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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XVIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte – Parintins - AM – 24 a 26/06/2019
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Mulher Indígena na Política: Análise do Enquadramento Jornalístico Acerca da
Eleição de Joênia Wapichana nas Revistas Exame, IstoÉ e Carta Capital1
Débora dos Santos GOMES2
Kamily Glória PANTOJA3
André Luís Campanha DEMARCHI4
Universidade Federal do Tocantins, Palmas, TO
Resumo
Nas eleições do ano de 2018 houve um crescimento da representação feminina de 52, 6%
em relação ao ano de 2014. Ressalta-se que dentre as mulheres eleitas, destaca-se a
indígena Joênia Wapichana, a primeira deputada a ocupar cargo no legislativo desde o
cacique Mário Juruna no ano de 1987. Partindo desse pressuposto, o presente artigo tem
como finalidade analisar o enquadramento jornalístico das revistas online Exame, IstoÉ
e Carta Capital referentes as reportagens posteriores a eleição de Joênia. Foram
observados cinco itens nas matérias: (1) estrutura da matéria jornalística (2)
características de webjornalismo (3) enfoque da mídia (4) construção da imagem de
Joênia Wapichana e (5) interpretação. Desse modo, o trabalho destaca a importância que
o enquadramento jornalístico possui na construção imagética de uma personalidade.
Palavras-chave: mulher indígena; Joênia Wapichana; enquadramento; eleições.
Introdução
Por séculos as mulheres vêm enfrentando diversos obstáculos quanto as
desigualdades de gênero, pelo fato da sociedade ser constituída seguindo os valores
patriarcais, no qual os homens mantem supremacia nas relações sociais, controle de
propriedades, na política e principalmente no controle do gênero feminino – que tinha
como função primordial a procriação. Mesmo perante inúmeros padrões baseados no
1 Trabalho apresentado na IJ01 – Jornalismo do XVIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte,
realizado de 24 a26 de junho de 2019.
2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação Comunicação e Sociedade da Universidade Federal do Tocantins, e-mail:
3 Mestranda do Programa de Pós-Graduação Comunicação e Sociedade da Universidade Federal do Tocantins, e-mail:
4 Orientador do trabalho. Professor do Curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Tocantins, e-mail:
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contexto histórico-cultural, gradativamente as mulheres vem conquistando diversos
direitos que antes eram atribuídos apenas aos homens.
No entanto, ainda é necessário que haja mudanças para que a igualdade de gênero
não seja apenas uma utopia. Em decorrência disso, diversos grupos de mulheres se uniram
para lutar em prol às causas femininas, principalmente no que diz respeito ao assédio,
remuneração salarial igualitária e sua inserção nas decisões voltadas as políticas públicas.
Dentre esses grupos que vem lutando por direitos e até pouco tempo quase não eram
notadas, destacam-se as mulheres indígenas.
Apesar de sofrerem múltiplas discriminações, as indígenas vêm desempenhando
um papel predominante na luta pelos direitos como mulheres e resistência de seus povos,
visto que propoem manifestações e participam de movimentos para reivindicar saúde,
educação e economia igualitária por exemplo.
Dentre essas líderes, destaca-se Joênia Wapichana, mulher indígena que mesmo
com diversos obstáculos, candidatou-se a um cargo político nas eleições de 2018, e ao ser
eleita com 8.267 mil votos, conseguiu algo inédito: tornou-se a primeira mulher indígena
a fazer parte do quadro de deputados federal do Brasil.
Partindo dessa conjuntura e as circunstâncias que nortearam esse fato histórico, o
presente artigo tem como finalidade analisar o enquadramento jornalístico das revistas
online Exame, Carta Capital e IstoÉ acerca das matérias que anunciavam o ingresso de
Joênia Wapichana no legislativo.
Mulher Indígena e Gênero
Juntamente com homens, idosos e crianças, a mulher indígena foi marginalizada
no processo de construção social. Dentre as classes, as indígenas são as que mais sofrem
com diversos tipos de preconceito e violência não apenas por questões étnicas, bem como
de caráter econômico, classe e de gênero. A construção imagética da mulher indígena,
trata-se de uma falsificação forjada pelas relações de poder do sistema colonial, ao
pertencimento de todas em uma única sociedade “ideal”, construída a partir de
estereótipos (NEVES, 2011). Devido a essa visão luso-brasileira constituída perante a
tradição europeia, as mulheres indígenas foram tradicionalmente formadas por
estereótipo da sexualização de seus corpos e na redução do seu papel à esfera doméstica.
Desse modo, pode-se afirmar que desde o colonialismo e pelo histórico acerca da
violência contra as indígenas, diversos males se perpetuaram, principalmente
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relacionados ao antagonismo sexual, no qual eram advindos de um “patriarcado
ancestral” (GARGALLO, 2014).
Essa realidade ainda prevalece nos dias atuais, conforme aponta o relatório
apresentado no ano de 2013 pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe
– Cepal, no qual assegura que mais de 23,5 milhões de mulheres indígenas são afetadas
por desigualdades étnicas e de gênero, ficando expostas a violências e inferiorizações. No
que tange a violência sofrida dentro das comunidades, uma das causas é a entrada e o
consumo de álcool nos locais, situações essas que muitas das vezes silenciadas por elas,
dificultando que as vítimas denunciem, pelo fato de sentirem receio de que a Lei Maria
da Penha5 não as ampare.
Outra situação alarmante relacionada a desigualdade das mulheres indígenas no
meio social, é o acesso à educação, que conforme a Cepal, de sete países analisados,
incluindo o Brasil, menos de 15% de jovens indígenas de 20 a 29 anos chegaram a
terminar o nível escolar secundário. Logo, menos da metade possui diploma para exercer
cargos de auto poder aquisitivo, esses dados internais são justificados na realidade de
nosso país, já que o estado não possui pesquisas que retratem as mazelas das indígenas.
Desse modo, tornou-se desafiador para as mulheres indígenas seguirem careiras onde
quebram estereótipos e paradigmas que se perpetuaram desde o descobrimento do Brasil.
Sem contar que uma das problemáticas vivenciadas por estas mulheres, são as
lutas por demarcações de terras, que a cada dia são mais recorrentes, no qual muitas das
vezes são violentadas e assassinadas por pistoleiros como forma de intimidar seus povos
a deixarem as comunidades. As demarcações também podem ser usadas como forma para
amenizar os enfrentamentos à violência contra mulheres, pelo fato de que a terra garante
reestruturação de comunidades indígenas, fazendo com que lhes garanta direitos e mais
segurança.
Mulher Indígena Como Participante Política
Para que as mulheres indígenas fossem ouvidas perante as autoridades, elas
tomaram iniciativa e criaram próprios departamentos dentro das comunidades. As
primeiras organizações e movimentos iniciaram na década de 70 e 80. Ainda não era
5 Lei N° 11.340 sancionada em 7 de agosto de 2009 com a finalidade de combater com mais veemência a violência
contra a mulher.
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institucionalizado, e a demanda inicial era apenas sobre questões de gênero denominadas
como Associação das Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro – Amarn e a “Associação
das Mulheres Indígenas de Taracuá, Rio Uaupés e Tiquié - Amitrut”. Ambas surgiam em
1980 na Amazônia, onde ainda estão situadas a maior parte das organizações femininas
indígenas do Brasil. A Amarn surgiu entre 1984 e 1987 quando se formalizou com o
intuito de melhoria na qualidade de vida e formação sociopolítica para mulheres indígenas
que viviam em situação de isolamento, cuja finalidade prevalece até os dias de hoje. A
Amitrut também criada com o intuito de propor melhorias na qualidade de vida das
indígenas atualmente está praticamente extinta.
Ambas serviram como percursoras na criação das demais, como a Associação de
Mulheres Indígenas Sateré Mawé – Amism, a Organização das Mulheres Indígenas de
Roraima – Omir e os Departamentos de Mulheres da Federação das Organizações
Indígenas do Rio Negro – Dmirn/Foirn e da Coordenação das Organizações Indígenas da
Amazônia Brasileira – Dmiab/Coiab.
A partir daí muitas outras foram surgindo e se tornando papel fundamental na
representação das mulheres indígenas nas comunidades e fora delas. Desta forma, as
indígenas aos poucos vêm ganhando espaço e mostrando-se mais presentes nas decisões
das comunidades, e ainda participando dos encontros, oficinas e conferências nacionais e
internacionais promovidas pelas organizações indígenas, instâncias estatais e não
governamentais, fazendo com que se reúna diversas mulheres de diferentes etnias, em
trocas de conhecimento. Num sentido amplo, estão redefinindo o que se entende por
política e por empoderamento, desde suas lutas coletivas e desde suas práticas cotidianas
(HERNANDEZ, 2008, p.18).
Com várias comunidades tornando-se adeptas as organizações indígenas, os
movimentos ganharam força não só interna, como também externamente e aos poucos as
mulheres indígenas vem ocupando posições fora das aldeias e comunidades graças ao
empenho pelos direitos de seu povo. Porém, ainda se nota que muitos desses direitos são
deixados de lado pelo poder público, por isso, cada vez mais indígenas estão se
candidatando a cargos políticos.
A dificuldade em se ter representante indígena no congresso é grande, pois desde
1987, após a eleição de Mário Juruna, nenhum outro indígena era eleito a Deputado
Federal, e a dificuldade torna-se ainda maior quando se trata de uma mulher indígena
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ocupando um cargo de alto escalão, que até outubro de 2018 ainda era considerado algo
inédito.
Teoria do Enquadramento (Framing)
O termo “enquadramento” pode ser empregado na língua portuguesa para
diferentes funcionalidades, por exemplo, na área da arquitetura se refere a qualquer
moldura ou sequência de motivos que envolve um vão ou uma superfície; na área das
finanças é empregado como um método aplicado aos fundos de investimento; no cinema
para se referir ao posicionamento dado a imagem da câmara. Por sua vez, no campo da
comunicação trata-se do enfoque utilizado pelos jornalistas em uma determinada matéria
(nota, notícia, reportagem etc.).
Os estudos que tratam sobre enquadramento (framing) surgiram durante a década
de 1974, com o sociólogo Erwin Goffman, que teve como finalidade avaliar a forma no
qual os seres humanos organizam os conhecimentos nas ações do cotidiano. De acordo
com Dantas (2009) os enquadramentos de Goffman são quadros de referência geral,
construídos socialmente, e que são acionados pelas pessoas para dar sentido aos eventos
e às situações sociais. Dentre as abordagens que o autor tratava em seus estudos se destaca
a “audiência”, ou seja, de que forma o público interpreta as informações contidas nas
matérias jornalísticas.
Anos mais tarde, Robert Entman (1993) retomou os estudos dos enquadramentos
(framing), mas agora não mais abordando acerca da audiência, mas sobre como os textos
jornalísticos são estruturados afim de que alcance a massa. Para o autor é possível
identificar o enquadramento de uma reportagem baseado em cinco elementos: palavras-
chave, metáforas, conceitos, símbolos e imagens. Partindo disso, se bem observada a
estrutura do texto e imagem das matérias jornalísticas será possível identificar qual
enquadramento foi atribuído naquele contexto.
Mauro Porto (2002) destaca ainda que o enquadramento colabora para superar o
modelo da objetividade e da imparcialidade que é tão amplamente divulgada na mídia. O
autor ressalta que:
enquadramentos não se referem apenas a processos de manipulação,
mas são parte de qualquer processo comunicativo, uma forma inevitável
através da qual atores fazem sentido de suas experiências. Agentes
sociais que desafiam o governo e outros grupos políticos poderosos
possuem seus próprios enquadramentos e buscam, muitas vezes com
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sucesso, influenciar a produção de sentido e significados pela mídia
(PORTO, 2002, p. 13).
Portanto, a noção de enquadramento é indispensável para analisar os produtos
jornalísticos, pois, é por meio desse conceito, que se é possível identificar sob qual ótica
o repórter utilizou para construir a realidade nas matérias, e se a mesma está associada às
perspectivas hegemônicas de manter o status quo ou não.
Eleição de Joênia Wapichana
A última eleição do ano de 2018 trouxe um fato histórico: pela primeira vez, em
190 anos de Parlamento, uma mulher indígena ocupa o cargo de deputada federal da
Assembleia Legislativa. Natural da comunidade indígena Cabeceira do Truarú, de etnia
Wapixana, Joênia Batista de Carvalho, mais conhecida como Joênia Wapichana saiu
juntamente com a mãe para a capital Boa Vista – RR quando tinha oito anos de idade, e
desde cedo começou a se interessar pelos estudos.
Durante sua trajetória de vida, foi a primeira indígena a se formar no curso de
Direito pela Universidade Federal de Roraima – UFRR, no ano de 1997. Em seguida se
tornou mestra pela Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, em 2011. Ressalta-se
que no ano 2004, foi a primeira a ir até a Comissão Interamericana de Direitos Humanos,
localizada em Washington, com o intuito de denunciar transgressões do Brasil contra os
povos indígenas. Já no ano de 2008, defendeu a demarcação da reserva Raposa Terra do
Sol diante do Supremo Tribunal Federal. Seu ativismo político foi reconhecido
internacionalmente no ano de 2018, momento no qual recebeu o prêmio de Direitos
Humanos da ONU (considerado Nobel da Paz concedido pelas Nações Unidas).
Destaca-se que a decisão de concorrer às eleições ocorreu durante a 47ª
Assembleia Geral dos Povos Indígenas de Roraima, uma vez que os indígenas perceberam
a importância da participação de lideranças na disputa institucional. Joênia Wapichana
foi então indicada pelo movimento indígena de Roraima a representá-lo. A indígena foi a
única parlamentar eleita pela Rede Sustentabilidade em seu estado, e conseguiu o total de
8.491 votos, com uma campanha de pouco mais de R$ 170 mil proveniente do Fundo
Partidário e de apoiadores. Dentre as causas defendidas por Joênia durante a campanha
eleitoral, encontra-se: a defesa dos direitos coletivos indígenas; a atuação pelo
desenvolvimento sustentável do Estado de Roraima. Bem como, atuar contra a corrupção,
a favor da transparência, ética e com a maior participação indígena na tomada de decisões.
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Metodologia
Delimitou-se o escopo da pesquisa as reportagens das revistas online Exame,
Carta Capital e IstoÉ sobre a eleição da primeira mulher indígena, a deputada Joênia
Wapichana, no ano de 2018. A escolha por analisar as revistas online foi por conta do
aspecto textual que costuma ser mais elaborado em um periódico, e ao se apresentar uma
escrita mais descritiva, colabora para uma análise de enquadramento menos flutuante.
Quanto a seleção das revistas é por se destacarem no cenário nacional e de acordo
com Leal (2009) a comparação de pontos de vistas diferentes auxiliam na identificação
dos enquadramentos presentes na cobertura midiática dos veículos jornalísticos. Ressalta-
se ainda que, para a realização das análises dos enquadramentos das revistas foram
criados cinco itens de observação: (1) estrutura da matéria jornalística (2) características
de webjornalismo (3) enfoque da mídia (4) construção da imagem de Joênia Wapichana
(5) interpretação.
Analise da Revista Exame
Criada em 1967 a revista Exame, pertencente a Editora Abril é uma das mais
influentes no ramo da economia e negócios do país. Além da revista, possui ainda a
plataforma online com a audiência mensal de 16 milhões de visitantes segundo a
ComScore6. Traz como conteúdo artigos de colunistas e serviços da informação
financeira, além de temas relevantes no Brasil. Dentre os temas que ganhou destaque no
país e publicado no website da revista no dia 10 de outubro de 2018 foi a eleição da
indígena Joênia Wapichana. A partir da teoria do enquadramento, será realizado uma
análise da matéria jornalística divulgado no site da revista Exame. Antes da análise
propriamente dita, se faz necessário apresentar a estrutura do texto jornalístico presente
na matéria:
Editoria Brasil
Título Primeira mulher indígena é eleita para a Câmara dos Deputados
Linha Fina Há 31 anos, desde que o cacique xavante Mário Juruna deixou o
Congresso Nacional, em 1987, um índio não era eleito deputado federal
6 Dados da revista.
Quadro 1 – Estrutura da reportagem da revista Exame
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Imagens Visuais Na foto dessa matéria a deputada Joênia está usando acessórios
indígenas e aparece em um local arborizado com sorriso no rosto e
cabelos ao vento.
Legendas Joênia Wapichana: aos 43 anos, indígena milita desde 1997, quando se
tornou a primeira mulher índia a se formar em Direito
Subtítulos Candidaturas Indígenas
Propostas
A revista Exame inicia a matéria de forma detalhada a respeito da eleição de
Joênia Wapichana, desde o momento em que venceu, com dados referentes a campanha,
breve biografia e citação da deputada. Em seguida apresenta dois subtítulos: candidaturas
indígenas e propostas. Com relação a estrutura, a revista soube utilizar as ferramentas
jornalísticas disponíveis (imagem, linha fina, subtítulos, citações entre outros). No
entanto, utilizou de forma simplória as características presentes no webjornalismo, que
de acordo com Gutiérrez (2013) vai além de uma transposição de conteúdos da mídia
tradicional, pois oferece ao público um produto mais completo ao utilizar o texto
jornalístico juntamente com outras mídias. Dentre as seis características fundamentais do
webjornalismo destacam-se: multimidialidade/convergência, interatividade,
hipertextualidade, personalização, memória, instantaneidade/atualização contínua.
A multimidialidade trata-se da possibilidade de unir diferentes formatos como
texto, áudio e vídeo no texto jornalístico; a interatividade é a participação que o leitor tem
com os veículos de comunicação; a hipertextualidade se caracteriza por propor novos
sentidos ao texto por meio de conexões de palavras que permitem ao usuário acessar
outras páginas disponíveis na web; a personalização consiste na configuração do texto
de acordo com os interesses individuais do usuário; a memória é possibilitar ao leitor o
acesso ao acervo site; a instantaneidade/atualização contínua é a atualização quase em
tempo real das notícias.
Nesse sentido percebeu-se que o texto jornalístico poderia ter explorado mais as
ferramentas disponíveis na web, uma vez que utilizou apenas uma imagem, e um hiperlink
na matéria. Conforme pode se observar na figura:
Fonte: as autoras
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Figura 1: Reportagem sobre a eleição de Joênia
No que diz respeito ao enfoque que a mídia atribuiu ao fato, pode-se considerar
que foi de forma atrativa, pois o texto foi extenso e ocupou bem o espaço na página, e
assim, a reportagem foi elaborada seguindo o tamanho recomendado, com
desdobramentos acerca da candidatura de Joênia.
Quanto a construção da imagem de Joênia, a revista possibilitou uma boa
visibilidade apresentando quatro citações diretas ao longo da matéria e mais uma de Sônia
Guajajara, que foi candidata à vice-presidência da República pelo Psol. O texto
jornalístico trouxe dados da trajetória de vida de Joênia, o que possibilitou os leitores
conhecimento de quem se trata, além de apresentar as propostas que ela pretende
implementar em sua gestão.
De modo geral, a matéria foi bem produzida, apresentando elementos textuais que
facilitaram na leitura da matéria, além disso o enquadramento não foi de forma a subjugar
a indígena, pelo contrário, possibilitou um engrandecimento da personagem perante o
público. No que se refere a utilização dos elementos voltados ao webjornalismo, a
reportagem faltou utilizar mais, para que então a leitura ficasse mais dinâmica.
Análise da Revista IstoÉ
A revista IstoÉ foi fundada em maio de 1976 pela editora Três, na qual tinha sob
a direção, o jornalista Mino Carta. Desde o lançamento, apresentou-se como uma revista
de variedades, ocupando-se de política, economia, ciência, comportamento, artes,
Fonte: Exame
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esportes e outros assuntos. Em 1996 houve um grande marco: o lançamento do site oficial,
onde conquistou a marca de primeira revista semanal de informação online. Atualmente,
segundo dados divulgados pela própria empresa, as edições online registram em média
2,2 milhões de acessos mensais a qualquer de suas páginas. Além de profundas mudanças
no aspecto visual, a versão online da ISTOÉ traz algumas novidades em seu conteúdo e
gratuidade de no acesso, onde são aproximadamente mais de 195 edições digitais da
revista.
Quadro 2 – Estrutura da reportagem
Editoria Brasil
Título “Sou resultado do movimento de luta” diz 1ª indígena eleita
deputada
Linha Fina Não possui
Imagens Visuais Não possui
Legendas Não possui
Subtítulos Candidatura indígenas
Propostas Fonte: as autoras
Ao analisar a estética do texto, notou-se que a revista não seguiu a estrutura de
uma matéria produzida para web, visto que se notou a ausência de recursos visuais no
decorrer do texto, ressalta-se que a reportagem não possui nenhuma foto da deputada,
conforme se pose observar abaixo:
Figura 2 : Reportagem sobre a primeira deputada indígena a se eleger
Fonte: IstoÉ
A matéria é formada apenas por texto, que mesmo sendo simples e de fácil leitura,
torna-se cansativo ao leitor pela carência de recursos. Foi observado também a falta de
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hiperlinks que ligassem a reportagem a outras matérias políticos-eleitorais, sendo que a
importância dos hiperlinks em um texto produzido para a web é imprescindível, pois, em
meio a tanta informação é de grande valia para o leitor encontrar conteúdos relacionadas
àquilo que está lendo.
No que se refere ao título da matéria, a IstoÉ optou em iniciá-lo com uma citação
direta, no qual se destacou com a frase “Sou resultado do movimento de luta”, para que
logo em seguida informasse o fato histórico “(...) diz 1ª indígena eleita deputada”. As
citações diretas também foram usadas para compor o corpo do texto, de modo que foram
totalizadas cinco, sendo que uma delas foi utilizada para encerrar o texto.
A reportagem não possui linha fina, compondo-se apenas do título e do corpo da
matéria. O jornalista atentou-se em contextualizar a atuação de Joênia durante a campanha
eleitoral, bem como parte da biografia da deputada, buscando resgatar em ordem não
cronológica os seguintes fatos: da primeira indígena a se eleger deputada no Brasil, sua
luta em prol à causa indígena, o ingresso em uma universidade no exterior e a campanha
da deputada pelo partido Rede.
A matéria foi dividida em dois subtítulos. O primeiro denominado “Candidaturas
indígenas” retomou o título da matéria, no qual justificou indiretamente o motivo pelo
qual os indígenas passaram a se candidatar em cargos políticos e a conquista nas eleições.
Nota-se que as citações de Joênia são inseridas no texto como forma de justificar partes
do fato, onde todas as frases do jornalista são seguidas de citações.
No último subtítulo denominado como “Propostas”, o jornalista enfatiza a fala de
Joênia no qual ela enfatiza uma de suas principais reinvindicações enquanto deputada,
que será a demarcação de terra. Assim, o jornalista finaliza o texto com uma extensa
citação sobre o tema.
De modo geral, o enquadramento dado pela revista valorizou a imagem de Joênia,
deixando bem claro seu posicionamento, porém a falta de recursos de matérias para a web
e o excesso de citações, limitou o jornalista a uma matéria menos aprofundada que
valorizasse o fato histórico.
5.3 Enquadramento da Revista Carta Capital
Criada na cidade de São Paulo, no ano 1994 pelo jornalista Mino Carta a Revista
Carta Capital trata-se de uma publicação jornalística semanal. Inicialmente, era editada
mensalmente pela Carta Editorial, no qual surgiu a sugestão do nome, e ainda indicava o
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foco do projeto pelas questões financeiras, posteriormente o periódico passou a fazer parte
da editora Confiança Ltda A tiragem gira em torno de 75.000 exemplares, e nas matérias
é abordado temáticas como política, economia, comportamento, cultura entre outros.
Ressalta-se que devido a ampla divulgação da versão impressa, no ano de 2000 foi criado
o website, pertencente aos Portais: iG, iBest e BrTurbo.
Quadro 3 – Estrutura da reportagem
Editoria Brasil
Título Joênia Wapichana: quem é a primeira indígena eleita para
a Câmara
Linha Fina Não possui
Imagens A matéria possui duas imagens, a primeira se une ao
título. Nota-se que a deputada está sorrindo e fazendo
sinal positivo com as mãos; usando uma camisa com os
dizeres “nenhum direito a menos”.
A segunda foto é similar a primeira, trata-se de um
printscreen da rede social instagram de Joênia a foto
encontra-se cortada na direção de seus ombros. A
deputada também aparece sorrindo, com a legenda logo
abaixo: “Todos tem uma missão na vida. A minha é
defender os direitos coletivos indígenas”.
Legendas Não possui
Subtítulos Não possui Fonte: as autoras
Ao analisar a revista Carta Capital, notou-se que a mesma possui algumas das
características que o webjornalismo considera como fundamental na composição de um
texto em formato digital, pois possui vários hiperlinks que se direcionam a outras
matérias, mas nota-se a ausência de legendas e subtítulos para que cumpra todos os
requisitos de uma matéria para a web.
O título da reportagem tornou-se atraente, pois diferentemente das demais que o
título vem separado da imagem, a revista optou em colocá-lo dentro de uma foto onde
Joênia está em um tamanho destaque e o título sobrepõe.
Desse modo, foi observado que o jornalista teve o intuito de dar destaque ao fato,
que tem por título “Joênia Wapichana: quem é a primeira indígena eleita para a câmara”.
Conforme se pode observar na figura abaixo:
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Figura 3: A primeira indígena a ocupa um cargo na câmara
Além do título, o corpo do texto foi estruturado de modo com que leitor o
compreendesse antes, o durante e o depois da candidatura de Joênia, bem como a
biografia da deputada e o interesse pelas causas de seu povo.
A reportagem não possuir subtítulos, o jornalista inseriu um printscreen de uma
foto e legenda da rede social da indígena, para que a leitura ficasse mais atrativa. A
imagem que remete ao ler a matéria pelo enquadramento do autor, foi de que Joênia é de
uma mulher que lutou a vida inteira e que desde criança sempre ganhou destaque por tudo
que fazia. E ainda no meio do texto, tem-se sugestões de leitura sobre causas indígenas
relacionadas às mesmas defendidas pela deputada.
A matéria encerra com um parágrafo “Nos próximos quatro anos de mandato,
Wapichana vai encarar um Congresso conservador, com 52 parlamentares do PSL,
partido de Jair Bolsonaro. Mas, dessa vez, contará com mais mulheres ao seu lado: elas
passaram a ocupar 15% das cadeiras – contra 10% de deputadas eleitas em 2014”, ou seja,
indica que Joênia terá muitos desafios quanto deputada, mas que também terá apoio para
prosseguir o mandato.
Sendo assim, o enquadramento dado a referida matéria enalteceu a imagem de
Joênia, destacando o fato da deputada ser a primeira mulher indígena a assumir o
parlamento. Desde o início, o jornalista preocupou-se em enquadrá-la como uma figura
pública que ficará conhecida historicamente.
Fonte: Carta Capital
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Considerações Finais
A eleição da deputada Joênia Wapichana representou um marco histórico para as
mulheres indígenas, pois pela primeira vez elas agora são representadas no legislativo.
Tal acontecimento foi noticiado em inúmeros veículos de comunicação. Desse modo, é
necessário a observação de como foi realizado o enquadramento jornalístico, uma vez que
os indígenas têm pouca visibilidade nas mídias, ou quando são noticiados, são
apresentados na maioria das vezes de forma estereotipada.
De modo geral, o enquadramento das revistas Exame, IstoÉ e Carta Capital
apresentaram reportagens exaltando a imagem de Joênia, em todas as matérias retomaram
a trajetória de vida da deputada, e demostrando a relevância do fato aos povos indígenas.
Todavia, no que se refere a utilização de ferramentas advindas do webjornalismo, a revista
IstoÉ foi a que menos introduziu, uma vez que não utilizou linha fina, imagens ou outros
recursos visuais que pudessem deixar o texto mais atraente aos eleitores.
Constatou-se que a revista Exame construiu de forma positiva a imagem da
deputada e seguiu estrutura de uma matéria para a web, pois além da utilização da fala de
Joênia, ainda incluiu de outra personagem o que consequentemente reforçou as falas da
indígena. No que se refere ao enquadramento da revista Carta Capital, pode-se destacar
que foi a que melhor construiu a imagem da Deputada, pois mesmo notando a ausência
de subtítulos na matéria e legenda nas fotos, o texto e as imagens fizeram com que o ato
histórico tivesse destaque na revista.
Portanto, o enquadramento jornalístico dado nas reportagens não reforçaram os
estereótipos indígenas, mas faltou em todas as matérias maior utilização de ferramentas
que auxiliassem na leitura dos conteúdos.
Referências Bibliográficas
DANTAS, M.; VIMIEIRO, A. C . Entre o explícito e o implícito: proposta para a análise
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