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Ano IV, Número 14, Junho - 2013
2
Ficha Técnica
Conselho Editorial:
Stela Mithá Duarte - Doutora em Educação/ Currículo pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo - Brasil
Jó Anónio Capece - Doutor em Educação/ Currículo pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo - Brasil
Carla Maciel - Doutora em Estudos Ingleses pela Universidade de Illinois - EUA
Félix José Mulhanga - Doutor em Ciências da Educação pela Universidade Friedrich Schiller -
Alemanha
Crisalita Djeco Funes - Doutora em Ciências Pedagógicas pela Università degli Studi di
Bergamo - Itália
Equipa técnica
Jaime Mondlane - Mestre em Educação/ Ensino do Português pela UP
Daniel Ernesto Canxixe - Licenciado em Psicologia de Necessidades Educativas Especiais pela
Universidade Eduardo Mondlane
Germano Diogo - Licenciado em Planificação e Gestão da Educação pela UP
Titulo: UDZIWI
Publicação: Trimestral
Propriedade: Centro de Estudos de Politicas Educativas (CEPE) da Universidade Pedagógica
DISP. REGº/GABINFO-DEC/2008
3
Índice
Editorial 4
Influência dos instrumentos de avaliação da 8ª classe na disciplina de
Geografia
Daniela Januário Biché
5
Uma contribuição para a consciencialização ambiental no ensino de
Geografia – um estudo de caso na Escola Secundária Ndambine 2000 (2010
a 2012)
André Rafael Bila
26
A teoria da acção dialógica de Paulo Freire: uma solução para a crise de
implementação das escolas democráticas?
David Mudzenguerere
42
4
Editorial
Esta é a Revista nº 14 do ano de 2013, com um novo Conselho Editorial.
A revista é composta por 3 artigos que abordam questões sobre instrumentos de avaliação
e a problemática ambiental na disciplina de Geografia, sendo que o último artigo refere-se a
implementação de escolas democráticas.
O 1º artigo, da Mestre Daniela Januário Biché, resulta da Dissertação de Mestrado em
Desenvolvimento Curricular e Instrucional apresentada na Universidade Eduardo Mondlane
(UEM). Nele a autora aborda o uso dos instrumentos de avaliação no processo de ensino-
aprendizagem de Geografia. Constata que o instrumento privilegiado é o teste escrito e
recomenda a necessidade de se diversificar os instrumentos, na perspectiva de uma avaliação
mais formativa.
O 2º artigo, sobre a consciencialização ambiental no ensino da Geografia, resulta de uma
Monografia Científica com vista a obtenção do grau de Licenciado pelo autor, André Rafael
Bila, na UP-Gaza. O autor constata que na leccionação os professores aplicam métodos
diversificados, com maior destaque para a elaboração conjunta acompanhada de exposição oral,
assim como métodos de resolução de problemas e cooperativos nas aulas práticas. Entretanto,
recomenda o uso de meios ilustrativos e relevantes para a elevação da consciencialização
ambiental dos alunos.
O 3º artigo, do Mestre David Chabai Mudzenguerere, sobre implementação de escolas
democráticas nas nossas sociedades, apresenta a teoria da acção dialógica de Paulo Freire como
um possível instrumento típico para superar as dificuldades decorrentes desse processo. Ele
desenvolve a sua reflexão considerando que a humanidade se constrói com uma inclusão
promotora de todos os homens.
5
Influência dos instrumentos de avaliação da 8ª classe na disciplina de Geografia1
Daniela Januário Biché2
Resumo
O presente trabalho tem como tema: “Análise dos instrumentos de avaliação usados pelos professores e a
sua relação com o rendimento escolar”. Este estudo foi conduzido com objectivo de levar os professores a
reflectirem sobre a necessidade do uso dos instrumentos de avaliação no processo de ensino e
aprendizagem com vista a melhorar o rendimento dos alunos. Esta reflexão inclui a necessidade do
professor compreender o propósito da avaliação, ajudar o aluno a reconhecer as suas próprias
necessidades, desenvolvendo a consciência da sua situação escolar e orientando o seu esforço na
superação do que não está ocorrendo bem no processo de ensino - aprendizagem. O estudo foi realizado
nas Escolas Secundária Francisco Manyanga e Comunitária Santa Ana da Munhuana e a amostra
consistiu de 52 elementos dos quais 9 professores e 41 alunos provenientes das duas escolas e os
respectivos directores. Os instrumentos usados na recolha de dados foram: questionários, entrevistas e
ficha de observação. A população envolvida neste estudo foi constituída por alguns alunos da 8ª classe e
respectivos professores e os directores das duas escolas, de onde foram retiradas as seguintes amostras: (i)
De alunos constituída por 41 alunos, com aplicação do método de amostragem aleatória simples e (ii)
nove professores com recurso ao método aleatório não probabilístico. Os principais resultados das
análises indicam que no processo de ensino o tipo de avaliação que os professores mais privilegiam é o
teste escrito (77.8%). Quanto as estratégias usadas para avaliação dos alunos nas turmas numerosas, os
professores privilegiam a correcção dos exercícios no quadro (88.9%). Quanto as estratégias de avaliação
postas em prática pelos professores, eles costumam dar trabalho para casa (TPC) a todos os alunos, mas
não atribuem nenhuma classificação. Esta pesquisa reúne informações importantes que poderão auxiliar o
MEC e o INDE em investir no sistema educativo procurando capacitar os professores e reflectir sobre a
necessidade de valorizar a avaliação contínua.
Palavras-chave: avaliação, avaliação formativa e instrumentos de avaliação
Introdução
O objectivo central deste estudo é analisar os instrumentos de avaliação usados pelos
professores de Geografia da 8ª classe na sala de aula e a sua relação com o rendimento escolar.
Esta pesquisa foi motivada pelas constatações por parte da pesquisadora como professora
e delegada da disciplina de Geografia a partir da observação de aulas dos colegas que não usam
tais instrumentos de avaliação, afectando negativamente o rendimento escolar dos alunos.
1 Artigo resultante da Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento Curricular e Instrucional da autora, apresentada
à Universidade Eduardo Mondlane. 2 Mestre em Desenvolvimento Curricular e Instrucional (UEM), Licenciada em Ensino de História e Geografia (UP).
Docente do Departamento de Geografia da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Pedagógica, Maputo.
6
O Relatório para a UNESCO (1999) sobre Educação para o Século XXI considera a luta
contra o fraco rendimento escolar um imperativo (Delors, 1996). O mesmo documento refere que
no ensino secundário, em muitos países, "o aumento dos efectivos é acompanhado pelo insucesso
escolar, como provam as elevadas taxas de reprovações" (Ibid).
Em Moçambique, o Plano Estratégico da Educação (PEE) 2006-2010/11 preconiza como
um dos objectivos para o sistema educativo, "…melhorar a qualidade de ensino e aprendizagem
dos alunos". Neste contexto, a melhoria da qualidade de ensino e de rendimento escolar passa
necessariamente pelo uso dos instrumentos da avaliação pelo professor na sala de aula.
Contexto do estudo
A questão da avaliação é amplamente discutida em todos os ambientes escolares. Nos
últimos anos, as escolas buscam pedagogias direccionadas para a transformação e não mais para
a conservação, repensando nas formas de avaliação.
O uso dos instrumentos de avaliação é uma preocupação geral a nível internacional não
só e é neste contexto que importantes educadores e estudiosos tais como Fernandes (2006),
Luckesi (1998), Perrenoud (1999), Ribeiro (1993), Rosales (1992), Silva (2004), entre outros,
defendem uma nova forma de avaliação educativa, que ajude o aluno a construir o seu
conhecimento e o professor a privilegiar o acompanhamento, usando os instrumentos de
avaliação. Os autores argumentam que a função de avaliar corresponde a uma análise cuidada
das aprendizagens conseguidas face às aprendizagens planeadas, o que se vai traduzir numa
descrição que informa os professores e alunos sobre os objectivos atingidos e os que levantam
dificuldades.
A pesquisa sobre a avaliação tem tido lugar em vários contextos, sendo de realçar ainda
os trabalhos de Hadjl (2001), Hoffman (2001), Libâneo (1994), entre outros.
Em Moçambique, a pesquisa sobre avaliação educacional é desenvolvida por autores
como Duarte (2007), Germano (2002), Januário (1998), Januário (2008), entre outros que se têm
dedicado a este assunto, identificando as potencialidades e fragilidades ocorridas no
desenvolvimento da avaliação das aprendizagens, um processo que envolve toda organização do
trabalho pedagógico realizado nas instituições educacionais.
Apesar da importância da avaliação no processo de ensino, o que se verifica é que alguns
professores não valorizam o uso dos instrumentos de avaliação, conduzindo os alunos ao
insucesso no rendimento escolar. É neste âmbito que a educação em Moçambique tem como
7
grande desafio, dentro do contexto da actualidade, promover a aprendizagem de todos os alunos
e assegurar um percurso de sucesso. Este percurso só será possível se o processo de avaliação
fizer parte de uma actividade que valoriza avaliação formativa e outras formas de pensar para
garantir melhor rendimento escolar.
Nesta perspectiva, torna-se importante analisar os fundamentos de uma avaliação
pedagógica que atenda às necessidades de escolarização dos alunos. Neste sentido, questiona-se
o processo de aprendizagem dos alunos que está, usualmente, centrado apenas num desempenho
cognitivo, sem referência a um projecto pedagógico e ainda, o sentido das avaliações escolares
que se têm direccionado, especificamente, para o acto de aprovar ou reprovar os alunos (Lima,
2008).
O nível da 8ª classe foi escolhido neste estudo, porque nesta classe também são
abordados fenómenos físicos, visto que os programas são concêntricos e estes aspectos já
começam a serem tratados no Ensino Básico. Para a sua compreensão, é necessário que o
professor dê o devido acompanhamento ao aluno, usando instrumentos de avaliação
diversificados para ajudar os alunos que têm maiores dificuldades instrucionais. Igualmente, esta
é a classe inicial de um novo ciclo no Ensino Secundário Geral, o que ajudaria o professor na
escolha dos instrumentos de avaliação eficazes durante todo o ciclo.
Entretanto, o que se observa é que os alunos, ao concluírem esta classe, ainda denotam
muitas dificuldades na compreensão dos fenómenos físicos, tais como atmosfera, litosfera e
hidrosfera, que são tratados neste nível. Com a falta de uma avaliação formativa, chegam ao fim
da unidade didáctica com lacunas que influenciam negativamente o seu rendimento escolar como
ilustra tabela1e 2.
Assim, o presente trabalho visa fazer uma abordagem da necessidade de uso dos
instrumentos da avaliação, destacando a avaliação formativa como prioritária no processo de
ensino e aprendizagem.
Formulação do problema
A pesquisa sobre a avaliação é um acto muito importante, considerando que, em
Moçambique, o objectivo principal da Educação é perseguir um ensino de qualidade. No entanto,
na maioria dos casos, só se usa o teste escrito como o instrumento fiável na avaliação, o que
contribui sobremaneira para o baixo rendimento escolar, como se pode ver na tabela 1 e 2 do
aproveitamento pedagógico das duas escolas.
8
Nas duas escolas, a aprovação dos alunos não atinge os 100%, dos 469 avaliados a
Geografia na Escola Comunitária Santa Ana, somente 220 alunos passaram de classe,
correspondendo a 46.9% e, na Escola Francisco Manyanga, a situação não difere muito.
Tabela1. 1: Aproveitamento pedagógico anual por disciplina
Classe Português Inglês Histó
ria
Geogra
fia
Física Quími
ca
Matemá
tica
Desen
ho
8ª AV 469 469 469 469 469 469 469 469
N+ 280 335 240 220 295 401 234 310
% 59.7 71.4 51.1 46.9 62.8 67.9 85.5 49.8
Fonte: Direcção Pedagógica da Escola Comunitária Santa Ana, 2010.
Tabela1. 2: Aproveitamento pedagógico anual por disciplina
Classe Português Inglês História Geografia Física Química Matemá
tica
Desen
ho
8ª N+ 625 599 650 440 613 467 531 601
% 88.02 84.4 91.5 56.4 86.3 65.7 74.8 84.6
Fonte: Direcção Pedagógica da Escola Secundária Francisco Manyanga 2010.
Estudos realizados por Duarte (2007), Fernandes (2005), Mendez (2002) e Perrenoud
(1999) mostram que a avaliação da aprendizagem escolar é utilizada quase na totalidade para
classificar os alunos em aprovados ou reprovados.
Segundo Luckesi (1998) nas ocasiões onde se possibilita uma revisão dos conteúdos, em
si, não é para se proceder a uma aprendizagem ainda não realizada ou ao aprofundamento de
determinada aprendizagem, mas sim para "melhorar" a nota do aluno e, por isso, aprová-lo.
A questão fundamental que se coloca é que alguns professores não se têm servido dos
instrumentos para monitorar o processo de ensino-aprendizagem, isto é, não avaliam o
9
desempenho dos alunos ao longo do processo de ensino-aprendizagem de modo a detectar falhas
e encontrar estratégias para sua recuperação, em função dos objectivos, conteúdos e da realidade
da escola ou da turma.
Muitos dos professores preocupam-se em atribuir nota ao aluno acabando, este acto, por
ser um fim em si mesmo e distante da aprendizagem. Esta atitude ignora as complexidades que
envolvem o ensino, tais como os objectivos, os métodos, a situação social do aluno, as condições
e meios de organização do ensino.
De acordo com o novo Regulamento de Avaliação (2010) no seu artigo 10 (Diversidade
de avaliação), recomenda que o professor aplique formas diversificadas de avaliação
(observação, trabalho para casa, testes escritos, verificação de caderno, relatórios de pesquisas,
visitas de estudo, entre outros) de modo a que o processo de avaliação resulte em juízos
abrangentes e os dados recolhidos passem a ser quantitativos e qualitativos.
Assim sendo, o principal objecto desta pesquisa é a análise dos instrumentos de avaliação
usados pelos professores de Geografia da 8ªclasse e a sua relação com o rendimento escolar.
Portanto, este estudo surge da necessidade de se refletir a respeito das estratégias a serem
usadas pelos professores de modo a dar-se o acompanhamento mais adequado aos alunos para a
melhoria do rendimento escolar.
Objectivos e perguntas de pesquisa
O objectivo geral desta pesquisa é analisar os instrumentos da avaliação usados pelos
professores de Geografia da 8ª classe e a sua relação com o rendimento escolar. Especificamente,
o estudo visa:
Identificar os instrumentos da avaliação usados pelos professores no processo de ensino-
aprendizagem;
Determinar a relação que existe entre os instrumentos da avaliação que os professores de
Geografia usam nas salas de aula e o rendimento escolar;
Desenvolver instrumentos de avaliação da disciplina de Geografia que proporcionem o
melhoramento do rendimento escolar dos alunos.
Para o alcance destes objectivos foram formuladas as seguintes perguntas de pesquisa:
1. Quais são os instrumentos da avaliação que os professores usam nas salas de aulas?
10
2. Até que ponto o rendimento escolar do aluno está relacionado com o que é avaliado por
estes instrumentos na sala de aula?
3. Quais são os instrumentos da avaliação que devem ser usados para garantir uma
avaliação efectiva dos alunos?
1. 4 Relevância da pesquisa
Para permitir uma melhor compreensão dos propósitos desta pesquisa torna-se importante
apresentar as motivações que conduziram à escolha do tema ora proposto para o estudo.
Durante o tempo em que a pesquisadora participou na formação em Geografia e do seu
ensino, uma questão sempre a preocupou, o facto de não compreender se todos os professores de
Geografia davam o devido acompanhamento aos alunos, usando de forma adequada os
instrumentos de avaliação para uma melhor aprendizagem e aquisição de bom rendimento por
parte dos alunos.
Desde então, a pesquisadora, como participante do processo de ensino, vem leccionando
a disciplina de Geografia e, progressivamente, em todos níveis de ensino secundário, o que a
permitiu adquirir alguma experiência de que resulta a motivação para a realização deste estudo.
A experiência de trabalho e a frequência ao curso de Mestrado em Desenvolvimento
Curricular e Instrucional na Faculdade de Educação da UEM, permitiu igualmente desenvolver
capacidades e habilidades da pesquisadora para este exercício de reflexão sobre os problemas de
avaliação formativa no processo de ensino-aprendizagem da disciplina de Geografia,
particularmente no Ensino Secundário Geral.
Assim, entende-se que a investigação deste tema poderá ajudar os professores a
compreenderem que a avaliação formativa e o uso dos diferentes instrumentos assumem todo o
seu sentido no âmbito de uma estratégia pedagógica de luta contra o fraco rendimento escolar.
Portanto, o presente estudo surge da necessidade de se reflectir sobre os procedimentos e
estratégias do uso dos instrumentos da avaliação, de modo a se dar o acompanhamento mais
adequado aos alunos para a melhoria do rendimento escolar.
A reflexão incluirá a necessidade de o professor compreender o propósito da avaliação,
ajudando o aluno a reconhecer as suas próprias necessidades, desenvolvendo a consciência da
sua situação escolar e orientando o seu esforço na superação do que não está correndo bem. A
investigação do tema certamente ajudará também a pesquisadora na sua prática docente a usar os
11
instrumentos da avaliação para ajudar os alunos a terem acesso ao conhecimento e sucessos no
processo de ensino.
Metodologia do estudo
Introdução
Esta secção faz a discussão da metodologia usada, desde a descrição e justificação das
opções metodológicas, a escolha da população de estudo e da amostragem; os métodos de
recolha de dados; questões de ética que nortearam a pesquisa, terminando com uma explanação
sobre a forma usada para a análise de dados.
A pesquisa seguiu a abordagem de um estudo de dois casos. De acordo com vários
autores (Cohen, Manion e Morrison, 2000 e Martins, 2006), este tipo de abordagem consiste de
uma investigação empírica que analisa fenómenos ou situações que se procura estudar em
profundidade dentro de um contexto real, buscando compreender a totalidade de uma situação e
dos intervenientes no processo.
Segundo Benbasat (1984) e Yin (2001) o estudo de caso reveste-se de grande importância
por permitir entender o porquê e como, ou entender a natureza da complexidade dos processos
que estão acontecendo. É geralmente escolhido quando se quer obter uma riqueza de dados sobre
o assunto pesquisado. Daí advém a necessidade de triangular múltiplas fontes de evidência para
obter uma visão mais credível da realidade que se procura conhecer.
Porém, a opção pelo estudo de duas escolas, teve também como base o facto de permitir
uma comparação das informações usadas neste estudo, possibilitando, assim, a identificação das
causas do uso não diversificado dos instrumentos de avaliação por parte dos professores. O facto
de ser um estudo orientado para duas escolas, mediante uma análise profunda e exaustiva,
permitiu a penetração na realidade do trabalho dos professores de Geografia, com recurso ao
método qualitativo, não conseguida plenamente pela pesquisa quantitativa, por serem fenómenos
de elevada complexidade e de difícil quantificação.
Descrição e justificação das opções metodológicas
Como se referiu, o estudo assenta na conjugação articulada de métodos de natureza
qualitativa e quantitativa, com vista a alargar a base de sustentação das conclusões a tirar depois
da análise dos dados recolhidos. Tal como Bell (1993), Marconi e Lakatos (2007) e Patton
(1990) afirmam, todos os métodos são importantes e complementares entre si.
12
As abordagens qualitativas e quantitativas não são dicotômicas, pois apesar da
radicalidade de posições defendidas em torno das diferenças, os diversos paradigmas podem
proporcionar uma base de investigação que permite ao investigador assumir um procedimento
caracterizado pela dedução, verificação, enumeração e objectividade.
Segundo Richardson (1999) o método quantitativo garante a precisão dos resultados,
evita distorções de análise e interpretação e possibilita consequentemente, uma margem de
segurança considerável quanto às inferências.
Segundo Bauer e Gaskell (2003) citado por Marconi e Lakatos (2007) a pesquisa
quantitativa lida com números e usa modelos estatísticos para explicar os dados.
A aplicação do método qualitativo justifica-se por ser uma forma adequada para entender
o fenómeno social.
Bauer e Gaskell (2003) defendem que o aspecto qualitativo de uma investigação pode
estar presente até mesmo em informações colhidas por estudos essencialmente quantitativos, não
obstante perderem o seu carácter qualitativo quando são transformados em dados quantificáveis e
na tentativa de se assegurar a exactidão nos planos dos resultados.
Assim sendo, de acordo com os objectivos definidos para este estudo, pode-se notar que
trata-se de uma pesquisa de carácter exploratório uma vez que se aplicou aos fenómenos sociais
que estão em andamento, buscando maior familiaridade com o problema.
A pesquisa qualitativa responde às questões particulares. Em Ciências Sociais, preocupa-
se com um nível de realidade que não pode ser quantificado, ou seja, ela trabalha com o universo
significativo, motivos, aspirações, crenças, valores, atitudes etc, o que corresponde a um esforço
mais profundo das relações, dos processos e dos fenómenos que não podem ser reduzidos à
intervenção de variáveis (Minayo, 2002 citado por Marconi e Lakatos, 2007).
Como forma de responder aos objectivos específicos declarados na secção 1.3, foram
formuladas perguntas de pesquisa, cuja abordagem é mostrada na tabela 3.1.
13
Tabela 3.1: Operacionalização das perguntas de pesquisa
Pergunta de pesquisa Instrumentos
Usados
População
alvo
Tipo de
abordagem
1. Quais são os instrumentos da avaliação
que os professores usam nas salas de
aulas?
Questionário
Entrevista
Professores
Alunos
Quantitativa
Qualitativa
2. Como é que estes instrumentos de
avaliação se adequam ao processo de
ensino e aprendizagem dos alunos?
Questionário
Entrevista
Professores
Quantitativa
Qualitativa
3. Até que ponto o rendimento escolar do
aluno está relacionado com esses
instrumentos?
Quantitativa
Qualitativa
Professores
Quantitativa
Qualitativa
4. Quais são as características que os
instrumentos da avaliação devem ter para
garantir uma avaliação efectiva dos
alunos?
Quantitativa
Qualitativa
Professores
Quantitativa
Qualitativa
Como introduz um novo conteúdo aos
alunos?
Observação Professores
Quantitativa
Qualitativa
Como avalia participação dos alunos e
utiliza os resultados para um ensino
eficiente?
Observação Professores
Alunos
Quantitativa
Qualitativa
Como organiza o diálogo e a consolidação
da matéria?
Observação Professores
Alunos
Quantitativa
Qualitativa
A tabela 3.1 mostra os instrumentos usados para responder às perguntas de pesquisa, a
população inquirida e o tipo de abordagem que permitiu obter os principais pontos de vista dos
inquiridos.
14
População e amostra
O estudo foi realizado na zona urbana da cidade de Maputo, no bairro do Alto-Maé, que
faz parte da área de jurisdição do Município Kampfumo, concretamente no quarteirão 19, nas
escolas Secundárias Francisco Manyanga e Comunitária Santa Ana da Munhuana.
Para a selecção da amostra de uma população é necessário ter-se em consideração as
características da população e o tamanho da amostra (Marconi e Lakatos, 2007). Assim, a
amostra envolvida neste estudo foi constituída por 41 alunos da 8ª classe, dos quais 21 da Escola
Secundária Francisco Manyanga e 20 da Comunitária Santa Ana da Munhuana. Para além disso,
foram também envolvidos 9 professores e 2 directores das respectivas escolas. A tabela 3.2
resume os detalhes da amostra do estudo.
Tabela 3.2: Distribuição da amostra
Escolas Frequência/Percentagem
Alunos Professores Directores
Secundária Francisco Manyanga 21 (51) 6 (64) 1
Comunitária Santa Ana da Munhuana 20 (49) 3 (36) 1
Total 41 (100) 9 (100) 2
A tabela apresenta a distribuição da amostra dos alunos e dos professores das duas
escolas. Assim sendo, 21 alunos, correspondendo a 51,2% do total da amostra, são da Escola
Secundária Francisco Manyanga e 20 (48,7%) são da Escola Comunitária Santa Ana da
Munhuana. Para além disso, 6 professores inquiridos, correspondendo a 63,6%, são da Escola
Secundária Francisco Manyanga e 3 (36,3%) da Escola Comunitária Santa Ana da Munhuana.
Segundo Sousa (2004), quando a população-alvo do estudo possui uma dimensão
relativamente grande, para que os procedimentos da investigação possam ser aplicados a todos os
seus elementos, recorre-se à selecção de uma amostra, possuidora de todas as características da
população, trabalhando-se apenas com os sujeitos dessa amostra.
Para esta pesquisa, a amostra foi seleccionada de acordo com os objectivos da
investigação, privilegiando o método aleatório simples. Segundo Yule e Kendall (1999) citado
15
por Marconi e Lakatos (2007), o método aleatório simples é o que permite que cada elemento da
população tenha a mesma probabilidade de ser escolhido para o estudo.
O uso deste método visa garantir a representatividade da amostra no universo, o que
permitiu extrapolar os resultados obtidos, a partir desta à população dos alunos que frequentam a
8ª classe nas duas escolas. Tendo em conta que a pesquisa tem em vista obter informações com
maior profundidade do pensamento dos professores e dos alunos, o tamanho da amostra foi
relativamente reduzido, comparado a um estudo cuja metodologia privilegiada fosse a
quantitativa.
Deste modo, a amostra na Escola Comunitária Santa Ana da Munhuana, foi de 24
elementos, dos quais três professores e 20 alunos, de uma população de 65, que foi escolhida
mediante listas de chamadas para o sorteio dos números.
Na Escola Secundária Francisco Manyanga a amostra incluiu 21 alunos de uma
população de 55 com idades compreendidas entre os 13 e os 15 anos e 6 professores e os
respectivos directores como mostra a tabela 3.2.
Entretanto, para os professores das duas escolas, foi utilizado o método de selecção da
amostra por conveniência, que consiste num método não probabilístico, o qual inclui os
elementos que à altura da investigação se disponibilizaram a participar na pesquisa, para
perceber as suas opiniões sobre a importância do uso dos instrumentos de avaliação.
De referir que, a maior parte dos alunos inquiridos encontrava-se na faixa etária de 14 a
17 anos. Os que frequentam a 8ª classe com uma idade relativamente avançada, estão numa
situação que pode ser explicada pelo facto de que na escola comunitária são absorvidos alguns
alunos com problemas de vagas nas escolas públicas.
Em resumo, os elementos que constituem a amostra deste estudo são no total 52. Este
estudo utilizou duas fontes principais: fontes primárias, a partir das quais se recolheram dados
através da observação dos participantes nas aulas, questionário aos alunos e entrevistas para os
professores e directores das escolas e fontes secundárias que consistiram na consulta de artigos
científicos.
Instrumentos de recolha de dados
Conforme foi referido na secção 3.2, para este estudo foi usada a combinação de métodos
quantitativos e qualitativos. Para a operacionalização destes métodos, foram usados três tipos de
16
instrumentos de recolha de dados, nomeadamente, (i) questionários para os alunos e professores;
(ii) entrevistas não estruturadas e (iii) ficha de observação às aulas.
Foram usadas entrevistas semiestruturadas, porque permitiram a realização de perguntas
adicionais relacionadas com a ideia central da pesquisa. É de salientar que os instrumentos de
pesquisa utilizados na investigação foram pré-testados por dois delegados de disciplina da escola
Estrela Vermelha antes de serem aplicados aos participantes, a fim de minimizar a ambiguidade
das questões neles constantes e permitir a recolha de dados relevantes para o estudo.
Apresentação e discussão dos resultados
Introdução
Esta secção apresenta e discute os resultados desta pesquisa. Para tal, foi adoptado como
estratégia metodológica de apresentação e discussão dos resultados a separação da secção em
cinco partes. (i) a primeira parte, apresenta e discute os dados resultantes do questionário aos
alunos, (ii) a segunda parte, resultados do questionário aos professores, (iii) a terceira, resultados
da entrevista aos professores, (iv) a quarta, os resultados da entrevista aos Directores das escolas
e (v) a quinta, apresenta e discute os resultados das observações às aulas.
Resultados do questionário aos alunos
Uma avaliação dos resultados do questionário aos alunos revela que os dados analisados
fornecem subsídios em que se justificam a busca de uma nova forma de uso dos instrumentos de
avaliação. Essa nova forma deve alicerçar-se numa reflexão sobre a importância da avaliação e
exigência ao professor no uso adequado dos instrumentos de avaliação para leccionar com a
qualidade desejada.
Respondendo ao questionário, 41 alunos foram envolvidos na pesquisa de campo, dos
quais 20 do sexo feminino e 21 do sexo masculino. Em relação ao perfil sociodemográfico dos
mesmos, constataram-se diferenças nas duas variáveis em estudo entre as duas escolas. Na
Escola Secundária Francisco Manyanga (ESFM) os alunos inquiridos eram, na sua maioria, de
idades entre 12 – 14 anos (71.4%) enquanto na Escola Comunitária Santa Ana da Munhuana,
(ECSAM) eram, na sua maioria, de idades compreendidas entre os 15 a 17 anos.
Quanto ao sexo, a situação é inversa: na Escola Secundária Francisco Manyanga foram
inquiridas mais raparigas (57.1%) e na Escola Comunitária Santa Ana da Munhuana mais
rapazes (60%), como mostra a tabela 4.1.
17
A diferença de idades nas duas escolas pode ser justificada pela falta de vagas na ESFM,
por serem alunos que reprovaram na 8ª classe mais de uma vez e com idade avançada, acabam
indo matricular-se na ECSAM.
Tabela 4.1: Características dos alunos
Escola
Idade Sexo
12-13 14-17 Masculino Feminino
Secundária Francisco Manyanga N 15 6 9 12
% 71.4 28.6 42.9 57.1
Comunitária Santa Ana da Munhuana N 0 20 12 8
% 0.0 100.0 60.0 40.0
Quanto aos antecedentes escolares, verificou-se que na ESFM grande parte dos alunos
inquiridos referiu-se ao ano 2003 (57.1%) e 2002 (33.3%) como sendo o ano em que iniciaram
os seus estudos. Na Escola Comunitária Santa Ana da Munhuana foram mais mencionados
primeiro, o ano de 1999 (35.0%) e, segundo, o ano de 2000 (30.0%).
Em Moçambique, o acesso a educação é um direito de cidadania, mas está dependente
dos recursos económicos, da vontade e da cultura das famílias.
Esta situação condiciona o ingresso tardio na escola e pode ser motivada, pelas condições
sócio económicas dos pais e encarregados de educação, porque em condições normais um aluno
com 17 anos devia estar na 12ª classe.
A análise das reprovações e do rendimento escolar é importante, pois estes fenómenos
estão fortemente ligados à falta de acompanhamento dos alunos por parte dos pais e
encarregados de educação, à dedicação dos alunos e o uso não adequado dos instrumentos de
avaliação pelos professores.
18
Tabela 4. 2: Frequência das reprovações
Quantas vezes reprovou?
Em que classe
reprovou?
Uma
vez
Duas
vezes
Mais
de
duas
vezes Nenhuma
6a
Classe
7a
Classe
8a
Classe
Escola
Secundária
Francisco
Manyanga
N 1 0 0 20 0 0 1
% 4.8% 0.0% 0.0% 95.2% 0.0% 0.0% 100.0%
Comunitária
Santa Ana da
Munhuana
N 12 3 1 4 2 1 13
% 60.0% 15.0% 5.0% 20.0% 12.5% 6.3% 81.3%
Reconhecida a relação causa – efeito existente entre o insucesso escolar e o uso não
adequado dos instrumentos de avaliação, procurou-se saber seguidamente a profissão dos pais e
o meio familiar em que o aluno vive. Dos 41 alunos que responderam ao questionário, 50%
afirmou que as mães eram domésticas, 35.7% disseram que os pais eram comerciantes, 14%
disseram que os pais eram professores, 11.9% afirmou que os pais eram contabilistas.
Se considerarmos que uma mãe que estudou e trabalha está sempre ocupada e que mesmo
assim arranja um tempo para saber da situação escolar do filho, pode ajudar nos trabalhos de
casa e se o seu filho diz que tem actividades em grupo ou extra-escolares ela, como mãe
esclarecida, pode entender, diferentemente duma mãe doméstica não esclarecida ou que não
estudou, e que pode não dar o devido acompanhamento escolar ao seu filho, por não conhecer a
importância da educação. Preocupa-se apenas em mandar o filho ou a filha realizar trabalhos
caseiros do que rever a matéria, e fazer o TPC influenciando negativamente no rendimento
escolar.
As dificuldades financeiras das famílias, limitam também a aquisição do material escolar.
Neste contexto 50% dos alunos, por terem mães domésticas que não lhes dão o devido
acompanhamento, associado aos problemas de carência de livros, têm necessidade de aprender e
as condições adversas a que estão submetidos não propiciam um bom rendimento escolar.
19
Outro elemento que nos permitiu avaliar o contexto do rendimento escolar foi saber quais
eram as outras fontes que utilizavam para estudar a disciplina, para além dos conteúdos que o
professor dava na sala e o que faziam nos tempos livres. Através desta análise, pode-se averiguar
a percentagem de alunos que faziam a revisão da matéria e visitavam a biblioteca para o
melhoramento do seu rendimento escolar. Assim, 69 % disseram que faziam pesquisas na
Internet e visitavam a biblioteca, enquanto 28.5% responderam que estudavam só com
apontamentos e 2.3 % não respondeu à pergunta.
Os que afirmaram que estudavam só com apontamentos, explicam que não adianta ir à
biblioteca porque os professores obrigam-os a pôr nas provas as respostas exactamente como
lhes ensinam, não podem trazer suas ideias e por isso devem decorar as palavras dos professores.
Sabe-se que no ensino reprodutivo, com predomínio de testes escritos, a avaliação requer
memorização por parte do aluno.
De acordo com Duarte (2007) verifica-se ausência de um espaço para a criatividade do
aluno, porque apenas se exige que ele reproduza o que aprendeu, faz com que o processo de
ensino-aprendizagem assuma também um carácter enciclopédico.
Conclusões
1. Em relação aos instrumentos de avaliação usados pelos professores no processo de
ensino-aprendizagem
Os resultados da pesquisa mostram que, nas duas escolas estudadas, são usados
frequentemente dois instrumentos, o trabalho para casa e o teste escrito. O tipo de avaliação que
os professores mais privilegiam é o teste escrito (77,8%) enquanto 55,6% dos professores dão
trabalho para casa e a sua devida correcção todos os dias, contra 44,4% que realizam de 2 a 3
vezes por semana.
Desses dois instrumentos que os professores usam, o antigo Regulamento da Avaliação
no seu artigo 5 preconizava a realização somente, da avaliação sumativa distanciando-se da
formativa, valorizando o teste escrito que atribui uma nota para obtenção da classificação final
do aluno.
Segundo Fria e Takahashi (2002) o teste escrito, muitas vezes não pode avaliar o aluno,
pois o mesmo pode não ter entendido a matéria e apenas ter decorado o conteúdo para a
20
avaliação na sua véspera. Num ensino reprodutivo, com predomínio de testes escritos, a
avaliação requer memorização por parte do aluno.
Como afirma Osório (2008), os instrumentos de avaliação são meios de controlo, feitos
através de atribuição de pontos ou notas, para que os alunos realizem as tarefas e tenham
comportamentos esperados que o professor e a instituição desejam. Este mesmo autor reitera a
necessidade dos professores darem muitas tarefas de reforço e verificarem sistematicamente o
desempenho dos alunos nas actividades, contribuindo para a melhoria do rendimento escolar.
No entanto, como a literatura recomendada, para um ensino de qualidade, a avaliação
deve ser utilizada com apoio a múltiplos instrumentos de recolha de informações, sempre de
acordo com as características do plano de aula, isto é, dos objectivos que se apresentam junto ao
aluno. Assim, conforme o tipo de objectivo, podem ser utilizados trabalhos em grupos e
individuais, provas escritas, observação de cadernos, realização de exercícios, realização de
trabalhos para casa e a participação nas aulas.
2. Em relação à adequação dos instrumentos de avaliação ao processo de ensino-
aprendizagem
Os resultados do estudo permitiram constatar que:
Os instrumentos de avaliação no processo de ensino-aprendizagem ajudam a conhecer o
aluno, a melhorar a prática docente e a identificar as estratégias para resolver as
dificuldades que o aluno pode enfrentar;
Estimulam o estudo regular e sistemático, tanto individual como colectivo;
Fornecem ao aluno e aos pais e encarregado de educação, ao longo do processo de
ensino-aprendizagem, informações qualitativas e quantitativas do desempenho do aluno e
possibilitam ao professor reflectir criteriosamente sobre o seu desempenho e introduzem
melhorias que se revelarem pertinentes.
Embora o professor reconheça a importância do uso dos instrumentos de avaliação, o
mesmo depara-se com algumas dificuldades pedagógicas. Destes se destacam a falta de material
didáctico, o desinteresse por parte dos alunos, a existência de turmas numerosas e um rácio
professor-aluno muito elevado.
21
Este último aspecto não permite o professor: (i) conhecer cada aluno (não sabe quem são
os indivíduos que tem na sala); (ii) identificar as dificuldades de cada aluno ou dos alunos mais
fracos e (iii) organizar um programa de acompanhamento individualizado para os casos dos
alunos com dificuldades de aprendizagem.
Os resultados do estudo mostram também que, na prática, os professores não parecem
estar preocupados com o uso de variados instrumentos de avaliação. É neste contexto que
somente 11,1% dos professores observam os cadernos e 22,2 % fazem comentários das tarefas
dadas aos alunos como mostrou a tabela 4.12.
Ao longo do processo de ensino-aprendizagem o professor deve registar toda a
informação sobre a avaliação, tanto formativa como a sumativa, para acompanhar o desempenho
dos alunos, a partir das actividades desenvolvidas durante todo o trabalho pedagógico,
observando os cadernos, controlando o TPC, a participação dos alunos nas aulas e trabalho em
grupo, para melhor compreender o nível de aprendizagem.
Todavia os professores das escolas em estudo, usam os instrumentos de avaliação com
objectivo de atribuir uma nota ao aluno, nota esta que deve constar nos mapas de avaliação que
são controlados pelo delegado de disciplina, pelo director de turma e pelo director de escola.
3. Relativamente à ligação entre o rendimento escolar do aluno e os instrumentos de avaliação
que os professores de Geografia usam nas salas de aula
Os resultados do estudo mostram que 77,8% dos professores privilegiam o teste escrito,
os outros instrumentos não influenciam na passagem do aluno. O não uso dos outros
instrumentos de avaliação, tais como trabalhos em grupos e individuais, provas orais, seminários,
observação de cadernos, realização de exercícios em classe ou em casa e observação dos alunos
em classe, que podiam acompanhar o progresso e minimizar as dificuldades dos alunos,
contribuem para o baixo rendimento escolar e, consequentemente, para baixos índices de
aprovação que se verificam na 8ª classe.
Portanto, a relação entre o não uso dos instrumentos de avaliação e o rendimento escolar
é muito forte, porque quem fica prejudicado neste processo é o aluno que reprova no fim do ano,
devido provavelmente à negligência do professor que não usou os instrumentos devidos para o
acompanhamento do aluno ao longo do processo ou a falta de conhecimentos práticos para o uso
de variados instrumentos.
22
4. Em relação aos instrumentos de avaliação que garantam uma avaliação efectiva para o
melhoramento do rendimento escolar
O estudo foi realizado no sentido de propor instrumentos da avaliação da disciplina de
Geografia que proporcionem o melhoramento no rendimento escolar
Assim, os instrumentos de avaliação que podem ser usados na disciplina de Geografia
para o melhoramento do rendimento escolar são: As provas escritas, TPC, a participação do
aluno nas aulas e observação dos cadernos, mas mediante atribuição de nota para todos os
instrumentos no sentido de ajudar o aluno a melhorar o rendimento escolar de acordo com o
novo Regulamento de Avaliação.
Para além dos aspectos mencionados e que se referem as principais perguntas de
pesquisa, foi necessário analisar as condições físicas, logísticas e pedagógicas para o
melhoramento do rendimento escolar dos alunos. Assim sendo:
(i) Em relação às condições físicas
Nas duas escolas, são em geral deficientes as condições físicas para leccionar as aulas
com a qualidade desejada. As escolas apresentam as suas infraestruturas degradadas,
principalmente as casas de banho.
As escolas não têm postos de socorro para atendimento de alunos em caso de
necessidade. No caso de doenças que aconteçam na escola, são várias as iniciativas tomadas que
vão desde o acompanhamento ao banco de socorros até chamar telefonicamente ao encarregado
de educação, entre outras.
Verifica-se que a Escola Secundária Francisco Manyanga leva vantagem quanto ao
equipamento pois, para além de ter as salas iluminadas, tem carteiras em número suficiente e os
alunos ficam acomodados. Esta condição contribui para altos índices de aproveitamento escolar.
Na Escola Comunitária a situação é diferente: não existem carteiras suficientes e
inclusive o professor não tem uma mesa onde colocar o seu material. Cada sala tem um número
de carteiras duas vezes inferior ao número de alunos o que conduz à situação de terem de sentar
numa carteira singular dois alunos apertados, de tal maneira que podem ter dificuldades para
escrever.
Esta situação é constrangedora e contribui negativamente para o bom rendimento escolar
pois, a caligrafia é péssima, os alunos estão muitas vezes distraídos, sempre a conversar uns com
23
os outros e às vezes fazem barulho que interfere no processo de aprendizagem e daíi apontam-se
as condições logísticas como um dos factores para o baixo rendimento escolar.
(ii) Em relação às condições pedagógicas
No que diz respeito à formação dos professores, têm o nível superior, mas necessitam de
capacitação em matéria de avaliação. A situação da falta de capacitação reflecte-se no seu
desempenho e, consequentemente, no rendimento dos alunos, especialmente na qualidade de
ensino ministrado que é provado não ser dos melhores a nível do país, em geral, e das duas
escolas em estudo, particularmente.
No que diz respeito ao material didáctico, constata-se que as escolas não têm livros
suficientes para todos os alunos. Na Escola Comunitária Santa Ana da Munhuana em cada turma
existem no mínimo 65 alunos, o que dificulta o processo de controlo e acompanhamento
individual dos alunos, podendo não ser fácil prestar mais atenção aos alunos com mais
dificuldades instrucionais. A acrescer estas dificuldades, os professores não têm utilizado os
quadros para sistematizar os conteúdos abordados, limitando-se a ditar apontamentos e a dar
aulas expositivas.
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26
Uma contribuição para a consciencialização ambiental no ensino de Geografia – um estudo
de caso na Escola Secundária Ndambine 2000 (2010 a 2012)3
André Rafael Bila4
Resumo
Este trabalho enquadra-se no âmbito didáctico e pretende-se com o mesmo analisar os métodos que
contribuem para a consciencialização ambiental no Ensino de Geografia. Sendo assim, faz-se a
identificação e análise dos métodos e meios de ensino para a consciencialização ambiental e as formas de
avaliação na Escola Secundária Ndambine 2000. O Plano Curricular do Ensino Secundário Geral e os
programas de ensino de Geografia agregam conteúdos e metodologias que visam consciencializar o aluno.
Neste contexto, sendo que as comunidades moçambicanas vivem com diversificados problemas, há
necessidade de o ensino fornecer soluções para a formação do cidadão. Durante a pesquisa, constatou-se
que a consciencialização ambiental é abordada em todos as classes, da 8ª a 10ª classes e os assuntos são
desenvolvidos de forma crescente, isto é, mais evoluídos na 10ª classe, onde se abordam aspectos físico-
naturais e socioeconómicos de Moçambique. Entretanto, na leccionação os professores aplicam métodos
diversificados, com maior destaque para a elaboração conjunta acompanhada de exposição oral assim
como métodos por resolução de problemas e cooperativos nas aulas práticas. Nas aulas de Geografia, na
escola observada, não são usados meios de ensino mais modernizados, tais como televisão, DVDs,
internet, data show, cartazes ilustrativos, fotografias, entre outros que seriam relevantes para a
consciencialização ambiental. Os professores não realizam palestras nem intercâmbio entre turmas ou
escolas para a consciencialização ambiental.
Palavras-chave: Ensino de Geografia; Consciencialização; Métodos de ensino; Educação ambiental;
Ensino Secundário Geral.
Introdução
As aulas de Geografia constituem uma forma abrangente de educação, que se propõe
atingir aos alunos, através de um processo pedagógico participativo permanente que procura
formar no educando uma consciência crítica sobre a problemática ambiental, compreendendo-se
como crítica a capacidade de captar a génese e a evolução de problemas ambientais.
A inclusão da consciencialização ambiental no ensino de Geografia tem por objectivo
promover acções e valores que preservem o ambiente natural e o modo de organização social,
constituindo uma maneira de integrar o conhecimento geográfico para possíveis resoluções de
problemas diários, no que se refere às práticas comunitárias e sua contribuição para o modo de
3 Este artigo resulta da Monografia Científica apresentada pelo autor para a conclusão do curso de Licenciatura em
Ensino de Geografia na UP-Gaza. 4 Licenciado em Ensino de Geografia na UP-Gaza.
27
vida das comunidades e num ambiente harmonioso com a Natureza. Nesta perspectiva, este
trabalho faz uma análise dos métodos aplicados e que possam contribuir para a
consciencialização ambiental no ensino de Geografia. Para a sua realização recorreu-se à
pesquisa bibliográfica, entrevistas aos professores que leccionam a disciplina de Geografia na
escola pesquisada e a observação directa de aulas. Os progressos na modificação das atitudes e
do comportamento dos seres humanos dependem fundamentalmente da instrução e sensibilização
dos cidadãos, e é na educação que reside uma das principais possibilidades para o problema ser
superado.
Actualmente, verifica-se que as comunidades, quer urbanas ou rurais, vivem com
problemas tais como erosão, má gestão de resíduos, formas inadequadas de exploração e
utilização dos recursos naturais, quer renováveis ou não. Estes problemas têm um claro
enquadramento em várias unidades temáticas de Geografia. É necessário que, mais do que
informações e conceitos, os actores do processo de ensino-aprendizagem (PEA) de Geografia,
sejam sujeitos activos, críticos e responsáveis em relação aos problemas ambientais. Desta
forma, coloca-se a seguinte questão: quais as metodologias a serem utilizadas no ensino de
Geografia para a consciencialização ambiental? Em busca de resposta a esta questão de
pesquisa, procura-se analisar metodologias apropriadas para desenvolver a consciencialização
ambiental no ensino de Geografia, descrever os métodos usados na leccionação de Geografia que
contribuam para a consciencialização ambiental; identificar as actividades a desenvolver para
consciencialização ambiental no ensino de Geografia; identificar os meios que podem ser usados
nas aulas de Geografia para a consciencialização ambiental.
Em função da crescente consciencialização sobre a importância da preservação
ambiental, o aluno terá oportunidade de observar, analisar, descrever os problemas, discutir e
propor medidas para superação, criando desde modo uma consciência prática na conservação e
protecção dos recursos. Há necessidade de criar mecanismos nas aulas de Geografia para que
ocorra uma mudança de comportamento e atitude social face a relação do Homem com o seu
meio, sendo que o trabalho de consciencialização ambiental deve contar com actividades que
envolvam o aluno em situações de aprendizagem mútua.
O principal objectivo de se trabalhar o tema no ensino de Geografia, é de contribuir na
formação de cidadãos conscientes que possam actuar na realidade sócio ambiental de forma
comprometida com a vida em suas várias dimensões. Para tanto, torna-se importante que a escola
28
proponha actividades, para além de informações e conceitos, trabalhando a formação de valores
e mudanças de atitudes em relação à vida.
Metodologia de trabalho
Para tornar este trabalho uma realidade, aplicou-se a seguinte metodologia: pesquisa
bibliográfica e documental, observação directa e entrevistas.
Na pesquisa bibliográfica e documental, fez-se leitura e análise de obras de diversos
autores que auxiliaram a construção do quadro teórico e aquisição de outras informações
científicas sobre o tema. Nesta pesquisa bibliográfica procurou-se buscar informações sobre
estudos realizados acerca do tema noutros locais. Na pesquisa documental, fez-se a leitura e
análise de documentos do Ministério da Educação (MEC) e do Instituto Nacional de Educação
(INDE).
Na observação directa, foram observadas 8 aulas de Geografia com o objectivo de
identificar os métodos aplicados nas aulas de Geografia para a consciencialização ambiental,
tendo sido utilizada uma ficha de observação de aulas. Foi usada a observação directa não
participante, onde o pesquisador não estava inserido no grupo dos investigados. Foram
observadas as aulas de Geografia na escola onde decorreu a pesquisa, para obtenção das
informações da realidade, bem como aliar a teoria e a prática.
Esta observação, usou-se todo universo como amostra, ou seja, as turmas que possuem a
disciplina de Geografia na escola na décima classe, num total de 6 (seis) turmas compostas por
345 alunos, sendo que a média é de 60 alunos por turma. Nas aulas procurou-se observar todos
os aspectos pedagógicos dos planos de aulas, tendo sido preenchidas fichas de observação para a
identificação das potencialidades educativas nos domínios cognitivo, afectivo e psicomotor e,
teve-se a possibilidade de se observar os métodos e materiais para condução da aula que possam
consciencializar o aluno sobre a conservação e preservação do meio ambiente.
Na recolha de dados, foram ainda realizadas entrevistas aos 2 professores que leccionam
a disciplina de Geografia, orientadas por perguntas que foram previamente elaboradas.
Para a realização deste estudo, foi aplicado o método hipotético-indutivo a partir do qual
fez-se uma inferência indutiva dos dados recolhidos, o que serviu de teste a predição da
ocorrência dos fenómenos abrangidos pelas hipóteses. A partir dos resultados da pesquisa fez-se
uma generalização a nível da Escola.
29
Sendo uma pesquisa descritiva os factos observados e registados, foram analisados,
classificados e interpretados, sem interferência do pesquisador.
No estudo descrevem-se as aulas observadas e as metodologias de ensino para a
consciencialização ambiental na disciplina de Geografia.
Mediante as discussões apresentadas, pode-se entender que consciencialização ambiental
são os processos por meio dos quais o indivíduo e a colectividade constroem valores sociais,
conhecimentos, habilidades, atitudes, isto é, adquirem competências voltadas para a conservação
do meio ambiente, bem de uso comum, essencialmente na tentativa de busca de uma boa
qualidade de vida e sua sustentabilidade.
Consciencialização ambiental no Ensino de Geografia em Moçambique
Dada a necessidade de formar o cidadão consciente, capaz de agir no seu espaço de vida,
bem como entendê-lo em processos interactivos e interdisciplinares, o Governo moçambicano
definiu o projecto político pedagógico para a disciplina de Geografia. Nesta óptica, procurou-se
perceber o que está previsto em relação à consciencialização ambiental. Assim, descrevem-se as
competências, objectivos, conteúdos e estratégias de implementação para o 1°ciclo do Ensino
Secundário Geral.
PolÍtica moçambicana sobre consciencialização ambiental no Ensino de Geografia
Moçambique possui um projecto político pedagógico sobre a consciencialização
ambiental no ensino de Geografia. O Governo moçambicano aprovou na XXI Sessão Ordinária
do Conselho de Ministros, aos 24/11/09, as Estratégias do Ensino Secundário Geral 2009 – 2015,
na qual se afirma que o Ensino Secundário tem efeitos multiplicadores para o desenvolvimento
socioeconómico, combate à pobreza e melhoria das condições de vida dos cidadãos e que os
grandes desafios da globalização e da integração regional exigem a formação de jovens e adultos
que possam interagir num mundo cada vez mais interdependente. Os desafios da globalização
exigem um ensino geral que promova uma educação de qualidade, orientada para os valores
universais como o respeito pela democracia, pelos direitos humanos e pelo meio ambiente.
(PCESG, 2007) Este documento considera que o currículo traduz as aspirações da sociedade
moçambicana no sentido de formar cidadãos responsáveis, activos, participativos e
empreendedores. Afirma ainda que, a preparação do jovem passa pelo desenvolvimento de
30
competências orientadas para a sua realização pessoal, para sua integração bem-sucedida numa
sociedade em mudanças rápidas e para as novas dinâmicas (INDE/MINED, 2007).
Propõe ainda que a abordagem de ensino deverá estar orientada para a solução dos
problemas da comunidade, através da ligação entre os conteúdos veiculados pelo currículo e a
sua aplicação em situações concretas da vida, na família e na comunidade (INDE/MINED,
2007:16). Vendo a concepção do PCESG, percebe-se claramente uma real preocupação com a
formação de um homem interventivo na comunidade em diversas áreas, incluindo a componente
ambiental, que tem sido uma grande preocupação do Homem actual devido as formas de
utilização dos recursos disponíveis.
31
Neste contexto, considera-se que o currículo torna-se realidade quando os professores o
implementam com alunos reais, numa sala de aula real, isto é, quando traduzem o currículo
escrito em práticas na sala de aula (INDE/MINED, 2007: 89). Para tal, foram elaborados
programas de ensino e estes, por sua vez, integram competências, objectivos conteúdos e
metodologias em matéria da educação ambiental, grande preocupação do Homem actual devido
as formas de utilização dos recursos disponíveis.
Métodos aplicados na leccionação de Geografia que contribuem para a
consciencialização ambiental
No contexto da pesquisa foi feita uma descrição das aulas observadas, procurando-se
entender os processos usados para a consciencialização ambiental no ensino de Geografia. Nesta
pesquisa, constatou-se que os conteúdos que versam sobre a consciencialização ambiental
apresentam um desenvolvimento em espiral na forma de abordagem. A 10ª classe aborda
aspectos físicos e económicos, preocupando-se em localizar, avaliar, descrever e sintetizar os
fenómenos e factos, fazendo uma relação entre o Homem e o seu meio, enquanto a 8ªclasse
aborda aspectos físico-geográficos e a 9ªclasse versa sobre aspectos económico-geográficos.
Após esta análise dos programas de ensino, foi realizada a pesquisa nos planos de aula dos
professores e as respectivas entrevistas onde se observou o tratamento de temas ambientais em
cada conteúdo e as formas de reacção dos alunos em relação aos conteúdos abordados para o
desenvolvimento das competências propostas nos programas de ensino de Geografia.
Aulas observadas em Ndambine
Nas aulas observadas particularmente do professor “M”, 10ª classe, desenvolveu um
entrosamento de ideias, onde se formavam conceitos construídos em conjunto com os alunos,
através de aulas interactivas.
Durante o decurso das aulas os alunos efectuavam questionários para a percepção de
certos assuntos. Por exemplo: no decurso da aula sobre os transportes e comunicações, na qual o
professor “M” observado na turma C1, 10ª classe previa também a identificação dos problemas
ambientais, começou a aula com a correcção do trabalho de casa e, apresentou o novo tema e
depois solicitou aos alunos para que fizessem a identificação dos tipos de transportes, vantagens
dos diferentes tipos de transportes e, por fim, a identificação dos problemas ambientais derivados
dos meios de transporte. Estes fizeram com um domínio sobre os transportes, mas também
32
mostraram-se preocupados em querer perceber os problemas que advêm das comunicações sem
incluir os transportes.
Os questionários criavam na aula debate e, para além da elaboração conjunta, o professor
recorria a exposição para sintetizar a aula ou esclarecimento de dúvidas. Nesta aula, não houve
registo de apontamento, somente discussão sobre os transportes e realização dos exercícios de
aplicação. Teoricamente, os alunos demonstravam domínio e preocupação sobre a matéria da
educação ambiental, criando uma afectividade sobre o meio ambiente.
Estas formas de consciencialização ou de tratamento dos temas ambientais no ensino de
Geografia são também sugeridas pelos programas de ensino, onde realçam que o professor no
dia-a-dia tem que debater com seus alunos os principais problemas ambientais, desenvolvendo
neles uma atitude crítica e responsável sobre a necessidade de protecção e conservação da
Natureza e uma melhor qualidade de vida na terra. Assim, podem ser tratados temas como
queimadas descontroladas, poluição, erosão, processo de desertificação, saneamento do meio
entre outros.
Analisando a aula observada sobre os transportes, percebeu-se que o professor “M”,
embora aplique maioritariamente métodos de elaboração conjunta e exposição, trata com clareza
a problemática ambiental, e na discussão, os alunos identificaram a poluição atmosférica,
compactação do solo, erosão, desflorestamento na construção de vias de acesso, poluição sonora,
contaminação da água. O professor buscava exemplos da realidade mais próxima do aluno,
problemas que afectam directamente a escola assim como a comunidade, exemplificou com
áreas de ravinas nas proximidades da escola.
Além da observação, questionados sobre os métodos que são mais aplicáveis para a
consciencialização ambiental, os professores afirmam que aplicam métodos interactivos,
observação directa e em alguns casos, o trabalho de campo para observação directa dos
problemas ambientais.
Analisando esta resposta dada pelos entrevistados, e o que foi observado, sobre os
métodos interactivos, percebe-se que se referem a elaboração conjunta, porque os alunos
interagiam durante as aulas. Estas formas de aprendizagem podem-se relacionar com as que são
descritas por LEBRUM (2002: 137), citando o modelo de Diana Laureland onde descreve o
processo de aprendizagem como sendo um diálogo entre o professor e o aluno, caracterizando
conhecimentos como sendo discursivos, adaptativos, interactivos e reflexivos.
33
As características descritas por LEBRUM (op. cit), foram notórias nas aulas observadas,
onde cada interveniente tornava acessíveis as suas ideias aos colegas e os professores forneciam
um meio para que os alunos pudessem agir, demonstrando deste modo o seu carácter discursivo.
Esta característica, também foi observada na aula sobre Silvicultura.
Nas aulas sobre a pesca, foram observadas as aulas do professor “N” onde os alunos
demonstraram conhecimentos sobre o assunto tratado ao explicar a importância económica da
pesca, tipos de pesca, caracterização dos tipos de pesca e, por fim, discutiu-se o impacto
ambiental dos dois tipos de pesca. Neste tema sobre o impacto ambiental da pesca houve
predomínio da exposição e no fim da aula o professor “N” ditou apontamento e orientou
exercícios de aplicação.
Os conhecimentos eram adaptativos visto que havia a valorização das ideias dos alunos à
luz dos objectivos a atingir a partir das interacções precedentes. Os professores observados “N” e
“M”, a partir das respostas e ideias que eram dadas pelos alunos, relacionavam com a realidade
da comunidade onde a escola está inserida. A exposição nestas aulas é feita para sintetizar a aula.
A interactividade dos conhecimentos consistiu em alunos trabalharem para atingir os objectivos
prescritos nas tarefas fornecidas pelo professor e reflexivos na medida em que os professores
encorajavam a leitura e a interligação com as experiencias vividas.
As características mencionadas, para LEBRUM (2002), são operacionais através da
utilização de métodos pedagógicos activos, que é um processo activo e construtivo através do
qual o aluno manipula através das suas estratégias em recursos cognitivos disponíveis de maneira
a criar novos conhecimentos ao extrair a informação do meio e integrar na sua estrutura da
informação já presente em memória. O predomínio do discurso na aula, a interactividade criada,
a valorização dos conhecimentos dos alunos (carácter adaptativo) e a reflexão, clarificavam a
pedagogia activa na construção do conhecimento, e neste contexto a consciencialização do aluno
a partir do ensino de Geografia. Esta forma de aprendizagem, foi notória em todas as aulas
observadas dos dois professores.
Avaliação da componente ambiental no ensino de Geografia na escola pesquisada
A avaliação da componente ambiental, não é feita de forma particularizada, durante a
aula, são realizadas as OA (outras avaliações), onde o professor avalia a participação dos alunos
diariamente, apresentação dos trabalhos de casa incluindo as perguntas que versam sobre o meio
ambiente. Fora desta forma de avaliação, no ensino de Geografia realizam-se durante o trimestre
34
dois TE (testes escritos), nos quais as perguntas avaliam a percepção dos problemas ambientais e
as possíveis formas de minimização ou resolução.
Sendo que os temas da educação ambiental, para além de proporcionar conhecimentos e
atitudes, agregam também habilidades, as duas formas de avaliação (TE e OA) não são
suficientes para avaliar a componente ambiental, visto que os testes são ideais para avaliar
conhecimentos e não habilidades e comportamento.
Poder-se-ia avaliar o comportamento dos alunos na escola em várias situações, tais como:
conservação dos espaços verdes da escola, gestão de resíduos no recinto escolar, gestão da água,
uso de sanitários, entre outras formas da prática do quotidiano do aluno na escola.
A aprendizagem por resolução de problemas consiste em esclarecimento particular acerca
das tarefas e situações de ensino e caracteriza-se pelo papel do contexto da aprendizagem, do
meio e das experiências concretas, tomada de consciência, reformulação, aplicação de
competências de alto nível (LEBRUM, 2002:153).
Sendo que na escola onde decorreu a pesquisa, existem acções concretas para a resolução
dos problemas na escola, tornando as acções de consciencialização ambiental claras, onde
destaca-se o plantio de árvores de sombra, sebes vivas, relva, horta escolar e utilização correcta
dos colectores de lixo, evidenciado deste modo o método aprendizagem por resolução de
problema.
Este método (aprendizagem por resolução de problema), também é evidenciado pela
MINED nos programas de ensino de Geografia, sugerindo que se oriente o aluno para a
elaboração de planos de acção para a resolução de problemas que ele vive no seu dia-a-dia, tais
como conservação e preservação do ambiente, plantio de árvores, manutenção dos jardins,
recolha de lixo entre outros e garantir a sua implementação (INDE/MINED, 2010).
35
Figura 1: Relva para a protecção da erosão do solo na Escola onde decorreu a pesquisa.
Fonte: Autor, 2012
A figura 1 mostra a cobertura vegetal feita por relva e árvores de sombra no recinto
escolar. O recinto apresenta-se limpo, sem dispersão de papel ou outros resíduos e as árvores são
podadas pelos trabalhadores e os alunos têm a obrigação de proteger e conservar os espaços
verdes. A cobertura vegetal também é estimulada pelo projecto político denominado “Uma
criança uma planta”. Nesta política, os alunos são orientados a trazerem mudas para plantarem e
cada aluno tem obrigação de cuidar da mesma.
Ao analisar as entrevistas feitas aos professores N e M percebe-se que além de tratarem
assuntos na sala de aulas, trabalham com a temática de forma vivenciada e contextualizada. Os
professores afirmam que a consciencialização ambiental deve ser feita de forma prática e
criativa, consideram que a informação é o principal caminho para a consciencialização, onde eles
apontam que as palestras e campanhas são formas eficientes de se trabalhar com a temática
ambiental.
O professor “M” disse o seguinte: “para além de discussão na sala de aulas dos temas
ambientais, planificamos actividades do sábado para podarmos a relva, as sebes vivas que
36
vedam a escola, as árvores. Estas actividades contam com a ajuda do guarda e outros
professores.”
Existe contextualização dos conteúdos com a vida prática do aluno, isto é, a vida
quotidiana, social, onde os professores identificavam os problemas próximos do aluno e
colocavam em evidência nas questões de discussão. As competências eram adaptadas para
identificação das causas dos problemas ambientais e possíveis soluções.
Olhando para estas acções, elas enquadram-se no que está previsto nos programas de
ensino, que enaltecem que o aluno poderá ser incentivado a desenvolver actividades práticas com
vista a criar hábitos de protecção e conservação dos recursos naturais do meio circundante.
Neste sentido, podem-se promover acções de conservação de resíduos tais como: papel,
garrafas, plásticos e latas; plantio de árvores; limpeza do recinto escolar, entre outros. O
professor orienta a identificação e discussão das formas adequadas para a preservação do meio
ambiente. Os educandos trazem material local para a vedação da escola e dos lugares em
protecção para a conservação da relva, impedimento de passagem de veículos, chapas com
inscrições de parques de estacionamento.
O professor “N” na entrevista afirmou que: “o material que usamos para vedar a escola,
a relva para protecção da erosão do solo, o parque de estacionamento são actividades que
desenvolvemos com os alunos e as aulas de campo efectuamos aqui na comunidade e, pelo
menos duas turmas já realizaram no universo de 6 turmas da turma da 10ª classe ”.
37
Figura 2: Barreira para proteger a cobertura vegetal (espaços verdes)
Fonte: Autor, 2012
A figura 2 ilustra as acções desencadeadas pelos alunos para protecção e conservação do
pátio escolar. As estacas visualizadas pela imagem foram trazidas pelos alunos e professores para
protegerem a relva, visto que estas chapas enumeradas são reservadas ao estacionamento de
veículos. Segundo os professores, os automobilistas invadiam o espaço relvado, o que lhes levou
a planificarem a colocação destas barreiras e chapas para indicar o parqueamento de veículos.
Nas entrevistas feitas aos professores sobre a consciencialização ambiental, afirmaram
que para tornar mais claro os problemas ambientais, envolvem alunos na resolução de problemas
concretos na escola, como erosão, formas de conservação dos resíduos no recinto escolar,
participação dos alunos nas palestras sobre ambiente, como dia 5 de Junho.
Para a conservação dos resíduos, os alunos utilizam colectores de lixo, caixas que pelo
seu aspecto físico foram usadas nas Assembleias de Voto, demonstrando deste modo habilidades
para reutilização dos recursos disponíveis, uma atitude positiva para minimizar o problema de
dispersão dos resíduos sólidos no pátio escola. Os professores nas suas aulas incentivam a
utilização correcta dos mesmos.
38
Aulas de campo no ensino de Geografia em Ndambine 2000
Sobres as aulas de campo, os professores afirmam que realizam na comunidade onde a
escola está inserida, porque realizar num local distante ia acarretar custos e a escola não dispõe
de recursos financeiros para o efeito.
Nestas saídas, afirmam que observam os seguintes problemas: erosão pluvial; erosão
eólica; construção em lugares impróprios (lugares íngremes, nas encostas das dunas, nas bacias
de acumulação); acumulação dos resíduos sólidos nas ruas, eliminação da vegetação natural
entre outros.
Embora os alunos tenham visto e reconhecido estes problemas, os professores realçam
que nunca fizeram nada para ajudar esta comunidade, limitando-se em jornadas de limpeza na
escola. O professor “N” afirma o seguinte: “verificamos problemas diversificados, mas nunca
planificamos nenhuma actividade com a comunidade, mas sim exemplificamos na aula com base
no que foi observado nas aulas de campo”.
Mateial didáctico usado nas aulas de Geografia para a consciencialização ambiental
A nível do material didáctico utilizado no ensino de Geografia, a escola dispõe do livro
do aluno, embora em número insuficiente, atlas geográfico, alguns mapas temáticos e fichas de
apoio elaboradas pelos professores. Com este material, os alunos procuram desenvolver as suas
competências, sob mediação do professor e realizando exercícios de aplicação Estas actividades
levam o aluno a uma análise dos problemas, assim como identificação de formas de utilização e
conservação dos recursos naturais.
Fora dos meios disponíveis, os professores consideram relevante para a
consciencialização ambiental no ensino de Geografia, a utilização de DVDs para a exibição de
problemas ambientais em imagens, cartazes, fotografias, data show e a internet.
A utilização de tecnologias de informação e comunicação para o ensino, também são
sustentadas pelo MINED, afirmando que o professor deve promover debates sobre assuntos da
actualidade, onde o aluno poderá fazer uma comparação analítica e apresentar sugestões para a
melhoria da qualidade de vida da sua família e da comunidade tendo como fontes de informação
internet, vídeos, jornais, revistas, rádio, televisão e outros meios de comunicação social.
(INDE/MINED, 2010).
39
Conclusão
Moçambique possui um projecto político pedagógico para consciencialização ambiental
no ensino de Geografia aprovado pelo Conselho de Ministros. O projecto resultou de processo de
consulta a diferentes intervenientes do processo educativo: organizações sociais e profissionais,
líderes comunitários, académicos, alunos, professores e técnicos da educação. Para
implementação do projecto foram elaborados os programas de ensino, dando sugestões
metodológicas para a consciencialização do aluno.
Na escola onde decorreu a pesquisa as turmas são numerosas e os professores para
despertarem a consciência ambiental no aluno a partir do ensino de Geografia utilizam diversas
metodologias, sendo mais frequente a elaboração conjunta, a observação directa, a exposição
oral, os trabalhos práticos para a resolução de problemas e a utilização de exemplos mais
próximos do alunos. Os professores têm como dificuldade as turmas que são numerosas e o
material didáctico que é escasso ou mesmo inexistente, como é das TICs.
A classe observada tem uma grande vantagem para abordar os conteúdos de educação
ambiental, porque trata de aspectos físicos e económico-geográficos, o que possibilita fazer uma
interligação entre o Homem e o seu meio natural.
A escola limita-se em resolver seus os problemas e não presta assistência à comunidade
onde está inserida.
Para melhor as acções de consciencialização ambiental no Ensino de Geografia, sugere se
que:
- A escola disponibilize meios de ensino como tecnologias de informação e comunicação
(sala de internet, data show, DVD), revistas, jornais, televisão entre outros;
- Os professores poderiam aproveitar os dias comemorativos para fazer palestras na
comunidade, sendo os alunos apresentadores na sua própria comunidade e/ou promover jogos
educativos sobre meio ambiente.
- Criação do clube ambiental integrando alunos e alguns elementos da comunidade.
- As aulas de campo não deviam terminar com simples observação dos problemas, mas
sim dar resposta face aos problemas observados, registando e levar como matéria de debate sobre
as formas de utilização, conservação do meio ambiente nas aulas de Geografia;
- Promoção de concursos sobre matéria ambiental;
- Criação de intercâmbio entre turmas para se discutir assuntos que envolvem a escola e a
comunidade;
40
- Sendo que a escola não dispõe de materiais suficientes para a consciencialização
ambiental, os professores em conjunto com os alunos podiam produzir panfletos, cartazes,
fotografar os problemas e utilizar nas aulas de Geografia.
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42
A teoria da acção dialógica de Paulo Freire: uma solução para a crise de implementação
das escolas democráticas?
David Chabai Mudzenguerere 5
Resumo
Este artigo trata da necessidade e do impacto de implementação de escolas democráticas em nossas
sociedades, apresentando a teoria da acção dialógica de Paulo Freire como um possível instrumento típico
para superar as dificuldades em volta da sua implementação. O modo de vida democrático implica um
processo criativo de busca de modos de extensão e expansão dos valores da democracia, implica ter a
consciência de que se a educação é para humanizar o Homem, então ela tem de ser resultado da
contribuição dos habitus de todos os homens duma sociedade e não de um grupo sobre toda sociedade.
Pois, a riqueza do humano ou da humanidade está na diversidade do habitus entre os homens; e cada
grupo humano se aperfeiçoa, se conhece e se desenvolve cada vez mais com um diálogo permanente,
promotor e, logo, construtivo com outros grupos. Aliás, a humanidade se constrói com uma inclusão
promotora de todos os homens.
Palavras-chave: escolas democráticas, implementação, teoria da acção dialógica, classe dominante e
classe dominada.
Introdução
Marx e Engels, percebendo a educação, na sociedade capitalista, como um elemento de
preservação da hierarquia social, propuseram a integração entre o ensino e o trabalho (que
chamaram ensino politécnico ou formação omnilateral) como única forma de superar as
dicotomias existentes e emancipar o homem:
A integração entre ensino e trabalho constitui-se na maneira de sair da alienação
crescente, reunificando o homem com a sociedade. Essa unidade, segundo Marx, deve
dar-se desde a infância. O tripé básico da educação para todos é o ensino intelectual
5 Mestre em Educação/Ensino de Filosofia pela UP. Docente na UP-Quelimane.
43
(cultura geral), desenvolvimento físico (ginástica e desporto) e aprendizado
profissional polivalente (técnico e científico) (GADOTTI; 1984: 54-55).
Portanto, a escola, tida como sistema educativo em Marx e Engels, aparece, para estes,
como o mecanismo de promoção de igualdade entre os homens, como fim das classes sociais.
Não obstante, para Bourdieu e Passeron, longe de ser promotora da redução das
desigualdades, a escola acaba por reproduzi-las. Ela aparece, para Bourdieu e Passeron, como
um instrumento oculto de dominação: “Toda a acção pedagógica é objectivamente uma
violência simbólica enquanto imposição, por um poder arbitrário, dum arbítrio cultural”
(BOURDIEU e PASSERON, s/d., 24).
Ora, se Professor Ernani Fiori disse, na introdução da obra de Paulo Freire (1987), que
“A educação reproduz, assim, em seu plano próprio, uma estrutura dinâmica e o movimento
dialéctico do processo histórico da produção do homem; onde para o homem, produzir-se é
conquistar-se, conquistar sua forma humana, isto é, a pedagogia como antropologia” e se (…)
os homens humanizam-se, trabalhando juntos para fazer do mundo, sempre mais, a mediação de
consciências que se coexistenciam em liberdade; faz sentido a ideia da democratização das
escolas como superação da imposição da cultura dominante sobre a dominada, dos ricos sobre os
pobres, dos que sabem sobre os que não sabem, através da mobilização da participação de todos
os intervenientes na acção pedagógica, como entenderam Apple e Beane:
As escolas democráticas pretendem ser territórios democráticos, de tal modo que a ideia
de democracia atinja também os vários papeis que os adultos desempenham nas escolas.
Isto significa que os educadores profissionais, os pais, os activistas da comunidade e os
demais cidadãos têm o direito de participar crítica e informadamente na construção de
políticas e programas escolares para si e para os jovens (2000: 29).
Mas a materialização das escolas democráticas continua em crise e/ou um desafio devido
à incidente interferência dominante da classe/cultura dominante, passe a repetição, sobre a
dominada. E o problema que nos propomos discutir, nesta reflexão é: Como superar a crise da
implementação de escolas democráticas a partir da teoria da acção dialógica de Paulo Freire?
Com este problema, pretendemos, de um modo geral, mostrar a necessidade e o impacto
de implementar escolas democráticas em nossas sociedades, e, especificamente, descrever as
principais dificuldades da implementação de escolas democráticas e, finalmente, usar a teoria da
44
acção dialógica de Paulo Freire como instrumento típico para superar as crises/dificuldades dessa
implementação.
Insistir na democratização da escola, que tenta transformar, explicitamente, as condições
anti-democráticas na escola e na sociedade, significa exigir que os homens construam juntos o
mundo humano, assumindo a responsabilidade de dar-lhe (ao mundo humano) a direcção, através
do contributo da palavra de todos. E dizer cada um a sua palavra equivale a assumir
conscientemente, como pessoa, como trabalhador, a função de sujeito da sua história, em
colaboração com os demais trabalhadores – o povo. Portanto, negar que a escola continue um
instrumento ideológico de a classe dominante se impor à dominada, e querer que, na escola e na
sociedade, todos (dominantes e dominados) se encontrem e se sintam representados nos
conteúdos escolares como iguais em oportunidades, através de escolas democráticas, são o
motivo e a importância desta reflexão. Aliás, disse Professor Ernani Fiori (in FREIRE, 1987)
que:
Em regime de dominação de consciências, em que os que mais trabalham menos
podem dizer a sua palavra, em que multidões imensas nem sequer têm condições para
trabalhar, os dominadores mantêm o monopólio da palavra, com que mistificam,
massificam e dominam; nesta situação, os dominados, para dizerem a sua palavra, têm
que lutar para tomá-la.
1. (Im)possibilidade de implementação de escolas democráticas?
É verdade, já o dissemos acima, que
As escolas democráticas pretendem ser territórios democráticos, de tal modo que a
ideia de democracia atinja também os vários papeis que os adultos desempenham nas
escolas. Isto significa que os educadores profissionais, os pais, os activistas da
comunidade e os demais cidadãos têm o direito de participar crítica e informadamente
na construção de políticas e programas escolares para si e para os jovens (APPLE e
BEANE, 2000: 29).
Mas a implementação de escolas dessa natureza é confrontada por vários entraves
estruturais e curriculares. Ora vejamos que, simultaneamente, vários grupos com interesses
concretos, sobretudo fundamentalistas religiosos, exigem que as ideias e os materiais abertos à
discussão nas escolas se limitem aos que defendam os seus próprios valores (Delfattore, apud
APPLE e BEANE, 2000: 33). Paralelamente a esta questão, os grupos locais que atravessam os
45
vários territórios de espectro político, debatem-se com problemas resultantes das movimentações
pela criação de um currículo nacional, em que conjunto de conhecimento estudado se reduza ao
que é considerado importante pelos grupos seleccionados a nível nacional.
Isso mostra claramente que a ideia de uma participação abrangente nas questões
escolares, como característica das escolas democráticas, não é tão simples como um convite à
participação, num convívio festivo, até porque o direito “à palavra” introduz questões de como é
que vários pontos de vista se podem enquadrar na frágil equação que equilibra, por um lado, os
interesses mais específicos e, por outro, o “bem comum”, mais vasto, da comunidade
democrática. Pois,
Embora a democracia saliente a cooperação entre as pessoas, muitas escolas alimentam a
competição – através das notas, status, recursos, c programas, etc. Embora a democracia
dependa da preocupação pelo bem comum, muitas escolas, influenciadas pelas agendas
políticas impostas do exterior, enfatizam uma noção de individualismo assente quase
exclusivamente no interesse pessoal (APPLE e BEANE, 2000: 36).
Esses impasses no funcionamento das escolas democráticas acabam dando, quase
definitivamente, razão aos negadores da escola como instrumento redutor de desigualdade social,
e aos crentes da escola como um instrumento “perpétuo” de imposição da ideologia dominante,
como o foram Bourdieu e Passeron (s.d.: 59) ao afirmarem:
Enquanto trabalho prolongado de inculcação que produz a interiorização dos princípios
dum arbítrio cultural sob a forma dum habitus durável e transportável, capaz pois de
engendrar práticas conformes a esses princípios fora e além de toda a regulamentação
expressa e de toda a chamada explícita à regra, o TP (Trabalho Pedagógico) permite ao
grupo (dominante) ou à classe (dominante) que delega na AP (Acção Pedagógica) a sua
autoridade, produzir e reproduzir a sua integração intelectual e moral sem recorrer à
repressão externa e, em particular, à coerção física.
E de facto, nas relações entre a escola e as classes sociais, a harmonia parece perfeita.
Simplesmente porque
as estruturas objectivas produzem os habitus da classe e, em particular, as disposições e
predisposições que, engendrando as práticas adaptadas a essas estruturas, autorizam o
funcionamento e a perpetuação das estruturas: por exemplo, a disposição para utilizar a
Escola e as predisposições para nela ter sucesso dependem (...) das oportunidades
objectivas de a utilizar e de nela ter sucesso que estão às diferentes classes sociais,
constituindo essas disposições e predisposições, por sua vez, um dos factores mais
importantes da perpetuação da estrutura das probabilidades escolares como manifestação
46
objectivamente perceptível das relações entre o sistema de ensino e a estrutura das
relações de classe (BOURDIEU e PASSERON, s/d.: 274-275).
Para além da táctica solenemente sofisticada com que se impõe a cultura dominante, por
isso de algum modo imperceptível para a massa dominada, há, contra o avanço da
democratização de escolas, aquilo que Apple e Beane (2000: 37) disseram: “Todos os que
apoiam uma educação democrática colocam-se numa posição de conflito em relação às
tradições dominantes de escolarização”. Pois, quase tudo o que um currículo democrático
propõe se contrapõe à maioria dos ideais dominantes (…) sobre o que deve constituir a
planificação curricular. “A possibilidade de se ser sensível a um leque abrangente de opiniões e
perspectivas é frequentemente interpretada como uma ameaça à cultura dominante, sobretudo
porque algumas dessas opiniões permitem interpretações de questões e acontecimentos bem
distintas daquelas que são tradicionalmente ensinadas nas escolas (APPLE e BEANE, 2000:
44).
E outros preferem pensar que as frustrações envolvidas na criação de escolas
democráticas não só são ultrapassadas por uma tarefa mais ambiciosa: mantê-las perante as
correntes anti-democráticas da opinião pública e da política educacional, como também "com a
intervenção selectiva do Estado, principalmente onde o processo e o conteúdo do processo de
tomada de decisões a nível local viabilizem a provação dos direitos legais e a opressão de
determinados grupos de indivíduos" (APPLE e BEANE, 2000: 32).
E nós entendendo esse problema como uma patologia mental tanto dos dominantes como
dos dominados, uma espécie de alienação sua, preferimos convocar a teoria da acção dialógica
de Paulo Freire como base para vitalização das escolas democráticas.
2. Teoria da acção dialógica de Paulo Freire como possibilidade das escolas democráticas
A questão das atitudes anti-democráticas ou do regime de dominação de consciências
desenvolvida pela cultura dominante tanto na escola como na sociedade em geral, e filtrante
mesmo em ambientes que se pretendam democráticos, se fundamenta na absoluta valorização do
eu e, ao mesmo tempo, na nadificação ou coisificação do outro (o tu). Os dominadores mantêm o
monopólio da palavra, com que mistificam, massificam e dominam, considerando-se os únicos
47
que sabem, que podem orientar os outros, regrar o mundo segundo os seus interesses,
absolutizando a ignorância nos outros (tu). E, como refere Freire (1987: 26): "Os oprimidos,
como objectos, como quase 'coisas', não têm finalidades. As suas, são as finalidades que lhes
prescrevem os opressores".
Num ambiente conflitante desse, é inimaginável uma educação democrática em que as
pessoas apostam umas nas outras e os jovens encorajados a melhorar a vida da comunidade
ajudando os outros. Só se pode falar, isso sim, de uma visão “bancária” da educação, onde o
“'saber' é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. A doação que se
funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão – a absolutização da
ignorância, que constitui o que chamamos de alienação da ignorância, segundo a qual esta se
encontra sempre no outro” Freire (1987: 33).
É mesmo diante deste dilema que convocamos à solução o método de Paulo Freire que é,
fundamentalmente, um método de cultura popular: conscientiza e politiza. Não absorve o político
no pedagógico, mas também não põe inimizade entre educação e política. Distingue-as, sim, mas
na unidade do mesmo movimento em que o homem se historiciza e busca reencontrar-se, isto é,
busca ser livre.
Não tem a ingenuidade de supor que a educação, só ela, decidirá dos rumos da história,
mas tem, contudo, a coragem suficiente para afirmar que a educação verdadeira
conscientiza as contradições do mundo humano, sejam estruturais, super-estruturais ou
inter-estruturais, contradições que impelem o homem a ir adiante. Porque, as contradições
conscientizadas não lhe dão mais descanso, tornam insuportável a acomodação. Um
método pedagógico de conscientização alcança últimas fronteiras do humano. E como o
homem sempre se excede, o método também o acompanha. É a educação como prática da
liberdade (Professor Ernani Fiori, in FREIRE, 1987).
Ora, a educação como prática da liberdade se fundamenta na ideia de que “Ninguém
liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão” (FREIRE,
1987: 29). Vale dizer que tanto a cultura dominante deve ser liberta da sua mentalidade
dominante e animalesca para uma visão mais interactiva e humanizada em relação ao outro
(dominado) como a cultura dominada e oprimida (o povo, a massa) deve ser liberta da sua
mentalidade obediente e servil para uma visão mais activa, contribuinte e construtora da
humanidade e do mundo, numa relação dialógica entre homens iguais com aqueles que eram da
48
classe dominante. Porém, ao povo (os dominados) cabe dizer a palavra de comando nesse
processo histórico-cultural, pois não são os confortados a reclamar pelos desconfortados.
Portanto, para manter a contradição, a concepção “bancária” nega a dialogicidade como
essência da educação e se faz antidialógica; para realizar a superação disso, a educação
problematizadora – situação gnosiológica – afirma a dialogicidade e se faz dialógica. Enquanto,
na teoria da acção antidialógica, a conquista, como sua primeira característica, implica num
sujeito conquistando o outro, o transforma em quase “coisa”, na teoria dialógica da acção, os
sujeitos se encontram para a transformação do mundo em colaboração.
Porque, a teoria da acção dialógica entende que "Ninguém educa ninguém, ninguém
educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo" (FREIRE, 1987:
39); graças à co-laboração, à união, à organização e à síntese cultural. Pelo que enquanto o eu
antidialógico, dominador, transforma o tu dominado, conquistado num mero “isto”; o eu
dialógico, pelo contrário, sabe que é exactamente o tu que o constitui. Desta forma, o eu e o tu
passam a ser, na dialéctica destas relações constitutivas, dois tu que se fazem dois eu.
Sabe-se que a colaboração somente pode realizar-se na comunicação. O diálogo, que é
sempre comunicação, funda a co-laboração. O diálogo não impõe, não maneja, não domestica,
não sloganiza. Por isso, a liderança revolucionária tem um compromisso com a liberdade das
massas oprimidas, pelo que não pretende conquistá-las, mas seguir sua adesão para a libertação.
A adesão verdadeira é a coincidência livre de opções, fundada na intercomunicação dos homens,
mediatizados pela realidade.
Aqui o currículo democrático deixa de aparecer como contraposição à maioria dos ideais
dominantes (…) sobre o que deve constituir a planificação curricular. Todos se tornam sensíveis
a um leque abrangente de opiniões e perspectivas numa construção de cultura única. Porque, a
teoria da acção dialógica exige que acção revolucionária se funda na comunhão com as massas
populares, pois só a comunhão leva à colaboração. E "como, da síntese cultural, não há
invasores, não há modelos impostos, os actores, fazendo da realidade objecto de sua análise
crítica, jamais dicotomizada da acção, se vão inserindo no processo histórico, como sujeitos. O
saber mais apurado da liderança se refaz no conhecimento empírico que o povo tem, enquanto o
deste ganha mais sentido no daquela" (FREIRE, 1987: 106). A contradição entre a visão do
mundo dos dominadores e a dos dominados é superada, na síntese cultural, com o
enriquecimento de ambos.
49
Portanto, a síntese cultural não nega as diferenças entre uma visão e outra, pelo contrário,
se funda nelas. O que ela nega é a invasão de uma pela outra. O que ela afirma é o indiscutível
aporte que uma dá a outra.
Conclusão
O modo de vida democrático implica um processo criativo de busca de modos de
extensão e expansão dos valores da democracia, implica ter a consciência de que se a educação é
para humanizar o Homem, então ela tem de ser resultado da contribuição dos habitus de todos os
homens duma sociedade e não de um grupo sobre toda sociedade. Pois, a riqueza do humano ou
da humanidade está na diversidade do habitus entre os homens; e cada grupo humano se
aperfeiçoa, se conhece e se desenvolve cada vez mais com um diálogo permanente, promotor e,
logo, construtivo com outros grupos. Aliás, a humanidade se constrói com uma inclusão
promotora de todos os homens.
É um erro grave da classe dominante achar-se perfeita, sábia, auto-suficiente e única
capaz de orientar a classe dominada porque tem tudo a dar, esquecendo-se de que a experiência
com o mundo é diferenciada entre os homens e nisso devem cooperar com os diferentes (classe
dominada). Porque Ninguém (grupo perfeito) educa ninguém (grupo dominado, atrasado) nem o
inverso, ninguém educa a si mesmo (nem o dominante nem o dominado), os homens se educam
entre si, mediatizados pelo mundo.
Portanto, é só com uma acção dialógica que teremos as escolas democráticas como
territórios democráticos, onde a ideia de democracia atinge também os vários papeis que os
adultos desempenham nas escolas, isto é, onde os educadores profissionais, os pais, os activistas
da comunidade e os demais cidadãos têm o direito de participar crítica e informadamente na
construção de políticas e programas escolares para si e para os jovens.
Para já, o imperativo é cada classe ou grupo (dominante e dominado) tomar consciência
do “demónio” que carrega e, em colaboração com o outro, juntos se libertarem em direcção ao
desenvolvimento da humanidade, que é a causa da educação/escola. Pois, Ninguém liberta
ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão.
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Bibliografia
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