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O africano que existe em nos I

O Africano que Existe

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Page 1: O Africano que Existe

O africano que existe em nosI

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Edição de texto

Júlia Vidal

Adaptação e revisão do texto

Ana Vidal

Projeto gráfico e editoração eletrônica

Júlia Vidal

Capa

Júlia Vidal

Fotografias

Júlia Vidal

Maria Sampaio

Pierre Verger

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fontes digitais afro-brasileirasO africano que existe em nos

Júlia Vidal

1ºşexemplar 2004

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Agradecimentos especialíssimos a Ana Vidal, Via Negromonte, Maria Sampaio, a minha mãe, Sílvia Vidal, e Minha Avó, Cirene Vidal, que tanto inspiraram este trabalho.

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Ana Vidal

A negritude em lábios fartos e olhos cor da noite. E nos olhos um mar de lembranças, de dor, de renascimento. E nos lábios um som diferente, sílabas, palavras, que expressam uma nova raça. A negritude em batuques ansiosos, que sussurram, contam, gritam sua história. E no batuque nascem ritmos de todas as cores. A negritude em movimentos, ora lentos, ora revoltos. E nos movimentos, a pulsação marca a cadência que sobe pelos pés, pernas, explode nos quadris e silencia no coração. A negritude em sabores indescritíveis e odores embriagantes. E no sabor sempre uma mistura de terra e fogo, principalmente fogo, de se queimar a boca, agitar a mente e acalmar o corpo. O corpo, que exala todos os sabores pelos poros, pela respiração. A negritude em fé, arrebatadora. E na fé, a certeza, devoção. O bem e o mal, intimamente ligados, como irmãos. A negritude em símbolos, em formas decifradoras. E nos símbolos, uma história, gerações, uma vestimenta, uma arte, expressão. Uma raça e sua tradução. A negritude em miscigenação. E na miscigenação, um povo. E no povo, uma nação. E na nação, Brasil. E no Brasil, a negritude.

A negritude

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9Dizem que o Brasil é o maior país mestiço do mundo, um país multirracial.

O brasileiro é múltiplo, a sua alma é composta por inúmeras influências, crenças, ritos, lendas, danças, ritmos, cores e sabores.

E nesta grande mistura não nos distinguimos mais. Somos pardos, brancos, negros?

O objetivo desse trabalho é conhecer e registrar de onde viemos e em especial resgatar os primeiros negros que chegaram no Brasil e as características culturais que trouxeram, o que as-

similamos e o que faz parte da nossa maneira de agir, de pensar e das nossas representações.

Foi através de sua escrita: símbolos carregados de significados, que começou este trabalho de documentar a origem estética da identidade

brasileira. Formas e ritos que fazem parte do nosso cotidiano, e nem ao menos, sabemos separá-los, identificar sua origem: africana, indígena

ou portuguesa?

Mas o resultado dessa mistura é, com certeza, bem brasileira.

IntroducaoIs

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Arte Negra associada a Tipografia

“Escrever, no início, era uma arte”.

As primeiras imagens “escritas” eram formas simples, ideográficas, que representavam o vocabulário básico: homem, mulher, fogo, comida, árvore, abrigo e outras idéias rela-cionadas ao princípio da nossa existência. Portanto, a forma estética de um determinado ser ou objeto era a sua própria representação na escrita.

Os africanos e sua arte são muito antigos, anteriores aos gregos. Pela ausência de uma língua e até mesmo de um Estado comum, que estabelecesse um idioma e uma escrita unificadora, toda cultura, mitologia e conhecimento é passado através da arte. E a arte afri-cana, se torna uma forma de comunicação social subjetiva, assim como a tipografia hoje.

Sua principal característica é o naturalismo e a total liberdade criativa.

A liberdade de expressão, fortemente presenciada na arte negra, influenciou diversas culturas, chegando a modificar a arte até então produzida.

O seu princípio de integração total da arte na vida vem à tona nos ideais fundamentadores da Bauhaus, berço do design. Esta buscava a união entre criação livre e a arte aplicada.

A arte africana, algumas vezes, considerada primitiva, deu novo rumo obra de Picasso. Ele, após esse contato, liberta-se formalmente começa a cubificar o objeto (decomposição geométrica), movimento denominado Cubismo.

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Outros movimentos que assumem aspectos presentes na arte negra foram: O Expressionismo, deformação emocional; Concretismo, ponto e contraponto; Sur-realismo, temas paradoxais e irrealidade; Futurismo, processo baseado na dinâmica (pinturas rupestres do sudoeste africano); Abstracionismo, arte que representa o estado de espírito.

Sendo assim, podemos dizer que a arte africana influenciou e inspirou a Arte Moderna.

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12 A escravidão na África era uma instituição consolidada e defendida pelos povos antigos, civilizados ou não. Já existia entre eles um sistema semifeudal, com produção agrícola, artesanal, fundição de metal e mineração.

O trabalho servil era comum entre estes povos. Da mesma forma que, oferecer uma família para o trabalho escravo, como pagamento de dívidas contraídas. Ou o sistema dos “soba”, onde uma aldeia inteira era escravizada por um senhor.

A ausência de um Estado comum fazia com que cada nação tivesse um dialeto, religião ou divindade cultuada, arte...

Logo, estas sociedades muitas vezes se envolviam em conflitos e a tribo ou nação der-rotada era escravizada pela vencedora.

Uma vez a escravidão instituída entre os africanos, a Igreja Católica utilizou-se desta para defender a idéia de que “os negros são condenados a serem para sempre escravos dos brancos”, Bispo Azevedo Coutinho.

Os portugueses mediante esta conjuntura favorável ao tráfico de escravos, trouxeram inúmeras “peças” de suas colônias africanas para o Brasil.

Chegando a colônia portuguesa, os negros descendentes dos grupos Bantos (vindos do Congo, Angola e Moçambique) e Nagôs (vindos do Daomé, Nigéria e Sudão) foram os que mais influenciaram nossa cultura.

A Escravidao

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Os primeiros escravos, das tribos fulas e mandingas, vieram da Guiné portuguesa, e eram chamados de “peças da Guiné”. Depois seguiram as demais tribos:

• Nigéria: egbás ou iorubanos (chamados de nagôs no Brasil) eram eles haussás, fulas e kanures; • Guiné: mandingas (ou malês), biafadas, manjacos, balantas, brames, felupes, banhuns, baiotes, bijagós, papeis, nalus; • Angola: benguelas, caçanjes, rebolos; • Congo: cambindas e muxicongos; • Moçambique: macuas e anjicos; • Costa do Ouro (Gana): fantis e ashantis; • Costada Mina (englobava Costa do Guiné, Costa do Marfim e dos Escravos): êues, fons, gás, txis, tapas, gruncis e mandingas;

Os Bantos trouxeram para o Brasil características etnográficas, folclóricas, como ins-trumentos de sopro, cantos, jogos de luta (a capoeira) e o samba. Trouxeram também aspectos da cultura árabe, como as lendas, mitos e tradições orientais.

Os Nagôs, assim chamados por serem mais desenvolvidos intelectualmente, trouxe-ram características religiosas, como o culto aos orixás, divindades do candomblé. Nos influenciaram também na culinária, na indumentária com o traje de baiana e com novos instrumentos, hoje incorporados a música brasileira.

O destaque destes dois grupos na cultura brasileira se deu devido a grande expres-sividade de suas culturas, em relação dos demais grupos de diferentes regiões africanas que chegaram na colônia brasileira.

15Os primeiros escravos chegaram para a edificação da cidade de Salvador, na Bahia em 1549, e depois em 1551 foram para os engenhos de Pernambuco.

Os africanos não eram primitivos, sua cultura já influenciara várias outras sociedades, visto que formam uma civilização antiga, anterior aos gregos.

Eles trouxeram conhecimentos em diversas áreas como por exemplo, a fundição de metal. Com isso, o papel do negro escravo torna-se essencial na construção das primeiras metalúrgicas no Brasil.

• Música

Na música, o negro africano trouxe 25 instrumentos musicais: atabaque, agogô, adufe, berimbau, carimbó, caxambu, cucumbi, chocalho, fungador, ganzá, gongom, mulungu, marimba, puíta, balafom, pandeiro, quissange, rincador, pererenga, socador, tambor, ubatá, xequer, vuvu e o triângulo.

• Entre seus cantos , ritmos e danças estão:

O Acalanto, cantigas com as quais a tão marcada figura da “babá-preta” embalava as crianças.

HerancasI

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O Samba, ritmo que surgiu no Brasil, inspirado nas dançarinas dos cultos afri-canos, denominadas de “sambas”. Estas possuíam grande destaque nos

festejos de Momo, pela sua característica forma de dançar balançando os quadris.

A Capoeira é uma modalidade de luta que também apresenta aspectos da dança. Ela chegou ao Brasil através dos negros

angolanos, firmando-se no recôncavo baiano. É marcada pela música, composta pelo som de berimbaus-de-barriga, pan-deiros, caxixis e reco-recos.

O Lundu possui aspectos que lembram as modinhas. Este ritmo trazido pelos bantos, apresenta características co-reográficas e letras alegres e descontraídas.

O Maracatu une ritmo e dança. Este faz referência tradição da “Coroação dos reis Congos” homenageando a pa-droeira N.sra. do Rosário. Apresenta um cotejo luxuoso, e traz rei, rainha, príncipes, damas de honra e embaixadores.

A “Dama do Passo” é uma figura de grande representação pois carrega a boneca-deusa Calunga, que durante a dança

é passada para os demais integrantes do bailado.

O Batuque era um instrumento primitivo de percussão. Ele acompanhava a dança de roda afro-brasileira, marcada pelo

sapateado e batida de mãos ao som da cantiga.

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O Batuquengê, alterna batucadas suaves e violentas, causando movimentos intensos entre seus componentes.

O Samba de Umbigada ou samba de Roda, era uma dança comum nas festas dos escravos. Neste é formada uma roda, na qual as mulheres dançavam no meio e em seguida cediam o centro para os demais componentes através de um gesto denominado “umbigada”.

O Coco era o canto-dança das praias e dos sertões. Nele o refrão é cantado em coro, que corresponde aos versos do tirador de coco.

O Malungos era uma coreografia, na qual era simulada a partida de escravo para a colônia brasileira.

O Funeral era a forma de comunicação dos filhos de Santos e orixás, através de atabaque e agogôs (que representavam as divindades).

O Jongo era um duelo de dança, demonstrado com o samba e o sapateado, no qual os escravos demonstravam suas habilidades individuais no centro da roda.

O Candomblé é um ritual religioso que tem início com o despacho de exu (o mens-sageiro entre Deus e os homens), seguindo com a “descida” dos orixás, suas danças e cânticos.

O Macule era um bailado, que faz referência a lenda, em que o guerreiro negro salva a sua tribo, por ter deixado de ir a caça para cumprir obrigações com seus deuses.

O Samba Duro, brincadeiras entre os negros de Angola, nas horas de folga.

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• Culinária

Na Culinária afro-brasileira podemos encontrar a comida sagrada dedicadas aos orixás.

E em respeito a este, ainda são mantidas muitas tradições africanas, como: grande assepsia, uso do pano na cabeça, cozer em panela de barro, utilização de fogão de lenha ou carvão, abanar da direita para a esquerda, somente mexer para frente e com a colher de pau, o costume de mulher regrada não entrar na cozinha, entre outras. Muitas das tradições foram incorporadas ao hábito brasileiro, sendo também usadas isoladamente no modo de preparar comidas brasileiras.

O modo de preparo da comida africana ainda persiste, porém os ingredientes foram altera-dos por aqueles que já eram cultivados aqui. A introdução do azeite de dendê, coco, condi-mentos e pimentas, castanha, milho, amendoim e da mandioca, vieram enriquecer a culinária afro-brasileira. Ex-escravos repatriados ex-portaram os hábitos alimentares brasileiros, por isso, na África, estes pratos são conhecidos como “comidas de brasileiros”.

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Dentre os quitutes desta cozinha podemos destacar: o cuscuz, o vatapá, o caruru, o acarajé, o pé-de-moleque,

o cuxá de banana, a paçoca de amendoim, baba de moça, o bolo de aipim e de mandioca, creme de milho verde, o bobó de camarão, moqueca de peixe, cocada branca, axoxó e omolucum, amalá, xinxim, ebó, entre outros.

• Indumentária

Na indumentária percebemos alguns vestígios africanos, como a maneira de amarrar os panos em

volta do corpo ou na cabeça. As várias pulseiras, anéis, colares de coral coloridos e diversificados, feitos

com miçangas, ou fios presos bem junto ao pescoço, hoje são facilmente vistos nos brasileiros e na sua moda.

O uso de rendas brancas em dias de festa, tecidos com cores vibrantes, de listras largas, também são reminiscências da cultura africana, já incorporada pela brasileira.

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20 A diversidade de nações africanas, com diferentes dialetos, dificultou a formação de uma linguagem comum, tanto falada quanto escrita.

Em alguns lugares da África, algumas tribos desenvolveram uma escrita, como os suda-neses, que mantinham permanente contato com o exterior, pois habitavam no litoral.

Porém isso não foi um fato generalizado e cada uma das nações africanas falava diferentes dialetos, assim como desenvolveu diferentes produções artísticas: ourivesaria da Costa do Ouro - atual Gana, máscaras da Costa do Marfim, escultura da Nigéria.

Logo, a linguagem entre países africanos e a transferência cultural entre gerações se dava, muitas vezes, através de sua arte, dos símbolos e seus significados. Estes eram gravados em cada uma das produções artísticas.

Além disso, músicas e ritos eram passados de pai para filho. E para as comunidades primitivas não faltavam representações simbólicas. Os padrões da estamparia africana podem ser considerados apenas como decorativos. Entretanto, se observarmos melhor, verifica-se uma riqueza de símbolos que os desenhos ou motivos evocam.

Os padrões africanos tinham a função tanto simbólica quanto decorativa. Freqüente-mente, imagens humanas ou de animais eram representadas, sempre estilizadas, enfati-zando algumas características com a repetição de formas geométricas.

Idioma e arte

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Triângulos, losangos, quadrados e formas entrelaçadas, aparecem repetidamente nos tecidos, passando pela madeira até a porcelana.

Nos casos em que a função simbólica está presente, encontramos lendas e mitos, representados por imagens de animais. Como exemplo Crocodilo, que é geralmente representado com uma presa na boca. Um dito popular lembra que quando um peixe cresceu e engordou muito, tem mais probabilidade de se tornar presa atual de um crocodilo - entendida como o principio pelo qual a prosperidade do servo beneficia sempre o patrão.

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22 Na África os batiks, tecidos estampados, e as serigrafias resultam de pesquisas ligadas a mitos e lendas, símbolos do folclore nativo.

A estamparia vistosa reflete a imaginação do negro africano, que contribuiu muito para a formação do inconsciente coletivo do brasileiro. Os símbolos e motivos foram incor-porados ao cotidiano, entretanto, desconhecemos sua origem e significado.

A arte negra não é apenas uma representação estética, é também uma atividade cria-dora. Nela o artista expressa o seu universo, apresentando uma estreita relação entre homem, natureza, vivos e mortos. É uma arte que se destaca pela liberdade de forma, adquirindo notável autenticidade.

É através da arte que o negro africano deixa vestígios culturais para as futuras gera-ções. Podemos com isto, estabelecer um paralelo com as produções artísticas do povo brasileiro, tão original diversificadas entre si.

Na arte africana nota-se uma predominância da simetria. Os ornamentos tradicionais são: ponto, traço, lista, linha quebrada, círculo, espiral, disco dentado, losango, triângulo, retângulo e a pirâmide.

A estrutura do ornamento é feita através de paralelismos, respeitando as leis de equilíbrio e movimento. Além da simetria bilateral, a repetição rítmico-circular é muito utilizada.

As fontes digitais afro-brasileiras

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A fonte digital Crioula foi inspirada nas culturas africanas (Nigéria, Daomé, Guiné, Senegal, Angola e Gana).

Foi a partir das características de algumas formas africanas, procedentes das nações, cujas tribos vieram para o Brasil, que os padrões africanos foram selecionados e desenha-dos na fonte Crioula, para estamparia. Foram mantidas formas geométricas trazidas principalmente da Nigéria e Costa do Marfim, países de representação artística mais forte que influenciaram os brasileiros.

O propósito de digitalizar estes símbolos africanos é o de construir estamparias diversas, usando-os conscientemente, já que aqueles encontrados no Brasil, são usados sem que sua origem e significados sejam conhecidos.

Cada um desses símbolos e formas, devem ser teclados repetidamente formando séries paralelas entre si. A escolha das formas utilizadas é feita livremente, expressando a subjetividade do criador.

Por isso, estes símbolos são apresentados de forma acessível. E o resultado, paradoxal-mente, torna-se individual e também integrado a um mesmo universo cultural. Como nos exemplos:

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A família tipográfica Crioula destinada estamparia afro-brasileira se divide em duas fontes:

A Crioula simbolo, que está composta por símbolos que devem ser usados seguida-mente, através da repetiçãode um determinado caractere do teclado. Apresentando um espaço entre cada caractere.

A Crioula padrão também deverá ser usada seguidamente, repetindo um mesmo caractere do teclado ou vários caracteres. Irá compor lindas barras africanas, quando forem alternadas as fontes, Crioula padrão - Crioula simbolo - Crioula padrão. Como no exemplo abaixo:

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A cruz gamada (que corresponde ao caractere “a”, caixa baixa, da fonte Crioula sim-bolo) é um símbolo dos povos indo-arianos, e segundo alguns autores teria inspirado a cruz suástica (voltada para a direita). Essa cruz está em pesos ashanti de bronze, usadas em diversas variantes e originando similares.

As diferentes posições dos elementos que compõem a cruz gamada e a cruz suástica foram debatidas pelos participantes de um festival de Arte Africana. A cruz suástica é um símbolo religioso em forma de cruz, cujos braços são recurvados ou angulares. A cruz suástica voltada para a direita, é o símbolo do partido Nacional Socialista Alemão, enquanto a gamada, voltada para a esquerda é o símbolo de origem indo-ariana.

Os símbolos que seguem, foram retirados de um tecido de um rei ashanti, de grande valor afetivo para os africanos, onde podemos encontrar referências para algumas das formas reproduzidas e utilizadas aqui no Brasil.

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Cabeça vista de trás significa valor, bravura, e coragem. Evoca um tecido tradicional, precioso, do norte do Gana.

“Se a galinha pisar o seu pintinho, ele não morrerá” significa correção, desejo de proteger, paciência.

Garras da águia, evocam o penteado dos servidores da rainha-mãe, aptidão para servir.

Lua simboliza o feminino, significa fidelidade, paciência e determinação.

Talismãăestimado a afastar o que é negativo, significa boa sorte.

O rei dos símbolos adinkra, significa autoridade, grandeza, firmeza e magna-nimidade.

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Cinco tufos de cabelos, evocam o penteado tradicional das sacerdotisas.

Cadeia, significa “estamos ligados tanto na vida como na morte”.

Variante da cadeia

Moinho de vento, significa faculdade de enfrentar as dificuldades a vida.

Chifres de carneiro, significam humildade, excelência, sabedoria.

Casa com dois andares, castelo, significa governo, autoridade, local do poder.

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36 Na África acredita-se em um Deus supremo, Olodumarê, que é inacessível e indiferentes às preces e ao destino dos homens.

Olorum (nagô) ou Zaniapombo (Angola, Congo) é erroneamente confundido pela maioria dos pesquisadores com Olodumarê, traduzido por Senhor do Céu, Orum geralmente é traduzido por céu, mas há algumas tradições que o traduzem como além, infinito, estaria situado na terra. Por isso todas as oferendas aos orixás, sangue de animais sacrificados, são derramadas em um buraco feito na terra. Quando as pessoas morrem são enter-radas embaixo da terra, ou seja, sua alma vai para o Orum.

Os nagôs, por influência dos muçulmanos, tem uma idéia de Deus mais próxima filosofia cristã.

Os orixás (nagô), voduns (gegê) ou inkices (Angola) são divindades africana, intermediárias entre os devotos e a suprema divindade. Eles estão atentos aos devotos e possuem poderes relacionados à natureza.

São ancestrais divinizados que encarnam para dar conselhos, conceder graças, resolver desavenças, dar remédios para dores. O tipo de relacionamento entre o devoto e o seu orixá, é familiar e informal. A descendência do orixá é transmitida pela família paterna.

CandombleI

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Os orixás querem voltar à vida por isso encarnam nos corpos dos seus filhos, descen-dentes, “cavalos”, médiuns preparados para essa atividade.

Na África, cada orixá estava originalmente ligado a uma cidade ou a uma nação in-teira. Há regiões que cultuam um orixá e o culto a outros é oficialmente inexistente. Como por exemplo, o culto de Oxum, marcante na região de Ijexá, e ausente em Egbá. E Iemanjá é soberana em Egbá e ausente em Ijexá. Por estas divergências, muitas vezes essas regiões ou nações guerreavam.

Os cultos são nacionais ou regionais. A realização da cerimônia é assegurada pelos sacerdotes, designados para tal. Os membros da família não têm deveres, somente da contribuição material aos custos do culto. Logo o culto toma um caráter coletivo.

No Brasil, chegando em grupos de diferentes nações, prevalecem às crenças das nações mais desenvolvidas e as demais tendem a aderir ao culto destas. Cada orixá toma caráter individual, já que o devoto cultua seu orixá trazido da região que habitava na África. Eles são orientados pela mãe ou pai-de-santo, no terreiro. Existe então, no mesmo terreiro, vários orixás, reunidos em torno do orixá do terreiro, representando a união dos negros africanos, antes dispersados pelo tráfico negreiro.

Os primeiros africanos, foram trazidos para o Brasil em barcos que homenageavam santos católicos, que tinham o objetivo de converter os “infiéis”. Para isto, a Igreja Católica se utilizava todas as arte-manhas para “salvar as almas”.

Foi através do sincretismo religioso, que os negros encontraram a solução para manter a sua religião de origem. Eles cultuavam e se organizavam em grupos, cantando para seu

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orixá, porém com a imagem de santos católicos, assim puderam manter vivas as suas crenças até hoje, com a correlação que faziam entre seus orixás e os santos católicos. Quando seus senhores questionavam o ritual, diziam que São Jerônimo em sua língua era Xangô, São Lázaro era Omolu, Santa Bárbara era Iansã...Não ficava claro então para quem ou o quê se dirigia o “batuque”. E seus senhores acreditavam e o chamavam de divertimentos nostálgicos, que lhes faziam renascer lembranças em relação as suas origens, não os fazendo esquecer dos sentimentos que os levaram a guerrear em ter-ras africanas.

Hoje os terreiros mais tradicionais lutam para o fim do sincretismo religioso entre os orixás africanos e os santos católicos, embora com o passar do tempo, descendentes de africanos e mulatos tenham sido educados num igual respeito a ambas religiões. São tão sinceramente católicos quando vão à igreja, como ligados as tradições africanas, nas cerimônias do candomblé.

Os orixás desenhados para a família Orixás, são aqueles de culto mais representativo no Brasil. O desenho dos orixás, foi em base aos movimentos e gestos característicos de cada um, além da indumentária. As ferramentas estão associadas a cada um deles e são símbolos de cada orixá e de seus poderes naturais.

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Exú (iorubá); Legbá (gegę); Bombonjira-macho e Panjira-fêmea(nagô);

Não é considerado por todos os pesquisadores um orixá.

É o mensageiro, intermediário entre os homens e os orixás.

Chamado de “o compadre” ou “o homem das encruzilhadas”, pois são nestes lugares que lhe são depositadas as oferendas.

Tem caráter violento e arrebatador, por isso, as cerimônias se iniciam com sacrifícios para ele.

É indevidamente, sincretizado com o diabo, pois convenientemente trabalhado faz o bem.

Simbolizado por um montículo de terra, onde são fincados ferros, lanças, tridentes e objetos de formas obscenas.

As pessoas que lhe são consagradas usam colares de contas pretas e vermelhas. Seu fetiche é uma cabeça onde são incrustadas conchas como olhos e bocas.

Seu dia é segunda-feira.

Fotos Orixá: Pierre VergerFoto estátua do Exu: Maria Sampaio

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Ogum (iorubá); Gú (gegês); Roximucumbi (nagô);

É um dos mais antigos deuses iorubas. É a divindade dos guerreiros e quando se manifesta dança com sua espada, fazendo mímicas guerreiras e de combates.

É o irmão de Exu e de Oxóssi.

Na Bahia, Ogum foi sincretizado com Santo Antônio de Pádua. O que surpreende, já que este santo é geralmente representado com um ar doce e envolvente. No Rio de Janeiro, é sincretizado com São Jorge, o que é mais compreensível, pois a imagem deste santo está associada com um valente guerreiro.

Além da espada, é representado por sete instrumentos de ferro.

As pessoas que lhe são consagradas usam colares de vidro azul escuro e algumas vezes verde. Seu dia é terça-feira e sua saudação é “Ogunyê!”.

Foto Orixá: Pierre Verger

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Oxóssi (iorubá); Águe (gegê); kibuco motolombo (nagô);

É a divindade dos caçadores, proveniente de Ketô. Sua dança é a mímica de uma caçada.

Na Bahia foi sincretizado com São Jorge e no Rio de Janeiro com São Sebastião.

É o irmão de Exu e de Ogum.

Seu símbolo é um arco e flecha em ferro forjado. Dança com o arco e flecha numa mão e na outra o erukerê (espécie de espanador feito de rabos de boi).

As pessoas que lhe são consagradas usam colares de contas azuis esverdeadas.

Foto Orixá: Pierre Verger Foto folheto: Júlia Vidal

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Entre outros deuses da caça, estão:

Orelucrê. Inlê, Ibualama e Logunêdê.

Logonêdê (iorubá);

É a divindade ioruba ligada aos elementos terra e água. Seus domínios são rios, cachoeiras e matas.

Seu culto na região de Ijexá, na África, já foi quase extinto. Porém, No Brasil, tem numerosos adeptos.

Filho de Inlê e Oxum. Dança com o amparo (uma espécie de chicote) na mão.

Tem uma particularidade por viver seis meses na terra, como homem, comendo caça, e seis meses nas águas do rio, como mulher, comendo peixe.

Na Bahia é sincretizado como São Expedito.

As pessoas a ele consagradas usam colares de contas verde- amareladas.

Seu dia é quinta-feira e sua saudação é “Logum!”.

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Águe (iorubá);

Forma de Oxossi de uma nação vizinha aos Nagôs e que se encontra nos candomblés gegês.

Vive permanentemente nas matas e por isso é o inter-mediário de Ossain.

Dança com a ferramenta em uma das mãos e na outra o Erukerê.

É filho de Mawu e Lissa (Oxalá).

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Omolu ou Obaluaiê (iorubá); azoani ou sakpata (gegês); kingongo (nagô);

É a divindade da varíola e doenças contagiosas.

Dança ao ritmo denominado Opanigé, com o rosto e o corpo coberto de palhas e o xaxará (espécie de vassoura feita de nervuras de folhas de palmeiras, decorada com búzios, contas e pequenas cabeças que supõem conter remédios). Quando se manifesta, dança com o corpo curvado para frente, como se estivesse atormentado pelas dores, e imita o sofrimento, as coceiras e os tremores de febre.

Na Bahia, é sincretizado com São Lázaro e São Roque, no Rio de Janeiro e Recife, São Sebastião.

As pessoas a ele consagradas usam dois tipos de colares: o lagidiba, feito de pequeninos discos pretos enfiados, ou colar de contas marrons com listas pretas.

Seu dia é segunda-feira, neste dia o chão da Igreja de São Lázaro, na Bahia, é coberto de pipocas. Seus adeptos passam a pipoca no corpo, com a finalidade de livrar-se de doenças contagiosas associando, numa mesma fé a força do Deus africano e a do santo católico.

Sua saudação é “atotô!”.

Fotos Orixá: Pierre Verger

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Nãnã Bukuru(iorubá); Rodialonga(nagô).

É a mais antiga divindade das plantas águas, das águas paradas, dos lagos e pântanos.

No Brasil, é sincretizado com Sant’Ana.

É a mãe de Omolu.

Sua dança lembra passos lentos de uma senhora idosa, apoiada num bastão imaginário, pois seu corpo está inclinado para frente. Com seu símbolo na mão, eburi, faz gesto de como estivesse ninando uma criança.

As pessoas que lhe são consagradas usam colares de contas e vidro brancas com listas azuis.

Há uma divergência em relação ao dia consagrado a esse orixá, segundo uns é segunda-feira, juntamente com seu filho, e outros que seu dia é sábado, juntamente com as demais divindades das águas, e outros ainda que é na terça-feira.

Sua saudação é “Salúba!”.

Foto Orixá: Pierre Verger

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Oxumarê (iorubá);

É a serpente arco-íris. Simboliza a continuidade e permanência.

Simbolizado por cobras de ferro, dança mostrando o céu e a terra.

Na Bahia é sincretizado com São Bartolomeu.

As pessoas a ela consagradas usam colares de contas de vidro amarelas e verdes.

Seu dia é terça-feira e sua saudação é “ao boboi!”.

Foto festa para Oxumarê: Pierre Verger

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Xangô (iorubá); Sobô ou Badê (gegê); zazê (nagô);

É a divindade do trovão e dos raios.

Sua dança é viril e guerreira, pois era rei dos iorubás. Seus ritmos são vivos e acom-panhados pelos ruídos dos “xerés”. No Recife, seu nome designa o conjunto de cultos africanos praticados em Pernambuco.

É o irmão mais jovem, de Dadá e Omolu.

É sincretizado com São Jerônimo.

Seus símbolos são a pedra de raio, os machados de pedra e o oxé (machado duplo).

As pessoas que lhe são consagradas usam colares de contas brancas e vermelhas.

Seu dia é quarta-feira e sua saudação é “Kawo Kabiesile!”.

Foto Orixá e xeres de Xangô: Pierre Verger

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Oiá-Yansã (iorubá); kaiongo (nagô);

É divindade dos ventos, das tempestades e do rio Níger.

É a 1º mulher de Xangô e antes foi mulher de Ogum.

Sua dança é guerreira, agita os braços como se enxotasse almas, ou com seus símbolos, o alfange (espada) e um Eruexim de rabo de cavalo. Os chifres de búfalos, também são seus símbolos, já que em uma lenda contam que Oiá era um búfalo, que ao tirar sua pele, se transforma em uma linda mulher.

Usa franja de contas que escondem seu rosto.

É sincretizada com Santa Bárbara.

Seus “filhos” usam colares de contas roxas.

Seu dia é quarta-feira e sua saudação é “Epa Hei Oiá!”.

Foto Yansã à esquerda: Pierre VergerFoto Yansã à direita: Júlia Vidal

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Oxum (iorubá); Aziri(gegês); kissimbi (nagô);

É divindade do rio Oxum, que corre na Nigéria, Ijexá e Ijebu. Ocupa o lugar mais impor-tante entre todas as mulheres, pois controla a fecundidade e a vida nos rios, exercendo grande poder sob os de água doce.

Foi também mulher de Ogum e depois a 2º mulher de Xangô. Sua dança lembra o comportamento de uma mulher que vai sensualmente banhar-se ao rio, enfeita-se com colares e braceletes, que titilam quando dança, e contempla-se num espelho.

O ritmo de suas danças é “ijexá”.

Na Bahia, é sincretizada com Nossa Senhora das Candeias, e no Recife é Nossa Senhora dos Prazeres.

As pessoas a ela consagradas usam colares de contas de vidro amarelo-ouro.

Seu dia é sábado e sua saudação é “Ore Yeye o!”.

Foto Orixá: Pierre Verger

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Ossain (iorubá); katende (nagô);

É a divindade das plantas medicinais e litúrgicas.

O ritmo dos seus cantos e danças é rápido, saltitante e ofegante.

Nunca se manifesta em iaôs (iniciados que podem receber o santo ao qual foi consagrado).

Seu símbolo é uma haste de ferro, cuja extremidade é um pássaro em ferro forjado. Esta haste é cercada por outras seis hastes dirigidas

para cima em forma de leque.

As pessoas que lhe são consagradas usam colares de contas verdes e brancas.

Seu dia é sábado e sua saudação é “Kauo Kabiesile!”.

Obá (iorubá)

É divindade do rio Obá.

Foi também mulher de Ogum e depois a 3º mulher de Xangô.

Sua dança é guerreira, em uma das mãos brande um sabre e na outra leva um escudo.

No Brasil é sincretizada com Santa Catarina, mas não se sabe ao certo se seria Santa Catarina de Alexandria, de Bolonha, de Gênova ou de Siena.

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Yemanjá (iorubá); Dandalunga (nagô);

É divindade do mar e da água doce. É a mãe dos outros orixás.

Sua dança imitando o movimento das ondas, leva as mãos alternadamente a testa e a nuca.

Em uma das mãos carrega seu símbolo: Abebé. Simbolizada também por pedras marinhas e conchas.

É sincretizada com Nossa Senhora da Imaculada Conceição.

As pessoas a ela consagradas usam colares de contas de vidro transparentes e vestem-se de preferência azul-claro.

Seu dia é sábado e sua saudação é “Odoia!”.

Foto Orixá: Pierre VergerFoto estátua de Yemanjá: Júlia Vidal

Foto estatueta de Yemanjá: Maria Sampaio

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Oxalá ou Obatalá (iorubá); Olissassa(gegês); Lemba di lê (nagô);

É a divindade da procriação. Orixá mais importante e o mais elevado dos deuses iorubás, pois foi o primeiro a ser criado por Olodumaré, e concedido a ele o poder de modelar os corpos humanos cujas vidas são dadas por Olodumaré. Possui duas formas, que são os mais conhecidos na Bahia:

• Oxalufãn, que dança curvado como um velho com corcunda apoiado num cajado, em cuja extremidade possui um pássaro.

• Oxaguian é um guerreiro vestido de branco, que leva espada e escudo, e uma mão de pilão amarradaŕà cintura.

Na Bahia, é sincretizado com Nosso Senhor do Bonfim.

As pessoas a ele consagradas usam colares de contas brancas e vestem branco.

Seu dia é sexta-feira e sua saudação é “Epa Babáe! e Eké he!”.

Uma versão sincretizada das “águas de Oxalá” é a lavagem do chão da Basílica do Senhor do Bonfim, que acontece todos os anos na Bahia. Atualmente é uma das festas mais populares. Nesse dia as baianas, vestidas de branco, vão em cortejo a Igreja do Bonfim, levando na cabeça, jarros de água perfumada com flores. Elas são acompanhadas por uma multidão, onde até as autoridades civis do Estado da Bahia e da cidade de Salvador figuram.

Foto Orixá: Pierre VergerFoto lavagem Bonfim e fitas do Bonfim: Maria Sampaio

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enigmáticos que levam aos lugares onde as cerimônias são realizadas na África e os camin-hos difíceis e tortuosos para as casas das favelas, onde vivem os negros brasileiros, foi levantada por Renato Barbieri (diretor do Filme Atlântico Negro - na Rota dos Orixás).

• O termo Banguela, tem origem nos escravos procedentes de Angola, das regiões de Benguela, Cambida e Luanda, pois eles tinham o hábito de arrancar os incisivos ou limar um triângulo, com o vértice nas gengivas, em ambos os casos deixando um buraco maior entre os dentes dianteiros.

• Costa do Ouro, atual Gana, foi assim chamada porque os portugueses quando ali chegaram, foram recebidos pelos ashantis com peças de ouro.

• As “batinhas” atualmente tão usadas, sob as formas mais variadas: soltinhas, franzidas, presas à cintura por meio de elástico ou fita, nada mais são que as influências das batas nagôs.

• Abadás, hoje traje usado pelos foliões no carnaval, é um termo africano que designa traje branco (túnica) usado pelos malês para a oração noturna, que se chama aluma gariba.

• O termo mandinga, provem das tribos fulas e mandingas que habitavam a Guiné portuguesa e dedicavam-se à prática de magia e adivinhação.

• Na época da independência do Brasil, em 1822, as relações eram tão próximas com Angola, que este foi o primeiro lugar a reconhecer a independência brasileira. A popu-lação de Angola se sentia muito próxima ao Brasil, já que 94% dos negros escravizados que saiam de Angola vinham para este país. Por isso, os angolanos se sentiam mais próximos ao Brasil que a metrópole portuguesa e nesta ocasião, queriam unir-se ŕ nação brasileira.

70 • O termo “fulo de raiva” e “negrinha fula”, tem sua origem nos fulas, negros inteligentes e empreendedores, que se caracterizavam fisicamente por sua cor opaca, logo ambas se referiam à ausência momentânea de cor na face das pessoas, palidez, sendo aplicado tanto para brancos, quanto para negros.

• A indumentária da baiana tem sua origem nos orixás, saias rodadas e bem ornamentadas, batas (blusa de renda), com grandes laços nas costas na altura da cintura, de cor branco alvo. Influência dos “malês”, que usavam túnicas rendadas e brancas em dias de festas ou em cerimônias.

• Balangandãs: pequenos enfeites de prata, ouro ou corais utilizados como pingentes, em formas de figas, corações, frutas regionais, campainhas, sinos, chaves, pássaros, pequenos chifres. Estão presentes em correntes ou na cintura das negras e mestiças da Bahia, Pernambuco ou Minas Gerais.

• O termo samba, provem das dançarinas da religião africana. As “sambas” se destacavam pelo seu modo de dançar com as mãos nas cadeiras, agachando-se e levantando-se num rebolar original.

• Caminhos sinuosos e tortuosos levam aos terreiros africanos onde as festas para as divindades acontecem, o mesmo ocorre em terreiros afro-brasileiros, que nunca estão à beira da rua. Uma discussão a respeito de uma possível relação entre os caminhos

Curiosidades

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s

“Meu pensamento sempre foi o resultado de uma consciência de terra, de povo... eu venho pregando há muitos anos contra o colonialismo cultural, contra a aceitação pas-siva, sem nenhuma análise crítica, das formas, que nos vêm do exterior - em revistas, bienais, etc - e a favor de um caminho voltado para as profundezas do ser brasileira, sua raiz, seu sentir”. Rubem Valentim.

Cito Rubem Valentim, por sua luta por uma identidade legítima brasileira, por um design caboclo, brasileiro, latino-americano.

Concluindo este projeto, sinto muita satisfação, por que desejo com ele contribuir para que os elementos da cultura afro-brasileira deixem de fazer parte do nosso inconsciente coletivo, e passe a fazer parte do nosso consciente coletivo.

Disponibilizando a fonte Orixás e Crioula, além de toda a minha pesquisa escrita e estética, acredito que os brasileiros terão mais possibilidade de entrar em contato com sua história, sua cultura, sua arte. E possam, a partir dela, interagir indepen-dentemente de conhecimentos estéticos, e criar novas formas e novas estampas. Acredito que qualquer um será capaz de criar uma estampa, sendo esta original e ex-pressiva. Também será possível a aplicação dessas fontes em tecelagem, tapeçaria, painel decorativo, azulejos, papel, entre outros materiais.

Conclusao

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Foi muito gratificante trabalhar com uma cultura visual tão rica e surpreendente, por ser tão pouco explorada em termos de elementos visuais e em relação a sua importância como elemento formador da cultura brasileira. Além de pouco trabalhada no campo do design.

Nós, designers, que constantemente, buscamos uma identidade brasileira, a cara do design brasileiro, devíamos preocupar-nos por explorar toda a nossa própria cultura visual nacional, e produzir a partir dela. Creio igualmente que a profissão e por tanto a produção gráfica brasileira é ainda muito recente, para que tenhamos uma identidade, mas ela virá com uma base na nossa cultura e em todas as culturas formadoras do “jeito brasileiro de ser”.

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74• Carybé e Verger, Pierrre Fatumbi. Lendas Africanas dos Orixás. Salvador. Editora Cur-rupio Comércio Ltda e Círculo do Livro S.A..

• Carybé e Verger, Pierrre Fatumbi. Orixás. Coleção Recôncavo, exemplar nº 10. Salvador BA, 1951. Editora Tipografia Benedita Ltda.

• Carise, Iracy. África: trajes e Adorno. São Paulo, 1991. S.N., S.L..

• Carise, Iracy. Arte Negra na Cultura Brasileira. Rio de Janeiro, 1974. Editora Artenova.

• Jewell, Rebecca. African Designs, British Museum Pattern Books, London, 1994. Editora The British Museum Press.

• Lopes, Nei. Logunêdê. Coleção Orixás. Rio de Janeiro, 2002. Editora Pallas.

• Landes, Ruth. A cidade das mulheres. Rio de Janeiro, 2002. Editora UFRJ.

• Martins, Cléo. Obá. Coleção Orixás.Rio de Janeiro, 2002. Editora Pallas.

• Martins, Cléo. Euá. Coleção Orixás. Rio de Janeiro, 2002. Editora Pallas.

• Martins, Cléo e Marinho, Roberval. Iroco. Coleção Orixás. Rio de Janeiro, 2002. Editora Pallas.

Bibliografia

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• Prandi, Reginal. Mitologia dos Orixás. São Paulo, 2003. Companhia das Letras.

• Rocha, Cláudio. Projeto Tipográfico, análise e produçăo de fontes digitais. São Paulo, 2002, Editora Rosari LTDA.

• Silva, Alberto da Costa e. Um Rio, Chamado Atlântico, a África no Brasil e o Brasil na África. Rio de Janeiro, 2002. Editora UFRJ.

• Tavares, Ildásio. Xangô. Coleção Orixás. Rio de Janeiro, 2002. Editora Pallas

• Verger, Pierrre Fatumbi. Orixás, Deuses Iorubás na África e no Novo Mundo. Tradução de Maria Aparecida da Nóbrega. Salvador, 2002. Editora Currupio Comércio Ltda e Círculo do Livro S.A..

• Valentim, Rubem. Consulta ao arquivo histórico do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), a exposição “Construção e símbolos” do artista em 1994.

• Williams,Geoffrey. African Designs; From tradicional/sources. Dover Publications, Inc., New York.

Longas - metragens:

• Barbieri, Renato. Atlântico Negro - Na Rota dos Orixás. 1998. Filmado em Bahia, Maranhão e Benin.

• De Hollanda, Lula Buarque. Pierre ‘Fatumbi’ Verger - Mensageiro entre Dois Mun-dos.1998. Filmado em Benin, Paris e Salvador.