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Adeus, millennials!Ola. geração 7J
São chamados individualistas, gostam deastrologia e substituíram a televisão pelaNetflix. .\f?o têm qualquer tabu em assumirdistúrbios menlais e procuram cada vezmais soluções alternativas para os seusproblemas. Já percebeu sobre quem estamosa Jalar? Dos novos jovens - a geração Z.
por Vanessa Pina Santos
ascidos entre 1 995 e20 1 0, fazem parte da
geração mais qualifica-da e tolerante de sem-
pre. Certamente quemuitos deles não se
vão lembrar do Myspace ou dos discmans
que tantos millennials tiveram. Os jovens da
geração Z são os primeiros a crescer naera dos smartphones. Ativistas, inovadores
e sem linhas tradicionais a seguir, vão terde lidar com as questões do terrorismo e
sobretudo com os problemas relaciona-dos com o aquecimento global. Afinal, o
que podemos esperar destes jovens, que,de acordo com um estudo da agência de
previsão e análise de tendências WGSN,são já cerca de dois mil milhões?
Para a geração/,. a vida antesda Interneté um localdesconhecidop psitranho
Crescidos e criadospelo digitalPara a geração Z, a vida antes da Inter-net é um local desconhecido e estranho.Em comparação com os mtllennials, esta
geração está ainda mais conectada à tec-
nologia. "O que diferencia a nova geraçãoda anterior é uma aceleração do processotecnológico", diz-nos Bernardo Coelho, so-
ciólogo e investigador no Centro Interdis-
ciplinar de Estudos de Género de Lisboado Instituto Superior de Ciências Sociais
e Políticas da Universidade de Lisboa.Nascidos num período em que as novas
tecnologias estão completamente genera-lizadas, esta é a geração do imediato, quenão tem tempo para esperar e que vive
completamente no digital - desde a forma
como se alimentam até à forma de como se
divertem. Nunca uma geração teve acesso à
quantidade de informação que esta tem. No
entanto, quanto mais informação há, maior
é o risco de desinformação. "As questões
áefake news colocam emevidência a importânciada literacia tecnológica",diz-nos Maria ManuelVieira, coordenadora doObservatório Permanente
da Juventude, do Institutode Ciências Sociais da Uni-versidade de Lisboa.
Mais qualificados, maisimpacientesSegundo um estudo realizado pela espe-cialista em recrutamento Hays, Talento Z:
Os Nativos Digitais no Mercado Laborai,esta nova geração é a mais qualificada de
sempre, com especial interesse pela áreada gestão. "Os millennials, em Portugal,não estiveram sujeitos a uma escolaridade
obrigatória que vai até aos 1 8 anos. Aocontrário desta nova geração que "apre-senta níveis de qualificação potencialmen-te maiores em comparação com os mais
velhos", explica Maria Manuel Vieira à
Saber Viver. No entanto, "esta é uma ge-
ração que se confronta com os problemasde integração no mercado de trabalho.Não quer dizer que seja uma geração com
desemprego à entrada, mas a questão é
que os empregos que encontram têm con-
dições muito precárias", explica Bernar-do Coelho. Por precariedade entende-sefalsos recibos verdes e, principalmente,salários baixos. Nunca uma geração ga-nhou tão mal em Portugal. O rendimen-to salarial dos jovens no nosso País está
muito abaixo da média da Europa. Esteé um problema de geração e também de
género, porque, embora as raparigas se-
jam mais qualificadas do que os rapazes,"enfrentam mais frequentemente essescenários de precariedade no mercado de
trabalho", diz-nos o sociólogo.No entanto, esta também é uma geração
que encontra facilmente outras soluçõesde trabalho. Por um lado, porque devidoàs suas altas qualificações não tem difi-culdades em emigrar. Por outro, porqueprocura formas de autoemprego mais li-
gadas às novas tecnologias. "A geração Zquando não está satisfeita com o empre-gador não tem qualquer problema em sair
e procurar outra alternati-va que vá ao encontro das
suas expectativas", afirma
Solange Soares, team lea-der da Hays. Aliando isto
às condições precáriasdo mercado de trabalho,esta é uma geração quetendencialmente, ao longo
do seu percurso profissional, passa pordiversas empresas. Contudo, não é esteo seu desejo. O estudo já citado da Hays,concluiu que "a geração Z é, de todas as
analisadas, a que quer trabalhar em me-nos empresas diferentes".
"A geração Zquando nãoestá satisfeitacom o
empregadornão leni
qualquerproblemaem sair e
procuraralternativa"
Solange Soarestearn ieade r
da especsfeísem recrutamento
Hays
Estar oito horas no escritório?Não, obrigadoEsta será a geração que provavelmenteterá de trabalhar pelo menos até aos 70anos. No entanto, a forma como olha parao trabalho está a mudar, uma tendência
que já começou com os millenniak. Fa-lamos de flexibilidade de horários e dapossibilidade de trabalhar a partir de casa.Cada vez mais, os jovens procuram o equi-líbrio entre a vida profissional e pessoal.O trabalho deixou de ser um'lugar' para passar a ser 'algo'com a mesma importância de
outra coisa qualquer. Com a
geração Z, o equilíbrio entre avida profissional e pessoal (que
pede flexibilidade de horários)tornou-se muito mais impor-tante do que propriamente as
recompensas salariais mais va-lorizadas pelos millennials, porexemplo. No estudo Talento
Z, 72 por cento dos jovens da
geração Z diz valorizar o bomambiente no trabalho. Alémdisso, esta geração atribui umamaior importância a outrotipo de recompensas, como,por exemplo, seguro de saúde,
formações, Internet para uso
próprio e dias de férias extra.
Um novo desafio paraas empresas"Em Portugal, temos empre-sas muito antigas no mercado
que, por vezes, têm as quatrogerações a trabalhar e, neste
sentido, poderão existir algunsdesafios", diz-nos Solange Soa-
res. Este desafio não é novo.Um estudo, realizado pela con-sultora PWC, sobre os millen-
nials mostra que mais de meta-de dos jovens sente que os seus gestoresnem sempre compreendem a forma comoé usada a tecnologia no trabalho. Trinta e
oito por cento afirma que os se-niores não se relacionam coma geração mais jovem.
Como a geração Z não tem
qualquer problema em se des-
pedir e procurar outras alter-
nativas, é necessário que as
empresas criem mecanismos
para incentivar estes jovens.Quando questionados sobre o
tempo que consideram razoá-vel para subirem de posição, os
jovens da geração Z responde-ram entre um e dois anos, "en-
quanto que os baby boomers
e a geração X estão dispostosa aguardar entre dois e cinco
anos por uma promoção", lê-se
no estudo já mencionado da
Hays. Ainda no mesmo estudo refere-se
que "para a geração Z, apenas as empresasmultinacionais se mostram apelativas."O que se revela num problema para Por-
tugal, maioritariamente constituído porPME (Pequenas e Médias Empresas).Neste sentido, a forma como as empre-sas avaliam o percurso profissional dos
seus candidatos também vai ter de mudar.
"Hoje em dia, as mudanças constantes de
empresa não devem ser mal interpretadascomo eram há uns tempos", explica So-lange Soares.
Os caminhos não são linearesA precariedade do trabalho leva a que as
perspetivas de futuro destes jovens se-
jam construídas com base na incerteza.Por isso, é que tendem a ter mais do queuma alternativa e também a seguir ca-minhos que são o oposto do tradicional.
"Se, há umas gerações, nós tínhamos os
percursos de vida muito lineares, ou seja,estudávamos, começávamos a trabalhar,eventualmente casávamo-nos e tínhamosfilhos e íamos progredindo nas nossas pro-fissões, o mesmo já não acontece com a
geração Z, porque a entrada no mercadode trabalho também não é tão linear", ex-
plica Bernardo Coelho. Por outro lado,também existem outras opções
que não existiam há uns anos,o que faz com que esta geraçãoexperimente várias coisas, atéfinalmente decidir o que quer.Além disso, a instabilidade em
que vivem também faz com que seja di-fícil sair da casa dos pais mais cedo ou
começar uma vida a dois. Apesar disso, "a
família e o trabalho continuam a constituirvalores importantes para os jovens", refereMaria Manuel Vieira. No entanto, está averificar-se uma alteração na forma como
se pensa no conceito de família. "Hojeem dia, há uma pluralidade de possibi-lidades de famílias que é bastante mais
alargada do que foi no passado", explicaa socióloga.
A incerteza criada pelos tempos de críseleva à necessidade de afirmarem a sua
individualidade
Versáteis e empreendedoresEsta geração foi ensinada a adaptar-se,porque "sofreu na família ou com estaos efeitos da crise económica que afetoumuitos pais e provocou muito desempre-
go. Há uma série de vivências que terãomarcado a sua existência", afirma a coor-denadora do Observatório Permanenteda Juventude, explicando que a crise teve
impactos diferentes entre a geração Z e
os millenniak. Estes últimos tiveram umembate mais direto, visto que, na altura,estavam a tentar entrar no mercado detrabalho. "Os millennials passaram pormomentos de crise, não estão tão aber-tos ao risco. Já a geração Z é muito mais
propícia a criar o seu próprio negócio,
porque nasceu no tempo dos unicórnios
(startups tecnológicas que são avaliadas
em mais de mil milhões de dólares)", afir-
ma Solange Soares.
O ambiente faz parte da lista de reivindicações dos maisjovens.
"O surgimentoe o crescimentode algunsmovimentos e de
partidos políticosque se aproximamdas questõesambientais (ainda
que não sejammuito claros)estão relacionadoscom uma maiorconsciênciaambiental dos
jovens", explica o
sociólogo BernardoCoelho. No entanto.
o facto de estanova geração termais informaçãoe ser maissensível a estestentas não querdizer que possanecessariamente"desenvolver
práticas consoantescom essainformação",diz-nos a
socióloga MariaManuel Vieira."Um estudorealizado pelo
Instituto de CiênciasSociais, relativoà consciênciaambiental e aosefeitos nocivos do
comportamentoconsumista. como,por exemplo,mudar de telemóveltodos os anos,mostrou quemuitos jovens nãotinham consciênciados impactosambientais das
novas tecnologias",afirma a socióloga.
Eu ou nós?Esta incerteza criada pelos tempos decrise leva à necessidade de procuraremo seu lugar e de afirmarem a sua indivi-dualidade. "Ao contrário dos millennials,estes jovens são muito mais competitivose gostam de trabalhar a nível individual.No fundo, são mais individualistas", realça
Solange Soares. "Os jovens da geraçãoZ tendem a procurar marcas que, assim
como eles, valorizam a capacidade de
autoexpressão e de autonomia. Não têminteresse nas que tentam agradar a todos
e preferem aquelas que dão mais valor ao
indivíduo", lè-se no estudo A Equação da
Geração Z, realizado pela WGSN.A maneira como os jovens se relacionam
uns com os outros também é um reflexoda própria valorização do indivíduo. Noentanto, este é um processo de individua-
lização que precisa sempre do outro paraobter reconhecimento. "Quando um jovemtem muitos amigos no Facebook, isso mos-tra que é reconhecido e, portanto, precisados outros para reforçar a sua singularida-
de, tal como ter muitos likesno Instagram", explica MariaManuel Vieira.
O facto de terem nascido naera das redes sociais faz com
que não se sintam confortá-veis em receber/eedbacfe negativo. "Quan-do colocamos a nossa informação nas re-des sociais, estamos sempre à espera decríticas positivas e, portanto, não lidamostão bem com as críticas negativas. Nestesentido, a forma como os empregadores
passam ofeedback de desempenho devetambém ser alterada", sublinha SolangeSoares.
A política das pequenascausasOutro dos reflexos do individualismo des-
ta geração é a forma como olham para a
política e como poderão vir a fazer políticano futuro. Hoje em dia, existem novas for-
mas de ativismo político "menos institu-cionalizado, já não tanto em torno de par-tidos (...), mas em torno de causas", explicaMaria Manuel Viera. Esta nova forma de
agir na política "prende-se muito com oativismo que está relacionado com a 'mi-
nha construção identitária' e menos com o
desejo de levar o mundo todo", adianta a
socióloga. "As redes sociais permitem essa
flexibilidade de construção e de diálogoentre ativistas de uma forma mais flexíveldo que as grandes instituições, como os
partidos políticos", diz-nos Maria ManuelVieira. Bernardo Coelho é da mesma opi-nião, exemplificando que "nos últimos
tempos tem surgido uma multiplicação de
associações, o que é também uma formade participação política. Temas como a
igualdade de género e o feminismo têmsido cada vez mais debatidos e têm vindo
a crescer grupos e movimentos mais ou
menos formalizadas nessa área".
Esta "multiplicação das formas de participa-ção cívica e política também está relaciona-da com a multiplicação de horizontes que as
pessoas têm", refere Bernardo Coelho. Ou
seja, com os seus percursos pouco lineares.
Saúde psicológica frágilAs estatísticas indicam uma tendência
para o aumento da depressão à medida
que as gerações avançam. "Esta realidade
merece uma preocupação muito especialse considerarmos que a geração Z cons-titui cerca de 30 por cento da populaçãoportuguesa atual", diz-nos a psicóloga RitaFonseca de Castro, que define a saúdemental destes jovens como sendo frágil.O estilo de vida desta nova geração tem
consequências na sua saúde mental. As
principais queixas estão relacionadas com
stresse, ansiedade, mas também com afalta de energia e a tristeza. Outros dosfatores a ter em consideração são as difi-culdades de socialização e os sentimentosde insegurança e de indefinição (acercado próprio, do mundo que o rodeia edo futuro), muito próprios do contextoem que esta geração nasceu e cresceu.
Mundo virtual ou real?A sobrevalorização das redes sociaisaliada ao seu uso abusivo contribuem
para "um maior isolamento e escassezde ligações reais", explica Rita Fonsecade Castro. A necessidade de aceitação e a
procura constante por algo novo ou maisinteressante também são alguns dos pro-blemas causados pelo uso abusivo destes
meios sociais. "A contabilização e controlodo número de amigos, seguidores, de likes
em fotografias e publicações podem assu-mir uma forma quase obsessiva e gerado-ra de ansiedade", esclarece a especialista.
Outra caraterística desta geração é o'FOMO' (FearofMissing Out), que é um es-
tado de espírito de ansiedade e de insatis-
fação constantes. "Nunca se está satisfeito
com o que se tem ou se está a fazer, porquepode sempre surgir algo melhor a apenasum clique de distância - um evento ou um
programa que parece melhor do que aquele
que acabou de se combinar, uma pessoaque nos parece muito mais interessante do
que as que já conhecemos e a quem pode-mos 'pedir amizade' ou tentar um 'match'",
assegura Rita Fonseca de Castro.
Sem tabusApesar de serem considerados impacientes(o que dificulta a gestão de frustrações), os
jovens desta geração lidam com os proble-mas mentais de uma forma bastante mais
aberta e descomplicada, quando compa-rados com as gerações anteriores. "Recor-
rem com mais facilidade e de forma mais
precoce a formas possíveis de resolução,encarando sem tabus a necessidade de re-
curso a psicoterapia ou o apoio psicológico- quando se tem queixas físicas, vai-se ao
médico, quando o sofrimento é de natureza
psicológica, procura-se um psicólogo ou um
psiquiatra", explica Rita Fonseca de Castro.
Nestas situações, as redes sociais assumem
um papel positivo porque normalizam a ne-cessidade de pedir ajuda. É comum, nos dias
de hoje, vermos pelo Instagram páginas de
empoderamento relacionadas com proble-mas psicológicos. Estas iniciativas ajudam a
desmistificar crenças que antes eram muito
comuns, como, por exemplo: 'sou só eu quetenho isto', 'ninguém passa pelo mesmo' ou
até 'os psicólogos são para malucos', precon-ceitos que, de acordo com a especialista, são
quase inexistentes na geração Z.