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SUS IE IE Ministério da Saúde Fundação Nacional de Saúde ISSN 0104-1673 FUNASA Projeto Bambuí: um Estudo Epidemiológico de Características Sociodemográficas, Suporte Social e Indicadores de Condição de Saúde dos Idosos em Comparação aos Adultos Jovens The Bambuí Project: an Epidemiological Study of Socio Demographic Characteristics, Social Support and Selected Health Status Indicators of the Elderly Compared with Young Adults Uso das Causas Múltiplas de Morte em Saúde Pública The Use of Multiple Causes of Death in Public Health Doenças Crônico-Degenerativas em Adultos da Região Centro-Sul de Belo Horizonte: Análise sob a Perspectiva de Causas Múltiplas de Morte Chronic-Degenerative Diseases among Adults of the Center-South Region of the Belo Horizonte City: Analyses by Multiple Causes of Death Approach Morbidade por Causas Externas em Crianças de 0 a 12 Anos: uma Análise dos Registros de Atendimento de um Hospital do Rio de Janeiro External Causes of Morbidity in Children Aged 0-12 Years: an Analysis of of Medical Records at an Emergency Hospital in Rio de Janeiro Volume 10 - Nº 4 Out/Dez 2001 INFORME EPIDEMIOLÓGICO DO SUS INFORME EPIDEMIOLÓGICO DO SUS

Ministério da Saúde Fundação Nacional de Saúde INFORME …bvsms.saude.gov.br/bvs/periodicos/inf_epi_2001_4completo.pdf · ATPS/MS - DF Comitê Editorial José Cássio de Moraes

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SUSIEIE

Ministério da SaúdeFundação Nacional de Saúde

ISSN 0104-1673

FUNASA

Projeto Bambuí: um Estudo Epidemiológico de Características Sociodemográficas, Suporte Social e Indicadores de Condição de Saúde dos Idosos em Comparação aos Adultos JovensThe Bambuí Project: an Epidemiological Study of Socio Demographic Characteristics, SocialSupport and Selected Health Status Indicators of the Elderly Compared with Young AdultsUso das Causas Múltiplas de Morte em Saúde PúblicaThe Use of Multiple Causes of Death in Public HealthDoenças Crônico-Degenerativas em Adultos da Região Centro-Sul de Belo Horizonte: Análise sob a Perspectiva de Causas Múltiplas de MorteChronic-Degenerative Diseases among Adults of the Center-South Region of theBelo Horizonte City: Analyses by Multiple Causes of Death ApproachMorbidade por Causas Externas em Crianças de 0 a 12 Anos: uma Análise dos Registros de Atendimento de um Hospital do Rio de JaneiroExternal Causes of Morbidity in Children Aged 0-12 Years: an Analysis of of MedicalRecords at an Emergency Hospital in Rio de Janeiro

Volume 10 - Nº 4 Out/Dez 2001

INFORMEEPIDEMIOLÓGICO DO SUSINFORMEEPIDEMIOLÓGICO DO SUS

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Presidente da RepúblicaFernando Henrique Cardoso

Ministro da SaúdeJosé Serra

Presidente da Fundação Nacional de SaúdeMauro Ricardo Machado Costa

Diretor-ExecutivoGeorge Hermann Rodolfo Tormin

Diretor do Centro Nacional de EpidemiologiaJarbas Barbosa da Silva Júnior

Diretor do Departamento de Saúde IndígenaUbiratan Pedrosa Moreira

Diretor do Departamento de Engenharia de Saúde PúblicaSadi Coutinho Filho

Diretor do Departamento de AdministraçãoCelso Tadeu de Azevedo Silveira

Diretor do Departamento de Planejamento e Desenvolvimento InstitucionalAntônio Leopoldo Frota Magalhães

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Ministério da Saúde

Fundação Nacional de Saúde

ISSN 0104-1673

Volume 10 - No 4Out/Dez 2001

INFORME EPIDEMIOLÓGICO DO SUS

SUS

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25.000 exemplares

Editoração Eletrônica

Edite Damásio da SilvaMarcos Antonio Silva de Almeida

Revisão de TextoWaldir Rodrigues Pereira

Projeto Gráfico e EditorialAndré Falcão Tatiana Portela

Tiragem

CVE/SES - SPFIOCRUZ - RJFCM/UNICAMP - SPISC/UFBA - BAFM/USP - SPENSP/FIOCRUZ - RJDSC/UNB - DFATPS/MS - DF

Comitê Editorial

José Cássio de Moraes Maria Cecília de Souza MinayoMariliza Berti de Azevedo BarrosMaurício Lima BarretoMoisés GoldbaumPaulo Chagastelles Sabroza Pedro Luiz TauilAntonio Ruffino Netto

Editor GeralJarbas Barbosa da Silva Júnior

Consultores

Maria Adelaide MillingtonFábio de Barros Correia Gomes Eduardo Hage CarmoFabiano Geraldo Pimenta JúniorMaria de Lourdes Souza MaiaGuilherme Franco NettoLenita Nicoletti Marcia Furquim Maria da Glória Teixeira Maria Lúcia Penna

Editores Executivos

Maria Regina F. Oliveira Maria Margarita Urdaneta GutierrezAna Maria Johnson de Assis

CENEPI/FUNASA-DFCENEPI/FUNASA-DFCENEPI/FUNASA-DFCENEPI/FUNASA-DFCENEPI/FUNASA-DFCENEPI/FUNASA-DFFIOCRUZ - DFFSP/USP - SPUFBA - BAUFRJ - RJ

CENEPI/FUNASA-DFCENEPI/FUNASA-DFCENEPI/FUNASA-DF

CENEPI/FUNASA-DF...................................

........................................................

.............................................

...................................

Os artigos publicados são de responsabilidade dos autores. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte.

2000. Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde

Informe Epidemiológico do SUSIESUS

O Informe Epidemiológico do SUS é distribuído gratui-

tamente. Para recebê-lo, escreva para o CENEPI/FU-

NASA no endereço:

Setor de Autarquias Sul, Qd. 4, Bl. N, Sala 612

70.050-902 Brasília - DF

ou para o endereço eletrônico [email protected]

A versão eletrônica do IESUS está disponível na

Internet:

http://www.funasa.gov.br

Informe Epidemiológico do SUS / Centro Nacional de Epidemiologia, coord. - Brasília : Ministério da Saúde : Fundação Nacional de Saúde, 1992 -

Trimestral

ISSN 0104-1673

1. Epidemiologia

FICHA CATALOGRÁFICA

Correção BibliográficaRaquel Machado Santos

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SUMÁRIO................................................................................

volume 10, nº 4 outubro/dezembro de 2001

IESUSInforme Epidemiológico do SUS

Editorial

Projeto Bambuí: umm Estudo Epidemiológico de características Sociodemográficas, Suporte Social e Indicadores de Condição de Saúde dos Idosos em Comparação aos Adultos Jovens - The Bambuí Project: an Epidemiological Study of Socio Demografic Characteristics, Social Support and Selected Health Status Indicators of the Elderly Compared with Young AdultsMaria Fernanda F. de Lima e Csta, Henrique L Guerra, Josélia O. A. Firmo e Elizabeth Uchôa

Uso das Causas Múltiplas de Morte em Saúde Pública - The Use of Multiple Causes of Death inn Public HealthLenice Harumi Ishitani e Elizabeth França

Doenças Crônico-Degenerativas em Adultos da Região Centro-Sul de Belo Horizone: Análise sob a Perspectiva de Causas Múltiplas de Morte - Chronic-Degenerative Diseases among Adults of the Center-South Regiion of the Belo Horizonte City: Analyses by Multiple Causes of Death ApproachLenice Harumi Ishitani e Elizabeth França

Morbidade por Causas Externas em Crianças de 0 a 12 Anos: uma Análise dos Registros de Atendimento de um Hospital do Rio de Janeiro - xternal Causes of Morbidity in Children Aged 0-12 Years: an Analysis of Medical Records at an Emergency Hospital in Rio de JaneiroInês E. Mattos

Normas para Publicação

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Editorial

Novas perspectivas nas análises de padrões de desgaste degrupos populacionais

No século vinte, as populações hu-manas apresentaram profundas alteraçõesque, em pouco tempo, vieram modificarpadrões demográficos históricos queexpressavam o resultado de experiênciasseculares de adaptação das sociedades aosseus contextos ambientais, sempre comcustos elevados em relação a mortes prema-turas e sofrimento físico. Essas mudançasdecorreram de transformações no conjuntodas organizações sociais, destacando-se osmovimentos populares por melhores con-dições de vida e a rapidez na incorporação edifusão de inovações técnicas.

Conseqüentemente, mesmo nas forma-ções socioespaciais periféricas, as taxas demortalidade na infância e as taxas de nata-lidade caíram de modo rápido e acentuado,embora de forma defasada, o que levou ainédito crescimento das populações e au-mento das demandas sociais. A ênfase napreocupação neomaltusiana com a questãodas taxas elevadas de crescimento popula-cional, que logo se mostraram temporárias,limitou até há pouco a nossa capacidade dedar destaque a outros componentes funda-mentais deste processo de transição demo-gráfica, que vieram a se mostrar como de maiore duradouro impacto sobre as condições devida e de saúde: a intensa e irreversível urba-nização e a profunda alteração da estruturaetária, com o progressivo aumento da partici-pação dos idosos, já excluídos da reproduçãobiológica e dos processos tradicionais detrabalho.

Os modelos de sociedades urbanasevoluíram, na metade do século passado,daqueles apoiados no trabalho, que enfati-zavam o desenvolvimento social, para outroscentrados na expansão do consumo deprodutos e serviços disponíveis em mercadosglobalizados e sempre em expansão. Asimplicações que isso acarretou para osprojetos de saúde foram marcantes. Questõescomo o prolongamento progressivo daduração da vida humana, o uso difundido depróteses mecânicas e químicas e a redução damorte a um evento técnico, desprovido de valorsimbólico, vieram responder mais aos estí-

mulos e expectativas de ampliação demercados da crescente indústria médica doque a propostas concretas relativas a me-lhores condições de saúde ou mesmo redu-ção do sofrimento humano.

No Brasil, a intensa medicalização dasdemandas sociais, iniciada no período militare acentuada com a integração desigual damaior parte da população como consumidoresdo circuito inferior urbano, conseguiu efeti-vamente deslocar a ênfase do direito àmelhoria da qualidade de vida para a questãodo acesso a produtos e serviços de atençãomédica, cuja oferta passou a expressar asprioridades de um dos setores mais dinâmicosda economia.

Difundiu-se, assim, a ilusão de que atécnica seria capaz de compensar os des-gastes decorrentes da precariedade dascondições de vida. Mas, o que se constatou,foi a expansão do sentimento de desamparonas populações.

Ao contrário do que previa a ideologiacientífica da transição epidemiológica, aredução da mortalidade precoce por doençasinfecciosas e o conseqüente aumento da ex-pectativa de vida não resultaram em melhorescondições de saúde das populações. Oacúmulo de morbidade como conseqüênciado desgaste devido às condições precáriasde vida e trabalho, o sofrimento mental decor-rente da alienação social e as várias formasde violência produziram um quadro que osmodelos de atenção médica não conseguemreverter.

A conscientização das conseqüênciasdesses processos, orientados até agora maispela lógica da reprodução do capital do queda reprodução da vida, impõe a revisão domodo como tem sido tratadas as questõesdas mortes prematuras, das agressões e daqualidade de vida e cuidado no momento damorte inevitável dos idosos. A alternativaconcreta à expansão inesgotável da deman-das e ofertas de serviços e produtos dirigidosa uma atenção médica de custo cada vez maiore de precários resultados parece ser a recu-peração do valor de duas práticas essenciais

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na tradição da humanidade: o cuidado e otrabalho.

Se, agora, já podemos pensar em outrasformas de trabalho além daquelas priorizadasno modelo industrial tradicional, surge aocasião de construir projetos de saúde queconsiderem outras oportunidades de partici-pação das pessoas e que não priorizem apenasseu papel de consumidor e sua inserção nomercado, mas respeite sua prática e inserçãosocial, independente da idade de cada um.

A possibilidade de saúde dependeriamais de um contexto de cuidados e promoçãode competências singulares do que apenasdo acesso a técnicas de tratamento, sendoperfeitamente compatível a condição de saúdecom a presença de limitações decorrentes deenfermidades ou da idade, desde que nãoinviabilizem a inserção social e a busca derealização pessoal. Por outro lado, a simplesextensão da duração da vida pode estarrepresentando apenas a acumulação de dor,sofrimento, dependência e medo, se não foracompanhada da possibilidade de respeito eparticipação.

Estudos como estes apresentados nestenúmero do Informe Epidemiológico do SUScomeçam a mostrar como abordar osproblemas da saúde e da morte, em perspec-tivas que permitam tratar essas questões coma complexidade necessária, sem a redução asimples estatísticas.

O artigo de Maria Fernanda de Lima eCosta e colaboradores apresenta os resulta-dos de estudo de condições de vida e saúdede população de idosos em uma cidade depequeno porte, mostrando como o padrãourbano, nas suas dimensões demográfica, de

difusão de fatores de risco e de consumo, jáestá presente mesmo nas pequenas locali-dades do País, integradas em uma extensamalha urbana, que subordina as áreas rurais euniversaliza seus projetos, problemas emodelos de atenção.

Os dois artigos de Lenice Ishitani eElizabeth França apresentam a questão dascausas múltiplas de morte, abordando um dosprincipais aspectos metodológicos dosprocedimentos de classificação e sua utili-zação nos serviços de saúde. O outro trata dasua aplicação na análise das causas múltiplasde morte por doenças crônico-degenerativasem adultos de uma região metropolitana. Autilização do conceito de causas múltiplas demorte possibilita uma primeira aproximação emrelação à perspectiva de deixar de entender amorte como evento isolado e passar a consi-derá-la como processo integrado nomovimento da vida, refletindo o seu desgastenas múltiplas formas de adoecer, que expres-sam as condições da experiência vivida.

Finalmente, o trabalho de Inês Mattosdiscute a morbidade por causas externas emcrianças a partir dos registros de atendimentohospitalar. O descuido e a violência contracrianças e adolescentes são o mais dramáticocomponente do desgaste de uma sociedade,na medida em que coloca em questão a perdade compromisso em sua continuidade e nareprodução da vida. No momento em que essasquestões emergem, a busca de indicadoresque nos imponham a reflexão sobre asprioridades do sistema de saúde e a ampliaçãodo conceito de cuidado certamente é uma dasprincipais contribuições que os epidemiolo-gistas podem prestar à sociedade.

Paulo Chagastelles SabrozaMembro do Comitê Editorial - IESUS

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Projeto Bambuí: um Estudo Epidemiológico de Características Sociodemográficas, Suporte Social e

Indicadores de Condição de Saúde dos Idosos em Comparação aos Adultos Jovens

Informe Epidemiológico do SUS 2001; 10(4) : 147 - 161.

ResumoO presente trabalho tem por objetivos: (a) descrever a distribuição de características sociodemográficas, indicadores de suporte social e indicadores da condição de saúde da população idosa e (b) comparar estas características com as da população mais jovem. Todos os habitantes da cidade de Bambuí (MG) com 60 ou mais anos (n=1,742) e uma amostra aleatória de 1.020 moradores com 18-59 anos de idade foram selecionados para o estudo. Destes, 1,606 (92,2%) e 909 (89,1%) participaram, respectivamente. As ca-racterísticas sociodemográficas dos idosos, em comparação às dos mais jovens, foram muito semelhantes às da população brasileira, no que se refere à distribuição etária, feminização do envelhecimento, maior fecundidade, menor escolaridade, menor renda domiciliar e ao aumento com a idade da proporção de chefes de família e de viúvas. A relação entre os sexos aproximou-se mais da composição das populações urbanas do país do que das rurais. O conjunto de dados sociodemográficos estudados apontou para a maior vulnerabilidade dos idosos, em relação aos mais jovens, especialmente das mulheres. Os indicadores de suporte social investigados mostraram uma importante rede de solidariedade entre gerações, verificada através da ajuda que o idoso recebe (financeira, moradia e/ou companhia) e presta à sua família. Todos os indicadores utilizados mostraram uma piora do estado de saúde com o aumento da idade, chamando atenção a grande proporção de hospitalização entre idosos e, em especial, entre os idosos mais velhos. Nossos resultados reforçam a necessidade de aumentar o número de estudos epidemiológicos da população idosa para que o mapeamento das suas características e demandas sociais possa ser feito no país.

Palavras-Chave Envelhecimento; Epidemiologia; Saúde do Idoso; Bambuí - Brasil.

SummaryThe objectives of the present study are: (a) to describe the distribution of socio demographic characteristics, indicators of social support, and indicators of health status among the elderly and (b) to compare these characteristics with those of young adults living in the municipality of Bambuí, Minas Gerais. All inhabitants aged 60 or more years (1742 individuals) and a random sample of 1020 inhabitants aged 18-59 years were selected. From these, 1606 (92.2%) and 909 (99.1%) participated in the study, respectively. The characteristics of the elderly, in comparison with young adults, were similar to the Brazilian population regarding age distribution, higher proportion of women in older ages, increasing fecundity, less education, less household income and increased proportion of widows and heads of family among the elderly. The ratio between sexes was close to those of urban areas in Brazil. The socioeconomic data pointed out the higher vulnerability of the elderly in the study population, in relation to young adults, especially among females. The social indicators revealed that the elderly are an important source of support to the family showing solidarity between generations. All indicators used showed decrease in health status with age, with a great proportion of hospitalization among elderly, especially among those oldest. Our results reinforce the need for further population based epidemiological studies of the elderly to better understand their characteristics and social demands around the country.

Key WordsAging; Epidemiology; Aging Health; Bambuí-Brazil.

Endereço para correspondência: Av. Augusto de Lima, 1715 - Belo Horizonte/MG. CEP: 30.190-002.E-mail: [email protected]

The Bambuí Project: an Epidemiological Study of Socio Demographic Characteristics, Social Support and Selected Health Status Indicators of the

Elderly Compared with Young Adults

Maria Fernanda F. de Lima e Costa Núcleo de Estudos em Saúde Pública e Envelhecimento - NESPE - CPqRR/FIOCRUZ

Henrique L. Guerra Núcleo de Estudos em Saúde Pública e Envelhecimento - NESPE - CPqRR/FIOCRUZ

Josélia O. A. Firmo Núcleo de Estudos em Saúde Pública e Envelhecimento - NESPE - CPqRR/FIOCRUZ

Elizabeth Uchôa Núcleo de Estudos em Saúde Pública e Envelhecimento - NESPE - CPqRR/FIOCRUZ

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Introdução

Os idosos, particularmente os mais velhos, constituem o segmento que mais cresce da população brasileira. Entre 1991 e 1996, o número de habitantes com 60 a 69, 70 a 79 e 80 e mais anos de idade aumentou respectivamente, cerca de duas (28%), três (42%) e quatro vezes mais (62%), do que a população brasileira mais jovem (14%).1,2 Esse crescimento não tem sido acompanhado na mesma proporção por estudos epidemiológicos sobre a população idosa. De fato, até muito recentemente, os bons inquéritos de saúde brasileiros excluíam a população idosa ou tratavam todos aqueles com 60 a 65 ou mais anos de idade como se fossem um grupo homogêneo.3,4

Informações sobre condições sociais da população idosa são fundamentais para que se possa mapear suas necessidades e orientar políticas sociais.5 Informações sobre as con-dições de saúde, padrões de uso e demandas por serviços são fundamentais para orientar políticas de saúde voltadas para essa popu-lação. Estudos epidemiológicos com base populacional (ou seja, aqueles que estudam idosos residentes na comunidade) fornecem esse tipo de informação, mas esses estudos são ainda raros no Brasil. Pelo nosso conhe-cimento, estudos com base populacional da saúde do idoso foram desenvolvidos somente em São Paulo,6-8 Rio de Janeiro,9 Fortaleza,10 Veranópolis11 e no Estado do Rio Grande do Sul.12

O sistema público de saúde brasileiro (Sistema Único de Saúde) é descentralizado. Isso significa que a política da atenção à saú-de do idoso é preponderantemente de res-ponsabilidade do município. Cerca de dois terços dos municípios brasileiros possuem vinte mil habitantes ou menos.2 As condi-ções sociais e, em particular, as condições de saúde da população idosa nesses municípios são praticamente desconhecidas.

Visando preencher essa lacuna, está sendo desenvolvido um estudo epidemio-lógico com base populacional da saúde do idoso na cidade de Bambuí (Minas Gerais), que tem cerca de 15 mil habitantes. O Pro-

jeto Bambuí tem dois componentes: (a) um estudo de coorte da população idosa e (b) um inquérito de saúde da popula-ção mais jovem. Para o estudo de coorte foram selecionados todos os idosos (60 ou mais anos) residentes na comunidade. A linha de base do estudo foi constituída em 1997 e os participantes vêm sendo seguidos anualmente desde então. Para o inquérito de saúde, foi selecionada, em 1996, uma amostra representativa de indivíduos com 18 a 59 anos de idade. O inquérito de saúde foi desenvolvido para permitir comparações das características dos idosos observadas na linha de base do estudo de coorte com as da população mais jovem.13

O presente trabalho é parte do Projeto Bambuí e tem por objetivos: (1) descrever a distribuição de características sociodemográficas, de indicadores de suporte social e de indicadores da con-dição de saúde da população idosa e (2) comparar essas características com as da população mais jovem.

Material e métodos

Área

O município de Bambuí (oeste do Estado de Minas Gerais) possuía 20.573 habitantes em 1991, 73% dos quais viviam na sede (cidade de Bambuí). O índice de desenvolvimento humano no município era 0,70, a esperança de vida ao nascer era igual a 70,2 anos e 75% dos óbitos eram en-tre pessoas com 50 ou mais anos de idade. As doenças cardiovasculares eram as mais freqüentes causas de mortalidade (34% do total de óbitos) e constituíam a segunda causa (18,5%), após parto, que constituía a primeira causa de internações hospitalares. A cidade de Bambuí possui um hospital geral com 62 leitos e um médico para mil habitantes. As atividades econômicas mais importantes são agricultura, pecuária lei-teira e comércio. Maiores detalhes podem ser vistos em outra publicação.13

População

Um censo completo da cidade de Bambuí foi conduzido pela nossa equipe,

Projeto Bambuí: Estudo Epidemiológico da População Idosa

Informe Epidemiológico

do SUS

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entre novembro e dezembro de 1996, para identificação dos idosos participantes da linha de base do estudo de coorte. Todos os residentes com 60 ou mais anos de idade (1.742 pessoas) foram selecionados para entrevista, medidas físicas (medidas antropométricas e de pressão arterial), exames laboratoriais (exames hematoló-gicos e bioquímicos) e eletrocardiograma. Alíquotas de soro, plasma e camada de leucócitos foram armazenadas para futuras investigações.

O censo para a identificação de par-ticipantes mais jovens foi realizado entre outubro e novembro de 1994. Uma amos-tra probabilística simples sem reposição de 1.664 moradores com cinco ou mais anos de idade foi selecionada. Os indiví-duos selecionados para o presente trabalho (1.020 pessoas) são aqueles pertencentes a esta amostra com idade entre 18 e 59 anos (Bambuí possuía 8.899 habitantes nessa faixa etária).13 O tamanho da amostra é suficiente para estimar uma prevalência das características estudadas de 0,50, com intervalo de confiança igual a 0,95, para 0,20 de perdas e 0,03 de precisão.13

Variáveis

Todas as informações para este tra-balho foram obtidas por meio do ques-tionário Bambui Health and Aging Study (BHAS).13 As entrevistas foram realizadas no domicílio do participante. Os entrevis-tadores foram selecionados entre membros da comunidade com pelo menos 11 anos de escolaridade completa e foram exaus-tivamente treinados por um dos autores. Quando o idoso não estava em condições de responder à entrevista devido a déficit cognitivo ou outro problema de saúde, um respondente próximo foi entrevistado, mas as perguntas que requeriam julgamento pessoal não eram respondidas. No presente trabalho foram consideradas variáveis so-ciodemográficas, indicadores selecionados de suporte social e de condição de saúde.

As variáveis sociodemográficas con-sideradas foram as seguintes: grupo etário (18-39, 40-49, 50-59, 60-69, 70-79 e 80 ou mais anos); gênero; número de filhos (variável contínua); estado civil (casados/

vivendo juntos, solteiros, divorciados/se-parados e viúvos); número de anos de escolaridade completa (variável contínua e discreta: 0, 1-3, 4-7, 8 ou mais anos); in-serção na família (chefe ou não); religião (católica e outras) e renda domiciliar (< 2, 2,0-3,9 e 4 ou mais salários mínimos); principal fonte de renda (trabalho atual, aposentadoria/pensão e outra).

Os indicadores de suporte social considerados foram: residir só (sim e não); ser filiado a associações comunitárias (sim e não); freqüência a cultos religiosos (pelo menos uma vez por semana e me-nor freqüência); receber ajuda financeira da família (sim e não); receber ajuda da família através de moradia (sim e não); ter a companhia da família (sim e não); pres-tar ajuda financeira à família (sim e não); prestar ajuda à família oferecendo moradia (sim e não); prestar ajuda à família fazendo companhia (sim e não).

Com relação às condições de saúde, os seguintes indicadores foram consi-de-rados: capacidade para caminhar 1.500 metros sem se cansar; diagnóstico médico anterior de doenças crônicas selecionadas (algum médico já disse que o/a senhor/a já teve: artrite, hipertensão, diabetes, angina ou infarto do coração? sim e não); ter dei-xado de realizar alguma das atividades habituais nas duas últimas semanas por problemas de saúde (sim e não); ter estado acamado nas duas últimas semanas (sim e não); ter estado internado por pelo menos uma noite em um hospital nos últimos 12 meses (sim e não).

O Projeto Bambuí foi aprovado pelo Comitê de Ética da Fundação Oswaldo Cruz. Maiores detalhes sobre aspectos éticos e metodologia do trabalho podem ser vistos em trabalho anterior.13

Análise dos dados

A análise dos dados foi baseada no teste qui-quadrado de Pearson (para proporções) e nas razões em Odds ratios e seus intervalos de confiança (método de Woolf).14 As razões de chance foram ajustadas por sexo, usando-se o método de regressão logística múltipla.15 A análise foi feita, utilizando-se o software Stata.16

Maria Fernanda F. de Lima e Costa e colaboradores

volume 10, nº 4 outubro/dezembro 2001

Os idosos, particu-larmente os mais velhos, constituem o segmento que mais cresce da população brasi-leira. Entre 1991 e 1996, o número de habitantes com 60 a 69, 70 a 79 e 80 e mais anos de idade aumentou respec-tivamente, cerca de duas (28%), três (42%) e quatro vezes mais (62%), do que a população brasileira mais jo-vem (14%).1,2

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Resultados

Entre os 1.742 habitantes com 60 ou mais anos de idade, 1.606 (92,2%) parti-ciparam do presente trabalho. Entre os 1.020 indivíduos com 18-59 anos de idade selecionados para o estudo, 909 (89,1%) participaram. Respondentes próximos fo-ram necessários somente para entre-vistas com os idosos (5,6%).

Na Tabela 1, está apresentada a dis-tribuição de características sociodemo-gráficas selecionadas, segundo a faixa etária. As mulheres predominaram em todas as faixas etárias, sendo a sua proporção mais alta entre as idosas (59,6, 60,3 e 61,5% nas faixas etárias de 60-69, 70-79 e 80 ou mais anos de idade, respectivamente). A mediana do número de filhos aumentou com a idade (1, 2 e 3 filhos, respectivamente, nas faixas de

18-39, 40-49 e 50-59 anos e 4 filhos nas faixas etárias superiores). A proporção de chefes de família aumentou com a idade, sobretudo entre as mulheres. A religião católica predo-minou em todas as faixas etárias, girando em torno de 90%, e esse resultado não diferiu significativamente com a idade.

A proporção de viúvos, em de-tri-mento dos demais estados conjugais, aumentou com a idade (p<0,001). A pro-porção de viúvos foi menor em todas as faixas etárias em comparação à de viúvas (Figura 1).

As proporções daqueles com menor escolaridade foi mais alta nos grupos mais velhos (p<0,001). A diminuição da esco-laridade com a idade foi observada tanto entre os homens quanto entre as mulheres (Figura 2).

Tabela 1 - Distribuição percentual de características sociodemográficas, segundo faixa etária no Projeto Bambuí - 1996 a 1997

Características 40-49(n=201)

60-79(n=933)

80 ou mais(n=182)

18-39(n=547)

Faixa etária (anos)*

50-59(n=161)

70-79(n=491)

GêneroHomensMulheres

Mediana do número de filhos (p25-p75)**

HomensMulheresTotal

Chefe de famíliaHomensMulheresTotalOR (IC 95%)***

Religião católicaHomensMulheresTotalOR (IC 95%)***

* Os percentuais dos que responderam afirmativamente foram calculados em relação ao total de cada coluna para cada gênero (os casos sem informação não estão apresentados na tabela, mas foram considerados para os cálculos percentuais).

** (p25-p75): percentis 25 e 75.*** OR (IC 95%): Odds ratio e intervalo de confiança em nível de 95% (método de Woolf), ajustado por sexo (a classe de referência é a faixa

etária de 18-39 anos).

Projeto Bambuí: Estudo Epidemiológico da População Idosa

Informe Epidemiológico

do SUS

46,653,4

0 (0-2)1 (0-2)1 (0-2)

48,612,729,41,0

93,394,594,21,0

41,358,7

2 (2-3)2 (2-3)2 (2-3)

94,030,556,7

5,8(3,9-8,8)

95,294,194,5

1,1(0,5-2,1)

46,653,4

3 (1-5)3 (1-5)3 (1-4)

98,744,269,9

10,5(6,6-16,6)

90,788,489,4

0,5(0,3-1,0)

40,459,6

4 (2-7)4 (2-7)4 (2-6)

97,160,375,1

17,7(12,9-24,3)

95,093,594,1

1,0(0,6-1,5)

39,760,3

4 (1-7)4 (1-7)4 (2-7)

92,868,978,4

22,1(15,3-31,7)

96,493,294,5

1,0(0,6-1,8)

38,561,5

4 (1,5-7)4 (1,5-7)4 (2,0-7)

87,161,671,4

15,4(9,8-24,1)

92,996,495,1

1,2(0,5-2,5)

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151

IESUS

A renda domiciliar diminuiu acen-tuadamente com a idade (p<0,001). A proporção de mulheres que possuíam renda domiciliar mais baixa (menor de dois salários mínimos) foi maior do que a dos homens em todas as faixas etárias (Figura 3).

Como era de se esperar, a proporção daqueles cujas fontes de renda eram origi-

nárias do trabalho diminuiu com a idade, em detrimento daqueles cuja principal fonte de renda era a aposentadoria ou outra fonte (p<0,001). A proporção de aposentados/pensionistas foi maior entre as mulheres a partir dos 40 anos de idade em comparação aos homens (Figura 4).

Na Tabela 2, está apresentada a dis-tribuição de indicadores selecionados de

Figura 1 - Distribuição de indivíduos por estado civil segundo gênero e faixa etária noProjeto Bambuí -1996 a 1997

Faixa etária (anos)

Maria Fernanda F. de Lima e Costa e colaboradores

volume 10, nº 4 outubro/dezembro 2001

Faixa etária (anos)

Homens100

80

60

40

20

0

%

18 - 39 40 - 49 50 - 59 60 - 69 70 - 79 80 ou mais

Estado civil

Casados Viúvos Solteiros/divorciados

18 - 39 40 - 49 50 - 59 60 - 69 70 - 79 80 ou mais

100

80

60

40

20

0

% Mulheres

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IESUS

152

suporte social, segundo a faixa etária. A proporção de pessoas que residiam sós aumentou com a idade, tanto entre os homens como entre as mulheres. A filia-ção a associações comunitárias também aumentou com a idade, especialmente entre as mulheres. A freqüência a cultos religiosos aumentou com a idade e foi maior entre as mulheres, exceto entre as

idosas mais velhas (80 ou mais anos). A ajuda financeira da família foi maior nas faixas etárias extremas (18-39 e 80 ou mais anos); em todas as faixas etárias, as mulheres recebiam mais ajuda financeira da família do que os homens. O ofere-cimento de moradia também foi maior para as mulheres do que para os homens de todas as faixas etárias; esse tipo de ajuda

Figura 2 - Distribuição de anos completos de escolaridade segundo gênero e faixa etária no Projeto Bambuí -1996 a 1997

Faixa etária (anos )

Projeto Bambuí: Estudo Epidemiológico da População Idosa

Informe Epidemiológico

do SUS

0 1 - 3 4 - 7 8 +Escolaridade (anos completos)

Faixa etária (anos)

Homens60

50

40

30

20

0

%

10

18 - 39 40 - 49 50 - 59 60 - 69 70 - 79 80 ou mais

18 - 39 40 - 49 50 - 59 60 - 69 70 - 79 80 ou mais

60

50

40

30

20

0

%

10

Mulheres

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153

IESUS

foi significativamente menor em todas as faixas etárias quando comparadas à faixa etária mais jovem. O oferecimento de companhia foi menor em todas as faixas etárias em comparação à faixa etária mais jovem.

Na Tabela 3, está apresentada a dis-tribuição de pessoas que relataram ajudar a família financeiramente, com moradia

ou com companhia. A ajuda financeira à família reduziu-se com a idade; a ajuda financeira foi mais freqüente entre os ho-mens do que entre as mulheres de todas as faixas etárias. A ajuda com moradia à família foi maior em todas as faixas etárias após os 40 anos de idade; esse tipo de ajuda foi mais freqüente entre os homens do que entre as mulheres. A proporção dos que

Figura 3 - Distribuição da renda domiciliar segundo gênero e faixa etária no Projeto Bambuí - 1996 a 1997

60

50

40

30

20

0

%

10

18 - 39 40 - 49 50 - 59 60 - 69 70 - 79 80 ou mais

Faixa etária (anos)

Mulheres

Maria Fernanda F. de Lima e Costa e colaboradores

volume 10, nº 4 outubro/dezembro 2001

< 2 2 - 3,99 4 +Renda domiciliar (salário mínimo)

Faixa etária (anos)

Homens60

50

40

30

20

0

%

10

18 - 39 40 - 49 50 - 59 60 - 69 70 - 79 80 ou mais

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IESUS

154

relataram ajudar a família fazendo com-panhia foi alta entre homens e mulheres e diminuiu com a idade.

Os seguintes indicadores da condição de saúde pioraram com a idade: incapa-cidade para caminhar 1.500 metros sem se cansar, diagnóstico médico de pelo menos uma entre cinco doenças/condições crônicas, ter deixado de realizar alguma

das atividades rotineiras por problemas de saúde nas duas últimas semanas, ter estado acamado nesse período e ter estado internado em um hospital nos últimos 12 meses (Tabela 4).

Discussão

Os resultados deste trabalho mos-tram que, de uma maneira geral, as ca-

Figura 4 - Distribuição da principal fonte de renda segundo gênero e faixa etária no Projeto Bambuí - 1995 a 1997

Projeto Bambuí: Estudo Epidemiológico da População Idosa

Informe Epidemiológico

do SUS

Trabalho Aposentadoria/Pensão Outra

Principal fonte de renda

Faixa etária (anos)

Homens100

80

60

40

20

0

%

18 - 39 40 - 49 50 - 59 60 - 69 70 - 79 80 +

Faixa etária (anos)

100

80

60

40

20

0

%

18 - 39 40 - 49 50 - 59 60 - 69 70 - 79 80 +

Mulheres

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155

IESUS

Tabela 2 - Distribuição percentual de indicadores de suporte social, segundo faixa etária no Projeto Bambuí - 1996 a 1997

Características 40-49(n=201)

60-79(n=933)

80 ou mais(n=182)

18-39(n=547)

Faixa etária (anos)*

50-59(n=161)

70-79(n=491)

Vive sóHomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

Filiação a associações comunitárias

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

Freqüência a cultos religiosos pelo menos uma vez por semana

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

Recebe ajuda financeira da família

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

2,40,31,31,0

4,82,53,5

2,7(0,9-7,9)

8,08,18,1

6,8(2,7-17,3)

8,815,312,7

10,8(5,0-23,4)

16,623,420,7

19,6(9,0-45,6)

13,224,120,0

18,5(8,1-42,5)

11,88,9

10,21,0

13,316,114,9

1,5(0,9-2,4)

17,318,618,0

1,9(1,2-3,2)

16,219,618,2

1,9(1,4-2,6)

9,226,419,6

2,1(1,5-3,0)

10,027,720,9

2,2(1,4-3,5)

18,423,621,21,0

27,738,133,8

1,9(1,3-2,7)

34,746,541,0

2,6(1,8-3,8)

35,345,914,6

2,6(2,0-3,3)

35,943,940,7

2,5(1,9-3,3)

31,431,331,3

1,7(1,2-2,5)

40,060,350,81,0

22,946,636,8

0,5(0,4-0,8)

29,352,341,6

0,7(0,5-1,0)

35,345,741,5

0,7(0,5-0,8)

32,846,040,7

0,6(0,5-0,8)

32,956,347,3

0,8(0,6-1,1)

* Os percentuais dos que responderam afirmativamente foram calculados em relação ao total de cada coluna para cada gênero (os casos sem informação não estão apresentados na tabela, mas foram considerados para os cálculos percentuais).

** OR (IC 95%): Odds ratio e intervalo de confiança em nível de 95% (método de Woolf), ajustado por sexo (a classe de referência é a faixa etária de 18-39 anos).

Família ajuda oferecendo moradia

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

56,572,665,11,0

10,851,734,8

0,3(0,2-0,4)

12,039,526,7

0,2(0,1-0,3)

14,926,121,5

0,1(0,1-0,2)

19,534,528,5

0,2(0,1-0,2)

17,139,330,8

0,2(0,1-0,3)

Família faz companhia

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

85,587,786,71,0

74,781,478,6

0,6(0,4-0,8)

73,382,678,2

0,5(0,3-0,8)

80,980,680,7

0,6(0,4-0,8)

78,082,880,9

0,6(0,4-0,9)

67,183,076,9

0,5(0,3-0,7)

Maria Fernanda F. de Lima e Costa e colaboradores

volume 10, nº 4 outubro/dezembro 2001

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IESUS

156

Tabela 3 - Distribuição percentual de pessoas que relataram ajudar a família financeiramente, com moradia ou com companhia, segundo a faixa etária no Projeto Bambuí - 1996 a 1997

Características 40-49(n=201)

60-79(n=933)

80 ou mais(n=182)

18-39(n=547)

Faixa etária (anos)*

50-59(n=161)

70-79(n=491)

Relataram ajudar a família financeiramente

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

Relataram ajudar a família oferecendo moradia

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

Relataram ajudar a família oferecendo companhia

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)**

63,635,248,51,0

83,146,661,7

1,9(1,4-2,7)

66,745,455,3

1,4(0,9-2,0)

62,630,243,3

0,9(0,7-1,1)

59,026,039,1

0,7(0,3-0,7)

42,921,429,7

0,5(0,3-0,7)

45,916,430,21,0

80,739,056,2

3,7(2,6-5,2)

68,041,954,0

3,1(2,1-4,6)

68,731,346,4

2,4(1,9-3,0)

60,531,843,2

2,1(1,6-2,8)

50,027,736,3

1,5(1,1-2,2)

91,090,190,51,0

89,291,590,6

1,0(0,6-1,8)

78,790,785,1

0,6(0,4-1,0)

84,183,383,6

0,5(0,4-0,7)

80,577,478,6

0,4(0,3-0,6)

71,469,670,3

0,2(0,2-0,4)

* Os percentuais dos que responderam afirmativamente foram calculados em relação ao total de cada coluna para cada gênero (os casos sem informação não estão apresentados na tabela, mas foram considerados para os cálculos percentuais).

** OR (IC 95%): Odds ratio e intervalo de confiança em nível de 95% (método de Woolf), ajustado por sexo (a classe de referência é a faixa etária de 18-39 anos).

racterísticas sociodemográficas dos par-ticipantes do Projeto Bambuí apresentam as mesmas tendências observadas para a população idosa brasileira: acentuado predomínio de mulheres (feminização do envelhecimento), maior número de filhos (redução da fecundidade entre os mais jovens), menor escolaridade, aumento da proporção de mulheres como chefes de família, menor renda domiciliar e maior proporção de viúvas em comparação à de viúvos.5,17

A distribuição dos idosos bambui-enses segundo a idade (58, 31 e 11% nas faixas etárias de 60-69, 70-79 e 80 anos e mais de idade) foi igual à da população brasileira no período correspondente (58,

31 e 12%, respectivamente).18 A razão entre os sexos masculino/feminino (ou seja, o número de homens em relação a 100 mulheres na faixa etária) diminuiu com a idade (cerca de 63-65% a partir dos 60 anos). Essa razão foi cerca de duas vezes menor que o observado em zonas rurais (122%) e cerca de vinte por cento menor que o observado em zonas urbanas brasileiras (82%).5 O excesso de mulheres na área estudada pode ser devido a dife-rencial da mortalidade entre os sexos e/ou a maior emigração masculina em busca de trabalho.

A redução da fecundidade nas coor-tes mais jovens em Bambuí é evidente. A

Projeto Bambuí: Estudo Epidemiológico da População Idosa

Informe Epidemiológico

do SUS

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157

IESUS

Tabela 4 - Distribuição percentual de indicadores da condição de saúde segundo faixa etária no Projeto Bambuí - 1996 a 1997

Características 40-49(n=201)

60-79(n=933)

80 ou mais(n=182)

18-39(n=547)

Faixa etária (anos)*

50-59(n=161)

70-79(n=491)

* Os percentuais dos que responderam afirmativamente foram calculados em relação ao total de cada coluna para cada gênero (os casos sem informação não estão apresentados na tabela, mas foram considerados para os cálculos percentuais).

** Artrite, hipertensão arterial, diabetes, angina pectoris e/ou infarto do miocárdio.*** OR (IC 95%): Odds ratio e intervalo de confiança em nível de 95% (método de Woolf), ajustado por sexo (a classe de referência é a faixa

etária de 18-39 anos).

É capaz de caminhar 1.500 metros sem se cansar

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)***

Já teve diagnóstico médico de pelo menos uma doença/condição crônica**

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)***

Deixou de realizar alguma das atividades habituais por problemas de saúde nas duas últimas semanas

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)***

Esteve acamado nas duas últimas semanas

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)***

88,267,577,11,0

75,958,565,7

0,6(0,4-0,8)

74,747,760,3

0,4(0,3-0,6)

68,441,752,5

0,3(0,3-0,4)

68,241,652,1

0,3(0,2-0,4)

41,416,125,8

0,1(0,1-0,1)

14,122,318,51,0

34,942,439,3

2,8(2,0-4,1)

42,775,660,3

7,1(4,9-10,6)

58,176,368,9

10,1(7,8-13,1)

61,081,173,1

12,4(9,2-16,7)

47,169,661,0

6,9(4,8-10,0)

6,712,39,71,0

15,717,016,4

1,8(1,1-2,9)

12,023,318,0

2,1(1,3-3,4)

13,319,416,9

1,9(1,3-2,6)

11,319,916,5

1,8(1,2-2,6)

12,922,318,7

2,1(1,3-3,3)

4,37,25,91,0

13,3 7,6 9,9

1,7(1,0-3,1)

2,716,3 9,9

1,8(1,0-3,4)

6,411,0 9,1

1,6(1,0-2,3)

7,212,210,2

1,8(1,6-4,8)

8,619,615,4

2,8(1,6-4,8)

Esteve internado em um hospital nos últimos 12 meses

HomensMulheresTotalOR (IC 95%)***

6,715,411,31,0

7,212,710,5

0,9(0,5-1,5)

16,012,814,3

1,3(0,8-2,2)

17,023,420,8

2,0(1,5-2,7)

18,524,322,0

2,1(1,5-3,0)

25,737,533,0

3,7(2,5-5,6)

Maria Fernanda F. de Lima e Costa e colaboradores

volume 10, nº 4 outubro/dezembro 2001

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IESUS

158

mediana do número de filhos diminuiu progressivamente de quatro, entre os aqueles com 60 ou mais anos de idade, para três, dois e um nas faixas etárias mais jovens. Essa tendência é consistente com o observado para a população brasileira.5

A chefia feminina das famílias cor-respondeu a apenas 13% na faixa etária de 18-39 anos em comparação a 49% dos homens. À medida em que a idade au-mentou as chefias femininas também aumentaram, alcançando 62% das mu-lheres aos 80 ou mais anos de idade. Essa tendência também é consistente com o observado para a população brasileira. O aumento das chefias femininas com a idade é conseqüência da viuvez, de sepa-rações e de maternidade sem casamento. Os domicílios chefiados por mulheres e por idosos tendem a possuir menor renda, refletindo uma situação de maior vulne-rabilidade.5 As maiores discrepâncias entre os gêneros foram observadas em relação ao estado civil. O predomínio de viúvas em comparação ao de viúvos é evidente em todas as faixas etárias, especialmente nas mais velhas: 64% dos homens bam-buienses com 80 ou mais anos de idade eram casados e somente 23% eram viúvos; entre as mulheres a proporção de casadas foi de somente 18% e a de viúvas de 73%. Tendências semelhantes são observadas para a população brasileira, indicando que as mulheres têm maiores chances de enfrentar o declínio da sua capacidade física e mental sem o suporte de um com-panheiro.5

A escolaridade diminuiu progressi-vamente com o aumento da idade, como também observado para a população bra-sileira.5 Entre as mulheres idosas, a escola-ridade foi menor que a dos homens (35% das mulheres e 29% dos homens com 60 ou mais anos de idade nunca haviam estudado). É interessante observar que o oposto foi observado entre as mulheres mais jovens: nas duas faixas etárias mais jovens, 54 e 32% possuíam oito ou mais anos de escolaridade completa; entre os homens, as percentagens correspondentes

foram 43 e 23%, res-pectivamente. Este contraste pode ser devido ao fato de as mulheres jovens estarem estudando mais e/ou a maior emigração entre os homens jovens com maior escolaridade.

Também acompanhando a tendência brasileira,17 a renda domiciliar diminuiu com a idade, especialmente entre as mulheres. Em um estudo antropológico, realizado com mulheres idosas na cidade de Bambuí, verificou-se que a renda é um dos elementos essenciais para a preser-vação da autonomia e para a manutenção ou recuperação da saúde. Na maioria dos casos, é a soma de recursos financeiros familiares e pessoais que permite pagar um médico particular, a mensalidade de um convênio, alguém para tirar ficha na prefeitura (para consultas médicas) ou comprar os medicamentos prescritos.19

Um outro contraste importante entre homens e mulheres na comunidade estudada foi a maior proporção de homens cuja principal fonte de renda era oriunda do trabalho. Isso foi observado tanto entre os idosos quanto entre os mais jovens.

A maior vulnerabilidade da popula-ção idosa bambuiense, especialmente a feminina, pode ser verificada também na proporção daqueles que vivem sós. Essa proporção aumentou de 1% na faixa etá-ria mais jovem para 20% na mais velha. Esse aumento foi mais acentuado entre as mulheres a partir dos 60 anos de idade. Por outro lado, a filiação a associações co-munitárias aumentou significativamente entre as mulheres mais velhas, assim como a freqüência a cultos religiosos.

A grande proporção de jovens e ido-sos que relataram receber ajuda financeira da família, receber ajuda da família com a moradia e ter a companhia da família reflete a solidariedade da comunidade bambuiense. A ajuda financeira da famí-lia foi relatada por cerca de um terço dos homens idosos e por cerca da metade das mulheres idosas. De uma maneira geral, o recebimento de ajuda financeira foi maior nos extremos da vida.

Projeto Bambuí: Estudo Epidemiológico da População Idosa

Informe Epidemiológico

do SUS

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159

IESUS

A ajuda da família com moradia foi significativamente maior na faixa etária mais jovem do que nas mais velhas. Em todas as faixas etárias, essa ajuda da fa-mília com a moradia foi maior para as mulheres.

A companhia da família foi relatada pela maioria dos participantes deste tra-balho. A proporção dos que afirmaram ter a companhia de familiares diminuiu com a idade. Em geral, as mulheres de todas as faixas etárias (exceto aos 60-69 anos) afirmaram com maior freqüência ter a companhia de familiares.

Se, por um lado, uma parcela impor-tante da comunidade relatou receber ajuda da família, por outro, um número ex-pres-sivo de jovens e idosos relataram ajudar a família financeiramente, oferecendo mo-radia ou companhia. A ajuda financeira à família foi relatada com mais freqüência pelos homens e diminuiu progressivamen-te a partir dos 40 anos de idade.

O oferecimento de moradia para a família foi mais freqüente entre os homens. Esse tipo de ajuda aumentou entre os 18-39 anos e 40-49 anos de idade e diminuiu progressivamente a partir desta idade.

O oferecimento de companhia para a família foi muito freqüente, tanto entre homens quanto entre mulheres. Esse tipo de ajuda diminuiu após os 60 anos de idade, mas mesmo assim manteve-se em patamares altos.

Nossos resultados confirmam aqueles do estudo antropológico citado anterior-mente, no qual se verificou que a rede de solidariedade da comunidade bambuinese está primordialmente centrada na família. Esta aparece como a principal fonte de suporte social. Nos casos de doença, a fa-mília, e em particular os filhos, têm papel fundamental: cuidam, tomam decisões, marcam consultas e pagam as contas. Em raros casos, sempre na ausência dos filhos, parentes mais distantes, vizinhos, amigos ou associações comunitárias podem ad-quirir papel preponderante.19

Uma das conseqüências do enve-lhe-cimento é o aumento da demanda

por serviços médicos e sociais devido à piora da condição de saúde. No presente trabalho, todos os indicadores utilizados mostraram uma piora do estado de saúde com o aumento da idade. A capacidade de caminhar 1.500 metros sem se cansar diminuiu significativamente com a idade e os homens de todas as faixas etárias apre-sentaram maior capacidade para caminhar em comparação às mulheres. A história de diagnóstico médico de pelo menos uma entre cinco doenças/condi-ções crônicas foi mais freqüente entre as mulheres. Esse relato aumentou até os 70-79 anos e diminuiu após essa idade. Essa redução pode ser conseqüência de viés de sobre-vivência: aqueles com doenças/condições crônicas teriam maior probabilidade de morte precoce.

O prejuízo das atividades habituais por problemas de saúde nas duas últimas semanas foi menor na faixa etária mais jovem e maior nas faixas etárias supe-riores, assim como o relato de ter estado acamado nesse período. A proporção dos que relataram ter tido suas atividades habituais prejudicadas por problemas de saúde ou ter estado acamado foi maior entre as mulheres.

A ocorrência de internações hos-pitalares aumentou significativamente a partir dos 60 anos de idade (21, 22 e 33% daqueles com 60-69, 70-79 e 80 anos e mais de idade relataram ter tido pelo me-nos uma internação hospitalar durante o período considerado, em comparação a 11-14% dos mais jovens), tendo sido mais freqüentes entre idosas do que entre idosos. Esses resultados são consistentes com o observado para a população bra-sileira.20

Com relação a aspectos metodoló-gicos, todos os esforços foram feitos para evitar vieses nos resultados do Projeto Bambuí, encorajando a participação da-queles selecionados para o estudo, coletan-do-se informações de forma duplo-cega, estabelecendo a confiabilidade dos dados coletados, utilizando-se instrumentos e equipamentos padronizados e treinando-se exaustivamente as equipes de campo

Maria Fernanda F. de Lima e Costa e colaboradores

volume 10, nº 4 outubro/dezembro 2001

A escolaridade diminuiu progressivamente com o aumento da idade, como tam-bém observado para a população brasileira.5 Entre as mulheres idosas, a escolaridade foi menor que a dos homens (35% das mulheres e 29% dos homens com 60 ou mais anos de idade nunca ha-viam estudado).

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e do laboratório. A validade interna do estudo foi garantida porque a proporção de participantes em relação aos indivíduos selecionados foi alta e esses eram seme-lhantes à população da cidade em relação ao gênero, idade, estado civil, renda mensal familiar e escolaridade.13 Por outro lado, estudos seccionais com base populacional estão sujeitos a duas principais limitações: (1) os participantes mais velhos são sobre-viventes (ou seja, aqueles expostos a fatores de risco têm maior probabilidade de mor-rer prematuramente); (2) os participantes são idosos não institucionalizados (ou seja, aqueles que vivem na comunidade tendem a ser mais saudáveis). Em Bambuí, não há instituições para idosos, mas nós não podemos descartar a possibilidade de viés de sobrevivência. Um viés de sobrevivência reduziria a magnitude das associações, favorecendo as associações encontradas no presente trabalho.

Em resumo, os resultados deste trabalho levam às seguintes conclusões: a) as características sociodemográficas dos habitantes idosos de Bambuí, em comparação aos mais jovens, são muito semelhantes às da população brasileira, no que se refere à distribuição etária, femi-nização do envelhecimento, aumento da fecundidade, menor escolaridade, menor renda domiciliar e aumento da proporção de mulheres como chefes de família e de viúvas; b) a relação entre os sexos aproxi-ma-se mais da composição das populações urbanas do país do que das rurais; c) o conjunto dos dados sócio-demográficos estudados aponta para a maior vulnerabi-lidade dos idosos, em relação aos adultos jovens, especialmente as mulheres; d) os indicadores de suporte social investiga-dos mostram uma importante rede de solidariedade entre gerações verificada na ajuda que os idosos recebem (financeira, moradia e/ou companhia) ou que prestam à sua família; e e) todos os indicadores uti-lizados mostraram uma piora do estado de saúde com o aumento da idade, chamando atenção a grande proporção de hospitali-zação entre os idosos e, em especial, entre os idosos mais velhos.

Um dos grandes desafios contempo-râneos é a construção de políticas sociais adequadas, incluindo a atenção à saúde, para a população idosa. Informações sobre a população idosa são importantes para subsidiar essas políticas, mapeando suas necessidades e buscando corrigir dis-torções, entre outras, por classe social, gênero e geração.5 Estudos epidemiológi-cos com base populacional da população idosa devem ser incentivados para que o mapeamento das suas características e demandas seja feito no país.

AgradecimentosEste trabalho não teria sido possí-

vel sem a colaboração da população de Bambuí. Os autores gostariam também de agradecer à associação “Mocinhas de Ontem” pelo apoio incansável ao Proje-to Bambuí. Este projeto foi financiado pela Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), mediante a concessão de bolsas de pesquisa para alguns dos autores (Lima-Costa, MF e Uchôa, E).

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Projeto Bambuí: Estudo Epidemiológico da População Idosa

Informe Epidemiológico

do SUS

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Maria Fernanda F. de Lima e Costa e colaboradores

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Uso das Causas Múltiplas de Morte em SaúdePública*

Informe Epidemiológico do SUS 2001; 10(4) : 163 - 175.

Resumo

As estatísticas de mortalidade têm empregado, tradicionalmente, o conceito de causa

básica de morte. Atualmente, entretanto, com o aumento da expectativa de vida e

importância das doenças crônico-degenerativas como causas de óbito, um maior número

de diagnósticos têm sido informados nas declarações de óbito. Para evitar a perda de

informações relativas às afecções que não são selecionadas como causa básica de morte,

uma proposta alternativa é a utilização do enfoque de causas múltiplas. Este enfoque

retrataria melhor a magnitude de patologias freqüentemente mencionadas como causas

associadas de morte, contribuindo para o melhor conhecimento de importantes problemas

de saúde pública e oferecendo subsídios para o planejamento e a avaliação dos programas

de saúde. Dessa forma, algumas vantagens e limitações relacionadas à utilização do

enfoque de causas múltiplas de morte são apresentadas.

Palavras-Chave

Mortalidade; Causas Múltiplas de Morte; Causa da Morte.

Summary

Mortality statistics have traditionally been based on the concept of the underlying cause

of death. Today, however, with the increase of life expectancy and the importance of

chronic disease-related deaths, a large number of diagnoses are reported in the death

certificate. To avoid losing information among conditions which are not classified as the

underlying cause of death, an alternative approach for mortality statistics could be to

analyze multiple causes of death. This approach could be an important instrument to

estimate public health problems and to provide support for planning and evaluating

health programs. Thus some advantages and limitations of the multiple cause of death

approach are discussed in this paper.

Key WordsMortality; Multiple Causes of Death; Cause of Death.

* Artigo originado de dissertação de Mestrado “Desigualdade Social e Causas Múltiplas de Morte em Adultosda Região Centro-Sul de Belo Horizonte”. Programa de Pós-graduação em Saúde Pública/UFMG.Endereço para correspondência: Gerência de Regulação, Epidemiologia e Informação/GERSA-CS/SecretariaMunicipal de Saúde de Belo Horizonte - Rua Tupis, 149 - 7o andar - Centro - Belo Horizonte/MG. CEP:30.130-007E-mail:[email protected]

The Use of Multiple Causes of Death in Public Health

Elisabeth FrançaGrupo de Estudos em Epidemiologia/DMPS/Faculdade de Medicina/UFMG

Lenice Harumi IshitaniGerência de Regulação, Epidemiologia e Informação-GERSA-CS / Secretaria Municipal de Saúde de Belo

Horizonte

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Uso das Causas Múltiplas de Morte em Saúde Pública

Informe Epidemiológico

do SUS

Introdução

As estatísticas de mortalidade sãode grande relevância em Saúde Públicapor constituírem importantes indicadoresdas condições de saúde das populações,permitindo a identificação de grupos demaior risco e orientando o planejamentoe a implantação de programas de saúde,bem como a avaliação de seus resultados.Tradicionalmente, estas estatísticasutilizam o conceito de causa básica demorte. Este enfoque baseado em umacausa única tem sido empregado porpermitir comparabilidade entre diferenteslocais, pela sua importância na análisedas tendências de mortalidade e por seuuso tradicional de orientar medidas deprevenção da morte.1,2

Embora seja de grande importânciaa utilização do conceito de causa básicanas análises de mortalidade, este enfoqueapresenta algumas limitações devido auma perda considerável de informaçõescontidas nas declarações de óbito (DO),quando se ignoram outras causas oudiagnósticos mencionados no atestado deóbito.2,3 Muitas afecções mencionadasfreqüentemente na DO não aparecemcomo causas mais comuns de mortenessas estatísticas. Isto ocorre, porexemplo, com a hipertensão arterial e odiabetes, dificultando a avaliação dosprogramas específicos para o controledessas doenças. O mesmo é observadoem relação à prematuridade, queraramente aparece classificada comocausa básica de morte, significandoperda de informações importantes parao planejamento da assistência perinatal.Além disso, com o aumento da esperançade vida e o envelhecimento da população,essa perda torna-se ainda mais relevante,pois, acompanhando essas mudanças, asdoenças crônico-degenerativas têm setornado importantes causas de morte.Devido ao curso prolongado dessasdoenças e, muitas vezes, pelo fato deapresentarem etiologia comum, essasafecções crônicas aparecem simulta-neamente mencionadas nas DO, elevandoo número de diagnósticos informados.4,5

Evidência do aumento do número de

afecções mencionadas na DO, é que onúmero de diagnósticos era de apro-ximadamente 1,94 por DO, na década de60,6 passando a próximo de três, nadécada de 80.2,7

A análise da mortalidade sob oenfoque das causas múltiplas de mortepermite a identificação de doençaspresentes no momento da morte e quepodem ter participado no processo queevoluiu para o óbito. Dessa forma, há ummelhor conhecimento das causas demorte e essa informação, além de poderser obtida a partir das causas men-cionadas nas declarações de óbito, podeser também pesquisada em prontuáriosmédicos, laudos de necrópsia ou resul-tados de exames laboratoriais.

Declaração de óbito

Além dos objetivos jurídicos, oregistro dos eventos vitais é tambémmuito importante para a análise dascondições de saúde de uma população.Utilizando as tabelas mortuárias obtidasnas paróquias de Londres, em 1662, JohnGraunt, considerado pioneiro no uso dasestatísticas de mortalidade, verificou aocorrência de maior mortalidade decrianças e pessoas do sexo masculino,quais eram as principais causas de mortee as variações sazonais respectivas.1,3,8

Outro pioneiro no uso dos registros civispara fins estatísticos, William Farr,designado em 1839 para o cargo deCompiler of Abstracts do Registro Civilda Inglaterra, demonstrou as deficiênciasdas estatísticas vitais e os métodosnecessários para melhorá-las, com oobjetivo de atender às finalidades desaúde pública e de demografia.8 Elaborouainda uma classificação das causas demorte, antecessora da atual ClassificaçãoInternacional de Doenças (CID), e desen-volveu métodos de análise para estudosde mortalidade ocupacional, demons-trando a necessidade de uma reformasanitária para provocar impacto namortalidade.9

Até fins do século passado, ascausas de morte eram atestadas emdiferentes modelos de declarações de

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óbito, que variavam nos diversos países.Em 1925, a Organização de Saúde da Ligadas Nações sugeriu a adoção de ummodelo único de atestado de óbito. Nessemodelo, seria anotada, em primeiro lugara causa que conduziu diretamente à morte(causa imediata de morte, causa final outerminal) e, a seguir, os estados pato-lógicos antecedentes àquela, casoexistissem, ficando a causa primária(causa básica) declarada em último lugar,de cima para baixo.8

Ao aprovar a Sexta Revisão daClassificação Estatística Internacional deDoenças, a Conferência Internacional daRevisão da Classificação (1948) adotouesse modelo como o Modelo Internacionalde Atestado de Óbito, o qual passou aser utilizado, a partir de 1950, por quasetodos os países do mundo, inclusive oBrasil. Uma das finalidades desse modeloera o de obter informação adequada, parafacilitar a seleção da causa básica demorte, caso fossem informadas duas oumais causas.

No Brasil, embora a parte relativa àcausa de morte, denominada atestadomédico, fosse conforme o modelointernacional, os dados referentes àidentificação e outras informações nãoeram padronizados e o próprio impressoapresentava-se em formatos e coresdiferentes nos vários Estados. Em 1976,o Ministério da Saúde padronizou a DOpara todo o país, mantendo o modelointernacional do atestado médico epermitindo a uniformização do registrodos demais tipos de informações.10 Essemodelo internacional, utilizado no Brasilaté 1999, constava de duas partes:

a) Parte I, com três linhas (a,b,c)onde o médico deveria declarar, em últimolugar, a causa básica; esta poderia darorigem a algumas complicações, queseriam registradas nas linhas acima(causas conseqüenciais); e

b) Parte II, onde deveriam serinformadas outras condições patológicasque influíram desfavoravelmente,contribuindo para a morte, as chamadascausas contribuintes.1

No final do ano de 1999, o Minis-tério da Saúde alterou esse modelo,

acrescentando uma linha na Parte I (linhad) por recomendação da OrganizaçãoMundial da Saúde (OMS) (CID-10).11

Esta alteração permite a declaração demaior número de diagnósticos, possi-bilitando o preenchimento mais completoda DO e melhorando a informação quepode ser obtida dos campos relativos àscausas de morte.

Causa básica de morte

Para o conhecimento do processosaúde e doença da população, as infor-mações sobre morbidade são consi-deradas mais adequadas. Entretanto,devido a maior dificuldade de obtençãoe análise dessas informações, são utili-zados dados de mortalidade, que são maisfacilmente disponíveis e têm coberturauniversal.8,12,13 No Brasil, por exemplo, oSistema de Informações sobre Mortali-dade (SIM) com características decontinuidade, padronização e coberturanacional, foi implantado em 19752,13,14 ea base de dados está disponível desde oano de 1979.15

As estatísticas de mortalidade emSaúde Pública têm tradicionalmenteatribuído uma só causa para cada óbito,desde os trabalhos de Graunt no séculoXVII. Entretanto, classificar a causabásica de morte é relativamente simplesquando está mencionada uma só causano atestado, sendo mais problemáticoquando dois ou mais estados patológicosestão mencionados na DO. Por essadificuldade de tabular dados referentesàs causas de óbito, convencionou-se, em1900, durante a Conferência Internacio-nal para a Revisão da Lista Internacionalde Causas de Morte, analisar dados sobreuma causa única de morte, ou seja,selecionar para cada óbito uma causa,caracterizada como “causa de morte”,“causa primária” ou “causa principal”.10,16

Em 1948, durante a realização daConferência Internacional para aprovara Sexta Revisão da Classificação Esta-tística Internacional de Doenças, con-vencionou-se chamar essa causa únicacomo “causa básica de morte”, entendida

Embora seja degrandeimportância autilização doconceito de causabásica nasanálises demortalidade, esteenfoqueapresentaalgumaslimitações devidoa uma perdaconsiderável deinformaçõescontidas nasdeclarações deóbito (DO),quando seignoram outrascausas oudiagnóst icosmencionados noatestado deób i t o . 2 ,3

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Informe Epidemiológico

do SUS

Uso das Causas Múltiplas de Morte em Saúde Pública

desde então como: “(a) a doença ou lesãoque iniciou a cadeia de acontecimentospatológicos que conduziram diretamenteà morte ou (b) as circunstâncias doacidente ou violência que produziram alesão fatal”.11 Para padronizar e homo-geneizar critérios, capazes de assegurara comparação entre diferentes áreas, aseleção da causa básica de morte ficoudefinida de acordo com regras norma-tizadas internacionalmente em conjuntocom cada revisão da CID.3

A importância da causa básica demorte em Saúde Pública está relacionadaà prevenção, pois as ações poderão sermais eficientes e eficazes quando se ageno início de uma sucessão de eventos quepossam levar à morte, diminuindo umgrande número de mortes prematurasevitáveis e o sofrimento das pessoas eproporcionando a redução dos custossociais e econômicos decorrentes dessasmortes. Entretanto, dificilmente sepoderia afirmar que uma morte tem umacausa única, pois além da doença oudoenças que determinam a morte, comgrande freqüência estão presentes outrasque, associadas ou não entre si, con-tribuem direta ou indiretamente noprocesso que leva à morte.3

Além disso, no processo de seleçãoda causa básica de morte há váriosproblemas que merecem ser destacados.As causas básicas identificadas segundoas regras de seleção muitas vezes sãodiferentes das que o médico pretendiainformar.12,17 Um dos fatores que preju-dicam a qualidade dessa informação emmortalidade são as falhas na codificaçãoda causa de morte, que é realizado porum codificador, geralmente um técnicotreinado e especializado. Tais falhaspodem ser devidas ao treinamento inade-quado do codificador e erros de registrode código.2,18 Em um estudo sobre aconfiabilidade da DO para causas demortalidade infantil, realizado por França-Mendonça e colaboradores,19 verificou-seque para a septicemia, independente daidade da ocorrência do óbito, foi utilizadoo código correspondente à septicemia doperíodo neonatal, o que elevou artifici-

almente a mortalidade por afecçõesperinatais e subestimou os óbitos infantispor causas infecciosas no períodoestudado. Outros erros que podemocorrer são aqueles referentes à aplicaçãoinadequada das regras de codificação, àdesconsideração de afecções mencio-nadas no atestado de óbito e às diferençasde interpretação de relações causais entreas doenças.2,18 Mesmo utilizando asregras de seleção padronizadas inter-nacionalmente, Laurenti1 encontroudiscordância em 6,73% das DO codi-ficadas por dois técnicos treinados naclassificação de doenças. Segundo oautor, este erro poderia ser muito maior,pois nem sempre os órgãos responsáveispela codificação e classificação dascausas de óbito dispõem de técnicossuficientemente habilitados.

Outro problema referente à seleçãoda causa básica de morte está relacionadoao preenchimento da DO. A maneiracorreta de preencher o atestado muitasvezes é desconhecida pelo médico, o quefaz com que a causa básica seja informadade maneira incorreta e não seja iden-tificada.1 Dessa forma, mesmo quando asregras de seleção são aplicadas, a causade morte selecionada não é a patologiaque iniciou a seqüência de eventos quedesencadearam a morte. Em algunscasos, esta patologia não é conhecida oupode não ser determinada; em outros, acausa básica, apesar de conhecida, podenão ter sido informada.12,20 Muitas vezes,os atestados registram somente causasterminais ou mesmo algumas causas quenem existiram.8 Circunstâncias ainda le-vantadas são a falta de uniformidade noentendimento da definição da causa demorte12 e a dificuldade que o médicoenfrenta quando precisa informar umacausa básica ou uma seqüência de causasque levou à morte; neste caso, ele podenão descrever o curso clínico com-pletamente e deixar de informar asafecções concorrentes e, ainda, arbitra-riamente, selecionar uma seqüência.21,22

Laurenti,1 em 1973 em São Paulo, apósinvestigação de óbitos hospitalares,encontrou concordância de somente62,31% entre as causas básicas dos

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atestados de óbito originais e aquelespreenchidos após investigação hospitalar.Em estudo realizado na Região Me-tropolitana de Belo Horizonte, em 1989,a concordância observada foi de 74,4%,com índice Kappa de 0,62.19 Outro estudorealizado por Ladeira e Guimarães,23 paraóbitos por acidentes de trânsito, encon-trou um índice Kappa bem menor(Kappa=0,124).

Um outro fator a ser considerado éque algumas doenças, em função dasregras de seleção, apesar de informadascorretamente como originárias, sãodescartadas em favor de outras causasque têm maior prioridade sobre asprimeiras.2,17 Por exemplo, segundo aDécima Revisão da CID, quando ahipertensão essencial vem mencionadajuntamente com doenças isquêmicas docoração, esta última será selecionadacomo causa básica de morte, mesmo quea hipertensão esteja informada na últimalinha da Parte I da DO. Além disso,quando há mudança nas sucessivasrevisões da CID, essas mesmas regraspodem afetar artificialmente a tendênciade algumas doenças. Exemplo importantede alteração ocorrida da Nona para aDécima Revisão da CID é que nestaúltima, a pneumonia e a broncopneumoniapodem ser aceitas como complicações dequalquer doença, particularmente dedoenças consumptivas (neoplasias,desnutrição) e de doenças que levam àparalisia,11 o que não ocorria na NonaRevisão. Dessa forma, a pneumonia e abroncopneumonia serão mais dificilmenteselecionadas como causa básica de mortepela Décima Revisão, ocorrendo aaparente diminuição de suas freqüências.24

Essas revisões periódicas, com as cor-respondentes modificações das regras deseleção da causa básica da morte, não têminfluência em estudos de causas múltiplasde morte.1

Importância das causas múltiplas demorte no estudo da situação de saúde

O enfoque da causa única adequava-se à descrição dos padrões de mortalidade

do início do século, quando as morteseram devidas, em sua grande maioria, adoenças agudas infecciosas ou aviolências.2,5,18 À medida que tais causasdiminuem e aumenta a expectativa devida das pessoas numa população, aproporção de adultos e idosos cresce eas doenças crônico-degenerat ivastornam-se as causas mais freqüentes demorte.25 Nesse caso, as mortes sãodeterminadas por mais de uma condiçãopresente no momento da morte,aumentando o número de diagnósticosinformados na DO, fato este quedificulta a identificação da patologia queiniciou a cadeia de eventos e a seleçãode uma única causa como causa básicade morte.1,2,4,5,22 Diante dessa situação,as estatísticas de mortalidade sob oenfoque das causas múltiplas de mortepodem retratar melhor o perfi l demortalidade, quando se aproveitam asinformações sobre todas as causas demorte mencionadas na DO.

Vários estudos têm utilizado aapuração de todos os diagnósticosinformados nos atestados de óbito -codificação de causas múltiplas de morte- com o objetivo de um melhor conhe-cimento da morbidade da população eda freqüência de óbitos por aquelasdoenças que não são selecionadas comocausa básica, bem como da possibil-idade do estudo da associação decausas.1,2,6,17,22,26-32

Já em 1925, o Comitê de CausasContributórias de Morte do Vital

Statistics Section of the American Public

Health Association, coordenado por vanBuren,33 considerou que estatísticas vitaiscontendo informações de causas asso-ciadas ofereceriam contribuições valiosaspara a clínica médica e a saúde pública.Tais estatísticas, possibilitando o conhe-cimento das causas mencionadas na DO,permitiriam dimensionar a magnitude dedeterminadas doenças como importantescausas de morte, as quais muitas vezestêm permanecidas ocultas devido aoenfoque da causa básica de morte. Naopinião de Treloar,34 a prevalência dedoença numa população não será di-

O enfoque dacausa únicaadequava-se àdescrição dospadrões demortalidade doinício do século,quando as morteseram devidas, emsua grandemaioria, adoenças agudasinfecciosas ou av io lênc ias . 2,5 ,18

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mensionada quando se seleciona apenasuma causa de morte e é falsa a pres-suposição de que cada morte sejaresposta de uma única causa, pois opressuposto da multiplicidade de causasenvolvidas na morte é tácita no própriocertificado de óbito.

Segundo Laurenti,1 trabalhar comas causas múltiplas de morte é maisvantajoso, pois parece ser mais simplesa declaração de todos os diagnósticosexistentes nos atestados do que o preen-chimento de uma cadeia de eventos quelevou ao óbito. Ainda segundo o autor,apesar da definição de causa básica serentendida e aceita pelos médicos, que aacham lógica porque considera a pre-venção primária, em alguns casos elesnão aceitam que determinadas patologiasapareçam nas estatísticas de mortalidade,como aquelas de pequena gravidade quelevam a complicações cirúrgicas. Nestescasos, ocorre uma resistência por partedos médicos, em informar corretamentea causa básica, no atestado. Além disso,o autor verificou que em muitas de-clarações de óbito com causa básicaselecionada incorretamente, ela estavamencionada nas declarações de óbitooriginais, porém em posição incorreta,evidenciando a importância do estudo damortalidade por causas múltiplas demorte.

Alguns autores29,35

têm enfatizado queprogramas de prevenção orientados peloperfil de mortalidade definido pela causabásica não são suficientes para evitar asmortes. Desta forma, a atuação sobre asdemais causas que participaram doprocesso que levou ao óbito (as causasassociadas) poderia trazer um impactomaior, pois, se as afecções contribuintespersistirem, não bastarão as medidas paraevitar a causa básica. Exemplo disso é aassociação de infecção e deficiêncianutricional; é necessário intervir nos doiselementos, pois, sem esta intervenção, podeocorrer o denominado fenômeno da“substituição”, ou seja, uma morte evitadapela não ocorrência de uma infecção (causabásica) pode ocorrer posteriormente como

conseqüência de outra infecção, sepersistir a deficiência nutricional (causaassociada).29,35

Formas de apresentação das causasmúltiplas de morte

O estudo das causas múltiplas demorte tem sido discutido desde o iníciodo século passado, propondo-se a suautilização para a análise de tendências demortalidade de afecções que dificilmenteseriam selecionadas como causa básicatais como a hipertensão arterial36 e odiabetes mellitus,20,28,31,37-39 além da na-tureza das lesões.2,17,22,40 Tem sidoutilizado também em estudos de algunsgrupos ocupacionais,7,41

de mortalidade

infantil27,29,30 e de agravos de saúde sobvigilância epidemiológica.42-44

As estatísticas de mortalidade porcausas múltiplas aproveitam todas ascausas mencionadas nos atestados -básicas e associadas. A causa básica é aque dá origem a uma sucessão de afecções,as chamadas conseqüenciais. As causasassociadas são constituídas pelas afecçõesconseqüenciais e contribuintes. Estasúltimas não entram na cadeia iniciada pelacausa básica, e no atestado devem serdeclaradas na Parte II.1,2

Uma importante questão a serconsiderada durante o processamento dosdados referentes às causas múltiplas demorte é a necessidade de se eliminar aduplicação ou multiplicação de diag-nósticos sempre que estes ocorrerem.Esta multiplicação de diagnósticos ocorrequando as causas múltiplas são tabuladasem maiores graus de agregação do queaqueles em que os dados foram pro-duzidos, ou seja, o número de causasassociadas tende a diminuir quando seaumenta o grau de agregação.27,32 Estaeliminação é importante, pois, sem ela,ocorreria a desnecessária verificação daassociação de uma doença com elamesma.2

Para a análise das causas múltiplasde morte, deve-se estar atento à ocor-rência simultânea de doenças agrupadase classificadas com código único, adenominada “associação de causas tipo

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combinação”. Exemplificando, em umaDO cujas causas mencionadas são adilatação cardíaca, a esclerose renal e ahipertensão, as três afecções serãocombinadas em um código único, adoença cardíaca e renal hipertensiva.Nesse caso, se cada condição não forindividualmente codificada, a patologiarenal não será evidenciada nem durante autil ização do enfoque das causasmúltiplas.2,16,21

Para a apresentação das causasmúltiplas de morte, são propostos doistipos de tabulação.2,22 No primeiro deles,seria incluída a apresentação dafreqüência de todos os diagnósticosinformados nas declarações de óbito.Neste tipo de apresentação, observa-se amudança da freqüência das causas demorte quando considerado o total devezes que são mencionadas em relaçãoao número de vezes que são selecionadascomo causa básica de morte. A razão dafreqüência com que uma causa émencionada dividida pela freqüência comque é selecionada como causa básica demorte (razão menções/causa básica) épróxima da unidade para algumas doençascomo neoplasias e para causas externas.Para outras doenças, essa razão é próximaou maior que dois, demonstrando quepara essas causas é importante a análisesob o enfoque das causas múltiplas demorte. Em um estudo realizado no Estadode São Paulo, as doenças hipertensivasforam responsáveis, como causa básicade morte, em aproximadamente 2% dosóbitos; porém, pelo enfoque das causasmúltiplas, elas estavam presentes emcerca de 8% dos óbitos masculinos e em10% do sexo feminino.2

Da mesma forma, o diabetes temsua freqüência bastante aumentada, quan-do se analisa a mortalidade por causasmúltiplas. Puffer6 verificou que, emBristol e em São Francisco, o diabetesmellitus foi selecionado como causabásica de morte em 1,1 e 0,9% dos óbitos,respectivamente. Quando foi analisadoatravés do enfoque das causas múltiplas,ele verificou que esta causa estava pre-sente em 2,6 e 3,1% (mais do que o dobro)

das DO. Franco e colaboradores,31 noEstado de São Paulo, encontraram umaproporção de 2,6% do total de óbitoscom diabetes mellitus como causa básicade morte. Esta proporção aumentou para6,8% após análise sob a perspectiva dascausas múltiplas de morte. Lessa ecolaboradores,37 na cidade de Salvador,observaram que, com a inclusão dosóbitos por diabetes mellitus como causaassociada, a mortalidade por esta causaapresentou, em algumas regiões, umincremento de até 700%.

A principal aplicação dos estudosde causas múltiplas de morte é paraobter informações sobre doenças deduração prolongada não fatais, massuficientemente sérias para seremmencionadas na DO7 ou para as causasde morte que são dificilmente classi-ficadas como causa básica de morte(apresentam maiores razões menções/causa básica).45 Entretanto, os dados decausas múltiplas de morte também sãoúteis para certas causas que apresentammenores razões menções/causa básica,mas são responsáveis por grandenúmero de óbitos (por exemplo doençasisquêmicas do coração)22 ou outrascausas que são objeto de investigaçãoem programas de vigilância epidemio-lógica (por exemplo mortes maternas,22,26

doenças de notificação compulsória,42-44

doenças ocupacionais).7,41 Em saúdeocupacional, por exemplo, foi obser-vado entre cortadores de granito que osíndices PMR (Proportionate Mortality

Ratios, razão entre o observado e oesperado) para doença renal crônica eartrite foram estatisticamente significa-tivos sob a perspectiva das causasmúltiplas de morte, enquanto que estesíndices não foram significativos com autilização do enfoque da causa básicade morte.7

Em estudo sobre doenças cere-brovasculares,46 a utilização do enfoquedas causas múltiplas de morte permitiua detecção de áreas onde este problemade saúde foi subestimado pela utilizaçãoda informação proveniente somente dacausa básica de morte, possibilitando aidentificação de regiões com maiores

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taxas de mortalidade por essas doençase, assim, oferecendo subsídios para asaúde pública na priorização de ações paraa saúde.

O segundo tipo de tabulação apre-senta associações de causas, que é umdos aspectos mais importantes no estudodas causas múltiplas de morte, porque amorte muitas vezes pode ocorrer devidoà ação sinérgica de duas ou mais afecçõese tal fato não pode ser avaliado pelasestatísticas por causa básica.6,32 NoEstado de São Paulo, Santo2 verificouque, quando a hipertensão era a causabásica, as causas associadas maisfreqüentes eram as doenças da circulaçãopulmonar e outras formas de doenças docoração, cujo principal componente eraa insuficiência cardíaca. Em estudo sobremortalidade de adultos, Laurenti1 veri-ficou que, nos atestados de óbito nosquais o diabetes estava registrado, ascausas associadas foram arteriosclerose,doenças cerebrovasculares, hipertensãoarterial e doenças isquêmicas do coração.Melo e colaboradores28 observaramque, nas DO cuja causa básica era odiabetes mellitus, 29,8% mencionavam asepticemia.

Medidas de associação utilizadas naanálise das causas múltiplas de morte

Uma aplicação importante do en-foque das causas múltiplas de morte é averificação da associação entre asafecções presentes no momento da morte.Quanto à medida da associação entre ascausas , d ive r sos e s tudos u t i l i za -ram diferentes metodologias.17,21,27,29,30

Guralnick21 construiu uma tabela 2x2 compares de causa básica e contributórias,para cálculo do qui-quadrado.

Chamblee e Evans,17 partindo dapressuposição da ocorrência das doençasser independente, sugeriram o cálculo doQ de Yule para verificação da associaçãodas causas, teste também utilizado porSaad27 e Niobey.29 Esse teste mede amagnitude da associação entre duas va-riáveis (causas básicas e causasassociadas) e é calculado com base na

razão dos produtos cruzados obtidos apartir de tabelas de contingência tipo 2x2.Quando o Q de Yule for igual à unidade,significa que a associação é perfeita e,quando for zero, não existe associação.Ao utilizar esse recurso estatístico,entretanto, é necessário estar-se atento àpressuposição da independência durantea interpretação dos resultados. Tambémbaseado na suposição de independência,Israel e colaboradores

22 propõe análise

através do cálculo da razão do númerode pares de causas observados pelonúmero de pares esperados.

Em um outro enfoque, Machado30

utilizou o método do Grade of Membership

(GOM), que permite observar a ocor-rência de conjuntos de enfermidades quese agremiam em maior número de vezes.Delineou combinações de causas demortes infantis (denominados “perfis”)sob a perspectiva da classificação deconjuntos nebulosos ou conjuntos deenfermidades que se destacaram comuma significativa freqüência. Essametodologia também parte da pressupo-sição de que as variáveis originais sãoindependentes.

Entretanto, segundo Olson ecolaboradores,47 é difícil determinarquando a associação de uma condiçãocom outra tem significância estatística,pois as técnicas estatísticas utilizadaspara a determinação de associaçõessignificativas partem da premissa de queas variáveis do estudo são independentese, portanto, tais técnicas não seriamaplicáveis para o estudo das causasmúltiplas de morte.

Mackenbach e colaboradores4 con-sideram que o estudo das causas múltiplasde morte é muito apropriado para ocálculo do efeito potencial na expectativade vida ao eliminar uma certa causa demorte. Tábuas de vida com utilização dascausas múltiplas de morte seriam úteispara estimar melhor a medida da impor-tância relativa das causas de morte e oganho potencial na expectativa de vidaobtido com a intervenção em uma causaespecífica de morte. Entretanto, tambémalertam que as causas são dependentes

Em estudo sobredoenças

cerebrovasculares,46

a utilização doenfoque das

causas múltiplasde morte permitiu

a detecção deáreas onde este

problema de saúdefoi subestimado

pela utilização dainformação

provenientesomente da causa

básica de morte,possibilitando aidentificação de

regiões commaiores taxas demortalidade por

essas doenças e,assim, oferecendo

subsídios para asaúde pública na

priorização deações para a

saúde.

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entre si e que uma pessoa que não morreude uma determinada causa não implica emter a mesma probabilidade de morrer deoutras causas assim como outrosintegrantes de uma população, pois podemser portadores de determinados fatoresde risco que os predispõem a ter outrascausas de morte. Verificaram que ospacientes que morrem de doenças cardio-vasculares têm probabilidade maior de teruma ou mais doenças crônicas do queaqueles que morrem de outras causas.Isso implica que, eliminando as doençascardiovasculares, com o uso do métodode análise de causas competitivas demorte pelas tábuas de vida, os anos devida a serem ganhos estarão sendosobrestimados em relação à eliminaçãode outras causas como neoplasias ecausas externas, nos quais ocorre ocontrário pois raramente outras causassão mencionadas.

Da mesma forma, a OrganizaçãoMundial da Saúde (OMS)48 adverte quedeve ser evitada a comparação de umaassociação de causas com o grupo rema-nescente de todos os óbitos devidos àsdemais causas de morte. Por ser esse grupoheterogêneo, esse tipo de comparação nãopermite uma conclusão razoável, sendocientificamente inválido. Recomenda tra-balhar com a comparação entre asproporções das associações de uma causa.Uma graduação dessas proporções indicaquais causas estão mais freqüentementeassociadas a uma causa básica. Exem-plificando, a hipertensão está mais fre-qüentemente mencionada associada àdoença cerebrovascular do que com àsneoplasias. Essa análise também sugeridapor Treloar34 foi realizada por Laurenti,1

Santo,2 Melo e colaboradores28 e Franco ecolaboradores.31

Essas várias metodologias utilizadaspor diversos autores manifestam a com-plexidade do estudo de associação decausas na análise das causas múltiplas demorte,22 demonstrando a necessidade depesquisas adicionais nas quais se utilizemtécnicas estatísticas especiais quecontemplem essas questões.

Limitações na uti l ização das causasmúltiplas de morte como indicadoresde saúde

Para utilização e interpretaçãoadequada das causas múltiplas de morteé necessário estar-se ciente daslimitações desse método de análise. Assimcomo ocorre com o enfoque da causabásica de morte, as estatísticas demortalidade resultam da opinião médica,que pode variar segundo a escola e a áreageográfica em que o médico atua ousegundo a compreensão de qual causadeverá ser incluída na declaração deóbito. Além disso, as causas múltiplas demorte são dependentes da magnitude comque os médicos relatam as causasassociadas.22,49

Uma outra limitação do enfoque dascausas múltiplas de morte é o própriomodelo da declaração de óbito, desenhadopara informar a causa básica, que estáassim adotado desde a Sexta Revisão daLista Internacional, em 1948.4,47 SegundoGuralnick,21 quando o médico é forçadoa decidir sobre uma única causa ou umaseqüência de eventos que levou à morte,ele não se sente estimulado a descrevero curso clínico completo da doença.Aliado a isso, vem sendo dada, histori-camente, pouca importância à utilizaçãodas causas associadas presentes nosatestados de óbito,27 podendo haveromissão de diagnósticos durante opreenchimento da DO devido ao espaçoinsuficiente para que sejam anotadastodas as causas existentes.1

Um questionamento já levantado éa realização da análise de causasexclusivamente informadas nos ates-tados de óbito, sem busca de informaçõescomplementares em registros dehistórias clínicas e autópsias. SegundoSaad,27 só se justifica trabalhar apenascom as causas mencionadas nas DOquando estas aparecem não somente emnúmero significativo, mas, também,reproduzam o mais fielmente possível ashistórias clínicas. Entretanto, isso nemsempre é exeqüível. Para Laurenti,1 acodificação das causas múltiplas utili-zando somente os atestados oficiais,

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melhora as informações, mesmo não seobtendo o número exato das ocorrênciasdas várias causas. Não se mediria amagnitude real das associações, mas ter-se-ia uma indicação satisfatória do sentidodas mesmas associações. Niobey29

corrobora tal opinião, acreditando que aanálise realizada em seu estudo demortalidade infantil permitiu umaaproximação do complexo causal noconjunto de óbitos infantis tardios, inclusivepodendo representar um dos indicadoresde monitoramento das ações de prevençãoe da qualidade de atendimento dos serviçosde saúde.

Os problemas acima destacadosnão invalidam a análise por causas múl-tiplas de morte. Simplesmente, é precisoter consciência de que a informaçãodisponível, ainda que mais rica que a análiseunicausal, se encontra incompleta e sujeitaa imper-feições, devendo os resultadosserem encarados como uma aproximaçãodo processo mórbido no qual se insere amorte.27

O estudo das causas múltiplas demorte representa um avanço na análise dasestatísticas de mortalidade. Entretanto, nãovisa substituir o enfoque da causa básicade morte que, apesar de apresentarlimitações, possui objetivos e benefíciosbem estabelecidos. A utilização da meto-dologia das causas múltiplas de morte podeser um importante instrumento com-plementar na avaliação e planejamento dasações de saúde, especialmente nestemomento em que se verifica um aumentodo número de diagnósticos informados pordeclaração de óbito. Tal análise torna-secada vez mais factível, pois, na atualidade,conta-se com o desenvolvimento deprograma específico como o Tabulador deCausas Múltiplas de Morte (TCM), jáacoplado ao Sistema de Informações sobreMortalidade (SIM), do Ministério da Saúde.

Uma vantagem do estudo das causasmúltiplas de morte é que este poderepresentar um importante incentivo parao preenchimento mais completo dasdeclarações de óbito, obtendo-se maisinformação da DO e, conseqüentemente,aumentando a utilidade das estatísticas de

mortalidade que, quando utilizadasadequadamente, possibilitam melhorconhecimento da situação de saúde dapopulação.

Agradecimentos

Aos professores Augusto HasiakSanto e Mark Drew Crosland Guimarãespelas preciosas sugestões.

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Doenças Crônico-Degenerativas em Adultos daRegião Centro-Sul de Belo Horizonte: Análise sob

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Informe Epidemiológico do SUS 2001; 10(4) : 177 - 188.

Resumo

As estatísticas de mortalidade constituem um importante instrumento para a análise dascondições de saúde das populações. Essa análise tem empregado, tradicionalmente, oconceito de causa básica de morte. Atualmente, entretanto, com o aumento da importânciadas doenças crônico-degenerativas como causas de morte, um maior número de diagnósticostem sido informado nas declarações de óbito, dificultando a seleção de uma única causa demorte e levando a uma perda de informações relativas às afecções que não são selecionadascomo causa básica de morte. Uma alternativa para isso é a utilização do enfoque de causasmúltiplas de morte. Utilizou-se esse enfoque para estabelecer a magnitude da mortalidadede algumas doenças crônico-degenerativas na região Centro-Sul de Belo Horizonte. Foramanalisados todos os óbitos ocorridos em adultos (20 a 69 anos de idade), no período de1996 a 1998, por diabetes mellitus, doenças cerebrovasculares, doenças hipertensivas,fibrose e cirrose do fígado e doenças crônicas das vias aéreas inferiores. Os óbitos pordiabetes mellitus e por doença hipertensiva, quando analisados sob o enfoque da causabásica de morte representaram 1,7 e 2,3% do total, respectivamente, e, quando analisadosatravés das causas múltiplas de morte, essas proporções aumentaram para 5,4 e 9,0%.Considerando que as políticas de saúde devem propiciar a promoção e proteção da saúde,enfatizando o conhecimento e a prevenção dos fatores de risco, o enfoque das causasmúltiplas de morte pode ser um importante instrumento no planejamento das ações desaúde para as doenças crônico-degenerativas.

Palavras-Chave

Mortalidade; Doenças Crônico-degenerativas; Causa da Morte; Causas Múltiplas de Morte.

Summary

Mortality statistics are an important tool to evaluate the population’s health status. This analysishas traditionally been based on the concept of the underlying cause of death. Today, however,with the increasing proportion of death from chronic-degenerative diseases, an increasednumber of conditions are reported on death certificates, making assignment of a single causedifficult and resulting in the loss of information about conditions which are not classified as theunderlying cause of death. Analysis based on multiple causes could be a new dimension inmortality statistics. This approach was used in this study of deaths caused by chronic diseasesin the Center-South region of the city of Belo Horizonte. All deaths of adults aged 20 to 69 yearswhich ocurred in the period between 1996 and 1998, caused by diabetes, cerebrovasculardiseases, hypertension, cirrhosis and chronic lower respiratory tract diseases were considered.The proportional mortality of diabetes mellitus and hypertensive diseases was 1.7 and 2.3%,respectively when analyzed based on the underlying cause of death, and rose to 5.4 and 9.0%,respectively, when analyzed using the multiple cause of death approach. Health policies mustprovide health promotion and protection, with emphasis on knowledge and prevention of riskfactors. The multiple causes of death approach could be an important instrument for planningand implementing effective health programs of chronic-degenerative diseases.

Key Words

Mortality; Chronic Diseases; Cause of Death; Multiple Causes of Death.

* Artigo originado de dissertação de Mestrado “Desigualdade Social e Causas Múltiplas de Morte em Adultosda Região Centro-Sul de Belo Horizonte”. Programa de Pós-graduação em Saúde Pública/Universidade Federalde Minas Gerais.Endereço para correspondência: Gerência de Regulação, Epidemiologia e Informação/GERSA-CS/Secretaria Mu-nicipal de Saúde de Belo Horizonte - Rua Tupis, 149 - 7o andar - Centro - Belo Horizonte/MG. CEP:30.130-007.E-mail:[email protected]

Elisabeth FrançaGrupo de Estudos em Epidemiologia/DMPS/Faculdade de Medicina/UFMG

Lenice Harumi IshitaniGerência de Regulação, Epidemiologia e Informação-GERSA-CS/Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte

Chronic-Degenerative Diseases among Adults of the Center-South Region of the Belo Horizonte City: Analyses by

Multiple Causes of Death Approach

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Doenças Crônico-degenerativas em Adultos da Região Centro-Sul de Belo Horizonte

Informe Epidemiológico

do SUS

Introdução

As estatísticas de mortalidade têmsido freqüentemente utilizadas para aanálise das condições de saúde daspopulações. Entre as muitas variáveis deanálise, como sexo, faixa etária, local deocorrência e local de residência, a causade morte constitui a mais importante.1,2

Tradicionalmente, emprega-se nasestatísticas de mortalidade o conceito decausa básica de morte por permitir maiorcomparabilidade entre diferentes locais,pela sua importância na análise detendências históricas e por seu uso tradi-cional de indicar medidas de prevençãoda morte. Entretanto, o enfoque da causaúnica adequava-se à descrição dos pa-drões de mortalidade do início do séculopassado, quando os óbitos eram devidos,em sua grande maioria, a “doenças agudasinfecciosas” ou a violências.2,3

Com o envelhecimento da populaçãoe com o aumento da expectativa de vida,as doenças crônico-degenerativas torna-ram-se importantes causas de morte.Devido ao curso prolongado dessasdoenças e, muitas vezes, por apresen-tarem etiologia comum, observa-se umaumento do número de diagnósticosinformados na declaração de óbito (DO),2,4

o que dificulta a seleção de uma únicacausa. Entre esses diagnósticos podemexistir causas importantes de morte quenão são classificadas como causa básica,não constando, portanto, nas estatísticasde mortalidade. Isso ocorre, por exemplo,com a hipertensão arterial e o diabetes, oque dificulta a avaliação dos programasde controle dessas doenças. O mesmo éobservado em relação à prematuridade,também raramente classificada comocausa básica. Diante desses fatos, aoselecionar apenas uma das patologiascomo causa de morte, perdem-se infor-mações relativas aos demais diagnósticoscontidos nas DO.

Outra limitação do enfoque da causabásica de morte é o preenchimentoinadequado da DO, por desconhecimentoda maneira correta de fazê-lo ou devido àdificuldade do médico em selecionar acadeia de acontecimentos que levou à

morte. Nesse caso, ele pode deixar deinformar as afecções concorrentes, nãodescrever o curso clínico completamenteou ainda, arbitrariamente, selecionar umaoutra seqüência.5

Um outro aspecto importante é que,apesar de serem informadas corretamentecomo originárias, algumas afecções nãosão selecionadas como causa básica, emfunção das regras de seleção.1 Segundo aDécima Revisão da Classificação Es-tatística Internacional de Doenças eProblemas Relacionados à Saúde (CID-10), em uma DO na qual a hipertensãofoi a causa básica registrada e a doençaisquêmica do coração, a causa associada,será considerada causa básica de morte adoença isquêmica.6

Falhas também podem ocorrer nomomento da codificação das causasmencionadas na DO, decorrentes de errosde registro de código, desconsideraçãode algumas afecções mencionadas noatestado de óbito ou de aplicação incorretade regras de codificação, alterando aseleção da causa básica de morte.2

Os outros diagnósticos, além dacausa básica, que estavam presentes nomomento da morte e que podem ter sidoimportantes na evolução para o óbito,devem ser conhecidos. Essas infor-mações poderão ser obtidas através doestudo da mortalidade sob o enfoque decausas múltiplas de morte, o qual poderepresentar um importante subsídio parao planejamento das ações de saúde.

O estudo das causas múltiplas demorte tem sido discutido desde o iníciodo século passado e foi utilizado para aanálise de afecções que dificilmenteseriam selecionadas como causa básica,tais como a hipertensão arterial,7 odiabetes mellitus,8,9 a natureza das lesõesem óbitos por causas externas.2,3

Também tem sido utilizado em estudosde alguns grupos ocupacionais,10 demortalidade infantil,11 estudos para aanálise de agravos sob vigilância epi-demiológica12 e em estudos de tendênciasda mortalidade.7

Com o envelhecimento da popula-ção, os problemas de saúde do adulto tor-

O estudo dascausas múltiplas

de morte tem sidodiscutido desde o

início do séculopassado e foi

utilizado para aanálise de

afecções quedificilmente seriamselecionadas comocausa básica, tais

como ahipertensãoarterial,7 o

diabetesmellitus,8,9 anatureza das

lesões em óbitospor causas

externas. 2,3

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volume 10, nº 4outubro/dezembro 2001

naram-se importantes. Apesar disso, aSaúde Pública no Brasil tem tradi-cionalmente priorizado ações voltadaspara a criança, a mulher e o idoso,provocando um lapso em relação àassistência ao adulto - o período de vidamais produtivo de uma pessoa.13 Assim,conhecer a mortalidade dessa faixa etáriatorna-se fundamental para a avaliação dasituação de saúde e o planejamento dosserviços de saúde.

Diante dessas considerações evisando quantificar a mortalidade poralgumas doenças crônicas não trans-missíveis bem como identificar aassociação das causas informadas nasdeclarações de óbito, propôs-se utilizar oenfoque das causas múltiplas de mortepara análise dos óbitos de adultos pordiabetes mellitus, doenças cerebrovas-culares, doenças hipertensivas, fibrose ecirrose do fígado e doenças crônicas dasvias aéreas inferiores (bronquites,enfisema, asma e doenças pulmonaresobstrutivas crônicas).

Material e métodos

Foram utilizadas as informaçõesreferentes aos óbitos de 1996 a 1998, deadultos na faixa etária de 20 a 69 anos,residentes na regional Centro-Sul de BeloHorizonte, com uma população estimadaem 250 mil habitantes.

Os dados contidos na base de dadosdo Sistema de Informações sobreMortalidade (SIM) - Ministério da Saúdeforam processados no Núcleo de Epide-miologia do Distrito Sanitário Centro-Sul(DISACS). Esses dados foram comple-mentados com os obtidos por busca ativa,na Fundação João Pinheiro, das DO quenão constavam na base de dados do SIMdo DISACS.

As causas de óbito informadas nadeclaração de óbito foram codificadas,segundo CID-10.14 Em se tratando deestudo sob a perspectiva das causasmúltiplas de morte, é necessária ainformação precisa sobre o número devezes que cada diagnóstico foi men-cionado. Dessa forma, nas DO em quehouve codificação da associação de

causas, cada afecção foi, posteriormente,codificada individualmente.

Após a codificação, todas as causasmencionadas de óbito foram digitadas noprograma Sistema de Seleção de CausaBásica (SCB-l0 - Décima Revisão),15 pro-grama compatível com o SIM e queprocede à seleção da causa básica de óbito,padronizando a utilização das regras de clas-sificação das causas, segundo a CID-10.6

Os diagnósticos mencionados nasDO foram agrupados segundo a ListaBrasileira para Mortalidade da CID-10(CID-BR).16 A CID-BR, elaborada em1980 pela Divisão Nacional de Epide-miologia e Centro Brasileiro de Classi-ficação de Doenças (CBCD), é uma listaresumida que leva em conta as causas deóbito mais relevantes no quadro noso-lógico brasileiro, permitindo a pa-dronização da apresentação dos dados, eé atualizada conforme revisão da CID.

As causas de óbito foram analisadassegundo o conceito de causa básica ecausas múltiplas de morte. A definição dacausa básica de morte utilizada foi aquelapadronizada em 1948, quando foiaprovada a Sexta Revisão da CID, ou seja:“(a) a doença ou lesão que iniciou a cadeiade acontecimentos patológicos queconduziram diretamente à morte ou (b)as circunstâncias do acidente ou vio-lência que produziram a lesão fatal”.6

Causas múltiplas são aquelas referentesà classificação de todas as causas -básicas e associadas - mencionadas nosatestados. As causas associadas sãoconstituídas pelas causas conseqüenciaise as contribuintes. As conseqüenciais sãoaquelas que sucedem a causa básica.Causas contribuintes são aquelas que nãofazem parte da cadeia iniciada pela básica,e que, no atestado, são declaradas naParte II.1

Para obtenção das informaçõessobre a causa básica e as causas múltiplasde morte, foi utilizado o Tabulador deCausas Múltiplas de Morte (TCM),programa específico e compatível com oSIM e o SCB-10. Esse programa constróiuma tabela matriz que oferece afreqüência das causas mencionadas nas

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Doenças Crônico-degenerativas em Adultos da Região Centro-Sul de Belo Horizonte

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DO, o número e a média de diagnósticosmencionados na DO segundo a causabásica de morte. Além disso, fornece acombinação dessas causas e o cálculo darazão entre o total de menções de umadeterminada causa e o número de vezesem que foi selecionada como básica(razão menções/causa básica). Na análisedas causas múltiplas de morte é necessáriaa eliminação das multiplicações dediagnósticos, realizadas pelo TCM. Estamultiplicação de diagnósticos ocorrequando as causas múltiplas são tabuladasem graus de agregação maiores do queaqueles em que os dados foram produ-zidos, ou seja, quando se aumenta o graude agregação o número de causasassociadas tende a diminuir.17 Sem essacorreção, ocorreria a desnecessáriaverificação de associação de uma doençacom ela mesma.2

Selecionou-se para estudo osseguintes grupos de causas e respectivoscódigos da CID-10: diabetes mellitus (E10- E14), doenças hipertensivas (I10 - I13),doenças cerebrovasculares (I60 - I69),fibrose e cirrose do fígado (K74) e ogrupo das doenças crônicas das viasaéreas inferiores (bronquites, enfisema,asma, doenças pulmonares obstrutivas

crônicas, identificadas no grupo da CID-10 pelos códigos J40 - J47).

Resultados

Em 2.239 DO de adultos residentesna região Centro-Sul, ocorridos no perío-do de 1996 a 1998, foram mencionados6.168 diagnósticos, resultando em umamédia de 2,76 diagnósticos informadospor DO (desvio-padrão = 1,24) (Tabela 1).Observa-se que, em apenas 16,3% dasDO, estava informada somente umacausa de morte e que, pelo enfoque dacausa básica de morte, se deixariam deestudar as informações relativas aosoutros diagnósticos mencionados em83,7% das DO.

As causas básicas mais impor-tantes de morte neste período foram asdoenças do aparelho circulatório, asneoplasias e as causas externas, quecorresponderam a 67,8% dos óbitos(Tabela 2). As doenças isquêmicas docoração (n=198), a doença hipertensiva(n=52) e as doenças cerebrovasculares(n=160) foram responsáveis por 62,9%dos óbitos por doenças do aparelhocirculatório. As mortes violentas comohomicídios (n=139) e acidentes detransporte (n=122), corresponderam aum total de 70% dos óbitos por causasexternas.

Ao analisar as causas de morte soba perspectiva das causas múltiplas,observa-se um aumento da importânciarelativa de quase todas as causas de morteevidenciada pela razão menções/causabásica maior que um (Tabela 2). Esseaumento, que atingiu 525% nas doençasdo sangue e dos órgãos hematopoiéticos,só não foi maior que 50% (razãomenções/causa básica maior ou igual a1,50) nas neoplasias, nas doenças car-diovasculares, nas complicações dagravidez, parto e puerpério e nas causasexternas. Essas causas foram também asque apresentaram menores médias dediagnósticos por DO. Observa-se que amédia apresentada na Tabela 2 (2,13) émenor do que a apresentada na Tabela 1(2,76). Tal fato deve-se à eliminação damultiplicação de diagnósticos decorrente

Fonte: Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) / Núcleo deEpidemiologia / Distrito Sanitário Centro-Sul (DISACS)* Média de diagnósticos por DO=2,76 e desvio-padrão=1,24.

Tabela 1 - Distribuição de óbitos de adultos e total dediagnósticos*, segundo o número de diagnósticos mencionados

por declaração de óbito (DO) na região Centro-Sul de BeloHorizonte - 1996 a 1998

1

2

3

4

5

6

7

Total

Número dediagnósticos

ÓbitosNo %

Total de diagnósticosNo %

364

610

742

331

131

48

13

2.239

16,3

27,2

33,1

14,8

5,9

2,1

0,6

100,0

364

1.220

2.226

1.324

655

288

91

6.168

5,9

19,8

36,1

21,5

10,6

4,7

1,5

100,0

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do maior grau de agregação dos agru-pamentos, conforme capítulos da CID-10.

A Tabela 3 apresenta algumasdoenças crônicas não transmissíveiscomo causas de morte e observa-se quenas 542 DO em que foram selecionadascomo causa básica de morte, forammencionadas em média mais de 2,54diagnósticos por DO, atingindo umamédia de 3,35 no diabetes mellitus.

Observa-se que, na região Centro-Sul, alguns diagnósticos como o diabetesmellitus e a doença hipertensiva forammencionados pelo menos duas e trêsvezes mais do que selecionados comocausa básica (razão menções/causabásica de 3,30 e 3,88, respectivamente).No caso do diabetes mellitus, quandoanalisado sob o enfoque da causa básicade morte, a proporção de óbitos foi de

1,7% e, quando analisado através dascausas múltiplas de morte, esta proporçãoaumentou para 5,4%. Na doençahipertensiva, passou de 2,3 para 9 %. Coma utilização das causas múltiplas de morte,ocorreu também o aumento das outrasdoenças crônicas não transmissíveisreferidas na Tabela 3.

No estudo de associação de causas(Tabela 4), verifica-se que, quando odiabetes mellitus foi selecionado como acausa básica de morte, as doençashipertensivas apareceram como causaassociada em 29,7% (n=11) das DO,enquanto a septicemia, as doenças is-quêmicas do coração e as doençascerebrovasculares em 18,9% (n=7) e ainsuficiência renal em 21,6% (n=8). Asdoenças hipertensivas, por sua vez, forammencionadas como causa associada em33,8% (n=54) e em 20,7% (n=41),

Tabela 2 - Óbitos e mortalidade proporcional de adultos segundo causa básica e causas múltiplas de morte, agrupadas porcapítulos da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) na região Centro-Sul de Belo Horizonte - 1996 a 1998

Doenças infecciosas e parasitáriasNeoplasiasDoenças do sangue e hematopoéticasDoenças endócrinas, metababolismo e nutricionaisTranstornos mentais e comportamentaisDoenças do sistema nervosoDoenças do olho e anexosDoenças do aparelho circulatórioDoenças do aparelho respiratórioDoenças do aparelho digestivoDoenças da pele, tecido subcutâneoDoenças osteomusculares, tecido conjuntivoDoenças do aparelho geniturinárioGravidez, parto e puerpérioMalformações congênitasMal definidasLesões e envenenamentosCausas externasFat. influenc. saúde e cont. serviços****

Total de óbitos

Causas de morteCausa básicaNo % *

Causa mencionadaNo % *

138492

8472545

-652178142

96

3626

80-

373-

2.239

6,222,00,42,11,12,0

-29,17,96,30,40,31,60,10,33,6

-16,7

-

100,0

33652650

23288

1041

8887072551518

13829

680253452

5

4.759

15,023,52,2

10,43,94,60,0

39,731,611,40,70,86,20,10,4

30,411,320,20,2

Não-calculada

Fonte: Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) / Núcleo de Epidemiologia / Distrito Sanitário Centro-Sul (DISACS).* Percentual em relação ao total de óbitos.** Razão (M/B) = razão causa mencionada / causa básica.*** Média de diagnósticos por declaração de óbito, segundo a causa básica de morte (agrupadas segundo capítulos da CID-10), excluída

a multiplicação de causas.**** Fatores que influenciam o estado de saúde e o contato com os serviços de saúde.

Razão(M/B)**

Média***

2,431,076,254,943,522,31

-1,363,971,801,673,003,831,001,508,50

-1,21

-

2,13

2,462,072,883,062,602,71

-1,972,192,383,893,672,971,503,333,33

-2,02

2,13

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Doenças Crônico-degenerativas em Adultos da Região Centro-Sul de Belo Horizonte

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Tabela 3 - Óbitos e mortalidade proporcional de adultos segundo causa básica e causas múltiplas de morte, e razão(M/B), por algumas causas de morte na região Centro-Sul de Belo Horizonte - 1996 a 1998

Diabetes mellitus

Doença hipertensiva

Doença cerebrovascular

Doenças isquêmicas do coração

Doenças crônicas de vias aéreas inferiores

Fibrose e cirrose do fígado

Total

Causas de morteCausa básica

No (a) %Causa mencionadaNo (b) % *

37

52

160

198

43

52

542

1,7

2,3

7,1

8,8

1,9

2,3

24,2

122

202

225

244

68

91

952

5,4

9,0

10,0

10,9

3,0

4,1

42,5

Fonte: Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) / Núcleo de Epidemiologia / Distrito Sanitário Centro-Sul (DISACS).* Percentual em relação ao total de óbitos.** Razão causa mencionada / causa básica.*** Média de diagnósticos por declaração de óbito, excluída a multiplicação de diagnósticos.

Razão(M/B) (b/a)**

Média***

3,30

3,88

1,41

1,23

1,58

1,75

1,76

3,35

2,44

2,45

2,42

2,91

2,50

2,54

Tabela 4 - Distribuição percentual* dos principais grupos de causas associados em que diabetes mellitus, doençahipertensiva, doença cérebrovascular, doenças crônicas das vias aéreas inferiores, fibrose e cirrose do fígado e

doenças isquêmicas do coração foram causa básica na região Centro-Sul de Belo Horizonte - 1996 a 1998

Septicemia (A40-A41)D. sang. órg. hem. alguns tr. imun. (D50-D89)*****Diabetes mellitus (E10-E14)Rest. doenças endóc. nutr. e metaból.1*****Transt. mentais e comport. dev. ao álcool (F10)*****Restante transtornos mentais e comportamentais2

Restante das doenças do sistema nervoso3

Doenças hipertensivas (I10-I15)Doenças isquêmicas do coração (I20-I25)Outras doenças cardíacas (I26-I52)Doença cerebrovascular (I60-I69)Aterosclerose (I70)Restante das doenças do aparelho circulatório (I71-I99)Pneumonia (J12-J18)Restante das doenças do aparelho respiratório4

Outras doenças do fígado (K71-K73, K75-K77)Restante das doenças do aparelho digestivo5

Insuficiência renal (N17-N19)Restante das doenças do aparelho geniturinário (N20-N99)

Causas de morte (código na CID-10)**** Diabetesmellitus

(n=37)

Doençacérebro-vascular(n=160)

18,9---

2,78,12,7

29,718,913,518,9

-8,1

13,524,3

--

21,65,4

3,8-

3,81,9

-1,9

---

32,75,81,91,9

-46,21,9

-5,8

-

5,6-

5,64,44,41,35,6

33,81,36,3

-1,33,15,6

28,1-

1,92,51,3

2,5-

11,65,6

-2,01,0

20,7-

31,34,54,51,50,58,11,0

-2,5

-

Fonte: Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) / Núcleo de Epidemiologia / Distrito Sanitário Centro-Sul (DISACS).* Percentual em relação ao total de óbitos.** Razão causa mencionada / causa básica.*** Média de diagnósticos por declaração de óbito, excluída a multiplicação de diagnósticos.**** CID-1014 = Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde***** D50-D89 = Doenças do sangue e dos órgãos hematopoéticos e alguns transtornos imunitários; Restante das doenças endócrinas,

nutricionais e metabólicas; F10: transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool.

Doençascrônicas dasvias aéreasinferiores

(n=43)

Fibrose ecirrose

do fígado(n=52)

11,6----

4,74,74,7

-23,34,72,3

-11,672,14,7

-4,7

-

5,89,61,91,9

----

1,93,8

--

5,85,8

19,226,925,05,8

-

Doençahipertensiva

(n=52)

Causas básicas

Doençaisquêmicado coração

(n=198)

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respectivamente, das DO cujas causasbásicas foram as doenças cerebrovascu-lares e as doenças isquêmicas docoração.

Quando o diabetes mellitus foi causaassociada (Tabela 5), observa-se no-vamente a relação com as doençasisquêmicas do coração que foram a causabásica em 27,1% (n=23). A doençahipertensiva foi causa associada em27,3% (n=41) e 36,0% (n=54) das vezesem que as doenças isquêmicas do coraçãoe as doenças cerebrovasculares foram,respec-tivamente, selecionadas comocausas básicas de morte. Encontrou-setambém uma relação entre fibrose e cirrose

do fígado com hepatite viral e neoplasiade fígado e vias biliares (10,3%). Emrelação às doenças crônicas das vias aéreasinferiores, observa-se uma maior im-portância das doenças do aparelho respi-ratório e das cardiovasculares.

Discussão

A análise da mortalidade de adultos érelevante, pois permite identificar im-portante parcela de mortes prematuras,tendo em vista que a esperança média devida do brasileiro aproxima-se dos 70anos de idade.18 Essas mortes prematurasrepresentam um ônus para a sociedade, poisindicam redução de vida produtiva e perda

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volume 10, nº 4outubro/dezembro 2001

Tabela 5 - Distribuição percentual* das principais causas básicas de óbitos em que diabetes mellitus, doençahipertensiva, doença cerebrovascular, doenças crônicas das vias aéreas inferiores, fibrose e cirrose do fígado edoenças isquêmicas do coração foram causas associadas na região Centro-Sul de Belo Horizonte - 1996 a 1998

Fonte: Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) / Núcleo de Epidemiologia / Distrito Sanitário Centro-Sul (DISACS)* Percentual em relação ao total de menções como causas associadas.** Menções como causa associada.*** CID-1014 Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde**** Restante das doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas;-̀́ = zero.

1 (E00-E-07, E15-E35, E50-E90)2 (J00-J06, J30-J39, J60-J98)3 (K00-K22, K28-K64, K66, K80, K82-K93)

Hepatite viral (B15-B19)

Neoplasia maligna do fígado e vias biliares (C22)

Diabetes mellitus (E10-E14)

Rest. doenças endóc. nutr. e metaból.1 ****

Doenças hipertensivas (I10-I15)

Doenças isquêmicas do coração (I20-I25)

Outras doenças cardíacas (I26-I52)

Doença cerebrovascular (I60-I69)

Restante das doenças do aparelho circulatório (I71-I99)

Pneumonia (J12-J18)

Restante das doenças do aparelho respiratório2

Outras doenças do fígado (K71-K73, K75-K77)

Restante das doenças do aparelho digestivo3

Restante das doenças do aparelho geniturinário (N20-N99)

Causas de morte (código na CID-10***) Diabetesmellitus

(n=35)**

Doençacérebro-vascular(n=65)**

1,2

-

-

1,2

2,4

27,1

12,9

10,6

1,2

5,9

4,7

-

-

3,5

-

-

7,3

2,0

-

27,3

4,0

36,0

4,0

3,3

-

0,7

2,0

0,7

1,5

-

10,8

1,5

4,6

13,8

13,8

-

3,1

3,1

3,1

-

-

1,5

-

-

15,2

6,5

-

-

13,0

4,3

-

10,9

6,5

-

6,5

4,3

Doençascrônicas dasvias aéreasinferiores(n=25)**

Fibrose ecirrose

do fígado(n=39)**

-

-

-

-

4,0

12,0

24,0

8,0

12,0

4,0

8,0

4,0

-

-

10,3

10,3

-

-

5,1

2,6

7,7

-

-

5,1

5,1

28,2

12,8

-

Doençahipertensiva(n=150)**

Causas associadas

Doençaisquêmicado coração(n=46)**

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Doenças Crônico-degenerativas em Adultos da Região Centro-Sul de Belo Horizonte

Informe Epidemiológico

do SUS

da qualidade de vida da família, provocandoimpactos social e econômico negativos.19

Para utilização e interpretaçãoadequada das causas múltiplas de morte,é necessário estar ciente da principallimitação desse método de análise - adependência da magnitude com que osmédicos relatam as causas associadas.Assim como ocorre com o enfoque dacausa básica de morte, as estatísticas demortalidade por causas múltiplas resultamda opinião médica, que pode variarsegundo a escola e a área geográfica emque o médico atua ou segundo a com-preensão de qual causa deverá ser incluídana declaração de óbito.3

Apesar dessas limitações, os resul-tados deste estudo mostraram que amortalidade por algumas doenças crôni-co-degenerativas podem ser subestima-das, tanto em decorrência da evoluçãocrônica das doenças quanto dos proce-dimentos internacionais de seleção dacausa básica de morte adotados pelaOrganização Mundial da Saúde (OMS).9

Optou-se por trabalhar apenas comuma região e não com todo o município,com base na proposta de planejamento eatuação descentralizada da Prefeitura deBelo Horizonte e da impossibilidade doreprocessamento, em tempo hábil, deaproximadamente 4 mil DO por ano dabase de dados da Fundação João Pinheiro,nos quais foram utilizados códigos deassociação. Neste caso, no processo decodificação, outras causas mencionadaspodem não ter sido devidamente codi-ficadas e, portanto, não digitadas, o quepoderia distorcer a interpretação dosresultados encontrados pela metodologiadas causas múltiplas de morte. Seriam,então, necessários o resgate dessas DO,a conferência da codificação, a reco-dificação e posterior digitação. Foi ne-cessário, então, o estudo num períodode três anos (1996 a 1998) para analisara associação de causas, pois o númerode óbitos ocorrido durante o período deum ano foi insuficiente para tal análise.

A proporção de DO que apresentavaapenas uma causa mencionada foi menorque a encontrada por Laurenti,1 Israel3 eSanto,2 o que pode sugerir tendência de

aumento do número de diagnósticosinformados por DO. O número médio decausas informadas nas DO foi semelhanteao encontrado no Estado de São Paulo.17

Essa informação, relacionada à qualidadedo preenchimento da DO e à assistênciaprestada ao falecido,11,17 pode ser umimportante indicador da qualidade dosdados util izados para este estudo.Ressalta-se que, quanto maior for a pro-porção de DO com mais de um diag-nóstico, maior é a perda de informaçãosobre as causas de morte, quando ana-lisadas sob o enfoque da causa única.11 Ascausas, cujas DO apresentaram médias denúmero de diagnósticos me-nores podemser conseqüência do fato de outraspatologias presentes no momento do óbitonão serem mencionadas em função dodiagnóstico bem determinado como nocaso de causas externas e neoplasias; ou,ao contrário, serem referentes aos óbitossem diagnósticos definidos ou relativasàquelas DO com preenchimento deafecções terminais de doenças.

Com o enfoque das causas múltiplasde morte, evidenciou-se que o diabetesmellitus e a doença hipertensiva sãosubestimadas quando analisadas sob aperspectiva da causa básica de morte(razão menções/causa básica maior que3). A proporção de óbitos por diabetesmellitus encontrada neste estudo (1,7%)foi menor que a apresentada por Francoe colaboradores,8 em 1992, no Estado deSão Paulo (2,7%). Isto pode ser ex-plicado pela faixa etária da população desteestudo estar restrita de 20 a 69 anos. Amortalidade proporcional por diabetesmellitus, quando analisada pela pers-pectiva das causas múltiplas de morte emrelação ao enfoque da causa básica demorte, apresentou, um incremento de230%, maior que os 140% relatado emRecife9 e maior que a encontrada porFranco e colaboradores8 (160%) no Estadode São Paulo. Esse aumento pode serconseqüência da evolução crônica dadoença, do aumento da esperança de vidae de melhoria da assistência à saúde.Assim, os diabéticos passam a morrermenos da doença e mais de suas com-

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volume 10, nº 4outubro/dezembro 2001

plicações crônicas, por exemplo as car-diovasculares, que passam a figurarcomo causas básicas de morte subes-timando o diabetes. Este aspecto ressaltaa necessidade de se empregar nos estudosde mortalidade, a análise das causasmúltiplas, quando se deseja conhecer areal importância do diabetes como causade morte. Essa abordagem tambémpermite conhecer o perfil de morbidadeassociada ao diabetes por ocasião doóbito. As doenças cardiovasculares taiscomo as isquêmicas do coração, as cere-brovasculares e as hipertensivas mos-traram-se importantes como já citado poroutros autores.8,9 Esse achado pode serrelacionado a resultados encontrados emoutros estudos, que comprovaram umrisco maior de morte de pacientesdiabéticos por doenças cardiovasculares,entre esses a doença cerebrovascular,além de ser também uma causa impor-tante de insuficiência renal.8,20

Conhecer a magnitude do diabetesmellitus na mortalidade é fundamental porser prevalente em adultos; por apresentargraves complicações e incapacidadesprecoces; por ser fator de risco cardio-vascular; e por ser uma enfermidade quegera encargos, tanto para os pacientescomo para a sociedade. Constitui agra-vante para a Saúde Pública o ônus geradopelo aumento da prevalência do diabetesmellitus decorrente da tecnologia médicae do aumento da expectativa de vida.Assim, a metodologia das causas múl-tiplas de morte poderá ser útil para oplanejamento da prevenção primária e daatenção ao paciente diabético que deveráincluir não só o diagnóstico e o trata-mento, mas, também a reabilitação sociale profissional e a educação sobre aenfermidade.20

Observou-se que a hipertensãoarterial foi mencionada três vezes maisdo que foi selecionada como causabásica, apresentando uma razão men-ções/causa básica menor que a registradapara o Estado de São Paulo.17 Essa razãomaior que três é decorrente de uma regrade seleção que dá preferência às outrascausas (por exemplo doença cerebro-

vascular e doenças isquêmicas docoração). A maior proporção de causasassociadas às doenças hipertensivas,quando esta foi causa básica, foramrelativas às doenças cardíacas, seguidasdas doenças restantes do aparelho res-piratório. Evidenciou-se também aimportância da insuficiência renal e dasdoenças cerebrovasculares. Quando asdoenças hipertensivas foram causasassociadas de morte, as principais causasbásicas foram as doenças isquêmicas docoração e as doenças cerebrovasculares.Esses resultados foram semelhantes aosencontrados por Santo.2

A análise da mortalidade através daperspectiva das causas múltiplas de morteevidenciou que as doenças cerebrovascu-lares são mencionadas 40% mais do quesão selecionadas como causa básica demorte, demonstrando que essas doençassão ainda mais freqüentes do que odivulgado nas estatísticas definidas pelacausa única. A razão de menções/causabásica foi semelhante à encontrada porSanto e Pinheiro.17 Em relação à associaçãodas causas de morte, Santo2 já tinhaapontado a relevância das doenças hiper-tensivas e das demais doenças respiratóriascomo causas associadas de morte. Quantoàs causas básicas mais freqüentes, essastambém foram as doenças isquêmicas docoração, outras doenças cardíacas e odiabetes mellitus. Considerando que asdoenças cerebrovasculares estão associa-das à hipertensão arterial, fica evidente anecessidade do programa de controle dahipertensão arterial. Constituem fatores quecontribuiriam para a redução da mortalidadepor hipertensão arterial: o aumento daconscientização pública quanto aos fatoresde risco cardio e cerebrovasculares; asmudanças significativas nos estilos de vida,como o aumento da atividade física e adiminuição do hábito de fumar; o desen-volvimento de terapia efetiva para hiper-tensão; e o acesso à assistência. Com efeti-vos programas de controle da hipertensão,seria possível uma redução considerável donúmero de mortes precoces por com-plicações dessa doença e da doençacerebrovascular.7,19

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Informe Epidemiológico

do SUS

Em relação às doenças crônicas dasvias aéreas inferiores, observou-se quecom o enfoque das causas múltiplas demorte houve um incremento de 58% namortalidade proporcional. Tal informaçãopossibilitará o reconhecimento dessascomo problemas de saúde pública, pro-blemas estes que demandam programasespecíficos de prevenção e de assistência,além do maior investimento na área desaúde ambiental, visto que pacientes comdoenças pulmonares obstrutivas crônicasconstituem uma população suscetível apartículas aéreas urbanas.21 Enfatiza-sea necessidade de implantação de estra-tégias populacionais contra o tabagismo,por constituir esse hábito fator de riscopara aquela patologia.

O enfoque das causas múltiplas demorte também aumentou a importânciada cirrose hepática na mortalidade etornou possível verificar a associaçãodesta com a hepatite. Vários estudosepidemiológicos têm demonstrado arelação existente entre o consumo deálcool e a mortalidade por cirrose. Depoisdo alcoolismo, os vírus B e C da hepatitesão os mais importantes fatores de riscopara a cirrose.19 As mortes em idadesprodutivas são, geralmente, atribuídas aomaior consumo de álcool.22 Neste caso,estratégias populacionais, tais como aeducação para a saúde enfocandomudanças no estilo de vida, de atitudes ede comportamentos tornam-se neces-sárias. Conforme Lessa,19 os benefíciosatingiriam também outras doençascrônicas associadas ao consumo exces-sivo de álcool como as doenças cere-brovasculares, o diabetes secundário aoalcoolismo, a pancreatite e as doençasrelacionadas à esfera psíquica. Outraimportante estratégia de saúde seria avacinação de hepatite B.

Observou-se que, com a análise damortalidade sob o enfoque das causasmúltiplas de morte, ocorre um aumentoda proporção dos óbitos por algumasdoenças crônicas não-transmissíveis.Nota-se também que as doenças dosangue e dos órgãos hematopoéticos, asdoenças endócrinas, do metabolismo e

nutricionais, bem como as doenças doaparelho geniturinário também merecemuma análise sob este enfoque. O númeroelevado de menções de doenças doaparelho respiratório pode ser explicadopelo fato de serem relativas a com-plicações ou afecções terminais dedoenças.

Apesar de alguns autores3,5,11 utili-zarem testes estatísticos para verificar aassociação existente entre as causas demorte, não foi utilizado o recurso dessastécnicas, levando em consideração apremissa da independência nesses testes.Além disso, a abordagem descritivapermitiu evidenciar a magnitude de al-gumas associações de causas comoproblemas de saúde do adulto.

As políticas de saúde devem pro-piciar a promoção e proteção da saúde,evitando as mortes prematuras dosadultos, enfatizando o conhecimento e aprevenção dos fatores de risco passíveisde modificação, principalmente os re-lacionados aos hábitos de vida. Com aadoção de estilo de vida saudável, po-deriam ser obtidos benefícios para asdoenças cardiovasculares, mas, também,para o diabetes e algumas neoplasias,resultando em riscos menores de morte.19,23

Outro aspecto a ser considerado estárelacionado ao ambiente, destacando-seo de trabalho.19

A análise das causas múltiplas demorte permite dimensionar a magnitude damortalidade para várias doenças crônicasnão-transmissíveis, demonstrando ser uminstrumento alternativo de avaliação eplanejamento das ações de saúde. Umaoutra vantagem é a possibilidade de esteenfoque tornar-se um importante incen-tivo para o preenchimento completo dasDO. Acredita-se que os médicos respon-sáveis pelo preenchimento das declaraçõesde óbito fiquem mais interessados quandoconstatarem que as DO podem fornecernovos conhecimentos quando, analisadosatravés das causas múltiplas. Com aobtenção de maior informação, aumentar-se-ia a utilidade das estatísticas demortalidade para o planejamento dosserviços de saúde.

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Agradecimentos

Ao professor Mark Drew CroslandGuimarães pelas sugestões, ao professorAugusto Hasiak Santo pelas sugestões,cessão de referências bibliográficas eorientações na utilização do TCM e aoCelso Escobar Pinheiro pela orientaçãona utilização do TCM.

Referências bibliográficas

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Doenças Crônico-degenerativas em Adultos da Região Centro-Sul de Belo Horizonte

Informe Epidemiológico

do SUS

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Morbidade por Causas Externas em Criançasde 0 a 12 Anos: uma Análise dos Registros deAtendimento de um Hospital do Rio de Janeiro

Informe Epidemiológico do SUS 2001; 10(4) : 189 - 198.

Resumo

Foi realizado um estudo descritivo de variáveis coletadas em todos os boletins de

atendimento de crianças de 0 a 12 anos, atendidas nos meses de maio e outubro de 1995,

devido a causas externas, em um hospital de emergência do Rio de Janeiro. Foram

selecionadas para análise variáveis demográficas (sexo, idade) e outras, como causa da

lesão, tempo decorrido entre a ocorrência do acidente e a consulta, tipo de lesão. Foi

observado predomínio do sexo masculino entre as crianças atendidas (57,4%; p<0,01),

e maior número de atendimentos na faixa etária de cinco a nove anos (26,8%). As quedas

se destacaram como a principal causa de morbidade em todas as faixas etárias,

correspondendo a 44,7% dos atendimentos analisados. Alguns dados observados

chamaram a atenção para a possibilidade de maus-tratos.

Palavras-Chave

Causas Externas; Morbidade; Acidentes.

Summary

A descriptive study was conducted of the medical records of children aged 0-12 years

treated at an emergency hospital in Rio de Janeiro for an external cause of morbidity

during the months of May and October, 1995. The records were analyzed according to

demographic variables (sex, age) and others related to the cause of injury, time elapsed

between the accident and medical attention and type of lesion(s). A high proportion of

those receiving medical attention were male (57.4%; p<0.01), and there was a

predominance of children aged 5-9 years (26.8%). Falls were the principal external

cause of morbidity in all age groups (47.7% of all analyzed records). Some data indicated

the possibility of child-abuse.

Key Words

External Causes; Morbidity; Accidents.

Endereço para correspondência: Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde -Escola Nacional de Saúde Pública - Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) - Rua Leopoldo Bulhões, 1480 - 8o

andar. Manguinhos - Rio de Janeiro/RJ. CEP: 21.041-210.E-mail: [email protected]

External Causes of Morbidity in Children Aged 0-12 Years:an Analysis of Medical Records at an Emergency Hospital in

Rio de Janeiro

Inês E. Mattos Departamento de Epidemiologia e Métodos Quantitativos em Saúde / Escola Nacional de Saúde Pública /

FIOCRUZ

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Introdução

Nas últimas décadas, uma série defatores, entre os quais se inclui o progres-so da Medicina no campo do diagnósticoe tratamento de uma série de patologias,entre elas, as doenças infecciosas, contri-buíram para que as causas externas setornassem uma das mais importantesameaças à saúde e bem-estar de criançase adolescentes.

Esse problema, observado no Brasil,assim como em todo o continente america-no, levou a Organização Pan Americanada Saúde (OPAS), em 1993, a solicitar,de seus países-membros, o estabeleci-mento de políticas e planos de prevençãoe controle da violência.1 Naquele mesmoano, a Coordenação Materno-Infantil doMinistério da Saúde, preocupada com essaquestão, se propunha a garantir o seuestudo como linha de pesquisa prioritária,destacando as universidades e centros deinvestigação como locais privilegiadospara a execução desse tipo de trabalho.2

Nas causas externas, estão envol-vidos dois tipos de eventos: a naturezadas lesões que o paciente apresenta(codificadas de acordo com o capítuloXIX da Décima Revisão da ClassificaçãoInternacional de Doenças - CID-10)

3 e as

circunstâncias que produziram essaslesões.4 A CID-10 tem um sistema declassificação suplementar para a codi-ficação dessas circunstâncias, encontradono capítulo XX, que fornece a informaçãobásica necessária para a organização deprogramas preventivos - a causa da lesão.5

Embora a incidência de lesões porcausas externas exceda em muito onúmero de casos fatais, esse grupo decausas, vem sendo, tradicionalmente,estudado por meio da mortalidade, sendoos sistemas de informação de morbidade,em quase todos os países, precários ouinexistentes.6,7 Em um amplo estudo sobremorbidade por causas externas emcrianças de 1 a 17 anos, realizado nosEstados Unidos, Scheidt e colaboradores

8

observaram que “em nenhum grupo deidade, as três causas mais freqüentes delesões não fatais eram as mesmas veri-ficadas para lesões fatais”. Com base

nesses dados, os referidos autores levan-tam a possibilidade de que os determi-nantes dos dois tipos de lesões possamser diferentes e destacam a importânciados estudos de morbidade para o controlee a prevenção da violência.

Embora seja bastante comum as-sociar a palavra violência com crimi-nalidade, os estudiosos desse tema con-sideram-na uma questão bem mais ampla,que tem sua origem em processos sociais,assumindo diferentes formas de ma-nifestação.9 Nesse sentido, o aumento daviolência estaria, portanto, relacionado aum intrincado processo de determinaçõeseconômicas, políticas e sociais, peculia-res a cada país, mas que resultam em umquadro geral de elevação da morbi-mortalidade por causas externas, obser-vado praticamente em todo o mundo, nosanos mais recentes. Devido à extremacomplexidade desse fenômeno, diversostrabalhos publicados destacam a impor-tância da abordagem multidisciplinar paraa investigação de suas causas.6,9

A realização desse tipo de inves-tigação, de caráter tão amplo, foge,evidentemente, ao escopo e às possi-bilidades dos profissionais que atuam narede de serviços de saúde. Por outro lado,é para esses serviços que confluem asvítimas das diferentes formas de vio-lência, em busca de tratamento e soluçãopara seus problemas, consti-tuindo-seeles também num “locus” privilegiadopara o estudo e análise dessas questões.6,10

Não é por outro motivo, que nessesmesmos serviços, os pesquisadores vãorecolher as informações de quenecessitam para a realização de seustrabalhos.7

O desenvolvimento de qualquertrabalho de investigação, assim como aelaboração de programas preventivos esua posterior avaliação, tem como pontoimprescindível a existência de registroscompletos e acurados. Esses registrossão realizados pelos profissionais queatuam nos serviços de saúde e que,embora “... tenham como dever diagnos-

ticar, notificar e atender os casos de

crianças e adolescentes vítimas de

Morbidade por Causas Externas em Crianças

Informe Epidemiológico

do SUS

Embora sejabastante comum

associar a palavraviolência com

criminalidade, osestudiosos dessetema consideram-

na uma questãobem mais ampla,

que tem suaorigem em

processos sociais,assumindo

diferentes formasde manifestação.9

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IESUS

violências, além de encaminhá-los e

acompanhá-los objetivando um atendi-

mento integrado (...)” raramente têm

acesso ao saber de pesquisadores (...)”.2

O Hospital Miguel Couto, da rede desaúde do município do Rio de Janeiro, háalguns anos, vem se preocupando emanalisar os seus registros hospitalares edevolver a informação já trabalhada, nãosó ao conjunto de seus profissionais, como objetivo de fornecer subsídios para amelhora da qualidade do atendimento ede incentivar o aprimoramento individual,mas também à população em geral. Esseesforço de utilizar as fontes de informa-ções originadas no próprio hospital,permitiu que fosse observado um aumentoacentuado dos atendimentos de emergên-cia relacionados às causas externas, nafaixa etária de 0 a 18 anos.11

Esses dados motivaram a realizaçãode um estudo piloto, com o objetivo deinvestigar as principais causas de morbi-dade por causas externas em crianças de0 a 12 anos (grupo etário que recebeatendimento pediátrico), atendidas nosetor de emergência do referido hospital.

Material e métodos

Todos os boletins de atendimentodo Serviço de Emergência do HospitalMunicipal Miguel Couto, referentes aosmeses de maio e outubro de 1995, foramseparados, para posterior seleção da-queles pertencentes a crianças de 0 a 12anos de idade. Esses meses foramescolhidos por serem de semestresdiferentes e por serem considerados“típicos” em relação aos atendimentosefetuados na Emergência, uma vez quenão coincidem com períodos de férias oufestas populares.

Os boletins selecionados foram,então, divididos em dois blocos, deacordo com o tipo de causa que motivouo atendimento. Os boletins, cujo motivoda consulta era uma causa externa,constituíram o objeto desse estudo. Foidesenhado um protocolo para coleta deinformações nos Boletins, que incluíauma série de variáveis como sexo, faixaetária, horário do atendimento, causa do

acidente e tipo de lesão, procedimentosutilizados para tratamento, atendimentopor outros profissionais especializados etempo decorrido entre o acidente e aconsulta. A coleta de todas as informa-ções dos boletins foi realizada sempre pelamesma pessoa.

Com os dados obtidos, foram cons-truídas tabelas de freqüência para aanálise da distribuição das variáveisestudadas. Um espaço no final doquestionário permitia que fossem trans-critas quaisquer outras informações dosboletins que fossem de interesse para oestudo. Algumas variáveis analisadascomo descrição da lesão, medidas tera-pêuticas adotadas, realização de examescomplementares para diagnóstico eatendimento por médico especialista nãoserão aqui apresentadas, devido ao altopercentual de não preenchimento nosboletins (variando entre 33 e 57%).

Resultados

Em relação ao total de atendimentosdo Serviço de Emergência do HospitalMiguel Couto, nos meses estudados, oatendimento pediátrico correspondeu a22% do total, com 9.191 boletins; destes,12% dos casos (1.093 boletins) foramdevidos a causas externas, correspon-dendo a uma média de 18 atendimentospor dia para esse grupo de patologias.

Na Tabela 1, é apresentada a dis-tribuição dos atendimentos por causasexternas segundo sexo e faixa etária.Pode-se observar um predomínio do sexomasculino em relação ao feminino, esta-tisticamente significativo, ocorrendo,entretanto, uma oscilação desses valoresnas diferentes faixas etárias. As criançasde 5 a 9 anos foram o grupamento etáriocom maior número de atendimentos,seguidos dos grupos de 10 a 12 e de 1 a2 anos.

Em relação ao tempo transcorridoentre o acidente e o atendimento, obser-vou-se que o percentual de crianças aten-didas após 24 horas do acidente era maiornas faixas etárias menores (Tabela 2). Nogrupo de menores de 1 ano, o atendimentotardio correspondeu a 34% do total; no

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grupo de 1 a 2 anos, esse percentualdiminuiu, mas ainda assim correspondeua cerca de 16%, atingindo cerca de 11%entre as crianças de 10 a 12 anos.

A Tabela 3 apresenta os diferentesgrupamentos de causas externas e suasfreqüências de ocorrência segundo faixaetária. As quedas representaram a prin-cipal causa de atendimento pediátrico porcausas externas, vindo em segundo lugara exposição a forças mecânicas inani-madas. No grupo de crianças de 0 a 2anos, assim como na faixa etária de 5 a 9anos, as quedas corresponderam a maisda metade dos casos atendidos. Aexposição a forças mecânicas inanimadasfoi a principal causa de atendimento nasfaixas etárias de 3 a 4 e de 10 a 12 anos,

destacando-se, nesse grupo, o impactoacidental contra objetos e a introduçãode corpo estranho no ouvido ou no nariz.As queimaduras foram importante causade atendimento no grupo de menores deum ano. É importante destacar o grandenúmero de acidentes de causa ignorada,que dificulta a análise dos dados.

Na Tabela 4, são apresentados osacidentes por queda, em cada faixa etária,segundo a forma de ocorrência. Grandenúmero de casos com informação in-completa, impedindo a classificação doacidente, aparece em todos os grupos deidade, comprometendo a análise dessesdados. Nos casos em que foi possívelestabelecer a causa da lesão, verificamosque as quedas de cama ou berço predo-minam na faixa etária de menores de umano de idade. No grupo de 1 a 4 anos,assumem maior importância as quedas deescada. As quedas da própria altura sãoobservadas como importante causa deacidente, em todas as faixas etárias, a partirde um ano de idade.

Discussão

Antes de comentar os resultadosdesse estudo, algumas limitações precisamser mencionadas.

Em primeiro lugar, trata-se de umestudo que utilizou dados da demanda doHospital Miguel Couto. Nesse sentido, osdados levantados, embora correspondamao total de atendimentos, foram coletadosem apenas dois meses e podem estarexpressando resultados diferentes da-queles que seriam obtidos ao longo de umperíodo maior de investigação.

É importante lembrar, também, queo grupo de crianças estudado representaapenas uma parcela daquelas que, diaria-mente, se acidentam. De modo geral, sãocrianças que sofreram lesões um poucomais sérias, que requeriam cuidadosmédicos e que, além disso, tiveramacesso ao tratamento.7 Em um estudo rea-lizado nos Estados Unidos8 foi verificadoque 27 em cada cem crianças de 1 a 17anos, apresentam lesões por causasexternas no período de um ano. Des-conhecemos a existência de um trabalho

Morbidade por Causas Externas em Crianças

Informe Epidemiológico

do SUS

Tabela 1 - Distribuição dos atendimentos por causas externas emmenores de 13 anos realizados pelo Serviço de Emergência do

Hospital Municipal Miguel Couto, segundo sexo efaixa etária - maio a outubro de 1995

Faixa etária(anos)

No %

< 11 a 23 a 45 a 910 a 12

Total

25150121164167

627

424192627

57

2811010312897

465

624222721

43

53260224292264

1.093

Sexo

524202724

100

No No% %

Masculino Feminino Total

* *

* p<0,01 (qui-quadrado).

Tabela 2 - Número de atendimentos por causas externas emmenores de 13 anos realizados pelo Serviço de Emergência do

Hospital Municipal Miguel Couto, e percentual de casos atendidos,segundo faixa etária - maio a outubro de 1995

Faixa etária(anos)

< 11 a 23 a 45 a 910 a 12

Total

53260224292264

1.093

1843324028

161

Total deatendimentos

Atendimentos após 24 horas

*

* p<0,01 (qui-quadrado)

3416141411

15

No % *

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semelhante em nosso país, mas, tomandocomo base os dados acima, é possível,para exemplificar, fazer uma estimativagrosseira do número de acidentes queesperaríamos que ocorressem, nessegrupo etário, ao longo de um ano. Apopulação de 0 a 19 anos da área deplanejamento do município do Rio deJaneiro, onde se situa o Hospital MiguelCouto (AP 2.1), era, de acordo com dadosdo Censo de 1991, constituída por162.957 pessoas.11 Considerando umaincidência semelhante à do estudo citado,chegaríamos ao número de 43.998ocorrências por ano, para essa população,um número certamente bem maior do queo que seria observado naquele hospital,ao longo de um ano, considerando umamédia de mil atendimentos por mês esomente para moradores daquela área.Entretanto, é preciso considerar que o

Hospital Miguel Couto não atendesomente os moradores da região ondeestá situado, mas tem uma demandaampliada de pessoas residentes em outrasáreas consideradas no planejamento domunicípio e mesmo em outros muni-cípios do Estado.11

No presente estudo, observou-sepredomínio do sexo masculino, em rela-ção ao total de atendimentos, embora ospercentuais por sexo tenham oscilado nasdiferentes faixas etárias, fato que poderiaser atribuído ao reduzido número deindivíduos em alguns dos estratos anali-sados. Scheidt e colaboradores,8 em umestudo sobre morbidade por causas exter-nas em crianças americanas, verificaramo predomínio do sexo masculino em todasas faixas etárias. Kendrick e Marsh,12 naInglaterra, observaram resultados seme-lhantes em um estudo sobre mortalidade

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volume 10, nº 4outubro/dezembro 2001

Tabela 3 - Distribuição dos atendimentos por causas externas em menores de 13 anos realizados pelo Serviçode Emergência do Hospital Municipal Miguel Couto, segundo tipo de causa e

faixa etária - maio a outubro de 1995

Tipo de causa(código na CID-10)* No %

Colisões(V40-V59)

Atropelamentos(V01-V09)

Acidentes de bicicleta(V10-V19)

Quedas(W00-W19)

Queimaduras(X00-X19)

Mordidas e picadas(W50-W54)

Exposição a forçasmecânicas inanimadas(W20-W59)

Eventos com intençãoindeterminada(Y10-Y34)

Total

No No% %

< 1

Faixa etária (anos)

No % No % %No

-

-

-

36

7

-

7

3

53

-

-

-

68

13

-

13

6

100

-

2

-

147

8

-

60

43

260

-

1

-

56

3

-

23

17

100

-

-

5

87

5

-

105

22

224

-

-

2

39

2

-

47

10

100

7

-

3

132

10

-

48

64

264

3

-

1

50

4

-

19

24

100

4

-

7

87

-

7

102

85

292

1

-

2

30

-

3

35

29

100

11

2

15

489

30

7

322

217

1.093

1

0

1

45

3

1

29

20

100

1 a 2 3 a 4 5 a 9 10 a 12Total

* CID-103 Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde

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por causas externas na infância quevisava identificar características socio-demográficas associadas a um maiorrisco de acidentes. Em um estudo reali-zado num bairro da periferia de RibeirãoPreto, Del Ciampo e colaboradores13

encontraram um maior percentual deacidentes em meninos (55%) do que emmeninas (45%), embora essa diferençanão tenha sido estatisticamente signi-ficativa.

Apesar de ter sido constatada umapreocupação maior em descrever asconseqüências (as lesões) do que pro-priamente as causas dos acidentes, atémesmo para aquelas existiram inúmerasdeficiências no preenchimento dosboletins de atendimento do paciente.

Tabela 4 - Distribuição dos atendimentos por quedas em menores de 13 anos realizados pelo Serviço de Emergênciado Hospital Municipal Miguel Couto, segundo tipo de causa e faixa etária - maio a outubro de 1995

Tipo de causa(código na CID-10)* No %

Enquanto carregadoapoiado p/pessoas(W05)

De leito(W06)

De cadeira(W07)

De outro tipo de mobília(W08)

Em (ou de) escadas(W10-W11)

Outras quedas de umnível a outro

(W17)

Outras quedas nomesmo nível(W18)

Quedas semespecificação(W19)

Total

No No% %

< 1

Faixa etária (anos)

No % No % %No

1

11

-

-

-

16

-

8

36

1 a 2 3 a 4 5 a 9 10 a 12Total

3

31

-

-

-

44

-

22

100

7

11

3

3

40

14

40

29

147

5

8

2

2

27

9

27

20

100

-

-

3

3

21

21

21

18

87

-

-

3

4

24

24

24

21

100

-

3

-

-

15

11

57

46

132

-

2

-

-

12

8

43

35

100

-

-

-

-

9

7

35

36

87

-

-

-

-

10

8

40

42

100

8

25

6

6

85

69

153

137

489

2

5

1

1

18

14

31

28

100

Em um estudo sobre a utilização docódigo E para classificar a morbidade depacientes hospitalizados por causasexternas, realizado em hospitais dediversos estados americanos, Langlois ecolaboradores5 observaram que poucomais de 50% dos casos de hospitalizaçãopor violências recebem codificaçãoadicional para a causa das lesões; em 90%dos casos, entretanto, essas informaçõesestavam presentes nos registros médicosdos pacientes, sendo possível, ao recu-perá-las, atribuir o código correspon-dente. No caso do Hospital Miguel Couto,entretanto, observou-se que cerca de20% dos boletins de atendimento nãoregistravam em nenhum local a causa dalesão, inviabilizando esse tipo de codi-

Morbidade por Causas Externas em Crianças

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* CID-103 Décima Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde

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ficação. Essa informação, de modo geral,foi encontrada com mais freqüência apenaspara os chamados casos policiais (colisões,atropelamentos e outros), para os quais ohospital adota, há algum tempo, um carimboespecífico para cada causa de lesão.

A falta de informações nos Boletinsde atendimento não permitiu que os dadosfossem analisados segundo o local deocorrência do acidente (casa, escola,rua). No seu estudo, Scheidt e colabo-radores8 observaram que os acidentes emcasa eram mais comuns nos gruposetários mais jovens, sendo substituídospelos acidentes na escola e, depois, narua, à medida em que aumentava a idade.Nesse mesmo trabalho, quedas, contu-sõese cortes foram os principais tipos deacidentes em todas as faixas etárias, àsemelhança do observado no hospital MiguelCouto. No estudo de Ribeirão Preto,13 maisda metade dos acidentes ocorreram em casa,sendo também mais freqüentes as quedas,as contusões e os cortes.

As quedas, junto com os acidentesprovocados pela exposição a forçasmecânicas inanimadas e as queimaduras,constituíram cerca de 76% das causasconhecidas dos acidentes atendidos noperíodo do estudo. Pode-se observar quegrande parte desses acidentes ocorreu nogrupo de crianças menores de dez anos. Umapossível explicação para esses resultadospoderia ser o número expressivo de criançasdessa faixa etária, que permanece em casa,sob a supervisão de irmãos um pouco maisvelhos, devido a necessidade da mãe emexercer uma atividade remunerada. Esse fatopoderia, também, justificar, pelo menos emparte, a demora observada na busca deatendimento médico. Del Ciampo ecolaboradores,13 em Ribeirão Preto, tambémobservaram maior percentual de acidentesna faixa etária de até dez anos.

Em relação às causas das quedas,foram observadas diferenças entre esteestudo e o trabalho realizado por Scheidte colaboradores8 pois, enquanto no hos-pital verificou-se número bastantereduzido de quedas de bicicleta, mesmonos grupos etários mais velhos, no estudoamericano, grande número delas foi

devido a essa causa ou a quedas de skate,na faixa etária de 8 a 15 anos. Essasdiferenças poderiam estar relacionadas adiferenças socioeconômicas entre aspopulações de estudo.

Scheidt e colaboradores,8 devido aogrande número de acidentes cuja causafoi a prática de esportes e a utilização debicicletas e veículos similares, levantama possibilidade de que a associaçãopositiva que observaram entre freqüênciade acidentes e nível socioeconômico, sejaexplicada pelo fato de essas atividadesserem praticadas, de modo geral, pelosgrupos de maior poder aquisitivo. Emborao Hospital Miguel Couto atenda indivíduosoriundos de todos os grupos socioeco-nômicos,11 uma grande parcela de suaclientela é formada por pessoas de baixoe médio poder aquisitivo, o que estariade acordo com os dados obtidos. Entre-tanto, é preciso considerar, o grandenúmero de quedas com causa ignorada,observado neste estudo, particularmentenas faixas etárias mais velhas. Na Ingla-terra, Kendrick e Marsh12 verificaram aexistência de um gradiente socioeco-nômico na mortalidade por causasexternas em crianças, observando que ofato de residir em áreas pobres estavaassociado com acidentes que necessita-vam de internação para tratamento e como número de lesões apresentadas.

As conseqüências do acidente cons-tituem importante informação para oplanejamento e administração dos servi-ços de saúde, permitindo-lhes preparar-se melhor para o atendimento da deman-da, tanto em termos de recursos humanoscomo de recursos materiais. Essa infor-mação, como já mencionamos, tambémapresenta inúmeras deficiências nosboletins de atendimento analisados: em33% deles, não havia nenhuma descriçãodas lesões apresentadas pelos pacientes.A precariedade da informação não permi-tiu uma análise dos dados coletados.

O grande número de casos de aci-dentes atendidos após 24 horas, espe-cialmente no grupo de crianças menoresde um ano, em que as quedas e queima-duras foram importantes causas de

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atendimento, é um fato que chama aatenção, assim como as circunstânciasque levaram à ocorrência das quedas(queda de colo, de carrinho). No grupode um a dois anos, observamos tambémum grande número de quedas, entre elas,sete quedas de colo, três de cadeira e trêsde mesa. Esses dois últimos tipos dequeda aparecem com quantitativosemelhante no grupo de três a quatroanos, enquanto no grupo de cinco a noveanos chamam a atenção três quedas decama que necessitaram de atendimen-to médico.

Em estudo realizado na Inglaterra,Warrington e colaboradores,14 investigan-do acidentes ocorridos em crianças de atéseis meses de idade, observaram umpercentual de 1,5% para queimaduras,bem menor do que o verificado em nossoestudo, com a ressalva de que conside-ramos crianças até um ano. Nesse mesmotrabalho, entre o conjunto de quedasrelatadas, 53% haviam sido de camas oucadeiras e 12% dos braços de quemcarregava a criança, percentuais bastantediferentes também dos observados emnosso estudo. Essas diferenças, todavia,poderiam estar relacionadas ao grandenúmero de casos ignorados, devido aopreenchimento incompleto dos boletins deatendimento.

A questão dos maus-tratos é umaspecto importante da morbidade porviolências em crianças,10 sendo um deseus principais tipos a violência física,que ocorre no ambiente doméstico.2,10,12

A distinção entre maus-tratos e acidenteé uma tarefa complicada, pois a própriaconceituação do termo é complexa, emuma sociedade onde os castigos físicosainda são relativamente comuns e consi-derados, por muitos, como indispensáveispara a educação da criança.15

Alguns aspectos, entretanto, podemser facilmente observados pela equipe desaúde: “a história dos pais não está deacordo com os achados clínicos”(...)“muitas vezes eles vêm ao hospital poroutra queixa ...”; “a atitude de indiferençados pais para com a gravidade dos feri-mentos”; “nota-se que o problema

ocorreu há alguns dias ou horas antes,havendo, portanto, demora em procurarajuda médica”.15 Santoro16 destaca aindaoutros aspectos, como a localização daslesões (parte superior do corpo), suasimetria e o seu tipo (queimaduras,principalmente por líquidos quentes,fraturas múltiplas de ossos longos), adiscrepância entre a história e o examefísico ou na cronologia do evento e otempo decorrido entre o acidente e aprocura do socorro médico.

Trogan e colaboradores17 mencio-nam que, segundo a literatura, um terçodas lesões de fêmur que ocorrem emcrianças abaixo de seis anos poderiam seratribuídas a maus tratos; entretanto, aoanalisarem 57 casos consecutivos defratura femural em crianças dessa faixaetária, em um hospital de emergência daGrécia, verificaram que em nenhum deleshavia sido feito esse diagnóstico, oumesmo levantada a suspeita de maustratos, embora o padrão de ocorrência daslesões, em alguns casos, fosse compatí-vel com essa hipótese. Os autores des-tacam a necessidade de chamar a atençãodos profissionais do hospital para esseproblema, de modo que ele possa serrevelado, quantificado e apropriadamentetrabalhado naquele país.

Deslandes18 destaca que os maiorespercentuais de registros recolhidos sobreesse tipo de violência se encontram nasclasses populares, que constituem, justa-mente, uma grande parcela da demandada rede municipal, sendo necessário,portanto, que os profissionais de saúdesaibam identificar e tratar esses casos,assim como sabem diagnosticar e tratarpneumonias e gripes.

Em um estudo de morbidade reali-zado com a utilização de dados registradosem boletins de atendimento, e limitado porsérias deficiências no preenchimento, nãoseria possível uma análise aprofundadasobre a possibilidade de ocorrência demaus-tratos, mas vale destacar os relatosabaixo, bastante ilustrativos de algunsoutros que foram observados:

“Menina de seis meses, atendida

com traumatismo crânio-encefálico. A

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família relata que a criança caiu do colo

da mãe, três dias atrás, não sabendo

explicar direito porque só procurou

atendimento hoje”.

“Menina de um ano e oito meses,

atendida 48 horas após o acidente com

relato de queda de berço. Radiografada,

apresentava fraturas nos ossos das duas

mãos.”

Apesar das inúmeras limitações queos dados disponíveis nos serviços desaúde possam apresentar, a importânciade sua análise deve ser sempre destacada.Até mesmo registros precários consti-tuem uma aproximação da realidade e,quando analisados, podem sugerir cami-nhos para serem aprofundados emestudos mais completos.

Por outro lado, pesquisas realizadaspor universidades e outros centros deinvestigação utilizam os dados produzidospelos serviços de saúde, mas o conhe-cimento daí resultante percorre um longocaminho até chegar ao profissional quetrabalha na linha de frente, o que tornaimportante a análise desses dados nopróprio local.

O uso freqüente dos registroshospitalares e a discussão dos resultadoscom os profissionais responsáveis pelasua produção possibilitaria o aprimo-ramento da qualidade da documentaçãomédica, contribuindo para o bom de-sempenho do serviço e para o melhoratendimento da população.

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Morbidade por Causas Externas em Crianças

Informe Epidemiológico

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Normas para Publicação

O Informe Epidemiológico do SUS

é u m a p u b l i c a ç ã o t r i m e s t r a l d eca rá t e r técnico-científico destinadaprioritariamente aos profissionais desaúde. Editado pelo Centro Nacional deEpidemiologia da Fundação Nacional deSaúde (CENEPI /FNS) , t em comomissão a difusão do conhecimentoepidemiológico visando ao aprimoramentodos serviços de saúde do SUS. Tambémé um veículo de divulgação de portarias,regimentos, resoluções do Ministério daSaúde, bem como de Normas Técnicasrelativas aos Programas de Controle.

Serão aceitos trabalhos sob asseguintes modalidades: (1) Artigosoriginais nas seguintes linhas temáticas:avaliação de situação de saúde; estudosetiológicos; avaliação epidemiológica deserviços, programas e tecnologias eavaliação da vigilância epidemiológica(máximo 20 páginas); (2) Artigos derevisão: revisão crítica sobre tema re-levante para a saúde pública ou deatualização em um tema controverso ouemergente (máximo 40 páginas); (3)Relatórios de reuniões ou oficinasde trabalho: relatórios de reuniõesrealizadas para a discussão de temasrelevantes para a saúde pública comconclusões e recomendações (máximo25 páginas); (4) Comentários: artigosde opinião, curtos, sobre temasespecíficos; (5) Notas e (6) Artigosreproduzidos.

Os trabalhos encaminhados parapublicação deverão ser preparados deacordo com os “Requisitos Uniformes paraManuscritos Submetidos a PeriódicosBiomédicos” [Informe Epidemiológico doSUS 1999; 8(2):5-16; disponível em:http://www.funasa.gov.br/pub/Iesus/ies00.htm] e apresentados por meio deuma carta dirigida ao Corpo Editorial doInforme Epidemiológico do SUS. Paraartigos originais, artigos de revisão ecomentários, os autores deverão respon-sabilizar-se pela veracidade e ineditismodo trabalho apresentado. Na carta deencaminhamento deverá constar que o

manuscrito não foi publicado parcial ouintegralmente nem submetido a publi-cação em outros periódicos e deverá serassinada por todos os autores.

Os trabalhos serão submetidos àrevisão de pelo menos dois relatores e aoComitê Editorial do Informe, sendoaceitos para publicação desde queaprovados pelo Comitê Editorial.

Apresentação do material:

Os trabalhos deverão ser redigidosem português e impressos em espaçoduplo, fonte “Times New Roman”,tamanho 12, formato. RTF (Rich Text

Format), em papel A4, com margem de 3cm à esquerda e remetidos em três viasimpressas e em disquete de 31/2”. As tabelase figuras poderão ser elaboradas emprogramas do tipo Microsoft Office, Corel

Draw ou Harvard Grafics, no formato.BMP (Bitmap do Windows) ou .TIFF, nomodo de cor CMYK. Todas as páginasdeverão estar numeradas, inclusive as dastabelas e figuras. Não serão aceitas notasde pé de página. Todos os trabalhos devemser enviados com:

a) Página de rosto: onde constarão títulocompleto, nome dos autores e dasrespectivas instituições por extenso,com endereço completo, telefone, faxe e-mail.

b) Título: título do trabalho em portuguêse inglês em letras maiúsculas e nomecompleto dos autores em letras mi-núsculas. No rodapé: nome da(s)instituição(ções) a que pertencem osautores, órgão financiador e endereçopara correspondência. Indicar tambémum título resumido para o cabeçalhodas páginas.

c) Resumo: colocado no início do texto,redigido em português e com um máximode 200 palavras. Após o resumo, listartrês a quatro palavras-chave.

d) Resumo em inglês (Summary): devecorresponder à tradução do resumoem português e seguido pelas pa-lavras-chave (Key Words).

volume 10, nº 3ju lho/setembro 2001

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Os artigos originais devem conter aseguinte seqüência, além dos tópicos jádescritos:

a) Introdução: apresentação do problema,justificativa e objetivo do estudo.

b) Metodologia: descrição precisa dametodologia utilizada e, quando indicado,dos procedimentos analíticos.

c) Resultados: exposição dos resultadosalcançados, podendo constar tabelase figuras auto-explicativas (máximoseis). As tabelas e figuras devem sernumeradas em algarismos arábicos eter título conciso. Devem ser apre-sentadas em folhas separadas, agru-padas em seqüência no final do textoevitando abreviaturas. Em caso de usarabreviaturas, incorporar legendasexplicativas.

d) Discussão: relacionar os resultadosobservados aos de outros estudosrelevantes, incluindo suas implicaçõese limitações.

e) Agradecimentos: os agradecimentosdevem se limitar ao mínimo indis-pensável e localizar-se após o texto doartigo.

f) Referências bibliográficas: as refe-rências citadas deverão ser listadas aofinal do trabalho, redigidas em espaçoduplo, numeradas em algarismosarábicos e ordenadas de acordo com aseqüência de citação no texto, no qual onúmero deve aparecer após a citação,sobrescrito e sem parênteses. Os títulosdos periódicos, livros e editoras deverãoser colocados por extenso.

g) Considerações éticas: quando perti-nente, citar os nomes das ComissõesÉticas que aprovaram o projeto original.

As referências deverão obedecer aoestilo e pontuação do “InternationalCommittee of Medical Journal Editors”,1997 (Vancouver), traduzido no InformeEpidemiológico do SUS 1999; 8(2), comodescrito abaixo:- Artigos de periódicos:Monteiro GTR, Koifman RJ, Koifman S.

Confiabilidade e validade dos atestadosde óbito por neoplasias. II. Validação docâncer de estômago como causa básicados atestados de óbito no Município doRio de Janeiro. Cadernos de SaúdePública 1997;13:53-65.

- Instituição como autora:Fundação Nacional de Saúde. Ministérioda Saúde. Manual de normas devacinação. Brasília (DF); 1994.

- Livros:Fletcher RH, Fletcher SW, Wagner EH.Clinical Epidemiology. 2a ed. Baltimore:Williams & Wilkins; 1988.

- Capítulos de livros:Opromolla DV. Hanseníase. In: Meira DA,Clínica de doenças tropicais e infecciosas.1ª ed. Rio de Janeiro: Interlivros; 1991.p. 227-250.

- Resumos de congressos:Carvalho H, Thuler LCS. Perfil demortalidade por AIDS no estado do Rio deJaneiro. In: Resumos do XXXII Congressoda Sociedade Brasileira de MedicinaTropical 1996; Goiânia; 1996. p.48.

- Teses:Waldman EA. Vigilância Epidemiológicacomo prática de saúde pública [Tese deDoutorado]. São Paulo: Universidade deSão Paulo; 1991.

Os trabalhos serão aceitos parapublicação, uma vez reformulados,segundo os questionamentos e/ou su-gestões feitos pelos relatores e o ComitêEditorial.

Informações adicionais, incluindomaterial para publicação, devem serencaminhados para:

Centro Nacional de EpidemiologiaInforme Epidemiológico do SUSSAS Quadra 4 - Bloco N - Sala 608Brasília/DF - 70.058-902Telefones: (061) 314-6545 / 226-4002Fax: (061) 314-6424e-mail: [email protected]

Normas para Publicação

Informe Epidemiológico

do SUS

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O informe Epidemiológico do SUS é uma publicação de caráter técnico-científico voltada à divulgação de análises das informações sobre o quadro sanitário brasileiro. É um instrumento destinado aos órgãos de administração e aos quadros de profissionais da área da saúde ou de outras áreas nas quais as questões de saúde são relevantes.

SUSIEIEO INFORME EPIDEMIOLÓGICO DO SUS é uma publicação trimestral de

caráter técnico-científico destinada prioritariamente aos profissionais de saúde. Editado pelo Centro Nacional de Epidemiologia da Fundação

Nacional de Saúde, tem como missão a difusão do conhecimento epidemiológico visando o aprimoramento dos serviços de saúde do SUS.

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