Morcegos Do Brasil

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Morcegos do Brasil

Nelio R. dos Reis Adriano L. Peracchi Wagner A. Pedro Isaac P. de Lima (Editores)

EDITORESNelio Roberto dos Reis Doutor em Cincias pelo INPA - 1981. Titular da rea de ecologia da Universidade Estadual de Londrina. rea - Ecologia de Mamferos. Adriano Lcio Peracchi Doutor em Cincias pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro 1976. Livre Docente da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro 1976. rea - Zoologia de Mamferos. Wagner Andr Pedro Doutor em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal de So Carlos 1998. Livre Docente em Cincias do Ambiente da Unesp Araatuba. rea - Diversidade e Histria Natural de Vertebrados. Isaac Passos de Lima Mestre em Cincias Biolgicas pela Universidade Estadual de Londrina 2003. Doutorando em Zoologia Animal pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. rea - Zoologia e Ecologia de Mamferos.

Nelio R. dos Reis Adriano L. Peracchi Wagner A. Pedro Isaac P. de Lima (Editores)

Morcegos do Brasil

Londrina 2007

Capa e Ilustraes: Oscar Akio Shibatta Design grfico e Diagramao: Isaac Passos de Lima

Catalogao na publicao elaborada pela Diviso de Processos Tcnicos da Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina. Dados internacionais de Catalogao-na-Publicao (CIP)M833 Morcegos do Brasil / Nelio Roberto dos Reis ...[et al.]. - Londrina: Nelio R. dos Reis, 2007. 253p. :il. Vrios Colaboradores. Inclui bibliografia e ndice. ISBN 978-85-906395-1-0

1. Morcego - Classificao. 2. Mamfero - Classificao. 3. Taxonomia animal - Brasil. 4. Zoologia - Brasil. I. Reis, Nelio Roberto. CDU 599.4 Depsito legal na Biblioteca Nacional Impresso no Brasil/ printed in Brazil

ApresentaoEm decorrncia de sua viso adaptada apenas luz do dia, os humanos primitivos desenvolveram um temor e um respeito atvicos pelas trevas noturnas, extensivos aos seres que so ativos nelas. Assim, se desenvolveram mitos e fantasias sobre a coruja, o sapo, as grandes mariposas (tambm conhecidas como bruxas) e o morcego, entre outros tipos de animais. Tais fantasias atravessaram os tempos e, na Europa, por exemplo, deram origem a lendas sobre seres meio humanos meio demnios como as bruxas, o lobisomem e o vampiro. Tratados no singular, como se fossem espcies nicas, esses animais passaram a ser temidos porque, alm de serem feios, seriam nocivos: a coruja por seu mau agouro, o sapo por ter verrugas e espirrar leite venenoso nos olhos das pessoas, as mariposas por seu p capaz de cegar e os morcegos por serem todos capazes de sugar o sangue dos humanos. J no sculo XVII, o naturalista Guilherme Piso, tratando da flora e fauna brasileiras, relatava que a mordida do andir (morcego) era da mesma natureza que a peonha do co raivoso. Felizmente, por seus hbitos crpticos e por serem ativos em perodo do dia diferente daquele da maioria dos humanos, esses animais, que no so formas nicas (s de morcegos voam no Brasil ao menos 167 espcies distintas), esto relativamente protegidos de sua extino. Os quirpteros, se por um lado algumas entre suas espcies frutvoras so capazes de provocar danos em pomares e as hematfagas de disseminar o vrus da raiva, por outro, e a balana pende significativamente a seu favor, so importantssimos no controle dos insetos, que as formas insetvoras consomem s toneladas em cada noite, na polinizao de inmeras espcies de plantas florestais, que desapareceriam sem o concurso das formas nectarvoras, e na disseminao de sementes pelas frutvoras, tanto pelo abandono das sementes maiores aps devorarem a polpa, como pela eliminao das menores junto com as suas fezes. S o papel de conservadores das nossas florestas justificaria o empenho que muitos pesquisadores atualmente demonstram no sentido de melhor conhec-los, tanto no aspecto taxonmico, como em sua distribuio, ecologia e hbitos reprodutivos. Com a inteno de se atualizar os dados taxonmicos e informaes sobre os quirpteros brasileiros, para atender aos diversos pesquisadores sobre morcegos, tanto os mais antigos como aqueles que esto se iniciando, Nlio Roberto dos Reis, Adriano Lucio Peracchi, Wagner Andr Pedro e Isaac Passos de Lima reuniram-se para editar este livro, contando com a colaborao de mais outros 18 autores, todos especialistas no assunto e igualmente pesquisadores em instituies de ensino superior e de pesquisa brasileiras. Trata-se, portanto, de obra indispensvel para todos aqueles que desejarem se atualizar ou aumentar seus conhecimentos sobre esse interessante grupo de animais to importantes para a preservao do meio ambiente. Eugenio Izecksohn Professor Emrito da UFRRJ

DedicatriaS podemos preservar o que amamos, s podemos amar o que entendemos, s podemos entender o que nos foi ensinado.(Autor desconhecido)

Este livro oferecido aos professores Valdir Antnio Taddei (In memoriam) e Adriano Lcio Peracchi pelas grandes contribuies para o conhecimento da Ordem Chiroptera no Brasil, pela manuteno de respeitadas Colees Zoolgicas e pela formao de um grande nmero de profissionais nesta rea.

A eles o nosso mais profundo respeito.

Nelio Roberto dos Reis Wagner Andr Pedro Isaac Passos de Lima

Aos revisores

Agradecimentos

Carlos Eduardo de Alvarenga Julio (Dr.) Bilogo, Professor Adjunto - Zoologia/Invertebrados - Departamento de Biologia Animal e Vegetal - Universidade Estadual de Londrina (UEL). Cibele Rodrigues Bonvicino (Dra.) Biloga, Instituto Nacional do Cncer, Coordenadoria de Pesquisa, Diviso de gentica (INCA). Edson Aparecido Proni (Dr.) Bilogo, Professor associado do Departamento de Biologia Animal e Vegetal da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Enrico Bernard (Ph.D.) Bilogo, York University, Toronto, Canad/Gerente de Projetos para a Amaznia Conservao Internacional. Erica Marisa Sampaio-Czubayko (Ph.D.) Biloga, Pesquisadora Associada doNational Museum of Natural History - Mammals Division/Estados Unidos e Department of Experimental Ecology - University of Ulm/Alemanha. Fabiana Rocha Mendes (M.Sc.) Biloga, Doutoranda em Cincias Biolgicas, Zoologia - Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (UNESP - Rio Claro - SP). Joo Alves de Oliveira (Ph.D.) Bilogo, Professor adjunto do Departamento de Vertebrados, Museu Nacional Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Marcelo Passamani (Dr.) Bilogo, Prof. Setor de Ecologia, Departamento de Biologia da Universidade Federal de Lavras (UFLA). Marco Aurlio Ribeiro de Mello (Dr.) Bilogo, Departamento de Botnica da Universidade Federal de So Carlos (UFSCAR). Margareth Lumy Sekiama (Dra.) Biloga, Ambincia - Klabin Florestal Paran. Oilton Jos Dias Macieira (Dr.) Eclogo, Professor associado do Departamento de Biologia Animal e Vegetal da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Renato Silveira Brnils (M.Sc.) Bilogo, Doutorando em Zoologia, Departamento de Vertebrados, Museu Nacional Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Sandra Bos Mikich (Dra.) Biloga, Pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria - Unidade Embrapa Florestas. Srgio Luiz Althoff (M.Sc.) Bilogo, Professor Pesquisador do Departamento de Cincias Naturais da Fundao Universidade Regional de Blumenau (FURB). Valria Tavares (Dra.) Biloga, Department of Mammalogy, American Museum of Natural History (AMNH). Wilson Uieda (PhD.) Bilogo, Professor do Departamento de Zoologia no Instituto de Biocincias da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (UNESP) - Campus de Rubio Junior.

Agradecimentos especiais Caixa Econmica Federal; Pr-Reitoria de Pesquisa (PROPe), da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (UNESP); Fundao Carlos Chagas Filho de Amparo Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). Estas entidades deram total apoio financeiro na impresso desta obra. Universidade Estadual de Londrina (UEL) na pessoa do Magnfico reitor Dr. Wilmar Sachetin Maral; Ao Programa de Ps-graduao em Cincias Biolgicas (UEL). Por darem apoio logstico e de infra-estrutura para a execuo deste livro. Ao CNPq, a CAPES e a FAPERJ pelo apoio e concesso de bolsas aos pesquisadores envolvidos neste projeto. Aos profissionais que cederam as fotos para a composio deste livro.

Lista dos AutoresAdriano Lcio Peracchi (Dr.), Agrnomo, Professor Livre Docente do Instituto de Biologia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Cibele Maria Vianna Zanon (M.Sc.), Biloga, Doutoranda em Ecologia de Ambientes Aquticos da Universidade Estadual de Maring (UEM). Daniela Dias (Dra.), Biloga, Laboratrio de Mastozoologia - Instituto de Biologia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Eliana Morielle-Versute (Dra.), Biloga, Professora do Departamento de Zoologia e Botnica da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (UNESP). Fabio Nascimento Oliveira Fogaa (M.Sc.), Bilogo, Professor Assistente do Curso de Tecnologia em Meio Ambiente, Universidade Estadual de Maring (UEM), Campus Umuarama. Gisele Aparecida da Silva Doratti dos Santos (M.Sc.), Biloga, Laboratrio de Mastozoologia - Centro de Cincias Biolgicas da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Gledson Vigiano Bianconi (M.Sc.), Bilogo, Doutorando em Cincias Biolgicas, Zoologia, da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho (UNESP Rio Claro-SP). Henrique Ortncio Filho (M.Sc.), Bilogo, Doutorando em Ecologia de Ambientes Aquticos Continentais da Universidade Estadual de Maring (UEM), Professor Adjunto do Curso de Cincias Biolgicas da Universidade Paranaense (UNIPAR), Campus Cianorte. Isaac Passos de Lima (M.Sc.), Bilogo, Doutorando do Curso de Biologia Animal do Instituto de Biologia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Janaina Gazarini Biloga, Mestranda do Programa de Ps-Graduao em Cincias Biolgicas da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Ludmilla Moura de Souza Aguiar (Dr.), Biloga, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (EMBRAPA) - Centro de Pesquisa Agropecuria dos Cerrados. Marcelo Oscar Bordignon (Dr.), Bilogo, Professor Adjunto III do Departamento de Cincias do Ambiente da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). Marcelo Rodrigues Nogueira (Dr.), Bilogo, Pesquisador Associado do Laboratrio de Cincias Ambientais da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF). Marlon Zorta (Dr.), Bilogo, Professor do departamento de Biologia da Universidade Federal de Gois (UFG). Marta Elena Fabian (Dr), Biloga, Professora Adjunta do Departamento de Zoologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Nelio Roberto dos Reis (Dr.), Biomdico, Professor Titular do Departamento de Biologia Animal e Vegetal da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Oscar Akio Shibatta (Dr.), Bilogo, Professor Associado do Departamento de Biologia Animal e Vegetal da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Priscila Mara de Moraes Veduatto (M.Sc.), Biloga, Universidade Estadual de Londrina (UEL). Renata Issa Rickli (Mestranda), Biloga, Programa de Ps-Graduao em Cincias Biolgicas da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Renato Gregorin (Dr.), Bilogo, Professor do Departamento de Biologia da Universidade Federal de Lavras (UFLA). Ricardo Moratelli Mendona da Rocha (M.Sc.), Bilogo, Programa Institucional Biodiversidade e Sade, FIOCRUZ; Doutorando do Programa de Ps-graduao em Cincias Biolgicas (Zoologia), Museu Nacional, (UFRJ). Wagner Andr Pedro (Dr.), Bilogo, Professor Livre Docente, Laboratrio de Chiroptera, Departamento de Apoio, Produo e Sade Animal da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho (UNESP - Araatuba - SP).

Sumrio

Sumrio

Captulo 01 - Sobre os Morcegos Brasileiros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17Nelio R. Reis; Oscar A. Shibatta; Adriano L. Peracchi; Wagner A. Pedro e Isaac P. Lima

Classificao e diversidade de morcegos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Origem e evoluo dos Chiroptera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Caractersticas gerais dos Microchiroptera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Conservao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Caracteres morfolgicos dos morcegos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Adriano L. Peracchi e Marcelo R. Nogueira

17 18 19 23 25

Captulo 02 - Famlia Emballorunidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27Gnero Centronycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Cormura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Cyttarops . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Diclidurus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Peropteryx . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Rhynchonycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Saccopteryx . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 28 29 30 31 33 34

Famlia Phyllostomidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 Captulo 03 - Subfamlia Desmodontinae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39Ludmilla M. S. Aguiar

Gnero Desmodus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 Diaemus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 Diphylla . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

Captulo 04 - Subfamlia Glossophaginae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45Marcelo R. Nogueira; Daniela Dias e Adriano L. Peracchi

Tribo Glossophagini . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gnero Anoura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Choeroniscus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Glossophaga . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Lichonycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Scleronycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tribo Lonchophyllini . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gnero Lionycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Lonchophylla . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Xeronycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Marcelo R. Nogueira; Adriano L. Peracchi e Ricardo Moratelli

46 46 48 50 52 53 54 54 55 58

Captulo 05 - Subfamlia Phyllostominae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61Gnero Chrotopterus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Glyphonycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Lampronycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Lonchorhina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 64 67 68

Morcegos do Brasil

Gnero

Lophostoma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Macrophyllum . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Micronycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Mimon . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Neonycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Phylloderma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Phyllostomus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tonatia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Trachops . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Trinycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Vampyrum . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

70 74 75 83 85 86 88 92 94 95 96

Captulo 06 - Subfamlia Carolliinae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99Henrique O. Filho; Isaac P. Lima e Fbio N. O. Fogaa

Gnero Carollia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99 Rhinophylla . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103

Captulo 07 - Subfamlia Stenodermatinae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107Marlon Zorta

Gnero Ametrida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Artibeus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Chiroderma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Enchisthenes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Mesophylla . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Platyrrhinus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Pygoderma. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Sphaeronycteris . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Sturnira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Uroderma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Vampyressa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Vampyrodes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Cibele M. V. Zanon e Nelio R. Reis

108 109 113 115 116 117 120 120 121 123 125 127

Captulo 08 - Famlia Mormoopidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129Gnero Pteronotus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129

Captulo 09 Famlia Noctilionidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133Nelio R. Reis; Priscila M. M. Veduatto e Marcelo O. Bordignon

Gnero Noctilio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133

Captulo 10 - Famlia Furipteridae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137Nelio R. Reis e Janaina Gazarini

Gnero Furipterus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137

Captulo 11 Famlia Thyropteridae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139Isaac P. Lima e Renato Gregorin

Gnero Thyroptera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 140

Captulo 12 - Famlia Natalidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 145Nelio R. Reis; Gisele A. S. D. Santos e Renata I. Rickli

Gnero Natalus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 145

Sumrio

Captulo 13 - Famlia Molossidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149Marta E. Fabian e Renato Gregorin

Gnero Cynomops . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Eumops . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Molossops . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Molossus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Nyctinomops . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Promops . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tadarida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Gledson V. Bianconi e Wagner A. Pedro

149 151 156 158 161 163 164

Captulo 14 - Famlia Vespertilionidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 167Subfamlia Vespertilioninae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tribo Eptesicini . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gnero Eptesicus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tribo Lasiurini . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gnero Lasiurus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tribo Nycticeiini . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gnero Rhogeessa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tribo Vespertilionini . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gnero Histiotus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Subfamlia Myotinae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gnero Myotis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 168 168 168 174 174 181 181 183 183 187 187

Captulo 15 - Mtodos e aplicaes da citogentica na taxonomia de morcegos brasileiros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 197Ricardo Moratelli e Eliana Morielle-Versute

Tcnicas para obteno de cromossomos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tcnicas de colorao e bandeamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Procedimento para obteno de cromossomos em condies de campo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Sntese dos dados citogenticos sobre espcies de morcegos da fauna brasileira . . . . . . . . . . . . . Aplicaes dos estudos citogenticos em morcegos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Emballonuridae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Phyllostominae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Glossophaginae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Stenodermatinae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Desmodontinae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Carolliinae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Mormoopidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Noctilionidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Furipteridae, Thyropteridae e Natalidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Vespertilionidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Molossidae . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Anexo I protocolos para preparo de reagentes e solues. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Anexo II frmula para clculo de fora centrfuga. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

199 202 203 204 211 211 212 212 213 215 215 216 216 216 216 217 218 218

Lista das espcies de morcegos do Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 219 Referncias Bibliogrficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 225 ndice . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 251

Morcegos do Brasil

Reis, N.R.dos; Shibatta, O.A.; Peracchi, A.L. Pedro, W.A. & Lima, I.P. de

Captulo 01 - Sobre os Morcegos Brasileiros

Captulo 01

Sobre os Morcegos BrasileirosNelio Roberto dos Reis Professor Titular do Departamento de Biologia Animal e Vegetal Universidade Estadual de Londrina (UEL) Oscar Akio Shibatta Professor Associado do Departamento de Biologia Animal e Vegetal Universidade Estadual de Londrina (UEL) Adriano Lcio Peracchi Professor Livre Docente do Instituto de Biologia Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) Wagner Andr Pedro Professor Livre Docente do Laboratrio de Chiroptera, Departamento de Apoio, Produo e Sade Animal Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho (UNESP Araatuba-SP) Isaac Passos de Lima Doutorando do Curso de Biologia Animal do Instituto de Biologia Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)

No Brasil, poucas pessoas sabem que os morcegos recebem os nomes andir, guandira ou guandiruu na lngua tupi. O desconhecimento sobre esses animais no se restringe a esses nomes, mas diversidade de espcies, complexidade biolgica e importncia ecolgica. A palavra morcego remete a maioria das pessoas figura de um rato alado, noturno e sugador de sangue. O prprio nome, morcego, derivado do latim muris (rato) e coecus (cego). Em grego verpertilio e em latin nycteris, que so nomes relacionados ao hbito de vida noturno. Segundo BIEDERMANN (1993), a simbologia associada a esses animais variada, e as narrativas dos primeiros colonizadores, da existncia de morcegos-vampiros sugadores de sangue na Amrica do Sul, contriburam para que os morcegos inofensivos tambm fossem vistos na Europa como seres assustadores. Morcegos hematfagos j faziam parte das narrativas dos autores quinhentistas Hans Staden, Jean de Lry e Gabriel Soares de Souza, que foram os primeiros a tecerem comentrios sobre os mor17

cegos do Brasil (CASSIMIRO & MORATO, 2005). Entretanto, esses animais apresentam diferentes hbitos alimentares e a grande maioria til ao homem. Na cultura maia da Amrica Central, ao norte de Yucatn, havia um Deus-morcego chamado Acanceh. Na China, alm de ser um smbolo da felicidade, cinco morcegos juntos significam os bens terrenos (idade avanada, riqueza, sade, amor virtuoso e morte natural). Na antiguidade, o morcego era o smbolo da vigilncia, e seu olho protegeria da sonolncia (BIEDERMANN, 1993). Lendas parte, a simplificao imposta pela crendice popular no faz jus a esses formidveis animais, que apresentaremos a seguir. Classificao e diversidade de morcegos Morcegos pertencem ordem Chiroptera, palavra derivada do grego cheir (mo) e pteron (asa). Quirpteros so um dos grupos de mamferos mais diversificados do mundo, com dezoito famlias,

Morcegos do Brasil

202 gneros e 1120 espcies (SIMMONS, 2005). Isso representa aproximadamente 22% das espcies conhecidas de mamferos, que hoje totalizam 5416 espcies (WILSON & REEDER, 2005). Tradicionalmente os Chiroptera so divididos em duas subordens, os Megachiroptera e os Microchiroptera. Duas hipteses correntes de relacionamento filogentico podem ser destacadas. A primeira, que demonstra o polifiletismo da ordem, baseada em caracteres do sistema visual (PETTIGREW, 1986), relaciona os Megachiroptera aos Primates. A segunda, baseada em dados morfolgicos (SIMMONS, 1994; VAN DEN BUSSCHE et al., 1998) e reforada recentemente pelas informaes genticas (MURPHY et al., 2001), demonstra o monofiletismo do grupo. Os Megachiroptera no ocorrem no Brasil e esto representados por apenas uma famlia, Pteropodidae, com 150 espcies distribudas pelo Velho Mundo, na regio tropical da frica, ndia, sudeste da sia e Austrlia (FENTON, 1992). Devido similaridade de suas faces com as das raposas, so conhecidos popularmente como raposas-voadoras. Apresentam tamanho mdio a grande, com Pteropus vampyrus, atingindo aproximadamente 1,5 kg e 1,7 m de envergadura. Utilizam a viso para navegao e, por isso, tm olhos grandes. Alm disso, tm as orelhas pequenas e sem o tragus (apndice membranoso na abertura auricular) e no tm ornamentaes faciais e nasais, pois no apresentam ecolocalizao (apenas uma espcie dessa famlia apresenta esse sistema). A cauda e o uropatgio esto ausentes, as vrtebras cervicais no so modificadas e a cabea fica virada para a regio ventral quando esto empoleirados. No hibernam e nem entram em torpor. As diferentes espcies podem apresentar variadas estratgias reprodutivas, desde estacionalmente monoestra at poliestria assazonal (TADDEI, 1976). Os Microchiroptera so compostos por 17 famlias e 930 espcies no mundo (SIMMONS, 2005), no ocorrendo apenas nas regies polares.18

No Brasil so conhecidas nove famlias, 64 gneros e 167 espcies (REIS et al., 2006; TAVARES et al., no prelo; presente trabalho). Neste pas a segunda ordem em riqueza de espcies, sendo superada somente pela ordem Rodentia, com 235 espcies. As famlias brasileiras, com seus respectivos nmeros de espcies so: Emballonuridae (15); Phyllostomidae (90); Mormoopidae (4); Noctilionidae (2); Furipteridae (1); Thyropteridae (4); Natalidae (1); Molossidae (26) e Vespetilionidae (24) (PERACCHI et al., 2006). Eles habitam todo o territrio nacional, ocorrendo na Amaznia, no Cerrado, na Mata Atlntica, no mido Pantanal, no rido nordeste, nos pampas gachos e at nas reas urbanas. Mais adiante sero apresentadas caractersticas gerais dessa subordem. Origem e evoluo dos Chiroptera A ancestralidade dos morcegos continua obscura. A dificuldade de vincular os morcegos a qualquer outro grupo de mamferos sugere uma origem muito antiga. difcil encontrar fsseis com informaes sobre o perodo inicial da evoluo dos morcegos por causa do esqueleto delicado, pequeno e leve, que no se preserva bem. Alm disso, nas florestas as condies no so favorveis fossilizao. O registro fssil mais antigo, que remete a alguma caracterstica quirptera, provm de alguns dentes descobertos na Frana, do perodo Paleoceno, que apresentam caracteres tanto de morcegos quanto de insetvoros (Eulipotyphla, o grupo dos musaranhos), permitindo relacionar filogeneticamente esses dois grupos. Isso foi confirmado recentemente, em estudo com dados moleculares (MURPHY et al., 2001), em que os Eulipotyphla se mantiveram como o grupo irmo do clado onde se encontram os morcegos. Mesmo assim, no possvel determinar se esses animais primordiais j apresentavam estruturas alares, ape-

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nas pelo exame dos dentes fsseis. O fssil completo mais antigo de um verdadeiro morcego foi encontrado em rochas Eocnicas (60 milhes de anos) da formao Green River do Wyoming, Estados Unidos. Entretanto, esse fssil, denominado Icaronycteris index, no apresenta nenhuma caracterstica intermediria, sendo claramente um Microchiroptera de hbitos insetvoros. A morfologia craniana dessa espcie tambm indica habilidade para a ecolocalizao. Outro fssil encontrado na Alemanha, o Palaeochiropterys tupaiodon, de 50 milhes de anos atrs, tambm era um morcego semelhante aos atuais (FENTON, 1992, SIMMONS & GEISLER, 1998). Outra datao da antiguidade do grupo foi realizada com a descoberta de ovos fossilizados de mariposas noctudeas, que tm a habilidade de detectar sons de morcegos. Eles tm aproximadamente 75 milhes de anos, sugerindo que os morcegos floresceram muito cedo, h cerca de 80 a 100 milhes de anos. Assim, eles permaneceram sem mudanas expressivas na sua arquitetura corprea, mesmo depois de ter compartilhado o mundo com os dinossauros e de ter presenciado os eventos que os extinguiram no final do Cretceo (FULLARD, 1987; GALL & TIFFNEY, 1983; BAILEY, 1991). Especula-se que os morcegos evoluram com o incio da diversificao das plantas com flores, que trouxe como conseqncia a abundncia de insetos. Desta forma, os mamferos da ordem Insetivora tambm se estabeleceram e exerceram uma forte presso de predao contra os ancestrais dos morcegos, pois havia Insetivora que predavam pequenos mamferos. Por essa razo, presume-se que esses ancestrais dos morcegos fossem noturnos, evoluindo de um mamfero pequeno e arborcola. Aps milhes de anos saltando atrs de insetos, de rvore para rvore, o processo de seleo natural direcionou para o desenvolvimento de membranas, o que possibilitou aos an19

cestrais dos morcegos planarem de modo similar quele dos modernos colugos (ordem Dermoptera) e esquilos voadores (ordem Rodentia). Deste ponto eles literalmente se lanaram para o vo, tornando-se esses caadores areos altamente bem sucedidos que so conhecidos atualmente. Assim, menos energia gasta com o vo planado de rvore para rvore do que caminhando ou correndo. Alm disso, evita-se contatos com predadores terrestres (ALTRINGHAM, 1996). Caractersticas gerais dos Microchiroptera Os Microchiroptera geralmente apresentam tamanho mdio, mas podem ocorrer espcies diminutas como Furipterus horrens com peso mdio de 3 gramas e 15 cm de envergadura (NOWAK, 1994). Outras espcies podem ser relativamente maiores, como o filostomdeo Vampyrum spectrum, conhecido como andir-au, que pode chegar a 190 g, 15 cm de corpo e 70 cm de envergadura (EMMONS & FEER, 1990). Morcegos em geral apresentam alta longevidade se comparados a mamferos de mesmo porte: enquanto um rato de 40 g vive at dois anos, um morcego vampiro pode viver at 20 anos na natureza (BERNARD, 2005). Como animais noturnos, tm poucos cones na retina, uma estrutura relacionada com a percepo de cores. No entanto, no so cegos e, embora todas as famlias brasileiras usem a ecolocalizao para se orientar, alguns frugvoros maiores tambm se localizam pela viso. Por utilizar primariamente o sistema de ecolocalizao, os olhos so pequenos, as orelhas so grandes, o tragus bem desenvolvido e as ornamentaes nasais e faciais muitas vezes esto presentes. Na maior famlia brasileira, Phyllostomidae, a folha nasal proeminente toma parte importante no direcionamento dos ultrassons que saem pelas narinas (NEUWEILER, 2000). Durante o processo de ecolocalizao, eles transmitem sons de alta freqncia pela boca ou pelo nariz, que so refleti-

Morcegos do Brasil

dos por superfcies do ambiente, indicando a direo e a distncia relativa dos objetos (FENTON, 1992). assim que os insetvoros se desviam dos obstculos noturnos e caam pequenos insetos em pleno vo, e piscvoros pescam, atravs da deteco das ondas formadas pelos pequenos peixes de superfcie. A ecolocalizao tambm importante para os morcegos que vivem em florestas fechadas, onde os obstculos so muitos. Morcegos tambm usam o som para outras finalidades como comunicao e alarmes, acasalamento e agresso, e alguns sons emitidos pelos morcegos no so audveis para a espcie humana. Apesar de alguns mamferos conseguirem planar a longas distncias, tais como o Galeopithecus da ordem Eulipotyphla, Petaurus da ordem Didelphimorphia e Pteromys da ordem Rodentia, os morcegos so o nico grupo capaz de realizar o vo verdadeiro (FENTON, 1992). No transcorrer da evoluo, finas e elsticas membranas se desenvolveram entre seus dedos, alongando-se at a parte distal das suas pernas, dando-lhes capacidade de manobras e tornando-os grandes voadores. Ainda para favorecer esta habilidade, os seus ossos so longos, finos, tubulares e leves (KUNZ & RACEY, 1998). As falanges da mo so extremamente longas e sustentam as membranas ou patgios, as vrtebras cervicais so torcidas, possibilitando cabea permanecer levantada, as vrtebras traco-lombares da coluna curvaram-se para ampliar a caixa torcica, o esterno apresenta uma crista para insero de fortes msculos peitorais, as costelas ligaram-se parcialmente para tornar o trax mais resistente, a clavcula grossa e bem fixada, a bacia sofreu torso e o joelho voltado para trs. Como suas asas possuem grande superfcie, a desidratao mais rpida do que em outros animais de mesmo peso, e a necessidade de gua maior em morcegos do que em outros mamferos do mesmo peso (NEUWEILER, 2000). Os morcegos tambm desenvolveram a capacidade de se dependurar para o repouso, de20

cabea para baixo, agarrando-se a superfcies de cavernas, troncos e galhos com suas unhas afiadas e curvas como um cabo de guarda-chuva. As vrtebras cervicais, da mesma forma que permitem cabea permanecer levantada durante o vo, a mantm levantada durante o repouso, de modo que o ambiente no parea invertido. Para esses animais noturnos, uma colorao viva seria de pouca utilidade e, por isso, h apenas variaes entre o preto e o pardo, com algumas espcies ruivas ou amareladas. Mesmo assim, podem ocorrer pelagens brancas como nas espcies de Diclidurus, embora isso no parea ser um componente importante, de modo que haja aumento de sua predao. Apesar de existirem vrios animais que possam predar morcegos, tais como corujas, gavies, falces, guaxinim, gatos, cobras, sapos e aranhas grandes, apenas uma guia africana realmente especializada em morcegos. O mais surpreendente que alguns morcegos se alimentam de outros, embora no sejam canibais, pois capturam espcies diferentes da sua (FENTON, 1992). Eles no esto livres dos parasitos, sendo observadas populaes numerosas de pequenas moscas, carrapatos e caros, alm de inmeros parasitos internos em exemplares coletados em campo. O estudo dos parasitos ainda um campo pouco explorado pelos quiropterologistas. Os morcegos constituem um dos grupos de mamferos mais diversificados quanto aos hbitos alimentares, o que no surpreendente se considerada a diversidade de espcies. Praticamente todos os grupos trficos podem ser observados entre os morcegos, excetuando-se os saprfagos. Os carnvoros so predadores de pequenos vertebrados, tais como pssaros, anfbios, rpteis e at pequenos mamferos. Tambm comem grandes insetos. Dentre os morcegos brasileiros, os carnvoros esto entre aqueles de maior tamanho. Existem morcegos predominantemente

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frugvoros, mas que tambm podem incluir insetos na sua dieta. No Brasil pertencem exclusivamente famlia Phyllostomidae (aqueles que apresentam a folha nasal), que ocasionalmente so considerados como prejudiciais s rvores frutferas, por atacarem os frutos dos pomares depois que todas as matas foram destrudas na regio. Entretanto, segundo GREENHALL (1956, 1966), os danos causados pelos morcegos indstria derivada dos frutos so poucos ou de nenhuma importncia. Sobre a sua importncia biolgica, os frugvoros desempenham importante papel na disperso de sementes. Alguns botnicos afirmam que os quirpteros so os dispersores mais importantes entre todos os mamferos (HUBER,1910; PIJL, 1957). Ainda HUMPHREY & BONACCORSO (1979) sugerem que 25% das espcies de rvores da floresta de algumas regies tropicais so dispersas por eles. Os melhores dispersores de sementes, nas Amricas, so os filostomdeos (JONES & CARTER, 1976), o que os coloca entre os principais responsveis pela regenerao das florestas neotropicais (BREDT et al., 1996). Esse potencial de disperso est associado com seu hbito de forrageio, sua mobilidade e com as grandes distncias que percorrem em busca de alimentos (GALINDO-GONZLEZ, 1998). Os hematfagos alimentam-se exclusivamente de sangue de mamferos ou de aves e, para isso, utilizam incisivos especializados para fazer pequeno corte nos animais. Lanam um anticoagulante com a saliva e sorvem o sangue que flui para fora. Depois, j saciados, separam a parte lquida do sangue com os rins especializados e urinam, eliminando o excesso de peso, para retornar aos seus abrigos. Existem apenas trs gneros e trs espcies de morcegos hematfagos e todos so neotropicais (BRASS, 1994). A raiva comum nos morcegos-vampiro, mas segundo CONSTANTINE (1970) a transmisso dessa doena ao homem raramente ocorre. Na21

Amaznia foi realizado um estudo sobre morcegos-vampiro na epidemiologia da raiva humana, e concluiu-se que no possvel incrimin-los como tendo um papel significativo (MOK & LACEY, 1980). Por outro lado, a raiva relacionada com o gado mais importante, pois foram constatadas, em 1972, a contaminao de 2 milhes de cabeas em todos os pases das Amricas Central e do Sul, exceto no Chile e Uruguai (CONSTANTINE, 1970). O controle da raiva paraltica dos ruminantes deve ser feito com vacina anti-rbica (vrios tipos so produzidos no Brasil), e com a diminuio da populao de seus transmissores, que, no caso, seriam os morcegos hematfagos. Dado o pouco conhecimento sobre o assunto, costuma-se incriminar todas as espcies de morcegos. Por esse motivo, muitas vezes morcegos benficos como os insetvoros ou os frugvoros so injustamente acusados e exterminados s centenas. Felizmente, com a descoberta de venenos especficos, tornase possvel a diminuio dos morcegos hematfagos, sem perigo s outras espcies. Os insetvoros, tais como os Vespertilionidae, obtm a maioria dos insetos dos quais se alimentam em vo. Normalmente, os Embalonuridae e os Vespertilionidae capturam esses insetos voando em nvel mais baixo do que a copa das rvores, e os Molossidae, voando acima dessas copas. Existem relatos de morcegos que sobem a aproximadamente trs mil metros de altura para alcanar concentraes de mariposas. Os morcegos so importantssimos como controladores de insetos. Estima-se que algumas espcies possam comer quantidades correspondentes a uma vez e meia o seu peso em uma nica noite (GOODWIN & GREENHALL, 1961). Alguns Phyllostomidae comuns no Brasil tambm podem capturar at 500 insetos por hora (GRIFFIN et al., 1960). Muitos dos insetos capturados pelos morcegos so daninhos lavoura ou podem transmitir doenas como a dengue. Alm disso, captu-

Morcegos do Brasil

ram colepteros e ispteros que atacam a estrutura de casas construdas com madeira (YALDEN & MORRIS, 1975). JONES (1971) mostrou que 22 espcies de morcegos tiveram reduzidas as suas populaes nos Estados Unidos. Entre os fatores que mais contriburam para essa diminuio, estava o uso indiscriminado dos inseticidas, que contaminaram e diminuram suas fontes de alimentos, alm de ter contaminado o prprio animal, que mais vulnervel a esse tipo de envenenamento do que outros. Como exemplo, cita-se o DDT, cuja dose letal de 40 mg.kg-1 para morcegos e de 800 mg.kg-1 para os ratos (COCKRUM, 1969; 1970; CLARK-JR et al., 1975; DAVIS, 1970a). Alm disso, por estarem no fim da cadeia alimentar, os insetvoros ficam sujeitos a maiores acmulos de inseticidas e envenenamento subletal que provoca a sua esterilidade. Um exemplo para demonstrar o impacto do homem sobre os morcegos pode ser o de uma colnia no Mxico, que em 1963 continha 25 milhes de morcegos e que foi dizimada para apenas 30 mil indivduos em 1969 (COCKRUM, 1969). Os onvoros so adaptados para vrios hbitos alimentares. Se alimentam de insetos, plen, nctar e frutas e, s vezes, pequenos invertebrados. Os piscvoros so habilidosos na pesca, com grandes e fortes ps em forma de garra. Vivem perto de cursos da gua e pescam atravs de ecolocalizao. Os polinvoros e nectarvoros so morcegos da famlia Phyllostomidae (que possuem dentes diminutos) retiram carboidratos do nctar e protenas do plen das plantas, mas que tambm podem ingerir insetos. So tpicos pelo seu focinho alongado e lngua exageradamente comprida. Tm plos faciais e corporais especializados para transportar o plen. Algumas plantas populares como o pequizeiro, o jambeiro, o abacateiro, a goiabeira, a mangueira e a bananeira tm suas flores polinizadas por morcegos. Alguns so importan22

tes como polinizadores, tanto que VOGEL (1969) estimou que os morcegos desempenham papel importante na polinizao de pelo menos 500 espcies de plantas neotropicais, de 96 diferentes gneros, em matas de capoeiras, sendo que muitas destas plantas so economicamente importantes para a humanidade como fonte alimentar ou ornamentais. A dentio varia com o modo de alimentao adotado, tendo cspides mais agudas nos molares das espcies insetvoras do que nas frugvoras. Os caninos so grandes e os incisivos so sempre rudimentares com exceo dos hematfagos, onde so desenvolvidos. Os dentes permanentes vo de 20 nos hematfagos (Desmodus) at 38 nos insetvoros (Myotis, Thyroptera e Natalus) e esses dentes so diferenciados, sendo os incisivos cortantes nos hematfagos, os molares achatados para esmagar frutos nos frugvoros e pontiagudos nos insetvoros, para quebrar a quitina dos insetos (GLASS in SLAUGHTER & WALTON, 1970). Os filhotes tm dentio de leite em forma de ganchos, com uma ou duas pontas, e com eles se prendem teta da me, que os carregam durante o vo. As fmeas tm frequentemente duas e excepcionamente quatro mamas funcionais do lado do trax. Em mdia, os morcegos como os humanos, tm um filhote por ano, mas podem ter dois ou trs e, raramente, quatro. Noctilionidae e Phyllostomidae geralmente so poliestros enquanto que Vespertilionidae e Mollossidae so monoestros. A gestao dura de 44 dias a 11 meses e o nascimento dos filhotes se d em poca de maior oferta de alimentos (REIS & PERACCHI, 1981). Geralmente cuidam dos seus filhotes durante trs meses aproximadamente. Observaes preliminares na Amaznia indicaram que os insetvoros deixam seus filhotes nos lugares de repouso, enquanto os frugvoros procuram carreg-los em vo enquanto for possvel (REIS, 1981). Os Molossidae so coloniais e h reconhecimento individual de cha-

Reis, N.R.dos; Shibatta, O.A.; Peracchi, A.L. Pedro, W.A. & Lima, I.P. de

Captulo 01 - Sobre os Morcegos Brasileiros

mados para reunir mes e filhotes nos locais de abrigo e repouso. Em reas preservadas, de um modo geral, seus abrigos so as cavernas, tocas de pedras, e cos de rvores, mas tambm rvores com troncos com colorao similar sua, ou no meio das folhas (principalmente de palmeiras), folhas no abertas de Musaceae (famlia das bananeiras), rvores cadas, razes na beira de rios e cupinzeiros (GREENHALL & PARADISO, 1968; REIS, 1981). No Brasil, nas reas urbanas, j foram encontrados morcegos em pontes, forros de prdios e de casas de alvenaria, tubulao fluvial, pedreira abandonada, junta de dilatao de prdios, toldo de construes, interior de churrasqueiras em quintais e at em aparelhos de ar condicionado (REIS et al., 2002b). Segundo GREENHALL & PARADISO (1968), para quebrar o jejum de 10 horas, o perodo de atividades geralmente mais intenso nas duas primeiras horas ao escurecer e nas duas horas antes do amanhecer. Em climas frios, os morcegos hibernam ou migram, podendo se deslocar por mais de 1700 km (ALTRINGHAM, 1996). No Brasil, embora se desloquem bastante, no se conhecem casos de hibernao ou migrao a longas distncias. Mas quando dormem durante o dia, muitas espcies ficam em estado de semi-torpor e com reduo da temperatura do corpo. Utilidade dos morcegos ao homem Os morcegos so extremamente teis ao homem, servindo como material de pesquisa na medicina, em estudos epidemiolgicos, farmacolgicos, de mecanismos de resistncia a doenas e no desenvolvimento de vacinas (YALDEN & MORRIS, 1975). As suas asas, que so constitudas dos tecidos animais mais transparentes, permitem estudos sobre a circulao sangnea, efeito de inalao de fumaa e tempo23

de eliminao de drogas. O mecanismo da hipotermia que utilizam durante a hibernao, se estivesse melhor entendido pelo homem, poderia facilitar grandes cirurgias, pois o organismo, nessas condies, menos susceptvel a danos e requer menos oxignio. Servem tambm como recurso alimentar para alguns povos na frica e at para algumas tribos no Brasil (SETZ & SAZIMA, 1987; SETZ, 1991). O guano, depositado pelos morcegos, tem sido utilizado como fertilizante em vrias regies do mundo e pode ser comprado em casas de flores e supermercados na sia h dezenas de anos. O guano pode ser o nico alimento orgnico para certas espcies caverncolas. Freqentemente so tidos como prejudiciais pelas doenas que podem veicular e transmitir ao homem, tais como certas viroses e micoses. A relao com o fungo patognico Histoplasma capsulatum conhecida h mais de quatro dcadas. O crescimento saproftico do H. capsulatum, agente da histoplasmose em solos contaminados por fezes de morcegos, foi descoberto por EMMONS (1958). Esta micose pulmonar pode ser evitada mantendo-se distncia dos lugares de repouso deste animal, sem ventilao. No somente as fezes de morcegos podem servir de meio para crescimento de H. capsulatum, mas tambm as de outros animais, inclusive de galinhas. Maiores detalhes sobre as micoses transmitidas por morcegos so fornecidos em REIS & MOK (1979). Conservao No Brasil, h legislao que garante a proteo dos morcegos, conforme o Artigo 1 da Lei no 5197, de 3 de janeiro de 1967 (Dirio Oficial de 5 de janeiro de 1967), que diz textualmente: Os animais de qualquer espcie, em qualquer fase de seu desenvolvimento,

Morcegos do Brasil

e que vivem naturalmente fora de cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais so de propriedade do Estado, sendo proibida sua utilizao, perseguio, destruio, caa ou apanha. Mesmo assim, pouco se tem feito para a sua conservao. Atualmente cinco espcies de duas famlias esto includas na Instruo Normativa n 3, de 27 de maio de 2003, do Ministrio do Meio Ambiente e constam como ameaadas de extino: Famlia Phyllostomidae - Lonchophylla bokermanni Sazima et al., 1978; Lonchophylla dekeyseri Taddei, Vizotto & Sazima, 1983; Platyrrhinus recifinus (Thomas, 1901) e Famlia Vespertilionidae - Lasiurus ebenus Fazzolari-Corra, 1994 e Myotis ruber (E. Geoffroy, 1806) (MMA, 2003), mas esse nmero pode estar subestimado. As repreenses com pesadas multas so mais freqentes para aqueles que cau-

sam danos a qualquer outro animal, menos aos morcegos, que esto sendo mortos impunemente. Populaes de algumas espcies tm decrescido visivelmente no Brasil. A proteo legal dos morcegos j foi implementada na Austrlia, Bulgria, Tchecoslovquia, Dinamarca, Alemanha Ocidental e Oriental, Finlndia, Hungria, Itlia, Mxico, Polnia, Rssia, Iugoslvia e Estados Unidos. Nestes pases, o interesse pela conservao dos morcegos foi reconhecido por alguns autores como MANVILLE (1962), DAVIS (1970a) e COCKRUM (1969; 1970). Uma sociedade esclarecida deveria executar um programa de conservao da fauna sem preconceitos, que no inclusse somente os animais do agrado pblico. Os morcegos esto ameaados por inseticidas, pelos desmatamentos, e at motivados pelas lendas e supersties a seu respeito, o que lastimvel, porque eles so alguns dos vertebrados mais interessantes do mundo.

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Reis, N.R.dos; Shibatta, O.A.; Peracchi, A.L. Pedro, W.A. & Lima, I.P. de

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Apndice Caracteres morfolgicos dos morcegos Como so mamferos muito especializados, algumas estruturas so exclusivas e tm uma nomenclatura particular, que familiar apenas aos especialistas. Por isso, para que o leitor em geral ou especialistas de outras reas da biologia possam identificar essas estruturas nos textos a seguir, um desenho esquemtico ilustrando-as apresentado abaixo.

Representao esquemtica de um morcego (Ilustrao: Oscar A. Shibatta).

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Peracchi, A.L. & Nogueira, M. R.

Captulo 02 - Famlia Emballonuridae

Captulo 02

Famlia EmballorunidaeAdriano Lcio Peracchi Professor Livre Docente do Instituto de Biologia Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Marcelo Rodrigues Nogueira Pesquisador Associado do Laboratrio de Cincias Ambientais Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro

Essa famlia encontrada tanto no Velho como no Novo Mundo e compreende 13 gneros e 51 espcies, sendo que no Brasil ocorrem 7 gneros e 15 espcies. So morcegos pequenos, com olhos relativamente grandes, focinho alongado e orelhas largamente triangulares, ligeiramente pontudas ou arredondadas no pice, geralmente providas de dobras paralelas na face interna das pinas e trago simples e curto. A membrana interfemural bem desenvolvida e quando estendida to longa ou mais longa que as pernas; a cauda mais curta que a membrana, perfurando-a na face superior e ficando com a extremidade livre. O segundo dedo das asas desprovido de falanges. As asas so tambm muito peculiares, pois quando em repouso apresentam a primeira das duas falanges do dedo mdio dobrada sobre o metacarpo. Vrias espcies apresentam bolsas no propatgio ou na membrana interfemural. Essas estruturas so mais desenvolvidas nos machos e durante algum tempo pensou-se que tivessem funo secretora. An27

lises histolgicas, entretanto, tm refutado essa hiptese (SCULLY et al., 2000), e o mais provvel que tais bolsas atuem apenas como depsito de substncias produzidas em glndulas genitais e gulares. A mistura dessas substncias apresenta forte odor e pode ser empregada tanto na defesa de territrio quanto durante a crte (VOIGT & Von HELVERSEN, 1999). Os molares desses morcegos so bem desenvolvidos e apresentam cspides em forma de W, apropriadas para triturar os pequenos insetos que capturam em pleno vo e dos quais se alimentam (KALKO, 1995). Formam um grupo essencialmente tropical, havendo um claro decrscimo na diversidade de espcies conforme aumenta a latitude (STEVENS, 2004). Algumas espcies parecem ter no sudeste do Brasil o limite meridional de sua distribuio geogrfica (PERACCHI & NOGUEIRA, no prelo).

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Gnero Centronycteris Gray, 1838 Esse gnero compreende 2 espcies, C. maximiliani (J. Fischer, 1829) e C. centralis Thomas, 1912, das quais somente a primeira ocorre no Brasil.

Centronycteris maximiliani (J. Fischer, 1829)

Com localidade tipo na Fazenda da Coroaba, rio Juc, Esprito Santo, Brasil, essa espcie ocorre tambm no nordeste do Peru, sul da Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa. Em territrio brasileiro j foi observada tambm no AM, PA e PE. (1) S e g u n d o SIMMONS & HANDLEYJR (1998) no h diferenas externas perceptveis entre as duas espcies do gnero, que diferem pelo tamanho e extenso das fossas basiesfenides. Esses autores informam que em C. maximiliani cabea e corpo medem de 41 a 64 mm, a cauda de 20 a 26 mm e o antebrao de 41,5 a 44,7 mm. O peso varia de 4,5 a 7 g, as fmeas sendo ligeiramente maiores que os machos. Nesses Centronycteris maximiliani (Foto: E. Bernard) morcegos no h presena de bolsas e a pelagem felpuda, pardoGnero Cormura Peters, 1867 avermelhada nas partes superiores, sendo mais Cormura brevirostris (Wagner, 1843) plida nas inferiores. Essa espcie insetvora, como confirmado por REIS & PERACCHI (1987). Uma fmea lactante de C. maximiliani foi capturada em fevereiro no Brasil central, constituindo-se no nico registro reprodutivo da espcie.1

Tem sido encontrada em florestas midas primrias de terras baixas, com altitudes de at 300 m, mas ocorre tambm em reas de vegetao secundria. Recentemente, BARNETT et al. (2006) reportaram a ocorrncia de C. maximiliani em reas de campina e campinarana no Parque Nacional do Ja, Estado do Par, com base na identificao de chamados de ecolocalizao. Quanto ao uso de abrigos, um exemplar de C. maximiliani foi encontrado pendurado sob folha de melastomatcea na Guiana Francesa.

Essa espcie a nica do gnero e tm como localidade-tipo Marabitanas, Rio Negro, Amazonas. Sua distribuio vai da Nicargua ao Peru e Brasil, onde j foi observada no AM, MA, MT, PA e RO. Esse embalonu-rdeo apresenta cabea e corpo medindo de 50 a 65 mm (EMMONS & FEER,

A distribuio geogrfica geral apresentada aqui para cada espcie se baseia em SIMMONS (2005), ao passo que a distribuio em territrio brasileiro teve como base os dados compilados por TAVARES et al. (no prelo).

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Peracchi, A.L. & Nogueira, M. R.

Captulo 02 - Famlia Emballonuridae

(Strelitziaceae), mas salientaram que esse no seria um comportamento habitual da espcie. Nos refgios formam grupos pequenos de 2 a 5 indivduos, mais freqentemente 3 exemplares.

Gnero Cyttarops Thomas, 1913 Cyttarops alecto Thomas, 1913Cormura brevirostris (Foto: A. L. Peracchi)

1990), cauda de 9 a 17 mm e antebrao de 41 a 50 mm. O peso varia de 6,8 a 11 g (SIMMONS & VOSS, 1998), as fmeas sendo ligeiramente maiores que os machos. A pelagem sedosa, de colorao marrom-escura ou marrom-avermelhada no dorso, mais clara na face ventral (BERNARD, 2003). A bolsa longa e se situa no meio da membrana antebraquial. A base da membrana interfemural quase nua, e as asas esto ligadas aos ps, na base dos dedos. Alimenta-se de pequenos insetos capturados em vo no sub-bosque das florestas. H registro do uso de ortpteros (RIVAS-PAVA et al., 1996). Fmeas grvidas foram encontradas no Panam em abril e maio (FLEMING et al., 1972). Ocorre em mata primria e em clareiras (REIS & PERACCHI, 1987; SIMMONS & VOSS, 1998), e se refugia em ocos de rvores e cavidades rasas na base de rvores viventes, bem como sob o tronco de rvores cadas e sob pontes de concreto (BERNARD, 2003). SIMMONS & VOSS (1998) encontraram na Guiana Francesa um pequeno grupo dessa espcie abrigado sob folha no modificada de Phenakospermum guyannensis29

nica espcie do gnero, C. alecto tem como localidade-tipo Mocajatuba, Par, Brasil. encontrada tambm na Nicargua, Costa Rica e Guiana, estando representada por menos de 20 exemplares, todos capturados em reas com at 300 m de altitude (STARRETT, 1972). Nessa espcie cabea e corpo medem de 47 a 55 mm, cauda de 20 a 25 mm e antebrao de 45 a 47 mm. O peso varia de 6 a 7 g (REID, 1997). So morcegos que apresentam olhos grandes e orelhas curtas e arredondadas. O trago uma caracterstica importante dessa espcie, pois a metade inferior da margem externa se apresenta como um lbulo grande, muito desenvolvido, nico entre os quirpteros (NOVAK, 1994). A pelagem longa e sedosa, de colorao cinza-enegrecida; as membranas so negras. No h bolsas nas asas nem na membrana interfemural. Espcie insetvora, como evidenciado por STARRETT (1972) que encontrou fragmentos de insetos no trato digestivo de oito indivduos capturados na Costa Rica. Duas fmeas e um macho capturados na

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Costa Rica, no incio de agosto, no apresentavam qualquer evidncia de atividade reprodutiva. Ainda na Costa Rica, trs sub-adultos foram capturados no incio de agosto (STARRETT, 1972). Ocorre em mata primria (BROSSET et al., 1996) e abriga-se sob as folhas de palmeiras, geralmente situadas em reas relativamente abertas. Nesses refgios forma grupos de 1 a 10 indivduos (STARRETT, 1972). Gnero Diclidurus Wied-Neuwied, 1820 Esse gnero inclui quatro espcies: D. albus Wied-Neuwied, 1820, D. scutatus Peters, 1869, D. ingens Hernndez-Camacho, 1955 e D. isabellus (Thomas, 1920). As trs primeiras pertencem ao subgnero Diclidurus, enquanto a ltima a Depanycteris, que durante muito tempo foi considerado um gnero distinto de Diclidurus e que alguns autores insistem em considerar como gnero vlido.

conhecida e acredita-se que desempenhe papel idntico ao das bolsas que ocorrem nas asas de outro embalonurdeos, atraindo as fmeas nos perodos reprodutivos. A cauda curta e estende-se at o tero basal da membrana interfemural, perfurando-a no centro da bolsa glandular. Espcie insetvora. O estmago de oito exemplares capturados no Mxico apresentou fragmentos de lepidpteros (CEBALLOS & MEDELLN, 1988). No Brasil, dpteros e lepidpteros foram reportados por PERACCHI & ALBUQUERQUE (1987). Ainda no Mxico, D. albus parece se reproduzir de janeiro a junho, com a cpula provavelmente ocorrendo em janeiro ou fevereiro, quando machos e fmeas so encontrados juntos nos abrigos. Fmeas com embries bem desenvolvidos foram capturadas em maio, sendo encontrado somente um embrio por fmea (CEBALLOS & MEDELLN, 1988). Ocorre em florestas midas e secas, reas peridomiciliares e em ruas de cidades (HANDLEY-JR, 1976). Nesses locais tem sido coletada com auxlio de arma de tiro, no em redes. Abriga-se entre folhas de palmeiras de palmeiras altas (GOODWIN & GREENHALL, 1961) e tambm em forro de residncias (PERACCHI & ALBUQUERQUE, 1987).

Diclidurus albus Wied-Neuwied, 1820Essa espcie tem como localidade-tipo Canavieiras, rio Pardo, Bahia, e ocorre do Mxico ao sudeste do Brasil. Em territrio brasileiro j foi observada no AM, AP, BA, ES, PA e RO. Morcego de porte mediano, com cabea e corpo medindo de 68 a 82 mm, cauda de 18 a 22 mm, antebrao de 63 e 69 mm e peso de 17 a 24 g (REID, 1997). Como denota o epteto especfico, nessa espcie a pelagem branca. Outras duas espcies do gnero, D. scutatus e D. ingens, tambm apresentam pelagem branca, mas D. albus maior que a primeira e menor que a segunda. Assim como as demais espcies do gnero, D. albus apresenta orelhas amareladas, curtas e arredondadas, olhos grandes e uma bolsa localizada no centro da membrana interfemural. Essa bolsa, uma verdadeira cpsula crnea, mais desenvolvida nos machos e se torna maior na poca da reproduo. A sua funo des30

Diclidurus ingens Hernndez-Camacho, 1955Essa espcie tem como localidade-tipo Puerto Laguizano, rio Putumayo, Caqueta, Colmbia, e ocorre tambm na Venezuela, Guiana e norte do Brasil, onde j foi observada no Estado do Par. Morcego relativamente grande, com antebrao entre 70 a 73 mm. A pelagem branca, como em D. albus e D. scutatus, mas a separao pode ser feita pelo tamanho, maior nessa espcie. As demais caractersticas descritas anteriormente

Peracchi, A.L. & Nogueira, M. R.

Captulo 02 - Famlia Emballonuridae

ou nas proximidades de suas margens (HANDLEY-JR, 1976). Tem sido coletado apenas com o auxlio de arma de tiro.

Diclidurus scutatus Peters, 1869Essa espcie tem Belm, Par, como localidade-tipo, e ocorre na Amaznia, Venezuela, Peru, Guiana, Suriname e sudeste do Brasil. No territrio brasileiro j foi observada no Amap, Amazonas, Par e, recentemente, So Paulo (SODR & UIEDA, 2006). Morcego relativamente pequeno, com antebrao entre 51 e 59 mm. A pelagem branca, como em D. albus e D. ingens, mas D. scutatus pode ser reconhecida por seu menor tamanho. As demais caractersticas descritas anteriormente para D. albus tambm valem para essa espcie. Morcego insetvoro, coletada em reas de mata primria e secundria (BROSSET et al., 1996; SIMMONS & VOSS, 1998), nas proximidades de bancos de rios, em reas peridomiciliares e em ruas de cidades (HANDLEY-JR, 1976; SODR & UIEDA, 2006). Nesses locais, D. scutatus tem sido coletada principalmente com o auxlio de arma de tiro. Gnero Peropteryx Peters, 1867 Esse gnero compreende quatro espcies: P. kappleri Peters, 1867; P. leucoptera Peters, 1867; P. macrotis (Wagner, 1843) e P. trinitatis Miller, 1899. Dessas, somente as trs primeiras ocorrem no Brasil. P. kappleri, P. macrotis e P. trinitatis pertencem ao subgnero Peropteryx e P. leucoptera ao subgnero Peronymus, que at pouco atrs era considerado gnero distinto.31

Diclidurus ingens (Foto: E. Bernard)

para D. albus tambm valem para essa espcie. Esse morcego insetvoro e tem sido capturada em florestas midas, nas proximidades de bancos de riachos, em reas peridomiciliares e em ruas de cidades (HANDLEY-JR, 1976). Nesses locais tem sido coletada apenas com o auxlio de arma de tiro.

Diclidurus isabellus (Thomas, 1920)Essa espcie tem Manacapuru, Amazonas, como localidade-tipo, e ocorre apenas no noroeste do Brasil e na Venezuela. Em D. isabellus a cabea e as espduas so pardo-claras, o dorso pardo-escuro e as partes inferiores branco-amareladas. Alm disso, nessa espcie o polegar no reduzido e apresenta garra bem desenvolvida (ele muito reduzido e tem garra vestigial nas demais espcies). As demais caractersticas descritas anteriormente para D. albus tambm valem para essa espcie. Morcego estritamente insetvoro, que tem sido encontrado em floresta midas, sobre riachos

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Peropteryx kappleri Peters, 1867Essa espcie tem como localidade-tipo o Suriname, e ocorre do Mxico s Guianas, Peru, norte da Bolvia e leste do Brasil. J foi assinalada nos seguintes Estados brasileiros: AL, AM, BA, ES, MA, MG, PA, PE, RJ e SP. Apresenta tamanho relativamente grande, com antebrao variando de 45 a 50 mm nos machos e 46 a 52 mm nas fmeas. As orelhas so enegrecidas e separadas, o dorso usualmente castanho-escuro, e as partes inferiores ligeiramente mais claras. As asas so enegrecidas. Pelos longos, geralmente com 8 mm de comprimento na altura do pescoo e 10 mm mais para trs. Assim como as demais espcies do gnero, diferencia-se de outros embalonurdeos por apresentar bolsa curta, junto ao bordo anterior do propatgio. Espcie exclusivamente insetvora (BRADBURY & VEHRENCAMP, 1976). Na Colmbia, observaes sobre P. kappleri mostraram que os nascimentos ocorrem em janeiro, maro, abril, maio, outubro e novembro, com um pico acentuado em abril e um menor, entre outubro e novembro, acompanhando os picos de precipitao pluviomtrica (GIRAL et al., 1991). Ocorre em florestas midas primrias e secundrias, florestas secas e reas cultivadas (HANDLEY-JR, 1976; SIMMONS & VOSS, 1998). Na Colmbia, sete minas de carvo abandonadas continham colnias formadas por 5 a 47 indivduos, que ocupavam as partes mais escuras desses refgios. Abriga-se ainda em cavernas, frestas entre rochas, ocos de rvores e cmaras escuras formadas entre sapopemas de troncos cados (HANDLEY-JR, 1976; SIMMONS & VOSS, 1998).

Suriname, ocorrendo tambm nas demais Guianas, Peru, Colmbia, Venezuela e norte e nordeste do Brasil, onde conhecida do Amazonas, Par e Pernambuco. P. leucoptera apresenta tamanho pequeno, com antebrao variando de 41 a 43 mm nos machos e 42 a 45 mm nas fmeas. O peso varia de 5,5 a 7,8 g. Orelhas ligadas por membrana baixa. Dorso castanho-enegrecido, ventre mais claro. Dactilopatgio usualmente branco. Espcie insetvora, havendo registro do consumo de colepteros (REIS & PERACCHI, 1987). Duas fmeas grvidas e uma lactante foram registradas em maio no norte do Brasil (BERNARD, 1999). Ocorre em reas de floresta primria (SIMMONS & VOSS, 1998) e secundria (BROSSET et al., 1996), e na amaznia brasileira foi encontrada em fragmento florestal em cercado por vegetao de savana (BERNARD, 1999). Abriga-se em ocos de rvores cadas e tambm em cmaras escuras formadas entre sapopemas de troncos cados (SIMMONS & VOSS, 1998; BERNARD, 1999). Nesses refgios, P. leucoptera tem sido encontrada em grupos que variam de 2 a 12 indivduos (SIMMONS & VOSS, 1998; BERNARD, 1999).

Peropteryx macrotis (Wagner, 1843)Essa espcie tem como localidade-tipo Mato Grosso, e tambm encontrada do Mxico ao Peru, Bolvia, Paraguai e sul e sudeste do Brasil. J foi registrada nos seguintes Estados brasileiros: AL, AM, AP, BA, DF, ES, GO, MA, MG, MT, PA, PE, PR, RJ, RN e SP. P. macrotis apresenta tamanho relativamente pequeno, com antebrao medindo de 43 a 45 mm nos machos e 45 a 48 mm nas fmeas. O peso varia de 4 a 7 g. As orelhas so castanho-

Peropteryx leucoptera Peters, 1867Essa espcie tem como localidade-tipo o32

Peracchi, A.L. & Nogueira, M. R.

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Gnero Rhynchonycteris Peters, 1867 Rhynchonycteris naso (WiedNeuwied, 1820) nica espcie do gnero, R. naso tem como localidade-tipo o rio Mucuri, prximo ao Morro dArara, Bahia, e encontrada do Mxico ao Per u, Bolvia, Guiana Francesa, Guiana, Suriname, Trinidad e sudeste do Brasil. Em territrio brasileiro j foi observada no AC, AL, AM, AP, BA, ES, GO, MG, MT, PA, PI, PE, RJ, RO e RR. Nessa espcie, cabea e corpo medem de 37 a 46 mm, a cauda de 11 a 14 mm e o antebrao de 35 a 40 mm. O peso varia de 35 a 46 g. Pode ser reconhecida pelo focinho alongado, com extremidade pontuda, prolongando-se alm do lbio inferior; presena de tufos de plos esbranquiados no antebrao e ausncia de bolsas antebraquiais ou no uropatgio. A colorao da pelagem grisalho-acinzentada no dorso, com o ventre cinza mais claro. No dorso ocorrem 2 listras longitudinais esbranquiadas, sinuosas e pouco distintas. Esses morcegos so encontrados em refgios bem iluminados, prximos ou sobre cursos dgua: pontes, entrada de cavernas, troncos de rvores e pedras. Formam colnias de 3 a 15 indivduos, segundo BRADBURY & VEHRENCAMP (1976). Contudo, NOGUEIRA & POL (1998) observaram essa espcie no norte de Minas Gerais formando colnias de at 80 exemplares. Os vos de forrageio comeam ao entardecer e se desenvolvem sobre as colees dgua, quando so capturados pequenos insetos, incluindo mosquitos, tricpteros, quironomdeos e besouros PLUMPTON & JONES, 1992; DALQUEST, 1957). No norte de Minas Gerais, NOGUEIRA33

Peropteryx macrotis (Foto: Marlon Zorta)

acinzentadas e separadas. O dorso geralmente castanho-avermelhado e partes inferiores levemente mais claras. As asas so enegrecidas e os plos moderadamente longos, com 6 mm de comprimento no pescoo e com 8 a 9 mm mais para trs. Espcie insetvora, havendo registro do consumo de colepteros e dpteros (BRADBURY & VEHRENCAMP, 1976). Fmeas grvidas de P. macrotis foram observadas na caatinga em janeiro, setembro e outubro, sugerindo que essa espcie apresenta poliestria sazonal; fmeas lactantes foram encontradas em janeiro (WILLIG, 1985a). Na Amrica Central, fmeas grvidas foram observadas em maro e abril (JONES et al., 1973; RICK, 1968). P. macrotis ocorre em florestas midas primrias e secundrias, savanas, florestas secas e reas cultivadas (HANDLEY-JR, 1976; SIMMONS & VOSS, 1998). Abriga-se em cavernas, fendas rasas, minas e construes, freqentemente prximo gua. Forma grupos de 10 a 20 exemplares, mas s vezes congregam quase 80 indivduos e vrios grupos podem ocupar uma grande caverna.

Morcegos do Brasil

a maior das quatro espcies do gnero, com antebrao medindo de 45 a 48 mm nos machos e 48 a 51 mm nas fmeas. O peso varia de 6,7 a 9,9 g nos machos e 7,8 a 13,2 g nas fmeas (SIMMONS & VOSS, 1998). Apresenta a pelagem dorsal e as membranas enegrecidas, e a face ventral cinza-escuro. H duas listras dorsais esbranquiadas bem ntidas. Assim como as demais espcies do gnero, S. Rhynchonycteris naso (Foto: A. L. Peracchi) bilineata apresenta bolsa situ& POL (1998) observaram que R. naso apresenta ada no propatgio, junto ao antebrao e prximo poliestria bimodal, com nascimentos ocorrendo no ao cotovelo. Essa bolsa bem desenvolvida nos incio e no final do perodo chuvoso. Essa machos e rudimentar nas fmeas. sazonalidade reprodutiva foi tambm constatada por BRADBURY & VEHRENCAMP (1976) na Costa Rica, onde os filhotes no foram observados durante a estao seca. Contudo, em certas reas de sua distribuio essa espcie pode se reproduzir ao longo de todo o ano (PLUMPTON & JONES, 1992). Gnero Saccopteryx Illiger, 1811 O gnero Saccopteryx compreende 5 espcies: S. antioquensis Muoz & Cuartas, 2001; S. bilineata (Temminck, 1838); S. canescens Thomas, 1901; S. gymnura Thomas, 1901 e S. leptura (Schreber, 1774). Dessas, somente a primeira no ocorre no territrio brasileiro. A dieta composta exclusivamente por insetos, tais como colepteros e dpteros (BRADBURY & VEHRENCAMP, 1976; RIVASPAVA et al., 1996). De acordo com dados obtidos na Costa Rica e em Trinidad por BRADBURY & VEHRENCAMP (1976), S. bilineata forma grupos compostos por um macho adulto e um harm que pode conter at oito fmeas. Numa mesma rvore vrios grupos podem ser encontrados, formando uma colnia de 40 a 50 indivduos. Cada macho defende ativamente uma rea de 1 a 3 metros quadrados de refgio e apresenta um complexo comportamento de crte para atrair as fmeas de seu harm. Em ambas as funes esses machos podem executar uma srie de procedimentos, incluindo vocalizaes, bocejos e vo pairado, no qual dispersam o odor da mistura de substncias que so depositadas em suas bolsas antebraquiais (VOIGT & Von HELVERSEN, 1999; BEHR & Von HELVERSEN, 2004). Machos solitrios em uma colnia procuram formar

Saccopteryx bilineata (Temminck, 1838)Essa espcie tem o Suriname como localidade-tipo, e encontrada do Mxico Bolvia, Guianas, Trinidad e Tobago e sudeste do Brasil. Em territrio brasileiro j foi observada no AC, AM, AP, BA, CE, GO, MA, MG, MT, PA, RJ, RR e RO.34

Peracchi, A.L. & Nogueira, M. R.

Captulo 02 - Famlia Emballonuridae

seu prprio harm (VOIGT & STREICH, 2003) Tem sido capturada em reas de floresta primria e secundria (REIS & PERACCHI, 1987; BROSSET et al., 1996). Abriga-se em rvores ocas, cavernas, blocos de pedra e construes, incluindo runas (POLANCO et al., 1992, RICK, 1968), Freqentemente so tambm encontrados pousados, durante o dia, em troncos de rvores na floresta.

S. gymnura bem menor que as espcies anteriores, com o antebrao variando de 33,5 a 35,3 mm. O dorso apresenta pelagem castanhoescura e as listras so ausentes ou muito esmaecidas. A membrana das asas ligada ao metatarso, enquanto nas demais espcies ela unida tbia. Essa espcie insetvora e tem sido capturada em pequenas clareiras e sob estradas, sempre em associao direta ou nas proximidades de florestas primrias (SIMMONS & VOSS, 1998).

Saccopteryx canescens Thomas, 1901Essa espcie tem bidos, Par, como localidade-tipo, e ocorre na Colmbia, Venezuela, Peru, Bolvia, Guianas e norte do Brasil, onde j foi observada no AM, AP, MA, PA e RO. S. canescens de tamanho semelhante espcie anterior, da qual pode se distinguir por apresentar pelagem dorsal castanho-agrisalhada de cinza ou amarelo e listras dorsais esbranquiadas e distintas. O antebrao varia de 35,8 a 40,8 mm (SIMMONS & VOSS, 1998). Esse morcego insetvoro ocorre em florestas midas e secas, reas abertas, tais como pastos e pomares (HANDLEY-JR, 1976), e em ambiente urbano (BROSSET et al., 1996). TEJEDOR (2003) encontrou colnia com cinco indivduos abrigados sob teto externo em construo situada em rea bem iluminada de uma reserva biolgica no Peru. A composio dessa colnia (com um nico macho adulto e mais de uma fmea adulta) sugere poliginia para esse txon (TEJEDOR, 2003).

Saccopteryx leptura (Schreber, 1774)Essa espcie tem o Suriname como localidade-tipo, e encontrada do Mxico ao Peru, norte da Bolvia, Guianas, Ilha Margarita (Venezuela), Trinidad e Tobago e sudeste do Brasil. Em territrio brasileiro conhecida dos Estados do AC, AM, AP, CE, ES, GO, MA, MT, PA, PE, RJ, RO e RR. S. leptura semelhante espcie anterior, porm menor, com a face dorsal castanho-escura, e a ventral castanho-acinzentada. As membranas tambm so de cor castanha. As listras dorsais so

Saccopteryx gymnura Thomas, 1901A localidade-tipo dessa espcie Santarm, Par, Brasil. Ela ocorre tambm na Guiana Francesa, Guiana e talvez na Venezuela.35

Saccopteryx leptura (Foto: M.R. Nogueira)

Morcegos do Brasil

menos pronunciadas. O antebrao varia de 36 a 40 mm nos machos e de 39 a 42 mm nas fmeas. O peso varia de 3,8 a 4,6 g nos machos e 4,2 a 6,4 g nas fmeas (SIMMONS & VOSS, 1998). Morcego exclusivamente insetvoro. Um exemplar de S. leptura capturado no Estado do Rio de Janeiro, ao entardecer, durante vo de forrageio, continha nas bochechas cinco fmeas aladas de formigas do gnero Pheidole. As fezes de trs outros exemplares colecionados em rea florestada na cidade do Rio de Janeiro tambm apresentaram fragmentos de himenpteros (NOGUEIRA et al., 2002). Em Trinidad a estao reprodutiva de S. leptura sincronizada, com cada fmea produzindo um filhote antes da estao chuvosa (NOWAK, 1994). Parece tratar-se de forma mongama, com o grupamento mais freqentemente encontrado sen-

do composto por um macho adulto e uma fmea (BRADBURY & VEHRENCAMP, 1976). Tem sido capturada em reas de floresta primria e secundria, pastos, pomares e reas urbanas (HANDLEY-JR, 1976; REIS & PERACCHI, 1987; BROSSET et al., 1996). Prefere abrigar-se no tronco exposto de grandes rvores, se bem que na cidade do Rio de Janeiro um grupo de 3 indivduos foi encontrado abrigado, durante o dia, numa construo situada aproximadamente 30 m da floresta (NOGUEIRA et al., 2002). Agradecimentos Somos gratos ao revisor annimo pela leitura crtica e correes no manuscrito, aos colegas que gentilmente cederam imagens para ilustrar esse captulo, FAPERJ (ALP e MRN) e ao CNPq (ALP) pelo apoio financeiro.

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Peracchi, A.L. & Nogueira, M. R.

Captulo 02 - Famlia Emballonuridae

Famlia Phyllostomidae *

Os morcegos desta famlia apresentam como caracterstica marcante a presena de uma folha nasal membranosa em forma de lana ou folha, na extremidade do focinho. Porm na subfamlia Desmodontinae a folha nasal reduzida (VIEIRA, 1942; VIZOTTO & TADDEI, 1973; NOWAK, 1994; MEDELLN et al.,1997).

* Pelo fato desta famlia ser muito numerosa e muito importante para o Brasil, resolveu-se aqui fazer de cada Subfamlia um captulo.37

Morcegos do Brasil

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Aguiar, L. M. S.

Captulo 03 - Subfamlia Desmodontinae

Captulo 03

Subfamlia DesmodontinaeLudmilla Moura de Souza Aguiar Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (EMBRAPA) Centro de Pesquisa Agropecuria dos Cerrados.

Os morcegos hematfagos pertencem ordem Chiroptera, famlia Phyllostomidae, subfamlia Desmodontinae. Esta subfamlia inclui trs gneros Desmodus, Diaemus e Diphylla e trs espcies hematfagas, monotpicas e simptricas: Desmodus rotundus, Diaemus youngi e Diphylla ecaudata. Somente D. rotundus se alimenta do sangue de mamferos e conhecido como morcego vampiro comum. Diphylla ecaudata, o vampiro-de-pernaspeludas, e o raro Diaemus youngi, se alimentam na natureza do sangue de aves (BRASS, 1994). Os desmodontinae possuem como caractersticas diagnsticas que os distinguem das outras famlias de morcegos Neotropicais, apndice nasal rudimentar, de estrutura discide em forma de ferradura ou como protuberncia. No possuem cauda e o uropatgio reduzido. As pernas, antebraos e polegares so longos, sendo esses ltimos espessados e usados como ps para andar, saltar ou escalar de forma quadrpede. Almofadas podem ou no ocorrer (ALTENBACH, 1979; GREENHALL et al., 1983).39

Os incisivos superiores so longos e cortantes, o que permite abrir uma ferida de forma indolor. H reduo do tamanho dos dentes molares e pr-molares; presena de substncia anticoagulante na saliva (FERNANDEZ et al., 1998); lbio inferior sulcado e destitudo de papilas, lngua sulcada que permite ao sangue fluir por capilaridade para o interior da boca; estmago e rins especializados na absoro e processamento do plasma sanguneo e presena de sensores trmicos localizados no apndice nasal, que permitem detectar reas mais intensamente vascularizadas na pele da presa (GREENHALL et al., 1983; BERNARD, 2005). Como os outros morcegos, os hematfagos tambm emitem sinais de ecolocalizao para a orientao espacial. A audio dos vampiros, porm, mais bem adaptada para baixas freqncias, entre 100 Hz e 10 kHz (SCHMIDT et al., 1991).

Morcegos do Brasil

Gnero Desmodus Wied-Neuwied, 1826 Desmodus rotundus (E. Geoffroy, 1810) Desmodus rotundus tem ampla distribuio no Novo Mundo, ocorrendo desde o norte do Mxico at o norte da Argentina (MAcNAB, 1973; GREENHALL et al., 1983; KOOPMAN, 1988). Economicamente, esta espcie pode trazer grandes prejuzos para a pecuria da Amrica Latina, por causa de seu papel na transmisso da raiva dos herbvoros (GREENHALL et al., 1983; ACHA & MLAGA-ALBA, 1988). A espcie ocorre em reas florestadas assim como regies desrticas, abrigando-se em ocos de rvore, cavernas, bueiros, minas abandonadas e mesmo construes civis (BREDT et al., 1998). Em climas frios sua distribuio limitada pela habilidade em transportar quantidades suficientes de alimento para manter a temperatura do corpo (KUNZ, 1982). Existem registros na literatura mostrando que no Brasil a espcie ocorre de norte a sul (PERACCHI et al., 2006). Desmodus rotundus a espcie mais comum e abundante de morcego vampiro. Em funo de seu hbito alimentar e de sua importncia econmica devido transmisso de raiva a espcie uma das mais bem conhecidas e estudadas do mundo (BERNARD, 2005). Esses morcegos tm cerca de 35 cm de envergadura (distncia entre as pontas das asas abertas), pesam entre 25 e 40 gramas e podem ser considerados de mdio porte (GREENHALL et al., 1983), quando comparados s outras espcies. A pelagem bastante macia, em geral de colorao cinza brilhante, mas pode apresentar tambm tons avermelhados, dourados ou mesmo alaranjados (BERNARD, 2005). uma espcie estritamente hematfaga (GARDNER, 1977a) e seu hbito alimentar exige grande capacidade integrativa do crebro, sendo40

Desmodus rotundus (Foto: Isaac P. Lima).

que o neocrtex e o cerebelo so mais desenvolvidos que em outras espcies de morcegos (BERNARD, 2005). Preferem o sangue de mamferos de grande porte e a introduo de animais domsticos como cavalos, bovinos, e sunos tm aumentado o nmero de indivduos nos ltimos 300 anos (ALTRINGHAM, 1996). Habitualmente as colnias so pequenas (GREENHALL et al., 1983) e contm de 10 a 50 indivduos; contudo, agrupamentos com 100 ou mais morcegos podem ocorrer principalmente em regies onde o controle de suas populaes no feito com regularidade (UIEDA et al., 1996). Colnias maiores (cerca de 300 indivduos) foram mencionadas por SAZIMA (1978) e TADDEI et al. (1991) para o Estado de So Paulo e por BREDT et al. (1999), para a regio do Distrito Federal. So fortes as relaes entre fmeas, e os indivduos caam e forrageiam em grupo (WILKINSON 1985; 1986). Seu padro de atividade parece ser mais intenso no intervalo entre 19 e 23 horas (FERREIRA SALES et al., 1975). Estudos tm revelado a existncia de dimorfismo sexual e ocorrncia de maior nmero de fmeas (ALENCAR et al., 1994; NUEZ & VIANNA, 1997; GOMES & UIEDA, 2004). Desmodus rotundus considerada uma espcie polistrica, sem um perodo definido de reproduo (TADDEI et al., 1991; ALENCAR et al.,

Aguiar, L. M. S.

Captulo 03 - Subfamlia Desmodontinae

1994). Contudo, o nascimento da maioria dos filhotes parece se concentrar na estao mais quente e chuvosa (GOMES & UIEDA, 2004). A gestao dura sete meses, com o nascimento de um filhote por vez, ocasionalmente podendo ocorrer gmeos. No segundo ms de vida o filhote j recebe alimento regurgitado pela me e a acompanha at os quatro meses, tornando-se independente aos cinco meses (LORD, 1992; TURNER, 1975). Desmodus rotundus freqentemente encontrado em reas com presena de animais de criao. No se encontra na lista das espcies ameaadas para o territrio nacional, de acordo com dados do MMA (2003), e nem da lista da IUCN (2006). Gnero Diaemus Miller, 1906 Diaemus youngi (Jentink, 1893) A distribuio dessa espcie ampla, com ocorrncias do nordeste do Mxico, passando pela Amrica Central e chegando a Amrica do sul, da bacia Amaznica at o norte da Argentina. Ao contrrio de D. rotundus, que uma espcie bastante abundante e comum, D. youngi independentemente de sua ampla distribuio, localmente rara e h uma deficincia de dados populacionais, biolgicos e ecolgicos (AGUIAR et al., 2006; GREENHALL & SCHUTT, 1996). Na literatura so encontrados registros de D. youngi para 13 dos 26 estados brasileiros (AGUIAR et al., 2006). Diaemus youngi um morcego de porte mdio, com peso variando entre 30 e 38 g e antebrao 50-55 mm. A cor da pelagem varia do marrom claro ao escuro (GREENHALL & SCHUTT, 1996). Assemelha-se a D. rotundus mas pode ser41

Diaemus youngi (Foto: A.L. Peracchi).

distinguida facilmente das outras espcies de vampiros devido a ausncia de calcar e cauda. O dedo polegar de D. youngi tem uma nica almofada, enquanto D. rotundus tem duas. Em D. youngi, ambos os sexos possuem glndulas localizadas bilateralmente dentro da boca, que s so vistas quando o morcego est incomodado, e emitem odor ofensivo (GREENHALL & SCHUTT, 1996). As pontas das asas e orelhas so brancas, assim como a membrana entre o segundo e terceiro dedos. uma espcie que habita cavernas e ocos de rvores, em colnias com at 30 indivduos (GREENHALL & SCHUTT, 1996) e apresenta comportamento de domnio-hierarquia com displays e padres de comportamento no relatados para outras espcies de morcegos (SCHUTT et al., 1999). A reproduo desta espcie no bem conhecida (GREENHALL & SCHUTT, 1996). AGUIAR et al. (2006) encontraram machos reprodutivos na estao chuvosa, mas no tiveram capturas no perodo de seca no Cerrado do Brasil Central. , mas o molar posterior superior vestigial e geralmente perdido em adultos (GREENHALL &

Morcegos do Brasil

SCHUTT, 1996). Alimenta-se de sangue fresco e parece ter preferncia por sangue de aves, embora em cativeiro, alimente-se de sangue bovino (UIEDA 1993, GREENHALL & SCHUTT, 1996). Diferenas no comportamento alimentar relacionadas a seleo de presas arbreas e terrestres reduz a competio onde D. rotundus e D. youngi coexistem (SCHUTT et al., 1999). Devido a sua semelhana com D. rotundus, a espcie negativamente afetada por atividades de controle de vampiros. O vrus rbico j foi isolado no Brasil em indivduos de D. youngi, mas relatos de raiva humana e raiva causada por morcegos so relacionadas a atividade de Desmodus rotundus (GONALVES et al., 2002). Diaemus youngi no se encontra na lista das espcies ameaadas para o territrio nacional, de acordo com dados do MMA (2003), e tambm no consta da lista da IUCN (2006). No entanto, considerada ameaada nos estados do Paran (MARGARIDO & BRAGA, 2004) e Rio de Janeiro (BERGALLO et al., 2000). Gnero Diphylla Spix, 1823 Diphylla ecaudata Spix, 1823 A distribuio dessa espcie mais restrita que a dos outros vampiros. Existe um registro para o sul dos Estados Unidos, e registros de ocorrncias do Mxico, passando pela Amrica Central e chegando a Amrica do sul, at o Brasil (PERACCHI et al., 2006). PERACCHI et al. (2006) citam a ocorrncia de D. ecaudata para 13 dos 26 estados brasileiros. Diphylla ecaudata a menor espcie de vampiro e parece ocupar o segundo lugar em abundncia (freqncia) de capturas, atrs de D. rotundus e a frente de D. youngi. Pode ser diferenciada dessas espcies por possuir olhos grandes, orelhas pequenas e arredondadas e folha nasal pou42

co desenvolvida. Os membros post