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/ 0 r , 2o,t{v: Parte V FASE DEANAuSE DO MATERIAL QUALITATNO OS PESQUISADORES COSTUMAM ENCONTRAR TRES grandes obstaculos quando iniciam a analise dos dados reco- lhidos no campo (documentos, entrevistas, biografias, resul- tados de discussao em grupos focais e resultados de obser- va<;:ao ). o primeiro deles e 0 que Bourdieu denomina "ilusao da transparencia" is to e, a tentativa de interpreta<;:ao espontanea e literal dos dados como se 0 real se mostrasse nitidamente ao observador. Essa "ilusao" e tanto mais perigosa quanta mais 0 pesquisador tenha a impressao de familiaridade com 0 objeto. Portanto, analisar, compreender e interpretar urn mate- rial qualitativo e, em primeiro lugar, proceder a uma supera- <;:ao da sociologia ingenua e do empirismo, visando a penetrar nos significados que os atores sociais compartilham na viven- cia de sua realidade. o segundo obstaculo e 0 que leva 0 pesquisador a su- cumbir a magia dos metodos e das tecnicas, esquecendo-se do mais importante, isto e, a fidedignidade a compreensao do material e referida as rela<;:6es sociais dina micas e vivas. Como orientadora de tese e avalia<;:ao de livros e artigos e 0 que mais tenho encontrado : uma rendi<;:ao do investigador as tecnicas, 299 .. i

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Parte V FASE DEANAuSE

DO MATERIAL QUALITATNO

OS PESQUISADORES COSTUMAM ENCONTRAR TRES

grandes obstaculos quando iniciam a analise dos dados reco­lhidos no campo (documentos, entrevistas, biografias, resul­tados de discussao em grupos focais e resultados de obser­va<;:ao ).

o primeiro deles e 0 que Bourdieu denomina "ilusao da transparencia" is to e, a tentativa de interpreta<;:ao espontanea e literal dos dados como se 0 real se mostrasse nitidamente ao observador. Essa "ilusao" e tanto mais perigosa quanta mais 0 pesquisador tenha a impressao de familiaridade com 0

objeto. Portanto, analisar, compreender e interpretar urn mate­rial qualitativo e, em primeiro lugar, proceder a uma supera­<;:ao da sociologia ingenua e do empirismo, visando a penetrar nos significados que os atores sociais compartilham na viven­cia de sua realidade.

o segundo obstaculo e 0 que leva 0 pesquisador a su­cumbir a magia dos metodos e das tecnicas, esquecendo-se do mais importante, isto e, a fidedignidade a compreensao do material e referida as rela<;:6es sociais dina micas e vivas . Como orientadora de tese e avalia<;:ao de livros e artigos e 0 que mais tenho encontrado : uma rendi<;:ao do investigador as tecnicas,

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300 301 fase de analise do material qualitativo

pondo-as no lugar da essencialidade dos significados e inten­cionalidades. Como ja referi inicialmente, repito aqui: meto­dos e instrumentos sao caminhos e mediadores para permitir ao pesquisador 0 aprofundamento de sua pergunta cennal e de suas perguntas sucessivas, levantadas a partir do enconno com seu objeto empfrico ou documental.

o terceiro obstaculo, tambem recorrente na interpreta<;:ao dos trabalhos empfricos, e a dificuldade que muitos pesqui­sadores encontram na jun<;:ao e sfntese das teorias e dos acha­dos em campo ou documentais. Emuito comum que os pes­quisadores apresentem denso capitulo metodol6gico e te6rico e, ao finaL quase como urn apendice, descrevam em urn ou dois capitulos sua visao sobre 0 trabalho de campo, geral­mente, sem apropria<;:ao das teorias descritas.

Uma analise do material recolhido em campo ou documen­'. tal, em termos muito gerais, busca atingir tres objetivos:

• ultrapassagem da incel~eza: dando respostas as perguntas, hip6teses e pressupostos;

.• enriquecimento da leitura: ultrapassando 0 olhar imedia­to e espontaneo em busca da compreensao de significa<;:oes e de estruturas de relevantes latentes;

• integrat;iio das descobertas, devendando a l6gica interna subjacente as falas, aos comportamentos e as rela<;:oes (Bar­din, 1979, p. 29).

Sendo assim, a analise do material qualitativo possui tres finalidades complementares dentro da proposta de investiga­<;:ao social: (a) a primeira e heurfstica. Isto e, insere-se no con­texto de descoberta a que a pesquisa se propoe. (b) A segun­da e de "administra<;:ao de provas", que se realiza por meio do balizamento entre os achados, as hip6teses ou os pressupos­tos. (c) A terceira e a de ampliar a compreensao de contextos culturais, ultrapassando-se 0 nivel espontaneo das mensagens (Bardin, 1979).

Para a realiza<;:ao das analises, varios caminhos sao pos­siveis e, praticamente, todos eles dependem da corrente de

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fase de analise do material qualitativo

pensamento a que 0 investigador se filia. No entanto, tam­bern nesse ponto existem problemas, pois, ao se fazer uma metanalise das pesquisas qualitativas se observa, frequen­temente, que os investigadores tendem a ocultar a alquimia que usaram para transformar dados brutos em descobertas cientificas.

Minha inten<;:ao nesta parte do estudo e discutir essa fase de uma pesquisa social , trazendo a luz possibilidades te6­ricas e praticas de analise do material qualitativo.

Trabalharei com tres modalidades de analise ja consagra­das: (a) Analise de Conteudo, expressao generica que designa 0

tratamento de dados qualitativos. Trata-se de urn conceito his­toricamente construfdo para dar respostas te6rico-metodoI6­gicas e que se diferencia de outras abordagens. A mais impor­tante autora dessa modalidade e Bardin (1979). (b) Analise de Discurso concebido para trabalhar com a fala e seu contexto, sendo utilizada como alternativa as praticas de analise de con­teudo tradicionais. Seus expoentes mais importantes sao Pe­cheut e atualmente toda urn escola de interpretes do campo de comunica<;:ao; (c) Analise Hermeneutica-Dialetica, proposta por Habermas no seu dialogo com Gadamer (1987) como uma uma terceira alternativa que superaria 0 formalismo das analises de conteudo e de discurso, indicado "urn caminho do pensamento". Incluirei, ainda, uma reflexao pessoal, ope­racionalizando a abordagem hermeneutico-dialetica e uma proposta de triangula<;:ao de metodos qualitativos e quantita­tivos, tendo em vista que hoje essa estrategia vai se tomando frequente nas anaIises do setor saude.

Neste estudo, aos discutir as tres modalidades rna is comuns, dou preferencia a hermeneutica dialetica. Minha escolha fun­damenta-se na busca de urn instrumental que corresponda as dimensoes e a dinamica das reIa<;:oes que se apreendem numa pesquisa que toma como objeto a saude em suas mais variadas dimensoes: concep<;:oes, polftica, administra<;:ao, configura<;:ao institucional, representa<;:oes sociais e reIa<;:oes.

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302 fase de analise do material qualitativo

Antes de terminar 0 trabalho, fac;:o uma breve discussao sobre validade e fidedignidade em pesquisa qualitativa, to­mando por base 0 pensamento de auto res consagrados nas discussoes epistemol6gicas.

Capitulo 11 TECNICAS DE ANALISE

DO MATERIAL QUALITATNO

Analise de conteudo

A EXPREssAo MArs COMUMENTE US A DA para represen­tar 0 tratamento dos dados de uma pesquisa qualitativa e Ana­

lise de Conteudo. No entanto, a expressao significa mais do que urn procedimento tecnico . Faz parte de uma h ist6rica bus­ca te6rica e pratica no campo das investigac;:oes sociais.

Para Bardin, a Analise de Conteudo pode ser definida como:

Urn conjunto de tecnicas de analise de comunicac;:ao visando obter, por procedimentos sistematicos e objeti ­vos de descric;:ao do conteudo das mensagens, indicado­res (quantitativos ou nao) que permitam a inferencia de conhecimentos relativos as condic;:oes de produc;:aojrecep­c;:ao destas mensagens (Bardin, 1979, p. 42).

Ou seja, analise de conteudo diz respeito a tecnicas de pesquisa que permitem tomar replicaveis e validas inferencias sobre dados de urn determinado contexto, por meio de pro­cedimentos especializados e cientfficos Em comum, as defi­nic;:oes ressaltam 0 processo de inferencia.

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304 tecnicas de analise de material qualitativo tecnicas de analise de material qualitativo 305

A Analise de Conteudo, como tecnica de tratamento de da­dos, possui a mesma 16gica das metodologias quantitativas, uma vez que busca a interpretac;ao cifrada do material de cara­ter qualitativo. Berelson, um dos primeiros te6ricos da anali­se de conteudo nos Estados Unidos, assim a define:

liE uma tecnica de pesquisa para desCTir;;iio objetiva, siste­matica e quantitativa do conteudo manifesto das comunicar;;8es e tendo por fim interpreta-Ios (Berelson, 1952, p. 18).

Os termos em italico foram anotados por mim, com in­tenc;ao de enfatizar os adjetivos usados por Berelson, lem­brando que eles fazem parte do vocabulario da sociologia positivista. A relevancia concedida ao qualitativo e ao conteu­do manifesto ou latente das comunicac;6es, neste caso, da en­fase as regularidades da fala, a sua analise lexica I e remete a tradicional discussao sobre a especificidade do material pr6­prio as Ciencias Sociais, particularmente quanto a questao da significac;ao.

Historicamente a Analise de Conteudo classica tern oscila­do entre 0 rigor da suposta objetividade dos numeros e a fecundidade da subjetividade. A arte de interpretar os textos sagrados, a exegese religiosa, coloca a hermeneutical por exem­plo, como uma tecnica muito antiga. A atividade de desven­damento de mensagens obscuras, do duplo sentido de urn discurso geralmente simb61ico e polissemico, remonta a Anti­guidade. Bardin situa a Ret6rica e a L6gica tambem como prati­cas milenares de tratamento de discurso, anteriores a atual

A analise lexica constitui um tipo de estudo do vocabulario de um informante, por meio da aplica<;ao de metodos estatfsticos visando a averiguar ou a medir a extensao das suas respostas. Sao feitos dimensionamentos das frases (essa pessoa respondeu concisa ou eA'tensamente?) e tambem eSludo da incidencia quantilativa das pala­vras, ou seja, do numero de vezes que um vocabulo ou um uma ideia apareceram . Pode-se considerar que, mediante procedimenlOs aUlOmalicos, 0 usa da analise lexica permite interpretar com rapidez 0 montante de palavras e express6es ana· li sadas tendo em vista explicar 0 universo total das informa<;6es.

tecnica de Analise de Conteudo. A Ret6rica estuda as modali­

') dades de expressao pr6pria de uma fala persuasiva. A 16gica analisa os enunciados de urn texto, seu encadeamento, e as regras formais que validam 0 raciocfnio.

Analise de Conteudo e uma expressao recente. Surgiu nos Estados Unidos na epoca da Primeira Guerra Mundial, dentro do campo jomalistico na Universidade de ColUmbia. Dentre os nomes que ilustram a hist6ria do desenvolvimento dessa tecnica destacam-se Lasswell (1952), que fazia analise de ma­terial de imprensa e de propaganda desde 1915 . Sua obra prin­cipal, Propaganda Tecnique in the World War foi publicada em 192 7. 0 trabalho de Lasswell teve como contexto urn mo­mento hist6rico de fasdnio pelo rigor matematico como me­dida e como parametro cientffico. Dessa forma, a Analise de C6nteudo, em sua origem, e vftima da pretensa objetividade que os numeros e as medidas ofere cern.

A partir da decada de 1940, os departamentos de Ciencias Polfticas das universidades americanas tomaram-se 0 locus de desenvolvimento das tecnicas de Analise de Conteudo, tendo como material privilegiado as comunicac;6es provenientes da Segunda Guerra Mundial. Os investigadores visavam, dentre outros objetivos, a desmascarar os jornais e peri6dicos sus­peitos de propaganda considerada subversiva ou de carater nazista. Lasswell continuava seus trabalhos sobre analise de sfmbolos. A ele juntaram-se estudiosos das mais diferentes areas: soci610gos, psic610gos, cientistas polfticos . Os marcos distintivos da tecnica desenvolvida nessa epoca foram as ana­lises estatfsticas de valores, fins, normais, objetivos e sfmbo­los. A preocupac;ao da objetividade e da sistematicidade so­lidificou-se tendo como foco 0 rigor quantitativo , para se contrapor ao que os cientistas denominavam "apreensao im­pressionista", numa crftica permanente as escolas etnometo­dol6gicas e interacionistas. Do ponto de vista metodol6gico, Berelson & Lazarsfeld (1952) sintetizaram e sistematizaram as preocupa<;:6es epistemol6gicas da epoca. Em The Analysis of

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Co mmunications Content (Berelson & Lazarsfeld, 1948) , os cri­terios fundam entais entao exigidos para testificar 0 rigor cien­tffico foram assim resumidos: (a) trabalhar com amostras reu­nidas de maneira sistematica; (b) interrogar-se sobre a validade dos procedimentos de coleta e dos resultados; (c) trabalhar com codificadores que perrnitam verifica<;:ao de fidelidade; (d) enfatizar a analise de freqiiencia como criterio de objetivida­de e cientificidade; (e) ter possibilidade de medir a produtivi­dade da analise.

Berelson (1952) , Lazarsfeld (1952) e Lasswell (1952) sao portanto importantes te6ricos e criadores das tecnicas de ana­lise de conteudo. Neles, a obsessao pela objetividade e 0 rigor se confundem com os pressupostos do positivismo. Seus no­mes, seus trabalhos e influencia continuam marcantes e ainda atuais em rela<;:ao as propostas de tratamento dos dados.

No perfodo posterior a Segunda Guerra, a utiliza<;:ao das tecnicas quantitativas para analise de conteudo entrataram em decadencia. Seus pr6prios criadores reflufram 0 animo e se de~encantaram em rela<;:ao aos resultados e as repercussoes de seus trabalhos. Ede Berelson a seguinte Frase citada por Bardin:

A Analise de Conteudo como metodo nao possui qua­lidades magicas e raramente se retira mais do que nela se investe e algumas vezes se retira menos. No final das con­tas nada ha que substitua as ideias brilhantes (Bardin, 1979, p.20).

A constata<;:ao do citado autor demonstra uma certa de­cep<;:ao te6rica em rela<;:ao aos modelos matematicos para ana­lise qualitativa e se curva a importancia da compreensao dos conteudos latentes. Mostra que 0 rigor matematico pode ser uma meta e vir junto com outras forrnas de valida<;:ao, mas nunca substituir a intui<;:ao e a busca do sentido das falas.

A partir dos anos 1950, e sobretudo na decada de 1960, a questao da Analise de Conteudo ressurge, desta vez dentro

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tecnicas de analise de material qualitativo

de urn debate mais aberto e diversificado . A Antropologia, a Socio logia, a Psicologia juntam-se a Psicanaiise, ao Jomalis­

.~~ ( mo e ha uma retomada de problematicas anteriormente qua­

se intocaveis. No plano epstemol6gico, confrontam-se duas concep<;:oes de comunica<;:ao: (a) 0 modelo "instrumental", que defende 0 seguinte ponto de vista: numa comunica<;:ao 0

mais importante nao e 0 conteudo manifesto da mensagem (como defendia Berelson) mas 0 que ela expressa gra<;:as ao contexto e as circunstancias em que se da; (b) 0 modelo "re­presentacional", que da rel evancia ao conteudo lexical do dis­curso, cuja proposta e fazer uma boa analise, focalizando a quantidade e 0 sentido das palavras .

Do ponto de vista metodol6gico, a polemica entre a abor­dagem quantitativa e a qualitativa na analise do material de co­

J munica<;:ao sempre existiu. Em rela<;:ao ao primeiro tipo de abordagem, predominaram as ideias de Berelson, Lazarsfeld e LasswelL acrescidas de novas formas de procedimento, todas elas buscando "medidas " para as significa<;:oes, como criterio de cientificidade (Osgood et aI., 1957).

Os pesquisadores que buscam a compreensao dos signifi­cados no contexto da fala, em geraL negam e criticam a analise de freqiiencia das falas e palavras como criterio de objetivida­de e cientificidade e tentam ultrapassar 0 alcance meramente descritivo da mensagem, para atingir, mediante a inferencia, uma interpreta<;:ao mais profunda.

Atualmente varios fatores vieram a alimentar 0 debate dessa pratica te6rica. A informatica e a semi6tica sao duas areas que vern influenciando definitivamente as modalidades de trata­mento dos dados de comunica<;:ao. Varios softwares passararn a atualizar com maior rigor tecnico as propostas quantitativis­tas que se originararn no infcio do seculo xx. Em todos os congressos mundiais e locais sobre pesquisa qualitativa, exis­tern postos de exposi<;:ao de novidades instrumentais para analise de conteudo. De outro lado, tambern tem-se intensi­ficado as propostas compreensivistas para analise das falas e

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308 309 temicas de analise de material qualitativo

discursos, revelando novo dinamismo nos estudos de signi­ficac;oes.

As atuais tendencias hist6ricas do uso e do desenvolvi­mento de tecnicas de Analise de Conteudo conduzem a uma certeza. Todo 0 esfon;o te6rico, seja baseado na 16gica quanti­tativista ou qualitativista, visa a ultrapassar 0 nivel do senso comum e do subjetivismo na interpreta<;:ao e alcan<;:ar uma vigilancia critica ante a comunica<;:ao de documentos, textos literarios, biografias, entrevistas ou resultados de observa<;:ao

Do ponto de vista operacional, a analise de conteudo parte de uma leitura de primeiro plano das falas, depoimentos e documentos, para atingir urn nivel mais profundo, ultrapas­sando os sentidos manifestos do material. Para isso, geral­mente, todos os procedimentos levam a relacionar estruturas semanticas (significantes) com estruturas sociol6gicas (signi­ficados) dos enunciados e a articular a superficie dos enun­ciados dos textos com os fatores que determinam suas carac­terfsticas: variaveis psicossociais, contexto cultural e processo de produ<;:ao da mensagem. Esse conjunto de movimentos analfticos visa a dar consistencia interna as opera<;:6es. Como afirma Allport:

A consistencia intema conseguida atraves de multiplas abordagens e quase 0 unico teste que temos para a valida­de das pesquisas. Portanto, em todos os senti dos, os do­cumentos pessoais entram no interior de urn conjunto abrangente de estrategicas de compreensao da realidade (1942, p. 121).

Visando a consistencia referida por Allport, os te6ricos da analise de conteudo consideram que ela deva ser objetiva, tra­balhando com regras preestabelecidas e obedecendo a diretri­zes suficientemente claras para que qualquer investigador possa replicar os procediinentos e obter os mesmos resulta­dos; sistematica, de tal forma que 0 conteudo seja ordenado

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temicas de analise de material qualitativo

e integrado nas categorias escolhidas, em fun<;:ao dos objeti­vos e metas anteriormente estabelecidos. Alguns te6ricos acres­centam a essas caracterfsticas 0 termo quantitativo, entenden­do que e importante estudar a frequencia para que os temas tenham a medida exata de sua importancia. Esse ultimo re­quisito, no entanto, nao e exigido por todos os estudiosos que questionam a quantifica<;:ao dos significados .

Existem varias modalidades de Analise de Conteudo, dentre as quais: Analise Lexical, Analise de Expressdo, Analise de Rela­((oes, Analise Tematica e Analise de Enunciac;do. Definirei cada uma resumidamente e darei relevancia a Analise Tematica por ser a mais simples e considerada apropriada para as investiga­<;:6es qualitativas em saude.

J t Analise lexical I Uma analise lexical inicia-se sempre pela contagem das

palavras, avan<;:ando sistematicamente na dire<;ao da identifi­ca<;:ao e dimensao do texto em estudo. No caso das entrevis­tas abertas, sao feitos grupamentos de palavras afins, del eta­das palavras que apresentam pouco interesse, ate se conseguir que representem 0 sentido do texto . As 'frequencias pE'rmi­tem consolidar a aplica<;:ao de um tema ou locu<;:ao, possibili­tanto situar no contexto as ideias trazidas pelas palavras.

Operacionalmente, a analise lexica se faz da seguinte for­ma. 0 pesquisador faz 0 tratamento do conteudo de um tex­to mediante a identifica<;:ao do numero total de ocorrencias de cada palavra, do numero total de palavras, do numero de diferentes palavras, venda a riqueza de vocabulario utilizada para produzir uma resposta ou urn discurso . A seguir, ele clas­sifica as palavras, de acordo com sua ordem na produ<;:ao de significados: verb os, substantivos e adjetivos e, a seguir, os vocabulos instrumentais como artigos e preposi<;:6es. A partir de entao, 0 analista reduz 0 numero de vocabulos significati­vos, fazendo uma analise controlada, eliminando os artigos, preposi<,:6es e as palavras que julga sem importancia para 0

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310 311 tecnicas de analise de material qualitativo

objetivo a que se propoe. 0 aprofundamento do estudo pode dar-se com a analise bi ou multivariada dos dados textuais, e depois (0 que ja consiste um procedimento mais aprimora­do), integrando-os no contexto de produ<;:ao da linguagem .

• Analise da Expressiio Designa um conjunto de tecnicas que trabalham indica­

dores para atingir a inferencia formal. A hip6tese da tecnica de analise de expressao e que existe uma correspondencia entre o tipo de discurso e as caracterfsticas do locutor e de seu meio. A enfase e dada a necessidade de conhecer os trac;os pessoais do autor da fala, sua situac;ao social e os dados culturais de seu contexto. No entanto, esse tipo de tecnica tambem utiliza indicadores lexica is, como a repetic;ao e a incidellcia das pala­vras. Mas a eles acrescenta a analise do es tilo das falas , do encadeamento 16gico das ideias, dos arranjos sequenciais e da estrutura da narrativa . Sua aplicac;ao mais frequente ocorre na investigac;ao da autenticidade de documentos, na psicolo­gia clinica, na analise de discursos politicos e persuasivos (Bar­din, 1979; Unrug, 1974).

• Analise de Relafoes Designa tecnicas que, em vez da analise da mera frequen­

cia de vocabulos num texto, abordam relac;oes entre os varios elementos do discurso dentro de urn texto. Sao duas as prin­cipais modalidades de analise das relac;oes: (a) a de co-ocor­rencias e a (b) estrutural.

A analise de co-ocorrencias procura extrair de urn texto as relac;oes entre as partes de uma mensagem e assinala a presen­c;a simultanea (co-ocorrencia) de dois ou mais elementos na mesma unidade de contexto. Por exemplo, no estudo do dis­curso de uma doente mental, 0 analista observa que cada vez que ela define sua situac;ao, a doenc;a aparece vinculada a si­tuac;ao financeira. No caso, existe correlac;ao entre esses ele­mentos. Osgood (1959) propoe a seguinte sequencia de pro­

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tecn icas de analise de material qualitativo

cedimentos para a analise de co-ocorrencias: (a) escolha da unidade de registro (essa pode ser uma palavra-chave ou uma expresssao) e sua categorizac;ao por temas a que diz respeito; (b) escolha das unidades de contexto (podem serf por exem­plo, paragrafos ou ate urn texto inteiro) e 0 seu recorte em fragmentos; (c) busca da presenc;a ou ausencia de cada unida­de de registro nas unidades de contexto; (d) calculo de co-ocor­rencias; (e) represen tac;ao e interpreta<;ao de resultados.

A analise de co-ocorrencia tem sido utilizada para esclare­cimento de estruturas da personalidade; para 0 levantamento de relevancias que permanecem latentes tanto nas falas dos indivfdu os como nos textos referentes a coletividade; para estudo de estere6tipos e de representac;oes sociais (Bardin, 1979; Osgood, 1959 i Unrug, 1974) .

A analise estrutural passou a ser bastante exercitada a par­tir da decada de 1960 e tern, como pressuposto fundamental, a cren<;:a na existencia de estruturas universais, ocultas sob a aparente diversidade dos fen6menos. Filia-se as correntes es­truturalistas na sociologia e na antropologia (Levi-Strauss, 1967) e na lingiifstica (Sapir, 1967; Barthes, 1967). Os estru­turalistas buscam 0 imutavel e permanente sob a heteroge­neidade aparente. Por tras dessa busca esta a noc;ao de siste­ma. Analisar significara, nesse tipo de estudo, reencontrar as m esmas engrenagens, quaisquer sejam as formas dos meca­nismos em que se apresentem. A signiflCac;ao, no caso, fi ca subordinada a es truturac;ao da linguagem.

A analise es trutural nao se aplica ao vocabulario, a seman­tica ou ao temario da mensagem em si. Ela se dirige a organi­zac;ao subjacente, ao sistema de rel a<;:oes, as regras de enca­deamento, de associac;ao, de exclusao e de equivalencia. Isto e, ela trabalha com todas as interac;oes que estruturam os ele­mentos (signos e significac;oes), mas de maneira invariante e independente deles (Bardin, 1979; Levi-Strauss, 1964, 1967;

Barthes, 1967).

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312 tecnicas de analise de material qualitativo

• Analise de Avaliapio ou Representacional Proposta por Osgood (1959), a analise representacional

tern por finalidade medir as atitudes do locutor quanta aos objetos de que fala (pessoas, coisas, acontecimentos). Seu pressuposto e de que a linguagem representa e ref1ete quem a utiliza. Portanto, 0 estudo de seu conteudo explfcito permite fazer inferencias sobre 0 emissor, seu contexto e sua ambien­teo 0 conceito central para 0 processo de analise avaliativa ou representacional eo termo atitude. Uma atitude seria, na visao de Osgood, a predisposi<;:ao relativamente estavel e organiza­da para reagir sob a forma de opinioes ou de atos em presen­<;:a de objetos (pessoas, icieias, coisas, acontecimentos), de maneira determinada.

Sendo 0 conceito de atitude 0 nucleo ou matriz que pro­duz e traduz urn conjunto de ju[zos de valor, uma analise representacioanl ou avaliativa consistiria em encontrar as ba­ses das atitudes dos entrevistados, por tras da dispersao das manifesta<;:oes verbais. Seu objetivo e especifico: atem-se so­mente acarga avaliativa das unidades de significa<;:ao, buscan­do nelas a direyao e a intensidade dos ju[zos selecionados (Bar­din, 1979; Osgood, 1959).

• Analise da Enuncia{:iio

Ap6ia-se numa concep<;:ao de comunica<;:ao como proces­so (e nao como urn dado estatico) e do discurso como pala­vra em ato. A analise da enuncia<;:ao considera que na produ­<;:ao da palavra elabora-se, ao mesmo tempo, urn sentido e operam-se transforma<;:oes. 0 discurso nao seria urn produto acabado, mas urn momento de cria<;:ao de significados com tudo 0 que isso comporta de contradi<;:oes, incoerencias e imperfei<;:oes. Esse tipo de estudo parte da ideia de que, nas entrevistas, a produ<;:ao da fala e, ao mesmo tempo, esponta­nea e constrangida pela situa<;:ao. Levando em conta essa du­pIa perspectiva na produ<;:ao do texto, a analise da enuncia<;:ao

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tecnicas de analise de material qualitativo 3 13

trabalha com: (a) as condi<;:oes de produ<;:ao da palavra. Parte do principio que a estrutura de qualquer comunica<;:ao se da numa triangula<;:ao entre 0 locutor, seu objeto de discurso e 0

interlocutor. Ao se expressar, 0 locutor projeta seus conf1itos basicos por meio de palavras, silencios e lacunas indicando processos, na sua maioria, inconscientes de expressao; (b) 0

continente do discurso e suas modalidades. Neste segundo tem­po, se realiza (1) uma aproxima<;:ao por meio de analise sintati­ca e paralingiifstica das estruturas gramaticais; (2) uma analise 16gica que mostra os arranjos do discurso; (3) uma analise dos elementos formais atfpicos: silencios, omissoes, ilogismos; (4)

urn realce das figuras de ret6rica . A entrevista aberta e 0 material privilegiado da analise da

enuncia<;:ao, no sentido de que ela evidencia urn discurso di­namico em que esponta!1eidade e constrangimento sao simul­taneos e em que 0 trabalho de elabora<;:ao se configura, ao mesmo tempo, como emergencia do inconsciente.

Em terrnos operacionais, a analise da enuncia<;:ao segue 0

seguinte roteiro : .• Estabelecimento do Corpus ou Carpi : delimita<;:ao do

numero de entrevistas a serem trabalhadas. A qualidade da analise substitui a quantidade do material. 0 pesquisador leva em conta a questao central e objetiva da pesquisa para deli­near as dimensoes do Corpus e dos desdobramentos para, se for necessario, fazer divisoes em subconjuntos que se inte­

gram no conjunto (Corpus). • Prepara<;:ao do Material: cada texto (entrevista) e uma

unidade basica. Come<;:a-se pela transcri<;:ao exaustiva de cada uma delas, deixando-se uma margem (a direita ou a esquer­da) para anota<;:oes ou utilizando-se algum artiffcio no com­putador. A transcri<;:ao conserva tanto 0 registro da palavra (sig­nificantes) como dos silencios, risos, repeti<;:oes, lapsos, sons

e outros. • Etapas da Analise: na analise de enuncia<;:ao cad a entre­

vista e submetida a tratamento como uma totalidade organi­

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314 315 tecn icas de analise de materia l qualitativo

zada e singular. Sao observados em cada uma delas os seguin­tes aspectos: (1) alinhamento ao coletivo e a dinamica pro­pria do discurso do indivfduo, para se encontrar a logica que estrutura cad a uma delas; (2) 0 estilo; (3) os elementos atfpi­cos e as figuras de retorica.

Na analise da enunciac;:ao de uma entrevista, primeiramente e preciso observar 0 encadeamento das proposic;:6es2 e fazer­se uma analise l6gica. Separam-se por barra ou recopiam-se todas as orac;:oes, observando-se as relac;:6es que ressaltam a forma de raciocfnio. A seguir, realiza-se a analise sequenciaL pondo atenc;:ao sobre a maneira de construc;:ao do texto, seu ritmo, sua progressao e as rupturas do discurso.

Na analise de enunciac;:ao, 0 estilo e urn revelador do lo­cutor, de seu contexto e de seus interlocutores, no sentido de que a expressao e 0 pensamento caminham lado a ladq: e preciso te-lo em conta. Igualmente, os chamados elementos atfpicos e as figuras de retorica sao relevantes neste tipo de pratica teorica, devendo-se prestar especial atenc;:ao a: (a) repe­tir;oes de urn mesmo tema ou de uma mesma palavra dentro de urn texto . A repetic;:ao pode ser indicador da importancia do assunto que a palavra enuncia, mas tam bern da sua ambi­valencia e da denegac;:ao; (b) lapsos que podem significar a in­sistencia numa ideia recusada. Segundo a psicanalise, a erup­c;:ao irracional de urn termo num contexto da racionalidade significa uma quebra de defesa do locutor; (c) ilogisrnos, isto e, os emperramentos nos raciocfnios demonstrativos. Costu­mam ser indicativos de uma necessidade de justificac;:ao ou de urn jufzo contraditorio com a situac;:ao real; (d) lugares-comuns. Esses podem ter urn pape! justificador. Costumam tambern apelar para a cumplicidade do interlocutor (frases feitas, pro­verbios cultural mente partilhados) ou para desviar a atenc;:ao do entrevistador ou, ainda, para a recusa de aprofundar de-

Po r proposi~ao cmende-se uma afirmac;ao, uma decl a ra~ao, um juizo. E uma llnid~dc que se bas ta J si mesma, ou seja, que pronu nci ada sozinh a tem sen ­tido.

tecnicas de analise de material qualitativo

terminados assuntos; (e) jogos de palavras: os chistes podem indicar descontrac;:ao mas tambem costumam ser usados para ludibriar 0 entrevistador, visando a provocar 0 distanciamen­to de uma questao que 0 interlocutor nao quer enfrentar; (f) figuras de ret6rica. Elas jogam com 0 sentido das palavras. As mais comuns sao: 0 paradoxo (reuniao de duas ideias apa­rentemente irreconciliaveis) ; a hiperbole (0 aumento ou a di­minuic;:ao excess iva das coisas); a metonfmia (uso da parte pelo todo, do abstrato pelo concreto e vice-versa); a metafora (de­signa uma coisa por outra)_

Em sfntese, a proposta da Analise de Enunciar;a.o, bern mais complexa e contextualizada que as abordagens quantitativas das falas, e conseguir, atraves do confronto entre a analise 10­gica, a analise sequencial e a analise do estilo e dos elementos atfpicos de urn texto, a compreensao do seu significado. A conexao entre os temas abordados, 0 processo de produc;:ao da linguagem e seu contexto, acabam por evidenciar os con­flitos e as contradic;:6es que permeiam e estruturam urn dis­curso. Essa tecnica e bastante utilizada e com grande produti­vidade na area de jornalismo inves tigativo e reflexivo .

.. Analise Tematica A noc;:ao de tema esta ligada a uma afirmac;:ao a respeito de

determinado assunto. Ela comporta urn feixe de relac;:6es e pode ser graficamente apresentada atraves de uma palavra, de uma frase, de urn resumo. Segundo Bardin,

o terna e a unidade de significac;:ao que se liberta natu­ralmente de urn texto analisado segundo criterios relati­vos a teoria que serve de guia a leitura (1979, p. 105).

Para Unrug, terna e:

uma unidade de significac;:ao complexa de comprimento variaveL a sua validade nao e de ordem linglifstica, mas

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316 317

tecnicas de analise de material qualitativo

antes de ordem psicologica. Pode constituir urn tema tan­to uma afirma<;:ao como uma alusao (1974, p. 19) .

Fazer uma analise tematica consiste em descobrir os nu­cleos de sentido que compoem uma comunica<;:ao, cuja presem;a ou jrequencia signifiquem alguma coisa para 0 objeto analfti­co visado. Tradicionalmente, a analise tematica era feita pela contagem de frequencia das unidades de significa<;:ao, defi­nindo 0 carater do discurso. Para uma analise de significados, a presen<;:a de determinados temas denota estruturas de rele­vancia, val ores de referencia e mode-los de comportamento presentes ou subjacentes no discurso.

Operacionalmente, a analise tematica desdobra-se em tres etapas:

.. Primeira etapa: Pre-Analise

Consiste na escolha dos documentos a serem analisados e na retomada das hipoteses e dos objetivos iniciais da pes­quisa. 0 investigador deve se perguntar sobre as rela<;:oes en­tre as et3.pas realizadadas, elaborando alguns indicadores que o orientem na compreensao do material e na interpreta<;:ao fi­nal. A pre-analise pode ser decomposta nas seguintes tarefas:

Leitura Flutuante: do conjunto das comunica<;:oes. Este momenta requer que 0 pesquisador tome contato direto e intenso com 0 material de campo, deixando-se impregnar pelo seu conteudo. A dinamica entre as hipoteses iniciais, as hipo­teses emergentes e as teorias relacionadas ao tema tornarao a leitura progressivamente mais sugestiva e capaz de ultrapassar a sensa<;:ao de caos inicial.

Constituicao do Comus, termo que diz respeito ao uni­verso estudado em sua totalidade, devendo responder a al­gumas normas de validade qualitativa: exaustividade: que 0

material contemple todos os aspectos levantados no roteiro; representatividade: que ele contenha as caracteristicas essenciais do universo pretendido; homogeneidade: que obede<;:a a crite­rios precisos de escolha quanto aos temas tratadas, as tecnicas

tecnicas de analise de material qualitativo

empregadas e aos atributos dos interlocutores; pertinencia: que os documentos analisados sejam adequados para dar respos­ta aos objetivos do trabalho.

Formulacao e reformulacao de Hipoteses e Objetivos, pro­cesso que consiste na retomada da etapa exploratoria, tendo como parametro da leitura exaustiva do material as indaga­<;:oes iniciais. Os procedimentos exploratorios devem ser valo­rizados neste momento, para que a riqueza do material de campo nao seja obscurecida pelo tecnicismo. Por isso se fala tam bern em reformula<;:ao de hipoteses, 0 que significa a pos­sibilidade de corre<;:ao de rumos interpretativos ou abertura para novas indaga<;:oes.

Nessa fase pre-analftica, determinam-se a unidade de regis­tra (palavra-chave ou frase), a unidade de contexto (a delimita­<;:ao do contexto de compreensao da unidade de registro), os recortes, a forma de categorizar;Go, a modalidade de codificar;Go e os conceitos te6ricos rnais gerais (tratados no infcio ou levan­tados nesta etapa, por causa de amplia<;:ao do quadro de hi­poteses ou pressupostos) que orientarao a analise.

.. Segunda etapa: Explorar;Go do Material A explora<;:ao do material consiste essencialmente numa

opera<;:ao classificatoria que visa a alcan<;:ar 0 nucleo de com­preensao do texto. Para isso, 0 investigador busca encontrar categorias que sao expressoes ou palavras significativas em fun­<;:ao das quais 0 conteudo de uma fala sera organizado. A cate­goriza<;:ao - que consiste num processo de redu<;:ao do texto as palavras e expressoes significativas - e uma etapa delicada, nao havendo seguran<;:a de que a escolha de categorias a priori leve a uma abordagem densa e rica. A analise tematica tradi­cional trabalha essa fase primeiro, recortando 0 texto em uni­dades de registro que podem se constituir de palavras, frases, tern as, personagens e acontecimentos, indicados como rele­vantes na pre-analise. Em segundo lugar, 0 pesquisador esco­Ihe as regras de contagem, uma vez que tradicionalmente a compreensao e construfda por meio de codifica<;:oes e indices

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318 tecnicas de analise de material qualitativo

quantitativos. Em terceiro lugar, ele realiza a classifica~ao e a agrega<;:ao dos dados, escolhendo as categorias teoricas ou empfricas, responsaveis pela especifica~ao dos temas.

.. Terceira etapa: Tratamento dos Resultados Obtidos e Interpre­tar;:ao

Os resultados brutos sao submetidos (tradicionalmente) a operac;:oes estatfsticas simples (porcentagens) ou complexas (analise fatorial) que permitem colo car em relevo as informa­c;:oes obtidas. A partir daf, 0 analista propoe inferencias e rea­liza interpretac;:oes, inter-relacionando-as com 0 quadro teori­co desenhado inicialmente ou a~re outras pistas em torno de novas dimensoes teoricas e interpretativas, sugeridas pela lei­tura do material.

Como se pode perceber, a analise tematica e bastante for­mal e mantem sua cren~a na significa~ao. da regularidade. Como tecnica ela transpira as rafzes positivistas da analise de conteu­do tradicional. Porem ha variantes desse tipo de abordagem que trabalham com significados em lugar investir em inferen­cias estatfsticas. Entre tais variantes, a que mais valoriza os sig­nificados e a modalidade de analise da enunciac;:ao.

Analise de discurso

Analise do Discurso e urn conceito relativamente jovem no campo de intersec;:ao entre as Ciencias Sociais e a Linglifstica. Seu criador nas Ciencias Sociais e 0 filosofo frances Michel Pecheux, que fundou, na decada de 1960, a Escola Francesa de Analise do Discurso com 0 proposito de substituir a Analise de Conteudo tradicional.

o quadro epistemologico dessa proposta de trabalhar a linguagem, tanto do senso comurn, como do discurso politi­co ou erudito, de acordo com seu principal pensador, articula tres regioes do conhecimento: (aJ 0 Materialismo Historico,

\

tecnicas de analise de material qualitativo 31 9

canismos sintaticos e dos processos de enuncia~ao; (cJ a Teo­ria do Discurso como teo ria da determina~ao historica dos pro­cess os semanticos .

Em suas obras, Pecheux ressalta que as tres regioes do co­nhecimento citadas estao perpassadas transversalmente por uma Teoria da Subjetividade, de natureza psicanalista e que deve ser apropriada para explicar 0 carater recalcado na forma~ao do significado.

o objetivo basico da Analise do Discurso, segundo Pecheux, e realizar uma reflexao geral sobre as condi~oes de produc;:ao e apreensao da significac;:ao de textos produzidos nos mais diferentes campos: das rela~oes primarias, religioso, filoso£1­co, jurfdico e sociopolitico, visando a compreender 0 mo­do de funcionamento, os princfpios de organizac;:ao e as for­mas de produ~ao de seus sentidos.

Os pressupostos basicos da teoria de analise de discurso podem resumir-se em dois princfpios, segundo Pecheux: (1) o sentido de uma palavra, de uma expressao ou de uma pro­posic;:ao nao existe em si mesmo. Ao contrario, expressa posi­c;:oes ideologicas em jogo no processo socio-historico no qual as formas de rela~ao sao produzidas; (2) toda forma~ao dis­cursiva dissimula, pela pretensao de transparencia, sua depen ­dencia das forma~oes ideologicas .

Como procedimento, as tecnicas de analise de discurso pretendem inferir, a partir dos efeitos de superffcie (a lingua­gem e sua organiza~ao), uma estrutura profunda: os processos de sua produr;:ao (Pecheux, 1988, p. 115). Inscrevem-se portan­to, nos marcos de uma sociologia da linguagem, tendo como hipotese basica 0 fato de que 0 discurso e determinado por condi~oes de produ~ao e por urn sistema lingUfstico.

Orlandi e uma discfpula de Pecheux, que trouxe para 0

Brasil a contribui~ao desse £1losofo. Segundo essa autora, Ana­lise de Discurso e uma pro posta crftica que busca problemati­

como teoria das forma~oes sociais, de suas transformac;:oes e zar as formas de ref1exao estabelecidas. Ela distingue e situa tambem das ideologias; (bJ a Lingii.fstica como teoria dos me- r esse tema como objeto teorico: (aJ pressupoe a lingUfstica,

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320 temicas de analise de material qualitativo

mas se destaca dela: nao e nem uma teoria descritiva, nem uma teoria explicativa. Euma teoria critica que trata da deter­mina<;:ao historica dos processos de significa<;:ao; (b) considera como foco central de analise a rela<;:ao entre a linguagem e seu contexto de produ<;:ao, tendo como marco teo rico a teoria das forma<;:oes sociais e as teorias da sintaxe e da enumera<;:ao; (c) pela sua especificidade, ela e cisionista em dois sentidos: (1) procura problematizar as evidencias e explicitar 0 carater ideo­logico da fala, revelando que nao ha discurso sem sujeito e nem sujeito sem ideologia; (2) ressalta 0 encobrimento das formas de domina<;:ao polftica que se manifestam na razao disciplinar, instrumental e reducionista.

A Analise do Discurso situa-se, portanto e ao mesmo tem­po, numa apropria<;:ao da linglifstica tradicional e da analise de conteudo, e numa critica dessas abordagens, evidenciando que sao praticas-teoricas historicamente definidas. Orlandi diz que a analise de discurso cria urn ponto de vista proprio de olhar a linguagem como espa<;:o social de debate e de conflito. Nela, 0 texto e considerado como uma unidade significativa, pragmatica e portadora do contexto situacional dos falantes. Comenta Orlandi que neste tipo de proposta, as palavras, as senten<;:as e os perfodos sao valorizados tambem em suas pe­culiaridades lexicais, morfologicas, sintaticas e semanticas, po­rem, 0 que cria a analise do discurso, "e 0 ponto de vista das condi<;:oes de produ<;:ao do texto" (Orlandi, 1987, p. 130) .

Em rela<;:ao a Analise de Contelido, tanto Pecheux como Orlandi insistem em marcar uma linha divisoria. Sua crftica fundamental e de que esse tipo de abordagem toma 0 texto como pretexto e 0 atravessa so para demonstrar 0 que ja foi definido a priori pela situa<;:ao dos atores em campo, ou como ilustra<;:ao de uma situa<;:ao. Enquanto isso, a Analise de Discur­so considera 0 texto como urn monumento e sua exterioridade como parte constitutiva da historicidade inscrita nele. Dessa forma, entende que a situa<;:ao em estudo est} atestada no texto e e preciso buscar a compreensdo do seu processo produtivo,

tecnicas de analise de material qualitativo 32 1

muito mais do que realizar uma interpretar;do exteriorizada do objeto de pesquisa.

A teoria de Analise do Discurso trouxe uma contribui<;:ao fundamental para a analise do material qualitativo, sobretu­do numa situa<;:ao em que a hegemonia sempre coube as ana­lises positivistas dos conteudos das falas. Atualmente nichos especfficos de seu desenvolvimento teorico e tecnico sao, prin­cipalmente, as areas de informa<;:ao e comunica<;:ao. A analise dos diversos fenomenos informacionais e comunicacionais (Sodre, 1992; Champagne, 1997) tern em comum a concep­<;:ao de que eles fazem parte de urn sistema que se articula a logica da vida socia!. E que, nas sociedades modernas, esses meios ocupam urn lugar privilegiado de produ<;:ao e reprodu­<;:ao do real, tornando-se poderosos "interferentes" na orga­niza<;:ao do espa<;:o relacional (Hobsbawm, 1995; Ramonet, 1996; Martin-Barbero, 2001).

E importante definir alguns conceitos desenvolvidos a partir da perspectiva dos teoricos da tecnica de analise de dis­curso.

Texto - Na tecnica de analise de discurso, 0 termo texto e tornado como unidade de analise: unidade complexa de sig­nifica<;:oes . Urn texto pode ser uma simples palavra, urn con­junto de frases ou urn documento completo. Texto distingue­se de discurso . Enquanto este ultimo vocabulo designa urn conceito teorico-metodologico, 0 primeiro e utilizado como conceito analftico. 0 discurso e a linguagem em intera<;:ao, com seus efeitos de superffcie e representando rela<;:oes esta­belecidas. 0 texto consiste no discurso acabado para fins de analise. Todo texto, enquanto corpus, e urn objeto completo. A partir dele sao realizados posslveis recortes. Como objeto teo-rico, porem, 0 texto e infinitamente inacabado : a analise lhe devolve sua incompletude, acenado para urn jogo de mul­tiplas possibilidades interpretativas, para 0 contexto que 0

gerou, para a ideologia nele impregnada e para as rela<;:oes dos atores que 0 tornam possive!.

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322 3 23 tecnicas de analise de material qualitativo

Do ponto de vista analitico, 0 texto e 0 espac;:o mais ade­quado para se observar 0 fen6meno da linguagem: ele contem a totalidade. Essa totalidade revela-se em tres dimensoes de ar­gumentac;:ao: (a) relar;oes de forr;a em que se demarcam lugares sociais e posic;:ao relativa do locutor e do interlocutor; (b) rela­r;ao de sentido, constituindo a interligac;:ao existente entre este e varios outros discursos como num "coro de vozes " que se es­conde em seu interior; (c) relar;ao de antecipar;ao, que diz respei­to ao movimento do falante, prevendo a reac;:ao de seu interlo­cutor: qualquer fala tern em mente urn ouvinte e sua reac;:ao.

Segundo Orlandi (1987) , 0 movimento que acontece no interior do discurso e ao mesmo tempo, 0 processo, 0 produ­to eo centro nevralgico da significac;:ao a ser compreendido na analise do texto. Portanto, todo texto exala ideologia e pode determinar a relac;:ao entre 0 enunciador e 0 ouvinte, caracteri­zando sua inserc;:ao em determinada formac;:ao discursiva .-l Qualquer discurso e referidor e referido: dialoga com outros discursos e se produz no interior de instituic;:oes e grupos que determinam quem fala, 0 que e como fala e em que momento.

Leitura e Silencio - Qualquer texto admite multiplas pos­sibilidades de interpretac;:ao. 0 jogo de relac;:oes e de intera ­c;:oes sociais permite tanto 0 nivel de leituras parafrasticas, ou seja, possuem 0 sentido dado por seus autores, como 0 nivel polissemico em que a fala se atribuem multiplos sentidos. Tanto a leitura como a significac;:ao sao produzidas pelos in­terlocutores e leitores. A possibilidade de multiplas interpre­tac;:oes ap6ia-se no fato de que 0 processo discursivo nao tern urn infcio preciso: ele acumula sentidos de discursos previos e parte deles, sendo reinterpretados peJa experiencia concreta do lei tor, do interlocutor ou do analista.

] Entende-se em Pecheux po r Fonna~ao Discursiva as marcas de eS lii o que se produ­zem na rel ac;ao da linguagem com suas condi c;6es de prod uc;ao. A formac;ao di s­cursiva edefinida na sua relac;ao com formac;ao ideo logica: 0 que pode e deve ser dilO. Toda formac;ao discursiva dissimula, pela lransparencia do serll ido que nela se co nsliLUi, sua dependencia das formac;6es ideo logicas (Pecheux, [988, pp. 160-2).

tecnicas de analise de material qualitativo

o Silencio ocupa lugar de relevancia na tecnica de anali­se de discurso. Tanto quanto a palavra, 0 silencio tern suas con­dic;:oes de produc;:ao : ele e ao mesmo tempo ambiguo e elo­quente. 0 silencio conseguido pelo opressor e uma forma de exclusao; 0 silencio imposto pelo oprimido pode expressar formas de resistencia . 0 silencio sobre urn tema contundente ressalta a importancia de que seja abordado pelo investiga ­dor. 0 dito e 0 nao dito configuram 0 jogo de cenas entre a regiao inte-rior e exterior dramatizado no trabalho de campo, pois ha silencios que dizem e ha falas silenciadoras. A fala autoritaria visa a impedir que as pessoas se revelem, mas tam­bern quer coagi-las a dizer 0 que nao pretendem pronunciar. Portanto, nem a fala nem 0 silencio dizem por si. Ambos ex­pressam relac;:oes e dizem muito sobre as pessoas que os em­

pregam. Tipos de Discurso - Segundo Orlandi urn tipo de discur­

so resulta de determinado modo de funcionamento discursi­vo. Ou seja, a atividade de dizer e tipificante: todo locutor, quando fala, estabelece uma configurac;:ao que tern embutido em si urn estilo que se expressa na interac;:ao. Porem, se 0 dis­curso determinado s6 pode ser compreendido como proces­so, seu resultado pode ser classificado dentro de formas ou tipos discursivos distintos. A autora propoe (na linha do tipo­ideal de Max Weber, isto e, como instrumento de analise) a seguinte tipologia: discurso ludica, discurso polemico e discurso autoriWrio. No primeiro, a simetria e a reversibilidade entre os interlocutores sao totais e a polissemia e maxima. No tipo polemica, a reversibilidade e menor e s6 se da sob certas con­dic;:oes, comportando algum grau de polissemia. 0 discurso autoritcirio e totalmente assimetrico e contem poucas possibi­lidades de interpretac;:ao polissemica. Os tipos se subdividem e permitem a construc;:ao de' matrizes de interpreta c;:ao dentro da linha que inspira 0 modelo te6rico, 0 modelo estrutural.

Carater recalcado da matriz do sentido - Pecheux cha­ma atenc;:ao para 0 fato de que os processos discursivos reali ­

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324 325 tecnicas de analise de material qualitativo

zam-se por meio da prodw;ao de sentidos, mas tern urn cam­po de atua<;:ao rnais amplo . Adotando a linha da psicanalise lacaniana, Pecheux lembra que 0 inconsciente atravessa toda enuncia<;:ao e que toda fala e marcada por dois nfveis de recal­que: "0 esquecido numero urn" eo "esquecido numero dois ".

o esquecido numero urn "designa aquilo que nunca foi conhecido e que, portanto, toca mais de perto 0 sujeito que fala, na estranha familiandade que ele mantem com as causas que 0 determinam " (Pecheux, 1988, p. 175 ). 0 autor refere­se a uma zona inconsciente, no sentido em que a ideologia e, por sua constitui<;:ao, tambem inconsciente e, no entanto, de­termina a forma de estrutura discursiva.

o esquecido numero dois diz respeito a urn tipo de ocul­ta<;:ao parcial em que 0 recalcado pode ser compreendido, re ­cuperado e reformulado pelo sujeito da enuncia<;:ao. Quando alguem tenta aprofundar ou enunciar de forma mais adequa­da seu pensamento em linguagem, passa a se situar numa zona intermediaria, pre-consciente/consciente em rela<;:ao ao senti­do de sua fala (Pecheux, 1988).

A contnbui<;:ao dos pnncipais autores da teona da Analise do Discurso se fundamenta principalmente na crftica da lin­guagem, sempre ressaltando que 0 emissor e 0 receptor em inter-rela<;:ao na constru<;:ao de determinado discurso corres­pondem a lugares determinados na estrutura social (patrao/ operarios; padre/fieis; pai/fil hos; polftico/povo). A situa<;:ao dada do locutor assim como a do destinatario afetam 0 dis ­curso emitido, pois 0 sujeito produz e transmite 0 discurso num espa<;:o social: 0 locutor antecipa, no processo discursi­vo, as representa<;:oes de sentido de seu interlocutor, ainda quando esse ultimo seja configurado apenas hipoteticamen­te na fala sempre refenda do autor.

Enquanto possibilidade teorica, a analise do discurso apre­senta m eios para que 0 investigador entenda 0 processo e as condi<;:oes de produ<;:ao de urn discurso (fala, documento); 0

sentido do campo semantico em que ele e produzido; e uma

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tecnicas de analise de material qualitativo

elabora<;:ao contextualizada e crftica das realiza<;:oes discursi­vas (corpus, amostra) .

Como tecnica, Pecheux e Orlandi propoem varias opera­<;:oes descritas a seguir: 0 texto deve ser submetido a varias opera<;:oes classificatorias, simultaneamente semanticas, sin­taticas e logicas. De acordo com recheux, cada frase deve ser decomposta em proposi<;:oes, 0 que implica varias opera<;:oes linglifsticas: substitui<;:ao das anaforas4 pelos termos que elas representam; 0 restabelecimento da ordem corrente na frase; reagrupamento dos term os de liga<;:ao e explicita<;:ao de pro­posi<;:oes latentes. Ou seja, 0 pesquisador deve, de certa for­ma, refazer 0 discurso, buscando as dependencias funcionais da linguagem evidenciadas nas frases. Assim, as proposi<;:oes VaG se reduzindo a unidades mfnimas que, dentro da perspec­tiva fenomenologica, Schutz (1979) chamana de ?st/l1turas de releviincia. Mas a sugestao de Pecheux e que 0 pesquisador che­gue a proposi<;:oes passfveis de serem colocadas em graficos e classificadas de forma binana. A partir de entao, 0 pesquisador procede aanalise automatica do material. Isto e, codificados os enunciados elementares e as rela<;:oes binarias, os dados 150 ­dem ser computadorizados em busca de correla<;:oes.

Para recheux, a possibilidade da analise automatica vern do fato de que os mecanismos de produ<;:ao do discurso sao caracterizados pela repeti<;:ao do iden tico, atraves de formas diferenciadas . Tal co ncep<;:ao se apoia na analise estrutural dos mitos em Levi-Strauss (1967) e na propria leitura que esse autor faz da concep<;:ao estruturalista do materialismo histori­co em Althusser (1967): "busca-se, por tras das varia<;:oes de superffcie, 0 princfpio gerador que organiza 0 conjunto" (1988, p. 180) .

Orlandi apresenta uma proposta tecnica mais flexfvel. Ela trabalha utilizando os seguintes procedimentos: (1) em pri­

, 0 lermo lind/om diz respeilO as repeli,6es de uma Oll mais palavras no in ic io de duas ou mais frases. de membros da mesma Frase ou de dois ou mais ve rsos.

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326 327 tecnicas de analise de material qualitativo

meiro lugar procede ao estudo das palavras do texto (faz a separa<;:ao dos termos constituintes, analise dos adjetivos, dos substantivos, dos verbos e dos adverbios); (2) em segundo lugar, realiza a analise da constru<;:ao das frases; (3) em tercei­ro lugar, constroi uma rede semantica que evidencia uma di­namica interrnediaria entre 0 social e a gramatica; (4) por fim, elabora a analise, cOflsiderando a produ<;:ao social do texto como constitutiva de seu proprio sentido

Sem duvida, a proposta de analise do discurso, que sai do campo reduzido da lingliistica e se coloca no interior das Cien­cias Sociais, e urn bern inestimavel para a pesquisa qualitativa, mesmo quando 0 investigador nao a utilize em todo 0 seu rigor tecnico. Sua maior contribui<;:ao para quem trabalha com analise social e dar elementos para contextualiza<;:ao da fala, ultrapassando em complexidade as posturas positivistas ou fenomenologicas. No entanto, sua pretensao de substituir a Analise de Conteudo e radicalmente questionada por Bardin,s segundo a qual:

Por debaixo de uma linguagem obscondita que por vezes mascara banalidades, sob urn formalismo que por vezes escapa ao leitor, para alem das constru<;:oes teoricas, que ao nivel da pratica da analise sao improdutivas a cur­to prazo, existe uma tentativa totalitaria (no sentido em que se procura integrar, no mesmo procedimento, conhe­cimentos adquiridos ou avan<;:os ate al dispersos ou de natureza disciplinar estranha: teoria e pratica linglilstica, teoria do discurso como enuncia<;:ao, teoria da ideologia e automatiza<;:ao dos procedimentos) cuja ambi<;:ao e sedu­tora, mas em que as realiza<;:oes sao anedoticas. 0 que e deploravel! (1979, pp. 220-2).

Bardin e urn estudioso da Analise de Con teudo e ob\~amente sua disCllssao com Pecheux esta influenciada por uma visao da Ana lise do Discurso que pretende destruir sua pretensa concorrente.

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tecnicas de analise de material qualitativo

Orlandi, no entanto, avan<;:a nas propostas concretas de a<;:ao: suas forrnula<;:oes sao menos estruturadas e fechadas que as de pecheux. As reflexoes da autora sobre 0 discurso peda­gogico, 0 discurso politico, 0 discurso religioso e 0 discurso escolar ampliam 0 campo da abordagem critica e desvendam os mecanismos de domina<;:ao que se escondem sob a lingua­gem. No caso de Pecheux, 0 que dificulta bastante a opera­cionaliza<;:ao da proposta e a sua submissao aos procedimen­tos estruturalistas, subtraindo muito da flexibilidade que a teo ria pretende dar a produ<;:ao de sentido. A redu<;:ao do dis­curso a proposi<;:oes binarias e a finaliza<;:ao do processo por meio da analise automatizada nao permitem ao investigador a compreensao das reia<;:oes dialeticas constitutivas da realiza­<;:ao social.

A Hermeneutica Dialetica

A vida pensa e 0 pensamen to ? c

- GADAMER, 1999, JX3 26

Buscq aprofundar a articula<;:ao entr~ermeneutica e dia­letica investindo nas raizes de~ naosa d' fussao, apenas do ponto de vista do "co mo fazer" sim, tam bern, do "como

pensar". Na verdade, a a~ordoem desse assunto junta duas questoes fundamentais: a s jetiva<;:ao do objeto e a objetiva­<;:800 do sujeito, temas cry ais da sociologia do conhecimento, que, do ponto de vis :{ metodologico, costumam ser reduzi­das aos problema as rela<;:oes entre quantitativo e qualitati­vo na praxis cie ifica.

Come<;:o ortanto, problematizando os dois conceitos centrais n quais 0 texto se sustenta, a hermeneutica e a diale­tica. Pa ,a seguir, articula-Ios como caminho de possibilida­des J constru<;:ao teorico-metodologica de base empirica e dy-umental. 0 conceito de saude sera tratado apenas como

, urn caso de aplica<;:ao dessa abordagem, amedida que, seguin­

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354 355 tecnicas de analise de material qualitativo

micas e politicas, de sua participa<;:ao e inser<;:ao nas tot ida­des maiores como bairro, cidade, pais; (b) do map mento do sistema de saude local e proximo (hospitais, ntros de saude, farrnacias, outras facilidades e alternativas rapeuticas, mesmo populares) dos profissionais, da acessibi . dade aos ser­vi<;:os; (c) do perfil de morbimortalidade da opula<;:ao resi­dente e objeto da investiga<;:ao. Esse primeir: nivel e 0 plano da totalidade (sempre totalidade parcial) 9 do contexto, que significa, segundo Lukacs:

Urn todo coerente em que ca a elemento esta, de uma maneira ou de outra, em rela 0 com outro elemento; e de outro, que essas rela<;:oes :D . rrnam na propria realidade objetiva, correla<;:oes conere as, con juntos, unidades liga­das entre si de maneiras omplementares diversas, mas sempre determinadas (1 67, p. 240).

No momento concert de interpreta<;:ao dos dados, 0 sen­tido da totalidade se re re tanto ao nivel das determina<;:oes como a do recurso int retativo pelo qual se busca descobrir as conexoes que a ex eriencia empfrica mantem com 0 plano das rela<;:oes essenc' is. Nem sempre esse momento pode ser captado apenas at aves das representa<;:oes sociais. A opera<;:ao intelectual pela ual se obtem a totalidade conereta implica urn moviment da razao e da experiencia, uma articula<;:ao da base material das ideias. Do ponto de vista historico, a pos­tura compr nsiva reconhece os fenomenos sociais sempre como res tados e efeitos da atividade criadora, tanto ime­diata qu to institucionalizada . Portanto, toma como centro da anal' e a ratica social e a a ao humana e as considera como result os de condi<;:oes anteriores, exteriores, interiores e tam­bern omo praxis. Isto e, 0 ato humano que atravessa 0 meio so 'al conserva as determina<;:oes, mas se realiza no sujeito que v' e, pensa, sente e reflete 0 mundo. "0 homem faz a histo­na: ele se objetiva nela e nela se aliena" (Sartre, 1978, p. 150) .

~ tecnicas de analise de material qualitativo

As concep<;:oes de saude e doen<;:a sao frutos e manifesta<;:oes de condicionamentos socio-historicos que se vinculam a aces­so a servi<;:os, tradi<;:oes culturais, concep<;:oes dominantes so­bre 0 assunto e da inter-rela<;:ao de tudo isso. Portanto, saude e doen<;:a sao fen6menos sociais nao apenas porque expres­sam certo nfvel de vida ou porque correspondem a certas pro­fissoes e praticas. Mas porque sao manifesta<;:oes da vida mate­rial, das carencias, dos limites sociais e do imaginario coletivo.

o segundo momenta interpretativo e 0 ponto de partida e 0 ponto de chegada de qualquer investiga<;:ao: e 0 encontro com os fatos empfricos, no caso, com urn conjunto de con­cep<;:oes sobre saude e doen<;:a Epreciso encontrar nos relatos dos inforrnantes 0 sentido, a logica interna, as proje<;:oes e as interpreta<;:oes. Isto e, nesses textos existe, ao mesmo tempo, uma especffica significa<;:ao cultural propria do grupo e uma vincula<;:ao muito mais abrangente que junta esse grupo a cfr­culos cada vez mais abrangentes e intercomunicaveis da reali­dade, tratados no primeiro item.

Na busca da significa<;:ao especffica, e preciso que a analise contemple: (a) as comunica<;:oes individuais (entrevistas, his­torias de vida, resultados de discussoes de grupo); (b) as ob­serva<;:oes de condutas, costumes e rela<;:oes relativas ao tema saude e doen<;:a; (c) a analise das falas sobre institui<;:oes ofi­ciais (e outras inforrna<;:oes sobre elas) e sobre outras entida­des ou organiza<;:oes alternativas que ofere cern servi<;:os no lo­cal; (d) observa<;:ao de cerim6nias e ritos atinentes ao tema.

A interpreta<;:ao exige elabora<;:ao de Categorias Analfticas (geralmente trabalhadas desde 0 infcio da investiga<;:ao) capa­zes de desvendar as rela<;:oes mais abstratas e mediadoras para a parte contextual e de Categorias Empiricas e Operacionais, cria­das a partir do material de campo, contendo e expressando rela<;:oes e representa<;:oes tfpicas e especfficas do grupo em questao. A partir dos dados colhidos e acumulados, 0 investi­gador se volta para os fundamentos das teorias que fizeram parte da elabora<;:ao dos conceitos iniciais na fase explorato­

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ria, para por em duvida ideias evidentes anteriormente e para verificar em que medida 0 momenta p6s-trabalho de campo lhe exige aprofundamento de outros tern as. Assim, 0 pesqui­sador constr6i uma nova aproxima<;ao do objeto: 0 pensa­mento antigo (proveniente da fase explorat6ria) que e nega­do, mas nao exclufdo, encontra outros Ii mites e se ilumina na elabora<;ao do momento presente. 0 novo contem 0 antigo, incluindo-o numa nova perspectiva.

Como operacionalizar esse segundo momento que, na verdade, constitui 0 maior desafio da fase de analise? Por meio de tres fases, cujos passos sugiro que sejam os seguintes:

.. OTdena~ao dos dados o momenta da ordena<;ao engloba tanto as entrevistas como

o conjunto do material de observa<;ao e dos documentos popu­lares e institucionais, referentes ao tema concep<;oes de saude e doen<;a. 6 Essa etapa inclui: (a) transcri<;ao de fitas-cassete; (b) releitura do material; (c) organiza<;ao dos relatos em determi­nada ordem, 0 que ja supoe urn infcio de dassifica<;30; (d) orga­niza<;ao dos dados de observa<;ao, tambem em determinada ordem, de acordo com a proposta analftica . Essa fase da ao in­vestigador urn mapa horizontal de suas descobertas no campo.

Entendo este trabalho como urn processo hermeneutico, em que se toma 0 material empfrico sobre concep<;oes de sau­de e doen<;a como urn conjunto, urn Corpus, a ser tecnica­mente trabalhado. Caso a pesquisa empfrica tenha sido feita com grupos diferenciados por classe social, por idade, por re­ligiao (todas essas divisoes sao aqui hipoteticas), varios sub­conjuntos devem ser criados, visando-se a uma leitura que busque homogeneidades e diferencia<;oes por meio de com­para<;oes e contrastes.

,. Nao entramos aqui nos detalhes referentes a Ordena~ao de Dados. lndicamos co mo bibliografia complementar 0 trabalho de Poirier e! at. Les Ricit.s de \lie. Pari s: PUF. 1983

tecnicas de analise de material qualitativo

... Classifica~ao de dados E preciso ter em mente que nao e 0 campo que cria 0

chamado "dado", uma vez que a informa<;ao que de la emerge ja traz em seu interior uma constru<;ao de indaga<;oes e respos­tas. Neste momento 0 processo de constru<;ao do conheci­mento se complexifica. Proponho que 0 momento classifica­t6rio seja constitufdo pelas seguintes etapas:

.. Leitura horizontal e exaustiva dos textos, prolongando­se uma rela<;ao interrogativa com eles. Apenas provisoriamente toda a aten<;ao do pesquisador deve estar voltada para esse material. Se Fosse possIvel sugerir uma atitude, a ideal seria fe­char olhos e ouvidos para qualquer interferencia contextuali­zadora, tal qual e proposto pela analise fenomenol6gica (Ca­palbo, 1979), mas infelizmente isso e quase impossfve!. Costaria, porem, de chamar aten<;ao para a importancia desse momento, para nao ocorrer algo muito comum das produ<;6es qualitati­vas: ou a mera exposi<;ao das falas com comentarios do pesqui­sador ou urn solene menosprezo dos achados ern campo.

Essa etapa inicial de contato corn 0 material de campo exi­ge uma leitura de cada entrevista e de todos os outros do­cumentos, anotando-se (no computador ou ern papel impres­so) as primeiras impressoes do pesquisador, iniciando-se, assim, a busca de coerencia interna das informa<;oes.

o material escrito necessita ser cuidadosamente analisa­do: frases, palavras, adjetivos, concatena<;ao de ideias, senti­do geral do texto. Sobre 0 tema, Bakhtin (1986) sugere algu­mas regras metodol6gicas: (1) n30 separar a ideologia da realidade material do signo; (2) nao dissociar 0 signo das for­mas concretas de comunica<;ao (entendendo-se que 0 signo faz parte de urn sistema de comunica<;ao social organizado); (3) nao dissociar a comunica<;ao e suas formas da base mate­rial em que ela se sustenta.

Esse exercfcio inicial, denominado por alguns autores como "leitura flutuante" permite apreender as estruturas de relevan­

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cia dos atores sociais, as ideias centra is que tentam transmitir e os momentos-chave e suas posturas sobre 0 tema em foco (no caso, como exemplo as concep<;:oes de saudejdoen<;:a). A aten<;:ao imergente do pesquisador sobre 0 material 0 ajudara pouco a pouco a construir categorias empfricas. Urn passo futuro sera confronta-Ias com as categorias analfticas, teorica­mente estabelecidas como balizas da investiga<;:ao, e buscar as inter-rela<;:oes e interconexoes entre elas.

• Leitura transversal. 0 segundo momenta e 0 da leitura leitura transversal de cada subconjunto e do conjunto em sua totalidade. 0 processo e do recorte de cada entrevista ou do­cumento em "unidade de sentido", por "estruturas de rele­vancia", por "topicos de informa<;:ao " ou por "temas". Os cri­terios de classifica<;:ao em primeira instancia podem ser tanto variaveis empfricas como variaveis teoricas ja construidas pelo pesquisador. No processo classificatorio, 0 pesquisador sepa­ra temas, categorias ou unidades de sentido, colocando as partes semelhantes juntas, buscando perceber as conexoes entre elas, e guardando-as em codigos ou gavetas.

Terminado este primeiro esfor<;:o em que muitas "gavetas" foram abertas, 0 pesquisador parte para uma segunda tarefa, fazendo urn enxugamento de suas classifica<;:oes; agrupando tudo em numero menor de unidades de sentido e buscando compreender e interpretar 0 que foi exposto como mais rele­vante e representativo pelo grupo estudado. Aqui se faz uma reflexao sucessiva, em que a relevancia de algum tema, uma vez determinado (a partir da elabora<;:ao teo rica e da evidencia dos dados de campo), permite refinar 0 movimento classificato­rio. As multiplas gavetas sao reagrupadas em tomo de catego­rias centra is, concatenando-se numa logica unificadora.

• Analise Final. As etapas de ordena<;:ao e classifica<;:ao de­mandaram uma profunda inflexao sobre 0 material empirico, que deve ser considerado 0 ponto de partida e 0 ponto de chegada da compreensao e da interpreta<;:ao. Esse movimento circular, que vai do empirico para 0 teo rico e vice-versa, que

tecnicas de analise de material qualitativo

dan<;:a entre 0 concreto e 0 abstrato, que busca as riquezas do particular e do geral e 0 que se pode chamar, parafraseando Marx (1973), " 0 concreto pensado".

Levando-se em conta 0 exemplo adotado, a pesquisa so­bre concep<;:oes de saude e doen<;:a deve apresentar aos leito­res urn quadro complexo de respostas voltadas para esclare­cer a logica interna de urn grupo determinado sobre 0 tema em pauta, quando 0 pensa, quando fala dele, quando se rela­ciona e quando a partir dele se comporta, projeta e planeja sua vida. Pois, como lembra Sartre (1978) , as significa<;:6es que vern do ser humano e de seu projeto se inscrevem por toda parte, na ordem das coisas e nas rela<;:oes mediadas pelas es­truturas enquanto a<;:ao humana objetivada.

• Relatorio. Estou usando 0 termo relat6rio para me referir a comunica<;:ao dos dados de uma pesquisa. Nesse sentido, relatorio passa a ser sinonimo da formata<;:ao final de uma monografia, de uma disserta<;:ao ou de uma tese, ademais de ser 0 produto (provisoriamente) acabado de uma determina­da investiga<;:ao. 0 relatorio final de uma pesquisa deve confi­gurar-se como uma uma sfntese, na qual 0 objeto de estudo reveste, impregna e entranha todo 0 texto. Costumo dizer a meus alunos: da primeira aultima linha de seu trabalho, falem de seu objeto. 0 contexto, as determina<;:oes abstratas e tudo mais, nessa etapa do "concreto pensado", emanam do objeto e nao ao contrario. Portanto, sera urn trabalho incompleto 0 que apenas descreve, ipsis litteris, 0 processo de trabalho do inves­tigador. A compreensao e a interpreta<;:ao em seu Formato fi­nal, alem de superar a dicotomia objetividade vs. subjetivida­de, exterioridade vs. interioridade, analise vs. sfntese, revelara que 0 produto da pesquisa e urn momenta da praxis do pes­quisador. Sua obra desvenda os segredos de seus proprios condicionamentos, pois a investiga<;:ao social como processo de produ<;:ao e produto e, ao mesmo tempo, uma objetiva<;:ao da realidade e uma objetiva<;:ao do investigador que se torna tambem produto de sua propria produ<;:a.o.

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Do ponto de vista operativo, relat6rio e 0 instrumento mais tradicional de apresenta<;:ao dos resultados de uma pesquisa. Ha algumas normas basicas sobre esse tipo de documento. A folha de rosto deve conter: (a) titulo que corresponda ao obje­to de investiga<;:ao; (b) nomes dos participantes da equipe de avalia<;:ao com suas respectivas fun<;:6es; (c) nomes ou logomar­cas das institui<;:6es realizadoras do trabalho e das patrocinado­ras e (d) data de finaliza<;:ao do informativo. Todos esses deta­lhes facilitam a comunica<;:ao direta e a cataloga<;:ao do trabalho.

Em seguida, caso 0 texto seja apresentado em capitulos e fundamental acrescentar 0 indice do trabalho. 0 conteudo pode ser apresentado de varias formas, mas e preciso manter o tom direto e ao mesmo tempo complexo, nunca se omitin­do os seguintes termos: 0 objeto, os objetivos; 0 hist6rico, 0

contexto e as circunstancias da investiga<;:ao; os conceitos cen­trais que balizaram 0 olhar cientifico, de forma sucinta e pro­blematizada; 0 metodo ou os metodos adotados com suas respectivas modalidades de operacionaliza<;:ao tecnica; a des­cri<;:ao, analise e problematiza<;:ao dos achados empfricos; os resultados e, se for 0 caso, as recomenda<;:6es.

Quem elabora urn relat6rio precisa ter sempre em mente 0

carater da pesquisa que realizou: se foi uma pesquisa basica, operativa ou estrategica, pois a forma de realizar a sintese deve refletir a proposta do trabalho. Em qualquer hip6tese, esse ins­trumento precisa ressaltar os pontos mais relevantes do estudo e, ainda, descrever as condi<;:6es de realiza<;:ao da pesquisa, como ja foi fundamentado na parte que trata do trabalho de campo.

Para facilitar sua leitura, 0 relat6rio deve ser escrito em linguagem clara, objetiva, e apresentar, sempre que possivel, formatos sinteticos e visuais que permitam compara<;:6es, como e 0 caso de graficos, tabelas, mapas ou outros dispositivos. Dados mais complexos e de diffcil compreensao podem ser postos em anexos, desde que explicados de forma simplifica­da no relat6rio. Urn estudo bern planejado e acompanhado durante todo 0 seu processo de realiza<;:ao e 0 pre-requisito da confian<;:a para apresenta<;:ao de resultados fidedignos.

Capitulo 12 TRIANGULAC;AO DE METODO

QUANTITATIVOS E QUALITATWOS 1

N 0 CAP iTU LO QUE TRATA DOS CjiNCEITOS BA.SICOS de pesquisa, discuti os problemas epi(emol6gicos das rela<;:6es entre metodos qUantitativos~Halitativos , Neste momento ofere<;:o ao leitor urn caminho ae possibilidades em que os dois termos podem se encon} ar, superando dicotomias e ven­cendo, do ponto de vista quantitativo, os marcos do positi­vismo; e, sob a 6tica qu itativa, as restri<;:6es relativas acom­preensao da magnitu ' e dos fenomenos e process os sociais . Falo de urn tipo de bordagem, a Triangulm;iio de Metodos que pode ser compre dida como uma dinamica de investiga<;:ao que integra a alise das estruturas, dos processos e dos re­sultados, a c mpreensao das rela<;:6es envolvidas na imple­menta<;:ao d s a<;:6es e a visao que os atores diferenciados cons­troem so e todo 0 projeto: seu desenvolvimento, as rela<;:6es hierar icas e tecnicas, fazendo dele urn construto (Schutz, 1982 especffico . Alem da integra<;:ao objetiva e subjetiva nos pro €:ssos de pesquisa, esta proposta inclui os atores contac­

1 Como anunciei na ap resema<;ao deSla nona edi<;ao do livro 0 Desafio do Conheci­mento. resolvi acrescentar e ampliar algumas panes dessa obra. No caso deste ca pitulo 'Triangula\ao de MelOdos ", 0 texto e, em pane, reprodu<;ao do capitulo introdutci ri o que escrevi para 0 livro Avnliar;ilo por Triangular;ilo de Metodos, publica­do pela Edilora Fiocruz, Rio de Janeiro, em 2005.

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