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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA 1 EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO vem, no uso das atribuições que lhe conferem o art. 29, inc. I da Lei 8.625/93, c/c. o art. 30, XVI, da Lei Complementar estadual n.º 95/97, e art. 112, III, da Constituição do Estado do Espírito Santo, propor a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE dos artigos 264, 279 e 280 da Lei Complementar Nº 008/2008 do Município de Pedro Canário (doc. 01) , requerendo, desde logo, seja concedida a

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO vem,

no uso das atribuições que lhe conferem o art. 29, inc. I da Lei 8.625/93,

c/c. o art. 30, XVI, da Lei Complementar estadual n.º 95/97, e art. 112, III, da

Constituição do Estado do Espírito Santo, propor a presente

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

dos artigos 264, 279 e 280 da Lei Complementar Nº 008/2008 do Município

de Pedro Canário (doc. 01), requerendo, desde logo, seja concedida a

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antecipação dos efeitos da tutela pretendida, in limine litis e inaudita

altera parte, pelos fatos e fundamentos abaixo aduzidos.

I – DOS DISPOSITIVOS VICIADOS, IPSIS LITTERIS:

LEI COMPLEMENTAR Nº 008/2008:

(...)

Art. 264. Os empregos referentes aos contratos de trabalho

dos servidores que optarem pela mudança de regime

jurídico ficam transformados em cargos públicos nos quais

serão enquadrados seus ocupantes.

(...)

Art. 279. O servidor efetivo que contar com mais de dois anos

ininterrupto, na data da publicação desta Lei, exercendo

cargo em comissão terá remuneração deste incorporado ao

salário base do cargo efetivo para todos os efeitos desta lei,

como forma de estabilidade financeira.

Art. 280. Ao servidor que estiver percebendo gratificação

pelo exercício de função gratificada, na data da

publicação desta Lei, pelo período de 06 meses a 02 anos

ininterruptos, a mesma será incorporada ao salário do

servidor efetivo.

(...)”

Analisando detidamente os dispositivos legais supramencionados, é

manifesto que as ditas normas reclamam o ajuizamento da presente ação

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com o escopo de se ver declarada a inconstitucionalidade dos artigos 264,

279 e 280 da Lei Complementar Nº 008/2008 do Município de Pedro

Canário, haja vista as incontestáveis anomalias jurídicas que exsurgem

quando de seu cotejo com as normações da Constituição do Estado do

Espírito Santo. Veja-se:

1 - DO ART. 264 DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 008/2008 - OFENSA

AO ART. 32, INCISO II DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – DA INTERPRETAÇÃO

CONFORME O DIPLOMA CONSTITUCIONAL

Art. 32. As administrações públicas direta e indireta de

quaisquer dos Poderes do Estado e dos Municípios

obedecerão aos princípios de legalidade, impessoalidade,

moralidade, publicidade, eficiência, finalidade e interesse

público, e também aos seguintes:

...................

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de

aprovação prévia em concurso público de provas ou de

provas e títulos, de acordo com a natureza e a

complexibilidade do cargo ou emprego, na forma prevista

em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão

declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

A Constituição Estadual é a lei maior da ordem jurídica estadual, sendo

que todos os comandos infraconstitucionais devem ser elaborados em

estrita observância às suas prescrições, seja com relação ao processo de

formação, seja no que pertine ao próprio conteúdo das normas

produzidas. Leis ou atos normativos conflitantes com as regras ou princípios

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insertos na Constituição devem ser atacados pelas vias próprias e

defenestrados do contexto jurídico.

No caso em voga, verifica-se clara violação à sistemática constitucional

estadual, de modo que a presente ação direta é medida que se impõe no

sentido de preservar a higidez constitucional.

Com efeito, não se pode olvidar que a Constituição Federal de 1988 e a

Constituição Estadual de 1989 implementaram, a partir de sua vigência, o

mecanismo de ingresso no serviço público exclusivamente após concurso

público de provas ou de provas e títulos, ressalvados os cargos

comissionados e de confiança, de livre nomeação e exoneração, as

contratações por tempo determinado para atender a necessidade

temporária de excepcional interesse público, previstos nos estatutos dos

órgãos da administração pública, e os cargos eletivos decorrentes do

princípio democrático.

Para garantir a salutar transição para o regime constitucional vigente, a

Carta Magna Federal previu concessão de estabilidade especial para

aqueles servidores que ingressaram no serviço público sem concurso

público antes de 05 de outubro de 1983 nos termos do artigo 19 do Ato das

Disposições Constitucionais Transitórias, in verbis:

Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do

Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta,

autárquica e das fundações públicas, em exercício na data

da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco

anos continuados, e que não tenham sido admitidos na

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forma regulada no art. 37, da Constituição, são

considerados estáveis no serviço público.

Neste diapasão, é incontestável que, fora as hipóteses supra

especificadas, não há como se falar, dentro do regime constitucional

vigente, na possibilidade de ingresso no serviço público sem que seja por

meio concurso público.

Sobre o tema, é uníssono o entendimento do Supremo Tribunal Federal,

ipsis litteris:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ALEGAÇÃO DE

INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL DA

RESOLUÇÃO N. 825/2002, DA ASSEMBLEIA DO ESTADO DE SÃO

PAULO: AFRONTA AO ART. 37, INC. II, DA CONS TITUIÇÃO DA

REPÚBLICA. 1. Preliminar de falta de interesse de agir por

ausência de impugnação das Leis complementares paulistas

ns. 865 e 881/2000: Objeto diverso daquele contida na

resolução. Preliminar afastada. 2. Possibilidade de

impugnação de resolução por meio de ação direta de

inconstitucionalidade, nos casos em que por meio dela se

formalize ato normativo e autônomo. 3.

Inconstitucionalidade formal não configurada. Arts. 51, inc.

IV, e 52, inc. XIII, da constituição da república: Competência

das casas legislativas para dispor sobre sua organização,

funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção

dos cargos, empregos e funções de seus serviços. 4.

Inconstitucionalidade material configurada: Art. 37, inc. II, da

constituição brasileira; afronta à regra constitucional da

prévia aprovação em concurso público. Forma de

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provimento derivado de cargo público abolida e vedada

pela Constituição da República. 5. Ação direta de

inconstitucionalidade julgada procedente. (STF; ADI 3.342-5;

SP; Tribunal Pleno; Relª Min. Carmen Lúcia; Julg. 04/03/2009;

DJE 01/07/2009; Pág. 47) (Grifei)

O dispositivo da legislação ora objurgada preceitua que “Os empregos

referentes aos contratos de trabalho dos servidores que optarem pela

mudança de regime jurídico ficam transformados em cargos públicos nos

quais serão enquadrados seus ocupantes”.

Urge salientar que a transformação formal, adequada e legal de

empregos públicos, provenientes de investidura exclusiva por concurso

público, para o quadro de cargos públicos da entidade municipal não é,

por si só, inconstitucional.

A conversão do regime celetista em estatutário não obsta o vínculo

jurídico entre a Administração Pública e o servidor, de modo que mantém-

se a prestação de serviços, a retribuição financeira, o local de trabalho

sem qualquer solução de continuidade.

A possibilidade dos empregados públicos poderem ter direito de opção

para integrar o regime jurídico único dos servidores civis do Município de

Pedro Canário, prima facie, não padece de vício de inconstitucionalidade.

A transposição, prevista em lei formal, de empregos públicos para cargos

públicos, mantendo-se em todo caso a necessidade constitucional de

efetivação por concurso público, não viola o texto constitucional.

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A medida é, pois, constitucional, desde que sejam mantidas as

características originais das atribuições do emprego/cargo público, sem

criar privilégio funcional, pessoal ou sectário para o servidor, o qual,

ressalte-se novamente, tenha ingressado por concurso público.

Com efeito, conforme entendimento solidificado no âmbito da

jurisprudência do Excelso Pretório “A transformação violadora da

Constituição é aquela que visa constitucionalizar uma forma de

provimento derivada de cargo público sem ter se tido acesso anterior por

meio de concurso público, não quando o procedimento de transformação

respeitou a regra do concurso público e foi realizada preservando a

reserva de lei formal de competência do Legislativo”.1

Assim, tem-se que a transformação dos empregos públicos em cargos

públicos dos servidores que optarem pela mudança de regime será

constitucional, nos casos em que o servidor (empregado público) tenha

adentrado nos quadros da Administração mediante aprovação em

concurso público, e que a referida transformação seja efetivada por lei

com regular procedimento legislativo.

Todavia, no caso em apreciação, não é feita qualquer ressalva que possa

especificar o alcance da transposição. O art. 264 da Lei Complementar

Estadual limita-se a autorizar a transformação dos empregos em cargos

públicos, sem maiores exigências.

1 STF, ADI n. 3.342/SP, rel. Min. Carmen Lúcia, j. em 04/03/2009; STF, ADI n. 1.677/DF, rel. Min.

Moreira Alves, j. em 03/02/2003; STF, ADI/MC n. 1.476/PE, rel. Min. Carlos Velloso, j. em

07/11/1996

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De ver está que o permissivo em tela viola o princípio do concurso público,

merecendo a pronta censura desse Egrégio Sodalício.

Não sendo este o entendimento esposado pelo Tribunal, partindo-se da

teoria da mutação constitucional há a possibilidade de, a um só tempo,

preservar a lisura da ordem constitucional sem ser desprestigiado o

princípio da presunção de constitucionalidade.

Destarte, com escopo de dar clara expressão ao comando legal

questionado, pode essa Corte se valer da técnica de interpretação

conforme a Constituição, admitindo-se a transformação dos empregos em

cargos públicos determinada pela Lei Complementar Municipal Nº

008/2008, caso o empregado tenha ingressado no serviço público por

meio de regular concurso para o desempenho das mesmas atribuições do

cargo para o qual foi transposto, sem possibilidade de provimento de

forma derivada ao cargo público.

2 - DOS ARTS. 279 e 280 DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 008/2008 -

OFENSA AO ART. 32, “CAPUT” DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL

Nos termos da Lei Complementar Municipal Nº 008/2008, “O servidor

efetivo que contar com mais de dois anos ininterruptos, na data da

publicação desta Lei, exercendo cargo em comissão terá remuneração

deste incorporado ao salário base do cargo efetivo para todos os efeitos

desta lei, como forma de estabilidade financeira”.

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A priori, é evidente a inexistência de impedimento para que a lei municipal

estabeleça direito à incorporação de acréscimo percebido a título de

função gratificada aos vencimentos dos servidores. O que se mostra

descabido, por expressa vedação constitucional, desde o advento da

Emenda Constitucional Nº 19/98, é acrescer tais valores à base de cálculo

para incidência das demais vantagens.

O direito à estabilidade financeira é legítimo e tem respaldo constitucional

para os casos de servidores que exerceram funções ou cargos em

comissão por determinado lapso temporal. Para evitar impacto

imprevisível no orçamento desses servidores, a lei permite que parcelas da

remuneração daqueles cargos ou funções sejam incorporadas aos seus

vencimentos, como vantagem pessoal. Ocorre que, como será

demonstrado, no presente caso resta evidente a ofensa ao art. 32, caput,

e inciso XI da Carta Constitucional Capixaba.

Vale repisar o que preceituam os artigos 279 e 280 da legislação

complementar municipal:

Art. 279. O servidor efetivo que contar com mais de dois anos

ininterrupto, na data da publicação desta Lei, exercendo

cargo em comissão terá remuneração deste incorporado ao

salário base do cargo efetivo para todos os efeitos desta lei,

como forma de estabilidade financeira.

Art. 280. Ao servidor que estiver percebendo gratificação

pelo exercício de função gratificada, na data da

publicação desta Lei, pelo período de 06 meses a 02 anos

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ininterruptos, a mesma será incorporada ao salário do

servidor efetivo.

Analisando o regramento supramencionado, resta patente a ofensa aos

princípios da moralidade e da impessoalidade – Art. 32, caput da CE.

Fica claro o desprezo à ordem jurídica, gerando, via reflexa, cabal

violação aos princípios da moralidade e impessoalidade, na medida em

que o texto legislativo permite que a administração pública aja sem

isenção e ao arrepio da ordem constitucional.

É que o dispositivo em comento criou regra que privilegia um grupo

minoritário de pessoas, mostrando-se incompatível com os princípios da

impessoalidade e moralidade previstos no art. 32, caput da Constituição

do Estado do Espírito Santo2.

Destarte, patente se mostra a inconstitucionalidade dos dispositivos

impugnados, violadores dos princípios da impessoalidade e moralidade

públicas.

Segundo Hely Lopes Meirelles 3 , a Administração deve obediência ao

princípio da impessoalidade, sendo que:

o administrador fica impedido de buscar outro objetivo ou

de praticá-lo no interesse próprio ou de terceiros... O

2 Art. 32. As administrações públicas direta e indireta de quaisquer dos Poderes do Estado

e dos Municípios obedecerão aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,

publicidade, eficiência, finalidade e interesse público, e também aos seguintes:

3 Meirelles, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 32ª ed., Malheiros, 2006, cap. II, n°

2.3.3 e 2.3.10, páginas 92 e 103.

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princípio do interesse público está intimamente ligado ao da

finalidade. A primazia do interesse público sobre o privado é

inerente à atuação estatal e domina-a, na medida em que

a existência do Estado justifica-se pela busca do interesse

geral.

Neste diapasão, adverte o renomado doutrinador Celso Antônio Bandeira

de Mello4, in verbis:

Nele se traduz a idéia de que a Administração tem que

tratar a todos os administrados sem discriminações,

benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem

perseguições são toleráveis. Simpatias ou animosidades

pessoais, políticas ou ideológicas não podem interferir na

atuação administrativa e muito menos interesses sectários,

de facções ou grupos de qualquer espécie. O princípio em

causa não é senão o próprio princípio da igualdade ou

isonomia.

Adotam idêntico posicionamento doutrinário Diógenes Gasparini (Direito

Administrativo, 11ª ed., Saraiva, 2006, cap. I, n° 2.2, pág. 9); Odete

Medauar (Direito Administrativo Moderno, 10ª ed., RT, 2006, n° 7.5, pág. 125-

6); Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito Administrativo, 19ª ed., Atlas, 2006,

n° 3.3.3, pág. 85).

Na ocasião do julgamento dos embargos infringentes na remessa ex officio

Nº 012050142939, onde se discutia matéria análoga a aqui debatida, a

Eminente Desembargadora Relatora Catharina Maria Novaes Barcellos

assim se manifestou:

4 Bandeira de Mello, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 15ª ed., Malheiros,

2003, cap. II, n° 19, página 104.

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“Não tenho a menor dúvida em afirmar que a Lei nº 1.678/85,

editada de forma casuística e imoral, com a finalidade de

favorecer indevidamente servidores que tenham ocupado

cargos de confiança na Municipalidade, para os quais não

se exige concurso público, restou eivada de vício insanável

de inconstitucionalidade, pelas mesmas razões que

ensejaram a declaração de inconstitucionalidade da Lei nº

3.385/99. Como visto alhures, em essência, tais diplomas

legislativos possuem idêntico conteúdo, ao tratar da

malfadada estabilidade financeira, diferindo-se muito

pouco quanto ao requisito temporal, ambas evidenciando o

flagrante intuito de perpetuar situações funcionais precárias

e transitórias, à margem do texto constitucional. Vejamos, a

propósito, a ementa do v. acórdão unânime proferido pelo

Egrégio Tribunal Pleno, no julgamento da Ação Direta de

Inconstitucionalidade nº 100.99.0012484, sob a relatoria do

Exmo. Desembargador Álvaro Manoel Rosindo

Bourguignon (DJES 06/02/2003), o qual confirmou a medida

liminar deferida em 27 de junho de 2000:

“CONSTITUCIONAL - AÇÃO DIRETA DE

INCONSTITUCIONALIDADE - LEI N° 3.685/99 DO

MUNICÍPIO DE CARIACICA QUE PERMITE

ESTABILIDADE FINANCEIRA PARA OS SERVIDORES

PÚBLICOS MUNICIPAIS - OFENSA AOS ARTS. 32,

XIV, 68, PARÁGRAFO ÚNICO, VIII, 152, 11; E 154,

DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL - PEDIDO DEFERIDO

COM EFEITOS „EXTUNC‟. I - Ação Direta de

Inconstitucionalidade contra a Lei n° 3.685/99, do

Município de Cariacica que permitiu a

estabilidade financeira para os servidores públicos

municipais. II - A lei atacada ofende a

Constituição Estadual na medida em que atenta

contra a vedação de: a) vinculação ou

equiparação de vencimentos para efeito de

remuneração de servidor público; b) criação de

vantagem que não tenha obedecido a forma

legal específica; c) cálculo de proventos que não

tenham como base o cargo efetivo exercido

pelo servidor público; d) realização de despesas

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que excedam aos créditos orçamentários e; e)

concessão de qualquer vantagem ou aumento

de remuneração sem prévia dotação

orçamentária e não prevista na competente lei

de diretrizes. (arts. 32, XIV, 68, parágrafo único, VIII,

152, 11; e 154, da Constituição Estadual, com

aplicação do disposto nas Emendas

Constitucionais Federais nºs. 19/98 e 20/98, por

força dos arts. 14 e 20 da Carta Estadual). III -

Padece de inconstitucionalidade formal o ato

legislativo que, mediante lei ordinária, veicula

matéria privativa de lei complementar. IV -

Ofende igualmente princípio da moralidade,

sendo, portanto, inconstitucional, lei que, sob o

disfarce da estabilidade financeira, permite

verdadeira agregação, por servidor efetivo, dos

vencimentos de cargo de comissão exercido por

curtíssimo período, em evidente e inaceitável

dilapidação da receita pública.”

O Supremo Tribunal Federal vem consagrando a “teoria da

transcendência dos motivos determinantes”, segundo a qual

a razão de decidir (ratio decidendi) em controle de

constitucionalidade concentrado projeta os seus efeitos

para fora do processo, passando a vincular outros

julgamentos similares.

(...)” (Destaquei)

Destarte, assim como asseverado pela Eminente Relatora do Recurso

supramencionado, parece claro ter sido o dispositivo legal criado com

assento em outro escopo, furtivo e malicioso, que veio a ser editado,

deixando de objetivar interesse público, agredindo os princípios da

impessoalidade e moralidade.

Impossível não se vislumbrar que os comandos atacados padecem de

vício de inconstitucionalidade material, a impor a declaração de sua

nulidade total.

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A jurisprudência deste Egrégio Sodalício assim vem se manifestando sobre

o tema:

APELAÇÃO CÍVEL. DECLARAÇÃO INCIDENTAL DE

INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL QUE ESTABELECIA

A ESTABILIDADE FINANCEIRA. 1. É inconstitucional lei que

autoriza a incorporação permanente aos vencimentos do

servidor público de gratificação recebida em razão do

exercício de cargos em comissão ou funções de confiança

pelo período de 3 (três) anos. 2. O prazo de 3 (três) anos

estabelecido pela lei para incorporação definitiva destas

gratificações é totalmente desarrazoado e ofensivo aos

princípios da impessoalidade e moralidade públicas

insculpidos no art. 32, caput, da Constituição Estadual e no

art. 37, caput, da Constituição Federal. 3. DECLARAÇÃO,

INCIDENTER TANTUM, DA INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL

DA LEI Nº 456 de 26 de dezembro de 2002 do Município de

Marechal Floriano e SUSPENSÃO DO JULGAMENTO até a

análise da questão pelo Tribunal Pleno na forma do art. 97

da CF. (TJES, Classe: Apelação Cível, 12050038459, Relator:

RONALDO GONÇALVES DE SOUSA, Órgão julgador: TERCEIRA

CÂMARA CÍVEL, Data de Julgamento: 13/01/2009, Data da

Publicação no Diário: 20/01/2009)

EMBARGOS INFRINGENTES. REMESSA NECESSÁRIA E

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. MUNICÍPIO DE

CARIACICA. ESTABILIDADE FINANCEIRA. SERVIDORES

EFETIVOS. DIREITO À MANUTENÇÃO DOS VENCIMENTOS E

VANTAGENS DOS CARGOS COMISSIONADOS (LEI Nº 1.678⁄85).

DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE EX TUNC DE

NORMA DE CONTEÚDO IDÊNTICO (LEI Nº 3.385⁄99). TEORIA DA

TRANSCENDÊNCIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES.

INCOMPATIBILIDADE DA LEI COM A SUPERVENIENTE ORDEM

CONSTITUCIONAL. REVOGAÇÃO. SUPRESSÃO DOS

ACRÉSCIMOS REMUNERATÓRIOS POR DECRETO EXECUTIVO.

PODER-DEVER DE AUTOTUTELA ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO

AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INEXISTÊNCIA. PRINCÍPIO DA

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RELATIVIZAÇÃO OU DA CONVIVÊNCIA DAS LIBERDADES

PÚBLICAS. VALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO.

IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO DESPROVIDO. 1.

Hipótese na qual os embargantes, servidores efetivos do

Município de Cariacica, foram agraciados com a

estabilidade financeira prevista na Lei municipal nº 1.678⁄85,

que lhes assegurou o direito de continuar recebendo o

vencimento e as gratificações dos cargos comissionados dos

quais haviam sido exonerados. Contudo, o Prefeito

Municipal, por meio de decreto executivo, suprimiu tais

acréscimos remuneratórios, em virtude da suspensão liminar

retroativa (ex tunc) dos efeitos da superveniente Lei

municipal nº 3.685⁄99, que instituía semelhante benefício, em

ação direta de inconstitucionalidade proposta neste Tribunal

(ADI 100.99.0012484, Rel. Des. Álvaro Manoel Rosindo

Bourguignon, DJES 06.02.2003). 2. A Lei municipal nº 1.678⁄85,

editada de forma casuística e imoral, com a finalidade de

favorecer indevidamente servidores que tenham ocupado

cargos de confiança, para cuja investidura não se exige

concurso público, afigura-se manifestamente incompatível

com a atual Constituição da República, pelas mesmas

razões que ensejaram a declaração de

inconstitucionalidade da Lei municipal nº 3.385⁄99, dotada

de idêntico conteúdo normativo, diferindo-se muito pouco

quanto ao requisito temporal para a malfadada

estabilidade financeira, ambas evidenciando o flagrante

intuito de perpetuar situações funcionais precárias e

transitórias, à margem do texto constitucional. 3. Segundo a

¿teoria da transcendência dos motivos determinantes¿,

preconizada em vários precedentes do STF, a razão de

decidir (ratio decidendi) em controle de constitucionalidade

concentrado projeta os seus efeitos para fora do processo,

passando a vincular outros julgamentos similares, ainda que

digam respeito a leis emanadas de entes políticos diversos,

bem assim as suas autoridades administrativas, pois a

eventual disparidade de interpretações do texto

constitucional debilita a sua força normativa. 4. Os

diplomas legislativos incompatíveis com a Constituição

superveniente são considerados por ela revogados (não

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recepcionados), não se podendo invocar direito adquirido

em face da instauração do novo ordenamento

constitucional (art. 17 do ADCT). Logo, o reconhecimento da

não-recepção da lei pré-constitucional pode ser feito por

órgão fracionário do Tribunal, em situações concretas

debatidas em processos subjetivos, sem ofensa à cláusula de

reserva de plenário (art. 97 da CF e Súmula Vinculante nº 10

do STF), ou mediante argüição de caráter abstrato pela via

concentrada da ação de descumprimento de preceito

fundamental (art. 1º, par. único, Lei nº 9.882⁄99). Orientação

jurisprudencial do STF. 5. Assim, agiu corretamente a

Administração Municipal, no exercício do seu poder-dever

de autotutela (Súmula nº 473 do STF e art. 46 da Constituição

Estadual), ao sustar os efeitos pecuniários da odiosa

estabilidade financeira baseados em diploma legislativo

cujo conteúdo essencial revestiu-se de manifesta

incompatibilidade com o texto constitucional, pelas mesmas

razões emergentes da declaração de inconstitucionalidade

da lei similar posterior. 6. Se a redução dos vencimentos dos

servidores resultou da mera observância da força vinculante

do pronunciamento emitido em controle de

constitucionalidade na via direta, reputa-se suficiente e

válido o decreto executivo contendo a motivação do

respectivo ato administrativo, flexibilizando a garantia

constitucional do devido processo legal. De mais a mais,

esclarecidos os fatos determinantes da providência

adotada pela Administração e sendo possível o reexame

judicial da questão jurídica, em toda a sua extensão, não há

prejuízo efetivo decorrente da ausência da ampla defesa na

esfera administrativa. 7. Os direitos e garantias

fundamentais consagrados na Constituição Federal não são

ilimitados, devendo harmonizar-se com outros igualmente

assegurados na Carta Magna (princípio da relativização ou

convivência das liberdades públicas). E não se pode perder

de vista o caráter instrumental do processo (judicial ou

administrativo), como meio de buscar a realização da

justiça, transformando-o numa simples exigência formal

inteiramente dissociada de sua finalidade constitucional,

capaz de servir como manto protetor àqueles que não

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possuam o direito material subjacente. Logo, numa

interpretação finalística, se o administrado tem a

oportunidade de exercer a plenitude de defesa na instância

judicial, a falta de pré9via instauração de procedimento

administrativo, por si só, não torna nulo o ato administrativo.

8. Embargos infringentes desprovidos, mantido o v. acórdão

que, em sede de remessa necessária e apelação cível,

reformou a sentença e julgou improcedente a pretensão

autoral. VISTOS, relatados e discutidos estes autos dos

Embargos Infringentes na Remessa Ex-officio e Apelação

Cível nº 012050142939, sendo embargantes ALDEMIR PEREIRA

DA SILVA E OUTROS e embargado MUNICÍPIO DE

CARIACICA. (TJES, Classe: Embargos Infringentes Rem Ex-

officio, 12050142939, Relator : CATHARINA MARIA NOVAES

BARCELLOS, Órgão julgador: SEGUNDO GRUPO CÂMARAS

CÍVEIS REUNIDAS, Data de Julgamento: 11/03/2009, Data da

Publicação no Diário: 24/04/2009)

Evidencia-se, assim, que a norma guerreada procurou atingir uma

finalidade alheia ao interesse público, qual seja, a de permitir a promoção

de interesses particulares de determinados servidores públicos, em

detrimento do respeito pela coisa pública.

Não se pode olvidar que a norma impugnada, de fato, contém vício de

inconstitucionalidade, por aberta violação aos princípios da

impessoalidade e moralidade na administração pública, devendo por

consequência serem retirados do ordenamento jurídico os dispositivos

legais municipais.

Caso este não seja o entendimento deste Excelso Pretório, insta ressalvar

que, da forma como redigida, a lei municipal questionada dá margem a

diversas interpretações. E, dentre as possíveis, encontra-se aquela que

permitiria a incorporação de gratificação sobre o vencimento-padrão já

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acumulado com outros acréscimos pecuniários, o que é vedado por

provocar o denominado “efeito cascata”.

É possível, deste modo, que a interpretação literal dos dispositivos em

epígrafe poderia mesmo conduzir a um entendimento inconstitucional.

Cumpre salientar, aqui, o inciso XI do art. 32 da Constituição Estadual, in

verbis:

XI - os acréscimos pecuniários percebidos por servidor

público não serão computados nem acumulados para

fins de concessão de acréscimos ulteriores;

Destarte, por se tratar de norma polissêmica ou plurissignificativa, a permitir

mais de uma interpretação possível, revela-se adequado que se opte pelo

sentido que deixe a norma em compatibilidade com o texto

constitucional, justamente a fim de evitar a sua retirada do ordenamento

jurídico, entretanto, resguardando de um potencial dano ao erário.

Neste sentido, há mais de uma centena de precedentes do Supremo

Tribunal Federal a indicar a possibilidade da adoção do instituto da

interpretação conforme o texto constitucional, para vedar sua indevida

aplicação, sem a necessidade, contudo, de sua exclusão do mundo

jurídico.

Neste diapasão, conforme exaustivamente explicitado, caso não seja

declarada a inconstitucionalidade material das normas impugnadas,

deve-se aplicar o princípio da interpretação conforme a Constituição, aos

efeitos de não permitir a incorporação da gratificação ao vencimento e o

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respectivo aproveitamento para composição de base de cálculo para

outros acréscimos pecuniários - “efeito cascata”.

3 - DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA

Na presente Ação Direta de Inconstitucionalidade, não se almeja a análise

de um caso concreto, mas sim de lei municipal, com o escopo de se

declarar sua inconstitucionalidade em face da Constituição Estadual,

extirpando do mundo jurídico norma que conflita com essa Lei

Fundamental ou interpretá-la em conformidade com o texto

constitucional.

Assim, necessário se faz a concessão antecipada dos efeitos da tutela na

presente Ação Direta de Inconstitucionalidade, consoante art. 273 do

Código de Processo Civil, pelos seguintes fundamentos.

Inicialmente, temos o primeiro requisito imprescindível à concessão da

tutela satisfativa in limine litis – fumus boni iuris, facilmente constatado pela

singela análise dos dispositivos legais debatidos, que permitem a

transformação dos empregos públicos em cargos públicos dos servidores

que optarem pela mudança de regime sem as observâncias

constitucionais, bem como a incorporação de remuneração de cargo em

comissão exercido e de funções gratificadas, em flagrante ofensa ao texto

constitucional.

Quanto ao segundo requisito – periculum in mora, é também patente,

verificando-se em razão de possibilitar, à mercê da discricionariedade que

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possui o Município, o pagamento das referidas incorporações e

gratificações mensalmente, gerando uma lesão mensal ao erário, em

desacordo com os critérios constitucionais, violando materialmente a

Constituição Estadual.

Desta forma, é incontestável o risco de potenciais danos irreparáveis caso

não seja suspensa a eficácia dos dispositivos legais questionados, sendo

imperioso o deferimento da medida cautelar conforme pleiteada, tendo

em vista estar cabalmente comprovada a inconstitucionalidade dos

artigos 264, 279 e 280 da Lei Complementar Nº 008/2008 do Município de

Pedro Canário.

Assim sendo, conclui-se pela flagrante necessidade de antecipação dos

efeitos da tutela pretendida no caso em tela, uma vez ser essencial alijar

do cenário jurídico os preceptivos impugnados ou interpretá-los conforme

a Constituição Estadual, visto que ferem preceitos constitucionais da Lei

Fundamental do Estado do Espírito Santo.

Destarte, estando presentes os requisitos para a concessão da medida

cautelar pleiteada, consistentes na relevância jurídica do pedido e no

periculum in mora, ou mesmo na conveniência da suspensão dos efeitos

dos dispositivos da Lei municipal em tela, é imprescindível a admissão do

pedido em epígrafe.

4 – DOS PEDIDOS

Ex positis, requer o autor:

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a) A suspensão liminar da vigência do artigos 264, 279 e 280 da Lei

Complementar Nº 008/2008 do Município de Pedro Canário,

conforme artigo 169, alínea “b”, do Regimento Interno deste

Egrégio Tribunal de Justiça e artigo 12 da Lei Federal Nº 9.868/99;

a) A notificação do do Prefeito e do Presidente da Câmara

Municipal de Pedro Canário, para os fins previstos no artigo 169,

alínea “a”, do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de

Justiça;

b) E, por derradeiro, seja a presente Ação Direta de

Inconstitucionalidade julgada procedente, para:

Declarar-se a inconstitucionalidade do artigo 264 “caput”

da Lei Complementar Nº 008/2008 do Município de Pedro

Canário; Assim não se posicionando essa Corte, seja

aplicada a técnica da interpretação conforme a

Constituição, de modo que a transformação dos empregos

públicos em cargos públicos somente se dê no caso de

empregado aprovado por meio de concurso público.

Declarar-se a inconstitucionalidade material dos arts. 279 e

280 da Lei Complementar Nº 008/2008 do Município em

apreço, porquanto viola o art. 32, caput da Constituição

Estadual; Caso não seja o entendimento desse Pretório, seja

feita interpretação conforme a Constituição, evitando-se as

incorporações sobre o vencimento-padrão já acumulado

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com outros acréscimos pecuniários (art. 32, inc. XI, CE), o

que é vedado por provocar o denominado “efeito

cascata”.

c) Sejam adotadas as providências necessárias para que cessem, ex

tunc, todos os efeitos dos dispositivos legislativos vergastados.

Valora a causa, por força de expressa disposição legal, em R$ 100,00 (cem

reais).

Nestes termos,

pede deferimento.

Vitória,25 de janeiro de 2010.

FERNANDO ZARDINI ANTONIO

PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA