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Ano VI, Número 21, Março - 2015

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Ficha Técnica

Conselho Editorial:

Stela Mithá Duarte - Doutora em Educação/Currículo pela Pontifícia Universidade Católica de

São Paulo - Brasil

Daniel Dinis da Costa - Doutor em Educação/Geometria Descritiva-3D pela Universidade de

Newcastle - Inglaterra

Carla Maciel - Doutora em Estudos Ingleses pela Universidade de Illinois - EUA

Geraldo Ernesto Mate - Doutor em Ciências da Educação pela Universidade de Otto-von-

Guericke, Magdeburg, Alemanha

Crisalita Djeco Funes - Doutora em Ciências Pedagógicas pela Università degli Studi di

Bergamo - Itália

Equipa Técnica

Simião Alberto Muhate - Mestrado em Educação/ Ensino de Português pela UP

Germano Diogo - Licenciado em Planificação e Gestão da Educação pela UP

Titulo: UDZIWI

Publicação: Trimestral

Propriedade: Centro de Estudos de Políticas Educativas (CEPE) da Universidade Pedagógica

DISP. REGº/GABINFO-DEC/2008

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Índice

Editorial 3

O currículo local no Ensino Básico: proposta de conteúdos relevantes

para a rapariga da Vila do Milénio de Lionde

Maria Verónica Francisco Mapatse e João Mucavele

4

Percepções dos professores a respeito do ensino da Matemática: um

estudo com cinco professores moçambicanos

Geraldo Deixa e José Piletichi

21

Educação Para o Sentido em Moçambique

Francisco Valente Fumo

37

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3

Editorial

Esta é a primeira Revista do ano académico 2015. Nela apresentamos um total de 3

artigos.

O primeiro, de Maria Verónica Francisco Mapatse e João Mucavele, intitulado "O

currículo local no Ensino Básico: proposta de conteúdos relevantes para a rapariga da Vila do

Milénio de Lionde", debruça-se sobre os conteúdos locais a inserir no currículo local no Ensino

Básico, na Vila de Lionde, no distrito de Chókwé, Província de Gaza. No artigo, os autores

propõem a integração de aspectos locais no currículo oficial, nos programas de ensino das

disciplinas do I e II ciclos do Ensino Básico.

O segundo, de Geraldo Deixa e José Piletichi, intitulado "Percepções dos professores a

respeito do ensino da Matemática: um estudo com cinco professores moçambicanos", é relativo

a um estudo que decorreu na Escola Pré-universitária 25 de Setembro, cidade de Quelimane,

Província da Zambézia. Os autores constatam que a preocupação dos professores ainda continua

sendo o ensino. Esse constrangimento pode concorrer para o fraco aproveitamento pedagógico

dos alunos e para a ausência de qualidade das acções do docente em sala de aula.

O terceiro e último artigo, de Francisco Valente Fumo, intitulado "Educação Para o

Sentido em Moçambique", desenvolve-se numa abordagem filosófico-educacional, tendo como

cerne os conceitos de liberdade e responsabilidade presentes na análise fenomenológica de

Viktor Frankl (1905-1997). O autor considera que a educação em Moçambique está em crise de

identidade e ética e recomenda que nunca se perca de vista o que é específico do ser humano, o

ser espiritual; que se proceda a uma educação fundada na liberdade; que se eduquem os

estudantes à responsabilidade e que se integre na educação, de modo decisivo, os valores da

moçambicanidade, da africanidade e os valores universais.

Uma boa leitura e votos de um próspero ano 2015, com muita produção científica.

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O currículo local no Ensino Básico: proposta de conteúdos relevantes para a rapariga da

Vila do Milénio de Lionde

Maria Verónica Francisco Mapatse1

João Mucavele2

Resumo

A proposta de conteúdos relevantes para a rapariga da Vila do Milénio de Lionde que frequenta o Ensino

Básico teve lugar em 2010 em Chókwé e envolveu uma pesquisa empírica e bibliográfica para buscar

subsídios que permitissem a selecção de conteúdos que caracterizam os conhecimentos e/ou práticas mais

usuais a inserir no processo de ensino e aprendizagem escolar. A pesquisa envolveu um universo da

população estudantil de cerca de 1.780 alunos, dos quais 922 são do sexo feminino, o equivalente a

51,7%, assistidos por 34 professores, sendo 25 mulheres e 9 homens, de três escolas, nomeadamente: a

Escola Primária de Lionde A, a Escola Primária de Lionde D e a Escola Primária Completa de Lionde E.

Para a recolha de dados e informações recorreu-se à entrevista e à observação participante, na perspectiva

de buscar subsídios para fundamentar a pertinência da selecção de conteúdos relevantes, sobretudo para a

rapariga, junto da Direcção, professores, e encarregados de educação e, foi também aplicado um

questionário aos alunos daquelas escolas, que apresentaram as suas ilações relativamente às actividades e

práticas a serem integradas no currículo como conteúdos de formação. Os resultados mostram que os

intervenientes estão cientes do valor educativo das actividades e práticas da comunidade de Lionde e, por

conseguinte, da necessidade de valorização e preservação destas práticas, de modo que a sua inserção no

ensino formal seja uma atitude de capital importância para a formação integral dos alunos, em geral, e da

rapariga, em particular. Assim, é proposta a integração de aspectos locais no currículo oficial durante a

leccionação dos conteúdos preconizados nos programas de ensino das disciplinas que caracterizam o I e II

ciclos do Ensino Básico, bem como a metodologia que orienta a sua consecução.

Palavras-chave: Currículo, Conteúdos, Ensino-Aprendizagem, Ensino Básico, Lionde.

Introdução

O presente estudo debruça-se sobre os conteúdos locais a inserir no currículo local no

Ensino Básico, na Vila de Lionde, tem a intenção de contribuir com subsídios para a selecção de

conteúdos que caracterizam os conhecimentos e/ou práticas mais usuais, de modo a inseri-los no

processo de ensino e aprendizagem nesta região, os quais deverão potenciar principalmente, a

rapariga. A Vila de Lionde localiza-se na parte Sul da Província de Gaza, concretamente, no

Posto Administrativo do mesmo nome, no distrito de Chókwé, há cerca de 110 Km da Cidade de

Xai-Xai.

Os conteúdos propostos resultam de uma pesquisa empírica, a partir da qual foi possível

identificar as características geográficas e sócio-económicas da região em estudo, de modo não

só a reconhecer as principais actividades e práticas, mas também a aferir as reais necessidades do

ponto de vista de objecto e objectivos para o ensino, que resultem na dinamização e impulso

sobre as referidas actividades e/ou práticas em prol do desenvolvimento local.

1 Docente de Didáctica de Geografia na UP-Gaza, Mestre em Educação/Currículo e Doutoranda da FACEP

(Faculdade de Ciências de Educação e Psicologia) -UP. 2 Técnico da Direcção Provincial de Educação e Cultura (DPEC)-Gaza. Licenciado em Educação Matemática para o

Ensino Primário (LEMEP).

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Assim, através da entrevista, questionário e observação participante, envolvendo a

Direcção, professores, alunos e encarregados de educação de três escolas que leccionam o Ensino

Básico, nomeadamente: a Escola Primária de Lionde A, a Escola Primária de Lionde D e a

Escola Primária Completa de Lionde E foi possível constatar algumas premissas que permitiram

identificar aquelas actividades e/ou práticas que podem constituir conteúdos de ensino no âmbito

do currículo local.

Deste modo, e porque o processo de ensino e aprendizagem requer a existência de

conteúdos de ensino, é apresentada a proposta de selecção de conteúdos para o currículo local,

bem como as sugestões metodológicas para a sua consecução.

Os conteúdos de ensino representam o conjunto de conhecimentos sistematizados,

capacidades e habilidades necessárias para a explicação e compreensão da complexidade do

mundo, por forma a desenvolver atitudes, hábitos, valores e convicções de actuação consciente

no quotidiano, principal objectivo da educação escolar para a formação integral do aluno.

1. Conteúdos sobre aspectos locais a inserir no currículo local

A identificação de actividades e práticas locais e quotidianas dos alunos para a sua

integração no currículo escolar surge da necessidade de aproximar o saber empírico ao saber

sistematizado, de modo a estreitar as suas relações e tornar o conhecimento mais útil para a vida

da comunidade. Esta intenção pretende ser, também, uma resposta ao mundo contemporâneo,

que exige da ciência e da tecnologia um diálogo constante e profundo entre os campos do saber,

para possibilitar a compreensão e intervenção integradas no quotidiano social, complexo e

dinâmico.

Contudo, e apesar da consciência de que a dinâmica provoca mudanças rápidas e, na

sequência, instabilidade em todos os sentidos, acentuando as incertezas pelo futuro devido à

liberalização de ideias, é necessário problematizar os saberes emergentes, aliás, estes resultam do

contacto com a realidade dinâmica que, por sua vez, depende do ponto de vista dos sujeitos nela

inseridos.

É com base nestes pressupostos que a identificação das actividades e/ou práticas do

quotidiano social da Vila do Milénio de Lionde-Chókwé, em Gaza, vêm contribuir para a

problematização do conhecimento da realidade social, de modo a aferir a possibilidade de

reflexão do mesmo no contexto escolar, através da sua inserção como conteúdos a leccionar no

currículo local que corporiza o Ensino Básico no nosso País.

Esta inovação do Plano Curricular do Ensino Básico enquadra-se perfeitamente no

paradigma educacional emergente, o qual é pressionado por mudanças rápidas do mundo que

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marcam um novo arranjo social, moderno, complexo, aberto e cada vez mais próximo, sendo que

a especificação rígida do conhecimento inquestionável não faz mais sentido. Sugere um ensino

que dê primazia aos factos da realidade quotidiana, representada pela paisagem, a qual resulta da

interacção de vários fenómenos: naturais, sociais, económicos e/ou políticos.

Neste contexto, o paradigma emergente chama à atenção para a interdisciplinaridade,

uma sugestão que decorre do facto de que a realidade, que constitui um todo, é resultado da

relação entre as diferentes partes que a compõem em interacção dinâmica e dialéctica

(THIESEN, 2008). É uma prática pedagógica que visa dotar os alunos de instrumentos de saber

fazer e saber ser, aplicados para a compreensão e participação no quotidiano.

Assim, os conteúdos escolares são organizados de modo a retratar não só as

características essenciais de objectos e/ou fenómenos que caracterizam o mundo, mas também, a

experiência social no que se refere aos conhecimentos e formas de actuação, os quais se

transformam em instrumentos de assimilação e compreensão para enfrentar as exigências

teórico-práticas da vida social (NICOLAU, 1991).

Contudo, a sua consecução no processo lectivo requer a interdisciplinaridade como uma

acção metodológica de construção de conhecimento pelo sujeito em interacção com o seu

contexto social e cultural, o que leva à problematização desta realidade, exercício complexo que

se fundamenta no aprender a aprender, na acção e pela acção, numa perspectiva fenomenológica,

onde o indivíduo pode ser capaz de compreender e interpretar essa realidade de forma subjectiva,

sistematizada e integrada (FAZENDA, 2002).

Esta perspectiva fundamenta a premissa de que os conteúdos escolares devem inserir

conexões entre os conhecimentos empírico (vivenciado) e científico (disciplinar), os quais

proporcionam o desenvolvimento de capacidades, habilidades e atitudes, ou seja, a articulação do

saber com o saber fazer e o saber ser ou estar. A proposta de conteúdos a seguir apresentada

decorre da pesquisa empírica, realizada na Vila do Milénio e que, de certa forma, representam o

domínio das actividades desenvolvidas pela comunidade local. Encontram inserção em todas as

disciplinas leccionadas no I e II ciclos do Ensino Básico.

Estão dispostos por unidades temáticas com indicação dos objectivos gerais a alcançar, e

orientados para estabelecer uma interacção com conteúdos programáticos versados nos

programas oficiais do Ensino Básico em 20% do tempo lectivo previsto, cabendo ao professor a

planificação coerente, de modo a alcançar o triângulo didáctico em prol da formação integral do

aluno, dotando-o de competências e habilidades para a vida.

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Proposta de conteúdos locais

Unidade Objectivos gerais Conteúdos Competências

I-Actividade

Agro-pecuária

Conhecer as

características

relativas a prática da

actividade agro-

pecuária, sua

importância e

impacto na

comunidade de

Lionde

- Formas de maneio do solo

em Lionde;

- Principais culturas de Lionde

e sua importância na

comunidade;

- O processo de criação de

animais em Lionde;

- Principais espécies animais

de Lionde e sua importância

na comunidade;

- O impacto da actividade

agro-pecuária em Lionde

- Identifica formas de

maneio do solo e de

criação de animais;

- Indica as principais

culturas e animais

domésticos;

- Reconhece a importância

da actividade agro-

pecuária.

II-

Processamento

de alimentos

Conhecer as

diferentes

possibilidades de

conservação de

alimentos e sua

contribuição na dieta

alimentar e na saúde

nutricional da

população de Lionde

- Formas de conservação e

processamento de produtos

agro-pecuários;

- Receitas locais para a

confecção de alimentos;

- Importância da variação da

dieta alimentar e nutrição

- Identifica as formas de

conservação e

processamento de

produtos agro-pecuários;

-Demonstra a importância

dos alimentos para a

nutrição

III-Artesanato

Demonstrar as

diferentes

possibilidades de

aplicação de

recursos locais para

a produção de bens

úteis para a

comunidade

- Importância e utilidade de

recursos florestais de Lionde

- Construção de capoeiras,

currais, latrinas com recurso a

material local

- Corte e Costura e

ornamentação

- Elabora artigos artesanais

como cestos, vassouras,

pilões, vasos, bordados e

outros;

- Participa na construção

de infraestruturas.

IV-Canto e

dança

Valorizar a dança e

o canto local na

formação estética e

corporal como

condimentos de

identidade sócio-

cultural da

comunidade de

lionde

- A importância social e

cultural do canto e dança

- Principais danças da região:

Massesse, muthimba, makway,

makwaela, xingomana e

outras;

- Origem das danças e

instrumentos tradicionais da

região

- Cria um grupo coral e/ou

cultural;

- Valoriza o património

cultural local;

- Pesquisa as danças e

instrumentos tradicionais.

V- Jogos

Explicar a

importância dos

jogos na formação

integral do aluno

- Importância dos jogos

tradicionais locais para o

desenvolvimento das

capacidades e habilidades

intelectuais das crianças;

-Impacto social dos jogos

tradicionais.

- Participa e valoriza os

jogos da escola;

-Aplica as regras dos jogos

na disciplina de

matemática.

VI-História

local

Resgatar a história

sobre a origem e

desenvolvimento de

Lionde

- Origem do nome local;

- O processo de migração e

expansão do povoado de

Lionde;

- A questão da transmissão de

poderes;

- Descreve a sua origem e

a do povo de Lionde;

- Identifica a hierarquia de

Lionde no poder social

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- A hierarquia tradicional de

Lionde;

- A árvore genealógica de

Lionde.

VII-Saúde e

higiene pessoal

e colectiva

Conhecer as doenças

mais frequentes de

Lionde e as formas

de sua mitigação

- Cuidados a ter para a

prevenção de doenças;

- A medicina verde na

prevenção e tratamento de

doenças.

- Identifica as doenças

frequentes;

- Participa na mitigação

das doenças

A consecução destes conteúdos temáticos apela aos professores para a planificação do

trabalho lectivo, como pressuposto que o ajude a si e aos alunos a reflectirem sobre os mesmos e

sobre os meios e procedimentos mais adequados que os permitam controlar e fazer ajustamentos

permanentes de acordo com as necessidades decorrentes do trabalho. Cabe ao professor

seleccionar os conteúdos a orientar no PEA de acordo com os objectivos a alcançar, que deverão

reflectir a ansiedade dos alunos, da escola e da comunidade.

2. Propostas metodológicas para a leccionação de conteúdos locais no currículo local

em Lionde

2.1. Unidade I- Actividade agro-pecuária

A caracterização da actividade agro-pecuária tem lugar no I e II ciclos do Ensino Básico

na disciplina de Ciências Naturais e consiste na descrição das formas de maneio do solo, na

identificação das principais culturas e espécies animais, para além do reconhecimento da sua

importância para a comunidade de Lionde.

Assim, a feitura de canteiros, de viveiros, de horta suspensa e de enxertia com espécies

vegetais dominantes da região na escola, com destaque para as hortaliças, árvores de fruta, de

sombra e medicinais, é uma estratégia importante para a iniciação sobre o maneio do solo, bem

como sobre os cuidados a ter com as plantas no seu desenvolvimento.

Fig.1: Viveiro de Moringa

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As plantas desenvolvidas no viveiro, canteiro e horta da escola devem ser devidamente

identificadas e etiquetadas para o seu conhecimento, tanto pelo nome local como pelo nome

vulgar e científico.

Estas plantas e hortaliças, além de poderem fazer parte da paisagem da escola podem,

mais tarde, ser distribuídas aos alunos, na altura do transplante, para semearem nas suas casas e

também, procederem ao plantio no recinto escolar e arredores. Paralelamente, é preciso ensinar

às crianças a importância de cada espécie na vida quotidiana da comunidade de Lionde.

A elevação da rapariga nesta actividade de produção de comida é um pressuposto de

particular importância pois pode proporcionar-lhe uma visão mais ampla, como mulher, sobre o

seu valor, sua contribuição para a elevação do bem-estar familiar e social, realçando o seu papel

de mãe, esposa e protectora dos mais desfavorecidos.

Incentiva-se aos professores e à direcção da escola o estabelecimento de contactos e

parcerias com a comunidade e instituições que operam na Vila do Milénio para apoiarem em

sementes, materiais agrícolas e “oficinas” pedagógicas para as actividades práticas, com destaque

para a criação de animais, dadas as dificuldades das escolas em relação a esta matéria.

Assim, para aferir as actividades agro-pecuárias de Lionde e porque as escolas não

possuem machambas nem currais e/ou capoeiras, o professor pode organizar uma excursão ou

visita de estudo a uma comunidade vizinha para levar os seus alunos a observar um

empreendimento agro-pecuário, de modo a ligar os aspectos teóricos do manual com a realidade

local. Esta visita pode ocorrer pelo menos uma vez por cada trimestre lectivo, aliás, a excursão

constitui um grande potencial pedagógico de formação de adolescentes e jovens, pois, “permite a

vinculação da escola com a vida, a teoria com a prática e a assimilação de conhecimentos

mediante a observação de objectos e fenómenos em seu próprio ambiente; ou seja, converte a

realidade em meio de ensino” (NICOLAU, 1991:174).

Estas sugestões demonstram claramente a intenção de elevar as actividades dos alunos no

PEA pela primazia que dão ao trabalho prático e independente, reforçando o método expositivo e

o de elaboração conjunta que predominam na sala de aulas da escola moçambicana.

É preciso, sistematicamente, treinar os alunos a saber ver e manipular, insistindo nos

factos diários, cenas do quotidiano sempre ligadas aos objectivos da aula, para que se releve a

sua importância e estimule a reflexão sobre as causas da sua ocorrência e os devidos efeitos, para

que não os encarem como mera casualidade, mas que os vejam “com discernimento, em vez de

admirarem tudo cegamente, repensar cada coisa vista em função dos conhecimentos anteriores,

em suma, reagir perante os fenómenos” (SPORCK, e TULIPPE, 1978: 30).

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Durante a excursão ou visita de estudo a empreendimentos agro-pecuários, o professor

deve incentivar as meninas, orientando tarefas que estejam directamente ligadas com o seu papel

de mãe que deve prover alimentos para a família e, como a agricultura é a base e fonte desses

alimentos, elas devem tomar consciência do trabalho com a terra de modo a reconhecerem o

valor dos produtos agrícolas para a família. De facto, na visita de estudo, o aluno procede a

observação directa do meio, “ ... o meio não é, nem pode ser, apenas objecto de estudo distante

da escola (...). É a sua própria realidade, o seu mundo, ´onde se vive’ e onde a escola existe, é a

sociedade que se deseja transformar... ” (FELTRAN e FILHO, 2003:126).

2.2. Unidade II- Processamento de alimentos

Nesta temática orienta-se à necessidade de conservação de alimentos e a melhoria da

dieta alimentar a partir do processamento dos produtos agro-pecuários, por meio de sua

confecção pela cozedura e/ou secagem. Este procedimento sugere a inserção da culinária no

PEA, podendo ser enquadrada na disciplina de ofícios.

A Vila de Lionde, potencialmente agrícola, é dominada por hortaliças como o tomate e,

verduras; por leguminosas como o amendoim e, por tubérculos como a mandioca e a batata. A

partir da culinária, ensina-se as crianças e, sobretudo, as meninas a confeccionar alimentos de

forma diversificada, melhorando a dieta alimentar da família, e a conservar os produtos para

épocas de escassez. Seguem-se alguns exemplos de processamento de alimentos:

2.1.1. Tomate

O tomate é bastante cultivado e utilizado na cozinha da comunidade de Lionde. Na época

fresca, a colheita supera as necessidades da população local, chegando a ter excedente para a

venda, várias vezes sub-aproveitado. Para reduzir ao máximo as perdas, os agricultores podem

transformar o tomate em diversos produtos conservados para uso doméstico ou de valor

acrescentado, como fonte de rendimento, como é o caso do pó, da polpa, da compota de tomate,

entre outros.

a) O pó de tomate é obtido com o seguinte procedimento:

Começa pela escolha de tomate maduro, fresco e de boa qualidade; de seguida é lavado

em água limpa e corrente num balde grande; corta-se o tomate em rodelas com uma espessura

fina de cerca de 0,5 cm. Estas são colocadas numa superfície lisa e limpa para que sequem ao sol,

cobertas de uma rede mosquiteira para evitar impurezas que as possam contaminar. Para a

finalização, o tomate seco é moído com a ajuda dum moinho de martelo, num pilão ou alguidar e

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vai-se peneirando até conseguir o pó de tomate que será colocado em saquinhos de plástico

selados, com cera de vela ou com a chama da lareira e guarda-se num lugar fresco e seco até a

época seguinte.

b) Relativamente à produção da polpa de tomate, o processo começa também pela

selecção de tomate maduro, vermelho e fresco, que é lavado e, depois, fervido para a cozedura

em água suficiente até ficar mole e a pele desfeita facilmente. É retirado da água com a ajuda

duma escumadeira ou coador e posto num outro recipiente onde são esmagados com a ajuda de

uma colher de pau, separando a polpa das sementes e da pele.

2.2.2. O amendoim

O amendoim é um produto agrícola bastante apreciado em Lionde e um condimento

importante na cozinha desta comunidade. É utilizado na confecção do caril de verduras, carnes,

aves e mariscos. É um petisco que não pode faltar para deliciar os momentos de convívio na

presença de alguma bebida. No que se refere à feitura de caril, descrevemos abaixo algumas

receitas com verduras dominantes em Lionde e, apelamos para incentivar as meninas a sua

experimentação.

a) Caril de folha de abóbora (mboa), matapa, couve, nhemba

Ingredientes:

* 200 g de amendoim descascado e pilado

* 1 cebola picada

* 700 g de camarão fresco ou seco cozido e descascado

* 700 g de folhas de abóbora (mboa), ou de folhas de mandioca pilada ou moída (matapa), ou de

folha de couve, ou de folha de feijão nhemba

* 2 dl de leite de coco

* 2 tomates maduros

* sal qb.

Preparação:

lavam-se as folhas de abóbora, de couve ou de nhemba em água limpa, depois são

cortadas em tiras. No caso das de mandioca, estas são piladas até constituírem uma pasta.

Cozem-se em água temperada com sal e, depois, são espremidas ou deixam-se a escorrer num

passador. Leva-se numa panela ao lume o óleo e a cebola picada a alourar. Junta-se o tomate,

sem pele nem sementes e deixa-se cozer até este desfazer-se. Adicionam-se a este refogado as

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folhas de abóbora, de nhemba, ou de mandioca escorridas. Juntam-se o leite de coco, o camarão

e o amendoim pilado e desfeito em um pouco de água. Tempera-se com sal a gosto. Leva-se

novamente ao lume para apurar. Serve-se acompanhado com xima/usva ou arroz branco.

Estas propostas estão ao alcance das escolas de Lionde pois, existem condições para a sua

efectivação de modo a lograr a variação da dieta alimentar local. Incentiva-se aos professores e,

sobretudo, as professoras, para estimularem a rapariga a empenhar-se nestas actividades pois, no

que tange aos alimentos, na sociedade moçambicana, cabe às mulheres a cozinha. Assim, e tendo

em conta que a maior parte da população moçambicana é constituída por mulheres, cerca de 52%

das quais 72,2% encontram-se a viver na zona rural e, destas 23,2% são chefes de agregado

familiar (PARPAII-2006/2009), estas precisam de estar aptas para a sua sustentabilidade, ou seja,

habilitadas a construírem as condições básicas para a família.

2.3. Unidade III- Artesanato

A caracterização desta unidade temática sobre o artesanato insere-se na disciplina de

Ofícios no I e II ciclo. Durante as aulas, o professor faz a recolha das principais realizações e

produtos artesanais locais, dialogando com os alunos sobre, por exemplo, utensílios domésticos,

instrumentos de trabalho e de ornamentação existentes nas suas casas e/ou na comunidade,

estimulando a atenção sobre o seu valor. É importante questionar sistematicamente sobre a

importância de cada instrumento para a comunidade como forma de incitar a necessidade do seu

reconhecimento e disseminação na escola e na comunidade.

Alistados os instrumentos mais usados em Lionde, segue-se a fase de discutir a sua

produção e avaliação do material necessário, bem como a identificação de mestres capazes de

ensinar às crianças as técnicas do ofício, que podem ser os próprios alunos, professor ou alguém

da comunidade. Entende-se que estas actividades contribuem não só para a organização, limpeza

e aprumo, mas também para a obtenção da renda pela venda dos produtos, reduzindo a pobreza.

“(...) já pode pregar botão no uniforme e, (...) as meninas são asseadas” (Maria Inês Ubisse)3.

Sugerimos que os produtos resultantes destas aulas possam beneficiar os alunos e que se

promovam exposições nas escolas, nos bairros ou na Vila do Milénio no final do ano lectivo. Os

melhores trabalhos devem ter uma menção honrosa, em especial os das raparigas, atribuindo-lhes

diplomas de honra e de participação. Os valores arrecadados podem servir para a compra de

materiais que servirão para o sustento da oficina pedagógica.

3 Directora da EPC Maguiguana. Entrevista no dia 11/03/010.

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2.4. Unidade IV- Canto e dança

O reconhecimento do património cultural de Moçambique, em geral, e de Lionde, em

particular, reveste-se de grande importância pois constitui a nossa identidade, o nosso orgulho

como cidadãos deste País. Pelo canto e dança, expressamos os nossos sentimentos de alegria,

angústia, ansiedade, amor, dor, fraternidade, amizade, ódio, revolta etc, inserimos mensagens

diversas. Eles permitem não só o exercício corporal e vocal, como também a comunicação

interpessoal dos indivíduos.

É preciso que se faça um levantamento deste manancial cultural junto dos alunos e da

comunidade. Na disciplina de Língua Portuguesa, propõe-se que o aluno redija as suas canções,

um exercício que ajuda a criança na leitura, escrita e interpretação. No contexto da interpretação,

o professor pode ainda fazer uma ponte com as ciências sociais, tendo em conta o conteúdo da

referida canção, que pode ter a ver com um acontecimento histórico, social e/ou político.

Paralelamente, cria-se um grupo coral da turma/escola que se pode apresentar em datas festivas

e/ou comemorativas da escola e da comunidade.

No concernente à dança, a sua inserção no PEA pode acontecer no âmbito da disciplina

de Ciências Sociais e de Educação Física. O movimento corporal que esta actividade cultural

exige possibilita a manutenção e disposição do físico do praticante, além da beleza que o

espectáculo proporciona.

Na Vila do Milénio, a comunidade aprecia danças como a makwaela, makway, muthimba

e outras que estão intimamente ligadas a cerimónias tradicionais diversas, mas também ao

convívio. “As crianças vão a escola para ler e aprender, mas porque não podem aprender a

dançar? Essas danças são bonitas (...) a makwaela é simples, se não é dançada pode

desaparecer. Não é xingombela não serve para crianças (...) a noite” (Barbosa Jossias

Mucave)4.

À semelhança do canto, a criação de um ou vários grupos de dança na escola e, a

promoção de espectáculos e intercâmbios com outras escolas em datas festivas vai, certamente,

impulsionar a recuperação e perpetuação destes valores culturais e permitir entretenimento das

crianças e da comunidade neste mundo cada vez mais globalizado. É preciso dar a oportunidade

aos alunos, professores e pais ou encarregados de educação para trazerem este legado para a

escola e, naturalmente, desta irá acontecer a retribuição com a disseminação na comunidade.

4 Encarregado de Educação da EPI de Lionde E. Entrevista no dia 10/3/010.

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2.5. Unidade V- Jogos

Na comunidade de Lionde praticam-se os jogos de Ncuva, Muravarava, Mathakuzana e

Neka, sendo os dois primeiros dominados por rapazes enquanto a Mathakuzana e a Neka são

favoritas das meninas.

2.5.1. Mathakuzana

Este jogo é realizado por duas equipas de 3 a 5 crianças. Cada par de jogadores

adversários faz uma cova na qual são postas 12 pedrinhas ou sementes chamadas vana. As duas

equipas sentam-se frente a frente com uma fila de covas no meio. Cada par de jogadores tem um

fruto ou pedra relativamente grande, chamada mugungu. A realização do jogo compreende duas

fases:

A primeira fase consiste em realizar as casas de 1 a 12. Para fazer a casa um, os

jogadores de uma equipa lançam o mugungu, tiram todos os 12 vana da sua cova e devem

receber o mugungu no ar usando a mesma mão. Em seguida, põem-se os vana uma a uma usando

o mesmo processo: lançam o mugungu e põem um nwana na cova e recebem o mugungu no ar.

Repetem a actividade, movimentando os vana para a cova 2 a 2, 3 a 3, 4 a 4, assim por diante até

completar a casa doze. Os jogadores da mesma equipa jogam em simultâneo, sendo suficiente

que um deles cumpra as exigências da casa em execução para todos passarem para a casa

seguinte. Se todos os jogadores da equipa falharem, por não assegurar o mugungu no ar ou por

não movimentar o número certo de vana, passa para a outra equipa.

Na segunda fase, cada jogador põe os 12 vana por cima das suas mãos com as palmas

voltadas para baixo. O jogador deve atirar os vana para o ar e depois tentar agarrar no ar o maior

número possível. Cada nwana agarrado, significa um ponto para a equipa. Todos os jogadores

devem anunciar o número de pontos que fizerem, sem ver os vana que foram agarrados e que

estejam nas suas mãos nem os que caíram. Estes são rapidamente tapados pelos seus adversários.

Portanto, o jogador aproveita ver os vana enquanto caem. Finalmente a equipa determina o

número total de pontos feitos pelos membros, adicionando-os. Depois segue a outra equipa

começando a jogar da casa um ou da última casa que tinha chegado. Geralmente, o jogo é

realizado com muita rapidez, as equipas com cinco jogadores chegam a fazer as casas de 1 a 12

em um minuto.

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Fig:3 Crianças jogando mathakuzana

2.5.2. Neka

Consiste em traçar no chão uma figura caracterizada por rectângulos e quadrados

chamados “casa”, que deverão ser alcançados e atravessados pelas crianças no processo do jogo.

Neste jogo, é necessário um mugungu ou dado que é atirado para dentro do quadrado ou

rectângulo e, uma vez posicionado, é arrastado por um dos pés da jogadora para percorrer as

diferentes “casas” da neka até alcançar a última casa e retornar ao ponto de partida, marcar

pontos e continuar o jogo.

A pontuação caracteriza-se pela escolha e marcação de uma “casa” que é vedada ao

adversário, ou seja, este não pode pisá-la nem o seu mugungu alcançá-la se não quiser perder a

sequência do jogo quando for a sua vez.

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Fig. 4: Traçado para neka

2.5.3. Ncuva

Para a consecução deste jogo, é preciso proceder a construção de um tabuleiro que

consiste em quatro filas que variam de quatro a vinte e quatro. Este tabuleiro pode ser concebido

no chão, numa tábua de madeira e/ou de betão/cimento.

Constituem-se equipas que podem ser de um ou mais jogadores, que disputam a

movimentação e o posicionamento de vana do tabuleiro um de cada vez, até retirar

completamente os vana do adversário.

Fig.5: Tabuleiro para Ncuva

Estes jogos ajudam as crianças a reconhecer as quantidades, números os agregados

resultantes de operação e/ou adição, sobretudo na fase da pontuação a que o jogo se refere.

Desenvolvem diferentes estratégias de encontrar os resultados, a partir da concentração sobre o

número de vana e sua disposição, o que lhes ajuda no desenvolvimento de raciocínio da lógica

matemática. Permitem também que exercitem a mente e o físico com o reconhecimento de

figuras geométricas que são ensinadas na disciplina de Matemática. Desenvolvem habilidades de

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movimento das mãos, dos pés e da visão, que são um estímulo para o desenvolvimento das

capacidades motoras das crianças.

A versão dos jogos aqui descrita não é única, podendo os professores e os alunos

encontrar outras formas e estratégias referentes a estes jogos e outros que contribuam para o

desenvolvimento mental e físico das crianças. A promoção de campeonatos entre alunos e

escolas vai estimular a prática destes jogos, que além da importância referida neste texto, fazem

parte da diversão e entretenimento da comunidade.

2.6. Unidade VI- História local

O princípio didáctico de activação permanente da realidade próxima do aluno, recomenda

que se explore sistematicamente os conhecimentos da vida da criança pois, por um lado,

constituem premissas para a aprendizagem e, por outro, relevam a importância desta no contexto

do desenvolvimento da ciência.

Incitar o aluno a reconhecer primeiro a sua origem no espaço geográfico e no tempo, a

sua idade e data de nascimento, para mais tarde, levá-lo ao conhecimento de datas e lugares de

figuras influentes e/ou acontecimentos importantes no panorama local de Lionde, de Chókwé, de

Gaza e de Moçambique.

Na disciplina de Língua Portuguesa e numa redacção, o aluno é orientado a retratar-se a

si e sua família, realçando os aspectos como: quem sou eu?, donde vim?, e o meu nome?, os

outros?, etc, a descrever a sua árvore genealógica. Este procedimento pode despertar a

curiosidade sobre a origem de Lionde, de Gaza, de Moçambique e a História do País, em geral.

A reconstituição da história local, caracterizando os movimentos migratórios da região e

os conflitos que ocorreram até a ocupação e atribuição no nome de Lionde, o processo de

transmissão de poderes e hierarquia, é muito importante para nos respeitarmos e não nos

deixarmos enganar com os oportunistas (Barbosa Jossias Mucave)5. Existe ainda a possibilidade

de envolver os pais e/ou encarregados de educação e até as estruturas político-sociais da região

para que, em palestras ou simples mesa redonda com a escola, procedam a explicação da história

local, usos e costumes locais, em coordenação com os professores.

2.7.Unidade VII- Saúde e higiene pessoal e colectiva

Os conteúdos relacionados com a saúde e higiene individual e colectiva são de capital

importância, na medida em que abordam aspectos de prevenção das doenças, principal factor da

5 Encarregado de Educação da EPI-Lionde E.

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mortalidade em Moçambique. Nas aulas de Ciências Naturais, é de salientar a inclusão das

doenças mais frequentes em Lionde, as quais, na sua maioria estão ligadas com questões

ambientais como a diarreia, malária, tosse, doenças da pele e as associadas ao HIV-SIDA.

Os professores podem promover um debate sobre a origem destas doenças e sempre na

perspectiva da sua prevenção, de acordo com as condições sociais e ambientais de Lionde

insistindo, por exemplo, para a eliminação de charcos de água, capim com vectores da malária.

Há necessidade de conservação dos poços e o tratamento da água para o consumo, a fim de se

evitar a diarreia e as doenças da pele, que grassam aquela Vila (Lurdes Carlos Nhadumbuque).6

À medida que se apela para a prevenção, a cura também deve ser objecto de diálogo na sala, com

recurso aos conhecimentos sobre as plantas, a sua utilidade a partir da unidade sobre a agro-

pecuária, acrescenta-se o valor medicinal das mais conhecidas e divulgadas em Lionde, no

tratamento das doenças.

À rapariga, impõe-se uma responsabilidade acrescida na prevenção e tratamento das

doenças, na medida em que ela é preparada para assumir-se como futura esposa e mãe e que deve

cuidar da família. Ela deve prevenir-se da gravidez precoce e do HIV e garantir o bem-estar

familiar. A abordagem sobre o HIV-SIDA, no que diz respeito as formas de transmissão e

prevenção desta doença, pode acontecer em coordenação com os programas divulgados pela área

de Saúde e em palestras envolvendo o pessoal da Saúde e da AMETRAMO.

A comunidade pode ser convidada a participar nas palestras sobre doenças, na limpeza e

higiene, para que se reduza a tendência de associá-las a feitiçaria e de se julgar que a educação

sexual na escola, no lugar de contribuir para a mitigação das DTS e SIDA, estimula a prática

sexual precoce e promíscua dos adolescentes. A participação dos pais/encarregados da educação,

especificamente das mães, deve ser privilegiada, sobretudo para o aconselhamento das meninas

para se prevenirem da gravidez precoce e ajudar a persuadir aquelas que, estando grávidas, não

desistam das aulas (Jorge Franscisco Tsamba)7.

A encenação em teatro sobre as causas e consequências das doenças como malária,

diarreia e HIV-SIDA, é uma sugestão a ter em conta na leccionação desta unidade temática.

6 Professora da EPC de Maguiguana. Entrevista no dia 9/03/010.

7 Professor da EPC Maguiguana. Entrevista no dia 10/03/010.

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Considerações finais

Este estudo constatou que a implementação do currículo local enfrenta algumas

dificuldades relativamente a identificação e selecção de conteúdos locais a inserir e na gestão dos

20% do tempo lectivo durante o PEA.

Os resultados da pesquisa revelam que apesar de haver preocupação para o

reconhecimento das actividades e práticas que a comunidade de Lionde desenvolve, que têm a

ver com a prática agrícola e criação de gado reforçadas pelo comércio maioritariamente informal,

muito ainda há que fazer para transformar estas práticas em conteúdos de leccionação no

quotidiano escolar.

Esta inquietação sustenta a ideia de que o reconhecimento é apenas uma das condições

que pode levar a inserção de práticas locais no ensino formal, contudo há necessidade de

encontrar estratégias metodológicas de ensino/aprendizagem para a sua efectivação, de modo a

contribuir para que os objectivos educacionais de formação integral dos alunos sejam alcançados.

Assim, propõe-se uma aliança a partir dos programas de ensino das disciplinas que

caracterizam o I e II ciclos do Ensino Básico entre os conteúdos escolares oficiais e locais nas

diferentes unidades temáticas, com a respectiva metodologia para a sua mediação, na esperança

que a referida sugestão venha a mitigar as dificuldades de implementação do currículo local no

PEA pelos professores de Lionde e, de outros cantos do País com características

socioecónomicas similares a esta região.

Bibliografia

FAZENDA, i. C. A. A integração e interdisciplinaridade no ensino Brasileiro: Efectividade ou

ideologia?. 5.ed. São Paulo, Edições Loyola, 2002.

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Alencastre. Técnicas de ensino: por que não? 15 ed. São Paulo, Papirus, 2003.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Projecto de Fortalecimento da Educação

Primária na Província de Gaza. Textos de Apoio. DPEC de Gaza com o apoio da JICA,

2009.

_____. Plano Curricular do Ensino Básico. Maputo, INDE, 2008.

NICOLAU, Graciela Barraquê. Metodologia de la Eñsenanza de la Geografia. Havana, Editorial

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para o Ensino da Geografia. Lisboa, Editorial Estampa, 1978.

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aprendizagem”. Revista Brasileira de Educação. V.13, N.39. Rio de Janeiro, 2008.

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Percepções dos professores a respeito do ensino da Matemática: um estudo com cinco

professores moçambicanos

Geraldo Deixa 8

José Piletichi9

Resumo

Este artigo trata de um estudo das percepções de cinco professores a respeito do ensino, que decorreu na

Escola Pré-universitária 25 de Setembro, cidade de Quelimane, Província da Zambézia, Moçambique, em

2013. Tem como objectivo investigar as práticas dos professores em exercício. Foi adoptada a pesquisa

qualitativa com base na análise de conteúdo (Bardin, 2011). Os dados foram colectados por meio de uma

entrevista semi-estruturada e utilizou-se a matriz 3x3 como instrumento de análise das preocupações dos

professores em exercício nas práticas lectivas. Da análise das falas (depoimentos) sintetizadas na matriz

por meio das suas respectivas codificações, constatou-se que a preocupação daqueles professores ainda

continua o ensino. Isto releva a ausência de reflexões a respeito do ensino, dos conteúdos e das

aprendizagens. Esse constrangimento pode concorrer para o fraco aproveitamento pedagógico dos alunos

e para ausência de qualidade das acções docentes em sala de aula.

Palavras-chave: Percepções dos professores, Relação com o saber, Ensino da Matemática, Formação de

professores.

1. Introdução

O presente artigo tem como objectivo investigar as práticas dos professores de

Matemática após sua formação superior ao actuar no Ensino Secundário Geral. Aborda os

saberes e os valores que são mobilizados para o ensino. Tomou-se como ponto de partida os

seguintes questionamentos: 1) Que repertório de conhecimentos aqueles professores mobilizam

para o ensino após sua formação superior? 2) Que preocupações os professores em exercício

mostram durante as suas práticas lectivas? Preocupam-se com o ensino; com os conteúdos ou

com a aprendizagem? Por outras palavras a distribuição das suas falas nos diferentes sectores da

matriz 3 x 3 será equitativa?

Em Moçambique, a educação, desde o ensino básico até ao superior, tem sido, nos

últimos anos, objecto de críticas e discussões. Tanto a sociedade civil, educadores e estudantes,

quanto os políticos, têm-se mostrado preocupados com o rumo que vai tomando dia-a-dia. Essas

discussões revelam, quase sempre, a falta de qualidade no ensino e na aprendizagem e a

necessidade de se ter profissionais capacitados na tarefa social de educar. Poucos são os estudos

que investigam as preocupações de um professor após a sua formação superior, isto é, em

exercício.

8 Doutor em Ensino de Ciências e Educação Matemática pela Universidade Estadual de Londrina/Brasil, docente da

UP-Quelimane. 9

Licenciado em Ensino da Matemática pela Universidade Pedagógica, Quelimane, docente da Escola Secundária de

Inhassunge, Zambézia.

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Arruda, Lima e Passos (2011) ao estudarem as reflexões dos estagiários brasileiros sobre

suas experiências durante a realização do estágio, constataram que a maior preocupação dos

estagiários estava voltada ao ensino e à sua actuação como professor. Pouca ênfase era dada a

respeito da aprendizagem dos alunos e sua relação com o conteúdo. Diante desse cenário, que

tendências alguns professores moçambicanos, após sua formação superior, mostram durante o

seu trabalho?

Este artigo encontra-se dividido em quatro partes. Na primeira parte, foi aprofundada a

revisão sobre a relação com o saber (CHARLOT, 2005), os diferentes saberes necessários para o

exercício da docência com destaque ao saber experiencial (TARDIF, 2012), na segunda parte,

abordam-se os caminhos desta investigação, na terceira parte, os resultados da pesquisa, que

foram discutidos à luz da teoria adoptada e assumindo a intervenção analítica do pesquisador; o

artigo finaliza colocando algumas considerações.

2. Fundamentação teórica

O professor pode olhar o ensino não só como um mecanismo de transmissão e mediação

de conhecimentos, mas também como um meio transformador do cidadão.

Para Libâneo (2006:16), “o trabalho docente é parte integrante do processo educativo

mais global pelo qual os membros da sociedade são preparados para a participação na vida

social”. O professor é um transformador e está acima de qualquer outra profissão, porque ele

mexe com a educação que, com certeza, é a coluna vertebral de uma sociedade. A educação tem

o poder de transformar e é através dela que surge um pensamento divergente, que defenderá uma

ideia capaz de mudar toda uma nação. Partindo desse princípio, pude-se perceber que um dos

papéis do professor é formar cidadãos capazes de produzir mudanças na sociedade e não somente

distribuir diplomas que, no concreto, não se traduzem em nada. É preciso que o professor seja

capaz de reflectir sobre os saberes necessários à sua profissão e estudar a sua actuação no sistema

didáctico (CHEVALLARD, 1985). Esses saberes podem ser actualizados por meio de pesquisas

envolvendo os próprios professores, como actores principais nos seus ambientes de trabalho.

Várias pesquisas no campo do ensino mostram a necessidade de formalizar o magistério, isto é,

de nomear os seus saberes. Tal formalização remete à identificação das características das

actividades do professor na sala de aula; análise e comprovação dos saberes por eles mobilizados

e por uma problemática da mediação desses saberes estáveis apropriados a uma situação

complexa (GAUTHIER et al., 1998:288).

Os educadores e pesquisadores, o corpo docente e a comunidade científica tornam-se dois

grupos cada vez mais distintos, destinados a tarefas especializadas de transmissão e de produção

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dos saberes sem comunicação directa entre si (TARDIF, 2012:35). Essa separação pode

prejudicar o desenvolvimento profissional do professor, tendo em conta que ele necessita de ter

uma visão geral sobre o ensino, os conteúdos e a aprendizagem, actualizando os seus saberes.

A separação entre ensino e pesquisa como pólos diferentes é evidente. Enquanto as

universidades produzem os saberes, os professores aplicam-nos, ou seja, aos professores são

reservadas as competências técnicas e pedagógicas para a transmissão de saberes elaborados por

outro grupo (modelo tradicional de formação profissional). Essa separação é caracterizada pela

ausência de centros de pesquisas que pudessem envolver professores de diferentes níveis de

escolaridade, entre ensino primário, secundário, educação de adultos, institutos de formação de

professores primários, escolas comerciais e industriais e as universidades. Ainda, o pouco que se

produz nas universidades quase não é consumido, visto que os professores tomam os livros

didáticos como o único instrumento que pode fornecer os saberes escolares aos alunos, o que

torna cada vez mais complexo os processos de ensino e de aprendizagem (DEIXA, 2014).

Todavia, os saberes que podem ser construídos a partir da interacção universidade – escola

aprimoram a prática docente e pode ser uma variável importante para uma reflexão a respeito da

qualidade da educação no nosso País. Outro aspecto não menos importante está relacionado com

o trabalho pedagógico do professor, por isso, devemos buscar a resposta de: "o quê; porquê;

como; para quê; quando; onde trabalhar com os alunos? O que vou fazer com essa turma? O que

eu quero com essa turma?".

Sendo o saber docente um saber plural e também temporal constituído pelos saberes de

formação profissional, proveniente das instituições de formação de professores (formação inicial

e contínua), saberes disciplinares (conteúdo das matérias ensinadas na escola), curriculares

(programas e livros escolares: objectivos, conteúdos, métodos), experienciais (proveniente da

prática da profissão) e saber cultural. O saber cultural é herdado da trajectória da vida do

professor e da sua pertença a uma cultura particular que partilha em maior ou menor grau com os

alunos. Todos esses saberes são relevantes e inseparáveis para a formação da personalidade do

professor e necessitam de uma integração. O saber docente é temporal visto que é adquirido no

contexto de uma história da vida e de uma carreira profissional. Pressupõe aprender a ensinar, ou

seja, aprender a dominar continuamente os saberes necessários à realização do trabalho docente

(TARDIF, 2012). A ausência da sua integração pode fazer com que um professor ao terminar a

sua formação profissional, muito cedo abandone os saberes adquiridos na formação e opte pelos

saberes escolares presentes nos livros didáticos (DEIXA, 2014). Os saberes dos professores

universitários e dos da escola secundária e primária são heterogéneos visto que provêm de fontes

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diversificadas. O saber escolar situa entre o saber quotidiano e o saber científico (PAIS,

2011:52).

Essas múltiplas articulações entre a prática docente e os saberes fazem dos professores

um grupo social e profissional cuja existência depende, em grande parte, de sua

capacidade de dominar, integrar e mobilizar tais saberes enquanto condições para a

prática [...] (TARDIF, 2012:.39).

O simples facto de os alunos não compreenderem as matérias pode ser um motivo de

preocupação para o professor pesquisar as razões da não compreensão. Assim, o problema

fundamental não é como ensinar o aluno, mas como mudar a relação com o saber. A relação do

professor com o saber pode ser tanto motivo de alarme quanto do sucesso dos seus alunos

(CHARLOT, 2005). E como resgatar essa mudança tendo em conta que os saberes do professor

são múltiplos?

Um professor incita, de uma forma directa ou indirecta, o aluno a seguir um estilo de vida

em função daquilo que são as práticas do próprio professor; cada criança, durante o processo de

aquisição de conhecimentos, procura ter um professor como modelo, mesmo na escolha de um

futuro curso, o professor tem um papel fundamental na criança. Assim sendo, pode ser um

pensador da cultura, assumindo o seu papel de transmissor da mesma, para o qual é pago, mas

mantendo a crítica e a reflexão sobre a mesma.

Assim, concorda-se com Bachelard apud Pais (20011:12), quando argumenta que "toda

análise teórica deve ser submetida ao crivo de uma verificação experimental". Para Pais (2011),

o professor, para além de ser Matemático, ele procura fazer a dupla função: encontrar modelos de

explicação dos conceitos matemáticos que sejam acessíveis aos alunos de modo que esses

possam compreender bem as ideias matemáticas subjacentes.

O educador matemático é aquele que concebe a Matemática como um meio: ele educa

através da Matemática. Tem por objectivo a formação do cidadão e, devido a isso, questiona qual

a Matemática e qual o ensino são adequados e relevantes para essa ou aquela formação (PAIS,

2011:10). Tal questionamento remete a uma transposição didáctica com vista atender as

demandas dos alunos em termos de conhecimentos que lhes possam servir para o seu quotidiano.

Para que haja qualidade na divulgação e socialização das ideias matemáticas, é preciso

que os professores de Matemática, a quem cabe a responsabilidade de divulgar essas ideias,

sejam profissionais. Com o termo “profissionais”, refere-se a pessoas com preocupação de

melhorar as suas aulas e actualização por meio de pesquisa - acção que pode decorrer na sala de

aulas com os seus alunos. Essa pesquisa não exige que o professor se desloque para outro canto a

fim de colectar dados. Ela não tem um lugar predeterminado para começar, trata-se de um

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trabalho de reflexão permanente, que pode ocorrer em sala de aula ou fora dela. A pesquisa para

um professor constitui um eixo fundamental para o seu desenvolvimento profissional,

aprimorando os seus conhecimentos matemáticos e as suas práticas do ensino. O professor

percebe o ensino, o conteúdo e aprendizagem com os seus próprios olhos.

Desse modo, os saberes gerados a partir do trabalho são fundamentais para o ensino e,

precisam de ser validados pela comunidade científica. São saberes ligados ao sistema didáctico.

O sistema de ensino é formado pelas escolas que, por sua vez, sofrem influência da noosfera

(pesquisadores, políticos, administradores, sectores da Educação, etc). A noosfera, por sua vez, é

influenciada pela sociedade onde se localizam tais escolas (CHEVALLARD, 1985). Em todo o

caso, o foco está no trabalho. O professor precisa gerir a relação do saber com o aluno. Ele não

tem controlo sobre o que ensina. Quem decide o que deve fazer está na noosfera. As actividades

do professor ocorrem em interacção com pessoas, num contexto onde o elemento humano é

determinante e dominante. Tal interacção, naturalmente, ocorre numa escola que funciona com

normas que precisam ser seguidas. Assim sendo, os saberes devem ser verdadeiros para a

comunidade científica.

Concorda-se com TARDIF (2012) ao defender que o saber é uma informação da qual um

sujeito se apropria e está sujeita a mudanças ao longo do tempo e, resulta de múltiplas interações.

Por isso, o saber dos professores é incompleto visto que sempre está em construção ao longo da

carreira, necessitando da sua validação, o que remete a necessidade de trabalhos em equipa com

outros professores, investigadores, seminários, congressos, conferências, entre outras formas de

divulgação e debate dos conhecimentos científicos; o saber dos professores parece estar assente

em transformações constantes entre o que eles são e o que fazem. O ser e o agir, ou melhor, o

que eu sou e o que faço ao ensinar [...] (TARDIF, 2012:16). Os saberes do professor são de

vários tipos, dão-se em função do trabalho e são mediados pelo trabalho que exerce.

TARDIF (2012:103) distingue três tipos de saberes do ensino: existenciais, sociais e

pragmáticos. São sociais visto que provêm de fontes diversificadas (tempo da infância, da

formação escolar, formação profissional, na carreira) e são produzidos e legitimados pelos

grupos sociais. São existenciais visto que existem em função da vida, com o que foi, com o que

viveu, com aquilo que acumulou em termos de experiências da vida, em termos de lastros de

certeza. São pragmáticos, porque estão ligados ao trabalho e a pessoa do trabalhador, são práticos

ou operativos e normativos, visto que devem ser adequados às funções, aos problemas reais e às

situações do trabalho, bem como aos objectivos educacionais, são regidos por normas pré-

estabelecidas.

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Assim, o ensino, o conteúdo e a aprendizagem vão sofrendo modificações ao longo dos

tempos, necessitando de uma revisão contínua, observando as condições da época e do local. A

seguir, apresentam-se os procedimentos metodológicos da pesquisa.

3. Procedimentos metodológicos da pesquisa

Participaram do estudo cinco dos dez professores de Matemática em serviço na Escola

Secundária e Pré-Universitária 25 de Setembro, na cidade de Quelimane, em 2013. A escolha

dessa escola justifica-se por ser a mais antiga da Província da Zambézia e que reúne professores

com muita experiência no ensino. Também se justifica por ser uma escola que foi uma referência

nacional, em virtude da maioria dos alunos que frequentaram e concluíram o ensino médio ter

tido bastante sucesso nos exames de admissão para o Ensino Superior. Porém, nos últimos anos

esse cenário mostra-se contrário, facto que levou a que se enveredasse pela pesquisa.

Todos os entrevistados têm o nível mínimo de Bacharelato e o máximo de Licenciatura

em Ensino da Matemática. Possuem uma larga experiência de magistério no ensino primário,

secundário e médio. Os entrevistados foram designados por P1, P2, P3, P4 e P5 para professores 1,

2, 3, 4 e 5, respectivamente.

A escola possui dez professores, mas devido ao elevado número, facto que poderia

requerer muito tempo para as análises, decidiu-se seleccionar, ao acaso, cinco professores para

participarem do estudo. Para a escolha desses professores, fez-se um baralho de 10 pedaços de

cartolina enumerados, cada pedaço contendo o nome de cada um dos 10 professores. Só iriam

participar do estudo aqueles que fossem sorteados ao retirar, casualmente, os papéis do baralho

(DEIXA, 2010). Esta actividade foi realizada com o delegado da disciplina de Matemática

daquela escola. Foi usada uma entrevista semi-estruturada como forma de possibilitar a inclusão

de perguntas pontuais. Os resultados foram analisados com base em análise de conteúdo,

recorrendo a matriz 3x3 para a classificação dos depoimentos dos professores envolvidos na

pesquisa.

De acordo com BARDIN (2011:125-126), a análise de conteúdo compreende três fases: a

pré-analise; a exploração do material e o tratamento dos resultados; a inferência e a interpretação.

Essas fases não foram definidas sequencialmente nesse estudo. Primeiro, formulamos o problema

e os objectivos da pesquisa e em seguida escolhemos os documentos pertinentes. A preparação

do material da pesquisa e o estabelecimento das unidades de registros ou indicadores foram

obtidos via idas e vindas das leituras flutuantes do corpus. Corpus é o conjunto dos documentos

tidos em conta para serem submetidos aos procedimentos analíticos. Constituiu o corpus da

pesquisa os depoimentos dos entrevistados. Esse movimento sucessivo nos permitiu a

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compreensão e aprofundamento do problema da pesquisa. Fez-se o uso da intuição durante a

organização do material de forma a delinear-se um caminho que facilitasse a análise. A

preparação do material exige o cumprimento de algumas regras. A regra da exaustividade utiliza

a exaustão junto aos dados do texto de forma cautelosa e com tempo. Nada do material foi

excluído sem explicação. A regra da homogeneidade que permitiu agrupar os termos ou palavras

semelhantes ou que tivessem o mesmo significado e encaixou-se no seu devido sector na matriz

3x3. Teve-se em conta a necessidade de evitar que outro tema, ideia ou texto fossem inclusos no

mesmo segmento da matriz 3x3. A regra da pertinência permitiu adequar o material selecionado

ao conteúdo e ao objectivo da análise. Pelas características que apontamos acima, a nossa

pesquisa toma o carácter qualitativo.

Todos os depoimentos dos entrevistados foram obtidos por meio de entrevistas semi-

estruturadas, o que deu espaço para cada um compor a sua resposta de maneira própria. O

questionário da entrevista não foi previamente encaminhado. Assim, garantiu-se que o

depoimento de cada professor indicasse um valor, sentido ou percepções naquele momento e que

reflectisse a sua prática. A entrevista decorreu na escola, em salas, horários e dias diferentes. Foi

usado um gravador, o que possibilitou gravar todas as informações. Cada entrevistado foi

informado sobre a hora e o local do encontro. Depois da entrevista, transcreveram-se os

depoimentos, que foram agrupados de acordo com o seu teor. Primeiro, analisaram-se os

depoimentos de cada entrevistado e, em seguida fez-se uma análise global envolvendo todos os

depoimentos dos entrevistados. No fim, cruzaram-se os dados da pesquisa com o referencial

teórico e o nosso posicionamento, resultando, desse modo, os meta-textos. Deste modo,

classificaram-se os depoimentos colhidos a partir da matriz 3x3 proposta por Arruda, Lima e

Passos (2011). Codificaram-se os depoimentos/frases em A1, A2, A3, ...., A42. E, em seguida,

os classificamos e agrupamentos na matriz 3x3, conforme o modelo ilustra a seguir.

Quadro 1 - Um novo instrumento para análise da acção docente em sala de aula

Relações com saberes/ novas

funções do professor

1 Gestão do

segmento P-S

(Conteúdo)

2 Gestão do

segmento P-E

(Ensino)

3 Gestão do

segmento E-S

(aprendizagem)

A Epistêmica: compreensão Sector 1ª Sector 2A Sector 3ª

B Pessoal Sector 1B Sector 2B Sector 3B

C social Sector 1C Sector 2C Sector 3C

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Fonte: Arruda, Lima e Passos (2011:147)

Optou-se por analisar, primeiro, o depoimento de cada entrevistado, em separado, usando

a matriz 3x3 e, na segunda etapa, apresentou-se o resumo de todos os depoimentos numa única

matriz. Essa escolha foi relevante visto que nos permitiu estudar as falas dos depoentes com

facilidades.

Descrição dos sectores da matriz

ARRUDA, LIMA e PASSOS (2011) criam a matriz 3x3 a partir do cruzamento das novas

funções do professor (CHEVELLARD, 1985) e as relações com o saber (CHARLOT, 2005).

Nessa matriz, os sectores resultantes do cruzamento entre colunas e linhas mostram o que deve

ser a preocupação do professor/estagiário. Por exemplo, nessa matriz encontram-se três linhas

contendo as relações com o saber, nomeadamente: epistêmica (compreensão); pessoal

(relacionado com a identidade com o saber) e social (diz respeito aos valores dados pela

comunidade em que o sujeito vive). A matriz contém ainda três colunas ou segmentos: P-S (diz

respeito a gestão do professor com o conteúdo), P-E (diz respeito a gestão das relações do

professor com o ensino) e E-S (diz respeito a gestão das relações do professor com a

aprendizagem). Assim, do cruzamento das linhas e colunas, surgem os nove sectores: 1A; 2A;

3A;1B; 2B; 3B; 1C; 2C e 3C. O sector 1A diz respeito a compreensão do conteúdo que o

professor ensina. Para o professor ensinar algum conteúdo é condição necessária que o

compreenda primeiro. O sector 2A remete a relevância de que o professor precisa de

compreender os fenômenos ligados ao ensino que vai exercer. Essa compreensão o ajudaria a

avaliar as aprendizagens adquiridas pelos alunos (3A). O sector 1B mostra que o professor para

além de dominar os conteúdos, a pedagogia e processos avaliativos, é importante que ele goste

dos conteúdos, da sua tarefa (2B) (ensino) e o desejo de ver os alunos aprender as matérias (3B).

Deste modo, o professor pode detalhar os conteúdos ao aluno, evitando que esconda algum para

depois solicitar no teste. O sector 1C refere aos conteúdos, a busca de aperfeiçoamento por meio

dos cursos de curta duração, seminários, capacitações, planeamento dos conteúdos com o grupo

de estudo e a sua partilha com colegas de profissão, alunos e comunidades em geral. O sector 2C

diz respeito ao ensino enquanto actividade social e interativa, as dificuldades e inseguranças

encaradas na interação com outros (pais, director da escola, comunidades, administradores, etc) e

em 3C refere as aprendizagens enquanto actividade social e interativa, a manutenção de um

ambiente adequado às interações e à aprendizagem dos alunos. Desse sector, consta a forma

como são geridos os trabalhos na sala de aula. Percebe-se que uma boa gestão pode ocorrer

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quando as preocupações do professor/estagiário se encontram distribuídas de um modo

equilibrado nos nove sectores da matriz 3x3.

4. Apresentação dos dados

Nessa secção apresentam-se os depoimentos dos entrevistados. O quadro a seguir elucida

uma parte desses depoimentos. Os dados analisados foram colectados no âmbito da monografia

de José Piletichi e reaproveitado para sua reanálise utilizando a matriz 3x3 neste artigo.

Quadro 2 - Depoimentos de todos entrevistados

Professor Depoimentos

P1

A1: É desgastante saber que os alunos não gostam da sua disciplina, não resolvem as

tarefas, se resolvem é por encomenda e eles não percebem nada do que foi feito.

A2: Não consigo manter contacto com os alunos, porque é desgastante trabalhar com

mais de 70 alunos, pelo número de alunos na sala somos obrigados a corrigir mais de 300

avaliações o que satura.

A13: Nunca pensei ser professor de outra coisa que não de Matemática.

A14: A Matemática é fundamental para o desenvolvimento de um pais, é também

instrumento de aprendizagem e da cultura;

A15: Procuro não ser apenas teórico, em cada conteúdo, depois das aulas teóricas reservo

algumas aulas práticas onde resolvo exercícios com os alunos, corrijo os trabalho e

promovo discussões acerca dos conteúdos aprendidos.

A34: Eu penso que a pesquisa é de extrema importância para a nossa actividade de

docência, mas confesso que nunca desenvolvi nenhuma pesquisa, não por falta de

vontade, mas as circunstâncias obrigam que seja assim.

A35: Somos obrigados a ter mais de 300 alunos, corrigir mais de 300 avaliações não é

tarefa fácil de certeza já não resta cabeça para pesquisar.

P2

A3: Sou exigente na conduta pessoal, na linguagem, na forma dos trabalhos, no

cumprimento dos horários e tarefas.

A4: Mas sinto que os alunos não gostam.

A5: Os alunos às vezes preferem faltar as minhas aulas que encararem as minhas

exigências, e sinto-me mal.

A16: Nem todos alunos gostam de Matemática, aliás posso mesmo dizer que 90% dos

alunos não gostam de Matemática, só estudam por não terem outra alternativa, isto é

preocupante para os professores.

A17: Como educador e professor de Matemática, tento passar aos meus alunos, esse

gosto pela Matemática, bem como fazê-los perceber que a cada descoberta, poderemos

qualificar o nosso desempenho, e, portanto, o dos alunos.

A36: Não existe um programa sério que estimule a pesquisa nas nossas escolas, por quê

perder muito tempo com isso se não terá nenhum efeito.

A37: Se para o professor já é difícil pesquisar, fica quase que impossível incentivar o

aluno para a pesquisa.

P3

A6: Às vezes me exponho aos alunos, falo de mim, da minha vida, das minhas

experiências no quotidiano de modo a aproxima-los mais a mim.

A7: Procuro exigir menos aos alunos, nunca puni-los de modo a preservar a nossa

relação.

A18: Em cada aula, dou aos alunos um roteiro de tarefas para a prática, e exijo que eles

apresentem, às vezes classifico a resolução dos alunos.

A19: Nem sempre consigo resolver as tarefas com eles, por isso apelo que eles façam em

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30

grupos.

A38: Vontade de pesquisa não falta, mas onde vamos publicar nossos trabalhos?

A39: Ninguém está interessado com essas pesquisas, nada podemos fazer.

A40: Mas quando dou tarefas aos alunos e eles encontram situações problema nessas

tarefas, penso que para chegarem a conclusão acontece alguma pesquisa, e assim estou a

desenvolver o espírito de pesquisa no seio dos alunos.

P4

A8: Às vezes sinto-me só na sala de aulas, é difícil ver os alunos participarem

activamente na aula, dar as suas opiniões, ir ao quadro resolver exercícios.

A9: Tento excita-los, mas torna-se quase que impossível.

A10: Os alunos não estudam porque desenvolveram uma ideia intuitiva que não precisam

fazer muito esforço para passarem de classe. "no final de tudo o professor será obrigado a

me passar de classe para cumprir com as suas obrigações".

A30: Nas minhas aulas procuro motivar os que participam nas aulas, os que respondem

questões, aumentado alguma nota na sua média final, essa é a maneira que encontrei de

fazer trabalhar os alunos.

A31: Prefiro usar o domingo para planificar ar aulas de toda a semana, às vezes planifico

para duas ou três semanas, assim sobra tempo para minhas actividades e lazer.

P5

A11: Procuro ser mais reservado com os alunos, não falar muito de mim, procuro apenas

cumprir com o meu papel que é a transmissão dos conhecimentos, porque os alunos já

não se mostram amigos do professor.

A12: Às vezes quando nos aproximamos dos alunos, eles pensam de forma errada,

pensam que o professor quer se aproveitar dessa amizade para pedir isso ou aquilo.

A20: Uma das frustrações que tenho refere-se à união da teórica e da prática

A22: Acho que a hora da prática é que é propícia para explorar a teoria. Para nós,

professores de Matemática, a nossa prática se cinge em resolver exercícios entre os

alunos e o professor.

A23: Onde damos liberdade para todos apresentarem livremente as suas ideias.

A32: Para mim planificar não é fazer um esquema da aula, mas sim fazer algumas

anotações do que vou tratar na sala de aulas que nem levo para sala de aulas.

A33 Os alunos ficam motivados quando não levo nenhum papel para me guiar durante a

aula, eles ficam mais confiantes em mim.

A41: Penso que nós, como professores das escolas secundárias, cabe-nos apenas

transmitir conhecimentos aos alunos, há pessoas apropriadas para discutir trabalhos

científicos e mudanças curriculares e são pagos para isso.

Fonte: Organizado pelos autores

Assim, a partir dos depoimentos verifica-se que os entrevistados têm algumas visões em

comum, todos eles afirmam que gostam de ensinar Matemática, apesar das dificuldades que

enfrentam na sala de aula, porque um conhecimento só é válido quando é visto e comprovado.

Outro aspecto que foi salientado em comum por todos os professores foi a alegada falta de

interesse de estudar a Matemática por parte dos alunos. Ainda os professores foram unânimes em

suas entrevistas ao afirmarem que sentem os alunos a se distanciarem deles quando procuram ser

mais exigentes, afirmaram que os alunos pouco se interessam com as exigências dos professores,

desvalorizam a sua presença na sala de aula. A seguir apresenta-se a caracterização dos

depoimentos de cada professor entrevistado.

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31

Quadro 3 - Caracterização dos depoimentos do P1 na matriz 3 x 3

Relações com saberes/ novas

funções do professor

1 Gestão do

segmento P-S

(Conteúdo)

2 Gestão do

segmento P-E

(Ensino)

3 Gestão do

segmento E-S

(aprendizagem)

A Epistêmica: compreensão A13; A14; A34 A1; A2; A15; A24;

A25

B Pessoal A2; A35

C social

Fonte: Organizado pelos autores

No quadro anterior (3) pude-se observar que as atenções dos entrevistados estão mais

ligados aos conteúdos e o ensino (sectores 1A e 2A) e pouco se preocupam com a relação pessoal

e com a aprendizagem (sector 3B). Os restantes sectores não receberam algum tratamento. Os

entrevistados entendem que a produção de conhecimentos é mal percebida pelos alunos.

“quando os professores adoptam a produção de conhecimentos na sala de aulas, os alunos

pensam que o professor está a fugir das suas responsabilidades, até chegam a pensar que o

professor não tem o domínio da matéria”, deste modo os professores preferem adoptar a

reprodução de conhecimentos, que é a simples transmissão de conhecimentos, “os nossos alunos

são preguiçosos, eles preferem os conhecimentos prontos para serem consumidos, acabados,

eles não gostam de procurar e nem de pensar”. Os entrevistados mostraram-se preocupados com

a linguagem utilizada na sala de aula, no sentido de que ela seja vinculadora da compreensão e

não um meio de ocultamento da mensagem. “um professor pode ter um grande domínio da

matéria, mas se durante a passagem dessas matérias para os alunos não usa uma linguagem

simples e popular, uma linguagem objectiva, os alunos não vão perceber nada”. Os

entrevistados reconhecem esse valor e estão conscientes que para a percepção da matéria, já

fazem algum esforço, e não pode ser o professor a exigir mais esforços ao aluno para

descodificar a linguagem que o professor traz, amenizando-a. A seguir apresentamos a

caracterização dos depoimentos do P2.

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Quadro 4 - Caracterização dos depoimentos do P2 na matriz 3 x 3

Relações com saberes/ novas

funções do professor

1 Gestão do

segmento P-S

(Conteúdo)

2 Gestão do

segmento P-E

(Ensino)

3 Gestão do

segmento E-S

(aprendizagem)

A Epistêmica: compreensão A3; A26

B Pessoal A17; A27 A5; A16

C social A4; A36; A37

Fonte: Organizado pelos autores

No quadro anterior (4) notou-se que a maior preocupação do P2 está no ensino (1A, 1B e

1C) e pouca atenção na aprendizagem (sector 3B). Não há preocupação com o conteúdo. Assim,

pode-se compreender a ausência de pesquisas nos entrevistados uma vez que depois da sua

formação não desenvolveram nenhuma pesquisa, “nunca produzi nem publiquei nenhum

trabalho resultado de uma pesquisa, mas às vezes costumo produzir textos de apoio a partir dos

livros”. Outros ainda dizem que a falta de tempo e dinheiro são o factor principal para a ausência

de investigação nas nossas escolas, “não existe nenhum programa concreto que estimule a

pesquisa e nós não podemos fazer nada”. O quadro a seguir elucida a caracterização dos

depoimentos do professor P3 na matriz 3x3.

Quadro 5 - Caracterização dos depoimentos do P3 na matriz 3 x 3

Relações com saberes/ novas

funções do professor

1 Gestão do

segmento P-S

(Conteúdo)

2 Gestão do

segmento P-E

(Ensino)

3 Gestão do

segmento E-S

(aprendizagem)

A Epistêmica: compreensão A7; A18; A19 A38;

B Pessoal A6;

C social A20 A29; A39; A40 A28

Fonte: Organizado pelos autores

Nota-se também que as preocupações do P3 assentam no ensino (2A, 2B e 2C) pouca

atenção é dada aos sectores 1C, 3A e 3C. A ausência de preocupação pelo conteúdo e pelas

aprendizagens pode nos revelar que os professores não pesquisam para o aprimoramento do

ensino, limitando-se a transmissão de conhecimentos. A seguir, apresenta-se a caracterização dos

depoimentos do P4.

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Quadro 6 - Caracterização dos depoimentos do P4 na matriz 3 x 3

Relações com saberes/ novas

funções do professor

1 Gestão do

segmento P-S

(Conteúdo)

2 Gestão do

segmento P-E

(Ensino)

3 Gestão do

segmento E-S

(aprendizagem)

A Epistêmica: compreensão A18 A18

B Pessoal A8; A30; A31

C social A19 A10

Fonte: organizado pelos autores

No quadro anterior (6) nota-se que a preocupação do P4 também vai para o ensino (2A e

2B) e ainda pouca atenção com o conteúdo (1A, 1C) e menos com a aprendizagem (sector 3C).

Esse resultado mostra que apesar de esse professor possuir muita experiência do magistério, a

preocupação principal continua a de ensinar. A seguir apresenta-se a caracterização dos

depoimentos do P5 na matriz 3x3.

Quadro 7 - Caracterização dos depoimentos do P5 na matriz 3 x 3

Relações com saberes/ novas

funções do professor

1 Gestão do

segmento P-S

(Conteúdo)

2 Gestão do segmento

P-E

(Ensino)

3 Gestão do

segmento E-S

(aprendizagem)

A Epistêmica: compreensão A20; A21; A32; A42

B Pessoal A22

C social A11; A12; A23; A33;

A41

Fonte: Organizado pelos autores

No quadro anterior (7) as preocupações do P5 assentam nos sectores 2A, 2B e 2C. Assim

sendo, apesar do tempo de serviço e o grau académico que esse professor possui, a sua

preocupação continua o ensino.

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Quadro 8 - Caracterização dos depoimentos dos cinco professores na matriz 3 x 3

Relações com saberes/ novas

funções do professor

1 Gestão do

segmento P-S

(Conteúdo)

2 Gestão do segmento

P-E

(Ensino)

3 Gestão do

segmento E-S

(aprendizagem)

A Epistêmica: compreensão A13; A14; A34 A1; A2; A15; A24;

A25; A8; A3; A26;

A20; A21; A17; A27;

A4; A30; A31; A36;

A37; A32

A38

B Pessoal A22; A7; A18; A19;

A20; A21; A32; A42

A2; A35; A5;

A16

C social A19; A20 A6; A11; A12; A29;

A39; A40; A23; A33

A41; A11; A12

A10; A28

Fonte: Organizado pelos autores

No quadro anterior (8) constatou-se que as preocupações dos entrevistados, quando estão

na sala de aula, centram-se no ensino (sectores 2A; 2B e 2C). Este resultado mostra que apesar

dos entrevistados possuírem muita experiência do magistério, o seu foco continua sendo o

ensino, pouco se preocupam com os conteúdos e com as aprendizagens dos seus alunos.

Esperava-se que a distribuição das falas dos entrevistados nos diferentes sectores da

matriz 3x3 fosse equilibrada, dado que se trata de profissionais experientes na área. A seguir

apresentam-se as considerações finais da pesquisa.

5. Considerações finais

Dos resultados obtidos foi possível perceber as diferenças de percepção entre os

diferentes professores que constituíram a pesquisa e as tensões que vivem no desenvolvimento

das tarefas sob sua responsabilidade.

Desse estudo, constatou-se que o grande problema nas escolas não se resume à falta de

professores formados. Há excessiva preocupação dos professores pelo ensino, não havendo

espaço para reflexões a respeito do ensino e da aprendizagem. Foi possível constatar também, a

partir dos depoimentos dos entrevistados, que eles não confiam nos seus alunos. Como

alternativa, propõe-se que haja incentivo para a formação de pequenos grupos ou núcleos de

investigações nas escolas, capacitação de professores a respeito das suas relações com o saber e a

melhoria das condições da vida.

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A pesquisa revelou que a preocupação dos entrevistados reside no ensino confirmando os

estudos de ARRUDA, LIMA E PASSOS (2011). Dado o tempo de serviço e o grau académico

dos entrevistados, deviam estar preocupados com o ensino, o conteúdo e aprendizagem,

estabelecendo suas relações epistêmicas, pessoal e social, Isto é, a distribuição dos depoimentos

pelos sectores da matriz 3x3 deveria ser equilibrada. A ênfase pelo ensino que os entrevistados

mostraram pode ser explicada pelo facto de que a grande preocupação do Ministério da

Educação está mais ligada ao ensino, neste caso, se os professores ensinam bem ou não, de modo

a garantir o aproveitamento pedagógico, que em geral se resume em cifras. Quando há

supervisão dos técnicos pedagógicos nas escolas do País, a sua preocupação tem sido o

cumprimento do programa, ou seja, se o professor ensinou tudo o que foi programado ao longo

do trimestre, semestre ou do ano. A maior preocupação com o ensino mostra que a aprendizagem

pressupõe o ensino. Então, se o aluno foi ensinado é porque aprendeu, caso contrário é a ausência

do interesse pela aprendizagem por parte do aluno. Essa afirmação está em desuso. Daí a

necessidade de investigar os processos de ensino e de aprendizagem bem como dos conteúdos de

aprendizagem.

Referências bibliográficas

ARRUDA, S.M.; LIMA, J. P. C. e PASSOS, M. M. Um novo instrumento para a análise da

ação do professor em sala de aula. In: Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em

Ciências, Vol. 11 No 2, 2011.

BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Tradução: Luis Antero Reto, Augusto Pinheiro. 2ª reimp. da

1ª edição. São Paulo, Edições 70, 2011.

CHARLOT, B. Relação com o saber, Formação dos professores e globalização. Porto Alegre,

Atmed, 2005.

CHEVALLARD, Y. La transposition didactique: du savoir au savoir enseigné. Grenoble,

Éditions la pensée sauvage, 1985.

DEIXA, G.; SALVI, R. "Dificuldades dos professores em exercício no uso da História da

Matemática como alternativa didáctica para o ensino da Matemática". In:

Rev.cient.UEM: sér.Ciên.edu.vol.1, 2014, 63-76.

GAUTHIER.C. et al. Por uma teoria da pedagogia: Pesquisas contemporâneas sobre o saber

docente. Trad. Francisco Pereira. Editora UNIJUI, 1998.

LIBANEO, J. Didáctica Geral. São Paulo, Editora Cortez, 1998.

PAIS, L. C. Didática da Matemática: uma análise da influência francesa. 3. ed. Belo Horizonte,

Autêntica Editora, 2011.

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TARDIF, M. Saberes docentes e a formação de professores. 14. ed. Petrópolis, RJ, Vozes, 2012.

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Educação Para o Sentido em Moçambique

Francisco Valente Fumo10

Resumo

Viktor Frankl, psicoterapeuta que escreveu no ramo da filosofia, parte do existencialismo, humanismo e

do personalismo, e desenvolve uma nova teoria que se chama logoterapia, ou, numa linguagem filosófica,

fenomenologia existencial, análise existencial, que difere do existencialismo. Esta análise existencial

sustenta que o homem, sendo um ser essencialmente espiritual, marcado pela sede de sentido da vida, a

sua existência se dá como liberdade. É nesta dimensão da liberdade em que se deve desenvolver a

educação. Esta (educação) deve responder a sede de sentido da vida que é a textura do ser humano. Uma

educação que ajuda o homem a encontrar o sentido para a sua vida terá como base a liberdade e a

responsabilidade. Em Moçambique, a sede de sentido manifesta-se como vazio ético e crise de identidade,

por isso se deve educar para a liberdade e responsabilidade.

Palavras-chave: Análise Existencial, Logoeducação, Educação, Liberdade, Responsabilidade.

Introdução

Neste artigo, a partir dos conceitos de liberdade e responsabilidade presentes na análise

fenomenológica de Viktor Frankl (1905-1997), oferecemos uma abordagem da educação para o

sentido em Moçambique. Viktor Frankl é o fundador da chamada terceira escola vienense de

psicologia - a logoterapia ou cura através do sentido. A base da apresentação do artigo é

filosófico-educacional.

1. O Homem em Viktor Frankl: Um Ser em Busca do Sentido da Vida

Em Viktor Frankl, não encontramos necessariamente um existencialismo; contudo a

questão da existência é fio condutor do seu pensamento. Se o existencialismo tem como ponto de

partida a situação existencial do homem e a sua vivência existencial, Frankl tem alguma relação

com esta corrente, visto que ele centra sua reflexão sobre a existência humana, considerada no

seu aspecto particular, individual e concreto. Embora tenhamos de referir que em relação ao

sentido da vida, alguns existencialistas afirmam que a vida carece de sentido, sendo em si mesma

um absurdo que, para ser suportado, necessita que se “invente” um sentido para a vida. Já Frankl

afirma que a vida sempre tem sentido, o qual está no mundo, sendo simplesmente necessário que

este sentido seja “descoberto” pela pessoa.

Na análise existencial, orientação antropológica da investigação de Frankl, ele

fundamenta que o homem tem o seu destino marcado pela vida interrogante. Daí que a sua vida

constantemente e dialecticamente pergunta pelo sentido, e o homem responde, se não estiver

10

Mestrado em Educação/Ensino de Filosofia (FCSF - UP), Licenciado em Filosofia (Universidade S. Tomás de

Moçambique) e Bacharel em Teologia (Pontifícia Universidade Urbaniana de Roma).

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imerso no vazio existencial, pelos caminhos do trabalho, experiência de relacionamento ou

vivência amorosa, enfrentando o sofrimento. O homem é um existente que busca um sentido para

a sua vida. A vida do homem clama por um sentido. No entanto, “esta procura de sentido que é

tão distintiva do homem não foi considerada seriamente em seu valor absoluto. Se não existir

algum sentido para o seu viver, uma pessoa tende a tirar-se a vida e está pronta fazê-lo mesmo

que todas as suas necessidades sob qualquer aspecto estejam satisfeitas” (FRANKL, 1989:14).

O homem é um ser que se interroga pelo sentido e procura viver uma vida plena de

sentido. O problema existencial de dar um sentido para a vida e a procura existencial de um

sentido de vida são preocupações que hoje estão presentes em todas as sociedades e em todas as

faixas etárias. Frankl analisa a vida do homem, chega a conclusão de que a vida do homem

contemporâneo (ou pós-moderno) é extremamente complexa e imprevisível, dinâmica, pois o

desenvolvimento tecnológico, traduzido no incremento das vias de comunicação, aglomerações

nas cidades e várias outras tecnologias, não corresponde ao desenvolvimento dos valores morais,

humanos e espirituais.

O problema da nossa época é o vazio existencial, o aborrecimento face à posse de tantos

bens, a ausência de uma realização pessoal mesmo quando se tem todo o sexo e o poder que se

poderia ter. Esta sede de sentido, este sentimento de vacuidade existencial, verificamos de forma

explícita na nossa época, “o vazio existencial cresce cada vez mais, nos últimos dois ou três

anos. Mesmo em África aumentou e, precisamente, entre a juventude universitária”. (FRANKL,

2002a:15).

Segundo Frankl (2002a), a sede de sentido é um sentimento intrínseco ao homem, o ser

humano tem sempre esta sede de sentido, visto que o vazio existencial trespassa, sem permissão,

os limites da ordem social, tanto capitalista como socialista.

Na perspectiva de Frankl (1977), a busca do sentido é uma categoria transcendental,

posto que o homem crê num sentido desde que começa a respirar. A busca do sentido pelo

homem é uma motivação primária na sua vida, não é uma racionalização secundária.

Frankl está convencido de que o sentido é “a mais humana de todas as necessidades

humanas” (FRANKL, 2002a:17), por isso o centro noético da vida humana deve ser a vontade

do sentido. Na sociedade hodierna, esta sede de sentido é evidente. O vazio existencial é o que

caracteriza a sociedade do nosso tempo, visto que na actualidade a preocupação já não é o

instinto sexual reprimido (Freud), nem o sentimento de inferioridade (Adler); mas o sentimento

de futilidade, de carência de sentido e vazio de existência.

Portanto, nas sociedades contemporâneas de consumo e bem-estar, “parte significativa da

população dispõe do mais do que necessário para satisfazer as suas necessidades, mas não

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encontra um sentido para a sua existência” (FRANKL, 2003: 23). Ademais, o vazio existencial

cresce hoje no homem contemporâneo porque “diversamente do homem de outros tempos, não

lhe vem imposto o que deveria fazer por tradições e valores tradicionais. Não existindo tais

imperativos, o homem talvez não saiba mais o que quer fazer” (FRANKL, 1989: 15).

Etiologicamente, a falta de sentido vem principalmente desta falta de paradigmas, o

homem da era da informação compreende-se a partir de si próprio, da sua subjectividade. Esta

orientação foi inaugurada pelo cogito cartesiano e levada para a frente pelo Iluminismo, que

punha o homem como medida de todas as coisas (ideia já presente no pensamento do sofista

Protágoras). Afirma-se pela reivindicação da emancipação do homem e um sentido de progresso

ilimitado e irreversível em ordem a um futuro radioso; e que muitas vezes cai num vazio

existencial, numa futilidade perante a vida. Se a etiologia é fundamentada pela ausência de

paradigmas nos quais o homem pode apoiar a sua existência, a sintomatologia da falta de sentido

se manifesta na depressão, agressão e a toxicodependência que assolam cada vez mais as

sociedades de consumo.

O sentido de que fala Frankl é um sentido pessoal, individual, diferente daqueles do

homem revoltado de Albert Camus, talvez mais próximo de Miguel de Unamuno11

pois para este

filósofo o que mais conta é o homem concreto atormentado pela morte: “ni lo humano ni la

humanidad, ni el adjetivo simple, ni el sustantivado, sino el sustantivo concreto: el hombre.

El hombre de carne y hueso, el que nace, sufre y muere - sobre todo muere”. (UNAMUNO,

1912: 1) Este sentido individual e pessoal, a que se refere Frankl, é possível em todas as

circunstâncias da existência humana. Visto que “tudo depende do homem, devemos agregar:

depende de cada indivíduo”. (FRANKL, 2002a: 92).

Frankl fala explicitamente deste sentido quando, na obra “Um Sentido Para a Vida”, ou

se quisermos na versão original: The Unheard Cry for Meaning, fala da possibilidade de

conseguir o sentido deste modo: “quanto à inegável transitoriedade da vida, a logoterapia

afirma que isto realmente só se aplica com relação às possibilidades de dar um sentido, às

oportunidades de criar, de experimentar, de sofrer com pleno sentido”. (FRANKL, 1989: 95).

O homem pode encontrar sentido em todas as circunstâncias, porque, por natureza, ele é

um ser que decide sempre, “e ele decide sempre de novo o que é, o que será no próximo

momento. Nele existem as possibilidades de ser anjo e de ser diabo”. (FRANKL, 2002a: 90) Ele

não está a dizer coisas teóricas, mas algo que experienciou na sua vida, nas condições mais

trágicas, nos campos de concentração nazis, ele encontrou um sentido para a sua vida.

11

A ideia fundamental de Unamuno é a ideia existencialista típica, reflectir sobre o homem concreto, e não se

concentrar nos seres humanos em geral, ou na Humanidade abstracta.

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Frankl foi durante muito tempo prisioneiro nos campos de concentração. Ali, ele se viu

reduzido aos limites entre o ser e não-ser, recorrendo a linguagem de Kierkegaard. Perdeu toda a

sua família e tudo o que ele tinha. Porém, o que surpreende o mundo é que foi nestas condições

infra-humanas de total ameaça à existência que Frankl chegou a conclusão de que valia a pena

viver, que a vida tem um sentido e que sempre se pode realizar este sentido sejam quais forem as

circunstâncias. Acerca disso, Gordon W. Allport, no prefácio da edição norte-americana de 1984

da obra-prima de Frankl (2004): “Em Busca de Sentido”, questiona-se como Frankl conseguiu

encarar a vida como algo que valia preservar mesmo tendo perdido tudo o que era seu, ver os

seus valores destruídos e esperando a cada momento a exterminação final.

A experiência de Viktor Frankl e a sua filosofia de vida fazem-nos chegar a conclusões

indubitáveis, o homem busca um sentido de vida e pode encontrar este sentido em qualquer

circunstância. O homem, sendo um ser espiritual (não se confunde com a concepção cristã,

refere-se a inteligência a que Frankl chama nous), não apenas biológico e psicológico, anela por

um sentido que fundamente a sua vida. Pois, Frankl entende que é possível dizer sim à vida

apesar de tudo. Assim, Frankl distancia-se sobretudo dos existencialistas ateus, como Albert

Camus (1913-1960), em “O Mito de Sísifo” ou Le Mythe De Sisyphe, que podemos exprimir

nestas termos:

o suicídio é apenas a confissão de que a existência não vale a pena (...) Morrer voluntariamente

implica reconhecermos, mesmo instintivamente, o carácter irrisório desse hábito, a ausência de

qualquer razão profunda de viver, o carácter insensato dessa agitação quotidiana e a inutilidade do

sofrimento (CAMUS, 2002:15).

Frankl distancia-se diametralmente de todos os filósofos que pensam que a existência

humana é sem sentido. Como em Heidegger, que o homem é capaz de compreender o “Ser”

fazendo um desvelamento; em Frankl, o ser humano é capaz de sentido, visto que “o ser humano

é auto-determinante, em última análise. Ele não simplesmente existe, mas sempre decide qual

será a sua existência, o que ele se tornará no momento seguinte”. (FRANKL, 2004:150)

Esta forma de ver de Frankl não se pode confundir com o credo de Sartre: “o homem está

condenado a ser livre”. (SARTRE, 1970: 228) Há uma diferença considerável, pois, para Frankl,

a liberdade não é aspecto absoluto nem primordial, a liberdade está ao serviço da

responsabilidade que conduz à realização humana. A distinção se nota mais se considerarmos

que no pensamento de Frankl o homem se move por valores, ao passo que Sartre sentencia: “se

os valores são, e sempre demasiados vastos para o caso preciso e concreto que consideramos, só

nos resta guiarmo-nos pelo instinto”. (SARTRE, 1970: 232) Em “Ser e Nada”, Sartre (1984)

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coloca a liberdade como textura do próprio ser não como qualidade ou propriedade da natureza

humana.

Frankl, ao defender que o homem não só existe, como também escolhe o modo da sua

existência, liberta o homem do psicologismo, do determinismo e do biologismo, e esclarece a sua

verdadeira natureza de ser homo humanus. Assim, entendemos que o homem é um ser que actua

no mundo e não um ser que reage por estímulos (como no modelo condutivista) ou que

descarrega as suas pulsões e instintos (como no modelo psicodinâmico). O homem é um ser que

se auto-transcendente, que se esquece de si, entregando-se a alguém ou a algo, com

responsabilidade.

2. A Liberdade Responsável Como Lugar da Realização do Sentido da Vida

Uma consulta breve deste termo, na sua origem latina libertate remete-nos a ideia de agir

livremente, ou ausência de constrangimentos, consoante as leis da própria natureza. No contexto

filosófico, não é tão fácil expressar a riqueza e diversidade que o mesmo termo encerra. A este

propósito, Russ, tratando do tema da liberdade, escreveu “liberdade, uma palavra com múltiplos

sentidos e que desempenha todos os ofícios” (RUSS, 2000: 178).

Mas como Frankl compreende a liberdade? Para Frankl, a liberdade tem origem no nous e

diz respeito à dimensão noética ou espiritual do ser humano. A liberdade é uma qualidade

especificamente humana, o homem é um ser livre. Se observarmos para os outros seres, como os

animais, o homem partilha com eles as dimensões biológica e psicológica, mas só ele é que é livre.

Pode agir além da constituição biológica e psicológica; isto é, pode agir como ser espiritual ou

livre. Logo, ao homem, fica sempre reservada uma possibilidade que não esteja nele determinada

biológica e psicologicamente, por isso afirmámos que a dimensão noética é determinante e não

determinada.

Aprofundando ainda mais, podemos dizer que Frankl postula frente aos condicionalismos a

liberdade humana, própria e verdadeira, como capacidade de o homem se situar frente a todos os

determinismos; como já tinham indicado os existencialistas, a liberdade estabelece a essência

humana. A experiência da capacidade da liberdade do homem, de distanciar-se dos seus

condicionamentos e escolher a atitude a tomar ante eles teve sua máxima verificação nos campos de

concentração. Como podemos ler em La Vontad de Sentido:

“Después de que en el marco de una entrevista se me apostrofó que como Profesor de Neurología y

Psiquiatría debería estar informado sobre los condicionamientos biológicos, psicológicos y

sociológicos del hombre invité a reflexionar en el hecho de que no solamente era profesor en dos

especialidades, sino también sobreviviente de cuatro campos de concentración y, como tal, testigo

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de la capacidad del hombre de resistir aún a las peores condiciones. Y si Sigmund Freud dijo una

vez: trátese de exponer al hambre a un grupo de personas diversas y con el aumento de la necesidad

apremiante de alimentos, todas las diferencias individuales se borrarán y, en su lugar, aparecerán las

manifestaciones uniformes de este instinto no gratificado, lo que sucedió en realidad fue más bien

todo lo contrario. En el campo de concentración la gente se volvió más diferenciada aún. Los cerdos

se desenmascararon. Y también los santos. El hambre los descubrió. Esse hambre era el mismo en

un caso y otro. Sin embargo, la gente se diferencia”. (FRANKL, 2002: 150s)

A citação anterior remete-nos a entendermos que a conduta do homem não se dita pelas

condições que ele encontra ou enfrenta, senão pelas decisões que toma, ele decide se resiste ou se

submete a elas (condições). Podemos dizer que todas as decisões têm uma causa, mas são

causadas por aquele que as toma. Assim, percebemos que a liberdade do homem, em Frankl, é

uma liberdade de consciência, de escolher entre duas possibilidades: “a de ouvir a consciência

ou fazer-lhe ouvidos de mercador” (FRANKL, 1986: 80). Liberdade de tomar uma posição

frente aos condicionalismos. Diferentemente de outros pensadores, como Camus, que falam

apenas da liberdade de escolha; ele fala da liberdade para realização de valores, uma liberdade

que apela a responsabilidade.

A liberdade de que fala Frankl é uma liberdade de decidir perante uma situação concreta.

Por isso, o homem emerge como um ser que decide o que é, que decide o que quer ser. Trata-se

do homem como ser de vontade e do homem como vontade de ser. Posto que a liberdade é uma

atitude pessoal que se deve adotar frente ao destino, para decidir o seu próprio caminho.

Consciente desta liberdade, Frankl (2004) defende que o homem pode conservar um

reduto de liberdade espiritual, de independência mental, inclusive naqueles estados cruéis de

tensão e de indigência.

Isto significa que cada homem, mesmo sob condições tão adversas, guarda a liberdade

interior de decidir quem quer ser espiritual e mentalmente. Deste modo, a liberdade é uma atitude

espiritual que se manifesta na escolha de uma dada atitude, em detrimento de outra. Podemos

ilustrar isto com base na sua obra, mais conhecida, na sua versão espanhola, El hombre en busca

de sentido:

“cada hombre, aun bajo unas condiciones tan trágicas, guarda la libertad interior de decidir quién

quiere ser- espiritual y mentalmente -, porque incluso en esas circunstancias es capaz de

conservar la dignidad de seguir sintiendo como un ser humano. Y es precisamente esta libertad

interior la que nadie puede arrebatar. La que confiere a la existência una intención y un sentido”.

(FRANKL, 2004: 91)

Podemos afirmar que a nossa liberdade é limitada. Com isso, queremos dizer que nunca

estamos completamente livres das circunstâncias, sejam elas de ordem biológica, psicológica ou

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sociológica. Porém, a liberdade plena está sempre ao nosso alcance, isto é, a liberdade de

enfrentar quaisquer condições adversas. O modo como reagimos às condições impostas é uma

decisão nossa. Em outras palavras, se não pudermos mudar a situação, ainda resta-nos a

liberdade de mudar nossa atitude frente à situação.

O ser humano sempre se encontra envolvido em situações que não escolheu. Sempre já

nos encontramos num determinado ambiente sócio-cultural, já apresentamos caracteres corporais

específicos, já vivemos num determinado ponto espaço-temporal, etc. E são justamente tais

limitações que nos permitem agir livremente, pois somente há liberdade frente a um destino ou

frente a vínculos. Não somos livres de nossas limitações, todavia temos liberdade para nos

posicionar diante delas. Somos livres para algo e não de algo.

Se o homem não está livre de condicionalismos, mas pode tomar uma atitude, então ele é

autodeterminante. Porque é ele quem determina se resiste ou não a esses condicionamentos. Isso

envolve escolhas que o ser humano, obrigatoriamente, faz; ainda que actue como se não fosse

livre para decidir ou não tivesse possibilidades para escolher.

O homem é livre pelo que ele não se limita a existir, senão que decide como será sua

existência, em que se converterá no minuto seguinte; por isso o ser humano é um ser

autotranscendente. Deste modo, a liberdade é uma atitude interior perante uma circunstância,

mas também uma liberdade para a responsabilidade. Por isso, Frankl disse: “a liberdade não é a

última palavra. A liberdade é uma parte da história e a metade da verdade. A liberdade é a cara

negativa de qualquer fenómeno humano, cuja cara positiva é a responsabilidade. De facto, a

liberdade se encontra em perigo de degenerar em mera arbitrariedade salvo se se exerce em

termo de responsabilidade”. (FRANKL, 2004: 151).

O homem é livre porque responsável nas suas atitudes perante a sua própria vida que

clama por sentido, e também perante os outros, Deus e o mundo. Sustenta esta tese o que Frankl

(2004) experimentou nos campos de concentração que no meio daquele sofrimento, alguns

prisioneiros que, reprimindo a irritação e superando a apatia, passavam de barracão em barracão

e pelos lugares de revista para dar uma palavra ou um pedaço de pão. Estes homens são

testemunhas vivas da liberdade humana, são exemplo real de que nem a prisão injusta converte-

nos em algo que não queremos ser.

Em Frankl, é indubitável que a liberdade esteja vinculada ao sentido de responsabilidade

do homem; a liberdade é sempre acompanhada de responsabilidade. A liberdade e a

responsabilidade definem o ser humano em Frankl. Na sua acepção, o homem não é apenas um

ser que decide o que deve ser, mas um ser responsável. Por isso, na obra El Hombre En Busca

Del Sentido Último, Frankl escreveu: “La humanidad del hombre se basa en su sentido de

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responsabilidad. El hombre es el responsable de darle sentido a su vida. Ser humano significa

responder ante situaciones de la vida, contestar a las perguntas que la vida nos hace”.

(FRANKL, 2010: 156s).

Frankl assevera que o homem pode agir livremente, apesar das circunstâncias (seja o caso

da prisão, tortura ou maus tratos). Portanto, na linha de Frankl, em todas as circunstâncias,

chama-se o homem à responsabilidade. Pois, ele tem sempre em si o poder de decisão. E a

liberdade, em Frankl, é o poder de tomar decisão. Este nunca desaparece no homem. Pois, o

homem é um ser que decide sempre, mesmo coagido pode tomar uma decisão livre.

Na concepção antropológica de Frankl, a liberdade é um existencial importante. O

homem, mesmo que condicionado pelas suas características biológicas e psicológicas, ou ainda

pelas condições externas, pode escolher o seu destino e o seu próprio caminho.

3. Uma Educação Para o Sentido da Vida em Moçambique

A antropologia de Frankl pode ser resumida nestes termos: “el hombre es un ser que

participa de tres dimensiones distintas: primero, la corporal, somática u orgánica; segundo, la

psíquica o mental en sentido estricto; y tercero, la intelectual, que es la dimensión

específicamente humana, la propia de las personas” (FRANKL, 2000: 22s).

A dimensão intelectual, as vezes, é designada por espiritual ou noética, pois a sua

componente é o nous. Os filósofos gregos pré-socráticos tinham percebido o nous como uma

força “imanente nas almas humanas cuja operação é conhecer os eide12

e governar todas as

outras partes da alma” (PETERS, 1974:161). Frankl concebe o nous como espírito. Entendendo

por este uma dimensão superior ao corpo e à mente.

O ser humano partilha com os outros animais as dimensões biológica, psicológica e

social, mas se difere deles porque faz parte do seu ser a dimensão noética. A essência da sua

existência está na dimensão espiritual. O ser humano, como os animais irracionais, possui um

corpo sensível, a dimensão psicológica, no entanto o que lhe caracteriza essencialmente é a

dimensão noética. Daí que a existência propriamente humana é a existência espiritual, a

dimensão noética é considerada superior às demais.

Deste modo, percebemos que a dimensão noética seria uma dimensão não-determinada,

mas determinante; a dimensão da unicidade, da identidade mais profunda do ser humano,

implicando também a transcendência livre, criativa e responsável das limitações. Frankl assinala

que ela é necessariamente, pois impulsiona a pessoa para fora e para além de si mesmo, onde a

12

Ideias superiores ou essências.

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consciência do “eu” deixa de existir e todo o interesse se volta para o outro. A dimensão noética

pode se manifestar de várias formas - no trabalho e no amor altruístas, na intuição verdadeira e

na experiência religiosa. Essencialmente, devemos dizer que é pela dimensão noética que o

homem descobre um sentido de vida no mundo; visto que ele é fundamentalmente um ser-no-

mundo, e o mundo existe para ser descoberto pelo ser humano.

É na dimensão noética onde se realiza a educação. Por isso, a educação deverá ajudar o

educando a aprofundar a liberdade; isto é, a ser mais livre e consciente do seu ser pessoa

espiritual. Aliás, como escreveu o próprio Frankl: “educación pressupone siempre libertad, es

decir la libertad de cambiar y tomar nuestro destino en nuestras manos, aun el destino social o

histórico (FRANKL, 2002: 95).

A educação pressupõe sempre a liberdade, pois ela é um processo de crescimento e

amadurecimento pessoal, isso exige envolvimento da própria pessoa como sujeito do processo

educativo. Deste modo, educar para liberdade significa oferecer uma educação reflexiva, crítica,

ou melhor é dotar o aluno de instrumentos que lhe possam ajudar a fazer uma leitura crítica do

mundo e da vida. Pois, para Frankl: “por cuanto ser hombre significa ser en el mundo, el mundo

incluye un mundo de sentidos y valores” (FRANKL, 2002: 156).

Uma vez que o homem é um ser num mundo de sentidos e valores, a educação tem a

missão de enriquecer a liberdade do educando de modo a escolher os sentidos e os valores nos

quais deve assentar a sua existência. Esta educação faz com que a vida seja plena de sentido.

Visto que insta o aluno a saber escolher os valores vivenciais, a procurar um propósito de vida.

O homem não encontra sentido fechando-se em si, mas ele encontra sentido fora dele,

pela autotranscendência. A educação para liberdade deve dar a possibilidade de o educando ir

além dele mesmo, dando-lhe ferramentas para fazer escolhas que lhe conduzem a fazer o bem.

Educar para o sentido é chamar o educando a viver a autotranscendência. A educação deve levar

o estudante a buscar a autotranscendência realizando um trabalho ou obra (valor criativo),

vivendo para alguém ou amando alguém (valor vivencial) e a encontrar sentido no sofrimento.

A educação para liberdade forma o educando para as decisões cruciais da existência

humana; dado que o homem é um ser que decide sempre o que quer ser, o homem não está preso

a um ser-assim, ele é um ser cheio de possibilidades. Decide o que é, o que será no próximo

momento. Assim, a educação para liberdade é educação para o questionamento, para a pergunta

(CURY, 2008).

É através da pergunta que atendemos aos sinais do mundo, buscando respostas e sentidos

para as coisas da vida. Esta forma de entender a educação já estava presente em Sócrates. Este

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filósofo “andava por Atenas questionando seus cidadãos, particularmente os sofistas, (...), e via

a si mesmo como alguém que levava as pessoas a pensarem” (OZMON; CRAVER, 2004:27).

Sócrates achava que a pergunta faz a pessoa chegar ao conhecimento. Portanto, a razão

do uso da pergunta é que através dela o educando aprende a percorrer o caminho do saber,

interroga-se não apenas sobre as coisas do mundo exterior, mas também sobre aquelas do mundo

interior, é através da pergunta que o aluno pode encontrar sentido para a sua vida.

O estudante deve ser ensinado a questionar o mundo exterior, mas também o seu próprio

mundo. Paulo Freire entendeu bem isto, por isso recusou a educação bancária, que considerava o

aluno como um “depósito” para o qual o professor devia atirar o conhecimento. Para afrontar a

educação bancária, Freire defende a educação libertadora. Pois, “a educação libertadora,

problematizadora, já não pode ser acto de depositar, ou de narrar, ou de transferir, ou

transmitir conhecimentos e valores aos educandos, meros pacientes, à maneira da educação

bancária, mas um acto congnoscente” (FREIRE, 1977: 78).

A educação para liberdade é educação para o questionamento, para a expansão da

capacidade reflexiva do educando. Com este tipo de educação, o educando atende os sinais do

mundo, busca respostas e sentidos para as coisas da vida e para a sua própria vida.

A educação para liberdade usa-se do diálogo como ferramenta principal. Pois, como dizia

Freire,“o diálogo é a essência da educação e é o meio de superação da contradição entre o

educador e o educando” (FREIRE, 1977: 22). O diálogo constrói a liberdade porque respeita a

curiosidade e o questionamento do educando em relação ao mundo, às pessoas, ao seu sentido de

vida. O diálogo é fundamental na educação, porque no fundo ninguém educa ninguém, os

homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo. Por isso, a dialogicidade deve ser base da

educação. Pois, dentro da educação mediada pelo diálogo, acontece aquele contacto profundo

inter-humano; na qual, para Buber, se dá a confirmação da pessoa; ou melhor confirma-se que o

aluno é um parceiro na busca do conhecimento.

O diálogo possibilita a participação activa do aluno na busca do saber. Por isso, “ensinar

não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou sua

construção” (FREIRE, 1999: 52).

A dialogicidade, para usar a expressão de Freire, ajuda o professor a reconhecer a

unicidade e as potencialidades do educando, para se tornar pessoa única. Aliás, para pedagogia

existencialista, o sujeito (neste caso o educando), como centro de referimento, no diálogo,

descobre a sua real capacidade de auto-afirmação, como via de buscar a autenticidade.

Não se pode compreender a educação sem o diálogo, pois “a educação é, por excelência,

o lugar do diálogo, portanto, o lugar da palavra e da reflexão, que ultrapassa a apropriação dos

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conhecimentos para nos conduzir à formação pessoal. Desde que podemos dizer a palavra,

estamos em constante conversação com o mundo, instaurando a própria possibilidade de

educar” (HERMANN, 2003: 95).

Assim, o diálogo, no sentido socrático, assume o encontro com o estranho e o diferente,

possibilitando à educação construir-se por si mesma. Dito de outro modo, a educação passa a

operar não mais pela abstracção das teóricas, mas pela produção interactiva dos sujeitos capazes

de interpretação e transformação, acompanhando o movimento que o sujeito faz de si no

reconhecimento do outro. Aliás, como escreveu Moreno “a vida é um diálogo permanente. Não

existe vida sem diálogo, uma vez que a vida é fundamentalmente diálogo” (MORENO, 2005:

183).

Ademais, a experiência do diálogo é sempre a experiência da alteridade. Neste sentido, é

mister fazer uma referência à Levinas, “o discurso e, mais exactamente, a resposta ou a

responsabilidade, é que é esta relação autêntica” (LEVINAS, 2000: 79). Este pensamento de

Levinas leva-nos a dizer que só o diálogo cria uma relação autêntica com o outro. Nessa

experiência, a linguagem, a vivência do outro, acompanha o educando a desenvolver seu projecto

de vida com liberdade e responsabilidade. Deste modo, urge criar no educando a necessária

tensão entre o ser e o ser-de-outra-maneira do próprio educando, para fazê-lo participante e

implicado no ofício da sua liberdade e responsabilidade.

Na antropologia de Viktor Frankl, o homem é um ser livre, mas para ser responsável. No

ser humano, a liberdade não tem última palavra; mas sim, é a responsabilidade que goza da

última palavra. Por isso, Frankl afirmou:

“la persona es existencial: con esto se significa que no es fáctica ni pertence a la facticidad. El

hombre, como persona, no es um ser fáctico sino um ser facultativo; el existe de acuerdo a su

propria possibilidad para la cual o contra cual puede decidirse. Ser hombre es ante todo, y como

siempre vuelvo a decir, ser profunda y fianlmente responsable” (FRANKL, 2002: 111).

Podemos dizer que a liberdade é, para o homem, um convite à responsabilidade. Isto faz-

nos recordar que, no existencialismo, o homem constrói a sua essência; mas, como já indicava

Sartre, na construção dessa essência, o homem é chamado a fazê-lo de modo responsável. O ser

humano está chamado a poder ser melhor de si mesmo por toda a sua existência. A educação tem

como finalidade ajudar a pessoa a chegar à autenticidade, ou melhor a auto-afirmação,

oferecendo ao sujeito a possibilidade de percorrer todas as etapas da sua evolução. Entretanto,

esta autenticidade, auto-afirmação e evolução devem ser conduzidos para uma responsabilização

do educando.

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Nesta óptica, a pedagogia do sentido será um percurso reflexivo e activo de auto-

determinação, não com objectivo de construir ou criar a realidade, mas sobretudo como um abrir-

se ao mundo, um expor-se ao que é, usando a linguagem heideggeriana, ou fazer-se disponível ao

desvelamento infinito do “Ser”. Tudo isto é um caminho que envolve responsabiliade, porque o

ser humano não é escravo das suas pulsões, nem de seus instintos, a partir da sua capacidade de

autotranscendência pode dirigir-se a uma obra a cirar, a um outro a amar. Ao buscarmos uma

educação para o sentido, temos que ter como ponto de referimento a tensão salutar entre a

existência e o ser. Tal tensão desafia o ser humano na construção do próprio destino.

Ainda, temos que afirmar que, na concepção da ontologia fundamental de Heidegger,

uma corrente que influenciou sobremaneira a Frankl, o dasein (o homem que vive prostado na

verdade do ser) é também mitsein (ser-com-os-outros). É mister também indicar a perspectiva de

Marcel, o “nós somos” ao invés de “eu penso” cartesiano. Para com isto dizermos que a

educação para o sentido deve conduzir o estudante a considerar na sua vida a alteridade, como

também a tornar-se mais consciente do seu ser-no-mundo. E neste ser-no-mundo deve buscar um

sentido que “alimente” a sua existência. Isto requer que o educando seja encaminhado à

compreensão da sua própria existência, visto que sem esta compreensão ele perde o sentido da

existência pessoal.

Esta alteridade, em Frankl, é fundamental visto que na busca de sentido, um dos

caminhos é viver uma experiência de relacionamento ou de amor com alguém. Assim, torna-se

evidente que a educação para o sentido não se identifica com acumulação de conhecimentos,

nem educação para a uma certa profissão. Mas sim, pela vivência de experiências humanas

relevantes que incluem amor, sofrimento, temores e demais dimensões afectivas que habitam a

dimensão do homem. Com Frankl, aprendemos que se deve educar o homem no difícil exercício

de abrir-se à alteridade.

Educar para o sentido da vida é educar para a responsabilidade visto que o educando deve

colocar-se de forma consciente perante a sua própria existência e a dos outros, assumir um

empenho ético diante das diversas situações da existência, sentir-se mergulhado nas situações da

vida e poder tomar posição. O educando deverá aprender a assumir-se mediante as escolhas que

vai fazendo ao longo da sua existência. Estas escolhas, segundo Frankl, devem ser norteadas por

valores sejam eles criativos (obras, trabalhos), vivenciais (relacionamento, amor, amizade) e

atitudinais (atitudes perante situações limites). Assim, o processo educativo é um caminho para a

responsabilização, na escolha das atitudes e empenhos no projectar-se em busca da realização

pessoal. Dito de outro modo, dever-se-á despertar no educando que todos os actos da consciência

devem responder ao seu projecto de vida.

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Este apelo à educação responsável fundamenta-se no facto de que a existência especifica-

se através dos contínuos actos de escolha, que levam o educando à autenticidade perante o

mundo, entretanto esta autenticidade é sempre acompanhada de valores e de ressonância ética.

A visão antropológica de Frankl impele-nos a apostar numa educação sensível à questão

de sentido; sendo assim, deverá ajudar o educando a ser selectivo, aprender a distinguir entre o

que é essencial e o que não é, entre o que tem sentido e o que não tem, entre o que é responsável

e o que não é. Neste itinerário de educação para responsabilidade, os educadores nunca devem

perder de vista que o ser humano é um-ser-de-relação. Um ser vinculado com sua história

pessoal e colectiva. Portanto, o educando deverá cultivar valores que o realizem como sujeito e

como colectividade.

A prática pedagógica da educação para o sentido deve familiarizar os educandos com a

tomada de decisões responsáveis, esta pedagogia contribuirá para dotar o educando de

ferramentas necessárias para clarificar os valores pessoais que sustentam a sua existência.

Também é importante levar o educando a uma reflexão permanente sobre valores e uma atitude

adequada perante a diversidade de decisões de outros seus coetâneos. A reflexão é um requisito

fundamental para uma existência responsável; visto que o sentido é sempre ad personam et ad

situationem; portanto, cada pessoa busca o seu próprio sentido e este tem a ver com uma situação

concreta.

Ademais, a educação para o sentido é sustentada pelas autênticas fontes, estas encontram-

se fora do educando; seja criando um trabalho ou realizando um feito notável ou ao sentir-se

responsável por terminar um trabalho que depende fundamentalmente de seus conhecimentos ou

sua acção.

O educando poderá encontrar o sentido experimentando um valor, algo novo e

estabelecendo um novo relacionamento pessoal. Este é o caso de uma pessoa que está consciente

da responsabilidade que tem em relação a alguém que a ama e espera por ela. A outra forma de

aceder ao sentido é pelo sofrimento, enfrentando de modo digno o sofrimento, ou adoptando uma

atitude responsável em relação a um sofrimento inevitável. Se o educando tiver consciência de

que a vida espera muito da sua contribuição para com os demais, ele enfrentará o sofrimento com

muita responsabilidade, não se deixando arrastar por respostas banais. Enfim, como acenou

Ruben Queiroz Cobra, “nestes três caminhos de busca de sentido, a resposta do indivíduo deixa

de ser perda de tempo em conversas e meditações, e se torna a acção correcta e a conduta moral

objectiva” ( www.cobrapages.nom.br 18.02.12, 20h). Isto implica, por outro lado, uma abertura à

alteridade. Por isso, o professor, na educação para o sentido, como um parteiro, vai tirando de

dentro do educando a responsabilidade e a liberdade.

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A educação para responsabilidade valoriza o educando como uma pessoa única e

irrepetível, que deve desenvolver as suas capacidades criadoras; coloca ao aluno o desafio de

responder as exigências da vida. Para educar para a responsabilidade, é preciso educar desde o

sentido de esforço, apelando a capacidade do espírito de se opor às situações adversas da vida,

como também educar para o sentido da comunidade.

Podemos afirmar que a educação para o sentido orienta a pessoa para algo ou para

alguém; através da educação, o educando adquire hábitos que lhe ajudam a ser melhor. Assim a

educação é uma dinâmica de perfeição de cada pessoa. Nos aperfeiçoamos na medida em que

nos transcendemos até aos nossos próximos e a Deus. Ao educando, se deve ensinar que a vida

inclui alegrias e penas, gozos e sofrimento, os desejos, os anelos e as realizações.

Por um lado, educar para o sentido é educar para a responsabilidade porque, na

perspectiva de Frankl, a principal preocupação do homem é estabelecer e perseguir um objectivo,

e é esta busca que é capaz de dar sentido à vida do educando, fazendo valer a pena viver. Por

outro lado, a responsabilidade é fundamental porque não se trata de buscar um sentido em termos

gerais, mas um sentido pessoal para a vida de cada indivíduo.

A educação para o sentido é educação para a responsabilidade; pois, na concepção de

Frankl, “o homem não é subjugado pelas condições diante das quais se encontra. Ao contrário,

são elas que estão submetidas às suas decisões (FRANKL, 1989: 42). Assim, é essencial que

todas as suas decisões sejam responsáveis, porque decidem, de certa maneira, a sua existência.

Viktor Frankl, apesar de ser muito distante da realidade moçambicana, oferece uma

abordagem sobre a educação que tem relevância nas reflexões que se têm apresentado sobre a

educação em Moçambique. A razão é que, ultimamente, já se fala em Moçambique do vazio de

sentido, como crise de identidade e crise ética. Castiano e Ngoenha (2011: 83) elucidaram o

aspecto da crise de identidade de seguinte modo: “em tudo o que pretendemos fazer, como o

desenvolvimento, fazemo-lo à imagem e a semelhança do Ocidente como horizonte, como

justificação, como legitimação”.

Fazer tudo em função do Ocidente é negação da própria identidade de moçambicanos,

como também é negar que o homem moçambicano seja um projecto que deve construir a sua

essência. No sentido existencialista, o ser humano deve ser considerado como centro do seu

próprio desenvolvimento, neste caso o desenvolvimento nunca será imitar o outro. Os

moçambicanos deverão compreender que cada um é único e irrepetível e pelas escolhas pessoais,

vai construindo a sua essência.

No campo da educação, em particular, com a difusão dos meios de comunicação sociais e

electrónicos; com a criação de extensas redes sociais; com a emergência de uma sociedade multi-

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cultural, multi-etnica e multi-religiosa; com a massificação do acesso ao Ensino Superior, o

pessimismo ocidental difunde-se por Moçambique. Confrontado com o desenvolvimento

acelerado dos países europeus, americanos e asiáticos, o estudante moçambicano sente encanto

pelo Ocidente e desencanto por Moçambique.

O estudante moçambicano perdeu os sentidos de referência tradicionais, primeiro com a

introdução de religiões estrangeiras, o cristianismo (uma religião de raiz hebraica-grega e latina)

e o islamismo (uma religião de raiz árabe); e, depois, com a adopção de uma política importada

desde as remotas terras do Império Soviético. Alterou a sua relação com a terra, com a

comunidade, com o seu povo ou tribo. Identificou-se com um Estado Moçambicano, criado

artificialmente pela vontade humana, e, com uma língua oficial herdada de uma potência

estrangeira e europeia. A perda da identidade manifesta-se numa perda de sentido.

Actualmente, os jovens lutam para conseguir um diploma universitário. As suas famílias

esforçam-se por os ajudar. Mas no final não conseguem emprego. Não têm mais uma aldeia, uma

comunidade, uma tribo que os suporte. Perdem o sentido, perdem a esperança. Ademais, que

sentido tem estudar numa sala sem condições mínimas de higiene, nem cadeiras para sentar, sem

livros para as consultas requeridas. Por outro lado, o vazio de sentido além de se manifestar

como crise de identidade, em Moçambique, pode ser visto também como crise ética, pois como

acenou Gonçalves, citando a Hessen, “é a realização dos valores, parte fundamental e integrante

do ethos que dá sentido e significado à existência” (HESSEN apud GONÇALVES, 2011: 138).

A crise ética, na visão de Gonçalves (2011), deveu-se a negação da tradição para a

construção de um futuro socialista e à reversão repentina do país ao capitalismo. Em outras

palavras, os jovens, em particular, são confortados com passado revolucionário socialista e com a

ilusão neoliberal, em que a realização do futuro melhor se mostra cada vez mais distante, por isso

caíram no vazio de sentido.

Além da crise de identidade e da crise ética que enfermam a educação em Moçambique,

os outros problemas são a má formação dos estudantes e a consequente falta de enquadramento;

nota-se também que a maior parte das instituições de ensino não oferece cursos virados ao saber

fazer, o que proporciona desespero nos estudantes. Estas questões não podem ser resolvidas com

simples cópias dos paradigmas ocidentais, sejam elas de educação ou de desenvolvimento

económico e social.

A partir dos problemas que enfermam a educação em Moçambique, a nossa proposta,

nesta monografia, é defender que a educação não deve perder de vista o que é específico do ser

humano, a dimensão noética, o ser espiritual, com a sua motivação básica, que é a busca de

sentido para vida. Considerando esta dimensão e esta sede de sentido, a educação, em

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Moçambique, poderia equacionar nos seus curriculla a questão de uma pedagogia de sentido,

visando a educar para o sentido tendo como fundamentos a liberdade e a responsabilidade. Pois,

o homem é um ser essencialmente livre e responsável. Ou, melhor é na liberdade e através da

responsabilidade que ele encontra sentido para a sua vida.

No entanto, quando observámos de forma sistemática as contribuições no campo da

educação em Moçambique, notámos que já está presente o pensamento de Frankl, ainda que em

entrelinhas. É neste sentido que as ideias apresentadas por vários autores moçambicanos falam

de educar para o sentido, ainda que de modo implícito.

Mazula defende que “a educação não deve ser autoritária, mas sim a educação deve

seguir uma pedagogia dinâmica e com liberdade” (MAZULA, 2006: 41). Esta frase conduz-nos

à educação feita com liberdade, que norteia a pedagogia de sentido, ou a educação para o sentido

de vida. A este propósito, Frankl defende que o ser humano é um ser que sempre decide, nunca

perde a sua liberdade, ele age sempre livre, mesmo que esta liberdade seja apenas espiritual. Por

isso, a educação deverá conduzir o ser humano a reflectir sobre a sua existência, o que lhe ajuda

a caminhar para a autenticidade, e isso não se pode fazer, seguindo uma educação autoritária.

Seguindo este pensamento, a educação para liberdade é, no contexto moçambicano, aquela que

Mazula (2005) apelidou de auto-reflexiva e emancipatória.

Para Mazula (2006), esta educação coloca no centro a iniciativa, a criatividade e a

investigação. Esta posição só se pode compreender na medida que vemos a educação como

caminho para ajudar o homem a ser si mesmo, a desenvolver suas capacidades, buscando o seu

sentido pessoal e concreto. É a educação para a autenticidade, para que o homem seja sujeito da

sua existência. E o percurso da autenticidade passa por despertar nos jovens o espírito crítico,

que se orienta para formar a personalidade do educando, como sujeito da sua existência.

Reconhecendo a importância da liberdade na educação, Mazula cita uma frase

interessante de Einstein: “o que esta planta necessita, para além da estimulação inicial, é de

liberdade. Sem isso é de certeza destruída” (EINSTEIN apud MAZULA, 2006: 43).

Se nós, em Moçambique, queremos uma educação que desenvolva a criatividade dos

educandos, o chamado empreendedorismo, é necessário educar tendo a liberdade como um dos

principais fundamentos, porque só ela é capaz de tornar o aluno uma pessoa que desenvolve as

suas potencialidades, que não tem medo, porque formado dentro do diálogo e da reflexão crítica.

Ademais, a educação para liberdade deve ser a própria para Moçambique, porque se existe um

substrato axiológico que sustenta o ser moçambicano, como também o fim de todo pensamento

filo-moçambicano, é a liberdade (NGOENHA e CASTIANO, 2011).

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Através da educação, levemos os estudante a entenderem que não se dá existência senão

como liberdade. Então formemos o aluno para a crítica e auto-crítica. É justamente a crítica que

ajuda o educando a descobrir o mundo, o outros e o mundo que ele é, e assim poder traçar

caminhos de desenvolvimento pessoal e da sua colectividade. Só assim acontecerá o tão

almejado desejo de “mudar o mundo, ou seja a situação de pobreza da nossa sociedade”

(MAZULA, 2006: 76).

A educação para liberdade é educação a criatividade do aluno, mas sobretudo à

responsabilidade. Pois, a liberdade e a responsabilidade estão, em Frankl, intrinsecamente

vinculados: “toda a liberdade tiene un de qué y un para qué. Si perguntamos de qué es libre el

hombre, la respuesta es: de ser impulsado, es decir que su yo tiene libertad frente a su ello; en

cuanto a para qué el hombre es libre, contestaremos: para ser responsable (FRANKL, 2006:

55).

Assim, compreendemos que a liberdade não tem a última palavra, sendo esta da

responsabilidade. Por isso, sendo o educando um ser-no-mundo, deverá fazer, em cada

circunstância e situação, escolhas responsáveis que dêem sentido a sua existência. Portanto, a

educação deve tornar alguém em um sujeito capaz de falar e agir consciente e responsavelmente.

No contexto moçambicano, Mazula (2005) chama atenção a necessidade de educar a

juventude para uma forte consciência do dever e na perspectiva de uma ética do futuro, a ética da

responsabilidade. Na verdade, toda a educação deve ser guiada por um forte sentido de

responsabilidade. Os educandos devem ser consciencializados a serem responsáveis por eles

próprios e pelos demais. Assim, “ a solução da nossa educação está em construir um conjunto

de posturas, crenças, conceitos e preconceitos”. (COUTO, 2009: 31) O educando deverá

desenvolver posturas responsáveis que de certa forma desafiam a crise ética que sociedade

moçambicana vive. Crer que ele é capaz de desenvolver-se pessoalmente e como colectividade e

não sempre confiar os seus problemas ao Ocidente.

A nossa educação, tendo como centro do processo educativo o próprio homem, deve estar

articulada de modo a desenvolver no estudante a capacidade de agir com liberdade, como já

indicaram Mazula (2005) e Couto (2009), porém este agir livre deve ser responsável diante das

imposições da vida e de exercer com dignidade seu potencial para transformar as tragédias

pessoais em triunfo humano, consagrando à vida um sentido próprio e pleno de valor.

Acerca das dificuldades que muitos estudantes enfrentam na educação, como estudar

numa escola sem as mínimas condições logísticas e falta de bibliografia adequado para a

investigação? Gostaríamos de ressaltar que Frankl, ao defender o optimismo trágico, chama a

atenção do nosso estudante a saber superar as dificuldades e no meio delas a tomar decisões

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orientadas por valores humanos. Para Frankl (2010), as dificuldades ou os sofrimentos

inevitáveis, ajudam a pessoa a elevar-se acima de si mesmo, mais além de si mesmo, através da

transformação de si mesmo. Nesta linha, o estudante moçambicano aprenderia o valor do

sacrifício.

Por outro lado, a educação em Moçambique é chamada a desenvolver nos educandos a

capacidade de identificar os desafios próprios da moçambicanidade, pois o sacrifício pessoal

deve repercutir num valor para toda a colectividade moçambicana. Assim, urge que as escolhas

responsáveis, das quais temos falado, devem ser feitas tendo em conta a sua situação de existente

moçambicano; pois, como defende Frankl, o ser humano é um ser-sendo-no-mundo, no caso

concreto este mundo é Moçambique, com os seus problemas e as suas riquezas, e não o

Ocidente. Por isso, na perspectiva de Castiano (2005), há uma necessidade de educar à

moçambicanidade e africanidade.

Se a renovação ética, ou a superação do déficit moral, depende fundamentalmente da

educação, as instituições de ensino devem ensinar o jovem moçambicano a fazer escolhas

responsáveis, perante os modelos pouco éticos da nossa sociedade, chamados por Mazula (2005)

de felicidade parasita e caduca da corrupção13

, que acaba convencendo a juventude

moçambicana. Esta perspectiva é importante em Moçambique, visto que a “educação é um

instrumento de reabilitação social” (CASTIANO et al, 2005: 211).

Eduquemos os moçambicanos ao trabalho, como um valor, como uma forma de

autotranscendência, que orienta a vida para uma causa justa a realizar (FRANKL, 1989), isto

confere ao próprio educando o sentido de vida.

A educação para o sentido, na perspectiva de Frankl, apelando à responsabilidade,

apresenta-se como uma abordagem essencial na formação do homem com ideais e referências

éticas válidas e sólidas; educando a responsabilidade, o estudante aprenderá a escolher entre o

que é essencial e que lhe constrói como pessoa e como moçambicano. Esta educação visa a

ajudar os jovens moçambicanos a alcançar o sentido de vida, e possibilita uma convivência

humana digna entre os moçambicanos.

Por outro lado, a educação para o sentido, é educação para os valores, visto que a

filosofia de sentido está imediata e inseparavelmente associada aos valores (FRANKL et al,

1990); daí que, no contexto da sociedade moçambicana, Mazula (2005) fala da necessidade de

criar uma sociedade de valores e não de vícios. Como defende Moreno (2005: 132), “a educação

deve permitir o exercício dos valores que tornam possível a vida em sociedade, especialmente o

13

O autor usa esta expressão para se referir ao enriquecimento conseguido através de meios ilícitos como usura,

roubo, assassinatos, violências, e menos trabalho justo.

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respeito aos direitos e às liberdades fundamentais e a aquisição de hábitos de convivência e de

respeito mútuo”.

É necessária uma educação ética que apela a responsabilidade e que se fundamenta na

liberdade, educando aos valores realiza-se e revitaliza-se o campo axiológico não apenas dos

estudantes, senão também da sua colectividade. Aliás, já que a crise ou o vazio de sentido em

Moçambique manifesta-se através da crise ética, é necessário incluir a ética nos programas de

ensino em Moçambique (GONÇALVES, 2011).

Para Frankl, na busca de um sentido para vida, estes valores podem ser criativos,

vivenciais e de atitudes. Contudo, dentre estes todos valores o mais importante valor é o próprio

homem – “o homem é valor” (FRANKL et al, 1990: 53).

Nesta proposição de Frankl está subjacente uma necessidade de educar à alteridade ou ao

reconhecimento do “outro” como epifania do Infinito14

, a respeitar a dignidade humana. O ser

humano tem um valor absoluto, como escreveu Adela Cortina15

(2007: 134), “hay seres para los

que es impossible encontrar un equivalente, porque no tienen valor de uso y, por tanto, tampoco

valor de cambio. Esos seres valen por sí mismos y, en consecuencia, no pueden intercambiar-se

por otros ni por un precio”.

A educação nunca deixará de fora a necessidade de chamar o educando ao respeito do

valor intrínseco do ser humano, ele não pode ser trocado nem pelo outro, nem por nenhum preço.

Ele é um fim em si mesmo. É necessário educar ao respeito da dignidade. Pois, segundo a

reflexão de Gonçalves (2011), o não reconhecimento do outro, fomenta a intolerância para com

quem pensa diferente e os mais variados preconceitos.

A educação em Moçambique deverá demonstrar que a dignidade humana é um valor

fundamental. Com razão, para Frankl, a dignidade humana se funda no ser do homem, enquanto

ser, no que ele é, não no que ele tem. Assim, o estudante não verá a diferença como algo a

combater mas a respeitar, porque essencialmente todos os seres humanos são iguais em

dignidade. Uma educação que sublinha dignidade como valor, é um combate contra uma visão

etnocentrista ou a consideração duma raça como superior às outras (SERRA, 2000), que de uma

forma imperceptível, vão minando a moçambicanidade.

O educando deve ser educado a respeitar a dignidade humana, visto ser uma instância

ética fundamental para a convivência humana, dado que apela a reciprocidade; deve-se ensina-

lhe a tratar o outro como ele próprio quer ser tratado. Na linha de Frankl, diríamos que o homem

14

Emmanuel Levinas defende a ideia de que no rosto (o que não se pode transformar num conteúdo, que o nosso

pensamento abarcaria, é o incontável, leva-nos além) há um acesso a ideia de Infinito, Deus. Por isso, devemos

respeitá-lo. 15

Valenciana catedrática de ética e filosofia política. Tem várias obras no campo da ética.

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é livre porque responsável nas suas atitudes perante o outro. Todo o ser humano é sujeito de

respeito incondicional. A reciprocidade da qual brota a regra de ouro, o direito, a justiça e o bem-

estar são valores comuns a todas as culturas e civilizações (HOFFE, 2004 apud GONÇALVES,

2011), para os quais devem ser educados os jovens em Moçambique.

Num mundo globalizado, a educação apostará na introdução de valores resultantes da

multi(inter)culturalidade que se fundamentam na ética global (CASTIANO, 2005), assim o mito

do Ocidente como paradigma da existência pode ser superado por uma escolha responsável

daqueles valores que estão presentes em todas as culturas.

Na interculturalidade, a africanidade, para os moçambicanos, apresenta-se como um dos

principais valores, esta é entendida como uma “forma própria de existência, de pensamento e de

agir dos africanos na sua condição periférica e neocolonial” (NGOENHA, 2004 apud

CASTIANO, 2005: 85).

Por outro lado, a nossa educação é chamada a ter em conta a tradição moçambicana e a

modernidade ocidental, não basta só formar tecnicamente a que integrar os valores

moçambicanos e os da modernidade (NGOENHA, 2000: 200).

Conclusão

O homem é, em Frankl, um ser com sede de sentido; ele, na sua liberdade, busca

responsavelmente realizar esse sentido. Dado que a liberdade e a responsabilidade são os meios

de realização do sentido, o nosso objectivo foi analisar a concepção da liberdade e

responsabilidade no pensamento de Frankl.

Este objectivo foi cumprido, pois chegámos a conclusão de que o homem é

essencialmente livre, ele decide o que ele quer ser, escolhendo responsavelmente os valores que

devem plasmar a sua vida, sem esquecer que ele é o primeiro valor. Ora, esta análise conduziu-

nos ao campo de educação. Esta deve ter em conta que ser homem é viver num estado de

permanente tensão entre ser-assim e ser-de-outro-modo. A educação se dá na dimensão

propriamente humana do espiritual, pois nela acontece a liberdade e responsabilidade. Deste

modo, educar para a liberdade e responsabilidade significa educar para o sentido.

A educação para liberdade é conduzir o aluno à autenticidade, criatividade, a ter uma

visão crítica de si mesmo, do mundo e dos outros, através do diálogo e da reflexão. Educar para

liberdade é formar o educando para o questionamento, é ajudar a tomar decisões cruciais para a

sua existência humana.

No entanto, a liberdade é um convite à responsabilidade. Por isso, ao proceder a educação

à liberdade deve ser acompanhada duma educação para responsabilidade. A educação deve

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ajudar os educandos a fazerem escolhas responsáveis. Deve-se educar o jovem a saber distinguir

o que é essencial, quais os valores (criativos, vivenciais e de atitudes) que devem nortear as suas

escolhas, no entanto, ele próprio se descobre primeiro como valor, daí a necessidade de respeitar

a dignidade humana.

O estudante deverá assumir o empenho ético diante diversas situações da vida, sabendo

que todos os actos da sua consciência devem responder ao seu projecto de vida. Nesta educação,

nunca se deve perder de vista que o ser humano é um ser-de-relações, um ser vinculado com a

sua história pessoal e colectiva.

Colocando a liberdade e a responsabilidade como fundamentos da educação, observámos

que toda educação deve ser sensível à questão do sentido, educando para um sentido de vida;

visto que o homem não é um ser estático, está em constante movimento em busca do sentido para

a sua vida, envolvendo-se no universo cultural e abrindo-se a alteridade.

O pensamento de Frankl convida-nos a defender uma educação para o sentido da vida,

alicerçada na liberdade e na responsabilidade. Analisando a situação da educação em

Moçambique, considerando que a crise de sentido, neste país, manifesta-se como crise de

identidade e ética, por isso recomendamos:

A) Que a educação nunca perca de vista o que é específico do ser humano, a dimensão

noética, o ser espiritual, com a sua motivação básica, que é a busca de sentido para vida, e

a tensão que existe no homem entre o ser-assim e ser-de-outro-modo;

B) Que se proceda a uma educação fundada na liberdade, que transmita o conhecimento

de modo criativo; seguindo uma pedagogia da dialogicidade e do questionamento, que

leve os educando a uma consciência crítica, a auto-reflexão e a serem sujeitos na busca

do conhecimento;

C) Que se eduque os estudantes à responsabilidade. Educar a responsabilidade

significará, neste contexto, formar a consciência moral dos educando, de modo a respeitar

a dignidade humana, a buscarem os valores presentes em todas as civilizações, como é o

caso do direito, justiça e bem-estar

D) Que se integre na educação, de modo decisivo, os valores da moçambicanidade,

africanidade e os valores universais.

Fundamentar a liberdade e a responsabilidade no pensamento de Frankl significa, para

nós, buscar uma educação para o sentido de vida, que coloca no centro o educando, oferecendo-

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lhe uma educação participativa, criativa e dialogada e que faz apelo à uma vivência ética

correcta.

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