ferraz de Vasconcelos, Poá e Itaquaquecetuba), Oeste(Osasco, Carapicuíba, Jandira e Itapevi) e Sudeste(Diadema, Santo André, Mauá, Rio Grande da Serra),conforme a Tabela 1.

Relacionando tais municípios à sua participação na di-visão social do trabalho metropolitano, percebe-se que,certamente, fazem parte de fenômenos diferenciados. Mu-nicípios industrializados integrantes das sub-regiões Su-deste e Oeste apresentam posições distintas dos municí-pios dormitórios situados ao Norte e a Leste da RMSP.

De modo geral, os municípios situados nas sub-regiõesNorte, Leste e Sudoeste, que combinam uma elevadaproporção de população pendular com características demaior crescimento populacional e estruturas etárias maisjovens, estabelecem fluxos pendulares principalmente com

o Município de São Paulo. Além disso, configuram-se comoáreas pouco dinâmicas, com menores densidades de em-pregos – o que os caracteriza como áreas mais precárias.

A predominância da concentração do fluxo pendularem direção ao Município de São Paulo e as elevadas pro-porções dessa população em relação ao total daquela queestuda ou trabalha (Gráfico 1) são as principais caracterís-ticas dos diferentes tipos de movimentos pendulares queenvolvem as sub-regiões Norte, Sudoeste e Leste.

De maneira geral, os municípios que compõem a áreado entorno metropolitano apresentam uma estrutura etáriamais jovem do que aquela observada na capital. As sub-regiões Norte, Leste e Sudoeste destacam-se nesse senti-do, conforme pode ser observado nas pirâmides etárias(Gráfico 2).

As informações sobre a densidade de empregos no ter-ritório da RMSP entre os anos de 1987 e 1997, que foramobtidas pelas pesquisas Origem-Destino, indicaram baixasconcentrações em direção às sub-regiões que apresenta-vam elevadas proporções de pendulares e estruturas etáriasmais jovens. Foi verificada uma tendência ao adensamentode empregos, especialmente em áreas centrais e em dire-ção ao vetor Sudoeste do Município de São Paulo. Alémdisso, a expansão da mancha de baixas densidades (entre25 e 50 empregos/ha) mostrou-se bastante expressiva, tantoem direção às áreas dos vetores Sudeste, Leste e Sul maispróximas às zonas centrais do Município de São Paulocomo rumo aos municípios de Osasco, Guarulhos e ABC.A expansão dos locais de empregos ocorre, ainda, de for-ma concentrada, nas áreas mais centrais, em sub-centrosregionais e áreas adjacentes (Mapa 2).

Desse modo, as sub-regiões Oeste, Sudeste e Nordestedestacam-se como as áreas mais dinâmicas do contextometropolitano, e por isso abrigam tais subcentros locais. Assub-regiões Oeste e Sudeste constituem áreas com eleva-do contingente populacional de pendulares, níveis de cres-cimento populacional menores, e estruturas etárias maisenvelhecidas. Assim, caracterizam-se como sub-regiõesmais dinâmicas, com fluxos pendulares intra-regionais maisintensos.

Os números absolutos mais significativos de pendularesda RMSP e a elevada participação do movimento pendularintra-regional (Gráfico 1) são as principais características dosmovimentos ocorridos nas sub-regiões Sudeste e Oeste.

Como são divididas em diferentes sub-regiões, as pirâ-mides etárias são indicativas das desigualdades existen-tes entre os municípios que compõem a área do entornometropolitano.

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CLÁUDIA ÂNTICO

GRÁFICO 1

População Pendular, por Sub-Regiões de Residência, segundo Direção dos Fluxos para Trabalho ou EstudoRegião Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: IBGE. Demográfico 2000 (tabulações especiais – Nepo/Unicamp).

A sub-região Sudeste assemelha-se aos padrõesetários do Município de São Paulo, registrando a basemais estreita da pirâmide e a maior proporção de idosos(Gráfico 2).

A sub-região Nordeste possui um dos fluxos pendularesnumericamente mais importantes da RMSP, com concen-tração e predominância do deslocamento do município deGuarulhos em direção ao Município de São Paulo. Emborapossua um ritmo de crescimento populacional bastante

significativo e combinado a uma estrutura etária mais jo-vem, a sub-região Nordeste diferencia-se de outras quetambém têm essas características por apresentar um dina-mismo econômico mais intenso e tendências de aden-samento de emprego. Entretanto, mesmo configurando-secomo um subcentro local, ela apresentou a menor partici-pação do movimento intra-regional no total de seus deslo-camentos pendulares, comparando-se com as demais sub-regiões da RMSP (Gráficos 1 e 2).

81%

14% 5%

Sub-Região Leste

62%26%

12%Para o Município de São Paulo

Intra-regional

Inter-regional

83%

12% 5%

Sub-Região Sudeste

43%

55%

2%

63%

34%

3%

90%

5% 5%

Sub-Região NordesteSub-Região Oeste

Sub-Região Sudoeste

Sub-Região Norte

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DESLOCAMENTOS PENDULARES NA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 110-120, out./dez. 2005

GRÁFICO 2

Pirâmides Etárias, por Sub-Regiões de Residência, segundo SexoRegião Metropolitana de São Paulo – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000 (tabulações especiais – Nepo/Unicamp).

Sub-Região Norte

-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8

0-4

10-14

20-24

30-34

40-44

50-54

60-64

70 e +

IdadeHomens

Mulheres

Em %

Sub-Região Sudoeste

-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8

0-4

10-14

20-24

30-34

40-44

50-54

60-64

70 e +Idade

Em %

-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8

0-4

10-14

20-24

30-34

40-44

50-54

60-64

70 e +Idade

Em %-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8

0-4

10-14

20-24

30-34

40-44

50-54

60-64

70 e +

Em %

Idade

-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8

0-4

10-14

20-24

30-34

40-44

50-54

60-64

70 e +Idade

Em %

-8 -6 -4 -2 0 2 4 6 8

0-4

10-14

20-24

30-34

40-44

50-54

60-64

70 e +Idade

Em %

Sub-Região Leste Sub-Região Sudeste

Sub-Região NordesteSub-Região Oeste

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CLÁUDIA ÂNTICO

MAPA 2

Densidade de EmpregosRegião Metropolitana de São Paulo – 1987-1997

Fonte: Companhia do Metropolitano de São Paulo – Metrô. Pesquisa Origem-Destino 1987 e 1997.

1997

1987

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DESLOCAMENTOS PENDULARES NA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Realizada a partir dos dados do Censo Demográfico 2000e das tendências trazidas pelas pesquisas Origem-Desti-no, a análise dos deslocamentos pendulares ocorridos nosmunicípios da Região Metropolitana de São Paulo – RMSPrevelou importantes aspectos relacionados à configuraçãoespacial metropolitana e sua heterogeneidade.

A maior concentração dos deslocamentos pendularesocorridos no território da RMSP deu-se em direção ao Mu-nicípio de São Paulo. Juntamente com essa concentração defluxos dirigidos à área central metropolitana e a menor in-tensidade dos movimentos em direção aos demais municí-pios, observou-se a tendência de aumento dos deslocamen-tos pendulares ocorridos entre os municípios da RMSP –seja em suas dinâmicas intra-regionais ou inter-regionais.

Tal tendência revela a importância da dinâmica de con-figuração e consolidação de subcentros locais em algumasáreas na recepção dos trabalhadores pendulares de algu-mas sub-regiões, especialmente na Sudeste e Oeste, comdestaque para os municípios de São Bernardo do Campo,Osasco e Barueri.

As sub-regiões Sudoeste, Oeste e Norte apresentaramas maiores proporções de população pendular: ou seja,elevado impacto sobre o total da população que trabalhae/ou estuda. De fato, tais sub-regiões caracterizam-se pelaacentuada presença de municípios considerados comodormitórios no território metropolitano, como Taboão daSerra, Carapicuíba, Jandira e Francisco Morato. Entretan-to, os tipos de fluxos observados nesses espaços sub-re-gionais são diferenciados; enquanto as sub-regiões Nor-te e Sudoeste apresentaram a predominância de fluxospendulares dirigidos ao Município de São Paulo, a sub-re-gião Oeste registrou um crescente dinamismo interno, li-gado à diversificação da atividade econômica presente emseu território.

Por estarem situados em diferentes partes do territóriometropolitano, os municípios com elevado impacto de po-pulação pendular sobre o total populacional apresentamdinâmicas diferenciadas em seus fluxos pendulares, asso-ciadas aos processos de constituição e de expansão dosespaços sub-regionais.

Apesar de apresentar um pequeno impacto da popula-ção pendular sobre o total, a sub-região Nordeste registrao maior volume numérico de trabalhadores e estudantespendulares da RMSP, em função do município de Gua-rulhos. Nessa sub-região, o dinamismo pendular interno ébastante reduzido, e os fluxos são quase que exclusiva-

mente direcionados ao Município de São Paulo. Isso a di-ferencia de outras, como as sub-regiões Sudeste e Oeste,que também se caracterizam como antigas áreas de expan-são derivadas da industrialização e adensamento metropo-litano. Na sub-região Sudeste, mais da metade da popula-ção pendular trabalhava ou estudava em municípios daprópria sub-região. Em menor medida, os movimentospendulares intra-regionais também se destacaram na sub-região Leste.

O que explica a maioria dos deslocamentos pendularesocorridos na RMSP é tanto o processo de ocupação e ex-pansão da metrópole (que está ligado ao crescimento dasáreas do entorno metropolitano que abrigam grande parteda população sem condições de residir nas áreas mais cen-trais e valorizadas), como também a maior concentração deatividades produtivas em determinados espaços centrais– principalmente do Município de São Paulo. Assim, como desenvolvimento de um padrão locacional de ofertas nomercado imobiliário em áreas mais afastadas e desvalori-zadas, os trabalhadores pendulares utilizam como estraté-gia residir nos locais mais acessíveis, percorrendo maio-res distâncias para chegar ao local de trabalho.

A distribuição espacial dos postos de trabalho mostraa acentuada concentração nas áreas centrais do Municí-pio de São Paulo. E mostra-se bastante incipiente, aindaque possa apresentar uma tendência à descentralização(indicada pelo crescimento e diversificação das atividadesterciárias; com a instalação de grandes equipamentos deserviços em subcentros regionais; e com o surgimento deoportunidades de trabalho em novas áreas – fato que criamais condições para que haja maior proximidade entre olocal de moradia e o de trabalho e reduz a necessidade delongos trajetos).

Pode-se verificar que as regiões da cidade que se so-bressaem pela grande concentração de empregos – vetoresSudoeste, Central e Oeste – destacam-se também pelas maiselevadas rendas médias familiares. Esse fato, relacionadoà tendência de expansão da mancha urbana e da residên-cia de trabalhadores de baixa renda em áreas periféricas,indica que é esse o grupo social mais penalizado por lon-gos deslocamentos casa-trabalho.

Apesar de observar-se maior volume de deslocamentospendulares da RMSP em direção ao Município de São Paulo,percebe-se que estes caminham para o fortalecimento dasdinâmicas locais. Tais movimentos poderiam estar acompa-nhando um processo mais amplo de redistribuição internada população, em que a migração intrametropolitana trazimplicações decisivas. Já desde a década de 70, sua principal

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CLÁUDIA ÂNTICO

característica vem sendo a dispersão da população a partirdo Município de São Paulo, além da significativa absorçãode migrantes em alguns municípios do entorno metropo-litano que vêm se configurando em subcentros regionais.

Entretanto, esse processo mostra-se ainda restrito e lentoface ao dinamismo dos movimentos migratórios. Além dis-so, caracteriza a metrópole como um espaço extremamenteheterogêneo e desigual, onde grande parcela da populaçãoprecisa percorrer longos trajetos diários para chegar ao lo-cal de trabalho ou para satisfazer suas necessidades de con-sumo e lazer. Esse aspecto pode ser observado não só pe-los deslocamentos intermunicipais, mas também pela grandemovimentação intra-urbana interna aos municípios – prin-cipalmente no Município de São Paulo.

NOTAS

Esse trabalho está baseado na Tese de Doutorado em Demografia,intitulada Onde Morar e Onde Trabalhar: Espaço e Deslocamen-tos Pendulares na Região Metropolitana de São Paulo, defendidapela autora no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Uni-versidade Estadual de Campinas.

1. Resultados da Amostra – Migração e Deslocamento – divulgadosem 2003.

2. Estudo sobre a migração intrametropolitana na RMSP na décadade 70 (CUNHA, 1994) já apontava para a presença de áreas dinâ-micas do entorno metropolitano na recepção dos fluxos migrató-rios provenientes do Município de São Paulo.

3. Atualmente, há um certo consenso entre os estudiosos do tema“população”: eles acham que os “deslocamentos pendulares”nãodevem ser considerados “migração”, pois os dois fenômenos con-figuram conceitos distintos. A “migração” envolve a mudança deresidência e os “movimentos pendulares” têm como principal ca-racterística os deslocamentos entre diferentes municípios de resi-dência e de trabalho (algumas definições também incluem municí-pio de estudo). Por ocasião da divulgação dos resultados da amostrado Censo Demográfico 2000, a Fundação IBGE denominou o fenô-meno que envolve as pessoas que trabalham ou estudam fora domunicípio de residência de “deslocamento”.

4. A Pesquisa Origem-Destino, de caráter amostral, realizada tra-dicionalmente a cada dez anos desde 1967, coleta dados sobre ascaracterísticas socioeconômicas da população residente na RMSPe sobre a localização das atividades urbanas, com o objetivo de iden-tificar os fatores que determinam o padrão das viagens, definidopor suas origens, destinos, modos de transporte, motivos e horá-rios. Uma nova edição da pesquisa foi realizada recentemente, comdados coletados em 2002, parcialmente divulgados.

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CLÁUDIA ÂNTICO: Doutora em Demografia, Consultora na Fundap (SP-Brasil).

Artigo recebido em 25 de abril de 2005.Aprovado em 22 de maio de 2005.

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MOVIMENTO PENDULAR E PERSPECTIVAS DE PESQUISAS EM ...

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A

Resumo: O conceito de movimento pendular é revisitado e discutido neste artigo, para, com base emestudos teóricos e empíricos, apreender a novas dimensões do processo de reestruturação metropolitana.A importância desse movimento na dinâmica dos principais espaços urbanos do Brasil é revelada porobservações preliminares acerca da informação de deslocamento domícilio-trabalho/estudo, pesquisadono Censo Demográfico 2000.Palavras-chave: Movimento pendular. Mobilidade urbana. Deslocamentos intrametropolitanos.

Abstract: This paper aims to discuss the role of commuting at intrametropolitan level and its relationto urban agglomeration restructuring processes. A theoretical and empirical review is presented to builda preliminary framework, used in the analysis of the Demographic Census 2000 data, to identify thespatial patterns of major urban areas of Brazil.Key words: Commuting. Urban mobility. Intrametropolitan flows.

ROSA MOURA

MARIA LUISA GOMES CASTELLO BRANCO

OLGA LÚCIA C. DE FREITAS FIRKOWSKI

MOVIMENTO PENDULAR EPERSPECTIVAS DE PESQUISAS EM

AGLOMERADOS URBANOS

s informações sobre deslocamentos domicílio-tra-balho/estudo constituem importante referencialpara a análise dos processos de metropolização e

expansão urbana. Na atualidade, verifica-se que essesdeslocamentos ocorrem entre distâncias cada vez maioresentre a origem e o destino, revelando o avanço do proces-so de ocupação do espaço das aglomerações urbanas. Ascentralidades dessas áreas tornam-se nítidas e permitem aidentificação de processos seletivos de uso e apropriaçãodo espaço, com segmentação dos locais de moradia e detrabalho.

Neste artigo, foi considerada a hipótese de que a men-suração dos deslocamentos domicílio-trabalho/estudo,como uma modalidade de movimento pendular, permite aapreensão de novas dimensões do processo de reestru-turação do espaço intrametropolitano, podendo contribuir

para revelar o alcance das novas formas espaciais urba-nas, cada vez menos definidas e precisas.

Com essa finalidade, o conceito de “movimento pen-dular”, apesar de antigo nas análises geográficas, érevisitado a partir de uma atualização teórica, bem comode estudos realizados para algumas aglomerações metro-politanas nacionais. Assim, com base nos resultados detabulações da informação censitária de 2000, serão tecidasobservações preliminares para os principais espaços ur-banos do Brasil.

UM CONCEITO REVISITADO

Neste início de século, as discussões sobre cidades sãocada vez mais perpassadas pela compreensão de que suasformas urbanas têm-se alterado rapidamente. Assim, não

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ROSA MOURA / MARIA LUISA GOMES CASTELLO BRANCO / OLGA LÚCIA C. DE FREITAS FIRKOWSKI

são poucos os autores que propõem novas denominaçõespara tentar apreender tal fenômeno: cidades-regiões(SCOTT et al., 2001), metápolis (ASCHER, 1995) e exópolis(SOJA, 2002) são alguns exemplos. Em comum, materiali-zam-se formas urbanas cada vez mais estendidas sobrevastas superfícies, criando novas relações cotidianas en-tre pessoas e lugares. É nesse contexto que se torna perti-nente revisitar o conceito de “migração pendular”, e a dis-cussão atual que sugere uma outra denominação, qual sejaa de “movimento pendular”.

O estudo da dinâmica metropolitana com base nos mo-vimentos pendulares está vinculado a uma das linhas tra-dicionais de pesquisa em Geografia Urbana: a identifica-ção de áreas de influência ou regiões funcionais. Adams(1995, p. 13) considera, a partir de formulações teóricas eseus respectivos estudos empíricos, que “áreas geográfi-cas são definidas, principalmente, em termos de desloca-mento diário de casa para o trabalho”.

Tais áreas seriam, essencialmente, de mercado de tra-balho, econômicas e metropolitanas. Adams (1995, p. 25)destaca ainda que o conceito de “área metropolitana” re-laciona-se a um sistema de assentamento orientado para aprodução, que tem suas origens no século 19, com a “ci-dade industrial”. Nesse sistema de assentamento, os des-locamentos para o trabalho assumem importância crescen-te, integrando o núcleo metropolitano, que é o centro daprodução, às áreas do entorno residencial. Nessa época, afeição territorial metropolitana dos países de economiaavançada era caracterizada por um núcleo urbano tercia-rizado com número

crescente de sedes empresariais [...], de repartições governa-mentais, instituições financeiras e atividades de apoio naprestação de serviços e de vigilância (SOJA, 1993, p. 217).

Esse núcleo era circundado por anéis de classe traba-lhadora, onde havia uma cunha em direção à periferia, lo-cal de residência de população de renda mais elevada, ex-travasando sobre outras unidades político-administrativas.Tal processo de incorporação de novas unidades políti-co-administrativas caracterizou-se por crescente fragmen-tação das unidades pré-existentes (SOJA, 1993, p. 217).

A forma urbana das aglomerações metropolitanas –constituída de forma geral por um núcleo de atividadesterciarizadas e por uma periferia residencial – também ca-racteriza as aglomerações metropolitanas de outros paísesem meados do século 20. Todavia, nestes, a expansão paraa periferia se dá com a localização de áreas industriais eresidências de baixa renda, em função da precariedade da

infra-estrutura urbana, da dinâmica do mercado de terras,do acesso ao mercado de trabalho, entre outros (ABREU,1987; CORRÊA, 1989; 1997; ÂNTICO, 2004). A fragmenta-ção das unidades político-administrativas das áreas daperiferia é também uma característica da configuraçãoterritorial dessas unidades metropolitanas.

Desde então, o extraordinário avanço tecnológico e suarápida difusão alteraram os meios de transporte, a produ-ção e sua organização, assim como as comunicações. Tudoisso, associado às mudanças nos padrões demográficos ena vida social, resultou no

desacoplamento destes espaços funcionais e físicos. Áreaseconômicas regionais são agora muito mais extensas queáreas de mercado local e espaços de atividade local. Atravésdos anos, a expansão das áreas existentes e a criação de novasáreas de baixa densidade conduziu a diversidade de configu-rações físicas para um espaço de atividade diária dosresidentes da comunidade – incluindo áreas que não têm core

visível (FREY; SPEARE Jr., 1995, p. 139).

Assim, para Frey e Speare Jr., essas transformações naforma de assentamento definiriam um novo conceito de“área metropolitana”, a área ampliada de vida local carac-terizada por alta densidade de movimento pendular – quepassa a ser o principal indicador do espaço de atividadeda comunidade.

A discussão do movimento é, portanto, indissociávelda de mobilidade. É ela que vai caracterizar a vida urbanaatual, acentuando a importância dos transportes, sobretu-do o individual. Nessa discussão, deve ser considerada aprópria diversidade de uso do termo em expressões, oraaparecendo como “migração pendular”, ora como “movi-mento pendular”.

Para Andan, D’Arcier e Raux (1994, p. 247), o conceitode mobilidade refere-se à vida cotidiana do indivíduo. Paraos autores,

a mobilidade corresponde ao conjunto de deslocamentos queo indivíduo efetua para executar os atos de sua vida cotidiana(trabalho, compras, lazer).

Dupuy (1995) aponta a natureza complexa dos desloca-mentos urbanos, considerando o automóvel como um dosmaiores responsáveis pela gama e variedade de movimen-tos no desenrolar da vida cotidiana de uma grande cidade.Para o autor, o “sistema automóvel” cria uma nova econo-mia e uma nova ecologia dos deslocamentos humanos,capaz de transformar a cidade anterior, compondo, recom-pondo e decompondo novos territórios.

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É esse “sistema automóvel” que demarca a segmentaçãodos deslocamentos urbanos, contrapondo a condição deagilidade e conforto à precariedade dos transportes públi-cos existentes na maioria das grandes cidades – em espe-cial nos países subdesenvolvidos.

Desse modo, a mobilidade tem relação direta com ostransportes, e estes com a dimensão e segmentação da ci-dade. Revigora-se, então, a necessidade de inserção dos“deslocamentos diários” ou, como definem alguns auto-res, das “migrações pendulares”, na atual agenda de pes-quisa urbana.

O conceito de “migração pendular” é antigo na Geogra-fia. Aparece nas análises de Beaujeu-Garnier (1980) eDerruau (s/d), dentre outros clássicos da Geografia Huma-na, com ênfase em Geografia da População. Contudo, aperspectiva de análise do geógrafo difere da do demógrafo,particularmente em razão da natureza da preocupação daGeografia com a espacialização dos fenômenos.

Entre os estudos clássicos, observa-se uma certa com-preensão de que os movimentos migratórios variam quan-to à duração e à escala de abrangência, e que aqueles decaráter cotidiano devem ser compreendidos no contextoem que se inserem, predominantemente urbano.

Tal é a posição de Derruau (s/d, p. 67), quando, ao ini-ciar sua análise das migrações temporárias, adverte que

nem todos os deslocamentos temporários de uma certapopulação constituem fenômenos demográficos. Nãoestudaremos pois, neste lugar, as deslocações quotidianasentre o domicílio e o local de prestação do trabalho, quemerecem lugar de destaque no estudo da geografia dascidades e dos arredores.

Portanto, é no âmbito da compreensão das cidades queo autor afirma ser pertinente a análise dos deslocamentostemporários.

Beaujeu-Garnier (1980, p. 292), por sua vez, analisa ofenômeno dos movimentos diários no interior da discus-são sobre migrações para o trabalho, no qual destaca tam-bém as migrações de temporada. A autora denomina ossujeitos desse processo como “migrantes diários”, e ad-mite que “os movimentos diários estão constantementeaumentando, quer em número, quer em distância”.

A principal causa desse aumento seria a melhoria nosistema de transportes, já apontada por Dupuy (1995), quepossibilita a ampliação das distâncias percorridas diaria-mente. Outra importante causa tem sido a inexistência depolíticas coordenadas entre local de moradia e de trabalho(BEAUJEU-GARNIER, 1980).

Para a autora, ao se tratar do movimento pendular entreo local de residência e o local de trabalho, pode-se empre-gar o termo americano commuting, e

se reconhecermos que, de fato, há enorme número de pessoasenvolvidas nesse movimento diário, comumente realizadoduas vezes por dia, poderemos restringir o uso do termo‘commuting’ a movimentos que encerram três características:apreciável extensão, uso de alguns meios de transportemecânicos e certo grau de convergência (BEAUJEU-

GARNIER 1980, p. 292-293).

Quanto à dificuldade de apreensão, a autora já advertiaque

tais movimentos constituem feição característica da vida daregião, mas são difíceis de analisar na ausência dedocumentação suficientemente precisa e exata, e criamproblemas na representação cartográfica (BEAUJEU-

GARNIER, 1980, p. 301).

Recentemente Brunet, Ferras e Théry (1993) assevera-ram que, em se tratando das populações humanas, há quese fazer uma distinção entre migrações periódicas e definiti-vas, considerando o período abrangido pelas mesmas. Paraos autores, as migrações temporárias podem ser, entre ou-tras, cotidianas ou bicotidianas, e aquelas relativas ao tra-balho também seriam chamadas de “pendulares”, “alternan-tes” ou “navettes” – termo que, em francês, designa um ire vir incessante, caracterizando o migrante cotidiano.

Sallez e Vérot (1993), em pesquisa que reúne sete ensaiosde prospectiva urbana, analisam, entre outras questões,os “novos espaços domicílio-trabalho”. Argumentam que,com a extensão das cidades, crescem e espraiam-se osescritórios e ateliês, e as migrações cotidianas se multipli-cam, favorecidas pelo desenvolvimento dos transportes.Tais eventos provocam uma desconexão entre a concen-tração do emprego e a diluição do hábitat. Assim, haveriauma tendência de multiplicação dos novos modos de tra-balho, sendo que o emprego está cada vez menos ligado ànoção de estabilidade e de segurança, tanto no tempoquanto no espaço (SALLEZ; VÉROT, 1993).

É importante ressaltar que, dentre os autores citados,não há uma denominação única a essa ordem de desloca-mentos, na medida em que ora se referem à “migração” oraa “movimento”. Neste texto, optou-se pelo uso dos termos“movimento” ou “deslocamento” pendular, por se enten-der que tal dinâmica envolve um deslocamento diário e que,portanto, não implica transferência para ou fixação defini-tiva em outro lugar.

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Desse modo, a natureza dos deslocamentos pendularesdifere substancialmente da compreendida pelos movimen-tos migratórios, embora ambos impliquem fluxos de pes-soas no território.

Referindo-se ao conceito de migração, Carvalho eRigotti (1998, p. 211), com base na definição em TheDeterminants... (1973, apud CARVALHO; RIGOTTI, 1998),sublinham que “excluem-se dela os movimentos cujosindivíduos não se estabelecem permanentemente no lo-cal de residência”. Nessa exclusão, estão os movimentossazonais, temporários, de populações nômades e ospendulares.

Assim, enquanto a migração envolve mudança de resi-dência, os deslocamentos pendulares caracterizam-se pordeslocamentos entre o município de residência e outrosmunicípios, com finalidade específica – nesta pesquisa, combase nas informações da amostra do Censo Demográfico2000, foram consideradas as finalidades de trabalho e es-tudo.1 Além do Censo, algumas pesquisas do tipo origem/destino – OD, particularmente as realizadas para análise eplanejamento do setor de transporte urbano, fazem levan-tamentos dessa condição de mobilidade.

No entanto, esse tipo de deslocamento da população man-tém estreita vinculação com os movimentos migratóriosintrametropolitanos e inter-metropolitanos (ou internos àsaglomerações urbanas, sejam estas metropolitanas ou não),como demonstram estudos sobre o tema, apontados no itemsubseqüente. Com a expansão física dessas aglomerações,as distâncias entre residência e local de trabalho/estudoaumentam, inviabilizando ou encarecendo esse tipo de des-locamento, e implicando – em muitos casos – a migraçãopropriamente dita.

A NATUREZA DA INFORMAÇÃO ESUA PRESENÇA NO CENSO

Inúmeros estudos vêm sendo realizados com base nosmovimentos migratórios ou intra-aglomerados urbanos,metropolitanos ou não, dando suporte à compreensão dofenômeno de expansão e segmentação dessas aglomera-ções. No entanto, poucos têm-se voltado ao trato da co-mutação diária, em grande medida pela irregularidade dainformação disponível – o Censo Demográfico registrouum hiato na coleta dessa informação e são poucas as pes-quisas do tipo origem/destino realizadas nas aglomeraçõesurbanas brasileiras. Essa lacuna não omite, entretanto, aimportância da informação como medida de impacto dosdeslocamentos intrametropolitanos, particularmente no que

concerne à oscilação de demandas, algumas das quaisinseridas no complexo âmbito de funções públicas de in-teresse comum.

Ressalta-se, ainda, a importância da informação para acompreensão dos fenômenos que registram esses fluxoscontínuos, como medida de extensão e densidade dosmovimentos.

Além do interesse analítico que desperta este fenômeno, emparticular do ponto de vista demográfico, seu impactoconcreto no espaço metropolitano é absolutamente visível,[...] o que por si só, justifica a preocupação pelo seu melhorentendimento (CUNHA, 1995, p. 523).

A intensidade do movimento pendular é reveladora daextensão do fenômeno urbano no território, constituindouma informação utilizada na delimitação de grandes áreasurbanas, especialmente por institutos de pesquisa estatís-tica. O Bureau do Censo dos Estados Unidos baseia a de-finição e delimitação de grandes conjuntos metropolitanosem informações sobre movimento pendular por motivo detrabalho (RATCLIFFE, 2001). Atualmente, na França, oInstitut Natitonal de la Statistique et des Etudes Econo-miques – INSEE utiliza o dado de deslocamento pendularpor motivo de trabalho na identificação de polarização deuma área urbana (JULIEN, 2000). A identificação da aglo-meração de Londres, que utilizou o movimento pendularnas décadas de 50/60, foi realizada com base no número depassageiros das linhas férreas, vis-à-vis o percentual depessoas de outros condados, que trabalhavam no conda-do de Londres (SOARES, 1968).

No Brasil, na década de 60, foi criado pelo Instituto Bra-sileiro de Geografia e Estatística – IBGE o Grupo de ÁreasMetropolitanas. Seu objetivo era delimitar áreas dessanatureza, definindo-as como

o conjunto de municípios integrados econômica e socialmentea uma metrópole, principalmente por dividirem com ela umaestrutura ocupacional e uma forma de organização do espaçocaracterística e por representarem, no desenvolvimento doprocesso, a sua área de expansão próxima ou remota(GALVÃO et al., 1969, p. 56).

No processo de delimitação dessas áreas, um dos as-pectos mais relevantes considerados foi o das relaçõesmetropolitanas. Ou seja, a integração, representada porinúmeros fluxos – de bens, de comunicações e, princi-palmente, de pessoas. Uma de suas formas de materializaçãoé o deslocamento diário de população entre o local de re-sidência e o local de trabalho.

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No âmbito da pesquisa realizada na década de 60, defi-niu-se um critério, entre outros, para identificar os “muni-cípios integrados”. Seriam aqueles que tivessem

pelo menos 10% de sua população total deslocando-sediariamente, em viagens intermunicipais, para o municípioque contém a cidade central ou outros municípios da área(GALVÃO et al., 1969, p. 61).

Todavia, essas informações não estavam disponíveisnos Censos da época. Assim, a pesquisa sobre movimen-to pendular foi introduzida no Censo Demográfico 1970,buscando preencher essa lacuna, e, mais especificamente,visando a obter informações sobre a proporção de popu-lação residente que trabalhava ou estudava “fora do mu-nicípio”.

Na década de 70, a questão da identificação de áreasurbanas foi retomada por Davidovich e Lima (1975), queutilizaram o movimento pendular como um dos critérios paradefinir “integração entre municípios de uma mesma aglo-meração urbana”. Tomaram por base o percentual de

pessoas residentes que trabalham fora do município emrelação ao total da população economicamente ativa: omunicípio deve apresentar um número de residentes traba-lhando fora pelo menos da ordem de 10% (DAVIDOVICH;

LIMA, 1975, p. 54).

A identificação de aglomerações urbanas e de áreasmetropolitanas que utilizavam essa informação foi descon-tinuada, apesar de o quesito permanecer no CensoDemográfico 1980, contemplando a informação sobre “mu-nicípio de destino” para trabalho e estudo. Essas informa-ções representavam

uma oportunidade ímpar, ao permitir captar simultaneamenteos fluxos migratórios internos e a mobilidade pendular delesdecorrente (CUNHA, 1995, p. 521).

O Censo Demográfico 1991 não contemplou o movimen-to pendular. Já no Censo de 2000 o quesito foi reintro-duzido, e incluía pesquisa de município de origem e desti-no para trabalho e estudo da população residente.

Com a análise dos dados sobre movimento pendular,abrem-se novas perspectivas de pesquisa sobre a con-figuração territorial das aglomerações metropolitanas. Taisdados podem vir a revelar os resultados espaciais, indi-cando quais foram as transformações na tecnologia detransportes e comunicações que intensificaram o desloca-mento de atividades dos pólos para o entorno metropoli-tano. Assim, poderão ser identificadas configurações dis-

tintas daquelas das aglomerações que mantêm o antigomodelo – com base em um núcleo principal mais diversifi-cado e entorno predominantemente residencial – pois se-rão definidas pela predominância dos fluxos do entornopara o pólo. Outros modelos de aglomerações em trans-formação, ou já inseridas em novo contexto territorial, po-derão ser revelados pela dispersão dos fluxos entre os di-versos núcleos da aglomeração, com predominância – ounão – de um pólo principal.

O MOVIMENTO PENDULAR NO BRASIL

Com base nos resultados do Censo de 2000 quanto aosdeslocamentos entre municípios para estudo/trabalho,percebe-se a relevância da informação para qualificar taisfluxos e compreender os nexos que se estabelecem entreos municípios das aglomerações.

Esses resultados oferecem números relevantes: no Bra-sil, 7,4 milhões de pessoas trabalhavam ou estudavam forado município de residência – o que representa 6,66% daspessoas que trabalhavam ou estudavam. Essa proporçãoaumenta consideravelmente quando se consideram as re-giões metropolitanas institucionalizadas – RM, regiõesintegradas de desenvolvimento – Ride e as aglomeraçõesurbanas no entorno de capitais, mesmo que não institu-cionalizadas – conjunto que constitui os principais espa-ços urbanos aglomerados do país.

Essas unidades, num total de 30, somavam aproximada-mente 4,9 milhões de pessoas em deslocamento do muni-cípio de residência para trabalho ou estudo em outro mu-nicípio (Tabela 1). Dessas pessoas, apenas 543,8 milprocediam dos pólos. Enquanto a proporção desses des-locamentos em relação às pessoas que trabalham ou estu-dam era de 10,24% para o total das unidades, nos pólosesta caía para cerca de 2%, e, no conjunto dos demais 435municípios, superava 21%. Entre eles, 255 desenvolviamfluxos superiores a 10% da população que trabalha ou es-tuda (Tabela 2), incluindo Santos que, entre os pólos, erao único município a atingir essa proporção (com 10,27%).

Mesmo em se tratando de unidades regionais defini-das sob critérios distintos, salvo algumas exceções, a pro-porção desses deslocamentos nos pólos sempre era a me-nor do conjunto regional. Dentre as exceções, algumasreferem-se a unidades regionais com grande número demunicípios com características evidentemente rurais,como ocorre nas áreas de expansão das RMs catarinenses,polarizadas por Florianópolis, Criciúma e Tubarão, e, emMinas Gerais, na do Vale do Aço, polarizada por Ipatinga.

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TABELA 1

Movimento Pendular dos Principais Espaços UrbanosBrasil – 2000

Principais Espaços Número deMovimento Pendular

Urbanos (1) Municípios Total de Pessoas quePessoas que Trabalham % de Pessoas que

Trabalham ou Estudamou Estudam em Trabalham ou Estudam emOutro Município Outro Município

Total da Unidade 47.783.404 4.894.957 10,24Pólos 30 27.391.305 543.845 1,99Demais Municípios (2) 435 20.392.099 4.351.112 21,34Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; legislações federais e estaduais até dezembro de 2004.(1) Consideram as regiões metropolitanas institucionalizadas – RM, as regiões integradas de desenvolvimento – Ride e as aglomerações urbanas no entorno de capitais de Estados.(2) Incluem municípios das áreas de expansão, colares ou regiões de desenvolvimento, integradas às regiões metropolitanas, segundo legislações estaduais.

Outras referem-se a casos de municípios com centralidadesecundária, porém expressiva, como Guarapari, no Espí-rito Santo, com proporção de deslocamentos inferior à deVitória.

No caso de Santos, que, além de possuir a mais eleva-da proporção de deslocamento entre os pólos, tambémsuperava a proporção em relação aos demais municípiosda RM, particularmente da porção sul do litoral paulista,essa peculiaridade impõe uma análise mais apurada dedestino dos fluxos. A articulação da RM da BaixadaSantista com um complexo metropolitano como a RM deSão Paulo provavelmente contém elementos que possamexplicar tal comportamento.

Em todas as unidades consideradas, parte dos municí-pios periféricos ao pólo possuía as mais elevadas propor-ções de deslocamentos. O Mapa 1 ilustra essa constatação,mostrando o volume de deslocamentos e sua proporçãoem algumas unidades regionais selecionadas.

No total do conjunto de espaços urbanos examinado,131 municípios desenvolviam entre 10% e 20% de des-locamentos para outros municípios, entre as pessoas quetrabalhavam ou estudavam; 73 tinham proporção entre 20%e 30%; 46, entre 30% e 40%; e apenas cinco tinham mais de40%, como ocorria nas RMs de Belo Horizonte (municípiode Ibirité), Brasília (Águas Lindas de Goiás e Novo Gama),Curitiba (Almirante Tamandaré, mas merecendo destaquetambém Piraquara, com proporção de 39,2%) e Porto Alegre(Alvorada). De modo geral, as proporções diminuemprogressivamente em municípios mais distantes dos pólos.Cabe salientar, ainda, que muitos dos municípios quedesenvolvem fluxos com proporções elevadas são tambémbastante populosos, colocando em trânsito grandescontingentes de residentes.

A organização desses indicadores torna evidentesalguns padrões entre os municípios desses espaçosurbanos e oferece elementos que podem contribuir paradefinir políticas públicas mais pertinentes para deter-minadas áreas em contínua mudança. Detalhando eaperfeiçoando essas tabulações, a elaboração de matrizcom os deslocamentos intermunicipais poderá revelar asnovas centralidades de absorção desses fluxos intra-aglomerados, bem como as áreas alimentadoras, assimcomo apontar indicativos que possibilitem aferir a ocor-rência de novas espacialidades, como a configuraçãoreferente ao complexo metropolitano de São Paulo – isso,sem descartar outros complexos urbanos, em menor escala,que dão sinais de articulações entre aglomerações, comoBrasília/Goiânia, Porto Alegre/Caxias do Sul, Florianópolis/Vale do Itajaí/Foz do Itajaí/Norte-Nordeste Catarinense,Londrina/Maringá, entre outros.

O cruzamento das informações dos deslocamentospendulares com outros indicadores – como densidadedemográfica, taxas de crescimento da população, estrutu-ra ocupacional e fragmentação municipal – pode contribuirpara a construção de tipologias dos municípios dessasáreas, sendo de fundamental importância para avaliar o graude inserção no fenômeno urbano-metropolitano da aglo-meração.2 São também uma notável contribuição para aconstituição de parâmetros para a delimitação institucionalde aglomerações urbanas e regiões metropolitanas, e – porque não? – para se rediscutir os limites espaciais das uni-dades já institucionalizadas.

A leitura associada desses e outros indicadores auxi-lia a tecer um perfil dos padrões de distribuição da popula-ção nesses espaços, ofertando subsídios para detectartraços da segregação socioespacial. Afinal, há referências

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MAPA 1

Pessoas que Trabalham ou Estudam Fora do Município em que ResidemCidades Selecionadas – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000, Migração e Deslocamento, Resultados da Amostra, Comentário dos Resultados. Rio de Janeiro, 2001, p. 67.Nota: Foram selecionados os municípios onde mais de 5.000 residentes trabalham ou estudam fora do município.

Número de Pessoas Porcentual sobre total deresidentes que trabalham

ou estudamAté 4,995 a 9,99

10 a 19,9920 a 29,9930 a 45,06

5.000 a 9.99910.000 a 24.99925.000 a 49.999

50.000 a 74.999

75.000 a 150.000

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TABELA 2

Movimento Pendular, segundo Regiões Metropolitanas Institucionalizadas, Regiões Integradas deDesenvolvimento e Aglomerações Urbanas do Entorno de Capitais de Estados

Brasil – 2000

Movimento Pendular Número de Municípios,

Número de Pessoas quePercentual em Relação ao segundo percentual

Trabalham ou Estudam emTotal de Pessoas que de Deslocamentos

RMS (1) e Demais UnidadesOutro Município

Trabalham ou Estudamem Outro Município 10 a 20 a 30 a >40%

Pólo Demais Pólo Demais <20% <30% <40%

Fonte: IBGE. Censo Demográfico 2000; legislações federais e estaduais até dezembro de 2004.(1) Inclui municípios das áreas de expansão, colares ou regiões de desenvolvimento, integradas às regiões metropolitanas, segundo legislações estaduais.(2) Aglomeração urbana não institucionalizada.(3) Institucionalizada como Região Integrada de Desenvolvimento – Ride.

Total (4.894.957) 543.845 4.351.112 1,99 21,34 131 73 46 5Aracaju (2) 8.467 48.350 2,68 30,10 1 2 1 0Baixada Santista (Santos) 27.340 106.912 10,27 16,10 4 1 0 0Belém 11.784 90.737 1,36 26,71 1 2 0 0Belo Horizonte 52.499 368.906 3,40 22,14 14 8 5 1Brasília (3) 6.950 136.617 0,48 24,13 2 1 4 2Campinas 31.301 151.012 4,82 16,67 7 2 1 0

Carbonífera (Criciuma) 6.048 14.473 5,17 14,09 8 0 0 0

Cuiabá/Varzea Grande (2) 5.251 23.410 1,53 16,14 1 0 0 0

Curitiba 29.577 183.782 2,67 24,33 6 5 4 1

Florianópolis 10.466 79.633 4,26 24,47 4 5 2 0

Fortaleza 15.822 75.229 1,09 13,63 5 1 0 0

Foz do Itajaí (Itajaí) 3.729 23.868 3,75 15,87 5 0 1 0

Goiânia 16.841 111.889 2,13 25,57 6 4 2 0

João Pessoa 7.740 34.439 1,90 16,97 2 2 0 0

Londrina 8.203 24.525 2,65 15,88 3 1 0 0

Maceió 6.310 15.152 1,25 13,95 5 0 1 0

Maringá 4.944 27.755 2,38 20,50 3 0 2 0

Natal 8.132 50.243 1,68 20,73 3 1 1 0

Norte/Nord. Catar. (Joinville) 3.852 20.946 1,35 6,47 2 0 1 0

Porto Alegre 26.923 334.248 2,94 22,03 9 7 5 1

Recife 26.797 279.265 2,88 23,89 5 5 1 0

Rio de Janeiro 43.488 770.215 1,15 25,29 5 6 4 0

Salvador 30.819 42.077 1,83 10,96 2 1 0 0

São Luís 4.165 38.903 0,70 29,64 0 1 1 0

São Paulo 114.414 1.070.465 1,65 22,35 12 14 8 0

Teresina/Timon (3) 5.181 16.191 1,02 19,80 1 0 0 0

Tubarão 1.500 15.057 2,43 9,52 4 0 1 0

Vale do Aço (Ipatinga) 5.744 23.856 4,18 11,43 4 2 0 0

Vale do Itajaí (Blumenau) 3.450 17.681 1,78 8,27 5 0 0 0

Vitória 16.108 155.276 7,66 20,58 2 2 1 0

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às condições sociais das pessoas em movimento como:sexo, faixa etária, grau de instrução, ocupação, renda, con-dição de moradia, meio de deslocamento, posse de veícu-lo e de domicílio, fecundidade, mortalidade, etc. Atualmentealguns estudos já se estruturam nessas direções.

CONSIDERAÇÕES SOBRE ESTUDOS EMPÍRICOS

Análise efetuada para a Região Metropolitana de PortoAlegre – RMPA, dimensionando e caracterizando em ter-mos de origem/destino a imigração para a metrópole, osfluxos intrametropolitanos e os movimentos pendulares,examina o

fenômeno da mobilidade em sua relação com as trans-formações recentes no perfil econômico da região, em especialcom o movimento de reconcentração da indústria no espaçometropolitano, que se verifica nos anos 90, após um períodoem que era perceptível uma tendência à desconcentração dasatividades econômicas, principalmente da indústria(JARDIM; BARCELLOS, 2004, p. 2).

Particularmente quanto à mobilidade, a análise mostraque existe um fluxo considerável de pessoas que se deslo-cam para outro município onde trabalham ou estudam, exi-gindo serviços adequados para tais deslocamentos e one-rando a infra-estrutura dos municípios de destino. Emboraa informação levantada pelo Censo não separe os fluxosentre trabalho ou estudo, a análise baseia-se na condiçãode ocupação para apontar que o percentual de pessoasque só trabalham é muito elevado, principalmente entre osque moram na periferia da RMPA e trabalham em PortoAlegre. A análise revela os principais destinos desses flu-xos (Porto Alegre, Canoas e Novo Hamburgo) assim comoa dinâmica entre municípios de cada recorte intra-regionalconsiderado, mostrando a configuração territorial da aglo-meração metropolitana.

A análise também chama a atenção para a relevância dodimensionamento do percentual de acréscimo populacionaldevido ao movimento pendular em relação à população quetrabalha ou estuda.

Este indicador mede qual é o ‘plus’ populacional que deveser considerado na formulação de políticas públicas deatendimento desta parcela da população no município detrabalho ou estudo e, em contrapartida, a formulação depolíticas de geração de emprego no município de origem, jáque a grande maioria que se desloca o faz para trabalhar(JARDIM; BARCELLOS, 2004, p. 17).

Também revela o perfil de pessoas em deslocamentopara o pólo, com a idade média mais elevada, menor esco-laridade e menor rendimento médio. Aponta, ainda, a im-portância da dinâmica da economia como elemento de atra-ção na configuração dos deslocamentos, e seu papel comomotor da forma metropolitana.

Pesquisa semelhante (ÂNTICO, 2004), realizada para aRegião Metropolitana de São Paulo – RMSP dimensiona aconcentração nessa região de 54,8% dos que trabalhavamou estudavam fora do município e residiam no Estado, par-ticularmente nos municípios de Osasco (116 mil pessoas),São Paulo (114 mil), Santo André (95 mil) e Guarulhos(94 mil), “caracterizando, assim, esse deslocamentopopulacional como um fenômeno urbano concentrado emgrandes cidades” (ÂNTICO, 2004, p. 2). Na RMSP, entreos que trabalhavam ou estudavam fora do município deresidência, 91% o faziam em municípios situados na pró-pria RMSP, o que revelava a forte dinâmica intra-metropo-litana e deixava clara a fragilidade dos recortes municipaispara a compreensão dessa escala de análise.

Buscando explicitar as tendências de distribuição daatividade econômica e da localização da moradia no terri-tório dessa região metropolitana, o trabalho aprofunda aanálise dos deslocamentos pendulares ocorridos na RMSPentre os anos de 1980 e 1990, nos diversos espaços sub-regionais existentes na metrópole. Para isso, utilizou comoprincipal fonte de dados a Pesquisa OD realizada pelaCompanhia do Metropolitano de São Paulo (edições de 1987e 1997), que mediu os deslocamentos diários realizados pelapopulação ocupada residente na RMSP, entre o municípiode residência e o município de trabalho.

Os resultados dessa análise demonstram o relaciona-mento inverso entre a espacialização das atividades eco-nômicas e os locais de moradia, pois geram a configuraçãode locais com funções distintas, em decorrência do aces-so diferenciado à terra e da divisão regional do trabalhometropolitano. Além disso, reiteram sua importância parao entendimento do papel desses deslocamentos diários eimplicações no processo de configuração e estruturaçãoda aglomeração metropolitana.

Mostrando a relação existente entre os deslocamentospendulares e a constituição espacial da RMSP, a análiseapóia-se em Cunha (1994, apud ÂNTICO, 2004) para res-saltar que esses não só refletem

o distanciamento progressivo entre o lugar de moradia e ode trabalho, fruto da não-coincidência dos padrões dedistribuição da população e da atividade econômica e social

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dentro da Região Metropolitana, mas também elementosligados à forte segregação espacial da população.

Entre os anos de 1987 e 1997, verificou-se uma acen-tuada diversificação dos locais de origem e destino dosfluxos, com maior concentração dos deslocamentos pen-dulares em direção ao Município de São Paulo. A tendên-cia de crescimento do número de fluxos intra-regionais re-velou a importância da dinâmica de configuração econsolidação de subcentros locais em algumas áreas.

O processo de ocupação e expansão da metrópole, ligado aocrescimento de áreas do entorno metropolitano, que abrigamgrande parte da população sem condições de residir nas áreasmais centrais e valorizadas, aliado à maior concentração deatividades produtivas em determinados espaços centrais,principalmente do Município de São Paulo, explica a maioriados deslocamentos pendulares ocorridos na RMSP. Assim,com o desenvolvimento de um padrão locacional de ofertasno mercado imobiliário em áreas mais afastadas e desva-lorizadas, os trabalhadores pendulares utilizam comoestratégia residir nos locais mais acessíveis, percorrendomaiores distâncias para chegar ao município de trabalho(ÂNTICO, 2004, p. 15).

Com base nos resultados da amostra do Censo Demo-gráfico 1980, uma análise voltada aos movimentosintrametropolitanos da Região Metropolitana de Belo Ho-rizonte (RMBH), Matos (1994) também apresenta reflexõesa respeito do papel imposto pela dinâmica excludente domercado da terra urbana que estava na origem das “cida-des-dormitório”. Acompanhando o comportamento depopulações emigrantes de Belo Horizonte, com 20 ou maisanos de idade, segundo municípios onde residiam e traba-lhavam, o autor aponta sete municípios do entorno do pólometropolitano como os principais receptores desses con-tingentes, desempenhando nitidamente a função de “dor-mitórios”, já que exibiam proporções de “emigrantes tra-balhando fora do município de residência” bem acima de50%. Essa condição era suportada pela relativa proximida-de com os municípios dinâmicos da RMBH, particularmenteBelo Horizonte, e pela presença de transporte coletivo, quefavorecia o deslocamento de trabalhadores “submetidosa uma sobrejornada de trabalho, em face do tempo e doscustos assumidos com o deslocamento entre casa e traba-lho” (MATOS, 1994, p. 469).

Reiterando essa compreensão, numa leitura da inter-rela-ção entre a distribuição espacial dos domicílios e dos empre-gos na RMBH, com base em pesquisa OD realizada em 1992,Magalhães e D’Ávila (1996, p. 768) concluem que a acessibi-

lidade ao trabalho, custos de transporte e tempo de desloca-mento influenciam a escolha do local de residência.

À medida que os custos de moradia mais próxima do empregosão proibitivos para determinados segmentos da população,estes procuram se estabelecer em locais mais afastados,porém com boa acessibilidade garantida pelo transportepúblico (MAGALHÃES; D’ÁVILA, 1996, p. 768).

Também voltado a RMBH, num momento em que o de-bate se voltava à “desmetropolização”, Brito (1996) apon-ta, com base nos indicadores da mesma pesquisa OD de1992, que as migrações intrametropolitanas em nada com-prometem a metropolização. Pelo contrário, até a reforçam.Considerando os volumes de deslocamentos cotidianosda população em direção a municípios do corredor indus-trial oeste, e por motivo de trabalho, e verificando inten-sa relação entre os municípios com maiores fluxos dessetipo de deslocamento e municípios onde ocorreram asemigrações de Belo Horizonte, Brito (1996, p. 786) con-clui que as

pessoas emigraram, certamente empurradas pelo mercadoimobiliário, mas retornam diariamente para o trabalho ouqualquer outro motivo. O que só aumenta as interações dentrodo espaço metropolitano.

Caracterizado como um tipo de mobilidade intra-urba-na, que é intensa em áreas de maior concentração popula-cional, o movimento pendular (ou a possibilidade abertapor ele) interfere na decisão de migrar – como ponderaBaeninger (2000) – tornando-se uma dimensão importantea ser considerada na dinâmica urbana regional.

Baeninger (1996), numa análise dos movimentos mi-gratórios paulistas da década de 80,3 chama a atenção paraas novas modalidades de deslocamentos impressos peladinâmica econômico-populacional das distintas regiões dointerior.

Os movimentos intra-regionais parecem ter garantido, emgrande medida, nos anos 80, a retenção de uma populaçãoque potencialmente migraria; nesse contexto, os deslo-camentos pendulares têm se intensificado, indicando uma daspossibilidades da mobilidade intra-urbana (BAENINGER,

1996, p. 690).

Analisando a incidência de chefes de domicílios queresidiam em município diferente do de trabalho, a autorapercebe que, nesse cômputo, os chefes migrantes tinhamuma participação mais elevada que os não-migrantes. Po-rém, comparando essas proporções entre as três regiões

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metropolitanas paulistas, a de Santos acusava uma presen-ça maior de chefes não-migrantes em deslocamentos paratrabalho fora do município de residência,

indicando que esse tipo de mobilidade espacial não é apenasuma característica da população migrante; esses deslo-camentos têm direção, sentido e composição distintosdependendo do espaço urbano em que se processam(BAENINGER, 1996, p. 691).

A autora ressalta a

necessidade de se considerar as novas modalidades dosdeslocamentos populacionais para a compreensão dascaracterísticas e tendências do fenômeno migratório [...], umavez que as dinâmicas regionais tenderão a aumentar esse tipode movimento, aumentando o leque de opções na decisão demigrar (BAENINGER, 1996, p. 692).

Cunha (1995) relaciona os fenômenos da migração intra-metropolitana e os movimentos pendulares que, emboradistintos, estão intimamente relacionados.

Na verdade, é em um contexto de expansão territorial daRegião Metropolitana – baseada, em boa medida, na migraçãointra-urbana – no qual o espraiamento da população noespaço se dá em ritmo e abrangência bem maiores que os daatividade produtiva, que a mobilidade pendular ganhacontornos de um fenômeno da mais alta relevância e interesse(CUNHA, 1995, p. 518).

O autor enfatiza a grande heterogeneidade regionaldesse tipo de movimento, com concentração das pessoasque o realizam residindo em municípios considerados “dor-mitórios” e “industriais-dormitórios”, conforme tipologiado autor; e reforça, também, a correspondência entre a in-cidência da pendularidade e a condição migratória dos in-divíduos, que é majoritária entre os migrantes intrametro-politanos. Sobre esse aspecto, Cunha destaca que 27% dototal da mobilidade pendular registrada no Censo de 1980eram compostos por este tipo de migrante. Com base nes-ses dados, constata que, para a década de 70, boa partedos indivíduos que mudaram de residência também reali-zava mobilidade pendular. Salienta que

Desta forma, mesmo que esta última não seja necessariamentedecorrência direta da migração intrametropolitana, não hácomo negar a influência, sobretudo na Região Metropolitanade São Paulo.

Contudo, não se pode perder de vista que, na medida em queesta mobilidade, por definição, decorre do aumento pro-

gressivo das distâncias entre a residência dos indivíduos eos locais onde estes exercem suas atividades, vários doscondicionantes ligados ao processo de produção e ocupaçãodo espaço (mercado de terras, distribuição da atividadeprodutiva etc.) necessitam ser recuperados para suainterpretação uma vez que, na Região Metropolitana de SãoPaulo, foram estes os principais responsáveis pelo deslo-camento progressivo da população para a periferia e,portanto, pela migração intrametropolitana.

Por esse motivo, pode-se concluir que, numa cadeia causal,muitos dos determinantes da mobilidade pendular poderãoser identificados a partir do conhecimento profundo doscondicionantes da intensa migração interna na RegiãoMetropolitana (CUNHA, 1995, p. 523).

Assim, o autor conclui que

não se pode negar que o entendimento dos movimentospendulares (commuting, ou “alternantes”, como denominaCastells, 1974) passa, entre outros aspectos, pela compreen-são da migração intrametropolitana, não apenas comomanifestação de um processo específico de segregaçãoespacial, mas também enquanto elemento decorrente de umfenômeno mais abrangente, qual seja, a distribuição daatividade econômica no território da Região Metropolitanade São Paulo (CUNHA, 1995, p. 520).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da análise aqui iniciada, é possível apontar al-gumas conclusões acerca da importância das informaçõesdo movimento pendular domicílio-trabalho/estudo. Asobservações tecidas ao longo do trabalho buscaram salien-tar a louvável reinserção da pesquisa sobre o movimentopendular no Censo Demográfico 2000, devido ao potenci-al aberto por seus dados para delinear a dimensão, o perfile a espacialidade da população em trânsito. Os fluxos quese desencadeiam em determinadas aglomerações urbanascarecem urgentemente de serem dimensionados, na medi-da em que colocam populações e administrações munici-pais em grau de maior vulnerabilidade quanto à incidênciae oscilação de demandas por serviços, equipamentos epolíticas públicas.

Espacializados, esses dados permitem definir ouredefinir a extensão de aglomerados urbanos; confirmar ouapontar centralidades; identificar áreas alimentadoras, comoas “cidades-dormitórios”; e vislumbrar novas configura-

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ções espaciais. Associados a indicadores de densidade,crescimento, ocupação, entre outros, podem ainda subsi-diar a construção de tipologias do grau de integração dosmunicípios na dinâmica das aglomerações.

Apesar da complexidade de análise desses dados, mui-tos estudos que confirmam sua relevância já foram reali-zados ou estão em curso. Há os que discutem a pertinênciaconceitual quanto à denominação “migração” ou “movi-mento” sem absolutamente descartar a constatação de queos deslocamentos pendulares guardam estreita relaçãocom a dinâmica migratória intrametropolitana. Há tambémos que particularizam o perfil social dos residentes emdeslocamento. E há ainda os que buscam os nexos entrelocal de trabalho e de residência entre municípios de aglo-merações urbanas; os que analisam as transformaçõessocioespaciais decorrentes da concentração/descon-centração da atividade econômica; e muitos outros.

Dentre os inúmeros fatores que se associam à pendula-ridade, alguns podem ser apontados como decisivos. Sãoeles: a dinâmica do mercado de terras no município-pólodos aglomerados; a alteração do perfil econômico e adesconcentração da indústria para municípios que não opólo ou distritos industriais consagrados; o acesso dife-renciado ao mercado de trabalho e/ou oportunidades deestudo; os custos e a qualidade do transporte disponívele o tempo de deslocamento.

Esses fatores, aliados à “transparência” dos limitesmunicipais, contribuem definitivamente para a extensãoterritorial das cidades. E, em algumas delas, para o reforçodo processo de configuração de aglomerações ou dametropolização. Nesse sentido, a intensificação dos mo-vimentos pendulares remete às considerações feitas porGeddes (1994) quanto à irrelevância dos limites adminis-trativos na vida cotidiana metropolitana e a necessidadede sua superação, sob pena de se continuar intervindo noespaço metropolitano de forma fragmentada e não se con-siderando a totalidade.

A indagação do autor permanece muito atual. Apesarde se referir a Londres do início do século passado, permi-te uma importante reflexão quanto ao papel dos movimen-tos pendulares na conformação da vida metropolitana,

para nós que a percebemos à distância, ou para seushabitantes, hoje, o que nos importam esses velhos limites doscondados, penosamente traçados no passado e até hojemantidos, têm utilidade prática, servem a algum propósito?Que importância têm hoje as divisões entre inúmeras vilasoficiais e vilarejos, cujos nomes históricos desapareceram,

aparentemente para sempre, como plantas microscópicas,pequeninas plantas e animais, implacavelmente devoradospor uma imensa e envolvente ameba? (GEDDES, 1994,

p. 44).

NOTAS

1. Essas informações não explicitam, entretanto, a periodicidadedo movimento. Infere-se, aqui, que os deslocamentos de grandevolume de pessoas entre localidades próximas provavelmente re-ferem-se ao movimento diário da população.

2. Estudos dessa ordem vêm sendo objeto de pesquisa do Observa-tório das Metrópoles (www.observatorio.tk), porém com resulta-dos ainda não divulgados.

3. A autora tomou por base a pesquisa “Migrações, Emprego eProjeções Demográficas para o Estado de São Paulo: pesquisa regio-nal por amostra domiciliar”, PRAD, desenvolvida pelo Nesur/Nepo-Unicamp e PUC-SP, no período 1991-1995.

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ROSA MOURA: Geógrafa do Instituto Paranaense de DesenvolvimentoEconômico e Social (Curitiba-PR), Pesquisadora da rede Observató-rio das Metrópoles – Instituto do Milênio, CNPq.

MARIA LUISA GOMES CASTELLO BRANCO: Coordenadora da Coordenaçãode Geografia do IBGE (Rio de Janeiro-RJ) ([email protected]).

OLGA LÚCIA C. DE FREITAS FIRKOWSKI: Professora Doutora do Departa-mento de Geografia da Universidade Federal do Paraná (Curitiba –PR) ([email protected]).

Artigo recebido em 23 de março de 2005.Aprovado em 17 de agosto de 2005.

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P

Resumo: Motivos de migração têm sido um tema poucas vezes levantado em pesquisas amostrais nopaís: estes só foram coletados recentemente na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD2001. Este trabalho apresenta evidências empíricas desses motivos, analisando-os a partir do perfil etárioe sexo do migrante e dos diferentes tipos de deslocamentos migratórios segundo origem e destino, des-tacando-se, em particular, o motivo de retorno para o Nordeste declarado pelos migrantes.Palavras-chave: Migração. Motivos de migração. Padrão migratório.

Abstract: Reasons to migrate have not been frequently addressed in surveys in Brazil until 2001 NationalHousehold Survey. This paper brings empirical evidences on these type of information, analyzing onsex and age perspective and also on different types of migratory displacements framework. The reasonsdeclared for migrants that return to the Northeast are also analyzed.Key words: Migration. Reasons to migrate. Migratory patterns.

KLEBER FERNANDES DE OLIVEIRA

PAULO DE MARTINO JANNUZZI

MOTIVOS PARA MIGRAÇÃO NO BRASILE RETORNO AO NORDESTE

padrões etários, por sexo e origem/destino

oucas vezes os motivos de migração têm sido abor-dados em pesquisas amostrais no país. Embora pre-sente em estudos de natureza qualitativa, as razões

pessoais de migração foram apresentadas em raras opor-tunidades em surveys mais abrangentes como os reporta-dos em Patarra et al. (1997). Há duas possíveis causas paraesse fato. De um lado, há a dominância de modelos, abor-dagens e teorias interpretativas do fenômeno migratóriocomo resultado dos desequilíbrios regionais dos fatoresde produção (em especial, do trabalho). De outro, há a re-gularidade empírica do padrão etário dos migrantes (jo-vens, sobretudo homens de 15 a 29 anos de idade). Assim,surgiu a tendência de corroborar as teses aportadas portais modelos e abordagens. O enfoque neoclássico suge-re que os indivíduos migrariam em busca de trabalho, me-lhores oportunidades e salários, realizando um cálculo ra-cional-econômico para a escolha do destino. Já a abordagem

histórico-estruturalista indica que a formação dos fluxosde migrantes decorreria das necessidades e ditames do de-senvolvimento econômico capitalista no país. Qualquer queseja o ponto de vista, os motivos da migração empreendi-da – pessoal ou compulsoriamente – seriam os relaciona-dos ao trabalho; e os protagonistas do processo, jovensem pleno potencial produtivo. Evidências apresentadasprimeiramente por Ântico (1997) e aprofundadas emJannuzzi (1998; 2000) corroboram tais assertivas para oconjunto de migrantes no Estado de São Paulo no começodos anos 90.

Para o conjunto do país, só mais recentemente (naPNAD 2001) foram coletadas algumas informações sobreos motivos de migração. Foi nessa edição da pesquisa –que incluía crianças, adultos e idosos – que foi levantadoo motivo predominante para a realização do último movi-mento migratório nos últimos quatro anos, como um que-

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sito pré-codificado. Este trabalho procura trazer evidênciasempíricas desses motivos, analisando-os a partir do perfiletário e sexo do migrante e dos diferentes tipos de deslo-camentos migratórios segundo origem e destino.

Para tanto, o texto está estruturado em três grandestópicos. Inicia-se com uma apresentação dos resultadosgerais da pesquisa sobre os motivos declarados, discrimi-nado-os segundo idade e sexo dos migrantes. Em segui-da, apresenta-se uma análise das motivações para migra-ção, tendo como referência a região de origem e os destinosdo processo. Por fim, devido à importância dos fluxos mi-gratórios originados do Nordeste brasileiro, serão inves-tigados os motivos envolvidos na migração de retorno àregião, segundo diferentes perspectivas de análise.

MOTIVOS DE MIGRAÇÃO SEGUNDO SEXO EFAIXA ETÁRIA DOS MIGRANTES

Os modelos explicativos e esquemas interpretativos dofenômeno migratório – sejam eles formatados a partir deabordagem macro ou microssocial, inspirados em escolade orientação clássica ou histórico-estrutural – atribuemaos desequilíbrios espaciais de natureza econômica a de-terminação básica dos fluxos migratórios (SALIM, 1992;EBANKS, 1993). As desigualdades das taxas de crescimen-to econômico, da oferta de empregos e de nível de saláriostenderiam a criar áreas propensas à evasão populacional eáreas destinadas à atração migratória, originando fluxos depessoas em busca de trabalho ou melhores rendimentos.A disponibilidade de serviços públicos e políticas sociaisnas áreas mais dinâmicas também constituiriam fatorespotencializadores do fenômeno (BAENINGER, 1999).

A partir dessa perspectiva, os itens “busca por traba-lho” e “acesso a serviços sociais” deveriam figurar entreas principais motivações declaradas para a migração. Nãoé o que aponta o levantamento de motivos de migração daPNAD 2001 no Brasil, o que poderia ser encarado, à pri-meira vista, como uma evidência a contraditar premissastão caras à pesquisa na área. De fato, como mostra a Tabe-la 1, o motivo “acompanhar a família” é o mais mencionadona pesquisa, por mais da metade dos migrantes entrevis-tados, seguido de motivos relacionados ao trabalho, apon-tado por pouco menos de um quarto dos entrevistadoscomo a principal razão do último deslocamento no país.Motivos relacionados ao custo da moradia figuram comoo terceiro item mais importante para migração, sendo men-cionado por 10% dos migrantes. Migrações motivadas porestudo ou por questões de saúde são muito menos fre-

TABELA 1

Distribuição dos Migrantes, por Sexo, segundo Motivos

Declarados para o Último Deslocamento

Brasil – 2001

Em porcentagem

Motivos Declarados Homens Mulheres Total

Total 100,0 100,0 100,0

Trabalho da Pessoa 34,7 11,8 23,1

Estudo da Pessoa 2,7 3,2 2,9

Saúde da Pessoa 1,6 1,6 1,6

Moradia 11,0 9,4 10,2

Acompanhar a Família 39,6 63,0 51,5

Dificuldade no Relacionamento

Familiar 1,5 2,4 2,0

Outro Motivo 8,9 8,5 8,7

Ignorado 0,1 0,1 0,1

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2001.

qüentes no país (2,9 % e 1,6% dos respondentes, respec-tivamente).

A importância de fatores microssociais como a neces-sidade de acompanhar a família já havia sido identificadaanteriormente por Ântico (1997) a partir dos dados da pes-quisa de campo do projeto “Migrações, emprego e proje-ções populacionais” (PATARRA et al., 1997). Por meio deentrevistas com os chefes de famílias migrantes residen-tes em 1993 no Estado de São Paulo, identificou-se que tra-balho e motivos relacionados à família constituíam-se asjustificativas mais citadas para a mudança para o municí-pio em que residiam por ocasião da pesquisa.

A não-primazia do trabalho como motivação principalpara migração, na PNAD, deve-se, em primeiro lugar, aofato de que o quesito acerca dos motivos de migração foiaplicado a todos os indivíduos que fizeram um desloca-mento nos últimos quatro anos, indistintamente da idade.Assim, é natural que, para cada chefe de família que decla-rasse migrar em busca de trabalho, houvesse cônjuge efilhos que declarassem que o deslocamento decorria – paraeles – como a necessidade de acompanhar o chefe ou ospais. De fato, dados da própria Tabela 1 corroboram essaassertiva, ao mostrar que, entre as mulheres, 63% declara-ram migrar pela necessidade de acompanhar a família, en-quanto entre os homens, a cifra correspondente é significa-tivamente mais baixa (39,6%). Mas, mesmo entre os homens,os deslocamentos motivados por trabalho situam-se abaixo

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daqueles justificados pela necessidade de acompanhamen-to de familiares (34,7% deles declararam ter migrado portrabalho, contra 39,6% por necessidade de acompanhar afamília).

O fato de o trabalho não figurar como motivação princi-pal da migração deve-se também, como já observado, àpresença de filhos na amostra de entrevistados. Comomostra a Tabela 2, a necessidade de acompanhar a famíliaé o motivo predominante (mais de 80%) entre crianças eadolescentes até 14 anos. Já para migrantes pertencentesà força de trabalho primária, com 25 até 49 anos de idade, otrabalho é claramente o motivo mais importante, cor-roborando extensa bibliografia de natureza empírica(JANNUZZI, 1998). De modo geral, jovens em seus 20 epoucos anos estariam sujeitos a migrar mais do que qual-quer outro grupo etário. Esse padrão etário de mobilidadeestaria condicionado, sobretudo, aos ciclos de entrada esaída do mercado de trabalho. Assim, a elevada concen-tração de jovens entre os migrantes seria explicada pelamaior sensibilidade dos mesmos com relação às ofertas detrabalho e de melhores empregos, assim como pela maioradaptabilidade a novas situações e maior desprendimentoem deixar seu ambiente de origem.

A necessidade de acompanhar o cônjuge em casais re-cém-formados, assim como a busca de oportunidades deformação educacional e profissional em centros regionaismaiores também seriam outros fatores mobilizadores de jo-vens, sobretudo aqueles na faixa de 15 a 24 anos. Há maisde um século, em suas “Leis da Migração”, Ravenstein jáhavia identificado tal característica do fenômeno migrató-rio, ao apontar a predominância da migração de moças pelocasamento e de rapazes em busca de trabalho.

De fato, entre os jovens nessa faixa, além do trabalho eda necessidade de acompanhar a família, a migração moti-vada por estudo também se mostra relativamente impor-tante. Entre os migrantes mais idosos, a migração forçadapor contingências familiares passa a ter papel mais impor-tante que o trabalho. Migração motivada por questões desaúde e moradia (morar com parentes, morar no interior,etc.) também passam a ser mais importantes.

Como já foi observado, a migração motivada por ques-tões relacionadas à moradia é bem menos freqüente queas motivadas por trabalho e pela necessidade de acompa-nhar a família. Contudo, tal tipo de migração passa a sermais significativa a partir das idades próximas à formaçãodo núcleo familiar, a partir dos 20 a 24 anos, crescendo de

TABELA 2Distribuição dos Migrantes, por Motivos Declarados para o Último Deslocamento, segundo Faixa Etária

Brasil – 2001

Em porcentagem

Trabalho Estudo Saúde AcompanharDificuldade

OutroFaixa Etária

da Pessoa da Pessoa da PessoaMoradia

a Famíliano Relaciona-

MotivoTotal

mento Familiar

0 a 4 Anos 0,3 0,4 0,4 3,5 89,2 0,9 5,3 100,0

5 a 9 Anos 0,2 1,5 0,7 4,8 87,7 1,0 4,1 100,0

10 a 14 Anos 0,8 3,5 0,5 4,4 84,1 1,9 4,8 100,0

15 a 19 Anos 13,6 9,3 0,6 6,4 59,9 2,5 7,7 100,0

20 a 24 Anos 33,1 6,5 0,9 9,7 38,8 2,0 9,0 100,0

25 a 29 Anos 38,6 2,2 0,9 12,1 35,1 2,1 9,0 100,0

30 a 34 Anos 38,4 1,2 1,4 13,6 32,0 2,6 10,8 100,0

35 a 39 Anos 40,1 0,6 1,4 15,4 30,5 2,5 9,5 100,0

40 a 44 Anos 39,3 0,5 2,0 15,1 30,3 2,4 10,5 100,0

45 a 49 Anos 41,1 0,5 2,2 13,4 29,6 1,9 11,3 100,0

50 a 54 Anos 33,4 0,3 4,6 14,8 28,8 1,8 16,3 100,0

55 a 59 Anos 24,9 0,1 6,6 17,0 32,7 2,2 16,5 100,0

60 a 64 Anos 19,2 0,1 7,0 23,2 29,8 1,5 19,1 100,0

65 Anos e Mais 8,4 0,2 14,1 23,3 34,7 2,2 17,1 100,0

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2001.

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MOTIVOS PARA MIGRAÇÃO NO BRASIL E RETORNO AO NORDESTE:...

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 134-143, out./dez. 2005

Trabalho

0102030405060708090

100

0 a 4 10 a 14 20 a 24 30 a 34 40 a 44 50 a 54 60 a 64

Homens

Mulheres

Faixa Etária

Por mil residentesAcompanhar a Família

0102030405060708090

100110

0 a 4 10 a 14 20 a 24 30 a 34 40 a 44 50 a 54 60 a 64

Mulheres

Homens

Faixa Etária

Por mil residentes

Moradia

02468

101214161820222426

0 a 4 10 a 14 20 a 24 30 a 34 40 a 44 50 a 54 60 a 64

Homens

Mulheres

Faixa Etária

Por mil residentesEstudo

0123456789

10111213

0 a 4 10 a 14 20 a 24 30 a 34 40 a 44 50 a 54 60 a 64

Homens

Mulheres

Faixa Etária

Por mil residentes

Saúde

0

1

2

3

4

5

6

7

8

0 a 4 10 a 14 20 a 24 30 a 34 40 a 44 50 a 54 60 a 64

Homens

Mulheres

Faixa Etária

Por mil residentes Outros Motivos

0

2

4

6

810

12

14

16

18

0 a 4 10 a 14 20 a 24 30 a 34 40 a 44 50 a 54 60 a 64

Homens

Mulheres

Faixa Etária

Por mil residentes

Total

0

20

40

60

80

100

120

140

160

0 a 4 10 a 14 20 a 24 30 a 34 40 a 44 50 a 54 60 a 64

HomensMulheres

Faixa Etária

Por mil residentes

GRÁFICO 1

Taxas Migratórias, por Sexo e Faixa Etária, segundo Motivos Declarados para Último Deslocamento

Brasil – 2001

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2001.

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KLEBER FERNANDES DE OLIVEIRA / PAULO DE MARTINO JANNUZZI

importância até as idades mais avançadas. Entre os jovensde 20 a 24 anos, 9,7% declararam ter migrado por necessi-dade de uma nova moradia. No estágio mais avançado dociclo vital e familiar, entre os migrantes de 65 anos ou mais,essa cifra passa a 23%, desbancando, inclusive o trabalhocomo segundo motivo mais citado. A necessidade de umamoradia para abrigar uma nova família (Quem casa quercasa!), a busca de locais mais seguros e dotados de infra-estrutura de serviços para criação dos filhos, a procura decidades e bairros mais aprazíveis ou de custos mais baixosde vida na aposentadoria explicam o comportamento des-se tipo de migração ao longo do ciclo de vida.

Essas mesmas características podem ser ilustradas pormeio das curvas delineadas pelas taxas específicas de mi-gração por motivos, calculadas como quocientes demigrantes por mil pessoas (migrantes ou não) nas faixasqüinqüenais de idade, para cada sexo, reproduzindo – noque é possível comparar – as curvas descritas em Jannuzzi(1998). Assim, observa-se com clareza o padrão fortemen-te modal e concentrado da migração por trabalho nas fai-xas de 20 a 39 anos, e sua incidência acentuada entre ho-mens. A migração associada à necessidade de acompanhara família apresenta um padrão com taxas elevadas nas pri-meiras idades, para ambos os sexos, com pico na faixa de 5a 9 anos, com magnitudes próximas ao alcançado pelos ho-mens nas principais faixas de idade produtiva que migrampor trabalho. Entre as mulheres, a curva é bimodal, comoutro pico nas idades próximas ao casamento (20 a 29 anos),decrescendo gradativamente a partir de então. Refletindoos processos associados à formação e expansão do núcleofamiliar, as taxas de migração motivada por questões rela-cionadas à moradia (busca por moradia mais barata, em localmais seguro, etc.) atingem níveis mais elevados na faixa de25 a 34 anos para homens, e um pouco mais cedo no casodas mulheres (em função da idade ao casar, um pouco menorpara as últimas). Como era de se esperar, as taxas de mi-gração por estudo têm formato sinoidal, atingindo valoresmais elevados dos 15 aos 24 anos. O fato de as taxas seremum pouco mais elevadas para as mulheres talvez se deva aque homens nessas faixas etárias estejam mais propensosa se engajar no mercado de trabalho. A migração por mo-tivos de saúde exibe um padrão crescente com o aumentoda idade, apontando a necessidade de pessoas mais ve-lhas retornarem às cidades de origem, ou se deslocarem embusca de tratamento, de parentes ou até mesmo de asilosem outras localidades. A migração residual (por outros mo-tivos) revela um padrão etário também sinoidal, comcúspide mais tardia que a da migração por trabalho.

MOTIVOS DE MIGRAÇÃO SEGUNDO ORIGEME DESTINO DOS MIGRANTES

A análise da motivação para mudança de municípiosegundo local de residência dos migrantes por ocasião dapesquisa revela algumas especificidades do processo pe-las regiões do país, embora em todas elas a migração moti-vada pela necessidade de acompanhamento da família atinjamais de 40% das declarações, sendo que a migração portrabalho, em geral, figura em segundo lugar.

No Norte, a migração por estudo é comparativamentemais citada pelos indivíduos, possivelmente pelas gran-des distâncias em que se localizam as escolas de ensinomédio e faculdades na região; para migrantes residentesno Nordeste, a mudança motivada por busca de trabalho,por outro lado, não tem a incidência relativa identificadaem outras regiões, especialmente se comparada com áreasde economia mais dinâmica, como a Região Metropolitanade São Paulo – RMSP e interior paulista.

Para residentes nas duas principais regiões metropo-litanas do país, a mudança induzida por busca de mora-dia em local mais aprazível ou de custo mais baixo é sig-nificativamente mais alta, como era de se esperar, sejapelos fluxos voluntários de saída da classe média dosgrandes centros, seja pela expulsão involuntária da po-pulação de baixa renda dos distritos mais centrais dasmetrópoles em direção às periferias. Vale lembrar que essamotivação também envolve aquelas pessoas que buscamas áreas metropolitanas devido à maior concentração deequipamentos sociais – característica que reforça a hipó-tese de a moradia representar uma motivação de carátermais funcional. Na direção inversa, nota-se a poucaexpressividade dessa motivação no Norte brasileiro e nointerior paulista.

Esses resultados podem ser analisados de forma aindamais refinada a partir da identificação de alguns fluxosespecíficos de origem e destino, como os que partem doNordeste para a Região Metropolitana de São Paulo oupara o Centro-Oeste (em especial Brasília) e aqueles demigrantes sulistas para Centro-Oeste e Norte do país (Ta-bela 4). Cerca de 36% dos migrantes que se dirigiram doNordeste para a RMSP mencionaram o trabalho como prin-cipal fator; parcela muito próxima (37%) declarou o mesmomotivo para escolha de municípios na Região Centro-Oes-te do país. Esses resultados reafirmam a análise apresen-tada em Jannuzzi (2000) para explicar a robustez dos fluxosde migrantes nordestinos para São Paulo, mesmo em con-junturas econômicas desfavoráveis.

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MOTIVOS PARA MIGRAÇÃO NO BRASIL E RETORNO AO NORDESTE:...

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 134-143, out./dez. 2005

TABELA 3Distribuição dos Migrantes, por Região de Residência, segundo Motivos Declarados para o Último Deslocamento

Brasil – 2001

Em porcentagem

Motivos Declarados Norte Nordeste Sudeste SulCentro-

R M R J RMSPInterior de

Oeste SP

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Trabalho da Pessoa 22,9 18,4 24,2 26,0 26,2 21,8 26,6 25,6

Estudo da Pessoa 5,0 3,1 2,3 2,8 3,5 1,6 3,2 1,6

Saúde da Pessoa 1,2 2,0 1,4 1,7 1,4 1,2 1,0 1,0

Moradia 6,8 11,1 11,3 9,2 7,3 18,0 14,6 6,4

Acompanhar a Família 54,6 51,5 50,0 52,1 53,7 42,1 45,8 56,2

Dificuldade no Relacionamento

Familiar 2,4 2,3 1,8 1,7 1,8 3,1 1,8 1,1

Outro Motivo 7,0 11,7 8,6 6,5 6,0 10,9 7,1 8,1

Ignorado 0,1 - 0,3 - - 1,5 - -

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2001.

TABELA 4Distribuição dos Migrantes, por Direção dos Fluxos, segundo Motivos Declarados para o Último Deslocamento

Brasil – 2001

Em porcentagem

NE para ESP NE para Centro-OesteSul para Norte +

Motivos DeclaradosRMSP para NE Centro-Oeste para NE

Norte + Centro-Oeste

Centro-Oeste para Sul

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Trabalho da Pessoa 36,4 19,1 37,0 14,0 36,1 29,5

Estudo da Pessoa 1,7 1,2 5,0 2,1 1,8 3,2

Saúde da Pessoa 0,6 2,7 1,6 2,7 0,3 2,1

Moradia 12,6 12,1 6,1 8,1 2,2 6,6

Acompanhar a Família 44,4 42,6 42,7 48,6 53,8 51,2

Dificuldade no Relacionamento Familiar 1,0 2,8 2,2 2,7 1,0 1,8

Outro Motivo 3,4 19,4 5,5 21,8 4,8 5,5

Ignorado - - - - - -

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2001.

Entre os sulistas, 36,1% daqueles que se dirigiram paraa Fronteira Centro-Oeste/Norte o fizeram em busca de tra-balho. A comparativamente alta incidência de declaraçãode outros motivos por migrantes partindo de São Paulo ouCentro-Oeste em direção ao Nordeste é reveladora de queparte da migração de retorno é motivada por fatores possi-velmente relacionados ao insucesso de inserção laboral oude adaptação.

Os fluxos migratórios partindo de Minas Gerais, sejapara São Paulo, seja para Centro-Oeste, têm forte motiva-ção laboral, como mostra a Tabela 5. Também compartilhadessa característica a mobilidade de pessoas dentro doEstado de São Paulo e, curiosamente, – mesmo com as di-ficuldades do mercado de trabalho carioca –, a migraçãoque se origina nos municípios no interior do Rio de Janei-ro e se desloca para a Região Metropolitana do Rio de Ja-

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SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 134-143, out./dez. 2005140

KLEBER FERNANDES DE OLIVEIRA / PAULO DE MARTINO JANNUZZI

neiro – RMRJ. Como já foi observado anteriormente, asquestões relacionadas à moradia explicam parte significa-tiva da migração intrametropolitana na RMSP e RMRJ, ajulgar pelas aproximações a que se pode chegar quanto aseu dimensionamento (não passível de mensuração preci-sa na PNAD).

MOTIVOS DE MIGRAÇÃO DE RETORNO:O CASO DO NORDESTE

O Nordeste brasileiro tem-se caracterizado como umaárea de intensos fluxos emigratórios. No cerne dessesmovimentos podem ser localizados alguns fatores histori-camente conhecidos, como a estagnação econômica, asmais diversas manifestações de desigualdades sociais,sobretudo os elevados níveis de desemprego nas áreasurbanas da região.

As transformações na estrutura produtiva brasileira eas novas configurações do desenvolvimento regional quese delineiam a partir da década de 70 ambientam importan-tes modificações na dinâmica migratória nordestina. O pro-cesso de desconcentração econômica, amparado pelaspolíticas de incentivo ao investimento industrial no Nor-deste, influencia o comportamento da migração nordesti-na na década de 80, onde se destacam os fluxos de retorno(CUNHA; BAENINGER, 2000). Na década de 90, a migra-ção originada do Nordeste reaquece o comportamento do

TABELA 5Distribuição dos Migrantes Internos, por Direção dos Fluxos, segundo Motivos Declarados para o Último Deslocamento

São Paulo e Rio de Janeiro – 2001

Em porcentagem

Intra-Intra-

Intra-Intra-

MG para MG paraestadual com estadual com estadual com estadual com

SP Centro-OesteMotivos Declarados Residência Residência Residência Residência Total

na RMSP no Interior na RMRJ no Interior

de SP do RJ

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Trabalho da Pessoa 38,8 32,8 31,2 21,7 30,9 33,6 33,8

Estudo da Pessoa 3,6 1,2 1,9 3,0 2,3 3,5 2,5

Saúde da Pessoa 1,0 1,4 0,3 0,5 2,3 3,2 1,4

Moradia 7,5 3,0 6,1 3,9 8,0 7,7 6,0

Acompanhar a Família 41,0 53,8 41,4 63,1 44,1 45,8 46,4

Dificuldade no Relacionamento Familiar 1,4 0,4 1,0 3,9 2,0 1,8 1,3

Outro Motivo 6,7 7,4 14,6 3,9 10,5 4,4 8,1

Ignorado - - 3,5 - - - 0,4

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2001.

período que se estende até os anos 70, no qual se desta-cam os fluxos para o Sudeste e Centro-Oeste, sendo queessa retomada ocorre ao mesmo tempo em que a migraçãode retorno à região também intensifica os seus fluxos, cons-tituindo, assim, uma novidade revelada pelo CensoDemográfico 2000 (OLIVEIRA, 2003).

Nesse contexto, cumpre mencionar os reflexos das po-líticas públicas de planejamento urbano e regional, ence-tadas na região a partir da década de 70, que visavam aestruturar as cidades médias de forma que elas atuassemna redução das disparidades regionais através da inte-riorização do desenvolvimento e que absorvessem partedos fluxos migratórios que se destinam às metrópoles(AMORIM FILHO; SERRA, 2001). A estruturação dessescentros contou com um célere processo de expansão deconjuntos habitacionais, cujas unidades financiadas pelogoverno certamente acabaram atraindo migrantes internose os de retorno. O caráter seletivo dos investimentos nossetores não-tradicionais (química, metalurgia, minerais não-metálicos, papel e celulose) impôs à região uma feição di-ferente daquela caracteristicamente produtora de bens deconsumo não-duráveis (cana-de-açúcar, algodão). Talseletividade também teve rebatimentos no espaço nordes-tino devido à tendência de o movimento de industrializa-ção convergir para as áreas que apresassem certos atribu-tos (tamanho populacional, capacidade de articulação comoutros centros de hierarquias distintas, etc.). Ao longodessas décadas, tais modificações fazem surgir novas con-

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MOTIVOS PARA MIGRAÇÃO NO BRASIL E RETORNO AO NORDESTE:...

SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 134-143, out./dez. 2005

figurações regionais, de que são exemplo os espaços pro-dutivos modernos como o complexo petroquímico deCamaçari (BA), o pólo têxtil e de confecções de Fortaleza(CE), o complexo mínero-metalúrgico de Carajás (MA), opólo agroindustrial de Petrolina (PE)/Juazeiro (BA), a fru-ticultura do Rio Grande do Norte e a pecuária intensiva noAgreste pernambucano (ARAÚJO, 2000a).

Essas transformações na estrutura econômica nordes-tina constituem o ambiente sobre o qual pode-se, agora,analisar a participação do trabalho e outros fatores noconjunto de motivações para retornar à região. Antes,porém, são necessários alguns esclarecimentos meto-dológicos acerca da definição da migração de retorno, jáque ela pode ser estudada a partir de duas modalidades. Aprimeira, denominada de retorno de única etapa refere-seà pessoa que, retornada à unidade federativa – UF de na-turalidade, possui igual tempo de residência no municípiode enumeração, podendo ser enumerada no município quenasceu ou não. O retorno com mais de uma etapa, por suavez, é realizado pela pessoa que, após ter retornado à UFde naturalidade, efetua etapas migratórias dentro do esta-do, antes de, finalmente, ser enumerado no município denascimento ou outro qualquer – o que justifica ser o tem-po de residência no município de enumeração inferior aoverificado na UF (RIBEIRO, 1997).

Tal distinção metodológica impõe também diferençasquantitativas, ou seja, ao se considerar como migrante de

retorno aquela pessoa que retorna à UF de naturalidade,mas que realiza movimentos migratórios intermunicipais,obtém-se possivelmente uma população retornada maisnumerosa. Entretanto, a pertinência de considerar-se essemovimento pode ser questionada através do argumento deque, ao realizar a migração entre municípios, esse migrantedeixa de ser “de retorno” e passa a ser “interno”. Este ar-tigo compartilha dessa idéia e define como migrante deretorno aquela pessoa natural do município e que possuíaaté quatro anos de residência ininterrupta no lugar (retor-no ao município de nascimento), ou o natural da UF comaté quatro anos de residência no município atual em quefoi entrevistado (retorno à UF de naturalidade, mas a ou-tro município que não o de nascimento).

Valendo-se das observações da Tabela 6 referentes àparticipação relativa de cada motivo, segundo fluxos deretorno, observa-se que acompanhar a família é o principalmotivo da migração, como já foi assinalado para todos osdemais fluxos aqui estudados, em função das característi-cas do levantamento (realizado junto a todas as pessoasda família migrante). Considerando as áreas originárias dosfluxos de retorno, o peso desse motivo apresenta-se maiorna região Norte, sendo apontado por 51,1% dos mais de119 mil retornados a essa região. Nas regiões Nordeste eCentro-Oeste, esse motivo foi apontado por cerca de 44%dos retornados, enquanto que, dos originados do Estadode São Paulo, 35,7% apontaram esse motivo.

TABELA 6Distribuição dos Migrantes, por Principais Origens dos Fluxos de Retorno para o Nordeste, segundo Motivos Declarados para o Último Deslocamento

Brasil – 2001

Motivos Declarados

Origem do Retorno Total

Norte NordesteSudeste

SP SulCentro-

%Nos

(Exceto SP) Oeste Absolutos

Total (Nos Absolutos) 119.919 255.001 169.642 537.502 12.187 139.357 1.233.608

Total (%) 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Trabalho da Pessoa 21,3 20,0 18,3 22,2 24,9 13,2 20,1 248.128

Estudo da Pessoa 3,0 3,5 1,4 1,1 0,0 2,4 2,0 24.086

Saúde da Pessoa 4,7 1,3 3,8 3,2 0,0 3,6 3,1 37.698

Moradia 9,0 10,1 12,0 12,5 13,7 8,9 11,2 137.779

Acompanhar a Família 51,1 44,8 39,1 35,7 37,2 44,1 40,5 499.699

Dificuldade no Relacionamento

Familiar 2,1 3,9 4,9 2,9 12,4 3,0 3,4 41.763

Outro Motivo 8,8 16,5 20,6 22,5 11,8 24,8 19,8 244.455

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2001.

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SÃO PAULO EM PERSPECTIVA, v. 19, n. 4, p. 134-143, out./dez. 2005142

KLEBER FERNANDES DE OLIVEIRA / PAULO DE MARTINO JANNUZZI

O item trabalho figura como a segunda motivação deretorno, sendo declarado por 20,1% do total dos re-tornados, cifra essa que assume valores um pouco maisaltos dentre os da Região Sul, São Paulo e Região Norte.Entre 1997 e 2001, cerca de 248 mil pessoas retornaram aoNordeste motivadas principalmente pelo trabalho, sendoque, desse total, 150,2 mil pessoas provenientes da regiãoSudeste. De um lado, as crises econômicas que marcaramtoda a década de 90 aumentaram as dificuldades de inser-ção, ou mesmo de manutenção laboral, nos grandes cen-tros urbanos – e, assim, favoreceram a intensificação doretorno ao Nordeste. Nessa região, por sua vez, os refle-xos das transformações econômicas regionais, como asacima aludidas, contribuíram ainda mais no direcionamentodesses fluxos, embora o dinamismo econômico nordesti-no já apresentasse sinais de estagnação. Vale acrescentartambém que a demanda por postos de trabalho no merca-do nordestino, que já se mostrava pressionado desde oinício dos anos 90,1 torna-se maior na medida em que cer-ca de 248 mil pessoas exercem de forma direta essa busca,da mesma forma que indiretamente as demais pessoas quemigraram por outro motivo – como, por exemplo, os queacompanham a família.

A pequena importância do motivo estudo pode serexplicada, ademais da idade mais adiantada dos migrantesde retorno, pelo relativo atraso do sistema educacionalnordestino, embora algumas universidades como as Fede-rais de Pernambuco, Bahia e Ceará já despontem comocentros de referência nas Ciências Exatas e Sociais Apli-cadas.

Com maior expressividade, aparecem os motivos relacio-nados com a moradia. Note-se que, dos mais de 1,2 milhãode pessoas consideradas como migrantes de retorno aoNordeste, pouco mais de 11% apontaram esse motivo.Dentre os fluxos regionais, merecem destaque provenien-tes do Sul, com 13,7%, sobretudo aqueles retornados doSudeste – exceto São Paulo, com 12% e do Estado de SãoPaulo, com 12,5%.

Mas o que realmente desponta como motivação dife-renciada para a migração de retorno para o Nordeste é aimportância dos outros motivos. Note-se que ela é citadacom maior intensidade pelos migrantes que retornaram àregião, em especial de áreas tradicionalmente receptorasde nordestinos, para lá deslocados por motivo de trabalho(além de acompanhamento da família). Assim, cerca de umquarto dos migrantes que retornaram do Centro-Oeste,declararam outros motivos para justificar o retorno; entreos que retornaram do Estado de São Paulo, a cifra equiva-

lente é de 22,5%. Como são essas as duas regiões onde amigração de nordestinos por trabalho é mais intensa, comojá foi mostrado anteriormente (Tabela 4), é plausívelconjecturar que, dentre as possíveis razões subentendi-das nessa resposta (outros motivos), destaquem-se fato-res como a dificuldade de inserção laboral no local de resi-dência anterior, seja pela elevada competitividade domercado formal, seja pela instabilidade do setor informaldo mercado de trabalho. Além disso, o agravamento daviolência nos grandes centros do Sudeste, manifestado noaumento das mortes por causas externas contra a pes-soa – e, em especial, daquelas em idade economicamenteativa –, também deve ser outra razão subentendida dentrodessa categoria residual outros motivos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho procurou trazer elementos empíricos acer-ca das motivações declaradas pelos indivíduos para migra-ção para o município de residência por ocasião da residên-cia. A necessidade de acompanhar a família e a busca portrabalho revelaram-se as motivações mais importantes paraa mudança para o município atual. A primeira, por mulhe-res; a segunda, por homens – especialmente os prove-nientes do Nordeste e aqueles que se dirigem, dentre asáreas estudadas, à RMSP ou ao interior de São Paulo. Mu-danças motivadas por questões relativas ao custo da mo-radia tendem a ser mais freqüentes para pessoas residen-tes ou que saíram de regiões metropolitanas. Migração pormotivos de saúde tende a ser um item mais importante paramigrantes em ciclo vital mais avançado. Ainda que essesresultados pareçam fazer sentido e revelem-se bastanteconsistentes com achados anteriores, é oportuno lembrarque declarações sobre motivos de migração – como tan-tas outras questões opinativas em pesquisas amostrais –estão sujeitas a erros de memória e racionalizações postfacto, de modo a reduzir a dissonância entre a atitude doindivíduo e sua intenção à época de migração.

Se é fato que não se pode sobrevalorizar fatores micros-sociais em detrimento das causas macroestruturais noentendimento dos processos sociais, os resultados aquiapresentados ilustram, no campo de estudos migratórios,a contribuição analítica complementar que a primeira ordemde fatores – motivações individuais – pode trazer àinterpretação das nuances que o fenômeno manifestaestruturalmente. No caso dos fluxos de retorno ao Nor-deste, existem outras variáveis macroestruturais, além dasapontadas neste texto, que devem ser consideradas na in-

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MOTIVOS PARA MIGRAÇÃO NO BRASIL E RETORNO AO NORDESTE:...

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terpretação do crescente interesse verificado nos migrantescom idade superior aos 55 anos, da mesma forma que aretomada dos fluxos destinados ao Sudeste não pode maisser explicada pelos mesmos elementos utilizados nos anos70 e 80.

NOTA

1. Devido à intensificação do crescimento populacional dos anos70, resultante do balanço positivo entre as elevadas taxas defecundidade e do intenso processo de redução da mortalidade.

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KLEBER FERNANDES DE OLIVEIRA: Professor do Departamento de Econo-mia da Universidade Mackenzie – SP. Mestre em Estudos Populacionaise Pesquisa Social ([email protected]).

PAULO DE MARTINO JANNUZZI: Assessor da Diretoria Executiva da Fun-dação Seade – SP. Professor do Mestrado em Estudos Populacionaise Pesquisas Sociais da ENCE/IBGE – RJ.

Artigo recebido em 23 de fevereiro de 2005.Aprovado em 22 de março de 2005.

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MARIA REJANE SOUZA DE BRITTO LYRA

H

MARIA REJANE SOUZA DE BRITTO LYRA

SULANCA X MUAMBArede social que alimenta a migração de retorno

Todas as sextas-feiras, um posto de gasolina de Caruaru,localizado às margens da BR-104, transforma-se numa

verdadeira rodoviária pirata com dezenas de ônibus clandesti-nos partindo para o Sul e Sudeste do país, sobretudo São

Paulo. Pelo menos três desses ônibus fazem viagens regularespara Foz do Iguaçu, no Paraná, viabilizando a atividade

de um novo tipo de mascate cada dia mais comum emCaruaru: o sulanqueiro-muambeiro. São dezenas de homens

e mulheres que duas vezes por mês enfrentam três dias deviagem para vender as roupas produzidas em Santa Cruz

do Capibaribe e comprar brinquedos, fitas cassete e toda asorte de bugigangas em Ciudad del Este, paraíso da

muamba, vizinho a Foz do Iguaçu.1

á cerca de doze anos, este circuito, percorrido poresses ônibus clandestinos2 , parece consolidaruma rede entre nordestinos do Agreste de Per-

nambuco e moradores do Sul e Sudeste do país, especial-mente de São Paulo, já que é nesta cidade onde desce amaioria dos passageiros (85%), com suas cargas dirigindo-

Resumo: Este trabalho analisa o processo de migração de retorno a Pernambuco, procedente do Estadode São Paulo, no período 1970-2000, buscando indícios de redes sociais que se instalam no processo demigração de retorno. Como resultado, o retorno não implicou, para muitos, a perspectiva de tornar aemigrar para São Paulo, caracterizando a reversibilidade do movimento de retorno, inclusive para o AgrestePernambucano, para onde afluiu o maior volume de retornados.Palavras-chave: Migração de retorno. Redes sociais. Redes migratórias.

Abstract: This work examines the return migration process to Pernambuco, proceeding from the state ofSão Paulo, in the period of 1970-2000, treating the migratory flow from the perspective of the socialnetworks. As a result, the return characterize the reversibility of movement to the Agreste Pernambucano,where a lot of migrants returned to.Key words: Return migration. Social networks. Migratory flow.

se ao bairro do Brás, indo o restante dos passageiros até acidade paranaense de Foz do Iguaçu, onde atravessam aPonte da Amizade para Ciudad del Este, no Paraguai. Nessatravessia, um grupo de pernambucanos atua como “laranjade mão dupla”3 levando sulanca4 e trazendo muamba.5

Como núcleo do Agreste Pernambucano, o municípiode Caruaru é ponto inicial dessa rota de ônibus que liga aregião a São Paulo e a Foz do Iguaçu, através de um circui-to regular de transporte de sulanqueiros e muambeiros comseus produtos para comercializar.

As redes de relações sociais estabelecidas e consoli-dadas pelo circuito dos ônibus na rota Caruaru–São Pau-lo–Foz do Iguaçu levam a supor que:

- migrantes pernambucanos residentes em São Paulo ali-mentam a rede de comércio – formal e informal – esta-belecida entre o sul do país e sua terra natal, reforçandosua relação com a família e a própria economia familiar;

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SULANCA X MUAMBA: REDE SOCIAL QUE ALIMENTA A MIGRAÇÃO DE RETORNO

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- a rede estabelecida pela rota dos ônibus anteriormentecitada propicia o aumento do fluxo de retorno dos migrantesresidentes no Sul e Sudeste do país, em especial em SãoPaulo, seja de forma permanente, caracterizando uma “rever-sibilidade”6 do fenômeno da migração, seja de caráter pro-visório, caracterizando o “ir e vir”, ou seja, a “circularidade”7

dos migrantes.

Este texto focaliza a migração de retorno para a Regiãode Desenvolvimento – RD Agreste Central de Pernambuco,contextualizando-a a partir dos processos instalados noterritório desse Estado. Evidencia que, surpreendentemen-te, essa região ultrapassa em termos de volume e taxa mé-dia anual de migração de retorno a Região Metropolitanado Recife – o pólo mais dinâmico do Estado – onde seesperaria encontrar uma maior atratividade de retornados.Destaca, como questão central, o papel das redes sociaisque ligam os núcleos dinâmicos da região do agrestepernambucano com o Estado de São Paulo e que alimen-tam a migração de retorno, possivelmente atraída pelas opor-tunidades econômicas que têm se configurado como alter-nativa de trabalho e renda naquela região agrestina.

O DESTAQUE DA MESORREGIÃO DO AGRESTEPERNAMBUCANO ATRAINDO MIGRANTESRETORNADOS

A Mesorregião – MR do Agreste Pernambucano, nocontexto estadual, destacou-se ao longo de todo o perío-do analisado, não só como de maior evasão de população8

– 39,3% (1970-80) e 33,1% (1981-91) –, como também demaior atração de migrantes de retorno – 42,5%, 45,2% e41,3%, nas décadas de 70-80, 81-91 e 90-2000, respectiva-mente. Enquanto mostrou-se propensa a perder menospopulação, exibiu, em compensação, a tendência a recebermais retornados (Tabela 1).

Ao relacionar o volume dos migrantes de retorno com ocontingente populacional, evidenciou-se a expressividadedos pernambucanos da mesorregião do Agreste. Verificou-se, dessa forma, que a taxa média anual de migração deretorno superou tanto a média estadual quanto as demaismesorregiões, chegando a triplicar o seu valor em relaçãoà Mesorregião Metropolitana no período 1981-91. Tal con-dição reafirmou a Mesorregião do Agreste como a de maiorintensidade migratória.

Observa-se, no contexto da MR do Agreste Pernam-bucano, que a RD Agreste Central, da qual o município deCaruaru constitui o centro dinâmico, destacou-se como ade maior volume de retornados. Sua posição de destaque

também apresentou as maiores taxas médias anuais de mi-gração de retorno nas duas primeiras décadas, reduzindo,contudo, a distância relativa que a destaca da RD AgresteMeridional nos anos 90.

Para a compreensão desse processo, especialmentequanto às oportunidades de trabalho dos migrantes deretorno, buscou-se identificar alguns elementos de incen-tivo ou de constrangimento das regiões de desenvolvimen-to mais expressivas de Pernambuco, capazes de explicar sejaa evasão dos migrantes naturais pernambucanos seja aatração dos migrantes de retorno, aprofundando a análisenum quadro de mudanças ocorridas no período 1970-2000.

O enfoque dado às condições de trabalho leva em con-sideração que “trabalho” e “família” são entendidos comofatores fundamentais na decisão de migrar e constituemduas questões-chave para o entendimento do processo demigração de retorno. Este entendimento é reforçado porScott (1986), que destaca entre as razões mais fortes quefazem com que tantos migrantes voltem a enfrentar as mes-mas condições que deixaram: a exclusão da maioria dosmigrantes de retorno da força de trabalho ocupada durantea sua estada fora; a família, mais especificamente, a unidadedoméstica, com a qual o migrante sente ligação e que seconstitui como o seu veículo de sobrevivência na sociedade.

Reforçando a importância das relações de trabalho,Sayad (2000, p. 8) indaga:

existem migrações, por mais reduzidas que sejam, e porquaisquer que sejam as razões declaradas, que não sejamde trabalho? Isto é, que não tenham implicações no mercadode trabalho?

Pernambuco, com a diversidade de suas regiões, apre-senta grande centralização da economia e da população emalgumas áreas, bem como expressa significativa desigual-dade nos níveis de desenvolvimento e de qualidade devida. A Região Metropolitana do Recife, que abrange quase3% da área do Estado, concentra 42,11% (1990-2000) dapopulação pernambucana e mais da metade do PIB do Es-tado, apresentando os seus melhores indicadores sociais.Essa região conta, ainda, com as maiores potencialidadese condições mais efetivas de crescimento e desenvolvimen-to, tais como a oferta de infra-estrutura e o nível de esco-laridade, além da proximidade dos centros universitáriosexistentes em Pernambuco (FIDEM, 1999). Assim, era dese esperar que essa região metropolitana atraísse um maiornúmero de migrantes de retorno interestaduais proceden-tes do Estado de São Paulo, em vez de eles se dirigirem emmaior quantidade para a Região de Desenvolvimento

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MARIA REJANE SOUZA DE BRITTO LYRA

TABELA 1

Volume e Taxa Média Anual dos Migrantes de Retorno a PernambucoProcedentes do Estado de São Paulo (1), segundo Mesorregiões e Regiões de Desenvolvimento

Pernambuco – 1970-2000

Mesorregiões e 1970-80 1981-91 1990-2000Regiões de Volume Taxa (2) Volume Taxa (2) Volume Taxa (2)Desenvolvimento Nos Abs. % (% a.a.) Nos Abs. % (% a.a.) Nos Abs. % (% a.a.)

PERNAMBUCO 30.539 100,00 0,050 62.367 100,00 0,086 78.635 100,00 0,116

MR/RD Metropolitana (3) 10.469 34,27 0,050 14.984 24,03 0,052 21.106 26,84 0,075Núcleo Central 8.803 28,83 0,054 10.329 16,56 0,048 13.368 17,00 0,066Recife 6.743 22,08 0,060 5.929 9,51 0,043 6.459 8,21 0,053Litoral Norte 914 2,98 0,051 2.349 3,77 0,068 3.534 4,49 0,090Faixa Oeste 589 1,93 0,039 1.516 2,43 0,069 2.600 3,31 0,119Litoral Sul 163 0,53 0,013 772 1,24 0,045 1.604 2,04 0,093

MR Mata PE 3.077 10,08 0,030 6.345 10,17 0,053 8.478 10,78 0,080RD Mata Norte 760 2,49 0,017 2.650 4,25 0,050 3.391 4,31 0,072RD Mata Sul 2.317 7,59 0,042 3.695 5,92 0,056 5.087 6,47 0,087

MR Agreste PE 12.981 42,51 0,080 28.184 45,19 0,157 32.479 41,30 0,190RD A. Setentrional 1.569 5,14 0,044 3.808 6,11 0,088 6.335 8,06 0,161RD A. Central 7.884 25,82 0,108 15.582 24,98 0,177 14.998 19,07 0,187RD A. Meridional 3.528 11,55 0,069 8.794 14,10 0,146 11.146 14,17 0,215

MR Sertão PE 2.870 9,40 0,040 10.796 17,31 0,118 12.893 16,40 0,159RD S. Pajeú-Moxotó 1.932 6,33 0,048 7.721 12,38 0,155 7.967 10,13 0,185RD S. Central 395 1,29 0,033 1.355 2,17 0,086 1.723 2,19 0,123RD S. Araripe 543 1,78 0,027 1.720 2,76 0,066 3.203 4,07 0,135

MR S. Francisco PE 1.142 3,74 0,050 2.058 3,30 0,059 3.679 4,68 0,099RD Sertão de Itaparica 491 1,61 0,056 716 1,15 0,063 818 1,04 0,081RD São Francisco 651 2,13 0,047 1.342 2,15 0,058 2.861 3,64 0,106Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1980 a 2000 (tabulações especiais).(1) Fluxo interestadual de Migrantes de Retorno SP-PE: corresponde aos migrantes com menos de 10 anos de residência na UF atual (PE), que nasceram em Pernambuco e a última procedênciaé o Estado de São Paulo.(2) Taxa média anual de migração de retorno SP-PE, corresponde ao volume de retornados, dividido pelo número de anos do período considerado, dividido pela população projetada para omeio do período de cada região. Deste modo, as Taxas Médias Anuais de Migração de Retorno expressam a relação existente entre este componente do fluxo migratório e a população médiano período estudado. Este procedimento não só atende às medidas comparáveis em intervalos diferentes, como mede a atração que as Regiões de Desenvolvimento de Pernambuco exercemsobre os emigrantes pernambucanos residentes em São Paulo.(3) Os municípios da Meso/RD Metropolitana estão reunidos em sub-regiões geográficas: Núcleo Central (Recife, Olinda, Jaboatão dos Guararapes), Litoral Norte (Paulista, Abreu e Lima,Igarassu, Itamaracá, Itapissuma e Araçoiaba), Faixa Oeste (Camaragibe, São Lourenço da Mata e Moreno), Litoral Sul (Cabo e Ipojuca). Os dados do distrito estadual de Fernando de Noronhaforam incluídos no total da MR/RD Metropolitana do Recife.

Agreste Central, que, surpreendentemente, ultrapassa emvolume e taxa média anual de migração de retorno aquelaregião. A ampliação das oportunidades de trabalho na MRdo Agreste, na década de 80, pode-se colocar como fatorde mudança desse comportamento.

A Mesorregião do Agreste Pernambucano ocupa cercade um quarto do território do Estado, onde se assenta, tam-bém, um quarto da população, sendo a única, entre asmesorregiões de Pernambuco, a apresentar taxa de cresci-mento ascendente. Situada na região de semi-árido do Es-

tado, reúne três regiões de desenvolvimento: RD AgresteSetentrional, RD Agreste Central e RD Agreste Meridio-nal. Tem economia caracterizada por exploração agrícola,pecuária e atividades de comércio e serviços associadasaos centros urbanos dinâmicos. A pecuária de corte e deleite tem um grande peso econômico na região, incremen-tada pela produção artesanal, semi-artesanal e industrialde laticínios, que se destaca como a maior do Estado. Nasáreas de brejo, o cultivo de hortifrutigranjeiros tambémoferece um suporte à economia regional.

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Desde a década de 70, novas atividades vêm assumin-do um papel econômico importante na região, que envol-ve não só a produção – de roupa (sulanca), de bordadose renda, de artesanato de barro – como também, especial-mente, a comercialização dessa produção, através da cria-ção e do incremento de feiras livres – a Feira da Sulanca,em vários locais do Estado, e a Feira de Caruaru. Os even-tos turísticos, incentivados pelo poder público em asso-ciação a promotores privados, que, em geral, envolvemvários municípios, extrapolando, em alguns casos, a RDonde eles se localizam, também contribuem para a cria-ção de novas oportunidades de trabalho na região. Issopode, inclusive explicar o destaque da MR do AgrestePernambucano, no contexto da migração de retorno noEstado.

Um aspecto importante a salientar é que os municípiosdo entorno de Caruaru oferecem as vantagens da proximi-dade desse centro dinâmico, ao mesmo tempo em que exi-bem condições de fixação talvez mais acessíveis aoretornado. Em todo caso, pode-se admitir a influência deCaruaru, seja na atração de migrantes de retorno de outrosmunicípios pernambucanos para o seu espaço, seja nadeterminação de retornar a um município de origem situa-do nas vizinhanças de Caruaru.

O maior porcentual dos emigrantes naturais da RDAgreste Central, no período 1981-91, foi encontrado nomunicípio de Pesqueira e no seu entorno (32,85%), domesmo modo que esses municípios apresentaram o maiorretorno do período (34,05%). Este pólo de muitas saídas emuitas entradas sugere a existência de redes sociais. Noconjunto desses municípios destacam-se Belo Jardim, ondeestão instaladas indústrias de porte como Palmeiron,Mafisa e Baterias Moura; os municípios de Alagoinha ePoção, onde há uma significativa produção de renda re-nascença, doces artesanais e indústrias do setor de con-dimentos; Pesqueira e Poção, por seu turismo religioso(LYRA, 2003).

Nesse sentido, é importante citar Patarra et al. (1997, p.33), que destacam a elevada mobilidade da população, sejaatravés de fluxos intrametropolitanos ou de fluxos entre ametrópole e o interior, num quadro onde se mantém aexpressividade do movimento migratório, seja pelo aumentosensível da emigração de naturais como de não-naturais(inclusive os migrantes de retorno) de São Paulo, seja pelaimportância relativa dos grandes fluxos migratórios para SãoPaulo originários do Nordeste. Nesse contexto, os autoresapontam para o novo papel que se desenha para as pequenase médias cidades do sistema urbano paulista, uma vez que

de um lado, se consolidam os processos de formação dasnovas metrópoles do interior [...], bem como ganham novadensidade antigos aglomerados urbanos constituídos por umatrama de cidades articuladas funcionalmente e hierar-quicamente dispostas. Este processo é movido sobretudo pelaperiferização do crescimento populacional destas áreas, tantono sentido de menores diferenciais entre os ritmos deexpansão das sedes regionais e seus entornos, como muitasvezes pelo próprio crescimento mais acentuado das pequenaslocalidades e do entorno das sedes regionais.

Lyra (2003) constatou uma afluência expressiva denão-naturais desde a década de 70, crescendo na déca-da de 80, para a região do Agreste pernambucano, emface, especialmente, da produção de sulanca e das fei-ras livres, inclusive motivados pela expansão e dina-micidade da Feira de Caruaru,9 com sua diversidade deprodutos e procedimentos. A “feira do troca-troca”, porexemplo, é um de seus atrativos, onde não se fala emdinheiro. Tudo é trocado, mesmo sendo os mais absur-dos dos negócios. Trocam-se aves por discos, relógiospor rádios, bicicletas por animais, móveis, botijões degás, pássaros, etc. Toda essa diversidade faz da Feirade Caruaru um evento que extrapola a região, alimentan-do, inclusive, os ônibus clandestinos que ligam essaregião a São Paulo.

A ROTA CLANDESTINA DE ÔNIBUS SUGERINDOREDES MIGRATÓRIAS ENTRE PERNAMBUCOE SÃO PAULO

As informações obtidas, através da reportagem já cita-da e de entrevista com integrantes do Sebrae, acerca docircuito de ônibus clandestinos que ligam Pernambuco aSão Paulo, confirmam uma rede de interações de migrantespernambucanos estabelecidos em São Paulo com seusparentes e conterrâneos (Mapa 1).

A importância do pólo caruaruense no Agrestepernambucano dá-se pelo comércio dinâmico da cidade,através de sua Feira de Caruaru, onde se insere a Feirado Paraguai. Nelas são comercializadas, entre outrosartigos, a sulanca produzida em Santa Cruz do Capiba-ribe,10 os artefatos de couro produzidos em Cachoeirinha,município vizinho a São Caetano,11 além de produtos vin-dos de São Paulo e do Paraguai.

De acordo com os vendedores que trabalham com amercadoria nas ruas de Ciudad del Este,12 as roupas ba-ratas produzidas em Pernambuco e em São Paulo corres-

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MARIA REJANE SOUZA DE BRITTO LYRA

MAPA 1

Circuito de Ônibus do Agreste Pernambucano a São Paulo – Foz do Iguaçu (1)

Fonte: Jornal do Comércio, 22 out. 2000.(1) Rota: Caruaru – São Paulo – Foz do Iguaçu – São Paulo – Caruaru.

pondem a 30% dos produtos de vestuário comercializados.Comprada a baixo custo, a mercadoria tem saída certa, ali-mentando o comércio que se estabelece entre São Paulo eos pólos de produção e comercialização da “sulanca” emPernambuco.

Tanto as roupas do Nordeste quanto as de São Paulo sãomuito procuradas porque têm preço baixo e são muito bonitas,apesar de não terem um acabamento muito bom.13

Os produtos trazidos de Ciudad del Este vão, na maio-ria, para os tabuleiros da Feira do Paraguai, em Caruaru,que se inicia todas as segundas-feiras às 20 horas e termi-na ao meio-dia das terças-feiras, congregando cerca de3.000 comerciantes e atraindo compradores de todo o inte-rior pernambucano e até de Estados vizinhos. Parte dos pro-dutos são revendidos diretamente em cidades do interiorde Pernambuco, na busca de maior lucro pelos mascates.

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Um dado de grande interesse para este estudo, queenvolve essa rede de comércio, remete às conexões quese estabelecem entre migrantes pernambucanos em SãoPaulo e seus parentes do Agreste de Pernambuco. DonaSantina Lima,14 63 anos, participa da Feira do Paraguaicom mercadorias enviadas por seu filho, residente emSão Paulo. Tais produtos são remetidos via transporta-dora regularizada, o que, por sua vez, sugere uma coe-xistência de processos formais e informais nesse comér-cio estabelecido. O vizinho de banca de D. Santina, porexemplo, afirmou que todas as suas mercadorias sãocompradas com nota fiscal e que ele próprio participada luta dos feirantes de Caruaru para que se disciplineo comércio local.

No outro lado da rede, ou seja, em São Paulo, Rigamonte(1997) aponta para alguns processos que se estabelecem ealimentam os fluxos migratórios. A “Feira do Norte”, mon-tada nas imediações da Praça Agente Cícero, diante da Es-tação Ferroviária Roosevelt, funciona nos moldes de umafeira livre, destacando-se pela variedade de produtos pro-venientes do Nordeste e comercializados por conterrâneosnordestinos. Aos artigos regionais mistura-se uma infini-dade de produtos eletrônicos provenientes do Paraguai,acompanhados por roupas e cosméticos, à semelhança daFeira do Paraguai de Caruaru.

Além dessa feira, outras organizações são estabelecidaspor migrantes, promovendo um contato regular interpessoale facilitando grandemente o processo de adaptação e mú-tua assistência. A Praça Sílvio Romero, por exemplo, há maisde 30 anos reúne, aos domingos, imigrantes nordestinosque esperam caminhões para trocar mercadorias – presen-tes, alimentos, dinheiro, cartas, recados – com seu local deorigem. Esses migrantes vão até lá, muitas vezes, para con-versar com o caminhoneiro recém-chegado, a fim de obterinformações recentes sobre a sua região, tais como quemcasou, quem morreu, quem migrou, quem retornou, e as-sim por diante. Essa convivência dominical estreita laçosde amizade, motivados pela conterraneidade, e alimentaredes de informações sobre oportunidades de trabalho, noslocais de origem e destino, bem como sobre moradia, lazer,etc. (RIGAMONTE, 1997).

A relação é de confiabilidade e cumplicidade entre osorganizadores e os receptores dessa “rede informal de co-municação”. Em meio à metrópole e a relações tão distan-ciadas, há um espaço preservado que reproduz as rela-ções vividas na região de origem, garantindo a suacontinuidade. Além da perpetuação dos laços de origem,é possível observar ainda, nesses locais como se deu a

formação de um “pedaço” nordestino dentro de pedaçosde São Paulo.

O desenvolvimento dos meios de comunicação contri-bui bastante, facilitando não só a interação das redes demigrantes, como também a decisão de migrar. Nesse senti-do, o depoimento de um migrante pernambucano (Edivânio,66 anos),15 aposentado, atesta a diferença que separa o pro-cesso por ele vivido, certamente nas décadas de 50-60, e oprocesso atual:

Hoje, as informações são de conhecimento de todos, no meutempo a gente não tinha nem TV, não sabia o que ia encontrarpela frente. Alguns nem sabiam o caminho de volta para casa,se desse errado estava tudo perdido. Hoje não, há assistênciapara todo lado, assim facilita a vida do povo.

O desenvolvimento dos meios de comunicação – viáriose informacionais – propicia, por sua vez, a alimentação dasredes de relações que conferem maior dinamismo ao fluxoque se estabelece entre os dois Estados – Pernambuco eSão Paulo. A migração como processo social envolve, tam-bém, um complexo conjunto de mudanças individuais,domésticas e comunitárias.

A PERSPECTIVA DAS REDES SOCIAIS NOENTENDIMENTO DA MIGRAÇÃO DE RETORNO

Destacando a relevância das redes sociais no contextodas migrações, Sales (1999) considera que:

As unidades efetivas de migração não são indivíduos nemfamílias, mas sim grupos de pessoas ligadas por conhecimento,amizade e experiência de trabalho, as quais, de alguma forma,incorporam a migração como uma alternativa possível a ummomento crítico das suas vidas, definidas por TILLY (1990,apud Sales, 1999:36). Daí o porquê de as migrações não sedarem de forma aleatória, mas se dirigirem para aquelaspoucas localidades com as quais seu lugar de origem temfortes laços que constituem as tais redes sociais. Uma dasformas de expressão dessas redes traduz-se na ajuda mútua,como a moradia temporária aos que chegam e ajuda emconseguir o primeiro emprego. As remessas dos imigrantesaos seus parentes nos locais de origem em muito contribuempara solidificar ainda as redes, à medida que essas remessassão fatores decisivos para a vinda de novos migrantes deuma mesma procedência.

Cunha (1994) compartilha com o mesmo ponto de vistade Sales (1999), quando afirma, a respeito dos deslocamen-tos populacionais internos na Região Metropolitana de SãoPaulo, que

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as direções dos mesmos não são aleatórias, já que nãodependem apenas do que ocorre nas principais áreas deevasão populacional, mas, também, das condições oferecidasnos municípios de destino.

Dentro de um quadro de referência que leva em contaas redes sociais no processo migratório, Massey et al.(1987, p. 4) consideram que tais mudanças

ocorrem de modo preditivo (antecipado), ordenado e sãosensivelmente semelhantes em diferentes comunidades. Agem,ainda, em uníssono, causando um aumento na migraçãoatravés do tempo. Ao longo do tempo crescem os laços entreáreas emissoras e receptoras criando uma rede social queprogressivamente reduz o custo do movimento. As pessoasde uma mesma comunidade se entrelaçam em uma rede deobrigações recíprocas sobre as quais os novos migrantes seapóiam e encontram trabalho na sociedade receptora. A faixade contatos sociais nesta rede se expande com a entrada decada novo migrante, encorajando, assim, mais migração e,em última análise, levando, assim, a emergir a migraçãocomo um fenômeno de massa.16

Em uma pesquisa realizada junto a emigrantes do Agres-te Pernambucano (RD Agreste Central) do município deGravatá para Pirituba, em São Paulo, Cavalcanti (1999, p.81) destaca a questão do imaginário social como um ele-mento importante nesse processo, considerando que

a decisão de sair [...] depende seguramente dos laços dosparentes no ‘sul’. Esses passam sua experiência para os quechegam e fazem, de certa maneira, uma triagem, selecionandoos que devem ser acolhidos e estimulados a ficar e os quedevem voltar. Todos aprendem rápido que, para sobreviveremnesse novo espaço urbano, é necessário que o indivíduoadquira novos sistemas de sinais e novos referenciais, osquais precisam ser interiorizados a fim de que possam situar-se. O futuro, obviamente, pode ser ampliado ao preço daincerteza e insegurança e da superação de um certo limite,que é dado a cada um pelo sistema de uma cidade organizada,impessoal e exigente de qualidades.

As redes sociais fornecem o apoio psicológico e mate-rial necessário aos migrantes. Representam uma forma decapital significativo. Encaminham ao emprego, interme-deiam as comunicações, fazem um tipo de ponte entre aspessoas envolvidas. Geralmente, cada migrante novo, oprimeiro a chegar em um lugar, faz crescer uma rede em tornode si, incluindo outras pessoas, migrantes ou não. Essasredes proliferam-se e sustentam-se. Funcionam quase comouma força estrutural. Esse apoio incondicional ficou evi-

denciado na pesquisa realizada por Baptista (1998, p. 286),analisando as redes sociais de solidariedade, como táticade resistência e sobrevivência, na vida cotidiana domigrante nordestino residente em São Paulo, que enfrentaa pobreza e a miséria. Entre os depoimentos colhidos pelaautora, o de uma migrante nordestina explicita isso:

A ajuda que temos junto aos nossos que moram aqui é grande.Se não fosse isso eu não teria como estar aqui.

Enfocando as relações estabelecidas nas redes sociais,entendendo estas como facilitadoras da migração, Domenache Picouet (1990) têm em mente que as relações de paren-tesco, amizade e conterraneidade encontram-se na basedessas redes. Massey et al. (1987) compartilham dessaopinião, defendendo, ainda, que essas mesmas relações sãoreforçadas por uma interação regular em associações volun-tárias, constituindo-se como uma das bases sociais nasquais as redes sociais se assentam.

Tais bases consistem em laços sociais que ligam a co-munidade emissora a pontos específicos das sociedadesreceptoras. Estes laços sociais, por sua vez, não são cria-dos pelo processo migratório, mas são a eles adaptados eno decorrer do tempo reforçados pela própria experiênciacomum da migração. As mais importantes relações nas re-des sociais são baseadas em parentesco, amizade, con-terraneidade, as quais são reforçadas por uma interaçãoregular em associações voluntárias. As diferentes organi-zações voluntárias servem às funções de coesão dosmigrantes e de integração de outras comunidades. Sejamquais forem os seus propósitos, essas associações volun-tárias aumentam sua importância para as redes de migra-ção, além das ligações interpessoais acima mencionadas.

As “organizações voluntárias” contribuem para a fixa-ção dos migrantes no local de destino, confirmando um dosprincípios das redes sociais, definido, também, por Masseyet al. (1987), segundo o qual, independentemente da apa-rência temporária do fluxo migratório, é inevitável a fixa-ção de alguns migrantes no seio da sociedade receptora.Os migrantes podem começar como trabalhadores sazonais,mas, com o correr do tempo, adquirem laços sociais e eco-nômicos que os lançam na condição de residência perma-nente. Estes migrantes formam comunidades afiliadas,coesas dentro da sociedade receptora, as quais fortalecemgrandemente as redes na medida em que proporcionam umsólido ancoradouro para relações sociais fora do local deorigem, criando um contexto seguro aos quais os migrantespodem chegar e ajustar-se. Isso leva Albuquerque Jr. (1990,p. 32) a afirmar que tal resistência cultural leva, em com-

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pensação, o migrante a colocar a sua marca no processoonde se insere,

estabelecendo limites, abrindo brechas nas quais puderampreservar aspectos de seu modo de vida tradicional: suasfestas, seus divertimentos, seus amores, afetos, ódios evalores.

Algumas pesquisas fornecem exemplos ricos do funcio-namento das redes sociais para populações que migram.Demonstram que as redes na migração têm um papel tantoviabilizador da saída como territorializador, ou seja, de in-serção do migrante no local de destino. Bilac (1997, p. 70)afirma:

Correntes migratórias são estimuladas pelas redes sociaisbaseadas em laços familiares domésticos de amizade ecomunitários. Ligando migrantes e não-migrantes em umacomplexa teia de relações sociais e interpessoais, tais redesconduzem informação, assistência social e financeira. Elastambém modelam os efeitos da migração – desde a não-migração, a imigração, a migração de retorno e a continuidadedos fluxos migratórios.

Segundo Massey et al. (1987), a rede impulsiona e fazcom que a pessoa migre. Estar dentro da rede significa maiorprobabilidade de migrar. Se as redes não existissem, asbarreiras tornar-se-iam mais fortes e as migrações não se-riam tão intensas.

Para a maioria dos migrantes de longa distância, é im-portante a informação para as decisões de migrar, bem comoaquelas redes de assistência para a fixação no destino.Diante dos constrangimentos causados pelas redes pes-soais, considerando falhas muitas das vantagens teorica-mente disponíveis nos locais de destino, os migrantesconcentram-se em algumas localidades nas quais têm for-tes ligações com o lugar de origem. O alto risco e o grandecusto do retorno tornam mais intensas a confiança nos laçosestabelecidos previamente.

Povoa-Neto (1997, apud Batista, 1998), abordando oslimites dos troncos teóricos através dos quais a questãodas migrações vem sendo analisada e a necessidade decompreensão de fenômenos e processos pouco estudados,finaliza dando relevância às redes:

Tudo parece indicar que, na conjuntura da crise, as redes derelações sociais primárias tendem a representar um apoioainda mais fundamental àqueles que buscam se estabelecerem um dado lugar ou se encontram simplesmente de pas-sagem. [...] A presença dessas redes de contato, cristalizadasao longo de décadas de migrações, contribui para explicar a

intensidade dos deslocamentos populacionais mesmo em umasituação social em que os diferenciais de renda e de condiçõesde vida se tornam pouco perceptíveis. Tais redes se tornamforças sociais vivas, a estabelecer “pontes” entre os lugarese a permitir o fluxo de informações e de pessoas que fizeramda mobilidade geográfica a sua principal estratégia desobrevivência.

Baptista (1998), por sua vez, chama atenção para o des-taque que Povoa-Neto dá para tais diferenças, as quais,segundo a teoria das migrações mais tradicional, seriam osprincipais motivadores da decisão de migrar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retomando algumas apreciações feitas ao longo dotexto, pode-se dizer que, no contexto das três décadasanalisadas (1970-2000), sabe-se que na crise de 1980, fatoresestruturais – por exemplo, as limitações do mercado detrabalho, acarretando desemprego e subemprego; adiminuição do poder aquisitivo da população; entre outrosfatores aliados à precária qualificação do contingente mi-gratório – passaram a interferir na dinâmica demográficaregional nordestina, à medida que espaços que his-toricamente se caracterizavam pelo seu poder atrativo demigrantes, a exemplo do Estado de São Paulo, não forammais capazes de reter o migrante no lugar de destino.

Nesse cenário de retorno ou de redução dos fluxos mi-gratórios pernambucanos, a MR do Agreste Pernam-bucano foi a região de troca migratória mais expres-siva com o Estado de São Paulo. Ao mesmo tempo em queela se converteu na região que mais expulsou sua popu-lação para a terra paulista, ela foi também a que mais re-cebeu os retornados, chegando a superar a MR/RDMetropolitana do Recife, onde era de se esperar umamaior absorção, considerando seu grau de dinamismosocioeconômico.

A mudança da tendência apresentada pela RD AgresteCentral, que passou, da década de 70 para a de 80, de áreaexpulsora para área de absorção do contingente migrató-rio de retorno, pode ser explicada por alguns fatoresdinamizadores que ocorreram na região: novas oportuni-dades de trabalho, especialmente na década de 80, aumen-to da produção artesanal com a respectiva dinamização docomércio e dos serviços, associados a eventos turísticosque envolvem vários municípios da região. Esses elemen-tos de incentivos ou constrangimentos, seja na área deorigem seja na área de destino, certamente influíram noprocesso de remigração da população.

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O que tudo indica é que a diversificação das atividadeseconômicas, que vêm se expandindo, a partir dos anos 70,atraiu os retornados que empreenderam esse movimentode “ir e vir”, alimentado por redes sociais que ligaram nú-cleos dinâmicos dessa região do Agreste pernambucanocom a Região Metropolitana de São Paulo. A consolida-ção dessas atividades na RD Agreste Central, na décadade 80, em contrapartida, influenciou provavelmente o com-portamento do fluxo migratório que afluiu para a região,ampliando o número daqueles que retornaram para fixarresidência.

Apesar de os indícios do movimento de “ir e vir” teremsido expressivos no fluxo migratório analisado, o que sepode concluir é que, para muitos, o retorno não implicounecessariamente a perspectiva de tornar a emigrar para SãoPaulo, caracterizando a reversibilidade do movimento deretorno, inclusive para a RD Agreste Central, para ondeafluiu o maior volume de retornados.

As alternativas de ocupação que vêm emergindo, es-pecialmente nos municípios do Agreste Pernambucano, eque se articulam no entorno do núcleo dinâmico da RDAgreste Central, oferecem um quadro de possibilidades parainvestigar tal hipótese: Santa Cruz do Capibaribe, comogrande produtor de vestuário (sulanca); Cachoeirinha,como produtor de artefatos de couro – sapatos, botas,bolsas, selas, tapetes, etc.; Caruaru, como grande centrode comercialização desses produtos e pólo da redeestabelecida entre o Agreste de Pernambuco e São Paulo,estendendo-se a Foz do Iguaçu. Possivelmente, tal redeseria capaz de responder a Moura (1999, p. 144) quando, arespeito dos migrantes nordestinos de retorno à sua terranatal, ele indaga: “Mas a que novas válvulas de escapepoderia a população do Nordeste recorrer para sobrevi-ver?”.

NOTAS

Este trabalho faz parte da tese de doutorado da autora (LYRA,2003), sob a orientação do Prof. Dr. José Marcos Pinto da Cunha.Comunicação apresentada no Seminário “Quantos Somos e QuemSomos no Nordeste?”, realizado pela Fundação Gilberto Freyre, noperíodo de 26 a 28 de abril de 2004. Recife, PE.

1. Trecho de reportagem de Eduardo Machado apresentada no Jornaldo Comércio (2000, p. 1-4).

2. A rota percorrida por esses ônibus pelo interior do Brasil incluitrechos onde a estrada “simplesmente sumiu”, como a de OuroBranco, em Alagoas até Jeremoaba, na Bahia. Esses ônibus sãoadaptados para comportar a maior quantidade possível de carga,

retirando, para isso, as três últimas fileiras de bancos traseiros e opróprio banheiro.

3. “Laranjas de mão dupla” são pessoas contratadas pelossulanqueiros-muambeiros para carregar mercadorias na travessia daPonte da Amizade, que liga Foz do Iguaçu a Ciudad del Este, visan-do “driblar” a fiscalização.

4. Roupas produzidas, em geral de forma artesanal e utilizando re-talhos variados, no município de Santa Cruz do Capibaribe, situadono Agreste de Pernambuco, limítrofe com o município de Caruaru.

5. Produtos importados, adquiridos, no caso específico, em Ciudaddel Este, no Paraguai, e, na sua maioria, sem regularidade fiscal.

6. A “reversibilidade” dos fluxos pode ser definida como o lugar ouconjunto de lugares a partir do qual os deslocamentos têm a proba-bilidade de retorno mais elevada, uma vez que reforça a condiçãoda primeira residência, do local de nascimento (DOMENACH;PICOUET, 1990, p. 53).

7. “Circularidade” remete ao processo migratório de “ir e vir” epode referir-se tanto aos indivíduos quanto aos fluxos (CUNHA,1998, p. 38).

8. Segundo Lyra (2003), os emigrantes pernambucanos totalizaram289.382 (1970-80) e 242.295 (1981-91).

9. A Feira de Caruaru reúne, em 40.000 m2 de área destinada ex-clusivamente aos comerciantes, fabricantes e feirantes, a FeiraLivre, a Feira da Sulanca, a Feira dos Importados (Feira do Paraguai),a Feira do Artesanato e a Feira do Gado. Dentro desse espaço, exis-te, ainda, um açougue com 306 boxes internos e 43 boxes exter-nos, além de um Mercado de Farinha com 27 boxes internos e 80boxes externos.A Feira da Sulanca, com uma quantidade superior a 10.000 bancascadastradas, mais uma média de 20% de sulanqueiros sem lugar cer-to e preços altamente competitivos, onde se compram roupas apartir de R$ 1,00, é a mais famosa e mais conhecida feira do Esta-do. Cada dia, mais e mais pessoas a visitam, vindas de cidades vizi-nhas ou do exterior, em busca do grosso ou varejo. São em média400 ônibus e 40.000 pessoas por feira. Conforme pesquisa realiza-da por técnicos de uma consultoria, apuraram-se os seguintes re-sultados:– Consumidores: 10% são de Caruaru, 40% de outras cidades dointerior, 14% de outros Estados, como Alagoas e Paraíba, 6% vêmde outros países (Paraguai, por exemplo) e o restante (30%) vemde outros Estados;

– Comerciantes/compradores/produtos: 98% dos compradores vêmtodas as semanas à feira; 83% vêm por causa dos baixos preços dosprodutos; 68% dos comerciantes residem em Caruaru; 37% dasmercadorias são fabricadas na cidade; 64% das mercadorias vendi-das são confecções;

– Vendas: 87,5% das vendas são feitas em dinheiro; 8,25% sãoefetuadas em cheques pré-datados; 4,25% são com cheques à vista.Calcula-se ainda que em cada feira comercializa-se em média R$ 1milhão; adicionalmente, foram identificados 1.294 carroceiros paraposterior cadastro (Fonte: <www.feiradecaruaru.com.br>).

10 . Conforme informação do Sebrae, Santa Cruz do Capibaribe pos-sui mais de 3.000 unidades produtivas.

11 . O município de São Caetano se situa entre Caruaru e Cachoei-rinha. Como verificou Lyra (2003), São Caetano e Santa Cruz doCapibaribe, onde se localiza a grande produção de “sulanca”, am-bos vizinhos a Caruaru, apresentam os mais altos índices de eficá-cia migratória entre os municípios do Estado de Pernambuco, oque é indicador de uma absorção de população significativa.

12 . Conforme entrevista dos repórteres do Jornal do Comérciocom os comerciantes da sulanca, em Caruaru.

13 . Afirma Feliciana Espinoza, dona de uma loja na Galeria Vênusem Ciudad del Este.

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14 . Pseudônimo dado pelos repórteres do Jornal do Comércio auma barraqueira da Feira do Paraguai, em Caruaru.

15 . Entrevista realizada por Rigamonte (1997, p. 51).

16 . Tradução da autora.

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MARIA REJANE SOUZA DE BRITTO LYRA: Socióloga, estatística e demógrafa.

Artigo recebido em 26 de setembro de 2005.Aprovado em 21 de novembro de 2005.