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Propriedade e Edição:Ministério da SaúdeMissão para os Cuidados de Saúde Primários Redacção e Secretariado:Rua Gomes Freire 5, 4º esq. - 1169-086 LisboaTel. 213 564 450 - Fax 213 559 214Email: [email protected]://www.mcsp.min-saude.ptDirecção: Luís PiscoCoordenação: Filipa Homem ChristoFotografia: IstockPhoto, Mª José Pinto,Jornal Médico de FamíliaProdução Gráfica: Editideias, Lda.Av. Forças Armadas 4, 8º D - 1600-082 Lisboa Tel. 217 819 442 - Fax 217 819 447Email: [email protected] Tiragem: 3000 exemplaresDistribuição gratuita
missãocuidados de saúdeprimários
OUTUBRO 2008
04 Uma gestão de proximidade ao serviçodos cuidados de proximidade
09 Reforma dos cuidados de saúde primários Uma mudança cultural em curso
14 Acreditamos que é possíveluma reforma de baixo para cima
18 Dos SSP dos CS à USP dos ACES
22 Unidade de Cuidados na Comunidade
25 Juventude e entusiasmo lideramUSF Santa Clara
31 Manual de Procedimentos na Diabetes Mellitus
38 Atendimento de Qualidade Reconhecida
42 Programas PACES
O APARECIMENTO DE UMA REVISTA dedicada aos Cuidados de Saúde Primários seria
sempre de saudar. O seu aparecimento nesta fase crucial da Reforma é seguramente um
contributo importante no caminho complexo e difícil que ainda temos que percorrer. Esta não
será certamente apenas mais uma Revista para profissionais de saúde. Ao levar a cabo a sua
publicação, a Missão para os Cuidados de Saúde Primários pretende disponibilizar um
instrumento de trabalho, um espaço de formação e informação, um elo de ligação entre todos
os que trabalham nos Cuidados Primários. É uma Revista
Técnica que pretende abordar práticas inovadoras da gestão,
de governação clínica, de qualidade, mas também dar visi-
bilidade ao muito que de bom se faz nos Centros de Saúde
para que essas boas práticas sirvam de modelo e de inspi-
ração para outros.
IREMOS ACOMPANHAR O DESENVOLVIMENTO
das Unidades de Saúde Familiar, o aparecimento dos Agru-
pamentos de Centros de Saúde e todas as suas unidades
funcionais – Saúde Pública, Cuidados na Comunidade, Recur-
sos Assistenciais Partilhados, Cuidados de Saúde Persona-
lizados – bem como a aplicação no terreno da governação
clínica. Sendo um conceito recente entre nós, abrange vários
aspectos da condução de um serviço de saúde, como a efecti-
vidade clínica, a auditoria clínica, a gestão do risco, a satisfa-
ção do doente e o desenvolvimento de competências profissio-
nais, implicando um esforço conjunto da equipa para iden-
tificar aspectos que necessitem de melhoria e para procurar as
melhores soluções, conjugando a incorporação de inovações
com a segurança e a efectiva aplicação destas.
A FORMAÇÃO, A INVESTIGAÇÃO, A AVALIAÇÃO e
a melhoria da qualidade, as boas práticas clínicas e orga-
nizacionais nas múltiplas profissões que constituem os cui-
dados de saúde primários, seja a nível nacional seja inter-
nacional, merecerão a nossa atenção e divulgação.
CONTAMOS COM A VOSSA COLABORAÇÃO, o vosso
empenho e o vosso sentido crítico para podermos melhorar a
nossa revista.
missãocuidados de saúde
primários
LUÍS PISCOCOORDENADOR DA MISSÃOPARA OS CUIDADOSDE SAÚDE PRIMÁRIOS
Edito
rial
AReforma dos Cuidados de Saúde Primários que avan-
ça por todo o País ao ritmo das diferentes Regiões mas
com um propósito comum, há muito que se instalou
na Península de Setúbal. A nomeação de um director
para mais que um Centro de Saúde (CS) foi uma das
medidas. Estávamos em 2000, como nos conta Rui Monteiro:
«Se recuarmos no tempo, quando pela primeira vez iniciei
funções de coordenador, em Fevereiro do ano 2000, já se
falava da necessidade de reconfigurar os Centros de Saúde.
Tomei nessa altura a iniciativa de propôr a nomeação de
um director para mais que um CS. Considerei, com base na
minha experiência, que era uma decisão que só tinha
vantagens: libertava médicos para a prática clínica, libertava
administrativos afectos a cada uma das direcções, harmo-
nizava a gestão.
Comecei por juntar 3 CS do concelho de Almada, depois 2 CS
do concelho do Barreiro e mais 2 CS do Concelho do Seixal.
Entretanto saí da Sub-região, em Junho de 2002, e tudo voltou
à estaca zero.
Quando voltei, em Junho de 2005, a Reforma dos Cuidados
de Saúde Primários era uma das prioridades do Ministério
da Saúde e, curiosamente, agrupar CS era uma das medidas
propostas.
A circunstância de ter integrado o Grupo Técnico para a
Reforma dos Cuidados de Saúde Primários, nomeado por
despacho do Ministro da Saúde, em Abril de 2005 e a expe-
riência do passado, foram muito úteis para avançar imedia-
tamente para todos os CS da Península de Setúbal. Passa-
mos de 16 CS e de 16 directores para 4 agrupamentos e
4 directores».
missão4 cuidados de saúdeprimários
UMA GESTÃODE PROXIMIDADEao serviço dos cuidados de proximidade
Fazer a Reforma dos Cuidados de SaúdePrimários juntamente com a reformada Administração Pública conduzinevitavelmente à desactivação de algumasestruturas que, num processo de evoluçãopara a modernidade, flexibilidadee descentralização, deixam de sernecessárias e à criação de outras, de quesão exemplo os Agrupamentos de Centrosde Saúde. No caso da Sub-região de Saúdede Setúbal, as duas reformas estão emfase avançada e o seu Coordenador,RUI MONTEIRO, explica à Revistada Missão para os Cuidados de SaúdePrimários o longo caminho que,decididamente, percorreram.
TEXTO DE FILIPA HOMEM CHRISTO
Primeiros agrupamentosgeram grandes economiasA Sub-região de Setúbal teve o mérito de não ficar à
espera da legislação que viria a sair.
Sabia o caminho, não esteve parada e obteve ganhos
evidentes, por economia de escala. São disso exemplo os
12 médicos ganhos para a prática de medicina geral e
familiar, 62 administrativos para atendimento de públi-
co e 6.500 euros mensais de poupança (por cessação do
subsídio mensal que era pago aos directores ao abrigo
do DL 60/2003).
Um outro ganho, porventura mais importante, foi a
possibilidade de se começar muito cedo a trabalhar
“ombro a ombro” com pequenas equipas, muito motiva-
das e muito comprometidas com a mudança.
Passar da gestão à distânciapara uma gestão de proximidadeMas qual foi afinal a visão que impulsionou e antecipou
a a criação dos ACES na península de Setúbal e o início
da desactivação da estrutura Sub-região de Saúde? Rui
Monteiro é peremptório em afirmar que a reforma dos
CSP era a grande oportunidade para acabar com uma
gestão distrital, centralizada nas Sub-regiões, e passá-la
para o nível local.
«O que eu no fundo desejava era acabar, o mais rapi-
damente possível, com uma situação que sempre se
criticou, mas que nunca se resolveu, caracterizada por
uma gestão à distância, centralista, de tipo controlo-
-comando e passar para um modelo de gestão de pro-
ximidade, em que aos dirigentes, que conhecem e
sentem os problemas, é dado o poder e os meios para
decidirem as melhores soluções. Esta mudança é a nossa
pressa.”
Uma boa gestão dos ACES é determinante para o bom
funcionamento das diferentes unidades prestadoras de
cuidados de saúde, sejam USFs ou outras. É sabido que
sem uma estrutura de back-office operacional e efectiva
toda a prestação de cuidados é afectada.
No entender de Rui Monteiro a coincidência da Refor-
ma da Administração Pública e da Reforma dos Cuida-
dos de Saúde Primários constitui uma oportunidade
para criar modelos gestionários mais ajustados a novos
desafios.
«Tenho a convicção de que a principal dificuldade é
justamente criar nos ACES uma nova cultura e uma
estrutura gestionária e dirigente, bem preparada para
liderar e motivar, para fazer uma boa contratualização
externa e interna, para desenvolver uma boa governa-
ção clínica, etc. Criar Unidades de Saúde Familiar é
determinante para o sucesso da reforma, mas não tem
sido o mais difícil, pelos menos até agora. O que a admi-
nistração tem de fazer é garantir os meios, desde as
instalações aos equipamentos, a mobilidade dos profis-
sionais e a apreciação e correcção das candidaturas»
Avancei até onde podia avançar A criação de ACES e a desactivação da estrutura de uma
Sub-região de Saúde devem ser abordados de forma
sistémica, dada a sua interacção, um cresce à custa do
outro.
«Tivemos o cuidado de nos reunirmos com todos os
funcionários dos serviços centrais sub-regionais para os
informar dos objectivos da reforma e da necessidade de
se extinguir a sub-região. Sem compromissos, discu-
tiram-se todas as hipóteses possíveis de destino dos fun-
cionários», refere Rui Monteiro.
Fiel à estratégia de desactivar a sub-região de forma
progressiva, foi necessário reorganizar serviços para
permitir algumas saídas para os ACES e para facilitar
saídas de funcionários que encontraram alternativas de
trabalho fora do Ministério da Saúde. O próprio coor-
missãocuidados de saúde 5primários
denador deu o exemplo ao aceitar a saída de 3 directo-
res, assumindo ele próprio as suas funções.
Desde 2005, até à presente data, já saíram dos serviços
centrais sub-regionais 80 profissionais, sem que tenha
havido qualquer entrada. Foram vários os destinos, sendo
uma parte para os ACES.
«Avancei com o que era de avançar» diz Rui Monteiro.
«Podia só ter criado os ACES ...mas era preciso também
desactivar a Sub-região. E comecei muito cedo a fazer
tudo isto».
A descentralizaçãojá é uma realidadeA liderança e a confiança num movimento reformista
sem retorno foram de facto fundamentais para as pes-
soas perceberem que a Sub-região ia mesmo acabar, que
novos centros de saúde estavam a ser criados e que era
neles que, num futuro próximo, passariam a trabalhar.
A descentralização já é uma realidade: já se pagam
vencimentos nos ACES. Rui Monteiro explica como:
«Tenho uma equipa de trabalho (directores dos ACES e
técnicos superiores da Sub-região) muito competente e
altamente motivada para romper com o passado e cons-
truir um futuro de que todos irão beneficiar.
E tem havido muita transpiração, muito trabalho e
muita chatice. Porque isto não se faz sem muito trabalho
e sem empenho em resolver os problemas. Mas está-
vamos determinados e conseguimos.
Neste momento a maior parte das actividades/tarefas
que eram desenvolvidas nos serviços centrais sub-regio-
nais passaram a ser desenvolvidas nos agrupamentos.
Temos vários profissionais, técnicos superiores da área
administrativa e não só, que dividem o seu trabalho
semanal pelos serviços sub-regionais e pelos ACES. Esta
solução e este sacrifício terão de se manter enquanto a
Sub-região não fôr extinta. Cada agrupamento já desen-
volve todo o processo relativo ao pagamento de salários
dos seus funcionários. Era um dos nossos objectivos
emblemáticos.
É óbvio que nem todas as actividades devem migrar
para os ACES. São disso exemplo: compras de bens e
serviços que possam gerar economias de escala, confe-
rência automática de facturas das farmácias e conven-
cionados e respectivos pagamentos, construção de novos
equipamentos, gabinete jurídico, etc».
Extinguir é fechar à chave Como é que se faz a passagem dos efectivos da Sub-
-região para os Agrupamentos de Centros de Saúde
(ACES)? Porque é que a Sub-região ainda subsiste? Rui
Monteiro explica que a Sub-região ainda não foi extinta
(só o será quando for publicada a portaria que cria o
último ACES) e por isso tem de continuar a cumprir as
suas obrigações enquanto tal, só que o faz, para uma
grande parte destas obrigações, através de um processo
de junção e consolidação do que já é feito nos agru-
pamentos. Ou seja, os ACES ainda não podem relacio-
nar-se funcionalmente com a Região.
Quanto à passagem dos efectivos da Sub-região para os
ACES, encontram-se na fase de ultimar uma proposta
que farão à Região (ARS LVT) e que ainda não é opor-
tuno detalhar. Mas adianta que não defendem serviços
residuais, tipo serviços regionais desconcentrados.
Para Rui Monteiro extinguir é fechar à chave e entregar
as instalações ao senhorio. É para isto que têm estado a
trabalhar e é isto que gostariam de fazer o mais rapi-
damente possível.
Unidades de Apoio à Gestãojá estão organizadasDe acordo com o DL 28/2008, os ACES são organiza-
dos em unidades funcionais e uma dessas unidades é a
Unidade de Apoio à Gestão (UAG), cuja organização e
desempenho são da maior importância não só para o
sucesso da reforma dos cuidados de saúde primários,
mas também para a desactivação das sub-regiões. Rui
Monteiro defende que a maioria das actividades/tarefas
feitas nesta estrutura, que vai ser extinta, devem migrar
para os ACES. Isto é: passarão a ser desenvolvidas pelas
UAGs de cada Agrupamento.
«Com base nesta estratégia de descentralização e de res-
ponsabilização máximas, estruturámos as UAGs em
quatro áreas: Financeira, Recursos Humanos, Gestão da
Informação, uma área em que estamos a fazer uma
grande aposta, e Serviços Gerais.
Inspirados no método seguido nas USFs, escolha dos
recursos a afectar às UAGs foi feita por convite. O direc-
tor do ACES começou por convidar o responsável e este,
em articulação com o director, convidaram os restantes
profissionais. É uma metodologia que aconselho, por
razões de coesão e fortalecimento do espírito de equipa,
mas com o devido cuidado de convidar os melhores.
Simultaneamente, estamos a criar uma cultura demissão6 cuidados de saúdeprimários
trabalho em equipa, de polivalência e de flexibilidade
para, em cada momento, garantir respostas efectivas e
rápidas aos problemas vindos, principalmente, de quem
tem a missão de prestar cuidados de saúde.
É por isso que defendo uma gestão de proximidade ao
serviço de cuidados de saúde de proximidade».
Inverter a pirâmide «O que estamos a fazer é inverter a pirâmide, porque o
mais importante é a base, é onde se prestam cuidados de
saúde».
Esta afirmação de Rui Monteiro não deixa de ser sur-
preendente vinda de um dirigente da administração
pública.
«Se considerarmos o modelo clássico da estrutura pira-
midal, que ainda está presente nos serviços públicos,
então o que eu defendo é o modelo da pirâmide inver-
tida, em que a importância passa para a base e tudo o
resto, a começar no vértice, são fornecedores dos clien-
tes internos que estão nessa base. É com base neste
modelo que costumo dizer que os ACES são os herdeiros
naturais das sub-regiões, com excepções como já foi dito,
designadamente na cultura de comando-controlo.
Há quem nos “acuse” de estarmos a defender mini sub-
-regiões, o que não é verdade pelas razões já expostas.
Mas se formos por este caminho fácil de dizer uns
chavões sem substância, então eu respondo que é prefe-
rível uma mini sub-região depurada do que construir
um “monstro” chamado mega região».
Interrogado sobre se ainda há alguns burocratas que
querem centralizar, admite que assim possa ser: «É
assim é que se realizam profissionalmente porque esse
foi o modelo em que sempre funcionaram. Muita gente
sob as suas ordens, muitos papéis, muitas pessoas a
telefonar a pedir ajuda e… a reclamar. Mas quando se
avaliam os serviços que prestam aos que estão distantes,
na tal base onde se encontram as unidades que prestam
cuidados de saúde, os resultados são os conhecidos».
Criar os alicerces para uma gestãomais eficienteRui Monteiro recorda um artigo do Professor Vital
Moreira que diz que defender o SNS passa por comba-
ter o desperdício. Este combate é outro dos grandes
desafios da reforma dos cuidados de saúde primários.
Não se trata de poupar, mas de evitar o gasto desne-
cessário.
Diz ser sua convicção que o modelo de descentralização
que estão a desenvolver é o mais ajustado em custo/
/efectividade e o que melhor responde a novas exigên-
cias. Defende uma avaliação externa e a comparação
com outros modelos que estão a ser desenvolvidos.
Mas há muitas “frentes de combate”, sendo a mais
importante da responsabilidade conselho clínico e da
abertura dos colegas para reverem algumas práticas.
Nesta matéria, como em outras vai ser muito importante
o benchmarking gerado pelas USFs
Os ACES são grandes empresase geri-los bem é um desafioDe acordo com um estudo do Gabinete de Análise
Económica da UNL (GANEC), cerca de 60% dos ACES
correspondem, no panorama português, a grandes
empresas.
missãocuidados de saúde 7primários
“NÃO CONHEÇO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICAUMA REFORMA TÃO PROFUNDA E COM TÃO
GRANDE ALCANCE. UM DIA IRÁ CONTAMINARPOSITIVAMENTE OUTROS SERVIÇOS PÚBLICOS”
missão8 cuidados de saúdeprimários
Em Setúbal cada um dos 4 ACES terá um efectivo que
varia entre 469 a 523 profissionais e um orçamento
global de várias dezenas de milhões de euros.
Perante esta dimensão e do que se espera desta reforma,
a escolha dos directores executivos, dos directores clíni-
cos, dos responsáveis pela Unidade de Apoio à Gestão e
de todos os coordenadores das unidades funcionais (não
USFs) foi um trabalho difícil, por vezes penoso, e ainda
há ajustamentos a fazer.
Rui Monteiro espera que o programa de formação,
pensado pela Missão e INA para os principais respon-
sáveis, traga uma mais valia na difícil tarefa de gerir bem
os ACES.
Diz, também, que num futuro próximo deverá ser
pensada uma forma de compensar os responsáveis pelas
UAGs, dadas as suas responsabilidades na gestão dos
ACES, tendo como referência o que está previsto para o
director clínico e os coordenadores das USFs modelo B.
A Reforma não tem retrocesso Interrogado sobre se teme um recuo nas profundas alte-
rações já concretizadas nos Agrupamentos de Centros
de Saúde da península de Setúbal, Rui Monteiro diz que
isso só seria possível se alguém provasse que o que foi
feito é um verdadeiro disparate: «Não temos o modelo
perfeito, podemos e devemos melhorá-lo e não o quere-
mos impôr a ninguém. Apenas queremos consolidá-lo,
avaliá-lo e apresentá-lo como uma via possível.
Perante mudanças nunca experimentadas, é sabido que
a criação de novas estruturas deve ocorrer numa estra-
tégia de gradualismo e de testes-piloto. É isso que esta-
mos a fazer e é este o nosso contributo.
Esta reforma não tem retorno e tem de ser levada até ao
fim. É evidente que o grande impacte junto da popu-
lação está na prestação directa de cuidados: a acessibili-
dade, a qualidade, o atendimento, etc. Mas a nível
gestionário e administrativo também já tomámos deci-
sões muito úteis para os utentes, acabando com a buro-
cracia de assinaturas desnecessárias nos pedidos de
TAC, fisioterapia, termas, etc. O colega pede e o doente
já não precisa de voltar para levantar a credencial que
ficou apenas para ter mais uma assinatura. É tudo isto
que faz a diferença nesta mudança.
Contaram-me que uma utente de uma USF perguntava:
Isto já não é a Caixa pois não?».
Esbater diferenças entre USF e UCSPTendencialmente as diferenças entre USF e UCSP têm
de se esbater até um limite aceitável . Mas como enca-
ra Rui Monteiro a coexistência de Unidades de Saúde
Familiares e as Unidades de Cuidados de Saúde Perso-
nalizados?
«A minha posição de princípio é a de respeitar e aceitar
a vontade de todos os profissionais que não queiram
aderir a USFs. É nossa obrigação tudo fazer para que
todos tenham o que consideram indispensável e para
que diferenças de funcionamento entre USFs e não
USFs não possam ser imputadas à administração.
A única medida que por vezes temos de tomar que não
agrada aos profissionais é a sua mobilidade, dentro do
seu CS. Isto acontece quando há uma USF que se orga-
nizou num determinado local e isso implica a saída de
profissionais desse local por não terem sido convidados
para integrar a USF. Para isto não há alternativa.
Na perspectiva da administração, as diferenças entre
USF e não USFs têm de se esbater, com o tempo, até um
limite aceitável. Compreende-se que haja diferenças,
mas até um certo limite. Utentes de primeira e de segun-
da é uma ideia que tem de ser combatida e que não se
deve confundir com utentes assistidos por colegas com
melhores ou piores desempenhos. Esta realidade existi-
rá sempre.
Temos 15 USFs, das quais 9 já estão em modelo B e a
nossa política é tudo fazer para que não lhes falte nada
e para que se organizem quantas mais melhor».
A reforma vai “contaminar”positivamente Rui Monteiro está convicto de se estarem a construir
novos serviços (ACES) com novas estruturas (USF e
outras unidades funcionais) que ajudarão a manter o
SNS e a dar mais garantias de trabalho.
«Se tivermos como referência a inovação introduzida
pelas USFs, não conheço na Administração Pública uma
reforma tão profunda e com tão grande alcance, que um
dia irá contaminar positivamente outros serviços
públicos.
A circunstância de termos duas reformas em curso,
PRACE e Reforma dos Cuidados de Saúde Primários é
uma mais-valia que deve ser aproveitada». E remata com
convicção: «Apesar de se terem cometido “erros de pal-
matória”, continuo confiante, mas ainda não digo que
sejam “favas contadas”». q
Em entevista, um dos responsáveis pelo
estudo de avaliação do impacte económico
do novo sistema de organização
dos Cuidados de Saúde Primários,
o economista PAULO GOMES, enuncia
os problemas encontrados e a forma
de os resolver. Gestão profissional, autonomia,
trabalho em equipa, cultura de exigência,
satisfação e motivação profissional
são algumas das soluções apontadas
e que estão na base dos princípios
de criação dos agrupamentos
de centros de saúde (ACES).
UMA MUDANÇACULTURALEM CURSO
Reforma dos cuidadosde saúde primários
missãocuidados de saúde 9primários
ENTREVISTA DE GRAZIELA AFONSOFOTOS DE MARIA JOSÉ PINTO
missão10cuidados de saúdeprimários
MMCCSSPP –– AA eessttrraattééggiiaa ddee rreeoorrggaanniizzaaççããoo ddooss ccuuiiddaaddooss ddee
ssaaúúddee pprriimmáárriiooss ((CCSSPP)) ttoorrnnoouu nneecceessssáárriioo iiddeennttiiffiiccaarr ooss
pprroobblleemmaass eexxiisstteenntteess qquueerr aa nníívveell ffuunncciioonnaall qquueerr eeccoonnóó--
mmiiccoo.. QQuuaaiiss ffoorraamm ooss pprriinncciippaaiiss pprroobblleemmaass eennccoonnttrraaddooss??
PAULO GOMES – Detectámos falta de enfoque no utente
e uma gestão afastada dos problemas do terreno, que tem
conduzido a uma organização focada essencialmente nos
seus problemas internos. De algum modo esta situação tem
vindo a ser ultrapassada com a criação das unidades de
saúde familiar (USF). Mas detectámos também falta de
enfoque no cliente interno, nomeadamente na prestação
dos serviços de suporte técnico às operações assistenciais.
Esta é uma falha que terá de ser resolvida através de uma
mudança sistémica da organização.
Deparámos também com muito desperdício de talento
humano. Encontrámos no sistema nacional de saúde (SNS)
profissionais muito qualificados e capazes, movidos pelo
seu brio profissional e por uma vontade de melhorar a
sua prestação, que desenvolveram iniciativas de grande
mérito. Por exemplo, uma USF do Norte criou uma ferra-
menta de monitorização do desempenho, a CliniMed, que
permite avaliar o desempenho e consequentemente
definir as necessidades de formação. Porém, estas inicia-
tivas e estes focos de talento não são depois aproveitados
e replicados no SNS, por falta de recursos e organização
para o fazer.
Outra área fortemente deficitária é a dos sistemas de infor-
mação. Apesar das melhorias que vêm sendo introduzi-
das e do maior acesso a sistemas que suportam a prestação
de serviços assistenciais e disponibilizam mais informação
sobre o utente, ainda estamos a um nível muito deficitá-
rio para os dias que correm. Os sistemas actuais não estão
orientados para a gestão do conhecimento, para servir
de suporte à acção e condução de iniciativas no terreno.
A título de exemplo, para o acompanhamento de forma
efectiva de grupos de risco, como diabéticos ou hiper-
tensos, é preciso conhecer o historial de interacção com
esta população e isto não está feito. Não existe este suporte
ao conhecimento em nenhum sistema de informação.
QQuueerr ddiizzeerr qquuee ffaallttaa pprrooaaccttiivviiddaaddee nnoo ssiisstteemmaa nnaacciioonnaall
ddee ssaaúúddee??
Falta e não é só nesses aspectos. Outras áreas que consi-
dero deficitárias a nível de prestação são as áreas da saúde
pública e das especialidades. O sistema de saúde pública
não é proactivo, está montado para reagir a grandes crises
e resolver situações de rotina. Na área das especialidades,
as soluções são de natureza ad-hoc, têm a ver com a exis-
tência de recursos pontuais, sem que haja um plano
efectivo de disponibilização de oferta face à procura pre-
vista. Por exemplo, a oferta é deficitária ao nível de espe-
cialidades como a higiene oral e a psicologia.
EE nnoo qquuee rreessppeeiittaa aa qquueessttõõeess ddee nníívveell eeccoonnóómmiiccoo,, qquuee pprroo--
bblleemmaass ffoorraamm eennccoonnttrraaddooss??
Entre os problemas económicos, saliento, por um lado,
uma deficiente gestão de stocks e, por outro, o excesso de
pessoal administrativo, que acrescenta pouco valor às
organizações. Com efeito, verifica-se que na área dos cui-
dados de saúde primários (CSP) o rácio relativo ao pessoal
é desajustado. Os custos com pessoal administrativo e
dirigente têm muito peso na estrutura face ao que deve-
riam ter numa estrutura eficiente.
Princípios e objectivos dos ACESQQuuaaiiss ooss pprriinncciippaaiiss ppiillaarreess ddeessttaa rreeffoorrmmaa ddooss CCSSPP ee,, eemm
ppaarrttiiccuullaarr,, qquuaaiiss ooss pprriinnccííppiiooss ssuubbjjaacceenntteess àà ccrriiaaççããoo ddooss
AACCEESS??
O verdadeiro pilar da reforma são as USF, com um novo
modelo de gestão baseado na constituição de equipas
multidisciplinares, capacitadas para resolver muitos dos
problemas de estrutura que referi e cuja responsabilização
está centrada no utente. Os agrupamentos de centros de
saúde foram desenhados em torno deste modelo de pres-
tação, de certa forma para replicar o funcionamento das
USF noutras áreas. Nomeadamente na componente assis-
tencial surge uma série de unidades funcionais que através
de equipas multidisciplinares tentam replicar o trabalho
das USF nas áreas de saúde pública, cuidados na comu-
nidade e recursos assistenciais partilhados e especializa-
dos. Por exemplo, a Unidade de Recursos Assistenciais
Partilhados (URAP) é criada ao nível do ACES e não ao
nível do centro de saúde (CS), tendo em vista ganhos de
maior eficiência na utilização de um recurso que é escasso
e especializado. Um dos princípios fundamentais subja-
cente à criação dos ACES é a tentativa de ganhos de efi-
ciência e de escala.
A constituição dos ACES tem como principal objectivo
criar capacidade de gestão que falta aos CS. O director de
um centro de saúde não é um gestor profissional e o que
se pretende com o ACES é que exista uma gestão pro-
fissional. Pretende-se fomentar uma cultura de exigência
que na prática se traduzirá em criar desafios aos profis-
sionais. As direcções dos ACES têm de ser facilitadoras no
acesso a recursos e o acesso a estes obriga a planear a sua
utilização eficiente, a gerir a interdependência de tarefas
entre o ACES, a alavancar recursos do SNS e a pensar
investimentos e justificar a sua necessidade. Contratua-
lização significa traçar rumos e responsabilização.
Caberá às direcções dos ACES criar redes de valor, envol-
vendo a comunidade e procurando gerar sinergias na rela-
ção com hospitais de referência e outras entidades rele-
vantes. Trata-se de criar uma cultura de exigência e de
desafios aos profissionais, a que estes irão certamente res-
ponder, pois existem muitos com vontade de fazer mais e
melhor.
SSiiggnniiffiiccaa uummaa ggeessttããoo ppoorr oobbjjeeccttiivvooss ee uummaa nnoovvaa ffoorrmmaa ddee
ggeerriirr ssaaúúddee??
Sim, toda a prestação dos ACES vai ser orientada para
a obtenção de resultados, resultados esses traduzidos
em melhorias da qualidade. Acreditamos que se existir,
por exemplo, um maior acompanhamento da popula-
ção diabética, podemos obter melhores resultados em
termos de efectividade, nomeadamente diminuir proble-
mas de visão ou de amputações que se traduzirão em
ganhos de saúde efectivos. Quer isto dizer que a preven-
ção e vigilância é um princípio de orientação dos ACES.
Os desafios que vão ser colocados pelo gestor do ACES
passam por tentar balancear ganhos de eficiência com
ganhos de efectividade, por gerir recursos de forma racio-
nal e ter custos adequados aos objectivos, por tentar obter
ganhos em saúde para a comunidade, ou seja, pela reali-
zação de um trabalho de melhoria contínua da qualidade
do serviço.
OO qquuee ggaannhhaamm ooss pprrooffiissssiioonnaaiiss ccoomm eessttee nnoovvoo ttiippoo ddee
ggeessttããoo??
O bom funcionamento das USF não é devido ao sistema, é
apesar do sistema. Se a função dos ACES é, por um lado,
colocar mais exigência na gestão e, por outro, ser um
facilitador de acesso a recursos para uma actuação mais
efectiva das unidades funcionais, então, um dos primeiros
ganhos para os profissionais será ter uma gestão que está
mais preocupada em perceber que recursos são neces-
sários, de que modo os deve alocar dentro do ACES e
como justificar a ocupação desses recursos através de
planos de actividade e de investimento devidamente traça-
dos. Se falarmos em termos de incentivos, o que está pre-
visto nesta altura são os incentivos que as USF beneficiam
nos regimes de contratualização.
CCoommoo ffoorraamm ddeeffiinniiddooss ooss 7744 AACCEESS ccoomm vviissttaa aa eessssaa mmeellhhoorr
ggeessttããoo eeccoonnóómmiiccaa ee ddee rreeccuurrssooss??
Houve um conjunto de estudos que teve por objecti-
vo encontrar a situação eficiente: saber em que ponto se
ganha eficiência aumentando a população que está a ser
servida por um conjunto determinado de recursos. Esses
estudos, conduzidos pelo Dr. Miguel Gouveia, apontaram
para uma população de 50 mil utentes. Esta foi uma pri-
meira indicação de um patamar mínimo de população a
agregar para a constituição de um ACES. Nesse sentido, a
população coberta pelos 74 ACES constituídos varia, devi-
do a especificidades geográficas e demográficas, entre os
50 mil e os 150 mil utentes.
Outro indicador relevante que tivemos em conta,
relativo ao trabalho de investigação e de análise da inci-
dência de doenças ou outros problemas numa deter-
minada comunidade, demonstrou-nos que para obter
estudos eficientes e para conseguir caracterizar uma popu-
lação em termos dessa incidência, precisaríamos de ter
uma população analisada de 200 mil utentes. Assim sen-
do, ficou definida a escala mínima de eficiência nos 50 mil
utentes e a escala máxima nos 200 mil, pelo que a maio-
missãocuidados de saúde 11primários
ria dos ACES foi constituída entre estes dois parâmetros.
A par destes indicadores, outras questões de ordem polí-
tica, geográfica e sócio-económica justificaram a cons-
tituição dos agrupamentos. Como um dos objectivos desta
reforma é criar uma relação forte entre os ACES e as
comunidades envolventes, houve uma preocupação em
grupar CS que, apesar de se encontrarem em concelhos
diferentes, estavam geograficamente próximos.
Benefícios para os utentesDDoo ppoonnttoo ddee vviissttaa ddoo uutteennttee,, qquuee oouuvviirráá ffaallaarr ddee 7744 AACCEESS,,
aa rreeaaccççããoo nnaattuurraall nnããoo sseerráá ddee pprreeooccuuppaaççããoo??
É uma preocupação a que o Ministério da Saúde deverá
responder comunicando da melhor maneira esta reforma.
Mas há que realçar que, no modelo anterior, passar a
resolução de um problema do CS para o nível hierárquico
superior significava ir à sub-região e havia 18 sub-regiões.
Segundo o novo modelo, o utente continua a ter o CS com
o qual tem uma interacção regular e quando precisa de
escalar um problema poderá fazê-lo pelo ACES, ou seja,
74 ACES muito mais próximos do utente do que estavam
as sub-regiões. Além disso, esta reestruturação é de cariz
sobretudo interno, que não deverá ter impacte na forma
como o utente se relaciona com o CS. Não há propria-
mente uma opção de fechar CS, há é uma Direcção do
ACES com autonomia administrativa e uma capacidade de
actuação mais próxima do utente do que havia ante-
riormente.
QQuuee oouuttrrooss bbeenneeffíícciiooss ppooddeerrããoo sseerr sseennttiiddooss ppeellooss uutteenn--
tteess??
O sucesso desta reforma passa pelo aumento da acessibi-
lidade dos utentes aos serviços, pela melhoria da qualidade
assistencial, pela melhoria da prevenção e vigilância e, a
médio prazo, possivelmente pelo aumento do leque de
serviços que é prestado pelo CS. Por exemplo, com as
URAP conseguiu-se partilhar entre os diferentes centros
de saúde incluídos no ACES alguns recursos especia-
lizados, como higienistas orais e psicólogos. Ou seja, o
mesmo conjunto de profissionais poderá agora ser utili-
zado de forma mais eficiente e servir uma população mais
vasta a nível das especialidades.
Outro dos problemas detectados de que falámos no início
prende-se com a necessidade de aproveitar o conheci-
mento e o talento de alguns na tomada de iniciativas,
fazendo com que os ACES promovam a homogeneização
da prestação, elevando assim o nível da qualidade desta.
Hoje já existem vários CS a trabalhar com os refeitórios das
escolas na melhoria da alimentação e nutrição, uma prática
que se pretende transversal e generalizada a todos os
ACES.
PPoorr qquuee rraazzããoo eemm vveezz ddee ssee ccrriiaarreemm ooss AACCEESS nnããoo ssee
iinncceennttiivvoouu ooss cceennttrrooss ddee ssaaúúddee aa ttrraannssffoorrmmaarreemm--ssee nnaass
eessttrruuttuurraass jjáá eexxiisstteenntteess,, aass UUSSFF??
As USF são unidades organizacionais de pequena dimen-
são, constituídas por uma equipa de 22 profissionais,
enquanto que nos CS a equipa é significativamente maior.
Por seu lado, os ACES são entidades organizacionais com
uma dimensão muitas vezes equiparada a grandes empre-
sas nacionais, isto é, grupando mais de 10 mil funcionários.
As USF vão manter o seu grau de autonomia adminis-
trativa relativamente elevado, apenas prevendo-se que no
futuro passem a ser os ACES a fazer a contratualização
interna de serviços com as unidades funcionais, incluindo
as USF. Ou seja, a contratualização que as USF hoje fazem
deixa de ser feita com um gabinete da ARS e passa a ser
feita com o director executivo do ACES, mas a lógica do
seu modelo de funcionamento não é alterada. Há toda a
vantagem nesta nova forma de contratualizar, porque uma
das funções do director executivo do ACES é garantir a
integração das actividades das várias unidades funcionais.
Cabe-lhe ter uma visão de conjunto que lhe permitirá
negociar melhores condições para a comunidade do que
aquela que a ARS negoceia.
QQuuee bbooaass pprrááttiiccaass ssee ppooddeemm iinnttrroodduuzziirr ee ddeesseennvvoollvveerr nnooss
AACCEESS??
Como exemplo de boas práticas, algumas invisíveis para os
utentes mas com benefícios para os profissionais, podemos
salientar o facto dos serviços de suporte técnico (financeiro,
contabilístico, recursos humanos…) passarem a funcionar
numa lógica de prestação de serviços exterior ao ACES,
com o objectivo de garantir que os pedidos feitos chegam
nas quantidades requisitadas e no tempo devido. Por outro
lado, a inclusão da comunidade na estrutura organizativa
do ACES, através da criação do Conselho da Comunidade,
é uma prática também importante. Neste conselho está
representado, entre outros, o poder local abrangido pelo
ACES, a quem caberá ter uma palavra sobre o plano de
actividades e de investimentos a realizar pelo agrupa-
mento.
missão12cuidados de saúdeprimários
Ameaças a ter em contaQQuuaaiiss ssããoo,, ppoorr sseeuu llaaddoo,, aass pprriinncciippaaiiss aammeeaaççaass aa eessttaa
rreeffoorrmmaa??
A principal ameaça é política e advém das tensões que
habitualmente ocorrem devido à redistribuição de poder
na organização. A segunda ameaça tem a ver com os pro-
fissionais e a necessidade de os convencer que as mudanças
vão mesmo acontecer. Tivemos reformas no passado que
foram anunciadas e que depois nunca foram imple-
mentadas, o que criou cepticismo e resistência. Penso que
o trabalho que vem sendo realizado ao nível das USF é um
sinal de que a reforma está em curso e que o paradigma
pode mudar. No entanto, é preciso reforçar essa ideia
através de uma comunicação adequada e objectiva, através
do envolvimento dos diferentes stakeholders, bem como
de formação que conduza a uma mudança cultural na
forma de pensar e actuar.
HHaavveerráá ffoorrmmaass eessppeeccííffiiccaass ddee ddeemmoonnssttrraarr qquuee aa mmuuddaannççaa
ssee eessttáá aa eeffeeccttiivvaarr??
Estamos a desenhar um painel de indicadores que irá ser
disponibilizado para apoiar a gestão dos ACES, em relação
ao qual é importante que os profissionais o percepcionem
como válido e relevante para o contexto em que actuam,
caso contrário esses indicadores não constituirão um guia
para o seu desempenho. Para a construção deste painel de
indicadores foram identificadas quarto áreas-chave:
económica, técnica, clínica e da qualidade funcional. Esta
última tem a ver com a satisfação dos utentes e com a
qualidade do acesso aos serviços, englobando a eficiência
dos processos internos e a preocupação com a aprendi-
zagem, formação e satisfação dos profissionais. São quatro
áreas que contribuem para um objectivo último, o da
efectividade.
Este painel de indicadores tem de ser constituído por um
conjunto de indicadores homogéneo, por forma a permitir
o benchmarking entre ACES, tem de estar alinhado com os
objectivos de contratualização e permitir verificar se esta-
mos a evoluir no sentido da melhoria contínua.
OO qquuee ssee eessppeerraa ggaannhhaarr eemm tteerrmmooss ddee pprroodduuttiivviiddaaddee ee ddee
eeffiicciiêênncciiaa eeccoonnóómmiiccaa??
Foram estimados ganhos ao nível da concentração de back--office administrativo dos CS, do controlo de desvios asso-
ciados à prescrição de medicamentos e MCDTs, à redução
de desperdícios e optimização de processos resultante da
proximidade do controlo de gestão da actividade dos CS.
Para além disso, projectamos ganhos ao nível externo dos
CS, que resultam de uma actuação da gestão ao nível da
interface entre cuidados primários e cuidados hospitalares.
A estimativa de encargos com a nova estrutura de gestão e
o cenário de reestruturação dos serviços de suporte técnico
das SRS a extinguir leva-nos a uma redução da ordem dos
20,18 milhões de euros anuais.
CCoonnsseegguuiirr--ssee--áá ggaarraannttiirr qquuee ooss AACCEESS nnããoo ssee iirrããoo ttrraannss--
ffoorrmmaarr ddee nnoovvoo nnaass ssuubb--rreeggiiõõeess??
Existe esse risco e a forma de o impedir compreende o
esquema de contratualização. Cabe à ARS avaliar o desem-
penho do ACES e da sua Direcção Executiva, com base em
critérios de efectividade, qualidade e eficiência. Registan-
do-se uma má prestação do ACES face a este tipo de
objectivos, poderá ocorrer a substituição da equipa de
gestão. O sistema de contratualização prevê que em caso
de mau desempenho não exista bónus, todavia mais
importante do que isso é a necessidade de haver feedbackdo desempenho com vista a poder-se alterar e/ou melhorar
o desempenho no futuro.
Por seu lado, a formação específica dos directores execu-
tivos, possivelmente dos coordenadores da unidade de
apoio e gestão do ACES e do director clínico procurará pro-
mover a desejada mudança cultural nas organizações. q
missãocuidados de saúde 13primários
Na conversa que a Revista da MCSP manteve com
o Dr. Francisco Gouveia e a enfermeira Isabel
Espírito Santo que o apoia na gestão de seis Cen-
tros de Saúde de quatro concelhos diferentes –
todos agrupados em torno de um único director
– não foi difícil perceber que a perspectiva de inversão
da pirâmide os entusiasmou desde o início. Não havia
nenhum modelo feito para a reconfiguração dos Centros
de Saúde (CS). Tudo ia nascer de baixo para cima e isso
estimulava todos os que se dedicaram a reflectir, inovar,
experimentar e alterar as práticas até aí existentes.
FRANCISCO GOUVEIA: “Nós sabíamos para onde que-
ríamos caminhar mas não sabíamos ainda como. Enten-
díamos que os caminhos iriam ser encontrados através de
muita discussão interna e de muita reflexão. Nós não nos
víamos como chefes. O nosso papel era antes o de ouvir e
auscultar. E de estarmos disponíveis para testar as solu-
ções propostas depois de trabalhadas e amadurecidas.
Sabíamos por exemplo que para além das unidades clássi-
cas ia haver uma unidade de saúde pública, uma unidade
de cuidados na comunidade. Tentou-se logo perspectivar
como era a organização destas unidades, mas estas pers-
pectivas eram construídas pelos próprios intervenientes.
Com os médicos de saúde pública e os demais profissio-
nais de saúde pública, bem como com o resto do grupo de
enfermagem. As soluções a que iam chegando eram solu-
ções de compromisso, com carácter ainda experimental.
Algumas foram abandonadas, outras sofreram adaptações.
missão14cuidados de saúdeprimários
ACREDITAMOSQUE É POSSÍVELuma reforma de baixo para cima
Durante muitos anos, cerca de duas décadas,não existia nos Centros de Saúde qualquerautonomia dos profissionais.Para além de não existir nos Centros de Saúdeuma verdadeira cultura de avaliação,é reconhecido que não havia o hábito departilha. Muito menos havia lugar paraa rentabilização de recursos cuja necessidadejá ninguém discute. As grandes mudançasocorridas na Sub-região de Saúde de Setúbalprocuravam dar resposta a estas questõese cedo encontraram eco nalguns Centrosde Saúde que se mostraram disponíveis paratrabalhar a mudança. FRANCISCO GOUVEIAe ISABEL ESPÍRITO SANTO falam-nosde alguns aspectos da mudança ocorrida.E só podem dizer que tardou!Hoje sentem-se prontos para a fase seguinte:a criação dos ACES por portaria.
TEXTO DE FILIPA HOMEM CHRISTO
A Sub-região de Saúde reconheceu-nos maioridade para
o fazer e ao longo destes meses foi nos dando todas as
condições que nós iamos solicitando. O que foi feito ao
nosso nível não poderia ser ter sido feito ao nível de outras
Sub-regiões que não tivessem uma liderança ou um
espírito de missão do seu coordenador como nós tivemos.
Onde anteriormente havia directores de Centro de Saúde
que decidiam passou a haver equipas de trabalho. Deixou
de haver o poder discriminatório de uma só pessoa para
se investir numa cultura de partilha e discussão interna.
Fazendo agora a retrospectiva de dois anos não há dúvida
nenhuma de que contámos muito com os profissionais,
sobretudo aqueles que estão na linha da frente, na área da
prestação de cuidados, pois foi essa a área com que nos
preocupámos em primeiro lugar. É lógico que a retaguar-
da também foi trabalhada mas para nós sempre foi
entendida como um parente mais distante.
Queremos ir ainda mais longe e para isso temos de ter
mais autonomia, o que pressupõe muito maior responsa-
bilidade. Mas este acréscimo de responsabilidade não nos
apavora. O que nós queremos é ter o que nunca tivemos:
instrumentos de decisão. Acreditamos que podemos de
facto construir uma organização que proporcione satisfa-
ção quer aos clientes internos quer aos clientes externos.
E não precisamos de mais investimento. Vamos procurar
gerir com os mesmos recursos, mas de uma forma que
traga as pessoas mais satisfeitas. Acreditamos que isso
é possível. Se não acreditássemos nisto não estaríamos
envolvidos”.
ISABEL ESPÍRITO SANTO: “Começámos pacientemen-
te a explicar às pessoas para onde queriamos caminhar
e elas começaram a envolver-se na construção das solu-
ções. Desde o início que fomentámos o espírito de parti-
lha. Nós achávamos que o objectivo principal era ter mais
e melhores cuidados. Mas queriamos conseguir ao mesmo
tempo alguma racionalização. A reorganização dos cui-
dados continuados e dos cuidados domiciliários que nos
é tão cara foi um exemplo disso. Temos aqui dois con-
celhos, a Moita e o Barreiro, com zonas que estão muito
próximas. O que fizémos foi conseguir que sejam os mes-
mos enfermeiros a prestar os cuidados domiciliários nas
zonas vizinhas dos dois concelhos. Não fazia por exem-
plo nenhum sentido vir um profissional de enfermagem
da Moita até quase ao Lavradio para prestar cuidados
domiciliários que podiam ser realizados aqui. Isto per-
mite-nos rentabilizar pessoas e recursos como por exem-
plo transportes que são sempre um problema. E conse-
guimos também, juntando o grupo e ajustando as activi-
dades, que as pessoas que trabalham nesta área sejam as
pessoas que querem realmente estar nesta área, o que
representa uma mais-valia em termos de comunidade.
Os cuidados de proximidade prestados por pessoas que
gostam de os fazer são quase sempre de melhor qua-
lidade”.
missãocuidados de saúde 15primários
“QUEREMOS IR AINDA MAIS LONGEE PARA ISSO TEMOS DE TER MAISAUTONOMIA, O QUE PRESSUPÕE
MUITO MAIOR RESPONSABILIDADE.MAS ESTE ACRÉSCIMO DE
RESPONSABILIDADE NÃO NOSAPAVORA. O QUE NÓS QUEREMOS
É TER O QUE NUNCA TIVEMOS:INSTRUMENTOS DE DECISÃO.”
Enfoque na governaçãoclínicaPara Francisco Gouveia um dos benefícios da reforma em
curso é o enfoque na governação clínica, ou seja, na
preocupação com a qualidade dos actos e não apenas com
tarefas de carácter transversal. Um dos pilares que inte-
gram a governação clínica é a acessibilidade a cuidados de
qualidade. A reorganização da consulta de recurso permi-
tiu prestar cuidados mais eficientes centrados nas neces-
sidades dos utentes, tornando-os mais acessíveis.
FRANCISCO GOUVEIA: “Durante muito tempo estes
Centros de Saúde tiveram uma politica de abertura à
consulta imediata, à consulta de SAP. O que vigorava era
a política de porta aberta onde o doente chega, se serve e
vai embora. Isto consumia enormes recursos que faziam
falta para outras áreas. Com a escassez de recursos médi-
cos e a existência de um elevado número de utentes sem
médico de família fizémos todo um trabalho de explicar
aos profissionais de saúde que era necessário reconfigurar
os horários de atendimento complementar, tendo este
sido reduzido de 12 para 7 horas por dia em todas as
unidades. As pessoas compreenderam esta necessidade.
As horas assim poupadas foram destinadas ao aten-
dimento dos utentes sem médico de família que passaram
a ser vigiados e acompanhados de forma diferente. Come-
çou mesmo a ser possível programar consultas para uten-
tes que não têm médico de família, que aqui representam
cerca de 25%, com evidentes ganhos para a sua saúde.”
Também Isabel Espírito Santo refere as grandes dispa-
ridades existentes nos mapas de enfermeiros dos diferen-
tes centros de saúde. “Para o mesmo número de utentes
havia Centros de Saúde que tinham muito mais enfermei-
ros do que outros ao lado. Reunimos as pessoas, falámos
com elas e confrontados com esta realidade os profis-
sionais aceitaram a deslocação entre Centros de Saúde.
A pessoa continua a pertencer ao quadro de um Centro
de Saúde mas está a desempenhar funções noutro Centro
de Saúde. Foi negociado esse acordo com todos os inter-
venientes e até agora não houve nenhum problema. Este
é realmente o melhor espírito da reforma”.
Medir para Avaliar A avaliação é uma das áreas mais importantes da reforma
em curso. O investimento nos sistemas informáticos leva-
do a cabo pela Sub-região de Saúde de Setúbal tem sido
vital, mas ainda há um longo caminho a percorrer. A
intranet já chega a cerca de 90% dos profissionais deste
agrupamento, e todos eles têm o seu próprio computador.
Faltam-lhes os sistemas que possibilitem ter informação
fiável e atempada.
FRANCISCO GOUVEIA:“Infelizmente, nos últimos anos,
temos estado reféns de sistemas de informação que não são
capazes de fornecer toda a informação necessária e atem-
padamente. E pouco evoluímos. Até para as USFs que têm
contratualizados uma série de objectivos é notório que os
actuais sistemas de informação não são os mais adequados.
Claramente, tem de haver um investimento muito grande
a este nível. É lógico que no futuro a melhoria que pode
vir a ser perspectivada tem a ver com uma verdadeira
cultura de avaliação e de monitorização. Para isso tem de
haver sistemas fiáveis de colheita de toda a informação, o
que neste momento ainda não há. Esta é a grande defi-
ciência que ainda encontramos, a dos sistemas de infor-
mação. Há unidades em ACEs que vão trabalhar com o
SAM outras com Medicine One outras com o Vita Care.
Os numeradores para determinados indicadores não são
iguais nestes três programas e a intercomparação não é
possível. Estes sistemas têm de estar uniformizados em
relação àquilo que permita a obtenção de dados que sãomissão16cuidados de saúdeprimários
“FOI NEGOCIADO ESSEACORDO COM TODOSOS INTERVENIENTESE ATÉ AGORA NÃOHOUVE NENHUMPROBLEMA.ESTE É REALMENTEO MELHOR ESPÍRITODA REFORMA”
cruciais para a monitorização de cuidados. Eu espero que
até ao fim do ano tenhamos o módulo estatístico do SAM
a funcionar e passemos a ter toda a informação que o SAM
pode dar, o que nos vai permitir o acompanhamento dos
hipertensos, dos diabéticos, do número de colpocitologias
feitas, das mamografias, e não apenas dados de produção.
É verdade que esta avaliação também só é importante no
dia em que nós formos capazes não só de fazer a avaliação
como também de produzir uma informação de retorno
capaz. Até hoje houve uma série de profissionais que
utilizaram o SAM como uma máquina de escrever para
passar receitas e exames auxiliares, porque o SAM não
lhes dava mais nada. No dia em que aquilo que as pessoas
registarem puder ser utilizado para dizer quantas hemo-
globinas glicosiladas solicitou, quantas vezes os valores da
tensão arterial estavam acima do normal, e no dia em que
os médicos forem confrontados com estes dados a avalia-
ção dos cuidados começa a mudar.
Mas a rede de sistemas informáticos não serve apenas
para se obterem dados e indicadores fiáveis. É também o
melhor veículo de informação e formação. Quando os
profissionais ligam o seu computador, este arranca com a
intranet. Tudo o que sejam avisos e circulares internas
desta mesma estrutura, da DGS ou da ARS são digita-
lizadas e colocadas na intranet a que todos acedem. Toda
a legislação necessária às diferentes actividades se encon-
tra compilada e pode ser consultada e a um clique de um
rato. A formação realizada no Centro de Saúde fica de
imediato disponível na intranet. Todos a podem consultar
sem restrições pois a partilha de informação e formação é
aqui considerada uma mais-valia.
Procedimentos apoiama prestação de cuidadosEstá a ser criado um Manual de Procedimentos para os
agrupamentos cuja existência foi identificada como sendo
fundamental. Quando estiver terminado, o Manual de
Procedimentos vai ser carregado na intranet e passará a
estar acessível para todos os utilizadores que dele neces-
sitem. Os procedimentos do back-office estão a ser recon-
figurados com a ajuda da pessoa que irá ficar à frente da
Unidade de Apoio à Gestão (UAG). Anteriormente havia
procedimentos que eram realizados na Sub-região de
Saúde e outros que o eram no Centro de Saúde. Agora
tudo passará a ser feito no Centro de Saúde. Repetições,
redundâncias e práticas desajustadas foram revistas e
alteradas ou eliminadas.
Está também a ser feita uma compilação exaustiva das
orientações técnicas. Os profissionais não se limitam a
seguir as orientações vindas por exemplo da DGS. Existe
espaço para o investimento em boas práticas clínicas com
a orientação da futura direcção técnica. Quer no âmbito
da prescrição de exames auxiliares de diagnóstico, quer
da prescrição medicamentosa, quer de actos de enferma-
gem e outros.
Uma experiência de sucesso Depois de tanto tempo a trabalhar neste processo de
mudança, Francisco Gouveia só lamenta que este trabalho
conjunto com a Sub-região de Saúde de Setúbal não
tivesse avançado mais rapidamente e que não tivessem
sido tomadas as disposições necessárias para que tivesse
sido possível avaliá-lo e validá-lo ou não como uma
experiência de sucesso.
“Foi muito trabalhoso, envolveu imensa gente, imensas
horas destes profissionais, muita dedicação e o estar dispo-
nível para continuar mesmo quando as sucessivas demo-
ras faziam surgir algumas dúvidas no espírito de alguns.
Tenho muita pena que não tenha servido para ser piloto,
testado, avaliado e aplicado. Se tal tivesse acontecido, hoje
estariamos em condições de apresentar um modelo mais
consistente para todos os que vão agora começar”. q
missãocuidados de saúde 17primários
1 BARREIRO 2 QUINTA DA LOMBA3 MOITA 4 BAIXA DA BANHEIRA5 MONTIJO 6 ALCOCHETE
Seis Centros de Saúde quatro concelhos,
um director
Ao recuarmos na história recente das sociedades e
na sua evolução em termos de Saúde facilmente
identificamos o significativo contributo que a
intervenção biomédica personalizada teve nos
ganhos em saúde dos indivíduos, em particular os
ganhos na luta conta as doenças infecciosas, ganhos esses
que rapidamente começaram a estabilizar levando-nos
a pensar que este tipo de intervenção não seria a for-
ma mais adequada para melhorar a saúde das popula-
ções como um todo. Curava-se uma doença mas a curto
prazo ela ressurgia no mesmo indivíduo e na mesma
comunidade. Podemos hoje dizer que se tratava uma
pessoa mas os factores causadores da doença permane-
ciam na comunidade.
Foi a evolução do conhecimento da história natural das
doenças que rapidamente nos colocou os desafios para
uma intervenção mais ampla. Que muito para além da
própria Biologia Humana abranja também uma inter-
venção a nível do Ambiente, adequando as influências
externas ao organismo do Homem, e a nível dos Esti-
los de Vida, promovendo a capacitação individual na
tomada de decisões que influenciam a sua saúde. A uni-
-causalidade da doença foi substituída pela complexa
multi-causalidade. O facilmente conhecido foi substi-
tuído pelo complexo desconhecido, em constante desco-
brimento.
Quando na década de 70 do século passado se instituiu
em Portugal o Serviço Nacional de Saúde, foram os
conhecimentos anteriormente referidos que nortearam
missão18cuidados de saúdeprimários
Dos SSP dos CSAUSPDOSACES
Quando falamos de Saúde Pública de imediato nos vem ao pensamento a redede serviços que tem como denominadorcomum e como alvo de intervençãoa totalidade da população abrangida e nãoapenas o indivíduo, ser isolado que recorrea um médico ou a outro profissional de saúdena procura de uma orientação personalizadaque responda a uma necessidade sentida,que está a perturbar a sua saúde ou o seubem-estar individual e que ele sabe maisou menos expressar. Falamos de saúde públicaem oposição à saúde personalizada.Quando falamos de Saúde Pública de imediatonos surge no pensamento a noçãode desenvolvimento da sociedade, poissabemos que este está intimamente ligadoà saúde da população. Não só por esta seruma consequência do próprio desenvolvimentocomo igualmente o seu garante.
TEXTO DE JOSÉ MARQUES NEVES (MCSP)Chefe de Serviços de Saúde Pública
a dinâmica da criação dos centros de saúde nas sedes de
todos os concelhos do país. Estes, ao ser implementada
uma verdadeira administração da saúde, começaram
por intervir aliando sinergicamente actividades perso-
nalizadas (no âmbito do adulto, da mulher grávida, da
puérpebra, da criança) com actividades de âmbito
comunitário (saúde infantil, saúde materna, planea-
mento familiar, saúde ocupacional, vacinação, saúde
ambiental) dirigidas essencialmente a factores de risco
ambientais e comportamentais como os estilos de vida
de uma comunidade influenciadores das elevadas taxas
de morbilidade, letalidade e mortalidade que caracte-
rizavam Portugal.
Coube aos serviços de saúde pública dos centros de
saúde assumir a responsabilidade por esta intervenção
comunitária. Partindo do conhecimento que tinham do
estado de saúde da sua população, identificaram os pro-
blemas de saúde presentes e os seus factores deter-
minantes e implementaram os necessários programas de
intervenção. Foi uma intervenção dirigida aos abun-
dantes factores de risco presentes, facilmente iden-
tificáveis com base nos conhecimentos adquiridos atra-
vés de uma investigação e vigilância epidemiológica
em franco desenvolvimento. Foi uma intervenção que
aliou, para além do incremento na prestação de cuida-
dos de saúde personalizados numa perspectiva de vigi-
lância em saúde, o desenvolvimento de uma literacia em
saúde na comunidade, em que há a destacar a aquisição
de conhecimentos e a mudança de comportamentos ine-
rentes à promoção da saúde e à prevenção da doença.
Não esquecendo o desenvolvimento de um melhor
ambiente socio-económico, este dinamizado pela pró-
pria sociedade.
Foi a necessidade de incrementar esta intervenção per-
sonalizada e igualmente para satisfazer as necessidades
de um atendimento curativo mais alargado que justi-
ficou tecnicamente o surgimento do serviço médico à
periferia nos meados dos anos 70.
Concomitantemente a este desenvolvimento assistencial
em saúde, consequência de uma verdadeira admi-
nistração da saúde baseada no conhecimento da rea-
lidade, houve necessidade de se desenvolver uma inter-
venção na área da autoridade sanitária. Visou esta inter-
venção o cumprimento de regras e procedimentos sani-
tários que contribuíssem para a diminuição do impacto
dos factores de risco ambientais e comportamentais na
Saúde. O poder de autoridade indispensável às mudan-
ças imperiosas que era necessário introduzir no senti-
do da promoção da saúde na comunidade. Explicitado
através do assumir do dever legal de cumprir.
Estávamos com os serviços de saúde pública sedeados
nas sedes dos concelhos e dirigidos pelo delegado de
saúde, médico de saúde pública que cumulativamente
detinha o poder de autoridade sanitária. Os problemas
de saúde eram tão significativos em termos de quanti-
dade que a proximidade para o seu conhecimento e
para a respectiva intervenção era fundamental.
Vivíamos uma época em que o baixo nível de desen-
volvimento social existente permitia que os mais elemen-
tares factores de risco para a saúde condicionassem as
elevadas taxas de morbilidade e de mortalidade que
caracterizavam o nosso país.
missãocuidados de saúde 19primários
Estávamos perante uma sociedade onde as clássicas
doenças infecto-contagiosas tinham como elementares
factores de risco: o consumo de água sem o necessário
padrão de qualidade; a ingestão de alimentos sem a
necessária qualidade dos circuitos de produção, trans-
porte, armazenagem e consumo; as habitações que não
dispunham dos necessários requisitos de habitabilidade;
estabelecimentos alimentares que não dispunham dos
requisitos mínimos indispensáveis à disponibilização de
alimentos de qualidade ao público; estabelecimentos
insalubres, incómodos e perigosos que eram abundan-
tes, etc. Todos estes factores foram intervencionados
pelos serviços de saúde pública em articulação com as
autarquias e demais parceiros sociais com respon-
sabilidade nas diferentes áreas do desenvolvimento
sócio-económico.
Vivíamos em comunidades onde os comportamentos e
as atitudes dos seus elementos eram transmitidos de
geração em geração sem a necessária adequação à evo-
lução do conhecimento científico. Verdades compor-
tamentais herdadas do passado tiveram que ser modi-
ficadas tendo em vista a promoção da qualidade de vida
necessária e tecnicamente aspirada por todos nós.
Falamos aqui das intervenções em saúde escolar, em
saúde oral, em planeamento familiar, em saúde mater-
na, em educação sanitária e educação para a saúde, etc.
Só uma intervenção em grupo modificando tabus sociais
ancestrais conseguiu levar à procura de cuidados básicos
individuais nos centros de saúde e assim contribuir para
a promoção da saúde e para a prevenção da doença na
nossa população.
Tínhamos doenças infecto-contagiosas, já então evitáveis
pela vacinação, a contribuir para a elevada taxa de
mortalidade e morbilidade infantil e materna que nos
caracterizava. Foi o esforço dos serviços de saúde públi-
ca, com campanhas de vacinação em massa da popula-
ção seguidas pela manutenção atenta da imunidade
individual por parte dos serviços com atendimento
personalizado, que fez com que hoje praticamente nin-
guém veja um caso de poliomielite ou de varíola, sendo
insignificante a incidência das outras doenças para as
quais existe uma vacina eficaz.
Partilhávamos uma sociedade onde, para além dos
recursos especializados de médicos e enfermeiros serem
escassos para as necessidades que fomentávamos,
também a nível dos outros parceiros da comunidade
com responsabilidades na área do bem-estar e da saúde
a carência de técnicos era sentida. À autoridade sanitá-
ria, como consequência do seu conhecimento acrescido
em termos dos factores de risco ambientais identificados
na vigilância epidemiológica então iniciada, foram-
-lhe sucessivamente atribuídas significativas responsa-
bilidades de intervenção pericial na área da higiene
ambiental e em licenciamentos comerciais e industriais.
Igualmente lhe foram atribuídas responsabilidades em
actos médicos personalizados (boletins de sanidade, car-
tas de condução, verificação de ausências laborais, etc.).
Em 30 anos de centros de saúde a sociedade evoluiu. A
qualidade e quantidade dos prestadores de cuidados
médicos e de saúde aumentaram. Os saberes diferen-
ciaram-se em especialidades. Apareceram e foram dina-
mizadas novas ciências de intervenção social. Apare-
ceram, diferenciaram-se e autonomizaram-se novas
ciências técnicas de intervenção ambiental. A sociedade
modificou-se. A rotura com o passado, provocada por
uma mudança por nós induzida, é hoje uma rotina e
uma necessidade social acrescida. Os factores de risco
para a saúde são cada vez mais difíceis de valorizar ao
que se alia a dificuldade de uma intervenção muito
especializada e multisectorial. Os padrões de mortali-
dade e de morbilidade alteraram-se, em particular
devido à substituição das “clássicas” doenças infecto-con-
tagiosa pelas designadas como “novas” e pelo aumento
das doenças crónico-degenerativas e das civilizações. A
facilidade de movimentação de pessoas e populações
transforma uma realidade local numa realidade global
onde deixou de haver fronteiras.
Os serviços de saúde pública que sempre tiveram como
finalidade única a redução da quantidade de doença, da
morte prematura, do desconforto e da incapacidade ele-
vando o nível de saúde das populações devem adaptar-
se a este novo estádio de desenvolvimento da sociedade.
Mas devem estar cientes que a sua prática e as suas
decisões se devem continuar a basear numa identifica-
ção de necessidades de saúde, numa monitorização do
estado de saúde da população e dos seus determinan-
tes, numa avaliação do impacto das várias intervenções,
numa investigação e vigilância epidemiológica, bem
como numa gestão e execução de programas e projectos
de intervenção de promoção e protecção da saúde da
população onde a rentabilização dos recursos disponibi-
lizados é premissa estratégica.missão20cuidados de saúdeprimários
Para atingir os seus objectivos, os serviços de saúde
pública têm de deixar a polivalência que os caracterizou
no passado e, através da utilização dos novos saberes e
das novas ciências instaladas na sociedade, respon-
sabilizar-se pela identificação dos actuais problemas de
saúde presentes na sua área geodemográfica por forma
a constituir-se como um recurso técnico fundamental na
dinâmica das novas estruturas do serviço nacional de
saúde e um recurso social na dinâmica comunitária.
Os serviços de saúde pública devem deixar de ser
responsabilizados por tarefas e actividades personali-
zadas que em nada contribuem para a finalidade que
justifica a sua existência e cuja eficácia em termos de
saúde é questionável. Devem assumir que o poder de
autoridade de saúde (já não de autoridade sanitária)
deve constituir-se como instrumento excepcionalmen-
te facilitador de intervenção. A sociedade deve desen-
volver-se com o respeito pelos conhecimentos científicos
que promovem a saúde e a prevenção da doença e não
esperar que os mesmos sejam assumidos apenas perante
o poder de intervenção de uma autoridade.
Os serviços de saúde pública devem privilegiar a dife-
renciação dos saberes e das metodologias que funda-
mentam o conhecimento científico dos problemas de
saúde, necessidade esta que não se viabiliza com micro-
-estruturas de recursos humanos e técnicos polivalentes.
Por outro lado os problemas de saúde deixaram de estar
confinados às fronteiras de um concelho e cada vez mais
são supra concelhios, assim como a própria população
residente deixou de viver num único concelho para no
mesmo dia viver em 2 ou 3 concelhos. Por outro lado,
em consequência da modificação do nosso padrão de
saúde, a sua multifactoralidade justifica a necessidade de
serem estudados em populações maiores para poderem
ser interpretados e poderem ter significado epidemio-
lógico.
Tal como no passado, os profissionais dos serviços de
saúde pública dos centros de saúde, agora integrados
sinergicamente nas unidades de saúde pública dos agru-
pamentos de centros de saúde, irão continuar a promo-
ção da saúde e a prevenção da doença, domínios de
excelência da saúde pública, continuando a contribuir
para os notáveis ganhos em saúde havidos.
Aos clássicos profissionais dos serviços de saúde pública
dos centros de saúde – médicos de saúde pública, enfer-
meiros de saúde pública ou de saúde comunitária, técni-
cos de saúde ambiental e administrativos devemos agora
acrescentar técnicos de outras ciências para num espírito
de equipa multiprofissional aceitarmos os novos desafios
e contribuirmos para uma melhor saúde da população
que reside ou visita Portugal.
No entanto é primordial que a sociedade assuma que as
intervenções que a Saúde Pública promove nas comu-
nidades colhem resultados a médio e a longo prazo. São
resultados geracionais, nunca imediatos, contrariamente
ao que acontece nas intervenções personalizadas onde
após um diagnóstico clínico se institui uma terapêutica
reparadora de um problema individual. Em Saúde
Pública os recursos que agora se consomem vão con-
tribuir para reparar problemas que apenas o deixarão
de ser num futuro indeterminado. q
missãocuidados de saúde 21primários
OServiço Nacional de Saúde foi criado em 1975 coma chamada lei Arnaut. No entanto esta reformacomeçou a ser pensada em 1972 por Sampaio eGonçalves, grandes estrategas da filosofia doServiço Nacional de Saúde que marcou o início dos
Cuidados Saúde Primários.
Ao longo dos anos foram feitas várias reformas. Agrande reforma ocorreu em 1975 tal como referido econseguiu transformar as caixas de providência,também chamadas mútuas, nos actuais centros desaúde. Em 1983 houve uma nova reforma dos cui-dados saúde primários e a última teve lugar em 1999com a criação dos Regimes Remuneratórios Expe-rimentais (RRE).
Esta evolução fez com que Portugal atingisse bonsindicadores de saúde: a população atingiu uma espe-rança de vida mais elevada; houve uma diminuição damortalidade infantil; obtiveram-se elevadas taxas devacinação da população. A Organização Mundial deSaúde, no seu relatório de 2000, classificou o nossosistema de saúde em 12º lugar. O acesso aos cuidadosdiferenciados generalizou-se e aperfeiçoou-se. A dis-
tribuição de centros de saúde pelo país tornou-se umarealidade.
Devido a uma maior esperança de vida, o que é bompor um lado, acrescem as necessidades de saúde dapopulação cada vez mais envelhecida. Surge um sectorda população que vive excluída da sociedade quandoPortugal se tornou um país de imigração em vez doque aconteceu nos anos 60 e 70 em que era funda-mentalmente um país de emigração. Basta lembrarque uma grande fatia de nascimentos é já de popu-lação imigrante, o que contribui para melhorar a baixataxa de natalidade em Portugal.
Cabe-nos agora a responsabilidade de aceitar e com-preender esta evolução e proporcionar condições desaúde condignas à população que nos procura, umapopulação muitas vezes carenciada e com dificuldadeem saber como recorrer aos cuidados de saúde.
Sabemos que a nossa sociedade se tem modificado aolongo destes anos. A globalização da sociedade de con-sumo, os empregos que deixaram de ser para toda a
missão22cuidados de saúdeprimários
UNIDADEDE CUIDADOSNACOMUNIDADE
TEXTO DE JOSÉ PEDRO TOMÉ PARDAL (MCSP)Enfermeiro especialista em Saúde Comunitária
vida, a evolução para a sociedade de infor-mação, para só referir alguns aspectos. Houveconceitos que se modificaram como o conceitode família, considerado o conceito base da nossasociedade. Também os tipos de doença e demortalidade que nossa sociedade induz semodificaram: a obesidade infantil e de adultos,as doenças cardíacas associadas à substituição dadieta mediterrânica pelo o “fast-food”, o seden-tarismo crescente, a dependência de substânciasque as induzem, o aumento exponencial deacidentes rodoviários, a ascensão de doenças doforo psiquiátrico considerada já um flagelo anível europeu para o século XXI, a tubercu-lose multi-resistente. Tudo isto são desafios queultrapassam as portas das instituições de saúde.É por isso certo que se quisermos ter sucesso nasintervenções de saúde neste novo contexto muitasterão de ser feitas na comunidade.
A actual reforma dos cuidados saúde primáriosiniciou-se em 2006 com a Missão dos CuidadosSaúde Primários. Aposta na implementação deuma nova filosofia de trabalho, no trabalho comequipas motivadas que têm objectivos a cum-prir, no apoio dado por sistemas de informaçãoadaptados que sistematizam a informação doscuidados prestados aos cidadãos e suas famílias.Os ganhos em saúde que daí advêm serão comcerteza uma mais-valia resultante desta nova filo-sofia de cuidados de saúde.
Com esta reforma surgiram as Unidades de Saú-de Familiar (USF) já existentes no terreno. Outrasse seguirão como sejam a Unidade de Cuidadosde Saúde Personalizados (UCSP), a Unidade deSaúde Pública (USP), a Unidade de RecursosAssistenciais Partilhados (URAP) e a Unidade deCuidados na Comunidade (UCC).
Existirá uma UCC por cada actual centro desaúde e será coordenada por um enfermeiro econstituída por equipas multidisciplinares. Énesta unidade que se procura uma resposta
missãocuidados de saúde 23primários
NOS CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOSAINDA NÃO SE APOSTA O SUFICIENTENOS CUIDADOS DE PREVENÇÃO POR FALTADE RECURSOS HUMANOS E OUTROS.A PRIORIDADE TEM SIDO DADAAOS CUIDADOS NA ÁREA CURATIVA. O INVESTIMENTO NOS CUIDADOSDE SAÚDE PRIMÁRIOS TERÁ DE SER FEITOATRAVÉS DE POLÍTICAS DE SAÚDEDIRECCIONADAS TANTO PARAO INDIVÍDUO E SUAS FAMÍLIAS QUERECORREM AOS CENTROS DE SAÚDE,COMO TAMBÉM PARA AS COMUNIDADES. A PREVENÇÃO É UMA ÁREA ONDEOS RESULTADOS NÃO SÃO VISÍVEISNO CURTO PRAZO. SE BEM ORIENTADAOS RESULTADOS VER-SE-ÃO COM CERTEZANO FUTURO, CONTRIBUINDO PARAOS GANHOS EM SAÚDE E PARAA EVOLUÇÃO DA PRÓPRIA SOCIEDADE.
missão24cuidados de saúdeprimários
diferente das que têm sido dadas ao longo destes anos,uma resposta nos três níveis de prevenção, com eleva-do peso da intervenção social.
As intervenções de carácter curativo serão realizadasno âmbito da UCC através das equipas de cuidadoscontinuados integrados (ECCI) pertencentes à RedeNacional de Cuidados Continuados (RNCCI). Asequipas que actuam no domicílio do cidadão e suafamília necessitam de uma boa articulação com osprofissionais da USF ou da UCSP (médico de família eenfermeiro de família) pois esta articulação seráfundamental para a continuidade de cuidados ao cida-dão e suas famílias, sempre no âmbito da comunidadeonde se inserem.
Sendo a noção de comunidade muito abrangente háum imenso trabalho a realizar na comunidade queinclui: o domicílio dos cidadão e suas famílias; as asso-ciações; as instituições de solidariedade social; as esco-las; os locais de trabalho, as comunidades étnicas, ascomunidades desportivas.
Todo o trabalho das UCC terá de ser avaliado cominstrumentos de monitorização adequados. Tanto pelaprópria unidade como pela Unidade de Saúde Publi-ca, verdadeiro observatório das políticas de saúde nascomunidades do Agrupamento de Centros de Saúde aque pertencem.
O desafio está lançado, mas alguns críticos da reformareferem que o trabalho entre as várias unidadesfuncionais se pode ”tocar”. Mas é aqui que eu pensoque reside a essência da reforma: é no “tocar” entreos diversos técnicos de saúde, centrandos no cidadão,na sua família e na sua comunidade. Dentro de umnovo prisma de trabalho.
Na certeza porém de que, se se perder esta opor-tunidade, quem ficará a perder serão os Cuidados deSaúde Primários. E consequentemente a populaçãoportuguesa. q
PARA TRABALHAR NA COMUNIDADE,AS EQUIPAS TÊM DE TER VOCAÇÃOE ESTAR BEM PREPARADAS, QUEREM MEIOS HUMANOS QUER TÉCNICOS.TÊM DE TER OBJECTIVOS OU METASBEM DEFINIDOS E SER DOTADASDE ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃONA COMUNIDADE.A MONITORIZAÇÃO E AVALIAÇÃODAS ACÇÕES DESENVOLVIDASDE ACORDO COM OS PROGRAMASDE SAÚDE PRETENDIDOS É ESSENCIAL.
missãocuidados de saúde 25primários
Ésabido que nada acontece por acaso. A coor-
denadora da USF Santa Clara, ainda em início
de carreira, teve uma boa escola. Trabalhou num
RRE no Porto. Dessa experiência trouxe o gosto
pelo trabalho em equipa, por uma organização
disciplinada, a noção de que a prática clínica tem de ser
baseada em protocolos. Rapidamente soube desenvol-
ver e generalizar estes princípios na USF Santa Clara.
Conjuntamente com a equipa de profissionais da USF
foram-se desenvolvendo e implementando protocolos
clínicos, procedimentos organizacionais, boas práticas
de enfermagem.
Ana Costa teve uma outra experiência: também passou
por um centro de saúde. Desta experiência ficou-lhe
a certeza de que as pessoas precisam de ser ouvidas.
«Aquilo que eu sempre senti», diz Ana Costa «é que não
participava na organização e não era ouvida. Sempre
senti a gestão bem longe da realidade do centro de
saúde. No fundo eu olhava para o centro de saúde como
um conjunto de consultórios em que as pessoas entra-
vam e saíam e não conversavam. Não trabalhavam em
equipa. Contraraiamente a essa realidade, o que eu
encontrei no RRE foi trabalho em equipa e participação
na decisão. Na USF é rigorosamente a mesma coisa
que estamos a fazer. As pessoas que aqui trabalham
JUVENTUDEE ENTUSIASMOLIDERAMUSF SANTA CLARA
100 É UM NÚMERO MARCANTE.Atrai quem dele se aproxima.Significa amadurecimento, experiência vivida.No caso da USF Santa Clara (Vila do Conde)significa que a juventude está ao leme.É difícil encontrar uma coordenadoratão jovem à frente de uma equipade profissionais experientes que nela confiam.Mas o que surpreende nesta USF é a formacomo os procedimentos que normalizamas diferentes actividades foram estabelecidos,implementados e seguidos.O que lhe permitiu desenvolver uma boaorganização em pouco mais de seis meses.A revista da MCSP foi ouvir o que movea equipa que, em torno de Ana Dias Costa,se propõe cumprir todos os indicadorese melhorar continuamente as suas práticas.
TEXTO E FOTOS DE FILIPA HOMEM CHRISTO
missão26cuidados de saúdeprimários
participam na decisão da sua própria organização, têm
autonomia, cumprem objectivos por sua própria ini-
ciativa, e ainda por cima nas USFs está isto tudo plas-
mado na lei».
Se este tipo de organização é capaz de seduzir os pro-
fissionais que se associaram para criar uma USF, então
o que é que encanta o cidadão? Ana Costa é perem-
ptória em afirmar que o que encanta o cidadão é o facto
de cada um ter uma resposta no próprio dia quando
precisa realmente de um atendimento para uma situa-
ção aguda, o facto de ter mais tempo para ser ouvido na
própria consulta, a organização de trabalho que encon-
tra. E ainda o facto de ter instalações completamente
remodeladas e mais adequadas, com muito mais bem-
-estar. Com mais informação, mais cuidada e com-
preensível. Isso encanta-o. Para a coordenadora da
USF Santa Clara quando as pessoas passam ao papel
elogios e se preocupam em os escrever, isso quer dizer
alguma coisa.
Uma das práticas organizativas que veio facilitar muito o
trabalho é o Google talk, que surgiu como forma de
evitar as constantes interrupções da actividade. Os dife-
rentes elementos da equipa activam assim um conjunto
de alertas. Isto evita o bater à porta, evita os telefonemas
durante a consulta. O Google talk também interrom-
pe, mas o doente não se apercebe, é mais simpático.
Médicos, enfermeiros e administrativos comunicam uns
com os outros através do Google talk. Em vez de o tele-
fone tocar é enviada uma mensagem à qual o destina-
tário responde.
ANA DIASCOSTA
“ATÉ UM GRANDE LÍDER
NÃO O É SE NÃO ESTIVER
RODEADO DE UMA EQUIPA
QUE LHE CORRESPONDA.”
Como se organizaramos enfermeirosA enfermeira Manuela Pereira realça o respeito e a boa
articulação que unem toda a equipa de coordenação
e os restantes elementos da USF. «Todos nós defen-
demos as necessidades do nosso grupo profissional, mas
temos uma boa noção de que é preciso haver inter-
ligação entre eles. Eu sou enfermeira e especialista em
saúde comunitária. Durante muito tempo houve muito
isolamento nos centros de saúde e os diferentes assun-
tos não se interligavam. Se conversarmos sobre as dife-
rentes áreas de actuação todos ganhamos, ninguém fica
a perder. Agora todos nós olhamos para os nossos uten-
tes de uma forma muito mais global, verdadeiramente
holística. Não para actos isolados».
Em relação à sua escolha pessoal refere que não veio
para a USF por se encontrar insatisfeita mas por ter
gostado muito do desafio que lhe foi feito. Trabalhava
na saúde escolar e estava satisfeita. E explica como é
que se organizaram: «O que a Dr.ª Ana fez foi deveras
inteligente e motivou-nos a seguir o mesmo princípio.
Ela pegou em alguém de referência de cada grupo pro-
fissional e disse para nós nos organizarmos. Seguindo
o exemplo dela, foi o que eu também fiz. Reuni três
pessoas e cada uma dessas pessoas deu um nome, o que
eu acho que é bastante razoável porque assim cada um
teve oportunidade de indicar o nome de alguém que se
pudesse enquadrar. No nosso grupo profissional como
cada enfermeiro de entre nós os quatro deu um nome,
isso significa que existe uma forte ligação por se ter
dado o nome de alguém em quem se confia. E até hoje
acho que tem sido um sucesso».
Um desafio aliciantepara os administrativosA administrativa Helena Almeida continua: «Quando
tudo isto começou eu estava em casa de licença de par-
to. Não assisti a esta revolução inicial, á chegada
da Dra. Ana, nem à fase embrionária da constitução
da equipa. Fizeram-me o convite, ligaram-me passados
dois dias, e eu achei que era um desafio, um projecto
muito motivador e com pernas para andar. Na altura
em que se constituiu a USF eu também não posso dizer
que estivesse insatisfeita. Eu estava a desempenhar as
funções de secretariado da direcção mas já tinha pas-
sado pelo serviço administrativo normal por onde toda
a gente passa no início. Tinha a perfeita noção de que o
serviço administrativo na generalidade era um pouco
automatizado. Pelo menos foi essa a perspectiva com
que eu fiquei. Muitos administrativos não terão uma
grande noção do que é um programa de saúde, para
que é que ele existe, quais são as diferenças dos diversos
programas de saúde, o que é que o administrativo pode
fazer para contribuir para que os utentes tenham uma
maior acessibilidade a esses programas de saúde.
Quando passei pelo serviço administrativo do centro de
saúde eu não tinha noção para que é que serviam os
diferentes tipos de exames que eram pedidos, por que
razão tinham de ser feitos numa determinada altura e
não noutra. Não tinha por exemplo conhecimento da
verdadeira razão porque tínhamos que marcar uma
consulta para os recém nascidos logo no início, de qual
era a importância de se fazer essa consulta, de qual era
a importância de se fazer a revisão do puerpério. Nós
também somos agentes de tudo isto e não temos qual-
quer formação anterior. É por isso que eu digo que o
serviço administrativo é muito automatizado».
Helena Almeida considera que se não fôr garantido o
envolvimento de todos os sectores profissionais não
teremos verdadeiramente uma equipa multidiscipli-
missãocuidados de saúde 27primários
HELENAALMEIDA
“OS ADMINISTRATIVOS TÊM
AGORA UMA MELHOR
NOÇÃO DE COMO É QUE
PODEM CONTRIBUIR PARA
O SUCESSO DOS DIVERSOS
PROGRAMAS DE SAÚDE”
missão28cuidados de saúdeprimários
nar que contribua decisivamente para a melhoria dos
cuidados prestados. E para esta administrativa as USF
são de facto um marco decisivo nesta evolução, para a
qual segundo diz, os administrativos também contri-
buem bastante.
Um administrativo que venha a ingressar numa USF
terá ganhos fundamentalmente em organização do tra-
balho. Vai sentir motivação para que consiga pedalar
ao mesmo ritmo que os restantes membros da equipe
multidisciplinar e essa motivação, essa organização, vai-
-lhe dar uma satisfação profissional que provavelmente
no centro de saúde tradicional não encontraria. Porque
ao fim e ao cabo não é avaliado por aquilo que faz. Ou
então é avaliado da mesma forma que um colega que
tenha um desempenho menor. São essas as principais
vantagens que pensa que um administrativo encontra
nesta nova forma de organização do trabalho.
A função de secretariado clínicoQuestionada sobre um exemplo da participação dos
administrativos nos programas de saúde, Helena não se
faz rogad e exemplifica: «começando por exemplo pelo
recém-nascido, posso-lhe dizer que nós agora estamos
muito atentos a todas as notícias de nascimento que
chegam até nós. E temos o cuidado de, naquele mesmo
dia, dar conhecimento à equipe médico/enfermeiro de
família que essa criança nasceu. Imaginemos que a
notícia do nascimento, o que muitas vezes acontece,
chega mais cedo que a própria criança que vem com os
pais. Nós imediatamente tiramos uma ficha de
identificação, registamos a criança e damos conhe-
cimento à equipe. Muitas vezes as mães ligam a avisar
que a criança nasceu para que seja marcada de imediato
a primeira consulta para o bébé. Nós alertamos a equipa
para que seja marcada a visitação domiciliária nos
primeiros 14 dias, para que seja marcada a consulta do
puerpério para a mãe.
Se um administrativo não tiver formação e não estiver
alertado para estas situações que são fundamentais,
pode perder-se o contacto precoce com estas crianças».
Enfermeiro de famíliajá é uma realidade Na USF Santa Clara os enfermeiros já se organizaram
de acordo com a filosofia do enfermeiro de família.
Cada enfermeiro de família tem uma lista de utentes.
Por uma questão de articulação entenderam que era
mais simples que essa lista de utentes correspondesse à
do médico, e neste momento é assim que estão a
funcionar. Até aqui, o utente quando queria alguma
coisa de um enfermeiro não sabia a quem se dirigir.
Agora sabe e procura-o.
Desde o início que é ponto assente da equipe multi-
profissional elucidar sempre o utente de que tem um
médico e um enfermeiro de família. Tanto mais que
muitos utentes passaram directamente para a USF sem
nunca ter tido um médico de família. Um sintoma deste
trabalho do enfermeiro de família é que quando as mães
têm alguma dúvida sobre pequenos problemas dos seus
bébés, já não vão a correr para a USF, telefonam pri-
meiro para saber se estão a fazer bem, o que é que
devem fazer. Telefonam para o enfermeiro de família.
Trabalho em equipa,o segredo da unidadePara a coordenadora, o segredo do bom funcionamento
da unidade é o trabalho em equipa. Ciente de que não
lhe regateiam qualidades de liderança, afirma que até
um grande líder não o é se não estiver rodeado de uma
equipa que lhe corresponda. Ana Costa sublinha que na
USF Santa Clara o objecto de todos os esforços é o
utente. Sempre o utente. Não há problemas dos enfer-
meiros ou dos médicos. Há uma solicitação do utente a
que todos têm de dar resposta. Exemplificando: «eu
posso ter a agenda cheia, ter a consulta aberta cheia e
até já ter autorizado por exemplo mais duas consultas.
Mas se me mandam uma mensagem da secretaria pelo
Google talk a dizer que há mais um utente a pedir
consulta, eu tenho que dar resposta. Não quer dizer que
tenha que dar a consulta, até posso marcar a consulta
para o dia seguinte, e os utentes aceitam isso muito bem.
Agora nunca ninguém nesta unidade diz assim:
desculpe lá isso não é nada comigo, até já estou a fazer a
mais, já fiz mais duas consultas extra portanto desen-
rasque-se. Isso aqui não existe».
Em relação ao serviço administrativo há a noção clara
de que é a cara da unidade, o local onde se realiza o
primeiro contacto com o utente, e o atendimento atento
e interessado é por isso fundamental. Segundo afirma a
coordenadora da USF, os administrativos não estão no
atendimento por estar, para despachar os utentes e à
espera de chamar o próximo. Estão ali para prestar um
serviço, para encaminhar o utente. E depois têm o apoio
de retaguarda necessário. E sabem que se o utente faz
uma solicitação ao balcão, ela vai ser atendida. Fecha-se
o ciclo do atendimento. Quando se entra na USF Santa
Clara reina a calma. Com alguma persuasão conse-
guiram que as pessoas passassem a vir apenas à hora a
que têm a sua consulta marcada. É um trabalho que os
profissionais ainda não deram por terminado mas,
segundo relatam, é uma diferença abismal.
Entra-se na unidade e nota-se que as pessoas estão cal-
mamente sentadas, esperam um pouco, mas sabem que
vão ser chamadas. Não se sentem desorientadas. E uten-
tes orientados são utentes mais satisfeitos.
missãocuidados de saúde 29primários
MANUELAPEREIRA
“QUANDO AS MÃES TÊM
ALGUMA DÚVIDA SOBRE
PEQUENOS PROBLEMAS DOS
SEUS BÉBÉS, JÁ NÃO VÃO
A CORRER PARA A USF,TELEFONAM PARA
O ENFERMEIRO DE FAMÍLIA.”
missão30cuidados de saúdeprimários
Criar procedimentospara cada um conheceras suas funçõesA equipa não estava habituada a trabalhar em conjunto
e sentiu por isso necessidade de criar procedimento
para cada um conhecer bem as suas tarefas e respon-
sabilidades. Os administrativos passaram a ter funções
um pouco diferentes das que tinham no centro de
saúde, assumindo mais responsabilidades. Os enfer-
meiros também não tinham a prática de trabalhar como
enfermeiros de família. Até à entrada na USF tra-
balhavam por actividade. Tiveram necessidade de se
articular de uma forma diferente. E até para os médicos
os protocolos nem sempre eram a rotina.
Nesta primeira fase foi por isso feito um grande esforço
para criar os procedimentos e normas internas que sen-
tiam ser necessárias para a sua organização. Contaram
com o envolvimento de todos os profissionais, des-
dobraram-se em reuniões, distribuiram tarefas e cria-
ram os procedimentos para as actividades correntes do
dia-a-dia. Para cada um saber qual é o seu papel, saber
como proceder.
Para ilustrar o trabalho que a este nível está a ser feito na
USF Santa Clara, Ana Costa descreve para que serve o
procedimento da consulta de diabetes. «Um dos capí-
tulos do Manual de Procedimentos é o da consulta de
diabetes, onde se encontra especificado o papel dos
diferentes profissionais; os critérios de vigilância; o que
fazer em cada consulta; quem faz o quê e o que se faz
na primeira consulta e nas seguintes; o que é que o
médico faz, o que é que o enfermeiro faz; orientações
para a avaliação periódica; critérios de referenciação
interna; como é que os utentes são referenciados do
médico para o enfermeiro e do enfermeiro para o
médico; metas estabelecidas pelas normas; o que regis-
tar e onde registar. Não se pense que tem sido fácil, mas
havemos de o conseguir». q
A elaboração destes procedimentos
teve por base/fundamentação as
circulares normativas nº9/DGCG
de 04/07/02, nº23/DSCS/DPCD de
14/11/07 (Programa Nacional de
Prevenção e Controlo da Diabetes
Mellitus), nº8/DGCG de 04/11/98,
nº 7/DGCG de 04/11/98,
nº13/DGCG de 07/09/01 e as
recomendações do núcleo de
diabetes da APMCG.
Estes procedimentos são aplicáveis
às pessoas com diabetes, às
mulheres grávidas e à população
com risco acrescido de
desenvolvimento de diabetes.
• DIABETES GESTACIONAL
(qualquer grau de intolerância
à glicose documentado,
pela primeira vez, durante a
gravidez);
• OUTROS TIPOS específicos de
diabetes (ex: defeitos genéticos
da célula β pancreática, defeitos
genéticos na acção da insulina,
doenças do pâncreas exócrino,
endocrinopatias, induzida por
químicos ou fármacos, infecções,
formas raras de diabetes
auto-imune e outras síndromes
genéticas associadas à diabetes).
Papel dos profissionaisde saúde
PPaappeell ddoo mmééddiiccoo::
– Detecção de casos de forma
oportunista, segundo a
estratégia seguida pela equipa;
– Avaliação global do doente
diabético (etiologia e
complicações);
– Instaurar tratamento adequado
a cada doente;
CLASSIFICAÇÃODA DIABETES MELLITUS
• DIABETES TIPO 1 (resulta da
auto-destruição das células β do
pâncreas, levando a
insulinopenia absoluta, pode ser
auto-imune ou idiopática);
• DIABETES TIPO 2
(predominantemente por
insulinorresistência, com
insulinopenia relativa ou por
defeito secretor, coexistindo
frequentemente ambas as
alterações);
missãocuidados de saúde 31primáriosMANUAL
DE PROCEDIMENTOSDiabetes Mellitus
Por forma a ilustrar a metodologia de elaboraçãode procedimentos adoptada na USF Santa Clara, e porqueé um exemplo de procedimento elucidativo e útil, publicamoscom a autorização dos profissionais que o fizeram e aos quaisagradecemos o procedimento da consulta de diabetes.
– Avaliação periódica do utente
diabético;
– Educação para a saúde.
PPaappeell ddoo eennffeerrmmeeiirroo::
– Detecção de casos de forma
oportunista, segundo a
estratégia seguida pela equipa;
– Avaliação periódica do utente
diabético;
– Educação para a saúde.
PPaappeell ddoo aaddmmiinniissttrraattiivvoo::
– Proceder à isenção do utente
atribuindo o código 3011;
– Fornecer guia do diabético;
– Convocar, no dia seguinte, os
diabéticos que faltaram à
consulta, depois de sinalizados
pelo respectivo médico/
/enfermeiro de família;
CRITÉRIOSDE DIAGNÓSTICODE DIABETES MELLITUS
Factores de Riscode Diabetes Mellitus
• Excesso de peso (25 ≤ IMC<
30) e obesidade (IMC ≥ 30);
• Perímetro abdominal ≥ 94 cm ¢
e ≥ 80 cm ™;
• Idade ≥ 45 anos se europeus e
≥35 anos se de outra
origem/região do mundo;
• Vida sedentária;
• História familiar de diabetes, em
familiar de primeiro grau;
• História de doença
Critérios diagnósticos deAlteração do Metabolismoda Glicose (risco acrescidode diabetes)
AAnnoommaalliiaa ddaa GGlliicceemmiiaa eemm JJeejjuumm
((AAGGJJ))::
– glicemia em jejum ≥ 110 e <126
mg/dlTToolleerrâânncciiaa DDiimmiinnuuííddaa àà GGlliiccoossee
((TTDDGG))::
– glicemia em jejum < 126 mg/dl e
glicemia ≥ 140 e < 200 mg/dl,
2h após a PTOG com 75g de
glicose em 2 dl de água
Diabetes gestacional
Entre as 24-28 semanas, avaliar
glicemia 1h após prova de
sobrecarga de 50g glicose em 2dl
água (não necessita jejum).
Se glicemia ≥ 140 mg/dl, repetir
prova de sobrecarga com 100g
glicose em 4dl água. Considera-se a
prova diagnóstica de diabetes se,
pelo menos dois dos valores são
iguais ou superiores aos indicados
no Quadro 1.
Se esta prova de sobrecarga for
negativa, com rastreio positivo às
24-28 semanas, deve ser repetida
às 32 semanas.
Se esta prova de sobrecarga for
negativa, com rastreio positivo no
início da gravidez, deve ser repetida
às 24-28 semanas.
cardiovascular prévia (doença
cardíaca isquémica, doença
cerebrovascular e doença
arterial periférica)
• Hipertensão arterial;
• Dislipidémia;
• Intolerância à glicose em jejum
e diminuição da tolerância à
glicose, prévias;
• Consumo de fármacos que
predisponha à diabetes.
Critérios diagnósticosde Diabetes Mellitus(determinações no plasmavenoso)
– Glicemia em jejum ≥ 126 mg/dl
(jejum 8h)11
ou
– Sintomas clássicos (polifagia,
polidipsia, poliúria, perda peso)
+ glicemia ocasional ≥ 200
mg/dl1
ou
– Glicemia ≥ 200 mg/dl, 2h após
a PTOG com 75g de glicose em
2 dl de água
Nas crianças com idade < 15 anos,
deve-se efectuar PTGO com 1,75g
glicose/kg peso, até ao máximo de
75g (1dl água por cada 25 g
glicose).
missão32cuidados de saúdeprimários
Quadro1. Critérios de diagnóstico de diabetes gestacionalHora Glicemia plasmática (mg/dl)
0 ≥ 951 ≥ 1802 ≥ 1553 ≥ 140
__________1 Na ausência de hiperglicemia inequívoca, associada a sintomas clássicos, estes critérios
devem ser confirmados num segundo tempo.
Não efectuar a prova quando
glicemia em jejum ≥ 140 mg/dl ou
glicemia ocasional > 200 mg/dl,
porque estes valores já são
diagnósticos de diabetes.
Efectuar no 1º trimestre, após uma
glicemia em jejum, sempre que a
grávida apresentar os seguintes
factores de risco:
• Idade ≥ 35 anos;
• Obesidade (IMC ≥ 30);
• Multiparidade (≥ 4 partos);
• 2 abortos espontâneos;
• Nados mortos, ou mortalidade
perinatal, sem causa definida;
• Macrossomia fetal (peso ≥ 4kg);
• Diabetes gestacional em gravidez
anterior.
RReeccllaassssiiffiiccaaççããoo
Todas as grávidas com diabetes
gestacional, devem efectuar, seis a
oito semanas após o parto, prova de
“Guia do Diabético”, que poderão
manter ou não após a
reclassificação da diabetes
gestacional no puerpério (Se não
forem reclassificadas como
diabéticas, deve-se guardar “Guia
do Diabético” no respectivo
processo).
A consulta de vigilância do doente
diabético é multiprofissional, e é
agendada pelo respectivo
médico/enfermeiro de família, que
articulam entre si. Cada equipa de
saúde de acordo com o utente,
pode agendar as consultas médicas
e de enfermagem no mesmo dia
ou intercaladas.
No caso de o utente faltar à
consulta, o médico/enfermeiro de
família reagenda a consulta e o
administrativo convoca o diabético.
Periodicidadedas consultas:
– Consultas Médicas/Ano: 3-4
(dependendo do grau de
controlo metabólico);
– Consultas de Enfermagem/Ano:
2-4 (dependendo do grau de
controlo metabólico).
Nos diabéticos mal controlados, a
periodicidade das consultas médicas
e de enfermagem deve ser
individualizada.
História Clínicae Exame Objectivo
Quando oportuno as tarefas
anteriormente referidas podem ser
sobrecarga com 75g glicose em 2 dl
água, com avaliação de glicemia em
jejum e 2h após.
Se a prova estiver alterada, a
puérpera deve ser reclassificada
como sendo diabética ou com
diminuição da tolerância à glicose.
Se a prova estiver normal, deve
repetir anualmente glicemia em
jejum.
AVALIAÇÃO E VIGILÂNCIADO DOENTE DIABÉTICO
Após o diagnóstico de diabetes, o
médico preenche o boletim de
isenção e o administrativo atribui a
isenção com o código 3011 e
fornece o Guia do Diabético.
As grávidas com diabetes
gestacional também devem receber
missãocuidados de saúde 33primários
Quadro 2. História Clínica e Exame Objectivo1ª Consulta Consultas seguintes
Médico EnfermeiroHistória Clínica e Exame Objectivo X XAvaliação Índice de massa Corporal (IMC) X X
Avaliação Perímetro Abdominal X XObservação dos pés X XAvaliação TA X X XAuscultação cardíaca e vascular X XAvaliação complementar diagnostica X XAdesão ao regime terapêutico X X XGestão do regime terapêutico XReavaliação da terapêutica farmacológica X
Estratificação de Risco X XEducação Avaliação dos conhecimentos face à doença X Xdo Ensino Vigilância Periódica X XDiabético Alimentação X X
Actividade física e gestão do stress X XEstilos de vida X XFactores de risco X XComplicações X XAuto-cuidado X X
Definição/negociação dos objectivos X X XAvaliação dos objectivos terapêuticos X X
realizadas pelo outro elemento da
equipa.
Avaliação Periódicado Doente Diabético
A avaliação periódica do doente
diabético com complicações deve
ser individualizada.
AAuuttoovviiggiillâânncciiaa ee AAuuttooccoonnttrroolloo
ddaa GGlliicceemmiiaa CCaappiillaarr
No dia da consulta, os diabéticos
que efectuam autovigilância e auto-
controlo da glicemia capilar, devem
ser portadores do seu glucómetro
(com respectivas tiras e lancetas),
registos de glicemia e guia do
diabético.
A pesquisa de glicemia deve ser
feita pelo próprio diabético, com
supervisão do enfermeiro de
família, para correcção de eventuais
erros, ensino de interpretação do
valor de glicemia e de atitudes a
tomar perante os valores obtidos.
A frequência de monitorização deve
ser individualizada segundo o
controlo glicémico.
PPeessqquuiissaa mmiiccrrooaallbbuummiinnúúrriiaa
Deve proceder-se a diagnóstico
sistemático da microalbuminúria
imediatamente após o diagnóstico
da diabetes tipo 2 (e após 5 anos
de evolução na diabetes tipo1).
Efectuar teste semi-quantitativo
(Micral test), designadamente 3
pesquisas ao ano (amostras da
primeira urina da manhã, ou de
ocasião). Se a pesquisa for positiva,
deve ser confirmada em 2-3
neuropatia ou vasculopatia, e,
presença de pelo menos outro
factor de risco (deformação ou
proeminências ósseas, pele não
intacta, calosidade, perda de
mobilidade articular, calçado
inadequado);
– 1-3 meses, se neuropatia ou
isquemia.
RRaassttrreeiioo rreettiinnooppaattiiaa
Rastreio anual desde o diagnóstico
de diabetes tipo 2 (após 5 anos
evolução na diabetes tipo 1) por
referenciação a oftalmologia.
Critérios de ReferenciaçãoInterna
RReeffeerreenncciiaaççããoo ddoo MMééddiiccoo ppaarraa
EEnnffeerrmmaaggeemm
• Após diagnóstico, para
identificação no SAPE e 1ª
avaliação;
• Para escolha e fornecimento de
glucómetro e ensino;
• Para escolha e fornecimento de
caneta de insulina e ensino;
amostras num período de 6 meses,
e deve ser quantificada, com
colheita de 12h/nocturna minutada22
ou 24h. (Nota: Exercício físico nas
24h anteriores, infecção, febre,
insuficiência cardíaca, hiperglicemia
e hipertensão acentuadas, podem
aumentar os níveis de excreção
urinária de albumina para valores
superiores aos basais).
Para estabelecer o diagnóstico de
microalbuminúria devem existir
duas determinações positivas em
tempos diferentes. Depois de estar
diagnosticada microalbuminúria
deve proceder-se ao doseamento
anual na urina de 24 horas.
Os testes semi-quantitativos são
inúteis se já existir proteinúria
positiva.
OObbsseerrvvaaççããoo ddooss ppééss
A observação dos pés deve obedecer
à seguinte periodicidade:
– anual, se ausência de factores de
risco;
– 6-6 meses, se ausência de
missão34cuidados de saúdeprimários
Quadro 3. Avaliação Periódica do Doente Diabético (sem complicações)Avaliação Controlo • HbA1cTrimestral metabólico • IMC
• Perímetro abdominal• Auto-vigilância e auto-controlo (em todas as consultas)
Risco cardiovascular • Avaliar TA• Consumo tabaco
Neuropatia • Revisão sintomasAvaliação Controlo metabólico • Glicemia jejumAnual Risco cardiovascular • Perfil lipídico
• ECGOlhos • Rastreio retinopatiaPés • Observação pésNefropatia • Avaliação microalbuminúria
__________2 Recolher a urina eliminada durante a noite e a primeira da manhã (à noite, e antes de se
deitar não aproveita a urina, mas regista o dia/hora/minutos. Se urinar durante a noitecomeça a juntar urina e, na manhã seguinte, depois de se levantar, junta a primeira urinada manhã, completando a colheita e, registando novamente o dia/hora/minutos.
• Para reavaliação e seguimento
segundo o especificado
anteriormente.RReeffeerreenncciiaaççããoo ddee EEnnffeerrmmaaggeemm ppaarraa
MMééddiiccoo
• Para diagnóstico e avaliação
inicial:
– Após diagnóstico
oportunista;
– Quando detecta um diabético
já diagnosticado;
• Para revisão periódica do
controlo na diabetes controlada:
– Sem complicações: 3 -4
– Com complicações:
periodicidade individualizada
• Quando se verifica um mau
controlo metabólico
• Quando existem alterações na
observação dos pés:
– Feridas / úlceras;
– Onicomicoses;
– Ausência de pulsos e
diminuição da temperatura e
cor cianosada.
TRATAMENTODA DIABETES MELLITUS
Tratamento NãoFarmacológico
• Redução do peso em indivíduos
obesos ou com excesso
ponderal, idealmente para
valores de IMC de 18.5 a 24.9
Kg/m2;
• Hábitos alimentares saudáveis
• Actividade física, como, por
exemplo, exercício aeróbio,
como caminhar 30 min/dia, 5-7
dias/semana;
• Consumo moderado de álcool
com um máximo 30 ml
etanol/dia nos homens e 15
ml/dia para as mulheres;
• Cessação do consumo de tabaco,
que é, sobretudo, importante
numa perspectiva de redução
global do risco cardiovascular.
Tratamento Farmacológico(será abordado no Manual Boas
Práticas)
REGISTOS
Os registos médicos deverão ser
efectuados na aplicação informática
SAM:
• diagnóstico T89 ou T90 activo
na lista de problemas;
• registos no “Programa de
Diabetes”, com registo
parametrizado - “A” o SOAP –
com T89 ou T90.
No “Guia do Diabético”, que deve
acompanhar sempre o utente,
devem ser preenchidos os
• Quando avaliação de
microalbuminúria por tira teste
é positiva (2 avaliações com
intervalo 1-2 meses);
• Quando surgem sinais ou
sintomas novos.
Metas preventivas eterapêuticas orientadorasda Diabetes MellitusVer Quadro 4.
Anomalia da Glicemiaem Jejum/ Diminuiçãoda Tolerância à Glicose
Devem ser avaliados pelo menos
uma vez por ano, com
determinação de glicemia em
jejum, avaliação de factores de risco
e educação para a saúde (correcção
de erros alimentares, exercício físico
e cessação tabágica). Avaliar
anualmente risco cardiovascular
global.
missãocuidados de saúde 35primários
Quadro 4. Metas preventivas e terapêuticas orientadoras da Diabetes MellitusHbA1c ≤ 6,5%Glicemia em jejum < 108 mg/dlGlicemia pós-prandial < 135 mg/dl (DM tipo 2)
135-160 (DM tipo 1)TA < 130/80 mmHg
< 125/75 mmHg (ins. renal, proteinúria > 1g/24h)Colesterol total < 175 mg/dlColesterol HDL > 40 mg/dl ¢ e > 46 mg/dl ™Colesterol total /HDL Colesterol total /HDL < 3Colesterol LDL ≤ 70 mg/dlTriglicerideos < 150 mg/dlIMC < 25 kg/m2 (s10%, se excesso peso)Perímetro abdominal < 94 cm ¢ e < 80 cm ™Actividade física regular 30-45 min /diaCessação tabágica obrigatória
objectivos anuais de tratamento, os
dados de observação, problemas de
saúde, medicação e resultados de
exames. (Médico/Enfermeiro
família)
Os registos de enfermagem deverão
ser efectuados na aplicação
informática SAPE.
11.. FFeennóómmeennoo:: GGeessttããoo ddoo RReeggiimmee
TTeerraappêêuuttiiccoo
Status: Eficaz ou Ineficaz
Intervenções:
– Ensinos (medicação,
fisiopatologia da doença, hábitos
alimentares, exercício físico,…);
– Monitorizar (glicemia capilar,
tensão arterial, peso corporal);
– Providenciar material de leitura.
22.. FFeennóómmeennoo:: AAuuttoo--VViiggiillâânncciiaa
Status:
– Conhecimento sobre auto-
vigilância dos pés.
– Conhecimento sobre auto-
vigilância da glicemia capilar.
– Conhecimento sobre sinais de
alerta.
– Aprendizagem de habilidades
para proceder a auto-vigilância
dos pés.
– Aprendizagem de habilidades
para proceder a auto-vigilância
da glicemia capilar.
Intervenções:
– Ensinos (auto-vigilância dos pés
e glicemia capilar);
– Incentivar (auto-vigilância dos
pés e glicemia capilar);
– Instruir (auto-vigilância dos pés
e glicemia capilar);
– Providenciar equipamento de
– Monitorizar urina através de
“Combur” (albumina)
– Vigiar pés;
– Vigiar sinais de Cetonúria e
glicosúria.
Observação dos pés
Registada pelos enfermeiros no
SAPE no parâmetro “vigiar pés”. Os
médicos acedem à informação
através do SAM e registam
observação do pé (sim/não) no
“Programa de Diabetes”.
Pesquisamicroalbuminúria
Registada pelos enfermeiros no
SAPE no parâmetro “combur”. Os
médicos acedem à informação
através do SAM e registam
determinação qualitativa da
microalbuminúria no “Programa de
Diabetes - micraltest”. Registo
microalbuminúria quantitativa em
registo MCDT.
Observaçãodos olhos
Registada pelos médicos no SAM no
“Programa de Diabetes”,
escolhendo os itens “referenciação”
quando se referencia o utente e
“consulta” após ter sido efectuado o
rastreio.
Vacina da gripe
Os médicos devem assinalar na
listagem de diabéticos do SAM, os
diabéticos com prescrição de vacina
da gripe.
auto-vigilância da glicemia
capilar (registar a maquina na
avaliação inicial);
– Treinar auto-vigilância da
glicemia capilar;
– Vigiar auto-vigilância (ver
maquina);
– Providenciar material de leitura.
33.. FFeennóómmeennoo:: AAuuttoo--AAddmmiinniissttrraaççããoo
ddee MMeeddiiccaammeennttooss ((iinnssuulliinnaa))
Status:
– Conhecimento sobre a técnica
de auto-administração de
insulina.
– Aprendizagem de habilidades
sobre a técnica de auto-
administração de insulina.
Intervenções:
– Ensinar sobre a técnica de auto-
administração de insulina;
– Instruir sobre a técnica de auto-
administração de insulina;
– Treinar a técnica de auto-
administração de insulina;
– Vigiar pele;
– Elogiar aprendizagem de
habilidades.
Registar na avaliação inicial o tipo
de insulina, dose e esquema
terapêutico.
Intervenções:
– Aconselhar o uso de cartão de
identificação de diabético;
– Escutar o doente;
– Executar cuidados aos pés
(unhas, calos);
– Incentivar a actividade física;
– Informar sobre Guia do
Diabético;
– Monitorizar IMC;
– Monitorizar perímetro
abdominal;
missão36cuidados de saúdeprimários
Os enfermeiros devem assinalar na
listagem de diabéticos do SAPE, os
diabéticos com administração de
vacina da gripe.
A Enf. responsável na Equipa de
Diabetes deve centralizar a seguinte
informação:
– nº grávidas com diabetes
gestacional e resultado da
reclassificação;
– nº diabéticos com observação
dos pés e principais alterações;
– nº diabéticos acamados,
amputados e cegos;(enf./medico
família fornece informação)
– nº diabéticos com vacina da
gripe prescrita e administrada.
SITUAÇÕESA REFERENCIARAOS CUIDADOSSECUNDÁRIOS
• Diabéticos tipo 1;
• Diabéticos tipo 2, com mau
controlo metabólico;
• Diabetes gestacional;
• Rastreio retinopatia diabética
(referenciar anualmente para o
alimentação;
– interacção entre a ingestão
alimentar, a actividade física e o
tratamento farmacológico;
– acção e efeitos da sua
medicação;
– cuidados com os pés;
– complicações tardias e sua
prevenção;
– importância da autovigilância
para autocontrolo;
– planeamento familiar e diabetes;
– gravidez e diabetes;
– atitudes a adoptar em viagem;
– manuseamento do material
injectável e procedimentos
correctos na administração de
insulina;
– prevenção das complicações
agudas e seu controlo.
São fornecidos folhetos
informativos pela equipa de saúde:
• Prevenção da Diabetes (factores
de risco para a diabetes);
• Recomendações para a vigilância
do doente diabético (na 1ª
consulta, ou quando oportuno);
• Alimentação saudável (na 1ª
consulta ou quando oportuno);
• Cuidados com o pé (na consulta
de observação do pé).
Hospital Pedro Hispano);
• Alterações dos pés (para o
HGSA): isquémicas (2ªfeira) ou
neuropáticas (5ª feira);
• Complicações da diabetes (ex:
claudicação intermitente,
disfunção eréctil)
• Insuficiência renal: creatinina
> 2mg/dl ou clearance
creatinina < 60ml/min
SITUAÇÕESQUE NECESSITAMDE TRATAMENTOURGENTE(será abordado no Manual Boas
Práticas)
TRATAMENTODAS URGÊNCIAS(será abordado no Manual Boas
Práticas)
EDUCAÇÃOPARA A SAÚDE
O diabético deve conhecer:
– o que é a diabetes e o seu tipo;
– objectivos do seu tratamento;
– regras adequadas de
missãocuidados de saúde 37primários
Tipo de Documento: Procedimento Interno da USF Santa ClaraNome: Manual de procedimentos na Diabetes MellitusData: 21/05/2008 Data da Próxima Revisão: 30/01/2010Autores: Ana Dias Costa, Carina Ramos, Mª José AugustoPalavras-Chave: Diabetes Mellitus; Procedimentos
AMarca de Atendimento de Qua-
lidade Reconhecida AQR é uma
Marca registada do Ministério
da Saúde criada em Dezembro
de 2006 no âmbito do projecto
do Instituto da Qualidade em Saúde
designado por projecto dos Manuais da
Qualidade para a Organização do Aten-
dimento dos Utentes.
Esta Marca tem como objectivo reco-
nhecer e promover as boas práticas de
atendimento dos utentes nos Serviços
de Saúde, a quem todo o esforço de
qualidade e modernidade é dedicado.
Reconhecer as Boas Práticas de Aten-
dimento e tornar público esse reconhe-
cimento bem como os compromissos
que lhe estão subjacentes é, no enten-
der da Missão para os Cuidados de
Saúde Primários (MCSP), um impor-
tante impulso para a modernidade e
para a criação de um sentido de respon-
sabilidade cívica partilhada e um passo
em frente na espiral de melhoria con-
tínua dos cuidados de saúde primários.
Para isso, a Missão dos Cuidados de
Saúde Primários (MCSP) desenvolveu
um modelo de sistema de qualidade no
atendimento que se baseia num con-
junto de princípios e de compromissos
ATENDIMENTODE QUALIDADERECONHECIDA
No contexto da Reforma dos Cuidados de Saúde Primáriosem curso têm surgido importantes iniciativas na área doatendimento e da qualidade do serviço. Impõe-se reconheceros esforços de qualidade sustentada que têm surgido nasdiferentes unidades prestadoras de cuidados que integramo universo dos Cuidados de Saúde Primários, sejam elas osainda tradicionais CS, sejam as já reconfiguradas Unidadesde Saúde Familiares. O reconhecimento das boas práticase a sua ampla divulgação é um contributo decisivo paraa melhoria dos cuidados prestados e para um aumento deconfiança dos cidadãos nas unidades prestadoras de cuidadosde saúde. Ciente da necessidade de criar os mecanismosde reconhecimento da qualidade do atendimento aplicáveisàs várias Unidades de Saúde que virão a constituir os ACES,a Missão para os Cuidados de Saúde Primários decidiuavançar desde já com a atribuição da Marca AQR no âmbitodos Cuidados de Saúde Primários (CSP).
missão38cuidados de saúdeprimários
e que gira em torno de dois eixos
estratégicos.
OS EIXOS ESTRATÉGICOSDA QUALIDADEDO ATENDIMENTO
O Sistema de Qualidade no Aten-
dimento agora criado baseia-se em
dois grandes eixos estratégicos da
qualidade no atendimento a que se
convencionou chamar de EEiixxoo ddaa
VVoozz ddoo PPrroocceessssoo e EEiixxoo ddaa VVoozz ddoo
CClliieennttee.
O Eixo da Voz do Processo junta os
tradicionais elementos de back-offi-ce com elementos do atendimento
directo no front-office. Engloba pro-
cedimentos e práticas normalizadas
baseados na lógica da abordagem
por processos, com especial relevân-
profissional de saúde que o atende.
O cidadão espera encontrar no pro-
fissional que o atende uma atitude
de interesse e compreensão. Espera
que este o aborde de forma cordial
mas ao mesmo tempo resoluta. Que
seja capaz de lhe resolver os proble-
mas rapidamente e de forma des-
complicada. O cidadão quer acima
de tudo ser atendido por alguém
capaz reagir de forma flexível e efi-
caz perante situações imprevistas,
indo ao encontro das suas neces-
sidades com verdadeiro espírito
empreendedor.
Em qualquer destes eixos se reco-
nhece o forte e imprescindível cunho
da liderança e o impacto do trabalho
em equipa.
Em qualquer destes eixos aparece,
como mandatória, a existência de
cia para os processos-chave que se
traduzem no acolhimento e na pres-
tação dos cuidados de saúde. O cida-
dão espera encontrar profissionais
competentes e procedimentos de
atendimento e de prestação de cui-
dados que não variam conforme a
pessoa que o atende. O cidadão
espera que as formalidades e os
requisitos para o atendimento sejam
apenas as estritamente necessárias e
sempre justificadas. Espera eficiên-
cia, rapidez, simplicidade de pro-
cessos, recurso a novas tecnologias
para comunicação, informação sobre
o decurso do serviço.
O Eixo da Voz do Cliente representa
sobretudo os “momentos de verda-
de” do atendimento directo do clien-
te/utente. Está centrado nas atitudes
e comportamentos que ocorrem de
cada vez que um cliente aborda o
CAPACIDADEDE RESOLUÇÃO DE
PROBLEMAS
IMAGEM ETRANSPARÊNCIA
RECLAMAÇÕES
ATITUDESE COMPORTAMENTOS
LIMPEZA, ORDEME RIGOR
MEDIDADA SATISFAÇÃO
MEDIÇÃOE MONITORIZAÇÃO
MEDIÇÃOE MONITORIZAÇÃO
ABORDAGEMPOR
PROCESSOS
PRÁTICASNORMALIZADAS
EFICIÊNCIA
PRESTAÇÃODO SERVIÇO
REQUISITOSLEGAIS
AUDITORIASINTERNAS
IND
ICA
DO
RES
IND
ICA
DO
RES
EIXO 1VOZ
DO PROCESSO
MARCADE QUALIDADE NO
ATENDIMENTO
EIXO 2VOZ
DO CLIENTE
missãocuidados de saúde 39primários
compromissos e indicadores que
permitam avaliar objectivamente o
seu cumprimento.
OS COMPROMISSOS
A MARCA AQR baseia-se na verifi-
cação objectiva do cumprimento dos
compromissos estabelecidos pela ins-
tituição candidata, e a sua atribuição
orienta-se pelo modelo AQR apre-
sentado na página anterior.
A organização candidata à Marca de
Atendimento de Qualidade Reco-
nhecida deverá formular e publici-
tar os seus compromissos de quali-
dade do atendimento.
Os compromissos de qualidade do
atendimento terão de se enquadrar
nas seguintes áreas:
• Facilidade de acesso aos serviços
• Cortesia e correcção no Atendi-
mento
• Resposta aos pedidos dentro do
prazo anunciado
• Análise e tratamento de reclama-
ções
• Avaliação da satisfação e segui-
mento de sugestões
A avaliação da performance baseia-
-se nos compromissos estabelecidos e
na existência de um painel de indi-
cadores que terão que ser formu-
lados em consonância com os pro-
cessos identificados no dossier de
candidatura e com os compromissos
formulados.
QUEM SE PODECANDIDATAR À MARCAAQR?
Qualquer Centro de Saúde ou exten-
são do mesmo, bem como qualquer
Unidade de Saúde Familiar ou outra
das unidades funcionais integra-
das nos agrupamentos de centros de
saúde (ACES).
A atribuição da Marca de Atendi-
mento Reconhecido AQR baseia-se
na apresentação de um Dossier de
Candidatura a enviar à Comissão de
Atribuição da Marca (CAM) para a
sede da MCSP, que contenha os se-
guintes elementos:
• Identificação da entidade candi-
data
• Descrição sumária da organi-
zação (pode fazer referência ou
remeter para documentos ane-
xos)
• Indicação do âmbito de aplicação
pretendido
• Identificação dos processos de
atendimento identificados de
acordo com a lógica abordagem
por processos
• Descrição ou referência aos pro-
cedimentos de organização do
atendimento
• Descrição ou referência aos pro-
cedimentos de Boa Prática – ati-
tudes e comportamentos
• Os compromissos de qualidade
do atendimento
• O painel de indicadores adopta-
dos e os resultados da sua moni-
torização nos últimos seis meses.
A análise das candidaturas e decisão
de atribuição da Marca baseiam-se
no Regulamento de atribuição da
Marca AQR publicado pela MCSP e
que pode ser consultado em:
www.mcsp.min-saude.pt
A METODOLOGIADE AVALIAÇÃO
A metodologia de avaliação baseia-se
em dois tipos de avaliação externa
e na evidência de cumprimento do
painel de indicadores. A avaliação
externa consiste numa auditoria aos
processos e procedimentos do aten-
dimento e da prestação do serviço.
O outro tipo de avaliação externa é
uma visita de “cliente-simulado” que
simula um atendimento. Na audi-
toria externa aos processos serão
avaliados os documentos produzidos
pela organização candidata e veri-
ficada em sede de auditoria a sua
efectiva implementação conforme.
Na análise dos procedimentos/nor-
mas internas será avaliada a forma
como a organização traduz em orien-
tações internas os compromissos de
qualidade do atendimento estabe-
lecidos. Serão ainda entrevistados os
colaboradores em todas as áreas com
impacto directo no atendimento. Os
indicadores que demonstram a efi-
cácia da gestão dos processos de
atendimento e de realização do ser-
viço serão avaliados tendo em conta
as regras atrás enumeradas. Em
ambos os casos serão sempre tidos
em conta os compromissos de qua-
lidade do serviço e do atendimento
declarados pela organização. Na
visita “cliente-simulado”, que decor-
re sem ser previamente anunciada,
serão avaliadas as atitudes e com-
portamentos. Será também avalia-
da a envolvente do local de atendi-
mento.
A Comissão para a Atribuição da
Marca (CAM), a criar no âmbito da
MCSP, é a entidade que aprova – de
acordo com critérios bem estabe-
lecidos – os avaliadores, e superin-
tende a conformidade de todo o
processo de avaliação e atribuição da
Marca. missão40cuidados de saúdeprimários
ETAPAS A PERCORRER
EETTAAPPAA 11 EE 22 – A Comissão para a
Atribuição da Marca AQR (CAM)
analisa o dossier de candidatura e
decide sobre as condições de ele-
gibilidade. Uma vez reunidas as con-
dições, inicia-se o processo de mar-
cação das auditorias.
EETTAAPPAA 33 EE 44 – Realização da audi-
toria externa aos processos por uma
equipa de auditores nomeados pela
Comissão para a Atribuição da Mar-
ca de entre os avaliadores ou audi-
tores qualificados da Bolsa de Audi-
tores da MCSP. As auditorias rea-
lizam-se de acordo com uma lista de
comprovação de auditorias apro-
vada pela Comissão para a Atri-
buição da Marca AQR . Da auditoria
externa aos processos de atendi-
mento será elaborado um relatório
com as constatações da auditoria e
um eventual pedido de acções cor-
rectivas. A visita “cliente-simulado”
terá lugar de forma não anunciada.
haver um processo de recandida-
tura.
Durante os dois anos de vigência da
utilização da Marca haverá um
acompanhamento caracterizado por
uma visita “cliente-simulado” semes-
tral e por uma auditoria externa de
acompanhamento anual.
CENTROS DE SAÚDEJÁ MANIFESTARAMO INTERESSEPELA MARCA AQR
Vários Centros de Saúde manifes-
taram já à MCSP a sua intenção de
se candidatarem a esta marca, ven-
do assim reconhecidos os esforços
de qualidade que têm vindo a ser
desenvolvidos e que pretendem con-
tinuar a fazer crescer consisten-
temente, convictos de que a Marca
AQR é um bom impulso para a me-
lhoria contínua da qualidade nos ser-
viços de saúde. q
EETTAAPPAA 55 – A Comissão para a Atri-
buição da Marca analisa todo o pro-
cesso e, no caso de ter havido pe-
didos de acção correctiva/acções de
melhoria analisa a consistência das
mesmas. Após esta análise será to-
mada a decisão de atribuição ou não
da Marca de Atendimento de Qua-
lidade Reconhecida AQR.
EETTAAPPAA 66 – A decisão de atribuição
da Marca é comunicada à entida-
de candidata e é-lhe entregue a De-
claração AQR que comprova esta
atribuição bem como o galardão
AQR que deve ser afixada bem como
o conjunto de compromissos de qua-
lidade do atendimento com que
a entidade se comprometeu. A enti-
dade candidata fica assim autoriza-
da à utilização do símbolo AQR nos
seus documentos internos e meios
de divulgação, no âmbito em que fôr
concedida.
A atribuição da Marca tem o prazo
de dois anos, findos os quais tem de
ETAPA 1
ENVIODO DOSSIER
DE CANDIDATURAPARA MCSP
ETAPA 2
VERIFICAÇÃODAS CONDIÇÕESDE ELEGIBILIDADE
DACANDIDATURA
ETAPA 3
PREPARAÇÃODA
AUDITORIAINTERNA
ETAPA 4
REALIZAÇÃO DAAUDITORIA EXTERNAE VISITA DO “CLIENTE
SIMULADO”+
RELATÓRIO PARAAUDITADOS
+ANÁLISE DAS
RESPOSTAS E PLANOSDE ACÇÕES DE
MELHORIA
ETAPA 5
EMISSÃODE PARECER
EAPRECIAÇÃO
DA COMISSÃODE ATRIBUIÇÃO
DA MARCA(CAM)
ETAPA 6
ATRIBUIÇÃODA MARCA
E REGISTO
NACIONALDAS ENTIDADES
COM MARCAATRIBUÍDA
AS 6 ETAPAS PROCESSUAIS PARA ATRIBUIÇÃO DA MARCA
ENTIDADECANDIDATA
CAM EQUIPAAVALIADORES
EQUIPAAVALIADORES
CAM MCSP
missãocuidados de saúde 41primários
OInstituto Nacional de Administração (INA), em articulação com a Missão para os Cuidados de
Saúde Primários (MCSP), vai iniciar três Programas de formação na área da Gestão de
Unidades de Saúde para dirigentes dos Agrupamentos de Centros de Saúde (PACES), no
âmbito de um consórcio alargado a outros parceiros, como por exemplo a Escola Nacional
Saúde Pública (ENSP-UNL), a Escola de Gestão do Porto (EGP-UP) e o Instituto de Direito
das Empresas e do Trabalho (IDET).
Esses Programas PACES visam contribuir não só para a mudança na organização dos Cuidados
de Saúde Primários com o desenvolvimento de novas lideranças e a adopção de atitudes e
comportamentos adaptados a uma realidade cada vez mais dinâmica, mas também para o
desempenho de um papel prevalente nos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) no que
respeita ao desenvolvimento e gestão de projectos, à gestão e à potenciação do trabalho
de equipa, e à optimização dos sistemas de informação.
Estão agendados três Programas PACES distintos, de acordo com os seus destinatários.
O primeiro Programa a ser realizado será o Programa PPAACCEESS –– DDIIRREECCTT, com início
previsto para Novembro de 2008 e conclusão em Outubro de 2009. Este
programa está ajustado aos objectivos distintos e às funções de Director
Executivo dos ACES e inclui sobretudo áreas de estratégia, de gestão de topo
e de liderança. É constituído por 400 horas de formação, 220h das quais
presenciais, 120h tutoriais e 60h de trabalho colaborativo e de e-learningO outro Programa, PPAACCEESS –– TTEEAAMM, destina-se aos quatro membros que
constituem o Conselho Clínico dos ACES. Abordará sobretudo áreas de
trabalho de equipa multidisciplinar, de governação clínica, de
gestão de projectos e gestão operacional.
Está previsto realizar-se de Janeiro a Setembro de 2009 e dura
cerca de 200h, com uma distribuição horária semelhante ao
Programa PACES – DIRECT.
Finalmente o PPAACCEESS –– UUAAGG destina-se aos
elementos coordenadores das
Unidades de Apoio à Gestão,
UAG, e decorre também de
Janeiro a Setembro de 2009
com uma duração de cerca
de 200h. q
missão42cuidados de saúdeprimários
PACESProgramas Avançados em Gestão, Governação Clínica,Liderança e Tecnologias de Informação para Dirigentesdos Agrupamentos de Centros de Saúde