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1. Quais são as tuas áreas de interesse, os teus hobbies, actividades de tempos livres? Neste momento tenho estado a fazer investigação cultural. Sou licenciada em Animação e Investigação Cultural. Em Ciências da Cultura estou envolvida em vários projectos. Neste momento sou membro activo da plataforma editorial Amor Livre e estou desde o ano passado a compilar um livro que imagino será o primeiro livro de slam em Portugal. (inaudível) 17 poetas slammers autores incluindo um colectivo. No fundo, tou a sempre a (inaudível) em projectos. Neste momento, com este livro, também vamos envolver alunos de Design e, portanto, a ideia é sempre, para além deste trabalho,hmmmm…Eu foco muito no colectivo, acho que é uma noção, também, que está cada vez mais a ser vivida pelas pessoas em Portugal mas ainda com…Ou seja, já ando a fazer isto há bastante tempo e deparei-me, muitas vezes, com algumas dificuldades da parte das pessoas em entender o que é que é realmente o colectivo. À parte disso, também tenho um trabalho a solo que, no meio disto tudo, às vezes perde-se um bocado porque é difícil gerir as energias todas. Mas também já andei a fazer performances pela Europa, faço parte também de outros grupos paraliterários no Leste da Europa e publico poemas sobretudo fora. Sempre com pseudónimos, com heterónimos de maneira a não deixar rastos. Gosto muito, aliás um dos meus principais interesses é realmente a arte efémera e performativa. Há mais de 10 anos que ando envolvida em colectivos de dança, performance e, pronto, com esta ideia sempre do efémero, ou seja, são momentos que são vividos, são happenings, acontecimentos. E dessa forma, também, que encaro os eventos de poetry slam desde o início, como acontecimentos sendo que a única diferença é que tem havido registo que é a única forma que as performances, esse tipo de arte fica, normalmente. É através de fotografia, vídeo. São esses os registos artísticos. Os meus dias, neste momento, como já disse é trabalhar, há imensa coisa a acontecer, muitas solicitações. Normalmente faço também traduções. Acho que passo muito tempo acordada. 2. No que toca à cultura, à arte, como usa(s) o teu tempo? Que actividades fazes? Respondida na 1. 3. Lês poesia? Sim. não tanta como gostaria. 4. Tens algum autor/a (conhecido ou não, consagrado ou não), poema preferido? Há muitos. Tenho vários poetas vivos de quem gosto imenso. Um deles é um espanhol, o Marçal Font Espit, também slammer. Foi campeão. Também um amigo meu. Já traduzi, já fiz traduções de poemas dele. Gosto imenso do poema dele “A sentença de Adão”. Gosto muito do poema do Marc Kelly Smith, “Pull the next one up” que é um poema muito forte. Dos mais antigos, gosto muito do T.S. Elliot. Tenho ali um poema dele que foi escrito por um amigo, meio monge meio motard, que ele escreveu à mão. É o poema do T.S. Elliot, “the road no taken”, acho eu que é esse…não, não esse é o outro, “the fourth quartet”. Mas também gosto muito do outro, é muito potente. Mas também gosto muito de descobrir poetas vivos, pronto. Os que já foram, já foram. E acho que é importante estabelecer esta ponte entre o passado e o que vem aí. Mas estar atento ao que está a ser pensado e

No que toca à cultura, à arte, como usa(s) o teu …repositorio.ul.pt/bitstream/10451/28007/8/EntrevistaNo6.pdfTens algo publicado em papel, suporte digital (cd, dvd), na web (blogue,

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1. Quais são as tuas áreas de interesse, os teus hobbies, actividades de tempos livres?

Neste momento tenho estado a fazer investigação cultural. Sou licenciada em Animação e

Investigação Cultural. Em Ciências da Cultura estou envolvida em vários projectos. Neste

momento sou membro activo da plataforma editorial Amor Livre e estou desde o ano passado

a compilar um livro que imagino será o primeiro livro de slam em Portugal. (inaudível) 17

poetas slammers autores incluindo um colectivo. No fundo, tou a sempre a (inaudível) em

projectos. Neste momento, com este livro, também vamos envolver alunos de Design e,

portanto, a ideia é sempre, para além deste trabalho,hmmmm…Eu foco muito no colectivo,

acho que é uma noção, também, que está cada vez mais a ser vivida pelas pessoas em Portugal

mas ainda com…Ou seja, já ando a fazer isto há bastante tempo e deparei-me, muitas vezes,

com algumas dificuldades da parte das pessoas em entender o que é que é realmente o

colectivo. À parte disso, também tenho um trabalho a solo que, no meio disto tudo, às vezes

perde-se um bocado porque é difícil gerir as energias todas. Mas também já andei a fazer

performances pela Europa, faço parte também de outros grupos paraliterários no Leste da

Europa e publico poemas sobretudo fora. Sempre com pseudónimos, com heterónimos de

maneira a não deixar rastos. Gosto muito, aliás um dos meus principais interesses é realmente

a arte efémera e performativa. Há mais de 10 anos que ando envolvida em colectivos de

dança, performance e, pronto, com esta ideia sempre do efémero, ou seja, são momentos que

são vividos, são happenings, acontecimentos. E dessa forma, também, que encaro os eventos

de poetry slam desde o início, como acontecimentos sendo que a única diferença é que tem

havido registo que é a única forma que as performances, esse tipo de arte fica, normalmente.

É através de fotografia, vídeo. São esses os registos artísticos. Os meus dias, neste momento,

como já disse é trabalhar, há imensa coisa a acontecer, muitas solicitações. Normalmente faço

também traduções. Acho que passo muito tempo acordada.

2. No que toca à cultura, à arte, como usa(s) o teu tempo? Que actividades fazes?

Respondida na 1.

3. Lês poesia?

Sim. não tanta como gostaria.

4. Tens algum autor/a (conhecido ou não, consagrado ou não), poema preferido?

Há muitos. Tenho vários poetas vivos de quem gosto imenso. Um deles é um

espanhol, o Marçal Font Espit, também slammer. Foi campeão. Também um amigo

meu. Já traduzi, já fiz traduções de poemas dele. Gosto imenso do poema dele “A

sentença de Adão”. Gosto muito do poema do Marc Kelly Smith, “Pull the next one

up” que é um poema muito forte. Dos mais antigos, gosto muito do T.S. Elliot.

Tenho ali um poema dele que foi escrito por um amigo, meio monge meio motard,

que ele escreveu à mão. É o poema do T.S. Elliot, “the road no taken”, acho eu que

é esse…não, não esse é o outro, “the fourth quartet”. Mas também gosto muito do

outro, é muito potente. Mas também gosto muito de descobrir poetas vivos,

pronto. Os que já foram, já foram. E acho que é importante estabelecer esta ponte

entre o passado e o que vem aí. Mas estar atento ao que está a ser pensado e

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escrito neste momento acho que é uma urgência. E realmente, ligarmo-nos e

conectarmos com essas pessoas cada vez mais. A lista podia continuar mas

podemos ficar por aí.

5. Em que momentos lês poesia? É uma leitura regular ou de momentos?

Lês à noite, antes de dormir? Numa caminhada, numa pausa do trabalho, num sítio

especial, etc.)?

Eu acho que devíamos definir primeiro poesia.

O que é poesia para ti.

Para mim poesia é, é uma constante, é todo o tempo. Ou seja, ler poesia não tem,

necessariamente, de ser um texto escrito. Eu acho que podemos observar a vida, o

dia-a-dia, o quotidiano, tudo o que estamos a viver como uma forma…aliás, nós

estamos sempre a ler. Quando estamos a andar na rua, estamos a ler o que nos

rodeia. Ler não é só o que está num livro ou que está impresso numa folha, pelo

menos na minha perspectiva. Portanto…acho que tenho este defeito, estou sempre

a ver poesia e a ler poesia, em todo o lado.

6. Compras livros de poesia? Onde? O que te faz comprar um livro de poesia/como

escolhes?

Compro mas tenho-me retido ultimamente. O que eu mais gosto é quando compro

directamente a quem escreve, se forem vivos. Tento apoiar o trabalho de poetas mais jovens,

menos jovens. Se não, por falta de tempo e isso, tenho comprado pela Internet. Alguns

sobretudo que são difíceis de adquirir. Havia um livro, por exemplo, do Daniil KHARMS que foi

publicado, voltou a ser editado há 2 ou 3 anos e acho que tive imensa dificuldade em

encontrar. Qualquer sítio é bom para comprar poesia.

(a Ana mostrou-me o livro)

Isto é ele?

Isto é ele. Ele foi, ele não foi reconhecido na altura. Nasceu em S. Petersburgo, no séc. XX e

pronto, morreu aos 38 anos. E tem coisas muito engraçadas. O título do livro é “Hoje não

escrevi nada”. E é um livro de quase 300 páginas, para quem não escreveu nada. Isso mistura

um bocado prosa, alguns ensaios. É um livro difícil de encontrar. Gosto, também, de ter acesso

a algumas obras que não andam por aí, sobretudo com o fecho de tanta livraria.

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O que te faz comprar um livro de poesia/como escolhes?

Não sei. Acho que é intuitivo. Normalmente já sei ao que vou porque procurei ou então

porque conheço a pessoa e gosto da obra.

Já te aconteceu não estar à procura de nenhum livro específico e comprar aquele livro

porque o tiveste na mão e…?

Raramente. Não tenho essa liberdade financeira de comprar por impulso. Normalmente é um

bocadinho mais reflectido.

7. Lês poesia na Internet? Tens/Vais a algum site/blogue?

Sim.

E segues algum site, blog?

Não. Não tenho tempo.

Então quando lês poesia na internet, é porque estás a fazer alguma procura?

Sim, principalmente.

8. Escreves poesia? Se sim, quando começaste a escrever? Costumas partilhar o que

escreves com alguém? Tens algo publicado em papel, suporte digital (cd, dvd), na

web (blogue, site, etc.)?

Às vezes (risos). A minha primeira…é engraçado porque tenho o registo dos meus primeiros

passos na poesia. Foi…fiz um livro de poesia para oferecer à minha mãe quando tinha para aí 7

ou 8 anos. Foi tudo manual, artesanal e…eu não tenho jeito nenhum para ilustração. Portanto,

arranjei cartão, meti umas folhas, agrafei aquilo, escrevi tudo à mão e depois fiz uns desenhos.

E forrei a capa com papel de embrulho muito feio, com florzinhas. E pronto, foi o primeiro livro

que eu fiz, foi uma prenda para a minha mãe. Acho que foi para os anos dela. Esse foi o 1º

livro. E depois tive assim um, uma fase de vomitar poesia na adolescência, sem parar.

E quando é que começaste a partilhar aquilo que escrevias? Começaste logo com a tua mãe…

Com a minha mãe…depois passei para o meu professor de Francês. Partilhei com ele um

poema erótico que tinha escrito. Por razões pessoais era a pessoa indicada e gostava imenso.

Eu estudei no sistema francês. As aulas de Francês eram equivalentes às aulas de Português. O

meu professor de Francês era o equivalente ao professor de Português.

Mas cá?

Um bocado por toda a parte.

Desde quando é que estás cá, em Lisboa?

Assim, outra vez, desde 2010.

Tu costumas andar…és nómada?

Sim, muito.

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Ah, não sabia.

E sempre gostei imenso de estudar autores e gostava imenso dessas aulas e achei por bem

partilhar com ele o poema. depois partilhava imenso com amigos meus que eram, estavam

mais na onda do hip hop, do rap e escreviam e usavam d-jing. Escrevia já em Inglês, muito, e

partilhava com eles. Assim mais (inaudível). não conhecia slam, não havia slam nessa altura.

Quer dizer, não conhecia e acho que onde eu estava não havia. Hoje em dia penso que sim, foi

também isso que me levou a…não quero estar a adiantar muito.

Podes falar à vontade.

Mas…foi acontecendo. Lá está, eu como estive muito tempo fora e…os meus pais são os dois

portugueses e eu nasci cá. A minha relação com a língua portuguesa…eu só comecei a

aprender realmente…mesmo tendo tido aulas, foi a partir de 2004.

Que começaste a aprender Português?

A saber realmente expressar-me em Português. Inscrevi-me no Mestrado e para mim foi “e

agora como é que eu escrevo?”. Até escrever um mail, eu não fazia ideia como é que se

despede, aquelas coisas. Uma coisa é saber falar, outra coisa é dizer as coisas como tu queres

dizê-las. E, portanto, enquanto estava a estudar, a ter aulas de Mestrado, estava a aprender a

expressar-me em Português. Portanto, só comecei realmente a apropriar-me da língua nestes

últimos quase 10 anos. Conseguir realmente brincar com as palavras, senti-las, enfim, esculpi-

las. E pronto.

E no âmbito dessa partilha, já publicaste ou produziste flyers, folhetos, chapbooks, cd’s,

dvd’s, etc?

O meu lado efémero leva-me a não ter esta necessidade. Mas quando cheguei a Portugal, em

2004, rapidamente, logo nesse ano, portanto, além de escrever e ter o lado performativo

normalmente mudo porque era mais o trabalho do corpo.

Mas fala-me também dessa parte. No fundo também é uma forma de publicação, de

partilha.

Sim. já em Montreal, estive num colectivo de dança. Éramos sobretudo raparigas e íamos para

a rua, fazíamos manifestações espontâneas de performance, de dança, em espaços públicos.

Depois vim para cá e integrei-me num colectivo chamado Advance D-Lux dirigido por um

americano, em que fizemos imenso trabalho de corpo e algumas das performances ocorriam,

por exemplo, no Bairro Alto. Éramos cerca de 8 performers em que ocupámos 1 montra, numa

noite, durante 1 hora estávamos todos a fazer esta performance na montra. As pessoas

passavam e viam. Uns eram bailarinos profissionais, outros mais performers. E também

fizemos acções para angariação de fundos, para a revista Cais, no Museu da Água. Estivemos lá

em baixo, com água pelos joelhos. Também havia vídeo projectado. Portanto, havia vídeo,

edição de vídeo, performance. Mas…ou seja, sem palavras, muito o corpo só. Em 2004,

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também, o meu lado de Dj, música, vem à superfície. Portanto, havia uns concursos na rádio

Oxigénio. Eu decidi-me inscrever, logo no início. Ganhei 2 Dj battles na rádio Oxigénio e depois

participei na 1ª Dj battle eliminatória. Aquilo era quase como os slams – ias lá uma vez, se

ganhavas ias lá à 2ª ronda, se ganhavas depois ias a um bar. Acho que…não sei se eram 3 ou 4

rondas, não me lembro. Na altura fui. Apareci lá eu. Era Dj com cd’s. não tinha vinis, não tinha

material, equipamento técnico de todo. Chegou outro Dj com uma mala de vinis e…eu pensei

“já está. Foi bom chegar aqui”. e ganhei também essa Dj battle. Portanto, isso foi em 2005.

Cheguei a participar no Mundo Mix, no Hotel Tivoli. Fui Dj residente no (inaudível), em festas

privadas.

Tens essas 2 áreas, além da poesia e da literatura, tens essas 2 áreas fortes…ou tens mais

alguma?

Vídeo e fotografia também. Fiz vídeos para amigos, faço fotografia. As fotografias que estão no

Poetry Slam normalmente sou eu que tiro. Não por querer mas porque acontece. E entretanto

tive também um projecto de música chamado Material Eyes experimental, lá está. A 1ª coisa

que fizemos, isso fiz com um produtor que é o Bruno Lobato, que é um dos melhores

produtores de Portugal na minha opinião. É produtor e técnico dos Terracota, Kumpanhia

Algazarra, grupos de hip hop. Neste momento, é produtor dos Batida. Eles fazem um trabalho

de fusão de música angolana e também sons tradicionais, kuduro. Tivemos este projecto,

Material Eyes, em que (inaudível) gravávamos o poema e depois desconstruíamos tudo,

cortávamos tudo. E todos os sons são feitos a partir da voz, portanto havia aí um

questionamento entre a manipulação da tecnologia sobre o ser humano. Esta relação, isso tem

o trabalho no My Space, umas demos. Nunca fomos muito longe para além de ter ganho, ter

ganho…ter participado na compilação Novos Talentos FNAC com uma música.

Isso era excelente para abrir um slam…

Sim…isto já foi há algum tempo…5 anos. Sempre a olhar para a frente. Esse projecto nunca foi

feito ao vivo. Ou seja, foi um trabalho de estúdio. Está no My Space.é tudo em Inglês.

(inaudível) a tentar adaptá-los mais a música, canções. A partir daí, havia o trabalho de gravar

o poema e depois voltar a ele, voltar a gravar. Muito experimental. Tive também outros

projectos mais espontâneos, também em Inglês, mais jazz electrónico publicados em Itália

num livro sobre Portugal. Também estão lá outros artistas como André Sardet e os Clã, por

exemplo. Tenho 2 músicas também em Inglês em que também sou intérprete e autora dos

textos, com outro produtor, neste caso o Tiago (inaudível) e foi mais ou menos nessa altura,

em 2009, que descobri o Slam.

9. Que tipo de eventos culturais frequentas? Onde?

Os em que eu participo. Não dá para fazer tudo. Concertos, eventos de poesia,

lançamentos de livros, conferências.

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Dentro daqueles em que também participas de alguma forma, as áreas principais,

neste momento, são a poesia…?

Sim.

E como, só como espectadora, receptora, o que é que preferes?

Gosto de ir ver um bom concerto. Então quando são artistas que sabem o que estão a

fazer. Gosto muito de David Santos, por exemplo, de Noiserv. Patrick Watson, gosto

imenso de ver artistas multifacetados que conseguem mexer em vários

instrumentos e passar do acústico ao electrónico ao rock. Sim. é mais por aí.

10. Que eventos relacionados com poesia frequentavas e/ou continuas a frequentar?

Gosto de estar a par do que está a acontecer. Ter uma visão o mais possivelmente

global entre aspas do que se anda a fazer. Não sei. Queres reformular a pergunta?

Aquilo que eu queria saber é se, dentro da poesia, vais a algum tipo de evento para

além do slam que organizas.

A uma certa altura, isto já lá vão quase 3 anos a organizar portanto, às vezes satura. E quero é

fazer outra coisa qualquer que não tem nada a ver como ir passear no meio da Natureza ou

sair da cidade, sair do urbano um bocadinho, fazer outra coisa. Porque se não, chega a um

ponto de saturação e já não consigo ouvir, tou a ouvir tanta gente a dizer tanta coisa, Tanta

coisa (referência a poema de a&e) que às vezes é bom é limpar os ouvidos e os olhos.

Isso é uma coisa que não sei se está no teu quotidiano mas está na tua vida. Essa área de

saíres para fora do urbano.

Completamente. Estou muito ligada a todos os movimentos, neste momento, emergentes

ligados a essa lado de comunidades, permacultura.

É uma coisa que fazes regularmente.

Faço, faço. Vou para o campo e meto as mãos na terra. E planto e aprendo a fazer fornos

(inaudível) stoves. E sim, sementes. É um trabalho que faço também, que me dá imenso gosto

e que acho que é importante e urgente também. Acho que há aqui uma temática de muita

urgência neste momento. Para mim, está muito à vista.

11. Já organizaste ou organizas eventos culturais/artísticos? Quais?

Comecei logo no liceu quando tinha 15, 16 anos a organizar a festa de fim de ano. Fizemos 2

ou 3 anos seguidos. Faxíamos um apelo a todos aqueles que tinham bandas e grupos para

virem fazer um concerto ou ler ou tocar piano…sei lá. Eu na altura fiz as luzes, fazia luzes. Tinha

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organizado isso com o meu namorado, ele fazia parte do som. Depois arranjámos uma

estudante para fazer o flyer, isso era o concerto de fim de ano. Depois voltei a fazer e depois

também organizava com outro grupo as festinhas de dança para os mais novos. Estávamos no

liceu e fazíamos as festas para os de 12 anos. Aí já eram 2 ou 3 por ano. Portanto, é uma coisa

que já vem de…fiz parte de um colectivo, também em Montreal que se reuniu e que organizou

um happening de uma noite. Era das 21h00 às 06h00 da manhã que foi numa cave de uma

igreja. Porque as igrejas em Montreal, como já estão desertas há vários anos, foram adaptadas

ou para condomínios ou então cedem o espaço para festas e para eventos. E o padre dessa

igreja gostou imenso da nossa iniciativa e então pudemos ocupar a cave durante uma noite em

que a ideia era cada um…ou seja, podia ser artes circenses, música, teatro, dança, qualquer

coisa durante 15 minutos. E conseguimos preencher a programação durante 9 horas. Para

além disso, tínhamos uma cozinha comunitária dar sopas e outras coisas. Havia várias

actividades no espaço. Uma delas era uma câmara que andava a rodar a fazer um cadáver

esquisito de fotografias. Ou seja, a máquina circulava, as pessoas podiam apanhar e ir tirando

várias fotografias. Portanto, vários acontecimentos. Isso foi feito em comum com um grupo de

alunos de Belas Artes e muitos alunos de Animação e Investigação Cultural que foi o curso que

eu tirei onde o lema é melhorar a qualidade vida mas que tem uma grande parte de Sociologia

da Comunicação e Investigação. Ou seja, é vista pelo ponto de conhecer o território e ver quais

é que são as necessidades. Ou seja, não é fazer copy paste de alguma coisa ou forçar algum

tipo de coisa dentro de um meio ou de uma comunidade mas de realmente conhecer o

território e ver quais é que são as necessidades. Eu, quando cheguei a Portugal, senti

realmente que havia aqui uma necessidade de permitir e criar as condições para as pessoas se

exprimirem mais, serem ouvidas e estarem mais à vontade em falar o que pensam. Achava que

as pessoas estavam muito fechadas e continuavam com medo.

Nós não sabemos falar e discutir e debater, acho eu.

E, muitas vezes, fala-se do comum, daquilo que é aceite. Mas se tiveres uma ideia um bocado

fora as pessoas normalmente ficam caladas.

Uma das coisas que organizei aqui em Portugal, que aliás vai acontecer outra vez 6 anos

depois…em 2007 juntámo-nos, erámos 4 na altura. Juntámo-nos e organizámos o “Há revolta

no cais”. Na altura o Cais do Sodré não era o que é hoje em dia. Ainda era muito, ainda era

bastante abandonado. As pessoas continuavam a sair mais no Bairro e, portanto, mobilizámo-

nos os 4 e fomos bater Às várias portas. O Bar Europa aceitou. Na altura o Music Box tinha

acabado de abrir e a Casa Conveniente que ainda estava, portanto um espaço que tinha

acabado de abrir mas ainda em renovação , não tinham bar nem nada lá dentro, tinham um

espaço de performance. E a ideia na altura era fechar a rua. Fomos bater à Câmara Municipal e

não deu nada. Mas tivemos esses 3 passos e portanto o que fizemos foi mobilizar vários

artistas. A ideia era ser um ponto de encontro de vários músicos, artistas que nunca se cruzam

e com vários estilos. Portanto, ia do punk ao new wave, ao hip hop, ao…e pronto, dj’s,

músicos, vj’s. Também tínhamos o Mar Adentro, na rua acima, que era a parte lounge e VIP

onde os artistas iam para terem a refeição. Também não tivemos apoios, não houve sponsors,

nada. Foi uma iniciativa em que os bilhetes é que pagaram a todos os artistas. Cada um

recebeu a mesma coisa e tinha direito a jantar. E, portanto, aquilo era o ponto de encontro

para eles se conhecerem entre eles e, também para mobilizar a comunidade artística, criámos

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um grupo informal que só existiu naquele dia e que era o MUDA. MUDA como se estivesses

calada mas também de mudar que é Movimento União e Dinamização das Artes. Nessa noite

passaram por lá cerca de 1000 pessoas. Tivemos 50 artistas. Os Kumpanhia Algazarra

começaram no Largo Camões a descer a rua. E este ano, pela iniciativa de 2 deles há uma

temática que é “Arte pela Revolução, Revolução pela Arte”. Começa às 19h30 na Av. Da

Liberdade com conversas e debates. Estavas a dizer que não sabemos debater ou conversar.

Começa Às 19h30 com São José Lapa, Luis Varatojo, Raquel Freire, personalidades que estão

no meio da cultura e que têm coisas para dizer e…acho que vai ser bastante interessante. Às

21h30 abre o Passos de Fado que é um restaurante de fado. Foi aí que fomos convidados a

entrar com um slam. Portanto, a noite vai ser fado vs. Slam. As noites de fado correm um

bocadinho como quando há convidados slam, que a ideia é sempre 10/15 minutos para os

convidados. E os fadistas normalmente também intervêm 10/15 minutos portanto vamos

fazer, vamos alternar um fadista um slammer, um fadista um slammer, em modo slam aberto.

E à uma da manhã há um microfone aberto tanto para fadistas como para slammers. Portanto,

quem estiver lá e pensar “agora quero também ir cantar um fado” também pode. E aliás, os

fadistas que vão estar presentes são a Gisela, o Duarte, o Francisco e o Hélder Moutinho.

Portanto, vai ser bastante especial. Da parte dos slammers, há o Ali El Sayed, o José Candeias,

o Afonso Mata, a Maria João Neves, Cristina Vieira e Ana Reis. Portanto, 3 vozes femininas, 3

vozes masculinas. Que é uma coisa que quando comecei a organizar reparei que era difícil

para os portugueses exporem-se, em geral, e então as mulheres ainda mais. Chegarem assim à

frente e irem declamar uma coisa própria, própria…porque uma coisa é ir ler poemas de outras

pessoas que é talvez mais fácil, não é? Outra coisa é expores-te com aquilo que tens a dizer. E

acho que a situação das mulheres em Portugal ainda está, ainda tá difícil se não mesmo a

recuar. Mas pronto, é sempre com muito gosto que vejo vozes femininas a aparecerem, que é

o caso da Cristina Vieira. Gosto imenso do que ela escreve e da forma como ela diz. É um

exemplo. Fiquei contente que ela vá ser uma das vozes aqui do slam da Revolta. Portanto, este

é um dos eventos que volta a seguir a 6 anos de intervalo. Também no Ritz Club, vai lá tar o

Tiago Gomes com o Tó Tripes com um projecto de leitura de Jack Kerouac. E pronto, Macacos

do Chinês, Luis Varatojo da Naifa com outro projecto. São vários artistas, também uma parte

artistas de rua entre os 2 quiosques. Portanto, a ideia é tar aberto. Quem quiser fazer

performances tem a liberdade de ir para a Av. Da Liberdade e pronto, passar o chapéu, fazer

uma performance, tar ali. O espaço está a ser criado pela Cláudia Duarte que é também

radialista na Radar. Pronto, isto é um movimento espontâneo que envolve muita gente. Não

há aqui uma procura de autoridade no sentido de autor. E pronto, há sempre pessoas que se

expõem mais e outras que ficam mais à sombra mas realmente o fruto deste trabalho é a

vontade de várias pessoas de se quererem juntar para este evento. Pronto, para além disso

trabalhei imenso em festivais também. Tais como o Festival Internacional Noites de África em

Montreal, de Novos Cinemas em Montreal.

Mas estiveste lá muito tempo?

Estive lá 4 anos. Trabalhei também no Festival (inaudível) em Montreal. Portanto, tenho

bastante experiência nessas áreas. Aqui fui convidada a trabalhar em 2011 no Festival do

Silêncio onde se desenvolvia o 1º Festival Internacional de Poetry Film, que não teve

seguimento. Foi uma coisa que eu estive a fazer praticamente sozinha.

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E não pensas dar…podias dar continuidade dentro do slam Lisboa.

Hmmm, é muito trabalho. Não dá para tanta coisa.

Deixar o desafio às pessoas para enviarem coisas dessas e depois reunir uma vez por ano só.

Sim…mas é muito trabalho. Aliás, quando me convidaram para o Festival do Silêncio disseram

que queriam fazer isso mas não havia nada definido, não havia regulamentos. Tive que criar

tudo de raíz, fazer uma pesquisa do que é que existia no Mundo sobre este tipo de festivais e

pronto, depois lançar um apelo com…são vídeos. Vídeos não é uma coisa que se faz de um dia

para o outro, quer dizer. E portanto, lançar o apelo o mais depressa possível e conseguimos

imensas entradas até, das Filipinas, assim do Mundo inteiro. Acho que quase 50 participações

se não me engano. O que num espaço curto de nem 3 meses, organizar um Festival

Internacional de Poetry Film. Para além disso, eu estava…ou seja, eles na altura convidaram-

me foi para organizar os eventos ligados ao slam mas entretanto englobou muito mais coisas e

tive a trabalhar non stop, fins de semana e tudo. Também organizei o poetry slam do Festival

do Silêncio desse ano ao qual, na altura, dei o nome de Poetry Slam Portugal porque a ideia

era realmente começar a crescer um bocadinho e envolver mais pessoas e não ficar tão

fechado aqui e também mudar um bocadinho as regras que tinham existido nos anteriores que

era não meter um júri em cima do palco e não ser um júri convidado. Portanto, consegui com

alguma dificuldade que 2 membros fossem escolhidos do público. Mas a ideia, normalmente, e

as regras internacionais são mesmo que todos os membros do júri têm que ser do público. Ou

seja, as regras oficiais do slam, e para participar depois noutros concursos a nível

internacional, são…tem que ser mesmo do público. E não pode haver 3 júris ou 1 júri não-sei-

quê, convidados e depois só 2 do público porque a ideia é mesmo, no slam, é que o público

participe, que haja esta troca. Portanto, não faz nenhum sentido. Nesse ano consegui então

convencer…isso e convencer também a integrar um colectivo porque na opinião deles não

fazia sentido e eu continuo a achar, não só eu, se formos à Alemanha há campeonatos de slam

só de grupos e nós aqui…ou seja, só no Poetry Slam Coimbra é que se veem colectivos e,

portanto, achei por bem dizer “a maior parte são pessoas singulares mas é necessário, é

necessário que as pessoas comecem a ver…”

E provavelmente se houver um próximo eu acho que vai haver pessoas a trabalharem em

conjunto.

Sim. isso era óptimo. Só temos a beneficiar com isso. Eu faço tantas coisas que me esqueço. A

minha filosofia é sempre olhar para a frente e não tar a remoer o que podia ter sido.

12. E como artista? Participas, trabalhas, actuas? Em que áreas?

Já respondeu na 8.

Relação com o Poetry Slam

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1. Quando ouviste, leste, etc. sobre o Poetry Slam pela 1ª vez?

foi em 2009. No festivla silêncio. Ouvi algures não sei aonde que havia um concurso

qualquer em que se podia ir ler poesia.

2. E por que é que ficaste interessado no Poetry Slam?

Porque eu já fazia, já estava…já escrevia há imenso tempo, tava envolvida nestes projectos

experimentais de música mas muito cansada da tecnologia e já a chegar, lá está, a um culminar

de me querer libertar de tudo o que é fios, computadores, máquinas e não-sei-quê e querer

realmente chegar Àquele ponto minimal da folha de papel e caneta e ser tudo o que eu

preciso e do meu corpo e voz e poder partilhar isso com outras pessoas. Inscrevi-me, na altura

eles pediam…é preciso enviar um mp3, uns textos, o que normalmente não é requisito

necessário. Fiz isso tudo e fui seleccionada. Não sei se tiverem muitas pessoas, fui a 1ª

portuguesa, havia uma brasileira também, portanto fui a 1ª mulher portuguesa a pisar um

palco de slam, muito nervosa, sem saber o que tava ali a fazer. Fui sozinha, tinha aulas nesse

dia até às 22h00, cheguei tarde, não tive o tal jantar (inaudível). e pronto, correu…correu mal.

Foi assim quase uma humilhação, tínhamos o júri atrás a beber copos. Foi uma experiência

dura.

Vocês estavam de costas para o júri? Em 2009? Foi o ano em que ganhou o…Birú?

Eu já conhecia o Birú. Eu insisti com ele para ele se inscrever. Tinha quase a certeza que ele iria

ganhar.

Tu eras a única mulher portuguesa?

Sim. havia uma brasileira que ficou em 2º lugar. Depois havia outros…acho que tava lá o

Cristiano Figueiredo que depois começou a fazer o Poetry Slam Porto. Também estava lá o

Tiago (inaudível) Martins que nunca mais pisou um palco mas que para mim é, é grande poeta,

também ilustrador. E outro, que não me lembro se voltaram a aparecer porque foi uma

experiência, ou seja, hmmmm. Em 2010 voltei a participar e trouxe um amigo meu austríaco,

também slammer, que já conhecia muitas cenas de slam e que ficou muito mal impressionado

com o slam e que escreveu uma carta à qual nunca recebeu resposta a dizer que não é assim

que se tratam os poetas. Porque tínhamos o júri outra vez no palco a ver os poetas de costas e

a levantar folhas A4 que diziam orgasmo em letras grandes, vómito…e depois o problema era…

Ai sim? mas eles tinham as indicações de que era para dar votação?

Sim. aquilo…enquanto se estava a declamar eles levantavam porque estavam com os copos.

Mas o problema daqueles slams é que, para além de ser um júri escolhido, desde directores de

casting a radialistas a….pessoas que nem sabiam o que era slam, eles falavam mais do que os

poetas. Ou seja, eles para além de darem a pontuação, eles comentavam.

No final de cada leitura?

No final de cada intervenção. Diziam “Bem, eu acho que…” e ficavam ali a falar 5 minutos. Era

esse o formato dos slams em 2009 e em 2010.

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Eu não sabia porque não encontrei muitos registos. Encontrei alguns registos, não do slam

em si, mas de pessoas que participaram nesses slams e que depois fizeram vídeos. Só

estando com alguém que tenha participado ou que tenha ido ver é que sei o que aconteceu.

Portanto, houve um 1º slam em 2009 que foi…quem trouxe o slam a Portugal foi o Goethe

Institute e o Instituto Francês que criaram, em conjunto com a CTL, o Festival Siêncio. Quem

deu o nome, aliás, foi também o Instituto Francês. Voltaram a repetir a experiência em 2010 e

depois afastaram-se por razões de, pronto, acho que a organização não tava a correr bem, a

comunicação entre eles não correu bem. E, entretanto, quem ficou com o Festival do Silêncio

foi a CTL e os sócios do Musicbox.

Mas a CTL não é a mesma coisa que Musicbox?

É a Associação, é a Cultural Trends Lisbon. Portanto é quem…

Sim, mas qual é a relação que existe entre a CTL e o Musicbox? As pessoas são as mesmas…

São, são.

Ah, então os donos do Musicbox formaram uma Associação. É isso?

Não sei exactamente. O Musicbox é um nome de um bar mas é preciso uma empresa,

portanto é a empresa que está por trás do Musicbox. Que iniciou este festival, na altura em

parceria com o Goethe Institute e com o Instituto Francês que são os países que têm a tradição

de slam mais antiga da Europa. E foram eles que trouxeram o slam cá. Só que eles decidiram

fazer um formato diferente em que o júri era selecionado.

Quando falas eles, falas do Goethe e do Instituto Francês?

Não. Falo do Musicbox porque foram eles que acolheram o Poetry Slam.

Então essas decisões não passaram pelos outros?

Não faço ideia. Agora o que acontece é que houve esse slam em 2009 e depois durante o ano

não havia nada. Depois houve um em 2010. Correu outra vez muito mal, aliás, as pessoas

começaram-se a ir embora. A sala estava mais vazia no fim do que no início. O que não é

normal, não é?. Normalmente quando chegas à final estão lá os melhores e as pessoas…em

princípio para um evento no âmbito de um festival…

Ainda bem que nós só fomos em 2011.

Portanto, em 2010 conheci o Mick Mengucci que também participou. Tava lá o Jimmy

também, o meu amigo. E foi nessa altura que o Mick e, aliás, eu também pensava “isto não faz

sentido nós não podermos ter durante o ano…” Devia haver slams regulares. E comentei com o

Alex na altura “não faz sentido fazer isto uma vez por ano. As pessoas chegam aqui, não têm o

à vontade necessário, não, não há tantas vozes como poderia haver. Muitas pessoas não

sabem o que é”. Ou seja, não havia nenhum esforço de divulgar isto como prática e de chegar

às pessoas. E portanto, depois em conjunto com o Mick decidimos começar a organizar. Fui

primeiro falar com o Alex que achava que fazia sentido, “Olha, estamos a pensar fazer eventos

regulares, o que é que achas?”. Também falei com o Biru e com o Pedro Silva Sentinela a saber

o que é que eles achavam de slams regulares na cidade. E pronto, começámos em Setembro

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de 2010 nesta aventura. E pronto, de criar o espaço para as se juntarem, convergirem,

partilharem poesia dita.

3. Achas que há uma relação entre o teu envolvimento na arte e na cultural em geral

e o teu envolvimento no poetry slam? Há uma relação entre o papel da arte e da cultura

na tua vida e o interesse que tens pelo poetry slam? /achas que o interesse que tens

pela arte e cultura em geral condiciona o interesse que tens, que sentiste pelo poetry

slam?

Provavelmente não. Mas não sei.

Que percepção é que tens? Se tivesses que responder a esta pergunta o que é que

dirias?

Sim, acho que totalmente sim. a minha sensibilidade à cultura e às artes condicionaram

este meu impulso para, para…ou seja, tinha deixado a organização de eventos na

altura. Eu disse ao Mick “se é para fazermos isto é para fazermos a sério” porque eu sei

como é que, como é que as coisas funcionam normalmente. Fazem-se 2, 3 meses e

pronto. “pronto, já tou farto. Já fiz, o meu nome já lá tá, as pessoas…” e pronto, a

minha ideia é “se vamos fazer isto é para fazer a sério, não é para fazer a fingir”. E

pronto, na altura a ideia era fazer um ano de ventos, criar os registos necessários,

divulgar devidamente para depois ir bater à Câmara Municipal de Lisboa para pedir

apoios. Pronto. Devido a desequilíbrios de investimento de tempos e energia e visões

diferentes da coisa isso nunca se proporcionou porque…porque pronto, isto é preciso

um trabalho contínuo. Não é chegar no dia e apresentar ou fazer qualquer coisa.

Sobretudo numa altura, naquela altura em que ninguém faz ideia do que é o poetry

slam. E então passa-se muito tempo a explicar, e tem que sei procurar muita coisa,

partilhar vídeos e divulgar e partilhar isto, mostrar como se faz noutro sítio. E isto foi

tudo um trabalho exaustivo e cansativo e que era necessário para as pessoas verem

algum interesse e quererem participar. Isto é um evento de 360 graus em que é preciso

de tudo. Sem o público não há evento. Não é como organizar um concerto de música

em que, pronto, os músicos chegam lá, sentam-se, se o público não tiver lá eles tocam à

mesma, para o barman. Pronto. Aqui não, aqui é preciso o público para votar, não é? E é

preciso os participantes que se inscrevem para haver evento. Se não, não há. E tudo isto

requer uma gestão enorme e contínua. É preciso estar sempre disponível.

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4. Conheces Poetry Slams de outros pontos do país?

Sei que existem, sim.

E de uma forma mais próxima, conheces quais? Onde já tenhas estado ou conheças as

pessoas envolvidas ou conheças slammers, público?

é assim, nós começámos não é? O Mick e eu começámos o poetry slam lisboa (inaudível)

slams regulares no país. E, se não me engano, entretanto através de um amigo meu que

não tem nada a ver com slam conheci o Nuno Piteira. Fui ter com ele, tinha vontade de

organizar slams e ajudámo-lo com o 1º Poetry Slam Amadora, uma edição zero, ajudámo-

lo a lançar. E depois, um dos projectos que eu mais aprecio em Portugal e aqui é o

Poetry Slam Coimbra porque agarraram nisto de uma forma completamente autónoma

e começaram mais ou menos na mesma altura. Não sei se a Amadora foi primeiro ou

depois mas é capaz de ter sido primeiro. E logo a seguir o Poetry Slam Coimbra. E é um

projecto que gosto muito como funcionam e da forma como estão organizados e acho

que fazem um trabalho excelente no panorama nacional. Nunca tive a oportunidade de

ir e, também, há aquela coisa, quando já se está há tanto tempo e todos os dias

praticamente nisto satura um bocado. E no Poetry Slam Amadora, na altura o Musicbox

decidiu começar com slams regulares. Podiam ter concertado, podíamos na altura ter

feito logo em conjunto. Não sei. Sendo que eles sabiam que nós íamos fazer. Nunca

percebi muito bem isso. E depois o que acontecia é que na véspera dos eventos deles

eles contactavam-nos para nós darmos os contactos de slammers porque eles não

tinham inscrições suficientes. E portanto, foi assim que, que…eu na véspera ia dando os

contactos de “olha, este ganhou ontem, é muito bom”, “esta ganhou ontem”. Viton,

Raquel, Wilson, Paula. Várias pessoas eram convidadas para irem ao Musicbox através

da ponte que fazíamos na altura. Sempre a trabalhar em colaboração porque…isto não

era uma questão de quem é que…e pronto. Portanto, também cheguei a ir lá várias

vezes…e na boa. E, entretanto, no ano passado começaram a nascer imensos. Poetry

Slam Sul, por acaso nunca tive oportunidade de ir, fica do outro lado. E pronto, o Porto,

Braga…e Angra também nunca deu para ir. Também foi um dos primeiros na altura mas

com outra escala e outra…ou seja, não tem regularidade suficiente. O Angra acontece 2,

3 vezes por ano quando o Ricardo ou o amigo dele vão lá passar férias. Portanto, não há

aquela coisa da regularidade que normalmente também se requer minimamente

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para…se virmos isto como um serviço à comunidade, para manter…para manter o

ritmo dos slams. Outra coisa, é assim, se conheço os outros? Conhecer, conheço.

Conheces através da Internet ou conheces mesmo as pessoas envolvidas?

Acho que conheço praticamente toda a gente envolvida. Mais recentemente tem havido

solicitações espontâneas de donos de bares por exemplo, em Sines, nas Caldas. Aveiro

também há umas raparigas que talvez conheças. Nós fomos contactados por Sines, por

vários sítios mas eu nessa altura…já não tenho meios nem recursos suficientes.

Reencaminho, normalmente, para outras pessoas que estejam mais perto ou então

explico, quer dizer. Isto é uma coisa, a meu ver lá está, isto são iniciativas locais. Não faz

sentido nós andarmos aqui a saltar duns…na minha opinião a querer estar em todas

porque isto, isto…

Para mim não dá.

É assim, acho bem mas não é…eu quando vi a Amadora a certa altura era o Lisboa na

Amadora. E o Sintra, às tantas, é o Lisboa que era, antes, Lisboa e Amadora. Portanto,

são as mesmas pessoas. A ideia não devia ser tanto isso mas seria mais conseguir

hmmm…que as pessoas localmente participem, não é? Não é estar a ir…portanto,

Caldas também tem lá 3 que costumavam tar a participar…

Eu conheci 2 pessoas das Caldas que supostamente estão a organizar e não…

Mas convidaram para participar quem agora é do Poetry Slam Sintra. E outros…há

muita promiscuidade neste meio, o que é normal…não são os 10, 11 milhões de

portugueses que estão todos a participar e portanto, acabam por ser muitas vezes as

mesmas pessoas, sobretudo no início. Ou seja, temos que ver isso. Nós nem chegámos

a…no fundo ainda não chegámos a 3 anos de slams regulares no país. Isto é um bebé

ainda. Isto é mesmo um bebezinho se formos ver que a Alemanha já estão há 20 anos. A

França também, praticamente. Inglaterra está perto. Espanha é mais recente. Nós

começámos 1 ano a seguir a eles, praticamente. Itália nunca conseguiram fazer nada a

sério. Eles têm alguns…quer dizer. O Giacomo, por acaso tinha estado aqui, começou

um poetry slam em (inaudível) mas nunca…e isso, às vezes, reflecte o estado da

democracia em cada país. O nível de slams que se vê, consegue-se perceber por aí o

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estado da democracia de cada país, de alguma forma. Isto sou eu já a extrapolar. Mas

achei curioso quando me apercebi que em Itália nunca conseguiram realmente

organizar-se.

E o Giacomo tem alguma opinião sobre isso?

Não sei, não falei com ele. Ele começou…há muitos eventos de poesia em Itália. Agora

assim formato concurso, slam, acho que é mais difícil e o Sergio Garau, que é uma das

vozes mais importantes, na minha opinião, da poesia dita em italiano, neste momento

organiza os anti-slams. Onde as coisas chegaram. Anti-slams (inaudível) se não me

engano. Espero não estar a ser errada porque, nestas coisas, ou seja, tudo já foi feito.

Nunca há ninguém que comece realmente qualquer…não há nada de extremamente,

autenticamente original neste mundo por mais que se queira. A Paula (inaudível), uma

grande slammer americano-inglesa que esteve a viver em Berlim muitos anos, é que

organizava anti-slams em Berlim. Eu já a tinha convidado, na altura, porque gostava

muito que fosse ela a apresentar um anti-slam. Desde o início, que começámos, uma das

ideias era a certa altura fazer, para além de slams temáticos de vez em quando, haver

um dia de anti-slam com a Paula a apresentar porque ela tem jeito e foi ela, era ela a

principal dinamizadora lá em Berlim. Hmmm. Já não sei onde é que ia.

Estávamos a falar de slams do país.

Sim. pronto, isto há aqui um ano é que surgiram estes todos. E muitos, isto é deixar as

coisas irem.

Olha, e de outros países, tens algum contacto ou já estiveste nalgum slam?

Sim, estive no slam Barcelona em 2010. Estive num slam em Edimburgo em 2011. Estive

num slam em Bélgica em 2011. Quase 30 pessoas a participar, foi muito giro. Fui a

slams…aliás, eu conheci o slam, mesmo mesmo em Berlim. Foi lá que eu percebi, que eu

comecei a perceber o que é que era. Aquele que tinha havido aqui não, não…não era,

não me permitiu perceber realmente o que era o slam. Portanto, eu conheci o slam em

Berlim, sim.

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5. Participas no slam X em que vertentes: organização, slammer, público, júri?

6. Em que outros Poetry Slams já participaste? Como slammer, público, júri,...?

7. (se respondeu sim à pergunta anterior) Que semelhanças existem entre os Poetry

Slams em que já participaste? E diferenças?

É assim, eu posso falar de outra coisa talvez que é o que eu vejo com o que eu tenho

visto lá fora e o que é que eu vejo aqui. O poetry slam lisboa , com esta necessidade de

ter que…um bocado (inaudível), pedagógica de divulgar o que é que é o poetry slam

iniciava os eventos a convidar certos poetas para mostrar o que é que a poesia

performativa pode ser, com divulgação de vídeos, filmes, o Slam do Saul Williams. Mas

isto era tudo na perspectiva de informar. Um slam, normalmente, não precisa de nada

destas coisas todas. E aliás, eu prefiro que não tenha. Isto não é suposto ser mini-

festivais todos os meses não é? Mas em Portugal, sendo que o poetry slam fazia isto

nesta perspectiva de dar a conhecer e até de atrair um bocadinho mais as pessoas a

perceber o que é que é, como podem participar, entretanto acho que alguns se têm

colado um bocadinho e começam a ter que fazer um programa que tem tudo e mais

alguma coisa e…a meu ver, desvirtua o que o slam poderá ser, que é uma coisa para a

comunidade. Sobretudo, é voz, corpo, partilha, poesia, poesia, poesia. O que vejo a

acontecer, ou seja, tive em slams…o de Edimburgo, por exemplo, super espontâneo, a

rapariga a apresentar, (inaudível), o júri escolhido “olha, alguém faz as contas? Fazes as

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contas? Ok”. E portanto, toda a gente envolvido, não há dj nem nada e “vamos a isto”.

Coiso, a sala…não muita gente mas suficientes para aquilo funcionar, muito dinâmico,

toda a gente envolvido e pronto. Um espetáculo. Para mim, a mensagem tá lá, a coisa

não tem grandes distracções. O que eu tenho visto aqui, entretanto, e se calhar somos

culpados um bocadinho por isso também, mas daí também agora estarmos a fazer cada

vez mais slam aberto que é só…e pronto, e eventualmente também não sei qual é o

futuro do poetry slam lisboa, logo veremos. Mas vejo coisas que acho que não fazem

sentido nenhum na minha opinião, desde incluir autores publicados com teses não-sei-

aonde num evento que se chama slam que é suposto, precisamente, ser o contrário

disso, não é? E ser algo popular. E acaba por, para atraírem mais pessoas, chamar o

escritor tal-tal, com teses e trabalhou na Suiça, no CERN, em coisas que não têm nada a

ver. e ainda por cima a divulgar isso tudo, não é? E…e pronto e acho que desvirtua

imenso o propósito e a origem do slam e tenho pena mas pronto. E esta

necessidade…acho que há muita competição entre alguns, querem ser mais e melhores

em vez de trabalharem em conjunto. Isso é que eu acho pena realmente. Comparando

com lá fora. Não quero tar a comparar uns e outros cá dentro. Eu tenho preferências,

como já disse. O Poetry Slam Coimbra e o Poetry Slam Porto. Acho que…gosto muito

como trabalham naquilo que eu vejo. Porque nunca presenciei infelizmente. Acho que

consigo, pelo que eu vejo, e visto que também registam bastante bem os eventos, dá

para seguir. Não consigo ver os vídeos, infelizmente, porque são muitos, do Poetry Slam

Coimbra. Mas já vi alguns algumas vezes e gosto do que vejo. Gosto das participações

do Poetry Slam Coimbra. Parecem-me um bocadinho mais sóbrias, geralmente. Posso

tar enganada, não é, mas normalmente parece-me mais sóbrio sem querer fazer demais

e…prnto, sem querer chegar àquela coisa do espectacular, do espectáculo. É tudo mais

terra-a-terra, mais com os pés assentes no chão, que é, que é…uma forma de fazer

slam. Mas depois lá está, cada um faz como entende.

8. Como descreverias o poetry slam?

Lá está. Eu vejo o poetry slam como o evento. Não quer dizer que esteja correcta. Para

mim o poetry slam é um evento que pode ser em formato concurso e normalmente é.

Mas pode também ser em formato aberto. Em que há regras, ou seja, requer a

participação de poetas, autores, slammers, de pessoas que escrevem, que tem um limite

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de 3 minutos que existe para que ninguém se exceda ou esteja a ocupar muito tempo,

muita atenção das pessoas, para também dar mais possibilidade de muitas pessoas

participarem e que têm que vir como são, portanto, sem adereços. Hmmmm, e portanto

sim, para mim é isso. Não sei se me estou a esquecer de algum detalhe. Mas será, será

isso. Eu não vejo…ainda tou a trabalhar sobre esta definição do poetry slam ser…de ser

um estilo. Para mim, para mim…acho que…por isso é que eu vejo mais como um

evento em si porque acho que para lá disto há a poesia que as pessoas escrevem e

depois vêm partilhá-la. ou seja, também…poesia encorparda…

Estás a questionar-te sobre se há uma slam poetry, uma poesia própria do slam, ou se

há só o poetry slam…

Ainda tou a trabalhar sobre isso. Porque como leio muita poesia…

Pelo que tenho visto isso ainda tá em cima da mesa. Se isso existe ou não. Pelo que

tenho visto, o que se diz é que tendo em conta as especificidades locais, há estilos mais

associados a cada local. Mas que continua a haver espaço e…continuam a aparecer

vários estilos e que têm aceitações diferentes.

Depois a parte do formato em si também cria as condições para que um estilo se

desenvolva, não é? Lá está, os 3 minutos.

Eu espero que continue a haver diversidade…

Também eu. Mas quando uma pessoa vê “ai isto funciona”. E lá está o problema, quer

dizer, quando se pede que seja original, é um trabalho que a pessoa faz consigo própria,

não é? E quando começa a ser muito “o que é que aquele tá a fazer? Deixa ver. deixa-me

ir fazer aquilo à minha maneira”.

Eu já me apercebi que em slams, por exemplo, dos E.U.A., há uma tendência muito

grande sempre para o mesmo registo. E…

Que é a poesia falada…

E tu ouves 5 pessoas e parece que estás sempre a ouvir a mesma pessoa…

Com um tom de voz diferente…

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Às vezes nem é muito. São tã parecidos.

Aí se calhar já se pode dizer que é, que é um estilo.

Eu espero é que…talvez isso tenha vindo do tempo, não é? Por serem aqueles que já

fazem há mais tempo. Espero que isso não aconteça cá. Eu gosto da diversidade,

sempre gostei. Espero que continue a haver espaço para coisas diferentes.

Isso depende sempre da forma como é recebido, não é?

Pois…

Isso também vai influenciando.

Daqui a 20 anos vamos ver como é que isto está.

Depois fazes outras entrevistas…

Organizador/a

1. Podes fazer uma caracterização breve do Poetry Slam X (data de início, entidade

organizadora, local de realização, frequência)

Nós juntámo-nos em Julho de 2010. Começámos o 1º em Setembro de 2010 na

Culturbica, na Bica, que era na altura…

Quando dizes juntámo-nos…

Mick Mengucci e Ana Reis.

Não há nenhuma entidade formal colectiva por trás?

Não…a ideia foi sempre, sempre…privilegiou a ideia do grupo informal. Portanto, não

há nenhuma Associação. Ou seja, quanto menos burocracia melhor. Isto é uma

ideia…ou seja, a ideia era que isto fosse apropriado pelas pessoas. E foi mas, mas…para

fora e não no próprio. A regularidade, começámos…acho que fizemos a certa altura de

2 em 2 semanas. Eu sempre fui contra.

É verdade. Eu só pensava “eh lá, nós nunca vamos fazer isto assim. É impossível”.

O Mick queria fazer todos os 15 dias. Eu tinha noção do trabalho que exigia e, portanto,

acho que fizemos, talvez, 2 meses assim. E depois tive que o chamar à atenção, “ou

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trabalhas mais ou esquece porque não…” e portanto, tem sido mensal. Temo-nos

aguentado mensalmente, de forma itinerante.

Todos os meses é num sítio diferente?

Na Culturbica começámos todos os meses. Depois a ideia realmente era, lá está, e temos

sempre que pensar no Poetry Slam Lisboa como os primeiros a organizarem slams e

portanto, não se conhecendo o que é que isto é. E a ideia de ser itinerante era também

para quebrar um bocado o risco de se tornar um grupo fechado e as pessoas terem mais

reticências a entrarem e acharem que é uma coisa…as tais capelinhas que depois muito

facilmente emergem nos panoramas culturais em cidades. E então Lisboa mais

facilmente. Era um bocado para sair. Agora estamos aqui, agora estamos…portanto

manter sempre aberto. Chegar a públicos diferentes, ir a bairros diferentes hmmm…e

pronto, chegar a mais pessoas e ambientes diferentes. Se não, teria esta coisa de se

auto…auto…auto-diluir, destruir quase ou auto…ficar ali fechado num molde…no

início. Ou seja, se começássemos agora teria mais sentido ficar no mesmo sítio porque já

não tinha que haver este trabalho. Mas sendo assim, portanto, começámos em 2010. Em

2011 começámos realmente a ser itinerantes, nómadas, boémios. E, portanto, isso ainda

requer muito mais trabalho na negociação todos os meses com os espaços, de se

adaptar às condições de cada espaço. Alguns têm material, outros não têm. Alguns têm

bar, outros não têm. Uns têm mais, outros têm menos. Uns é preciso ser sócio, outros

não é. E…e pronto. E andamos de um lado para o outro. Temos voltado aos mesmos

lugares, lugares em estivemos mais que uma vez – Jardim da Estrela, Culturbica, vou-me

esquecer de alguns.

Jardim da Estrela por acaso tive pena de não ter ido lá. Acho que deve ser espectacular

fazer slam no Jardim da Estrela.

A ideia é realmente estarmos ali, as pessoas que passam vão poder…deparar-se com

pessoas ali…com 3 minutos para declamarem poesia, um dj ou uma banda. Também já

tivemos uma banda. E acho que houve várias pessoas que descobriram o slam assim, no

Jardim da Estrela, num passeio normal. Portanto, lá está, que é também sair um bocado

de estar encurralado entre 4 paredes, à noite, num bar, às escuras. Sair dali e ir…quer

dizer, os poetas poderem declamar para as árvores que é uma coisa muito especial. E,

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pronto, foi com muito gosto, adorámos estar lá. E pronto, foram tantos os espaços

que…estivemos muito pela Bica, estivemos no Bairro Alto, estivemos em galerias, no

Campo Mártires da Pátria, no (inaudível) Café, estivemos…não consigo…só mesmo

pondo tudo por escrito. E pronto.

2. Como foi o processo de criação deste Poetry Slam?

3. Podes falar-me de como correu o 1º poetry slam que organizaste?

O 1º correu bem. Éramos, éramos…acho que éramos 4, se não me engano. Eu tive que

participar porque não havia inscrições suficientes. O Mick tava a apresentar e pronto.

Ganhou o David Jacaré. Depois vim a saber, não sei se era verdade…eu se calhar nem

sei se devia estar a dizer isto, acho que eu é que tinha ganho mas porque não-sei-quê

alteraram a pontuação e…mas também era assim por muito pouco. E eu nem queria

ganhar, a minha ideia, eu só participei para haver mais uma pessoa. Como organizadora

seria…

Sim, eu percebo isso. Nós em Coimbra…também temos esse dilema lá. E então o que

nós fazíamos…vá, fazíamos as nossas coisas no início para tentar convencer as pessoas

a participar. E às vezes fazíamos o microfone aberto no início. Mas ainda 1 vez ou 2 em

que não fizemos competição.

Nós chegámos a fazer um slam com 2 pessoas. Que acho que foi 2 rondas e 1 final com

as mesmas pessoas. Sim, se não me engano…e depois…sobretudo quando eram os 15

dias. Há que dar tempo às pessoas para escreverem, para prepararem. E para não

saturar. Acho que ser mensal é o ideal. Mais vezes que isso não…as pessoas também

fazem outras coisas, não se justifica. E sobretudo quando começa a haver vários poetry

slams e aí tudo é muito perto e as pessoas podem ir aos outros. Portanto…qual é que

era a pergunta?

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Como correu o 1º?

Correu bem. Foi muito divertido. Não me lembro. Já foi há tanto tempo. Não estava

cansada. E pronto. Participei um bocadinho à força.

4. Que situações e/ou circunstâncias foram obstáculos/dificuldades na criação/

organização/manutenção do Poetry Slam?

Sendo um grupo informal, diria mais o que disse ao início. Dificuldade em as pessoas

perceberem em que é que consiste um colectivo. Nós estivemos sempre abertos à

participação na organização, de pessoas que vieram espontaneamente e de forma

voluntária dizerem que queriam participar. E pronto, e…ou seja, de forma espontânea

vinham querer dar, contribuírem com aquilo que podiam e depois falharem esses

compromissos que foram elas próprias que se comprometeram e, portanto, para

resumir acho que o problema é a questão do ego. É a questão da…de…e, também, la

está, de sermos muito abertos talvez. Tem os 2 lados da moeda. O termos sempre esta

atitude muito inclusiva…as pessoas, às vezes, não entendem isso, entendem isso mais

como uma oportunidade de se fazerem valer a elas próprias a título individual, o que

tem sido bastante nocivo. Bastante nocivo. Para o Poetry Slam Lisboa tem sido uma das

maiores dificuldades com que me tenho deparado. Esta falta de compromisso da parte

das pessoas, quando nada é à força. São elas próprias que se mostram disponíveis. E,

portanto, pensar que se pode contar com alguém e no mês seguinte não poder,

compromete muito a organização do evento, sobretudo em Lisboa onde estamos muito

perto de outras organizações, o que não sucede para outras cidades que estão mais

autónomas e não tão confrontadas com este tipo de questões. Que depois chega

mesmo a haver, intencionalmente, pessoas que metem energia para desinformarem,

desde publicar no jornal que o nosso evento é num dia quando é no dia seguinte…a

coisas incríveis que eu, com muita sorte, espero não estar atenta e não saber de metade

das coisas que acontecem. Se não, acho que ainda dormia menos.

5. E que situações e/ou circunstâncias foram facilitadoras?

As redes sociais. Não sei se isso se enquadra nestas definições mas as redes sociais acho

que foram uma das alavancas principais de divulgação e da própria

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organização…mais…toda a gente que se entusiasmou, que se foi entusiasmando com o

projecto e que foram partilhando também, divulgando. Acho que sobretudo os

participantes não é? Sobretudo quem escreve e quem vê no slam uma…uma plataforma

para divulgarem aquilo que fazem não é? E acho que também a própria filosofia do

Poetry Slam Lisboa que foi sempre de se manter aberto. Manter a abertura a todo o tipo

de participações, tanto a nível de conteúdo porque nunca limitámos mesmo só à poesia.

Portanto, a prosa também entrou para haver mais participações sendo que se

compararmos com outros sítios normalmente até quem seja mais limitativo e não aceita

prosa nesse tipo de…pronto. Portanto, a abertura do próprio projecto. E o

entusiasmo…algumas sinergias que foram criadas na altura…e a própria capacidade de

organização de pensar alternativas do projecto. Portanto, esse processo de negociação

mensal, praticamente, de encontrar espaços diferentes e de chegar a outras pessoas.

Portanto, a natureza itinerante do projecto dá mais trabalho mas também chega a mais

pessoas e, de uma certa forma, vai criando também um circuito mostrando aos próprios

espaços como é que se faz, podendo capacitá-los a eles próprios a organizarem eventos

ligados à poesia, o que aconteceu mesmo. Houve sítios que começaram a organizar

desde tertúlias a outras coisas ligadas à poesia que não o slam mas muito inspirados

nesta dinâmica do slam que é as pessoas irem, lerem, partilharem. E pronto.

6. Existiram/existem apoios e/ou parcerias na criação e organização periódica do

Poetry Slam?

Neste momento…ah pois estou-me a esquecer da 2034que é o parceiro portanto, que

trabalham na área da arte e comunicação e que são nossos parceiros a nível de imagem.

Foram eles que fizeram o logo no ano passado e têm trabalhado nos cartazes desde

Dezembro de 2012. Esse é o principal parceiro. Neste momento, temos também a Amor

Livre, colectivo do qual também faço parte, mas que não…pronto tá…sim é um

parceiro, não directamente na organização dos eventos mas participa num derivado que

é um livro sobre o qual temos estado a trabalhar desde o ano passado. E que…no início

ainda não sabíamos muito bem, ainda estávamos a pensar na própria ideia do livro e,

portanto, havia muitas opções e muitas vias possíveis. Ainda há um trabalho em

progresso neste momento. De resto, todos os sítios onde temos estado continuam a

ser, de alguma forma, parceiros. Não formal, mas informalmente, há sítios onde

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poderíamos voltar eventualmente. Não temos parcerias nem apoios nem…sponsors

porque a própria filosofia do Poetry Slam Lisboa é ser um grupo informal de pessoas,

cidadãos, poetas, autores, performers. Esse é o seu ideal sendo que as coisas tomam o

seu próprio… as suas próprias formas e, neste caso, a coisa tomou uma escala mais

nacional. Portanto, quem estava envolvido no Poetry Slam Lisboa divergiu para outros

projectos também de slam, para muitos. Mas não necessariamente a investir no Poetry

Slam Lisboa. Pela própria natureza de ser o 1º projecto em Portugal tem dessas coisas. E

tem-se mantido aberto…e o facto do Mick se ter ido embora.

Mas o Mick já não está em Portugal?

O Mick está no Brasil. Entretanto, tem cá vindo a Portugal…

Ah mas mudou-se para o Brasil?

Ele mudou-se mesmo. No 2º ano do Poetry Slam Lisboa já dizia que se ia embora.

Portanto, era muito difícil também estar a constituir ou pensar em constituir

Associações. Como houve muita instabilidade…desde o início até, mesmo.

7. O Poetry Slam X costuma ter convidados? De que áreas artísticas?

Sim, mas…isto volta sempre à natureza do projecto, de ser o 1º e de não se conhecer o

slam em Portugal. A ideia de ter os convidados, se fosse hoje talvez não seria uma

componente tão, tão importante. Na altura era mesmo uma componente muito

importante para captar mais pessoas e também dar a conhecer os potenciais da

performance oral e da poesia e do que se faz e de perceber o que é que o slam pode ser

ou, também, em que é que se pode transformar ou de onde é que ele vem também, não

é? Ou seja, o que é que já é feito que vai nesse sentido. Ou de pessoas que slamam e que

têm projectos simplesmente. E, portanto, temos convidados sim. tivemos logo o Márcio

André no 3º slam e depois fomos sempre tentando ter convidados. O Márcio, acho que

das 1ªs performances que ele fez em Lisboa foi no Poetry Slam Lisboa. Na altura ainda fiz

um note no nosso Facebook, temos as fotos. E ele depois, a seguir a isso, desenvolveu

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um projecto também. Foi à Culturgest mas…antes…foi também convidado para o

Festival do Silêncio através disto.

E de que áreas artísticas são os convidados que o Poetry Slam Lisboa tem tido?

Principalmente performance e performance poética e slam. Ou seja, desde…tivemos

também slammers internacionais, desde o Jimmy Lang da Áustria, Marçal Font Espit

também passou por cá, o Sérgio Garau também foi convidado do Poetry Slam Lisboa. E,

portanto, normalmente a ideia…o Diego Mata Rucu, um argentino a viver em Espanha,

(inaudível) também vencedora campeã do Reino Unido em 2009, o (inaudível) que é

mais do Freestyle, do rap, hip hop. Tivemos, mais recentemente, o Harry Baker que

também é do Reino Unido,q eu venceu a Coupe do Monde em França no ano passado.

Normalmente, os convidados que tentamos ter ou que temos tido são pessoas

que…slammers europeus vá. E que vêm também partilhar e mostrar um bocadinho o

que é que se faz fora de Portugal.

8. É importante para vocês, organizadores, ter a participação de pessoas de outras

áreas artísticas? Porquê?

É importante para mostrar a diversidade que há e dar a conhecer e partilhar também.

Ou seja, este encontro…o Poetry Slam Lisboa é um local de encontro também. Várias

pessoas partilham uma mesma paixão por esta arte que é…que é…arte em que a sua

origem é a língua, não é?, a linguagem tanto corporal como oral mas, mas a fonte,

mesmo a origem são as línguas e é sempre bom ouvir slam noutras línguas e

perceber…como diz o (inaudível) um dos mestres do slam na Alemanha “se não

entenderes, sentes” e, portanto, mesmo Às vezes podemos estar a ouvir um slam em

Português e não estar a entender nada à mesma, por mais que…e, portanto, há muito

esta questão também de, neste caso a posição de quem está a votar, do júri, de sentir

ou de tentar ver qual é o sentimento, qual é a emoção que está a ser transmitida. E

ajuda quando se ouve um slam noutra língua. Também porque temos que ir além do que

está a ser dito, por não entender, e temos que estar mais atentos à própria performance

em si e…pronto. Mas também pela partilha, pelo encontro, pela criação eventual…de

surgir, de criar outras sinergias…e das pessoas se encontrarem e de se conhecerem e de

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haver uma rede cada vez maior. Também favorece essas trocas. Agora não é, acho que

já tinha dito isso, eu para mim o slam continua…gosto muito mais da ideia de ser uma

coisa completamente informal onde não há convidados, não há estrelas, não é? Esta

ideia de estar a pôr alguém num pedestal, não é essa a ideia. Pronto, sim, prefiro este

formato mais directo, mais informal de X pessoas a participarem, concorrerem, as

rondas, o júri e…e os copos e a partilha. Esta coisa de ter convidados veio mesmo pela

falta de conhecimento do que é que era. Não é algo estruturante nem mandatório (isto

é uma palavra inglesa que eu esqueço-me sempre…) e…e pronto.

9. Que tipo de reacções e comentários tens tido da comunidade?

Hmmm…muito boas. Uma coisa que eu não consigo esquecer foi ter ouvido várias

vezes, não assim muitas mas…, “pá, isto mudou a minha vida” que é uma daquelas

frases que eu nunca esperava ouvir e, e que me fez continuar a organizar estes eventos

porque a ideia é mesmo essa, é tanto chegar àquelas pessoas que estão mais à vontade

e que, se calhar, às vezes já têm formação de autor e que vem isto como um palco para

se darem a conhecer mas, também, para aqueles que são mais solitários, que escrevem

ainda no seu cantinho e que não têm ninguém para os ouvir ou, ou que…os mais

inibidos e os mais desinibidos. E, portanto…mas a pergunta não era essa.

Não, estás a ir bem. O que é que reténs das reacções e comentários da comunidade

desde que começaste a fazer o Poetry Slam…

Principalmente positivo, principalmente positivos. Não sei que mais dizer. Desde ter

mais convites de outras pessoas para levar slams não-sei-aonde. Desde…

10. Como descreves a relação entre os Poetry Slams de Portugal? (slammers,

organizadores, público)?

Eu acho que o slam em Portugal, vendo assim de uma forma global, está muito saudável

porque em 2 anos e meio surgiram…não sei, acho que chegámos agora a cerca de 12

projectos em Portugal. Uns mais activos, outros menos activos, uns mais recentes,

outros menos recentes. Mas acho que, pelo menos pelo que eu vejo, que se criou

mesmo assim uma rede informal, quer dizer, que há uma comunidade…há uma

comunidade infelizmente…ou seja, de forma mais organizada tem havido dificuldades

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em desenvolver uma rede mais organizada e que desse realmente para conciliar os

esforços de todos…por várias razões. Para já, porque estão sempre a surgir novas e,

portanto, se nos juntarmos primeiro 4 ou 5 organizadores e, de repente, 2 meses a

seguir já há mais 2 ou 3 e temos que começar a conversa. E, portanto, como não se

começou nada ou não se chegou a um…a uma forma de consenso já com poucos, acho

que neste momento é cada um por si.

Mas vês os slammers e os próprios organizadores e, se calhar, até o público a circular,

por exemplo, entre slams diferentes?

Vejo…não sei agora neste momento, agora, agora. mas tenho…pelo que eu tenho visto

acho que tem havido alguma circulação, sim. depois, neste momento são…são mais ou

menos os mesmos. Mas isso é normal também. Agora circulação…sim.

11. Como vês o futuro do Poetry Slam X?

Ui…como é que eu vejo o futuro? Hmmm…tou à espera que ele me diga. É assim, eu

não sou profeta, não é? Escrevo poesia…mas não sou profeta, escrevo poemas.

Podes dizer que vês não vendo…

Pois, neste momento não vejo. Não vejo o futuro do Poetry Slam Lisboa. Não vejo. Acho

que…neste momento o Poetry Slam Lisboa sou eu, de alguma forma. E, nesse sentido,

tenho tido outro tipo de solicitações e tenho outros projectos que também quero vir a

realizar que não…que talvez não cheguem a poder ser conciliáveis com o projecto do

Poetry Slam Lisboa que é uma coisa muito confinada a um certo território, não é? E…e

pronto. Portanto, o facto também de já haver outro…várias organizações de slam aqui

perto também…facilita uma tomada de decisão hoje, que não seria tão fácil há talvez 1

ou 2 anos atrás de passar a outra coisa…mas, não sei, neste momento não vejo o

futuro, nos próximos meses não haverá Slam Lisboa.

Quando dizes nos próximos meses…

Eventualmente até Setembro. Numa ausência minha, que não estou no país. Não

havendo a tal equipa que era desejada e que desse para fazer trabalho de estafeta entre

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as várias, entre um grupo de pessoas, não havendo esse grupo de pessoas…portanto,

ou eu faço ou não há e infelizmente…

E o futuro do Poetry Slam em Portugal?

Eu acho que está muito bem encaminhado. Só espero que não, não…não diverge?

Como é que se diz esta palavra? Não divirja? Não divirja do lado convivial, autónomo

e…centrado na poesia mesmo. Ou seja, às vezes, não sei. Há pessoas que têm visões

mais comerciais do que é organizar um Poetry Slam e espero que isso não seja algo que

se sobreponha à natureza destes eventos e portanto, que possa é fomentar cada vez

mais criatividade e participação. Espero eu. E naturalmente que se constitua uma rede e

que as pessoas entendam que…há imenso potencial e que não é preciso, num ano ou 6

meses, para se fazerem coisas minimamente bem conseguidas…em que…para isso

basta alguma coordenação entre as pessoas e algum entendimento base. Perceber que

há pessoas que têm interesses que não estão totalmente ligados ao slam e que são

interesses institucionais e comerciais e ver como é que pode haver alguma harmonia

entre essas visões que são divergente e a própria…porque também há essa questão

que o próprio Marc Kelly Smith reforça que é…o slam surgiu como contraponto a um

universo editorial, formal, oficial…não, não é, ou também pode ser mas, é, é para

pessoas que escrevem poesia e, portanto, muitas vezes mais interventiva e (inaudível)

escritores e autores de romances. Perceber que há um lugar para todos mas em

momentos diferentes, não é? E eu vejo alguns eventos de slam a convidarem, como

cabeça de cartaz, num evento chamado Slam qualquer coisa um escritor que já publicou

não-sei-quantos livros romances que não, que não é performance poética. E isso a

mim…acho que as pessoas depois ficam um bocado baralhadas e não, não…é como

estar…é como abrir uma loja de supermercado e vender sapatos, não é? Ou abrir uma

padaria e vender máquinas fotográficas, tás a ver, a ideia? Mas acho que tá muito bem

encaminhado, há muita polémica envolvida no slam em Portugal, já houve guerras, há

ianda guerras frias neste momento, acho eu, não sei, há muito o virar uns contra os

outros…portanto, está vivo, está a acontecer e pronto…lá está, é não se fechar

e…porque eu, eu tive a sorte de encontrar pessoas de Coimbra que não são do slam

mas que por acaso até me vieram dizer “olha, estive lá no slam em Coimbra” e eu “ai é?

E então?”. E me dizerem, pronto, (inaudível) participações, comentarem mas a dizerem

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que faltava um bocado de qualidade poética (risos). E, portanto, a ideia é…quem

organiza slams conseguir manter e divulgar da melhor forma possível a quem ainda não

conhece, sem criar ruídos e sem criar desinformação. Lá está a questão de…se

começam a pôr num cartaz de um evento chamado slam um autor que já ganhou um

prémio e ainda por cima de 100 mil euros por ter escrito um livro, o slammer se calhar

sente-se intimidado ou sente que não é o lugar dele, ou seja, tem que haver algum

cuidado a esse nível. Comunicar o slam da melhor forma possível, pronto. E realmente

surgir uma plataforma, uma rede de partilha. E não estar à espera que alguém faça tudo

pelos outros, não é? A partilha tem que vir de toda a gente. Mas pronto. Acho que tá

saudável.

Slammer

1. Já leste ou fizeste performances com a tua poesia, o teu trabalho noutros eventos

para além do Poetry Slam?

Procurar nas respostas anteriores

2. O que significa ser slammer, para ti? Como descreves a participação enquanto

slammer no Poetry Slam?

Ser slammer, para mim, é gostar de escrever e de partilhar para…e de partilhar…e

de….é isso.

3. O que é a escrita do Poetry Slam? Como é escrever para participar num Poetry

Slam?

Como é que é escrever?

Quando participaste em poetry slams, na competição, os textos que levaste escreveste

a pensar em participar ou já os tinhas ou pensaste “vou participar num slam, vou

escrever qualquer coisa para participar”, como é que foi?

Pois…eu aí, eu não escrevo textos para participar num slam.

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Isso é porque escreves muito (em tom de brincadeira). Porque Às vezes não há nada e

tens que escrever porque vais ao slam.

São visões diferentes…

Tou a brincar, tou a brincar

Há quem ache que se deva escrever na altura. Sim, eu vou sempre escrevendo e já antes

de conhecer ou descobrir o slam escrevia e, também, ou seja, para música, escrevia

letras de música. Portanto, a minha relação com o escrever já é muito…eu ouço o que

estou a escrever e, portanto, há coisas que eu escrevo como, como ideia, como

conceito, como coisa que está no papel e que faz, e que para mim faz sentido ou

apetece ou surgiu e é uma ideia…e, e quando olho para aquilo não vejo como pôr isso

ou dizer oralmente acho que…seria outro tipo de trabalho. Eu trabalho muito com

ritmo e o próprio som das palavras, ou seja, quase como se cada sílaba fosse uma nota.

É como o trabalho de artesanato quase, artesania da linguagem, artesanato da

linguagem. Normalmente escrevo e conhecendo já as regras do slam, quer dizer

também tenho textos que duram 5 minutos, não dá necessariamente para o formato de

competição. Hmmm…

4. Como escolhes os textos que vais usar num slam?

Neste momento, cheguei a um ponto em que tenho tantos poemas na cabeça e, e talvez

devesse aprender de cor os mais recentes também. Mas normalmente escolho, tento

ter uma ideia mais ou menos e escolho na altura. Depende das pessoas, do ambiente, o

que é que faz sentido eu estar a dizer e comunicar naquela altura, do contexto não é?

Porque há coisas que… Eu posso ter poemas que eu gosto imenso mas “olha, não é o

momento para os dizer”, as pessoas não vão estar prontas para ouvir isto agora. não,

não é para aí que eu as quero levar. Portanto, é pensar um bocado o que é faz mais

sentido comunicar naquele momento. O que é que me sinto mais à vontade, também,

de dizer. Mas é escolhido na altura, normalmente.

5. Preparas-te, de alguma forma, para a tua participação no Poetry Slam?

É assegurar-me que o sei de cor. Acontece muitas vezes mas não, não tenho assim uma

rotina. Mas é ir declamando, se puder, de viva voz ou então ir dizendo em momentos,

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posso estar a andar ou posso estar na rua ou não-sei-quê e tou a declamar a assegurar-

me que está lá. Às vezes mudo o texto, já me aconteceu reescrever o texto na cabeça e

tentar não esquecer porque para mim os poemas ditos em slam têm esta virtude de

serem flexíveis e tu poderes reescrevê-los no momento também. Alterar uma palavra ou

alterar um verso num momento. E isso, para mim quando se chega a esse ponto é quase

como uma evolução natural que para mim faz sentido num poema de slam ou numa

performance slam ou…há pessoas que são contra estar-se a repetir os mesmos textos.

Eu acho que, em primeiro, depende, não é? Mas eu sou mais a favor porque acho que

cada vez que se diz, se a própria pessoa que o diz ta, também tá a dizer num momento

diferente, com…vai pôr enfâse numa palavra diferente, quem tá a ouvir vai descobrir

uma coisa que não tinha ouvido da última vez, o próprio tempo que se dá, os próprios

espaços que se deixam entre as palavras, a velocidade e o ritmo alteram os sentidos

também. Depende do texto em si mas, mas esta característica de poder dizer poesia

oralmente, esta coisa do acontecimento, do happening, ou seja, não ser uma coisa

estática, estar sempre em movimento.

6. E como te preparas?

7. Consideras-te poeta? Porquê?

Cada vez mais, cada vez mais estou pronta a assumir que sim. porque ser poeta é uma

forma de vida, é uma atitude perante a vida, é um estilo de vida, é uma forma de estar,

de ser, de ver, de olhar, de viver. E eu nisso…há quem diga que uma pessoa não se pode

auto-afirmar poeta, que só outras pessoas é que podem reconhecer isso numa pessoa. E

eu durante muito tempo acreditei nisso. Neste momento, a forma como eu vivo e quem

eu sinto que sou leva-me cada vez mais a estar segura de que sim, sou poeta. E poderia

não escrever nenhum poema nunca mais na minha vida, daqui em diante, mas sou

poeta.

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8. (para slammers que não são organizadores) Como é que descreverias o teu

envolvimento, a tua relação com o Poetry Slam?

Público

1.0 (para organizadores e slammers) Também participas no Poetry Slam como parte do

público? Ultimamente não. Ultimamente…quer dizer, eu tou sempre no público, sou sempre

público. Quando organizo também sou público. Não tenho ido a outros slams…porque

os meses são curtos, porque não dá para estar em todo o lado e porque a minha vida,

porque, porque tenho outros interesses. Não posso estar só em slams. Ou não quero

estar só em slams.

1. (se não é slammer) Como soubeste da existência do Poetry Slam?

2. Por que escolhes o poetry slam em relação a outros eventos ou outras actividades

que poderias fazer à mesma hora e dia do slam?

3. (só para público) como definirias a tua participação no Poetry Slam?

4. Pensas participar no slam numa das outras vertentes: organizando, competindo ou

fazendo parte do júri? Se sim, porquê?

5. Já fizeste parte do júri de um slam?

A pergunta é interessante. Se já fiz parte?...que eu me lembre não. Olha que engraçado,

nunca fui júri num slam. Nos que eu organizo não faz sentido, nos outros normalmente

estou a participar quando vou e, portanto, nunca, nunca tive esta posição de júri, não.

Que interessante. As coisas que tu me fazes descobrir que eu nem sabia. Nunca tinha

pensado nisso.

Relação com o Poetry Slam

O Poetry Slam tem, geralmente, uma parte de competição e uma parte de open mic. A

primeira tem algumas regras e uma certa ordem. A segunda pressupõe uma participação

com menos limites (tempo, adereços) e não tem a atribuição de pontuação.

1. O que pensas sobre o formato de competição?

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Ah já pensei muita coisa. Já pensei muita coisa…a primeira vez, quando descobri o

slam tive imensa resistência àquilo. Achava que não fazia sentido

nenhum…achava…achava, havia aí…muito estranho, esta coisa de votar e de dar

pontuações, das pessoas estarem ali a concorrer e…tive bastante…talvez

resistência não mas mais questionar “será que faz sentido isto assim?”. Com o

tempo apercebi-me…ou seja, também ao começar a organizar, não foi pelo

formato de competição. Foi mais pelo formato de convívio e de haver um ponto de

encontro para as pessoas que tinham vontade de expressar poesia oralmente sem

acessórios, sem música, sem…pronto. Ou seja, o formato em si do slam. Com o

tempo, acho que, acho que vejo a ideia de pontuar e de competição como uma

moldura, como um…um…impulso, alguma coisa que faça com que haja, ser mais

dinâmico, alguma coisa que marque o ritmo. É o lado do jogo. O lado do jogo

interessa-me bastante. Tanto em teoria como na prática. No fundo é isso, é o

playfullness, é o jogo no sentido de divertimento. Não levar a coisa demasiado a

sério, ou seja, porque a poesia às vezes pode levar para esse lado. Pode-se tornar ou

parecer uma coisa muito séria. E isto, ou seja, o formato de competição leva um

bocado para o lado lúdico também, que é…permite marcar o ritmo, permite

também haver o desejo para alguns de, deste desafio de querer ser o melhor. Claro

que também pode surgir como uma componente motivadora para participar.

Portanto, é mais por aí. E realmente uma parte muito importante é o público poder

participar. E é isso que me interessa também. É toda a gente estar presente e,

portanto o lado de acontecimento/happening, interessa-me bastante como arte em

si e esta coisa de que toda a gente que está presente é necessária, têm que

participar. Há os que slamam, há os que têm que estar atentos ao poema. isto não

foi…pelo menos é assim que é explicado porque é que surgiu um júri, não é? O Marc

Kelly Smith chegou a um bar e isso é a história, não sei se há tempo para contar

isto…chegou a um bar, pediu ao barman, deu 1 dólar ao barman e perguntou e

disse “posso ocupar o palco durante um tempo para dizer um poema?” e depois o

barman aceito e ele entretanto foi ver 3 pessoas. Isso foi logo assim quando

começou, mesmo antes dele saber que estava a fazer poetry slam, não é? Chegou

ao pé de 3 pessoas no público e disse “olha, vou-te dar isto. Isto é uma pontuação

de 0 a 10…” e isso foi uma boa forma de ele ter a certeza de que pelo menos 3

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pessoas no público estavam a ouvir o que ele estava a dizer. Portanto, por mais que

os outros possam, depois da 1ª palavra, ficar desinteressados, não é? E neste caso,

hoje em dia, são cinco, pelo menos há 5 júris que têm que estar atentos para dar a

pontuação e não-sei-quê, portanto…cada vez vejo mais isto como um evento que

se torna mais interessante havendo competição porque não havendo…mas são

coisas diferentes e acho que cada uma tem o seu espaço.

1.1. A utilização deste formato no poetry slam faz-te repensar o conceito de

competição?

2. E o que achas da parte de open mic, microfone aberto?

Acho excelente para quem nunca participou e é uma boa forma de começar,

também, a sentir-se mais à vontade ao microfone, e a partilhar e a dizer e a ter esta

experiência do que é que é estar perante pessoas a dizer poesia para quem não tem

essa experiência, não é? O poetry slam depois tem, é um local de convergência de

várias pessoas de backgrounds diferentes e, portanto, há actores e há performers

mesmo. Para eles, talvez o open mic não faça tanta diferença, seja mais já um canal

de partilha daquilo que sabem fazer, da arte de cada um. Para aqueles que

escrevem e que nunca tiveram esta oportunidade, acho que é excelente. Acho que

é muito importante haver microfones abertos também…ou seja, sim, para criar este

espaço para quem não se sente à vontade e, também, extra-concurso, para não ter

esta pressão “ai meu deus, agora vou ter um 2”, não é? E, portanto, tirar a pressão a

nível de pontuação e de ser realmente um canal, uma via aberta para uma pessoa se

iniciar e eventualmente depois estar mais à-vontade para participar num slam.

3. O que pensas do papel, da função do júri?

O que é que eu penso sobre o papel do júri? Hmmm…é, é, não sei, não sei (risos). Acho

que já disse um bocadinho. O facto de se ter um júri é importante para se ter a certeza

de que pelo menos há 5 pessoas a ouvir o que o performer está a dizer. De resto, é uma

notação que não é académica, não, não tem…ou seja, sim o júri tem que estar

realmente atento À performance e ao conteúdo e…mas depois é uma questão de

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feeling, de empatia. Se fosse outra pessoa dava outra pontuação, portanto, em termos

de…acho que é irrelevante, de alguma forma. Mas faz parte e tem um papel importante

no evento, claro. Acho que tem um papel importante porque, porque ao mesmo tempo

reflecte ou deveria (mas lá está, não é uma ciência exacta), deveria reflectir de alguma

forma que se consiga que o vencedor seja aquele que naquela noite esteve “mais lá”,

como slammer. Não quer dizer que seja o melhor poeta, não quer dizer sequer que seja

o melhor performer…mas, mas que é aquele que esteve “mais lá”, aquele que as

pessoas tiveram mais vontade de ouvir naquela noite e que, se calhar, noutra noite seria

completamente diferente. Há muito este lado…este lado…não sei…pronto.

4. Achas que deviam ser dados critérios prévios ao júri para a avaliação que fazem?

Acho que sim. acho que há 2 ou 3 coisas que são fundamentais e que, e que

divergem de pe…de organização para organização. Acho que o júri deve, para já

estar atento à performance e ao conteúdo. Hmmm…do slammer….hmmmm…e

também de ir um bocadinho além e ver realmente o que é que lhe faz sentir, não é

ter assim…um trabalho intuitivo daquilo que tá a ser performado. E eu, na minha

opinião, isso diverge às vezes, eu acho que o júri também tem que estar atento ao

público e à reacção do público. Ou seja, sendo que, imaginemos em 50 pessoas há 5

(isto são 10% a votar) é simpático que eles, ou seja, que não seja…mas aí diverge lá

está. Eu acho que o júri tem que estar um bocado sensível à reacção do público. Em

caso de dúvida. O que não quer dizer que tenha que dar a pontuação de 10 só

porque toda a gente bateu palmas, também pode dar 2. Acaba sempre por dar a

pontuação que lhe interessa. Mas para mim isso também seria 1 dos critérios.

Mas os critérios deviam ser ditos a quem faz parte do júri?

Sim, isso pode ser dito por quem está a apresentar. É uma frase. Basta relembrar

isso. Ah e depois há os tais dos de 0 a 10, a nota mais alta e a nota mais baixa são

retiradas. Para eles também saberem. Para mim o que é importante é realmente

não…o júri ousar completamente e não ter medo de dar um zero ou um 10. É que se

não, quando anda tudo à volta de 7, 6 é porque ninguém quer ferir ninguém. E as

susceptibilidades. Tanto o performer como o júri…é um jogo não é? Foi 3, “olha foi

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3. Correu mal. Não perceberam a mensagem”. Mas só assim é que todos juntos

conseguem melhorar e os performers melhoram e o próprio evento só ganha com

isso. Se começamos a organizar eventos em que toda a gente tem sempre 7.2

depois fica sempre assim morno e não se perceve muito bem…”ah porque ele diz

muito bem, tem uma voz muito boa”. “Tá bem mas tá a tocar-te? tá a dizer coisas?

tá a renovar a poesia? tá a trazer algo de novo à língua portuguesa? (inaudível) o

que já se fazia há 50 anos atrás. O Poetry Slam é um bocado também um espaço de

vanguarda, na minha perspectiva, e de experimentação e, portanto, idealmente

estamos todos a contribuir uns para os outros. Isso é que é o ideal, é o júri poder dar

uma nota muito baixa e para a próxima vez se o performer, o slammer não desistir

completamente talvez venha com ideias novas. E pronto.

Mas achas que…que tipo de papel é que temos que ter para que isso aconteça? Ou

achas que não temos que ter papel nenhum, se acontecer acontece, se não

acontecer não acontece?

Quando dizes temos é o júri ou…

Todos os que participamos no slam. Para ser esse espaço que tu vês como o espaço

ideal do poetry slam, achas que há alguma coisa que nós enquanto participantes

do poetry slam podemos fazer ou achas que tem que ser um movimento natural?

Ou podemos fazer alguma coisa nesse sentido? Por exemplo, como é que…, achas

que devemos fazer alguma coisa para que o júri realmente não se preocupe e dê

zero se acha que tem que dar zero ou dê 10 se acha que tem que dar 10?

Hmmm…

Isso pode nunca vir a acontecer. Podemos ter um júri que está sempre a pontuar

6,7.

Eu sou mais pelo movimento natural. Acho que vamos aprendendo. Agora, temos

todos experiências já de vida e de saber como é que as coisas evoluem. A própria

evolução natural das coisas às vezes pode ser um bocadinho previsível e, portanto,

é fomentar a criatividade e assegurar que sempre que há um slam, as condições

estão reunidas, que há pessoas atentas, que não há uma necessidade somente…ou

que não há uma centralização de protagonismo à volta de alguma coisa porque é

um evento colectivo e, portanto, fomentar a participação de toda a gente. O

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público saber que também se pode manifestar durante um slam, que não é fazer

silêncio, que não é fado, não é o formato de fado de “agora toda a gente, silêncio”.

Se isso acontece que aconteça naturalmente e é um bom sinal. Acho que…é cada

um…se…encontrar o seu lugar e se entender isto desta forma também ajudar a

que isso aconteça. Facilitar nesse sentido e não no sentido constrangimento cada

vez mais, que é ter um júri escolhido, pré-seleccionado sentado numas mesas…ou

seja, que gera um formato em que as coisas…de separação. Evitar um formato de

separação. Não sei o que é que isso quer dizer mas soa bem.

5. Como é que é o público do poetry slam?

Como é que é? É um público curioso. Sensível…e que gosta de poesia, que gosta da

língua, que gosta de palavras. Quando digo sensível é também no sentido de sentir,

ou seja, no fundo poesia também é transmissão de sentido e de ideias e de visões,

não é? Visões do Mundo, visões de coisas, estados de espírito, estados de alma.

Hmmm, acho que é um público maravilhoso. Tem é que também…mas isso também

vem com o tempo, perceber cada vez mais o poder que tem, não é? De participar,

tanto como público mas também de ousar e atraver-se a…eu acredito que a maior

parte das pessoas do público são pessoas que também escrevem e que vão também

para ouvir outros. Também sei que há muitos que não escrevem e que só gostam

mesmo de ir e ouvir e acham divertido e gostam sobretudo do formato de

competição, gostam de participar como público. Mas acho que sim. é um público

interessado, curioso, que gosta de poesia. Todas as idades. É uma coisa maravilhosa

no slam. Poder interessar e estar aberto, ser um evento intergeracional, que não há

muitos eventos assim. E participativo.

6. O que pensas sobre a condição de os textos terem que ser da autoria do slammer

para que possa participar na competição?

O que é que eu penso sobre isso?

Esse critério poderia não existir. Poderia haver uma competição em que as pessoas faziam

a sua performance mas em que usassem os textos de outras pessoas.

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Mas para isso as pessoas vão ao teatro. Ou ver uma performance baseada numa

anotação do texto de não-sei-quem. Não penso nisso porque isso é o núcleo do que

é o slam. O ponto fundamental do slam é serem textos escritos pelos próprios.

Agora, depois é muito difícil controlar, não sei se é a palavra certa, assegurar-se de

que quando se tá a ouvir alguém de que aquilo não foi escrito por outra pessoa, não

é? Já aconteceu, já sei de momentos em que há pessoas que vão ler textos escritos

até por um amigo, mas o amigo não queria ir e vão ou então pessoas que fazem

adaptações de um poema mas aquilo é quase…a adaptação foi uma vírgula não-sei-

aonde no meio. E pronto, já tive que explicar a uma pessoa, assim recentemente,

quando vim a perceber a ideia, disse-lhe. E fiquei assim “mas leste o regulamento?

Que parte é que não percebeste do poema original? Original, poema escrito por ti

próprio.” Mas…acho que isso é, é um dos parâmetros do slam, é serem poemas de

autoria própria, se não…depois há outros eventos. Há o evento que é o Drama

Slam, que é muito giro, que eu gostava de trazer cá um dia mas que já não vou, não

sei.

Porquê?

Porque são textos escritos por poetas slammers e interpretados por autores e tem

júri também e aquilo…pronto, podem ser diálogos com actores ao mesmo tempo a

lerem o texto escrito por alguém. E tem assim um formato diferente. Ou seja,

podem-se criar à volta do slam formatos diferentes. Mas convém também dares

nomes diferentes para aquelas pessoas que não conhecem não ficarem demasiado

perturbadas e confundidas. Quando se está a fazer slam tentar manter o evento

slam, poetry slam. E quando se faz uma coisa que é diferente, podem-se fazer slams

temáticos, podem-se fazer imensas coisas mas dar o nome à coisa para as pessoas

perceberem. Porque há slams de poetas mortos, por exemplo, e toda a gente tem

que levar…ou até mascarar-se de um poeta. E depois ganha o Baudelaire, por

exemplo. Porque quem o interpretou e escolheu os poemas esteve muito bem.

E…e pronto. Há muitas, isto é um universo em si. Dá para fazer imensa coisa.

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7. Na tua opinião, qual foi a razão para se criar um evento desta natureza, com estas

características?

Acho que ele (Marc Kelly) tinha coisas a dizer, não sei. E queria sair do…pá, isto é

complexo, ele vem dos E.U.A., os E.U.A. têm uma história enorme do que é a

oralidade, a poesia, os beat poets, os movimentos, tem muita coisa por trás. Isto

não é nada, nada de novo. Londres tem os speakers corners não-sei-aonde, também

nos E.U.A. também há muito. Eu acho que (inaudível), talvez não se identificava com

o meio poético estabelecido na altura. Os anos 60, 70 já tinham passado. Estávamos

no início dos anos 80, uma década um bocado sombria e pronto, depois do ânimo e

da euforia toda dos anos 70 e de todas as mudanças a nível mundial, a coisa parecia

que estava a esmorecer um bocadinho mas eu acho que era mesmo, ele não se

identificava na altura. E não queria ir pela via “vou agora fazer um livrinho com os

meus poemas e vou lançá-lo e vou-me sentar numa mesa e ler num ambiente muito

formal”. Ele no fundo apropriou-se, deslocalizou, portanto isto são tudo

movimentos…ou seja, técnicas, não são técnicas…correntes artísticas: a

apropriação, a descontextualização da coisa, não é?, o mudar as dimensões da coisa

faz logo que seja um objecto considerado artístico. Eu acho que isto tá um bocado

nessa linha, dos movimentos artísticos. E, no fundo, a performance a assumir o seu

lugar muito nos anos 80 com o Mar(imperceptível). Já se fazia performance há

muitos anos, desde sempre. Mas como movimento artístico acho que começou a

fortalecer nos anos 80 e o fundo foi o espaço que ele encontrou, um bar, à noite,

com copos. Uma coisa mais solta, mais leve e mais directa. Ou seja, não há nenhum

intermediário, és tu e quem está lá presente a ouvir. Não tens, não é preciso estares

à espera 6 meses, 1 ano ou falares com o não-sei-quantos ou arranjares uma editora

para fazer isto ou aquilo. E portanto, o lado imediato, de proximidade, acho que foi

isso. E continuar, e renovar e continuar, no fundo, dar continuidade a uma forma de

intervenção social também directa, participativa.

8. Qual a tua opinião sobre os textos que são lidos, performados no poetry slam?

Eh pá não tenho opinião. Não tenho opinião.

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9. Achas que há um tipo de texto, um tipo de poesia do poetry slam, que tem mais a

ver com o poetry slam? (se sim) Podes descrever, dizer como é, esse tipo de texto?

Provavelmente sim mas também prefiro (inaudível). idealmente…uma coisa que eu acho

boa é dão-te 3 minutos, agarra nos 3 minutos. Isso é uma coisa com a qual me sinto

bastante próxima. Chateia-me às vezes ver as pessoas saírem depois de 1 minuto, porque a

vida é curta, o tempo é curto. E dão- te 3 minutos ali para estares, tens uma oportunidade

para comunicares e expressares, agarra os 3 minutos, preenche os 3 minutos, repete o

poema, se tiver 30 segundos diz o poema 6 vezes de formas diferentes, não sei. Agora,

chegar ali, 30 segundos e vir embora, fico com pena. Porque acho, acho que é…mas isso

sou eu. Mas perguntar se há poemas que são melhores que outros?

Não. Se achas que há um tipo de poesia que tenha mais a ver com o poetry slam.

Um tipo de poesia? Há coisas que soam melhor, há coisas que passam melhor. Há

quem defenda muito a importância da mensagem, da parte…lá está, da própria

comunicação, daquilo que estás a dizer, da expressão. Eu acho que é o que se vai

fazendo, é o que se vai dizendo. Tá lá um júri para isso também, não é? Eu gosto

muito de ouvir alguém 3 minutos, a aguentar-se, até encher o tempo. E a dar ritmo,

a marcar o tempo. Eu acho que para mim, o tipo de poesia slam é que tenha alguma

sensibilidade ao tempo, vá, ao rtimo.

10. O que gostas mais no Poetry Slam?

O que é que eu gosto mais? A energia. A energia do evento. Estamos a falar do

formato de competição?

Não, estamos a falar da coisa toda em si.

Esta forma directa de se poder estar e o potencial de desenvolvimento que isto tem

em outras áreas da vida. É uma arte muito capacitadora, ou seja, ao praticá-la dá-te

ferramentas, de te sentires melhor em público. Isto leva a poder ter aspectos

positivos para a vida em comum, em geral. É uma forma muito directa. A poesia em

si, o poema, tem tanta coisa por trás, tens que pensar, um reflexo das coisas sobre

as quais cada um reflecte. Há quem trabalhe mais o som ou as palavras, há quem

trabalhe mais a mensagem. Mas acabas por ter que pensar “como é que eu me

posiciono? O que é que eu quero dizer? O que é que eu ouso dizer em público?”

hmmm…o que é que eu gosto mais?

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11. O que gostas menos?

Do slam? Não sei. Do que é que eu gosto menos…no slam em geral é mais

complicado. No evento em si…o que é que eu gosto menos…tou numa posição

complicada também para responder a certas perguntas. Olha, o que eu gosto

menos é de ter que produzir os eventos. O que eu gosto menos é organizar os slams

e produzir os slams, tudo o que isso envolve.

12. Já falaste sobre o Poetry Slam com pessoas que não ouviram falar ou nunca

estiveram num? O que dizes?

Já. Acho que já disse, aqui e agora, várias vezes, muitas vezes. É uma arte

performativa oral, poética, que eu encaro como um acontecimento, happening que

envolve, ou seja, que é participativo, que tem que envolver…que não existe sem

público, que não existe sem participantes, uma equipa que organize, que requer a

participação de toda a gente. Acaba por ser, às vezes, um exercício de democracia

participativa para além da própria coisa que tá a acontecer e que gira em torno da

poesia e que é sempre o pilar central dos eventos. E depois há a história toda…que

nasceu, que existe há 30 anos e tal, que na Europa chegou tarde, mais tarde e que

em Portugal e Espanha então…são agora dos mais recentes. Que alguns países da

Europa…depois depende a quem tou a contar isso mas basicamente é isso.

13. Na tua opinião, o que é que atrai as pessoas, público e slammers, no Poetry Slam?

Acho que o que atrai primeiro são os participantes. Depois levam os amigos, a

família, não-sei-quem. Acho que fundamentalmente parte daí. O que atrai é o poder

participar no evento. Para quem escreve acho que é isso. E depois, conviver e

conhecer outras pessoas que escrevem e ouvir outros e ter um copo à borla. Ter um

momento e uma experiência, viver a arte como experiência para citar o John

Dewey.

14. Na tua opinião, para que serve o Poetry Slam?

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15. No mundo da poesia, o Poetry Slam é um evento mainstream (de massas, popular)

ou underground, de contracultura (é uma sub-cultura com normas e valores que se

opõe àquilo que é mainstream, ex: Beat generation, hippies)?

Depende de onde estivermos. Acho que em muitas partes, e vou falar só da Europa,

acho que se tornou mainstream e que a poesia é que está no underground.

Eventualmente, a relação é mesmo essa. Em Portugal, eventualmente, tornar-se-á

mainstream e…quando dizes poesia é o tal “escreve, publicas um livro, lanças”?

No mundo que caracteriza a poesia, sobretudo em Portugal, qual é o lugar do

poetry slam?

Eu acho que são todos complementares. E acho que a poesia vai muito além, ou

seja, o mundo da poesia é enorme, na minha perspectiva. Tanto engloba artes

visuais, áudio-visuais, música, arquitectura. Poesia para mim…o mundo da poesia é

demasiado vasto na minha perspectiva. Agora, para fechar mais no escrever

poemas, no aspecto literário da poesia…são coisas diferentes no fundo. O escrever,

no fundo no poetry slam escreves primeiro, escreves no formato X, com limitações

X, tem um lado…já é lúdico na sua própria forma de…é outra coisa. Acaba por se

tornar outra coisa. E portanto não sei se dá para estar também a querer tar a meter

mainstream e underground aí. Acho que no próprio poetry slam vai haver slams

mainstream e slams underground. Eventualmente, não é? Como na poesia, tens a

poesia mainstream e continuas a ter outros poetas underground que fazem uns

coisitos. E porquê? Porque cada um tem a sua visão e complementares. E há-de

continuar assim. É continuar a fomentar a diversidade, a complementaridade. Mas

não…acho que cada coisa tem o seu lugar. Pronto, e se puder haver pontes entre

todos, quer dizer. No Slam, em Lisboa, também há o Poetry Clips que veio do slam.

Fazes um vídeo sem efeitos visuais, sem efeitos de edição, sem não-sei-

quê…pumba, poetry clip. E há festivais, há concursos de poetry clips. E depois

aquilo é um slam que foi gravado e é um vídeo. Isso ainda é poesia? O que é que

aquilo é agora é só vídeo? É slam? Portanto, Às vezes Acho que às vezes é bom não

tentarmos definir demasiado as coisas.

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16. Achas que existe uma comunidade em torno do Poetry Slam em Portugal? Porquê?

Porque…porque há eventos regulares, em várias partes. Alguns organizados por

pessoas, às vezes as mesmas, como é o caso do Sul e de Braga. São 2 cidades

diferentes mas há uma mesma pessoa que está envolvida nas 2 organizações e que

acaba por fazer ligações e pontes. E, portanto, facilmente uma conexão. Em Lisboa,

eu vejo, por encontrar e saber, que há uma mobilização de um grupo de slammers

que entretanto já criaram performances. Alguns, ou seja, eu já tinha falado no

LÁBIO… que foi também um momento bastante divertido de tentar criar, em

conjunto com outras artes, performances em volta da poesia. E, portanto, há

afinidades que se criam entre pessoas que desejam continuar a ver-se e a criar e a

partilhar e a fazer…o Ricardo Blayer no outro dia, tu entretanto já deves ter falado

com ele, encontrei-o por acaso e ele disse-me “tive agora a declamar um poema

num carrinho (inaudível)”. as pessoas ou juntam-se…ou não. Mas há, eu sinto que

há uma comunidade. É um grupo bastante pequeno, de alguma forma, mas sinto

que há. Não sei explicar mais que isso.

17. Achas que há grupos/comunidades de diferentes tipos de poesia?

Há um, que já ainda aí há imenso tempo, que são os Volte Face. Que é uma

vertente…há um designer também, trabalham muito bem a imagem, nas redes

sociais. E depois fazem performances que envolvem vídeo, som e palavra. E pronto,

acho que é um que se possa dizer (inaudível). por acaso nunca houve nenhuma

ponte feita com eles, estranhamente, em nenhum…mesmo festivais ligados à

palavra. Nunca foram contactados ou eles próprios não…mas sei que andam

activos e que continuam a fazer coisas. Depois há uns que não sei se vou dizer

porque não sei se existem ainda. Porque as pessoas às vezes pensam que isto é

tudo muito fácil, “ai vamos fazer uma coisa” e dura 2 meses. Em vez de se focarem

mais de criarem outro tipo de energias. Ah, há aranhiças&elefantes. É um bocado

difícil de dizer porque é um singular plural, não é? Também, também…até têm

projecção internacional vão a eventos a Universidades. E acho que há muitos e

vários, há coisas que duram mais tempo, outras que duram menos tempo. É difícil

avaliar…depois há trabalhos que são feitos mais…eu sei, por exemplo, que o

Cristiano do Porto também tem um projecto em que vão fazendo explorações

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sonoras. Há projectos musicais, há uns que participam em slams, outros não. Poesia

não falta em Portugal. Mas às vezes reflecte bastante bem…o Tiago Gomes faz

muito o Kerouac constantemente…e aliás, nem é poesia, o On the Road é um

romance. Nem sei por que é que estou a falar disto.

18. Identificas algum tipo de relação entre as pessoas dos Poetry Slams de Portugal?

Apercebes-te de circulação de pessoas entre slam´s? (excepto para organizadores)

19. Achas que o Poetry Slam é influenciado por outras áreas artísticas (excepto poesia,

performance)? Como?

Claro. Acho que é influenciado por qualquer coisa, tudo o que a pessoa slamma vive

e experiencia. Pode até ser graffiti, street-art. Pode ser tanta coisa. Uns aos outros,

muito. O que as pessoas leem, o que as pessoas veem. O sítio onde as pessoas

vivem, nomes de cidades (risos). Não sei. Mas com certeza. Ainda não falei de

teatro. Teatro é tão óbvio. Eu sou muito influenciada pela dança, por exemplo.

Extremamente influenciada pela dança quando escrevo. Não é que esteja a dançar

quando leio. Principalmente talvez o teatro.

20. Baseando-te na tua experiência de frequentadora de eventos de poesia, podes

fazer uma comparação entre o poetry slam e outros eventos de poesia em que há

leituras e performances de poesia?

Acho que a componente essencial é a questão da relação e da interacção. Acho que

é sobretudo aí que há diferenças. O poetry slam é um evento de poesia interactivo e

relacional enquanto que uma leitura de poesia ou espectáculos ou festivais é aquele

formato quase como se houvesse uma parede invisível entre quem está a dizer e

quem está a ouvir. Enquanto que o slam, no fundo, manda esse muro invisível

abaixo e toda a gente está em palco. O palco é o evento, é o espaço onde acontece

o evento. E há liberdade para uma pessoa se levantar, se mexer, andar, quem sobe

ao palco volta para o público, vem outro do público. É o relacional, é o interactivo. E

liberdade de circulação, de palavras, de pessoas.

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21. (excepto para organizadores) Como vai ser o futuro do Poetry Slam em Portugal?

Há alguma informação que gostasses de acrescentar ou alguma sugestão que

gostasses de fazer?

Talvez…também me lembrei no outro dia. Eu acho que devo ter falado só do Poetry

SLam Lisboa, a certa altura. Eu vejo muito o Poetry Slam Lisboa como uma escola. Acho

que surgiu mesmo como uma escola do que é que é o slam e que foi, nesse caso, essa

palavra acho que é de acrescentar aí algures. Foi uma plataforma onde as pessoas

descobriram o que era o slam, parenderam a fazer, aprenderam as ferramentas

necessárias e desenvolveram essa capacidade de se auto…e como modelo, como

protótipo de como se pode fazer o slam.

C1 – zé

C2 – sérgio

C3 – carolina

C4 – li alves

D1 – bruno dias

B3 – Harry

D2 – Harry

D3 – José

D4 – david

D5 – bruno

A6 - raquel