Mortalidade Infantil no Município de Paracatu/MG: Análise do Período de 2005 e 2006

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Trabalho de Conclusão de Curso

Citation preview

FACULDADE TECSOMA Curso de Enfermagem

MORTALIDADE INFANTIL NO MUNICPIO DE PARACATU/MG:Anlise do perodo de 2005 e 2006

Llia Conceio Sales Bernardino

Paracatu 2010

Llia Conceio Sales Bernardino

MORTALIDADE INFANTIL NO MUNICPIO DE PARACATU/MG:Anlise do perodo de 2005 e 2006

Monografia apresentada Disciplina de Trabalho de Concluso de Curso II, como requisito parcial para a obteno do Ttulo de Bacharel em Enfermagem. Professor Supervisor: Batista de Oliveira Orientadora Arantes Temtica: Geraldo Rosalba Benedito Cassuci

Paracatu 2010

BERNARDINO, Llia Conceio Sales, 1988Mortalidade infantil no municpio de Paracatu/MG: anlise do perodo de 2005 e 2006 / Llia Conceio Sales Bernardino. 2010. 76 f. : il. color. Orientadora: Msc. Rosalba Cassuci Arantes. Trabalho de Concluso de Curso (graduao) Faculdade Tecsoma. Curso de Enfermagem, 2010. 1. Mortalidade Infantil. 2. Taxa de Mortalidade Infantil. 3. Sistema de Informaes sobre Mortalidade. I. Arantes, Rosalba Cassuci. II. Faculdade Tecsoma. Curso de Enfermagem. III. Ttulo. CDU: 614.314.422.2

Llia Conceio Sales Bernardino

MORTALIDADE INFANTIL NO MUNICPIO DE PARACATU/MG:Anlise do perodo de 2005 e 2006Monografia apresentada Disciplina de Trabalho de Concluso de Curso II, como requisito parcial para a obteno do Ttulo de Bacharel em Enfermagem.

_______________________________________________ Rosalba Cassuci Arantes - FATEC Orientadora Temtica

_______________________________________________ Geraldo Benedito Batista de Oliveira - FATEC Professor Supervisor

Paracatu, 18 de junho de 2010

Dedico esse trabalho minha famlia, sem a qual nenhuma realizao seria completa.

AGRADECIMENTOS Agradeo primeiramente a Deus, Aquele que me d fora e perseverana para superar as dificuldades e seguir sempre em frente. minha orientadora, Rosalba Cassuci Arantes, pelo compromisso, dedicao e pelas dicas que tanto facilitaram a construo deste trabalho. Iara Melo Franco e D. Vilma Melo Franco, do Cartrio de Registro Civil das Pessoas Naturais, pelo acolhimento e simpatia. Suelen Aparecida de Souza Rosa, da Gerncia Regional de Sade Una, por se colocar prontamente disposio de uma voz desconhecida ao telefone. Aos professores que, sem dvida, contriburam com a minha formao tanto acadmica quanto pessoal. Vocs so meus exemplos! Aos colegas de turma, parceiros fiis de uma caminhada certamente vitoriosa. s minhas irms lida, Renata, Ceclia, Anna Paula, Kelly e Luciana, colegas de repblica, colecionadoras de tantas histrias. Um dia escreveremos nosso livro! Juliana Faria de Oliveira, pela amizade e companheirismo durante essa jornada. Ao meu namorado, Josemar, pela pacincia e compreenso com os meus momentos de ausncia. Finalmente, agradeo imensamente minha famlia. Ao meu pai (meu heri) e minha me (minha fortaleza), pela confiana, apoio e amor incondicionais; aos meus irmos Kako, Ana e Bibi, por terem compartilhado comigo tantos momentos incrveis. Apesar da distncia, esto sempre por perto. Ao meu av, em especial, por sempre ter acreditado e investido em mim atravs dos meus estudos. Muito disso se deve ao senhor, v! Muito obrigada a todos!

Por vezes sentimos que aquilo que fazemos no seno uma gota de gua no mar. Mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota. Madre Teresa de Calcut

RESUMO

Mesmo apresentando uma curva visivelmente descendente, a mortalidade infantil , ainda, um grande problema de sade pblica, principalmente quando se reconhece que mais de 90% das mortes de menores de um ano poderiam ser evitadas por aes de preveno, diagnstico e tratamento precoces. O municpio de Paracatu-MG, nos anos de 2005 e 2006, apresentou Taxa de Mortalidade Infantil superior s taxas do Brasil e do estado de Minas Gerais. Tendo em vista essa problemtica, este trabalho teve como objetivo identificar os fatores associados mortalidade infantil no municpio de Paracatu-MG, com base nos dados disponveis nas Declaraes de bito referentes aos anos de 2005 e 2006. Para tanto, optou-se por estudar as declaraes de bito arquivadas no Cartrio Civil de Pessoas Naturais, onde foram realizadas duas visitas e, com o auxlio de um questionrio padronizado, coletaram-se todas as informaes pertinentes a esta pesquisa. Os resultados foram preocupantes: o maior nmero de mortes foi observado nas reas perifricas do municpio; houve quantidade considervel de bitos de filhos de mes adolescentes, bem como de mes com baixo grau de escolaridade; a prematuridade foi a principal causadora dos bitos, seguida por sepse; muitas declaraes de bito apresentavam mais de um item no preenchido, o que dificultou a construo de estatsticas representativas sobre a mortalidade infantil no municpio. Considerando os princpios e diretrizes norteadores da atuao da equipe da ESF, a evitabilidade das causas da mortalidade apresentada e a possibilidade da melhoria no preenchimento das DO, os dados provenientes deste estudo sero encaminhados ao Gestor Municipal do SUS, os quais se espera que possam subsidiar as aes, bem como outros estudos, visando efetivao e eficcia da assistncia prestada e, consequentemente, o controle da mortalidade infantil.

Palavras-chave: Mortalidade Infantil. Taxa de Mortalidade Infantil. Sistema de Informao sobre Mortalidade.

ABSTRACT

Even displaying an evidently descending curve, infant mortality still is a huge problem of public health, especially when is known that the death of more than 90% of 1- year old babies could be avoided using methods of forward prevention, diagnosis and treatment. In the years of 2005 and 2006, the city of Paracatu displayed a higher infant mortality rate compared to Brazil and to the State of Minas Gerais. In view of this situation, this study had as objective the identification of factors related to infant mortality in the city of Paracatu, basing on available data on death certificates referring to the years of 2005 and 2006. For so, it was chosen to study the death certificates that are stored at the Office of Vital Statistics, where to two visits were done and, with the help of a standardized questionnaire, all relevant data to this research was collected. The results were disturbing: the biggest number of deaths was observed at the peripheral areas of the city; there was a considerable amount of deaths of newborn children from teenage mothers, as well as mothers with low degree of education; prematurity was the main cause of the deaths, followed by sepsis; many death certificates presented more than one non-filled item, what complicated on the construction of representative statistics about infant mortality in the city. Considering the principles and guidelines that rules the operation of ESF team, the avoidability of mortality causes presented and the possibility of improvement on the DOs fulfilling, the resulting data of this study will be sent to the SUS Municipal Manager, of which it is waited they can subsidize the actions, as well as others studies, aiming the effectuation and efficiency of the given assistance and, as result, the restrain of the infant mortality.

Keywords: Infant Mortality. Infant Mortality Rate. Mortality Information System.

LISTA DE ILUSTRAES

FIGURA 1 Distribuio per capita dos Recursos Financeiros da Ateno Bsica em reais/hab./ano. BRASIL 1998 e 2006........................................................35 FIGURA 2 Evoluo da Implantao das Equipes Sade da Famlia BRASIL 1998 e fevereiro/2010.........................................................................................36

LISTA DE TABELAS

TABELA 1 bitos de menores de 1 ano, por neonatal precoce, neonatal tardio e ps-neonatal, segundo as Grandes Regies do Brasil - 2006 (%).................22 TABELA 2 Distribuio dos nascidos vivos de acordo com a idade nos bitos e coeficientes, segundo o ano de ocorrncia. Paracatu/MG - 2010.....................46 TABELA 3 Relao entre a idade das mes das crianas que foram a bito e os anos de estudo concludos por elas, em 2005. Paracatu/MG - 2010...........49 TABELA 4 Relao entre a idade das mes das crianas que foram a bito e os anos de estudo concludos por elas, em 2006. Paracatu/MG - 2010...........49

LISTA DE GRFICOS

GRFICO 1 Evoluo da taxa de mortalidade infantil (menos de 1 ano) no Brasil, 1991 - 2006 (por mil nascidos vivos) ...................................................................................19 GRFICO 2 Ranking dos Estados do Brasil segundo a taxa de mortalidade infantil, 2006 (por mil nascidos vivos).......................................................................................20 GRFICO 3 Proporo de Consultas de Pr-natal por Regio do Brasil (2005) .........25 GRFICO 4 Distribuio dos bitos de acordo com o bairro de residncia, no ano de 2005. Paracatu/MG - 2010...........................................................................................45 GRFICO 5 Distribuio dos bitos de acordo com o bairro de residncia, no ano de 2006. Paracatu/MG - 2010...........................................................................................45 GRFICO 6 Distribuio da faixa etria das mes de acordo com as DO do ano de 2005. Paracatu/MG - 2010...........................................................................................47 GRFICO 7 Distribuio da faixa etria das mes de acordo com as DO do ano de 2006. Paracatu/MG - 2010...........................................................................................47 GRFICO 8 Distribuio do nmero de filhos nascidos vivos por mulher, em 2005. Paracatu/MG - 2010.....................................................................................................50 GRFICO 9 Distribuio do nmero de filhos nascidos mortos por mulher, em 2005. Paracatu/MG - 2010.....................................................................................................51 GRFICO 10 Distribuio do nmero de filhos nascidos vivos por mulher, em 2006. Paracatu/MG - 2010.....................................................................................................51 GRFICO 11 Distribuio do nmero de filhos nascidos mortos por mulher, em 2006. Paracatu/MG - 2010.....................................................................................................52 GRFICO 12 Distribuio da durao da gestao (em semamas), em 2005, Paracatu/MG - 2010.....................................................................................................53 GRFICO 13 Distribuio da durao da gestao (em semamas), em 2006, Paracatu/MG - 2010.....................................................................................................53 GRFICO 14 Distribuio das causas bsicas das mortes, em 2005. Paracatu/MG 2010.............................................................................................................................55 GRFICO 15 Distribuio das causas bsicas das mortes, em 2006. Paracatu/MG 2010.............................................................................................................................55 GRFICO 16 Distribuio da efetividade do preenchimento do Bloco V da DO, em 2005 e 2006, Paracatu/MG - 2010...............................................................................58

LISTA DE SIGLAS

ACS Agentes Comunitrios de Sade AIDPI Ateno Integrada s Doenas Prevalentes na Infncia CID Classificao Internacional de Doenas CNBB Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil DATASUS Departamento de Informtica do Sistema nico de Sade DN Declarao de Nascido Vivo DO Declarao de bito ESF Estratgia Sade da Famlia HIV Vrus da Imunodeficincia Humana IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IML Instituto Mdico Legal MS Ministrio da Sade NOB Norma Operacional Bsica NV Nascido vivo OMS Organizao Mundial de Sade ONU Organizao das Naes Unidas OPAS Organizao Pan-Americana de Sade PAB Piso da Ateno Bsica PACS Programa de Agentes Comunitrios de Sade PIB Produto Interno Bruto PSF Programa Sade da Famlia SIAB - Sistema de Informao da Ateno Bsica SIM Sistema de Informaes sobre Mortalidade SINASC Sistema de Informaes sobre Nascidos Vivos SUS Sistema nico de Sade SVO Servios de Verificao de bitos TMI Taxa de Mortalidade Infantil UBS Unidade Bsica de Sade UNICEF Fundo das Naes Unidas para a Infncia

SUMRIO

1 INTRODUO...............................................................................................13 1.1 Objetivos....................................................................................................17 1.1.1 Objetivo Geral.........................................................................................17 1.1.2 Objetivos especficos............................................................................17 2 MORTALIDADE INFANTIL...........................................................................18 2.1 Componentes da Taxa de Mortalidade Infantil e principais causas de morbimortalidade............................................................................................21 2.2 Sistema de Informao sobre Mortalidade (SIM) e Sistema de Informao sobre Nascidos Vivos (SINASC): principais problemas encontrados na coleta de dados...................................................................27 2.2.1 Fluxo da Declarao de bito..............................................................30 2.3 Estratgias e Polticas Pblicas que influenciaram positivamente a Taxa de Mortalidade Infantil............................................................................31 3 METODOLOGIA............................................................................................39 3.1 Tipo de Estudo..........................................................................................39 3.2 Local do Estudo........................................................................................39 3.3 Fonte dos Dados.......................................................................................40 3.4 Aspectos ticos........................................................................................40 3.5 Desenvolvimento do Estudo....................................................................41 4 RESULTADOS E DISCUSSO.....................................................................43 5 CONCLUSO................................................................................................60 REFERNCIAS.................................................................................................61 APNDICE........................................................................................................71 ANEXO..............................................................................................................76

12

1 INTRODUO

A sade pblica brasileira sofreu muitas modificaes para chegar ao que hoje. Ela evoluiu atravs dos anos, de simples agncia de luta contra doenas transmissveis at integrar-se ao plano de desenvolvimento socioeconmico da sociedade moderna. (FIGUEIREDO, 2005, p.261). Para Fleury (2009), a Reforma Sanitria foi o principal movimento de luta pela democratizao da sade. A construo do projeto da reforma sanitria fundamentou-se na noo de crise do conhecimento e da prtica mdica, do autoritarismo, do estado sanitrio da populao e do sistema de prestao de servios de sade. A situao sanitria da populao era to precria que milhares de pessoas tiveram suas mortes provocadas por doenas vinculadas ao meio em que viviam, como em 1971, quando uma epidemia de meningite se alastrou pelas principais cidades brasileiras, atingindo principalmente a populao residente na periferia. (BERTOLLI FILHO, 2008, p.52). As lutas poltico-sociais promoveram mudanas que, paulatinamente, foram moldando o sistema de sade brasileiro. Criou-se, a partir da Constituio Federal de 1988, o Sistema nico de Sade (SUS), que apesar das adversidades, uma poltica pblica que garante incluso social a todos os brasileiros, independente de classe social, e oferece acesso indiscriminado s aes de sade, sejam curativas, preventivas ou de promoo de sade. (ASSIS et al., 2009). Segundo Heller (1998), saneamento constitui o controle de todos os fatores do meio fsico do homem, que exercem ou podem exercer efeitos deletrios sobre seu estado de bem estar fsico, mental ou social. Destacam-se as aes de abastecimento de gua, esgotamento sanitrio, limpeza pblica, drenagem pluvial e controle de vetores de doenas transmissveis. De acordo com dados obtidos atravs do Departamento de Informtica do Sistema nico de Sade (DATASUS), no Brasil, 75,8% da populao conectada rede coletiva de gua; apenas 44,4% tm acesso ao sistema coletivo de esgotos; e 76,4% tm acesso a servios de coleta de lixo. (BRASIL, 2009).

13

Deve-se ter claro que a persistncia da problemtica do saneamento encontra-se fortemente vinculada ao modelo scio-econmico praticado e que a populao mais vulnervel corresponde justamente quela excluda dos benefcios do desenvolvimento. Percebe-se que h, ento, uma forte relao entre meio ambiente e sade, visto que pases com melhores coberturas por saneamento tm populaes mais saudveis. (HELLER, 1998). Para Santiago e outros (2008), a sade resultado de um processo de produo social que expressa a qualidade de vida de uma populao. Contudo, como avaliar a sade de um grupo de indivduos? Existem vrios instrumentos que avaliam a qualidade da assistncia de sade prestada populao. Os indicadores de sade compem esses instrumentos e, quando expressos em frequncias relativas, fornecem dados que medeia a tomada de decises pelos gestores de sade. A Taxa de Mortalidade Infantil (TMI), que expressa o risco de uma criana vir a morrer antes de completar o primeiro ano de vida, tem sido um indicador largamente utilizado para avaliar o nvel global de sade e as condies de vida de uma populao. (FRIAS et al., 2009). As precrias condies socioeconmicas e ambientais, aliadas dificuldade de acesso aos servios de sade constituem os principais fatores condicionantes e/ou determinantes dos bitos infantis. (VIDAL et al., 2003). Pelo fato de a TMI ser um indicador que expressa tantas variveis, a melhora isolada em uma delas no suficiente para alter-la. necessrio intervir em um conjunto de fatores para que, enfim, seja possvel reduzir essa taxa. Costa e outros (2003) afirmam, por exemplo, que nos ltimos anos, a queda da TMI coexistiu com grave crise econmica em diversos pases em desenvolvimento. Alguns autores tm apontado como possveis explicaes para o declnio persistente da TMI a adoo de polticas pblicas, como intervenes mdico-sanitrias, ampliao da rede de abastecimento de gua e aumento da escolaridade, aliadas atuao subjacente da reduo da fecundidade. Outros indicadores ligados sade infantil, tais como aumento do perodo de aleitamento materno, aumento do percentual de crianas vacinadas e avanos na assistncia pr-natal tambm colaboraram para o avano da sade infantil como um todo. (COSTA et al., 2003; HOLCMAN; LATORRE; SANTOS, 2004).

14

No Brasil, a mortalidade infantil por 1000 nascidos vivos sofreu uma queda significativa, passando de 21,3 em 2000, para 16,4 em 2006. (BRASIL, 2009). Mesmo apresentando uma curva visivelmente descendente, a mortalidade infantil , ainda, um grande problema de sade pblica, principalmente quando se reconhece que mais de 90% das mortes de menores de um ano poderiam ser evitadas por aes de preveno, diagnstico e tratamento precoces. (BEZERRA FILHO et al., 2007). No Estado de Minas Gerais, nos anos de 2000 e 2006, a TMI foi de 20,8 e 16,3 nascidos vivos, respectivamente. (BRASIL, 2009). O Municpio de Paracatu localiza-se na regio Noroeste do estado de Minas Gerais, estimadamente com 83.557 mil habitantes em 2009. Apesar de ser detentor de uma das maiores rendas do estado, principalmente por abrigar empresas de extrao de ouro e minrio, no perodo de 2002 a 2006 apresentou um aumento significativo na TMI. Em 2005 e 2006, este indicador correspondeu a 18,9 e 20,0, respectivamente, nmeros superiores aos do estado de Minas Gerais e do Brasil, no mesmo perodo. (BRASIL, 2009). Apesar de ter grande importncia na gerao de informaes, a TMI sofre com alguns problemas. No Brasil, este indicador muitas vezes afetado pelo sub-registro de nascimentos e bitos. A subnotificao torna os dados menos condizentes com a realidade por provocar uma margem de erro maior, promovendo uma queda artificial dos coeficientes e levando falsa impresso de que as condies de sade so satisfatrias. (MENDONA; GOULART; MACHADO, 1994; SANTA HELENA; ROSA, 2003). Verifica-se ainda falhas no preenchimento correto das Declaraes de bito (DO) pelos profissionais mdicos, talvez por no terem sido devidamente ensinados nas escolas, ou por que, para a maioria deles, o atestado possui apenas escopo legal. (SANTA HELENA; ROSA, 2003). H, tambm, impreciso ao se preencher, na declarao, a causa bsica da morte doena ou leso que iniciou a cadeia de acontecimentos patolgicos que conduziram diretamente morte, ou as circunstncias do acidente ou violncia que produziram a leso fatal. de extremo valor que este campo seja preenchido corretamente, pois intervindo sobre os fatores que provocam a morbimortalidade que, quase sempre, as aes podero ser mais

15

eficientes e eficazes sobre a reduo das taxas de mortalidade infantil. (MENDONA; GOULART; MACHADO, 1994; MONTEIRO; SCHMITZ, 2004). O presente estudo justifica-se pelo fato de que, apesar da melhora da acessibilidade e da implementao de polticas pblicas voltadas para a melhoria da assistncia sade, ainda permanece alta a taxa de mortalidade infantil em Paracatu. Torna-se imprescindvel a investigao do perfil da mortalidade infantil no municpio, a fim de que estas informaes possam subsidiar a elaborao de aes que fomentem a melhoria das condies de vida da populao e, consequentemente, dos indicadores de sade.

16

1.1 Objetivos

1.1.1 Objetivo Geral

Identificar os fatores associados mortalidade infantil no municpio de Paracatu-MG, com base nos dados disponveis nas Declaraes de bito referentes aos anos de 2005 e 2006.

1.1.2 Objetivos Especficos

Identificar as reas onde ocorreu o maior nmero de bitos infantis; Identificar as principais causas de mortes infantis; Conhecer, entre o perodo neonatal e o ps-neonatal, aquele em que a criana est mais sujeita a morrer, no municpio de Paracatu; Relacionar grau de escolaridade da me e mortalidade infantil; Relacionar idade da me e mortalidade infantil.

17

2 MORTALIDADE INFANTIL

A TMI representa o nmero de bitos de menores de um ano de idade, por mil nascidos vivos, na populao residente em determinado espao geogrfico e perodo. um indicador de sade que exprime condies de saneamento, habitao, educao, nutrio, assistncia pr-natal e ao parto, ou seja, as condies socioeconmicas da populao, alm de estimar o nmero de crianas que sobrevivero ao seu primeiro ano de vida. (SOUSA; LEITE FILHO, 2008; SANTA HELENA; ROSA, 2003). As crianas menores de um ano esto mais propensas a morrer por determinantes sociais do que os indivduos adultos, devido ao organismo infantil ser um complexo psicobiolgico em formao, com a capacidade de defesa s agresses externas naturalmente reduzida, sendo frequentemente expostas a inmeras doenas e complicaes que potencializam o risco da morte infantil. (SILVA et al., 2006). O conhecimento dos nveis de mortalidade infantil de uma dada comunidade constitui um elemento precioso para a anlise da situao de sade, auxiliando na avaliao de programas e na vigilncia epidemiolgica dos agravos sade. Tambm norteia a identificao de grupos populacionais mais expostos ao risco de adoecer e morrer. (MONTEIRO; SCHMITZ, 2004). A TMI sofre grandes disparidades no que diz respeito a pases desenvolvidos e em desenvolvimento. Segundo Bezerra Filho e outros (2007), em pases em desenvolvimento, como os da frica Central, esta atinge mdia de 113 bitos de crianas menores de um ano por mil nascidos vivos (nv), seguidos dos pases asiticos, cuja taxa global de 55 bitos por mil nv. Na Europa, essa taxa de 9 bitos por mil nv e na Amrica do Norte, alcana o patamar de sete bitos por mil nv. A Amrica do Sul detentora do valor mdio de 31 bitos por mil nv. No Brasil, houve grande declnio da TMI nos ltimos 20 anos (Grfico 1). Entretanto, ainda que se tenha atingido esse descenso, a mortalidade infantil no pas ainda alta. Em 2004, o Brasil apresentava TMI de 17,9 nv, nveis ainda elevados se comparado com pases desenvolvidos, como a

18

Frana (6 nv), Portugal (9 nv), Japo (4 nv), e Estados Unidos (7 nv). (BRASIL, 2009; HOLCMAN; LATORRE; SANTOS, 2004).

Grfico 1: Evoluo da taxa de mortalidade infantil (menos de 1 ano) no Brasil, 1991 - 2006 (por mil nascidos vivos) Fonte: IBGE/DPE/Coordenao de Populao e Indicadores Sociais (COPIS), citado por UNICEF (2008) Em relao iniquidade, a taxa de mortalidade infantil para ndios e negros maior do que para a populao branca. A taxa de mortalidade para a populao indgena de 48,5 por mil nascidos vivos (138% maior do que para a populao branca), enquanto para a populao negra de 27,9 por mil (37% maior do que para a populao branca). A taxa para a populao branca de 20,3 por mil nascidos vivos. (UNICEF, 2008, p. 29).

Dentro do territrio brasileiro, a TMI se apresenta extremamente heterognea o Brasil um pas com grande extenso geogrfica e disparidades regionais acentuadas, o que favorece indicadores de sade tambm dspares. Estados do Sul e Sudeste apresentavam, em 2006, valores de mortalidade infantil, em mdia, de 13,9 nv, enquanto os estados da regio Nordeste apresentavam TMI de 19,3 nv, no mesmo perodo. Das 27 Unidades da Federao brasileiras, apenas oito tm taxas de mortalidade infantil abaixo de 20/1000 nascidos vivos, o que pode ser visualizado no grfico 2. (UNICEF, 2008, p. 27; BRASIL, 2009). Esse fato poderia ser resultado de um impacto diferenciado das aes de sade sobre determinadas

19

reas ou segmentos sociais ou resultado de polticas diferenciadas de ateno sade infantil. (CALDEIRA et al., 2005).

Grfico 2: Ranking dos Estados do Brasil segundo a taxa de mortalidade infantil, 2006 (por mil nascidos vivos) Fonte: IBGE/DPE/Coordenao de Populao e Indicadores Sociais (COPIS), citado por UNICEF (2008)

Para Costa e outros (2003), at os anos setenta, a mortalidade infantil era entendida como um problema de subdesenvolvimento socioeconmico, pois, quase sempre, encontrava-se inversamente associada a indicadores como o Produto Interno Bruto (PIB), a taxa de desemprego, entre outros. Esta relao era explicada pelo papel desempenhado por esses indicadores na configurao do perfil da renda, educao, saneamento e acesso aos programas e servios de sade que, consequentemente, produziam uma melhora nas condies de vida da populao. Todavia, principalmente a partir do final daquela dcada, a tendncia persistentemente decrescente da

20

mortalidade infantil nos pases em desenvolvimento coexistiu com grave crise econmica caracterizada por reduo do PIB, do valor real do salrio mnimo e da elevao do desemprego. Esse paradoxo pode ser explicado pelo desenvolvimento de algumas aes de sade pblica que tm favorecido o aumento da sobrevida infantil, como a melhoria da ateno ao pr-natal e ao parto, o acesso aos avanos tecnolgicos, o uso da terapia de reidratao oral, o incentivo ao aleitamento materno, a ateno s doenas prevalentes na infncia e a ampliao da cobertura vacinal. (ALVES et al., 2008). Sousa e Leite Filho (2008) apontam ainda como grandes responsveis pela reduo da mortalidade infantil no Brasil maiores nveis de acesso gua tratada e saneamento, bem como o aumento da escolaridade, da renda per capita e a reduo na taxa de fecundidade.

2.1 Componentes da Taxa de Mortalidade Infantil e principais causas de morbimortalidade

A taxa de mortalidade infantil (TMI) representa um dos indicadores mais comumente empregados para anlise da situao de sade de um pas. Classicamente dividida em dois perodos: o neonatal, que estima o risco de bito nos primeiros 27 dias de vida e o psneonatal, que estima o risco de bito entre 28 dias de vida at o final do primeiro ano de vida. Enquanto a mortalidade neonatal est intrinsecamente relacionada s condies de gestao, do parto e da prpria integridade fsica da criana, a mortalidade ps-neonatal est mais associada s condies socioeconmicas e do meio ambiente, com predomnio das causas infecciosas. (CALDEIRA et al., 2005, p. 68).

A TMI pode ter seus componentes calculados separadamente, como pode ser verificado atravs da tabela 1.

21TABELA 1 bitos de menores de 1 ano, por neonatal precoce, neonatal tardio e ps-neonatal, segundo as Grandes Regies do Brasil - 2006 (%)

Regio/UF

Brasil Regio Norte Regio Nordeste Regio Sudeste Regio Sul Regio Centro-oeste Fonte: MS/SVS/DASIS - Sistema de Informaes sobre Mortalidade (SIM), citado por UNICEF (2008)

Neonatal precoce (0 a 6 dias) 51% 50% 52% 51% 51% 50%

Neonatal tardio (7 a 27 dias) 15% 13% 13% 18% 17% 17%

Ps-neonatal (28 a 364 dias) 33% 37% 35% 31% 32% 33%

A fase perinatal considerada o percurso da gravidez a partir da 22 semana de gestao ao stimo dia de vida, momento em que se manifestam, com maior clareza, as doenas genticas, os problemas relacionados sade da me, dentre outros. (QUEIROZ et al., 2007). Vrios trabalhos apontam para um declnio da Taxa de Mortalidade Infantil no Brasil, nas trs ltimas dcadas. Essa queda tem se manifestado mais no componente ps-neonatal, por ser este mais susceptvel s aes de promoo, preveno, diagnstico e tratamento precoce, mediante o emprego de tecnologias simplificadas e de baixo custo, alm da melhoria das condies ambientais. J o componente neonatal tem apresentado um decrscimo mais lento, provavelmente por estar associado tanto a fatores biolgicos, de preveno mais difcil, como ao acesso e qualidade da assistncia pr-natal, ao parto e ao recm-nascido, uma vez que reflete melhor a qualidade da ateno sade recebida pelas crianas e mes do que o bem-estar social. (VIDAL et al., 2003). Em 1980, pelo menos 50% dos bitos aconteciam no perodo psneonatal. Com a queda desse componente, ocorreu o deslocamento dos bitos para o perodo neonatal, principalmente no perodo precoce que corresponde aos sete primeiros dias de vida. Do mesmo modo, houve um grande declnio nos bitos devido s causas pertencentes ao conjunto de doenas infecciosas e parasitrias, doenas endcrinas, metablicas e nutricionais e de doenas do sistema respiratrio, que, em 1980, representavam juntas quase 70% dos bitos. (HOLCMAN; LATORRE; SANTOS, 2004).

22

Segundo Caldeira e outros (2005), nos pases desenvolvidos, o componente ps-neonatal pouco expressivo. Mas no Brasil, apesar do decrscimo acelerado nos ltimos anos, ainda h nveis elevados, eticamente inaceitveis. Esse fato particularmente importante quando se considera que a baixa efetividade dos servios de assistncia sade infantil representa um dos determinantes da mortalidade ps-neonatal por causas reconhecidamente evitveis. Ao contrrio do que ocorre em pases desenvolvidos, as complicaes que se estabelecem durante a gestao e parto so as que representam as maiores causas de morte entre os neonatos no Brasil, sendo responsveis por, aproximadamente, 80% das mortes neonatais e 50% da mortalidade infantil. (MONTEIRO; SCHMITZ, 2004). Existem algumas doenas e agravos em sade que constituem os principais causadores de mortes infantis. Holcman, Latorre e Santos (2004), utilizando os captulos da Classificao Internacional de Doenas (CID) 9a reviso, classificaram as cinco principais causas de bito do perodo de 1980 a 1995, sendo elas: captulo I (doenas infecciosas e parasitrias), III (doenas endcrinas nutricionais metablicas e transtornos imunitrios), VIII (doenas do aparelho respiratrio), XIV (anomalias congnitas) e XV (algumas afeces originadas no perodo perinatal). Para Alves e outros (2008), as causas de mortalidade infantil no Brasil sofreram modificaes ao longo dos anos. A partir da dcada de 1980, observou-se declnio das doenas infecciosas associadas desnutrio, bem como aumento das afeces perinatais, atualmente responsveis por mais de 50% dos bitos no primeiro ano de vida. As doenas infecciosas e parasitrias consistem em uma causa de bito infantil intimamente relacionada com fatores socioeconmicos e ambientais. Em 2005, estas doenas foram responsveis por 3.707 bitos em menores de um ano no Brasil, ocupando o terceiro lugar no ranking da mortalidade infantil, quando se exclui o grupo de sinais e sintomas mal definidos. Para determinados grupos populacionais, a sua ocorrncia mais expressiva devido s precrias condies de vida. Esse grupamento de doenas destaca-se como uma das principais causas de internaes

23

hospitalares e mortalidade infantil no Brasil e no mundo. (VILELA; BONFIM; MEDEIROS, 2008). A diarria, manifestao comum de doenas infecciosas intestinais, ainda representa uma das principais causas de mortalidade infantil nos pases em desenvolvimento, por envolver, de forma direta ou indireta, um emaranhado de fatores de ordem ambiental, nutricional e scio-econmico-cultural. (GUIMARES et al., 2001). Segundo Oliveira e Latorre (2010), no Brasil, somente na segunda metade do sculo XX que o nmero de mortes por diarria comeou a decair. Em 1970, foram implantadas Polticas de saneamento bsico no pas, resultando em uma grande melhora na taxa de mortalidade infantil. Outras medidas, como a introduo da terapia de reidratao oral, diminuio da desnutrio infantil e melhora no acesso a servios de sade podem ser apontadas como as principais responsveis pelo declnio na mortalidade por diarria no territrio brasileiro. Entretanto, apesar da significativa queda na magnitude dessa doena, a diarria parece representar, para parte do Pas, um importante problema de sade pblica. Segundo dados oficiais, no perodo de 1995 a 2005, ocorreram 39.421 mortes por diarria e 1.505.800 internaes associadas a esta doena em crianas menores de um ano de idade no Brasil. As malformaes congnitas caracterizam-se pela presena de um defeito fsico ao nascimento, podendo ou no ter etiologia gentica. Os principais fatores etiolgicos so as condies hereditrias (genticas), exposio a substncias (medicamentos, lcool e drogas ilcitas), infeces (citomegalovirose, rubola e toxoplasmose) e radiaes, sendo que na maioria das vezes as razes so desconhecidas. (ARRUDA; AMORIM; SOUZA, 2008). No Brasil, as malformaes congnitas constituem a segunda causa de mortalidade infantil. O aumento das taxas est provavelmente relacionado maior sobrevida das crianas com malformaes e ao deslocamento desses bitos do perodo neonatal para o ps-neonatal devido melhoria da assistncia ao recm-nascido e ao maior acesso a unidades de tratamento intensivo. Apesar das mortes por malformaes congnitas serem de difcil preveno, sabe-se que um pr-natal de boa qualidade pode contribuir ao desaconselhar o uso de lcool e drogas e diagnosticar e tratar afeces maternas de forma adequada. (AMORIM et al., 2010; ALVES et al., 2008).

24

A Organizao Mundial de Sade (OMS) recomenda que sejam realizadas, no mnimo, seis consultas pr-natais. No Brasil, aproximadamente 53% das gestantes realizaram mais de 6 consultas durante o pr-natal. Enquanto nas regies Sudeste e Sul, respectivamente, 67% e 68% das mulheres realizam sete ou mais consultas pr-natais, no Norte e Nordeste esse nmero de 29% e 35%, respectivamente (Grfico 3). (UNICEF, 2008).

Grfico 3: Proporo de Consultas de Pr-natal por Regio do Brasil (2005) Fonte: MS/SVS/DASIS/SINASC, citado por UNICEF (2008)

Segundo Silva e outros (2006), a garantia de assistncia pr-natal de qualidade adequadamente conduzida e a organizao da assistncia em sistemas hierarquizados e regionalizados de forma a garantir acessibilidade gestante, pode detectar doenas maternas e fetais, aumentando assim a probabilidade de sobrevivncia do recm-nascido e reduzindo a prevalncia de retardo do crescimento intra-uterino, a prematuridade e a ocorrncia de baixo peso ao nascer. Em 2003, as causas perinatais eram responsveis por 55,4% dos bitos infantis no Brasil. Destas, 61,4% esto associadas com a prematuridade, como sndrome de sofrimento respiratrio, hipxia e outros problemas respiratrios, o que lhe confere um importante papel nos bitos infantis. Em relao a fatores de risco para a ocorrncia de prematuridade, alguns estudos apontam o baixo peso materno pr-gestacional, extremos de idade materna, histria prvia de natimorto, tabagismo na gravidez, ganho de peso materno

25

insuficiente, hipertenso arterial, sangramento vaginal, infeco do trato geniturinrio, cinco ou menos consultas no pr-natal, baixa escolaridade, pertencer fora de trabalho livre e trabalhar em p. (SILVEIRA et al., 2008). Segundo Maranho citado por Kilsztajn e outros (2003), a assistncia ao recm-nascido com afeces do perodo perinatal apresenta elevados custos financeiros e a demanda por tecnologia sofisticada poderia ser reduzida se houvesse um adequado monitoramento da mulher durante o perodo gestacional, identificando e reduzindo os riscos na gravidez e no parto. Para Mariotoni e Barros Filho (2000), o peso ao nascer forte preditor de morbimortalidade infantil, pois inversamente proporcional ao risco de mortalidade dentro do primeiro ano de vida. Assim, constitui-se meta da OMS incentivar programas que objetivem a diminuio de nascimentos com menos de 2.500 g, contribuindo, consequentemente, para taxas de mortalidade infantil menores. Seria desejvel que ao menos 85% dos recm-nascidos tivessem peso maior ou igual a 3.000 g. Contudo, as cidades brasileiras esto longe de apresentarem essa frequncia. O conceito de morte infantil "evitvel" no recente e implica na disponibilidade de servios de sade eficazes, de boa qualidade. bitos infantis evitveis podem ser classificados como aqueles que no deveriam ter ocorrido, se forem consideradas a cincia e a tecnologia existentes na atualidade. Essas mortes evitveis, alm de serem consideradas eventos sentinela para avaliar a qualidade da assistncia, so chamadas bitos desnecessrios ou ainda bitos consentidos. Em geral, as suas complicaes podem ser evitadas pelo acompanhamento prximo, identificando-se situaes ou crianas de maior risco para uma atuao mais efetiva. Portanto, no caso de ocorrncia de bitos infantis, devem ser observadas as falhas nos servios ou na ateno sade. (CALDEIRA et al., 2005; MATHIAS; ASSUNO; SILVA, 2008). Investigar as causas da mortalidade , antes de tudo, estudar a sociedade que produz sua sade, doena e morte, exemplo extremo de privao da qualidade de vida do cidado. investigar os efeitos de um modelo de desenvolvimento que produz condies de vida e de trabalho que expem, de maneira desigual, as famlias e os indivduos a determinantes de risco ou proteo que iro, por sua vez, potencializar ou fragilizar sua sade. O nmero de mortes pode ser controlado mesmo em comunidades que apresentam

26

precrias

condies

de

desenvolvimento

scio-econmico.

Entretanto,

depende sempre de deciso poltica, organizao dos servios de sade e da rea social e adoo de aes educativas permanentes. (MATHIAS; ASSUNO; SILVA, 2008).

2.2 Sistema de Informao sobre Mortalidade (SIM) e Sistema de Informao sobre Nascidos Vivos (SINASC): principais problemas encontrados na coleta de dados

O Sistema de Informao sobre Mortalidade (SIM) foi criado pelo Ministrio da Sade (MS) em 1975, para a obteno regular de dados sobre mortalidade. O sistema proporciona a produo de estatsticas de mortalidade e a construo dos principais indicadores de sade, permitindo estudos estatstico-epidemiolgicos e scio-demogrficos. No mesmo ano, o MS padronizou um modelo nico de DO (Anexo A) em nvel nacional, quando havia mais de quarenta tipos diferentes de Atestado de bito ento em uso. O modelo atual decorre de alteraes sofridas desde ento, com incluso ou alteraes de variveis, de modo a adequar essa declarao atualidade epidemiolgica. (BRASIL, 2001). Segundo Szwarcwald e outros (1997), o SIM/MS tem como base do sistema as informaes das prprias DO. Aps a coleta dos dados, as DO so classificadas por municpio de residncia do falecido, passando-se, a seguir, seleo da causa bsica do bito, levando-se em conta os critrios internacionais recomendados pela OMS. Para todos os bitos de menores de um ano, existe, na DO, um grupamento especial de variveis (Bloco V), cujo preenchimento obrigatrio. Essas variveis possibilitam a construo de estatsticas que auxiliam a compreenso das circunstncias do bito infantil e definio de grupos mais vulnerveis. (SOARES; HORTA; CALDEIRA, 2007). Segundo Frias e outros (2009), no Brasil, existem problemas tanto em relao notificao dos eventos de bito, principalmente entre os menores de um ano, quanto em relao confiabilidade dos dados, apesar da melhoria

27

apresentada ao longo do desenvolvimento do SIM. A subnotificao de eventos vitais (natalidade e mortalidade) tem sido um srio entrave ao conhecimento preciso de importantes indicadores epidemiolgicos, limitando o uso dos sistemas de informao na maioria dos estados brasileiros, o que tem acarretado prejuzos na produo de dados diretos fidedignos, geis e oportunos. O sub-registro de bitos no Brasil apresenta diferenas por regio, sendo superior no Norte e no Nordeste e por idade, com predomnio entre os menores de um ano. Tem grandeza to relevante na grande maioria das Unidades da Federao, que torna invivel a estimativa dos indicadores de mortalidade atravs da sua frmula definidora. (SZWARCWALD et al., 1997). Nessas regies, a existncia de cemitrios que no exigem a declarao de bito ou a guia de sepultamento do cartrio para o enterramento ou, at mesmo, a realizao de sepultamentos clandestinos, muitos no prprio quintal da residncia, tm sido determinados como fatores preponderantes para a subnotificao de bitos infantis. (FRIAS et al., 2009). Vrios estudos tm evidenciado a precariedade de preenchimento da DO, principalmente quanto qualidade da informao sobre a causa do bito. No Brasil, um dos estudos pioneiros sobre o tema, realizado em So Paulo, em 1962/1963, mostrou que apenas 67,6% dos bitos tinham a causa bsica registrada em algum campo da DO. Estudo semelhante foi repetido 10 anos depois, e o percentual de registro da causa bsica na DO (68,6%) no teve melhoria significativa. (MENDONA; GOULART; MACHADO, 1994). Para Carvalho e outros (1990), a declarao de bito encarada pelo mdico como uma exigncia legal para o sepultamento, sendo poucas vezes vista como geradora de dados sobre a sade de uma populao. Em 1948, foi estabelecida em Assemblia da Organizao Mundial de Sade, uma definio precisa de causa bsica de morte. Apesar disso, o seu preenchimento como um todo apresenta inmeros problemas. Os erros ocorrem em todos os campos da DO, desde a identificao, na qual informaes primordiais como local de residncia e local de ocorrncia do bito apresentam-se incompletos ou errados. Informaes como ocupao dos pais, histria gestacional ou peso ao nascer costumam ser simplesmente omitidas. Alm disso, continuam deixando de ser referidas as causas contribuintes ou associadas.

28

O mdico , legalmente, o responsvel por todas as informaes contidas na declarao de bito e no deve assinar um documento em branco ou deixar campos sem o devido preenchimento. Os campos relativos gestao e ao parto so preenchidos pelo mdico assistente, e sua m qualidade parece indicar mais uma falta de comprometimento do profissional de sade no registro dessas informaes, do que um desconhecimento do contedo que tinha de ser registrado nos pronturios. (SOARES; HORTA; CALDEIRA, 2007; SANTA HELENA; ROSA, 2003). Apesar de todos os problemas referidos, estes vm sendo reduzidos gradativa e lentamente desde a implantao do SIM-MS. (OLIVEIRA; LATORRE, 2010) Diante das limitaes das fontes de informaes, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), que o rgo responsvel por prover a estimativa da mortalidade infantil no Brasil, tem recorrido a tcnicas demogrficas, ditas de mensurao indireta, para substituir as estimativas clssicas. Tais tcnicas so baseadas em dados de entrevistas domiciliares realizadas por ocasio dos Censos Demogrficos ou das Pesquisas Nacionais de Amostra por Domiclio (PNAD). (SZWARCWALD et al., 2002). O fluxo das estatsticas de mortalidade tem incio com o registro do bito em cartrio, mediante a apresentao da DO. As informaes divulgadas pelo IBGE so oriundas da transcrio das informaes das DO em mapas mensais pelos Cartrios de Registro Civil que so enviados trimestralmente s superintendncias estaduais do IBGE e destas para o nvel central. (SZWARCWALD et al., 1997). igualmente oportuno citar que a abordagem adotada pelo IBGE impossibilita o monitoramento e a avaliao das aes de sade em curso, pois se fundamenta em pressupostos tericos nem sempre observados nas diferentes populaes das regies brasileiras, o que acaba por gerar interpretaes errneas e desestmulo aos gerentes e executores de programas de sade. (FRIAS et al., 2009). Assim, a existncia de sistemas de informaes acessveis e confiveis na esfera municipal condio essencial para a elaborao do diagnstico, planejamento adequado e para a programao de aes efetivas. (FRIAS et al., 2009).

29

No que se refere s informaes referentes aos nascimentos, em 1990, o MS implantou o Sistema de Informao sobre Nascidos Vivos (SINASC). Esse sistema tem base na Declarao de Nascido Vivo (DN), documento cuja emisso considerada obrigatria no servio de sade onde ocorreu o parto. (SZWARCWALD et al., 2002). Segundo Bohland e Jorge (1999), a implantao do SINASC tornou possvel, em nvel populacional, a caracterizao dos recm-nascidos do ponto de vista demogrfico e epidemiolgico, a partir de dados secundrios. O formulrio da DN possui trs vias. A primeira deve ser encaminhada ou recolhida pela secretaria municipal de sade; a segunda, entregue famlia, que a levar ao cartrio para o pertinente registro de nascimento; a terceira deve ficar arquivada no pronturio do servio de sade responsvel pelo parto. (BRASIL, 2004). Embora seja perceptvel que a cobertura do SINASC esteja crescendo e que a qualidade da informao venha melhorando desde a sua implantao, sabe-se que a cobertura do sistema ainda no completa. A comparao entre o nmero de nascimentos ocorridos nos hospitais do Sistema nico de Sade e os declarados no SINASC mostra ainda deficincias na sua cobertura em alguns estados do pas, embora de menor magnitude que as apresentadas pelo SIM. (SCHRAMM; SZWARCWALD apud SZWARCWALD et al., 2002). O uso simultneo dos dois sistemas de informao SIM e SINASC permite estudos de mortalidade infantil segundo variveis comuns declarao de bito e declarao de nascido vivo. (BOHLAND; JORGE, 1999).

2.2.1 Fluxo da Declarao de bito

As declaraes de bito so impressas em trs vias pr-numeradas sequencialmente, pelo MS, e distribudas gratuitamente s secretarias estaduais de sade para subsequente fornecimento s secretarias municipais de sade, que as repassam aos estabelecimentos de sade, institutos mdicolegais (IML), servios de verificao de bitos (SVO), mdicos e cartrios. A primeira via recolhida nas Unidades Notificadoras, devendo ficar em poder do

30

setor responsvel pelo processamento dos dados, na instncia municipal ou na estadual; a segunda via entregue pela famlia ao cartrio do registro civil, devendo nele ficar arquivada para os procedimentos legais; a terceira via permanece nas Unidades Notificadoras, em casos de bitos notificados pelos estabelecimentos de sade, IML ou SVO para ser anexada documentao mdica pertencente ao falecido. No entanto, o fluxo varia em funo de onde ocorreu e do tipo de bito, sendo que, necessariamente, uma das trs vias sempre entregue pela famlia no cartrio do registro civil. (BRASIL, 2001). importante ressaltar que, das trs vias da DO, a primeira a que fornece os dados para o SIM; portanto, em qualquer situao, o seu destino a secretaria municipal de sade. (BRASIL, 2004).

2.3 Estratgias e Polticas Pblicas que influenciaram positivamente a Taxa de Mortalidade Infantil

Nos ltimos dez anos, inegvel que o Sistema nico de Sade (SUS) passou por transformaes importantes comparveis aos vrios momentos de modernizao dos setores produtivos no Brasil. (BRASIL, 2003, p. 113). As estratgias de sade propostas pelo governo brasileiro, tal como mostra a histria, nem sempre visavam o bem-estar da populao. As polticas de sade no pas refletem o momento vivido, a economia vigente e as classes dominadoras. (ROSA; LABATE, 2005). Aps dcadas de privilgio ateno hospitalar, herana da medicina previdenciria, em que a alocao de recursos da Unio em Estados e Municpios se dava com base principalmente na produo de servios e na capacidade instalada, os esforos, programas e investimentos pblicos passaram a se concentrar na ateno bsica. (ESCOREL et al., 2007). Essa transio se iniciou a partir da promulgao das Leis orgnicas da Sade 8.080 e 8.142 que regulamentam o SUS e a participao da comunidade na sua gerncia atravs das Conferncias e dos Conselhos de Sade, respectivamente.

31

O Programa Sade da Famlia (PSF) tem incio quando o MS formula, em 1991, o Programa de Agentes Comunitrios de Sade (PACS) com o intuito de contribuir para a reduo das mortalidades infantil e materna, principalmente nas regies norte e nordeste. Assim, a concepo do PSF se d em reunio ocorrida nos dias 27 e 28 de dezembro de 1993 em Braslia, Distrito Federal, sobre o tema Sade da Famlia, convocada pelo gabinete do Ministro da Sade Henrique Santillo com apoio do Fundo das Naes Unidas para a Infncia (UNICEF). A reunio esteve assentada na discusso de uma nova proposta a partir do xito do PACS e da necessidade de incorporar novos profissionais para que os agentes comunitrios de sade (ACS) no trabalhassem de forma isolada. (ROSA; LABATE, 2005). A Sade da Famlia entendida como uma estratgia de reorientao do modelo assistencial, operacionalizada mediante a implantao de equipes multiprofissionais em unidades bsicas de sade. Estas equipes atuam com aes de promoo da sade, preveno, recuperao, reabilitao de doenas e agravos mais frequentes, e na manuteno da sade desta comunidade. (BRASIL, 2010). A unidade de Sade da Famlia deve trabalhar com a demarcao de um territrio de abrangncia e adscrio da populao, sendo estes de responsabilidade da equipe de sade. Recomenda-se que, no mbito de abrangncia da unidade bsica, uma equipe seja responsvel por uma rea onde residam de 600 a 1.000 famlias, com o limite mximo de 4.500 habitantes. (BRASIL, 1997). Seguindo as diretrizes do MS, uma equipe de sade da famlia deve ser composta minimamente por um mdico, um enfermeiro, auxiliar de enfermagem ou tcnico de enfermagem e agentes comunitrios de sade. O nmero ACS suficiente para cobrir 100% da populao cadastrada, com um mximo de 750 pessoas por ACS de 12 ACS por equipe de Sade da Famlia. (BRASIL, 2006). A atuao das equipes ocorre principalmente nas unidades bsicas de sade, nas residncias e na mobilizao da comunidade, caracterizando-se, entre outros, por intervir sobre os fatores de risco aos quais a comunidade est exposta, prestando assistncia integral, permanente e de qualidade e por realizar atividades de educao e promoo da sade. E ainda, por estimular a

32

organizao das comunidades para exercer o controle social das aes e servios de sade; por utilizar sistemas de informao para o monitoramento e a tomada de decises; por atuar de forma intersetorial, por meio de parcerias estabelecidas com diferentes segmentos sociais e institucionais, de forma a intervir em situaes que transcendem a especificidade do setor sade e que tm efeitos determinantes sobre as condies de vida e sade dos indivduosfamlias-comunidade. (BRASIL, 2010). Embora rotulado primeiramente pelo MS como "programa", em outro documento (BRASIL, 1997), caracterizado como "estratgia" concebida como uma lgica diferente da interveno vertical e paralela s atividades dos servios de sade, que visa reverter o modelo vigente por meio da mudana de objeto da ateno, da forma de atuao e da organizao dos servios, com o objetivo de contribuir para a reorientao do modelo a partir da Ateno Bsica e de acordo aos princpios do SUS, imprimindo nova dinmica de atuao nas Unidades Bsicas de Sade (UBS), com definio de responsabilidades entre servios de sade e populao. (SISSON, 2007). A atualmente denominada Estratgia Sade da Famlia (ESF) representa o primeiro contato da populao com o servio de sade do municpio, garantindo a referncia e contra-referncia para os diferentes nveis do sistema, desde que identificada a necessidade de maior complexidade tecnolgica para a resoluo dos problemas identificados. (BRASIL, 1997). De acordo com Rosa e Labate (2005), desde que funcionando adequadamente, as equipes da ESF so capazes de resolver 85% dos problemas de sade em sua comunidade, prestando atendimento de bom nvel, prevenindo doenas, evitando internaes desnecessrias e melhorando a qualidade de vida da populao. A ESF no encontrou, no incio de sua implantao, um cenrio favorvel ao seu fortalecimento. O processo de formulao no estava totalmente concludo e no havia definies quanto ao seu financiamento (que era viabilizado por meio de convnios). Alm dessas restries, havia a prpria resistncia implantao de uma proposta que confrontava as formas tradicionais de organizao dos servios. (BRASIL, 2003). Com a Norma Operacional Bsica de 1996 (NOB/SUS/96) instrumento jurdico-institucional editado periodicamente pelo MS para

33

aprofundar e reorientar a implementao do SUS , foi criado o Piso de Ateno Bsica (PAB), pelo qual todo municpio teria um valor especfico repassado pelo Fundo Nacional de Sade ao Fundo Municipal de Sade, para viabilizar a ateno bsica de sade a toda a populao. O PAB apresentava tambm uma composio de recursos variveis, sob forma de incentivos para aes e projetos prioritrios, com destaque para o PACS e a ESF. Com a implantao do PAB (fixo e dos incentivos), a ESF passou a ter oramento prprio e foi includo no Plano Plurianual (PPA) do Governo Federal, em 1998. (BRASIL, 2003; ROSA; LABATE, 2005). Nos primeiros quatro anos de sua implantao, a ESF abrangia 3,51% da populao brasileira. Ao final de 1998, este percentual quase duplicou, atingindo 6,57% da populao. Em dezembro de 1999, existiam 4.114 equipes de Sade da Famlia, atuando em 1.646 municpios, que representam 29,9% dos municpios brasileiros. Eram aproximadamente 14 milhes de pessoas acompanhadas pelo programa, representando 8,8% da populao do pas. (BRASIL, 2003). Em 2007, havia um total de 27.324 equipes de Sade da Famlia implantadas, atuando em 5.125 municpios e abrangendo 46,6% da populao brasileira, o que corresponde a cerca de 87,7 milhes de pessoas. Com o aumento gradativo do nmero de equipes, consequentemente, o investimento tambm foi aumentando a cada ano (Figura 1). Enquanto em 2003 houve um investimento de R$1.662,80 milhes de reais na estratgia sade da famlia, em 2007, esse investimento foi de R$ 4.064,00 milhes. (BRASIL, 2010a).

34

Figura 1: Distribuio per capita dos Recursos Financeiros da Ateno Bsica em reais/hab/ano BRASIL 1998 e 2006 Fonte: DATASUS, citado por Brasil (2010a)

Atualmente, o modelo de Ateno Sade do Brasil referncia internacional, sendo a ESF modelo para outros pases. Estudos acadmicos em curso demonstram que a ESF, no perodo de 1992 a 2002, apresenta indicadores animadores, como a reduo da mortalidade infantil. Pesquisa realizada pelo MS, em parceria com a Universidade de So Paulo e Universidade de Nova York, demonstra que a cada 10% de aumento de cobertura, o ndice de mortalidade infantil cai em 4,6%. (BRASIL, 2010). A velocidade de expanso da ESF comprova a adeso de gestores estaduais e municipais aos seus princpios. Desde seu incio, em 1994, apresentou um crescimento expressivo nos ltimos anos (Figura 2).

35

Figura 2: Evoluo da Implantao das Equipes Sade da Famlia. BRASIL 1998 e fevereiro/2010 Fonte: Ministrio da Sade, citado por Brasil (2010a)

A OMS, juntamente com a Organizao Pan-Americana de Sade (OPAS) e o UNICEF, visando retificar o desequilbrio e a iniquidade existentes na sade infantil, criaram a estratgia de Ateno Integrada s Doenas Prevalentes na Infncia (AIDPI), adotada oficialmente pelo MS em 1996. (CUNHA; SILVA; AMARAL, 2001). A AIDPI tem por finalidade promover uma rpida e expressiva reduo da mortalidade na infncia e contribuir de maneira significativa com o crescimento e desenvolvimento saudveis das crianas, em especial daquelas que vivem em pases e regies menos desenvolvidas. (BRASIL, 2003a; CUNHA; SILVA; AMARAL, 2001, p. 34).No Brasil, a estratgia AIDPI foi adaptada s caractersticas epidemiolgicas da criana e s normas nacionais. As condutas preconizadas pela AIDPI incorporam todas as normas do Ministrio da Sade relativas promoo, preveno e tratamento dos problemas infantis mais freqentes, como aqueles relacionados ao aleitamento materno, promoo de alimentao saudvel, crescimento e desenvolvimento, imunizao, assim como o controle dos agravos sade tais como: desnutrio, doenas diarricas, infeces respiratrias agudas e malria, entre outros. A operacionalizao dessa estratgia vem sendo efetivada principalmente pelas Equipes de Sade da Famlia (ESF) e capilarizada em todo territrio nacional. (BRASIL, 2003a, p. 7).

Segundo Figueiras e outros (2005), a aplicao da AIDPI teve importantes benefcios para a qualidade da ateno prestada s crianas tanto

36

nos servios de sade como em casa e na comunidade. Entre eles, pode-se considerar que um dos mais importantes foi o fortalecimento de uma viso integrada da sade infantil, que possibilitou a mudana no foco de ateno das doenas especficas que podem afet-la. Em 2005, o Ministrio da Sade lanou a Agenda de Compromissos para a Sade Integral da Criana e Reduo da Mortalidade. O documento tem a finalidade de apoiar a organizao da assistncia populao infantil e possibilitar que os gestores e profissionais de sade identifiquem as aes prioritrias para a sade da criana e, para alcanar este objetivo, a assistncia organizada em linhas de cuidado como estratgia para superao da desarticulao entre os diversos nveis de ateno em sade (como o distanciamento entre a ateno bsica e a ateno hospitalar) e garantia de continuidade do cuidado integral, desde as aes de promoo s de tratamento e reabilitao, com um fluxo gil e oportuno em cada nvel de ateno (primria, secundria e terciria), com referncia e contra-referncia responsvel, at a recuperao completa do indivduo. (BRASIL, 2005, p. 8). A Estratgia Sade da Famlia e as demais estratgias adotadas pelo Ministrio da Sade, sem dvida, foram fundamentais para a reduo da mortalidade infantil ao longo destes anos. Mas existem algumas instituies do terceiro setor que esto trabalhando nesta causa h muito, e so coresponsveis pela melhora desta taxa. A Pastoral da Criana, organismo de Ao Social da Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), uma organizao comunitria, de atuao nacional, que tem como objetivo promover o desenvolvimento integral das crianas pobres, da concepo aos seis anos de idade, em seu contexto familiar e comunitrio, a partir de aes preventivas de sade, nutrio, educao e cidadania, realizadas por mais de 260 mil voluntrios capacitados. (PASTORAL DA CRIANA, 2010). De acordo com Barbosa (2008), a Pastoral da Criana tem sua origem em 1982, a partir de uma reunio da Organizao das Naes Unidas (ONU), em Genebra, na qual foi proposto D. Paulo Evaristo Arns que a Igreja

37

Catlica ajudasse a reduzir a mortalidade infantil no Brasil atravs de aes bsicas e de baixo custo. De volta ao Brasil, o ento cardeal Arns prope sua irm Zilda Arns Neumann, mdica sanitarista que trabalhava no servio pblico do Estado do Paran, que elaborasse um projeto piloto. Assim, um novo trabalho foi iniciado na Arquidiocese de Londrina no ano de 1983. Hoje, a Pastoral da Criana est presente em todos os estados do Brasil, em 4.066 municpios e 42.314 comunidades. As aes dos voluntrios ajudam a reduzir a desnutrio, a mortalidade infantil e ainda promovem a paz e a justia social nos grandes bolses de pobreza e misria do pas. So mais de 1,8 milhes de crianas e 95 mil gestantes acompanhadas pelos voluntrios. (PASTORAL DA CRIANA, 2010). Aes integradas entre esta instituio e o Governo Federal vm acontecendo h alguns anos. Segundo Barbosa (2008), foi a Pastoral da Criana que capacitou, em mbito nacional, os agentes da ESF para que esta fosse implantada. As formas de trabalho da ESF foram inspiradas na metodologia da Pastoral da Criana. Em 2002, o Brasil estava entre os pases que assinaram o documento da ONU denominado Um mundo para as crianas. Ao assinar este documento, os pases se comprometeram a, at 2015, diminurem em dois teros os bitos de crianas menores de 1 ano e de crianas menores de 5 anos. (UNICEF, 2005). Tudo indica que o Brasil conseguir cumprir esta meta. Mas para que isso possa tornar-se possvel, necessria a unio do governo, dos diversos setores e da sociedade.

38

3 METODOLOGIA

3.1 Tipo de Estudo

Trata-se de um estudo descritivo, retrospectivo, no amostral, com abordagem quantitativa. As investigaes epidemiolgicas, de cunho descritivo, tm a finalidade de informar sobre a distribuio de um evento, na populao, em termos quantitativos. O termo retrospectivo tem a conotao de utilizao de dados do passado. Quanto abordagem, o mtodo quantitativo permite avaliar a importncia, gravidade, risco e tendncia de agravos e ameaas. Ele trata de probabilidades, associaes estatisticamente significantes, importantes para se conhecer uma realidade. (PEREIRA, 1995; CODATO; NAKAMA, 2006). Optou-se por realizar um estudo no amostral por se reconhecer a importncia de se considerar cada declarao de bito como caso nico e relevante para a construo de estatsticas sobre mortalidade.

3.2 Local do Estudo

O presente estudo foi realizado no municpio de Paracatu, situado no noroeste do estado de Minas Gerais. Em 2006, a cidade contava com, estimadamente, 84.411 mil habitantes. No mesmo perodo, a despesa total com sade por habitante foi de R$ 180,49 reais e a Estratgia Sade da Famlia cobria cerca de 46,2% da populao. Ainda em 2006, houve 1.351 nascidos vivos, com uma Taxa de Mortalidade Infantil de 20 por mil nascidos vivos. (BRASIL, 2009).

39

3.3 Fonte dos Dados

A fonte dos dados utilizada foi a DO. Frias e outros (2009) postulam que a implantao do Sistema de Informaes sobre Mortalidade, a partir da utilizao de um modelo padronizado de DO, abriu a possibilidade de se adquirir informaes mais fidedignas e completas. Nas declaraes de bito foram coletadas informaes utilizando-se um formulrio padronizado (Apndice A). O formulrio foi dividido em dois itens, sendo o primeiro Dados de Identificao e o segundo, Informaes Referentes a bitos de Menores de um ano. O formulrio apresentava, no primeiro item, informaes capazes de contextualizar a criana em um ambiente, j que trazia, entre outras, o bairro de residncia da mesma, elemento importante para se ter uma idia das condies de vida da famlia. J o segundo item apresentava escolaridade e ocupao habitual da me, condies da gestao e do parto, alm da causa bsica da morte, entre outras, o que permite ponderaes sobre os possveis fatores que ocasionaram o bito.

3.4 Aspectos ticos

Todas as etapas deste estudo foram fundamentadas na Resoluo 196/1996 do Conselho Nacional de Sade, a qual incorpora, sob a tica do indivduo e das coletividades, os quatro referenciais bsicos da biotica: autonomia, no maleficncia, beneficncia e justia, entre outros, e visa assegurar os direitos e deveres que dizem respeito comunidade cientfica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado. O devido respeito dignidade humana demanda que toda pesquisa se processe aps consentimento livre e esclarecido dos sujeitos, indivduos ou grupos que por si e/ou por seus representantes legais manifestem a sua anuncia participao na pesquisa. (BRASIL, 1996).

40

Portanto, foi solicitada a autorizao para a coleta de dados Oficial Tabeli do Cartrio de Registro Civil das Pessoas Naturais, representante legal dos sujeitos, mediante a apresentao do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apndice B) e Declarao de Autorizao para a coleta de dados (Apndice C), autorizao esta que foi prontamente concedida.

3.5 Desenvolvimento do Estudo

A opo por realizar este estudo se deu ao se reconhecer que o municpio de Paracatu apresentava altas Taxas de Mortalidade Infantil. Surgiu, ento, a necessidade de se pesquisar o perfil da mortalidade infantil no municpio, a fim de identificar os grupos que tm maior risco de morrer antes de completar um ano de idade. Visando atingir os objetivos propostos, foram analisadas as declaraes de bito datadas de 2005 e 2006 de crianas com at um ano de idade que residiam no municpio de Paracatu. Optou-se por estudar as DO arquivadas no Cartrio de Registro Civil das Pessoas Naturais de Paracatu por entender que o vis provocado pelo desvio de documentos fosse menor, uma vez que, de acordo com seu fluxo, a DO necessariamente chega ao cartrio e l fica retida por um longo perodo. Sendo assim, em maro de 2010 foram realizadas duas visitas ao mesmo, onde os documentos estavam disponveis para o estudo. Os documentos arquivados no cartrio so organizados de acordo com o ms de ocorrncia do bito. Assim, todas as DO foram folheadas em busca daquelas em que o tipo do bito estivesse assinalado como no fetal e que o bito tivesse ocorrido menos de 365 dias da data do nascimento. De acordo com Frias e outros (2009), comum o erro na classificao do bito, pelo uso indevido de termos bito fetal/bito no-fetal, fato que foi observado nesta pesquisa. Para que esse vis no influenciasse nos resultados da pesquisa, tambm foi observado o item morte em relao ao parto, sendo excludas do estudo as DO assinaladas como bito no-fetal, em que a morte tivesse ocorrido antes do parto.

41

Foram coletadas na DO somente as informaes pertinentes ao estudo utilizando-se de um formulrio padronizado. As informaes no preenchidas tambm foram anotadas a fim de se conhecer, ao final, aquelas que mais sofreram com esta falha. O no preenchimento, bem como o preenchimento incorreto das declaraes de bito ainda constituem um grande problema no Brasil, pois dificultam a construo de estatsticas fidedignas que possam dar base s melhorias no setor sade. Ao final, os dados foram digitados em uma planilha do Programa Microsoft Execel 2007 e processados utilizando-se o mesmo programa. Optouse por apresentar os dados sob a forma de tabelas e grficos para facilitar a visualizao, devido grande quantidade de informaes. Com os resultados em mos, buscou-se, nos bancos de dados disponveis na internet, por artigos cientficos que apresentassem pesquisa similar realizada, a fim de se obter base para a discusso destes resultados. A maioria dos resultados obtidos nesta pesquisa j era esperada, tendo em vista os resultados de outros trabalhos publicados. Entretanto, alguns provocaram surpresa, e todos eles so apresentados a seguir.

42

4 RESULTADOS E DISCUSSO

Foram analisadas um total de 35 declaraes de bito de menores de 1 ano de idade, sendo 20 referentes ao ano de 2005 e 15 a 2006. Estes nmeros mostram-se diferentes daqueles disponveis no DATASUS, o qual apresenta a TMI em 2005 inferior a do ano de 2006. A diferena observada nesses dados pode ser justificada pelo fato de as declaraes de bitos ocorridos fora do municpio de residncia, no caso, Paracatu, ficarem retidas no municpio de ocorrncia do bito. Existe uma ferramenta utilizada na alimentao do SIM chamada retroalimentao. Essa ferramenta utilizada justamente nos casos de bitos ocorridos fora do municpio de residncia. Nesses casos, as declaraes de bito so digitadas no municpio de ocorrncia do bito, onde ficam arquivadas, mas o sistema alimentado de acordo com o municpio de residncia (informao verbal). disponveis no SIM e os resultados encontrados nesta pesquisa. Dos 20 bitos ocorridos em 2005, 70% eram crianas do sexo masculino e 30% do sexo feminino. Os resultados de 2006 foram prximos dos de 2005. Dos 15 bitos, 73% eram do sexo masculino e 27% do sexo feminino. Apesar de a maioria dos bitos serem de crianas do sexo masculino, em estudo realizado por Silva e outros (2006), no foi encontrada associao estatisticamente significativa entre sexo e mortalidade infantil. Quanto raa/cor, em 2005, 30% eram da raa branca, 40% da parda e 30% das declaraes de bito estavam com este subitem sem preencher. J em 2006, 27% eram da raa branca, 7% da raa negra, 33% da parda e 33% das declaraes de bito estavam com este subitem sem preencher. Quando o beb nasce, devido ao longo perodo exposto ao lquido amnitico, mesmo os filhos de mes negras apresentam pele clara e, por se basear somente na cor da pele da criana logo aps o parto, acaba-se por determinar erroneamente sua raa/cor, especialmente no caso de bitos neonatais precoces, perodo em que os bitos predominaram neste estudo.1

1

Esse poderia ser o motivo da disparidade entre as taxas de mortalidade

Informao obtida atravs de Suelen Aparecida de Souza Rosa, Referncia Tcnica do SIM e do SINASC do setor de Epidemiologia da Gerencia Regional de Sade Una/MG.

43

Logo, necessrio bom censo por parte de quem determina a cor da criana para evitar que erros desse tipo ocorram, visto que em 2005 nenhum bito de crianas negras foi registrado, e em 2006, o nmero de bitos de crianas negras foi proporcionalmente menor que os demais. Em estudo realizado por Cardoso, Santos e Coimbra Jr. (2005), crianas negras e indgenas apresentam nveis de mortalidade infantil substancialmente superiores aos observados nas demais categorias de raa/cor. Quanto zona de residncia, em 2005, 75% dos nascidos vivos residiam na zona urbana e 20% na zona rural, sendo que 5% das DO no apresentavam este subitem preenchido. Em 2006, 67% residiam na zona urbana, 13% na zona rural e 20% das DO no apresentavam este subitem preenchido. De acordo com dados obtidos atravs do IBGE, a taxa de urbanizao mdia da populao de 81,24%, indicando que o Brasil urbano significativamente maior do que o Brasil rural, dados estes que corroboram os resultados obtidos neste estudo. (IBGE, 2000). Em estudo realizado por Bohland e Jorge (1999), a TMI entre residentes da zona urbana foi praticamente o dobro do que entre os residentes na zona rural. Segundo estes autores, a menor TMI na zona rural poderia ser explicada pelo pequeno nmero de casos, tanto de nascimentos quanto de bitos ocorridos. Outra hiptese que poderia explicar a menor mortalidade na zona rural o fato de que, possivelmente, a populao residente nesta teria condies de vida menos precrias do que aquela residente na rea perifrica da sede do municpio. O bairro de residncia das mes se mostrou bem distribudo no municpio, tanto em 2005 quanto em 2006. Entretanto, em ambos os anos, houve predominncia de bitos no bairro Paracatuzinho (Grficos 4 e 5). Este fato poderia ser explicado tanto pela maior extenso deste bairro em relao aos demais, quanto pelo perfil do bairro. Segundo o Sistema de Informao da Ateno Bsica SIAB de 2009, dos moradores deste bairro cobertos pelo PSF, 9,89% consomem gua sem qualquer tratamento; 5,21% no possuem abastecimento pblico de gua; 6,01% no possuem sistema de esgoto; e 4,59% no possuem energia eltrica. (PARACATU, 2009).

44

Grfico 4: Distribuio dos bitos de acordo com o bairro de residncia, no ano de 2005. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Grfico 5: Distribuio dos bitos de acordo com o bairro de residncia, no ano de 2006. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Neste estudo, 65% e 67% dos bitos ocorreram no perodo neonatal, em 2005 e 2006, respectivamente, resultado corroborado pela literatura estudada. Resultados semelhantes foram encontrados em estudo realizado por

45

Silva e outros (2006), que afirmam que vrios fatores podem ter contribudo para o aumento relativo da mortalidade neonatal, destacando-se a reduo da mortalidade infantil ps-neonatal como um dos principais determinantes dessa elevao. A tabela 2 apresenta o coeficiente de mortalidade por componente em relao idade do bito.TABELA 2 Distribuio dos nascidos vivos de acordo com a idade nos bitos e coeficientes, segundo o ano de ocorrncia. Paracatu/MG - 2010

PERODO 2005 2006 Total

NASCIDOS VIVOS 1.429** 1.351** 2.780

IDADE DO BITO At 27 De 28 a 364 dias dias 13 7 10 5 23 12

COEFICIENTES* CMN CMPN CMI 9,1 7,4 16,5 4,9 3,7 8,6 14 11,1 25,1

*Por mil nascidos vivos **Dados obtidos atravs do DATASUS (BRASIL, 2009) CMN - Coeficiente de Mortalidade Neonatal CMPN - Coeficiente de Mortalidade Ps-neonatal CMI - Coeficiente de Mortalidade Infantil Fonte: Dados da pesquisa

importante destacar que, dos bitos ocorridos no perodo neonatal, grande parte deles se deu no primeiro dia de vida, ou seja, os bebs foram a bito no ambiente hospitalar, local que, subentende-se, deveria garantir a sobrevida da criana, exceto, evidentemente, nos casos de bitos inevitveis. Neste estudo, a idade das mes variou entre 14 e 40 anos, em 2005, e entre 15 e 38 anos, em 2006 (Grficos 6 e 7).

46

Grfico 6: Distribuio da faixa etria das mes de acordo com as DO do ano de 2005. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Grfico 7: Distribuio da faixa etria das mes de acordo com as DO do ano de 2006. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

O Estatuto da Criana e do Adolescente, Lei n 8.069/1990, no Artigo 2, considera adolescente indivduos entre doze e dezoito anos de idade. (BRASIL, 1990).

47

Sendo assim, em 2005, 35% das mes eram adolescentes. J em 2006, este grupo perfazia 25% do total de mes. Diferentes fatores contribuem para o aumento da gravidez na adolescncia, entre os quais se encontra o incio cada vez mais precoce da puberdade, o que ocorre desde a dcada de 40, e acarreta decrscimo na idade da primeira menstruao, instalando-se mais cedo a capacidade reprodutiva. A vida sexual dos jovens comea cada vez mais cedo e, como consequncia, ocorre o aumento do nmero das relaes sexuais, muitas delas sem a utilizao de mtodos contraceptivos e do preservativo, com maior exposio maternidade precoce e s infeces pelo Vrus da Imunodeficincia Humana (HIV) e outras doenas sexualmente transmissveis. (BRASIL, 2005a). Segundo Gama e outros (2001), alm da maior chance de os filhos de mes adolescentes nascerem com baixo peso (menor do que 2.500 g), alguns estudos revelam maiores taxas de morbimortalidade nesse grupo. Dentre os mecanismos explicativos, encontram-se os de natureza biolgica, como imaturidade do sistema reprodutivo, ganho de peso inadequado durante a gestao e fatores socioculturais, como pobreza e marginalidade social, combinados ao estilo de vida adotado pela adolescente. Apesar da relevncia de ambos os motivos biolgicos e socioculturais , a falta de cuidados prnatais das adolescentes associada pobreza e nveis baixos de instruo tm se mostrado fatores preponderantes na cadeia causal de recm-nascidos de baixo peso. Como se pode perceber atravs das tabelas 3 e 4, levando-se em considerao os dois anos estudados, a maioria das mes no havia concludo o ensino mdio. Duas (02) mes haviam concludo 12 e mais anos de estudo, sendo que uma delas possua apenas 14 anos, o que infere erro no preenchimento da DO. Menezes e outros (1996) comprovaram que a mortalidade perinatal entre crianas pertencentes a famlias pobres ou com pouca escolaridade at trs vezes maior do que entre aquelas de famlias abastadas ou com grau elevado de escolaridade.

48

TABELA 3 Relao entre a idade das mes das crianas que foram a bito e os anos de estudo concludos por elas, em 2005. Paracatu/MG - 2010

IDADE DA ME 14 a 19 20 a 34 35 e mais No Preenchida Total

Nenhum 2 1 3

1a4 -

ANOS DE ESTUDO DA ME 5 a 8 9 a 11 12 e Ignorado mais 1 5 1 1 1 1 3 5 1 1

No Preenchido 1 6 7

Fonte: Dados da pesquisa

TABELA 4 Relao entre a idade das mes das crianas que foram a bito e os anos de estudo concludos por elas, em 2006. Paracatu/MG - 2010

IDADE DA MENenhum 1a4

ANOS DE ESTUDO DA ME5a8 9 a 11 12 e mais Ignorado

14 a 19 20 a 34 35 e mais No Preenchida Total

1 1

1 1

2 5 7

2 1 3

1 1

-

No Preenchido 2 2

Fonte: Dados da pesquisa

A escolaridade da me considerada um marcador de sua condio socioeconmica e de sua famlia, relacionando-se nesse contexto com o perfil cultural e comportamental ligados aos cuidados de sade, agindo como importante determinante das mortes infantis. As mulheres com mais tempo de estudo so mais capazes de regular sua fecundidade e mais sensveis s campanhas de educao em sade, aderindo mais facilmente a programas de puericultura. (POLES; PARADA, 2002; SILVA et al., 2006). Em 2005, somente 45% das DO apresentavam o subitem ocupao habitual e ramo de atividade da me preenchido, sendo todas elas do lar. Em 2006, a ocupao do lar tambm predominou, correspondendo a 61% das mes, sendo as demais 6% estudantes, 6% balconistas e 27% das DO no possuam esse subitem preenchido. Infelizmente, impossvel determinar a

49

renda da famlia estudada somente atravs da declarao de bito. A ocupao e o ramo de atividade da me so insuficientes para tal fim, mas permitem a especulao. A ocupao do lar impossibilita a melhora da condio scio-econmica, uma vez que trabalhar em casa nesta condio no oferece renda fixa famlia. Segundo Poles e Parada (2002), consenso entre os autores a importncia da renda na determinao do processo sade-doena, por ser uma ferramenta atravs da qual os agentes de determinada classe social conseguem consumir bens e servios, como assistncia mdica, escola, alimentos, entre outros, essenciais para a manuteno da sade. Os itens nmero de filhos nascidos vivos e nmero de filhos nascidos mortos, em 2005, foram os que mais sofreram com o no preenchimento na DO (Grficos 8 e 9).

Grfico 8: Distribuio do nmero de filhos nascidos vivos por mulher, em 2005. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

50

Grfico 9: Distribuio do nmero de filhos nascidos mortos por mulher, em 2005. Paracatu/MG - 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Em 2006, tambm houve no preenchimento desses subitens, mas no to acentuado quanto no ano anterior (Grfico 10 e 11).

Grfico 10: Distribuio do nmero de filhos nascidos vivos por mulher, em 2006. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

51

Grfico 11: Distribuio do nmero de filhos nascidos mortos por mulher, em 2006. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Embora com este estudo no tenha sido possvel a obteno de dados representativos referentes paridade das mulheres, importante conhecer a histria obsttrica pregressa das mes, pois se sabe que a mortalidade maior no caso de mes que tiveram mais gestaes e quando o intervalo interpartal de um ano ou menos. Mulheres com histria de aborto anterior devem receber cuidadosa ateno pr-natal, com objetivo de evitar, em suas gestaes futuras, o parto prematuro e, consequentemente, reduzir os ndices de mortalidade, especialmente a neonatal. (POLES; PARADA, 2002). Em relao idade gestacional, os grficos 12 e 13 apresentam a distribuio da durao da gestao (em semanas).

52

Grfico 12: Distribuio da durao da gestao (em semamas), em 2005. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Grfico 13: Distribuio da durao da gestao (em semamas), em 2006. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Conceitua-se gravidez pr-termo aquela cuja idade gestacional encontra-se entre 22 (ou 154 dias) e 37 (ou 259 dias) semanas. (BRASIL, 2005a, p. 115).

53

Tomando esta definio, 50% e 40% das declaraes de bito analisadas pertenciam a crianas prematuras, em 2005 e 2006, respectivamente. Em 2005, as 10 crianas nascidas prematuramente foram a bito no perodo neonatal. Em 2006, das 6 prematuras, 5 foram a bito nos primeiros 27 dias. indiscutvel a importncia da prematuridade para a mortalidade infantil, seja devido imaturidade pulmonar ou falta de defesas. A prematuridade tem sido destacada como um dos fatores importantes da mortalidade perinatal e neonatal precoce, tendo a ruptura prematura das membranas, o trabalho de parto prematuro e a interrupo precoce da gestao em virtude de doena hipertensiva ou sangramentos vaginais como os principais mecanismos relacionados etiologia da mesma. (POLES; PARADA, 2002; SILVA et al., 2006). importante destacar a grande quantidade de bebs a termo e com peso adequado que foram a bito. Dos 20 bitos em 2005, 20% eram constitudo por bebs a termo. Em 2006, 33% dos 15 bitos foram de bebs com idade gestacional ideal. Barros e outros (1984) afirmam que, se uma proporo elevada de crianas falecidas apresentava peso apropriado, este dado por si s aponta provveis deficincias na assistncia sade prestada quela populao, ou seja, os bitos so influenciados pelo manejo obsttrico e falhas na qualidade da assistncia neonatal. Quando analisado o tipo de parto, em 2005, 86% dos partos foram vaginais e 14% cesreos. Em 2006, 85% foram vaginais e 15% cesreos. A incidncia de cesrea aqui observada est dentro daquela preconizada pela OMS para a populao em geral: 10% a 15%. (POLES; PARADA, 2002). Optou-se por apresentar a causa bsica da morte exatamente como ela foi preenchida pelo mdico na DO (Grficos 14 e 15).

54

Grfico 14: Distribuio das causas bsicas das mortes, em 2005. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Grfico 15: Distribuio das causas bsicas das mortes, em 2006. Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

De acordo com Mendona, Goulart e Machado (1994), a causa bsica deve ser sempre etiologicamente especfica e antecedente s outras causas, no tempo e na sequncia patolgica. Sem a causa bsica, o bito no deveria ter ocorrido. Quando o preenchimento correto, a causa bsica selecionada

55

para tabulao ser a ltima doena mencionada na parte I do Bloco VI da declarao de bito. Segundo Soares, Horta e Caldeira (2007), no raro o preenchimento incorreto da declarao de bito, sobretudo em relao ordem de eventos que levaram ao bito que, geralmente, incoerente. Esse problema foi observado neste estudo, principalmente porque parada cardiorrespiratria e parto domiciliar foram considerados causas bsicas do bito. A DO que apresentava parto domiciliar como causa bsica, trouxe sepse como causa contribuinte. Entretanto, o que levou a criana a bito foi a infeco e no o parto domiciliar. Da mesma forma, a parada cardiorrespiratria no acontece sem que algo a provoque. O evento que provocou a parada que, considerando a sequncia patolgica, deveria ser a causa bsica do bito. Para Carvalho e outros (1990), fato que existe certo grau de subjetividade inerente definio das causas contribuintes e das ditas bsicas, j que fica a critrio e a juzo de cada um definir as causas mais relevantes no processo mrbido que devem constar nas declaraes. Contudo, a determinao da causa bsica da morte deve ser encarada pelo mdico com mais seriedade, uma vez que as estatsticas geradas a partir das declaraes de bito so de grande importncia para a sade pblica. A prematuridade foi a principal causa de morte nos anos estudados, seguida por sepse. Segundo Fonseca, Bittar e Zugaib (1999), o nascimento prematuro est associado com 75% da mortalidade neonatal e representa a causa mais comum de morbidade neonatal. Geralmente, os partos prematuros ocorrem em situaes de risco, tais como gestaes na adolescncia e em mes com idade acima de 35 anos. No entanto, outras condies tambm so evidenciadas: baixo nvel educacional materno, tabagismo, hipertenso arterial, diabetes gestacional, infeco do trato geniturinrio, ausncia de acompanhamento pr-natal, presena de outros filhos com baixo peso ao nascer e parto cesariano. (VRAS; TRAVERSOYPEZ, 2010). Alm de um pr-natal bem feito, a existncia de assistncia especializada ao neonato aumenta em muito a probabilidade de sobrevivncia

56

de bebs prematuros. A ausncia deste servio no municpio de Paracatu poderia justificar os altos coeficientes de mortalidade neonatal. De acordo com o Consenso Internacional de Sepse Peditrica, sepse definida como uma sndrome clnica caracterizada por uma resposta inflamatria sistmica na presena ou como resultado de uma infeco suspeita ou confirmada. (HERRMANN; AMARAL; ALMEIDA, 2008). Segundo Pinheiro e outros (2007), a incidncia de sepse neonatal na populao em geral de um a dez casos em cada 1.000 nascidos vivos. Todavia, alguns autores relatam incidncia de at 21 casos por 1.000 nascidos vivos, dependendo da idade gestacional e do peso ao nascer. Os recm-nascidos que desenvolvem as infeces de incio precoce comumente apresentam histria de um ou mais fatores de risco significativos para infeco, associados com o perodo intraparto. J os fatores de risco frequentemente associados sepse tardia incluem a prematuridade, devido imaturidade do sistema imunolgico, procedimentos invasivos teraputicos, ventilao mecnica, nutrio parenteral, entre outros. A presena de fatores maternos tambm est ligada ao desenvolvimento de sepse neonatal tardia, sendo estes relacionados sade e nutrio da me, a presena de infeco de diversas etiologias e ao nvel socioeconmico. Entre 5-50% dos recmnascidos que apresentam sepse precoce podem ir a bito, em contraste com 10-20% dos que apresentam sepse tardia, evidenciando a importncia do diagnstico e tratamento adequados. (HERRMANN; AMARAL; ALMEIDA, 2008; PINHEIRO et al., 2007). O grfico 16 mostra a qualidade do preenchimento do Bloco V da DO, exclusivo e obrigatrio em bitos fetais e de menores de 1 ano.

57

Grfico 16: Distribuio da efetividade do preenchimento do Bloco V da DO, em 2005 e 2006, Paracatu/MG 2010 Fonte: Dados da pesquisa

Das 35 declaraes de bito analisadas, oito (08) no apresentavam nenhum campo do Bloco V preenchido, de acordo com modelo da DO (Anexo A), seis (06) em 2005 e duas (02) em 2006. Das oito, em sete o bito ocorreu no perodo ps-neonatal, ou seja, entre 28 e 364 dias. Observa-se, portanto, que quando o bito ocorre nesse perodo, a falha no preenchimento das variveis do Bloco V mostra-se maior, talvez pelo fato de, no momento do bito, o nascimento j no ser um evento to recente e, por falta de uma busca mais apurada, as informaes se perderem. Estudos nacionais ressaltam a importncia do preenchimento adequado da DO. Em estudo realizado por Bohland e Jorge (1999), algumas variveis tiveram preenchimento pouco frequente, como em relao aos antecedentes obsttricos, o total de filhos (11,9%), a durao da gestao (5,1%), o tipo de gravidez (8,5%) e o tipo de parto (13,6%). O peso ao nascer foi preenchido em 30% dos casos. Os autores salientam que a falta de preenchimento da DO no est relacionada ao desconhecimento da informao, e sim no-valorizao do documento como base de informao para as estatsticas de sade, por parte dos mdicos que a preenchem.

58

Por no ser objetivo deste trabalho, no foram determinados os motivos da elevao da TMI no municpio de Paracatu, bem como o fato de haver nmeros to elevados de mortes provocadas por causas potencialmente evitveis, como o caso da prematuridade e da sepse. Entretanto, um ponto importante deve ser levado em considerao. Em 2007, ltimo ano com dados disponveis no DATASUS, apenas 46,2% do municpio era coberto pela ESF. Esse dado relevante, sobretudo quando considerado que, nesse mesmo ano, 95,8% de todas as consultas pr-natais realizadas no municpio foram feitas pela ESF. (BRASIL, 2009). A outra metade da populao no coberta pela ESF deve realizar o pr-natal na Clnica da Mulher e da Criana. Entretanto, provvel que muitas gestantes deixem de realiz-lo por falta de informao ou o iniciem tardiamente, no completando as seis consultas preconizadas pela OMS. O fato que seria necessrio um estudo aprofundado para se determinar os motivos do aumento da TMI de 9,2 em 2001 para 20 por mil nascidos vivos em 2006. Contudo, levando-se em considerao os dados apresentados, a deficincia apontada acima pode estar refletindo, sim, na TMI do municpio.

59

5 CONCLUSO

Apesar de ser o ltimo estgio da vida, a morte se mostrou um indicador efetivo para a construo de estatsticas. Ao final desta pesquisa, pde-se concluir que a mortalidade infantil no municpio de Paracatu est intimamente relacionada baixa escolaridade, baixa condio scio-econmica, fixao de residncia na periferia e ao parto prematuro. Destaca-se tambm que a falha no preenchimento de todos os subitens das DO referentes a 2005 e 2006 prejudicou a obteno de dados mais fidedignos quanto mortalidade infantil no municpio de Paracatu. Considerando os princpios e diretrizes norteadores da atuao da equipe da ESF, a evitabilidade das causas da mortalidade apresentada e a possibilidade da melhoria no preenchimento das DO, os dados provenientes deste estudo sero encaminhados ao Gestor Municipal do SUS, os quais espera-se que possam subsidiar as aes, bem como outros estudos, visando a efetivao e eficcia da assistncia prestada e, consequentemente, o controle da mortalidade infantil.

60

REFERNCIAS

ALVES, Adriana Cherem et al. Principais causas de bitos infantis psneonatais em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, 1996 a 2004. Revista Brasileira de Sade Materno Infantil, Recife, v. 8, n. 1, mar. 2008. Disponvel em: . Acesso em: 14 set. 2009. AMORIM, Melania Maria Ramos de et al. Impacto das malformaes congnitas na mortalidade perinatal e neonatal em uma maternidade-escola do Recife. Revista Brasileira de Sade Materno Infantil, Recife, 2010. Disponvel em: . Acesso em: 07 abr. 2010. ARRUDA, Tarciana Albuquerque Marenga de; AMORIM, Melania Maria Ramos de; SOUZA, Alex Sandro Rolland. Mortalidade determinada por anomalias congnitas em Pernambuco, Brasil, de 1993 a 2003. Revista da Associao Mdica Brasileir