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1 MULTIFUNCIONALIDADE DA PAISAGEM: O PAPEL NA GESTÃO DO PATRIMONIO HISTÓRICO, CULTURAL E AMBIENTAL EM ÁREAS DE AGRICULTURA FAMILIAR Cristiane Dambrós UNESP/Rio Claro [email protected] Darlene Aparecida de Oliveira Ferreira UNESP/Rio Claro [email protected] Resumo Reflexões a cerca da multifuncionalidade da paisagem por ser um mecanismo que se configura na promoção de atividades e atitudes de valorização ambiental. O artigo aborda a importância da multifuncionalidade na gestão do patrimônio histórico, cultural e ambiental em áreas de agricultura familiar. Também se destacou três exemplos de multifuncionalidade da paisagem: um no Rio Grande do Sul, outro em São Paulo e outro no estado do Amapá, na intenção de exemplificar paisagens e funções que cada uma assume. Palavras-chave: Multifuncionalidade da paisagem. Gestão. Agricultura familiar. Introdução O “boom” do modelo de agricultura produtivista, impulsionado a partir da década de 1950, destacou-se pelo crescimento econômico e tecnológico, ampliando a oferta de matéria-prima e alimentos. Porém, por volta da década de 1980 começaram a surgir questionamentos a respeito da utilização desordenada dos recursos naturais, acumulo de capital, marginalização da população rural e êxodo rural. Dentre estes, a preservação dos recursos naturais ganhou força na Rio 92, através de discussões a respeito da sustentabilidade ambiental. A homogeneização da paisagem rural favoreceu a marginalização e o êxodo, além da desvalorização dos saberes tradicionais considerados arcaicos quando comparados com as novas tecnologias. Mas, nem sempre a tecnologia obteve êxito só, devido aos aspectos da paisagem, há lugares que necessitaram realizar readequações para as famílias se sustentarem no meio rural e/ou se inserirem no sistema. Em alguns deles foi necessária a revalorização dos saberes tradicionais, ampliação e diversidade produtiva e inclusão de prestação de serviços. Portanto, a propriedade passa não mais a ser somente produtora de alimentos, mas de múltiplas funções vinculadas à propriedade.

MULTIFUNCIONALIDADE DA PAISAGEM: O PAPEL NA GESTÃO DO ... · da multifuncionalidade na gestão do patrimônio histórico, cultural e ambiental em áreas de agricultura familiar

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MULTIFUNCIONALIDADE DA PAISAGEM: O PAPEL NA GESTÃO DO PATRIMONIO HISTÓRICO, CULTURAL E AMBIENTAL

EM ÁREAS DE AGRICULTURA FAMILIAR

Cristiane Dambrós UNESP/Rio Claro

[email protected]

Darlene Aparecida de Oliveira Ferreira UNESP/Rio Claro

[email protected]

Resumo Reflexões a cerca da multifuncionalidade da paisagem por ser um mecanismo que se configura na promoção de atividades e atitudes de valorização ambiental. O artigo aborda a importância da multifuncionalidade na gestão do patrimônio histórico, cultural e ambiental em áreas de agricultura familiar. Também se destacou três exemplos de multifuncionalidade da paisagem: um no Rio Grande do Sul, outro em São Paulo e outro no estado do Amapá, na intenção de exemplificar paisagens e funções que cada uma assume. Palavras-chave: Multifuncionalidade da paisagem. Gestão. Agricultura familiar.

Introdução

O “boom” do modelo de agricultura produtivista, impulsionado a partir da década de

1950, destacou-se pelo crescimento econômico e tecnológico, ampliando a oferta de

matéria-prima e alimentos. Porém, por volta da década de 1980 começaram a surgir

questionamentos a respeito da utilização desordenada dos recursos naturais, acumulo de

capital, marginalização da população rural e êxodo rural. Dentre estes, a preservação

dos recursos naturais ganhou força na Rio 92, através de discussões a respeito da

sustentabilidade ambiental.

A homogeneização da paisagem rural favoreceu a marginalização e o êxodo, além da

desvalorização dos saberes tradicionais considerados arcaicos quando comparados com

as novas tecnologias. Mas, nem sempre a tecnologia obteve êxito só, devido aos

aspectos da paisagem, há lugares que necessitaram realizar readequações para as

famílias se sustentarem no meio rural e/ou se inserirem no sistema. Em alguns deles foi

necessária a revalorização dos saberes tradicionais, ampliação e diversidade produtiva e

inclusão de prestação de serviços. Portanto, a propriedade passa não mais a ser somente

produtora de alimentos, mas de múltiplas funções vinculadas à propriedade.

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Adquirindo um caráter multifuncional, a agricultura familiar cruza a fronteira

socioeconômica e política que norteavam a produtividade e a sua sobrevivência. Mesmo

mantendo como objetivo principal conquista socioeconômico, agregam possibilidades

de conservação do patrimônio histórico, ambiental e cultural. Esta possibilidade surge

com a dinamização funcional da paisagem quanto aos seus fatos visíveis e não visíveis.

Esta situação acontece devido às diferentes intensidades e complexa organização dos

fatos, que resultam na possibilidade de exploração e apropriação da paisagem.

A partir destas considerações e acreditando que a multifuncionalidade da paisagem, não

se constitui apenas em um meio de alcançar a sustentação de um agricultor familiar,

destaca-se que a busca do desenvolvimento local e da sustentabilidade, a partir das

demandas locais e globais é uma estratégia de planejamento e gestão que ultrapassam os

limites da propriedade. É neste âmbito que desponta aspectos envolvendo o patrimônio

histórico, ambiental e cultural em que estas famílias estão inseridas e qual a influência

das mesmas no contexto da paisagem em escala regional.

Multifuncionalidade da paisagem

Com a mecanização e inserção de tecnologias no meio rural, a paisagem passou por

mudanças que resultaram na homogeneização de extensas áreas. No entanto, em muitas

regiões a intensificação produtivista e a aquisição tecnológica levaram a exaustão dos

recursos naturais e/ou endividamento de muitos agricultores familiares.

Essas dificuldades favoreceram o êxodo rural e a marginalização desta categoria. Para

sobreviver muitos agricultores reuniram-se em grupos cooperados ou associativos,

muitas vezes auxiliados por ONGs ou Instituições de Ensino Superior, que possibilitou

a reestruturação e a busca de alternativas viáveis capazes de melhorar a qualidade de

vida destes agricultores.

Muitas destas alternativas estavam não apenas direcionadas a produção de alimentos,

mas também a outras funções como conservação ambiental, processamento de matéria-

prima como forma de agregação de valor e prestação de serviços, o mais comum é o

turismo nas suas diferentes formas de expressão. Porém quando estas alternativas

apresentam-se também como variável de recuperação e conservação ambiental é

compreendida através da denominação de multifuncionalidade da paisagem (FAO,

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1999, CARNEIRO e MALUF, 2003, GROENFELDT, 2005, MIRANDA e ADIB, 2006,

GUIOMAR et al., 2008, CAZELLA et al., 2009, MAIA e FERREIRA, 2011).

Salienta-se que a multifuncionalidade da paisagem não faz parte do sistema ecológico,

mas o resultado da complexa interação entre a natureza/cultura ou sociedade/ambiente

(NAVEH, 2001; HAINES-YOUNG, POTSCHIN, 2000).

Segundo Oliveira et al. (2008) a multifuncionalidade da paisagem estaria ligada a uma

nova função que as propriedades agrícolas adotam, não mais apenas como produtora de

alimentos, mas também como uma possível área de conservação do ambiente.

O conceito de multifuncionalidade da paisagem surge então como um paradigma em relação às novas funções que o espaço rural deve considerar num contexto em que a agricultura como função produtiva tende a reduzir a sua importância, enquanto outras funções, baseadas ou não na agricultura, emergem como possíveis orientações para a gestão da paisagem (Oliveira et al., 2008, p. 8).

Segundo Pinto-Correia (2007), utiliza-se a multifuncionalidade como um conceito

analítico e a partir desta analise avalia-se quais funções são suportadas por uma

determinada paisagem, num determinado momento e como se definem os conflitos e as

sinergias das funções em um dado espaço. Portanto, a interpretação dos tipos de funções

e de como o uso do solo está ocorrendo, implicam na formulação de políticas de gestão.

Segundo Cazella et al. (2009) a agricultura familiar tem como requisito para sua

sustentação a multifuncionalidade, porém estas devem ser contextualizadas nas

especificidades de cada lugar, ou seja, quando compara-se um agricultor da Região

Norte com um agricultor da Região Sul do País é notória esta diferença.

Autores como Miranda e Adib (2006), Cazella et al. (2009) destacam que a

sustentabilidade, a agricultura familiar e as políticas públicas, estão intrinsecamente

correlacionadas, favorecendo a incorporação de ações multifuncionais de visam

desenvolvimento sustentável nas propriedades.

A necessidade de manutenção do homem no meio rural, bem como a conservação dos

recursos naturais, ocasiona a busca de funções alternativas para a propriedade. Verifica-

se que a atuação pode ocorrer em escalas diferenciadas, por exemplo, a reorganização

da propriedade no que diz respeito às funções que ela desempenha e, em âmbito

regional a proposição de associações ou cooperativas, no que diz respeito a ações de

desenvolvimento sustentável do lugar. Portanto, as finalidades entre estes dois exemplos

são iguais ambos visam à preservação e o uso sustentável dos recursos naturais pelo

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homem, bem como sua permanência no meio rural e melhorias na qualidade de vida

(GALVÃO e VARETA, 2010; PANZUTTI, 2011).

Estas novas características que o meio rural esta adotando, para muitos contribui apenas

para a melhoria da qualidade de vida das populações, além de respeitar as funções da

paisagem local. Acredita-se que a multifuncionalidade vai muito além do

desenvolvimento sustentável e do equilíbrio ambiental.

Gestão do patrimônio histórico, cultural e ambiental em de agricultura familiar

Para muitos a conservação do patrimônio cultural e ambiental se resumo em unidades

de conservação e museus. Porém, iniciativas que objetivam cuidado com fatos visíveis e

invisíveis da paisagem contemplam a preservação destes patrimônios. Ações de

valorização, revitalização e conservação não estão restritas as áreas urbanas, mas

também são cada vez mais comuns comunidades rurais tradicionais recuperando

características culturais históricas, bem como modificando seu comportamento diante

dos recursos naturais existentes no lugar.

A gestão pode ser entendida como um processo de formulação de princípios, diretrizes e

normas, compreendidos como o processo de planejamento, eficientes no gerenciamento

e na tomada de decisão que tem por objetivo o controle e proteção do patrimônio

(POLETO, 2010). Portanto, a organização associativa ou cooperativada de famílias que

visam o mesmo objetivo, favorece a tomada de decisão e minimização dos conflitos.

Já o entendimento de patrimônio não pode ser compreendido isoladamente, eles só terá

sentido quando estiver relacionado a alguma coisa. É o legado que herdamos e que

ainda persiste registrado na paisagem, assim o patrimônio pode ser classificado em

histórico, cultural e ambiental.

O patrimônio histórico pode ser entendido como os fatos visíveis na paisagem e que

perduram ao passar do tempo, como por exemplo, arquitetura, documentos, utensílios,

entre outros, importantes para o entendimento de sua identidade histórica. O patrimônio

cultural está presente, nos fatos visíveis e invisíveis da paisagem, que contam a história

através de costumes, gastronomia, religião, lendas, festas, entre outros. O patrimônio

ambiental envolve a inter-relação do homem com os recursos naturais, que em muitos

casos há o domínio do homem sobre a natureza, provocando conflitos e tomadas de

decisões preservacionistas (PPGPPC, 2011).

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Neste sentido a gestão tem fundamental importância na manutenção do patrimônio

histórico, cultural e ambiental de diferentes lugares. Estas ações são relevantes em

comunidades tradicionais de agricultores familiares, pois nestes lugares são perceptíveis

na paisagem as características de riquíssima herança patrimonial histórica, cultural e

ambiental. O resgate destas características favoreceu o desenvolvimento de múltiplas

funções dos agricultores em suas propriedades, melhorando a qualidade de vida e

contribuindo para a conservação dos patrimônios existentes no lugar.

O resgate dessas ações pelos agricultores através de atividades como o turismo,

artesanato, produção agroecológica, orgânica, agroflorestal, organização de uma

agroindústria, entre outras atividades, muitas vezes necessitam de apoio técnico e

treinamento, no sentido da gestão destas novas funções que a propriedade e/ou

comunidade irá adquirir. Estas ações necessitam de planejamento e engajamento dos

envolvidos, sendo que na maioria das vezes há melhora da qualidade de vida,

permanência das famílias no meio rural e, consequentemente, favorecerá ao meio

ambiente (BERTOLINI, BRANDALISE, NAZZARI, 2010).

Porém, é de suma importância, conhecer a comunidade ou o agricultor, pois não é

interessante impor atividades a família, mas sim ser uma escolha da mesma pelas

atividades que queira desenvolver e posteriormente procurar auxilio técnico para

efetivação do projeto. A valorização das habilidades individuais e dos saberes

tradicionais é indispensável para o sucesso e estimulo dos envolvidos, além de tornar

um trabalho prazeroso. Bertolini, Brandalise, Nazzari (2010), destacam que a qualidade

na gestão de propriedades e/ou comunidades deve estar baseada na tomada de decisão

em fatos e dados reais e não em suposições.

Portanto, a gestão do patrimônio histórico, cultural e ambiental em uma propriedade ou

em uma comunidade de agricultores familiares, deve estar integrada a legislação. Pois, a

gestão perpassa pelo desenvolvimento sustentável, crescimento econômico e

preservação ambiental e, estes devem estar harmoniosamente integrados para que de

fato possa ocorrer o gerenciamento deste lugar.

Exemplos de multifuncionalidade da paisagem em propriedades da agricultura

familiar

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No Brasil, há inúmeros exemplos de agricultores familiares que realizam atividades

multifuncionais. Estas atividades podem estar restritas aos indivíduos da família e a

propriedade ou organizados em grupos (cooperativas ou associações). Como os

exemplos de cooperativas e associações têm maior destaque e muitas são conhecidas em

escala nacional e até mesmo internacional, escolheram-se três exemplos que realizam

atividades e enquadram-se dentro de uma paisagem multifuncional.

Cada cooperativa ou associação tem características peculiares que valorizam os saberes

tradicionais e paisagens que marcam aspectos naturais e culturais específicos de cada

lugar. Os exemplos escolhidos foram: o Circuito de Turismo na Agricultura Familiar -

Cananéia/SP, Cooperativa Mista de Produtores e Extrativistas do Rio Iratapuru/AP e a

Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos/RS.

1º) Circuito de Turismo na Agricultura Familiar – Cananéia/SP

Considerando áreas que se destacam em seus aspectos naturais e culturais, têm-se o

município de Cananéia, localizado na Microrregião de Registro, extremo sul do estado

de São Paulo. Cananéia faz parte do Vale do Ribeira, declarado pela UNESCO como

Patrimônio da Humanidade, considerada Reserva da Biosfera, mantém uma das maiores

parcelas continuas do Bioma da Mata Atlântica. Quanto aos aspectos culturais,

destacam-se os costumes, gastronomia, cantos e festas que perduram ao longo do tempo

junto com as comunidades tradicionais. Em Cananéia também está presente o

patrimônio histórico através do conjunto arquitetônico construído e o artesanato

ensinado de geração para geração, pelos primeiros colonizadores, pois Cananéia é o

segundo município criado no Brasil, fundado em 1531 (IBGE, 2010).

Com objetivo de conservar esse patrimônio, muitos foram os esforços, como por

exemplo, o Circuito de Turismo Rural na Agricultura Familiar no Município de

Cananéia/SP. Foram feitos levantamentos dos agricultores interessados, treinamentos,

cursos e intercâmbios. Além dos agricultores manterem suas atividades corriqueiras de

produção de alimentos para subsistência, incorporou atividades agroflorestais, turismo

rural, turismo ecológico e produtos artesanais e agroecológicos (Figura 1a,b). Destaca-

se que mesmo, realizando atividades que visam agregação de renda, as atividades têm

cunho conservacionista, sendo este o ideal da multifuncionalidade da paisagem (SÃO

PAULO, 2012).

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Figura 1a,b: A figura 1a, ilustra uma cachoeira na encosta da Serra do Mar e a figura 1b, ilustra a gastronomia típica do lugar, Cananéia/SP.

Fonte: http://www.cananet.com.br/asa/phpsite/site/page.php?go&key=13.

2º) Cooperativa Mista de Produtores e Extrativistas do Rio Iratapuru/AP

Este exemplo destaca características diferenciadas, a Cooperativa Mista de Produtores e

Extrativistas do Rio Iratapuru (COMARU), localizado no estado do Amapá, foi fundada

em 1995 através de iniciativas de 22 moradores. Sendo esta cooperativa que demandou

a criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (DRS) do Rio Iratapuru, criada

em 1997, abrangendo parte dos municípios de Laranjal do Jarí, Mazagão, Pedra Branca

do Amaparí, perfazendo a área de 806.184 ha.

A criação da RDS ocasionou significativa melhora das famílias pertencente ao

COMARU, fazendo da idéia de conservação parte do dia-a-dia, dando visibilidade a

cooperativa e agregando parcerias, como por exemplo, da Natura cosméticos, atividades

de ecoturismo, pesca controlada e a principal mudança foi a passagem das famílias

apenas como coletoras de castanha para fabricantes de produtos derivados de amêndoas.

Destaca-se que não moradores dentro do RDS do Rio Iratapuru, todos residem no seu

entorno e dispõe de 5% da área para extrativismo sustentável.

Portanto, as famílias anteriormente a fundação do COMARU e da RDS, realizavam

atividades somente para subsistência. Com o COMARU, além de criarem parcerias e

conquistarem ascensão de renda, possibilitou qualidade de vida as famílias e

preservação do Bioma Amazônia, pois a com a criação do RDS além da extração, coleta

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e pesca ser controlada, possibilita o controle de ocupações e garimpos clandestinos

(WWF, 2006) (Figura 2).

Figura 2: A primeira imagem detalhe da mata e na segunda imagem um agricultor coletando castanhas.

Fonte: http://evaturismo-ap.blogspot.com.br/p/polo-castanhais.html

3º) Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos/RS

No Rio Grande do Sul, um exemplo de multifuncionalidade da paisagem está na Serra

Gaúcha, mais especificadamente no Vale dos Vinhedos. O Vale é delimitado pelos seus

pontos cotado e divisor de águas, abrangendo os municípios de Garibaldi, Bento

Gonçalves e Monte Belo do Sul. Os agricultores familiares residentes no Vale dos

Vinhedos organizaram-se em associação, a APROVALE – Associação dos Produtores

de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos, com intuito de agregar valor à principal

matéria-prima da região, o cultivo de videiras, que com apoio da EMBRAPA e da

Universidade de Caxias do Sul conseguiram reconhecimento como Indicação

Geográfica de seus produtos.

As atividades desenvolvidas pelos agricultores são: cultivo de videiras, agroindústria

(produção de vinho, sucos e geléias, além de outros produtos típicos da cultura italiana),

enoturismo, turismo rural, turismo cultural e histórico (capitéis, capelas, danças, cantos,

costumes, artesanato, memorial do vinho e acervo histórico dos imigrantes) e trilhas

ecológicas. Neste sentido, a preservação patrimonial cultural e ambiental do Vale, além

da agregação econômica para os agricultores familiares através da APROVALE,

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possibilita preservação dos remanescentes de Mata Atlântica da região (APROVALE,

2012).

Figura 3: A primeira imagem é a logomarca para indicação de procedência, e a segunda imagem um panorama dos parreirais.

Fonte: http://www.valedosvinhedos.com.br/vale/index.php#null

Considerações finais

Destaca-se a paisagem é conjunto complexo de fatos que por si só se expressa de modo

multifuncional. Isto pode ser observado nas peculiaridades de cada lugar, na formas de

gestão e nas diferentes funções desempenhadas pelos agricultores, passiveis de

entendimento de que a multifuncionalidade da paisagem se encontra presente.

Exemplo de uma função marcante nestas paisagens é o turismo e a agroindústria. Em

Cananéia/SP, o turismo está direcionado a exuberante paisagem litorânea, também há o

turismo cultural que busca valoriza as populações tradicionais e o turismo histórico. No

Vale dos Vinhedos/RS, o turismo tem diferencial por se desenvolver na área rural,

porém seu objetivo também está na exploração da paisagem cênica obtida pelas

características fisionômicas da paisagem, além de produtos derivados da uva. Já no

RDS do Rio Iratapuru/AP o turismo esta direcionada a produção e extração sustentável,

ao ecoturismo e a visitas de pesquisadores, neste lugar a quantidade de visitantes ainda é

baixa em comparação com as demais. Contudo, a multifuncionalidade é verificada

devido ao princípio a ações conservacionistas dos recursos naturais.

A multifuncionalidade é intrínseca a paisagem já existente, porém as políticas de

incentivo e as tomadas de decisões irão variar de acordo com os instrumentos de gestão,

como por exemplo, incentivos às atividades agroambientais (Cananéia e RDS do Rio

Iratapuru) e do desenvolvimento das atividades econômicas rurais (Vale dos Vinhedos).

Destaca-se que o Vale dos Vinhedos adquire esta qualidade, devido ao conjunto de

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funções que a mesma desempenha, destaca-se que ações direcionadas a conservação

ambiental, sociais, e culturais estão sempre presentes. Portanto, a multifuncionalidade

da paisagem possibilita a aproximação do desenvolvimento sustentável e do equilíbrio

homem/natureza.

Destaca-se que, o entendimento de paisagem é o resultado do complexo conjunto de

ações e interações de fatos visíveis e invisíveis, que indicam caminhos para o

ordenamento dos processos e dos sistemas no espaço geográfico.

Referências

APROVALE - Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos/RS.

Disponível em: http://www.valedosvinhedos.com.br/vale/index.php#null. Acesso em:

02/06/2012.

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