21
MODERNIZAÇÃO DA GESTÃO A PARTIR DO GERENCIAMENTO POR ORGANIZAÇÃO SOCIAL DE SAÚDE: UMA ANÁLISE CRITICA DO MODELO IMPLANTANDO NO HOSPITAL CENTRAL MUNICIPAL DE OSASCO/SP Jessica Pavan Beatriz Kipnis Bruno Mancini

MODERNIZAÇÃO DA GESTÃO A PARTIR DO …consad.org.br/wp-content/uploads/2016/06/Painel-38-03.pdf · 3 Os resultados atingidos apontam as diferenças entre o modelo de gestão anterior

Embed Size (px)

Citation preview

MODERNIZAÇÃO DA GESTÃO A PARTIR DO GERENCIAMENTO POR

ORGANIZAÇÃO SOCIAL DE SAÚDE: UMA ANÁLISE CRITICA DO MODELO

IMPLANTANDO NO HOSPITAL CENTRAL MUNICIPAL DE OSASCO/SP

Jessica Pavan Beatriz Kipnis

Bruno Mancini

2

Painel 38/003 Novos Modelos e Parcerias

MODERNIZAÇÃO DA GESTÃO A PARTIR DO GERENCIAMENTO POR ORGANIZAÇÃO SOCIAL DE SAÚDE: UMA ANÁLISE CRITICA DO MODELO IMPLANTANDO NO HOSPITAL CENTRAL MUNICIPAL

DE OSASCO/SP

Isidro-Filho

Jessica Pavan Beatriz Kipnis

Bruno Mancini

RESUMO

A administração pública brasileira convive com três modelos diferentes de gestão:

patrimonialista, burocrática e gerencial. O movimento mais atual é a tentativa de trazer

o Estado para a gestão por resultados, em um contexto de Estado-rede, com vários

atores participando na provisão de serviços públicos.

Nesse contexto, a Prefeitura Municipal de Osasco (PMO) aposta, desde 2013, no

planejamento estratégico com a adoção de uma gestão por resultados contratualizada

para gerar serviços mais eficientes, eficazes e efetivos para os cidadãos do município.

O planejamento estratégico do município se desdobrou em projetos estratégicos com

foco no resultado e dentre eles, a modernização da gestão do hospital central é uma

das prioridades da atual gestão (2013-2016). Desde 2015, o Hospital Municipal

Central de Osasco passou da administração direta para o modelo de gestão

compartilhado com Organização Social de Saúde (OSS).

A transição para esse modelo mostra as vantagens e os desafios de se adotar a

publicização de serviços públicos. No município de Osasco a realização do edital de

chamamento público para seleção de OSS, teve como escolhida a Fundação do ABC,

para firmar o contrato de gestão, responsável pela gestão do hospital desde abril de

2015.

3

Os resultados atingidos apontam as diferenças entre o modelo de gestão anterior por

meio da Administração Direta e a gestão pela Organização, principalmente em relação

à economia de recursos, ampliação dos atendimentos, aumento do número de leitos,

adoção do acolhimento com classificação de risco na chegada dos pacientes,

aumento do número de cirurgias.

Na avaliação e monitoramento dos resultados, fica claro a melhoria dos serviços

prestados na gestão compartilhada entre município e organização na eficiência,

efetividade e eficácia. Além disso, após 12 meses de execução do contrato é possível

identificar algumas das potencialidades do Estado para o monitoramento, controle e

avaliação efetiva dos resultados da gestão por Organização Social, a Prefeitura de

Osasco vem adotando algumas estratégias e ações para ampliar a efetividade do

modelo.

4

1. INTRODUÇÃO

A trajetória recente da Administração Pública brasileira está marcada por

mudanças e permanências de três formas de atuação: patrimonialista, burocrática e

gerencial (ABRUCIO, 2007). O patrimonialismo, ainda presente em maior ou menor

grau nas diferentes esferas da administração pública, se configura pela prevalência

do interesse particular sobre o interesse público. O Estado brasileiro começou a

buscar a burocracia como forma de combater os desvios do patrimonialismo, através

do cumprimento de normas e procedimentos preestabelecidos. A adoção do modelo

gerencial pela administração pública, por sua vez, está ligada à tentativa de lidar com

os problemas trazidos pela burocracia, sobretudo no que diz respeito a conseguir

melhorar a eficiência, eficácia e efetividade dos serviços públicos para os cidadãos.

Neste trecho, focaremos na mudança do modelo burocrático para o gerencial, para

entendermos o contexto do surgimento das organizações sociais enquanto modelo de

gestão. Vale ressaltar que essas mudanças na administração pública não foram

completas, havendo convivência entre as três formas de gestão.

A burocracia foi desenvolvida para resolver problemas ligados à irracionalidade

das organizações, visando aumentar a sua eficiência pela adequação dos meios aos

fins. No entanto, o tipo ideal de burocracia weberiana foi criticado em partes por não

levar em consideração alguns aspectos da realidade. Dentre as diferentes

inadequações imprevistas pelo modelo, destacam-se algumas ilustrações bastante

relevantes para as organizações, sobretudo públicas.

Disfuncionalidades do sistema aparecem quando os meios, inicialmente

projetados para melhor se atingir os fins, se tornam mais importantes do que os

objetivos iniciais. Segundo Merton (MERTON apud BRESSER-PEREIRA; MATTOS,

2004), o próprio princípio de impessoalidade pregado pela burocracia como caminho

para a eficiência seria um mal potencial. Isso porque a impessoalidade extrema levaria

a uma deformação ou desprendimento dos objetivos iniciais, tendendo a uma

supervalorização dos pequenos procedimentos. No que diz respeito especificamente

às organizações públicas, essa tendência se agrava porque não existe um mercado

para exigir padrões de competitividade, sendo mais provável a permanência de

5

conformismos e crescente poder das regras menores. Daí a maior necessidade de

controle para evitar que a burocracia se transforme em um “espiral para dentro”, ou

seja, que seja cada vez menos responsiva à população.

Outra visão das distorções do modelo burocrático é quanto ao hiato entre

formulação e implementação de políticas públicas (LIPSKY, 1980; WILDAVSKY,

PRESSMAN, 1984). No caminho da formulação até a implementação podem ocorrer

desde pequenas mudanças até transformações totais dos objetivos inicialmente

pensados pelos centros de concepção de uma política. Esta nunca chega da mesma

forma em todos os diferentes locais onde é implementada, estando sujeita às

particularidades dos implementadores, o que pode ser visto positiva ou

negativamente. Por um lado, as diferenças permitidas pelo hiato podem levar ao maior

descontrole entre meios e fins pré-estabelecidos e abrir uma brecha para o auto

interesse dos implementadores. Ou seja, estes teriam maior autonomia para distorcer

a eficiência da burocracia e fazer com que a mesma atenda a fins distintos dos

planejados, voltando-se para o bem particular deles mesmos. Porém, a

discricionariedade do burocrata de rua (LIPSKY, 1980) poderia ser um caminho para

o contrário, já que o maior conhecimento sobre as especificidades do local de

implementação, ambiente e atores, permitiria uma adequação maior da política

pública contribuindo para potencializar sua eficácia.

No momento atual, o Estado está se transformando de burocrático para uma

nova atuação em rede (DOWBOR, 2007). Esse movimento foi uma resposta perante

a necessidades da sociedade (mais complexas, fluídas, mais globais e mais locais)

que pressionaram mudanças para criar soluções possíveis para abarcar esse novo

contexto. É importante ressaltar que nesse novo contexto o Estado transfere a

prestação de serviços públicos, mas isso nunca o isenta da sua responsabilidade para

com esses serviços. Dessa maneira, o Estado se torna mais horizontal, formando

parcerias mediadas por contratos com a sociedade civil, em que os terceirizados não

são hierarquicamente subordinados à Administração Pública. Além disso, o

funcionamento da rede pressupõe metas de desempenho mensuráveis, definição

clara das responsabilidades de cada parceiro e simetria informacional.

6

A configuração desse Estado-rede se iniciou no Brasil a partir da necessidade

de redefinição do papel do Estado fruto das restrições fiscais e das disfuncionalidades

da burocracia apontadas anteriormente (BRESSER-PEREIRA, 1996). Além desse

cenário, o terceiro setor passava por um crescimento no Brasil nos anos 90. Esse

contexto levou a um movimento de Reforma do Estado, liderado pelo Ministério de

Administração e Reforma do Estado (MARE), que buscava mudar a função do Estado

para o planejamento e controle, diminuindo a execução direta dos serviços públicos.

Esse deslocamento para um novo modelo de funcionamento do Estado

levou à adoção de instrumentos reformadores (FRANZESE; MARINO, 2007). Como

ensinam Franzese e Marino (2007), estes seriam os instrumentos adotados na

reforma ligados à criação de novos tipos de organizações, como as Organizações

Sociais (OSs) e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP).

Essas organizações teriam de maior autonomia, em que se responsabiliza atores fora

da Administração Pública (direta e indireta) pela prestação de serviços públicos.

As Organizações Sociais foram criadas a partir do movimento de publicização

de serviços não-exclusivos do Estado. Pela reforma concebida pelo MARE nos dois

governos do Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), os serviços não exclusivos são

aqueles que podem ser prestados por agentes não-estatais, e que passariam por um

processo de mudança da forma de propriedade desses serviços de estatal para

pública não-estatal – publicização (FRANZESE; MARINO, 2007). Isso significa que

esses serviços (hospitais, museus, universidades etc) seriam exercidos por entidades

não pertencentes à Administração Pública, porém com finalidade pública.

Essas entidades, no momento de sua criação, tiveram a finalidade de

estabelecer parcerias com o Estado. A forma de administração das organizações

sociais foi concebida como gerencial, isto é, com flexibilidade nos procedimentos, mas

com controle dos resultados. O controle dos resultados das Organizações Sociais se

daria tanto pela sociedade (através de conselhos, por exemplo), quanto pela

Administração Direta via contratos de gestão (BRESSER-PEREIRA, 1996).

Contextualizando, o município de Osasco está localizado na sub-região

noroeste da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), composto pelos seguintes

7

municípios: Osasco, Carapicuíba, Jandira, Barueri, Vargem Grande Paulista, Itapevi,

Cotia, Santana de Parnaíba e Pirapora do Bom Jesus, uma região de alta densidade

demográfica e aumento constante da população.

Osasco ocupa área total de 64,95 km², que corresponde a 0,82% RMSP e

0,03% da área total do Estado de São Paulo, com uma população de 666.740, cerca

de 195.080 famílias (IBGE, 2010). Segundo a Fundação SEADE, a população de

Osasco corresponde a 3,33% da população total da RMSP, alcançando densidade

demográfica superior a outros municípios da Região atingindo 10.322 habitantes por

km², uma alta densidade populacional. Os estudos da SEADE mostram que 82% dos

empregos formais de Osasco se dão no comércio e serviços, enquanto que na região

metropolitana de São Paulo este índice é de 79% e no Estado de São Paulo chega a

72%. Desta forma, o setor de comércio e serviços é a principal fonte de emprego do

município. A renda média dos empregos formais no ano de 2012 foi de R$

2.212,73,valor este que chega a ser 15% menor do que a média da RMSP.

A Prefeitura Municipal de Osasco, dentro da realidade do município

apresentado, criou, em 2013, a Secretaria de Planejamento e Gestão (SEPLAG),

responsável pelos esforços de implementar projetos estratégicos que visem a

melhoria de vida da população osasquense. Nesse rol de iniciativas, emerge o Estado-

rede enquanto possibilidade de, através de contratualizações da Administração Direta,

poder aumentar a eficiência, eficácia e efetividade dos serviços públicos para os

cidadãos. Dentre as inovações em gestão, a SEPLAG trouxe para o município o

modelo de contratualização da gestão, com a assinatura de Acordos de Resultados

entre as agências executoras (secretarias municipais) e com Organização Social de

Saúde (OSS), no caso da publicização dos serviços do Hospital Central Municipal

Antônio Giglio (HMC). A contratualização é um dos pressupostos da

institucionalização da gestão por resultados, sendo que sua adoção reforça o

compromisso dos atores na permanente busca de elevação da performance

governamental, na aludida busca pela eficiência, eficácia e efetividade nas políticas

públicas, produzidas diretamente pelo Estado, ou por meio de parcerias com as

organizações sociais.

8

2. OBJETIVO

O objetivo deste artigo é refletir sobre a experiência da SEPLAG da PMO com

a publicização (FRANZESE; MARINO, 2007) do Hospital Central Municipal Antônio

Giglio, evidenciando os pontos de melhoria e os desafios de implementação do

Contrato de Gestão.

Como objetivos secundários, queremos responder:

a) Como aconteceu o processo de publicização do hospital?

b) Quais foram os ganhos do processo?

c) Quais foram/são os desafios da implementação?

Busca-se responder a esses pontos através da metodologia que será detalhada

a seguir.

3. METODOLOGIA

A metodologia adotada para a realização da pesquisa foi a pesquisa

documental, incluindo os relatórios de gestão, atas da Comissão de Avaliação e

Monitoramento, as Leis Municipais referentes ao Contrato e pesquisas primárias

realizadas pela Prefeitura Municipal de Osasco via SEPLAG. Além disso, foram

realizadas entrevistas com gestores públicos que participaram do processo de

contratualização.

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

A partir de 1998, o Governo Federal sancionou a Lei Federal nº 9637 permitindo

que entidades sem fins lucrativos sejam qualificadas como organizações sociais e

possam celebrar contratos de gestão com o poder público para o fomento de

atividades nas áreas de sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao

desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura

e à saúde.

9

No ano de 2009 o Município de Osasco aprovou a Lei Municipal nº 4343,

regulamentado pelo Decreto Municipal nº 10.271, de 10/09/2009 que dispõe sobre a

qualificação de entidades como organizações sociais de saúde permitindo que a partir

deste ano fossem celebrados contratos de gestão entre o poder público municipal e

organização sociais de saúde visando a parceria na oferta dos serviços de saúde.

A contratação por meio de Contrato de Gestão permite ao município a

celebração de contratos com entidades especialistas na prestação de serviços de

saúde em áreas em que o município tenha dificuldade de atendimento. Durante três

ciclos de mandato eletivo do mesmo grupo político à frente da cidade (Emídio de

Souza – PT: 2005-2008 e 2009-2012; e Jorge Lapas – PT/PDT: 2013-2016), a melhora

dos serviços de saúde foi identificada como um dos principais desafios de gestão, com

especial enfoque do poder público para a construção e melhoria de unidades básicas

de saúde; construção de unidades de pronto-atendimento; adoção da estratégia de

saúde da família, entre outras ações que reforçam o alinhamento com as demandas

da população, corroboradas pelas pesquisas primárias apresentadas abaixo.

A última dessas iniciativas, foi a contratualização de resultados com uma

Organização Social de Saúde para o Hospital Central, principal equipamento público

de saúde do município, sendo um Hospital Geral com atendimento da população de

todo o município, sem maternidade, atualmente atendendo à demanda espontânea

nos prontos-socorros adultos e pediátrico, além da demanda referenciada de baixa e

média complexidade do município. Possui 159 leitos de internação em clínica médica,

clínica cirúrgica, ortopedia e pediatria, Unidades de Terapia Intensiva adulto e infantil

e 01 (um) Centro Cirúrgico com 05 (cinco) Salas de Cirurgia.

Para apoiar a elaboração, implementação e avaliação das políticas públicas, a

SEPLAG realizou pesquisas primárias a fim de entender quais eram as maiores

demandas da população. Essas pesquisas foram executadas em 17 ondas a partir de

julho de 2015, com um total de 41.113 entrevistados. As entrevistas realizadas foram

individuais e presenciais com cidadãos residentes no município e aplicadas em pontos

de fluxo de Osasco em dias úteis da semana em horário comercial. Pela característica

da pesquisa, realizada em pontos de fluxo, não havia como garantir a aleatoriedade

da amostra. Dessa maneira, a SEPLAG optou por estabelecer pesos para cada

10

entrevistado, de acordo com o seu perfil. O peso de cada entrevistado foi determinado

como uma divisão entre o perfil da amostra da pesquisa e o perfil da cidade conforme

dados do IBGE e do SEAD e então aplicado em todas as perguntas de opinião, sendo

as variáveis sexo, idade, cor/raça, renda familiar, distrito e situação ocupacional

levadas em consideração.

Na primeira onda dessas pesquisas, realizada no período de 22 de julho a 04

de agosto de 2015, 47% dos 1.522 entrevistados apontaram saúde como o principal

problema da cidade, em respostas espontâneas. O gráfico abaixo mostra a evolução

dessa percepção:

Gráfico 1. Principal Problema da Cidade

Fonte: Elaboração Própria.

Percebe-se que há uma tendência ao longo do tempo de redução da

porcentagem da população que afirma que a saúde é o pior problema da população.

Esses dados não são conclusivos, uma vez que saúde é um tema abrangente e pode

ser influenciado pelas várias frentes de atuação da gestão nas diversas áreas, hábitos

de vida da população, entre outros. Porém, é um dado que nos ajuda a complementar

a posterior avaliação da gestão do HMC, também realizada pela SEPLAG, que

11

coincide com o período de “melhora” da percepção da saúde pela população, com o

primeiro ano de gestão contratualizada do HMC.

Somam-se às informações das pesquisas realizadas, os dados obtidos por

meio da Central 156 do município e as demandas provenientes do Orçamento

Participativo (OP) de Osasco. Quanto às reclamações na Central 156, três serviços

de saúde aparecem repetidamente no rol dos 10 serviços mais solicitados, no período

de 15 de Junho de 2015 a 21 de dezembro de 2015, sendo eles sobre falta de

medicamentos, consulta e exame especializado e Unidades Básicas de Saúde.

Quanto às consultas e exames especializados, a maior parte das reclamações foram

a demora para chamamento para realizar procedimento e a demora na entrega dos

resultados. Já o orçamento participativo de 2015 apresentou 57,89% das demandas

mais votadas relacionadas a saúde. Os temas que surgiram dentro dessa

porcentagem foram:

Gráfico 2. Demandas mais votadas no OP em Saúde

Fonte: Elaboração Própria.

Pode-se perceber que a questão das consultas especializadas surge

novamente nesse instrumento, além de qualificação dos profissionais e gestores para

agilizar os atendimentos e reforma, ampliação e construção de unidades de saúde,

12

que são temas apenas indiretamente ligadas ao Hospital Municipal Central de Osasco,

já que os atendimentos ambulatoriais do município são realizados majoritariamente

nas policlínicas situadas na zona norte e sul do município, e complementadas –

sobretudo após o início da contratualização – pelo HMC.

Somou-se a esses canais o fato de que o município contava com dois hospitais

apenas, uma maternidade e um único hospital geral, o HMCO. Agravando a situação,

o Hospital Central não avançava em cirurgias eletivas e exame, como percebemos

com os dados represados do 156 e do Orçamento Participativo, que demonstram um

hiato entre a quantidade e qualidade esperada de consultas e exames especializados

e os serviços oferecidos pela municipalidade. O HMC operava, antes da

contratualização, com uma estrutura menos eficiente, mais cara, e com precariedade

dos contratos de trabalho (a maioria celetistas por tempo determinado), contratos

emergenciais ou indenizatórios que atrapalhavam ou interrompiam a prestação dos

serviços contratados.

Além disso, não havia informatização dos prontuários e informações do

hospital, assim como sua estrutura estava em condições longes do ideal para a

prestação de serviços de qualidade para os cidadãos, como mostravam precária

condição de higiene do hospital, lixos sem distinção entre resíduo hospitalar e resíduo

comum, equipamentos de detecção de incêndios que não funcionavam, licenças de

desratização de dedetização vencidas, problemas de encanamento nos banheiros,

extintores há muito fora da validade, apenas um elevador em funcionamento, entre

outros pontos precários de funcionamento. Todas essas questões, somadas a uma

gestão com rotinas e fluxos de trabalho complexos e não efetivos, evidenciaram a

dificuldade da administração direta em prestar uma gestão de qualidade, quanto ao

atendimento e a oferta de serviços relativos ao Hospital Municipal Central de Osasco.

Dentre as alternativas, a PMO buscou a que fosse mais vantajosa para a população

do ponto de vista qualitativo e econômico, optando assim pela gestão compartilhada

com Organização Social de Saúde - OSS por meio de Contrato de Gestão.

Com o início do processo de implantação do modelo de gestão por OSS, houve

muitos conflitos do campo ideológico pois muitos dos atores envolvidos entendem o

Contrato de Gestão como a terceirização dos serviços de saúde e não do ponto de

13

vista de gestão compartilhada entre a Organização e o Poder Executivo municipal, em

que a gestão é do município, porém via contrato de gestão. Uma das grandes

dificuldades de todo o processo foi o entendimento de que não se tratava da

terceirização dos serviços de saúde, mas da adoção de um modelo de gestão

compartilhada com uma OSS.

Em 2014, com a escolha do modelo de gestão por Organização Social de

Saúde para atuar no gerenciamento do HMCO foi elaborado e publicado o Edital de

Chamamento Público nº 02/2014, realizado o processo seletivo de Organização Social

de Saúde para a gerenciamento e execução de ações e serviços de saúde do Hospital

Municipal Central de Osasco - Antônio Giglio firmado contrato de gestão,

estabelecidos por metas de atendimento, aumento do número de leitos e

modernização da gestão. O HMCO é classificado de baixa e média complexidade, de

atendimento geral, com atendimentos de pronto socorro adulto e infantil, leitos de

internação clínica médica, clinica cirúrgica, ortopédica e pediátrica, que atende

demanda espontânea e referenciada.

Com a dificuldade de encontrar parâmetros desejáveis de atendimentos e

serviços que devem ser realizados em Hospitais deste porte, o caminho para chegar

as metas e valores estabelecidos no certame foi o de pesquisa em Hospitais do

mesmo porte em cidades com características populacionais parecidas, além de haver

a necessidade de voltar a vocação do Hospital para baixa e média complexidade e

deixar de executar serviços de alta complexidade, como cirurgias de órtese e prótese.

Mesmo com as dificuldades de encontrar parâmetros percebeu-se, com as pesquisas

realizadas, que o contrato de gestão traria economicidade para a municipalidade e

melhora na qualidade do serviço prestado pela flexibilização dos contratos

A partir da seleção da OSS vencedora do certame se iniciou então o processo

de transição da gestão em um curto período, cerca de 10 dias entre plano de

realocação dos servidores efetivos a rede municipal de saúde e processo seletivo dos

profissionais por parte da Organização, em virtude do interesse da municipalidade em

interromper tão logo os contratos de trabalho temporários, contratos com prestadores

de serviço precários, que pressionavam as contas públicas e dificultavam a melhor

gestão dos recursos públicos.

14

Com o contrato de gestão, tornou-se possível o estabelecimento e

monitoramento de metas do HMC, vinculadas ao pagamento das partes fixa (90%) e

variável (10%) do contrato. A parte fixa está relacionada ao atingimento das metas

quantitativas, que incluem o número de atendimentos de urgência e emergência, o

número de saídas na internação, a quantidade de exames realizados, a quantidade e

distribuição das consultas por especialidades e o número de atendimentos

ambulatoriais. Ficou estabelecido contratualmente que metas acima do volume

contratado ou entre 90% e 100% do volume contratado recebem 100% do pagamento

desse serviço, entre 70% e 89,99% recebem 90% do valor contratado e menos que

70% do volume contratado, recebem 70% do pagamento.

Já a parte variável corresponde a fatores qualitativos, como a implantação e

atuação de comissões obrigatórias, a entrega e análise de relatórios de informação

hospitalar e relatórios e documentos mensais de satisfação do usuário. Essas metas

foram dimensionadas com diferentes pesos distribuídos nos quatro trimestres de cada

ano de atuação da OSS. Para a renovação contratual, será possível redimensionar as

metas de ambas as partes, de acordo com novas demandas da Prefeitura Municipal

de Osasco.

Atualmente, o HMC, com o gerenciamento por OSS, possui 214 leitos

operacionais, sendo 29 de emergência, trauma e retaguarda, 7 de Hospital DIA e 1 de

observação, além de 159 leitos de internação, divididos em clínica médica, 42, clínica

pediátrica, 18, ortopedia, 30, clínica cirúrgica, 35, clínica psiquiátrica, 6, UTI Pediátrica,

8, e UTI Adulto, 20. Além disso, o hospital conta com um Centro Cirúrgico com cinco

salas de cirurgia.

Em relação aos serviços prestados, segundo os relatórios de monitoramento

do contrato de gestão, realizou de maio de 2015 a janeiro de 2016, em média, 21.271

atendimentos de urgência e emergência mensalmente, entre Prontos-socorros Adulto

e Infantil, Cirurgia Geral, Ortopedia e Traumatologia. Os serviços de apoio diagnóstico

(SADT) também aumentaram em quantidade e variedade, sendo realizados em média

54.291 exames mensais, distribuídos em ultrassonografia com e sem doppler,

radiografia com e sem contraste, laboratoriais, tomografia com e sem contraste,

ecocardiograma, endoscopia digestiva alta e colonoscopia. A internação teve uma

15

média de 678 saídas por mês. Os atendimentos ambulatoriais giram em torno de 788

por mês e são realizadas uma média de 350 cirurgias mensalmente.

Comparando esses dados com a produção anterior ao contrato de gestão,

temos que o Hospital Municipal Central realizou, de janeiro de 2012 a abril de 2015,

uma média de 21.574 atendimentos mensais de urgência e emergência. A média de

exames realizados no hospital era de 13.188. As saídas de internação foram em média

705 por mês. As consultas ambulatoriais eram contabilizadas pelo hospital juntamente

com os atendimentos de urgência e emergência e o número realizado era irrelevante

frente ao total, além de serem realizadas apenas interconsultas pré e pós-operatórias.

Por fim, o número médio de cirurgias realizadas pelo hospital no período de janeiro de

2012 a abril de 2015 foi de 266,75 cirurgias mensais.

Como mostram os números, o maior ganho quantitativo da publicização da

gestão foi o aumento de cirurgias em 31% e exames em 312%. Também houve

avanço na diversificação desses exames e cirurgias, pela possibilidade da fundação

de contratar esses serviços com maior flexibilidade que a Administração Direta. Além

disso, a nova gestão permitiu a instituição do Hospital dia para pequenas cirurgias e

alguns leitos de Saúde Mental que o hospital não possuía. As consultas ambulatoriais

atualmente oferecidas pelo HMC foram expandidas não só em número, como são

disponibilizadas hoje consultas externas em especialidades que não eram prestadas.

A redefinição de fluxos e rotinas de trabalho, juntamente com os processos de

capacitação dos funcionários, da antiga gestão e novos contratados pela fundação,

contribuíram para um melhor atendimento na ponta. Qualitativamente, o resultado da

nova gestão foi avaliado por uma pesquisa da SEPLAG realizada no período de 3 de

setembro a 3 de outubro de 2015, com amostra de 661 pessoas que haviam sido

atendidas antes no hospital e se lembravam da data, que era há mais de 6 meses da

realização da pesquisa, demonstrando que o último atendimento do cidadão fora

antes da troca de gestão. Os resultados foram positivos: 48% dos entrevistados

afirmaram que o atendimento médico foi melhor, 42% consideraram o atendimento de

recepção melhor, 41% acharam melhor o atendimento de enfermagem, 39%

afirmaram melhor limpeza das instalações, 37% consideraram que melhor a

16

conservação e manutenção do prédio e 38% vivenciaram uma melhoria no tempo de

espera para realização de consulta ou exame.

A experiência da PMO com a contratualização trouxe avanços significativos

para a operação do HMC e consequentemente para a população osasquense. Apesar

dos resultados que a municipalidade vem usufruindo o processo foi e ainda é repleto

de desafios. Dentre eles, se destaca no início do processo de publicização uma forte

resistência da própria Secretaria de Saúde. Essa resistência ocorre, em parte, em

relação a admitir a incapacidade da Administração Direta de provisionar serviços de

qualidade e economicidade no HMC. Porém, essa resistência foi também de cunho

ideológico, por uma concepção da publicização como reforma neoliberal do Estado e

privatização da saúde, resistência essa comum em processos de troca de gestão

(SEGES, 2009).

Além da resistência ideológica da Secretaria de Saúde, que acabou

levando à implementação da troca de gestão pela SEPLAG a pedido do prefeito,

houve também um desafio em termos de cultura organizacional. Isto é, a PMO não

possuía experiência em publicização, o que levou e ainda leva ao grande desafio da

gestão compartilhada. Isso se concretizou na dificuldade de estabelecer meios de

gestão compartilhada e não somente de pontos de controle, com a definição conjunta

das necessidades de melhoria de gestão do hospital, tanto em termos dos serviços

oferecidos, quanto de sua qualidade e dinâmica de prestação. A PMO estava

habituada à prestação direta de serviços, dentro da sua estrutura organizacional e

hierárquica. A troca de gestão levou a uma nova lógica, de rede, novidade para a

municipalidade, que envolvia uma relação não hierárquica da fundação em relação às

secretarias da administração direta. Esse novo ethos de relacionamento ainda está

sendo um aprendizado para a PMO.

Contratualmente, ficou estabelecida uma Comissão de Avaliação e

Monitoramento do HMC, na qual há participação da SEPLAG e da Secretaria de

Saúde. Porém, e isso nos leva ao outro desafio, a operacionalização desse

acompanhamento ainda precisa ser melhorada. A comissão acabou se sobrepondo

institucionalmente como arena de acompanhamento, porém não possui condições

técnica para a resolução dos problemas que surgem. Assim, a comissão acaba sendo

17

um espaço de verificação daquela produção quantitativa do HMC ligada à

remuneração diretamente. No entanto, a comissão ainda não é um espaço que

consegue monitorar/avaliar qualitativamente o hospital, pela falta de conhecimento

técnico da saúde. Um exemplo disso são as informações de infecção hospitalar e

morbidade hospitalar, apresentadas mensalmente pelo hospital à comissão. Apesar

de disponíveis as informações, existe uma dificuldade de se parametrizar esses

indicadores, tanto pela falta de informações publicizadas de outros hospitais, quanto

pela ausência de parâmetros nacionais ou internacionais em relação a indicadores de

qualidade em saúde. Isso obstaculiza o estabelecimento de metas qualitativas que

poderiam impactar na remuneração do hospital. A SEPLAG está constituindo, para

contornar esse desafio, uma base de dados do próprio hospital, a fim de analisar uma

tendência na evolução dos indicadores qualitativos e possibilitar a instituição de metas

qualitativas a serem perseguidas pelo HMC.

Outro desafio nesse quesito operacional, consiste na ausência de uma

legislação municipal sobre a regulação dos contratos de gestão, sendo a relação com

a fundação então regulada pela legislação vigente, de convênios. Essa ausência

acaba engessando bastante a relação com a OSS, uma vez que ela precisa dedicar

tempo e esforços para disponibilizar vários documentos necessários na lei de

convênios, mas que para um contrato de gestão, na intenção de desburocratizar e

flexibilizar a gestão, seriam desnecessários. Atualmente, a Secretaria de Finanças da

prefeitura está se dedicando à elaboração de um novo decreto para regular os

contratos de gestão, diferenciando-os dos convênios.

5. CONSIDERAÇÕESFINAIS

Tendo em vista os resultados após um ano de troca de gestão e também os

desafios encontrados no caminho, hoje a SEPLAG acredita que a aposta no modelo

gerencial foi acertada. Contudo, entende-se que o modelo possui potencialidades que

ainda podem e devem ser exploradas. Atualmente, a SEPLAG está trabalhando em

conjunto com a Secretaria de Saúde e a Secretaria de Finanças para afinar o modelo

adotado, sendo a renovação do contrato com a fundação uma janela de oportunidades

18

para essas melhorias. Nesse processo de revisão, as secretarias vêm realizando

conjuntamente um diagnóstico das maiores filas de espera para exames e cirurgias

no município, a fim de incluir os mesmos no próximo contrato, dentro do equilíbrio

econômico da PMO. Além disso, a PMO está instituindo uma câmara técnica entre

Secretaria de Saúde e Gerência do HMC, com o objetivo de suprir o hiato encontrado

na Comissão de Avaliação e Monitoramento e permitir a resolução conjunta de

problemas importantes não só do HMC, mas da saúde da municipalidade como um

todo (olhar que será trazido pela equipe da Secretaria de Saúde), como também a

troca de experiências das equipes técnicas e maior aproximação e inserção do HMC

da rede de saúde pública de Osasco.

Acreditando nesse modelo, a PMO pretende ampliá-lo para a instalação de uma

Unidade de Pronto Atendimento gerida por contrato de gestão. Assim, prevê-se que

haverá uma melhoria no fluxo de pacientes do hospital, desafogando-o dos casos sem

iminência de morte, para melhor atender esses casos mais graves, e também diminuir

o contato de pacientes mais graves com pacientes com casos de pronto atendimento.

Também se pretende que com o deslocamento da maioria dos casos de pronto

atendimento do Hospital Central para a Unidade de Pronto Atendimento Centro, o

hospital tenha condições de ampliar as instalações do Hospital Dia, instituindo um

centro cirúrgico específico para o mesmo.

Apesar do avanço nesse quesito, a PMO entende que paralelamente aos

investimentos no hospital e em todo o complexo de urgência e emergência (UPA e

Hospital Dia, nesse caso), é necessário melhorar a atenção básica do município, além

de melhorar a regulação e atendimento das unidades de pronto atendimento e

emergência. Isso está claro para os gestores tanto pela demanda da população,

quanto para desafogar o hospital de casos que poderiam ser resolvidos na atenção

básica, com maior eficiência, eficácia e efetividade. Nesse sentido, vários projetos

estratégicos do Acordo de Resultados de Saúde caminham para a melhoria e

ampliação das Unidades Básicas de Saúde.

A experiência da SEPLAG com a publicização da gestão do Hospital Central

Municipal de Osasco está sendo importante para a melhoria da provisão de saúde no

município, mas também para o aprendizado e inovações na gestão pública municipal

19

com a ampliação de soluções possíveis para problemas públicos e a atuação junto a

uma rede de atores. A partir dos trâmites que a SEPLAG incorreu e tendo em vista as

possíveis aplicações práticas para outros entes federativos que queiram adotar

modelo de gestão parecido, recomenda-se que a transição entre gestão da

administração direta e de organização social seja mais longa. Além disso, um dos

maiores avanços do modelo de gestão adotado pela PMO foi atrelar metas à

remuneração diretamente, com previsão contratual. Isso permitiu a economicidade e

eficiência do contrato adotado, pois além de serem efetivados descontos por não

atingimento das metas, se constitui um fator importante para que a organização social

busque entregar melhorar resultados.

20

REFERÊNCIAS

ABRUCIO, Fernando. Trajetória Recente da Gestão Pública Brasileira: um Balanço

Crítico e a Renovação da Agenda de Reformas. Revista da Administração Pública.

Pgs. 67-86, Rio de Janeiro, 2007

BRESSER-PEREIRA, Luiz. Da Administração Pública Democrática à Gerencial.

Revista do Serviço Público. Brasília, 1996.

BRESSER-PEREIRA, Luiz; MOTTA, Fernando. Introdução à Organização

Burocrática. Thompson, São Paulo, 2004.

DOWBOR, Ladislau. O Mosaico Partido (e a economia além das equações). São

Paulo, 2007.

FRANZESE, Cibele; MARINO, Rodolfo. Contratualização de Resultados: uma

tipologia [ou classificação] com base em casos brasileiros. FundaçãoGetulio Vargas.

EAESP. São Paulo, 2006.

LIPSKY. Street Level Bureaucracy: Dillemas of the Individual in Public

Services.Russel Sage Foundation. New York, 1980.

SEGES. Agenda Nacional de Gestão Pública. Brasília, 2009. Disponível em:

<http://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/Arquivos/seges/091207_seges_

agenda_gestao-1.pdf> , acessado em 30.03.2016.

WILDAVSKY, Aaron; PRESSMAN, Jeffery. Implementation: How Great

Expectations in Washington Are Dashed in Oakland. University of California Press.

3ª Edição. Los Angeles, 1984.

21

_____________________________________________________________

AUTORIA

Jessica Pavan

Beatriz Kipnis

Bruno Mancini – [email protected]

Secretaria de Planejamento e Gestão - Prefeitura Municipal de Osasco

Telefones: (11) 2182-1244/ (11) 2182-1245

Endereço-eletrônico: [email protected]

[email protected]