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MPE Ministério Público Eleitoral Procuradoria Regional Eleitoral na Bahia EXMO. SR. DR. JUIZ AUXILIAR DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DA BAHIA PPE n. 1.14.000.002015/2014-75 O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL vem à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 73, inciso IV e § 11, da Lei n. 9.504/97, c/c artigo 22 da Lei Complementar n. 22/90, propor a seguinte REPRESENTAÇÃO em face de CONDUTA VEDADA , contra 1) * LUIZ CARLOS SANTOS LIMA, brasileiro, Vereador do Município de Salvador, candidato a Deputado Estadual com o nome de urna “SUÍCA”. 2) * EDSON CONCEIÇÃO DE ARAÚJO, Presidente/Diretor da organização não-governamental GRUPO ALERTA PERNAMBUÉS – GAP. 3) * HENRIQUE GONÇALVES TRINDADE, Secretário Municipal de Promoção Social e Combate à Pobreza (SEMPES). pelos motivos que passa a expor: * Dados pessoais foram omitidos. 1

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na Bahia

EXMO. SR. DR. JUIZ AUXILIAR DO TRIBUNAL REGIONAL EL EITORAL

DA BAHIA

PPE n. 1.14.000.002015/2014-75

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL vem à presença de

Vossa Excelência, com fundamento no artigo 73, inciso IV e § 11, da Lei n.

9.504/97, c/c artigo 22 da Lei Complementar n. 22/90, propor a seguinte

REPRESENTAÇÃO em face de CONDUTA VEDADA , contra

1) * LUIZ CARLOS SANTOS LIMA, brasileiro, Vereador do

Município de Salvador, candidato a Deputado Estadual com o

nome de urna “SUÍCA ”.

2) * EDSON CONCEIÇÃO DE ARAÚJO, Presidente/Diretor

da organização não-governamental GRUPO ALERTA

PERNAMBUÉS – GAP.

3) * HENRIQUE GONÇALVES TRINDADE, Secretário

Municipal de Promoção Social e Combate à Pobreza

(SEMPES).

pelos motivos que passa a expor:

* Dados pessoais foram omitidos.

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I. DA COMPETÊNCIA E DO RITO A SER SEGUIDO:

Nos termos do art. 96, inciso II e § 3º, da Lei 9.504/97, as

representações relativas ao descumprimento do mencionado diploma

normativo devem ser apreciadas pelos Juízes Auxiliares. É o que ocorre na

espécie tendo em conta que a presente representação tanto é arrimada nas

hipóteses consignadas no artigo 73 da Lei Eleitoral (condutas vedadas a

agentes públicos).

No que atina ao rito processual, o § 12 do art. 73 da Lei n.

9.504/97, incluído pela Lei nº 12.034/2009, estipula que as representações

pela prática de conduta vedada deverão seguir o rito sumário, previsto no art.

22 da LC 64/90. In verbis:

§ 12. A representação contra a não observância do disposto neste

artigo observará o rito do art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18

de maio de 1990, e poderá ser ajuizada até a data da diplomação.

Tal disposição foi didaticamente compilada no art. 22 da

Resolução 23.398/2013, in litteris:

Art. 22. As representações que visem apurar as hipóteses previstas

nos arts. 23, 30-A, 41-A, 73, 74, 75, 77 e 81 da Lei nº 9.504/97

observarão o rito estabelecido pelo art. 22 da Lei Complementar nº

64/90, sem prejuízo da competência regular do Corregedor

Eleitoral.

Lembrado disto, passar-se-á à narrativa das condutas.

II. DAS CONDUTAS:

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II.1. No dia 24 de julho de 2014, o Jornal da Metrópole

publicou matéria jornalística intitulada “ONG A SERVIÇO DO CANDIDATO:

Em campanha para deputado, vereador Suíca usa ONG para conquistar

votos e comete crime eleitoral” (fls. 5-6).

A referida reportagem retratou a utilização, em prol da

campanha eleitoral do primeiro representado , da entidade GRUPO ALERTA

PERNAMBUÉS – GAP, CNPJ n. 04.905.440/001-49, sediada no bairro de

Pernambués, nesta capital.

II.2. Presidido pelo segundo demandado , o GAP é

qualificado como entidade de utilidade pública municipal (Lei Municipal n.

8.576/2014, publicada no Diário Oficial do Município do Salvador de 27-06-

20141 – fl. 32). Ele atende a boa parte dos habitantes do populoso e pobre

bairro de Pernambués – e mesmo de outras localidades da capital, a exemplo

de Narandiba –, fornecendo atendimento médico, encaminhamento a

exames, cursos de qualificação profissional, acesso a computadores para

inscrição no Programa Minha Casa, Minha Vida, como apontam os

testemunhos colhidos pelo Ministério Público Eleitoral nos dias 21 e 24-10-

2014 (cf. registros audiovisuais às fls. 136 e 142).

II.3. Além de todas estas atividades, o GAP presta, por

delegação da Secretaria Municipal de Promoção Social e Combate à Pobreza

(SEMPES) – chefiada, à época dos fatos, pelo terceiro representado – ,

outros dois serviços públicos, de vital importância e grande potencial de

atração do eleitorado.

A referida entidade faz inscrições de interessados para o

Serviço Municipal de Intermediação de Mão-de-Obra (SIMM)2 e para o

1 O projeto de lei foi de iniciativa do primeiro representado, como ele informa em sua página de campanha (Disponível em: http://suicadeputadoestadual.com/?page_id=56.. Acesso em: 27-10-2014).2 Segundo o sítio eletrônico da Prefeitura Municipal do Salvador, o SIMM “tem como objetivo facilitar a inserção de pessoas no mercado de trabalho. Portanto, o SIMM é uma

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programa Bolsa Família3, sendo intensamente procurada pela população. A

propósito, basta conferir a extensa listagem de indivíduos cadastrados nestes

programas sociais durante o ano 2014 (fls. 71-74)

II.4. Apesar de prestar tantos e tão relevantes serviços

públicos, o Grupo Alerta Pernambués fazia propaganda eleitoral ostensiva em

favor do primeiro representado – que, indica a prova dos autos, é um dos

seus controladores, ainda que de forma não ostensiva.

Neste sentido, é possível lembrar que o primeiro

demandado é um dos fundadores do Grupo4, que não por acaso foi instalado

no bairro em que ele estudou e onde mantém um dos seus mais importantes

redutos eleitorais. Demais disso, SUÍCA foi um dos responsáveis pela

inauguração da atual sede da entidade, juntamente com o então Secretario

Municipal Maurício Trindade, conforme se verifica em vídeo disponível na

internet (TV do Servidor)5:

ferramenta de intermediação entre pessoas em busca de oportunidade de trabalho e empresas necessitadas de mão-de-obra” (Disponível em: http://www.salvador.ba.gov.br/templates/salvador/filtro_publico_alvo.php?opcao=1. Acesso em: 27-10-2014).3 Ainda de acordo com o site da Prefeitura, isto envolve a “inclusão e atualização cadastral das famílias de baixa renda no Programa Bolsa Família. O programa prevê transferência de renda com condicionalidades aos grupos familiares que estejam dentro do perfil para a obtenção do benefício (Idem, ibidem).4 Cf. http://www.metro1.com.br/vereador-admite-ligacao-com-ong-mas-nega-crime-eleitoral-10-50019,noticia.html. Acesso em: 27-10-2014. O primeiro representado foi o responsável, inclusive, pela inauguração da atual sede do GAP (Disponível em: http://tvdoservidorpublico.com/tv-vereador-suica-inaugura-nova-sede-do-gap-grupo-alerta-pernambues/. Acesso em: 27-10-2014).5 Disponível em: http://tvdoservidorpublico.com/tv-vereador-suica-inaugura-nova-sede-do-gap-grupo-alerta-pernambues/. Acesso em: 27-10-2014

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II.5. Quanto às propagandas eleitorais feitas pelo GAP em

benefício do primeiro representado , impende assinalar que, em 9 de agosto

de 2014 – e mesmo no dia 27 de outubro de 2014, data de elaboração desta

peça –, podia ser vista, na página da entidade na internet (GAPTV –

www.gaptv.com.br/2013/quem-somos/) fotografia de SUÍCA, em que este

último aparece ladeado do Deputado Federal Nelson Pellegrino e de diversos

militantes, carregando cartazes com o seu número de campanha (13031).

Eis a imagem, constante da fl. 17 do procedimento em anexo:

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II.6. Infelizmente não é só. A página do GAP na internet se

reporta ao canal da entidade no sítio eletrônico YouTube (Gaptv da Gente – fl.

14), em que foram postados diversos vídeos de propaganda eleitoral em favor

do primeiro representado , a exemplo de “Dobradinha de Sucesso Valmir

Federal e Suíca Estadual” (fl. 10) e “Convenção do PT – Suíca Deputado

Estadual o povo deseja ... vamos juntos” (fl. 12).

Gravados no CD-R de fl. 44, tais vídeos foram analisados

pela Assessoria de Pesquisa e Análise da Procuradoria da República na

Bahia (ASSPA/BA), que elaborou os Relatórios de Pesquisa n. 2.744, 2.746 e

2.747/2014, encartados nos autos (fls. 45-57).

II.7. Para que não reste dúvida acerca da propaganda

efetuada, é importante colacionar alguns trechos dos mencionados

documentos, a começar pelo Relatório n. 2.746/2014:

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II.8. Pior ainda: quando elaborava a matéria que deu início às

apurações, ou seja, em pleno período eleitoral, a reportagem da Metrópole

telefonou ao gabinete do primeiro representado na Câmara Municipal do

Salvador, dizendo necessitar atendimento odontológico. Como resposta, foi-

lhe indicado o GAP. Eis o diálogo (cf. CD acostado aos autos):

- Gabinete do Vereador Suíca, boa tarde.

- Oi. Boa tarde, moça. Tudo bom? É do gabinete de Suíca?

- Isso.

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- Tô com uma dor de dente muito forte, precisando de dentista. E aí

uma amiga minha me disse que eu posso arrumar com vocês uma

consulta, que o Seu Suíca ajuda o pessoal. Como é?

- Olha, não é aqui no gabinete. A senhora vai ter que ligar para o

GAP e marcar uma consulta lá. GAP é o Grupo Alerta Pernambués,

uma instituição que faz parte do projeto do Vereador.

- Qual é o número?

- É 3431-1281.

Não há dúvida, portanto, da vinculação do GAP com o

primeiro representado . Seu próprio gabinete referencia a “ONG” a quem o

procura, dizendo, com todas as letras, que “o Grupo Alerta Pernambués, uma

instituição que faz parte do projeto do Vereador”.

II.9. É importante ressaltar que o jornalista Matheus Morais,

redator da reportagem, chegou a ir à sede do Grupo. Lá, encontrou um

“santinho” do candidato afixado no mural da entidade, à vista de todos os que

lá eram atendidos (cf. fotografia à fl. 5). E, ao sair, flagrou a chegada de um

veículo VW Crossfox, plotado com propaganda do primeiro representado ,

levando pessoas para atendimento na entidade (cf. fotografia à fl. 5).

II.10. Todos estes elementos de prova, reunidos, conduzem a

uma única conclusão: o primeiro representado fez uso e foi beneficiário, na

campanha eleitoral, de serviços públicos de caráter social, dotados de grande

potencial de atração de eleitores, a exemplo de inscrições no Bolsa Família e

no SIMM.

Tais serviços foram prestados gratuitamente e em caráter

delegado pelo GAP, organização presidida pelo segundo representado , mas

controlada de fato pelo primeiro demandado , que não por acaso a situou,

estrategicamente, em um dos seus principais redutos eleitorais.

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II.11. Obviamente, o primeiro representado não pode alegar

falta de ciência do que ocorria, não apenas em razão da sua intensa

vinculação com a ONG, mas também porque seu próprio gabinete estava

envolvido. Mas, ainda que assim não fosse, valeria a recente lição do

TRE/RN: “Tratando-se de conduta vedada, o candidato responde, juntamente

com o agente público, pela prática da conduta ilícita, independentemente de

sua participação, ciência ou anuência em relação a esta, desde que

evidenciado o benefício auferido à respectiva candidatura, nos termos do

artigo 73, §§5º e 8º, da Lei nº 9.504/97” (RECURSO ELEITORAL nº 54754,

Acórdão nº 95/2013 de 10/12/2013, Relator MARCO BRUNO MIRANDA

CLEMENTINO, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data

13/12/2013, Página 02/03).

II.12. Contudo, deve-se recordar que tais condutas ilícitas

somente foram possíveis porque a Secretaria Municipal de Promoção Social

e Combate à Pobreza (SEMPES), titularizada, à época dos fatos, pelo

terceiro demandado deixou de fiscalizar a prestação dos serviços públicos

que tinham sido delegados à ONG e, com isso, permitiu seu uso eleitoreiro.

Tanto assim que a referida delegação persistiu mesmo após a divulgação,

pela imprensa, dos graves fatos que são objeto desta representação.

II.13. Sem dúvida, houve violação ao art. 73, inciso IV e § 11

da Lei n. 9.504/97. A propósito, leciona Olivar Coneglian:

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A respeito do tema, também merece ser lembrado

posicionamento de Marcos Ramayana:

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II.14. Portanto, vê-se que o primeiro representado

dolosamente se valeu de sua vinculação com o Grupo Alerta Pernambués –

GAP, entidade a que estava e está vinculado, para fazer uso promocional, em

favor de sua própria candidatura, da distribuição gratuita de bens e serviços

de caráter social mantidos pela Prefeitura Municipal de Salvador.

Evidentemente, isto somente foi possível com o concurso do

segundo demandado , presidente do GAP, que consentiu com seu e do

terceiro acionado , responsável, à época dos fatos, pela delegação dos

serviços.

II.15. Agindo desta forma, os representados violaram o inciso

IV e o parágrafo 11 do art. 73 da Lei n. 9.504/97, devendo ser aplicadas as

sanções dos §§ 4º e 5º do mesmo dispositivo legal.

III. DOS PEDIDOS:

Ante o exposto , o Ministério Público Eleitoral requer:

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a) recebimento da inicial, IMPRIMINDO-SE AO FEITO

O RITO PREVISTO NO ART. 22, DA LEI

COMPLEMENTAR 64/90 , conforme autoriza o art. 73, §

12, da Lei n. 9.504/97;

b) a notificação dos representados para, querendo,

apresentarem defesa em cinco dias (art. 22, I, “a”, da Lei

Complementar 64/90);

c) seja a representação regularmente instruída para ,

ao final, ser levada a julgamento em plenário,

julgando-a procedente para o fim de impor multa aos

dois últimos representados e cassar o registro ou o

diploma do primeiro representado , nos termos do art.

73, §§ 4º e 5º, da Lei n. 9.504/97.

Para provar o alegado, este Órgão Ministerial protesta por

todos os meios de prova admissíveis no Direito, em especial pela

testemunhal e pela documental, ouvindo-se, no curso da instrução, as

pessoas adiante elencadas.

Atribui-se à causa o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil

reais).

P. deferimento.

Salvador, 28 de outubro de 2014.

ANDRÉ LUIZ BATISTA NEVES

Procurador Eleitoral Auxiliar

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ROL DE TESTEMUNHAS:

1. Vanessa Nunes França de Jesus – fls. 120 e 136;

2. Valdirene Conceição dos Anjos – fls. 124 e 136;

3. Marinalva Cedraz Coelho – fls. 120 e 136;

4. Matheus Morais – fls. 139 e 142.

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