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Versão online: http://www.lneg.pt/iedt/unidades/16/paginas/26/30/185 Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial II, 641-644 IX CNG/2º CoGePLiP, Porto 2014 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X Modelo de circulação sedimentar litoral no arco Caparica-Espichel Caparica-Espichel longshore sediment transport model R. Taborda 1,2* , C. Freire de Andrade 1,3 , A. Nobre Silva 2 , T. M. Silveira 3 , C. Lira 2 , M. C. Freitas 1,3 , C. A. Pinto 4 © 2014 LNEG – Laboratório Nacional de Geologia e Energia IP Resumo: Neste trabalho avaliou-se o sinal e a magnitude da deriva litoral no arco Caparica-Espichel, recorrendo a seis estratégias de modelação. Os resultados mostram a necessidade de adotar estratégias de modelação que considerem explicitamente as relações retroativas entre a evolução da faixa costeira e o forçamento oceanográfico, utilizando um modelo de evolução de linha de costa. Propõe-se um modelo de circulação sedimentar com transporte residual anual (potencial e efetivo) para norte, ao longo de todo o domínio. Do extremo sul até uma fronteira localizada entre o Meco e a Lagoa de Albufeira, a magnitude da deriva litoral aumenta progressivamente, aumento este que é sustentado por recuo da linha de costa. A norte desta fronteira, o sistema adota uma configuração de equilíbrio onde a magnitude da deriva litoral é constante. Palavras-chave: Deriva litoral, Modelo de linha de costa. Abstract: The longshore drift along the Caparica-Espichel coastal stretch was evaluated using several modelling strategies. Results show the need to adopt a strategy describing the feedback between coastline evolution and oceanographic forcing through the use of a shoreline evolution model. A sedimentary circulation model for this coastal stretch is proposed with a net northward transport along the entire domain. From the southern end up to Meco/Lagoa de Albufeira boundary, longshore drift progressively increases and is sustained by shoreline retreat. Further updrift the coastal system adopts an equilibrium shape with a constant net longshore drift. Keywords: Longshore drift, Coastline model. 1 Faculdade de Ciências, Universidade de Lisboa. 2 Instituto Dom Luiz. 3 Centro de Geologia da Universidade de Lisboa. 4 Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. *Autor correspondente / Corresponding author: [email protected] 1. Introdução O troço Caparica-Espichel corresponde a um arco litoral de grande raio de curvatura que se estende ao longo de 30 km, desde o cabo Espichel até à Cova do Vapor (Fig. 1). Este arco pode ser dividido em dois sectores com características geomorfológicas distintas: um sector meridional, entre o cabo Espichel e a praia das Bicas (6 km) dominado por arribas altas desenvolvidas em rochas essencialmente carbonatadas, e um setor setentrional que se prolonga da praia das Bicas à Cova do Vapor e que corresponde a um litoral arenoso contínuo limitado por arribas talhadas em formações detríticas pouco consolidadas (no segmento sul, até ao paralelo de Fonte da Telha), por cordões dunares mais ou menos degradados (na parte central, entre a Fonte da Telha e a Costa da Caparica) e por estruturas de proteção costeira (no extremo norte). A construção destas estruturas de proteção iniciou- se em 1959 com o objetivo de contrariar uma tendência erosiva persistente no setor costeiro adjacente à Caparica (Veloso-Gomes et al., 2009). Este fenómeno erosivo está associado a um défice crónico no balanço sedimentar cuja origem não está, ainda, totalmente esclarecida mas que terá como componente fundamental a entrada de sedimento por deriva litoral do segmento costeiro a sul. Apesar de já terem sido propostos alguns modelos de circulação sedimentar para este arco litoral (Abecasis, 1987), e avançadas algumas estimativas para a magnitude deste transporte, eles são muito divergentes e na maior parte dos casos sustentados unicamente em análises de natureza qualitativa. O principal objetivo deste trabalho é propor um novo modelo de circulação sedimentar, e avaliar a magnitude da deriva litoral no arco litoral Caparica-Espichel. Para atingir este objetivo são ensaiadas diversas estratégias de modelação do trânsito sedimentar litoral. 2. Métodos A deriva litoral (Qls) ocorre sempre que a componente longilitoral do fluxo de energia das ondas na rebentação (Pls) é diferente de zero e exista disponibilidade sedimentar no sistema costeiro. As relações numéricas entre Pls e Qls são ainda relativamente mal conhecidas e são essencialmente suportadas por métodos empíricos. Estes métodos, coletivamente conhecidos como métodos de fluxo de energia, exigem alguma parametrização das variáveis intervenientes, tendo sido utilizados no presente trabalho para avaliar a deriva litoral. A estimativa de Qls recorreu às relações descritas em Rosati et al. (2002): (Eq. 1) Artigo Curto Short Article

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Versão online: http://www.lneg.pt/iedt/unidades/16/paginas/26/30/185 Comunicações Geológicas (2014) 101, Especial II, 641-644 IX CNG/2º CoGePLiP, Porto 2014 ISSN: 0873-948X; e-ISSN: 1647-581X

Modelo de circulação sedimentar litoral no arco Caparica-Espichel Caparica-Espichel longshore sediment transport model R. Taborda1,2*, C. Freire de Andrade1,3, A. Nobre Silva2, T. M. Silveira3, C. Lira2, M. C. Freitas1,3, C. A. Pinto4

© 2014 LNEG – Laboratório Nacional de Geologia e Energia IP

Resumo: Neste trabalho avaliou-se o sinal e a magnitude da deriva litoral no arco Caparica-Espichel, recorrendo a seis estratégias de modelação. Os resultados mostram a necessidade de adotar estratégias de modelação que considerem explicitamente as relações retroativas entre a evolução da faixa costeira e o forçamento oceanográfico, utilizando um modelo de evolução de linha de costa. Propõe-se um modelo de circulação sedimentar com transporte residual anual (potencial e efetivo) para norte, ao longo de todo o domínio. Do extremo sul até uma fronteira localizada entre o Meco e a Lagoa de Albufeira, a magnitude da deriva litoral aumenta progressivamente, aumento este que é sustentado por recuo da linha de costa. A norte desta fronteira, o sistema adota uma configuração de equilíbrio onde a magnitude da deriva litoral é constante. Palavras-chave: Deriva litoral, Modelo de linha de costa. Abstract: The longshore drift along the Caparica-Espichel coastal stretch was evaluated using several modelling strategies. Results show the need to adopt a strategy describing the feedback between coastline evolution and oceanographic forcing through the use of a shoreline evolution model. A sedimentary circulation model for this coastal stretch is proposed with a net northward transport along the entire domain. From the southern end up to Meco/Lagoa de Albufeira boundary, longshore drift progressively increases and is sustained by shoreline retreat. Further updrift the coastal system adopts an equilibrium shape with a constant net longshore drift. Keywords: Longshore drift, Coastline model.

1Faculdade de Ciências, Universidade de Lisboa. 2Instituto Dom Luiz. 3Centro de Geologia da Universidade de Lisboa. 4Agência Portuguesa do Ambiente, I.P. *Autor correspondente / Corresponding author: [email protected]

1. Introdução

O troço Caparica-Espichel corresponde a um arco litoral de grande raio de curvatura que se estende ao longo de 30 km, desde o cabo Espichel até à Cova do Vapor (Fig. 1). Este arco pode ser dividido em dois sectores com características geomorfológicas distintas: um sector meridional, entre o cabo Espichel e a praia das Bicas (≈ 6 km) dominado por arribas altas desenvolvidas em rochas essencialmente carbonatadas, e um setor setentrional que se prolonga da praia das Bicas à Cova do Vapor e que

corresponde a um litoral arenoso contínuo limitado por arribas talhadas em formações detríticas pouco consolidadas (no segmento sul, até ao paralelo de Fonte da Telha), por cordões dunares mais ou menos degradados (na parte central, entre a Fonte da Telha e a Costa da Caparica) e por estruturas de proteção costeira (no extremo norte). A construção destas estruturas de proteção iniciou-se em 1959 com o objetivo de contrariar uma tendência erosiva persistente no setor costeiro adjacente à Caparica (Veloso-Gomes et al., 2009). Este fenómeno erosivo está associado a um défice crónico no balanço sedimentar cuja origem não está, ainda, totalmente esclarecida mas que terá como componente fundamental a entrada de sedimento por deriva litoral do segmento costeiro a sul. Apesar de já terem sido propostos alguns modelos de circulação sedimentar para este arco litoral (Abecasis, 1987), e avançadas algumas estimativas para a magnitude deste transporte, eles são muito divergentes e na maior parte dos casos sustentados unicamente em análises de natureza qualitativa.

O principal objetivo deste trabalho é propor um novo modelo de circulação sedimentar, e avaliar a magnitude da deriva litoral no arco litoral Caparica-Espichel. Para atingir este objetivo são ensaiadas diversas estratégias de modelação do trânsito sedimentar litoral.

2. Métodos

A deriva litoral (Qls) ocorre sempre que a componente longilitoral do fluxo de energia das ondas na rebentação (Pls) é diferente de zero e exista disponibilidade sedimentar no sistema costeiro. As relações numéricas entre Pls e Qls são ainda relativamente mal conhecidas e são essencialmente suportadas por métodos empíricos. Estes métodos, coletivamente conhecidos como métodos de fluxo de energia, exigem alguma parametrização das variáveis intervenientes, tendo sido utilizados no presente trabalho para avaliar a deriva litoral.

A estimativa de Qls recorreu às relações descritas em Rosati et al. (2002):

(Eq. 1)

Artigo Curto Short Article

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onde,

Qls Deriva litoral (m3/s); Hsb Altura significativa de onda na rebentação (m); αb Ângulo de ataque da onda na rebentação; K Coeficiente empírico (0.39); A Coeficiente empírico (0.233 m1/2/s) apropriado

para sedimento quártzico com porosidade de 40 %, água do mar, rebentação em águas rasas e critério de rebentação Hsb/Db = 0.78 (Db – profundidade na rebentação).

Fig. 1. Área de estudo. Fig. 1. Study area.

Para caracterizar o forçamento oceanográfico utilizou-se uma série de ondas ao largo entre 1970 e 1995 (Dodet et al., 2010), testada e considerada representativa de um conjunto mais alargado. A propagação da agitação para a costa foi feita onda-a-onda com recurso ao modelo SWAN (Booij et al., 1999), sobre malhas batimétricas encaixadas, com 500 e 200 m de resolução espacial.

Considerando a elevada sensibilidade do cálculo de Qls (Eq. 1) ao termo direcional (ângulo de ataque na rebentação), ensaiaram-se as seguintes estratégias:

E1. Para cada onda propagada através do domínio computacional e cada passo de tempo, identificou-se o centro da célula imediatamente a barlamar da que contém a rebentação, extraindo-se a orientação do fundo e as características da onda. A partir deste ponto, utilizou-se a Lei de Snell e a teoria linear para simular a propagação da onda até à rebentação, assumindo que a orientação da batimetria desde o centro daquela célula até à linha de rebentação se mantinha invariante. Obtiveram-se resultados de deriva litoral potencial ao longo da costa, em intervalos de 400 m, entre as praias de São João e das Bicas (Fig. 2 - E1);

E2. Metodologia idêntica à utilizada em E1, mas em vez de se determinar o ângulo de ataque através da malha batimétrica utilizou-se a linha de costa obtida sobre ortofotomapa de 2010 à qual foi aplicada uma suavização com o método PAEK (Polynomial Approximation with Exponential Kernel) e uma tolerância (smoothing tolerance) de 1000 m. Neste caso, os resultados de deriva litoral ao longo da costa foram obtidos em intervalos regulares de 200 m, entre a Cova do Vapor e a praia das Bicas (Fig. 2 – E2);

E3. Metodologia de propagação idêntica à utilizada em E1, mas apenas até à profundidade de 15 m. Desta profundidade até à rebentação a propagação foi simulada com a Lei de Snell considerando a mesma linha de costa que em E2 (Fig. 2 – E3);

E4. Metodologia de propagação idêntica à utilizada em E3, mas intensificando a suavização do traçado da linha de costa através da aplicação de um ajuste polinomial de grau 4 à linha de costa descrita em E2 (Fig. 2 – E4);

E5. Metodologia de propagação idêntica à utilizada em E3, mas acoplada a um Modelo Unidimensional de Evolução de Linha de Costa (MELC). Em cada passo de tempo (6 horas) o MELC atualizou a posição da linha de costa de forma a satisfazer a equação da continuidade, independentemente do conteúdo geomorfológico da faixa terrestre (duna ou arriba) adjacente à praia. Considerou-se uma profundidade de fecho constante de 11 m (NMM), uma fronteira sul fechada, localizada 4 km a sul do Meco e uma fronteira norte aberta, localizada no paralelo da praia da Saúde (Fig. 2 – E5);

E6. Metodologia de propagação idêntica à utilizada em E5, mas reduzindo o domínio de simulação ao setor costeiro que não experimentou evolução significativa nas últimas décadas. As fronteiras sul (Meco) e norte (praia da Saúde) deste setor foram consideradas abertas. A linha de costa utilizada nesta simulação resultou de uma suavização obtida através de uma corrida do MELC no troço costeiro durante 25 anos (Fig. 2 – E6).

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Fig. 2. Variação do resíduo anual de deriva litoral ao longo do arco Caparica-Espichel calculada através das estratégias de modelação E1 a E6 (verde – para sul; vermelho – para norte). Fig. 2. Annual variation of the net longshore drift along Caparica-Espichel coastal stretch computed through the adopted modelling strategies: E1 to E6 (green – southward directed; red – northward directed).

3. Resultados Os resultados da deriva litoral residual ao longo do arco Caparica-Espichel obtidos através das estratégias de modelação E1 a E6 são díspares e, nos casos E1 a E4, apresentam elevada magnitude e variabilidade espacial.

A estratégia E1 conduz a estimativas variáveis no intervalo de +3 a -7 × 106 m3/ano. Observa-se resíduo dirigido geralmente para norte, a norte da Lagoa de Albufeira, e para sul, num domínio que se estende para sul da lagoa, apesar de, localmente, a tendência se inverter. Na região do campo de esporões da Caparica e praia de São João a variabilidade espacial da magnitude é muito elevada. Nos seus aspetos qualitativos, estes resultados são compatíveis com um modelo de circulação sedimentar de mesoescala onde uma região central de divergência e erosão sustenta a fuga de sedimentos para as extremidades setentrional e meridional deste arco.

A estratégia E2 reduz as estimativas da amplitude da deriva litoral para cerca de metade (+1.5 a -4 × 106 m3/ano). Em todo o arco predomina o transporte sólido para norte com exceção de três troços com extensão quilométrica: praia da Rainha à praia de São João, região da Fonte da Telha e região da Mina de Ouro (a meia distância entre a Lagoa de Albufeira e a Fonte da Telha). Continua a observar-se elevada variabilidade espacial e valores de magnitude de deriva litoral muito elevados a sul da praia do Meco e na praia de São João. Estes resultados, apesar de espacialmente pouco coerentes e das fortes variações na magnitude e sinal, são mais compatíveis com um modelo regional de circulação no qual predomina o transporte residual para norte com fontes sedimentares

localizadas a sul da Lagoa de Albufeira e erosão na praia de São João.

A estratégia E3 mantém a amplitude da deriva litoral no intervalo + 1.5 a -4 × 106 m3/ano. Os resultados são espacialmente mais consistentes e compatíveis com uma deriva residual dirigida para norte, exceto em dois dos três troços já identificados acima (região da Fonte da Telha e da Mina de Ouro). A sul observa-se forte diminuição da magnitude do resíduo da deriva, desde o extremo sul do domínio até à praia do Meco; para norte, observam-se variações significativas da intensidade de deriva mas as entradas na fronteira da praia do Meco são idênticas em magnitude às saídas na fonteira sotamar, configurando um resíduo nulo do balanço sedimentar.

A estratégia E4 conduz a uma diminuição da amplitude da deriva litoral (0.1 a -2.5 × 106 m3/ano), mantendo-se uma tendência para norte do resíduo da deriva litoral. Os locais de inversão perdem importância em extensão e magnitude. Nesta simulação observa-se diminuição da magnitude do resíduo da deriva desde o extremo sul do domínio até à Lagoa de Albufeira.

As estratégias E5 e E6 diferem das anteriores por permitirem uma adaptação permanente da configuração da linha de costa em resposta às variações temporais e espaciais do forçamento. Tal conduz à incorporação de efeitos de retroação de configuração da linha de costa sobre a deriva litoral, com efeitos numa redução significativa da magnitude do resíduo da deriva litoral para valores da ordem de 5 × 105 m3/ano na maior parte do domínio e incremento da consistência espacial daqueles valores. A estratégia E5 conduz à identificação de dois domínios espaciais contrastantes: o primeiro, com deriva

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razoavelmente constante (entre -4.5 e -5 × 105 m3/ano), estende-se para sul da praia da Saúde até uma fronteira localizada entre a Lagoa de Albufeira e o Meco; o segundo prolonga-se para barlamar deste ponto e caracteriza-se por uma redução persistente da magnitude da deriva litoral potencial até ao limite meridional do domínio, onde se anula (fronteira fechada). No caso da estratégia E6 observa-se uma persistência de transporte anual residual de sul para norte, com uma magnitude praticamente constante ao longo de todo o domínio, na ordem de 4 × 105 m3/ano.

4. Discussão e conclusões As estratégias de modelação utilizadas conduzem a resultados substancialmente diferentes no que respeita à magnitude, sinal e variabilidade espacial da deriva litoral desta área que se refletem em diferentes modelos de circulação e de balanço sedimentar.

A estratégia de modelação E1 foi suportada por um conjunto de dados batimétricos de elevada resolução mas que apenas representa a morfologia real dos fundos num único instante. A consideração dessa representação como estática ao longo de um intervalo de tempo alargado conduz a ampliação de perturbações, com reflexos muito significativos no resultado final obtido em cada ponto de simulação, através de integração de uma série longa de caudais sólidos instantâneos. As estratégias E2 a E4 pretendem minorar estes efeitos recorrendo a instrumentos de suavização das irregularidades do traçado da linha de costa e dos fundos próximos, mostrando-se progressivamente mais eficazes. Porém, apesar de suavizada, aquela representação mantém-se estática e não considera a interdependência morfológica e sedimentar entre células litorais adjacentes. As estratégias E5 e E6 consideram explicitamente estas relações, resolvem o balanço sedimentar em todo o domínio em cada passo de cálculo e permitem explicitar relações retroativas entre a evolução da faixa costeira e as características do forçamento na rebentação.

Os resultados deste exercício, representados nas estratégias de modelação E5 e E6, conduzem a um modelo de circulação sedimentar de escala decenal a secular no arco litoral Caparica-Espichel caracterizado por transporte residual anual (potencial e efetivo) para norte, ao longo de todo o domínio. Do extremo barlamar até uma fronteira localizada entre o Meco e a Lagoa de Albufeira, a magnitude daquele transporte aumenta, o que nesta aplicação é sustentado por

recuo da linha de costa, visto não contemplar outras fontes sedimentares, exteriores ao sistema costeiro. A norte desta fronteira, até ao limite sotamar considerado (praia da Saúde), o sistema adota uma configuração de equilíbrio onde a magnitude da deriva litoral residual é constante. A validação e calibração deste modelo, em particular no que se refere ao coeficiente de proporcionalidade empírico K (Eq. 1), implicam uma avaliação quantitativa das fontes sedimentares (recuo de arribas e abarrancamento), que se localizam na sua maioria a sul da praia do Meco. Neste contexto, os valores aqui apresentados, apesar de plausíveis, devem ser considerados como indicativos.

Agradecimentos O trabalho foi suportado pelo projeto “Criação e implementação de um sistema de monitorização no litoral abrangido pela área de jurisdição da Administração da Região Hidrográfica do Tejo”, adjudicado pela Agência Portuguesa do Ambiente, I.P./Administração da Região Hidrográfica do Tejo e financiado pelo QREN, atribuído pelo POVT (Operação POVT-12-0233-FCOES-000034) e pelo projeto “Processos de transferência sedimentar praia-canhão - Beach to Canyon Head Sedimentary Processes” financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT – PTDC/MAR/114674/2009).

Referências Abecasis, F., 1987. O regime aluvionar na costa portuguesa entre

Peniche e a foz do Mira. Ingenium, 8, 4-18. Booij, N., Ris, R.C., Holthuijsen, L.H., 1999. A third-generation

wave model for coastal regions. I- Model description and validation. Journal of Geophysical Research, 104, 649–666.

Dodet, G., Bertin, X., Taborda, R., 2010. Wave climate variability in the North-East Atlantic Ocean over the last six decades. Ocean Modelling, 31, 120–131.

Rosati, J.D., Walton, T.L., Bodge, K., 2002. Longshore sediment transport. In: Coastal Engineering Manual, Part III, Longshore sediment transport, Chapter III-2, Engineering Manual, 1100-2-1100. U.S. Army Corps of Engineers, Washington, DC.

Veloso-Gomes, F., Rodrigues, J.A., Taveira-Pinto, F., Pais-Barbosa, J., Neves, L.D., 2009. Costa da Caparica Artificial Sand Nourishment and Coastal Dynamics. Journal of Coastal Research, SI 56, 678-682.