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MISTÉRIO

DA MEIA-NOITE

Evaí Oliveira

Mistério da Meia-Noite

Evaí Oliveira

Contato: [email protected]

Copirraite © Evaí Oliveira, 2016

Caro leitor,

É com muita satisfação que lhe apresento o

primeiro conto da série Aventuras Misteriosas em que

Érique, Carla e Alana vão passar o final de semana em

um sítio na zona rural de Nova Corinto e se deparam

com um lobisomem que ronda o lugar.

No decorrer desta história, você terá informações

sobre as versões de uma mesma lenda folclórica além

de outras questões como as datas móveis das

celebrações da Igreja Católica.

Boa leitura!

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MISTÉRIO DA MEIA-NOITE

oucos dias depois do início da quaresma, Alana,

estudante do primeiro ano do Ensino Médio,

convidou seus amigos e colegas de classe,

Érique e Carla, para passarem o final de semana no sítio

que sua tia, Júli, acabara de comprar para morar com

sua filha Natália. Esse sítio não fica muito longe da

cidade de Nova Corinto, mas os antigos donos não

revelaram o motivo pelo qual a propriedade foi vendida,

só disseram que teriam que sair daquele lugar

assombrado o mais rápido possível. Júli, que não é

supersticiosa, preferiu acreditar que ladrões estavam

tentando assustá-los para roubar objetos de valor do

sítio.

No terreno, há um sobrado, de dois andares,

rodeado por várias árvores frutíferas, um poço de água

subterrânea e uma horta com uma vasta variedade de

verduras e legumes. Por ser uma propriedade afastada

da cidade, os vizinhos mais próximos moram a mais ou

menos um quilômetro de distância. Mas há energia

elétrica e sinal de celular, que fica caindo o tempo todo

impossibilitando o acesso à internete. A paz impera

acompanhada dos cantos dos pássaros.

Nas proximidades do sítio, existe uma enorme

mata, praticamente fechada, com vários animais

quadrúpedes e rastejantes, que, às vezes, tentam

ultrapassar as cercas proteção da casa, e um riacho,

P

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que nasce em uma cachoeira, com muitas espécies de

peixes, que passa por dentro do terreno do sítio, a uns

15 minutos da casa, andando.

No final da tarde de sexta-feira, um carro deixou

os visitantes na frente do portão de entrada do sítio.

Pendurada na estrutura de madeira que cobria o portão,

de duas partes de madeira, havia uma placa, também de

madeira, com o nome da propriedade entalhada: Sítio

Lua Cheia.

Érique é alto, 1,75m, moreno claro, usa óculos de

descanso. Carla, 1,60m, é loira de olhos azuis e com

cabelos na altura dos ombros. Alana, 1,65m, é meio

ruiva de pele clara e um pouco medrosa. Os outros dois

são mais decididos e destemidos, só acreditam no que

veem.

Eles seguiram pelo caminho de pedras, de 100

metros que levava à frente da casa. As anfitriãs, Júli e

Natália, estavam na frente da casa, embaixo de uma

goiabeira, que por sinal tinha muitas frutas maduras. Júli

aparenta estar na faixa dos quarenta anos, mas diz que

não passa dos 30, é morena de cabelos compridos e

ondulados. Natália é morena, 1,60m, cabelos compridos,

tem uma personalidade mais atrevida e controlada, e

assim como a sua prima, Alana, tem a mesma idade dos

visitantes: 16 anos, e foi matriculada na mesma turma,

isso porque sua mãe, Júli, fez uma encenação digna de

um óscar para conseguir uma vaga na mesma escola.

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Depois dos cumprimentos, os visitantes pegaram

goiabas dos galhos mais baixos e seguiram para dentro

de casa.

– Vocês já fizeram bananada com essas goiabas?

– Brincando, perguntou Érique.

– Não estamos no Sítio do Picapau Amarelo,

Gilberto Gil! – Respondeu Natália, rindo.

– Não perco a chance de ouvir as músicas de Gil,

e dos outros tropicalistas.

– Também gosto deles e de todos da MPB. As

músicas são sempre atuais e nunca são esquecidas.

– A propósito, achei interessante o nome daqui:

Sítio Lua Cheia. Foi você quem escolheu, tia? –

Questionou Alana.

– Realmente a MPB é incomparável. Tenho

vários discos, CDs, DVDs de vários cantores. E

respondendo à sua pergunta, Alana: não, a escolha foi

dos antigos donos, na época da construção dessa casa.

Se não me engano, este final de semana será de lua

cheia. Quando a lua aparecer, vou mostrar a vocês o

motivo do nome deste sítio. Agora subam para guardar

as mochilas. Quem quiser tomar banho, o banheiro fica

na área de serviço.

Enquanto os meninos foram guardar as bolsas no

andar superior da casa, Júli foi preparar o jantar. Pouco

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tempo depois de Natália levá-los para conhecerem os

quartos, desceram e foram andar debaixo das

mangueiras nos fundos da casa. O chão, ao redor da

casa, é coberto por uma grama bem verde e conservada.

Seguindo a fileira de mangueiras, ao lado da área de

serviços, nos fundos, havia duas placas fotovoltaicas,

medindo aproximadamente três metros quadrados, cada,

apoiadas em uma espécie de pilastra de aço de 1,50m

de altura.

Ao se aproximarem dos painéis, Natália disse que

eram as placas de energia solar que eles já tinham visto

nos livros, e em fotos, mas nunca pessoalmente. No sítio,

a energia elétrica é usada pelos aparelhos que mais

consomem energia, como máquina de lavar, aparelhos

de som e de DVD, computador, televisores e geladeira.

Já a energia solar é usada pelos eletrônicos que menos

consomem, como lâmpadas, bomba de água e outros.

Como se sabe, a irradiação solar é captada pelas células

fotovoltaicas que transformam o calor em energia e

carregam baterias, que permanecem carregadas por

determinado tempo, a depender da capacidade de

absorção das placas.

O sol estava quase desaparecendo atrás das

árvores que faziam enormes sombras no quintal. Os

meninos aproveitaram a belíssima paisagem para tirar

várias fotos próximos às árvores e debaixo delas. Logo

que não havia mais a luz do sol, enquanto um tomava

banho, os outros tiravam mais fotos, dessa vez, dos

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periquitos que pousaram nas goiabeiras da frente da

casa. Até gravações foram feitas desses pássaros

bicando as goiabas e emitindo seu canto admirável.

********************

Enquanto jantavam, os meninos comentaram

sobre o recesso de Semana Santa. Com isso, Júli disse

que não sabia por que cada ano era em uma data

diferente. Alana deu uma explicação bem sucinta.

– Tia Júli, veja só, a Semana Santa começa no

Domingo de Ramos e acaba no domingo de Páscoa. A

questão se refere à data da Páscoa, que assim como

outras celebrações da Igreja Católica, é móvel. Já ouviu

falar do imperador romano Constantino? Então, no ano

325 depois de Cristo, Constantino convocou o Primeiro

Concílio de Niceia, para tratar de algumas questões

relacionadas ao cristianismo. Nesse concílio, foi

determinado que a Páscoa cristã seria celebrada no

primeiro domingo depois da Lua Cheia que ocorre após

o equinócio de primavera no Hemisfério Norte, isso entre

21 de março e 25 de abril. Aqui no Hemisfério Sul, nessa

data ocorre o equinócio que marca o início do outono,

período em que as noites são mais longas que os dias.

Carla estava sentada ao lado de Júli. Levantou-

se e pegou o calendário que estava pendurado na

parede e mostrou a ela.

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– Vamos ver... aqui... Neste ano de 2016, o

outono se inicia no dia 21 de março. A primeira lua cheia

depois dessa data será no dia 23, uma quarta-feira.

Certo? O próximo domingo é dia 27 de março: Domingo

de Páscoa. Isso faz com que todas as comemorações

relacionadas também mudem de data.

– Como o Carnaval e a Quaresma?

– Exatamente. Sabendo da data da Páscoa, 27

de março, é só voltar 47 dias e teremos a terça-feira de

Carnaval no dia 9 de fevereiro. Obviamente, a

Quaresma começa um dia depois, na Quarta-feira de

Cinzas, dia 10 de fevereiro e acaba um domingo antes

da Páscoa, no Domingo de Ramos, dia 20 de março.

– Hum... O carnaval de 2017 será em 28 de

fevereiro. Então a Semana Santa será em abril?

– Sim. 47 dias depois. A Páscoa será... deixe-me

ver... acho que no dia 16 de abril. E a lua cheia será entre

os dias 10 e 15 de abril, possivelmente, mas precisaria

de um calendário com as fases da lua, para ter certeza.

Não é mais ou menos isso, Érique?

– Historiadoras, geógrafas, matemáticas... Como

você são sabidas. Só faltaram falar que a Páscoa cristã,

que celebra a ressurreição de Cristo, seguia, vamos

dizer assim, a Páscoa judaica, que celebra a libertação

dos hebreus do Egito para a Terra Prometida. Como o

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calendário judaico era baseado na Lua, no cristianismo,

a data passou a ser móvel também.

********************

Depois do jantar, Júli os convidou para segui-la à

varanda do andar superior, levando, com a ajuda de

Natália, uma garrafa de café com leite e um pote de

biscoitos de sal.

Na varanda, há uma mesa de centro de madeira,

um banco antigo e três cadeiras de plástico nos quais

todos se acomodaram. A leve brisa da noite tornou o

momento mais agradável e fresco. Nessa noite de sexta-

feira, a enorme lua cheia iluminava a varanda e uma

parte do quintal em que as sombras das árvores não

conseguiam cobrir.

– Respondendo à pergunta de hoje de tarde sobre

o nome do sítio: Lua Cheia. Esse sítio foi comprado em

um período de lua cheia. Em algumas estações do ano,

como acontece no outono, a lua cheia aparece bem

grande, como se fosse só para o sítio, que fica iluminado

como se fosse dia.

Já passava das 10 horas da noite. Da varanda,

era possível ver uma casinha atrás de algumas árvores

fora da cerca do sobrado, há uns quatrocentos metros

de distância.

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Curioso, Érique perguntou e a resposta veio de

Júli.

– Vejam ali! Quem mora naquela casa?

– É a casa do empregado do sítio. Ele mora aqui

há um bom tempo, desde a época dos antigos donos.

– O que ele faz?

– Bem... Colhe as verduras, os legumes e as

frutas para entregar aos compradores, verifica o sistema

de irrigação da horta, separa os ovos das galinhas, para

vender, as alimenta e tira leite das vacas. Mas os donos

anteriores venderam quase todas as galinhas e só

restou uma vaca leiteira. Ele é muito agradável.

– Só acho que há alguma coisa muito estranha

acontecendo aqui. Aqueles dois não venderiam esse

paraíso se não tivesse medo de alguma coisa. Ou de

alguém.

– Não há do que ter medo, Natália.

Provavelmente, tentaram roubar o sítio e eles decidiram

se mudar para a cidade. Foi uma pena eles terem se

mudado daqui.

Os visitantes se serviram e ficaram observando a

conversa.

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– Meninos, não deem ouvidos. Ela é tem uma

imaginação muito fértil. Agora cismou que há um

lobisomem rondando o sítio...

Érique interrompeu a conversa indicando que não

acreditava naquele ser fantástico.

– O lobisomem não passa de uma lenda que veio

da Europa, no século XVI com os portugueses que

colonizaram o Brasil.

E foi apoiado por Alana e Carla.

– Vejam só! Por que os lobisomens só aparecem

na quaresma? Eu mesma respondo: Porque é uma

lenda apoiada pela Igreja.

– Exatamente! Só não posso afirmar que a Igreja

criou a lenda. Mas a nossa querida instituição religiosa

sempre educou, entre aspas, as pessoas através do

medo.

– E os próprios padres diziam que os pais tinham

que batizar seus filhos, porque os lobisomens gostavam

de atacar bebês pagãos.

– Pelo que sei, essa lenda pode ter sido originada

na Europa, como Érique disse, pois a mitologia da

Grécia Antiga faz referência ao licantropo, um ser

lendário. De acordo com os mitos, um homem pode se

transformar em lobo em noites de lua cheia e só volta ao

normal pouco antes de o dia amanhecer.

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Lembrando-se das aulas de História, Érique

mencionou vagamente o mito grego do lobisomem.

– Se não me engano, o rei da Arcádia ofereceu

um sacrifício a Zeus, que o transformou em lobo.

Júli concorda em partes com o que ouve, seguida

por Érique e Carla.

– As pessoas mais velhas afirmam que existe e

algumas, até que já viram ou foram atacadas. Certo que

é uma lenda, mas alguma coisa pode ter feito essas

pessoas acreditarem na existência do tal lobisomem,

como um possível ladrão, para assustar. Eu mesma não

acredito.

– É cientificamente impossível um homem sofrer

uma transformação dessa forma.

– Isso só acontece na ficção e na imaginação das

pessoas supersticiosas.

– O empregado disse que já viu um lobisomem

aqui. E me confessou que esse foi o motivo da venda do

sítio. Ele também me disse que na quaresma passada,

um dia, a horta amanheceu toda pisada, várias galinhas

espedaçadas, marcas de garras na porta do fundo e o

que o bicho entortou o suporte do painel de energia solar.

Natália entrou na conversa relatando alguns fatos

recentes.

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– Não foi só na quaresma passada. Como

explicar, mãe, o barulho no galinheiro anteontem de

madrugada?

– Pode ter sido alguma raposa.

– E aqueles pelos nos fios de arame na cerca lá

perto do riacho?

– Pode ter sido a mesma ou outra raposa

tentando atravessar a cerca para atacar as galinhas.

– Não me convenceu. Nunca vi raposa de pelo

escuro.

Ouvindo aquelas suposições, Alana ficou

tentando não acreditar nas insinuações feitas por Natália.

– Você quer dizer, Natália, que há um lobisomem

rondando a casa?

– Alana, não sei mais em que acreditar. Mas

alguma muito estranha está acontecendo aqui.

No decorrer da conversa, Érique falou que a lenda

se refere à metamorfose em lobo em noites de lua cheia,

não necessariamente na quaresma. Alana e Carla

comentaram sobre as versões da lenda seguidas por

Natália e Júli.

– Isso mesmo. Uma versão diz que um homem foi

mordido por um lobo em uma noite de lua cheia. E

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depois disso, o homem desenvolveu a capacidade de se

metamorfosear em lobo, com traços humanos, em noites

de lua cheia.

– Outra diz que se uma mulher tiver seis filhas,

engravidar outra vez e o sétimo filho for menino, esse se

transformará em lobisomem.

– E dizem que se uma pessoa foi mordida por um

lobisomem, passa a se transformar também.

– Minha avó dizia que o oitavo filho de uma

sequência de sete filhas se teria a sina de se transformar

em lobisomem à meia-noite de sexta-feira em uma

encruzilhada e tinha que voltar ao mesmo lugar para se

destransformar. As transformações começam a ocorrer

a partir dos 13 anos de idade e tinha que percorrer sete

cemitérios antes de voltar ao normal. E só seria possível

matá-lo acertando-o com uma bala de prata.

O relógio marcava quase 23:30. Em meio a tantas

histórias de lobisomens, não sobrou nem uma gota de

café e o pote de biscoitos estava vazio. Todos foram

para seus dormitórios, que ficam no andar superior da

casa. Júli foi para o seu quarto, Alana e Carla seguiram

para o quarto de Natália e Érique foi para outro quarto,

ao lado do das meninas, dormir sozinho.

********************

17

Por volta da meia-noite, Alana disse ter ouvido

pisadas no lado da casa. Carla e Natália afirmaram não

terem ouvido nada. Elas se ativeram ao silêncio da noite

e também tiveram a impressão de ouvirem passos

pesados indo para os fundos da casa. As três se

levantaram, com a luz apagada e foram, nas pontas dos

pés, para a janela de guilhotina que estava aberta para

entrar o vento suave da noite.

Os galhos de algumas árvores dos lados da casa

estavam na altura do andar superior. Por causa disso e

das sombras criadas pelas árvores maiores, não era

possível ver o que passava por baixo. Só se poderia ver

se fosse dia. Não se ouviam mais as pisadas. Mesmo

sem ver nada, elas sussurraram alguma coisa. Em

seguida, ouviram o barulho da porta do galinheiro sendo

arrombada e as galinhas começaram a gritar. Alana e

Natália ficaram pasmadas, mas Carla ainda continuou

cética.

O quarto em que Érique estava tinha janelas

viradas para os fundos, onde fica o galinheiro. Quando

ouviu os passos pesados, também, com as luzes

apagadas, foi para a janela. Mesmo com as sombras das

árvores, viu um vulto preto derrubando a porta e

entrando no galinheiro e ouviu o barulho feito pelas

galinhas.

Era algo parecido com um animal andando nas

patas traseiras e aparentemente peludo. A silhueta era

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um pouco mais alta e mais forte que a de um homem

normal. Enquanto tentava não acreditar no que poderia

estar vendo, um possível lobisomem, olhou para a porta

do quarto e viu a câmera digital em cima da mochila.

Correu para pegá-la e voltou para a janela. Ligou e

começou a tirar fotos com flash com o intuito de atrair a

atenção do ser.

Vendo os reflexos dos flashes, as meninas foram

para o quarto de Érique a passos rápidos, mas sem fazer

barulho, pois Júli estava dormindo e elas não queriam

acordá-la. Poucos segundos depois, o vulto saiu

correndo pela única porta do galinheiro, seguindo para

os lados do riacho. As meninas afirmaram terem visto o

focinho e as garras, mas Érique estava acompanhando

pela tela da câmera e só conseguiu ver um bicho peludo.

A claridade da câmera não alcançou o monstro e em

todas as fotos só se podia ver um vulto mais escuro meio

distorcido.

Depois desse fato, as meninas voltaram ao quarto,

em silêncio, e todos foram dormir. Natália e Alana

estavam meio assustadas, mas Érique e Carla

continuavam sem querer acreditar no que seus olhos

viram. Nesse momento, o relógio marcava 00:40.

********************

No dia seguinte, sábado, desceram cedo para a

sala de estar, antes das 7h. Júli se levantou para

preparar o café da manhã e ao se aproximar da escada

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ouviu uma miniconfusão na sala. Ela desceu

perguntando o motivo da gritaria. Os meninos

responderam ao mesmo. Já ao lado do sofá, Júli pediu

silêncio e perguntou de novo. Mais uma vez, os quatro

falaram ao mesmo tempo.

– Chega! Não quero saber mais.

– Espere, mãe! Vamos falar um de cada vez.

– Tudo bem! Pode começar, Érique?

– Claro! Ontem, à noite, nós vimos um

lobisomem...

– Foi mesmo, tia Júli. As orelhas eram enormes.

– Eu fiquei arrepiada!

– Vocês são muito criativos! Já pensaram em

escrever contos de seres fantásticos?

– Veja esta foto que consegui tirar com a minha

câmera!

– Deixe-me ver... Só estou vendo uma parede e

algumas árvores.

– Olhe aqui... Esse vulto preto...

– Ah! A sombra de uma árvore.

– Mãe, ele entrou no galinheiro...

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– Você não ouviu a gritaria das galinhas?

– Não ouvi nada. Tenho o sono pesado. Mas

mesmo assim...

– Vamos lá fora, tia, para você ver com seus

próprios olhos.

– O lobisomem que vocês viram está lá fora?

– Não. Mas os estragos sim.

– Eu vou só para provar que vocês estão tentando

me pregar uma peça.

– Então, vamos!

Quando saíram pelo fundo, viram a porta do

galinheiro encostada na parede pelo lado de fora. Dentro,

havia penas e pedaços de algumas galinhas espalhados

para todos os lados. Érique estava tirando fotos com sua

câmera e, enquanto Júli e as meninas olhavam o que

sobrou do galinheiro, chegou o empregado.

– O que aconteceu aqui?

– Agora acredita em nós?

– Deve ter sido alguma raposa...

– Uma raposa que consegue derrubar uma porta

de madeira?

21

– O que nós vimos tinha quase dois metros de

altura. Não parecia nada com uma raposa. Sem falar

que saiu correndo de dois pés e não de quatro patas...

Acho que alguém está fazendo isso, pois esse ser

fantástico não existe.

– Dona Júli, as crianças podem estar falando a

verdade. Quando ouvi as galinhas gritarem, saí para ver

o que era. Cheguei perto da cerca e vi o lobisomem

derrubando a porta do galinheiro. Depois o bicho saiu

correndo e uivou lá embaixo. E não era uma pessoa, era

um lobisomem mesmo! Daí voltei correndo para casa e

me tranquei. Quando amanheceu, vim aqui, a porta

estava meio solta. Tirei e coloquei encostada na parede.

A senhora viu a situação do galinheiro?

– Adolescentes! Somos adolescentes e não

crianças.

– Que seja... Pode ter sido algum ladrão que

derrubou a porta e depois entrou alguma raposa e

atacou as galinhas...

– Nós vimos tudo pela janela. Não apareceu

raposa nenhuma.

– Enquanto vocês ficam aí falando que viram uma

pessoa fantasiada ou um ser fantástico, eu vou preparar

o café da manhã.

22

Depois que Júli foi para a cozinha, o empregado

disse aos meninos que há alguns dias ouviu o bicho

uivando perto do riacho e desde que ele veio trabalhar

no sítio, todos os anos, na quaresma, o lobisomem

aparece nos arredores da casa. Disse também que no

ano passado, o monstro tentou invadir a casa e deixou

as marcas das garras na porta dos fundos. Esse foi o

principal motivo pelo qual os antigos donos venderam a

propriedade.

– Bem... A porta da cozinha está fechada e não

estou vendo marca nenhuma.

– Menino, na semana seguinte ao ataque me

mandaram comprar e colocar outra porta. A arranhada

está no depósito, eu mesmo a guardei lá. Agora eu tenho

que ir até a cidade.

********************

Poucos minutos depois, Júli chamou os chamou

para tomarem o café da manhã. Depois do café, Júli

colocou um CD de músicas selecionadas da MPB no

som – a primeira a tocar foi Planeta Sonho de Milton

Nascimento – e dividiram as tarefas de casa com as

meninas. Érique foi pegar algumas mangas para fazer

suco para o almoço.

********************

23

Após colocar as frutas em cima da pia, pegou a

câmera e voltou ao galinheiro para tirar fotos da porta

arrancada, isso porque só tinha fotografado a parte de

dentro. Ainda com a câmera, seguiu para o lado da casa

por onde o lobisomem passou, mas só se podia ver a

grama amassada. Mesmo assim, tirou algumas fotos,

para analisar melhor.

Neste momento, ele se lembrou de que o

empregado disse que a porta arranhada estava no

depósito e foi até lá. A porta estava encostada na parede

de fundo. Tinha cinco riscos quase do mesmo tamanho

na parte de cima e na parte de baixo. Ao ver as marcas

de possíveis garras, achou-as estranhas e chamou

Carla, que estava na cozinha.

– Ei! Carla! Venha ver isso aqui.

– Venha ver isso aqui... Por favor!

– É a porta que o empregado disse que tinha sido

arranhada...

– Nossa! Eu acho que algum espertinho está se

fazendo de lobisomem para ficar com esse sítio.

– Eu acho a mesma coisa. Mas quem estaria

fazendo isso?

– Não sei quem. Mas nós vamos descobrir.

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– Olhe essas marcas na porta. Se eu imitar garras

com as minhas mãos, assim, as marcas dos polegares

estariam mais afastadas dos outros dedos. E outra coisa:

as marcas dos polegares começariam um pouco mais

abaixo dos outros dedos. E essas aqui não. São todas

quase do mesmo tamanho.

– Você tem razão. Parece que essas marcas

foram feitas com alguma coisa...

– Com uma foice, talvez?

– Se tivesse usado uma foice, as marcas seriam

mais profundas e desordenadas.

– Fui lá no lado em que vimos o ser passar, para

ver se eu conseguia encontrar marcas de sapatos, mas

a grama não colaborou.

Do outro lado do depósito, estavam amontoadas

várias ferramentas. Carla, ao vê-las, chegou mais perto

e pegou uma, em especial.

– Érique, você sabe para que serve um ancinho?

– Para juntar galhos e folhas secas...

– Você conseguiria arranhar uma porta com isso?

– Dê-mo aqui...

– Dê-mo! Estou vendo que alguém sabe usar a

ênclise...

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– Gracinhas à parte, vamos colocar os dentes do

ancinho em cima das marcas da porta... Está vendo?

Encaixa como uma luva. É obvio que os arranhões foram

feitos com esse ancinho. Pegue a minha câmera e tire

fotos.

– Temos que mostrar isso às meninas.

– Vamos pensar em uma forma de pegar esse

falso lobisomem.

– Isso. Depois do almoço, chamaremos Alana e

Natália para irmos ao riacho. Lá, a gente faz uma

reuniãozinha para encontrar uma forma de capturar

esse espertinho.

– Certo. Vou pensar em algo.

********************

Após o almoço, os meninos foram ver a cachoeira,

da qual nasce o riacho. Eles aproveitaram para admirar

a nascente do riacho com a bela paisagem natural

enquanto se sentaram em círculo embaixo de uma

mangueira, às margens da cachoeira, para comentar o

caso.

– Então, meninas... Natália e Alana, eu trouxe a

minha câmera para vocês verem essas fotos. Hoje, de

manhã, enquanto vocês estavam arrumando a casa, eu

fui investigar o caso. Olhem essas marcas de garras na

porta que o empregado falou que tinha trocado!

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Combinam com os espaços dos dentes do ancinho que

Carla encontrou no depósito.

– Eu sempre achei que havia alguma coisa errada

com a venda do sítio. Minha mãe disse que os antigos

donos não disseram por que queriam se mudar. Até o

empregado acredita nessa história de lobisomem. Mas

ele nunca se mudou daqui.

– Talvez ele não tenha para onde ir. Temos que

criar um plano para capturar seja lá quem for.

– Érique tirou fotos do lado por onde vimos o

monstro passar. Eu fui ver também, mas, infelizmente,

não ficaram rastros na grama que dessem para

identificar. Não dá para saber se os rastros foram

deixados por sandálias ou sapatos.

– Também olhei, Carla, ficou na mesma. A

propósito, Natália, ontem, você falou algo sobre os pelos

presos em fios de arame, se não me engano.

– Bem lembrado, Alana, na volta, mostrarei a

vocês onde foi. Mas não estão mais lá. O vento deve ter

levado.

Poucos minutos depois, ao som suave da queda

d’água, surgiram as primeiras ideias através de Carla e

Érique.

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– Já sei! Hoje, a noite é de lua cheia. Se ele veio

ontem, é possível que venha hoje também. Vamos nos

dividir e pegá-lo de surpresa...

– Tenho um plano! Vamos formar duplas: Eu e

Carla ficamos no meu quarto, Alana e Natália ficam no

quarto de vocês. Assim, quando ele aparecer, a gente

desce vai atrás dele. A noite vai ter lua cheia e tudo pode

acontecer!

– Temos que estar preparados com algo para

amarrá-lo. Acho que vi uma corda no depósito. Se ela te

chamar e quiser te amar, você vai, Pepeu Gomes!

Ouvindo aquilo, Natália e Alana começaram a

trocar olhares indiferentes.

– Um momento! Vocês não acham isso meio

perigoso?

– E se ele tiver uma arma? Eu acho que isso não

vai dar certo.

Carla e Érique, ao perceber que as duas não

gostaram da ideia, tentaram contornar a situação.

– Meninas, deixem de ser covardes!

– Digo o mesmo que Érique. Além do mais, se ele

tivesse uma arma, já teria invadido a casa e ameaçado

Júli e você, Natália.

28

– E o empregado também...

– Como Júli tem um sono pesado, vamos esperá-

la dormir para colocar o nosso plano em ação. Estão

comigo?

Pelo tempo que Carla e Alana conhecem Érique,

sabem muito bem que não adiantaria ficar contra. Carla

aceitou com facilidade, pois também gosta de participar

de confusões. Já Alana ficou meio desconfiada. Como

Natália estava em minoria, teve que concordar com o

plano. Antes do pôr do sol, voltaram para casa, para Júli

não ficar preocupada com a ausência.

No caminho de volta, Érique mencionou,

rapidamente, que tinham que resolver o mistério antes

voltarem para a cidade. O ser apareceu na noite anterior,

sexta-feira, e poderia aparecer mais uma vez naquela

noite de sábado, que era a única chance de capturá-lo,

pois iriam embora no domingo à tarde.

********************

A noite chegou e a lua cheia não perdeu tempo.

Júli preparou a mesa e os chamou para jantar. Logo

após isso, por volta das 20:30, foram para a sala de estar

assistirem ao telejornal local. Em um dos intervalos

comerciais, Júli falou que iria ficar de olho no galinheiro,

para surpreender a raposa da noite anterior. Mesmo

depois do que viu, ainda prefere acreditar que foi uma

raposa. Os meninos disseram para eles não preocupar

29

que eles mesmos ficariam atentos a qualquer

movimento nos arredores da casa. Ouvindo isso, ela

para eles ficarem olhando pelas janelas, acenderem as

luzes e não saírem de casa.

********************

Já passava das 22:00. Depois que Júli subiu para

dormir, como uma pedra, Érique e Carla foram ao

depósito pegar a corda. Natália os acompanhou até a

cozinha, abiu uma das portas da parte de cima do

armário e pegou as duas lanternas que estavam

carregadas, uma para ela e Alana e a outra para Carla e

Érique. Esses dois, quando voltavam do depósito, viram

o empregado indo em direção ao galinheiro. Quando

questionaram o que estava fazendo, ele respondeu que

estava indo verificar se a porta do galinheiro estava bem

fechada, pois havia consertado à tarde, quando os

meninos tinham ido ao riacho.

Quando o empregado viu Carla carregando a

corda, perguntou o que pretendiam fazer com aquilo.

Érique respondeu que era para brincar de pular corda e

logo percebeu o olhar dele de dúvida. Com isso, Carla

disse que, na verdade, eles elaboraram um plano para

pegar o falso lobisomem, pois tinham certeza de que era

um ladrão fantasiado. O empregado disse que

acreditava que era um lobisomem de verdade, pediu

para eles terem cuidado e perguntou qual era o plano.

Érique olhou para Carla e disse que tinham que ir. No

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mesmo momento, Natália e Alana saíram e se

aproximaram deles cada uma com uma lanterna na mão.

– Não me digam que vocês vão entrar no mato

para procurar o lobisomem?

– Claro que não! Nós...

Érique interrompeu a fala de Alana e completou

dizendo que não iriam entrar em detalhes e saiu quase

escoltando as meninas faladeiras. Seguiram para a

cozinha, pois pretendiam fazer um lanche antes de

ocuparem seus postos de espiões aprendizes.

********************

Enquanto esperavam o momento de pegar o

suposto ladrão, Natália verificou mais uma vez as

baterias das lanternas e Érique dobrou a corda em

algumas partes. Faltava pouco mais de 30 minutos para

a meia-noite e os meninos subiram para os quartos.

Como o combinado, Alana e Natália ficaram no quarto

da última e Carla e Érique ficaram no quarto de visitas.

A lua cheia brilhava formosa no céu e a claridade

adentrava nos quartos pelas janelas entreabertas. Nem

as luzes nem as lanternas estavam acesas, para não

chamar a atenção e cada dupla se atinha ao menor ruído

possível. Uma vez ou outra, ouviram o som emitido pelas

corujas.

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– Estamos prestes a desvendar os mistérios da

meia-noite que voam longe...

– Que você nunca, não sabe nunca, se vão, se

ficam, quem vai, quem foi...

– Impérios de um lobisomem que fosse o homem

de uma menina tão desgarrada, desamparada se

apaixonou...

– Naquele mesmo tempo...

– Vamos parar, Carla! Hoje não é a noite do

karaokê.

– Você que começou, Zé Ramalho!

– Não tenho culpa de ter bom gosto musical.

********************

Faltavam poucos muitos para a meia-noite. De

repente, um uivo ecoou na direção do riacho. Érique e

Carla trocaram olhares de atenção e cada um se

aproximou de uma janela, com vista para os fundos da

casa.

No quarto ao lado, Alana estava apoiada no

batente da janela, com vista para a lateral da casa, com

uma mão vazio e a lanterna na outra. Ao ouvir o uivo,

assustou-se e deixou a lanterna escapar das mãos. Por

ser muito leve, a lanterna não fez barulho ao cair em

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cima da grama. Com as cabeças do lado de fora da

janela, para ver onde a lanterna tinha caído, começam a

sussurrar e terminaram a conversa com os corpos

completamente dentro do quarto.

– Muito bem, Maria Assustada!

– Acho que vamos ter que esperar sem lanterna...

– Acha nada. Você derrubou e você vai buscar.

– Sozinha? Com seja lá o que for aí fora? Nem se

eu estivesse louca!

– Tudo bem! Eu vou com você. Vamos descer

sem que Carla e Érique nos vejam.

Abriram a porta com todo o cuidado possível e

desceram as escadas nas pontas dos pés, literalmente.

Considerando que a outra dupla estava monitorando a

parte de trás da casa, as duas saíram pela porta da

frente e seguiram pela lateral até o ponto em que a

lanterna caiu.

Ao chegarem perto da lanterna, Alana se abaixou

para pegá-la e Natália, que estava logo atrás, disse que

tinha ouvido alguma coisa. Aquele lado da casa estava

escuro porque a lua se posicionava do outro lado da

casa, de modo que só iluminava uma parte dos fundos

e a outra lateral da casa. Alana, com a lanterna na mão,

só ouviu os galhos das árvores batendo na parede.

Voltaram pelo mesmo lugar, seguindo a parede, com a

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lanterna desligada. A parte da frente da casa também

estava escura, pois a lua não estava muito alta e as

árvores impediam a passagem da luz.

Como passava da meia-noite, já era madrugada

de domingo.

Quando se dirigiam à porta da frente, Natália

notou apenas dois olhos brilhantes, aparentemente, em

cima dos galhos baixos da goiabeira. Percebendo que a

amiga não viu, parou para atrair a sua atenção falando

em baixo tom.

– Ei, Alana! Veja aqueles olhos ali!

– Onde? Sim! Deve ser um gato procurando

alguma coisa para comer.

– Sei que os olhos dos gatos brilham... Mas não

temos gatos.

Alana ligou a lanterna e apontou para a goiabeira.

As duas ficaram sem voz por alguns segundos,

enquanto a lanterna iluminava não um gato, mas sim o

vulto de um ser grande e peludo, o mesmo que viram na

noite anterior e que estava a poucos metros delas.

Logo após um uivo, com gritos de medo, as duas

correram para os fundos da casa.

– Cooorre!

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– Espere por mim! Ahhh!

Segundo depois, chegaram à porta dos fundos,

da cozinha, tentaram abri-la, mas estava trancada.

Então, correram para o galinheiro e se esconderam na

parte de trás. O monstro também seguiu pela lateral da

casa, a fim de alcançá-las.

No quarto, Érique e Carla ouviram o uivo seguido

dos gritos. E, em seguida, a correria das meninas pela

lateral da casa indo em direção ao galinheiro.

– O que está acontecendo? O que elas estão

fazendo lá fora?

– E não estão sozinhas. Veja! O lobisomem está

atrás delas.

– Vamos descer lá! Pegue a corda!

Desceram a escada nas pontas dos dedos e

seguiram para a cozinha, Érique na frente com a

lanterna ligada, para não acender as luzes e Carla, que

estava seguindo a luz da lanterna, pegou a vassoura que

estava pendurada na parede atrás da porta, para

garantir. Saíram cuidadosamente com a lanterna

apagada.

********************

O suposto lobisomem viu as meninas correndo

para detrás do galinheiro e estava indo atrás delas.

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Naquele momento, o fundo da casa estava iluminado,

pois a lua ainda estava no céu, presenciando a cena.

Érique e Carla o alcançaram na frente do galinheiro e a

última chamou a sua atenção.

– Ei, bicho feio! Por que não se mete com alguém

do seu tamanho?

Ele se voltou e foi em direção aos dois e, quando

chegou perto, Carla deu uma vassourada em sua

cabeça. Em seguida, ele levantou o braço, bruscamente,

e a vassoura caiu longe. Com o impulso, Carla deu

alguns passos para trás, desequilibrou-se e caiu.

Ouvindo a voz dos amigos, Natália e Alana apareceram

e cada uma jogou uma manga no monstro. Ele fez um

barulho, virou-se para elas e avançou.

Érique segurou uma ponta da corda e jogou a

outra para Carla, que estava se levantando. Como o ser

estava indo em direção às meninas, não percebeu que

esses dois preparavam uma armadilha. Segurando as

duas pontas da corda, os dois correram na direção do

monstro, jogaram a corda por cima dele, como na

brincadeira de pular corda, e antes que tocasse o chão,

os dois pararam e puxaram a corda para trás. O pé se

prendeu na corda e ele caiu para frente.

Antes de se levantar, Alana e Natália correram e

pularam em cima de dele. Enquanto isso, Carla e Érique

deram duas voltas com a corda em seus pés. As duas

primeiras puxaram seus braços para trás e os dois

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últimos amarraram suas mãos com as pontas das

cordas.

Com todo aquele barulho, Júli finalmente acordou,

foi ao quarto de visitas e colocou a cabeça do lado de

fora. Alana e Natália estavam sentadas nas costas do

falso lobisomem, Carla estava sentada em suas pernas

e Érique estava terminando de amarrar as pontas da

corda, em pé ao lado.

– Mas que gritaria... O que é isso?

– Acordou, Bela Adormecida!

– Capturamos um lobisomem para você, tia Júli!

********************

Júli desceu e acendeu as luzes dos fundos.

– Meninos, vocês são terríveis! Até tu, Natálias?...

– Saiam de cima de mim, pestes!

– Olhem só, meninas, não sabia que seres

folclóricos sabiam falar.

– Bem, assim amarrado e com as luzes acesas,

você não parece tão assustador!

– Aposto que roubou essa fantasia de algum

teatro.

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Curiosos para saber que estava dentro da roupa,

as meninas se levantaram segurando-o, Érique puxou

as orelhas e a cabeça da fantasia saiu facilmente. Júli

ficou pasmada quando viu o rosto da criatura.

– Você? Não tem vergonha?

– Eu já suspeitava dele, mãe. Só não tinha como

provar.

– Júli, eu e Carla vimos a porta arranhada no

depósito. E as marcas foram evidentemente feitas por

um ancinho que também estava no depósito.

– Daí, ficou claro que foram feitas por alguém que

tinha acesso à casa.

– E essa pessoa só poderia ser o empregado do

sítio.

– Ele fez tudo isso, simplesmente, para que

ninguém comprasse o sítio. Assim, a propriedade ficaria

só para ele.

– Mas você, tia Júli, resolveu comprar a

propriedade. Com isso, ele continuou com os falsos

ataques de lobisomem para que vocês fossem embora.

– O ataque ao galinheiro na noite passada foi

proposital, assim como os relatos de aparecimentos de

lobisomem. Ele nos disse que também tinha visto,

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pensando que nós a convenceríamos a se mudar daqui,

para ele ficar com tudo.

– Depois que ele me viu com a corda e Carla com

a lanterna, pensou que nós sairíamos para procurar o

falso monstro no mato. Daí, ficou observando a casa

para nos ver saindo e ir logo atrás.

– Mas Alana deixou a lanterna cair pela janela e

nós duas tivemos que descer sem avisar. Ele nos viu

saindo pela frente e ficou nos esperando voltar.

– Exatamente, Natália. Ele não queria nos atacar.

Só queria que nós corrêssemos para dentro de casa.

Mas Érique e Carla apareceram e ele ficou sem saber o

que fazer.

– A propósito, e aquela vassoura com o cabo

quebrado? E essa corda?

– Júli, eu quebrei o cabo da vassoura na cabeça

dele. Será que ficou a marca?

– E eu peguei a corda no depósito.

– Mãe, eu e Alana contribuímos com duas

mangas. Acho que ele está com uma leve dor de cabeça.

– Podem desamarrá-lo, meninos. Amanhã, ou

melhor, quando amanhecer, precisamos ter uma

conversa séria, caríssimo funcionário!

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********************

Depois de desmascararem o empregado do sítio,

a turma aproveitou as últimas horas da madrugada para

dormir um pouco. No começo da tarde, voltaram para

Nova Corinto satisfeitos por terem desvendado aquele

mistério.

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