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CAPITULO II
O CAIÇARA : MODO DE VIDA, SUSTENTO E NOMADISMO.
Cultura caiçara é uma herança decorrente da miscigenação entre o português e o
indígena do litoral brasileiro, com influencia mais tardia do negro. O caiçara tirava seu
sustento da pesca e do roçado e morava em casas de pau-a-pique (ou estuque), feita de
uma grade de paus e bambus amarrados com cipó preenchida com barro. Cercavam as
plantações com bambus ou galhos fincados à terra (esse tipo de cerca é o significado
original da palavra caiçara).
O modo de vida é organizado de forma que o uso dos recursos fica distribído
entre a pesca e a roça, complementado por atividade de coleta. As duas estações do ano
bem marcadas – verão e inverno – garantem a alternância da pesca: no inverno, o ponto
mais alto da atividade com o “arrasto da tainha” e o verão, com outras espécies. A pesca
de arrasto envolve grande parte da comunidade, é uma atividade coletiva, onde o
produto é distribuído pelos participantes. Já a pesca com caniço e rede de espera é
individual. No Aventureiro, por exemplo, muitos homens pescam” embarcados”, alto
mar, e passam muitos dias longe de casa. (VILAÇA & MAIA; 2006).
Em sua obra Ensaios de Antropologia Indígena e Caiçara, Giconda Mussolini
(1980), descreve a cultura caiçara em um ensaio de grande importância dentro das
ciências sociais, chamando atenção para a dieta da mandioca, peixe seco, e de toda
diversidade que compunha a subsistência caiçara.
O sistema de plantio era a roça de toco oou coivara, ou seja, derrubada e queima
da mata, seguindo-se um período de abandono ou pousio da terra para restauração da
fertilidade do solo. A agricultura deixou suas marcas na floresta da ilha como, por
exemplo, grande mosaico de florestas secundárias com diferentes idades de acordo com
o pousio da terra. Hoje poucas pessoas praticam a agricutura de subsistencia na Ilha
Grande, mais muitas ainda moram em casas de pau-a-pique, praticam a pesca artesanal
e reclamam que não há mais tanto peixe, como antes.
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Desde o litoral do Paraná, passando por São Paulo até o litoral
Sul Fluminense, entre as serras úmidas e o mar, ocorre a 500
anos a presença de uma população cuja a cultura está entranhada
nessa natureza. Os Caiçaras são representantes da história do
Brasil assim como outras comunidades tradicionais minoritárias
em nossa sociedade. (WIEFESLS; 2009: 02)
Caiçara é uma palavra de origem tupi que refere-se aos habitantes das zonas
litorâneas formadas principalmente no litoral do Estado de São Paulo. Também existe a
“cultura caiçara” no litoral paranaense e no litoral sul do Estado do Rio de Janeiro.
Inicialmente designava apenas a indivíduos que viviam da pesca de subsistência. As
comunidades caiçaras nasceram a partir do século XVI da miscigenação de brancos de
origem portuguesa com grupos indígenas das regiões litorâneas do Estado de São Paulo
(tupinambás).
A palavra caa-içara é de origem tupi-guarani. Separadas, as duas palavras
sugerem uma definição: caa significa galhos, paus, “mato”, enquanto que içara significa
armadilha. A idéia provinda desta junção seria, a primeira vista, uma armadilha de
galhos.
E pelo que se entende por caiçara é de que ele pesca, caça e planta:
Ao longo dos séculos a população sempre esteve presente
vivendo da roça de subsistência, do extrativismo vegetal, da
caça e da pesca artesanal; os caiçaras com o seu característico
modo de vida...Um povo que conhece muito bem o seu território
ancestral e a dinâmica da natureza e que nos ensina a viver em
simbiose nela dando uma lição de ecologia para toda a
população urbana. (WIEFESLS; 2009: 03)
As populações caiçaras que habitam o litoral dos estados do
Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro, têm origem na miscigenação
entre o colonizador português, o índio e o negro, ocorrida a
partir das primeiras décadas da colonização. Historicamente, sua
subsistência baseou-se na agricultura itinerante (mandioca,
milho, feijão, batata doce, arroz e cana-de-açúcar), associada à
pesca, caça, extração vegetal, e serviços para terceiros
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(principalmente turistas), numa proporção variável, dependendo
da época e da região consideradas. (SILVA; 2005)
A família é ponto central em torno do qual se organiza a unidade de produção
caiçara. As relações de trabalho articuladas no seio do grupo doméstico que envolvem a
roça, casa e pesca. - bem como as relações externas de cada unidade que passam por
determinações das relações familiares, principalmente da força de trabalho disponível
na família
Sabemos, como diz o professor Rogério Ribeiro de Oliveira, que sua
sustentabilidade baseia-se na pesca e roça de subsistência e que sua cultura é oriunda da
miscigenação, e também, cultural dos colonizadores portugueses com o indígena que
sofre influencia posterior do negro.
O caiçara é a alma da ilha. Seu conhecimento, traço de sua ancestralidade, tratou
de preservar a biodiversidade que ora podemos observar. Sua riqueza e força preservada
à partir das lendas, da fala, da forma de cultivo da terra e do respeito a unidade homem-
natureza nos garantem o ainda e esperamos sempre, por isso, Ilha Grande.
Os recursos existentes em uma comunidade caiçara são de uso comunitário.
Observamos na organização do espaço caiçara a raridade de cercas. Servindo, quando
existem para impedir a entrada de animais a horta perto da casa, como afirma
(WIEFESLS; 2009):
A territorialidade caiçara se constrói diariamente sob praticas
que legitimam o seu poder de ação sobre o seu espaço vivido. O
caiçara têm o domínio sobre seu espaço e sobre suas técnicas de
trabalho.... A territorialidade se dá devido a acumulação de
saberes tradicionais, transmitidos de pais para filho há muitas
gerações. As nove escolas municipais da Ilha Grande são fontes
de informação e representam para as localidades onde estão
situadas, a única representação do poder publico operante no
local e proximidades. (WIEFESLS; 2009:6).
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Parnaioca.
A vila vizinha da Parnaioca, por exemplo, tornou-se praticamente desabitada em
decorrência das fugas constantes de presos (o presídio localizava-se na Praia de Dois
Rios, contigua a Parnaioca) como área da foto 15 onde havia antiga escola.
“De acordo com os relatos orais, viviam mais de duas mil pessoas
nesta praia, que esconde na mata de restinga inúmeras ruínas de
casas, que comprovam a densidade demográfica, que ali existiu. É
na Parnaióca que fica o cemitério católico do Aventureiro. Hoje
em dia a praia da Parnaióca é muito procurada por turistas, já que
além da praia, há um grande rio de água doce, com cachoeiras e
por ser praticamente desabitada é mais vazia do que outras praias
da Ilha Grande durante a alta temporada. A Parnaióca também
está fora dos limites da Reserva Biológica. (COSTA; 2008: 29).
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Saco do Céu
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Aroeiras
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“Com quantos paus se faz uma canoa!”
O caiçara, como já exposto, era exímio canoeiro e foi com o passar dos anos que
aprimoraram sua tecnica, que sem sombra de dúvida representa o artezanato local, para
se fazer uma canoa de 60cm de boca por 4m de comprimento, você derruba uma grande
árvore de bapuruvu- guapuruvu- de preferencia a retira do seu quintal por ser uma
árvore leve e fácil de trabalhar.
“Derrube-a com um machado, cave com o encho de duas
mãos, em seguida cave com o encho de uma mão, depois cave
com o encho de goiva, para o acabamento é necessário cavar com
o encho de goiva e plaina, cavando durante 1 mês. Para conservar
essa canoa por mais ou menos 50 anos, você deve pintar com
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casca de aroeira ou casca de cobi-coubi-. Tire a casca da aroeira
ou do cobi, cozinhe num taxo de cobre de 50 litros por um tempo
de 2 horas. Ainda quente derrube dentro da canoa, balançando a
canoa até molha-la toda, deixando de molho por dois dias. Assim
ela mudava de cor ficando curtida. Repita essa operação por todos
os anos. Você morre e a canoa fica para contar a história.”
(Senhor Clarindo Cardoso;2010)
Era costume cada filho homem nascido na família ser plantada pelo pai uma
muda de guapuruvu no quintal para que, o filho na idade adulta, pudesse cortar a arvore
e fazer sua própria canoa.
Foto 30a – Canoa caiçara.
Ressurreição; 2010
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A canoa do seu Ari sai todos os dias pela manhã e no final da tarde, vai fazer o
que sempre fez uma canoa vai ser a ferramenta para a subsistência de sua família e
assim continua, com 67 (sessenta e Sete) anos, 60 (sessenta) na pesca. “comecei a
pescar na idade de 7 (sete) anos de idade, meu pai que fez a minha canoinha, cabia eu
a rede” “meus irmãos não quiseram isso não, foram trabalhar no presídio e depois
foram embora”.
Foto 30b – Canoa como decoração de jardim.
Ressurreição; 2010.
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Foto 30c - Canoa como decoração.
Ressurreição; 2010)
Essa canoa não sai todos os dias para pescar e nem tem o caiçara como dono,
está em frente a uma pousada e não serve para o que sempre serviu, agora é apenas um
vaso de planta para ornamentar e embelezar a paisagem.
Essa Canoa era uma ferramenta de trabalho, depois foi um vaso de planta e
agora é só um resquício, quando seu Clarindo diz: “não dava mais, estava proibido,
estava cansado, tive que parar”, no inicio do século XXI, quando aparecem os
impedimentos. É proibido trabalhar (Gadelha, 2008). Hoje não se planta mais o bapuruvu para se fazer a canoa quando nasce um
filho, primeiro que se plantar não vai poder cortar, segundo a terra caiçara não é mais
tão ampla e está limitada ou pelo turismo que colocou um preço na mesma ou pelo
parque que a restringiu.
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Tabela 01 - Número de citações em cada comunidade da Ilha Grande (N = 131 pescadores) sobre os motivos da diminuição da quantidade de pescado.
Causas da diminuição do pescado
Barcos grandes 1 1 1 4 3 2 6 5 2 2 2 29 Tecnologia (sonar) 1 6 2 2 1 1 3 3 3 1 1 1 25 Arrasto ou traineira 2 5 2 1 1 1 3 4 2 21 Muita matança 2 1 2 3 2 2 12 Pesca predatória 1 2 2 1 3 9 Pesca submarina 1 2 1 4 1 9 Cerco 1 1 1 2 2 7 Mergulho 1 2 2 2 7 Não sabe 2 2 1 1 1 7 Redes 1 2 3
Fonte: Síntese baseada no Relatório do Diagnóstico Socioambiental das
Comunidades de Pescadores Artesanais da Baía da Ilha Grande (RJ). Instituto
BioAtlântica (IBio). Begossi, A.; Lopes, P. F., Oliveira, L. E. C. e Nakano, H. – Rio
de Janeiro : Instituto BioAtlântica, 2009.