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  1 SIMULAÇÃ O DINÂMICA DO COMPORTAMENTO DE ETAR: PRINCÍPIOS E MODELOS FILIPA MARIA SANTOS FERREIRA ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO....................................................................................................... .............................................. 1  2. PRINCÍPIOS DE DESENVOLVIMENTO E FORMULAÇÃO DE MODELOS ........................................ 2  2.1. PRINCÍPIOS BÁSICOS................................................................................................................2  2.2. TRATAMENTO BIOLÓGICO POR LAMAS ACTIVADAS ................................................................6  2.2.1  Aspectos gerais....... ............................................................................................................6  2.2.2  Modelo ASM1 ......................................... ........................................... .................................8  2.2.3  Modelo ASM2 ......................................... ........................................... ...............................10  2.2.4  Modelo ASM2d ....................................... ........................................... ...............................13  2.2.5  Modelo ASM3 ......................................... ........................................... ...............................14  2.2.6  Caracterização das águas residuais e dos parâmetros e componentes dos modelos ......16  2.3. DECANTAÇÃO .......................................................................................................................18  2.3.1 Considerações gerais ....................................................................................... ................18  2.3.2 Tipos de modelos e critérios de selecção ....................................... ..................................20  2.3.3 Teoria do fluxo: princípios básicos..................................................................................21  2.3.4  Abordagem multi-camadas..................... ........................................... ...............................21  2.3.5  Modelação da velocidade de sedimentação .......................................... ...........................23  2.3.6   Modelo básico da teoria do fluxo e suas limitações............ ....................................... ......25  2.3.7   Modelos 2D e 3D....... .............................................................................................. .........27  2.4. OUTRAS OPERAÇÕES E PROCESSOS DE TRATAMENTO DE ÁGUAS RESIDUAIS .......................29 2.4.1  Modelos de biomassa fixa .................................... ............................................ ................29  2.4.2  Filtração e desinfecção por radiação ultravioleta ..................................... ......................32  2.4.3  Digestão anaeróbia ....................................... ........................................... ........................33  3. CARACTERIZAÇÃO SUMÁRIA DE MODELOS EXISTENTES ............................................................ 36  REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFI CAS ........................................................................................ ......................... 47  A  NEXO 1 - MODELOS ASM: MATRIZES DE PETERSEN E VALORES TÍPICOS DE PARÂMETROS E COMPONENTES ...................................................................................................................................51  

Modelacao ETAR-teoria V03

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    SIMULAO DINMICA DO COMPORTAMENTO DE ETAR: PRINCPIOS E MODELOS

    FILIPA MARIA SANTOS FERREIRA

    NDICE

    1. INTRODUO..................................................................................................................................................... 1

    2. PRINCPIOS DE DESENVOLVIMENTO E FORMULAO DE MODELOS........................................ 2

    2.1. PRINCPIOS BSICOS................................................................................................................2

    2.2. TRATAMENTO BIOLGICO POR LAMAS ACTIVADAS................................................................6 2.2.1 Aspectos gerais...................................................................................................................6 2.2.2 Modelo ASM1 .....................................................................................................................8 2.2.3 Modelo ASM2 ...................................................................................................................10 2.2.4 Modelo ASM2d .................................................................................................................13 2.2.5 Modelo ASM3 ...................................................................................................................14 2.2.6 Caracterizao das guas residuais e dos parmetros e componentes dos modelos ......16

    2.3. DECANTAO .......................................................................................................................18 2.3.1 Consideraes gerais .......................................................................................................18 2.3.2 Tipos de modelos e critrios de seleco .........................................................................20 2.3.3 Teoria do fluxo: princpios bsicos ..................................................................................21 2.3.4 Abordagem multi-camadas...............................................................................................21 2.3.5 Modelao da velocidade de sedimentao .....................................................................23 2.3.6 Modelo bsico da teoria do fluxo e suas limitaes.........................................................25 2.3.7 Modelos 2D e 3D..............................................................................................................27

    2.4. OUTRAS OPERAES E PROCESSOS DE TRATAMENTO DE GUAS RESIDUAIS .......................29 2.4.1 Modelos de biomassa fixa ................................................................................................29 2.4.2 Filtrao e desinfeco por radiao ultravioleta...........................................................32 2.4.3 Digesto anaerbia ..........................................................................................................33

    3. CARACTERIZAO SUMRIA DE MODELOS EXISTENTES ............................................................ 36

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ................................................................................................................. 47

    ANEXO 1 - MODELOS ASM: MATRIZES DE PETERSEN E VALORES TPICOS DE PARMETROS E COMPONENTES ...................................................................................................................................51

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    SIMULAO DINMICA DO COMPORTAMENTO DE ETAR: PRINCPIOS E MODELOS

    FILIPA MARIA SANTOS FERREIRA

    1. INTRODUO A modelao computacional de sistemas de drenagem de guas residuais, como instrumento de planeamento, projecto, anlise e operao de sistemas, teve incio sensivelmente na dcada de 1970. Desde ento, foram desenvolvidos vrios modelos destinados simulao do comportamento dos sistemas de drenagem e dos processos que ocorrem nos colectores, ETAR e meios receptores (incluindo modelao do transporte de sedimentos e da qualidade da gua), que apresentam diferentes nveis de detalhe e complexidade. Estes modelos de simulao, importantes para a adequada operao e gesto dos sistemas de drenagem urbanos (di Pierro, 2005), tm sido sobretudo desenvolvidos por diferentes equipas, com vista resoluo isolada dos problemas concretos de cada uma das respectivas componentes.

    A modelao dinmica do comportamento das estaes de tratamento visa a anlise do desempenho das ETAR, incluindo o diagnstico de eventuais problemas, e/ou o controlo e operao destas infra-estruturas (Ferreira, 2006). No caso do dimensionamento das ETAR so, em regra, utilizadas expresses empricas ou semi-empricas e mtodos tradicionais. A modelao essencial para a operao, gesto e controlo de estaes de tratamento de guas residuais, pois, de acordo com Olsson e Newell (2001), no possvel controlar o que no se entende. As metodologias de controlo mais comuns baseiam-se em abordagens do tipo feedback, em que a informao sobre o estado do processo transmitida de forma a controlar as variveis de entrada, ou do tipo feed forward, na qual se medem as perturbaes na entrada e se tomam, antecipadamente, medidas para compensar os potenciais efeitos dessas perturbaes nos processos.

    A maioria dos modelos para tratamento de guas residuais so desenvolvidos como dinmicos e determinsticos. A estrutura e complexidade dos modelos a utilizar depende dos objectivos da simulao e dos tempos de resposta dos fenmenos a modelar. Assim, os modelos destinados simulao do tratamento das guas residuais so, geralmente, desenvolvidos tendo em conta os processos unitrios preponderantes, podendo os aspectos hidrulicos serem aproximados de forma simplificada e modelados explicitamente atravs de funes de transferncia ou pelo mtodo do volume do tanque varivel (De Clercq et al., 1999). Usualmente, assumida a propagao instantnea de caudal, sendo as condies de mistura modeladas atravs de reactores de mistura completa dispostos em srie admitindo n reactores e fixando adequadamente os seus volumes, possvel simular qualquer tipo de regime hidrulico. Esta abordagem modela razoavelmente os fenmenos de adveco e de

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    disperso em decantadores, leitos percoladores e outros rgos de tratamento de guas residuais.

    A descrio matemtica dos processos unitrios compreende a especificao de grande nmero de componentes e interaces e segue, frequentemente, a matriz de apresentao das reaces proposta por Henze et al. (1987) para a simulao dinmica do comportamento de ETAR por biomassa suspensa. Para se simular o comportamento de ETAR necessrio acrescentar, igualmente, mdulos de previso da qualidade da gua associados s operaes de decantao primria e secundria.

    Ao proceder modelao do comportamento das ETAR, necessrio definir as condies iniciais em cada reactor (ou em cada um dos seus compartimentos). Como geralmente no se dispe de estimativas razoveis que as permitam definir, comum iniciar-se a simulao dinmica recorrendo a uma situao de regime permanente para condies mdias de cargas afluentes. Esta situao obtm-se atravs da aplicao de procedimentos de relaxamento (mtodos numricos utilizados para resolver equaes simultneas, adivinhando uma soluo e reduzindo os erros que resultam de sucessivas aproximaes, at que os erros sejam inferiores a um valor limite considerado satisfatrio), a partir de diversas idades da lamas e para todos os componentes interessados.

    No mbito do presente documento dada nfase aos modelos destinados ao tratamento biolgico por lamas activadas (biomassa suspensa) e decantao secundria, em conformi-dade com o actual estado de conhecimentos, e por serem talvez estes os processos de tratamento biolgico actualmente aplicados em ETAR de mdias e grandes dimenses.

    2. PRINCPIOS DE DESENVOLVIMENTO E FORMULAO DE MODELOS

    2.1. PRINCPIOS BSICOS Na formulao dos modelos, a dinmica dos reactores de mistura completa caracterizada por equaes diferenciais ordinrias. Os reactores sem mistura completa, como o caso dos decantadores, apresentam gradientes espaciais (as concentraes variam no tempo e no espao, em funo da sua posio no tanque): nestas situaes, a formulao dos modelos baseia-se em equaes diferenciais parciais.

    Genericamente, a modelao dinmica do tratamento de guas residuais efectuada recorrendo a balanos de massa, de acordo com a expresso seguinte (em que C representa o componente em anlise e rc a taxa de reaco, dada pelo quociente entre a taxa especfica do crescimento por unidade de biomassa e o rendimento celular da biomassa ( Yrc = )):

    Acumulao = entrada sada + (produzido consumido) ).(.. 00 VrCQCQVdtdC

    c+=

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    Devem ser explicitadas tantas equaes de balano de massa quantos os componentes do modelo, incluindo as guas residuais (assumem-se densidades constantes, pelo que

    QQQQdtdV == 00 , o que ilustra a resposta instantnea do sistema face variao de caudal). Note-se que, dado o amortecimento no reactor, as concentraes efluentes respondem lentamente s variaes das afluncias: quanto maior o tempo de residncia no sistema, mais lenta ser a resposta.

    Aplicando a equao de balano de massas ao oxignio obtm-se a expresso 1133H1133H(1), que considera o consumo de oxignio devido ao crescimento da biomassa (ro, que corresponde OUR e pode ser determinado por respirometria), bem como a taxa de transferncia de oxignio gasoso para a fase lquida, ra, que pode ser modelada com base na lei de Henry, atravs da expresso 1134H1134H(2).

    VrVrSoQSoQVdt

    dSoao += ... 00 (1)

    ( )SoSoaKr satLa = (2) em que:

    Sosat - concentrao de saturao em oxignio (depende da temperatura e da salinidade) (mg/l);

    KL.a - coeficiente de transferncia de massa (depende do tipo e dimenses do equipamento de arejamento).

    Nos modelos existentes, o OD frequentemente controlado por ajuste automtico do caudal de ar fornecido usando um algoritmo do tipo PID (proporcional, integral, derivativo), que se descreve em detalhe em Hydromantis (2003).

    As taxas de reaco, e em particular a taxa de crescimento especfico, , so parmetros essenciais para a descrio do crescimento da biomassa, do consumo de substrato (incluindo o oxignio) e da formao de produtos da reaco. Nas seces seguintes apresentam-se, resumidamente, algumas noes e modelos tipicamente utilizados. Bastin e Dochain (1982) (citados por Dochain e Vanrolleghen, 2001), referem mais de 60 modelos cinemticos aplicveis a processos biolgicos.

    A lei bsica da cinemtica (equao 1135H1135H(3)) permite determinar as taxas de reaco tendo em conta os reagentes envolvidos, Ci, e o valor da constante cintica, k0. O ndice i, exprime a ordem da reaco relativamente ao isimo reagente, sendo a ordem total da reaco dada pelo somatrio dos diferentes ndices i.

    =i

    iiCkr

    0 (3)

    A taxa de crescimento especfico varia com o tempo, sendo influenciada por factores ambientais como a concentrao de substrato, oxignio, biomassa e de produtos da reaco, o pH, a temperatura, a intensidade da luz e a presena de elementos inibidores do crescimento microbiolgico.

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    A influncia da concentrao de substrato na taxa de crescimento especfico pode ser simulada atravs do modelo de Michaelis-Menten, proposto em 1913 e generalizado por Monod, em 1942, ao crescimento de microrganismos. A equao 1136H1136H(4) corresponde ao modelo de Monod. Referem-se ainda os modelos de Tessier (de 1942) e de Blackman (Dochain e Vanrolleghen, 2001).

    SkS

    s

    mx

    += (4)

    em que: - taxa de crescimento especfico da biomassa (h-1); S - concentrao de substrato (mg/l); mx - taxa mxima do crescimento especfico da biomassa (h-1); ks - coeficiente de meia saturao (concentrao para a qual =mx/2) (mg/l).

    Os modelos anteriores apresentam a limitao de no considerarem eventuais efeitos inibitrios que elevadas concentraes de substrato possam ter na taxa de crescimento especfico. Por exemplo, ocorre a inibio da nitrificao na presena de elevadas concentraes de io amnio.

    A lei de Haldane, dada pela equao 1137H1137H(5), integra este efeito atravs do parmetro de inibio ki (Andrews, 1968; citado por Dochain e Vanrolleghen, 2001). De acordo com esta expresso, para cada existem duas possveis concentraes de substrato em regime permanente, S1 e S2: o primeiro valor corresponde a um ponto de equilbrio estvel e o segundo a um ponto de equilbrio instvel (situao em que a acumulao de substrato tem efeitos inibidores e resulta no washout da biomassa). Segundo Fripiat et al. (1984) (citado por Dochain e Vanrolleghen, 2001), um exemplo deste fenmeno a acumulao de AGV no processo de digesto anaerbia.

    is

    ismx

    kSSk

    kkS

    //21(

    2+++= (5)

    em que: - taxa de crescimento especfico da biomassa (h-1); S - concentrao de substrato (mg/l); mx - taxa mxima do crescimento especfico da biomassa (h-1); ki - parmetro de inibio (mg/l); ks - coeficiente de meia saturao (concentrao para a qual =mx/2) (mg/l).

    Os modelos de Monod, Blackman e Haldane representam-se nos grficos que constituem a 1138H1138HFigura 1.

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    Figura 1 Representao dos modelos de Monod, Blackman e Haldane

    (adaptada de Dochain e Vanrolleghen, 2001).

    Diversos autores tm observado experimentalmente que o crescimento da biomassa, X, retardado para concentraes elevadas da biomassa o modelo de Contois, proposto em 1959, demonstra este efeito (Dochain e Vanrolleghen, 2001):

    SXkS

    c

    mx

    += (6)

    em que: - taxa de crescimento especfico da biomassa (h-1); S - concentrao de substrato (mg/l); mx - taxa mxima do crescimento especfico da biomassa (h-1); kc - coeficiente de retardamento (-); X - concentrao da biomassa (mg/l).

    A concentrao dos produtos da reaco, P, tambm inibe o crescimento da biomassa, como se traduz pela equao 1139H1139H(7), sendo kp uma constante. Este tipo de modelos de inibio usado para simular fenmenos como a inibio da desnitrificao na presena de oxignio, sendo vulgarmente conhecido por switching function (para elevados valores de P, a expresso aproxima-se do valor zero; para valores reduzidos de P, kp domina a expresso, que assume o valor da unidade). Caso se pretenda simular o processo oposto (e.g., inibio da nitrificao na ausncia de oxignio, a switching functiona usar seria (P) = P/(kp+P): para valores de P reduzidos, kp domina a expresso que se aproxima do valor zero; para valores elevados de P, kp desprezvel e a expresso assume aproximadamente o valor da unidade. O facto destas funes serem contnuas elimina problemas de instabilidade numrica durante as simulaes.

    Pkk

    Pp

    p

    +=)( (7)

    em que: - taxa de crescimento especfico da biomassa (h-1); kp - coeficiente de saturao/inibio (mg/l); P - concentrao dos produtos da reaco (mg/l).

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    O crescimento da biomassa processa-se para valores relativamente restritos de pH e temperatura. A dependncia relativamente ao pH adequadamente representada, actualmente, por poucos modelos, sendo referido por Dochain e Vanrolleghen (2001) o modelo de Rozzi. A influncia da temperatura habitualmente modelada pela relao de Arrhenious.

    2.2. TRATAMENTO BIOLGICO POR LAMAS ACTIVADAS

    2.2.1 ASPECTOS GERAIS

    O conceito actual para a modelao das transformaes microbiolgicas em processos de lamas activadas (transformao da matria orgnica por aco da biomassa) foi introduzido, em grande parte, nos anos 70 e 80 por Dold et al. (1980) e Ekama et al. (1984) (citados por Mourato, 2000).

    Diversas abordagens foram desenvolvidas, com base no trabalho daqueles autores, at chegar aos actuais e reconhecidos modelos matriciais de lamas activadas da IWA (International Water Association, antiga IAWQ). Em 1982 foi criado um grupo de trabalho dedicado modelao matemtica dos sistemas de tratamento biolgico de guas residuais por lamas activadas, de forma a desenvolver uma plataforma comum a modelos futuros, com o mnimo de complexidade e que permitissem previses realistas. Desde ento, foram desenvolvidos os seguintes modelos de lamas activadas (em terminologia anglo-saxnica, activated sludge models, ASM), que permitem simular a remoo biolgica de matria orgnica, azoto e fsforo: os modelos ASM1 (Henze et al., 1987), ASM2 (Henze et al., 1995), ASM2d (Henze et al., 1999) e ASM3 (Gujer et al., 1999). A mais recente evoluo integra processos de armazenamento interno de produtos na biomassa, o que permite simular a remoo de fsforo em condies anxicas. Os modelos ASM tm estimulado o desenvolvimento de software e o conhecimento, cada vez mais detalhado, dos processos, possibilitando considerveis progressos na operao e gesto das ETAR.

    Nos modelos ASM adoptou-se o formato matricial baseado em Peterson (1965) e a notao simplificada recomendada por Grau et al. (1982) (citado por Henze et al., 1987), para representar a cintica e a estequiometria de cada processo que se admite ocorrer no sistema de lamas activadas. A nomenclatura e convenes adoptadas so as seguintes:

    X componentes particulados; S componentes solveis; ndices: B biomassa, S substrato, O oxignio; conveno de sinais: negativo para consumo, positivo para produo.

    A matriz inclui, para cada processo, j, e para cada componente, i, os respectivos coeficientes estequiomtricos, ij, bem como a taxa de processo, : para cada componente, a taxa de reaco pode ser obtido considerando os coeficientes estequiomtricos dos processos envolvidos e as respectivas taxas de processo, atravs da equao 1141H1141H(8).

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    =

    =n

    jjijir

    1 (8)

    O formato matricial permite o reconhecimento dos processos a que cada componente est sujeita e possibilita a verificao da continuidade, ou seja, assegura que os balanos de massa so correctamente calculados. Assim, para cada componente, e desde que se utilizem unidades consistentes, o somatrio dos coeficientes estequiomtricos deve ser nulo. A utilizao de unidades consistentes assegurada uma vez que a matria orgnica descrita como equivalente em CQO, e que o OD descrito como uma CQO negativa.

    Conceptualmente, os modelos ASM consideram a CQO como a medida ou parmetro que representa a matria orgnica e a biomassa, exprimindo todos os componentes orgnicos em unidades de CQO. Para efeitos de modelao, a CQO considerada prefervel face CBO e ao TOC, no que se refere quantificao da carga poluente afluente, uma vez que proporciona uma base consistente para a descrio dos processos de tratamento por lamas activadas. De facto, a CQO traduz, por si s, uma relao entre a biomassa, o oxignio utilizado e o equivalente em electres (electron equivalent, em terminologia anglo-saxnica) na matria orgnica.

    De acordo com Marais e Dold (1985) (citado por EnviroSim, 2004), a adequabilidade da CQO estabelecida tendo em conta a utilizao do substrato orgnico. No processo metablico dos organismos heterotrficos, representado na 1142H1142HFigura 2, parte do substrato oxidado pelos organismos para obteno de energia (que libertada pela transferncia de electres do substrato, atravs da cadeia de transporte de electres, para o receptor de electres terminal - oxignio ou nitratos, dependendo das condies ambientais). O restante convertido em nova biomassa, consumindo a energia libertada no processo anterior.

    Figura 2 Representao esquemtica da utilizao do substrato pelos organismos

    heterotrficos (adaptada de EnviroSim, 2004).

    A proporo de substrato consumido em cada um dos processos pode ser avaliada pela relao entre a quantidade de clulas formada e a quantidade de substrato utilizado, designada por rendimento celular da biomassa heterotrfica (YH). Teoricamente, em condies de crescimento relativamente estveis, o rendimento celular (expresso em termos da biomassa produzida por electres disponveis no substrato para serem transferidos) deve ser aproximadamente constante (Payne, 1970; citado por EnviroSim, 2004). Deste modo, se for medido o potencial de cedncia de electres do substrato, possvel quantificar a produo de

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    lamas a partir de YH, bem como a necessidade em oxignio, atravs de (1- YH). Este potencial medido no teste da CQO, no qual cada mole de oxignio aceita quatro electres equivalentes.

    A interligao entre electres equivalentes (CQO) do substrato, o rendimento celular e a correspondente necessidade em oxignio por unidade de substrato metabolizado justificam a adopo da CQO como parmetro fundamental na anlise do comportamento das lamas activadas. Assim, a CQO exprime adequadamente a necessidade de oxignio pois representa todos os componentes susceptveis de serem oxidados, sendo independente da concentrao da biomassa presente durante o ensaio. Adicionalmente, possvel efectuar balanos de massa com base na CQO.

    Estas caractersticas, que tornam a CQO o parmetro mais adequado para efeitos de modelao matemtica, no esto presentes no TOC nem na CBO. A CBO, cuja estimativa depende da quantidade e caractersticas da biomassa presente, mede apenas a poro do equivalente em electres no substrato utilizado para a criao de energia, excluindo a que transformada em nova biomassa, pelo que no deve ser usado como base para balanos de massa. O TOC no considerado apropriado, uma vez que o substrato integra um largo espectro de compostos orgnicos, e no TOC a relao entre o carbono e o equivalente em electres varia de composto para composto.

    2.2.2 MODELO ASM1

    DESCRIO DO MODELO O modelo ASM1 (Henze et al., 1987) foi desenvolvido utilizando uma notao matricial e aplica-se a sistemas de tratamento por lamas activadas que efectuem oxidao carboncea, nitrificao e desnitrificao. A matriz adoptada inclui 13 componentes de caracterizao das guas residuais e 8 processos biolgicos. Este modelo inclui ainda recomendaes para a caracterizao das guas residuais e valores de referncia para os parmetros envolvidos que possibilitam, em regra e com pequenos acertos, a obteno de resultados realistas.

    O modelo ASM1 inclui uma abordagem baseada no fraccionamento da matria orgnica, atendendo biodegradibilidade. A matria orgnica no biodegradvel (solvel e particulada, respectivamente SI e XI) passa pelo sistema sem sofrer qualquer alterao: o substrato particulado geralmente removido atravs da purga de lamas enquanto que a matria solvel abandona o sistema com o efluente da ETAR. Para efeitos de modelao, admite-se que a matria orgnica biodegradvel inclui uma componente rapidamente biodegradvel considerada solvel, SS, e uma parcela lentamente biodegradvel que se considera particulada, designada por XS.

    O substrato SS pode ser utilizado pelos microrganismos para manuteno celular e/ou para crescimento. A matria orgnica lentamente biodegradvel hidrolisada a SS, assumindo-se que neste processo no consumida energia, pelo que no h utilizao de receptores de

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    electres. Uma vez que a taxa especfica da hidrlise inferior de utilizao de SS, a hidrlise o processo limitante no crescimento da biomassa quando apenas existe substrato XS. Em condies anaerbias, aparentemente, no ocorre hidrlise (o que est em conformidade com o reduzido conhecimento disponvel relativo hidrlise neste tipo de condies ambientais).

    No modelo, a diferenciao entre CQO rpida e lentamente biodegradvel permite prever alteraes dependentes do tempo e do espao no que se refere s necessidades do receptor de electres (oxignio, nitratos ou nitritos), atravs da introduo de um atraso na utilizao do substrato, que se traduz no processo de hidrlise.

    O crescimento dos organismos autotrficos e heterotrficos descrito atravs de taxas de crescimento com cintica e estequiometria do tipo de Monod. A biomassa heterotrfica gerada por crescimento, consumindo substrato rapidamente biodegradvel, em condies aerbias ou anxicas, enquanto que a biomassa autotrfica gerada em condies aerbias, consumindo amnia para obteno de energia.

    O decaimento da biomassa modelado atravs de reaces de primeira ordem relativamente concentrao de biomassa. Este processo ocorre em quaisquer condies ambientais e inclui diversos mecanismos (respirao endgena, morte, predao e lisis), resultando na converso da biomassa em XS (que volta a ser hidrolisado, havendo reciclagem do substrato) e em XP (matria orgnica particulada inerte, ou seja, detritos celulares). No ASM1, admitido o conceito pragmtico de death-regeneration (Dold et al., 1980; citado por Henze et al., 1987), em que se assume que no ocorre utilizao de receptor de electres durante o decaimento da biomassa, pelo que a taxa de decaimento independente das condies ambientais. A parcela do oxignio consumido usualmente associada ao decaimento calculada como se resultasse, indirectamente, do crescimento de nova biomassa a partir do substrato libertado no processo de decaimento.

    No que se refere matria orgnica azotada, o ASM1 considera o seu fraccionamento em matria no biodegradvel (solvel e particulada, SNI e XSI) e em matria biodegradvel. A componente SNI ignorada pelo modelo, enquanto que a componente XSI, modelada como uma fraco da CQO particulada no biodegradvel. A matria orgnica azotada subdividida em azoto amoniacal, azoto orgnico solvel e azoto orgnico particulado (que hidrolisado a azoto orgnico conjunta e simultaneamente com XS, com iguais taxas de processo). A nitrificao modelada como um processo que ocorre numa s etapa (ou seja, NO3- a nica forma oxidada de azoto presente). Salienta-se que no possvel verificar a continuidade em termos de azoto devido s perdas no contabilizadas de N2 (a matriz no inclui a evoluo de N2 durante a desnitrificao).

    O modelo integra ainda a alcalinidade, SAlk, a fim de prever alteraes de pH associadas a reaces envolvendo a adio/remoo de espcies com a capacidade de remover protes. A incluso da alcalinidade nos balanos de massa permite avaliar se a produo de alcalinidade durante a desnitrificao suficiente para manter o pH constante, independentemente da

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    libertao de protes associada nitrificao. Caso no seja, necessrio, por exemplo, proceder adio de cal para manter o pH.

    No 1143H1143HQuadro A 1 do Anexo 1 apresenta-se a matriz de Petersen para o modelo ASM1. Os valores tpicos dos parmetros cinticos e estequiomtricos do modelo, a caracterizao sumaria dos respectivos parmetros e componentes e os valores caractersticos para esgoto domstico decantado constam dos Quadros A 8 a A 10, do 1145H1145H Anexo 1.

    Diversos autores referem que o modelo ASM1 especialmente sensvel a variaes dos parmetros YH (rendimento celular da biomassa heterotrfica), H (taxa mxima do crescimento especfico da biomassa heterotrfica), bH (coeficiente de decaimento da biomassa heterotrfica), A (taxa mxima do crescimento especfico da biomassa autotrfica) e kH (taxa mxima de hidrlise) (Almeida, 1999; Henze et al., 1987).

    HIPTESES E RESTRIES DO MODELO As principais hipteses admitidas pelo modelo so as seguintes:

    admite-se que a temperatura constante e que o pH aproximadamente neutro (6,3 a 7,8); as caractersticas das guas residuais e os coeficientes e parmetros das expresses que

    traduzem taxas de processo so considerados estveis ao longo do tempo (embora seja possvel simular variaes de carga poluente afluente, no se consideram alteraes na natureza da matria orgnica);

    o modelo assume que os nutrientes inorgnicos no limitam o crescimento celular nem a remoo de substrato;

    admite-se que a biomassa heterotrfica homognea e mantm-se constante; o aprisionamento da matria orgnica particulada na biomassa considerado instantneo.

    Como restries aplicao do modelo, refere-se que o modelo no aplicvel a guas residuais com elevadas contribuies industriais e que a idade das lamas se deve encontrar nos limites adequados (3 a 30 dias) para que a biomassa floculenta se desenvolva de forma a evitar problemas de sedimentao. Para garantir a sedimentao adequada das lamas necessrio assegurar uma concentrao em MLSS, expressa em unidades de CQO, entre 750 a 7500 g/m3, e que a intensidade de mistura nos reactores arejados seja inferior a 240 s-1. Uma vez que o modelo no inclui processos que descrevam o comportamento da biomassa em condies anaerbias, a fraco no arejada do reactor deve ser limitada (se parte significativa do volume apresentar condies anaerbias, os resultados do modelo podem revelar-se deficientes).

    2.2.3 MODELO ASM2

    DESCRIO DO MODELO O modelo ASM2, publicado em 1995 (Henze et al., 1995), constitui uma extenso do ASM1 que inclui processos relativos remoo biolgica de fsforo, pelo que a biomassa apresenta

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    estrutura interna a nvel celular, integrando tambm dois processos qumicos para simular a precipitao qumica do fsforo (em resultado da presena de metais em guas residuais com elevadas concentraes em ortofosfatos). A matriz adoptada, apresentada no 1146H1146HQuadro A 2 e no 1147H1147HQuadro A 3 do 1148H1148HAnexo 1 - , inclui 19 componentes de caracterizao das guas residuais e 19 processos biolgicos. Os valores tpicos para os parmetros do modelo, designadamente para as constantes estequiomtricas e factores de converso, constam nos Quadros A 11 a A 14 do 1149H1149HAnexo 1 - .

    Enquanto que o ASM1 se baseia na CQO para todos os componentes orgnicos, o ASM2 inclui tambm SST, XTSS, de forma a ter em conta os polifosfatos (uma fraco das lamas activadas que no apresenta nenhuma CQO) e a poder considerar a presena de matria mineral particulada no afluente, bem como a criao deste tipo de slidos durante a precipitao do fsforo.

    A matria orgnica rapidamente biodegradvel, designada por SS no ASM1, substituda neste modelo por duas componentes: SA, que corresponde aos produtos da fermentao, e SF, que representa a matria orgnica fermentvel, rapidamente biodegradvel e disponvel para assimilao pelos heterotrficos. A matria orgnica solvel no biodegradvel, que faz parte do afluente e pode ser produzida por alguns processos de hidrlise, modelada atravs da varivel SI.

    Os componentes azotados solveis consistem de azoto amoniacal, SNH4, nitritos e nitratos, SNO3. O gs dinitrognio produzido durante a desnitrificao, SN2, tambm modelado mas considerado insolvel, pelo que sai imediatamente de soluo. Os restantes componentes solveis so o oxignio, SO2, o fsforo solvel inorgnico, SPO4, constitudo principalmente por ortofosfatos, e a alcalinidade, SAlk (usada para prever atempadamente valores reduzidos de pH que possam inibir os processos biolgicos).

    No modelo ASM2 so apenas considerados trs grupos de microrganismos para representar uma vasta variedade de espcies, pelo que os processos descritos se baseiam no respectivo comportamento mdio, sendo descritos como processos de crescimento mdio. Deste modo, o modelo inclui a biomassa autotrfica aerbia responsvel pela nitrificao, XAUT, organismos heterotrficos, XH, e organismos acumuladores de fsforo, XPAO, tambm designados por PAO. Os produtos internamente armazenados pelos PAO so representados por variveis do sistema distintas de XPAO, designadamente por XPP e por XPHA (respectivamente, polifosfatos e CQO internamente armazenada, que se assume ter a seguinte composio: (C4H6O2)n).

    A matria orgnica no biodegradvel que integra o afluente ou eventualmente produzida durante o decaimento da biomassa, XI, tambm modelada. O substrato lentamente biodegradvel, XS, convertido por hidrlise a SF antes de ser assimilado. Os restantes componentes particulados so XMeOH e XMeP, que se assume serem constitudos por Fe(OH)3 e por FePO4, respectivamente.

    Os processos descritos pelo ASM2 incluem a hidrlise e os processos que envolvem organismos heterotrficos, autotrficos e acumuladores de fsforo, para alm de dois

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    processos qumicos para simular a precipitao qumica do fsforo. So considerados trs processos de hidrlise distintos, progressivamente mais lentos, em funo do receptor de electres disponvel: aerbio, anxico e anaerbio. A hidrlise do azoto orgnico no explicitamente includa no modelo: assume-se que XS contm uma fraco constante de azoto orgnico e de fsforo (respectivamente iNXS e iPXS), sendo hidrolisados simultaneamente.

    Os processos heterotrficos incluem o crescimento aerbio com base em SF e com base em SA, modelados como processos paralelos com idnticas taxas e coeficientes de rendimento (YH). Estes dois processos requerem oxignio (SO2), nutrientes (SNH4 e SPO4) e alcalinidade (SALK) e produzem XTSS. tambm considerado o crescimento anaerbio base em SF e em SA (desnitrificao). A fermentao anaerbia de SF em SA, durante a qual no se considera que possa ocorrer crescimento heterotrfico simultneo, identificada como o nico processo que requer mais investigao para aprofundamento do conhecimento cientfico. A morte e lisis dos organismos heterotrficos so modeladas de forma idntica do modelo ASM1.

    Os processos que envolvem os organismos PAO incluem: o armazenamento de SA sob forma de XPHA (ocorre sobretudo sob condies anaerbias mas tambm pode ocorrer em condies aerbias e anxicas); o armazenamento de XPP (incluindo um termo de inibio na expresso cintica, j que o processo interrompido se o contedo em P dos PAO for muito elevado); o crescimento dos organismos PAO (modelado como um processo aerbio estrito, consumindo apenas XPHA) e o decaimento (por morte, lisis, respirao endgena e manuteno) dos PAO e dos seus produtos de armazenamento, XPP e XPHA, originando a libertao de SPO4 e SA, respectivamente.

    Os processos autotrficos integram o crescimento em condies aerbias estritas e o decaimento destes organismos, processo anlogo ao descrito no modelo ASM1.

    O modelo ASM2 especialmente sensvel a variaes dos parmetros H, bH, KA e KO2 (coeficientes de saturao para SA e para o oxignio, para os organismos heterotrficos), AUT, bAUT, KNH4 e KO2 (coeficientes de saturao para a amnia e para o oxignio, para os organismos autotrficos) (Henze et al., 1995).

    HIPTESES E RESTRIES DO MODELO So aplicveis a este modelo as mesmas hipteses, limitaes e restries consideradas para o ASM1. Tendo em conta a remoo de fsforo e o facto do comportamento e fisiologia dos PAO ainda no serem completamente conhecidos, as principais hipteses admitidas para a aplicao do modelo so as seguintes:

    os organismos heterotrficos e os PAO so homogneos e no sofrem alteraes com o tempo;

    o SA o nico substrato que pode ser absorvido pelos PAO; em condies aerbias, admite-se que o crescimento dos PAO est associado ao consumo

    de XPHA, no consumindo SA directamente (apesar de, na realidade, os organismos heterotrficos e os PAO competirem pelo SA em condies aerbias); por esta razo, os

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    sistemas em que a afluncia de SA ao reactor aerbio significativa no devem ser modelados com o ASM2;

    assume-se que os PAO no desnitrificam (na realidade, alguns PAO podem desnitrificar e usam os nitratos, em vez dos polifosfatos, para obteno de energia, o que se traduz numa menor remoo de fsforo no ASM2, estes organismos so modelados como organismos heterotrficos desnitrificantes);

    a fraco da biomassa heterotrfica que armazena PHA sem libertar fsforo no includa no modelo (eventualmente, podem ser simulados reduzindo YPO4 e qPP).

    Para alm das restries comuns ao ASM1, refere-se que o modelo ASM2 no tem em conta limitaes relacionadas com a deficincia dos caties potssio e magnsio, o que pode resultar na reduo da eficincia de acumulao de polifosfatos. Embora os nitratos e o monxido de nitrognio inibam a remoo biolgica do fsforo, este facto no considerado no modelo. Em termos prticos, o modelo ASM2 s aplicvel a guas residuais domsticas (no aplicvel a guas residuais com elevadas contribuies industriais). A temperatura das guas residuais deve situar-se entre 10 e 25 C e o pH deve ser aproximadamente neutro.

    2.2.4 MODELO ASM2D

    O modelo ASM2d, publicado em 1999 (Henze et al., 1999), foi desenvolvido posteriormente ao ASM2 em consequncia de se ter demonstrado que os PAO podem ser modelados como duas fraces, uma das quais desnitrifica utilizando os produtos armazenados no interior das clulas (Mino et al., 1995; Meinhold et al., 1999; Kerrn-Jespersen e Henze, 1993; citados por Henze et al., 2002). O modelo difere apenas neste aspecto do anterior ASM2 os restantes processos, hipteses e restries do modelo so idnticas s do ASM2. A matriz adoptada, apresentada no 1150H1150HQuadro A 4 e no 1151H1151HQuadro A 5 do Anexo 11, inclui 19 componentes de caracterizao das guas residuais e 21 processos biolgicos. Os valores tpicos para os parmetros do modelo, designadamente para as constantes estequiomtricas e factores de converso, constam nos Quadros A 11 a A 14 do Anexo 11.

    No ASM2d, admite-se que alguns dos organismos PAO acumulam fsforo sob a forma de polifosfatos, enquanto que os restantes podem desnitrificar. Assim, o ASM2d pode prever o facto da libertao de fosfatos ser por vezes mais lenta na presena de nitratos. Paralelamente, o modelo admite que o crescimento dos PAO pode ocorrer em condies aerbias e anxicas (embora, nestas condies, a taxa mxima de armazenamento de XPP e de XPHA seja reduzida pelo factor NO3, dado que nem todos os PAO so capazes de desnitrificar), e que estes organismos s podem crescer consumindo a matria orgnica armazenada no interior das suas clulas (XPHA) este pressuposto constitui uma restrio forte do ASM2d, que pode originar o desenvolvimento de novas verses do modelo.

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    2.2.5 MODELO ASM3

    DESCRIO DO MODELO E COMPARAO COM O ASM1 O modelo ASM3 foi desenvolvido para colmatar os principais defeitos do anterior ASM1, tendo sido publicado em 1999 (Gujer et al., 1999). O ASM3 foi desenvolvido tendo em conta a sua aplicabilidade do ponto de vista prtico da engenharia e resolve as limitaes prticas do ASM1, facilitando a aplicao e permitindo que os esforos cientficos se voltem a focar em avanos tecnolgicos, e no na resoluo de problemas associados metodologia de simulao de processos de interesse reduzido. data do desenvolvimento do ASM3 os tpicos de investigao centravam-se na modelao da dinmica populacional, na remoo biolgica de fsforo e no armazenamento de produtos como parte estruturante da biomassa.

    Resumidamente, o modelo ASM3 inclui uma descrio mais detalhada dos processos celulares internos, dando nfase ao armazenamento de substratos orgnicos e permite um melhor ajustamento dos processos de decaimento s condies ambientais. A matriz adoptada, que consta no 1154H1154HQuadro A 6 e no 1155H1155HQuadro A 7 do 1156H1156HAnexo 1 - , inclui 13 componentes de caracterizao das guas residuais e 12 processos biolgicos. Os valores tpicos para as constantes estequiomtricas e factores de converso do modelo ASM3, bem como os valores tpicos dos parmetros cinticos do modelo para um efluente primrio, apresentam-se, respectivamente, no 1157H1157HQuadro A 15 e no 1158H1158HQuadro A 16 do 1159H1159HAnexo 1 - .

    A verificao da continuidade dos coeficientes estequiomtricos feita utilizando, como unidade consistente, a carncia terica em oxignio (em terminologia anglo-saxnica, theoretical oxygen demand, ThOD), uma forma conservativa da CQO: na matria orgnica, a CQO aproximadamente igual ThOD; na matria inorgnica, a ThOD deve ser calculada com base em equaes redox (em que cada electro livre na camada de valncia equivale a uma ThOD de 8 g/mole).

    Os mais relevantes princpios em que se baseia o modelo ASM3 so os seguintes:

    A hidrlise considerada independente das condies ambientais, ocorrendo mesma taxa em condies aerbias e anxicas.

    O decaimento da biomassa modelado como respirao endgena (em oposio ao conceito de death-regeneration adoptado no ASM1). Este processo descreve todas as formas de consumo de biomassa e necessidades de energia no associadas ao crescimento (incluindo a manuteno, respirao endgena, lise, predao e mobilidade), podendo as respectivas taxas e constantes cinticas serem obtidas por testes de respirometria.

    Os processos dos organismos heterotrficos e nitrificantes so considerados distintamente, contrariamente ao admitido no ASM1 que os considera interligados (embora, na realidade, difiram significativamente). Na 1160H1160HFigura 3 apresentam-se, esquematicamente, as diferentes abordagens dos modelos ASM1 e ASM3 relativamente aos processos heterotrficos e autotrficos.

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    Figura 3 Representao esquemtica dos processos heterotrficos e autotrficos

    considerados nos modelos ASM1 e ASM3 (adaptada de Henze et al., 2002).

    O decaimento da biomassa modelado como respirao endgena (em oposio ao conceito de death-regeneration adoptado no ASM1).

    modelado o armazenamento da CQO pelos organismos heterotrficos, em condies anxicas e aerbias.

    possvel diferenciar as taxas de decaimento dos organismos nitrificantes em condies aerbias e anxicas.

    Os processos de amonificao e de hidrlise de XND so eliminados, assumindo-se uma relao N/COD constante (i.e., admite-se que a composio de todos os componentes orgnicos constante).

    considerada a limitao da alcalinidade nas taxas de processo. dado nfase ao armazenamento de substratos orgnicos, pelo que SS estimado atravs

    do armazenamento e a biomassa modelada possuindo estrutura celular interna (no ASM1, era dado nfase hidrlise, sendo SS estimado com base no processo de crescimento).

    No ASM3, admite-se que a matria orgnica rapidamente biodegradvel, SS, inicialmente armazenada internamente pelos heterotrficos, devendo ser determinada por testes de respirometria. O substrato inerte solvel que no biodegradvel, SI, pode estar presente no afluente ou ser produzido pela hidrlise de XS. Os componentes azotados solveis consistem de azoto amoniacal, SNH4, nitritos e nitratos, SNO3, e gs azoto, SN2, considerado o nico produto da desnitrificao. Os restantes componentes solveis so o oxignio, SO2, e a alcalinidade, SAlk (usada para prever atempadamente o valor de pH, que pode, eventualmente, conduzir inibio dos processos biolgicos).

    Os componentes particulados incluem a matria orgnica inerte no biodegradvel, XI, que pode fazer parte do afluente ou ser produzida no processo de decaimento da biomassa (corresponde a XP no ASM1). O substrato lentamente biodegradvel, XS, convertido por hidrlise a SS e SI anteriormente respectiva assimilao. Contrariamente ao ASM1, assume-se que todo o XS est contido no afluente, no sendo gerado no processo de decaimento da biomassa.

    No modelo so apenas considerados organismos heterotrficos e autotrficos. A biomassa autotrfica, XA, considerada aerbia estrita e responsvel pela nitrificao. Em condies

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    aerbias e anxicas, a biomassa heterotrfica, XH, responsvel pela hidrlise de XS e por metabolizar toda a matria orgnica degradvel; em condies anaerbias a sua actividade limita-se hidrlise extracelular. O componente XSTO representa os substratos orgnicos armazenados intercelularmente pelos heterotrficos e encontra-se sempre associado a XH (mas no includo na sua massa). Nos clculos estequiomtricos, considera-se que XSTO possui a composio (C4H6O2)n. O modelo considera ainda os slidos suspensos atravs do componente XSS.

    Os processos descritos pelo ASM3 incluem a hidrlise e os processos que envolvem os organismos heterotrficos e autotrficos. A degradao do azoto orgnico solvel e particulado foi integrada nos processos de hidrlise, decaimento e crescimento.

    Os processos heterotrficos incluem o armazenamento de SS em condies aerbias e anxicas sob a forma de XSTO, assim como o crescimento aerbio e anxico destes organismos, consumindo exclusivamente o substrato previamente armazenado. Os processos de armazenamento utilizam a energia obtida da respirao aerbia ou pela desnitrificao, consoante as condies ambientais. Dado que apenas uma fraco dos heterotrficos pode desnitrificar, as taxas de armazenamento e de crescimento em condies anxicas so inferiores s aerbias.

    So considerados quatro processos de decaimento dos organismos heterotrficos distintos: respirao endgena aerbia, respirao endgena anxica, perda aerbia de XSTO e perda anaerbica de XSTO (estes dois ltimos processos so idnticos respirao endgena, assegurando o decaimento de XSTO conjuntamente com o da biomassa).

    Os processos autotrficos integram o crescimento em condies aerbias estritas e a respirao endgena em condies aerbias e anxicas.

    RESTRIES DO MODELO Para alm do ASM3 apresentar as mesmas limitaes do modelo ASM1, so ainda mencionadas as seguintes restries:

    o pH deve ser constante e aproximadamente neutro (6,5 a 7,5) e a alcalinidade deve ser predominantemente constituda por HCO3 (bicarbonato);

    o modelo no consegue lidar com aumentos da concentrao de nitritos; os parmetros utilizados pelo modelo devem ser especificados pelo utilizador aps a

    caracterizao das guas residuais afluentes ao sistema.

    2.2.6 CARACTERIZAO DAS GUAS RESIDUAIS E DOS PARMETROS E COMPONENTES DOS MODELOS

    A caracterizao experimental das guas residuais essencial para assegurar que as previses do modelo, nomeadamente em termos de necessidades de receptor de electres e de produo de lamas activadas, so adequadas. Os resultados so tanto mais fiveis quanto mais detalhada

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    for a caracterizao do afluente aos reactores biolgicos. Deste modo, o utilizador deve proceder caracterizao das guas residuais afluentes ETAR (definir as concentrao dos componentes solveis e particulados) e especificar os parmetros estequiomtricos e cinticos que se aplicam ao caso de estudo.

    Para caracterizar a fraco orgnica das guas residuais municipais, comum recorrer ao fraccionamento da CQO atravs de testes de respirometria e da anlise do afluente, incluindo a medio da matria orgnica total, que deve ser efectuada recorrendo ao dicromato de potssio. No caso concreto da componente SA, o seu valor pode ser estimado por testes de respirometria, sendo a fraco voltil respectiva avaliada por cromatografia gasosa.

    No necessrio caracterizar com tanto detalhe as fraces de azoto das guas residuais como as fraces orgnicas, dado que grande parte do azoto est presente nas guas residuais sob a forma de amnia. O restante azoto (que est, maioritariamente, associado aos componentes orgnicos) caracterizado atendendo s fraces fixas de azoto para os diversos componentes de CQO. As concentraes em azoto Kjeldahl, azoto amoniacal e nitritos e nitratos devem ser determinadas experimentalmente atravs dos mtodos convencionais.

    No que concerne s fraces de fsforo das guas residuais e para efeitos de modelao , em regra, suficiente associar uma fraco fixa de fsforo s diferentes fraces da CQO. A concentrao em ortofosfatos deve ser medida pelos mtodos convencionais.

    A descrio detalhada da forma de proceder estimativa/avaliao de cada valor consta de Henze et al. (1987); Henze et al. (1995); Henze et al. (1998) e Gujer et al. (1999). No 1161H1161HAnexo 1 - apresentam-se, de acordo com os mesmos autores, valores tpicos dos parmetros e das concentraes dos diferentes componentes dos modelos ASM1, ASM2, ASM2d e ASM3. Estes valores devem apenas ser considerados como valores de referncia, sendo aferidos experimentalmente em cada situao (note-se que os valores dos parmetros so influenciados por condies ambientais tais como o pH, a temperatura e a eventual presena de substncias txicas ou inibidoras das reaces).

    A principal limitao dos modelos prende-se, precisamente, com a calibrao dos parmetros. No caso de ETAR que recebam efluentes de origem domstica, conseguem-se obter, em regra, previses adequadas do seu comportamento usando os parmetros pr-definidos ou recomendados. Contudo, quando a contribuio de guas residuais industriais no desprezvel, conveniente proceder a campanhas e estudos especficos com vista sua calibrao (Petersen et al., 2001). A calibrao dos modelos deve ser baseada em resultados experimentais, obtidos na ETAR, e seguir um procedimento lgico tendo em conta o conhecimento detalhado dos princpios do modelo aplicado: apenas devem ser alterados os parmetros que forem sensveis aos testes usados na calibrao do modelo e, dadas as relaes entre parmetros, alterando apenas um parmetro de cada vez.

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    2.3. DECANTAO

    2.3.1 CONSIDERAES GERAIS

    A decantao actua sobre a matria particulada de forma a controlar a sua descarga para o tratamento biolgico (decantao primria) ou a proceder sua remoo, impedindo que prossiga para jusante, no efluente final (decantao secundria). A modelao de decantadores primrios feita, em regra, admitindo que as partculas esto separadas umas das outras e que no interagem, sendo vlida a lei de Stoke.

    A decantao secundria constitui um mecanismo determinante na qualidade do efluente das ETAR. Ao entrar nos decantadores secundrios, considera-se, em regra, que o afluente pode ser dividido em duas partes: uma apresenta escoamento ascendente e sai dos decantadores pelos descarregadores de superfcie; a outra tem escoamento descendente, sendo retirada do fundo dos decantadores atravs da extraco de lamas.

    A biomassa sedimenta devido aco da gravidade, independentemente do sentido do escoamento, estando presente em elevadas concentraes no caudal extrado do fundo dos decantadores secundrios. Deste modo, os modelos de decantadores secundrios devem permitir avaliar, em condies dinmicas, a concentrao da biomassa no efluente final, o nvel do manto de lamas e a produo de lamas.

    Destaca-se que as principais funes da decantao secundria incluem os seguintes aspectos:

    Clarificao Separao da biomassa das guas residuais tratadas, de forma a produzir um efluente final clarificado. Os problemas na clarificao podem estar associados a floculao deficiente (em resultado, sobretudo, de problemas ao nvel da entrada de caudal e dos deflectores), a problemas de curto-circuito hidrulico (o que acarreta a ressuspenso de slidos do manto de lamas por correntes de elevada velocidade), ao excesso de carga afluente, em termos de slidos (e consequente aumento de nvel do manto de lamas e perda de slidos no efluente quando o manto atinge um nvel prximo dos descarregadores) e desnitrificao no decantador secundrio (com consequente arrastamento e flutuao de slidos at superfcie).

    Espessamento da biomassa no fundo do decantador, que recirculada para o reactor biolgico. Esta funo limita a capacidade de tratamento da ETAR, sendo fortemente condicionada pela sedimentabilidade das lamas e pela concentrao de slidos no reactor.

    Armazenamento de lamas no fundo do decantador e subsequente utilizao em condies de elevada afluncia de caudais. As condies crticas de funcionamento dos descarregadores ocorrem em tempo de chuva, durante o qual h uma transferncia de biomassa do tanque de arejamento para o decantador secundrio: a taxa de recirculao (dada por aflR QQR /= ) diminui dadas as limitaes na capacidade de bombagem do sistema de recirculao de lamas, pelo que, para manter a recirculao da biomassa, necessrio aumentar a concentrao do caudal recirculado, conseguida atravs de um maior tempo de espessamento da lama no decantador secundrio e, consequentemente, no

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    seu armazenamento no interior deste rgo. Deste modo, a fim de no haver elevao excessiva do manto de lamas (o que afectaria a funo de clarificao), deve alocar-se parte do volume do decantador para armazenamento de lamas, em tempo de chuva, e limitar o caudal afluente ao sistema em tempo de chuva (usualmente, a duas vezes o caudal de ponta de tempo seco).

    Os decantadores secundrios podem ainda ser encarados como reactores biolgicos onde ocorrem converses aerbicas adicionais e/ou desnitrificao (com consequentes problemas de levantamento de lamas).

    A falha de uma destas funes pode comprometer a eficincia total do sistema, o que evidenciado pela concentrao significativa de slidos suspensos no efluente final e pela reduo da idade das lamas devido perda de biomassa, com eventual wash-out completo do sistema.

    Nos decantadores secundrios podem distinguir-se trs zonas principais (a zona de clarificao, o manto de lamas e a zona de compactao), em que se desenvolvem os seguintes quatro regimes de sedimentao distintos:

    Sedimentao discreta, no floculenta: ocorre na zona de clarificao, incidindo sobre as partculas sem tendncia para flocularem. Uma vez que as partculas sedimentam individualmente, o regime segue a lei de Stoke.

    Sedimentao discreta floculenta: ocorre na zona de clarificao, na proximidade da entrada de afluente (onde a velocidade se reduz), afectando as partculas dispersas com grande tendncia para flocularem, que formam flocos de maior volume, com maior velocidade de sedimentao. Este regime no ainda perfeitamente compreendido, dada a existncia de flocos filamentosos e esfricos com comportamentos distintos.

    Sedimentao em manto de lamas (em terminologia anglo-saxnica, zone settling): verifica-se na zona intermdia, onde existe interaco entre os flocos individuais de partculas devida elevada concentrao de biomassa, no sendo vlida a aplicao da lei de Stoke. Nesta zona, as foras interpartculas contrariam a sedimentao das partculas vizinhas, ficando estacionrias relativamente umas s outras e sedimentando como um todo deste modo, possvel captar partculas de menores dimenses, que sedimentariam com velocidades inferiores, e que decantam velocidade do conjunto. A teoria do fluxo, a que se refere o subcaptulo 1162H1162H2.3.3, descreve a decantao em manto de lamas e permite estimar a velocidade de sedimentao em funo da concentrao da biomassa.

    Sedimentao por compresso (em terminologia anglo-saxnica, hindered settling): verifica-se no fundo dos decantadores sendo necessrio, para que os flocos densos sedimentem, que o lquido seja empurrado para cima. Assim, o mecanismo presente nesta zona inclui uma combinao de lama que se desloca no sentido descendente (por compactao) e de lquido que se desloca no sentido ascendente, de forma a libertar o espao que ser ocupado pela lama. O conhecimento desta situao, em termos de modelao, ainda incipiente.

    A modelao do comportamento dinmico dos decantadores secundrios constitui uma rea onde ainda se verifica, actualmente, ampla necessidade de investigao. Os principais

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    problemas devem-se diferena de densidades entre a gua e os flocos (que so, em mdia, 0,5% mais densos que a gua) e ao facto dos decantadores secundrios serem muito sensveis a variaes de temperatura e aco do vento. Ambos os fenmenos referidos interferem no comportamento hidrulico dos decantadores.

    2.3.2 TIPOS DE MODELOS E CRITRIOS DE SELECO

    Segundo Ekama et al. (1997), os modelos para decantao classificam-se de acordo com a sua resoluo espacial em modelos de 0 a 3 dimenses (0D a 3D). Os modelos 0D separam o afluente rico em slidos suspensos num efluente praticamente isento destes slidos e no tm volume, admitindo que no ocorre a acumulao de massa no decantador. Os modelos tridimensionais requerem a aplicao de simulaes dinmicas dos fluidos. Os modelos mais populares so os modelos 1D, que descrevem razoavelmente os processos dinmicos de separao e de acumulao de massa no decantador. Normalmente, s consideram 10 camadas, pelo que a abordagem semelhante de reactores em srie.

    Os modelos baseiam-se na equao da continuidade, em balanos de massa e na teoria do fluxo slido, pelo que integram uma funo que descreve a velocidade de sedimentao e a sua dependncia face concentrao local a sedimentao potenciada pelo incremento da concentrao, a partir de um determinado valor e no ndice de lamas (SVI), um indicador da capacidade de sedimentao das lamas.

    A seleco do modelo a utilizar em cada caso deve ter em conta os objectivos do modelo, a utilizao final e as variveis a modelar, incidindo sobre os seguintes aspectos: tipo de tanque, configurao da entrada e da sada, recolha de lamas, zona de floculao, carga hidrulica superficial, carga de slidos, caractersticas das lamas, natureza do escoamento (1D, 2D ou 3D), regime de escoamento (varivel ou permanente) e relevncia da actividade biolgica. No 1163H1163HQuadro 1 apresentam-se, resumidamente, alguns princpios orientadores da seleco do modelo de decantao.

    Quadro 1 - Princpios orientadores da seleco do modelo de decantao. Objectivos (questes a responder com o modelo) Modelo

    Avaliar a concentrao da biomassa no efluente final, aaltura do manto de lamas e a produo de lamas

    1D e/ou 2D associado a um modelo delamas activadas

    Esquema de remoo de lamas 2D associado a um modelo de lamasactivadas verificado possivelmente comum modelo 3D

    Optimizao da geometria (e detalhes construtivos) dodecantador, reabilitao e estudo de correntes dedensidade

    2D e/ou 3D

    Modelao de decantadores sujeitos aco do vento 3D

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    2.3.3 TEORIA DO FLUXO: PRINCPIOS BSICOS

    A teoria do fluxo define a velocidade de sedimentao em funo da concentrao da biomassa, considerando que os slidos que afluem ao decantador secundrio esto sujeitos a um fluxo gravitacional de sedimentao, jS, e a um fluxo de gua (ascendente ou descendente, consoante se deva sada de efluente decantado ou extraco de lamas do fundo do rgo), jB. Assim, o fluxo total, jT, que representa a produo de slidos por unidade de rea e por unidade de tempo, dado por:

    XVXVjjj SBST .. +=+= (9)

    em que: VS - velocidade de sedimentao (m/s); V - velocidade de recirculao da biomassa devido ao fluxo de gua (m/s); X - concentrao das lamas (mg/l).

    Os modelos assumem, em geral, perfis horizontais de velocidade uniformes e consideram que os gradientes horizontais da concentrao so desprezveis, pelo que apenas modelam os processos na direco vertical. Estes modelos admitem que o caudal afluente ao decantador secundrio homogeneamente distribudo numa camada horizontal (correspondente camada de entrada), dividindo-se depois numa corrente ascendente e noutra descendente. As caractersticas especficas do tanque (e.g., formato da entrada e da sada, seco circular ou rectangular) no so discriminadas, no sendo portanto consideradas neste tipo de modelos.

    Os modelos baseados na teoria do fluxo so apropriados para associao a modelos de lamas activadas, como os modelos ASM da IWA, dando uma aproximao razovel do balano das lamas e da transferncia de lamas do tanque de arejamento para o decantador secundrio. A aplicao de modelos baseados na teoria do fluxo no requer grande capacidade computacional.

    2.3.4 ABORDAGEM MULTI-CAMADAS

    Os modelos mais comuns destinados simulao do comportamento dos decantadores secundrios baseiam-se na equao da continuidade, em balanos de massa e na teoria do fluxo. Em termos computacionais, a aplicao destes modelos unidimensionais aos decantadores secundrios concretizada atravs da diviso deste rgo em n camadas horizontais de espessura constante.

    este o princpio dos modelos multi-camadas, que consideram um nmero de camadas usualmente entre 10 e 100, dependendo na preciso pretendida em termos da previso da altura do manto de lamas e do objectivo global da simulao. Os slidos de uma camada provm da sedimentao exercida pela camada anterior e sedimentam, por sua vez, para a camada imediatamente abaixo. Para alm deste fluxo gravitacional, existe igualmente um fluxo associado ao escoamento observado, ascendente ou descendente, como se observa na 1164H1164HFigura 4. Devem ser considerados cinco tipos distintos de camadas, em funo da respectiva posio relativamente camada de entrada:

  • 22

    camada de topo; camadas situadas acima da camada de entrada (camadas i); camada de entrada (camada m); camadas situadas abaixo da camada de entrada (camadas j); camada de fundo.

    A camada de topo e a do fundo requerem ateno especial uma vez que, no primeiro caso, no recebe qualquer fluxo de slidos e que, na segunda situao, sai dela um fluxo associado ao escoamento. A localizao da camada de entrada pode variar: quanto mais perto do fundo ela se encontrar, mais suaves sero os gradientes de concentrao. Na 1165H1165HFigura 4 representa-se, de forma esquemtica, a abordagem multi-camadas, incluindo as contribuies a ter em conta para cada tipo de camada considerado.

    Figura 4- Representao esquemtica da abordagem multi-camadas.

    O modelo assume que as camadas se encontram bem misturadas, homogneas, e que o volume do decantador se mantm constante, pelo que o caudal afluente, QF, igual adio entre o efluente decantado, Qo, e o caudal extrado do fundo do decantador, Qu. Admite-se que o movimento vertical dos slidos e dos lquidos dominante, desprezando-se o movimento horizontal. Os fluxos que saem de cada camada dependem da concentrao observada no interior dessa mesma camada (na camada de topo, a concentrao igual do efluente do decantador secundrio, Xo, enquanto que na camada de fundo iguala a do caudal recirculado, Xu). Por razes de continuidade, os fluxos devem ser idnticos aos das camadas vizinhas, que partilham da mesma fronteira.

    Neste contexto, as equaes de balano de massas das camadas i, m e j correspondem, respectivamente, s seguintes expresses:

    iiiiiii

    i XVXVsXXVodtdX

    h += + 111 ).(. (10)

    ( ) 11).(. ++++= mmmmFmm XVsVsVuVoXVuVoXdtdX

    h (11)

    jjjjjjj

    j XVXVsXXVudtdX

    h += 111 ).(. (12)

  • 23

    em que: h - espessura da camada (m); t - tempo (s); Vo - velocidade devida ao fluxo de gua do efluente decantado (m/s); Vu - velocidade devida ao fluxo de gua da purga de lamas (m/s); Vs - velocidade de sedimentao gravtica (m/s); X - concentrao de slidos (g/ m3).

    A resoluo deste conjunto de equaes passa pela discretizao do termo dependente do tempo em intervalos de tempo t, possibilitando a determinao do perfil da concentrao em slidos no decantador secundrio, tanto em regime permanente como em regime uniforme.

    Em condies normais de carga afluente, h uma inconsistncia nos clculos (ao nvel do perfil de concentraes e da velocidade de sedimentao) pois a concentrao da camada do fundo determinada por balano de massas global e na camada imediatamente acima pela teoria do fluxo. Para evitar este problema, designado por inconsistncia nas fronteiras, uma possvel abordagem consiste em atribuir um valor nulo ao volume da ltima camada, o que desliga Xu de Xn, fazendo com que Xu reflicta uma alterao rpida a uma mudana de carga.

    2.3.5 MODELAO DA VELOCIDADE DE SEDIMENTAO

    So referidos na literatura diversos modelos para a velocidade de sedimentao (Olsson e Newell, 1999; Dochain e Vanrolleghem, 2001; entre outros). Dos modelos existentes, destaca-se o modelo exponencial de Vesilind (1968), o modelo de Takcs, tambm conhecido por modelo duplo exponencial (1991) e o modelo de Cho (1993), traduzidos, respectivamente, pelas equaes 1166H1166H(13), 1167H1167H(14) e 1168H1168H(15).

    XaevVs .0 .= (13)

    ( )min).(min).(0 XXrpXXrh eevVs = (14) XevVs Xa.0 .

    = (15)

    em que: Vs - velocidade de sedimentao (m/d); vo - velocidade mxima de sedimentao de Vesilind (m/d); a - parmetro de sedimentao (m3/g); rh - parmetro de sedimentao por compresso (m3/g); rp - parmetro de sedimentao floculenta (m3/g); X - concentrao de slidos (g/ m3); Xmin - concentrao mnima de slidos (corresponde fraco no sedimentvel de

    SST presentes no afluente, dada por Xmin = fns.Xafl) (g/ m3).

  • 24

    O modelo exponencial de Vesilind, apresentado na 1169H1169HFigura 5 (b), assume que a velocidade de sedimentao apenas funo da concentrao local (assuno de Kynch representada na 1170H1170HFigura 5 (a)).

    (a) (b)

    Figura 5 Representao grfica da velocidade de sedimentao obtida segundo o modelo exponencial de Vesilind (a) e do fluxo correspondente (b).

    Entre as principais limitaes do modelo de Vesilind, refere-se que:

    As constantes vo e a podem ser obtidas por regresso linear com base em resultados experimentais que determinem Vs para uma vasta gama de X (Ekama et al., 1997; Vanderhasselt e Vanrolleghem, 2000). Dado o extenso trabalho experimental necessrio, foram estabelecidas correlaes empricas que relacionam estes parmetros com as caractersticas de sedimentabilidade das lamas obtidas por ensaios como o SVI e o DSVI (Ekama et al., 1997). Estas correlaes devem ser usadas de forma cuidadosa pois a sua aplicabilidade pode ser limitada (Bye e Dold, 1998; Bye e Dold, 1999; citados por EnviroSim, 2004).

    A aplicao do modelo de Vesilind na teoria do fluxo conduz obteno de uma concentrao de slidos infinita na camada do fundo do decantador secundrio, o que um absurdo. Para contornar este problema, existem alteraes empricas que limitam o fluxo que aflui a cada camada.

    Grande parte dos modelos baseados na teoria do fluxo que incluem uma expresso exponencial simples no descrevem a concentrao de slidos no efluente de forma precisa (prevem com correco suficiente o comportamento, pelo menos qualitativo, no manto de lamas mas so deficientes na zona de clarificao e na zona de compactao, em resultado do tipo de modelo de fluxo assumido e dos respectivos mecanismos). Como tal, estes modelos so aplicveis zona do decantador secundrio onde ocorre a sedimentao, mas no devem ser usados para modelar a clarificao.

    As abordagens mais comuns para modelar a clarificao so a utilizao de um modelo de fluxo na forma de dupla exponencial (como o modelo de Takcs), assumir, acima do manto de lamas, uma velocidade de sedimentao constante ou admitir uma fraco no sedimentvel relacionada com as caractersticas da biomassa. O modelo emprico de Takcs (Takcs et al., 1991) , talvez, o mais correntemente aplicado, sendo, segundo Grijspeerdt et al. (1993) (citado por Vanderhasselt e Vanrolleghem, 2000), o que em regra melhor se adequa aos resultados experimentais.

  • 25

    Na expresso proposta por Takcs, dada pela equao 1171H1171H(14), o primeiro termo exponencial representa a sedimentao que ocorre no manto de lamas e o segundo a clarificao. Os modelos de simulao de decantadores secundrios desenvolvidos com base na equao de Takcs para a velocidade de sedimentao incluem, frequentemente, um parmetro vo que define, em termos prticos, a velocidade mxima de sedimentao (mxima velocidade realmente atingida pelos slidos no processo de sedimentao) (Hydromantis, 2003; EnviroSim, 2004).

    Na 1172H1172HFigura 6 apresentada, graficamente, a velocidade de sedimentao obtida pelo modelo de Takcs. Nesta figura distinguem-se quatro zonas:

    I) a velocidade de sedimentao nula pois a concentrao de SST atinge o valor mnimo, Xmin;

    II) a velocidade de sedimentao aumenta com o incremento da concentrao de SST, sendo fortemente influenciada pela natureza floculante dos slidos o comportamento do modelo depende do valor do parmetro rp;

    III) a velocidade de sedimentao independente da concentrao de SST, dado que se admite que as partculas atingiram a dimenso mxima, assumindo o valor vo;

    IV) a sedimentao por compresso o processo dominante e a velocidade de sedimentao reduz-se funo de Vesilind, pelo que o comportamento do modelo depende do valor do parmetro rh.

    Figura 6 Representao grfica da velocidade de sedimentao obtida pelo modelo de Tkacs.

    2.3.6 MODELO BSICO DA TEORIA DO FLUXO E SUAS LIMITAES

    Na sua forma mais simples, o modelo dinmico derivado da teoria do fluxo, e baseado em balanos de massas, pode ser expresso pela expresso 1173H1173H(16), em que apenas a conveco considerada (atravs do termo zF / ):

    zF

    tX

    =

    (16)

    em que: F - fluxo slido de biomassa (g/m2/d); z - profundidade do decantador, medida desde o topo at ao fundo (m).

  • 26

    Assumindo que cada camada dz uniforme, pode-se deduzir das equaes 1174H1174H(9) e 1175H1175H(16) um modelo 1D que apenas considera uma coordenada espacial, z, e que expresso pela equao diferencial parcial 1176H1176H(17), que depende do tempo t e da posio z:

    zXV

    zXV

    tX S

    +

    = .. (17)

    Uma das limitaes do modelo bsico reside no facto deste no permitir evidenciar, pelo menos em regime uniforme, os gradientes de concentrao: ao aplicar o modelo em condies de regime uniforme ( 0/ = tX ), a nica soluo possvel para a equao de balano de massas aponta para a no existncia de gradientes de concentrao ( 0/ = zX ) o que, de acordo com os resultados experimentais, no se verifica. Adicionalmente, ao simular um acrscimo de carga afluente ao decantador secundrio pela expresso 1177H1177H(17), designadamente em tempo de chuva, provocada uma onda de choque que se propaga ascendente e descendentemente, no sendo amortecida com o tempo. Como as condies de fronteira no topo e no fundo do decantador no incluem qualquer expresso para o fluxo de sedimentao, essas ondas de choque no so absorvidas, provocando a instabilidade numrica do modelo. Para contornar estas limitaes necessrio impor restries associadas ao fluxo, ou seja, proceder restrio do fluxo de sedimentao de uma camada para a outra (o que est de acordo com a existncia de limites de compactao, sobre os quais ainda o conhecimento incipiente).

    Existem diferentes formas de integrar as restries de fluxo de sedimentao nos modelos, s quais correspondem modelos modificados, baseados no modelo bsico derivado da teoria do fluxo slido. As duas principais abordagens so descritas de seguida.

    1. Impor uma limitao de fluxo no modelo A abordagem mais simples consiste em impor, posteriori, uma limitao de fluxo no modelo: considerando um modelo em camadas, admite-se uma limitao de fluxo de uma camada para a outra, ou seja, imposto que a concentrao de uma camada inferior ou igual da camada situada abaixo desta, o que impede a onda de choque de se propagar no sentido descendente. Este modelo modificado bastante adequado para simular o comportamento de decantadores secundrios pois aproxima-se de um modelo com derivadas de segunda ordem, obtendo-se, em regra, resultados muito bem adaptados realidade. No entanto, as bases fsicas do modelo so questionveis, sendo difcil estabelecer uma correspondncia directa entre o fenmeno fsico descrito e as expresses que constituem o modelo o principal problema reside no facto da limitao de fluxo no estar interligada com o balano de massas, sendo apenas introduzida aps o procedimento de aproximao do resultado.

    2. Incluir implicitamente a limitao do fluxo ao derivar o modelo de balano de massas Para incluir implicitamente a limitao do fluxo ao derivar o modelo de balano de massas necessrio introduzir um termo de segunda ordem relativamente derivada de z. Este termo representa a difuso turbulenta (eddy difusion, em terminologia anglo-saxnica) em conformidade com a lei de Fick, e usado para simular o regime de fluxo pisto no

  • 27

    ideal e a presena de efeitos de mistura, o que permite modelar gradientes espaciais de concentrao nos decantadores secundrios. As novas equaes do fluxo e de balano de massas so, respectivamente as seguintes:

    tXDXuXvF df += ...

    (18)

    2

    2..

    zXD

    zXV

    zXV

    tX

    dfS

    +=

    (19)

    O termo correspondente difuso turbulenta ( 22. zXDdf ) simplifica a resoluo numrica da nova equao diferencial parcial e permite distinguir entre efeitos provocados por questes relativas sedimentabilidade das lamas (considerados via Vs) e efeitos hidrodinmicos (considerados via Ddf, o coeficiente de pseudo-difuso).

    As metodologias anteriormente referidas para contornar a inconsistncia nas fronteiras, aliadas imposio de restries rgidas ao fluxo de sedimentao nas camadas inferiores, conduzem obteno de resultados de simulao mais adaptados realidade. Contudo, continuam a existir interaces entre fronteiras e condies de escoamento no interior dos decantadores secundrios que no so previstas, pelo menos directamente, por modelos 1D, nomeadamente:

    condies derivadas da geometria (seco em planta) e tipo de entrada e descarga dos decantadores;

    diluio das lamas na camada do fundo devido a eventuais curto-circuitos hidrulicos, que arrastam para a zona de extraco lamas menos concentradas, provenientes da zona de entrada (segundo Ekama et al. (1997), comum verificar-se Xu= 0,7.Xn);

    efeitos de correntes de densidade, turbulncia e ressuspenso de flocos do manto de lamas.

    Para ter em conta este tipo de interaces, recomenda-se, geralmente, a adopo de modelos 2D e 3D.

    2.3.7 MODELOS 2D E 3D

    Os modelos hidrodinmicos 2D so modelos determinsticos (do tipo glass box ou white box), que representam os processos que ocorrem nos decantadores secundrios atravs de equaes diferenciais: com base nas equaes 1178H1178H(9) e 1179H1179H(16), possvel deduzirem-se modelos 2D e 3D considerando, respectivamente, duas ou trs coordenadas espaciais. Estes modelos so especialmente indicados para simular o comportamento de decantadores secundrios no circulares.

    O desempenho dos decantadores secundrios depende das condies de hidrodinmica e da eficincia de remoo dos slidos. Para que os modelos traduzam adequadamente os efeitos destes processos, as equaes diferenciais que os descrevem devem ser resolvidas em simultneo, incluindo nomeadamente as seguintes equaes: equao da continuidade, da conservao do momento (uma equao por cada dimenso usada no modelo) e do amortecimento da turbulncia (que permite desenvolver a equao de transporte slido por

  • 28

    difuso turbulenta). Estas equaes hidrodinmicas, aliadas s condies de fronteira, permitem obter o campo de velocidades e os coeficientes da mistura turbulenta.

    Na 1180H1180HFigura 8 apresentam-se, esquematicamente, os padres tpicos de escoamento hidrodinmico em decantadores secundrio circulares, segundo Ekama et al. (1997).

    Figura 7 Padres tpicos de escoamento em decantadores secundrio circulares

    (adaptada de Ekama et al., 1997).

    A 1181H1181HFigura 8 reporta-se aos padres tpicos de escoamento em decantadores secundrios rectangulares, inicialmente apresentados por Larsen (1977) (citado por Ekama et al., 1997)).

    Figura 8 Padres tpicos de escoamento em decantadores secundrios rectangulares

    (adaptada de Ekama et al., 1997).

    Concretamente nos modelos 2D, so usadas as seguintes equaes para descrever o escoamento no interior dos decantadores secundrios:

    equao da continuidade; duas equaes resultantes da conservao do momento, na direco radial/axial e na

    direco vertical; equao de transporte slido (conservao da massa particulada); conservao da energia, que depende da temperatura da massa lquida; equao da turbulncia, incluindo a gerao da turbulncia e o seu amortecimento, devido

    estratificao estvel em camadas, no interior do decantador; equao de estado, que traduz o efeito dos SST na densidade total da mistura; caractersticas de sedimentabilidade das lamas: simplificadamente, os slidos afluentes

    so divididos em flocos (que se considera que sedimentam) e em partculas dispersas (que se admite que so removidas da suspenso por floculao).

  • 29

    Salienta-se que a previso da concentrao de SST no efluente atravs de modelos 2D e 3D emprica e depende do processo de calibrao do modelo, sendo ainda necessrio desenvolver investigao neste domnio para compreender adequadamente os aspectos relacionados com a teoria da compactao e da reologia das lamas, o comportamento dos flocos no interior dos decantadores e a contribuio dos aparelhos de remoo de lamas, entre outros. Adicionalmente, os efeitos de desnitrificao e de libertao de fsforo devem ser includos em modelos mais desenvolvidos, uma vez que estes processos podem ter um impacto significativo no desempenho dos decantadores secundrios.

    2.4. OUTRAS OPERAES E PROCESSOS DE TRATAMENTO DE GUAS RESIDUAIS

    2.4.1 MODELOS DE BIOMASSA FIXA

    Nos sistemas de tratamento baseados em biomassa fixa (como leitos percoladores, biofiltros e discos biolgicos) o tratamento biolgico concretizado no biofilme, verificando-se o despreendimento do biofilme em excesso e a sua separao posterior, durante a decantao secundria.

    Nos processos de tratamento por biomassa fixa ocorrem as mesmas reaces que nos processos de biomassa suspensa. Adicionalmente, h que ter presente a transferncia de massa por difuso, de forma a fazer chegar os nutrientes aos microrganismos que constituem o biofilme, bem como a remoo dos produtos da reaco do seu interior. Neste contexto, a principal diferena entre os modelos de biomassa fixa e os de biomassa suspensa a incluso dos processos de difuso que ocorrem no biofilme (no tratamento por biomassa suspensa tambm ocorre difuso de oxignio e de substrato nos flocos de lamas activadas mas, como os processos limitantes so as reaces biolgicas, este fenmeno pode ser desprezado para efeitos de modelao). No entanto, o principal desafio de concepo dos modelos de biomassa fixa no a descrio dos processos biolgicos de converso mas sim a quantificao e a predio dos processos fsicos de fixao e desprendimento do biofilme, para os quais s se dispe de formulaes empricas ou semi-empricas.

    semelhana dos modelos ASM da IWA, os modelos matemticos destinados a processos de biomassa fixa so apresentados sob a forma matricial de Petersen. Salienta-se que estes processos tm que ser descritos em funo do tempo e do espao, uma vez que a converso dos poluentes ocorre simultaneamente em diferentes locais e que as reaces de converso se verificam a profundidades distintas, no interior do prprio biofilme. A complexidade da modelao , portanto, superior.

    Os modelos destinados a processos de biomassa fixa prevem a remoo do carbono e do azoto e a desnitrificao, incluindo ainda, em alguns casos, a remoo/libertao biolgica de fsforo. Os processos so modelados de forma a que diferentes condies ambientais (aerbias, anxicas e anaerbias) possam ser consideradas no interior do biofilme. Em regra, as perdas de carga e a obstruo no meio de enchimento no so modeladas e a distribuio de

  • 30

    caudal pela rea dos leitos percoladores considerada homognea, desprezando-se o efeito da velocidade de rotao do distribuidor. A espessura mxima do biofilme , geralmente, definida pelo utilizador.

    Genericamente, os modelos consideram o reactor dividido em n seces horizontais. Em cada seco, as concentraes de substrato e produtos no interior do biofilme podem ser modeladas admitindo que este constitudo por um conjunto de camadas de reduzida espessura, paralelas ao meio de enchimento (Olsson e Newell, 1999; Dochain e Vanrolleghen, 2001; Hydromantis, 2003). Usualmente, considera-se uma camada para a interface lquida superficial do biofilme e cinco para o prprio biofilme. Cada camada modelada como um reactor de mistura completa, com as mesmas reaces biolgicas dos modelos de biomassa suspensa. Admite-se que a biomassa se distribui homogeneamente em cada camada do biofilme e que no ocorrem reaces na massa lquida.

    Na 1182H1182HFigura 9 apresenta-se o diagrama conceptual para o modelo de leitos percoladores, incluindo os perfis de concentrao no interior do biofilme, onde as concentraes de substrato so inferiores s da massa lquida e as concentraes de produtos da reaco so superiores, pelo que as taxas de reaco na biomassa so progressivamente mais lentas (podem ocorrer, em simultneo no biofilme, condies aerbias e anaerbias). Do ponto de vista do tratamento, ideal que as reas cobertas com biofilme sejam elevadas e que as respectivas espessuras sejam reduzidas (Olsson e Newell, 1999).

    Figura 9 Diagrama conceptual para o modelo de leitos percoladores

    (adaptada de Olsson e Newell, 1999).

    Estes modelos consideram que a transferncia das variveis de estado solveis pelas camadas do biofilme se processa apenas por difuso, e que variveis particuladas so assimiladas por processos de crescimento. O despreendimento do biofilme inicia-se quando a espessura total do biofilme atingida. Deste modo, os coeficientes de despreendimento e de adeso traduzem a transferncia dos componentes particulados entre a superfcie do biofilme e a interface lquida.

  • 31

    Nos leitos percoladores, em que o meio de suporte fixo, h ainda que considerar os gradientes de concentrao na direco do escoamento. Segundo Dochain e Vanrolleghen (2001), na modelao de reactores de biomassa fixa comum utilizar-se o termo disperso para designar o fenmeno de difuso que ocorre ao longo do reactor. Deste modo, os modelos dinmicos para reactores de biomassa fixa com disperso axial podem ser generalizados admitindo que a disperso obedece lei de Fick (o fluxo perpendicular de partculas por seco de espessura z dado por zCDj = ). Desprezando a disperso radial e considerando um reactor tubular, os modelos podem ser expressos pela equao 1183H1183H(20). As condies de fronteira mais usadas so as de Danckwerts (1953) (citado por Dochain e Vanrolleghen, 2001).

    ( )fixflflmaflfl XXrzX

    Dz

    Xu

    tX

    ,12

    2

    ++

    =

    (20)

    em que: Xfl - concentrao de substrato e produtos que se escoam atravs do reactor (mg/l); Xfix - concentrao de microrganismos fixos ao meio de enchimento (mg/l); - fraco do reactor no ocupada pelo meio de enchimento (quociente entre a

    rea no ocupada pelo meio de enchimento e a rea total) (-); u - velocidade do escoamento (quociente entre o caudal afluente e a rea no

    ocupada pelo meio de enchimento) (m/s); t - tempo (s); z - espessura da camada do biofilme (m); Dma - coeficiente de disperso axial (m2/s); r - taxa de reaco (mg/l/s).

    A partir desta expresso podem ser derivados modelos incluindo a fase gasosa (visto que alguns processos de biomassa fixa incluem arejamento mecnico), a disperso radial ou o facto do meio de enchimento ser mvel (fluidized bed reactor).

    O modelo de Wanner e Reichert (1996) (citado por Rauch et al., 2002) baseia-se igualmente em equaes diferenciais parciais que simulam a remoo de carbono e azoto pelos processos de nitrificao e desnitrificao. Tratando-se de um modelo de equaes diferenciais parciais, o processo de resoluo muito exigente a nvel computacional, pelo que tm sido propostas diversas simplificaes, nomeadamente assumir que a cintica da biodegradao de ordem zero, o que possibilita separar a descrio do transporte da biomassa por difuso, do processo de converso da biomassa (Rauch et al., 1999; citado por Rauch et al., 2002).

    Adicionalmente, a soluo das equaes diferenciais parciais pode ser reescrita recorrendo a equaes diferenciais ordinrias o que permite um considervel aumento da velocidade de simulao. A limitao mais significativa destes modelos est associada ao facto de no descreverem o crescimento, por camadas, dos organismos no biofilme o que, em certas condies, conduz a previses pouco precisas.

    Por fim, destaca-se que os biofiltros diferem dos restantes processos de tratamento por combinarem o tratamento biolgico e a separao de slidos, integrando um processo de

  • 32

    controlo da biomassa em excesso (backwash, em terminologia anglo-saxnica). Assim, pode referir-se que constituem uma combinao entre os modelos de biomassa fixa e os de filtrao.

    2.4.2 FILTRAO E DESINFECO POR RADIAO ULTRAVIOLETA

    Os modelos que simulam o comportamento dos filtros de areia so modelos empricos baseados em eficincias de remoo. Os modelos mais simples admitem que uma fraco do caudal afluente usada para a lavagem do filtro (backwash), transportando os slidos que so retidos pelo filtro e cuja quantidade depende da eficincia de remoo previamente definida.

    Os modelos mais complexos, unidimensionais, baseiam-se em balanos de massa e integram, alm destas equaes, as equaes diferenciais parciais da cintica definidas por Horner et al. (1986) (citado por Hydromantis, 2003). Estes modelos descrevem a remoo das partculas em suspenso num filtro granular e podem ser expressos pela equao 1184H1184H(21).

    CuC

    dtd

    d =

    1

    (21)

    em que: - volume de slidos depositado no filtro por unidade de volume; - coeficiente de filtrao; C - concentrao de SST; u - velocidade de aproximao (velocidade do escoamento sobre o filtro); d - porosidade dos slidos retidos no filtro; t - tempo.

    Para aplicar estes modelos, o filtro dividido em diversas camadas horizontais, admitindo-se que os sedimentos ficam depositados uniformemente em cada camada, sendo arrastados durante o ciclo de limpeza do filtro.

    Os modelos empricos destinados desinfeco por cloragem consideram que a fraco de E.coli sobrevivente pode ser estimada com base no tempo de deteno na unidade de desinfeco, atravs da equao 1185H1185H(22).

    det2 tcclkeScoli = (22)

    em que: Scoli - fraco de E.coli que sobrevive (-); k - taxa de mortalidade (m3/(g.min)); ccl2 - dosagem de cloro (g/m3); tdet - tempo de deteno (dado pelo quociente entre o volume da unidade de

    desinfeco e o caudal afluente) (min).

  • 33

    Os modelos destinados desinfeco por radiao ultravioleta, igualmente de cariz emprico, baseiam-se, em regra, no modelo proposto em 1995 pela Water Environment Research Foundation (WERF, 1995; citado por Hydromantis, 2003). A concentrao de coliformes no efluente estimada pela expresso:

    nDfN = (23)

    em que: N - concentrao de coliformes no efluente (NMP/100 ml); D - dose de radiao ultravioleta (mW.s/cm3); n - coeficiente emprico relativo dose e tipo de radiao ultravioleta (-); f - factor emprico de qualidade (-).

    O factor emprico de qualidade determinado por regresso atravs da equao seguinte:

    ba UFTSSAf = (24)

    em que: SS - concentrao de SST no afluente (mg/l); UFT - fraco da transmitncia no filtrada de UV a 253,7 nm (-); A, a, b - coeficientes empricos (-).

    Teoricamente, existem disponveis os seguintes trs mtodos ou metodologias para estimar doses de UV (Matos, 2005):

    1) No primeiro, conhecido como Point Source Summation (PSS), a dose ultravioleta calculada pressupondo uma intensidade mdia e um tempo mdio de exposio. um mtodo que depende das condies hidrodinmicas de cada sistema.

    2) O segundo mtodo, envolve clculos hidrodinmicos (Computational FIuid Dynamics, CFD) para integrar a distribuio espacial e temporal da radiao e o perfil de velocidades no reactor. um mtodo prometedor, mas ainda pouco vulgarizado.

    3) No terceiro mtodo, vulgarmente considerado mais adequado, a dose determinada por bio-ensaios (bioassays). Em regra, a aplicao do mtodo envolve um reactor com a amostra qual so aplicadas doses variveis de radiao, por equipamento especfico (collimated-beam, em terminologia anglo-saxnica), por forma a estimar, na prtica, a dose requerida para inactivao.

    2.4.3 DIGESTO ANAERBIA

    A digesto anaerbia um processo de fermentao em que favorecida a produo de gs metano, de elevado valor energtico, para reduzir o contedo em matria orgnica dos afluentes lquidos ou slidos (Olsson e Newell, 2001). Devido enorme variedade de caminhos metablicos disponveis para a comunidade anaerbia, a bioqumica e microbiologia deste processo apresentam complexidade muito superior relativamente s dos processos aerbios (Henze e Harremes, 1983). Na 1186H1186HFigura 10 apresentam-se, de forma

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    simplificada, as principais etapas do processo de digesto anaerbia (adaptada de Gujer e Zehnder, 1983; citados por Ribeiro, 1999).

    Os primeiros modelos matemticos fisicamente baseados para a digesto anaerbia consideravam apenas as reaces metanognicas, no pressuposto que a produo de metano era a etapa limitante do processo (Andrews, 1969; Andrews e Graef, 1971; citados por EnviroSim, 2004). Uma extenso inicial desta abordagem conceptual inclua as reaces dos organismos acidognicos, considerando a hidrlise e a produo de AGV (Hill e Barth, 1977; citados por EnviroSim, 2004). Estes modelos consideravam a concentrao de AGV o nico substrato para os organismos metanognicos.

    Figura 10 Representao esquemtica do processo de digesto anaerbia

    (adaptada de Gujer e Zehnder, 1983; citados por Ribeiro, 1999).

    A importncia do hidrognio na regulao da distribuio e consumo dos produtos esteve na origem de muitos modelos de digesto anaerbia posteriores (Mosey, 1983). Este avano permitiu aos modelos a previso da formao de vrios produtos da fermentao, para alm do cido actico, tais como o propionato e butirato. Adicionalmente, a produo de metano a partir do cido actico e do hidrognio passou a ser considerada nos modelos.

    O modelo introduzido por Mosey (1983) e Rozzi et al. (1985) (citados por Rauch et al., 2002), considera quatro tipos de populao bacteriana para descrever as principais converses que ocorrem em condies anaerbias: organismos heterotrficos (responsveis pela hidrlise, amonificao e fermentao anaerbia); bactrias acetognicas (responsveis pela acetognese); bactrias metanognicas hidrogenotrficas e bactrias metanognicas acetoclsticas (responsveis pela metanognese). A subdiviso da biomassa metanognica em duas classes visa a introduo do hidrognio como um produto intermdio da produo de metano: a acetognese termicamente desfavorvel s sendo possvel mediante a remoo

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    contnua de hidrognio pelas bactrias hidrogenotrficas (Dolfing, 1988; citado por Ribeiro, 1999). A presena de hidrognio no gs do reactor indicadora da inibio da met