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www.teixeiramartins.com.br São Paulo - R. Pe. João Manuel 755 19º andar Jd Paulista 01411 001 Tel.: 55 11 3060.3310 Fax: 55 11 3061.2323 Brasília - SCN QD2 Lote D Torre A Conjuntos 801/803 Asa Norte 70712-904 Tel./Fax: 55 61 3326.9905 1 EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 2ª VARA CÍVEL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL - DF Distribuição por dependência Mandado de Segurança nº 3481-05.2011.4.01.3400 URGENTE Síntese : Recurso contra decisão da Diretoria Colegiada da ANVISA direcionado ao Ministro da Saúde. Negativa injustificada de prosseguimento. Impossibilidade. Usurpação de Competência pela ANVISA. Competência para apreciar pedido de reconsideração de seus atos. Omissão ilegal. Direito de recurso assegurado pela Lei nº. 9.784/99 e pela Constituição Federal. Imperativo o regular processamento do feito. Direito líquido e certo. Periculum in mora iminente a justificar a medida liminar. Danos de difícil reparação. FERSOL INDÚSTRIA E COMÉRCIO S.A., pessoa jurídica de direito privado, com sede na cidade de Mairinque/SP, na Rodovia Castelo Branco, Km 68,5, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 47.226.493/0001-46, por seus advogados infra- assinados (instrumento de mandato e atos societários em anexo - Doc. 01), vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com supedâneo no artigo 5º, LXIX, da Constituição Federal e na Lei nº 12.016/2009, impetrar o presente MANDADO DE SEGURANÇA com pedido de liminar contra ato decisório proferido pela Diretoria Colegiada da AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA ANVISA, composta pelos Srs. (i) DIRCEU BRÁS APARECIDO BARBANO, (ii) MARIA CELINA MARTINS BRITO e (iii) JOSÉ AGENOR ÁLVARES DA SILVA, e representada pelo primeiro, na condição de Diretor-Presidente, pelos motivos a seguir aduzidos.

MODELO - Mandado de Segurança - ANVISA

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1

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 2ª VARA CÍVEL DA

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL - DF

Distribuição por dependência

Mandado de Segurança nº 3481-05.2011.4.01.3400

URGENTE

Síntese: Recurso contra decisão da Diretoria

Colegiada da ANVISA direcionado ao Ministro da

Saúde. Negativa injustificada de prosseguimento.

Impossibilidade. Usurpação de Competência pela

ANVISA. Competência para apreciar pedido de

reconsideração de seus atos. Omissão ilegal.

Direito de recurso assegurado pela Lei nº. 9.784/99

e pela Constituição Federal. Imperativo o regular

processamento do feito. Direito líquido e certo.

Periculum in mora iminente a justificar a medida

liminar. Danos de difícil reparação.

FERSOL INDÚSTRIA E COMÉRCIO S.A., pessoa jurídica de

direito privado, com sede na cidade de Mairinque/SP, na Rodovia Castelo Branco, Km

68,5, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 47.226.493/0001-46, por seus advogados infra-

assinados (instrumento de mandato e atos societários em anexo - Doc. 01), vem,

respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com supedâneo no artigo 5º, LXIX,

da Constituição Federal e na Lei nº 12.016/2009, impetrar o presente

MANDADO DE SEGURANÇA

com pedido de liminar

contra ato decisório proferido pela Diretoria Colegiada da AGÊNCIA NACIONAL

DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA – ―ANVISA‖, composta pelos Srs. (i) DIRCEU

BRÁS APARECIDO BARBANO, (ii) MARIA CELINA MARTINS BRITO e (iii)

JOSÉ AGENOR ÁLVARES DA SILVA, e representada pelo primeiro, na condição

de Diretor-Presidente, pelos motivos a seguir aduzidos.

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— I —

DA CONEXÃO ENTRE AS AÇÕES

Conforme dispõe o artigo 103, do Código de Processo Civil, são

conexas as ações quando lhes for comum o objeto e a causa de pedir.

Estabelece o artigo 253, inciso I, do mencionado diploma legal,

por seu turno, que serão distribuídas por dependências as causas de qualquer natureza

quando se relacionarem, por conexão ou continência, com outra já ajuizada.

O presente mandado de segurança é conexo com o impetrado

perante este D. Juízo da 2ª Vara Cível da Circunscrição Judiciária de Brasília – DF,

autos nº 3481-05.2011.4.01.3400 (doc. 2). De fato, ambas as ações envolvem as

mesmas partes e causa de pedir remota, devendo, portanto, serem julgados em conjunto,

com o objetivo de evitar decisões contraditórias, nos termos do art. 105 do Código de

Processo Civil:

“Art. 105. Havendo conexão ou continência, o juiz, de ofício ou a

requerimento de qualquer das partes, pode ordenar a reunião de ações

propostas em separado, a fim de que sejam decididas

simultaneamente‖ (destacou-se)

Atente-se que a jurisprudência recente do Col. Superior Tribunal

de Justiça, órgão de cúspide do Poder Judiciário para dizer o direito federal, confirma

esse entendimento a fim de evitar decisões conflitantes sobre temas iguais ou similares

e, ainda, para evitar o desprestígio do Poder Judiciário (STJ, 2ª. Seção, CC 100345/RJ,

Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, DJ 18.03.2009, dentre outros).

O critério de utilidade, nesse contexto, é relevante para orientar o

reconhecimento da conexão.

Veja-se, a propósito, a lição de CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO:

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3

“O que importa, nos institutos regidos pela conexidade, é a utilidade

desta como critério suficiente para impor certas conseqüências

(prorrogação da competência, reunião de processos) ou autorizar outras

(litisconsórcio). Essa utilidade está presente sempre que as

providências a tomar sejam aptas a proporcionar a harmonia de

julgados ou a convicção única do julgador em relação a duas ou mais

demandas (Redenti). Ainda que ocorra a mera identidade parcial de

títulos, será útil a prorrogação da competência, com reunião das

causas sob um juiz só, assim como será útil a formação do

litisconsórcio (dois ou mais sujeitos demandado ou sendo demandados

num só processo) ou a admissão da reconvenção – sempre que a

convicção para julgar haja de ser a mesma e não deva haver

discrepância entre os julgamentos. Conquanto vaga, essa orientação

tem as vantagens da flexibilização de critérios, permitindo ao juiz

alguma margem de poder para a inteligente avaliação dos casos

concretos e da nulidade da medida a ser determinada.” (in Instituições

de Direito Processual Civil. Volume II. Ed. Malheiros. pp. 151 –

destacou-se).

Também relevantes são as palavras de THEREZA ALVIM sobre o

tema:

―Do texto, supra transcrito, decorre a afirmação de alguns autores de

ter o legislador encampado a mais tênue ligação entre as ações, para

reputá-las conexas. Contudo, outros casos de conexão existem, pela

própria natureza das coisas, que não podem ser desconhecidos e, até

mesmo com ligação mais tênue entre as duas ações, do que a ligação

prevista em lei, se não for interpretado extensivamente esse art. 103, do

diploma processual civil.

Inegável a existência de causa de pedir próxima e remota, porque essa

dicotomia corresponde à realidade jurídica. Assim, toda petição inicial,

necessariamente, indicará o fato, que deu nascimento à pretensão, e os

fundamentos jurídicos do pedido (arts. 282, III e 295, parágrafo único,

inc. I, do Código de Processo Civil. O conglobamento de ambos,

essenciais a qualquer lide, recebe, por lei, a denominação de causa de

pedir, mas, qualquer delas, comum a ambas a ações, é suficiente para

determinar a conexão‖ (in O Direito Processual de Estar em Juízo,

Editora Revista dos Tribunais, p. 130, destacou-se).

Pede-se venia para trazer a lume, em abono, a título

exemplificativo, os seguintes precedentes do Col. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

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4

―PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO.

CONEXÃO. JUSTO PREÇO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL

NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.

SÚMULAS 292 E 356/STF E 7/STJ.

(...)

4. Em razão de conter elementos semelhantes, perfeitamente correta a

utilização, in casu, do instituto da conexão, cujo objetivo maior é o de

evitar a prolação de decisões contraditórias‖ (STJ, 4ª Turma, Resp

94.600-MS, Rel. Min. Castro Meira, DJ 16.11.2004 – destacou-se)

-----------------------------------------------------------------------------

―CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÕES COM

IDÊNTICO OBJETO: SANDÁLIAS „IPANEMA‟. CONEXÃO.

PREVENÇÃO. JUÍZES COM JURISDIÇÃO TERRITORIAL DIVERSA.

PRECEDENTES.

Processos que envolvem um mesmo objeto (uso de marcas e modelos)

são conexos. Não se exige identidade. Basta que deles se extraia a

conveniência de os dois receberem julgamento por um só juiz,

evitando-se decisões contraditórias‖ (STJ, 2ª Seção, CC 37.805-CE,

Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 01.07.2005 – destacou-se)

-----------------------------------------------------------------------------

“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA

LITISPENDÊNCIA NÃO CARACTERIZADA. CONEXÃO E

CONTINÊNCIA. LITISPENDÊNCIA PARCIAL.

1. A litispendência ocorre quando forem propostas ações com as mesmas

partes litigantes, o mesmo pedido e a mesma causa de pedir, consoante

dispõe o art. 301, § 1º, do CPC.

2. A ratio essendi da litispendência visa a que a parte não promova duas

demandas visando o mesmo resultado, o que, frise-se, em regra, ocorre

quando o autor formula em face do mesmo sujeito, idêntico pedido,

fundado da mesma causa de pedir.

3. In casu, há identidade parcial dos pedidos, porquanto o do segundo

mandamus (declaração de isenção da COFINS e compensação) é mais

abrangente que o do primeiro (declaração de isenção da COFINS) o que

configura a continência, que é espécie de litispendência parcial.

4. O instituto da continência, como na conexão, importa a reunião dos

processos, que visa evitar o risco de decisões inconciliáveis.

Por esse motivo, diz-se, também, que são conexas duas ou mais ações

quando, em sendo julgadas separadamente, podem gerar decisões

inconciliáveis, sob o ângulo lógico e prático.” (...)

(STJ – 1ª Turma - REsp 953034/PR - Rel. Min. LUIZ FUX - DJe

29.06.2009) (destacou-se)

Tenha-se presente, ainda, que o Col. SUPERIOR TRIBUNAL DE

JUSTIÇA tem firme o entendimento de que é necessário atribuir ―interpretação extensiva‖

ao artigo 115 do CPC, acima transcrito, de forma que a mera potencialidade ou risco de

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que sejam proferidas decisões conflitantes é suficiente até mesmo para ensejar a

propositura de conflito de competência (STJ, 1ª. Seção, AgRg no CC 66.507/DF, Rel.

Min. Castro Meira, DJ 12.05.2008).

Portanto, sendo patente a conexão entre as ações, requer-se, com

fundamento no artigo 115, do CPC, seja reconhecida a conexão entre a presente ação e

o Mandado de Segurança nº 3481-05.2011.4.01.3400, que tramita perante este E. Juízo

da 2ª Vara Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal.

— II —

SÍNTESE DOS FATOS

Em 22 de fevereiro de 2008, por meio da publicação da

Resolução nº. 10 da Diretoria Colegiada da ANVISA (―RDC nº. 10/2008 – Doc. 02),

esta Agência houve por bem proceder à reavaliação toxicológica dos produtos técnicos e

formulados à base dos ingredientes ativos ali indicados.

Dentre os 14 (catorze) ingredientes ativos a serem reavaliados,

conforme consta daquela Resolução, figurou o METAMIDOFÓS, o qual é utilizado

pela Impetrante na formulação dos produtos METAMIDOFÓS TÉCNICO FERSOL e

METAMIDOFÓS FERSOL 600.

Neste sentido, confira-se o anexo I daquela Resolução, que

expressamente aponta a Impetrante como fabricante daqueles produtos e, logo, parte

interessada do processo administrativo de reavaliação toxicológica, nos termos dos

artigos 9º, I e II, da Lei Federal nº. 9.784/99.

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(...)

Em 27 de novembro de 2009, a Diretoria Colegiada da ANVISA

resolveu adotar a Consulta Pública nº. 8 , através da qual concedeu o prazo de 30 (trinta)

dias para que fossem ―apresentadas críticas e sugestões relativas à proposta de

Regulamento Técnico, para o ingrediente ativo Metamidofós, contido na Relação de

Monografias dos Ingredientes Ativos de Agrotóxicos, Domissanitários e Preservantes

de Madeira, em anexo”.

A proposta de regulamento técnico submetida à consulta pública

pretendia ―cancelar os informes de avaliação toxicológica de todos os produtos

técnicos e formulados à base do ingrediente ativo metamidofós entre outros”.

A Impetrante, em 11 de fevereiro de 2010, após regularmente

deferida a prorrogação de prazo, aportou estudos relevantes no âmbito daquela consulta

pública, com o fito de provar, com argumentos técnicos, que o banimento do produto,

na forma proposta, não era medida adequada.

A despeito disso, a Impetrante jamais recebeu resposta

fundamentada à contribuição que aportou àquela consulta pública, em total

desconformidade com o que prevê os artigos 32, § 2º e 34 da Lei nº. 9.784, de 1999, e

artigo 11 da Resolução nº. 48 de 2008, da ANVISA (―RDC nº. 48/2008).

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Ou seja, a ANVISA jamais apresentou à Impetrante resposta,

com a devida motivação - ínsita, aliás, a qualquer ato administrativo -, às manifestações

por ela apresentadas no âmbito daquela consulta pública, na forma da legislação de

regência. Também não deu publicidade a qualquer documento dessa natureza.

A despeito disso, em 10 de janeiro de 2011, o Gerente de Análise

Toxicológica da ANVISA e o Gerente de Normatização e Avaliação da mesma

Agência, por meio do Ofício nº. 00024/2011-GGTOX/ANVISA/MS, convocou

representantes da Impetrante para participar de reunião, na sede daquela Agência, em 13

de janeiro de 2011, pasme-se, com a “finalidade de estabelecer o cronograma de

descontinuidade de formulação de produtos à base deste ingrediente ativo

(Metamidofós)” (destacou-se).

Ou seja, a reunião tinha por objetivo definir a data em que o

produto METAMIDOFÓS não mais seria comercializado, não deixando dúvida de que

naquela oportunidade já havia uma decisão final, que jamais havia sido comunicada à

Impetrante.

Note-se por especial obséquio: o processo de reavaliação do

METAMIDOFÓS foi instaurado em 22 de fevereiro de 2008; a Impetrante encaminhou

estudos relativos à consulta pública em 11 de fevereiro de 2010 e jamais recebeu

qualquer nova comunicação ou intimação a respeito do processo. Somente em 10 de

janeiro de 2011 a Impetrante recebeu um ofício da mesma ANVISA para estabelecer

um ―cronograma de descontinuidade‖!

Sem dúvida alguma, essa situação revela a adoção, pela ANVISA,

de um processo sigiloso, ao menos em sua parte substancial.

Registre-se, por relevante, que na mesma data de expedição do

referido ofício, a Impetrante havia protocolado petição junto à ANVISA, requerendo ao

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Gerente Geral de Toxicologia daquela Autarquia a concessão de vista dos autos do

processo de reavaliação do Metamidofós..

O mesmo pedido foi reforçado em correio eletrônico enviado à

Gerência Geral de Toxicologia (―GGTOX‖) da Anvisa na data de 12.01.2011:

Com enorme perplexidade em virtude do cenário acima, a

Impetrante compareceu à citada reunião na ANVISA em 13 de janeiro de 2011. Nessa

oportunidade, a ANVISA, através de seu Gerente Geral de Toxicologia, Sr. Luiz

Cláudio Meirelles, informou o óbvio: a Diretoria Colegiada já havia decidido pela

descontinuidade do METAMIDOFÓS em 2010, embora a Impetrante não tivesse sido

comunicada de tal deliberação. Tal afirmação, embora não conste da ata resumida da

reunião, está documentada na gravação de áudio em poder da ANVISA.

Outrossim, conforme consta na Ata lavrada durante a citada

reunião, a Impetrante, naquela oportunidade, voltou a reiterar o seu desconhecimento a

respeito de todo o processado, bem como de uma decisão final a respeito de uma

eventual descontinuidade do METAMIDOFÓS.

Fato é que nem mesmo naquela oportunidade, quando da

reiteração do pedido de vista dos autos, a Impetrante pôde ter acesso aos autos do

processo administrativo ou à decisão proferida pela Diretoria Colegiada. De acordo com

a ANVISA, os pedidos da Impetrante ainda não haviam sido processados internamente

e, em razão disso, não poderiam ser atendidos naquela data

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Não bastasse o quanto exposto, ainda para a maior surpresa da

Impetrante, em 17.01.2011 — portanto, apenas 04 (quatro) dias após a citada reunião

(incluindo-se aí um final de semana) —, a ANVISA fez publicar no Diário Oficial a

Resolução da Diretoria Colegiada de nº. 01 (RDC nº. 01/2011).

Por essa decisão, foi determinada a retirada programada do

ingrediente ativo METAMIDOFÓS – conforme, aliás, já havia antecipado à Impetrante

na indigitada reunião -, nos seguintes termos:

“Art. 1o- Determinar a retirada programada do ingrediente ativo

metamidofós do mercado brasileiro, ficando permitida a produção de

produtos formulados (formulação) com base nos quantitativos do

histórico de comercialização de anos anteriores, para cada empresa,

conforme declaração prestada aos órgãos de acordo com art. 41, do

Decreto n. 4074, de 04 de janeiro de 2002 e com base nos estoques já

existentes de matérias-primas e produtos técnicos, mensurados pela

ANVISA nas unidades fabris das empresas registrantes, até a data de 19

de novembro de 2010, não podendo ultrapassar as datas estabelecidas

nos incisos a seguir:

I - 31 de dezembro de 2011 - cancelamento da comercialização;

II - 30 de junho de 2012- proibição da utilização, com o cancelamento

de todos os informes de avaliação toxicológica de produtos a base de

metamidofós; e

III- 31 de dezembro de 2012- cancelamento da monografia do

ingrediente ativo metamidofós, mantida até esta data exclusivamente

para fins de monitoramento dos resíduos.”

Note-se, a título de ilustração, que os considerandos registrados

na aludida RDC nº. 01/2011 revelam a ocorrência até mesmo de reuniões a respeito das

quais a Impetrante jamais teve a oportunidade de participar:

“(...) considerando a recomendação das reuniões da Comissão de

Reavaliação Toxicológica, realizadas em 26 de outubro e 19 de

novembro de 2010, com a participação de representantes do IBAMA e

do MAPA (...)”.

A toda evidência, a Impetrante foi alijada do processo

administrativo em questão, a despeito do seu manifesto interesse jurídico —

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considerando, como já dito, que aproximadamente 90% de suas atividades giram em

torno do produto atingido pela resolução final.

Saliente-se, por relevante, que nem mesmo após a publicação da

decisão final a Impetrante teve atendido os seus pedidos anteriormente formulados de

acesso aos autos do processo administrativo e aos documentos que embasaram a decisão

final, refletida na já referida Resolução da Diretoria Colegiada de nº. 01 (RDC nº.

01/2011).

Vale dizer, o decêndio previsto no artigo 59 da Lei nº. 9.784/991

para que a Impetrante possa interpor recurso administrativo — inclusive recurso

administrativo hierárquico — foi deflagrado sem que ela tenha a oportunidade de

conhecer todos os atos relativos ao processo administrativo correspondente, a despeito

de sucessivos pedidos.

Por tais razões, impetrou o mandado de segurança ao qual esse

mandamus é distribuído por dependência, autos nº 3481-05.2011.4.01.3400, para que,

em suma, fosse assegurado o direito da Impetrante de, naquela oportunidade, ter

conhecimento de todos os atos documentados no processo administrativo, inclusive

dos documentos que fundamentaram a decisão então proferida (RDC n.º1 de 14 de

janeiro de 2011), bem como para ter suspenso seus efeitos e respectivos prazos –

administrativo e judiciais - para que pudesse interpor o recurso administrativo

competente, nos termos do artigo 56 da Lei nº 9.784/992;

Por reconhecer presente o direito liquido e certo da Impetrante,

violado pelas reiteradas condutas da Anvisa, este Juízo determinou que fosse concedido

a Impetrante “vista dos autos do Processo Administrativo de reavaliação toxicológica

de produtos técnicos e formulados à base do ingrediente ativo METAMIDOFÓS,

inclusive de todos os documentos que fundamentaram a decisão proferida. A contagem

do prazo para eventual recurso somente se iniciará após a vista”.

1. Art. 59. Salvo disposição legal específica, é de 10 (dez) dias o prazo para interposição de recurso

administrativo, contado a partir da ciência ou divulgação oficial da decisão recorrida”

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Oportuno ressaltar, entretanto, que a medida liminar concedida

por Vossa Excelência não foi prontamente obedecida pelas autoridades coatoras, tendo a

ANVISA criado óbices infundados para o cumprimento do mandamus, conforme

notificação recebida às 16:19h do dia 21.01.2011 (uma sexta-feira), dois dias após o

deferimento da medida liminar por esse D. Juízo, fazendo exigências descabidas para

vistas e extração de cópias reprográficas do processo administrativo.

Diante das infundadas restrições impostas pela Anvisa, ciente de

que o procedimento arbitrário adotado colocaria a Impetrante em eminente risco de não

ter acesso aos autos no prazo necessário para a apresentação de seu recurso, em

aditamento a petição inicial, foi requerido a este D. Juízo que a contagem do prazo se

reiniciaria apenas após a vista efetiva vista dos autos, pretensão deferida nos seguintes

termos:

“Ante o exposto, determino que seja concedida ao impetrante vista dos

autos do Processo Administrativo de reavaliação toxicológica de

produtos técnicos e formulados à base do ingrediente ativo

METAMIDOFÓS, inclusive de todos os documentos que

fundamentaram a decisão proferida. A contagem do prazo para

eventual recurso somente se iniciará após a vista. Publica. Intimar o

Diretor-Presidente da ANVISA para cumprir a decisão liminar em 72

horas, e para prestar informações no prazo de 10 dias. Após, ao MPF.

Retifique-se a autuação para que conste no pólo passivo apenas o

Diretor-Presidente da ANVISA.” (destacou-se)

Tal decisão, proferida em 24 de janeiro de 2011 e integralizadora

da liminar anteriormente deferida, foi reiteradamente descumprida pela ANVISA, tendo

a Impetrante obtido vista do processo administrativo somente em 02 de fevereiro de

2011– esclareça-se, acesso parcial dos documentos que o compõem -, iniciando seu

prazo para a apresentação do recurso, encerrado em 14 de fevereiro de 2011.

Tentou a ANVISA, ainda, não exibir os estudos que instruíam o

processo administrativo em apreço, sob a justificativa de proteção de um suposto direito

autoral, requerimento esse que foi corretamente rechaçado por este Juízo.

2 “Art. 56. Das decisões administrativas cabe recurso, em face das razões de legalidade e de mérito.”

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12

Interposto tempestivamente o recurso administrativo, uma vez

mais a ANVISA cerceou direito da impetrante, não promovendo, como exige o artigo

26 da Lei Federal nº 9.784 de 29 de janeiro de 1999, sua intimação para a Reunião

Presencial Aberta ao Público nº 02/2011 designada para 21 de março de 2011, na qual,

conforme ata aprovada em 03.03.2003, restou designado o julgamento de seu recurso.

Após muito pesquisar, a Impetrante através de consulta no site da

ANVISA, tomou conhecimento do julgamento do recurso requerendo em 23.03.2011

que lhe fosse aberta vista e extração de cópias reprográficas dos autos,

especialmente sobre a decisão proferida, a seguir transcrita, e parecer que lhe

serviu de motivação:

“A Diretoria Colegiada deliberou, por unanimidade, acolher o Parecer

CONS nº. 48/2011 da Procuradoria da Anvisa e não conhecer do

recurso em razão da inexistência de previsão legal para a interposição

de recurso hierárquico impróprio em decisão administrativamente

irrecorrível em matéria finalística de competência da Anvisa,

mantendo, assim, integralmente as determinações da Resolução da

Diretoria Colegiada nº. 01/2011 e afastando, por conseguinte, a

concessão de efeito suspensivo ao presente recurso.” (Doc. 3 – fls. 230 -

destacou-se)

Referida decisão foi disponibilizada no DOU – Diário Oficial da

União em 04.04.2011. Contudo, somente em 20.04.2011 foram franqueadas cópias

do processo à Impetrante (doc. 3), após muita insistência e a apresentação de

inúmeros pedidos de vista, conforme se observa das petições protocoladas em

01.04.2011 e 06.04.2011.

Como visto, ao apreciar o recurso administrativo da Impetrante, a

Diretoria Colegiada da ANVISA acolheu o parecer da Procuradoria da ANVISA e não

conheceu do recurso. Todavia, deixou de remeter o recurso à autoridade competente

para a apreciação de seu mérito, no caso, o Ministro de Estado da Saúde, o que viola

direito líquido e certo da Impetrante.

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É o que, adiante, se passa a expor.

— III—

DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO:

Da Patente Violação ao Devido Processo Legal e aos Princípios do Contraditório e

da Ampla Defesa – Cerceamento de Defesa - Ato ilegal da Diretoria Colegiada da

ANVISA – Cabimento do Recurso – Ato da ANVISA sujeito a Controle

III.1. Da Patente Violação ao Devido Processo Legal e aos Princípios do

Contraditório e da Ampla Defesa

Os administrativistas são categóricos em asseverar que a atuação

da Administração deve, em medida cada vez maior, ser dotada de processualidade. Daí

se falar, hodiernamente, em uma processualidade ampla.

Não se deve perder de vista, contudo, as razões que impõem que

a atuação da Administração seja, cada vez mais, procedimentalizada. Trata-se, em

realidade, de imperativo que diz com a legitimação dos atos da Administração, bem

como com o seu controle.

Ora, a atuação da Administração que se desenvolve na forma de

um encadeamento regrado de atos, oportunizando-se a participação dos administrados,

permite um constante controle o que, em última análise, confere maior carga de

legitimidade ao ato final.

Ou seja, o controle que se exerce sobre os atos da Administração

Pública é cada vez mais intenso, notadamente porque o processo permite um controle

dinâmico. O controle do ato apenas, por exemplo, é somente superveniente, ou ainda,

como preferem alguns doutrinadores, trata-se de controle ex-post factum. O processo,

por outro lado, permite um controle constante e dinâmico, como visto.

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Fala-se, ainda, de uma função garantista do processo

administrativo, no sentido de que este visa a garantir posições jurídicas dos

administrados. A esse respeito, trazemos à colação o ensinamento da Profa. ODETE

MEDAUAR:

“No campo de sua função garantista, o processo administrativo vem

finalizado à garantia jurídica dos administrados (funcionários e

particulares), pois tutela direitos que o ato administrativo pode afetar.

Atribui-se ao processo administrativo a condição de primeiro círculo de

garantia das posições jurídicas do administrado, enquanto supõe que a

atividade administrativa tem de canalizar-se obrigatoriamente por

parâmetros determinados, como requisito mínimo para ser qualificada

de legítima. No esquema processual o cidadão não encontra uma

Administração livre, e sim uma Administração disciplinada na sua

atuação.”(―A Processualidade no Direito Administrativo – 2ª edição –

São Paulo: ed. Revista dos Tribunais) (Destacou-se)

Vale dizer, o processo administrativo garante que a

Administração (entendida esta em sentido amplo, de modo a compreender entes da

Administração direta e indireta), no exercício de sua função, siga parâmetros objetivos e

pré-determinados, o que evita abusos e arbitrariedades daquele que detém parcela de

poder público. Nesta senda, o processo cumpre uma função nitidamente garantista,

como muito bem observado no excerto acima transcrito.

Além disso, o processo administrativo, quando manejado

adequada e corretamente, é a garantia de cumprimento do devido processo legal, de

observância obrigatória também pela Administração Pública, consoante entendimento

sedimentado pela jurisprudência3. Em realidade, o devido processo legal é um dos

pilares sobre o quais repousa o Estado Democrático de Direito.

3 A esse respeito, confira-se posicionamento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (―STJ‖):

―A cláusula do ´due processo of Law´, com as suas aplicações e conseqüências, tem aplicação no

procedimento administrativo, o que resultava de modo implícito da constituição de 1967 e está previsto,

expressamente, na constituição de 1988, artigo 5º, LIV e LV (...)” (STJ – j. em 13.03.1990 – Rel.

Ministro Carlos M. Velloso – fonte RDA 179, p. 163)

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15

A respeito do devido processo legal e de sua correlação com a

garantia de direitos dos administrados, assevera com maestria EGON BOCKMANN

MOREIRA:

“O adjetivo ´devido´ reporta-se à adequação da conduta administrativa.

Atuação adequada, tal como exigida pela Constituição, é aquela que

atende às expectativas mínimas de um Estado Democrático de Direito,

devendo corresponder e satisfazer o que se espera de uma

Administração aberta e participativa, em que se garante ao particular

voz ativa, em condição de igualdade com o ente público e sem qualquer

espécie de submissão e /ou supressão de expectações.

A adequação confere ao cidadão segurança e certeza que seus direitos

serão respeitados. O processo será instalado e conduzido de maneira

equitativa, com observância do rol de garantias constitucionais e

legais. O núcleo do objetivo visado pelo Estado está no prestigio à

dignidade da pessoa humana, não à máquina administrativa.

(―Processo Administrativo: princípios constitucionais e a Lei

9.784/1999‖ – 3ª edição atualizada, revista e aumentada – São Paulo:

Malheiros, 2007 – p.281-282) (Destacou-se)

Portanto, é corolário do princípio do devido processo legal que os

demais princípios atinentes ao processo administrativo sejam respeitados pelos atores

que dele participam. Afinal, a mera instauração de simulacro de processo administrativo

não garante de maneira plena a observância dos princípios mais basilares do processo

administrativo, tais como o contraditório, ampla defesa, publicidade, eficiência e demais

arrolados no caput do artigo 2º da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 19994.

Aliás, os princípios do contraditório e da ampla defesa, que

poderiam até mesmo ser reunidos sob a rubrica do ―direito à participação no processo

administrativo‖, são garantias que encontram fundamento na própria Constituição.

Outro não é teor do artigo 5º, LV:

―Art. 5 º - (....)

LV – aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos

acusado em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com

os meios e recursos a ela inerentes‖

4 “Art. 2º - A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade,

motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança

jurídica, interesse público e eficiência”.

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16

Com efeito, os princípios do contraditório e da ampla defesa

objetivam tornar o processo administrativo efetivamente dialético, de modo que ao

administrado sejam oportunizados ampla informação e direito de reação, entendido este

como o direito de participar da instrução, aportar documentos, apresentar alegações

finais, recorrer, etc.

A propósito, a efetiva participação dos administrados no processo

administrativo colabora para que a decisão, ao final, seja a mais acertada e justa

possível. Isso, contudo, só é alcançável se as alegações e posições dos administrados

forem efetivamente levadas em conta e apreciadas. Releva notar, ademais, que o

acolhimento do princípio do contraditório no seio do processo administrativo revela

uma mudança brutal de paradigma com respeito à relação Administração/administrado.

Senão vejamos:

“A noção de contraditório vinha tradicionalmente associada ao

processo jurisdicional; sua admissibilidade na esfera administrativa

representa mudança de algumas concepções relativas à supremacia do

Estado, à existência de um só juízo sobre o interesse público, à posição

do administrado como súdito, servil e submisso, à predominância

absoluta da autotutela.

(...)

A doutrina menos antiga pondera que ´o caráter contraditório tende a

afirmar-se universalmente; em verdade seria fechar os olhos à realidade

pretender que no procedimento administrativo haja uma só parte cujos

direitos serão discernidos, sem conflitos nem contendas, por um órgão

desinteressado do assunto; ao contrário, os recursos, reclamações,

denúncias administrativas supõem quase necessariamente um conflito de

interesses entre o requerente, de um lado, e o órgão autor do ato, de

outro, e isto desemboca bem concretamente numa impugnação que não é

outra coisa senão contenda: daí a indispensável discussão plena do

assunto, com ataque e prova, mediante um procedimento imparcial,

público, etc‖ (MOREIRA, Egon Bockmann – ―Processo Administrativo:

princípios constitucionais e a Lei 9.784/1999‖ – 3ª edição atualizada,

revista e aumentada – São Paulo: Malheiros, 2007 p.103) (Destacou-se)

Claro está, portanto, que na atualidade ninguém mais refuta a

aplicabilidade dos princípios do contraditório e da ampla defesa à seara do processo

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administrativo. Contudo, é de se constatar que os órgãos públicos ainda resistem em

adotar procedimentos integralmente convergentes com tais princípios.

A atuação da ANVISA é emblemática nesse sentido. Além de

todo o transtorno enfrentado pela Impetrante para obtenção de vista e cópia dos autos do

processo administrativo — com a necessidade de manejo de mandado de segurança

com essa finalidade! —, agora pretende a ANVISA, mais uma vez de forma maliciosa,

obstar o regular processamento de recurso interposto!

Fato é que diversas ilegalidades podem ser extraídas da conduta

da ANVISA: (i) por primeiro, não compete à Diretoria Colegiada da ANVISA se

manifestar sobre o cabimento do recurso direcionado ao Ministro de Estado da Saúde,

tendo ocorrido verdadeira usurpação de competência; (ii) jamais poderia aquele órgão

jurídico obstar o processamento de recurso regularmente interposto, sob pena de

verdadeiro cerceamento de defesa.

Frise-se, uma vez mais, que o princípio do contraditório não deve

ser mera garantia formal, no sentido de que se estabeleça um simulacro ou arremedo de

processo administrativo, o qual, contudo, cede ante uma análise mais detida da questão.

Em outros termos, de nada adianta assinalar-se prazo para que a Impetrante recorrer de

decisão proferida pela Diretoria Colegiada, se o recurso, regular e tempestivamente

apresentado, não puder ser regularmente processado.

Sobre a garantia substancial do princípio do contraditório, sábias

são as palavras, uma vez mais, de EGON BOCKMANN MOREIRA:

“O contraditório configura a garantia de ser cientificado com clareza

não só da existência do processo, mas de tudo o que nele ocorra,

podendo o particular manifestar-se a respeito de todos os atos e fatos

processuais, gerando, em conseqüência, o dever de o órgão julgador

apreciar tais intervenções e tomá-las em conta ao proferir sua decisão

(...)

Frise-se que o contraditório não alberga mero dever processual de

intimação das partes envolvidas, mas também os desdobramentos

substanciais desse dever. Seria inócua mera garantia formal, que

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não assegurasse resultados concretos ao processo. Assim, somente

serão válidas as decisões que motivadamente apreciarem cada uma das

manifestações dos administrados” (―Processo Administrativo:

princípios constitucionais e a Lei 9.784/1999‖ – 3ª edição, revista e

aumentada – São Paulo: Ed. Malheiros – p. 294) (Destacou-se)

Em outras palavras, não apenas a instauração do processo

administrativo, mas seu regular processamento, são garantias de higidez do instituto.

Portanto, de nada vale a mera garantia formal do recurso, se este não puder ser

apreciado.

Ora, a Administração Pública (seja ela corporificada por entes da

Administração direta ou indireta) é revestida de prerrogativas às quais correspondem

deveres na mesma medida. Daí a melhor doutrina administrativista usualmente se referir

aos chamados ―deveres-poderes‖ da Administração. Em realidade, os deveres

correspondem às competências legalmente atribuídas, às quais a Administração não

pode simplesmente se esquivar, sob pena até mesmo de responsabilização. Percucientes

são as palavras de JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO a esse respeito:

―Por conseguinte, se a lei ou algum outro ato normativo impõe ao

administrador o dever de agir, não pode ele quedar-se inerte diante da

regra de competência. Em outras palavras, se a lei impõe um facere, ao

administrador é vedado atuar com omissão (non-facere). A atuação

comissiva exigida na lei não pode ser substituída por atuação omissiva.

A omissão, nesse caso, estampa flagrante abuso de poder e, portanto,

inegável ilegalidade, por contraria a respectiva norma de competência‖.

(―Processo Administrativo Federal: Comentários à Lei nº. 9.784 de

29/11/1999 – 4ª edição – Rio de Janeiro: Ed. Lúmen Juris, 2009 – p. 240)

E prossegue o autor com o brilhantismo que lhe é peculiar:

―Qualquer que seja a conduta administrativa, comissiva ou omissiva,

em desacordo com a lei ou com o ato normativo pertinente, é possível

ao interessado pleitear seja restaurada a legalidade, inclusive junto ao

Poder Judiciário. Se existe omissão por parte do administrador, é lícito

ao juiz, havendo ação com esse pedido proferir sentença de conteúdo

mandamental, sendo determinado ao agente omisso que cumpra a

obrigação de fazer‖ (Idem – Ibdem – p. 241) (Destacou-se)

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19

Os Tribunais também são assentes neste sentido. Vejamos:

―ADMINISTRATIVO. RÁDIO COMUNITÁRIA. PROCESSO

ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO. MORA DA

ADMINISTRAÇÃO. ESPERA DE CINCO ANOS DA RÁDIO

REQUERENTE. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA EFICIÊNCIA E DA

RAZOABILIDADE. INEXISTÊNCIA. VULNERAÇÃO DOS ARTIGOS

165, 458, I, II, II E 535, II DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

AUSÊNCIA DE INGERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO NA SEARA

DO PODER EXECUTIVO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO PELA

ALEGATIVA DE VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 2º DA LEI 9612/98 70 DA

LEI 4.117/62 EM FACE DA AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO

DOS DEMAIS ARTIGOS ELENCADOS PELAS RECORRENTES.

DESPROVIMENTO

(....)

A lei 9.784/99 foi promulgada justamente para introduzir no nosso

ordenamento jurídico o instituto da mora administrativa como forma

de reprimir o arbítrio administrativo, pois não obstante a

discricionariedade que reveste o ato de autorização, não se pode

conceber que o cidadão fique sujeito a uma espera abusiva que não deve

ser tolerada e que está sujeita, sim, ao controle do Judiciário a quem

incumbe a preservação dos direitos, posto que visa a efetiva observância

da lei em cada caso concreto.

5. O Poder Concedente deve observar prazos razoáveis para instrução e

conclusão dos processos de outorga de autorização para

funcionamento, não podendo estes prolongar-se por tempo

indeterminado”, sob pena de violação dos princípios da eficiência e da

razoabilidade.”

(STJ – Resp nº 690.811-RS – 1ª Turma – Rel. Min. JOSÉ DELGADO –

DJ 19.12.2005) (Destacou-se)

No caso sob análise, nítido se revela que a violação da regra de

competência se deu porque não cabia à Diretoria Colegiada da ANVISA realizar juízo

de admissibilidade do recurso, mas, apenas, decidir se era o caso ou não de reconsiderar

sua decisão à luz do pedido aduzido no Recurso Administrativo, nos termos do que

prescreve o já citado artigo 56, §1º.

Vale dizer, não compete, em hipótese alguma, à Diretoria

Colegiada da ANVISA obstar a reapreciação do pedido pelo Ministro de Estado da

Saúde. Em realidade, a tal órgão acabou por decidir a questão, sem, contudo, que tivesse

competência para tanto!! Houve verdadeira usurpação de atribuição legal, em prejuízo

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20

dos mais comezinhos princípios que asseguram um processo administrativo hígido em

favor dos administrados.

A esse respeito, importante trazer à colação recente decisão

proferida pelo Juízo da 9ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, nos

autos do Mandado de Segurança nº 0022272-22.2011.4.01.3400, em tudo e por tudo

semelhante ao caso em análise, já que no citado processo a Procuradoria Jurídica da

INFRAERO obstou a apreciação do recurso administrativo pelo Conselho de

Administração e, posteriormente, pela ANAC.

Veja-se o teor da r. decisão concessiva da liminar:

“A impetrante mantém vínculo jurídico com a Infraero e teve instaurado

procedimento, ao qual, segundo alega, não lhe foi permitido exercer o

direito ao contraditório e ampla defesa.

Afirma que tendo sido notificada de decisão e da abertura de prazo para

provocar o controle da decisão pelo órgão superior, o Procurador

Jurídico da empresa pública federal obstou o exercício do direito,

determinando o arquivamento dos autos sob alegação de que

anteriormente a questão já havia sido submetida ao órgão este decidido

a respeito, contra os interesses do administrado.

Refere-se a anterior Mandado de Segurança que tramita perante este

Juízo Federal, onde foi protegido para obter acesso aos autos.

O quadro processual convence de que o Procurador Jurídico obstou o

trâmite regular e em consonância com a Lei n.º 9.784, de 1999, de

procedimento administrativo, prejudicando os interesses da impetrante.

Estou convencido de que ocorreu vício de desvio de poder, em face da

incompetência da autoridade, que obstou a tramitação e impediu que o

órgão superior se pronunciasse a respeito do inconformismo da parte.

Também está evidenciado o perigo de dano de difícil ou incerta

reparação a justificar a proteção.

Aplico o artigo 7.º, inciso III da Lei n.º 12.016, de 2009, e concedo

liminar. Consiste de ordem mandamental, anulando a deliberação do

Procurador Jurídico de obstar a subida do processo ao conhecimento

do órgão superior e de determinar que seja examinado o recurso

interposto no prazo de 5 (cinco) dias.

Transmita-se o teor da presente decisão para as autoridades, a fim de

que a cumpram.

Requisitem-se informações.” (grifou-se – Doc. 4)

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21

Enfim, não restam dúvidas de que a deliberação da Diretoria

Colegiada da ANVISA tomada na reunião púbica ordinária nº 02/2011, que acolheu o

Parecer CONS nº 48/2011 da Procuradoria da ANVISA, ao deixar de processar o

recurso administrativo hierárquico impróprio manejado pela Impetrante, é

manifestamente ilegal por usurpar competência do Ministro de Estado da Saúde, além

de consubstanciar-se em afronta aos princípios do devido processo legal, ampla defesa,

contraditório, e demais consagrados pela Lei nº. 9.784, de 29 de janeiro de 1999.

Até porque, conforme se passa a demonstrar, o cabimento do

recurso administrativo hierárquico no caso concreto é indiscutível, ao contrário do que

fez constar a ANVISA.

III.2 Cabimento do Recurso Administrativo – Ato da ANVISA sujeito a Controle –

Competência do Ministro de Estado da Saúde – Inteligência do art. 56 da Lei

Federal nº 9.784/99

De acordo com o art. 56 da Lei Federal nº 9.784/99, ―Das

decisões administrativas cabe recurso, em face de razões de legalidade e de mérito‖.

Ainda conforme comando inserto neste mesmo artigo, desta vez em seu parágrafo

primeiro, o correspondente recurso administrativo deve ser dirigido à autoridade que

proferiu a r. decisão recorrida, que o encaminhará à autoridade superior.

Acerca do cabimento e da relevância dos recursos no âmbito

administrativo, leciona com propriedade ODETE MEDAUAR:

“Os recursos administrativos apresentam-se como um dos modos pelos

quais a Administração é provocada a fiscalizar seus próprios atos,

visando ao atendimento do interesse público e à preservação da

legalidade. Por meio dos recursos administrativos os interessados

pedem à Administração reexame do ato, decisão ou medida editada em

seu âmbito. Embora pouco prestigiados no Brasil, representam um

importante meio para propiciar aproximação entre Administração e

particulares, para ouvir o cidadão e para suscitar mais credibilidade da

atuação administrativa.

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22

Sob o ângulo subjetivo, os recursos administrativos podem ser

considerados como instrumentos de proteção de direitos e interesses

eventualmente lesados pela Administração, pois permitem reagir a

decisões e medidas adotadas. Apresentam-se menos formalistas e

onerosos que as ações perante o Judiciário, dispensando o patrocínio de

advogado. Por outro lado o reexame suscitado pelo recurso abrange

questões atinentes à legalidade e ao mérito das decisões.

O direito de interpor recurso administrativo foi afirmado no direito

francês como um princípio geral, mesmo sem texto que o preveja

explicitamente. Esse entendimento deve prevalecer também no

ordenamento pátrio, sobretudo ante o direito de petição assegurado na

Constituição Federal, art. 5º, XXXIV, a. Além do mais, decorre da

garantia de ampla defesa nos processos administrativos em geral,

prevista na Constituição Federal, art. 5º, LV.” (Direito Administrativo

Moderno, 10ª edição, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2006, pp.

378-79)

Em verdade, o cabimento de recurso no âmbito do processo

administrativo com vistas a reformar, nos aspectos de mérito e de legalidade, decisão

anteriormente proferida é, ademais, respaldado pelo princípio da revisibilidade das

decisões, expressamente acolhido pela melhor doutrina administrativista. Vejamos o

que ensina o ilustre juspublicista CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO a esse

respeito:

―Princípio da revisibilidade. Consiste no direito de o administrado

recorrer de decisão que lhe seja desfavorável. O STF reconheceu o

direito ao duplo grau de jurisdição e afastou a exigência de prévio

depósito ou caução para interposição de recurso administrativo (REs

388.359, 389.383 e 390.513 e ADI 1.976)..”

Sobre o mesmo princípio, porém valendo-se de terminologia

distinta – qual seja, duplo grau de jurisdição administrativa-, discorrem com

propriedade mais uma vez SÉRGIO FERRAZ e ADILSON ABREU DALLARI:

“O duplo grau de jurisdição administrativa é um princípio tão elementar

na teoria geral do processo que muito pouco existe na doutrina a seu

respeito. Evidententemente, é ainda mais escassa a literatura a respeito

do duplo grau de jurisdição administrativa. O direito ao reexame de

uma decisão parece e, efetivamente é, elementar ao devido processo

legal. (...)

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De todo modo, o direito ao recurso de decisão proferida inauguralmente

pela Administração Pública está usualmente previsto nas leis de

processo administrativo, inclusive aquelas que cuidam de assuntos

específicos ou que estabelecem procedimentos especiais, mesmo as que

foram editadas antes da promulgação da Constituição Federal de 1988,

por se entender que isso é um imperativo de justiça, configurando um

princípio geral de Direito.

A possibilidade de um reexame da decisão retira o arbítrio de quem

decide e obriga a que a decisão proferida seja devidamente

fundamentada e motivada, abrindo ensejo à possibilidade de controle,

inclusive judicial, sem o qual não existe o chamado Estado de Direito.”

(Processo Administrativo, São Paulo: Ed. Malheiros, 2003, pp. 88-89)

No caso vertente, a autoridade prolatora da r. decisão

recorrida (a saber: a RDC ANVISA nº. 01/2011) é a Diretoria colegiada da ANVISA,

ou seja, seu órgão interno máximo, consoante disposto no artigo 15, §2º da Lei nº

9.782/995, o que predica, por uma conclusão lógica e insofismável, que a r. decisão final

é de último grau interno.

Contudo, como se sabe, a Lei nº 9.782/99, criadora da

ANVISA, expressamente a subordina, por vinculação, ao Ministério da Saúde, nos

seguintes termos:

―Art. 3o Fica criada a Agência Nacional de Vigilância Sanitária -

ANVISA, autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério da

Saúde, com sede e foro no Distrito Federal, prazo de duração

indeterminado e atuação em todo território nacional” (destacou-se).

Com efeito, consoante informa a Lei nº 10.683/03, que dispõe

sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, ao Ministério da

Saúde estão afetas, dentre outras, as seguintes áreas de atuação: insumos críticos para a

saúde, ação preventiva em geral, vigilância e controle sanitário de fronteiras e de

portos marítimos, fluviais e aéreos; vigilância de saúde, especialmente quanto às

drogas, medicamentos e alimentos (Art. 27, XX, ―e‖, ―f‖ e ―g‖)

5 Art. 15. Compete à Diretoria Colegiada: (...):

§ 2o Dos atos praticados pela Agência caberá recurso à Diretoria Colegiada, com efeito suspensivo, como última

instância administrativa”

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Aliás, com respeito às atribuições deste Ministério, o Decreto

nº. 7.336, de 2010, que regulamenta a Lei supra mencionada, é ainda mais incisivo em

seu Anexo I:

“Art. 1º O Ministério da Saúde, órgão da administração direta, tem

como área de competência os seguintes assuntos:

I - política nacional de saúde;

II - coordenação e fiscalização do Sistema Único de Saúde;

III - saúde ambiental e ações de promoção, proteção e recuperação da

saúde individual e coletiva, inclusive a dos trabalhadores e a dos índios;

IV - informações de saúde;

V - insumos críticos para a saúde;

VI - ação preventiva em geral, vigilância e controle sanitário de

fronteiras e de portos marítimos, fluviais e aéreos;

VII - vigilância de saúde, especialmente quanto às drogas,

medicamentos e alimentos; e

VIII - pesquisa científica e tecnológica na área de saúde.”

Nesse sentido, claro se afigura que o escopo de atuação da

ANVISA (ex.: insumos críticos para a saúde; ação preventiva em geral, vigilância e

controle sanitário de fronteiras e de portos marítimos e fluviais, dentre outros) está

abarcado pelo escopo mais abrangente da Pasta à qual aquela autarquia está submetida e

vinculada.

Sob outro ângulo, é nítido e irrefutável que as políticas

públicas a serem traçadas nas linhas de atuação circunscritas no artigo supra transcrito

cabem, primordialmente, ao Ministério da Saúde. Daí ser corolário lógico que quaisquer

atos expedidos pela ANVISA estão sujeitos à revisão do Ministério competente, no caso

o da Saúde, notadamente quando tais atos se revestirem de ilegalidade!! Mas não

apenas, como se demonstrará adiante.

No que concerne à consonância da atuação das agências

reguladoras com as políticas públicas traçadas pelos Ministérios correspondentes,

discorre ALEXANDRE SANTOS DO ARAGÃO com a propriedade que lhe é peculiar:

“Estes limites, além de não serem incompatíveis com a autonomia,

integram o seu próprio conceito. Não seria de se imaginar,

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realmente, que um órgão ou ente descentralizado, por mais autônomo

que fosse, ficasse alheio ao conjunto da Administração Pública. A

autonomia não pode servir para isentá-los da obrigação de se

inserirem nos planos e diretrizes públicas gerais. Se fossem colocados

em compartimentos estanques, a descentralização revelar-se-ia antiética

aos valores de eficiência e pluralismo que constituem o seu

fundamento.”(Administração Pública Pluricêntrica In: ―Revista de

Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 227, pp 131-150, jan./mar.

2002)

De se notar, ainda, o teor do art. 2º, IV, ―a‖, ―1‖ do Decreto

nº. 7.336/2010, que, ao dispor sobre a estrutura organizacional da Pasta da Saúde,

expressamente arrola a ANVISA como entidade a ela vinculada. Senão vejamos:

―Art. 2o O Ministério da Saúde tem a seguinte estrutura organizacional:

(...)

IV - entidades vinculadas:

a) autarquias:

1. Agência Nacional de Vigilância Sanitária”.

E não poderia ser de outra forma, porquanto as Agências

reguladoras, em que pese sua autonomia, estão submetidas incondicionalmente à

supervisão da Presidência da República e respectivos Ministérios, inclusive com

fundamento nos arts. 76, 84, II e 87, parágrafo único, I, da Constituição Federal6, até

mesmo porque seus atos devem ser compatíveis com as finalidades institucionais e com

as políticas públicas do País, como demonstrado acima.

Nesse diapasão é o anexo Parecer AGU AC-051 da

Advocacia Geral da União, de 12.6.2006, devidamente aprovado pelo Excelentíssimo

Senhor Presidente da República -- e publicado no Diário Oficial da União, de

6 ―Art. 76. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado.”

“Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

(...)

II - exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal”

“Art. 87. Os Ministros de Estado serão escolhidos dentre brasileiros maiores de vinte e um anos e no exercício dos

direitos políticos

Parágrafo único. Compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições estabelecidas nesta Constituição e na

lei:

I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua

competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República”

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19.6.2006, Seção 1, páginas 1-11, para os efeitos do art. 40, § 1º, da Lei Complementar

nº 73/037 --, que adotou, ―nos termos do Despacho do Consultor-Geral da União nº

438/2006, para os fins do art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de

1993, o anexo PARECER Nº AGU/MS-04/06, de 23 de maio de 2006, da lavra do

Consultor da União, Dr. MARCELO DE SIQUEIRA FREITAS, e submeto-o ao

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA‖.

Nesse Parecer, restou consolidada, com efeitos vinculantes a

toda a Administração Pública (Lei Complementar nº. 73/93, art. 40, §1º) a

competência do Ministro de Estado dos Transportes para apreciar recurso administrativo

hierárquico impróprio interposto contra a Diretoria da Agência Nacional de Transportes

Aquaviários - ANTAQ, com fundamento, entre outros, no art. 5º, XXXIV, LIV e LV e,

ainda, no art. do Decreto-lei nº 200/67 e na Lei nº 9.784/99, como segue:

“1.A questão trazida à apreciação, como bem mostrado pelo Parecer

AGU/MS-04/2006 que ora submeto à consideração de Vossa Excelência

está estreitamente relacionada com a adequada compreensão do regime

jurídico legal de regulação.

Com efeito, desde que a Constituição estabeleceu caber privativamente

ao Presidente da República o exercício do poder regulamentar, tem-se

como certo que lhe cabe, em qualquer circunstância, determinar as

medidas correspondentes. É claro que essa prerrogativa não exclui o

próprio poder regulador da lei até mesmo porque a atuação da

administração fica sempre sujeita ao princípio da legalidade.

Ocorre que, a despeito disso, é inegável o poder de avocação

presidencial em decorrência dessa privatividade de regular, o que

implica assentar a verdade lógica de que não há exceção à essa

eminência, a qual, de resto, é também derivação natural do regime

presidencialista adotado pela Constituição.

Daí resulta perfeitamente compreensível que em relação à

administração direta ou indireta do poder executivo todas as instituições

estão vinculadas à lei e às determinações regulamentares do Presidente

da República, estas as quais resultam por sua vez precisamente do

exercício do poder de definir as prioridades e discrição de sua

administração auxiliada pelos Ministros de Estado. Em resumo,

Presidente da República através de seus Ministros, exercendo a

administração pública superior, estão limitados apenas pela

7 Art. 40. Os pareceres do Advogado-Geral da União são por este submetidos à aprovação do Presidente da República.

§1º O parecer aprovado e publicado juntamente com o despacho presidencial vincula a Administração Federal, cujos órgãos e

entidades ficam obrigados a lhe dar fiel cumprimento.

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Constituição e pelas leis, em cujos limites, por isso, exercem também a

supervisão e controle dos órgãos intermediários e inferiores da

administração.

Em outros termos, a adequada compreensão como acima mencionada se

fixa pela exata inteligência constitucional que exclui nichos de

autonomia absoluta no interior da administração e pela necessária

atenção ao sistema constitucional de regulação. Nesse quadro é que se

deve desenvolver a discussão ora descrita no parecer em causa.

Assim, a questão não é a quantidade de autonomia destinada pela lei às

agências reguladoras senão a intensidade da supervisão que lhes pode

votar a administração direta dos Ministérios. Nesse sentido, a

argumentação do parecer referido é precisa ao definir as bordas da

“autonomia” reguladora titulada por elas nos limites de suas precípuas

finalidades legais e na escrupulosa sintonia com as políticas públicas a

cargo dos ministérios. A rigor, uma e outra têm sede legal ou

constitucional, daí porque em verdade a controvérsia não se situa no

reconhecimento da autonomia ou não, mas na compreensão da vontade

legal-constitucional relacionada com a atividade de cada uma delas.

Nessa linha de compreensão, as ações e atividades das agências

reguladoras, embora submetidas ao mesmo regime de supervisão, só

desfrutam dessa pretendida autonomia na medida em que desempenhem

seus encargos ou poderes no limite da competência legal, situação em

que a supervisão ministerial fica inversamente mitigada, o que, de resto,

é comum a todas as entidades da administração indireta. Assim, o

pressuposto necessário da premissa é a existência incondicional da

supervisão ministerial como traço essencial do regime presidencialista

vigente - que, aliás, repita-se, não é mera aplicação das regras do

Decreto-Lei n° 200/1967, mas reconhecimento da aplicação sistemática

das prerrogativas constitucionais de regulação privativas do Presidente

da República - e então a aferição da autonomia das agências e de suas

condutas além de diretamente vinculadas às suas finalidades

institucionais se mede principalmente pela adequada compatibilização

com as políticas públicas adotadas pelo Presidente a República e os

Ministérios que o auxiliam.

Pelas mesmas razões, o cabimento do recurso hierárquico impróprio

não encontra objeções já que inexiste área administrativa imune à

supervisão ministerial, reduzindo-se, contudo, o âmbito de seu

cabimento, de modo idêntico, na mesma razão inversa da obediência às

políticas de iniciativa do Ministério supervisor.

Em suma, não há suficiente autonomia para as agências que lhes possa

permitir ladear, mesmo dentro da lei, as políticas e orientações da

administração superior, visto que a autonomia de que dispõem serve

justamente para a precípua atenção aos objetivos públicos. Não é outra,

portanto, a conclusão com respeito à supervisão ministerial que se há de

exercer sempre pela autoridade ministerial competente, reduzindo-se, no

entanto, à medida que, nos limites da lei, se atendam às políticas

públicas legitimamente formuladas pelos Ministérios setoriais. Por isso,

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se afirma que a autonomia existe apenas para o perfeito cumprimento de

suas finalidades legais.”

Impende salientar, por oportuno, que o citado Parecer

vinculante, embora analisasse precipuamente a vinculação da ANTAQ ao Ministério

dos Transportes, faz expressa referência à revisão de decisões proferidas pela ANVISA

ao frisar que ―E essa autonomia decisória das agências, atualmente, seria

compartilhada em determinado grau por todas elas, pois nada justifica que apenas

ANATEL, ANVISA, ANS e ANAC não estivessem sujeitas à revisão ministerial (...)”

(destacou-se).

Na mesma linha é o entendimento do E. Superior Tribunal de

Justiça, que, no mandado de segurança nº 10.254/DF, julgado em 22.3.2006,

exteriorizou que ―O recurso administrativo hierárquico, independentemente da

denominação conferida pelo administrado, deve ser submetido à autoridade

hierarquicamente superior, caso o agente ou órgão prolator da decisão ou ato

impugnado não o reconsidere. Na espécie, o fundamento de que o processo

administrativo disciplinar se rege pela Lei n. 8.112/90 e apenas subsidiariamente pela

Lei n. 9.784/99 não exclui a possibilidade e o direito do interessado de ter seu recurso

examinado pelo agente superior, já que o recurso administrativo hierárquico

independe de previsão legal. Assim, é irrelevante o fato de o recurso hierárquico não

estar previsto na legislação especial, qual seja, a Lei n. 8.112/90. De qualquer forma, o

referido diploma legal contempla a possibilidade de recorrer à autoridade

hierarquicamente superior, no capítulo destinado ao direito de petição, assegurado aos

servidores públicos, em processo administrativo disciplinar (arts. 104/115),

denominando-se simplesmente de recurso.‖ (destacou-se).

E nem se argumente que este raciocínio, externado no

acórdão acima transcrito, não se aplicaria às agências reguladoras por faltar-lhes o

requisito de subordinação hierárquica aos Ministérios. Com efeito, mesmo nos casos de

subordinação por vinculação (como é a hipótese das agências em respeito aos

respectivos Ministérios), e, portanto, nos casos do dito recurso hierárquico impróprio, o

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entendimento da E. Corte Superior é o mesmo. Senão vejamos:

“MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ADMINISTRATIVO.

EXIGÊNCIA DE DEPÓSITO. PODER DE SUPERVISÃO DO

MINISTRO DE ESTADO AOS ÓRGÃOS A ELE SUBORDINADOS.

REVOGAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO ANULÁVEL. APLICAÇÃO

DA SÚMULA Nº. 473 DO STF. INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS

DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. ILEGALIDADE.

CONCESSÃO DA SEGURANÇA. PRECEDENTES DO STJ. I – é ilegal

a exigência, na interposição do recurso administrativo, da prova do

depósito da multa, como condição para o seu recebimento. II – Todo e

qualquer órgão da Administração Pública Federal, direta ou indireta,

está sujeito à supervisão do Ministro de Estado competente, cabendo-

lhe também conhecer de recursos providos de órgãos subordinados ou

de entidades vinculadas ao seu Ministério, com base na hierarquia ou

na supervisão ministerial. III – A Administração pode anular seus

próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque

deles não se originam direitos (Súmula nº. 473 do STF). Todavia, este

poder não é absoluto, porquanto deve respeitar as garantias

constitucionais da ampla defesa e do contraditório. IV – Precedentes do

STJ. V – Segurança concedida. MS- Mandado de Segurança – 6737.

Processo: 199901194121 UF: DF, órgão julgador: Primeira Seção,

Data da decisão: 10/04/2002, Fonte: DJ 13/05/2002. Relatora: Laurita

Vaz. (Destacou-se)

Como visto, a organização descentralizada da Administração,

ainda que feita por meio de autarquias dotadas de certa autonomia, não pode justificar

atuações dissentes das políticas públicas traçadas pela Administração Central e, mais

ainda, que estes desvios de conduta desfavoreçam o administrado.

Com efeito, assevera MARCOS JURUENA VILLELA

SOUTO:

“Os Ministérios e as Secretarias exercem sobre os órgãos de sua

estrutura administrativa um controle interno, utilizando-se de hierarquia

(controle por subordinação) e sobre as pessoas da Administração

Indireta (controle externo e por vinculação) um controle finalístico

(supervisão), podendo ser instrumentalizado em contrato de gestão. A

este último ficam sujeitas as agências reguladoras, já que, como dito, a

independência não afasta a incidência da norma constitucional que as

submete à direção superior do chefe do Poder Executivo.” (Direito

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Administrativo Regulatório, Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2002, p. 253)

Impende observar, contudo, que os Ministérios não

exercem apenas um controle finalístico sobre as atividades das agências reguladoras.

Há, importante que se diga, um controle mais amplo, o qual, ademais, é respaldado pela

previsão do artigo 19 do Decreto-lei nº. 200/67:

“Art. 19 – Todo e qualquer órgão da Administração Federal, direta ou

indireta, está sujeito à supervisão do Ministro de Estado competente,

excetuados unicamente os órgãos mencionados no artigo 32, que estão

submetidos à supervisão direta do Presidente da República.”

Ou seja, deflui-se do dispositivo legal que há expressa

previsão normativa para o controle das autarquias, mesmo aquelas ditas especiais, do

que decorre, de maneira lógica e incontornável, que é cabível o chamado recurso

hierárquico impróprio, in casu.

Desse modo, consoante ensinamento do eminente Prof.

CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, ao Ministério da Saúde caberá exercer

tanto o controle da legitimidade dos atos da ANVISA, quanto do mérito propriamente

dito:

“Não é demais recordar que a doutrina, acertadamente, encarece que o

controle das autarquias existe nos casos, forma e modos que a lei

estabelece (...) A ingerência que cabe à Administração Central exercer

sobre elas e a própria integração de suas atividades no planejamento

geral administrativo hão de realizar-se segundo os meios que a lei haja

previsto, ao estabelecer o controle da entidade autárquica. Tal controle

configura a chamada tutela ordinária. Cumpre observar, entretanto, que

a doutrina admite, em circunstâncias excepcionais, perante casos de

descalabro administrativo, de graves distorções no comportamento da

autarquia, que a Administração Central, para coibir desmandos sérios,

possa exercer, mesmo à falta de disposição legal que a instrumente, o

que denominam tutela extradordinária.” (Curso de Direito

Administrativo, 2ª edição, São Paulo:Ed. Malheiros, 2010, p. 164)

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No caso em análise, qual seja, o processo administrativo de

reavaliação toxicológica do Metamidofós, o qual culminou na edição da indigitada

RDC ANVISA nº. 01/2011,é até mesmo difícil cindir o que seja legitimidade/legalidade

de mérito do ato administrativo, eis que, como visto, tantas e tamanhas foram as

atrocidades cometidas ao longo do processo, que o ato final restou viciado desde sua

origem.

Por outro lado, a doutrina contemporânea até mesmo admite

que não existem contornos precisos e claramente delimitados do que seja mérito e

legalidade do ato administrativo, de modo que hodiernamente se preconiza, em matéria

de controle dos atos administrativos, que tanto os aspectos de legalidade quanto os de

mérito são sindicáveis.

A esse respeito, valemo-nos, uma vez mais, das palavras da

Ilustre Profa. ODETE MEDAUAR, que, ao discorrer sobre a ampliação do controle

jurisdicional em relação aos atos administrativos, claramente evidencia a ampliação da

noção de legalidade:

“A tendência da ampliação do controle jurisdicional da Administração

se acentuou a partir da Constituição Federal de 1988. O texto de 1988

está impregnado de um espírito geral de priorização dos direitos e

garantias ante o poder público. Uma das decorrências desse espírito

vislumbra-se na indicação de mais parâmetros de atuação, mesmo

discricionária, da Administração, tais como o princípio da moralidade

e o princípio da impessoalidade. O princípio da publicidade, por sua

vez, impõe transparência na atuação administrativa, o que enseja maior

controle. E a ação popular pode ter como um dos seus fulcros a

anulação de ato lesivo da moralidade administrativa,

independentemente de considerações de estrita legalidade.

Hoje no ordenamento pátrio, sem dúvida, a legalidade assenta em

bases mais amplas e, por conseguinte, há respaldo constitucional para

um controle jurisdicional mais amplo sobre a atividade da

Administração, como coroamento de uma evolução já verificada na

doutrina e na jurisprudência antes de outubro de 1988.‖ (Direito

Administrativo Moderno, 10ª edição, São Paulo: Ed. Revista dos

Tribunais, 2006, p. 395)

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Ou seja, a clássica distinção entre atos vinculados e

discricionários – os primeiros correspondendo àqueles através dos quais a

Administração pratica a única conduta permitida em lei (ou seja, em que à

Administração é vedada conduta diversa), e os segundos dizendo respeito, em sentido

inverso, às hipóteses em que a Administração, através de análise de conveniência e

oportunidade (mérito), tem liberdade no agir e decidir – não se presta, na atualidade, a

definir quais os atos que devam ou não ser objeto de controle!!

Mesmo porque, diante da assertiva, mais do que aceita pela

doutrina e jurisprudência, de que os princípios da impessoalidade, moralidade,

razoabilidade, proporcionalidade e tantos outros devam ser avaliados na conduta

discricionária da Administração, cai por terra a teoria de que o mérito é sempre

insindicável.

Portanto, de tudo quanto exposto, deflui como constatação

irrefutável que a competência deste Ministério da Saúde para apreciar a decisão tomada

pela Diretoria Colegiada da ANVISA, consubstanciada na RDC nº. 01, de 14 de janeiro

de 2011, é ampla, de maneira a abranger os aspectos de legalidade e de mérito

(notadamente no tocante à razoabilidade e proporcionalidade da medida).

Neste ponto, não há como prevalecer o entendimento exposto

no parecer emitido pela Procuradoria da ANVISA, visto que a especialidade da

atividade desenvolvida pelo órgão não torna suas decisões imunes à revisibilidade no

âmbito administrativo.

Nem mesmo o ―maior grau de autonomia decisória‖ pode ser

invocado como argumento para afastar a competência do Ministro de Estado da Saúde,

autoridade máxima da esfera administrativa, para apreciar os recursos contra as decisões

proferidas por tais órgãos.

Aliás, no que toca à análise da legalidade/legitimidade das

condutas praticadas ao longo do processo de reavaliação do Metamidofós, a

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competência revisória desta Pasta é medida que se impõe e pouca dissonância há quanto

a isso, até mesmo entre os que defendem uma competência revisória mais restrita nas

hipóteses de recurso hierárquico impróprio. Senão vejamos:

“O fato da agência reguladora ser independente não significa que não

possa ser objeto de controle. Esse controle pode ser administrativo, via

contrato de gestão, controle social – por meio do direito de petição a

ouvidorias ou aos legitimados à apreciação da validade dos atos – ou

até por meio do recurso hierárquico impróprio (que se limite à

declaração de ilegalidade de atos regulatórios, após prévio parecer

jurídico sobre o tema); pode se dar o controle no âmbito do Pode

Legislativo (para sustação dos efeitos dos atos ilegais) e dos Tribunais

de Contas (limitado este ao exame das contas e não da parte regulatória

em si) e, por fim, o controle judicial” (SOUTO, Marcos Juruena Villela

Souto. As Agências Reguladoras e os Princípios Constitucionais)

Por outro ângulo que se analise a questão, o direito de

petição, como natural corolário do princípio do devido processo legal, é cláusula pétrea

e direito fundamental do cidadão, de modo que não seria aceitável que uma decisão

proferida em única e última instância administrativa não pudesse ser objeto de

reavaliação. Por outro lado, a vedação ao duplo grau de jurisdição na esfera

administrativa importaria no cerceamento do direito constitucionalmente assegurado ao

contraditório e à ampla defesa. Na lição de JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO:

"Os recursos administrativos têm suporte em três fundamentos básicos:

1) o sistema de hierarquia orgânica; 2) o exercício do direito de petição;

3) a garantia do contraditório e ampla defesa.

(...)

Também é fundamento dos recursos administrativos o direito de

petição, previsto no art. 5º, XXXIV, 'a', da CF. Quando examinamos

neste mesmo capítulo, destacamos ser o direito de petição um dos

meios de controle administrativo. Aqui é propícia a extensão do sentido

em ordem a ser esse direito considerado como fundamento dos

recursos, porque os recursos não são senão um meio de postulação

formulado normalmente a um órgão administrativo superior. Ora, a

noção que encerra o direito de petição é ampla e logicamente abrange

também os pedidos revisionais, como são os recursos administrativos.

Podemos, assim, concluir que os recursos são uma forma de exercer o

direito de petição, não podendo os indivíduos, em conseqüência,

encontrar óbices para sua interposição.

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O art. 5º, LV, da CF, assinala claramente o terceiro fundamento dos

recursos, dispondo ser assegurado o direito de ampla defesa e

contraditório com os meios e recursos a ela inerentes. O texto deixa

claro que o princípio não estará completo se não se garantir ao

interessado o direito de interposição de recursos. Com efeito, hipóteses

de arbitrariedades e condutas abusivas por parte de maus

administradores devem ser corrigidas pelos agentes superiores, e para

que o interessado leve sua pretensão a estes certamente se socorrerá do

instituto recursal. Cercear o recurso, portanto, é desnaturar

indevidamente o fundamento pertinente ao próprio direito de defesa."

(Manual de Direito Administrativo, 11ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris,

2004, pp. 791-792)

Depreende-se, destarte, que as leis que definiram os

princípios e diretrizes das políticas públicas dos subsistemas regulados pelas agências

reguladoras não suprimem – e nem poderiam fazê-lo! -- a competência constitucional

dos Ministros de Estado aos quais essas Agências estão vinculadas. Ao contrário,

constata-se que, como regra, as leis que criaram as Agências fixaram, de forma

abrangente, porém clara e objetiva, princípios, objetivos e, neste contexto, limites de

atuação daqueles entes autárquicos.

Por essa linha de pensamento, a decisão exarada pela

Agência Reguladora, na qualidade de autarquia estando ela apenas vinculada ao

Ministério (ou Secretaria, no caso dos Estados e dos Municípios), não pode a ficar

infensa à apreciação superior. Isso porque a provocação de instâncias executivas

superiores não é apenas direito dos administrados, mas torna-se também

imperativa se pretenda observar o esgotamento da instância administrativa antes

de sujeitar a questão ao controle judicial.8

Dessa forma, plenamente admissível este recurso hierárquico

impróprio à luz do atual modelo regulatório brasileiro, ao qual, ademais, deverá ser

concedido efeito suspensivo, notadamente em vista do que prescreve o art. 61, parágrafo

único, da Lei nº 9.784/99.

8 Sérgio Guerra - Agências Reguladoras e a Supervisão Ministerial, texto componente do livro ―O poder

normativo das agências reguladoras‖, Alexandre Santos de Aragão, coordenador, Rio de Janeiro, Ed.

Forense, 2006, págs. 493/496.

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— IV —

DA NECESSÁRIA CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR

O art. 7º, III, da Lei Federal nº. 12.016/09, estabelece o seguinte:

“Artigo 7º - Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:

(...)

III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver

fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da

medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do

impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o

ressarcimento à pessoa jurídica”.

A concessão de liminar é ínsita ao mandado de segurança uma

vez que a sua finalidade é obstar a prática de uma ilegalidade pelo Poder Público e,

ainda, conservar in natura o direito perseguido.

Veja-se, a propósito, a lição de SÉRGIO FERRAZ na obra

―Mandado de Segurança (individual e coletivo) – Aspectos polêmicos‖ (Malheiros, 3ª

edição, 1996):

“(...) Atualmente, o que importa, ao lado da relevância do

fundamento, é a circunstância de que, na ausência da concessão da

medida de caráter antecipatório da tutela, estará a parte realmente na

iminência de se ver frustrada, pela absoluta então inaptidão da

sentença final com vistas à produção dos efeitos restauradores do

direito em si, que constituem a finalidade do mandado de segurança”9

(destacou-se).

No mesmo sentido, CÁSSIO SCARPINELLA BUENO leciona

na obra ―Mandado de Segurança‖ (Editora Saraiva) que:

“toda vez que o procedimento do mandado de segurança, não obstante

célere, ágil e expedito – mais do que qualquer outra ação no processo

civil – mostrar-se incapaz de assegurar ao impetrante perspectiva de

9 Mandado de Segurança (individual e coletivo) – Aspectos polêmicos, 3ª edição, Malheiros, 1996.

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fruição integral, plena e „in natura‟ do bem da vida por ele reclamado,

o caso é de „ineficácia da medida‟ („periculum in mora‟) e, pois, desde

que diante de fundamento relevante, de concessão da liminar...” (p.

68).

E em outro trabalho doutrinário sobre o tema (Liminar em

Mandado de Segurança, Editora Revista dos Tribunais, 2ª edição), o mesmo Jurista

afirma, com propriedade, o seguinte:

―Como a própria evolução destes textos legislativos [CPC de 1939 e Lei

1.531] é transparente em demonstrar, no atual regime, o legislador

acabou por assumir, em plena consonância com a previsão

constitucional do mandado de segurança (...), que o ‘periculum in

mora’ revista-se tão-somente da ineficácia da medida, valorando, portanto, a conservação da possibilidade de fruição ‘in natura’ do bem questionado se concedida, a final, a ordem. Se, como visto, o mandado de segurança volta-se,

precipuamente, à garantia plena do bem da via questionado, não

desejando o constituinte sua conversão (ou conversibilidade) em perdas

e danos, não poderia ser outro o comando da previsão legal da liminar

no mandado de segurança, até mesmo de acabar por minimizar a

potencialidade plena que pode ser extraída da Constituição em prol do

instituto (p. 68).

(....)

Temos como correto o entendimento pelo qual „há dano irreparável

toda vez que, por ato ilegal ou abusivo, atinge-se direito subjetivo da

parte, somente afastado mediante a tutela jurisdicional, até porque,

„reconhecida a plausibilidade do direito nos pródomos do mandado de

segurança, não há mais como coonestar sua exposição aos riscos da

autuação fiscal, já que comportam estes avaliação objetiva. Como

efeito, como já referido por diversas vezes, o mandado de segurança é

ação predisposta à conservação do bem „in natura‟ sendo contrário à

sua „ratio‟ e à sua previsão constitucional entender-se reparável o bem

da vida em questão.

(...)

Não se trata de outorgar ao impetrante uma posição mais favorável

que outro no pólo da relação processual (no caso, o Estado ou quem

lhe faça as vezes), mas, antes, em resguardo a plena eficácia final da

decisão, se concedida em natura, de evitar que a duração do processo

resulte em uma alteração do equilíbrio inicial da força entre as partes,

mormente como na hipótese do mandado de segurança, quando a força

entre as partes já é presumivelmente desequilibrada no ordenamento

jurídico, como elemento de operatividde do ato estatal (presunção de

auto-executoriedade e de legitimidade do ato estatal)‖ (p. 120/123).

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E conclui CÁSSIO SCARPINELLA BUENO no indigitado

trabalho:

―Diante disto, considerando que o valor maior a ser prestigiado pelo

mandado de segurança é a possibilidade de realização „in natura‟ do

bem jurídico apontado como ameaçado, o pressuposto relativo à

‘fundamentação relevante’ acaba, na exata proporção em que se agiganta o receio de ineficácia da medida, relevando-se nitidamente indicativo da possibilidade do sucesso do ‘mandamus’. Nestes casos, ainda que se verifique a

efetiva satisfação do direito do impetrante mercê da concessão da

liminar (com grau de preponderância), esta não deixa de se dar, em

conformidade com a clássica de Calamandrei, a título de acautelamento.

E dizemos „acautelamento‟ porque somente com a sentença final é que

será declarada a existência daquele direito em prol do impetrante e

fixadas as responsabilidades daí decorrentes‖ (p. 124 – destacou-se).

Pois bem.

No vertente caso, está comprovado, de plano, o chamado fumus

bonis iuris, uma vez que a ilegalidade dos atos perpetrados pelas autoridades coatoras

salta aos olhos.

Realmente, conforme se demonstrou nos tópicos anteriores:

(i) a ANVISA está vinculada administrativamente ao Ministério da Saúde por força de

Lei (Lei nº 9.782/99), sendo certo que o Ministro de Estado da Saúde é a autoridade

competente para julgar os recursos interpostos contra as decisões proferidas pela

Diretoria Colegiada da ANVISA;

(ii) a possibilidade de manejo de recurso administrativo hierárquico impróprio em

situações desse jaez já foi reconhecido em parecer aprovado pelo Exmo. Sr. Presidente

da República (Parecer AGU AC-051) e, portanto, com força vinculativa (Lei

Complementar nº. 73/93, art. 40, §1º);

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(iii) ao negar seguimento ao recurso administrativo hierárquico impróprio interposto

pela aqui Impetrante, a ANVISA acabou por usurpar a competência do Exmo. Sr.

Ministro de Estado da Saúde, e, ainda, negar eficácia às garantias constitucionais do

devido processo legal e aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Tenha-se presente, como também demonstrado acima, que esse

entendimento encontra guarida em solida jurisprudência, inclusive do Colendo Superior

Tribunal de Justiça (STJ, MS nº 10.254-DF e MS nº 6.737-DF).

Também na Justiça Federal do Distrito Federal há precedentes

relevantes no mesmo sentido, pedindo-se venia para citar a r. decisão proferida pelo E.

Juízo da 9ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, nos autos do Mandado

de Segurança nº 0022272-22.2011.4.01.3400, que houve por bem determinar o

processamento de recurso administrativo hierárquico impróprio interposto contra

decisão da INFRAERO em situação em tudo e por tudo idêntica à presente (doc. 4).

Por outro lado, o periculum in mora é inquestionável no presente

caso. Isto porque a manterem-se os efeitos da RDC nº 01/2011, a Impetrante estará

fadada a fechar suas portas, vez que, não poderá comercializar o Metamidofós, produto

essa cuja venda corresponde a aproximadamente 80% (oitenta por cento) do

faturamento da Impetrante.

Não se olvide, ainda, que a Resolução em comento já está

surtindo seus efeitos, de modo que a fabricação do Metamidofós deverá ser suspensa a

partir de 31.06.2011, isto é, em 45 (quarenta e cinco) dias!

A prevalecer a decisão da Diretoria Colegiada da ANVISA, no

dia 01.07.2011 a Impetrante será obrigada a suspender suas atividades, dispensar

funcionários, prestadores de serviço, suspender encomendas de investimento para a

produção de novos produtos, cancelar contratos de suprimentos externos e internos.

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Ou seja: trata-se de prazo sobremaneira exíguo e que poderá, caso

seja verificado na situação atual, inviabilizar completamente as atividades empresariais

da Impetrante.

Registre-se, por oportuno, que não se verifica in casu, o chamado

periculum in mora reverso, apto a impedir a concessão da liminar ora pleiteada.

Como visto, a ANVISA já havia procedido à reavaliação

toxicológica do Metamidofós em 2002, tendo, naquela oportunidade, tomado medidas

mitigadoras dos riscos.

N´outras palavras, fosse a continuidade de comercialização

do produto tão danosa, seria de rigor que, já naquela oportunidade, houvesse o

banimento do produto, o que não ocorreu.

Tenha-se presente, uma vez mais, que o Metamidofós é

utilizado no Brasil, com o aval das autoridades, desde 1969, tendo ele recebido o

referendo da ANVISA em 2002.

Assim, nesse contexto, não há dúvida, da necessidade de ser

concedida medida liminar no caso vertente, para o fim de:

(i) suspender a eficácia da decisão da Diretoria Colegiada da ANVISA tomada

na reunião pública ordinária nº 02/2011, que não conheceu do recurso

hierárquico impróprio interposto pela Impetrante, determinando sua imediata

remessa à autoridade competente para seu julgamento, no caso, o Ministro

de Estado da Saúde;

(ii) conceder efeito suspensivo ao recurso administrativo, posto que presentes

todos os requisitos legais previstos no artigo 61 da Lei nº 9.784/99.

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— V —

REQUERIMENTOS FINAIS

Diante de todo o exposto, requer-se seja concedida medida

liminar, inaudita altera parte (Lei 12.016/09, art. 7º, III), para o fim de:

(i) revogar a decisão da Diretoria Colegiada da ANVISA tomada na

reunião pública ordinária nº 02/2011 que não conheceu do recurso

hierárquico impróprio, por usurpar competência do Ministro de Estado

da Saúde, além de consubstanciar-se em afronta aos princípios do devido

processo legal, ampla defesa, contraditório, e demais consagrados pela

Lei nº. 9.784, de 29 de janeiro de 1999, determinando a remessa do

processo à autoridade competente;

(ii) conceder efeito suspensivo ao recurso administrativo, posto que

presentes os requisitos legais previstos no artigo 61 da Lei nº 9.784/99.

Sucessivamente, requer-se, na forma do art. 7º, I e II da Lei

Federal nº 12.016/09:

(i) seja notificada a autoridade coatora, na pessoa dos Impetrados para

que prestem suas informações no prazo de 10 (dez) dias e, ainda, sobre o

conteúdo da decisão que apreciou o pedido de liminar acima referido;

(ii) seja dada ciência da impetração deste mandamus ao órgão de

representação judicial da ANVISA.

Requer-se, ademais, após regular processamento, seja confirmada

a liminar acima requerida e, ainda, seja dado integral provimento ao presente mandamus

para os fins antes requeridos.

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Por fim, requer sejam as publicações atinentes ao presente

mandamus veiculadas em nome dos subscritores da presente.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais).

São os termos em que,

pede deferimento.

Brasília, 12 de maio de 2011.

ROBERTO TEIXEIRA CRISTIANO ZANIN MARTINS

OAB/SP 22.823 OAB/SP 172.730

OAB/DF 32.190