Upload
others
View
2
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
FOSSILIZARTE: UM ENCONTRO DA BIOLOGIA COM AS ARTES
Diego Cruz Camargo, Júlia das Neves Lucas, Luíza Araújo dos Santos Sousa
Orientador: Alberto Alexandre Lazzaroni
Coorientador: Robson Francisco Martins
CIEP 449 Gov. Leonel de Moura Brizola Intercultural Brasil-França.
Rua Carlos Ermelindo Marins, S/N , Charitas, Niterói, RJ
Resumo
O presente trabalho objetivou promover oficinas de confecção de fósseis artificiais utilizando
técnicas paleontológicas associadas às das artes plásticas com o intuito de despertar o espírito
científico e a criatividade em nossos alunos aliados à autonomia e ao protagonismo juvenil.
Foram utilizados materiais como argila, areia, gesso, tinta tipográfica, ferramentas como
formões, goivas e rolinhos de espuma além de exemplares de conchas de animais marinhos,
folhas, exoesqueletos de insetos e ossos de frango e peixe. Os aspectos mais destacados das
oficinas foram a interação com o público durante as atividades e a liberdade criativa que as
mesmas proporcionaram. A construção desse trabalho foi muito gratificante. Pudemos
vivenciar de forma bem clara a estreita relação que existe entre a Biologia e as Artes Plásticas.
Perceber o crescimento de todos foi muito prazeroso. Houve um estímulo muito grande para
que, durante todo o processo, pudéssemos agir de forma autônoma, protagonista e criativa.
Palavras chave: Paleontologia. Artes plásticas. Criatividade.
Introdução
As atividades foram realizadas por alunos da 1ª série do ensino médio do CIEP 449
Leonel de Moura Brizola Intercultural Brasil-França, que participam das atividades do clube
de ciências da escola. Partindo de uma oficina de confecção de fósseis artificiais realizada
pelos professores de Biologia e de Artes, nos sentimos estimulados a dar sequência ao
trabalho criando esse projeto. Achamos maravilhosa a ideia pois vislumbramos a
possibilidade de estimular o desenvolvimento do espírito científico bem como a nossa
autonomia e o protagonismo juvenil.
A nosso pedido, foram ministradas então para os componentes do projeto aulas
teóricas sobre paleontologia, os processos de fossilização e as principais técnicas
paleontológicas bem como as das artes plásticas. Os professores tentaram unir os aspectos
acadêmico-científicos propriamente ditos com os aspectos artísticos para que as informações
científicas fossem trabalhadas da forma correta sem, no entanto, podar a nossa criatividade o
que oportunizou o despertar do nosso lado artístico, criativo e lúdico. Além de nos
proporcionar a experiência prática, pudemos dialogar com a ideia do “ausente”, do “acabado”
e até do “extinto” atualizando estes conceitos à nossa época.
A Paleontologia (palaios, antigo; ontos, ser; logos, estudo) é a ciência que estuda os
fósseis, ou seja, restos mineralizados de seres vivos ou vestígios de vida de organismos que
existiram durante a história da vida na Terra. A palavra fóssil vem do latim fossilis,
significando “escavado, desenterrado”. Como definição, um fóssil é todo registro da vida do
passado preservado nas rochas que tenham existido antes do tempo atual (denominado
Holoceno), ou seja, com mais de 11 mil anos. Englobam uma variedade de materiais como
ossos, dentes, folhas, troncos, impressão de pegadas, ovos, penas, valvas de moluscos etc,
todos preservados em camadas formadas antes do Holoceno (KELLNER, 2006). Os fósseis
fazem parte do patrimônio cultural. Uma das maneiras de entender e valorizar essa riqueza
paleontológica é a promoção de ações educativas nas escolas (IZAGUIRRY, 2013).
Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) essas ações podem e devem ser
implementadas através do ensino das Ciências Naturais. Estas devem abordar conhecimentos
de Química, Física, Geologia, Paleontologia e Biologia, entre outras áreas (BRASIL, 1998).
No entanto, sabemos que tanto a Geologia quanto a Paleontologia são temas pouco discutidos
em nossas salas de aula (IZAGUIRRY, 2013). Tudo o que sabemos sobre a pré-história
devemos aos fósseis e aos objetos encontrados nas escavações paleontológicas. Os fósseis não
apenas registram a história da vida, mas são também os melhores instrumentos para o estudo
da morfologia dos seres antigos e da geologia do planeta, ajudando na datação de rochas,
pesquisando sobre mudanças no clima e sobre o movimento dos continentes além de
desvendar problemas biológicos relativos à evolução, origem e extinção da vida (EICHER,
1969).
A partir do que os paleontólogos descobrem com os fósseis é possível inferir, com
maior ou menor certeza, como eram os seres extintos, seu modo de vida e, até mesmo, o
ambiente em que viviam. Como na maioria das vezes o material encontrado não revela um
organismo inteiro, torna-se necessário também um pouco de imaginação e raciocínio lógico
para montar esse verdadeiro quebra-cabeça (EDUCAÇÃO PÚBLICA, 2006). Entra em cena
então a reconstituição paleontológica e uma especialidade chamada de paleoarte. A primeira é
entendida como a concepção artística de um ser vivo e∕ou ambiente pretérito a partir de
evidências fósseis enquanto que a segunda é o conjunto de técnicas utilizadas na recriação
dessa concepção. O escultor∕ilustrador∕desenhista especializado nessas técnicas é um
paleoartista (COLECIONADORES DE OSSOS, 2017).
Esse processo de reconstrução é interdisciplinar e combina a pesquisa paleontológica
com atividades como a ilustração científica, a modelagem 3D e a animação computacional. É
uma área de atuação que requer do profissional uma grande capacidade de observação aliada à
destreza na interpretação e na síntese de dados. Nesse processo de reconstrução de um
organismo extinto, o paleontólogo e o paleoartista trabalham juntos e em muitos momentos
seu trabalho se assemelha ao de um detetive. Utilizando-se dos conhecimentos científicos
disponíveis tais como anatomia comparada, biomecânica e filogenética, eles conseguem
gradativamente reconstruir o organismo extinto chegando a uma imagem muito próxima de
como ele pode ter sido bem como do paleoambiente em que viveu (DARDON, 2010).
Diante do exposto, percebe-se que unir ciência e arte não é um trabalho fácil. No
entanto, sendo ambas manifestações culturais da humanidade, elas se nutrem da nossa
curiosidade, da criatividade, do desejo de experimentar. Os fazeres artístico e científico são
duas faces da ação e do pensamento humanos, faces estas complementares mediadas por
tensões e descompassos, capazes de gerar o novo, o aprimoramento mútuo e a afirmação
humanística (MASSARANI, 2006). Assim sendo, propor um trabalho como esse é, acima de
tudo, instigante e desafiador.
Objetivos
Promover oficinas de confecção de fósseis artificiais no Colégio Estadual Intercultural
Brasil-França e em outras escolas, simpósios, congressos etc. Compreender o processo de
formação dos fósseis. Aprender como utilizar algumas técnicas das artes plásticas no estudo
da Paleontologia. Propiciar a aproximação entre o conhecimento científico e as artes plásticas.
Despertar o espírito científico, a criatividade, a autonomia e o protagonismo juvenil utilizando
o conhecimento científico como pano de fundo.
Materiais e Métodos
O trabalho foi realizado por alunos da 1ª série do ensino médio do CIEP 449 Gov.
Leonel de Moura Brizola Intercultural Brasil-França, no período de abril-setembro de 2017.
A ideia de criarmos esse projeto surgiu a partir de uma oficina de confecção de fósseis
artificiais realizada em conjunto pelos professores de Biologia e de Artes, cujo intuito era
aproximar o estudo dos fósseis (Paleontologia) com as Artes Plásticas. A oficina foi utilizada
como forma de materializar essa relação e foi realizada utilizando técnicas das duas áreas em
questão. O grupo desde o início priorizou que, na medida do possível, trabalharíamos
respeitando o princípio da sustentabilidade através da utilização de materiais recicláveis.
Iniciamos pela pesquisa de protocolos para a confecção dos fósseis artificiais
envolvendo técnicas de preparação de fósseis empregadas pelos paleontólogos em seus
trabalhos de campo tais como a criação de moldes e tomada de impressões, utilizando
materiais como argila, areia, gesso, sabonete de glicerina e massa de modelar e como
recipientes caixas de leite, potes de margarina, entre outros. Como exemplares de fósseis
foram usadas conchas de animais marinhos, folhas, exoesqueletos de insetos e ossos de frango
e peixe (Figura 1).
Figura 1- Fósseis artificiais produzidos pela técnica de moldagem
Posteriormente, sem perder o foco na sustentabilidade, utilizamos uma das técnicas
das Artes Plásticas, a gravura, mais especificamente a xilogravura. Pegamos fragmentos de
gesso (sobras de rebaixamento de teto) e desenhamos sobre essa placa o fóssil da nossa
preferência. Em seguida, utilizando ferramentas para sulcar (formões, goivas) esculpimos os
desenhos imaginados para os fósseis. Esse desenho era posteriormente coberto com tinta
tipográfica e, com o auxílio de um rolinho de espuma, realizamos a impressão para uma folha
de papel pardo das figuras (Figura 2).
Figura 2 – Fóssil artificial produzido pela técnica de impressão em papel pardo
Resultados e Discussão
A partir da primeira oficina o grupo foi avançando com as ideias. Vamos aqui relatar três
atividades que realizamos até então. A primeira foi uma exposição das gravuras na Aliança
Francesa de Niterói durante todo o mês de agosto do corrente ano. Para esse evento,
trabalhamos juntos com alunos da Universidade Federal Fluminense (UFF) licenciandos de
Ciências Biológicas e bolsistas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
(PIBID). Tivemos total liberdade para produzir as matrizes unindo fragmentos de animais
(espinha de peixe, conchas, ossos etc) e objetos do nosso cotidiano (pente, garfo e colheres de
plástico, tesoura, ferramentas etc). Dessa forma, as gravuras apresentavam imagens híbridas
cujo objetivo foi o de promover reflexões sobre a nossa relação com o meio ambiente. Foram
produzidas 25 gravuras em papel cartão e essa exposição teve uma repercussão bastante
satisfatória tanto pelo público presente como pela mídia (Figuras 3 e 4).
Figura 3 – Clipping jornal “A Tribuna” de 27 de julho de 2017
Figura 4 – Clipping jornal “O Fluminense” de 31 de julho de 2017
Posteriormente, fizemos uma segunda atividade quando fomos convidados a participar de
um congresso técnico científico realizado no Colégio Salesiano Santa Rosa em Niterói. Nesse
evento apresentamos uma oficina para cerca de duzentas pessoas, divididas entre estudantes
do ensino médio, estudantes de graduação, professores e público em geral (Figura 5).
Figura 5 – Fossilizarte no congresso técnico científico do Colégio Salesiano Santa Rosa
Nesse congresso um lado muito positivo foi relatado pelos presentes: a interação
proporcionada com o público pela atividade. Um outro aspecto salientado foi que muitas
gravuras puderam ser produzidas pelas pessoas que visitavam o evento, não se restringindo à
mera impressão daquelas previamente produzidas pela equipe. Isso, com certeza, aumentou
ainda mais o lado lúdico e criativo da oficina (Figura 6). Importante ainda dizer que essa
oficina foi quase que na sua totalidade por nós conduzida, ficando os professores apenas na
função de observadores.
Figura 6 – Interação do público com a oficina no congresso técnico científico do Colégio Salesiano
A terceira atividade foi quando participamos de um encontro entre os clubes de
ciências da nossa escola e o da Escola Municipal Levi Carneiro da prefeitura de Niterói.
Nesse dia, realizamos a oficina para dez alunos da referida escola municipal, todos entre o
sétimo e o nono anos do ensino fundamental. Pudemos interagir de uma forma muito intensa
com os alunos da escola municipal. Assim como no congresso do Colégio Salesiano, os
professores ficaram mais como observadores sendo as atividades praticamente por nós
conduzidas (Figura 7).
Figura 7 – Aluna do CIEP 449 Brasil-França explicando a técnica para os alunos da E. M. Levi Carneiro
Ao final da oficina, todas as peças produzidas, desde os moldes em gesso bem como
as gravuras em cartolina, foram deixadas de presente para os alunos da escola municipal, o
que provocou um sentimento de muita satisfação em todos. Aplicamos um questionário pós-
atividade. Dos dez alunos, três tiveram que se ausentar mais cedo e não puderam respondê-lo.
Dos sete alunos que ficaram, seis classificaram a oficina como “excelente” e um a classificou
como “boa”. Quando indagados sobre uma possível nota para a atividade, quatro alunos
atribuíram nota “dez”, um a nota “nove”, um a nota “oito” e um a nota “sete”. Quando
perguntados se existe relação entre paleontologia e artes plásticas, cinco disseram que “sim”,
um disse que “não” e um outro deixou em branco.
Conclusões
Pudemos vivenciar com esse trabalho, de forma bem clara, a estreita relação que existe
entre a Biologia e as Artes Plásticas. Pudemos também perceber, de forma muito clara, o
nosso crescimento, o que foi muito prazeroso e gratificante. Isso se deve muito em função do
estímulo que nos foi dado durante todo o processo para que pudéssemos agir de forma
autônoma, protagonista e criativa. Foi muito forte o envolvimento de todos nesse projeto e
isso foi percebido a cada atividade realizada. Para termos resultados mais efetivos sabemos
que esse trabalho necessita de ajustes e correções assim como da necessidade de realizarmos
mais atividades com um público cada vez maior e mais diversificado. No entanto, o primeiro
passo foi dado. As imagens têm muito a ensinar. Essa instigação para que desenvolvamos
uma educação estética do olhar nos motiva a se interessar pelo conhecimento e pela pesquisa,
de uma forma mais criativa e envolvente que o ensino tradicional (NETO, 2005).
Agradecimentos
À direção e aos professores do CIEP 449 Brasil-França, aos bolsistas PIBID-Biologia
UFF, à Aliança Francesa de Niterói e às professoras Fernanda Serpa (Colégio Salesiano Santa
Rosa) e Camilla Alô (Escola Municipal Levi Carneiro).
Referências
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais de Ciências Naturais e Biologia. Brasília: MEC/SEF, 1998.
COLECIONADORES DE OSSOS. Disponível em: http://www.colecionadoresdeossos.com/p/entende-se-por-reconstituicao.html. Acesso em 20 de julho de 2017.
DARDON, U. et al. "Modelagem 3D e suas aplicações na pesquisa paleontológica." Gaea-Journal of Geoscience 6.2 (2010): 76-89.
EDUCAÇÃO PÚBLICA. Disponível em: http://www.educacaopublica.rj.gov.br. Acesso em 10 de abril de 2006.
EICHER, D. L. Tempo Geológico. São Paulo. Editora Edgard Blucher, 1969. 173p.
IZAGUIRRY, B. B. D. et al. "A Paleontologia na escola: uma proposta lúdica e pedagógica em escolas do município de São Gabriel, RS." Cadernos da Pedagogia 7.13 (2013): 2-16.
KELLNER, A.W.A. Pterossauros: os senhores do céu do Brasil: relato inédito da aventura de importantes descobertas da paleontologia. Rio de Janeiro: Vieira & Lent, 2006. 175p.
MASSARANI, L., MOREIRA, I. C., ALMEIDA, C. "Para que um diálogo entre ciência e arte?." História, Ciências, Saúde-Manguinhos 13 (2006): 7-10.
NETO, A. G. "A arte fílmica e sua pedagogia." Existência e arte [periódico na internet] (2005).