12
Fernando Brenha Ribeiro Eder Cassola Molina 6.1 Introdução 6.2 Elementos do campo geomagnético 6.3 Unidades de medida do campo geomagnético 6.4 Características observáveis do campo geomagnético 6.5 Instrumentos de medida 6.6 Modelos do campo geomagnético 6.7 A geração do campo geomagnético Referências LICENCIATURA EM CIÊNCIAS · USP/ UNIVESP Geofísica 6 O CAMPO MAGNÉTICO TERRESTRE

O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

Fernando Brenha RibeiroEder Cassola Molina

6.1 Introdução6.2 Elementos do campo geomagnético 6.3 Unidades de medida do campo geomagnético6.4 Características observáveis do campo geomagnético 6.5 Instrumentos de medida6.6 Modelos do campo geomagnético 6.7 A geração do campo geomagnéticoReferências

Licenciatura em ciências · USP/ Univesp

Geof

ísic

a6O CAMpO MAGnétICO tERREstRE

Page 2: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

133Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

Geofísica

6.1 IntroduçãoObservações relacionadas ao fenômeno do magnetismo são relatadas desde alguns séculos a.C.

Aristóteles chegou a citar que algumas propriedades da atração magnética foram estudadas por

Tales, no século VI A.C. Ao que parece, os chineses já conheciam as propriedades magnéticas

dos materiais naquela época ou antes disso, mas os primeiros relatos conhecidos datam do

início do século X. É famosa uma lenda popular que diz que um pastor de ovelhas conduzia

seu rebanho pelas terras da Grécia quando percebeu que os pregos de suas sandálias tinham sido

atraídos fortemente por uma pedra escura que ele pisara. Essa rocha, posteriormente, recebeu o

nome de magnetita por ter sido descoberta na região chamada Magnésia.

Por se tratar de uma propriedade incomum, existem diversas lendas sobre o magnetismo e os

materiais magnéticos. Inicialmente, esses materiais eram tidos como mágicos, por apresentarem

essa propriedade única; há relatos de recomendação do uso de materiais magnéticos naturais para

curar doenças e afugentar fantasmas. Uma lenda chega a contar que Arquimedes teria usado rochas

magnéticas para atrair os pregos dos navios inimigos e afundá-los. O fato de que um objeto feito de

magnetita, que tivesse a forma de uma agulha e fosse colocado para flutuar na água, apontava sempre

para a mesma direção ajudou a reforçar as lendas sobre as propriedades mágicas desse material.

As características distintas da magnetita que eram conhecidas na Antiguidade incluíam o fato

de que, ao se atritar alguns materiais metálicos na magnetita, estes adquiriam suas propriedades e

se tornavam imantados, e a descoberta de que, se um peixe esculpido em ferro fosse aquecido ao

rubro e deixado esfriar com a cauda apontando para o norte, não seria necessário esfregá-lo na

magnetita para ele se tornar magnético, o que poderia ser verificado colocando-o para flutuar

na água sobre um pedaço de madeira.

Somente em 1269 um documento científico sobre magnetismo foi publicado por Petrus

Peregrinus (ou Peter Peregrinus, em algumas traduções), em forma de carta enviada ao seu

vizinho. Ao que parece, Petrus estava em uma campanha militar na Itália e, durante o cerco a

Lucera, teve oportunidade de descrever nessa carta diversas observações a respeito da magnetita

e do magnetismo, desde detalhes sobre a construção de uma bússola até o comportamento das

linhas de campo magnético em uma esfera de magnetita.

Durante as grandes navegações, a bússola era um instrumento fundamental nos navios, e

alguns estudos sobre seu comportamento ante materiais metálicos são relatados por navegadores e

Page 3: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

134 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

6 O campo magnético terrestre

exploradores. Cristóvão Colombo, por exemplo, deixou um valioso registro em seu diário de bordo

em setembro de 1492, ao cruzar a linha de declinação zero, chamada atualmente “linha agônica”,

quando estava próximo aos Açores. Essa linha atualmente encontra-se no oeste da América do Sul.

A próxima data significativa para o magnetismo veio em 1600 com os estudos de William

Gilbert, que notou que a Terra se comportava como um ímã gigante, que ímãs podiam ser

fabricados ao se bater em ferro de determinadas maneiras e que a magnetização podia ser

perdida caso o material fosse aquecido acima de certa temperatura.

Os avanços posteriores nesta área vieram com grandes cientistas do século XIX, como

Oersted, Maxwell e Gauss, que relacionaram o fenômeno do magnetismo ao da eletricidade,

estabelecendo as bases do eletromagnetismo, e estimularam a padronização das medidas do

campo magnético terrestre, o estabelecimento de observatórios magnéticos e a formulação

matemática e física para a investigação desse campo.

6.2 Elementos do campo geomagnético A Terra comporta-se como um gigantesco ímã e esse fato é notório a qualquer explorador que

se oriente por meio de uma bússola. A agulha imantada da bússola alinha-se com o meridiano mag-

nético local e aponta sempre para uma mesma direção - a direção do norte-sul magnético. Deve-se

notar que a direção norte-sul magnética

é distinta da direção norte-sul geográfica,

ou seja, o norte magnético não coincide

com o norte geográfico na maior parte da

superfície terrestre.

A forma mais conveniente de

exprimir a força magnética em um

determinado local da superfície terrestre

é decompondo o vetor força magnética

em 3 componentes: a declinação

magnética, a inclinação magnética

e a intensidade da força magnética

(normalmente chamada de “campo

Figura 6.1: Elementos do campo geomagnético em um ponto da superfície terrestre. O eixo Ox aponta na direção do norte-sul geográfico, o eixo Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o eixo Oz aponta na direção vertical.

Page 4: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

135Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

Geofísica

total”). A Figura 6.1 traz a representação desses elementos para um ponto localizado no

hemisfério norte magnético.

6.3 Unidades de medida do campo geomagnéticoTemos no eletromagnetismo dois vetores ligados ao campo magnético: o vetor indução

magnética, normalmente chamado de B, e o vetor intensidade do campo magnético, chamado

de H. Dependendo do tipo de sensor utilizado para medir o campo magnético, pode mudar a

escolha natural do vetor que deve expressar a medida. Se, por exemplo, usarmos bobinas para

medir o campo, estaremos investigando o campo magnético induzido nelas; então, seria intui-

tivo utilizar B para expressar a grandeza; se estivermos utilizando ímãs para a medida, a escolha

lógica para o valor do campo seria H. Ocorre que esses dois vetores não têm o mesmo tipo de

unidade e não podem ser utilizados indistintamente para expressar o campo.

Felizmente, existe uma relação simples entre os vetores B e H, dada por B = μ H, com μ sendo

a permeabilidade magnética do meio. Isso permite a escolha de B ou H para expressar o campo

magnético, visto que ambos estão diretamente relacionados. Em Geofísica, a recomendação

dada pela Associação Internacional de Geomagnetismo e Aeronomia (IAGA), em 1973, é a de

Observando a Figura 6.1, podemos definir os elementos do campo geomagnético da seguinte forma:

• a projeção do vetor força magnética no plano Oxy define o meridiano magnético, ou seja, a direção norte-sul magnética;

• a diferença angular entre o vetor força magnética e o plano horizontal Oxy é chamada inclinação magnética; ela é positiva quando o vetor força magnética aponta para baixo do plano horizontal e negativa na situação contrária;

• a diferença angular entre o norte-sul magnético e o norte-sul geográfico é chamada declinação magnética. Por convenção, ela é positiva quando o meridiano magnético fica a oeste do norte geográfico e negativa na situação inversa;

• o módulo do vetor força magnética é chamado intensidade magnética ou campo total.

Com esses 3 elementos é possível caracterizar o campo geomagnético em qualquer lugar do planeta.

Page 5: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

136 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

6 O campo magnético terrestre

que o campo geomagnético deve ser expresso pelo vetor B. Isso, porém, ainda não é suficiente

para evitar confusão, pois temos dois sistemas comuns para as unidades: o Sistema Internacional

(SI) e o Sistema CGS eletromagnético (CGSEM). No CGSEM, B é expresso em Gauss (G), e

no SI B é expresso em Tesla (T). Também por recomendação da IAGA, a unidade utilizada em

Geofísica é o Tesla. A relação entre essas unidades também é simples: 1 Tesla = 104 Gauss.

Como a intensidade do campo geomagnético é relativamente pequena, é comum utilizar

um submúltiplo do Tesla, o nanoTesla (nano = 10-9, 0,00000000 T). Desta forma, o valor da

intensidade do campo geomagnético na região de São Paulo, no ano de 2011, é da ordem de

grandeza de 25000 nT.

6.4 Características observáveis do campo geomagnético

O campo magnético terrestre tem

como característica importante o fato

de que, em um primeiro ajuste, pode ser

considerado como um campo dipolar, ou

seja, como o campo gerado por um ímã

comum que tem um polo norte e um

polo sul. Mais de 90% das observações

sobre o campo geomagnético podem

ser explicadas por um campo magnético

dipolar desse tipo. O eixo desse

dipolo magnético tem um pequeno

deslocamento, de aproximadamente

11°, em relação ao eixo de rotação da

Terra. Este pequeno valor sugere que

pode haver alguma correlação entre a

geração do campo geomagnético e a

rotação terrestre, visto que, de todas as posições possíveis no espaço tridimensional, o eixo do

dipolo quase coincide com o eixo de rotação.

Figura 6.2: Mapa de distribuição dos valores de inclinação magnética para o ano de 2002. A linha vermelha denota a linha de inclinação zero, ou seja, o equador magnético.

Page 6: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

137Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

Geofísica

Outra característica notável do campo geomagnético é a de que as grandes feições

magnéticas observadas nos mapas dos elementos magnéticos (inclinação, declinação,

intensidade) não parecem se alterar na passagem da crosta continental para a crosta oceânica,

nem em regiões de grandes feições geológicas, como seria de se esperar, caso esse campo fosse

gerado pelas rochas que se encontram nas primeiras camadas da Terra. Isso é um indicativo

de que o campo geomagnético não deve ter contribuição significativa das primeiras camadas

do planeta. A Figura 6.2 mostra as linhas de mesma inclinação magnética (as linhas de

mesma inclinação magnética são chamadas isoclínicas) para a região brasileira no ano de

2002, e pode-se notar que não existe correlação aparente entre as feições magnéticas e as

feições geológicas maiores conhecidas.

Outras importantes características do campo geomagnético estão relacionadas à sua variação

temporal. Ao contrário do campo da gravidade, que pode ser considerado estático para o intervalo

de tempo de alguns anos ou até mesmo décadas, o campo geomagnético apresenta variações no

tempo, que vão de horas a milhares de anos. As principais variações temporais do campo são:

• variação diurna solar: tem período de 24 horas e apresenta valores que atingem tipi-

camente algumas dezenas de nT; esta variação não é a mesma para todos os locais da

Terra, existindo pontos onde ela apresenta valores crescentes durante o dia até atingir um

máximo por volta do meio-dia, decrescendo lentamente durante a tarde para atingir o

mesmo valor inicial no final da noite. Em épocas de maior atividade solar podem ocorrer

as chamadas “tempestades magnéticas”, causadas por uma maior emissão de partículas

provenientes do Sol, que interagem com o campo magnético da Terra, gerando correntes

secundárias que perturbam esse campo;

• variação secular: tem escala de tempo típica de centenas a milhares de anos e não é a mesma

para todos os pontos da Terra. Esta variação faz com que o campo como um todo migre lenta-

mente para oeste, um fenômeno que é conhecido como “deriva para oeste”. Por esse motivo,

as cartas geomagnéticas tem de ser refeitas a cada 5 anos. A Figura 6.3 mostra a variação da

intensidade do campo geomagnético para a cidade de São Paulo no período de 1960 a 2011.

• reversões do campo geomagnético: o campo magnético chega a sofrer mudanças bruscas

em certos períodos, chamadas de reversões do campo geomagnético. Nessas reversões,

que ocorrem muito rapidamente no tempo geológico (estima-se que em um intervalo de

tempo de 3.000 a 5.000 anos), os polos magnéticos da Terra se invertem, ou seja, o local

onde hoje é o polo norte magnético ficaria sendo o polo sul magnético e vice-versa caso

Page 7: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

138 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

6 O campo magnético terrestre

ocorresse uma reversão nos dias de hoje. Após uma reversão, o campo permanece com

a mesma orientação por períodos que vão de centenas de milhares a milhões de anos,

sem periodicidade conhecida até o momento. Essas reversões podem ficar registradas nas

rochas ígneas e serem recuperadas pelos geofísicos especializados em estudar o campo

magnético passado da Terra, ciência conhecida com Paleomagnetismo.

Outro fator que é peculiar do campo geomagnético é a contribuição externa. Enquanto o

campo gravimétrico, por exemplo, é de origem exclusivamente interna, o campo geomagnético tem

uma pequena componente que é gerada fora da parte sólida da Terra. O fluxo de partículas carregadas

do Sol e de outras estrelas interage com as altas camadas da atmosfera, e gera campos secundários tênues,

mas importantes para a Geofísica e para aplicações espaciais e em telecomunicações.

6.5 Instrumentos de medidaExistem diversos tipos de instrumentos que podem ser utilizados para a medição das grandezas

associadas ao campo geomagnético. Gauss chegou a propor um tipo de medição, que poderia

ser utilizado para determinar a inclinação e declinação magnética por meio de instrumentos

chamados variômetros ou variógrafos, e um tipo de medição baseado na oscilação ou deflexão

de um ímã suspenso para obter a intensidade do campo horizontal. Atualmente, são utilizados

equipamentos chamados magnetômetros para determinar a intensidade (e, eventualmente, a

direção e o sentido) do campo geomagnético com rapidez e precisão.

Figura 6.3: Variação da intensidade do campo geomagnético para a cidade de São Paulo. Valores em nT.

Page 8: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

139Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

Geofísica

Os três tipos principais de magnetômetros utilizados em Geofísica são o de precessão de pró-

tons, o fluxgate e o de bombeamento óptico. Trata-se de equipamentos sofisticados, baseados em

efeitos físicos relativamente complexos, que, por esse motivo, não serão detalhados neste texto. Para

conseguirmos entender as características e variações do campo geomagnético é suficiente saber

que os magnetômetros de precessão de prótons e os de bombeamento óptico fornecem apenas o

valor da intensidade do campo geomagnético, de forma descontínua (ou seja, não fornecem um

registro contínuo desse elemento, mas uma taxa de amostragem do mesmo elemento, atualmente

da ordem de 10 medidas por segundo), ao passo que os magnetômetros fluxgate permitem a

determinação das componentes do campo geomagnético em qualquer direção, fornecendo uma

distribuição contínua de valores ao longo do tempo. Os primeiros são muito utilizados em traba-

lhos de campo de Geofísica, e o último normalmente é utilizado em observatórios geomagnéticos.

6.6 Modelos do campo geomagnético Com o acúmulo de dados geomagnéticos pelos observatórios magnéticos estabelecidos

em diversos países do mundo e por campanhas geofísicas para a exploração da Terra, é possível

elaborar modelos do campo geomagnético que

permitam estimar os parâmetros inclinação,

declinação e intensidade para qualquer ponto do

planeta em uma determinada época. Esses modelos

têm diversas aplicações, seja para determinar

os parâmetros para localização (a declinação

magnética, por exemplo, é necessária para obter

o norte geográfico quando se utiliza uma bússola,

que aponta para o norte magnético) seja para

corrigir dados geofísicos.

Os modelos internacionais mais utilizados

são o IGRF (International Geomagnetic

Reference Field) e o WMM (World Magnetic

Model ). O IGRF é o modelo recomendado

pela IAGA, e é recalculado periodicamente Figura 6.4: Representação da intensidade do campo geomagné-tico para 07/9/2011, calculada pelo modelo IGRF -11. Valores em nT.

Page 9: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

140 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

6 O campo magnético terrestre

em função de novos dados e avanços numéricos e computacionais. Uma boa descrição

desse modelo (em inglês) pode ser encontrada nos endereços eletrônicos fornecidos no

final deste texto. A representação da intensidade do campo geomagnético para 07/9/2011

calculada a partir desse modelo encontra-se na Figura 6.4.

O WMM é similar ao IGRF, mas tem outra metodologia para o cálculo, além de utilizar

dados distintos para elaborar o modelo e se prestar a outra finalidade: representar os valores do

campo geomagnético associados exclusivamente às partes mais profundas da Terra. As contri-

buições da crosta e do manto superior não são contempladas (nem desejadas) por este modelo,

nem as contribuições da ionosfera e da magnetosfera. A Figura 6.5 mostra a configuração da

declinação magnética para a Terra calculada pelo WMM para 01/01/2010.

Esses modelos são adequados para representar o campo geomagnético de forma global, mas

sua precisão depende da qualidade e da quantidade de informação disponível para elaborá-los.

No caso do território brasileiro, de dimensão continental e com apenas dois observatórios

geomagnéticos para fornecer os dados, espera-se que a precisão dos dados previstos pelos

modelos IGRF e WMM não seja tão boa quanto é para os EUA e países europeus, por

Figura 6.5: Representação da declinação magnética para 01/01/2010, calculada pelo modelo WMM.

Page 10: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

141Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

Geofísica

exemplo, onde a quantidade e a densidade de observatórios geomagnéticos permitem uma

melhor representação dos elementos do campo magnético terrestre.

Uma alternativa para amenizar esse problema foi proposta por dois pesquisadores do

Observatório Nacional, no Rio de Janeiro. Motta e Barreto publicaram, em 1992, um modelo

geomagnético para o território nacional calculado a partir dos dados dos dois observatórios

magnéticos brasileiros e de diversos observatórios itinerantes, que foram distribuídos pelo Brasil

e deixados em operação por períodos limitados. Essa melhor distribuição espacial de dados

e o tratamento numérico utilizado permitiram a elaboração de um modelo que representa

relativamente bem os elementos magnéticos no território nacional. A Figura 6.2 foi feita com

base nos dados calculados com esse modelo.

6.7 A geração do campo geomagnéticoPodemos imaginar alguns mecanismos possíveis para explicar a existência e as características do

campo geomagnético. A hipótese mais simples seria admitir que a Terra é formada por material

magnetizado e se comportaria como um enorme ímã exatamente por isso. Esta hipótese não

tem respaldo científico por alguns motivos, entre eles o fato de que a quantidade de minerais

magnéticos necessária para justificar o campo magnético terrestre seria exageradamente grande,

e exigiria uma espessura muito grande de material magnetizado na forma concentrada.

Além disso, uma Terra constituída de material magnetizado não poderia dar origem a variações

temporais do campo, como a variação secular, por exemplo.

O fluxo de correntes elétricas na superfície da Terra também seria capaz de gerar um campo

magnético considerável. Esta hipótese foi trabalhada pelos cientistas até que conseguiram calcular a

corrente necessária para gerar um campo compatível com o da Terra e descobriram que essas correntes

teriam de ser milhares de vezes mais intensas do que as que são observadas na superfície terrestre.

Por fim, um modelo plausível para a geração do campo geomagnético foi proposto por

Elsasser, em 1946, e por Bullard em 1949. Este modelo considera que a Terra funciona como

um dínamo, que converte energia mecânica em energia elétrica. O movimento do material

metálico líquido do núcleo externo, ao redor do núcleo interno metálico da Terra, faria o

papel desse dínamo e geraria um campo magnético compatível com o observado na superfície.

Este modelo explicaria bem as características observáveis do campo geomagnético, podendo,

Page 11: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

142 Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

6 O campo magnético terrestre

inclusive, justificar a variação secular caso houvesse uma rotação diferencial entre o núcleo e

a crosta. A reversão do campo geomagnético, porém, não pode ser explicada por este modelo.

Em 1958, Rikitake sugeriu um modelo com dois dínamos acoplados, que poderia explicar

as reversões do campo magnético caso os dínamos possuíssem propriedades distintas e sentidos

contrários de rotação. As simulações numéricas e os testes em laboratório comprovaram a

possibilidade de este modelo gerar um campo magnético com todas as características do campo

da Terra e, atualmente, este é o modelo vigente para explicar a geração do campo geomagnético.

ReferênciasIAGA. International Geomagnetic Reference Field. Disponível em: <http://www.ngdc.noaa.

gov/IAGA/vmod/igrf.html>. [28/01/2010]. Acesso em: Ago. 2012.

NOAA. National Oceanic and Atmospheric Administration. Disponível em:

<http://www.ngdc.noaa.gov/geomag/WMM/DoDWMM.shtml>. [28/01/2010].

Acesso em: Ago. 2012.

NOAA. National Oceanic and Atmospheric Administration. Disponível em:

<http://www.ngdc.noaa.gov/geomagmodels/IGRFGrid.jsp>. [28/01/2010]. Acesso em: Ago. 2012.

NOAA. National Oceanic and Atmospheric Administration. Disponível em:

<http://www.ngdc.noaa.gov/geomagmodels/IGRFWMM.jsp?defaultModel=WMM>.

[28/01/2010]. Acesso em: Ago. 2012.

BGS. British Geological Survey. Disponível em: <http://www.geomag.bgs.ac.uk/data_service/

models_compass/mercator.html>.[28/01/2010]. Acesso em: Ago. 2012.

Page 12: O CAMpO MAGnétICO tERREstRE Geofísica - iag.usp.breder/EAD/apostilas/Geofisica_top06_provisorio.pdf · Oy aponta na direção do leste-oeste geográfico e o ... • a diferença

143Licenciatura em Ciências · USP/Univesp · Módulo 2

Geofísica

Glossário0,000000001: Em referências antigas, é comum também encontrar uma unidade de medida chamada γ,

que é equivalente ao nT.

Dados geomagnéticos: No Brasil, temos dois observatórios geomagnéticos permanentes: o de Vassouras, no Rio de Janeiro, e o de Tatuoca, em Belém do Pará.

Material magnetizado concentrado: Normalmente, os minerais magnéticos encontram-se disseminados nas rochas, e é extremamente raro encontrá-los na forma concentrada.

Norte magnético: Assim como o norte geográfico não coincide com o norte magnético na maior parte dos pontos da superfície terrestre, também o equador magnético não coincide com o equador geográfico, nem o hemisfério norte geográfico coincide com o hemisfério norte magnético (o mesmo valendo para o sul).