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1 n oito - agosto 2014 ano 3 - n o. oito - ago/set 2014 OS POLÊMICOS E LUCRATIVOS JOGOS UNIVERSITÁRIOS na pg.6

O Casarão nº oito

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Parece roteiro de cinema. A história da construção do novo prédio do IACS já atravessa quatro décadas cercada de solavancos e reviravoltas, e cenas insólitas, como o desabamento da sede da construtora responsável pela obra, que levou junto as plantas da arquitetura. Mas ao melhor estilo cinemão, o roteiro parece aproximar-se de um final feliz: retomadas ano passado, as obras devem ser entregues em 2015 (esperamos!). Nesta edição contamos cada cena desta tragicomédia, com pequenos toques de enredo policial, e mostramos os próximos passos que nos levarão ao prédio hollywoodiano às margens da Baía.

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1 no. oito - agosto 2014

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Os pOlêmicOs e lucrativOs jOgOs universitáriOsna pg.6

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são mais dispensável do mundo. Achava que o jornalismo não dizia a verdade sobre a favela. E quando via as notícias relaciona-das à Maré sempre me questionava por que elas não correspondiam ao que eu via na rua. Então, a orientadora pediu para eu es-tudar a profissão e fiquei encantada com o mundo de possibilidades que o jornalismo oferecia, além do olhar crítico que o pro-fissional poderia imprimir às reportagens. Descobri que poderia retratar a verdade.Em que momento começou a trabalhar no jornal O Cidadão? O que te motivou a participar desse tipo de comunicação vol-tada para questões sociais?O jornal promoveu um debate político entre os candidatos da Maré que pleiteavam um cargo de vereador na Câmara, em 2000. Ao final, me aproximei do editor e disse que queria fazer parte da equipe, porque achava importante aquele tipo de intervenção. En-trei no como fotógrafa, porque fazia um cur-so no próprio Ceasm, mas queria mesmo es-crever. Quando acompanhava os repórteres em entrevistas, acabava me intrometendo. Depois fui para a reportagem e quando en-trei para a universidade tornei-me estagiá ria. Ao me formar, assumi o cargo de editora, a primeira moradora da Maré assinando como jornalista responsável. Foi uma felicidade imensa, e uma responsabilidade inigualá-vel. Trabalhar no Cidadão foi um verdadeiro laboratório pessoal e profissional. Apren-di errando e acertando e fortaleci minha identidade mareense. Foi lá que comecei a acessar a própria Maré, desconhecida por mim enquanto moradora que não circulava pelos espaços. Comecei a notar as gradações

de pobreza que existem em uma mesma favela, e fazia as inevitáveis comparações com a minha própria realidade. Nunca faltou comida na minha casa, por exemplo, mas co-nheci várias famílias que passam fome de verdade, com todo mun-do desempregado, sem ter sequer documentos de nascimento. Tem gente na Maré que não existe para o Estado. Percebi o quanto o aces-so aos direitos é limitado e quanto mais se acessa, mas certeza se tem de que os “favelados” não têm seus direitos respeitadosDe que modo você enxerga o cená-rio da comunicação comunitária/alternativa atualmente?Vejo com muito otimismo. Antes, essas iniciativas surgiam e desapa-

Desde criança, Renata tinha um histórico de frustração com o jornalismo. Nada que via na TV parecia com a sua realidade. Esta se-ria a primeira profissão dispensada por ela. Mas, aos 17 anos, o destino a surpreendera. Nascida em uma das famílias fundadoras do Parque da Maré, Renata Souza descobririu no jornalismo a possibilidade de dar voz àqueles que considera excluídos da opinião pública. “A informação liberta. Através dela as pessoas passam a ver sua realidade de maneira mais crítica. A mudança de postura diante dos pro-blemas pode levar à ação, à reivindicação de seus direitos”, afirma. Aos 31 anos, a jornalista orgulha-se da sua trajetória de militância na comunidade. Desacreditada de sua capacida-de de cursar o Ensino Superior, viu muitas por-tas serem abertas quando começou a fazer curso de teatro no Ceasm (Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré). Prestou vestibular e por três vezes pensou em desistir. O apoio familiar deu forças á “mareense” para cur-sarjornalismo e publicidade na PUC-Rio com 100% de bolsa. Hoje, é doutoranda da ECO-UFRJ e trabalha na Alerj (Assembleia Legisla-tiva do Estado do Rio de Janeiro). Foi através do jornal O Cidadão, do bairro Maré, que Renata conheceu sua realidade. “Foi ali que comecei a acessar a própria comunidade. No-tei as gradações de pobreza que existem em uma mesma favela”, conta. Apesar do leque de possibilidades que se abriu, Renata optou por permanecer na comunidade.Como foi a sua trajetória até o Ensino Su-perior? Você sempre morou na Maré?A minha história até chegar à graduação é engraçada. Fiz um teste vocacional aos 17 anos e indiquei o jornalismo como a profis-

Entre, circule pelos espaços, abra portas e janelas

Parece roteiro de cinema. A história da constru-ção do novo prédio do IACS já atravessa quatro décadas cercada de solavancos e reviravoltas, e cenas insólitas, como o desabamento da sede da construtora responsável pela obra, que levou junto as plantas de arquitetura. Mas ao melhor estilo cinemão, o roteiro parece aproximar-se de um final feliz: retomadas ano passado, as obras devem ser entregues em 2015 (esperamos!).

Nesta edição, contamos cada cena desta tragico-média, com pequenos toques de enredo policial, e mostramos os próximos passos que nos levarão ao prédio hollywoodiano às margens da baía.

Ainda pelo campus, encontramos a força das atléticas, associações esportivas que trouxe-ram novo gás para os atletas - profissionais ou de ocasião – e criaram boas oportunidades de negócios, movimentando a economia de pe-quenas cidades e criando um mercado para a organização dos jogos universitários.

Das quadras para as salas de aula, conversamos com profissionais de Educação para entender como a sexualidade, a afetividade e as questões de gênero são tratadas nas escolas do Ensino Fundamental e Médio. Ou como deveriam ser...

Também mostramos como, do outro lado da ponte, um grupo de moradores luta pelo di-reito de permanecer no seu espaço. O Vidigal, tradicional morro da Zona Sul, tornou-se alvo da especulação imobiliária e da ação do poder público, pressionado pela valorização pós-UPP.

Exclusivo para O Casarão, revelamos o carisma de um dos mais talentosos escritores da Amé-rica Latina, Eduardo Galeano, que nos recebeu para um gole de cappuccino com política, histó-ria e futebol num dos mais charmosos cafés de Montevidéu. Outro bom bate-papo aconteceu bem mais perto, na Maré, bairro carioca estig-matizado por sua associação com o tráfico de drogas e a violência, mas que revela sua força e potência criativa na voz de uma de suas mo-radoras, Renata Souza, jornalista e doutoranda em Comunicação e Cultura pela UFRJ.

A casa é nossa.

reciam na mesma velocidade por conta da falta de recursos financeiros. Com os avan-ços das novas tecnologias de informação, os meios de produção são mais acessíveis. Mesmo sabendo que o jornal impresso tem mais apelo nas favelas, por ser algo palpável, ou pelo fato do acesso à internet ainda não ser universalizado, a possiblidade da criação de um blog ou site evita a extinção dessas iniciativas. O próprio O Cidadão ficou um longo tempo sem sair em sua versão impres-sa e o blog acabou “segurando a onda”. Além disso, acho que as iniciativas alternativas ga-nham força diante do crescente descrédito que os meios de comunicação tradicionais e comerciais experimentam nos últimos anos. A internet, em especial as redes sociais, colo-cou em xeque a abordagem midiática sobre a cobertura dos fatos. Vide as manifestações de junho do ano passado, quando grupos independentes passaram a cobrir as mani-festações sem edição de seu material. Quem estava nas ruas, e não foram poucas as pes-soas, passou a comparar o que se via na te-levisão com o que efetivamente acontecia nos protestos. Quando os grandes veículos começaram a criminalizar os movimentos, as pessoas questionaram a suposta “neutra-lidade” que esses veículos juram ter. Acredita que esse tipo de comunicação é capaz de produzir alguma mudança na rea-lidade das pessoas dentro da comunidade? Com certeza, porque acredito que a informa-ção liberta. Através dela as pessoas passam a ver sua realidade de maneira mais crítica, a desnaturalizar aquilo que viam como co-mum na sua rotina. A mudança de postura diante dos problemas pode levar à ação, à reivindicação de seus direitos. Por isso, as pautas de qualquer jornal comunitário de-vem levar em consideração a realidade local. Quanto mais próximo estiver dos problemas que afligem a comunidade, mais identifica-ção as pessoas terão com ele. Você continua morando na Maré. Por que a escolha de permanecer na comunidade? Hoje não tenho a menor vontade de sair da Maré. Pode parecer contraditório, mas o fato de ter acessado outro tipo de infor-mação, diferente daquela disponível para meus pais, irmãos e vizinhos, me faz ter mais vontade de ficar na Maré e refletir so-bre a realidade da favela vivendo-a cotidia-namente. Sinto que a ausência do Estado fortalece o diálogo que tenho com aqueles que me cercam. No final das contas, a mi-nha certeza é que na Maré está a minha his-tória de militância. Aqui é o meu lugar!

“A informação liberta”Moradora da Maré e jornalista, Renata Souza fala sobre a realidade dos jovens da favela e o poder transformador da informação

Por Bianca Alcaraz e Paula Rodrigues

“A minha certeza é que na Maré

está a minha história de militância.

Aqui é o meu lugar.”Publicação Laboratorial do Curso de Comunicação Social

Orientação:Carla Baiense (18788 MTb) e Ildo Nascimento

Reportagem: André Borba, Arthur Figueire-do, Bernardo Oliveira, Bianca Alcaraz, Camilla Pacheco, Douglas Dayube, Fabio Peixoto, Fe-lipe Magalhães, Francielly Baliana, Gabriela Novaes, Gustavo Xavier, João Pedro Soares, Leonardo Pimentel, Lucas Bastos, Luís Pedro Rodrigues, Marcos Kalil, Paula Rodrigues, Rafael Bolsoni e Thiago Medeiros Fotos: Fa-bio Peixoto, Jéssica Alves e Thiago Machado Capa: Luís Pedro Rodrigues

[email protected]/jornalocasarao

@jornalocasaraoissuu.com/ocasarao

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Lições de Vênuscolegas de profissão, dos alunos, da mídia e da Secretaria Estadual de Educação, que passou a incorporar o assunto no conteúdo programático da rede pública de ensino. A partir disso, ele ganhou autoconfiança para começar a pesquisar sobre homoafetivida-de, que se tornava cada vez mais comum no cotidiano da escola.

Com uma pesquisa de opinião sobre sexo, diversidade sexual e preconceito, re-alizada com 226 alunos, divididos em seis turmas, o professor deparou-se com resulta-dos bastante positivos no início do período letivo deste ano. O interesse dos alunos so-bre o assunto surpreendeu o professor. “Eles querem participar, eles perguntam de forma descarada o que querem saber”, conta João, que já levou conceitos freudianos sobre a homossexualidade para debater.

Por enquanto, o projeto educacional ainda não aborda a diversidade de gêneros. João entende que gênero e sexualidade es-tão ligados dentro de uma mesma temáti-ca, mas pretende esperar o amadurecimen-to do debate atual para apresentar novas questões. Seu principal objetivo é mostrar que a homoafetividade é natural. “Eles têm que sentir orgulho. Essa briga eu resolvi to-mar porque nesse momento esse assunto está fervilhando na sociedade, só que as escolas não assumem isso”, afirma.

Em relação às famílias, João comenta que também pretende levantar dados sobre a opinião e o conhecimento que têm sobre esses assuntos. A intenção é conseguir criar um diálogo entre os alunos gays e trans* e os pais, assim como conseguiram incentivar entre as alunas grávidas e suas famílias. “Eles têm que se agregar para discutir esse assun-to. Hoje em dia os pais se omitem”, diz.

Em Niterói, a professora Luciana Vieira, que leciona Biologia na rede estadual de ensino, também se inquietou com o grande número de adolescentes grávidas no Colégio Estadual Manuel de Abreu. E, aliada a essa realidade, havia uma carência, não apenas de informações sobre métodos contracepti-vos, mas sobre afetividade. “Falta diálogo em casa e na escola. E, claro, muito preconceito, medo e insegurança”, afirma a professora.

Assim, em 2009, Luciana criou o proje-to Sexualidade de A a Z, que contemplava diversidade sexual, identidade de gênero e discussões sobre DSTs e gravidez na adoles-cência. Esses temas eram discutidos por meio de oficinas, conversas informais e exibição de curtas-metragens. “São assuntos que devem

Você sabia que nascer com um pênis não significa ser homem? Que identidade de gê-nero independe do corpo e da sexua lidade? Para Pedro Bessa, aluno de Relações Interna-cionais da UFRJ, essas questões já estão es-clarecidas. Aos 21 anos, ele afirma que para fins documentais seu gênero é masculino, mas na prática o identifica como fluido: livre dos termos. E disso, Pedro entende bem.

Apesar de só se relacionar com pessoas do mesmo sexo, ele evita o termo gay, “por motivos teóricos que me levaram a conce-ber que essa palavra tem um poder semân-tico opressivo”, afirma. Em uma explicação breve, o estudante apresenta o antônimo straight (direito/correto, em português) e mostra como gay soa incorreto nesta con-traposição. “Straight é opressivo até falan-do de cabelo”, brinca.

Pedro é um estudioso amador do tema, mas conta que pretende se especializar. Tudo que sabe sobre gênero e identidade sexual aprendeu por conta própria. Em mui-tos anos como aluno do Colégio Militar do Rio de Janeiro, ouviu sobre o corpo e a sexu-alidade, mas nunca sobre a sua diversidade e sempre de forma heteronormativa - por ser uma instituição militar, ele acredita. “Lembro que um dos principais dirigentes afirmou: ‘se quiser ser veado, espera sair do colégio!’”, relembra. E ainda que não tivesse seguido conscientemente essa recomendação, de fato, Pedro só assumiu sua identidade de-pois que se formou no Ensino Médio.

A visão homofóbica da direção do colé-gio contribuía para criar um ambiente hos-til tanto para os alunos gays como para os que eram vistos assim. “Nenhum relato de bullying homofóbico surtia efeito, nada era feito, nenhuma retratação”, comenta Pedro. A sensação era de indiferença por parte de quem deveria proteger.

Preocupado com os estudantes que não se encaixavam nos padrões tradicionais de gênero e sexualidade, o professor João de Melo Alves se empenhou para incluir esta pauta no debate entre os alunos. Com mais de 30 anos de sala de aula, há 10 leciona Bio-logia no Colégio Estadual Julia Kubitschek, no Centro do Rio de Janeiro. Foi lá que, em 2005, João implementou um projeto sobre sexo e reprodução. O intuito inicial era redu-zir a evasão escolar de estudantes grávidas.

Nessa primeira etapa, o sucesso foi ab-soluto: nenhuma das jovens que tinham ou estavam para ter filhos deixou a escola. Assim, João ganhou reconhecimento dos

ser debatidos. A Escola é o ‘lugar de a gente ser feliz’, como dizia Paulo Freire. Os alunos discriminados sofrem e não têm um aprendi-zado significativo. O abalo emocional tem reflexos na cognição”, declara Luciana, que buscou subsídios nos cursos de especializa-ção do Instituto de Medicina Social UERJ e da Faculdade de Serviço Social da UFRJ.

Durante o percurso, muitas dificulda-des se apresentaram, como a falta de es-paço e a carga horária inflexível da escola, que fizeram com que os alunos participas-sem no contra-turno, o que comprometia a frequência. Muitos docentes da própria escola não aderiram ao projeto, alguns por lidarem com o tema por um viés religioso, dificultando o trabalho interdisciplinar. Com a aprovação de Luciana em um novo concurso, obrigando-a a conciliar o tempo entre duas escolas, o projeto acabando sus-penso em 2012.

Amor e sexo Iniciativas de professores como Lu ciana

e João são exceções em uma sociedade que ainda vê a sexualidade e as suas diversas ma-nifestações como tabus. Para a psicanalista e professora da Faculdade de Educação da UFF, Marília Etienne Arreguy, a dificuldade que o adulto enfrenta ao falar sobre esses temas com as crianças se origina na forma como ele lida com as suas próprias questões sexuais. Para Marília, sexo deve ser discutido nas escolas não como atividade reprodutora, mas também sob o viés do afeto, do desejo.

“O educador geralmente mostra como elefantes, tigres, gatos e seres humanos fazem a reprodução sexuada. Assim, ele biologiza e dessexualiza o sexual. Fica mais fácil falar dessas questões sob o ponto de vista biológico”, aponta a professora. Ou-tros aspectos ligados à sexualidade, como o amor e o prazer, complexificam a temática, mas não devem ser ignorados. “Como falar sobre o que a gente sente? Parece que isso ainda não tem lugar nas escolas”, comenta.

Em relação às políticas educacionais, a professora Marília acredita que elas estão car regadas de arbitrariedade. “São sempre po líticas normativas que determinam em qual série se deve falar sobre sexo”. Para ela, deveria haver uma maleabilidade para que o mestre tratasse do assunto quando vies-se à tona em cada turma. Mas nem sempre surge a oportunidade para os alunos se ex-pressarem. “Na maioria das escolas o profes-sor tem que seguir um currículo rígido. Essa atitude cala as perguntas vivas, a partir das quais se constrói o conhecimento”, destaca.

Já a abordagem, defende, deveria ser de acordo com a idade dos alunos. “Não dá para falar sobre os picos de estrogênio e progesterona no ciclo menstrual para uma turma de crianças de três anos”, exemplifi-ca a professora, que condena as clássicas histórias da cegonha e da sementinha. “As crianças normalmente se satisfazem com respostas simples. Mas a mãe inventa uma história, o pai outra e a professora uma ter-ceira. Ela começa, então, a desconfiar do adulto. A criança vai buscar outras fontes, como amigos, revistas e internet, e vai ali-mentar o tabu em relação à sexualidade”, esclarece Marília.

A grande quantidade de fatores capa-zes de interferir sobre a formação sexual de cada indivíduo é uma das razões para que a temática seja alvo constante de de-bate. Para a Doutora Ana Márcia Bastos, ginecologista do serviço médico da UFF, “a sexualidade não é dada apenas pela natu-reza biológica do ser humano, mas é cons-truída social, cultural e psico-logicamente. Cada pessoa, desde a infância e ao longo dos anos, vai vivenciar fatos e ter experiên-cias individualmente, e como num aprendizado, vai construindo sua própria sexualidade”, explica.

Por André Borba, Bianca Alcaraz e Camilla Pacheco

Amor, sexo e gênero discutidos em sala de aula

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Parte I - Era um novo Casa-rão (nada) engraçado. Não ti nha porta, não tinha nada. Ninguém podia estudar ne le, não: havia muito capim no chão... E para não terminar a brincadeira de criança sem rima: o prazo estava na pror-rogação. Essa cantiga bem poderia ser a trilha sonora de uma novela de longos e monó-

tonos capítulos, iniciada em 2007, quando a Universidade Federal Fluminense (UFF) deu início à construção da nova sede do Instituto de Arte e Comunicação Social (Iacs). A pedra fundamental foi lançada em 2008, e a conclu-são da obra - orçada em R$ 7 milhões - estava prevista para 2012.

O trabalho, entretanto, só começou em maio de 2010. Segundo Roberto de Souza Salles, então reitor da UFF, o atraso era efeito das leis “que burocratizavam os processos de licitação”. Determinado a cumprir os prazos, o professor garantia lutar em Brasília para “receber um tratamento especial”, com o ob-jetivo de acelerar os processos. A informação consta do blog “Guia do Calouro”, produzido pela disciplina Redação de Hipertexto no se-gundo semestre de 2009.

Quando os recursos chegaram, a surpre-sa: a UFF recebeu R$ 130 milhões do Reuni, distribuídos pelas unidades que apresenta-

ram seus projetos de ampliação, entre elas o IACS, contemplado com 17 milhões. O pro-blema é que, aquela altura, o valor era insu-ficiente para viabilizar a obra completa. Dos 15 prédios que constavam no projeto inicial, apenas nove seriam construídos. Ficariam de fora justamente os seis prédios que abriga-riam a maior parte das 27 salas de aula pre-vistas. “O colegiado de unidade do IACS teve que fazer um ajuste, transformando alguns espaços de laboratórios em salas de aula. Dessa forma, conseguimos aumentar a ofer-ta de salas de aula de duas para 11”, lembra o diretor da unidade, Leonardo Guelman.

O Diretório Central dos Estudantes (DCE-UFF) e os Diretórios Acadêmicos do IACS também se mobilizaram para garantir a in-tegridade do projeto original. Com medo de que a Universidade licitasse apenas os nove blocos para a construção do prédio, os DAs lançaram, em 2012, o movimento “Quero o IACS inteiro e não pela metade”. Membro da diretoria do DCE desde 2013, à época aluno do curso de Cinema, Adil Lepri explica como isso aconteceu: “Levamos mais de 100 alunos do Instituto para a reunião do colegiado, e pressionamos pela licitação completa dos 15 blocos. Elegemos uma comissão para acompanhamento da obra, que se reunia fre-quentemente com o diretor Guelman, além do reitor da universidade”. Segundo Lepri, a pressão do “alunado” foi decisiva para o au-mento do número de blocos na nova licita-ção, que passou de nove para 11. Com a ex-pansão do número de prédios, a previsão de salas de aula saltou de 11 para 20.

A construtora Prescon Projetos Estruturais e Construções venceu a licitação aberta em 22 de dezembro de 2009 com um orçamento de 17 milhões de reais. Dois anos depois, em janeiro de 2012, a UFF cancelou o contrato, alegando que a construtora havia paralisado as obras. A empresa não recorreu devido ao desabamento do prédio onde ficava sua sede, no Centro do Rio de Janeiro. No acidente, de-sapareceu toda a documentação que com-provava o andamento da construção.

Àquela altura, a Prescon havia realizado cerca de 50% da obra, segundo Guelman. “Todos os blocos estavam em andamento. Alguns até avançados, com toda a parte de estrutura e alvenaria pronta. A empresa ou se tornou inadimplente ou houve algum pro-blema jurídico que a impediu de receber. A redução de pessoal no canteiro de obras le-vou a Universidade a cancelar a licitação.”

Em entrevista a O Fluminense, Sergio Giorgio Rita Fracassi, diretor técnico da Pres-con, justificou a paralisação das obras pelo atraso no pagamento dos serviços. Ele afir-mava que a Universidade devia ainda cerca de R$ 2 milhões pelo que foi construído. Na época, a UFF não comentou o assunto. A arquiteta Denise Nogueira, da SAEN, supe-rintendência que fiscaliza as obras na Univer-sidade, desmente a informação: “A Prescon parou porque ela não deu conta de cumprir o prazo; e a Universidade cancelou o con-trato, porque a Prescon não estava fazendo o serviço. Tudo o que ela construiu foi pago. Como algumas coisas estragaram, o serviço não foi concluído”. A equipe de reportagem de O Casarão procurou a construtora, mas não obteve respostas.

A União processou a Prescon. Em decisão judicial do dia 3 de outubro de 2013, o juiz Wilney Magno de Azevedo Silva determinou, pela terceira vez, que o reitor Roberto de Sou-za Salles informasse a existência ou não dívi-das por parte da Universidade. A intimação, publicada no Diário Oficial de 9 de outubro de 2012, consta da última etapa do processo a que O Casarão teve acesso.

Parte II - As obras foram pa-ralizadas por cerca de dois anos, congelando o sonho do novo Iacs. Enquanto a situação não se resolvia, a UFF atacou outro proble-ma: o projeto de sonoriza-ção, acústica e iluminação, que chegou a ser licitado, mas não foi entregue pela empresa vencedora. A nova licitação, aberta em 03 de dezembro de 2012 e con-

cluída em abril do ano seguinte foi vencida pela Pólus. A empresa consultou professores de cada departamento para especificar as necessidades dos laboratórios, como os de Rádio, Televisão e Fotografia.

Segundo Ana Baum, ex-chefe do depar-tamento de Comunicação Social, professores representantes de cada curso integraram a Comissão de Assessoramento à Direção do Instituto, “foram muitas reuniões para defi-nir o que a gente queria nesses laboratórios”. Esta comissão se reuniu com a Polus para acertar os detalhes do projeto adicional, além de funcionar como “fiscal” do andamento das obras.As reinvidicações foram incorporadas ao novo orçamento, que também previa a construção de dois novos blocos de salas de aula e a recuperação estrutural dos já cons-truídos, devido ao longo tempo que a obra ficou parada.

A Galcon Construções e Participações ven ceu a licitação aberta em 03 de dezembro

“Eterno é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha

in ten sidade que se petrifica e

nenhuma força o resgata.”

Carlos Drummond de Andrade

Ponham portas e janelas!

“Apostar no outro, perdoar

continuamente, dar sempre uma nova chance é

fundamental para superar frustrações

e criar novos vínculos.”

Augusto Cury

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Parte IV - Ten tamos entre-vistar, sem sucesso, os pro-fessores Roberto Salles, atu-al reitor, e Sidney Mello, vice e futuro reitor. A nota oficial solicitada não foi emitida até o fechamento desta edição. FIM (esperamos).

de 2013 para conclusão de todo o projeto, no valor de R$ 20.387.376,69. Segundo relatório divulgado pela Saen, em março deste ano, a etapa atual é de limpeza do terreno; elabo-ração de projeto executivo para estrutura; e testes de carga de estrutura já executada pela empresa anterior. O prazo para a conclusão dos 11 prédios é o dia 3 de fevereiro de 2015.

O diretor do IACS é otimista: “a gente está com uma expectativa grande. Estamos trabalhando com a meta de entregar no pri-meiro semestre de 2015”. Luciana Azevedo, da Contécnica - Consultoria Técnica, que por exigência legal fiscaliza a obra, concorda: “a obra entrou em ritmo normal e já bate com o cronograma. No início, enfrentamos dificul-dades para compatibilizar os projetos por-que algumas coisas não estavam totalmente redondas. Agora, os novos blocos C6 e D4 es-tão indo para o segundo pavimento”. Apesar disso, a fiscal admite ocorrer algum atraso na entrega: “Eu acho que a empresa não conse-gue entregar a obra no prazo de 12 meses”.

Solicitamos informações à construto-ra Gal con, sobre cinco itens: a situação das obras quando assumiu; o que pôde ser re-aproveitado; se a UFF disponibilizou tudo corretamente e o que falta; o cumprimento do prazo; e se a Universidade tem seguido o contrato da maneira adequada. O diretor da empresa, Carlos Franco Neto, afirmou ter imenso prazer em atender ao pedido de entrevista mas que “que a maioria dos que-sitos da reportagem diz respeito a assuntos anteriores à contratação, sobre os quais tem pouco a informar além do constante no auto do processo administrativo”.

Parte III - O projeto arquitetônico da nova sede do IACS difere dos ou-tros blocos em construção no campus do Gragoatá. São 11 pequenos blocos de dois andares, intercalados por vãos abertos dispostos na

forma de um tabuleiro de damas. Há espaços definidos para as coordenações dos nove cur-sos de graduação e cinco programas de pós-graduação; gabinetes para atendimento de professores; 20 salas de aula, auditório com sistema de projeção e laboratórios de foto-grafia, rádio, cinema e TV; xerox e cantina. No projeto, entretanto, não consta espaço para os DAs. Leonardo Guelman minimiza a ques-tão: ”O assunto será submetido ao Colegiado do Instituto que poderá determinar a trans-formação de uma sala de aula no espaço para reunião das representações discentes. Desde sempre, trabalhamos com o princípio da re-versibilidade de uso”, afirmou.

O novo projeto contagia os estudantes. Lepri, pós-graduando do Instituto, está an-sioso pelo novo espaço. “O pessoal do curso de Cinema é dos mais interessados. Na Casa Rosa da Lara Vilela os estúdios são bons mas tudo é meio adaptado. Se o prometido for cumprido, os alunos vão ter um ganho enor-me, principalmente nas atividades práticas”.

Densa narrativa que pode (finalmente) ter fim

O prédio da atual sede do Iacs foi construí-do no século XIX, para servir de residência do austríaco Othon Leonardos, considera-do um dos fundadores da Geologia no Bra-sil e vice-cônsul da Grécia.

De 1926 a 1968, o espaço foi ocupado pelo Gymnasio Bittencourt Silva, educandário de renome no Estado do Rio de Janeiro.A

União adquiriu o conjunto na década de 1960, para instalar o Instituto de Ciências Humanas e Filosofia (ICHF-UFF). Com a transferência do Instituto para o campus do Valonguinho, em 1978, o IACS passou a residir no casarão rosa da rua Lara Vilela.

Ao longo do tempo, o prédio sofreu diver-sas adaptações. No final da década de 1970

foram construídas uma lâmina lateral de salas de aula e, nos fundos, os laboratórios do Núcleo Áudio Visual. Nos anos 1990, o casarão passou por ampla reforma inter-na, mantendo preserva-da sua fachada original.

A partir de 2000, através do con-vênio MEC-BID, surgiu a possi-bilidade do IACS modernizar equipamentos e estrutura. Só que outras unidades acadêmi-cas da UFF também tinham essa pretensão. Então foi criada uma ordem de prioridades, segundo avaliações realizadas no âmbito do Conselho Universitário. De acordo com essa análise, em me-ados da década chegaria a vez de o IACS se reestruturar, como consta no Plano de Expansão e Reestruturação da UFF, de abril de 2008. É dessa época o primeiro projeto de deslocar a sede do IACS para o

campus do Gragoatá. Pelo programa MEC-BID, abriram-se as licitações para a cons-trução, e foram definidas as empresas ven-cedoras. Mas todo esse processo teve que ser interrompido, com o rompimento do acordo entre o Ministério e o Banco Inte-ramericano de Desenvolvimento, quando o Governo brasileiro declarou a moratória. Desde então, esse processo de ocupação do Gragoatá vem se arrastando.

A situação ficou crítica com o surgimento de novos cursos de graduação e progra-mas de pós-graduação atingindo o ápice em 2007, com a adesão ao programa Reuni, quan-do a unidade ampliou a oferta de vagas.

O Casarão Rosa

“Um esclarecimento

é capaz de não esclarecer,

mas uma dúvida é capaz

de sustentar outras

dúvidas.” Murillo Leal

circa 1983

“Excesso de expectativa é o caminho mais curto

para a frustração.”

Martha Medeiros

Por Fábio Peixoto, Felipe Magalhães e Luís Pedro Rodrigues

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“ Nossa intenção é alcançar o lucro,

mas sem extrapolar. Poderiamos aumentar

o preço todo ano, mas não

fazemos isso.”

nomes de quatro sócio-fundadores – Juan, João e os irmãos Rafael e Daniel Cotta –, in-gressou nesse mercado, quase nada explo-rado, em agosto de 2010. A empresa venceu a primeira concorrência com outras empre-sas para a organização do OREM. Desde en-tão, organiza os principais eventos universi-tários, como o Jucs, Jogos Universitários de Comunicação Social, e o Intereng, de Enge-nharia, ambos realizados recentemente em Vassouras, além do Super 15, que reuniu 21 atléticas de diferentes instituições.

O negócio surgiu de maneira modesta. Após perceber que não seria efetivado no estágio, o então estudante de Direito da UERJ, Juan Guillermo Souza, hoje com 30 anos, convenceu os irmãos Cotta, à época, presidente e vice da Atlética de Direito a fun-dar uma empresa para organizar os jogos. Eles já haviam organizados os Jogos Jurídi-cos de 2003 a 2010, e resolveram transfor-mar a experiência em negócio. “A dificulda-de que tínhamos como atlética, enxergamos no mercado também. As empresas não se interessavam em organizar eventos univer-sitários, achavam uma bagunça. Então, nós pensamos: ‘Cara, vamos tentar fomentar esse mercado de alguma forma!’”, explicou Juan.

O objetivo inicial da JC2 era organizar os Jogos Jurídicos no Rio de Janeiro. No en-tanto, por serem da UERJ, foram rejeitados pela Liga Jurídica Estadual que, de meados de 2005 até hoje, organiza a parte esporti-va desse evento. A Liga é formada por seis faculdades fundadoras, dentre as quais o Di-reito da PUC-Rio, à época liderado por Mar-celo Queiroz, atual vereador mais jovem da cidade. Após esse primeiro fracasso, surgiu a oportunidade de conduzir a parte esportiva do OREM. “E já foi logo um batismo de fogo, porque em nenhum evento acontece tanta coisa como lá. Se você consegue levar um OREM até o final, leva todos os outros eventos até o fim”, disse, em tom orgulhoso, o “J principal”. O que mui-tos desconhecem, no entanto, é que a empresa não organiza as festas dos jo-gos universitários nos quais trabalha – exceto quando o evento é exclusivamen-te dela.

Nos últimos anos, um fenômeno vem se destacando no ambiente universitário cario-ca: o crescimento das associações atléticas, organizações estudantis voltadas para o esporte. Responsáveis pelos jogos universi-tários, usualmente realizados em cidades do interior do estado, chegam a reunir seis mil pessoas por evento. O público-alvo – estu-dantes de faculdades públicas e particulares do Rio – paga cerca de R$ 500 por um pa-cote de quatro dias, que inclui transporte, hospedagem, ingressos para os jogos e três festas. Caneca na mão, nome da faculdade estampado no peito, grito na garganta e muita disposição para aguentar a maratona esportes-álcool-festas. Esse é o clima das 96 horas de evento.

Victor Max Melo, 22 anos, é uma das fi-gurinhas carimbadas que podem ser vistas, em dias de competição, a todo gás pelas ruas das cidades que sediam esses eventos – Vassouras, Volta Redonda, Friburgo, Pe-trópolis. E não poderia ser diferente. Afinal, o estudante de Engenharia Agrícola e Am-biental é presidente e fundador da Atlética de Engenharia da Universidade Federal Fluminense (UFF), a Associação Atlética Pio Orlando, cujo nome é uma homenagem ao zelador que há 40 anos trabalha no Campus. Ao ingressar na Universidade, em 2010, Vic-tor, que desde a 5ª série competia pelas es-colas onde estudou, resolveu criar a atlética a fim de manter acesa a paixão pela disputa esportiva. O presidente também não abre mão do cargo mais alto da Associação, que ocupa desde a criação. “Eu tinha esse sonho e não via ninguém com potencial para fazer, só gente querendo ‘sugar’. Eu montei a recei-ta do bolo. Se outra pessoa entrar, vai acabar tudo. Quando eu vir a necessidade, a gente muda”, diz o estudante.

Um mês antes de fundar a atlética, Victor também ajudou a dar forma ao Intereng, os Jogos Universitários de Engenharia. “Eu cos-tumava fazer súmula de jogos de handebol e vôlei. Um dia, na UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), um moleque de lá me perguntou: ‘O que acha de criarmos os jogos para o nosso curso, como os Jogos Jurídicos (Jogos de Direito) e o OREM (Jogos de Medicina)?’ Topei na hora”.

Mas se já é difícil organizar uma simples pelada, que dirá um evento com mais de 15 modalidades. O problema foi resolvido de imediato: estavam presentes na ocasião al-guns sócios da JC2, empresa organizadora de competições esportivas, que compraram a ideia. Formada por ex-alunos e integrantes da Atlética de Direito da UERJ, a JC2, cuja razão social faz alusão aos nomes ou sobre-

A forma encontrada para ganhar dinhei-ro é a cobrança de valor fixo por pessoa para a organização da parte esportiva. “Óbvio que a gente ganha nosso dinheiro. Nossa in-tenção é alcançar o lucro, mas sem extrapo-lar. A gente poderia aumentar o preço todo ano, mas não faz isso”, afirmou Juan, que há três anos vive exclusivamente da empresa.

Mas, então, quem é o responsável pelas tão comentadas festas, que tanto preocu-pam os treinadores em véspera de jogos? Sócio de uma boate em Copacabana e um dos principais nomes da noite carioca, o empresário Bernardo Egas afirma que mais do que retorno financeiro, os jogos são im-portantes como portfólio. “A gente acaba virando uma referência no ramo, ganha uma credibilidade no mercado que ajuda em outras coisas. Para mim, é importante ter essa marca que são os Jogos Jurídicos. Abre outras portas”, disse.

Egas organizou, de 2009 a 2013, os Jo-gos Jurídicos quando perdeu sua primeira licitação para o evento que ocorreria em Pe-trópolis. “Quando você começa a fazer isso por muito tempo as pessoas crescem o olho. Duas empresas se juntaram e fizeram uma proposta muito fora do normal para disputar comigo. Acabaram ganhando”, contou. “No meio dos Jogos, a Liga me contatou deses-perada. Tive que ir à Petrópolis no domingo com dinheiro emprestado apra resolver pro-blema dos outros. Nesse ano, eu quis fazer o pessoal entender que os Jogos, com três dias de evento, em uma cidade diferente e problemas de liberação de órgãos públicos, demanda alguém com know-how”, defen-de ele, que não só venceu a licitação para 2014, como também fechou um contrato para os próximos três anos.

As empresas do segmento utilizam o co-nhecimento prático obtido na organização de eventos similares e o networking dentro da hierarquia das atléticas para ampliar os negócios. Essa mistura de informalidade e camaradagem não foge muito ao sistema de ingresso e organização das próprias atlé-ticas, nas quais os cargos são preenchidos por indicação e confiança. “As atléticas não são uma entidade de representação estu-dantil. O negócio sempre passa do membro mais velho para o membro mais novo, que foi colocado por ele lá dentro. Isso pode pa-recer errado, mas é o segredo do sucesso”, detalhou Bernardo. “A alternância de poder é totalmente contra o que a gente faz. Para manter a consistência do evento, as atléticas se voltaram para uma hierarquia temporal. O presidente respeita os ex-presidentes. Fica bem familiar o evento.”

Nesse arriscado misto de negócio e pai-xão, irmandade e parceria, integrantes de atléticas gastam tempo e dinheiro para de-fender até o último grito suas instituições no Rio, em Petrópolis, Volta Redonda, ou onde quer que seja. “É muito difícil você falar de negócio com algo que envolve sua paixão. É um evento onde eu estou e existem três mil amigos”, disse Egas. “Então, eu quero fa-zer o melhor evento possível. É muito difícil você separar seu hobby da sua paixão.” Do outro lado, os empresários responsáveis por dar forma aos quatro dias de jogos e loucu-ra o fazem porque tem nos seus negócios a extensão de uma vida universitária que até pouco tempo ainda levavam. O resultado dessa combinação parece bem claro: no fi-nal, todos saem ganhando.

Combinação que vence jogoRelação próxima entre organizadores e dirigentes de atléticas é o segredo do sucesso dos jogos universitários,

que reúnem até seis mil pessoas por evento, em quatro dias de esporte, festa e competiçãoPor Marcos Kalil, Paula Rodrigues e Rafael Bolsoni

A rivalidade dentro da quadra contagia

os torcedores

Thiago Machado

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cimento do custo de vida e a consequente expulsão da população original, numa es-pécie de remoção branca.

No Vidigal, o conceito se aplica com to-das as letras. No rastro da pacificação, che-garam os novos vizinhos, atraídos pela lo-calização privilegiada e pelos preços baixos de alugueis e imóveis. Além disso, produto-res de festas e empresários do ramo de ho-telaria passaram a subir o morro, oferecen-do valores entre R$ 100 mil e 200 mil pelas antigas casas. Dessa forma, adquiriram e reformaram diversos espaços e, com a vista privilegiada da orla do Leblon e Ipanema, passaram a produzir festas para um públi-co elitizado, construir hostels e albergues. Muitos moradores se viram tentados a ven-der seus imóveis, e acabaram aceitando ir morar bem longe da região, onde construí-ram uma identidade e criaram raízes.

O súbito interesse também acendeu o apetite do mercado imobiliário. Os alugueis dispararam, chegando aos R$ 900, expul-sando muitos dos antigos moradores. Mas além da remoção branca, há outra mais explícita, levada a cabo pelo poder público. De fato, a ausência do Estado por décadas na região do Vidigal fez com que o cresci-mento desordenado das casas colocasse alguns moradores em situação de risco. Com a chegada da UPP à favela, o Posto de Orientação Urbanística e Social (POUSO), órgão vinculado à Secretaria Municipal de Habitação e que atua em diversas comuni-dades com policiamento ostensivo, passou a tentar regular a expansão das casas, crian-do regras para construção. O vice-presiden-te da Associação de Moradores, William de Paula, conhecido como “Ninho”, afirmou que o POUSO é rígido no combate à ex-pansão de casas feita por moradores, mas, quando os empreendimentos que sobem são de empresários e construtoras, a rigidez

Na noite quente do outono carioca, eles se destacavam pelos olhos verdes, ca-belos loiros e diferentes sotaques, em um claro contraste com a gente bronzeada do Vidigal. Não estavam ali, como de costume, para uma das badaladas festas que levam a juventude da zona sul a cruzar as ruas estreitas até o alto do morro. A presença estrangeira no último encontro da série de debates “Fala, Vidigal”, realizada em junho, indicava em que direção sopram os ventos da mudança que chegaram àquele peda-ço do Rio, entre o Leblon e São Conrado, bairros com o metro quadrado mais caro do Brasil: eles reivindicavam seu espaço na condição de moradores.

O encontro reuniu 150 moradores - além do coletivo Territórios da Paz, trazendo à luz os problemas que a comunidade enfrenta, alguns de longa data, como as tentativas de remoção. Diante de representantes da Secretaria Municipal de Urbanismo, UPP, UPP Social, Guarda Municipal e Light, ques-tionaram os métodos e as consequências do processo de ordenamento que a gestão municipal adotou após a pacificação, e que está mudando a cara da localidade.

As transformações na paisagem estão por toda parte. Dos rostos estrangeiros à nova arquitetura dos hostels, tudo nos lem-bra que há uma mudança em curso. Para estudiosos dos problemas urbanos o fenô-meno tem nome, gentrificação, e acontece sempre que áreas habitadas por gente po-bre sofrem uma súbita valorização e pas-sam a ser alvo da especulação imobiliária: a chegada de novos moradores, o encare-

não se aplica da mesma forma. Seu Delei, com mais de 30 anos de Vidigal, endossou o coro. “Nós vemos empreendimentos sen-do construídos e levantados em espaço pú-blico e nada é feito, mas quando queremos expandir nossa casa já somos barrados”.

Porteiro em um prédio de Ipanema, Marcos Oliveira vive há cinco anos no Vi-digal onde comprou uma casa por R$ 30 mil. Meses depois da chegada da Unidade de Polícia Pacificadora à favela, foi surpre-endido ao saber que o terreno – e muitas outras casas localizadas próximas ao Ar-vrão, famoso ponto no alto da comunidade - estava “condenado” pela Prefeitura, que iria removê-lo do local. Segundo Marcos, a decisão de despejo se deu em função da forte pressão das mansões de São Conrado, localizadas logo abaixo, com o pretexto de que o esgoto da região desembocava perto das residências e uma chuva mais forte po-deria causar deslizamentos. Com dinheiro arrecadado entre os moradores, Marcelo da Silva, Presidente da Associação de Morado-res, contratou um engenheiro que atestou não haver risco, portanto, a remoção seria desnecessária. Após várias reuniões entre Prefeitura, Associação e moradores, a de-molição foi suspensa. “Seria péssimo, mas graças a Deus não aconteceu nada”, conta Marcos, aliviado. “A gente junta dinheiro com esforço, durante muito tempo, e aí a pressão dos bacanas lá de baixo vai fazer com que a gente vá morar longe de tudo?”.

Membro da Associação de Moradores, André, o “Deco”, entende que é necessário ordenar as casas da favela, mas que a pro-posta do Aluguel Social no valor de R$ 400, é insuficiente. “Como alguém vive nesse Rio de Janeiro com essa quantia? Se a pessoa tem a casa condenada e deveria receber outra próxima à comunidade. Mas dão esse valor, que não dá para fazer nada nem na

Baixada”, reclama.O tratamento do poder público às fes-

tas na comunidade é também polêmico. De acordo com os moradores, enquanto festas privadas carregam as classes média e alta da Zona Sul para a comunidade, com preços que chegam a R$ 80, e transcorrem sem qualquer intervenção até de manhã, os residentes sequer podem fazer qualquer confraternização que logo são interrompi-dos pelos policiais. “A gente não pode fazer nosso baile funk nem pagode, porque o som é alto e o horário é tarde. Mas e as fes-tas dos ricos em que rolam drogas, o som é ensurdecedor e vai até de manhã? Por que não barram?” Indagou Ivanete Aleluia, da Associação de Mulheres do Vidigal, mora-dora da comunidade há mais de 50 anos . “Quando tem as festas, as vias ficam obs-truídas de carros, fica impossível de passar e não há ordenação nenhuma, nós temos que passar no meio da rua”, disse.

Outra queixa recorrente foi a mão dupla da Avenida Niemeyer, uma das principais vias de ligação entre Barra e Zona Sul e que cruza a entrada da favela. Até as 10h30m, a avenida funciona em mão dupla para a Zona Sul, prejudicando o trânsito de mo-radores do Vidigal que trabalham na Zona Oeste. “A via dupla só beneficia os ricos da Barra que vêm para o Leblon e Ipanema.”, criticou a empregada doméstica Rosária, moradora há 20 anos da favela.

O último encontro da série de debates do “Fala, Vidigal” deixou um ponto positivo: o território-centro da discussão estava sen-do debatido mais a fundo, o que é saudá-vel para a democracia. No entanto, a frase final de Seu Delei resume o sentimento do morador do Vidigal, que há décadas convi-ve com o descaso estatal e anda cansado com tanto desmando. “É o quarto encontro e nós só recebemos clichês, nós queremos mudança, mesmo! Por que só tem uma cre-che funcionando? O dia em que essa favela descer, vocês vão ver a força que a gente tem!”, arrematou.

Invasão branca no VidigalPelas mãos do poder público ou da iniciativa privada, antigos moradores se veem obrigados a deixar para trás o cobiçado morro da zona sul carioca

Por Leonardo Pimentel e Thiago Medeiros

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mais me chamou a atenção foi uma frase em um muro, que pedia que o governo brasileiro ‘fosse logo entregue às mãos de Charles Elbrick’, embaixador estadunidense na época”, assinalou, rindo do quanto aquela frase era certeira ao resumir suas impressões sobre aquele período. “Aquilo materializava a insatisfação diante dos rumos que o país tomava”, concluiu.

Àquela altura, o Café ganhara mais convidados. Um ca-sal em uma mesa ao lado observava a naturalidade com que Galeano enunciava. Era terno ao fazê-lo. Não havia dúvidas de que sua sutileza com as palavras, expressa principalmente no “O Livro dos Abraços”, que contou-nos ser seu preferido, também se refletia na calma e tranquilidade de sua fala.

Ao se tratar de anos ditatoriais, contamos o quanto ve-ículos brasileiros têm trazido à tona as memórias da resis-tência com relação ao regime militar. Citamos o exemplo das histórias que retratam a realidade das universidades brasileiras na época e o quanto esses espaços, que sempre foram considerados centros de resistência e formação ide-ológica social, foram claramente reprimidos pelo governo. Sobre isso, relatou a maneira similar com que a ditadura uruguaia agiu naqueles anos.

“A ditadura uruguaia agiu de forma parecida. Este Café, por exemplo, foi reconstruído pelas mãos da memória. Por-que a memória tem mãos. Por três vezes, esse espaço foi destruído pela ditadura. Era considerado um local típico de encontro da classe intelectual daqui. Vinham com um cami-nhão durante a noite e desmanchavam o lugar. Arrancavam os pisos, retiravam mesas e cadeiras, roubavam os lustres. No entanto, os frequentadores sempre tinham a disposição de reconstruir o Café através de suas lembranças em fotos e fatos”, contou-nos com brilho nos olhos que ora miravam em nós, ora nas paredes com fotografias de velhos conhecidos.

Lembrou-se também de uma vez que esteve em Lenin-grado - sua filha o cor rigiu atentando ao atual nome, São Petesburgo -, quando as pontes da cidade, que haviam sido destruídas pela guerra, estavam sendo reconstruídas por moradores através de fotografias. A memória parecia dar-lhe as mãos, ali.

O suspiro forte das lembranças abriu espaço para que nos entregasse dois de seus livros, “Mulheres” e “Dias e noi-tes de amor e de guerra”, que trouxera especialmente para nos presentear. Assinou com doçura: “Abraços, Galeano”, desenhando um porquinho abaixo de seu nome. Também fez isso nos livros que trouxemos para receber sua assinatu-ra. Quando perguntado sobre a escolha desse animalzinho, não demorou a dizer que “alguns escritores escolhem dra-gões e serpentes como mascotes de suas obras e assinatu-ras. Eu escolhi o porquinho, pois ninguém o havia escolhido. Gosto do porquinho”. Sua graça fez com que todos à mesa sorrissem. Sua filha, que pouco falou, também esboçou sur-presa diante do humor do pai. A ele, entregamos presentes escolhidos com cautela. O livro “Deus foi almoçar”, do escri-tor paulistano Férrez, e o filme “O som ao redor”, do diretor recifense Kléber Mendonça Filho.

Não poderíamos deixar o autor de “Futebol ao Sol e à sombra” partir sem indagarsobre uma de suas maiores pai-xões. Qual seria, então, sua opinião sobre o futebol sul-ame-ricano? Galeano foi preciso no chute. “Ele continua sendo uma característica muito forte de nossa cultura, mas as atu-ais condições do esporte no mundo, baseadas na comercia-lização do futebol, fazem com que nossos jogadores sejam vendidos muito cedo, o que provoca pouca contribuição ao nosso modo de jogar”, respondeu.

Uma das ruas mais antigas de Montevidéu abriga o Café Brasileiro, um charmoso espaço da Ciudad Vieja com arqui-tetura tí pica do século XIX. Ali, onde o vento do lado de fora parecia fazer a curva para o continente, foi onde esperamos por Eduardo Galeano, um dos maiores escritores da Améri-ca Latina. Enquanto contávamos os minutos para sua che-gada, as fotografias nas paredes revelavam a proximidade entre o autor e o local. Não era, então, coincidência, estar-mos ali, lugar escolhido por ele, naquela manhã de sábado. Devia ser seu mais aconchegante quintal, ao qual nos aco-modamos logo, sem saber se pelo apreço visual da madeira fria, ou pelo cheiro de um café tão tipicamente próximo ao nosso. As duas coisas, talvez.

Acompanhado da filha Florência, Galeano entrou sor-rateiro, sem que escutássemos o barulho de seus passos. Tomou-nos as mãos e cumprimentou-nos carinhosamente. “Veja se isso aqui não parece um romance policial”, ates-tou. “Quando olhei vocês dois aqui sentados, disse logo à Florência: são eles!”, sorriu com um humor de quem se sente em casa. Não demoramos a deixar nossos olhares curiosos de tudo focarem em seus olhos azuis, capazes de iluminar todo o ambiente. Antes mesmo de o café chegar, contamos a ele o motivo que nos levara ali – uma tenra admiração junto à vontade de estabelecer conversa com vozes e olha-res. O que falaríamos a um jornalista que já havia concedido inúmeras entrevistas a tantos veículos? Que pudéssemos assentar em um sábado de sua vida e compreender o que as histórias e a despretensão de estar ali, junto a ele, nos trouxessem às mãos.

O primeiro gole de cappuccino veio quando comenta-mos sobre a propaganda política que vimos pelo caminho e sobre as eleições presidenciais que acontecerão esse ano no Uruguai. Galeano apontou para as ruas em torno do res-taurante. “Eu não entendo a política uruguaia”, afirmou. “A divisão partidária me confunde. Aqui, dentro de um partido que se assume como “esquerda”, existem frentes conserva-doras e outras de extrema esquerda que disputam entre si. Então, antes do embate eleitoral, existe uma discussão de quem é que lidera o partido. Nunca vou entender isso”, completou.

Comentamos o quanto também é difícil no Brasil esta-belecer identidade dentre os mais de 30 partidos existentes. “Eles deixam complexo o que é extremamente simples”, re-tomou, interpelando a si mesmo com a cabeça, colocando mais um gole do seu cappuccino sem açúcar na garganta. Sobre o governo de Dilma Roussef, afirmou que é um bom governo, de forma geral. “Teve muitos erros e acertos, mas uma coisa é fato: o governo Dilma é claramente uma conti-nuidade do governo Lula, o que não é ruim. Continua com boas políticas sociais e de base, no entanto, por conta do per-fil de política do PT, que vem mudando nas últimas décadas, Dilma se preocupou demasiadamente com o modo de fazer politica através das muitas alianças, e isso pode ter atrasado algumas medidas importantes à população”, destacou.

O autor de “As veias abertas da América Latina” lembrou o peso histórico das ditaduras militares que se espalharam pelo continente no século XX. Exilado por duas vezes, Ga-leano esteve no Brasil em anos de chumbo, quando traba-lhava para um jornal de Montevidéu, e seu editor pediu que escrevesse sobre a realidade social brasileira com a ditadura.

“Ele pediu que eu fosse ao Brasil, mas, por ter ido di-versas vezes ao país, disse que o faria do Uruguai mesmo. Insistiu e eu fui até o Rio de Janeiro. Queria que eu visse o modo como as pessoas viviam a ditadura nas ruas. O que

Por Francielle Baliana e Diego Torres

Ressaltou, no entanto, que os jogadores sul-americanos têm um histórico de mudanças através de pequenas revolu-ções. “Há um movimento no Chile em que os jogadores se uniram e começaram a fazer parte da tomada de decisão na liga. O Bom Senso Futebol Clube também é outro exemplo. A Democracia Corintiana que surgiu na década de 1980, lide-rada por Sócrates - “muito meu amigo” - provou que futebol não pode se render à política de interesses que sempre diri-giu os clubes”. Em uma ocasião, o Sócrates foi questionado sobre nossa amizade e respondeu: ‘O Eduardo fala de poesia e eu falo de política. É simples’”, sorriu.

O relógio marca meio-dia, mas o charme matinal uru-guaio nos inspirava o sentimento de que ainda era nove da manhã. Galeano perguntou-nos onde vivíamos no Bra-sil. “Entre São Paulo e Rio de Janeiro”, respondemos. Como conviesse, perguntamos se lhe agradavam cidades como as nossas, mas nosso Eduardo foi enfático ao negar o apreço às grandes metrópoles. “Não gosto de cidades grandes como São Paulo. Elas têm caos demais, gosto de Montevidéu por-que consigo compreendê-la. Não se pode compreender uma cidade como São Paulo. Por isso escolhi viver aqui e sempre para cá voltar”, disse.

Eduardo e Florência se levantaram, carregando os pre-sentes em mãos. Despedimo-nos com um cumprimento ainda mais carinhoso que o da chegada. “Vamos nos rever”, disse, por fim. “As mãos da memória sempre trabalham por encontros assim”, quisemos entender. Agradeceu com os olhos. Agradecemos.

Um gole Galeanocom