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DESENVOLVIMENTO DE METODOLOGIAS DE APRENDIZAGEM : O ACORDO
ORTOGRÁFICO DA LÍNGUA PORTUGUESA
Helena Miyoko Miura da Costa (Professora – PDE)1
Orientadora: Profª Drª Beatriz Helena Dal Molin2
RESUMO: Este artigo resulta do trabalho desenvolvido junto aos alunos da 5ª série, matutino, da Escola Estadual Guimarães Rosa – Ensino Fundamental de Assis Chateaubriand, no ano de 2011. O objetivo maior desta proposta educacional foi o de desenvolver metodologias de aprendizagem que ajudem o aluno a ser capaz de compreender o sistema dos mecanismos linguísticos do acordo ortográfico da Língua Portuguesa, de maneira simples, facilitando a aprendizagem e favorecendo a compreensão dos textos. Por meio do trabalho com a gramática, pretendeu-se suscitar algumas reflexões que estimulem o aluno a observar regularidades na ortografia, aprimorando a sua capacidade de observação e pensamento crítico. Apresentar-se-ão os resultados da implementação desta proposta, as música empregadas, as imagens que utilizamos diferentes gêneros textuais bem como os encaminhamentos metodológicos propostos. Este trabalho é parte das atividades do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) do Estado do Paraná desenvolvido na qualidade de professora que realizou este aprimoramento oferecido pelo nosso governo estadual.
Palavras-chave: Acordo ortográfico; pensamento crítico; metodologia; aprendizagem.
1 Introdução
A reforma ortográfica foi criada para acabar com as diferenças relevantes nos
oito países que tem o português como língua oficial. Mas o objetivo principal da
reforma foi o de igualar o português do Brasil com o de Portugal. Além de Portugal e
Brasil, fazem parte da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – CPLP, Cabo
Verde, Guiné- Bissau, São Tomé e Príncipe, Moçambique, Angola e Timor Leste.
1 Cursou Mestrado em Letras na Universidade Estadual do Oeste do Paraná e Letras Franco-Portuguesas na Fundação Faculdade Estadual de Filosofia, Ciências e Letras de Cornélio Procópio. Professora de Língua Portuguesa, QPM (20 h) na Escola Estadual Guimarães Rosa – Ensino Fundamental de Assis Chateaubriand – PR. 2 Professora da Graduação em Letras e do Programa de Pós-graduação stricto sensu em Letras, níveis de Mestrado e de Doutorado: área de concentração em Linguagem e Sociedade da Universidade Estadual do Oeste do Paraná UNIOESTE. Coordenadora do NUPROEDUNI, membro dos grupos de pesquisa “Confluências da Ficção, História e Memória na Literatura”, “Linguagem, Cultura e Ensino, PECLA”, “Pesquisas em Educação, Cultura. Linguagem e Arte/Unioeste/CNPq”, “Núcleo de Complexidade e Cognição (Antigo Núcleo de Ecoergonomia) UFSC, PCEADIS/UFSC/CNPq”.
No Brasil, a nova ortografia da Língua Portuguesa definida pelo Acordo
Ortográfico de 1990 e assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entrou em
vigor em 1º de janeiro de 2009 com prazo de adequação até 2012. Além da extinção
do trema, da inclusão de k, w e y, algumas palavras perderam o acento gráfico,
houve mudanças no uso do hífen e normatizou-se o uso de iniciais maiúsculas e
minúsculas.
Nossa proposta de intervenção didático-pedagógica na Escola Estadual
Guimarães Rosa, em Assis Chateaubriand, pretendeu motivar os alunos da 5ª série
do Ensino Fundamental para interagir, de forma agradável, com os mecanismos do
acordo ortográfico da Língua Portuguesa. Ressaltamos que este trabalho não
pretendeu abordar como eram as regras antigas da acentuação gráfica, do trema, do
acento diferencial e tampouco como era usado o hífen. Temos como foco principal
desse estudo as regras e normatizações em vigor e a grafia atual da Língua
Portuguesa adaptadas nos livros didáticos desde 2010.
Buscamos promover um trabalho que ajude o aluno a ser crítico ativo, capaz de
compreender o raciocínio do sistema dos mecanismos linguísticos do acordo
ortográfico da língua materna, de maneira simples, aprimorando a capacidade de
observação, facilitando a aprendizagem e favorecendo compreender melhor os
textos.
A não funcionalidade do método tradicional de ensino da Língua Portuguesa
que colocava o professor como o único detentor do conhecimento acerca do uso da
língua, revela-nos a necessidade de buscar novas perspectivas pedagógicas. O
método de ensino tradicional da gramática pode ter sido, em grande parte,
responsável pelo surgimento da aversão, por parte do aluno, ao estudo da língua
materna. O fato do aluno não gostar de decorar regras gramaticais prontas pode ter
contribuído consideravelmente para a deficiência no ensino da Língua Portuguesa,
prejudicando o estudante nas habilidades de leitura e de escrita que são
pressupostos básicos para o desenvolvimento da reflexão nas demais disciplinas
curriculares.
Tentamos propor a possibilidade de um outro modo de ensino da ortografia da
Língua Portuguesa, de não mais praticar o ensino da língua materna baseado na
memorização, mas nos fatos da língua, a partir da produção escrita, da imagem, da
música, de diferentes gêneros textuais e do uso das novas tecnologias. Assim, esse
estudo propôs desenvolver metodologias reflexivas de aprendizagem para
compreensão das regras do acordo ortográfico e novos posicionamentos no ensino
da Língua Portuguesa.
Lembramos que as Diretrizes Curriculares Estaduais (DCEs) de Língua
Portuguesa não propõem “o abandono do conhecimento gramatical e tampouco
impede que apresentemos regras gramaticais para os alunos, visto que toda língua
é constituída de uma gramática e de um léxico” (Antunes, 2003)3. Além disso, as
DCEs (2008, p. 61) sugerem que, em casos como deste estudo, o ensino seja
encaminhado a partir da metodologia reflexiva baseada na indução, para conclusão
de regras pelos estudantes.
2 Aspectos Teóricos
Morais (2007, p. 20) afirma que “o conhecimento ortográfico é algo que a
criança não pode desenvolver sozinha, sem ajuda.” Em vez de preocupar apenas
em nos libertar do ensino da gramática tradicional, precisamos buscar novas
metodologias de aprendizagem que “trate a ortografia como objeto de reflexão”
(MORAIS, 2007, p. 25). Para tanto, faz-se necessário que o aluno entenda o
raciocínio da norma ortográfica da Língua Portuguesa, porque a questão não é
decorar, mas sim de compreender os mecanismos.
Possenti (2009) acredita que o objetivo da escola é o de criar condições para
que o português padrão seja aprendido. Ele propõe uma nova concepção do ensino
de língua na escola, e convida-nos a deixar para trás o preconceito do aprendizado
da língua padrão ser tarefa difícil para o aluno que usa dialetos não padrões.
Incentiva-nos a abandonar a velha metodologia que aprendemos no início de nossa
carreira e adotar novas estratégias no ensino da Língua Portuguesa.
A nossa tarefa enquanto professor de Língua Portuguesa não se restringe ao
ensino da ortografia com a finalidade de preparar estudantes para o vestibular.
Queremos inovar o ensino da ortografia no trabalho cotidiano de sala de aula.
Entendemos que a aquisição de conteúdos gramaticais deverá relacionar o
educando às diferentes situações que a escola apresenta. Faz-se necessário um
trabalho criativo, para motivar o aluno a interagir, de forma agradável, com os
3 ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro & interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003. In: PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Superintendência de Educação. Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua Portuguesa para Educação Básica. Curitiba, 2008, p. 53.
mecanismos do acordo ortográfico da nossa língua, aprimorando a capacidade de
observação e pensamento crítico.
Para desenvolver o raciocínio crítico do aluno, o conteúdo de nossas aulas
deverá se relacionar também a outros conteúdos, a outros discursos, a outras
disciplinas, a outros saberes, à música, imagem, Internet, etc. Assmann (1998, p.
30) recorda-nos que: “O conhecimento só emerge em sua dimensão vitalizadora
quando tem algum tipo de ligação com o prazer.”
Portanto, procuramos enriquecer a aula desenvolvendo metodologias de
aprendizagem, utilizando sons, músicas conhecidas, poesia, histórias, entusiasmo e
criatividade, tudo que ajude o educando a perceber, refletir e compreender as regras
subjacentes do acordo ortográfico da Língua Portuguesa, utilizando também a
tecnologia de comunicação digital em seu amplo feixe de possibilidades. A Internet
não pode ser considerada apenas como uma grande fonte de dados sobre os
conteúdos curriculares, sem que se perceba que se transformou também em um
modo de produzir conhecimento, onde a capacidade de aprendizado e de
assimilação do aluno poderá ser bastante elevada e estimulada.
Lévy (2000, p. 169) alerta que é preciso “buscar e encontrar soluções que
utilizem técnicas capazes de ampliar o esforço pedagógico dos professores”, pois do
professor depende a metodologia, a eficiência e os objetivos a serem alcançados.
Assim, a necessidade de dedicar-nos a desenvolver metodologias de
aprendizagem atraentes, aulas interessantes e desafiadoras. Devemos manter-nos
abertos para o novo, apropriar-nos dos benefícios que as novas tecnologias, a
música e diferentes gêneros do discurso oferecem, e ter disposição para aprender,
como proposição e melhoria no currículo, na proposta pedagógica e na prática de
sala de aula. Urge abandonarmos o esquema tradicional de aulas, uma vez que:
Em estreita parceria com aceleradas inovações tecnológicas nos mais variados campos, ele atingiu um potencial produtivo jamais visto. Mas bem no cerne dessa visão mutante do trabalho humano se instalou uma cobrança crescente de novas habilidades e novos conhecimentos. No futuro só vai continuar trabalhando quem estiver aprendendo intensamente por toda a vida. (ASSMANN; MO SUNG, 2000, p. 13).
Por isso, devemos continuar aprendendo e capacitando para evitarmos os
modelos fechados dos livros didáticos, atendendo às exigências de renovação
constante e necessidades do educando em um contexto mutante.
Quando entendemos a necessidade de inovar metodologias e maneiras de
ensinar, seremos professores capazes de tomar iniciativas, opondo-nos à
transmissão de saberes prontos dos livros didáticos e teremos alunos tão animados
quanto o professor. Assim, por meio do trabalho com a gramática, o educando
poderá compreender melhor a organização do texto, a adequação do discurso e
perceber os recursos linguísticos utilizados para efeitos de sentidos. De acordo com
Assmann (2000 p. 14), “Será necessário gostar de inventar e inovar para fazer algo
que seja apreciado pelos demais”. No mundo de hoje, apesar do trabalho e da
dedicação, precisamos tomar iniciativas inovadoras com metodologias de ensino
mais variadas, não permitindo fracasso no ensino da língua materna.
Gilles Deleuze e Félix Guattari (2004) nos ensinam por meio do livro Mil Platôs
os conceitos de mapa e decalque. O conceito de mapa extrapola o sentido
semântico porque Deleuze e Guattari foram procurar explicação na filosofia.
Percebe-se que fazer mapa é um convite insistente para o novo, para um algo mais
na educação, é um convite para abandonar o método tradicional de ensino e buscar
novas metodologias.
De outra forma, quando Lévy (2006, p.157 ) escreve que “pela primeira vez na
humanidade, a maioria das competências adquiridas por uma pessoa no início de
seu percurso profissional estarão obsoletos no fim de sua carreira”, Percebe-se que
Lévy também propõe o novo, convida-nos a deixar para trás a mesmice, ou seja, a
repetição dos mesmos conteúdos, dos mesmos exercícios, e incentiva-nos a
abandonar a velha metodologia que aprendemos no início de nossa carreira e que
vem se repetindo anos após anos.
Conforme Deleuze e Guattari (2004, p. 22),
O mapa é aberto, é conectável em todas as suas dimensões, desmontável, reversível, suscetível de receber modificações constantemente. Ele pode ser rasgado, revertido, adaptar-se a montagens de qualquer natureza, ser preparado por um indivíduo, um grupo, uma formação social. Pode-se desenhá-lo numa parede, concebê-lo como obra de arte, construí-lo como ação política ou como meditação.
Se o mapa é aberto, o conteúdo de nossas aulas deve se relacionar também
a outros conteúdos, a outros discursos, às outras disciplinas, a outras imagens, a
todo saber. Poder-se-á utilizar dos sons, das músicas preferidas na região, da
natureza, das cores, da poesia, do entusiasmo e da criatividade.
Nos seus propósitos de denúncia, Deleuze e Guattari (2004, p. 22)
consideram que “o decalque remete sempre a uma presumida competência.” Então,
o professor de Língua Portuguesa não precisa abandonar o ensino da gramática,
mas precisa ter criatividade para não fazer decalque no ensino da gramática.
Para o professor fazer mapa e não decalque, o ambiente pedagógico precisa
ser lugar que ofereça sensação de prazer e alegria de estar aprendendo. Hugo
Assmann assinala que:
Precisamos reintroduzir na escola o princípio de que toda a morfogênese do conhecimento tem algo a ver com a experiência do prazer. Quando esta dimensão está ausente, a aprendizagem vira um processo meramente instrucional. (ASSMANN, 1998, p. 29).
Diante disso, é possível entender que a escola deve ser um espaço propício
para estimular a imaginação criadora dos educandos, com educadores qualificados,
entusiastas e otimistas, com criatividade e novas metodologias de aprendizagem
para oportunizar situações agradáveis no contexto da aprendizagem do novo acordo
ortográfico da Língua Portuguesa.
3 Desenvolvimento
A implementação da proposta de intervenção pedagógica foi realizada em 8
(oito) encontros: o quarto e o último com o aproveitamento de 2 (duas) horas/aula,
perfazendo um total de 10 horas/aula. O local escolhido para o desenvolvimento das
atividades foi a Escola Estadual Guimarães Rosa – Ensino Fundamental, município
de Assis Chateaubriand, no segundo semestre de 2011, com 31 (trinta e um) alunos
da 5ª série do período matutino.
O primeiro passo dado para a realização deste trabalho foi a apresentação do
projeto para os alunos, que se mostraram curiosos e aceitaram participar das
atividades propostas. Em seguida, a professora repetiu seu nome pausadamente de
modo que o aluno percebesse que ela chamava a atenção para o acento tônico de
seu nome (He-le-na). O acento tônico, também conhecido de acento prosódico, não
deve ser confundido com acento diacrítico, ou seja, com os sinais de acentuação
gráfica, agudo (‘) ou circunflexo (^). O acento tônico pode recair na última, na
penúltima ou na antepenúltima sílaba das palavras. A palavra é classificada como
oxítona quando o acento tônico cai na última sílaba, paroxítona se o acento tônico
está na penúltima sílaba e proparoxítona quando o acento tônico recai na
antepenúltima sílaba.
O passo seguinte foi a apresentação dos alunos, cada um dizendo o seu
nome pausadamente. Nessa atividade, alguns dos alunos depararam com grupos
vocálicos em seus nomes. Houve necessidade de trabalhar os grupos vocálicos
ditongo e hiato, e a pronúncia que cada grupo obedece. Nessa etapa a professora
anotou o nome dos alunos para formação de 3 (três) equipes: a primeira equipe com
alunos de nome oxítono, a segunda equipe com alunos de nome paroxítono e a
terceira com nome proparoxítono. O objetivo era, a partir dos conhecimentos prévios
como acento tônico, o aluno detectar qual o critério usado para formação das
equipes e a compreender a diferença entre vocábulos oxítono, paroxítono e
proparoxítono.
Na próxima etapa foi trabalhada a letra da música Construção de Chico
Buarque, compositor, poeta, cantor e apreciador dos vocábulos oxítono e
proparoxítono, usando-os como recurso expressivo na composição da letra, na
música, na melodia, na harmonia e no ritmo da frase para produzir efeito especial.
Ele iniciou sua carreira como escritor em 1962, quando escreveu seu primeiro conto
aos 18 anos, mas ganhou destaque como cantor e é considerado um dos maiores
músicos brasileiros, e em sua produção artística demonstra preocupação social.
O aluno, além de ouviu a música do CD, acompanhou a letra da música em
papel impresso com o objetivo de perceber que toda palavra proparoxítona é
acentuada.
Construção (Chico Buarque) Amou daquela vez como se fosse a última Beijou sua mulher como se fosse a última E cada filho seu como se fosse o único E atravessou a rua com seu passo tímido Subiu a construção como se fosse máquina Ergueu no patamar quatro paredes sólidas Tijolo com tijolo num desenho mágico Seus olhos embotados de cimento e lágrima Sentou pra descansar como se fosse sábado Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago Dançou e gargalhou como se ouvisse música E tropeçou no céu como se fosse um bêbado E flutuou no ar como se fosse um pássaro E se acabou no chão feito um pacote flácido Agonizou no meio do passeio público Morreu na contramão atrapalhando o tráfego.
Na leitura oral, notou-se a necessidade de trabalhar o vocabulário, porque
havia palavras desconhecidas pelos alunos, dificultando a compreensão do texto.
Foi necessária a pesquisa no dicionário e o auxílio do professor. A letra dessa
música mostrou aos alunos o quanto é importante ter o conhecimento de mundo
para compreender os textos, conhecimento que se adquire, principalmente, por meio
da leitura. Trabalhou-se com a rima, a sua posição no verso e o valor da tonicidade
nas palavras. Observou-se a sonoridade com uso das oxítonas no início dos versos.
Para a realização da etapa a seguir foi selecionado o OAC nº 3136 do Portal
Dia-a-dia Educação.
Figura 1: OAC 3136 Fonte: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/apc/frm_resultadoBusca.php.
A professora contou a história da acentuação gráfica, do Leia mais, OAC nº
3136 e o aluno que ouviu atentamente. Nessa atividade, o aluno pesquisou na
Internet, nome de cidades do estado do Paraná que tem acento gráfico. Também foi
proposto que o aluno apontasse nome de familiares ou conhecidos que deveria ser
acentuado por essas regras. Muitos alunos encontraram nomes de familiares
acentuados de acordo com as regras da acentuação gráfica em vigor. Um dos
alunos apresentou o nome de seu pai Antonio sem acento gráfico. Durante essa
atividade percebeu-se bom nível de observação e pensamento crítico. A atividade foi
realizada de forma tranqüila e reconheceu-se que nenhum deles apresentou
dificuldades em reconhecer nomes que contemplam o acento gráfico.
Na sequência, foi apresentada a história No Reino dos Acentos4. Todo aluno da
sala conhecia e se lembrava de um conto de fadas. Para essa atividade, foi de
4 Adaptação de Uma ideia toda azul. COLOSANTI, Marina. Rio de Janeiro: Nórdua, 1979.
fundamental importância o uso das tecnologias na sala de aula, pois os alunos
tiveram a oportunidade de ver a figura 2 na TV Pen drive.
Figura 2: Reino dos Acentos Fonte: Acervo particular5
Era uma vez um rei que se chamava Júlio César Cristóvão Veríssimo. Como seu nome tinha acentos, gostava de nomes acentuados mais do que de nomes não acentuados graficamente. A princesa Cláudia Angélica também gostava muito de nomes acentuados mais do que de nomes não acentuados até o dia em que conheceu o príncipe Luis Eden Godoi. Aí ela gostou mais de nomes sem acento do que com acento. O pai, que gostava só de nomes com acento, achou logo que o príncipe não servia. Mandou investigar e descobriu que o rapaz tinha pais e irmãos com nomes acentuados. Era gentil, honesto e trabalhador, disseram, mas enfim, não era nenhum marido ideal para sua filha. Diante da insistência da princesa, o rei então, chamou o conselheiro do reino, um homem letrado e fiel. Ele pensou, pensou, e chegou à conclusão de que o jeito melhor era botar acento no nome do rapaz. Quem sabe, assim, o rei passaria a gostar dele. Dito e feito, deram outro registro de nascimento para o jovem que passou a assinar Luís Éden Godói e o rei aprovou o namoro. A prima Nilcéia, ao saber que o príncipe havia mudado o nome, tentava afastá-lo da princesa. Consultou os melhores gramáticos, mas não teve sucesso. E, surpresa, quis tirar o acento de seu nome. (Adaptação de “Uma idéia toda azul”).
Para o trabalho com o texto foram propostos questionamentos com o objetivo
de levar o aluno a perceber que Luis Eden Godoi, segundo as normas, deveria ser
acentuado e que não é um caso específico, e que esses erros são cometidos com
alguma frequência. Essas atividades suscitaram um autoconhecimento, uma vez
que as questões com nomes Cláudia Angélica, Nilcéia exigiam respostas que os
levava a refletir, baseada na indução da metodologia reflexiva.
5 Foto tirada em Las Vegas/Nevada/USA, na data de 21/04/2010.
Essa história levou-os a refletir e discutir sobre os erros que ocorrem nos
registros de nascimento e o que fazer diante das mudanças trazidas pelo acordo
ortográfico como no caso do nome Nilcéia. Após discussões que estimulam o aluno
a compreender as regularidades de uso da acentuação gráfica nos vocábulos
oxítono, paroxítono e proparoxítono foram propostas atividades de produção de
história em quadrinhos. Esta tarefa contou com entusiasmo de todos os alunos da
sala, que se mostraram envolvidos com o trabalho.
Figura 3: Atividade de História em Quadrinhos
Fonte: Acervo particular6
Para a realização da história em quadrinhos, primeiramente, foi apresentado
um breve estudo sobre o gênero história em quadrinhos.
Em outro momento houve também breve estudo do gênero textual poesia e a
sua estética. A poesia que sempre dá a emoção ao texto, que é a expressão de
sentimentos. Conversou-se sobre a linguagem do poeta que não usa as palavras em
seu sentido próprio, do modo como estão no dicionário (sentido denotativo), e sim no
sentido figurado, subjetivo, poético, produzido pelo contexto, possibilitando várias
interpretações (conotação). Esse efeito conotativo, o autor o busca no uso de figuras
de linguagem. Tais figuras são recursos que permitem criar efeitos de sentido para
emocionar/envolver o leitor. Há vários tipos de figuras de linguagem. Na sequência,
6 Atividade realizada pela aluna da 5ª série da Escola Estadual Guimarães Rosa de Assis Chateaubriand – PR.
apresentou-se dois exemplos de figuras de linguagem mais comumente usadas nos
textos literários.
Após o estudo, os alunos analisaram a poesia E agora, José? de Carlos
Drummond de Andrade por meio de atividades oral e escrita sobre acentuação
gráfica de José e você. Esta tarefa foi cumprida com sucesso pelos alunos. Na
discussão sobre o personagem José, os alunos abordaram temas como
desigualdade social, desemprego, preconceito racial, solidão e valores familiares
que gerou uma forte discussão sobre o personagem José da poesia.
Na sequência, apresentou-se os exemplos de figuras de linguagem da poesia
E agora, José?
Sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro...
A metáfora é uma figura de linguagem muito usada nos textos literários. A
metáfora ocorre quando o poeta usa uma palavra no lugar de outra, estabelecendo
relação entre dois elementos, sem usar o termo de comparação “como”, tornando-
se, assim, uma comparação abreviada, em função de alguma semelhança entre os
dois elementos.
Essa etapa do trabalho foi concluída com uma pesquisa de outras poesias. A
atividade proposta foi de pesquisar poesias que apresentassem títulos acentuados
graficamente, porém, muitos alunos pesquisaram e encontraram poesias que
apresentam vocábulos acentuados em seus versos.
Para iniciar o estudo do hífen, fez-se necessário um trabalho com cantigas e
brincadeiras de roda e apresentou-se ao aluno um breve histórico desse gênero.
Conhecida como cirandas, a prática dessas cantigas e brincadeiras é comum em
todo o Brasil e faz parte do folclore brasileiro. Consiste em formar um grupo de
crianças que dá as mãos e canta uma música com melodia e ritmo equivalente à
cultura local. As letras sempre são de fácil compreensão e geralmente apresentam
coreografias próprias.
Após esse estudo foi apresentada a cantiga Terezinha de Jesus e cantada
com a letra do texto Uso do Hífen.
USO DO HÍFEN (Música: Teresinha de Jesus) No acordo ortográfico, super-homem tem o hífen, é igual ultra-humano ou o mini-hospital. O primeiro é prefixo, o segundo é com h, quando isso acontece, é certeza leva o hífen. Quando o prefixo é o vice, pró, recém, ex, aquém, pré, além, pós ou sem, é certeza uso o hífen. É por isso, quando escrevo ex-aluno, vice-líder, pré-primário, pró-reitor, com certeza uso o hífen. Tem o hífen chá-da-índia, tique-taque, guarda-chuva, erva-doce, mal-me-quer, quarta-feira e bem-te-vi. Na palavra micro-ondas há o encontro de 2 “os”, quando isso acontece, é certeza leva o hífen. É igual em contra-ataque Onde há o encontro de 2 “as”, quando isso acontece, é certeza leva o hífen.
O trabalho com a música superou as expectativas e obteve-se um bom
resultado, tanto na oralidade quanto nas atividades escritas. Foi possível verificar
que o aluno é capaz de compreender o raciocínio lógico dos mecanismos no uso do
hífen e perceber regularidades, mas houve estranheza em relação à escrita das
palavras que perderam o hífen como minissaia, antessala, etc.
Ainda para essa etapa, foi selecionada a poesia A galinha cor-de-rosa de
Duda Machado para trabalhar a palavra “cor-de-rosa” que não faz parte das
regularidades do uso do hífen. Foram realizadas atividades de pesquisa na Internet
de grafias consagradas e que agora são exceções à regra como “cor-de-rosa”. Na
pesquisa, encontraram-se palavras como água-de-colônia, arco-da-velha, pé-de-
meia, mais-que-perfeito, queima-roupa, deus-dará que não fazem parte das
regularidades no uso do hífen.
Foi selecionada também a poesia O Relógio de Vinícius de Moraes. Houve
um estudo sobre a Onomatopéia (tic-tac) que o poeta Vinícius de Moraes usa para
dar ritmo e efeito sonoro ao poema. Essa repetição (tic-tac) ao longo do texto
acabou fazendo uma sonoridade agradável ao aluno da 5ª série que gostou do efeito
especial do som do relógio na leitura oral da poesia.
O Relógio7
Passa, tempo, tic-tac Tic-tac, passa, hora Chega logo, tic-tac Tic-tac, e vai-te embora Passa, tempo Bem depressa Não atrasa Não demora Que já estou Muito cansado Já perdi Toda a alegria De fazer Meu tic-tac Dia e noite Noite e dia Tic-tac Tic-tac Dia e noite Noite e dia.
O estudo se deu de forma descontraída e os alunos realizaram as atividades
propostas com facilidade demonstrando certa familiaridade com palavras compostas
com elementos repetidos que também levam hífen como tico-tico, pingue-pongue,
blá-blá-blá.
Também foram propostas atividades de pesquisa na Internet com finalidade
de levá-los a descobrir outras palavras que continuam com hífen por constituírem
uma unidade semântica e um só conceito como em bem-te-vi, bem-me-quer, erva-
de-cheiro, couve-flor, erva-doce, feijão-verde, coco-da-baía, joão-de-barro. Para
essa atividade houve breve estudo do significado de unidade semântica e de único
conceito em palavras compostas.
7 O Relógio é um dos poemas de Vinícius de Moraes que faz parte da A arca de Noé, lançado em 1970 pela José Olympio.
Para trabalhar a extinção do trema, houve antes um estudo sobre gênero
crônica e das características de linguagem pertinentes a esse gênero textual.
Verificou-se que primeiramente a crônica surgiu no jornal mas se tornou composição
literária e que apresenta as seguintes particularidades de estrutura e linguagem:
texto curto, descontraído, estilo informal e coloquial, uso de discurso direto com
diálogo entre personagens, exposição de fatos e crítica que conduz à reflexão das
idéias apresentadas sob visão do cronista.
Foram feitas algumas considerações a respeito do título da crônica: O trema
vai sumir, nome que leva o aluno à compreensão que o trema foi abolido de todas as
palavras da Língua Portuguesa. Porém, alguns alunos não conheciam o trema e
fizeram-se necessárias algumas informações sobre o trema. Logo após, foi-lhes
apresentado a crônica de Jô Soares, O trema vai sumir. Para essa atividade, foi
importante o uso das tecnologias, pois os alunos tiveram a oportunidade de ouvir a
crônica na TV Pen drive. Apresentou-se, então o seguinte texto:
Como é que a gente vai comer linguiça sem o trema? Vai estragar. Você chega ao botequim e grita: - Seu Lourival, me dá um sanduíche de linguiça. Depois de algum tempo, o dono do botequim, que você conhece há anos, entrega o seu pedido: - Seu Lourival, esta linguiça está estragada. - Como assim? - Está sem trema. - A culpa não é minha, é da reforma. - Não interessa. Eu não vou comer uma linguiça sem trema. Vai me fazer mal. - O senhor pode comer tranquilo. - Não posso, porque tranquilo também não tem mais trema. Vou ter de deixar de frequentar o seu botequim, uma vez que a sua frequência não é mais a mesma. - O senhor acha? - Claro, a sua frequência não tem mais trema. - Bom, então, suspende a linguiça? - Evidente, seu Lourival. Eu sou um homem de princípios. Sempre comi linguiça com trema, não vou passar a comer sem trema. Eu lá tenho cara de quem come 'linguiça'? - você pergunta, indignado, pronunciando 'gui' em vez de 'güi'. - Assim, eu não aguento. - Não aguenta com trema ou sem trema? Por isso eu imploro, senhores da reforma: cuidem do trema, ou correremos o risco de ver toda a população de língua portuguesa trocando a linguiça pela salsicha. (JÔ SOARES)8
8 SOARES, Jô. O trema vai sumir. In: Wem ay a reforma ortográfika. Disponível em: http://www.apn.org.br/apn/index.php?Itemid=43&id=675&option=com_content&task=view .
Realizou-se também a leitura oral da crônica em papel impresso e iniciaram-
se atividades orais a respeito das palavras linguiça, tranquilo, aguento, frequência.
Também foi questionado se conheciam outras crônicas e quais seriam esses outros
textos. Terminadas as questões orais, iniciou-se o trabalho com atividades escritas
com proposição de compreensão e análise do texto. Ainda nessa atividade, os
alunos visitaram os estúdios da Rádio Vale Verde Fm, que fica próximo à escola,
para gravação da crônica em CD, em grupo de 3 alunos.
Figura 4: Alunos gravam o texto O trema vai sumir no estúdio da Rádio Vale Verde Fm
Fonte: Acervo Particular
Além das atividades orais, que levaram o aluno perceber a extinção do trema,
foram realizadas também atividades escritas. Ressalta-se aqui, que a maioria dos
alunos apresentou-se motivado a desenvolver esta atividade, notou-se também que
o contato com a crônica contribuiu para que se envolvessem no assunto "trema" que
estava sendo discutido.
Na sequência, conversou-se sobre o autor da crônica, José Eugênio Soares,
mais conhecido como Jô Soares ou simplesmente Jô, que é um humorista,
apresentador de televisão, escritor, artista plástico, dramaturgo, diretor teatral,
músico e ator brasileiro.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho realizado com as regras e normatizações do Acordo Ortográfico da
Língua Portuguesa foi um desafio, uma inovação que trouxe uma experiência
gratificante. Durante o processo de implementação, surgiram algumas dificuldades e
sentimos que para se trabalhar as regras vigentes da Língua Portuguesa na 5ª série,
o aluno deve ter conhecimento anterior de grupos vocálicos, divisão de silabas,
acento tônico e estar amadurecido para leitura oral de textos. Eis por que
trabalhamos oxítona, monossílaba, ditongo, etc, durante a implementação, e em
algumas aulas, conceitos de diferentes gêneros textuais como poesia, crônica e
história em quadrinhos, pois se fez necessário determinar e atender horizontes de
expectativas.
Este trabalho não abordou como eram as regras antigas da acentuação
gráfica, do trema, do acento diferencial e tampouco como era usado o hífen. Em
nenhum momento foi colocado como foco principal, as mudanças ocorridas com a
reforma ortográfica, mas somente as regras e normatizações em vigor e a grafia
atual da Língua Portuguesa adaptadas nos livros didáticos desde 2010. Com base
nas regras e normatizações, a partir de diferentes gêneros textuais, buscamos
propor meios de ação para ajudar o aluno a ser capaz de compreender o raciocínio
do sistema dos mecanismos linguísticos do acordo ortográfico da língua materna, de
maneira simples e agradável.
Queremos ressaltar aqui que o desenvolvimento de metodologias para o
ensino do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa e sua implementação contribuiu
muito para que os objetivos a que o trabalho se propôs fossem alcançados, uma vez
que as Diretrizes Curriculares Estaduais (DCEs) sugerem que, em casos como deste
estudo, o ensino seja encaminhado a partir da metodologia reflexiva baseada na
indução, para conclusão.
No entanto, a tarefa de desenvolver metodologias voltadas para interagir o
aluno com as regras e normatizações do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa,
não foi concluída. O grande anseio é de que nossa experiência possa inspirar
professores PDE que buscam inovações pedagógicas que venham contribuir para a
melhoria da qualidade do ensino da Língua Portuguesa na rede pública
paranaense.
REFERÊNCIAS
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DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs _ capitalismo e esquizofrenia. 3ª reimpressão: São Paulo: Editora 34, Coleção Trans, v. 1, 2004. LOBATO, Monteiro. Negrinha. 9ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1959, p. 135. MACHADO, Duda. Histórias com poesia, alguns bichos e Cia. São Paulo: Editora 34, 2003. MORAES, Vinícius de. A arca de Noé: Poemas infantis. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. MORAIS, Artur Gomes de. Ortografia: ensinar e aprender. São Paulo: Ática, 2007. PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Superintendência de Educação. Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua Portuguesa para Educação Básica. Curitiba, 2008.
PIERRE, Lévy. Cibercultura. 2. ed. São Paulo: Editora 34, 2000. POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas: Mercado Letras, 2009.
SOARES, Jô. Wem ay a reforma ortográfika. Disponível em: < http://www.apn.org.br/apn/index.php?Itemid=43&id=675&option=com_content&task=view >. Acesso em: 15 jul. 2011.