15
Mulheres na Luta: A mobilização política das Uniões Femininas no pós-Guerra. Aluna: Manuella Thereza Cabral Pessanha Orientador: Rafael Soares Gonçalves Introdução O presente trabalho está relacionado ao projeto de pesquisa desenvolvido pelo Departamento de Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, através do Laboratório de Estudos Urbanos e Socioambientais (LEUS), orientado pelo professor Rafael Soares Gonçalves. Tem como propósito apresentar o modo como as Uniões Femininas atuaram no período pós Segunda Guerra Mundial. A presença das Uniões Femininas em bairros e favelas do Rio de Janeiro impactou a mobilização política nesses espaços, levantando as principais reinvindicações das mulheres que ali moravam. Após a 2ª guerra mundial, com o período da redemocratização, o movimento feminino se expandiu em todo o Brasil. As Uniões femininas, como veremos, exerceu forte atuação política, inclusive nas favelas da cidade. As favelas tinham como estigma ser um local anti-higiênico, um problema de saúde pública, de ordem urbana, estética e de assistência social. Com isso, houve tentativas de combater esses espaços em prol da ordem urbana, social e higiênica. As remoções, de cunho higienista, eram vistas como medidas eficazes para a solução do problema de saúde pública. Algumas iniciativas de remoção de favelas aconteceram durante o Estado Novo, com a construção dos Parques proletários provisórios. Da mesma forma, já no período democrático, muitos processos de despejo de favelados por pretensos proprietários dos terrenos, onde as favelas se localizavam, estimularam a emergência de movimentos de resistência, que se organizaram para lutar pela permanência dos favelados em seus locais de moradia. A presente pesquisa se insere em um esforço de compreensão do surgimento de movimentos de mobilização pelo direito à cidade nas favelas cariocas. Dentro de uma perspectiva histórica, é possível identificar forte presença do Partido Comunista Brasileiro nas favelas cariocas no período de 1945-64, sobretudo nos anos logo após a

Mulheres na Luta: A mobilização política ... - puc-rio.br · compreender as formas como as Uniões Femininas atuaram nos bairros e favelas do Rio ... luta contra as discriminações

Embed Size (px)

Citation preview

Mulheres na Luta: A mobilização política das Uniões Femininas no

pós-Guerra.

Aluna: Manuella Thereza Cabral Pessanha

Orientador: Rafael Soares Gonçalves

Introdução

O presente trabalho está relacionado ao projeto de pesquisa desenvolvido pelo

Departamento de Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro,

através do Laboratório de Estudos Urbanos e Socioambientais (LEUS), orientado pelo

professor Rafael Soares Gonçalves. Tem como propósito apresentar o modo como as

Uniões Femininas atuaram no período pós Segunda Guerra Mundial.

A presença das Uniões Femininas em bairros e favelas do Rio de Janeiro impactou

a mobilização política nesses espaços, levantando as principais reinvindicações das

mulheres que ali moravam. Após a 2ª guerra mundial, com o período da

redemocratização, o movimento feminino se expandiu em todo o Brasil. As Uniões

femininas, como veremos, exerceu forte atuação política, inclusive nas favelas da cidade.

As favelas tinham como estigma ser um local anti-higiênico, um problema de

saúde pública, de ordem urbana, estética e de assistência social. Com isso, houve

tentativas de combater esses espaços em prol da ordem urbana, social e higiênica. As

remoções, de cunho higienista, eram vistas como medidas eficazes para a solução do

problema de saúde pública. Algumas iniciativas de remoção de favelas aconteceram

durante o Estado Novo, com a construção dos Parques proletários provisórios. Da mesma

forma, já no período democrático, muitos processos de despejo de favelados por pretensos

proprietários dos terrenos, onde as favelas se localizavam, estimularam a emergência de

movimentos de resistência, que se organizaram para lutar pela permanência dos favelados

em seus locais de moradia.

A presente pesquisa se insere em um esforço de compreensão do surgimento de

movimentos de mobilização pelo direito à cidade nas favelas cariocas. Dentro de uma

perspectiva histórica, é possível identificar forte presença do Partido Comunista

Brasileiro nas favelas cariocas no período de 1945-64, sobretudo nos anos logo após a

Segunda Guerra. As uniões femininas tinham relação direta com o PCB e foram

organizações importantes no aumento da influência comunista nos bairros populares

cariocas.

A escolha do tema se faz importante na medida em que nos auxilia a identificar e

compreender as formas como as Uniões Femininas atuaram nos bairros e favelas do Rio

de Janeiro, modificando a dinâmica social nesses locais através da luta por direitos.

Procuramos, ainda, perceber os impactos da atuação do Partido Comunista Brasileiro na

vida social dos moradores das favelas do Rio de Janeiro e sua ligação com as Uniões

Femininas. Reconhecer a importância da atuação feminina e comunista nas lutas urbanas

nos convida a identificar e compreender as diferentes mobilizações e manifestações

sociais pela garantia de direitos.

Nesse contexto, realizamos, além do levantamento bibliográfico, pesquisas nos

acervos do Fundo de Divisão de Polícia Política e Social do Arquivo Público do Estado

do Rio de Janeiro, sobretudo do material referente às Uniões Femininas. Foi realizada,

ainda, pesquisa na hemeroteca digital da Biblioteca Nacional em diferentes jornais desse

período.

O PCB no pós–guerra

Após o término da Segunda Guerra Mundial e com o processo de democratização

pós-Estado Novo, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) saiu, por um breve período, da

ilegalidade (1945-1947) e ganhou forte visibilidade na vida política. Segundo Pandolfi

(1995, p.62)

“a luta antifascista tirou os comunistas do isolamento.

Tanto na França, como na Itália, o partido comunista

tornou-se no imediato pós-guerra, o agrupamento mais

forte junto à classe trabalhadora. Em diversos outros países

da Europa, à exceção da Alemanha Ocidental e da

Espanha, os comunistas aumentaram em muito o seu

contingente votos.”

Já em abril de 1945, os principais líderes do PCB foram libertos com a anistia

política. Luís Carlos Prestes assume oficialmente o comando do Partido Comunista

Brasileiro, afirmando a ativa atuação do Partido na redemocratização do país. Em maio

do mesmo ano, o Partido Comunista se articula em nível nacional, criando comitês

populares em todo o Brasil. A redemocratização é caracterizada por um período onde se

foi retomado o sistema político formalmente democrático, permitindo, assim, a atuação

de partidos e de organizações da sociedade civil. Essas ações colaboraram para aproximar

Vargas com os trabalhadores urbanos.

Com a redemocratização e a proposta de uma união nacional e uma aliança com

os que resistiam ao nazi-fascismo, o Partido Comunista Brasileiro solicita a contribuição

dos sindicatos para que as reivindicações trabalhistas e as greves fossem evitadas para

evitar choques. O PCB se torna paulatinamente um partido nacional de massas,

conquistando plena legalidade e chegando a marca de 200 mil filiados em 1947.

Nas eleições de 1945, o partido constituiu uma significativa bancada parlamentar,

elegendo 14 Deputados Federais pelo Distrito Federal, sendo o 4º partido mais votado no

país. Luís Carlos Prestes, o então Secretário-Geral do partido, foi eleito Senador, sendo,

aliás, o mais votado do país. Após a promulgação da nova Constituição, ocorrida em

setembro de 1946, os comunistas se lançaram na campanha eleitoral para os governos e

constituintes estaduais, eleições que ocorreram em janeiro de 1947. Elegeram vários

deputados, tendo obtido quase um terço da Câmara do Distrito Federal. A significativa

conquista eleitoral alcançada pelo Partido Comunista Brasileiro aumentou o medo pela

influência comunista no país.

As favelas e o Partido Comunista Brasileiro

A aproximação do Partido Comunista Brasileiro com as favelas pode ser

“atribuído à sua capacidade de organizar e mobilizar para além dos discursos e

orientações da cúpula”. (NEGRO, SILVA, 2003, p. 55)

“Os comunistas revelaram grande agilidade na organização de

dezenas de Comitês Populares e Democráticos, que se

envolviam em problemas dos bairros e discutiam temas como

habitação, custos dos gêneros de primeira necessidade, instrução

e saúde pública, lazer, etc.”(NEGRO, SILVA, 2003, p. 55)

A criação do Movimento Unificador dos Trabalhadores, em 1945, foi de extrema

importância para a construção e implementação do projeto comunista de atuação nos

bairros populares. Por ser um instrumento de “organização intersindical dos trabalhadores

que buscava reunir e organizar os dirigentes sindicais e estimular a sindicalização dos

trabalhadores, a fim de fortalecer a tão almejada unidade operária, defendida

historicamente pelos comunistas”. (Pinheiro: 2007, pg. 57).

Além da criação do Movimento Unificador dos Trabalhadores (MUT), o PCB

criou a Tribuna Popular, advindo do projeto que pretendia levar informação, cultura,

esporte, entre outros assuntos à população, além de ser um periódico que apregoava e

estimulava a expansão do movimento associativo de bairro no Rio de Janeiro. “É possível

identificar um projeto de educação política das massas pela cultura, no qual o Partido

atuaria como um elemento de mobilização e organização do proletariado”

(GONÇALVES, AMOROSO: 2011).

Na Tribuna Popular, havia seções específicas, tais como “O povo se diverte” e “O

samba na cidade”, incentivando a educação através da cultura, bem como a sessão

chamada “A vida dos comitês populares”, onde era apregoado as iniciativas dos inúmeros

Comitês Democráticos Populares espalhados pela Capital Federal e outras cidades do

país. O jornal era muito mais do que um agitador coletivo, e sim, um organizador coletivo.

Os Comitês Populares Democráticos tiveram uma significante importância

na vida social, política e sindical do Rio de Janeiro. Eram órgãos de fortalecimento do

PCB, que procurou se aproximar com as lutas dos bairros, incentivando a participação

popular em diversas questões, inclusive com a formação de associações de moradores.

Os CPD’s surgem como ferramenta de organização da classe trabalhadora, sob a liderança

do PCB, que atuava na luta pela apoderação dos direitos sociais, civis e políticos dos

trabalhadores e outros setores populares. Os Sub-comitês foram implantados nas favelas,

como o sub-comitê do Morro do Turano. Por meio dos CPD’s, o PCB tentou se credenciar

como força de peso no interior do cenário político.

Além da aproximação com a classe operária, o PCB atingiu os intelectuais. “A

presença dos intelectuais no Partido atingiu o seu auge entre os anos de 1945-1947,

período em que o PCB se fortalece devido a fatores externos. ” (GUIMARÃES, 2009, p.

94)

Indomável partido do proletariado! E dos sábios e dos escritores!

Dos poetas e dos artistas! Onde iríamos nós caber, por acaso,

senão dentro deste partido que é o do povo? Só nas suas fileiras

poderemos fortalecer, ao contato com o proletariado e o povo, a

nossa capacidade de criação artística ou científica. Aqui se

aponta para o futuro. (JORGE AMADO, 1946 apud

GUIMARÃES, 2009),

O Partido Comunista Brasileiro tinha a ideia de proporcionar aos moradores das

favelas melhorias, tais como: implementação de escolas, bicas d’agua, pontos de luz e

policiamento. Para isso, eram elaborados discussões e debates entre candidatos e o

povo.Os vereadores do Partido Comunista Brasileiro não só discutiam e debatiam sobre

as possíveis melhorias com os moradores, mas levavam esses debates à Câmara,

procurando angariar forte legitimidade junto aos favelados.

Apesar da cassação do registro PCB, em 1947, pelo Governo Dutra, o Partido

continua a sua atuação ilegalmente “através de Comissões de Ajuda de Bairros ou de

Comitês pela Paz e contra a Guerra da Coréia, braços legais do partido, que mantiveram

acessa a influência comunista em algumas favelas da cidade. ” (GONÇALVES,

AMOROSO: 2012 pg. 6). Por outro lado, foi criada, em 1954, pelo advogado Magarinos

Torres, a União dos Trabalhadores Favelados, que tinha como objetivo relacionar o

favelado ao universo do trabalho, procurando captar recursos e dar continuidade à

mobilização dos moradores por melhores condições de moradia e emprego. Com a

influência de Magarinos Torres, jurista próximo ao Partido Comunista, a UTF lutou pela

defesa dos moradores contra processos de reintegração de posse, reivindicou a melhoria

das favelas, assim como lutou contra a violência policial e mesmo pela regularização

fundiária dessas áreas.

As Uniões Femininas

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, período chamado de redemocratização,

o movimento feminino teve uma ascensão em todo o Brasil, como foram o caso das

associações femininas. Segundo Tabak (1987, p.5), “as associações femininas tem

servido em geral, como importante forma de organização de mulheres e através de sua

atuação contribuem para elevar o nível de conscientização e participação política de

grandes contingentes femininos”.

As uniões femininas do período pós-guerra eram segmentadas entre associações

profissionais e não profissionais. As associações profissionais agrupavam mulheres

representantes de uma determinada categoria profissional e sindicato. Já as associações

não profissionais eram compostas por mulheres que não exerciam uma atividade

profissional dentre do mercado de trabalho, fora do lar. Ambos os tipos de associações

exerciam uma grande influência política, tendo condições favoráveis de participação

democrática.

E essa tem sido uma outra área de atuação das associações

femininas: divulgar entre as mulheres a legislação que lhes

diz respeito, fazê-las conhecer os seus direitos já

assegurados, orientá-las no sentido de exigir o

cumprimento e a aplicação de conquistas já adquiridas, no

campo do emprego, da educação, da proteção da

maternidade e da infância, do exercício da função pública.

(TABAK, 2002. p.21)

No geral, a luta dessas associações se concentrava na

luta contra as discriminações por razões de sexo, por igual

salário para trabalho igual, por acesso qualquer cargo ou

função, por igual oportunidade de promoção na carreira e

de educação em todos os níveis, etc – também se constitui

numa ação politica bastante abrangente, pois é capaz de

mobilizar grandes contingentes femininos,

independentemente das categorias profissionais, de credos

políticos ou religiosos. (TABAK 1987, p.10)

No ano de 1946, surgia a União Feminina do Distrito Federal (quando o Rio de

Janeiro ainda era a capital do país), que já significava um passo à frente na coordenação

da atividade desenvolvida por inúmeras uniões de bairro, que se formavam por todo o

município e que combatiam a carestia de vida, a falta de produtos de primeira necessidade

e se manifestavam em favor da preservação da paz mundial. Essas uniões locais surgiram

em mais de 30 bairros (a 1ª a ser criada foi a da Tijuca) e se espalharam desde Botafogo

e Copacabana até Irajá, Parada de Lucas, e Bangu. Em muitas favelas cariocas formaram-

se também as uniões femininas. ” (TABAK, 1987 p.13)

Segundo reportagem do Jornal “O Momento Feminino”, de 1947, as Uniões

Femininas estavam localizadas em 36 endereços, sendo esses bairros, morros e favelas.

Figura 1 - Jornal "O Momento Feminino" - Edição 15 - Rio de Janeiro, 31 de Outubro de 1947.

O Jornal Momento Feminino possuía forte presença nos bairros populares e

exerceu um papel central na divulgação das atividades das Uniões Femininas à época.

Segundo Tabak, 1987 (p.19), o

Momento Feminino nasceu a 24 de junho de 1947, no Rio

de Janeiro e durante quase dez anos de existência (com

períodos de maior ou menor regularidade na sua

publicação) defendeu sempre os direitos da mulher da

infância e a paz mundial. Foi um órgão de imprensa que

atingiu boa penetração nacional, pois chegou a ter

representantes em 16 Estados, sendo vendido em barros de

grande concentração popular, em Favelas, em locais de

trabalho onde era elevada a proporção de mulheres etc. No

Rio, chegou a ser vendido com certa regularidade em 20

favelas.

Figura 2 - Capa da Primeira Edição do Jornal "O Momento Feminino" - Rio de Janeiro, 25 de Julho de 1947

As mulheres das Uniões Femininas estavam empenhadas na luta econômica.

Segundo a primeira edição do jornal “O Momento Feminino”, essas mulheres sentiram

que aguardar medidas apenas da boa vontade dos homens,

a fome lhes viria rondar o próprio lar. Com a vertiginosa

alta dos preços de gêneros de primeira necessidade,

volveram, as mulheres, o pensamento para as causas

públicas que deram origem a tal situação. Daí o crescente

número de associações que surgem em todos os bairros do

Distrito Federal.1

Com isso, essas mulheres tinham um leque amplo de reivindicações: luta contra a carestia

de vida; por uma vida melhor para as crianças; em defesa da paz mundial; pela igualdade

de direitos para a mulher em todos os terrenos, assim como reivindicavam o término dos

despejos de favelas e a urbanização dos morros cariocas. As suas ações eram concentradas

em reuniões para discussão dostemas, como, por exemplo, o problema do abastecimento

do leite, a necessidade de se fundar escolas em determinado bairro, lutavam por moradias

higiênicas, melhoria nos hospitais.... As uniões femininas pleiteavam, assim, soluções

para variadas questões, envolvendo transporte, habitação, educação e alimentação.

Figura 3 - Jornal "O Momento Feminino" - Edição 14 - Rio de Janeiro, 24 de Outubro de 1947

1 Jornal Momento Feminino - Edição 3 – Rio de Janeiro, 8 de agosto de 1947

Figura 4 - Jornal O Momento Feminino – Edição 5 - Rio de Janeiro, 22 de agosto de 1947.

É importante salientar o esforço das Uniões Femininas de integrarem plenamente

as favelas e suas moradores no debate político. Não eram representadas como marginais

e excluídas da cidade. O Jornal procurava trazer à tona os problemas locais das favelas.

Segundo Tabak (TABAK, 2002 p.21), “uma das atividades mais expressivas da atuação

das organizações femininas consiste na denúncia das diferentes formas de discriminação

que a mulher ainda sofre, em muitos setores da vida nacional”. Além da mobilização por

melhorias locais, as Uniões Femininas realizavam festas para as crianças com objetivo de

divertir e entreter. Promoviam também atividades de formação profissional, como os

cursos de costura, tendo em vista que grande número das associadas eram donas de casa,

domésticas e/ou costuravam para fora.

Figura 5 - Jornal O Momento Feminino - Edição 14 - Rio de Janeiro, 24 de outubro de 1947

A partir de situações que envolviam o cotidiano das mulheres, as uniões femininas

promoviam um forte debate sobre as questões políticas do período. Segundo o Art. 4º do

Estatuto das Uniões Femininas, as Uniões Femininas tinham como objetivo principal

prestar às associadas os serviços e benefícios

como combater a carestia da vida, facilitando todos os

meios, junto as autoridades competentes; adquirir para

suas associadas gêneros de primeira necessidade que se

encontrarem tabelados no Distrito Federal; Criar

Comissões de Sindicância nos bairros, visitando as casas

comerciais, levando relações às autoridades onde há

exploração e o Cambio Negro; Levantar reinvindicações

mais sentidas no bairro, como sejam: a falta de luz, d’água,

e a falta de saneamento e tudo quanto venha a prejudicar a

vida doméstica estendendo-se aos morros circunvizinhos;

levar à municipalidade as queixas das mais urgentes

necessidades; Conseguir mercadinhos, feira-livre,

caminhão de verduras e frutas e tudo que possa baratear a

vida do nosso bairro (até uma cooperativa). 2

É importante salientar que o Estatuto previa expressamente que os morros fossem

inseridos no rol de reinvindicações das uniões femininas. Devido às más condições de

moradia, falta de estrutura e uma falsa promessa de urbanização, fazia-se necessário

incluir como um objetivo a luta para a melhoria das condições de vida dos moradores de

favelas. As vereadoras comunistas, ligadas ao movimento das Uniões femininas, levaram

muitas vezes questões relacionadas às favelas para a Câmara do Distrito Federal.

Figura 6 - O Momento Feminino – Edição 5 - Rio de Janeiro, 22 de agosto de 1947.

Podemos perceber através do levantamento do acervo sobre as Uniões Femininas

no APERJ e pelos jornais da época, uma forte ligação entre o Partido Comunista

2Pasta nº426 (União Feminina Pedro Ernesto e Ramos). Fundo PolPol do Arquivo Público do Estado do

Rio deJaneiro.

Brasileiro e as Uniões Femininas. As lideranças das Uniões Femininas, como a vereadora

Arcelina Mochel (vereadora pelo PCB), eram diretamente vinculados ao PCB.

Figura 9 - Pasta nº426 (União Feminina Pedro Ernesto e Ramos). Fundo PolPol do Arquivo Público do Estado do Rio

de Janeiro

Quando uma união feminina estava para ser inaugurada, a população do bairro era

convidada pelo jornal O Momento Feminino e pela coluna Movimento Feminino no

jornal Tribuna Popular. O jornal “O Momento Feminino” era o maior vinculador

deinformaçõessobre as legislações, a mobilização feminina e suas reinvindicações. O

jornal publicava convites de reuniões, festas, tardes dançantes, inaugurações em geral,

almoços com vereadoras, entre outros.

Figura 8 - Imagem Pasta nº425 (União Feminina Morro do Pinto). Fundo PolPol do Arquivo Público do Estado do

Rio de Janeiro.

Considerações Finais

As Uniões Femininas exerceram um papel importante na mobilização política na

cidade do Rio de Janeiro, reivindicando melhores condições de trabalho e de vida.Essas

Uniões possibilitavam uma maior instrução das mulheres, que descobriam o significado

e o valor de seu voto, sabendo assim eleger para os cargos de representação popular,

homens e mulheres que defendiam os interesses da coletividade e, sobretudo, a liberdade

do país. Nas eleições de 1947,o Partido Comunista Brasileiro compôs a maior parte

daCâmara Municipal, sendo eleitas as vereadoras Odila Michel Schimidt e Arcelina

Rodrigues Mochel, atuantes no Jornal O Momento Feminino. As mulheres, ao

conhecerem seus direitos e reivindicarem por esses, se tornam sujeito de sua própria

história. Podemos perceber a gênese do Movimento Feminista através das lutas das

Uniões Femininas.

Referências Bibliográficas

ALVES, Iracélli Da Cruz. O PCB convida as mulheres à luta pela democracia:

Representações Femininas Representações Femininas em O Momento (1945-1947)

AMADO, Jorge. Homens e Coisas do Partido Comunista, 1946.

ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. A contradita. Polícia

política e comunismo no Brasil 1945-1964. Entrevistas com Cecil Borer, Hércules

Corrêa, José de Moraes e Nilson Venâncio. Rio de Janeiro, 2005.

BITTENCOURT, Danielle Lopes. O morro é do povo”: memórias e experiências de

mobilização em favelas cariocas. Dissertação de Mestrado em História. Niterói:

PPGH/UFF, 2012.

GONÇALVES, Rafael Soares; AMOROSO, Mauro. Da luta pelos direitos ao

reconhecimento como dever: as ações e o legado da União dos Trabalhadores Favelados.

In: SecondInternationalConferenceof Young UrbanResearchers. 2011.

GONÇALVES, Rafael Soares; AMOROSO, Mauro. A centralidade da UTF na

reconstrução da memória dos movimentos associativos de moradores nas Favelas

cariocas, 2012.

GUIMARÃES, Valéria Lima. O PCB cai no samba: os comunistas e a cultura popular

(1945-1950). Rio de Janeiro: Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, 2009.

NEGRO, Antonio Luigi; SILVA, Fernando Teixeira da. Trabalhadores, sindicatos e

política (1945-1964). In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves.

(org.). O Brasil republicano. O tempo da experiência democrática: Da democratização de

1945 ao golpe civil-militar de 1964. 1 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, v.

3, p.155-194.

OLIVEIRA, Luís Eduardo. A Tribuna Popular e a orientação do PCB para o movimento

sindical do Rio de Janeiro nos primeiros anos da experiência democrática brasileira

(1945-1946)

PANDOLFI, Dulce Chaves. Camaradas e companheiros: memórias e história do PCB /

Dulce Pandolfi – Rio de Janeiro: Relume-Damará: Fundação Roberto Marinho

PINHEIRO, Marcos César de Oliveira. O PCB e os Comitês Populares Democráticos na

cidade do Rio de Janeiro (1945-1947). Dissertação de Mestrado em História. Rio de

Janeiro: UFRJ, 2007.

TABAK, F. & Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Núcleo de Estudos

sobre a Mulher 1987, Mulher e democracia no Brasil, PUC, Rio de Janeiro.

TABAK, F. Mulheres públicas: participação política e poder. 2002.

VALLA, Victor Vincent. Educação, participação, urbanização: uma contribuição à

análise histórica das propostas institucionais para as favelas do Rio de Janeiro, 1941-

1980. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro , v. 1, n. 3, p. 282-296, Sept. 1985 .

VALLADARES, Licia. A gênese da favela carioca: a produção anterior s̉ ciências sociais.

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais, 2006.