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As influência que o alcoolismo provoca no âmbito familiar de Grasiele Grallina Seeger. 2011.
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Grasiele Gallina Seeger
O ALCOOLISMO E SUAS REPERCUSSÕES NO ÂMBITO
FAMILIAR
Santa Maria, RS
2011
Grasiele Gallina Seeger
O ALCOOLISMO E SUAS REPERCUSSÕES NO ÂMBITO
FAMILIAR
Trabalho Final de Graduação apresentado
ao Curso de Serviço Social – Área de
Ciências Humanas do Centro Universitário
Franciscano– UNIFRA como requisito
parcial para obtenção do grau de Assistente
Social – Bacharel em Serviço Social.
Orientadora: Profª. Ms. Rosilaine Coradini Guilherme
Santa Maria, RS
2011
Grasiele Gallina Seeger
O ALCOOLISMO E SUAS REPERCUSSÕES NO ÂMBITO
FAMILIAR
Trabalho Final de Graduação apresentado ao Curso de Serviço Social – Área de Ciências
Humanas, do Centro Universitário Franciscano- UNIFRA como requisito parcial para
obtenção do grau de Assistente Social – Bacharel em Serviço Social.
_________________________________________________
Prof.ª Ms. Rosilaine Coradini Guilherme – Orientadora (UNIFRA)
_________________________________________________
Profª. Ms. Nice de Neves Miranda (UNIFRA)
_________________________________________________
Prof.ª Camila dos Santos Gonçalves
Aprovado em 07 de dezembro de 2011
Me aprisionaram quando eu mais precisava de socorro
E se eu quebrava janela. Ou se eu estava agressivo
Era porque nunca tinha lutado para me manter calmo
E como desde pequeno aprendi a carregar tudo calado
Conformar com a tristeza, com desunião entre as pessoas que mais gostava.
Quando eu me senti sem saída
Quando me bateu a revolta das coisas serem do jeito que era
Aí em vez de encontrar uma palavra amiga
Quando precisava de compreensão,
Encontrei tratamento
De um bicho acuado
Fui amarrado
Mas nunca me roubaram minha liberdade
Poder atravessar as muralhas
Porque quando passamos por Regime fechado
Só sobra nossa imaginação e Insanidade.
(José Carlos Dias – MANICÔMIO)
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos meus pais, pelo incentivo, dedicação e amor. Sem vocês nada disso seria
possível.
Agradeço a minha irmã querida, que mesmo longe, esteve tão perto e presente.
Obrigado pelo incentivo e apoio incondicional!
Agradeço ao meu namorado, Pedro Henrique pela paciência, compreensão e carinho.
Agradeço aos professores do curso de Serviço Social, em especial as minhas
supervisoras Rosilaine Coradini Guilherme e Suleima Bredow pelo apoio, atenção e
contribuição em minha formação profissional.
Agradeço a equipe do CAPS-ad II “Caminhos do Sol”, pela oportunidade de estágio.
Foi significadamente importante a experiência vivenciada neste espaço ocupacional. Obrigado
pelo conhecimento, confiança e compreensão durante este tempo que fiz parte desta família
CAPS. Agradeço aos usuários e familiares que contribuíram direta ou indiretamente na
realização deste trabalho.
Agradeço aos meus colegas e amigos, que conviveram comigo durante esses quatro
anos de curso, partilhando dificuldades e felicidades.
Muito obrigada!
RESUMO
O fenômeno álcool/drogas constitui um problema de saúde pública em função da sua
complexidade e magnitude, visto que seus efeitos afetam significativamente a saúde e a
qualidade de vida dos usuários, familiares e da sociedade como um todo. O presente Trabalho
Final de Graduação foi construído a partir do estágio supervisionado em Serviço Social no
Centro de Atenção Psicossocial- álcool e outras drogas II (CAPS-ad II) “Caminhos do Sol”,
em Santa Maria, Brasil-RS. O objetivo do estudo dirige-se no âmbito de oferecer conteúdo
teórico-conceitual por meio de pesquisa bibliográfica que justifique a importância da inserção
da família cuidadora nos serviços oferecidos em saúde mental. Ainda assim será exposto o
projeto de intervenção como parte integrante da prática de estágio, e apresentado depoimentos
dos familiares/co-dependentes de usuários de álcool, no intuito de conhecer a realidade dos
mesmos. Sendo assim, o trabalho aqui exposto propõe a reflexão acerca dos cuidados
oferecidos aos familiares de dependentes químicos a fim de elencar o CAPS-ad II como
dispositivo fundamental neste processo de reabilitação psicossocial.
Palavras-chave: Saúde Pública. Centro de Atenção Psicossocial. Alcoolismo. Família.
Serviço Social.
ABSTRACT
The phenomenon alcohol/drug constitutes a problem of health publishes in function of his
complexity and magnitude, since its effects significantly affect the health and the quality of
life of the users, their families and of the society as a whole. The present Final Job of
Graduation was built from the Traineeship Supervised in Social Service in the Psychosocial
Care Center- alcohol and other drugs II (CAPS-ad II) “Ways of the Sun”, in Santa Maria,
Brazil-RS. The objective of the study is directed within the framework of offer theoretical
content and conceptual through bibliographic research that justifies the importance of
inclusion of the family caregiver in the services offered in mental health. Even so will be
exposed the intervention project as an integral part of the practice of the traineeship and
presented testimonials from family/co-dependent on alcohol users in order to understand the
reality of the same. Thus the job here exposed propose a reflection about the care offered to
the families of chemical dependents in order to enumerating the CAPS-ad II as device
fundamental in this process of psychosocial rehabilitation.
Keywords: Public Health. Psychosocial Care Center. Alcoholism. Family. Social Service
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 7
2 A TRAJETÓRIA DA LOUCURA E OS CAMINHOS PERCORRIDOS À REFORMA
PSIQUIÁTRICA.................................................................................................................. 10
2.1 BREVE ENTENDIMENTO DA LOUCURA EM DIFERENTES PERÍODOS DA
HISTÓRIA ............................................................................................................................. 10
2.2 A REFORMA PSIQUIÁTRICA: O PROCESSO DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO E
A PERSPECTIVA DE NOVOS DISPOSITIVOS DE TRATAMENTO EM SAÚDE
MENTAL..................................................................................................................................13
2.3 OS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS)............................................ 20
3 A PROBLEMÁTICA DO ALCOOLISMO NAS RELAÇÕES INTRAFAMILIA-
RES ........................................................................................................................................ 27
3.1 O ALCOOLISMO ENQUANTO EXPRESSÃO DA QUESTÃO SOCIAL ................... 27
3.2 O ALCOOLISMO E A REALIDADE DA FAMÍLIA/CUIDADOR DE PORTADORES
DE SOFRIMENTO PSÍQUICO ............................................................................................. 30
3.2.1 Co-dependência: a doença da família .......................................................................... 34
3.2.2. O alcoolismo na voz dos familiares/co-dependentes..................................................... 36
3.3 A IMPORTÂNCIA DA INSERÇÃO DA FAMÍLIA NOS CUIDADOS EM SAÚDE
MENTAL ............................................................................................................................. 39
4 SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE MENTAL..................................................................... 44
4.1 O SERVIÇO SOCIAL INSERIDO NOS CUIDADOS EM SAÚDE MENTAL ........... 44
4.2 AS AÇÕES DESENVOLVIDAS NO CAPS-AD II VOLTADAS ÀS FAMÍLIAS DE
DEPENDENTES QUÍMICOS................................................................................................ 48
4.3 A CONTEXTUALIZAÇÃO DA EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO – PROJETO DE IN-
TERVENÇÃO BIBLIOTECA “LEITURA REFLEXIVA”.................................................. 49
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................... 53
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 56
APÊNDICE A- TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .......... 64
APÊNDICE B- TERMO DE CONFIDENCIALIDADE ...................................................65
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por objetivo discutir o alcoolismo na perspectiva do contexto
familiar a partir da experiência de estágio curricular no Centro de Atenção Psicossocial -
álcool e outras drogas II (CAPS - ad II) “Caminhos do Sol”, no município de Santa Maria/RS.
O interesse pelo tema escolhido surgiu devido a sua abrangência e significado social.
Trata-se de uma proposta de reflexão sobre a necessidade de ações destinadas às famílias ou
cuidadores de dependentes químicos, em específico, dos alcoolistas.
Considerado um fenômeno que está presente em todas as classes sociais, o alcoolismo
caracteriza-se como um problema de saúde pública que requer intervenção. Neste sentido,
torna-se relevante compreender a importância da inserção da família nas ações desenvolvidas
neste espaço sócio-ocupacional. A justificativa de tal intervenção concentra-se no fato de que
as famílias de dependentes químicos adoecem junto com os mesmos.
Na primeira seção deste trabalho, buscou-se realizar um breve resgate da trajetória da
loucura em diferentes períodos da história, elencada, reconhecida e variável conforme cada
cultura, e definida posteriormente como sinônimo de doença mental, o que de fato não
desmistificou a idéia de que dito “louco” deveria estar sob controle absoluto. Ainda neste
contexto pode-se relacionar a temática estudada com a saúde mental.
O desafio é justamente desconstruir a idéia de que o “louco” deveria manter-se isolado
do convívio social, separado de outros indivíduos tidos como normais e sociáveis. Essa
desconstrução do aparato manicomial deu-se a partir do processo de Reforma Psiquiátrica,
buscando substituir os serviços e o tipo de tratamento oferecido. Estes novos modelos
constituem-se numa rede de serviços territoriais de atenção psicossocial, visando à integração
do portador de transtorno psíquico à comunidade. É nesta direção que os CAPS se inserem e
aqui representam à experiência discente.
O estudo desta primeira seção deve ser caracterizado como essencial para entender os
serviços de saúde mental na atualidade, já que a Reforma Psiquiátrica foi o eixo norteador de
todos os avanços ocorridos neste âmbito. Visto desta forma, é importante considerar que o
processo está em constante mudança, e a pretensão não é apenas modificar o sistema de
tratamento clínico da doença mental com a eliminação da internação. Pretende-se, desvincular
conceitos negativos da loucura para desta forma, construir um novo estatuto social para o
indivíduo portador de sofrimento psíquico, garantindo-lhe cidadania, respeitando seus direitos
e a sua individualidade.
A segunda seção apresenta a problemática do alcoolismo nas relações intrafamiliares.
O trabalho pretende mostrar como a família responde às demandas de provimento de cuidado
e o convívio com o portador de sofrimento psíquico. Prover cuidado sobrecarrega e
compromete a saúde do indivíduo e do cuidador (família). Neste contexto, o cuidado deve ser
repensado na sua dimensão totalizante.
Com a implantação dos serviços substitutivos de saúde mental no atual contexto da
Reforma Psiquiátrica, a família deve ser inserida de forma efetiva nas discussões e nas ações
da assistência em saúde mental, vista como um facilitador no processo de reinserção e
principalmente, encarado como foco de intervenção, para que seus anseios sejam acolhidos e
sua sobrecarga minimizada.
Elencado como uma expressão da questão social, o alcoolismo caracteriza-se como um
problema social. Neste contexto, expõe-se que com o avanço do capitalismo as diversas
formas de expressão da questão social, tais como: aumento da pobreza; violência; uso de
drogas, e assim por diante.
Busca-se também discutir a inclusão da família nos projetos terapêuticos dos serviços
em saúde mental de forma efetiva. Esta abordagem mais específica com a família é um
encargo de toda a equipe profissional que atua nestes serviços.
A última seção deste trabalho, procura elucidar a prática profissional do Serviço Social
nesta área de abrangência, configurando-a como essencial nos serviços substitutivos ao
modelo hospitalocêntrico. Dessa forma, o profissional deve ser crítico, propositivo e deve ter
a capacidade de perceber e identificar o usuário e o familiar na sua individualidade, conforme
o contexto histórico que os mesmos se inserem.
Ainda assim, o assistente social passa a integrar um trabalho multiprofissional no
CAPS-ad II “Caminhos do sol”, integrando-se à proposta de abrir canais de democratização
de novos saberes, antes focalizado somente no saber médico, para assim, fazer deste espaço,
um provedor de cidadania.
Dando continuidade, serão apresentadas neste trabalho, as ações desenvolvidas no
CAPS-ad II voltadas às famílias de dependentes químicos, no que tange os cuidados
propostos pela Reforma Psiquiátrica.
Por fim, será contextualizada a experiência de estágio supervisionado em Serviço
Social no espaço sócio-ocupacional do CAPS-ad II, com o intuito de relatar o Projeto de
Intervenção Biblioteca “Leitura Reflexiva”, realizado com os usuários de álcool e outras
drogas. Propõe-se demonstrar a referida efetivação/adesão ou não dos usuários no projeto.
08
Além disso, no espaço do grupo operativo serão transcritos depoimentos de familiares de
usuários de álcool.
Levando em consideração a demanda que chega ao serviço, constata-se que o cuidado
no âmbito familiar é limitado, sendo assim, torna-se necessário rever e repensar a intervenção
de forma ampliada.
09
2 A TRAJETÓRIA DA LOUCURA E OS CAMINHOS PERCORRIDOS À
REFORMA PSIQUIÁTRICA
Esta seção apresenta uma breve revisão bibliográfica de como a temática “loucura” foi
sendo abordada ao longo da história. Busca-se explicitar seu processo de transformação até
vir a ser definida posteriormente como patologia. Esta reflexão perpassa o processo de
Reforma Psiquiátrica, com a proposta gradual de extinção dos leitos em hospitais
psiquiátricos e a prática de reclusão em manicômios.
Propõe-se demonstrar que a Reforma Psiquiátrica é um processo complexo e em
constante mudança, com avanços e retrocessos. A partir deste movimento pela
desinstitucionalização e conseqüentemente à ampliação da rede de serviços substitutivos ao
manicômio, com destaque os CAPS, surgem novos e constantes desafios. Estes colocam em
questão a transformação não apenas do local de tratar os portadores de transtorno psíquicos,
mas principalmente o que tange as práticas e saberes construídos nestes novos espaços de
cuidado em saúde mental. Sob este novo olhar, os CAPS surgem com a proposta de
humanização, com princípios e práticas psicossociais que promovam a integração do sujeito.
2.1 BREVE ENTENDIMENTO DA LOUCURA EM DIFERENTES PERÍODOS DA
HISTÓRIA
A loucura foi compreendida de diferentes maneiras, situada no tempo e nas diferentes
culturas. Partindo deste entendimento torna-se relevante descrever, de maneira resumida,
como ela se deu no decorrer da sua trajetória, até vir a ser definida como patologia.
A loucura pode variar de cultura para cultura. A doença é variável como os costumes
ou, no dizer de Michel Foucault, "a doença só tem realidade e valor de doença no interior de
uma cultura que a reconhece como tal" (FOUCAULT, 1994, p. 23). Assim, conforme a
cultura e o período histórico foram-lhes atribuídas várias caracterizações, tais como: castigo
ou dádiva dos deuses, provação da verdade, força da natureza, etc.
Conforme Laplantine (1998) o comportamento humano com base em pesquisas
etnográficas varia muito nas diferentes sociedades, podendo ser tão díspar que o que é
considerado adequado em uma sociedade pode não sê-lo em outra.
Segundo Jorge et al. (2009), na Grécia Antiga (séc VIII), o “louco” era considerado
uma pessoa com poderes diversos. Acreditava-se que este poder, nada mais era do que
manifestações dos deuses. Portanto, reconhecido e valorizado socialmente, não havendo
necessidade de exclusão e/ou controle.
Na Idade Média, do século IX ao XV, a loucura era vista de outra forma. Segundo
Foucault (1994) o “louco” era considerado e interpretado como possuído, o que demandava
rituais religiosos para purificação da alma. Neste período medieval as crendices, as
superstições, a morte e a peste eram comuns.
Ainda considerando o período medieval, conclui-se que a história da loucura neste
período mantivera-se sustentadas por idéias religiosas. Segundo Foucault (1994), sempre
houve no Ocidente curas médicas da loucura e os Hospitais da Idade Média comportavam na
sua maior parte, leitos reservados aos loucos (leitos fechados, espécies de jaulas para manter
os furiosos).
A Igreja, por sua vez, tratava a loucura mediante práticas inquisitoriais, já que a
manifestação da desta era associada a espíritos maus que, deste modo, precisavam ser
aniquilados. Assim, nas palavras de Pedrosa (1996) os indivíduos que apresentassem
comportamentos “desviantes” eram submetidos aos princípios da Igreja, visto que qualquer
pessoa que apresentasse sintoma de alienação mental era condenada à fogueira.
Em meados do século XVII, com surgimento do racionalismo, a loucura passou a ser
visto com status de desrazão, ou seja, aquele que transgredia ou ignorava a moral racional. O
racionalismo é a "posição epistemológica que vê no pensamento, na razão, a fonte principal
do conhecimento" (HESSEN, 1987, p. 60). Sendo assim, a loucura ganhava um caráter moral
e também passava a ganhar expressões ameaçadoras e perigosas (JORGE et al., 2009).
Outro aspecto relevante do entendimento da loucura, neste período, baseava-se na
prerrogativa do controle social, já que os ditos loucos não contribuíam para o movimento da
produção mercantil, bem como as crianças, os mendigos, os velhos, os aleijados, que passam
então a ocupar verdadeiros depósitos humanos. Segundo Jorge et al. (2009) os loucos eram
considerados e julgados pela sociedade como ociosos, pelo fato de não produzirem e não
estarem inseridos no sistema econômico/mercantil vigente da época, por isso eram
enclausurados e afastados do convívio social.
Ainda, segundo Pedrosa (1996) para estes indivíduos foi criado em toda a Europa,
estabelecimentos de internação que recebiam não apenas os loucos, mas os inválidos, pobres,
mendigos, portadores de doenças venéreas, libertinos, eclesiásticos em infração, entre outros,
considerados escória social.
11
Por representar uma perspectiva social, subordinada as normas de trabalho industrial e
da moral burguesa, cujo, a principal característica era manter a ordem pública, o conceito de
saúde e doença mantinha-se atrelado a tais princípios. Segundo Foucault (1978), a instituição
médica apresentava-se como uma estrutura semi-jurídica, estabelecida entre a polícia e a
justiça, com função normatizadora. Neste sentido, o internamento que o louco recebia não
colocava em questão as relações da loucura com a doença, mas as relações da sociedade,
consigo mesma, com o que ela reconhece ou não na conduta dos indivíduos (FOUCAULT,
1994).
Foi então a partir do século XVIII, com a Revolução Francesa (1789) cujo, os ideais
de “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, impulsionaram transformações sociais, reiniciando
um processo novo. Desse modo, segundo Alves et al. (2009) passa-se a definir um novo status
social para a loucura, caracterizando-a como sinônimo de doença mental. A loucura enquanto
doença deveria ser tratada por intervenção médica. Este momento pode ser entendido, como a
chamada Primeira Revolução Psiquiátrica, liderada pelo médico francês Philippe Pinel, o qual
agia em consonância com os ideais racionalistas e humanitários próprios da Revolução
Francesa.
Para o mesmo autor, as idéias de Pinel reforçaram a separação dos loucos dos demais
grupos excluídos, a fim de estudá-los e buscar sua cura. Portanto, não houve extinção do
isolamento aplicável aos doentes mentais, mas estes passaram a ser recolhidos em locais
próprios, onde recebiam auxílio humanitário e médico, alimentação e atividades terapêuticas.
O asilo, por sua vez, passa a ser visto como a melhor unidade terapêutica.
O essencial é que no asilo fundado na época de Pinel, representa a confusão no interior
de um regime moral único cujas técnicas tinham caráter de precaução social e de estratégia
médica (FOUCAULT, 1994).
Na perspectiva de reconhecer o louco como um enfermo mental, Alves et al (2009)
revela que sendo concedido o direito de assistência médica e cuidados terapêuticos, em
contrapartida retirou-lhe a cidadania. Visto desta forma, desconsiderou o sujeito como
cidadão igual aos demais, impondo-lhe a interdição civil e o seu controle absoluto.
A essa lógica asilar existente, que tem o manicômio seu maior expoente, configura-se
um espaço de tratamento moral com ideais de punição, regulação, isolamento, tendo na doen-
ça o seu único e absoluto objeto.
Para Goffman (1961), os hospitais psiquiátricos são nomeados enquanto Instituição
Total, onde há toda uma estrutura organizacional, que tem por objetivo o controle, a alienação
12
e a separação do indivíduo privado da vida social. O autor define instituição total como
sendo:
[...] aquela que promove uma espécie de barreira à relação social com o mundo
externo, fechando-se e impedindo o contato de seus participantes com qualquer
realidade que lhe seja exterior provocando sim uma degeneração, através do
enfraquecimento da autonomia e da individualidade, coisificando o ser e iniciando o
sujeito numa carreira moral estigmatizada (GOFFMAN, 1961, p.37).
Ainda assim, o autor em sua crítica às Instituições Totais, descreve como as pessoas
submetidas à organização de suas vidas por um controle sistemático nos internatos
institucionais têm massacradas suas subjetividades e são colonizadas mentalmente.
Mencionado o questionamento sobre o papel dos manicômios e hospícios, visto que
essas instituições na sua prática de isolamento compulsório acabam por reproduzir a
alienação, o qual Basaglia (1991) caracteriza-as como sendo instituições de violência por
produzirem o sofrimento à pessoa.
A Reforma Psiquiátrica iniciada na década de 70, com destaque na experiência italiana
e no Brasil com eclosão no ano de 1978 com o Movimento dos Trabalhadores em Saúde
Mental (MTSM), tem sido elencado como um marco importante nos avanços em saúde
mental. O MTSM era formado por trabalhadores integrantes do Movimento Sanitário,
associações de familiares sindicalistas, membros de associações de profissionais e pessoas
com longo histórico de internações psiquiátricas (AMARANTE, 1995).
Neste sentido, os autores aqui estudados apontam para uma mudança de conceito de
loucura, que passa a ser compreendida como um fator social. O processo de ruptura de
práticas de confinamento de doentes mentais é um processo complexo, que vem ocorrendo de
forma lenta e gradual até os dias atuais.
2.2 A REFORMA PSIQUIÁTRICA: O PROCESSO DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO E
A PERSPECTIVA DE NOVOS DISPOSITIVOS DE TRATAMENTO EM SAÚDE
MENTAL
A trajetória histórica da loucura permeou-se durante muito tempo na separação entre o
doente mental e outros indivíduos tidos como normais e sociáveis, colocando em cheque a
ameaça que o doente poderia representar, bem como a preservação da ordem pública. Para
Amarante (1995), se na história a loucura se constituiu enquanto doença mental, na própria
13
história ela mesma pode ganhar novo estatuto. Se na história ela passou a ser anormalidade,
na própria história ela pode ser restituída à condição inerente às sociedades.
Levando em consideração o que o autor menciona, torna-se evidente que tais critérios
precisaram ser revistos, e é a partir de tal evidência que este modelo fortemente moralista e
excludente da loucura começou a modificar-se lentamente. Os primeiros movimentos em
torno dos hospitais psiquiátricos mantiveram-se pela busca da humanização dos asilos, porém,
o movimento que promove a maior ruptura entre o saber/ prática psiquiátrica surge na Itália, a
partir de 1960.
Conforme Alves et al. (2009) a psiquiatria democrática Itália não nega a existência da
doença mental. Propõe uma nova forma de olhar para o fenômeno, beneficiando a
complexidade da loucura. Ou seja, abre espaço para o sujeito, a família, a comunidade e
demais atores sociais.
A antipsiquiatria promoveu um forte questionamento sobre a doença mental, de modo
que, o saber psiquiátrico não conseguia responder a questão da loucura. Esta era entendida
como um fato social, uma reação à violência externa. Neste sentido, a sociedade é quem
enlouquecia as pessoas e em seguida, culpada, buscava tratá-las (ALVES et al., 2009). A
partir de tais questionamentos, cada vez mais freqüentes no âmbito da loucura/ doença mental,
iniciou-se o movimento de desinstitucionalização da psiquiatria italiana, a partir da
experiência de Franco Basaglia, no período de 1961 a 1968.
Este processo tinha por objetivo a desconstrução do aparato manicomial, buscando
substituir os serviços e o tipo de tratamento oferecido, visando à reinserção social do sujeito
no pleno exercício da cidadania, por meio de um trabalho interdisciplinar e psicossocial,
considerando o sujeito na sua complexidade. Dessa forma, procurou-se aos poucos produzir
um novo imaginário social para a loucura que desvinculasse a mesma de alguns conceitos
negativos, promovendo uma nova relação entre a loucura e a sociedade (ALVES et al, 2009).
A experiência italiana demonstrou a possibilidade real de transformações no lidar e
tratar com a loucura, sendo esta, a única que aboliu as internações aos hospitais psiquiátricos,
iniciando o processo de desinstitucionalização, defendendo a idéia de altas hospitalares e a
redução do número de leitos. Segundo Nicácio (2003), o processo de desinstitucionalização
favorece a construção de novos saberes e novas perspectivas para se pensar as instituições
psiquiátricas.
O termo desinstitucionalização é um conceito utilizado no processo de Reforma Psi-
quiátrica, que advém da abordagem da psiquiatria democrática italiana. Dessa forma a
desinstitucionalização é entendida como “[...] decompor o agir institucional” (BARROS, 1994
14
p.105), onde há um constante questionamento dos saberes e das práticas psiquiátricas.
A institucionalização, ou em outros termos o internamento em hospitais psiquiátricos é
apontado de forma negativa, pois:
O doente mental, fechado no espaço apertado da sua individualidade perdida,
oprimido pelos limites que lhe foram impostos pela doença, é forçado pelo poder
institucionalizante da internação a objetivar-se nas próprias regras que o
determinam, em um processo de aparvalhamento e de restrição de si que –
originariamente sobreposto à doença – não é sempre reversível (BASAGLIA apud
SARACENO, 2000, p.62).
Existe uma diferença entre o termo desinstitucionalização e desospitalização. O
primeiro termo é mais complexo, fundamentado na idéia de desconstrução e invenção,
ocupando-se do sujeito para haver um novo sentido no tratamento, não focando apenas na
doença (ALVES et al, 2009).
Assim, segundo Fernandes (1999), desinstitucionalizar é acima de tudo, ocupar-se do
sujeito e não da doença para, a partir daí, as instituições de cuidados ganharem um novo
sentido e o tratamento não significar apenas prescrição de medicamentos. Ou seja, utilizar a
terapia como um ocupar cotidiano do tempo, do trabalho, do lazer, do ócio, do fazer algo,
construindo uma atividade conjunta. O segundo termo refere-se ao processo de criação de
dispositivos alternativos de cuidados psico-sócio-assistenciais, que não permeiem o campo da
exclusão, repressão e segregação dos sujeitos.
A Reforma Psiquiátrica surge com a pretensão de modificar o sistema de tratamento
clínico de doença mental, eliminando gradualmente a internação como forma de exclusão
social. Além disso, procura construir um novo estatuto social para o indivíduo portador de
doença mental garantindo-lhe cidadania, respeito a seus direitos e a sua individualidade. Este
modelo seria substituído por uma rede de serviços territoriais de atenção psicossocial, visando
à integração da pessoa à comunidade.
Na visão de Vasconcelos (2008) a Reforma Psiquiátrica pode ser compreendida:
como um processo complexo de mudanças muito além do campo das políticas
específicas, dos serviços e da prática profissional, abarcando uma ampla, longa e
contínua luta política, institucional, legal e cultural visando o investimento em
formas integrais de cuidado humano, integrada aos múltiplos dispositivos de atenção
social e em saúde inerente à conquista dos direitos sociais de cidadania, e para
mudar as relações globais da cidade com a loucura, com a diferença existencial e
com os processos de subjetivação dos indivíduos (VASCONCELOS, 2008, p.78-9).
No Brasil, o debate sobre a Reforma Psiquiátrica tem origem no ano de 1978 com o
surgimento do MTSM após uma greve de residentes e uma série de denúncias. Más condições
de trabalho e péssimas condições dos hospitais psiquiátricos apontaram a necessidade de
15
reestruturação da assistência em saúde mental. É, sobretudo, por meio deste movimento de
luta, que se passou a protagonizar e a construir a denúncia da violência dos manicômios, a
mercantilização da loucura, a hegemonia de uma rede privada de assistência e a construir
coletivamente uma crítica ao chamado saber psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico
(AVENA, 2009).
Em outros termos o movimento dos trabalhadores sustentou-se na necessidade de
promover a extinção dos manicômios, compreendidos como mecanismos de opressão. Como
refere Amarante (2003), a grande repercussão do MTSM é considerado o dispositivo do
processo de Reforma Psiquiátrica brasileira.
Na experiência italiana de reforma, havia a proposta de que não basta trocar o local de
tratamento ao portador de transtorno mental, mas sim, transformar a forma de pensar, lidar e
cuidar a problemática da loucura. Dessa forma, Lancetti (1990) afirma que a principal fonte
inspiradora da experiência brasileira de reforma psiquiátrica foi a desinstitucionalização
italiana.
Porém vale ressaltar que a mudança da assistência psiquiátrica não era uma proposta
particular do MTSM, e sim vinculada à busca de uma democracia plena e de uma organização
mais justa da sociedade (AMARANTE, 1995). Ainda neste caminho de mudanças, é que a
Reforma Sanitária1 merece destaque, já que o processo da Reforma Psiquiátrica no Brasil é
contemporâneo da eclosão do movimento sanitário (1970).
Segundo Brasil (2005) a Reforma Psiquiátrica é um processo político e social
complexo, composto de atores, instituições e forças de diferentes origens e que incide em
territórios diversos, tais como, governo federal, estadual e municipal, nas universidades, no
mercado dos serviços de saúde, nos conselhos profissionais, nas associações de pessoas com
transtornos mentais e de seus familiares, nos movimentos sociais e nos territórios do
imaginário social e da opinião pública.
O processo que envolve a Reforma Psiquiátrica remete a um conjunto de
transformações de práticas, saberes, valores culturais e sociais, avançando aos poucos em
função dos impasses, conflitos e desafios que o permeiam.
Neste contexto de reabilitação psicossocial procurou-se propor alternativas para a
problemática levantada, defendendo a substituição dos manicômios por novos dispositivos de
1 Segundo Paim (2008), a Reforma Sanitária ocorrida no Brasil, pode ser entendida pelo movimento postulado à
democratização da saúde. Surgiu em meados à década de 70, e pode ser caracterizado como um conjunto de
preposições políticas voltadas para a saúde, que apontavam para a democratização da vida e para uma reforma
democrática do Estado.
16
acolhimento e tratamento, surgindo assim: os Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS), o
Hospital Dia, os leitos psiquiátricos em Hospital Geral, o Programa de Residência
Terapêutica, o Programa “De volta para casa”, bem como os Centros de Atenção Psicossocial
(CAPS) (BRASIL, 2004a).
Conforme disposto em Brasil (2004b), o surgimento do primeiro CAPS ocorreu na
cidade de São Paulo em 1987. Desde então esses serviços têm sido apontados como
estratégicos na consolidação das redes de atenção psicossocial por pretenderem ser
substitutivos aos hospitais psiquiátricos.
No ano de 1989, tem-se o Projeto de Lei do deputado Paulo Delgado (PT/MG) que
propõe a regulamentação dos direitos da pessoa com transtornos mentais e a extinção
progressiva dos manicômios no país. A partir deste projeto, inicia-se a luta da Reforma
Psiquiátrica no campo legislativo e normativo (BRASIL, 2004a). O projeto foi um catalisador
exuberante, pois trouxe à cena viva do país um intenso debate antes subterrâneo. Tratou-se de
uma etapa bastante significativa do movimento de humanização e reforma do atendimento em
saúde mental no Brasil (DELGADO,1992).
Avançando um pouco mais, em 1992 alguns movimentos sociais inspirados no Projeto
de Lei Paulo Delgado, são positivos na aprovação de leis que determinaram à substituição
progressiva dos leitos psiquiátricos por uma rede integrada de atenção à saúde mental.
As décadas de 1980 e 1990 foram significativas neste processo de avanços,
constituindo um novo cenário para a saúde mental, visto que, as primeiras normas federais
que regulamentaram a implantação de serviços de atenção diária fundadas nas experiências
dos primeiros CAPS, NAPS e Hospitais-Dia entraram em vigor neste período no país. Novos
serviços de caráter extra-asilar foram implantados em todo o país ao longo destas duas
décadas, na tentativa de resgatar a singularidade e a complexidade do adoecer psíquico
(BELMONTE, 1998).
Verifica-se que a Lei Paulo Delgado só foi sancionada no ano de 2001, após 12 anos
de tramitação no Congresso Nacional. Assim esta lei (n° 10.216 de 06 de abril de 2001)
dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e
redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Conforme:
Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que
trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça,
cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família,
recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu
transtorno, ou qualquer outra.
Art. 3o É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde
mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos
17
mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada
em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades
que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.
Art. 4o A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os
recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.
§ 1o O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do
paciente em seu meio.
§ 2o O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a oferecer
assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços
médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e outros.
§ 3o É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais em
instituições com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos recursos
mencionados no § 2o e que não assegurem aos pacientes os direitos enumerados no
parágrafo único do art. 2o (BRASIL, 2001).
Esta lei é resultado de anos de luta entre diversos interesses envolvidos e representa
um avanço significativo no que se refere à proteção e os direitos das pessoas portadoras de
transtornos mentais. Para Britto (2004) a proteção e garantia dos direitos das pessoas
portadoras de transtorno mental também está relacionada com o re-direcionamento do modelo
assistencial, pois questiona o modelo voltado para a internação especialística dentro do
hospital psiquiátrico e promove a viabilidade de outro modelo de atenção psicossocial, que
cuida e trata sem o dispositivo da internação hospitalar, embora alguns serviços possuam
leitos. Assim visa-se que estes novos serviços possam garantir autonomia aos usuários, de
modo que os mesmos tenham o pleno exercício de sua cidadania.
Considerando o movimento de Reforma Psiquiátrica em curso, é importante ressaltar
que a mudança do modelo de assistência em saúde mental não implica apenas em implantação
de serviços substitutivos, mas torna-se imprescindível uma modificação na prática
profissional pautado no modelo psicossocial e substitutivas ao modelo asilar (COSTA-ROSA,
2000).
Percebe-se então, que o movimento de Reforma Psiquiátrica, consistiu e ainda permeia
mudanças que vão além do caráter técnico-assistencial:
[...] seria poder transformar as relações que a sociedade, os sujeitos e as instituições
estabeleceram com a loucura, com o louco e com a doença mental, conduzindo tais
relações no sentido da superação do estigma, da segregação, da desqualificação dos
sujeitos ou, ainda, no sentido de estabelecer com a loucura uma relação de co-
existência, de troca, de solidariedade, de positividade e de cuidados (AMARANTE,
1997, p.165).
Pereira (1997) afirma que a organização dos serviços em saúde mental dentro do
processo de Reforma Psiquiátrica brasileira, foi marcada por dois momentos distintos: o
primeiro momento (década de 80) caracteriza-se pelo surgimento de instituições alternativas
ao manicômio. E o segundo momento (final da década de 80 e início na década de 90) merece
18
destaque por apresentar mudanças estruturais do modelo assistencial vigente, criando-se
novas formas de cuidar.
Os movimentos reformistas no campo da saúde mental buscam interferir e transformar
essa lógica, especialmente no que diz respeito ao empoderamento dos portadores de
transtornos mentais. As propostas de reabilitação psicossocial passam pelo exercício da
autonomia e cidadania, para, a partir deste ponto construir um novo lugar social para a
loucura, atrelado à invenção de novos espaços e formas de sociabilidade e de participação
(LIBERATO, 2009). É nesse sentido que a concepção de empoderamento em saúde mental
torna-se chave para a criação de autonomia e sociabilidade.
Dessa forma, o empoderamento aponta:
uma perspectiva ativa de fortalecimento do poder, participação e organização dos
usuários e familiares no próprio âmbito da produção de cuidado em saúde mental,
em serviços formais e em dispositivos autônomos de cuidado e suporte, bem como
em estratégias de defesa de direitos, de mudança da cultura relativa à doença e saúde
mental difusa na sociedade civil, de exercício do controle social no sistema de saúde
e de militância social (VASCONCELOS, 2008, p.60).
Portanto, o empoderamento em saúde mental é um termo que parece estar associado à
contemporaneidade, já que em tempos remotos a loucura era tratada de forma a desconsiderar
sua identidade, autonomia, singularidade e particularidade. Desse modo, a loucura era
entendida como uma “doença” incapacitante, caracterizada pela exclusão, segregação,
isolamento e subjugação das potencialidades do indivíduo e de sua capacidade de tomar
decisões (VASCONCELOS, 2008).
A Reforma Psiquiátrica, enquanto prática social é construída continuamente, de modo
que os profissionais, os usuários, os familiares e a sociedade participem deste processo.
Oliveira (2000) destaca que a condição para um serviço desenvolver suas práticas de forma
ancorada na Reforma Psiquiátrica é necessário que as instituições se configurem enquanto
produção de saberes, de convivência, respaldadas em um novo paradigma, compreendendo o
doente como sujeito com necessidades, com capacidades, com possibilidades, com desejos e
com direitos, abandonando a relação de doente “perigoso” e “incapaz”, passando a vê-lo
como cidadão.
No que se refere aos avanços alcançados a partir do processo de Reforma Psiquiátrica,
não há questionamentos, já que eles foram significativos. Porém, apesar de terem sido criados
serviços substitutivos ao manicômio, ainda assim eles não substituem as internações, ou seja,
não houve o fechamento destes.
19
Desse modo, faz-se necessário um olhar atento diante desses “novos” serviços,
envolvendo não apenas técnicos e profissionais, e sim os próprios sujeitos deste processo para
que a partir desta conscientização, os novos serviços não venham igualmente a se
institucionalizar, superando cada vez mais a lógica hospitalocêntrica que captura e mortifica a
loucura.
Os muitos desafios que envolvem a legitimação e sustentação destas novas práticas
incluem uma incessante invenção e resistência ao não se deixar capturar por uma
“subjetividade manicomial”, que reforça nos profissionais o desejo de dominar, subjugar, de
classificar, oprimir e controlar (ALBERGA, DIMENSTEIN, 2005).
Visto dessa forma, é preciso rever conceitos, práticas, mas principalmente, rever o que
foi negado durante muito tempo no que tange o modo de tratar os portadores de sofrimento
psíquico, para que não sejam reproduzidas ações semelhantes as que vigoraram no passado,
caracterizadas pela dominação, controle, punição, segregação, entre outros.
Aos poucos busca-se substituir a prática desumana de tratar o portador de sofrimento
psíquico, a partir da inserção de novos modelos de cuidado nos Centros de Atenção
Psicossocial.
2.3 OS CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS)
Os CAPS surgiram como possibilidade de organização de uma rede substitutiva aos
modelos existentes em um determinado período da história, centrados até então na premissa
de isolar o sujeito portador de transtorno mental, a fim de tratá-lo.
Segundo Costa-Rosa et al (2001), o modo de atenção psicossocial implica a
construção de um novo olhar clínico, que vê além do sintoma. Esse novo paradigma
caracteriza-se por representar uma referência estratégica em saúde mental, efetivando-se
como um novo modelo, substitutivo ao modelo manicomial. Assim:
A reformulação conceitual quanto ao que está em jogo na doença mental [...] não é
meramente uma questão de sintomas e de sua remissão, mas uma questão de
existência [...]. Recusa-se, portanto, uma abordagem exclusivamente
sintomatológica [...] em benefício de uma clínica psiquiátrica renovada, deslocando
o processo do tratamento da figura da doença para a pessoa doente [...]. O
pressuposto é o de que a alienação psicótica implica numa dificuldade específica de
expressão subjetiva, refratária a ser apreendida por instituições massificadas [...], as
dificuldades concretas da vida acarretadas pela doença mental grave, devem ser
também elas objeto das ações de cuidado, incorporando-se à prática psiquiátrica
aquilo que tradicionalmente era considerado extra-clínico [...] (TENÓRIO 2002,
p.40).
20
As primeiras experiências de atenção psicossocial que sugiram no Brasil, foram os
NAPS e os CAPS, ambos na cidade de São Paulo. Os NAPS eram serviços de referência de
uma ampla rede de cuidados, abertos, regionalizados, que ofereciam cuidados 24 horas por
dia, todos os dias da semana, inclusive internação (TENÓRIO, 2002).
O primeiro CAPS surgiu no ano de 1987 e pode ser considerado como uma conquista
de diversos movimentos sociais, inicialmente de trabalhadores de saúde mental, que
reivindicavam por melhores condições de tratamento, pautados na potencialização dos
sujeitos portadores de transtornos mentais (BRASIL, 2004a). Segundo Patriota et al. (2010) a
atenção psicossocial – novo paradigma da saúde mental – impele a uma abordagem mais
ampla, incorporando a influência dos aspectos macros social, considerando os fenômenos
sociais e os fatores psicossociais que determinam o sofrimento psíquico.
Segundo Ribeiro (1999) as experiências de atenção psicossocial no Brasil foram
inspiradas e emergiram como resultado das experiências da Psiquiatria Democrática Italiana,
norteadas a partir de um conjunto de práticas e saberes que pretendiam garantir a cidadania
das pessoas acometidas de transtorno mental. Assim, de acordo com esta nova proposta de
cuidado, os CAPS pautam seu tratamento na lógica da inclusão e promoção de saúde com
qualidade de vida, enquanto um direito social.
Os CAPS são serviços de saúde municipais, abertos, comunitários, localizados em sua
área de abrangência, e oferecem atendimento diário às pessoas com transtornos mentais
severos e persistentes, realizando o acompanhamento clínico, psicológico e social,
promovendo a reinserção social destas pessoas através do acesso ao trabalho, cultura, lazer,
preocupando-se com o sujeito, sua singularidade, e sua história de vida.
Na tentativa permanente de uma reforma, ou seja, na busca pela estruturação de
sistemas de saúde universais, eqüitativos e descentralizados, considerados por Desviat (1999)
como condições para a implantação de uma assistência comunitária em saúde mental, é que os
serviços de atenção comunitária vão surgindo e se fortalecendo.
Segundo Oliveira e Loyola (2004) os serviços de atenção comunitária em saúde
mental devem incluir ações dirigidas aos familiares2 e comprometerem-se com a construção
de projetos de inserção social, respeitando as possibilidades individuais e os princípios de
cidadania que minimizem o estigma e promovam a qualidade de vida dos portadores de sofri-
2 A inserção da família nos cuidados em saúde mental é de extrema importância. Este item será abordado no
próximo capítulo.
21
21
mento psíquico e de seus cuidadores.
Os CAPS, os NAPS e os Centros de Referência em Saúde Mental são gerenciados pela
Portaria/GM n° 336-de 19 de fevereiro de 2002 que regulamenta as modalidades e estabelece
normas de funcionamento e composição de equipe. Integram a rede de Sistema Único de
Saúde (SUS). Essa portaria reconheceu e ampliou o funcionamento e a complexidade destes
novos serviços (BRASIL, 2004b).
As características dos CAPS representam compromissos de ordem prática inerente a
qualquer unidade de saúde e, ao mesmo tempo, elementos provenientes de novos referenciais
de ordem epistemológica, ética, clínica e política, oriundos de sua vinculação com a
superação das políticas públicas tradicionais de saúde mental no Brasil, o que o torna um
serviço de saúde particularmente complexo (FURTADO, 2002).
É função dos CAPS prestarem atendimento clínico em regime de atenção diária,
evitando assim as internações em hospitais psiquiátricos; promover a inserção social das
pessoas com transtornos mentais através de ações intersetoriais; regular a porta de entrada da
rede de assistência em saúde mental na sua área de atuação e dar suporte à atenção à saúde
mental na rede básica. É função, portanto, e por excelência, dos CAPS organizarem a rede de
atenção às pessoas com transtornos mentais nos municípios.
Os CAPS são os articuladores estratégicos desta rede e da política de saúde mental
num determinado território. Este é o lugar de referência e tratamento para pessoas que sofrem
com transtornos mentais, psicoses, neuroses graves e demais quadros, incluindo transtornos
relacionados às substâncias psicoativas (álcool e outras drogas) cuja severidade e/ou
persistência, justifiquem sua permanência num dispositivo de cuidado intensivo, comunitário,
personalizado e promotor de vida (BRASIL, 2004b).
O CAPS-ad II “Caminhos do Sol”, sendo este, parte integrante da experiência de
estágio curricular em Serviço Social caracteriza-se a partir do atendimento diário de adultos,
usuários de álcool ou outras drogas com transtornos mentais severos e persistentes
decorrentes do uso de substâncias psicoativas. O CAPS-ad II desenvolve uma gama de
atividades que vão desde o atendimento individual (medicamentoso, psicoterápico, de
orientação, entre outros), bem como atendimentos em grupos e/ou oficinas terapêuticas e
visitas domiciliares (VD)3(BRASIL, 2004b).
3 A VD no âmbito da saúde representa um importante instrumento no caminho da promoção da saúde, bem como
de apreensão da realidade e do contexto social em que o usuário e sua família se inserem. É neste sentido que a
VD é um dos instrumentos que potencializa as condições de conhecimento do cotidiano dos sujeitos, no seu
ambiente de convivência familiar e comunitária (MIOTO, 2001). Assim, VD tem como objetivo conhecer as
22
Neste sentido, estes serviços desenhados no processo de construção de uma lógica
comunitária de atenção à saúde mental, apresentam como tarefa principal a promoção da
reinserção social, mas para que esta de fato ocorra, é necessária ampla articulação com as
várias redes4, entre as quais podemos citar sócio-sanitárias, jurídicas, sociais e educacionais,
entre outras.
Como expõem Brasil (2004b), os CAPS devem contar com um espaço próprio e
adequado para atender a sua demanda específica, obtendo alguns recursos físicos como
consultórios para atividades individuais (consultas, entrevistas, terapias), espaço para
atividades grupais, espaço de convivência, oficinas terapêuticas, refeitório, sanitários, áreas
para recreação e esportes, entre outros.
Ao chegar ao serviço o usuário e/ou familiar deverá ser acolhido. O acolhimento
poderá ser de diversas formas, de acordo com a organização do serviço. Então, o objetivo
deste primeiro contato é compreender a situação de forma mais abrangente possível, para dar
seqüência à iniciação do vínculo terapêutico e de confiança com os profissionais, para então
construir conjuntamente um projeto terapêutico individual (BRASIL, 2004b).
Ainda, a Política Nacional de Humanização do SUS (BRASIL, 2005b) afirma o
acolhimento como uma das diretrizes de maior relevância ética/estética e política. Ética no
que se refere ao compromisso com o reconhecimento do outro, na atitude de acolhê-lo em
suas diferenças, seus sofrimentos e alegrias, e assim por diante.
No que se refere à relevância estética, pode-se dizer que esta traz para as relações e os
encontros do dia-a-dia a invenção de estratégias que contribuem para a dignificação da vida e
do viver, e assim, para a construção de nossa própria humanidade. Já a relevância política se
expressa no compromisso coletivo de envolver-se, potencializando protagonismos e vida nos
diferentes encontros.
Firmando informações da cartilha do Ministério da Saúde citada anteriormente, o
projeto terapêutico poderá incluir atendimento individual e grupal. Cada usuário deverá ter
seu projeto terapêutico individual, que pode ser caracterizado como um conjunto de
atendimentos, que respeite a sua particularidade.
condições (residência, bairro) em que vivem tais sujeitos e apreender aspectos do cotidiano das suas relações,
aspectos estes que geralmente escapam às entrevistas de “gabinete”.
4 A rede é uma aliança de atores, forças, num bloco de ação ao mesmo tempo político e operacional. Essa
definição de rede pressupõe uma visão racional dos atores/forças numa correlação de poder, onde a perspectiva
de totalidade predomina sobre a fragmentação. Supõem também que as redes são processos dinâmicos e não
organismos burocráticos formais, mas onde se cruzam organizações dos Estados e da sociedade (FALEIROS,
FALEIROS, 2001).
23
A depender do projeto terapêutico de cada usuário, o CAPS poderá oferecer, conforme
as determinações da Portaria 336/ 02: Atendimento Intensivo, ou seja, atendimento diário
oferecido quando a pessoa se encontra com grave sofrimento psíquico, em situação de crise
ou dificuldade intensa no convívio social e familiar, precisando de atenção contínua. Além
dessa modalidade de atendimento os CAPS, oferecem atendimento semi-intensivo (o usuário
poderá ser atendido até 12 dias no mês), e por último o atendimento não-intensivo (atendido
até três dias no mês).
A reabilitação psicossocial engloba distintos aspectos, pois se trata de um processo
complexo. A partir do Plano Terapêutico Individual, constrói-se de forma estratégica as
atividades de maior interesse de cada um, respeitando o contexto em que estão inseridos e a
realidade de todos os CAPS, para dessa forma propiciar um tratamento resolutivo que englobe
os diferentes aspectos que compõe o sofrimento psíquico e a dependência química, a citar:
psíquico, social, cultural, político e econômico, ou seja, aspectos referentes à vida em
sociedade. Os CAPS oferecem diversos tipos de atividades terapêuticas, visto que algumas
modalidades são realizadas em grupo, outras individuais, algumas destinadas às famílias e
inserção na comunidade.
Em acréscimo, os CAPS-ad II preconizam como uma de suas metas, a
desinstitucionalização, amparada por um processo prático de desconstrução do modelo
tradicional de atenção à saúde mental, propondo um conjunto de dispositivos que considerem
a inclusão dos portadores de sofrimentos psíquicos na sociedade, bem como considera a
família como base fundamental no processo de reinserção. Neste sentido é que o CAPS-ad II
“Caminhos do Sol” do município de Santa Maria/RS vem buscando o direcionamento da
assistência por meio da inserção familiar, na medida em que esta unidade, conhecida como
família, pode possibilitar uma aproximação das relações afetivas e o rompimento de
preconceitos como a incapacidade e a periculosidade, os quais haviam ajudado no processo de
afastamento do convívio social.
Conforme Brasil (2004b) os CAPS-ad devem pautar seu tratamento na perspectiva de
reduzir os agravos recorrentes ao uso abusivo de substâncias psicoativas, como álcool e outras
drogas, bem como prevení-los. Assim suas ações são pensadas pela lógica da Redução de
Danos5, em uma ampla perspectiva flexiva de práticas voltadas para minimizar as
5 Segundo Bravo et al. (2004) a redução de danos no campo das drogas caracteriza-se por ser uma alternativa
para os indivíduos que não se encontram em condições de cessar, de imediato, com o uso da droga (ou que não
desejam) devido fatores inerentes à singularidade de cada indíviduo. Falar, pois em redução de danos num
contexto contemporâneo e crítico pressupõe respeitar as diferenças, garantir direitos de cidadania e olhar para
uma perspectiva de educação para a autonomia.
24
conseqüências globais de uso de álcool e drogas, e não meramente na busca pela abstinência
total. Isto porque a redução de danos aposta na capacidade de autodeterminação dos sujeitos e
na flexibilidade de alternativas (ERWING, BASTOS, 2000).
A redução de danos neste sentido tem por objetivo a diminuição dos danos decorrentes
do uso da substância psicoativa, na perspectiva de possibilitar uma melhor qualidade de vida
àqueles que fazem o uso da droga, respeitando desta forma, a liberdade dos sujeitos para
exercer sua autonomia e decisão.
Outro ponto relevante no que tange o funcionamento dos CAPS é a sua relação com a
unidade básica de saúde. A rede básica de saúde se constitui pelos centros ou unidades de
saúde locais e/ou regionais, pelo Programa de Saúde da Família e de Agentes Comunitários de
Saúde, que atuam na comunidade de sua área de abrangência (BRASIL, 2004a).
Essa relação deve acontecer, partindo da idéia de que a Reforma Psiquiátrica visa
deslocar o cuidado para fora do hospital, isto é, na direção da comunidade. Os CAPS são de
fato, os dispositivos estratégicos desse significativo movimento de deslocamento. Assim,
como exposto na Cartilha do Ministério da Saúde (BRASIL, 2004a) uma nova lógica de
atendimento e de relação com os transtornos mentais.
Ainda assim os CAPS devem buscar uma integração permanente com as equipes da
rede básica de saúde, que significa conhecer e interagir com as mesmas, estabelecer
iniciativas conjuntas de levantamento de dados relevantes sobre os principais problemas e
necessidades de saúde mental no território; realizar apoio matricial às equipes da atenção
básica, isto é, fornecer-lhes orientação e supervisão, atender conjuntamente situações mais
complexas, realizar visitas domiciliares acompanhadas das equipes da atenção básica, atender
casos complexos por solicitação da atenção básica; realizar atividades de educação
permanente (capacitação, supervisão) sobre saúde mental, em cooperação com as equipes da
atenção básica (BRASIL, 2004b).
A equipe profissional que integra os serviços oferecidos pelo CAPS, é composta de
profissionais de nível superior e médio. Esta recebe o nome de equipe multiprofissional.
Considera-se que o trabalho em equipe multiprofissional consiste uma modalidade de trabalho
coletivo que se configura na relação recíproca entre as múltiplas intervenções técnicas e a
interação dos agentes de diferentes áreas profissionais. Por meio da comunicação, ou seja, da
mediação simbólica da linguagem, dá-se a articulação das ações multiprofissionais e a
cooperação (PEDUZZI, 1998).
Para que os profissionais consigam trabalhar coletivamente é necessário, dividir
responsabilidades, pensando numa forma de cuidado conjunta, desconstruindo a lógica da
25
hierarquização existente. Ao falar sobre a prática como um processo de construção, e neste
sentido, tendo como foco os serviços substitutos ao modelo hospitalocêntrico, vale mencionar
que o processo de Reforma Psiquiátrica só se concretizará, na medida em que houver a
desospitalização da loucura e a desinstitucionalização da hegemonia poder-médico. Para
Filho, Moraes e Peres (2009), a prática manicomial contraria todas as possibilidades de
assistência centrada no humanismo ético, uma vez que os princípios norteadores do
manicômio, de vigiar, controlar e punir, não se adéquam a tal prática.
O ato de cuidar proposto a partir do processo de Reforma Psiquiátrica visa romper
com a questão da psiquiatrização do dito doente mental, com a medicalização e a
hospitalização dos sujeitos em sofrimento-existência (BRAVO et al., 2004). Além disso,
ainda nas palavras dos autores o trabalho em equipe mencionado anteriormente apresenta-se
como um dispositivo básico, que busca instrumentalizar as novas práticas, assim como o
escutar, o acolher, o interagir, o inserir e reabilitar.
Abrindo espaço para estes novos dispositivos de cuidado em saúde mental e tendo
como específico neste trabalho os CAPS, abrem-se parênteses para um questionamento
relevante, que consiste em revelar que eles são, sobretudo, práticas que podem: negar,
transcender e construir, em um mundo aberto, produtivo e inventivo, um tratamento
reabilitador de fato. O caminho seguido pelos CAPS representa apenas uma das vias possíveis
entre as possibilidades de mudanças no campo da saúde mental (FILHO, MORAES, PERES,
2009).
Outro ponto importante já mencionado, e por este motivo reavaliado novamente, tange
a questão dos profissionais que constituem esses novos serviços assistenciais em saúde
mental. Historicamente o espaço da doença mental, voltada ao modelo hospitalocêntrico teve
seu funcionamento centrado na atuação do médico. De acordo com Foucault (2005) a partir
do momento em que o hospital é concebido como um espaço de cura, a figura do médico
passa a ser a principal responsável por seu funcionamento.
Desse modo, questionam-se aspectos relevantes para que o processo de Reforma
Psiquiátrica avance, tais como a imagem dominante da loucura e o modelo de tratar os
portadores de transtorno psíquico pertinente durante muito tempo. É neste sentido que o uso
abusivo de álcool e/ou outras drogas é tratado nestes novos dispositivos de saúde mental,
oferecendo-lhes alternativas para a reabilitação psicossocial.
26
3 A PROBLEMÁTICA DO ALCOOLISMO NAS RELAÇÕES
INTRAFAMILIARES
A presente seção tem por objetivo discorrer sobre a problemática do alcoolismo na
atualidade. Elencado com um problema social e caracterizado como uma doença que afeta
não somente quem faz o uso da substância psicoativa, mas principalmente o familiar, esta
temática aqui desenvolvida é mencionada com tanta ênfase, justamente para ampliar o olhar
diante desta questão.
O alcoolismo enquanto expressão da questão social está interligada com as
transformações da sociedade capitalista principalmente nos processos de trabalho, com as
devidas mudanças. Desse modo, o alcoolismo na perspectiva da doença pode ser determinado
como sendo uma das manifestações da questão social.
No que tange a família, o alcoolismo causa sofrimento no campo das relações afetivas,
interpessoais e sociais, impedindo muitas vezes momentos de aproximação e manutenção dos
laços afetivos. A família caracteriza-se como sendo o núcleo de cuidado, e este por sua vez,
na maioria das vezes é caracterizado como uma sobrecarga para os familiares. Levando em
consideração o que foi mencionado, torna-se relevante abrir espaço para a discussão do
cuidado às famílias de dependentes químicos, em especial de alcoolistas.
A co-dependência caracterizada como uma doença familiar é abordada nesta seção,
justamente para demonstrar a importância de inserir os familiares nos cuidados em saúde
mental, no contexto da Reforma Psiquiátrica e no espaço nos novos serviços substitutivos ao
manicômio/hospitais psiquiátricos.
3.1 O ALCOOLISMO ENQUANTO EXPRESSÃO DA QUESTÃO SOCIAL
Buscando considerar o alcoolismo como um problema social e não apenas restrito ao
usuário/dependente químico, torna-se necessário compreender alguns aspectos importantes.
Estudos revelam que o abuso do álcool em si, é influenciado por um complexo cruzamento de
variáveis tanto sociais, quanto psicológicas e biológicas (CONTE, 2001).
Segundo Albuquerque (1999, p.48) o alcoolismo surge como problema social, em
decorrência do avanço do capitalismo e, posteriormente, da industrialização [...] as doenças
epidêmicas, oriundas do modo de vida urbano da classe operária, apresentavam-se como
elementos desintegradores do trabalhador, da família e da sociedade. Ainda pode-se dizer que
o alcoolismo foi enquadrado como uma doença epidêmica tal como eram consideradas a
sífilis e a loucura.
A dependência do álcool é uma doença que traz diversas conseqüências negativas ao
dependente, tornando-se um problema preocupante para a sociedade em geral na medida em
que afeta o indivíduo e sua família. O mundo das drogas existe:
É um fenômeno social que assumiu proporções alarmantes, trazendo um grave
desajuste pessoal social [...] A teia de aranha afeta o dependente e seus familiares,
inibindo-os de qualquer reação. As pressões exteriores parecem sufocar o
dependente: ele não tem condições psíquicas e psicológicas para conseguir sozinho,
a sua libertação das drogas (CORREIA, 2000).
Na contemporaneidade a questão social se expressa sobre novas e diferentes formas,
como nos impactos das transformações no mundo do trabalho, na formação social e
econômica de cada país, nos padrões de proteção social, e ainda nas formas de enfrentamentos
de suas expressões pela classe trabalhadora (YAZBEK, 2008).
Considera-se a questão social como uma expressão das alterações no padrão de
acumulação capitalista e suas contradições, principalmente no que tange o conflito
capital/trabalho. Segundo Iamamoto (1998, p.27) a questão social é apreendida como o
conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz
comum: produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente
social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada, por uma
parte da sociedade.
Assim, torna-se importante reconhecer que um dos aspectos centrais da questão social
hoje, é a ampliação do desemprego e a ampliação da precarização das relações de trabalho. O
cenário atual é palco para as diversas formas de expressões da questão social, que, numa
amplitude global, produz efeitos comuns, tais como: aumento da pobreza; violência; uso de
drogas, e assim por diante.
Na dinâmica da sociedade contemporânea, Arendt (1958) revela que são poucos os
prazeres disponíveis aos sujeitos, que cotidianamente são submetidos a cobranças em sua
participação como atores sociais. A forma como o indivíduo é percebido na sociedade,
interfere na sua conduta. A sociedade vem passando por diversas transformações:
Sabemos que os tempos agora são outros, que as conquistas sociais alcançadas estão
sendo devastadas pela avalanche neoliberal no mundo inteiro, que a destituição dos
direitos também significa a erosão das mediações políticas entre o mundo do
trabalho e as esferas públicas e que estas, por isso mesma, se descaracterizam como
esferas de explicitação de conflitos e dissensos, de representação e negociação
28
(coisa, aliás, que não acontece assim de repente, mas que carrega as complicações
históricas dos últimos tempos); e que é por via dessa destituição e dessa erosão de
direitos e das esferas de representação que se constrói esse consenso – que nos dias
que correm, ganha corações e mentes – de que o mercado é o único e exclusivo
princípio estruturador da sociedade e da política, que diante de seus imperativos
nada há a fazer a não ser administrar tecnicamente suas exigências, que a sociedade
deve a ele se ajustar e que os indivíduos, agora desvencilhados das proteções
tutelares dos direitos, podem finalmente provar suas energias e capacidades
empreendedoras (TELLES, 1996, p. 85-6).
Neste sentido, muitos dos sujeitos impossibilitados de acesso ao trabalho e excluídos
procuram no uso de substâncias psicoativas a busca pelo prazer. O alcoolismo na perspectiva
da doença pode ser determinado como sendo uma das manifestações da questão social. Ou
ainda associado ao estigma traçado pela sociedade, de que o usuário é sempre criminoso ou
vagabundo, o dependente sofre conseqüências que impedem sua reinserção social, o que o
exclui ainda mais, desencadeando outros problemas.
Norteada pelos valores do capital, a sociedade, padroniza o individuo naquilo que se
enquadra nos padrões de sua exigência, aquele que não se adaptar é excluído. Assim:
perante a série de frustrações dos anseios humanos, sejam eles de consumo,
existências ou espirituais, gerados pela sociedade, os cidadãos sofrem umas
massificações indiferenciadas, gerando formações reativas diversas que podem
extrapolar pela violência, autodestruição, a exemplo da droga-
dependência(MACRE, 200, p.31).
A problemática do álcool pode ser associada ao sistema capitalista, na sua forma de
exclusão social, e caracterizado desta forma, como uma válvula de escape para uma sociedade
tão desigual e desassistida. Neste sentido, é que Conte (2001) afirma que além dos aspectos
orgânicos, familiares e sociais, é necessário contextualizar outras dimensões, tais como as
subjetivas, econômicas, políticas e sociais que contribuem na determinação dessa
problemática. A autora ainda (2001) traz a importância de associar vários saberes, a partir da
interdisciplinaridade, ampliando desta forma, a visão e a compreensão do problema e
favorecendo a prática de uma abordagem integral.
No entendimento de Mota (2004), diante de tais mudanças, o que existe são novas
formas para velhos conteúdos, ou seja, a questão social se apresenta multifacetada, re-
configurada, mas trazendo em seu bojo, a mesma problemática da exploração de uma classe
social sobre a outra.
A questão social está carregada de influências históricas, políticas e culturais
configuradas por uma questão estruturante de relações sociais desiguais caracterizam pelo
sistema capitalista. Dessa forma:
29
[...] a questão social não é senão as expressões do processo de formação e
desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da
sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do
Estado. É a manifestação no cotidiano da vida social, da contradição entre o
proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção, mais
além da caridade e repressão (IAMAMOTO, CARVALHO, 1998, p.77).
O alcoolismo surge como uma das expressões da questão social tornado-se, um
problema de saúde pública. Seu uso desregrado tem sido muitas vezes justificado como uma
saída para aliviar os problemas pessoais, sociais e familiares. Visto dessa forma, o dependente
químico passa a viver o conflito familiar, sofrendo estigmatização no meio social, colocando-
se e colocando-o a margem da sociedade.
Diante deste contexto, é que o Serviço Social enquanto categoria profissional assume
determinadas intervenções. Assim:
Os assistentes sociais trabalham com a questão social nas suas mais variadas
expressões quotidianas, tais como os indivíduos as experimentam no trabalho, na
família, na área habitacional, na saúde, na assistência social pública, etc. Questão
social que sendo desigualdade é também rebeldia, por envolver sujeitos que
vivenciam as desigualdades e a ela resistem, se opõem. É nesta tensão entre
produção da desigualdade e produção da rebeldia e da resistência, que trabalham os
assistentes sociais, situados nesse terreno movido por interesses sociais, distintos,
aos quais não é possível abstrair ou deles fugir porque a vida em sociedade. [...] a
questão social, cujas múltiplas expressões são o objeto do trabalho cotidiano do
assistente social (IAMAMOTO, 1997, p.14).
Visto que o alcoolismo é uma das manifestações da questão social e sendo o assistente
social um dos profissionais capacitados e qualificados para intervir, vale mencionar a
importância de uma equipe multiprofissional para lidar com o enfrentamento da problemática
do uso abusivo de álcool.
3.2 O ALCOOLISMO E A REALIDADE DA FAMÍLIA/CUIDADOR DE PORTADORES
DE SOFRIMENTO PSÍQUICO
A problemática do alcoolismo tem sido cada vez mais freqüente na atualidade, porém
vale destacar que desde os primórdios da humanidade o álcool já era utilizado. Há relatos de
que o homem conviveu durante muito tempo com o álcool em sua vida social, cultural e
religiosa. Este comportamento é carregado de forte simbolismo cultural por estar circunscrito
aos rituais religiosos, comemorações e confraternizações em geral. Assim sendo:
30
a ênfase nos problemas derivados das drogas sejam aqueles ligados ao tráfico ou às
conseqüências individuais e coletivas do consumo, está inserida no cotidiano das
pessoas. Entretanto, a relação do homem com as substâncias psicoativas é bastante
antiga ou, melhor dizendo, ancestral. Assim, mostra-se equivocada a idéia de que a
presença das drogas é um evento novo no repertório humano. Na verdade, trata-se de
uma presença contínua no tempo e que envolve não somente medicina e ciência,
mas também magia, religião, cultura, festa e deleite (SEIBEL, JÚNIOR, 2001, p.07).
Tendo em vista a reformulação da assistência psiquiátrica, reconhecendo a
dependência química como uma doença de causas múltiplas, percebe-se a unidade familiar
como importante no cuidado e ressocialização dos indivíduos portadores de sofrimento
psíquico. Conforme Oliveira e Loyola (2004) a família caracteriza-se como um sistema
formado por valores, crenças, conhecimentos e práticas que direcionam suas ações na
promoção da saúde de seus integrantes, zelando pela prevenção e o tratamento da doença.
A presença do alcoolismo causa sofrimento aos familiares condicionando-os a seguir
uma rotina que afeta negativamente sua autonomia, sua individualidade, suas relações, sua
saúde, podendo produzir sobrecarga, conflitos, sentimentos de incredulidade, perda de
controle, medo, vivendo esta família/cuidador desgastante (OLIVEIRA, LOYOLA, 2004).
A convivência entre familiares e usuários é representada na maioria dos casos por um
movimento de ir e vir, um continuum de sofrimento, angústia, impotência e violência, no
contexto do lar e/ou na rua (AZEVEDO, MIRANDA, 2010). Ainda em relação à convivência,
o autor revela que as conseqüências do alcoolismo são vistas pelos familiares como
problemáticas no campo das relações afetivas, interpessoais e sociais, impedindo muitas vezes
momentos de aproximação e manutenção dos laços afetivos.
O fenômeno da dependência química constitui um problema de saúde pública em
função de sua complexidade e magnitude, visto que, seus efeitos afetam significativamente a
saúde e a qualidade de vida dos usuários, familiares e de toda a sociedade. Segundo a
Organização Mundial da Saúde- OMS (1997) a dependência química pode ser definida como
um estado psíquico e físico que sempre incluem na compulsão de modo contínuo ou periódico
da droga, causando várias doenças crônicas físico-psíquicas, com sérios distúrbios de
comportamento, podendo também ser resultado de vários fatores biológicos, genéticos,
psicossociais, ambientais e culturais.
O alcoolismo também conhecido como síndrome de dependência do álcool, é
entendido na atualidade como um problema social, e como doença de causas múltiplas com
implicações com a saúde mental. Conforme a Classificação Internacional de Doenças-CID10
(OMS, 1993), esta síndrome apresenta um conjunto de fenômenos fisiológicos,
comportamentais e cognitivos. Esta é uma doença que limita o bom funcionamento do
31
cérebro, gera um grande isolamento do convívio social e afetivo, além de desencadear outros
problemas. O consumo de álcool passa a ser considerado uma doença quando o indivíduo se
torna incapaz de assumir suas obrigações sociais e familiares.
O álcool é uma das poucas drogas psicoativas cujo consumo é aceito socialmente e até
incentivado pela sociedade em geral, principalmente por influência da mídia, que se utiliza
dos meios de comunicação para investir em propagandas que ligam a imagem do álcool a
situações de bem-estar, status, poder, e assim por diante. Dessa forma, cria valores distorcidos
que impõem padrões a serem seguidos, favorecendo assim o aumento do seu consumo.
Outro fator somado ao alto índice de alcoolistas deve-se à substância álcool ser uma
droga lícita, permitida por lei. Drogas lícitas são aquelas que têm sua produção e seu uso
permitidos por lei, sendo liberadas para comercialização (INSTITUTO SOCIAL E DE
CRIMINOLOGIA DE SÃO PAULO, 2011). O álcool dessa forma parece estar perfeitamente
integrado a grande parte dos ambientes e situações do cotidiano das pessoas principalmente
nos finais de semana e momentos de lazer, porém vale ressaltar que o alcoolismo é
considerado uma doença de evolução crônica e progressiva, acometendo todos os indivíduos,
sem distinção de sexo, raça, nível sócio-econômico, escolaridade e atividade laborativa
(BARROS, 1994).
Portanto, vale questionar a idéia de que o termo substância psicoativa é um tanto
desconhecido entre uma parcela populacional. Assim trazer à tona o conceito de substâncias
psicoativas e desmistificar o sentido pejorativo acerca da dependência. Substâncias
psicoativas referem-se a qualquer substância utilizada por qualquer via de administração que
altera o humor, o nível de percepção ou funcionamento cerebral. Tais drogas incluem desde as
medicações prescritas por médicos até o álcool (SCHUCKIT, 1991).
Ao longo do tempo, segundo Pilon e Luis (2004), surgiram diversos modelos
explicativos para o fenômeno do uso do álcool. Esses modelos são hipóteses teóricas que
tentam justificar o uso dessa substância, o qual é entendido como um fenômeno complexo por
ter diversas faces do contexto de análise. Cabe ressaltar que não existe um modelo único e
cristalizado que possa justificar por si próprio o uso do álcool. Dentre eles vale mencionar:
modelo ético-legal; modelo moral; modelo medico/doença; modelo psicológico ou
psicossocial e modelo sociológico ou sociocultural.
O primeiro modelo citado pelo autor trata-se do modelo ético-legal, que considera o
alcoolismo um ato incorreto que vai contra os princípios da ética e leva em consideração os
fatores relacionados à dependência da substância. Ainda neste modelo considera-se o
problema como um ato de transgressão que requer interferência baseado em sansão legal.
32
32
De acordo com o modelo moral, o alcoolismo é visto como um vício, ou seja, um
desvio de comportamento do sujeito, em que este é responsabilizado pelo problema
(BERTOLOTE, RAMOS, 1997), dentro de uma postura essencialmente moralista, sendo
considerado um problema de caráter e, como medidas terapêuticas, só cabiam métodos
punitivos, castigos e prisão.
O alcoolista por sua vez, está deixando de ser visto pela sociedade como um indivíduo
de baixa moral, sem-vergonha e de mau-caráter, passando então a ser visto como um
sujeito/vítima de uma doença como qualquer outra que desencadeia problemas psíquicos,
físicos e emocionais relacionados ao vício (PILON, LUIS, 2004).
Na seqüência, o autor revela o modelo médico/doença, citado acima, em que a causa
da doença está relacionada à vários fatores, destacando-se entre eles os fatores genéticos,
biológicos, estruturais, e de natureza química. Neste sentido, a partir deste modelo houve um
aprofundamento da análise da dependência da substância e dos processos que os
determinaram.
Em relação ao modelo psicológico ou psicossocial, o alcoolismo é um comportamento
social apreendido a partir da interação familiar e depende de alguns traços de personalidade
do próprio indivíduo. Nesta linha de considerações, é importante um ambiente familiar
saudável, uma vez que o alcoolismo está consistentemente associado à negligência,
distanciamento emocional, rejeição dos pais, entre outros.
Por último, o autor traz o modelo sociológico ou sociocultural, destacando a
importância do ambiente externo na conduta do indivíduo. Na concepção da sociedade, o
alcoolismo estaria ligado à fuga de problemas do cotidiano. Dessa forma, o estigma que
permeia o alcoolismo não é totalmente deixado de lado, mas algumas mudanças passam a
entendê-lo como uma doença que necessita de cuidados e tratamento.
Partindo disso, o alcoolismo representa um sério problema no ambiente familiar
repercutindo de forma negativa na vida de todos que convivem com quem faz o uso da
substância. A presença do alcoolismo provoca mudanças na rotina, hábitos e costumes da
família, podendo produzir sobrecarga, conflitos, perda de controle, medo, ansiedade,
agressividade, e assim por diante. Na afirmação de que a dependência do álcool adoece
também os familiares torna-se fundamental que ambos necessitam de apoio e de
acompanhamento.
O papel da família é relevante na prevenção, tratamento e recuperação do alcoolista.
Neste contexto, segundo Martins, Pillon e Luis (2004) a família passa a ser a mais
33
comprometida com o problema e a personagem que mais possui recursos para auxiliar o
membro usuário de drogas, desde que devidamente estimulada e acompanhada.
Ainda procurando entender como a família age, reage e quais suas responsabilidades
diante de um dependente químico, que Vecchia (1999) traz que os familiares de alcoolistas
vivem geralmente uma contradição, quando se deparam com este problema, pois, querem
auxiliar o alcoolista, mas não sabem como, e muitas vezes, reproduzem o estigma que a
sociedade revela.
Neste sentido alguns impactos relativos ao familiar/cuidador, podem reproduzir
algumas características do dependente químico, caracterizadas principalmente pelo desgaste
físico e emocional. Passa então a desenvolver a co-dependência, ou seja, adoece da mesma
forma que o dependente químico, uma vez que passa a viver e controlar a vida do mesmo.
3.2.1 Co-dependência: a doença da família
O alcoolismo entendido a partir do conceito de patologia passa a caracterizar-se como
uma doença que afeta não apenas o indivíduo que faz o uso da substância psicoativa, como
também, diretamente o convívio/relações entre seus membros/ familiares.
O prestígio atualmente dado ao processo saúde/doença mental do indivíduo, não mais
centrado na doença e sua respectiva “patologia mental”, permite que o usuário de álcool e
outras drogas possa a ser percebido e avaliado de outra maneira (AZEVEDO, MIRANDA,
2010). Os familiares precisam conhecer o problema do abuso do álcool e as formas de
manejar as condutas e problemas de saúde do usuário/dependente discutindo a forma de
cuidar que a família deverá adotar em relação ao mesmo (OLIVEIRA, 2000).
Partindo da idéia de Oliveira (2000), a família na sua maioria, caracteriza-se como
sendo o núcleo onde se erradia o cuidado, bem como o espaço onde o cuidar é aprendido.
Segundo o autor, o cuidado prestado pela família visa preservar a vida de seus integrantes,
possibilitando que estes alcancem o desenvolvimento pleno de suas possibilidades, de acordo
com sua própria capacidade, considerando a condições do meio onde vivem. Neste sentido,
muito além de prover cuidado, o familiar/cuidador passa a deixar de lado seus compromissos,
anulando suas vontades e necessidades em prol de sanar a dependência do familiar doente
(OLIVEIRA, LOYOLA, 2004).
Este comportamento pode ser definido por Lawson (1999) como um comportamento
problemático, desajustado e doentio, conhecido como co-dependência. Em outras palavras a
34
co-dependência é uma doença emocional, onde as pessoas vivem em função do(s) outro(s),
controlando, ajudando, sentindo-se culpadas, ansiosas e com atitudes de auto-anulação
(BEATTIE, 2001).
Ainda segundo Beattie (2001) a pessoa co-dependente pode ser definida como uma
pessoa que tem deixado o comportamento de outra afetá-la e é obcecada em controlar o
comportamento dessa outra pessoa. Para Zylberstajn (2009) o termo co-dependência surgiu no
final da década de 70, simultaneamente em diversos centros nos EUA, utilizado para designar
pessoas que tinham suas vidas afetadas pelo envolvimento com alcoólatras, desenvolvendo
com elas um padrão de relacionamento nocivo a ambos. Nos anos seguintes, a definição foi
expandida para a convivência com outros vícios, transtornos, entre outros. Hoje se sabe que o
relacionamento com pessoas perturbadas, carentes, doentes, deprimidas e dependentes pode
gerar a co-dependência.
A co-dependência, por sua vez, pode ser caracterizada por comportamentos
autodestrutivos, em que a família e/ou cuidador passa a considerar-se responsável pelo
dependente químico, mas muito mais do que isso, estes passam a invadir a vida dos
dependentes, perdendo seus próprios limites no sentido de viver a sua própria vida, e
passando então a viver muitas vezes a do dependente químico. O fato de numa família, existir
alguém que faça o uso abusivo de bebidas alcoólicas, pode acionar aos demais membros uma
série de mecanismos que buscam resgatar a estabilidade perdida (BERTOLOTE, RAMOS,
1997).
O co-dependente por sua vez, tem sua vida afetada e esta, pode vir a ser anulada em
favor da vida do outro. Drummond e Filho (1998) afirmam que da mesma forma como a
dependência é a doença do usuário de drogas, a co-dependência é a doença da família. Neste
contexto, o controle está relacionado principalmente em manter o dependente em estado de
abstinência. Assim conforme Laranjeira et e al. (2000), pessoas que bebem de forma
excessiva, quando diminuem o consumo ou se abstêm completamente, podem apresenta um
conjunto de sintomas e sinais denominados de Síndrome da e Abstinência de Álcool (SAA).
Segundo Martins, Pilon e Luis (2004), a preocupação por parte das famílias, em
relação à dependência química de algum membro familiar se inicia quando sintomas
emocionais e físicos são manifestados, não só pelo usuário, mas por alguns membros da
família. Assim torna-se fundamental que a família seja inserida nos serviços de saúde mental,
e que os serviços disponham de um grupo de orientação familiar, com o objetivo de contribuir
para a melhora das relações e da organização no contexto familiar, por meio do fornecimento
de informações sobre o uso do álcool e de outras drogas, bem como à prevenção de recaídas.
35
3.2.2 O alcoolismo na voz dos familiares/co-dependentes
Propõe-se neste item conhecer a realidade dos familiares (co-dependentes) de usuários
de álcool que freqüentam o CAPS-ad II “Caminhos do Sol” por meio da exposição de
depoimentos que demonstrem a sobrecarga dos cuidadores.
O estudo proposto não se trata de uma pesquisa. Entretanto para o levantamento dos
depoimentos utilizou-se um estudo de caráter descritivo- exploratório, com abordagem
qualitativa. O estudo descritivo tem por objetivo a descrição das características de
determinada população/fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis (GIL,
1999). O estudo exploratório por sua vez, possibilita que o acadêmico aumente sua
experiência em relação à determinada situação (TRIVIÑOS, 1995).
O instrumento utilizado para coleta dos depoimentos foi a entrevista não estruturada,
com uma questão aberta: Na sua opinião, quais as repercussões do alcoolismo no âmbito
familiar? As informações foram gravadas em audio-tape e transcritas a partir dos
depoimentos, trechos de maior relevância. A entrevista não estruturada é aquela em que o
informante aborda livremente o tema proposto (MINAYO, 2002). Ainda assim, constata-se
que entrevista aberta, permite obter um quadro mais completo das experiências dos sujeitos
do estudo.
As descrições vivenciadas foram desveladas por meio de abordagem individual. A
partir das informações contidas nos depoimentos dos atores sociais, emergiram-se análises
críticas-reflexivas fundadas em referenciais teóricos, para enfatizar a temática do alcoolismo
no âmbito das dificuldades vivenciadas pelos familiares co-dependentes.
A realização deste estudo se deu por meio de depoimentos coletados, no intuito de
enriquecer e elucidar a temática do alcoolismo abordada neste Trabalho Final de Graduação
em Serviço Social. Estes se tornaram importantes, na medida em que foram apresentadas as
principais dificuldades encontradas pelos cuidadores em relação à dependência de álcool.
O objetivo foi utilizar o espaço do grupo operativo- Projeto Biblioteca “Leitura
Reflexiva”, a fim de demonstrar o elo que existe entre a dependência química e a família. Isto
se evidencia, no momento em que se constata que a família/cuidador vivencia experiências
negativas da mesma forma que o usuário, gerando adoecimento. Neste sentido a partir das
leituras e reflexões realizadas no projeto de intervenção, buscou-se inserir a família cada vez
mais nos cuidados em saúde mental.
Os participantes do estudo foram convidados pessoalmente e por meio de contato
telefônico, finalizando ao total quatro familiares, cuja adesão foi voluntária. A coleta dos
36
36
depoimentos obedeceu aos princípios éticos, garantindo-lhes o sigilo das informações por
meio da utilização de um termo de consentimento livre e esclarecido.
Durante o percurso deste trabalho procurei compreender como os familiares vivenciam
a presença de um alcoolista em seu ambiente familiar, visando apreender o significado dessa
experiência e as modificações que ocorrem no seu modo de ser.
Neste contexto questiona-se a importância da inserção da família nos cuidados em
saúde mental, visto que o alcoolismo gera sobrecarga aos cuidadores. A vivência junto ao
alcoolista é marcada por um cotidiano de violência que revela um ambiente familiar
inesperado, instável e conflituoso, e pela preocupação, que os leva a apresentar sintomas
físicos e emocionais de desgaste, seja pela responsabilidade que assumem ao cuidar do outro,
seja pelas situações de vergonha, constrangimento e humilhações por que passam (VELOSO,
MONTEIRO, 2009.)
Dessa forma, este estudo possibilitou elucidar a prática de estágio supervisionado em
serviço social, bem como entender o alcoolismo na voz dos co-dependentes, permitindo
refletir sobre a inserção da família nos cuidados em saúde mental.
Nas falas a seguir podemos evidenciar a rotina de familiares co-dependentes de
usuários de álcool, constatando as repercussões do alcoolismo no ambiente familiar. Os
nomes utilizados são fictícios, e o grau de parentesco corresponde o atual estudo.
Maria- esposa do usuário
“(...) Quando eu conheci ele, ele já usava o álcool. Antigamente ele usava outros tipos de
drogas, mas parou e agora só usa o álcool.”
“Ele foi um pai horrível para os meus filhos, principalmente para o mais velho, não que ele
espancasse o guri, porque eu não deixava, mas o meu filho se tornou uma pessoa muito
rebelde em função do alcoolismo do pai.”
“Ele também me batia, às vezes, pegava uma faca e dizia que iria me matar. Bom, uma
desgraça né”.
Núbia -mãe do usuário
“(...) O álcool é a pior droga que existe. Afeta o organismo da pessoa e termina destruindo a
família”.
“Eu sempre dizia pra ele, que quando ele enchia a cara, ficava mais agressivo. Ele não
aceitava sabe, então a gente acabava discutindo e brigando”.
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“Ele já estava assim, que não se importava com mais nada, não queria saber de tomar
banho, fazer a barba, ficava todo molambento. Ele já havia perdido o controle, só queria
saber do trago. Levantava de manhã e já ia direto procurar a bebida. Era um verdadeiro
inferno”.
“Eu estava muito sofrida, até que ele resolveu ir para uma Fazenda Terapêutica. Pra mim foi
um alívio”.
Otília- esposa do usuário
“(...) A pessoa que usa o álcool acaba com sua vida e da família também. A gente sofre
muito, vive no meio de brigas, discussões, passa vergonha”.
“Quando ele sai de casa, eu fico nervosa pensando na hora que ele vai chegar, porque já sei
que ele vai vir bêbado, dizendo palavrões na frente dos filhos. Ele não tem respeito por
ninguém quando está bêbado”.
“A família toda abandonou ele, eu fui a única que não deixei ele de lado, mas é muito difícil.
Ele não consegue perceber que está arruinando com nossa família, que os filhos estão
sofrendo, vendo o pai caindo pelos cantos. É muito difícil”.
Mara- esposa do usuário
“(...) Eu vivo uma guerra dentro de casa, em função do álcool. Já tive problemas com meu
pai que era alcoólatra e agora com meu marido. Às vezes me pergunto por que tenho que
sofrer tanto. É muito ruim viver nesta situação, já fiz de tudo pra ele parar de beber”
“Agora acho que as coisas já estão melhorando, porque ele tá conseguindo ficar sem beber,
mas não sei até quando vai durar. Rezo todos os dias para que isso se torne verdade, seria
um sonho.”
“A família sofre mais do que eles, porque a gente vive ansiosa, nervosa, sem saber qual vai
ser a próxima situação constrangedora. Eu já ando bem doente, e não sei ate quando vou
agüentar”.
Conforme mencionado neste trabalho, o alcoolismo atinge não apenas o usuário. No
primeiro depoimento pode-se perceber que os filhos que convivem num ambiente alcoólico
sofrem por causa dos conflitos e abusos existentes no ambiente familiar, uma vez que há
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brigas constantes e os problemas não são resolvidos através de diálogos sadios entre pais e
filhos.
A co-dependência está caracterizada como sendo um comportamento problemático,
desajustado ou doentio, associado com a vida, trabalho ou qualquer outra situação de
proximidade de uma pessoa que sofre de dependência de substâncias. Toda a vez que a vida
de outra pessoa é alterada ou perturbada pelo uso de substâncias por parte de outrem, o
problema já não é mais apenas do dependente.
Em todos os relatos percebeu-se que o co-dependente busca resgatar a estabilidade
dentro da família, no entanto, as dificuldades sobrevêm do fato de que este tem de lidar tanto
com problemas no nível emocional quanto no nível de realidade. Os problemas enfrentados
são diversos, e causam angústia, medo e infelicidade.
3.3 A IMPORTÂNCIA DA INSERÇÃO DA FAMÍLIA NOS CUIDADOS EM SAÚDE
MENTAL
Atualmente a família, nomeada como um microssistema cuidador, caracteriza-se por
ocupar espaços significativos no cenário da saúde mental. Os familiares estão sendo
chamados a participar ativamente na implantação dos projetos terapêuticos nos novos
modelos de tratar o portador de sofrimento psíquico.
A partir da necessidade de repensar as práticas em saúde mental e levando em
consideração a reformulação da assistência psiquiátrica, é que a família assume um
importante papel no cuidado e ressocialização dos sujeitos que sofrem de enfermidade mental
(MORENO, 2003). Ainda nas palavras do autor, mais do que uma aliada na efetivação do
modelo psicossocial emergente, a família deve ser encarada como foco de intervenção, para
que seus anseios sejam acolhidos e sua sobrecarga minimizada.
Iniciado o processo de reforma psiquiátrica, a família passou a ser vista como parte
integrante do tratamento de pessoas portadoras de transtornos mentais. O eixo familiar
enquanto unidade de cuidados está sendo pensado e idealizado conforme os princípios e
diretrizes da política de saúde mental. A Política Nacional de Saúde Mental, disposta pela lei
n° 10.216 de 6 de abril de 2001 prevê a inclusão da família na assistência ao portador de
transtorno mental, conforme:
Parágrafo único do Art. 2º- São direitos da pessoa com transtorno mental:
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II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua
saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na
comunidade;
Art. 3º – É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde
mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos
mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada
em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades
que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.
(BRASIL, 2001).
Na busca pela desinstitucionalização, ou seja, na premissa de substituir os
manicômios, prisões, asilos e orfanatos, desvinculando a idéia de que o portador de
sofrimento psíquico deva permanecer excluído do meio familiar e social, de maneira a
desenvolver propostas alternativas, que assegurem direitos a grupos específicos da população
e valorizem os serviços abertos e comunitários, é que a família passa a ser caracterizada como
mediadora entre seus membros e a sociedade.
Neste sentido, para que os princípios norteadores do processo de Reforma Psiquiátrica
se efetivem, Mello (2005) ressalta que a família precisa ser vista como um agente
fundamental, como também ser incluída de forma responsável no processo de cuidado à
pessoa com transtornos mentais.
È importante inserir as famílias nos cuidados em saúde mental, levando em
consideração a importância da necessidade de alicerçar os vínculos entre família e usuários,
numa relação sincera e de respeito, onde a singularidade e a individualidade de todos sejam
preservadas, de forma que os primeiros não se sintam sobrecarregados, e os usuários possam
efetivamente resgatar sua cidadania e autonomia em uma relação terapêutica (OLIVEIRA,
LOYOLA, 2004).
Desse modo, promover um trabalho que envolve famílias é necessário definir o
modelo de compreensão de família, ou seja, crenças, valores e procedimentos, para que, atue
de modo a não julgar o que é melhor ou pior, e sim, oferecer elementos para a análise da
situação, deixando que a família tome a decisão final (GOMES, 1994).
Diante de alguns avanços, a família ainda ocupa um espaço pequeno no que se refere à
inserção dos familiares nos cuidados em saúde mental, especialmente quanto à sua
participação/integração de forma que estas são limitadas. Este ponto elucida-se porque o
familiar não recebe o mesmo atendimento que o usuário/dependente químico, pois as
atividades oferecidas no CAPS-ad II em Santa Maria /RS são voltadas para os sujeitos que
fazem uso de alguma substância psicoativa. Neste sentido, pouco se pode oferecer nestes
serviços, se comparado com o atendimento dos dependentes químicos, visto que o grupo
operativo de familiares é o único espaço que o CAPS-ad II oferece no que tange a inserção da
40
família. Outros cuidados se configuram na realização de encaminhamentos à rede
socioassistencial.
Prover cuidado significa sobrecarga e comprometimento muitas vezes da saúde do
cuidador, e sendo assim, é preciso repensar questões pertinentes que envolvem o cuidado
familiar. Rosa (2011) apresenta alguns aspectos relevantes ao tema referido, como a
necessidade de capacitar os profissionais em saúde mental, bem como democratizar os
serviços para que desta forma a família possa ser incluída.
Este questionamento segue principalmente na premissa de que os serviços de saúde
encontram-se despreparados para acolher a família, visto que a intervenção construída está
centralizada nos sintomas em si, ou seja, na questão que envolve a doença. Neste sentido o
cuidado dever ser repensado na sua dimensão totalizante, distribuindo o peso do cuidado do
portador de transtorno psíquico, entre a família e os serviços, na perspectiva de que a saúde e
a assistência configurem direitos universal, integral e um dever do Estado (ROSA, 2011).
A família deve ser considerada um dos pilares dos procedimentos voltados à
reconstrução de vida dos dependentes químicos, em específico dos alcoolistas, devendo ser
incluída no decurso do cuidar não apenas com apoio ao tratamento, mas também como alvo
dessa atenção, reconhecendo-se, assim a sua importância enquanto estrutura social.
A política de saúde mental se encontra em fase se transição, visto que ainda percebem-
se contradições e crises, singulares e comuns a todo processo de mudança, aliadas ao jogo
político, que em muitos momentos repõem em cena antigos fantasmas manicomiais (ROSA,
2005).
Ainda assim, Mello (2005) evidencia a necessidade da inclusão da família no
movimento da Reforma Psiquiátrica, não apenas como objeto de pressão social e política, mas
como coadjuvantes no tratamento. Os familiares precisam ser vistos como um grupo que
necessita de apoio e orientação para lidar com o impacto gerado pelo sofrimento psíquico de
longa duração em seu núcleo familiar.
Dessa forma para que a Reforma Psiquiátrica ocorra de forma efetiva, Mello (2005)
defende a idéia de que o Estado é o único responsável pelo cuidado do portador, torna-se
fundamental. Porém:
[...] defender o cuidado unicamente na família envolve o risco de reforço às políticas
regressivas nos moldes sugeridos pelo ideário neoliberal, que retira o Estado da
assistência ao portador de transtorno mental [...] que, ao orientar pela busca de
racionalização econômica e administrativa desospitalizou e provocou desassistência
[...] (ROSA, 2008, p.346).
41
Apesar de sua importância no acompanhamento, tratamento e reabilitação, a família,
via de regra, não tem recebido a devida atenção pelas políticas públicas de saúde mental
(VECCHIA, 2005). Isso pode ser entendido, a partir do modelo neoliberal6, que desde a
década de 1970 reorientou as políticas públicas de modo que, muitas funções anteriormente
assumidas pelo Estado, são devolvidas às famílias.
A família por sua vez, passa a responsabilizar-se cada vez mais no que tange os
cuidados aos seus familiares, e isso os sobrecarrega fisicamente, economicamente e
principalmente emocionalmente.
Ao analisar a sobrecarga física e emocional, Oliveira e Layola (2004) destacam que
esta sobrecarga não pode ser vista de forma isolada, visto que o ser humano é um ser
biológico, emocional e social. Em outras palavras os autores trazem que os acontecimentos
que ocorrem em qualquer uma dessas esferas, podem refletir de forma coletiva, precisando
inserir este familiar/cuidador nos cuidados em saúde mental, de forma que os fortaleça para o
enfrentamento.
Os CAPS, e neste caso, se tratando de álcool e outras drogas, os CAPS-ad,
configuram-se como os equipamentos de saúde mental capazes de impulsionar esse cuidar
centrado na reabilitação psicossocial do usuário e de sua família, congregando esforços
também nos espaços comunitários que os envolve, por meio de um processo de trabalho e
cuidado em saúde caracterizado pelo acolhimento, atenção integral, humanização, vínculo e
co-responsabilização (AZEVEDO, MIRANDA, 2010).
Ressalta-se a importância de desenvolver ações de atenção integral ao uso de álcool e
outras drogas, de modo a propor mudanças, inclusive de crenças e normas sociais,
diversificação e ampliação da oferta de serviços assistenciais, adoção de políticas públicas de
promoção a saúde, e assim por diante, no intuito de prevenir, tratar e reduzir danos causados
por essas substâncias psicoativas.
Abrindo parênteses para a próxima seção a ser abordada neste trabalho, a qual refere-
se sobre a atuação do profissional de Serviço Social na saúde mental, especificadamente no
CAPS-ad II “Caminhos do Sol”, tem-se o processo de trabalho do assistente social, orientado
na busca pela ruptura do isolamento social/cura predominante durante muito tempo. O novo
modelo proposto, pautado na concepção ampliada de saúde, deve articular/ atrelar o trabalho
deste profissional com outras áreas do conhecimento, fazendo uma leitura crítica destas para
6 No entendimento de Ball (1998), o neoliberalismo é “aquilo que se poderia chamar de ideologia de mercado”,
ou seja, uma proposta vinda do liberalismo, que ao se metamorfosear em neoliberalismo passa a focalizar sua
ação na redução gradativa da intervenção estatal na economia e na sociedade. Neste sentido, ao invés de
promover políticas sociais básicas, transfere as responsabilidades para a sociedade.
42
dar conta das demandas institucionais sem perder de vista a criticidade e a visão histórica dos
processos que envolvem a problemática do usuário.
43
4 SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE MENTAL
Esta seção busca orientar à atuação do profissional do Serviço Social dentro da saúde
mental, a partir de um breve resgate histórico referenciado em pressupostos teóricos sobre a
prática profissional do assistente social neste espaço. A experiência de estágio supervisionado
no Centro de Atenção Psicossocial será exposta, com o intuito de demonstrar a atuação do
assistente social na instituição, bem como abrir espaço para reflexões e construções de ações.
Tendo por objetivo demonstrar a importância da inserção da família nos cuidados em
saúde mental, expõem-se as ações desenvolvidas no CAPS-ad II, destinadas a
cuidadores/familiares de dependentes químicos. O adoecimento de um dos membros da
família sempre produz sofrimento e determina uma reorganização do grupo familiar para lidar
com a nova situação (BEATTIE, 2001).
É neste sentido que tais ações desenvolvidas neste espaço-institucional devem oferecer
suporte aos familiares. Acredita-se que o tema do cuidado em saúde mental nos serviços
pautados pela Reforma Psiquiátrica, ainda é emergente, especialmente no que se refere ao
segmento família.
Será apresentada a realidade dos cuidadores, por meio de depoimentos expostos pelos
mesmos. Os depoimentos reforçam a idéia das dificuldades cotidianas enfrentadas pelo co-
dependente. Vale mencionar que nem todo familiar é cuidador, porém a partir da experiência
de estágio no campo da saúde mental percebe-se que a família é na sua maioria, é cuidadora.
Ainda, contextualizar-sé-a a experiência de estágio curricular em Serviço Social, tendo
como intervenção o Projeto Biblioteca “Leitura Reflexiva”, realizado com os usuários de
álcool e outras drogas do espaço-institucional.
4.1 O SERVIÇO SOCIAL INSERIDO NOS CUIDADOS EM SAÚDE MENTAL
Há um questionamento em torno da história do Serviço Social na saúde mental, que
conforme Bisneto (2007) perpassa contradições e determinações que dificultam o
desenvolvimento de uma relação satisfatória entre teoria e prática, visto que muitos assistentes
sociais “estariam” pouco alicerçados metodologicamente no campo da saúde mental.
As primeiras sistematizações da atuação do assistente social na área da saúde mental
surgiram nos Estados Unidos, no campo psiquiátrico, conforme:
O Serviço Social no campo psiquiátrico iniciou-se, nos Estados Unidos, pouco
depois do Serviço Social nos hospitais [1905]. Tinha como função, no início, ajustar
o paciente a se reajustar à vida normal; depois foram incluindo nas funções do
assistente social o estudo do ambiente familiar e profissional e a ajuda à família para
aceitar o doente e prepará-la a recebê-lo depois da alta (VIEIRA, 1995, p.67).
Assim, o Serviço Social em saúde mental seguia uma linha de apoio terapêutico,
restringindo-se ao atendimento das questões ligadas ao tratamento médico em si (BISNETO,
2007). O autor ainda coloca que nos Estados Unidos havia agências de Serviço Social que
atendiam a população quanto às necessidades materiais e concessão de benefícios,
segmentando o atendimento apenas ao apoio terapêutico.
No Brasil, boa parte do trabalho do Serviço Social nas organizações psiquiátricas,
voltava-se ao atendimento das questões mais emergenciais, associadas à enorme pobreza dos
pacientes e a ausência de rede de suporte familiar e comunitário.
O foco aqui não é caracterizar a atuação dos assistentes sociais nos Estados Unidos, e
sim buscar por meio de um apanhado histórico, situá-lo à realidade brasileira. Desse modo,
cabe então demonstrar a atuação do Serviço Social no Brasil, e esta iniciou na assistência aos
trabalhadores, no intuito de amenizar a relação entre capital e trabalho.
A atuação do assistente social no território brasileiro difere dos Estados Unidos, visto
que no Brasil procurava-se intervir nas refrações mais imediatas da “questão social”, tais
como fábricas, previdência e assistência social (IAMAMOTO, CARVALHO, 1998). Os
Estados Unidos por sua vez, não mantinha sua prática profissional articulada com graves
problemas sociais, já que existiam agências especializadas para este tipo de intervenção.
Outro fator que difere a intervenção do assistente social, conforme a comparação entre
os países citados anteriormente, justifica-se pelo fato de que havia poucos profissionais
trabalhando exclusivamente com o problema da saúde mental. A formação dos primeiros
assistentes sociais no Brasil corresponde à década de 40.
Os recém-formados eram induzidos às instituições psiquiátricas para trabalharem nas
seções de assistência social dessas instituições, conforme assinala Bisneto (2007). Ainda nas
palavras do autor, a atuação destes profissionais neste período estava diretamente subordinada
aos médicos e seguiam na seguinte lógica: levantamentos de dados sociais e familiares dos
pacientes, contatos com familiares para preparação de alta, confecção de atestados sociais.
Abre-se o questionamento sobre a atuação dos assistentes sociais neste período, pois
os mesmos não tinham autonomia nenhuma, e conforme Bisneto (2007) tratava-se de um
fazer subalterno, burocrático, assistencialista e totalmente acrítico.
45
A proposta de desinstitucionalização a partir dos anos 1970 consubstancia um novo
olhar sobre a saúde mental, abrindo novas possibilidades de aproximação com o processo de
renovação crítica da profissão. O Serviço Social encontra um novo espaço sócio-ocupacional,
que direciona sua intervenção principalmente no âmbito da garantia e acesso aos direitos aos
portadores de sofrimento psíquico, estimulando sua integração social e familiar.
Conforme Robaína (2010), o campo identificado como atenção psicossocial, entendido
como o plano que envolve as questões de assistência, moradia, trabalho e cidadania, entre
outros, constitui-se em espaço sócio-ocupacional do assistente social, posto que nele se
expressa de forma significativa à questão social. Assim:
[...] para garantir uma sintonia do Serviço Social com os tempos atuais, é necessário
romper com uma visão endógena, focalista, uma visão “de dentro” do Serviço
Social, prisioneira em seus muros internos. Alargar os horizontes, olhar para mais
longe, para o movimento das classes sociais e do Estado em suas relações com a
sociedade; não para perder ou diluir as peculiaridades profissionais, mas ao
contrário, para iluminá-las com maior nitidez. Explorar o Serviço Social para
apreendê-lo na história da sociedade da qual ele é parte e expressão. É importante
sair da redoma de vidro que aprisiona os Assistentes Sociais de dentro e para dentro
do Serviço Social, como pré condição para que se possam captar as novas mediações
e requalificar o fazer profissional, identificando suas peculiaridades e descobrir
alternativas de ação” (IAMAMOTO, 2001, p. 20).
Aos poucos a ruptura com as intervenções conservadoras da categoria profissional vão
aparecendo. Segundo Patriota et al. (2010) as perspectivas teórico-metodológicas que marcam
a trajetória do Serviço Social7na saúde mental foram se conformando em consonância com as
mudanças societárias e com o processo de amadurecimento da profissão, processo esse
evidenciado no projeto ético-político adotado nos anos de 1990.
Até agora, apresentou-se um breve relato sobre a inserção do Serviço Social no campo
da saúde mental, para então, dar continuidade ao trabalho deste profissional no Centro de
Atenção psicossocial- álcool e outras drogas II, a partir da vivência discente.
O processo de trabalho em saúde mental está orientado na busca de ruptura do
binômio isolamento social/cura, enfatizado pelo modelo biomédico de medicalização e
focalização dos sintomas/patologias, e assim, substituindo-o por um modelo pautado na
7 O Serviço Social na década de 1990 rompe em sua base formal com o conservadorismo, claramente com uma
visão de homem enquanto ser social que constrói sua história, tendo a liberdade como eixo central de orientação
deste projeto, entendida não apenas como valor, mas como capacidade ontológica do ser social (BARROCO,
2003). O Projeto ético-político do Serviço Social se revela cada vez mais contrário ao projeto de sociedade
hegemônico hoje e manter sua direção e construção exige cada vez mais do Assistente Social uma formação
continuada, crítica e direcionada pelo fim da exploração de classes. Isto não significa que o Serviço Social
rompeu totalmente com as práticas conservadoras, pois o avanço e consolidação do projeto hegemônico burguês
têm contribuído para a reformulação de práticas tradicionais revestidas de um discurso progressista.
46
concepção ampliada de saúde, implicada numa relação com o contexto econômico, social e
cultural do país, ou seja, abrangendo situações de moradia, saneamento, renda, alimentação,
educação, acesso ao lazer e bens (BRASIL, 2005a).
Neste sentido busca-se abrir canais de democratização dos saberes profissionais, sendo
o assistente social um dos profissionais que pode fazer parte da equipe multiprofissional dos
CAPS, conforme Portaria 336 de 19 de fevereiro de 2002 (BRASIL, 2004a). Suas ações
nesses espaços devem contribuir para superação da estigmatização da loucura e garantir um
atendimento digno e humanizado.
A principal estratégia de atenção à saúde com relação ao consumo de álcool e outras
drogas é o Centro de Atenção Psicossocial. O assistente social desenvolve um papel
importante neste espaço, buscando esclarecer, orientar e intervir frente às demandas do
Serviço Social. Dentre os instrumentos técnico-operativos utilizados pelo assistente social no
espaço do CAPS-ad II “Caminhos do Sol”, tem-se: entrevistas individuais, encaminhamentos
para a rede sócio-assistencial, relatórios, grupos operativos, registros, acompanhamento
social, visitas domiciliares, entre outros. De acordo com Abade e Arbonelli (2001), o
assistente social contribui para uma visão global do paciente frente ao seu projeto terapêutico
individual, garantindo ao mesmo um tratamento digno, tornando-o um sujeito social com
direitos e deveres.
Menciono aqui a importância de vincular a prática profissional ao código de ética
profissional e a lei de regulamentação da profissão, visto que estes instrumentos consolidam,
norteiam e dão suporte ao trabalho do assistente social. É neste sentido que o Serviço Social,
na área da saúde, atua além do sofrimento físico e psíquico, explicitando o enfrentando as
diferentes expressões da questão social. Assim a atuação do assistente social não está restrita à
ocupação dos espaços no âmbito dos programas e serviços de saúde, mas abrange todas as
áreas relacionas à vida-alimentação, moradia, educação, transporte, lazer, trabalho, renda, e
assim por diante.
Conforme a Constituição Federal de 1988, em seu Art. 196: “A saúde é direito de
todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (BRASIL, 2005a). Portanto é o Estado
que deve garantir os recursos necessários e gerenciar o sistema para que seja efetivado o
direito à saúde para toda a população.
Tradicionalmente na saúde mental, vem sendo dirigidos aos assistentes sociais o
trabalho com famílias. Embora este trabalho não seja atribuição exclusiva do Serviço Social, é
47
seguro afirmar que entre as categorias profissionais típicas da equipe de saúde mental, é esta
profissão que tem maior lastro de conhecimento e trato nesta área (ROBAÍNA, 2010). Ainda
assim vale mencionar que a abordagem com a família é um encargo de toda a equipe técnica
de assistência psiquiátrica. Nenhum profissional pode ou deve deter o monopólio ou
exclusividade, no que tange a intervenção junto às famílias, visto que por se tratar de uma
equipe multiprofissional, diversos saberes devem se interligar e complementarem-se.
4.2 AS AÇÕES DESENVOLVIDAS NO CAPS-AD II VOLTADAS ÀS FAMÍLIAS DE
DEPENDENTES QUÍMICOS
A partir do processo de Reforma Psiquiátrica, os Centros de Atenção Psicossocial
sendo parte integrante dos novos serviços de cuidado em saúde mental, devem oferecer
atendimento ao usuário e sua família, dando o devido suporte. Porém este item procura
questionar não as ações oferecidas dentro do espaço ocupacional em si, mas a limitação
destas.
O grupo operativo de familiares caracteriza-se por ser um dispositivo de fundamental
importância no CAPS-ad II. Ele possibilita uma interação e compartilhamento das vivências
entre os participantes, constituindo um espaço de troca de conhecimentos e de experiências.
Percebe-se que este espaço dentro da instituição é uma importante ferramenta para ampliar a
capacidade de lidar com os problemas.
O grupo operativo refere-se:
[...] um conjunto de indivíduos que possuem um objetivo comum e que buscam
trabalhá-lo como equipe. Através da tarefa proposta, os indivíduos entram em
relações entre si e com as coisas, que ultrapassam uma mera vinculação técnica com
aquilo que se deve realizar, e esses elementos subjetivos e de relação constituem o
fator mais humano da atividade (BLEGER, 1980, p. 62).
Em outras palavras, o grupo configura-se como um momento de escuta e apoio às
famílias perante as dificuldades encontradas com o manejo do dependente químico. Para
Pontes (2009), nos grupos de familiares ou nos atendimentos de família, é comum que as
discussões girem em torno dos sintomas, e é importante que o profissional que coordena o
grupo fique atento às possibilidades e ao conjunto de recursos que a família apresenta e como
cada um se apropria deles ou como ficam paralisados diante do momento vivido.
A Reforma Psiquiátrica, a temática do cuidado e as questões familiares colocam
inúmeros desafios. E esta questão deve ser mencionada neste trabalho, justamente por
48
representar um ponto relevante a ser questionado a partir da prática de estágio supervisionado
em Serviço Social.
Se o cuidado em saúde mental a partir da Reforma Psiquiátrica é partilhado entre
família e serviços de saúde, alguns pontos precisam ser revistos. A clássica visão de que a
família é a unidade responsável pelo usuário/dependente químico, idealizando a idéia do
cuidar, faz com que os mesmos fiquem sobrecarregados e adoeçam muitas vezes. A
dificuldade em si, é tornar que os cuidados à familiares se ampliem, de modo a oferecer um
atendimento integral.
Para amenizar a sobrecarga familiar e alcançar o cuidado em saúde mental é
necessário que se construa uma rede de cuidados ampliada, que priorize a família. De fato,
este ponto não diz respeito a profissionais despreparados ou desinteressados, e sim, devido ao
grande fluxo de atendimentos que chegam ao serviço. Este de fato, é o que limita que o
cuidado com a família seja priorizado.
Dessa forma, o grupo de familiares é o único espaço concreto onde os cuidadores
recebem atendimento diferenciado, e sendo assim, as propostas de cuidados seguem:
orientações, acolhimento, encaminhamentos para a rede sócio-assistencial, a fim de que
outros espaços possam contribuir com a efetivação do cuidado.
A partir das ações desenvolvidas no CAPS-ad II “Caminhos do Sol” voltado às
famílias dos indivíduos em sofrimento psíquico, é possível compreender que ao incluí-las nas
ações, a família torna-se o principal elo entre o serviço e a sociedade, assumindo o papel de
protagonista no cuidado em saúde mental.
4.3 A CONTEXTUALIZAÇÃO DA EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO-PROJETO DE INTER-
VENÇÃO BIBLIOTECA “LEITURA REFLEXIVA”
Durante três semestres foi vivenciada a experiência de estágio curricular em Serviço
Social no Centro de Atenção Psicossocial-álcool e outras drogas II “Caminhos do Sol”, no
município de Santa Maria/RS. Nesta trajetória, a partir de março de 2011 aplicou-se o projeto
de intervenção Biblioteca “Leitura Reflexiva” com os usuários do espaço-institucional.
Vale mencionar que aprendizagem é um processo construído em base estruturante que
nos capacita para diversas atividades. No campo acadêmico o alicerce deve estar pautado na
apreensão de conhecimento, sendo este dividido em teorização e prática. Entretanto, vale
considerar que ambos se complementam e estruturam a intervenção profissional.
49
A prática de estágio aqui contextualizada proporcionou um amadurecimento quanto ao
arcabouço teórico atribuído durante o período de graduação. A experiência de estágio foi
muito importante, principalmente pela busca constante do saber8.
Os encontros do projeto aconteceram quinzenalmente (nas segundas-feiras), no
período que corresponde a março de 2011/ dezembro de 2011 no espaço da biblioteca, com
duração de uma hora. Foram aproximadamente dezenove encontros ao total, tendo uma
média de quatro a seis participantes por encontro. No que corresponde à efetivação do projeto,
podemos considerar algumas dificuldades, principalmente no que tange o processo de adesão
dos usuários. Considera-se como sendo um dos fatores relacionados à baixa adesão dos
usuários, as enumeradas atividades de grupo que o espaço-ocupacional favorece.
Estas atividades fazem parte da rotina dos usuários no espaço do CAPS-ad II e
integram o processo de reabilitação social preconizado pela política de saúde mental. Os
grupos de forma geral procuram facilitar o processo de aprendizagem, cujo, extensão é a
mudança. Neste sentido as práticas de grupos são importantes enquanto espaços de cuidado
em saúde mental.
Ainda que as atividades de grupo facilitem o processo de recuperação e tratamento da
dependência química, muitos usuários mencionam que os profissionais na sua maioria,
utilizam-se destas atividades com freqüência, justificando a atividade de grupo incessante.
Buscou-se atrelar ao espaço do projeto, atividades diferenciadas daquelas já propostas
no CAPS-ad II, utilizando-se de conversas, leituras, reflexões, apresentação de vídeos e
filmes, abrindo espaço para que os próprios participantes elencassem as atividades de
interesse próprio. Ainda assim, as leituras não se mantiveram em torno do tema da
dependência química, possibilitando que os mesmos sugerissem assuntos de interesse do
grupo. Neste contexto, as leituras seguiram em torno de assuntos atuais do sistema
econômico, político e social do país, bem como especificidades do Serviço Social, como
duvidas sobre benefícios, entre outros.
Conclui-se que por meio do acesso à cultura, especificadamente da leitura, os sujeitos
podem despertar para fatos e acontecimentos anteriores não percebidos ou desconhecidos.
8 A prática de estágio não se resume ao projeto de intervenção. A proposta de intervenção que parte do estagiário
deve ter a característica do próprio, em consonância com as competências técnicas, éticas e política do serviço
social, além de abrigar os conhecimentos teórico-metodológicos do curso. Sendo assim o estagiário utiliza-se de
instrumentos técnicos operativos tais como: entrevista individual, grupos operativos, visitas domiciliares,
encaminhamentos à rede sócio-assistencial, relatórios, registros entre outros. Essa intervenção se dá a partir da
supervisão do profissional do Serviço Social local.
50
Segundo Silva (1996), o ato de ler sempre envolve apreensão, apropriação e transformação de
significados, a partir do documento escrito. A leitura se manifesta como a experiência
resultante do trajeto seguido pela consciência do sujeito em seu projeto de desvelamento do
texto. È essa mesma experiência (ou vivência dos horizontes desvelados através do texto), que
vai permitir a emergência do leitor. Por sua vez os novos significados apreendidos, fazem
com que este se posicione em relação ao documento lido, o que pode gerar possibilidade de
modificação do texto evidenciado através do documento, ou seja, a incrementação dos seus
significados.
Nas palavras de Freire (1983, p. 12), a compreensão do texto a ser alcançada por sua
leitura crítica implica a percepção das relações entre o texto e contexto. A decifração da
palavra fluiu naturalmente da “leitura” do mundo particular. Dessa forma, pode-se dizer que a
leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo, mas por certa forma de
escrevê-lo ou reescrevê-lo, ou seja, de transformá-lo através de nossa prática consciente.
Levando em consideração que os CAPS de forma geral visam oferecer atividades que
estimulem a criatividade e a autonomia, capacitando os sujeitos a desenvolverem suas
potencialidades, tornam-se fundamentais espaços como o do projeto em destaque.
A reabilitação psicossocial engloba distintos aspectos, pois, trata-se de um processo
complexo. A partir do Plano Terapêutico Individual, constrói-se de forma estratégica junto
com o profissional responsável, atividades de maior interesse pessoal. Ainda neste contexto os
profissionais que compõem a equipe técnica do espaço-institucional podem estar sugerindo e
encaminhando os usuários ao grupo operativo da biblioteca.
O projeto de intervenção aqui apresentado teve por objetivo promover o acesso à
leitura enquanto estratégia de cuidado em saúde mental, com vistas a reflexões sobre as
histórias de vida dos usuários. Dentre os objetivos específicos podemos citar: constituir um
grupo operativo de reflexão com os usuários; propor uma nova estratégia de cuidado, garantir
maior adesão dos usuários no tratamento; promover cultura e lazer por meio da reconstrução
da realidade abstrata a partir da literatura; estimular os usuários a partir dos conhecimentos e
leituras adquiridos e socializados, entre outros.
Ainda assim, o projeto mencionado torna-se fundamental enquanto ferramenta de
tratamento aos usuários de álcool e outras drogas, pois oferece a possibilidade de cultura,
lazer e satisfação sem o efeito da substância psicoativa. Buscou-se a partir do acesso à leitura:
informação, promoção de conhecimento e reflexão por meio do acervo da biblioteca,
facilitando o processo de reabilitação.
51
Dentre os objetivos do CAPS-ad II, pode-se mencionar a reabilitação psicossocial, por
meio da reinserção social dos sujeitos com disposição de um serviço especializado no
tratamento de dependência química. Logo, estes são serviços de saúde mental pautados numa
nova proposta de cuidado no tratamento de dependente de álcool e outras drogas, a partir do
contexto da Reforma Psiquiátrica.
Levando em consideração que uma das finalidades destes novos serviços é oferecer
atividades terapêuticas e preventivas, neste âmbito podemos citar os grupos terapêuticos e
operativos, atividades artísticas e comunitárias, oficinas, atendimento aos familiares, como
essenciais no que tange a recuperação dos dependentes químicos.
Os grupos são importantes no tratamento dos sujeitos, pois ao conviverem em grupo
os indivíduos vão internalizando mutuamente suas formas de pensar e agir (BLEGER, 1980).
Além disso, constata-se que por meio da participação em grupo, os sujeitos podem, a partir da
troca de vivências, compartilharem experiências, repensar sua forma de agir frente à doença, e
conseqüentemente vir a mudar seus hábitos.
Visto que o projeto de intervenção mencionado destina-se aos usuários do serviço,
utilizando-se da leitura enquanto estratégia de cuidado em saúde mental cabe então ressalvar
que este mesmo espaço foi utilizado para refletir sobre a dependência química na sua
totalidade. Isto significa que apesar das famílias (co-dependentes) não participarem dos
encontros, o contexto que envolve a família e a dependência química, foi debatido.
Neste sentido, os usuários refletiram sobre a co-dependência, como sendo uma doença
que afeta os familiares/cuidadores, a qual se manifesta por meio de comportamentos
autodestrutivos. Dessa forma, os usuários puderam reavaliar a dependência química sob um
novo olhar, levando em consideração as conseqüências que a droga causa no ambiente
familiar.
52
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao questionar o processo que envolve o sofrimento psíquico, isto é, ao revelar que sua
trajetória permeou a idéia de isolamento, exclusão, punição, e desta forma utilizando-se do
processo de Reforma Psiquiátrica para nortear este trabalho, pretendeu-se demonstrar os
pressupostos que seguem esta lógica de mudança no modo de tratar o portador de transtorno
psíquico.
A partir da discussão sobre a nova proposta de cuidado em saúde mental, propõe-se
que a direção das ações visa reverter à tendência hospitalocêntrica, por meio da priorização e
implementação de um sistema extra hospitalar e interdisciplinar, substituindo as internações
em hospitais psiquiátricos por hospitais gerais, promovendo um atendimento integral e
articulado com os demais serviços.
O processo de Reforma Psiquiátrica compreende um conjunto de transformações de
saberes, práticas, valores culturais e sociais. Dessa forma, apesar dos avanços alcançados, vale
mencionar que grandes desafios permeiam a tarefa de expansão e consolidação desta
mudança. Esta por sua vez, exige a formação de profissionais dotados de capacidade de
reflexão crítica e competência técnica para se envolverem numa prática de cuidado que se
constitua num exercício de transformação para todos os envolvidos: usuários, familiares e
profissionais.
Para tanto, entende-se ser de fundamental importância à discussão da formação
acadêmica nesta nova perspectiva. O papel dos profissionais de saúde mental é relevante, se
não determinante, na transformação das relações cotidianas nos serviços de saúde mental,
tanto no que se refere à concepção e compreensão da loucura, quanto na concepção das novas
práticas institucionais.
Desse modo, a luta por uma assistência psiquiátrica mais humanizada vai além da
conquista dos novos modelos de atenção. Abarca a necessária ruptura de paradigmas
ideológicos e resistências silenciosas, demonstradas ainda por muitos profissionais nas suas
ações e atitudes.
Este estudo compreendeu uma reflexão sobre a temática da saúde mental, e neste
contexto se propôs a conhecer a sobrecarga da família que convive com o portador de
sofrimento psíquico. Constata-se por meio dos depoimentos que a realidade vivenciada pelos
co-dependentes, é permeada por sentimentos de desespero, ansiedade, preocupação e
sofrimento, implicando desta forma, em conflitos.
Ainda assim, para que a Reforma Psiquiátrica ocorra de forma efetiva à família deve
ser inserida nas ações de cuidado. Os familiares precisam ser vistos como um grupo que
necessita de apoio e orientação para lidar com o impacto gerado pelo sofrimento psíquico.
Reporta-nos sobre as repercussões do alcoolismo no âmbito familiar torna-se
necessário que as políticas em saúde mental garantam um cuidado não só para o usuário,
como também para aquele que oferece cuidado. Visto dessa forma, os CAPS são espaços
concretos que devem consolidar este atendimento diferenciado, centrados na reabilitação
psicossocial do usuário e de sua família.
Acredita-se que o tema do cuidado em saúde mental nos serviços pautados pela
Reforma Psiquiátrica ainda é emergente, especialmente no que se refere ao segmento família.
Diante de alguns avanços, as ações de cuidado direcionadas às famílias são limitadas. Este
ponto elucida-se porque o familiar não recebe o mesmo atendimento que o
usuário/dependente químico, pois as atividades oferecidas nos serviços substitutos ainda
voltam suas ações para os usuários.
A dificuldade em si, é tornar que estes cuidados se ampliem, de modo a oferecer
atendimento integral aos cuidadores. De fato, este ponto não diz respeito a profissionais
despreparados ou desinteressados, e sim, devido ao fluxo de atendimentos que chegam ao
serviço.
Tendo os CAPS como um dispositivo de cuidado em saúde mental, a partir da lógica
de desinstitucionalização, e assim verificando o deslocamento do saber-médico, antes
elencado como o único saber existente, passa-se a integrar a multiprofissionalidade, com o
intuito de utilizar-se dos diversos conhecimentos e saberes, de forma compartilhada e não
mais fragmentada numa intervenção mais eficaz.
Neste contexto pode-se mencionar ainda a atuação do assistente social, justificando
sua atuação, na medida em que se adentram a realidade, reconhecendo os problemas
implícitos acerca da pobreza e das questões desencadeadas pelo capitalismo e legitimada pelo
ideário neoliberal junto à globalização. Assim sendo, o Serviço Social em saúde mental
precisa estar atrelado a outras áreas do conhecimento, fazendo uma leitura crítica destas, para
dar conta das demandas institucionais sem perder de vista a criticidade e a visão histórica dos
processos que envolvem a problemática do usuário e familiar.
A experiência de estágio supervisionado em Serviço Social ao longo desses semestres
oportunizou a aproximação com as realidades complexas e ao mesmo tempo distintas. O
trabalho do assistente social neste espaço ocupacional é extremamente relevante, e mesmo
54
com todos os desafios, é preciso trabalhar com as potencialidades e possibilidades, para assim
valorizar a profissão.
Objetivou-se com a prática de estágio ampliar os conhecimentos relacionando a teoria
apreendida em sala de aula com a prática, por meio de instrumentos-técnicos integrando
diferentes fases do ensino e proporcionando um pensar mais crítico sobre a saúde mental. A
partir dos conhecimentos acerca da intervenção e da utilização de instrumentos técnico-
operativos e ético-políticos do Serviço Social, refletiu-se sobre um cuidado mais humanizado
aos usuários de drogas e seus familiares.
A experiência prática no campo de estágio foi fundamental para o desenvolvimento
deste trabalho. A partir dos atendimentos individuais, dos grupos operativos e do
conhecimento adquirido a partir da atuação dos profissionais da instituição foi possível
compreender a problemática do álcool no contexto social e familiar, abrindo espaço para
reflexões no que tange a inserção da família nos cuidados em saúde mental.
O projeto de intervenção merece destaque, pois é parte integrante do processo de
ensino e aprendizagem profissional, favorecendo a interação teoria e prática. Por meio deste,
obteve-se uma aproximação ainda maior com os problemas relacionados à dependência
química. Acredita-se que neste espaço os usuários puderam refletir sobre suas historias de
vida, com perspectivas à mudanças.
Os depoimentos foram significativamente importantes para a realização deste trabalho,
visto que elucidou questões pertinentes discutidas no decorrer do referencial teórico,
comprovando que o alcoolismo no âmbito familiar afeta e sobrecarrega os cuidadores.
Este trabalho de conclusão de curso teve por objetivo maior, abrir espaço para
questionamentos e reflexões, levando em consideração a necessidade de ampliar a
compreensão sobre as diferentes dimensões de cuidado prestadas aos familiares (cuidadores)
de portadores de sofrimento psíquico.
A partir da discussão teórica proposta, menciona-se a importância de repensar a
assistência à saúde mental, suas possíveis implicações e articulações para o desenvolvimento
de ações mais efetivas, particularmente no que se refere à ampliação das ações e serviços
disponibilizados a família cuidadora.
55
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63
APÊNDICE A
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Título do Trabalho: “Entendendo o alcoolismo e suas repercussões no âmbito familiar”
Prof.ª Orientadora: Rosilaine Coradini Guilherme
Acadêmica Responsável: Grasiele Gallina Seeger
Instituição de origem do acadêmico: Centro Universitário Franciscano (UNIFRA)
Curso: Serviço Social
Sr(a) foi selecionado(a) e está sendo convidado(a) para participar da exposição de
depoimentos referente à dependência química e a co-dependência de álcool, tendo por
objetivo elucidar a experiência de estágio no Centro de Atenção Psicossocial- álcool e outras
drogas II “Caminhos do Sol”, como parte integrante do Trabalho Final de Graduação em
Serviço Social. Este não é uma pesquisa, e seu depoimento será tratado de forma anônima e
confidencial, isto é, em nenhum momento será divulgado o seu nome em qualquer fase do
estudo. Quando for necessário exemplificar determinada situação, sua privacidade será
assegurada uma vez que seu nome será substituído de forma aleatória. Os depoimentos serão
utilizados apenas neste estudo e sua participação é voluntária.
Sr(a) não terá nenhum custo ou quaisquer compensações financeiras. Não haverá riscos de
qualquer natureza relacionada à sua participação. O benefício relacionado à sua participação
será de aumentar os questionamentos e reflexões no âmbito dos cuidados em saúde mental no
que tange a inserção da família.
Declaro estar ciente do inteiro teor deste TERMO DE CONSENTIMENTO e estou de
acordo em participar do estudo proposto, sabendo que dele poderei desistir a qualquer
momento, sem sofrer qualquer punição ou constrangimento.
Sujeito: ______________________________________________
(assinatura)
APÊNDICE B
TERMO DE CONFIDENCIALIDADE
Título do Trabalho: “Entendendo o alcoolismo e suas repercussões no âmbito familiar”
Prof.ª Orientadora: Rosilaine Coradini Guilherme
Acadêmica Responsável: Grasiele Gallina Seeger
Instituição de origem do acadêmico: Centro Universitário Franciscano (UNIFRA)
Curso: Serviço Social
I. Preservar o sigilo e a privacidade dos sujeitos cujos dados (informações e/ou materiais biológicos)
serão estudados;
II. Assegurar que as informações e/ou materiais biológicos serão utilizados, única e exclusivamente,
para a execução do projeto em questão;
III. Assegurar que os resultados do estudo somente serão divulgados de forma anônima, não sendo
usadas iniciais ou quaisquer outras indicações que possam identificar o sujeito do estudo;
A acadêmica declara ter conhecimento de que as informações pertinentes referentes ao estudo
somente podem ser acessados por aqueles que assinaram o Termo de Confidencialidade, excetuando-
se os casos em que a quebra de confidencialidade é inerente à atividade ou que a informação e/ou
documentação já for de domínio público.
Santa Maria, .......... de ..............................de 20..... .
_________________________
Assinatura Acadêmica
Nome: ..................................................
RG: ...........................................
_____________________________
Assinatura Orientador
Nome: ....................................................
RG: ......................................................
____________________________________
Assinatura Pesquisado
Nome: ...................................................
RG:....................................................