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O casal guardião das sementes Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 8 • nº1793 Abril/2015 Varzelândia Meu pai sempre disse que a semente é o mais importante para quem trabalha com a terra”, descreve Seu João José Santa Rosa, 65 anos, agricultor e guardião de sementes da comunidade de Taboal, no município de Varzelândia, no norte de Minas Gerais. Ele conta que há 30 anos se identifica com a função de guardião de sementes e aprendeu com o pai, Seu Aristides, o dom de cuidar, cultivar, comercializar e trocar sementes.Seu João é casado há 44 anos com Dona Maria de Lourdes Lopes Santa Rosa, 61 anos, agricultora e a grande parceira de Seu João na função de guardião de sementes. Dona Maria aprendeu com os pais e o sogro a plantar e cuidar da terra. O casal que se denomina os guardiões de sementes de Taboal, tiveram 12 filhos: Edna,Rosileide, Valdizar, Juliana, Manuel, Luciano, Lucílio, Jailson, Soliana, Jucélia, Hernandes e Deuza. Mesmo a maioria dos filhos morando em outras cidades e Estados, Seu João conta que eles estão sempre presentes no trabalho com as sementes. “Nas férias os filhos sempre vêm e quando temos que debulhar o milho sentamos todos ao redor da cesta e trabalhamos juntos”, conta Seu João. Dona Maria e Seu João contam que os filhos ficam bravos se eles falam que vão embora da terrinha ou que querem mudar o trabalho. “Eles falam: Ave Maria pai, você fica aí que nós vamos ajudar o senhor, nós vamos praí”, lembra com orgulho o agricultor. Já a Dona Maria de Lourdes diz que os filhos têm muito orgulho do pai. “O mais velho que esteve aqui estes dias, olhou o trabalho do João, a apostila que ele tem aqui em casa e disse que tinha inveja do pai, que mesmo sem leitura ele está na posição que está, é reconhecido”, afirma emocionada Dona Maria.

O casal guardião das sementes

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"Meu pai sempre disse que a semente é o mais importante para quem trabalha com a terra", descreve Seu João José Santa Rosa, 65 anos, agricultor e guardião de sementes da comunidade de Taboal, no município de Varzelândia, no norte de Minas Gerais. Ele conta que há 30 anos se identifica com a função de guardião de sementes e aprendeu com o pai, Seu Aristides, o dom de cuidar, cultivar, comercializar e trocar sementes.

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O casal guardião das sementes

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 8 • nº1793

Abril/2015

Varzelândia

“Meu pai sempre disse que a semente é o mais importante para quem trabalha com a terra”, descreve Seu João José Santa Rosa, 65 anos, agricultor e guardião de sementes da comunidade de Taboal, no município de Varzelândia, no norte de Minas Gerais. Ele conta que há 30 anos se identifica com a função de guardião de sementes e aprendeu com o pai, Seu Aristides, o dom de cuidar, cultivar, comercializar e trocar sementes.Seu João é casado há 44 anos com Dona Maria de Lourdes Lopes Santa Rosa, 61 anos, agricultora e a grande parceira de Seu João na função de guardião de sementes.

Dona Maria aprendeu com os pais e o sogro a plantar e cuidar da terra. O casal que se denomina os guardiões de sementes de Taboal, tiveram 12 filhos: Edna,Rosileide, Valdizar, Juliana, Manuel, Luciano, Lucílio, Jailson, Soliana, Jucélia, Hernandes e Deuza. Mesmo a maioria dos filhos morando em outras cidades e Estados, Seu João conta que eles estão sempre presentes no trabalho com as sementes. “Nas férias os filhos sempre vêm e quando temos que debulhar o milho sentamos todos ao redor da cesta e trabalhamos juntos”, conta Seu João.

Dona Maria e Seu João contam que os filhos ficam bravos se eles falam que vão embora da terrinha ou que querem mudar o trabalho. “Eles falam: Ave Maria pai, você fica aí que nós vamos ajudar o senhor, nós vamos praí”, lembra com orgulho o agricultor.

Já a Dona Maria de Lourdes diz que os filhos têm muito orgulho do pai. “O mais velho que esteve aqui estes dias, olhou o trabalho do João, a apostila que ele tem aqui em casa e disse que tinha inveja do pai, que mesmo sem leitura ele está na posição que está, é reconhecido”, afirma emocionada Dona Maria.

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Minas Gerais

Realização Apoio

O agricultor conta que no início, ele e a esposa acharam complicado trabalhar com a semente crioula. “Achamos complicado no início, porque não pode misturar, é necessário isolar, plantar separada para não se misturar com as outras sementes”. Mas Seu João e Dona Maria aceitaram o desafio e plantaram. Criaram seu campo de semente crioula,um pouco longe da casa, confessa, mas onde tinham a convicção que daria certo “Hoje só plantamos semente crioula. Ficamos felizes em chegar na roça e ver a semente de qualidade, crioula, pura e sem veneno. O pessoal chega aqui em casa e pergunta que milho é esse, com grãos grandes?”, relembra, com brilho nos olhos, o casal de agricultores.

Seu João explica que não é fácil o trabalho no campo de sementes. Ele disse que a água é escassa e que depende da água que cai do céu para molhar seu campo e que antes não tinha onde guardar as sementes. “Se chovesse mais plantaríamos muito mais, podíamos ter mais variedade. Sem contar que faz uns seis anos que conseguimos a casa de semente, um lugar próprio para guardar as sementes crioulas”.

O casal conta que antes da Casa de Semente eles guardavam as sementes na dispensa da casa, junto com outras coisas. Mas que com a construção do banco de semente em 2009, várias coisas mudaram. “Agora temos um lugar para guardar , assim elas não mofam. Guardamos em garrafas pet que as protegem e podemos plantar, comercializar e trocar com a certeza de que nossa semente tem qualidade”, conta Dona Maria.

Seu João e Dona Maria de Lourdes lembram que a ajuda do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Varzelândia tambémfoi fundamental para o sucesso do campo de sementes. “Eles enviaram técnicos para ajudar a gente, tem coisas que não sabíamos e aprendemos com eles”.

Com orgulho, o casal conta que hoje eles têm plantado feijão de arranca, mandioca, feijão, cana, fava, milho, feijão andú. Além disso, criam gado, galinha e porcos.

Para Dona Maria e Seu João, a terra,produz o que eles precisam, tanto para alimentar o corpo como a alma: “A roça é a satisfação do agricultor e da agricultora, tudo que temos é da roça. Na cidade grande a gente vive do emprego, mas tudo que precisamos vem é da roça”, confessa Seu João.