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Ano 1 - Número 7 - Setembro de 2015 Publicação do Instituto Episteme em Comemoração ao Ano do Centenário de Itapipoca MATÉRIA COM O HUMORISTA E CANTOR NA PRÓXIMA EDIÇÃO ENTREVISTA TIRIRICA Natural de Itapipoca onde nasceu em 1965, Francisco Everardo Oliveira Silva, mais conhecido como Tiririca, foi eleito Deputado Federal por São Paulo por duas vezes: em 2010 e 2014. Em 2010 adquiriu 1 milhão e 300 mil votos tornando-se o segundo Deputado Federal mais votado em toda história do Brasil. Perdeu apenas para Enéas Carneiro em 2002. Veja toda essa trajetória no O CENTENÁRIO a partir da biografia e da entre- vista que os itapipoquen- ses fizeram com seu conterrâneo. Páginas 6 a 9 O circo mexe com todo mundo. Como se trata de um tema muito abrangente, o Minha Vida traz, nesta seção, o depoimento de professores, empresários, radialistas e fotógrafos itapipoquenses sobre a passagem do circo pela Pedra Lascada. Páginas 4 e 5 Nascido em Caridade, município perto de Canindé, João Ferreira Lima, também chamado de João Faz Tudo, em Itapipoca, tinha o hábito de contar histórias mirabolantes tal como o Barão de Munchhausen na Alemanha do século 18. Aqui, algumas destas histórias fantásticas. Páginas 12 e 13 Tiririca começou a sua vida profissional em um circo mineiro. No Ceará há quatro meses, o circo mineiro Mundo Mágico abre suas portas para O CENTENÁRIO, em Fortaleza, e Andreza Suellen Alvarado Vieira, neta e bisneta de circenses, fala de sua vida, nas estradas, e da atuação do Tiririca no parlamento em prol da categoria. Páginas 10 e 11 MINHA VIDA E o palhaço o que é? VERDADES E MENTIRAS Histórias de João Faz Tudo TRADIÇÃO Um pé no circo e outro na estrada ITAPIPOCA Eleito deputado, o filho de dona Alice ainda teve que passar pelo dissabor de ser considerado analfabeto e impedido de assumir o cargo se tal alegação se confirmasse. Mas, no dia 17 de dezembro de 2010, o que ocorreu, na Assembleia Legislativa de São Paulo, foi o contrário. Tiririca foi o primeiro a ser diplomado e o único a ser aplaudido veementemente pelas galerias da Casa. ACLAMAÇÃO FALCÃO Foto: Leonardo Prado/Câmara dos Deputados

O centenário - Edição de setembro/2015

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Jornal mensal do Instituto Episteme criado para comemorar o Centenário da cidade de Itapipoca - Ceará durante o ano de 2015.

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Page 1: O centenário - Edição de setembro/2015

Ano 1 - Número 7 - Setembro de 2015

Publicação do Instituto Episteme em Comemoração ao Ano do Centenário de Itapipoca

MATÉRIA COM O HUMORISTA E CANTOR NA PRÓXIMA EDIÇÃO

ENTREVISTA TIRIRICANatural de Itapipoca onde nasceu em 1965, Francisco Everardo Oliveira Silva, mais conhecido como Tiririca, foi eleito Deputado Federal por São Paulo por duas vezes: em 2010 e 2014. Em 2010 adquiriu 1 milhão e 300 mil votos tornando-se o segundo Deputado Federal mais votado em toda história do Brasil. Perdeu apenas para Enéas Carneiro em 2002. Veja toda essa trajetória no O CENTENÁRIO a partir da biografia e da entre-vista que os itapipoquen-ses fizeram com seu conterrâneo.Páginas 6 a 9

O circo mexe com todo mundo. Como se trata de um tema muito abrangente, o Minha Vida traz, nesta seção, o depoimento de professores, empresários, radialistas e fotógrafos itapipoquenses sobre a passagem do circo pela Pedra Lascada. Páginas 4 e 5

Nascido em Caridade, município perto de Canindé, João Ferreira Lima, também chamado de João Faz Tudo, em Itapipoca, tinha o hábito de contar histórias mirabolantes tal como o Barão de Munchhausen na Alemanha do século 18. Aqui, algumas destas histórias fantásticas. Páginas 12 e 13

Tiririca começou a sua vida profissional em um circo mineiro. No Ceará há quatro meses, o circo mineiro Mundo Mágico abre suas portas para O CENTENÁRIO, em Fortaleza, e Andreza Suellen Alvarado Vieira, neta e bisneta de circenses, fala de sua vida, nas estradas, e da atuação do Tiririca no parlamento em prol da categoria. Páginas 10 e 11

MINHA VIDAE o palhaçoo que é?

VERDADES E MENTIRAS Histórias deJoão Faz Tudo

TRADIÇÃOUm pé no circoe outro na estrada

ITAPIPOCA

Eleito deputado, o filho de dona Alice ainda teve que passar pelo dissabor de ser considerado analfabeto e impedido de assumir o cargo se tal alegação se confirmasse. Mas, no dia 17 de dezembro de 2010, o que ocorreu, na Assembleia Legislativa de São Paulo, foi o contrário. Tiririca foi o primeiro a ser diplomado e o único a ser aplaudido veementemente pelas galerias da Casa.

ACLAMAÇÃO

FALCÃO

Foto: Leonardo Prado/Câmara dos Deputados

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Era assim que os circos se apresentavam quando chegavam ao interior do Ceará. Com o advento da televisão e da

Internet, posteriormente, esta prática acabou. Mas não a magia do circo. Ela permanece. Pelo menos é o que diz a proprietária do circo mineiro Mundo Mágico, Andreza Suellen Alvarado Vieira, em uma entrevista feita com ela pelo O CENTENÁRIO. Para ela, no tempo de seus avós, bastava armar o circo em algum lugar e, no dia da estreia sair perguntando à criançada “Hoje tem espetáculo?” acompanhada por alguns malabaristas e algumas bailarinas em cima de um carro para, à noite, o circo estar cheio. Com o surgimento das novas tecnologias tudo isso passou. Não adianta mais montar o circo e sair pela cidade perguntando se “hoje tem espetáculo?”. É preciso algo mais. Diz Suellen que é necessário dar entrevista em rádio e televisão; pagar anúncio em jornal e contratar um carro de som para, assim, garantir o público na estreia.

O espetáculo, no entanto, continua. E as atrações, pelo visto, são as mesmas do tempo em que os ciganos saíam pelo mundo mostrando suas habilidades com as mãos, malabarismo; com o corpo, equilibrismo; ou com o fogo, pirofagia. Passados os anos, Philip Astley, suboficial inglês que fazia parte da cavalaria daquele país, teve uma ideia. Como seus colegas tinham o hábito de fazer piruetas em cima de seus cavalos, Astley simplesmente montou um espaço circular dentro do qual seus colegas se apresentavam. Foi assim que surgiu o circo, tal como se

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conhece hoje, e as apresentações circenses, oriundas dos ciganos, se somaram às dos cavaleiros ingleses dando início ao espetáculo no qual se sobressai um personagem indispensável: o palhaço. Aquele que leva as crianças ao delírio e faz com que os adultos se tornem crianças novamente.

Diz Suellen, nas páginas 10 e 11 do O CENTENÁRIO, que o circo é uma das únicas atividades, no mundo, que reúne dentro dele, várias culturas. E cita algumas delas:

música, dança, mímica e teatro. Comparada com a ópera, ele sai ganhando porque a ópera se restringe à música e à representação enquanto o circo enfrenta o perigo no trapézio e no Globo da Morte.

Nas décadas de 1960 e 1970, quando o circo chegava em Itapipoca, havia um lugar destinado para ele. Ficava ali, nas proximidades da Estação Ferroviária. Nesse tempo, a forma de divulgação era aquela, antiga, na qual o palhaço saía pelas ruas perguntando: “Hoje tem espetáculo?” E a meninada respondia: “Tem, sim senhor!” “E o palhaço o que é?”, indagava ele. E a meninada respondia novamente: “Ladrão de mulher”. Vestido com um pano grosseiro, que lembrava aqueles que cobriam os colchões cheios de palha da Itália (daí o nome “palhaço” que vem da palavra paglia, que quer dizer “palha” em italiano), o palhaço, geralmente, caminhava em cima de uns pés de pau. Tiririca, quando nasceu em 1965, ainda era assim. Hoje, passados 50 anos, não é mais. Tiririca, no entanto, é seu continuador. Apresentando-se na televisão, e não mais no picadeiro, Tiririca mantém a tradição quando se veste de palhaço e faz o povo rir.

Para homenagear este artista que nasceu em Itapipoca, O CENTENÁRIO publica, neste número, a sua biografia seguida de uma entrevista nas páginas 8 e 9 respondida pelo deputado federal pelo Partido da República de São Paulo, Francisco Everardo Oliveira Silva que, de vez em quando, tira o paletó e a gravata e se veste de Tiririca.

Publicação do Instituto Episteme de Saúde, Educação e Cultura – CNPJ 056727010001-90 - Rua Plácido Castelo, 2265CEP 63 900-000 - Centro Quixadá CE.- Telefone: (88) 3412.2443 (14h às 18h). E--mail: [email protected]

Presidente do Instituto Episteme: Dr. Carlos Magno Cordeiro Barroso - Jornalista Responsável: Natalício Barroso (MtbCE1375).Redação: Natalício Barroso - Assessoria: Ito Liberato Barroso e Pedro Hamilton da Fonseca Elia - Colaboração: Lya Carvalho Jardim

Ilustração: Alcio, Pacelli C. Barroso e Glauco Bezera - Design Editorial: Chagas Neto (jornalista - MtbCE487) - Impressão: Expressão Gráfica . Tiragem: 5.000 exemplares - As matérias assinadas são de responsabilidade de seus autores, não reetindo, necessariamente, a opinião do jornal.EX

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Publicação do Instituto Episteme em Comeração ao Ano do Centenário de Itapipoca

Hoje tem espetáculo?Foto: Divulgação

Pedro Elia, do Instituto Epistemee representante do jornalO CENTENÁRIO, visita Tiririca noseu gabinete de trabalho em Brasília

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3Publicação do Instituto Episteme em comemoração ao Ano do Centenário de Itapipoca - ANO 1 - Nº7 - Setembro de 2015Publicação do Instituto Episteme em Comeração ao Ano do Centenário de Itapipoca

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O circo em nossa vida

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Os circos podem ser diferentes, mas a emoção que eles transmitem é a mesma”. A frase foi dita pelo fotó-

grafo João Edson. Com 41 anos, atual-mente, afirma ele que já viu circo de todos os tamanhos e de todas as categorias. O circo que mais o encantou, no entanto, encontrou em Morrinhos, interior do Ceará. Viajava para lá quando, de repen-te, mandou parar o carro e desceu. Havia um circo nas imediações. Era um “meia lona”, diz ele, ou, em outras palavras, um destes circos que não tem, sequer, a lona inteira de tão furados que são. Ficou tão emocionado com o que viu que pediu ao dono do circo para o fotografar. E o dono deixou. João Edson, com isso, entrou em todo o circo e o foto-grafou por dentro e por fora. Nunca se sentiu tão feliz. Foi aí que percebeu que os circos podem ser grandes, pequenos, luxuosos ou precários como aquele. A emoção que transmitem, porém, é sempre a mesma. Alceu C. Dutra, natural de Assunção, distrito de Itapipoca, também conta a sua experiência com o circo. Diz ele que era menino ainda quando apare-ceu um circo em Assunção. Como era muito danado, acompanhou o palhaço quando este saiu para a rua a fim de divulgar o espetáculo. “Eu tinha de oito a nove anos nesta época”, diz ele. E conti-nua: “Pintaram meu rosto e o de outras crianças de Assunção como se fizéssemos parte do elenco e fomos para a rua atrás

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APublicação do Instituto Episteme em Comeração ao Ano do Centenário de Itapipoca

Grandes ou pequenos, pobres ou luxuosos, o circo sempre leva alegria e emoção para as cidades por onde passa. Aqui, o depoimento de comerciantes, radialistas, professoras e fotógrafos de Itapipoca sobre a importância dos circos em suas vidas.

‘‘João Edson fotografou um "meia lona", em Morrinhos, que muito o encantou

Lona da Maria - Circo Escola de Itapipoca que pertence à Associaçãode Artes Cênicas do Município, existe há quatro anos

Foto: João Edson

Foto: Cacheado Braga

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do palhaço. Quando ele perguntava: ‘Hoje tem espetáculo?’ Todo mundo gritava: ‘Tem, sim senhor’. Para mim, tudo aquilo era novidade.’’ Mais tarde, quando o itapipoquense de Assunção saiu da sua terra e foi para o Rio de Janeiro, viu circos de todos os tipos. Um deles foi o de Moscou, no Maracanãzinho. Outro foi o Holiday On Ice que se apresenta no gelo. O primeiro circo, no entanto, foi o de Assunção, com sua “meia lona” igual ao que João Edson viu em Morrinhos. Aldenira Cordeiro, professora apo-sentada, também dá seu depoimento. Morava em Itapipoca, na década de 1960 (reside, atualmente, em Fortaleza) quan-do viu o circo pela primeira vez e ficou encantada não só com os palhaços, os malabaristas e os mágicos. Ficou admira-da com os animais que faziam todo tipo de estripulia sob as ordens de um doma-dor. Depois do circo, diz ela, as pessoas se reuniam nas calçadas, em Itapipoca, e iam falar das piadas dos palhaços. Uma delas marcou época na cidade: “Qual a diferença da ambulância para o sutiã?” Perguntava o palhaço para a plateia e esta ficava muda. Em seguida, ele mesmo respondia, para delírio de todos: “Ora, ora, ora, a ambulância leva os feridos e o sutiã os caídos”. Júlio César Rodrigues de Freitas, empresário de Itapipoca, está com 44 anos, mas lembra muito bem do tempo em que o circo chegava na Praça da Estação. “Era um tempo de felicidade”, diz ele, principalmente quando tinha a opor-tunidade de acompanhar os palhaços em seu percurso pela cidade propagando o espetáculo daquela noite. Julivan Benigno, radialista, diz

quase a mesma coisa. Para ele, que está com 59 anos, a grande alegria que sentia quando o circo chegava era a de acompa-nhar o palhaço pelas ruas de Itapipoca anunciando o espetáculo de logo mais à noite e, em seguida, receber o ingresso pelo trabalho prestado justamente com o que mais gosta de fazer hoje em dia : divulgação.

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Em atividade há quatro anos, o Circo Escola de Itapipoca (foto), pertence à Associação de Artes Cênicas do Município. Dirigido por Viana Júnior, promove espetáculos circenses na cidade e investe no desenvolvimento social e humano do município utilizando a cultura como via de acesso e oportunidade para a ascensão social e coletiva de crianças, adolescentes e jovens dos bairros Cacimbas, Mourão, Fazendinha, Encruzilhada e outros.

Julivan Benigno, radialista, acompanhava os palhaços pelas ruas de Itapipoca divulgando a estréia dos espetáculos

Foto:Cacheado Braga Foto:Cacheado Braga

Circo Escola de Itapipoca

Foto: Divulgação

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A6 Publicação do Instituto Episteme em comemoração ao Ano do Centenário de Itapipoca - ANO 1 - Nº7 - Setembro de 2015

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De palhaço a deputado

Em 1965 fazia um ano em que a ditadura militar havia sido implantada no Brasil. Foi neste ano, no entanto, no dia primeiro de maio, que nasceu, em Itapipoca, um menino chamado Francisco Everardo Oliveira Silva que, no futuro, seria chamado de Tiririca pela mãe. E por uma razão muito simples. Tiririca, como se sabe, é uma palavra da língua portuguesa que indica uma pessoa irritada. Como o filho de dona Alice, mãe do Tiririca, vivia assim, enfezado, a mãe lhe deu este apelido. E o apelido pegou principalmente em 1973, quando o filho, Everardo, foi atuar em um circo e nunca mais saiu dele. Estava com apenas oito anos. Mas foi em 1981 que tudo, de fato, começou. Tiririca estava com 16 anos e foi trabalhar em um circo mineiro que apareceu pelo Ceará. Nada demais se o palhaço não

tivesse se apaixonado pela acrobata e esta, por sua vez, por ele. Acontece que o pai da acrobata, dono do circo, não gostou nem um pouco do que viu e proibiu a filha de namorar o palhaço. Esta, no entanto, desobedeceu ao pai e, quando este foi embora, ficou com o palhaço.

Foi assim que Tiririca deu início a um novo capitulo em sua vida. Para sobreviver com Rogéria Márcia,

como se chamava a acrobata do circo mineiro, montou uma companhia, depois de trabalhar com ela em várias outras, e começou a viajar pelo Ceará, Piauí, Maranhão e Pará. O empreendimento deu certo. Tiririca e Márcia, para mostrar que eram uma companhia grande, chegavam em determinado local primeiro como simples funcionários, levantavam a empa-nada, dizendo para todo mundo que o elenco estava hospedado em uma cidade vizinha e iam embora em seguida. De noite, quando voltavam, os dois se reve-

Tiririca foi eleito deputado Federal em 2010 e reeleito em 2014 com mandato até 2018

Foto: Alexandra Martins / Câmara dos Deputados

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7Publicação do Instituto Episteme em comemoração ao Ano do Centenário de Itapipoca - ANO 1 - Nº7 - Setembro de 2015Publicação do Instituto Episteme em Comeração ao Ano do Centenário de Itapipoca

Em 2010 tomou uma iniciativa. Candidatou-se a Deputado Federal pelo Partido da República de São Paulo. Abandonando o método tradicional de propaganda, Tiririca assume a sua condição de palhaço e foi como tal que se lançou na política: “O que é que faz um Deputado Federal?”, perguntava ele no rádio e televisão. “Não sei”, ele mesmo respondia e terminava com a seguinte frase: “Vote em mim que eu conto”.

zavam no picadeiro. Tiririca anunciava, com voz de locutor, a apresentação do malabarista e, em seguida, aparecia no palco para fazer a apresentação. Depois vinha a Márcia com um quadro de magia que se transformava, posteriormente, em acrobacia. E assim permaneceram até que o circo pegou fogo.

O Macaco PregoTiririca e Márcia compraram um maca-

co-prego para animar ainda mais seus espetáculos quando o macaco mordeu um menino da cidade de Piritorá do interior do Maranhão. Como o menino era filho de um chefe político local, não deu outra. O homem mandou botar fogo no circo e o empreendimento de Tiririca e Márcia foi por água abaixo. Tiveram que voltar de carona para o Ceará. No Ceará, Tiririca começou uma nova empreitada. Cantar, além de fazer humor. Foi assim que gravou o seu pri-meiro CD, “Florentina”, com o apoio de amigos e estourou nacionalmente. Foi 1 milhão e 500 mil cópias vendidas. Em 1997, o segundo CD com a música “Ele é Corno, Mas é Meu Amigo”. Em 1999, ano em que ingressou na Rede Record, o terceiro com outra música de sucesso: “Casado Com Uma Viúva”. Na televisão, Tiririca trabalhou na TV Manchete, Rede Record e SBT antes de ir para a Bandeirantes.

O PolíticoEm 2010 tomou uma iniciativa.

Candidatou-se a Deputado Federal pelo Partido da República de São Paulo. Poucas pessoas acreditavam nele. A surpresa, portanto, foi grande. Abandonando o método tradicional de propaganda, Tiririca assume a sua condição de palhaço e foi como tal que se lançou na política: “O que é que faz um Deputado Federal?”, perguntava ele. “Não sei”, ele mesmo respondia e terminava com a seguinte frase: “Vote em mim que eu conto”. A aceitação pública foi geral. Poucas foram as pes-soas que se rebelaram contra ele. Mas houve quem se indispusesse e entrasse com uma representação no Ministério Público alegando afronta ao Congresso Nacional e ao poder público. Felizmente o ministério arquivou a representação e a campanha do Tiririca continuou para a alegria do povo que, em troca de sua sinceridade, o elegeu com 1 milhão e 300 mil votos tornan-do-se, o itapipoquense, o segundo candidato mais votado do Brasil em toda a sua história. O primeiro foi Enéas Carneiro, do Prona – Partido da Reedificação da Ordem Nacional – cujo bordão, na televisão, se resumia ao seguinte: “Meu nome é Enéas”, e nada mais.

AclamaçãoEleito deputado, o filho de dona Alice

ainda teve que passar pelo dissabor de ser considerado analfabeto e impedido de assumir o cargo se tal alegação se confir-masse. Mas, no dia 17 de dezembro de 2010, o que ocorreu, na Assembleia Legislativa de São Paulo, foi o contrário. Tiririca foi o primeiro a ser diplomado e o único a ser aplaudido veementemente pelas galerias da Casa.

Foto: Divulgação

“O que é que faz um Deputado Federal?”: esse foi o bordão da campa-nha de Tiririca quando de sua primeira candidatura em 2010.

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T-iririca, para provar que não era analfabeto, tomou uma decisão inesperada. Viajou para sua terra. E para quê? O mistério

foi grande. Algumas pessoas pensavam que a oposição tinha razão. O filho de dona Maria Alice, como se chama a mãe de Tiririca, era analfabeto e, por isso mesmo, não poderia assumir a função de deputado. Mas não foi o que aconteceu. No dia 11 de novembro de 2010 o cidadão Francisco Everardo Oliveira, como Tiririca se chama, fez o teste na Justiça Eleitoral, em São Paulo, e passou. Foi a este homem que O CENTENÁRIO entrevistou no mês de setembro para saber dele o que há ainda de itapipoquen-se em sua personalidade. Para entrevistar o deputado Tiririca e não exatamente o humorista, O CENTENÁRIO pensou duas vezes. Poderia, muito bem, fazer as perguntas sem que a população de Itapipoca soubesse, sequer, que esta entrevista estava sendo elaborada. Mas não foi assim que agiu. Como Itapipoca fez cem anos no dia 31 de agosto e as comemorações, neste jornal, se estendem até dezembro de 2015, é natural que a população e não a equipe do O CENTENÁRIO brilhe em seu lugar. Assim, quem fez as perguntas para aque-le que saiu de Itapipoca na década de 1980 e, em 2010 foi eleito deputado federal por São Paulo para ser reeleito em 2014 pelo mesmo estado, foi o povo da Pedra Lascada. Daí por que Itapipoca e não O CENTENÁRIO entrevista Tiririca no título de capa deste jornal.

Veja as perguntas, nas quais se encontram o nome e a profissão dos itapipoquenses que participaram da entrevista por intermédio do O CENTENÁRIO, e aprecie as respostas. Eneida Vasconcelos (comerciante) – Tiririca, você foi eleito pela cidade de São Paulo, mas quais são seus planos em relação a Itapipoca?TIRIRICA - Eneida, fui eleito e iniciei minha carreira política em São Paulo, e tenho planos para continuar trabalhando pela região. Mas Itapipoca é a cidade do meu coração.

Ana Alice Pereira (Secretária) – Como circen-se você não se vê como em um picadeiro em plena assembleia?

Itapipoca pergunta eo deputado responde

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AEm 2010, quando Tiririca foi eleito deputado federal por São Paulo com 1 milhão e 300 mil votos, tornando-se o segundo deputado mais votado da História do Brasil depois de Enéas Carneiro em 2002, que obteve 1 milhão e 500 mil votos pelo mesmo estado, disseram que o filho da Pedra Lascada era analfabeto e, por isso mesmo, não podia assumir a honrosa cadeira de deputado em Brasília.

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Foto: Divulgação

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TR – Encaro a política com muita seriedade e profis-sionalismo, Ana Alice. Assim como eu, aqui na Câmara tem muita gente séria que trabalha com transparência e em defesa do povo. No geral o político é muito mal visto pela população, mas eu faço minha parte e sempre sou reconhecido por onde passo pelas minhas boas ações como deputado.

Maria Nayara (gerente de vendas) – O que é mais difícil: ser um político honesto ou um come-diante?TR – Eu faço os dois. Quando você assume um compromisso e trabalha com seriedade, fica mais fácil para encarar o dia a dia. E é bom lembrar que em qualquer profissão ou em qualquer momento da vida devemos agir com honestidade. Honestidade faz parte do caráter da pessoa.

Mandu Holanda (servidor público) – Nobre deputado Tiririca, onde tem mais palhaçada: no congresso nacional ou nos circos?TR – No circo com certeza, Mandu. Lá é o local para isso. Como disse anteriormente: assim como eu, existem vários políticos que trabalham em defesa da população. Sou um dos deputados mais assíduos na Câmara e sempre estou fazen-do minha parte como político e cidadão.

Luciano (chaveiro) – Por que os deputados, quando entrevistados, sempre respondem que estão tentando encontrar um caminho e/ou uma solução para o país? Esta solução existe?TR – A situação do país é complicada realmente, Luciano, e não é fácil colocar tudo em ordem de uma hora pra outra. Mas acredito que com muito trabalho e persistência é possível melhorar as coisas. E eu sou brasileiro, nunca deixo de acredi-tar. Temos que ter Fé em Deus.

Francisco Mota (mídia social) – Qual o maior exemplo que você pretende deixar para a socie-dade: o de palhaço ou o de político?TR – Como palhaço, eu faço bonito. E como político também. Temos que dar bom exemplo sempre. Sou um deputado que não falta e sempre apresento projetos que possam contribuir da melhor forma para a sociedade.

Claudenir Sampaio (professor) – Tiririca, você quando está na Câmara dos Deputados age como comediante (“palhaço”) ou como deputado?TR – Na câmara, Claudenir, ajo sempre como Deputado. Comediante apenas nos shows, na televi-são. Temos que saber separar as duas coisas.

Genésio Andrade (empresário) – Diz aí, abestado! Você já descobriu o que um deputado faz em Brasília?TR – Eu posso responder por mim, Genésio. Eu trabalho muito, sou um dos Deputados mais assíduos e sempre estou apresentando projetos para a população. Apesar de ser deputado pela cidade de São Paulo, no nosso gabinete recebe-mos demandas de todo Brasil. Tem dias que atendemos mais de 150 pessoas.

O Centenário – O que o senhor acha que Itapipoca mereceria de presente em seus cem anos de elevação à condição de cidade?TR – Uma estátua minha para ser colocada na praça principal. Ninguém divulga ou divulgou mais Itapipoca do que eu. Existe uma atriz famosa que nasceu na região e nunca falou de Itapipoca. No momento, é o que me vem à mente. Uma estátua minha com a seguinte inscrição: “Cearense de Itapipoca”, pois tenho orgulho de ser itapipoquense.

Para entrevistar o deputado Tiririca e não exatamente o humorista, O CENTENÁRIO pensou duas vezes. Poderia, muito bem, fazer as perguntas sem que a população de Itapipoca soubesse, sequer, que esta entrevista estava sendo elaborada. Mas não foi assim que agiu. Como Itapipoca fez cem anos no dia 31 de agosto e as comemorações, neste jornal, se estendem até dezembro de 2015, é natural que a população e não a equipe do O CENTENÁRIO brilhe em seu lugar. Assim, quem fez as perguntas para aquele que saiu de Itapipoca na década de 1980 e, em 2010 foi eleito deputado federal por São Paulo para ser reeleito em 2014 pelo mesmo estado, foi o povo da Pedra Lascada. Daí por que Itapipoca e não O CENTENÁRIO entrevista Tiririca na edição deste jornal.

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Mandu Holanda, servidor público

Genésio Andrade, empresário

Francisco Mota, mídia social

Fotos: Divulgação

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Meus avós e bisavós já eram circenses e eu trabalhei em vários circos. Dentre eles o Beto Carreiro. Às vezes

como bailarina, outras no trapézio ou na cama elástica. Meu marido era do Globo da Morte. Foi quando surgiu a oportunidade de colocar o nosso próprio circo. Hoje estamos com este que já se chamou Globo Mágico por causa do Globo da Morte e agora se chama Mundo Mágico porque o nome soa bem.

COMPONENTESNão somos muitos. Somos sete famílias.

Uma faixa de 30 pessoas. Contando com as crianças dá 40 pessoas. Agora tem uma coisa: as sete famílias que aqui se encontram todas elas nasceram em circo. Tem muito circo que possui agregados de escolas de circo. Nós não. Todos os artistas que temos aqui são nascidos e criados em circo.

VIDA DE CIRCOSou muito suspeita para falar. Eu sou apai-

xonada por circo. Respiro circo. A minha vida inteira foi dentro de um circo. Para mim, o circo é como se fosse uma comunidade. São várias famílias em busca de um mesmo objeti-vo: levar arte, cultura e entretenimento para as pessoas de qualquer idade e classe social. Nesse mundo tão violento e que se torna cada vez mais violento e pornográfico à medida em que o tempo passa, tenho medo. Afinal, estou com 30 anos, possuo três filhos e não me sinto segura quanto a isso. No circo não. O circo é lúdico. Vida de circo, porém, não é fácil. Não é fácil, por exemplo, estar nas estra-

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O Mundo Mágico chegou em Fortaleza depois de passar pela Bahia e Pernambuco. Dirigido por Andreza Suellen Alvarado Vieira, neta e bisneta de donos de circo, o Mundo Mágico é natural de Minas Gerais onde surgiu há seis anos. Aqui, entrevista com Andreza na qual se destacam as respostas e não as perguntas.

das, sempre. Montar e desmontar a lona em qualquer circunstância: chova ou faça sol. Às vezes morro de medo. Ocorre, algumas vezes, de estarmos nas estradas, de madrugada, e quebrar um caminhão. Mas, o maior risco para os circos são os temporais. O temporal é uma calamidade. Tenho pavor de temporal. O lado bom desta vida é o fato de podermos estar em lugares novos e conhecer pessoas novas.

PÚBLICOGraças a Deus ainda existe aquele público

fiel, cativo. Se fosse feita uma pesquisa tenho para mim que são de famílias tradicionais que,

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Vida de circo

Natural de Minas Gerais, o Circo Mundo Mágico circula pelo Ceará há quatro meses com trapezistas, bailarinas, globo da morte e outras atrações

Andreza Suellen Alvarado Vieira, dona do Mundo Mágico, é filha, netae bisneta de circenses

Fotos: Divulgação

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assim como nós, que nascemos no circo, frequentam a empanada há muito tempo. Na época dos meus avós, eles contam, era mais fácil. Naquele tempo não precisava de muita publicidade. Bastava o circo chegar em uma determinada cidade para chamar a atenção de todos. Conta um de meus avós que antiga-mente ele alugava o terreno, colocava o circo e a casa enchia. Bastava, para isso, um carri-nho de som, uma passeata no dia da estreia com um perna de pau, malabaristas e bailari-nas em cima de um carro para chamar a atenção. Hoje está mais difícil. A competição é maior. Assim, é preciso colocar propaganda em jornal, rádio, televisão e, se possível, carro de som.

ATRAÇÕESTemos trapezistas, bailarinas, globo da

morte, tecido acrobático, lírio espacial e, claro, palhaços. Estes não podem faltar. Temos, tam-bém, monociclos e malabaristas. Tudo isso com tecnologia de som e iluminação muito boas.

PIADASExistem várias. O circo, por exemplo, pos-

sui um dialeto muito específico. Os mastros ou espinhamentos que sustentam as lonas são chamados de mortos porque são fincados no chão. Assim, toda vez em que o circo vai ser montado, as pessoas dizem: “vamos enterrar o morto”. Uma vez, quando fomos montar o circo em uma cidade e a população próxima ouviu esta conversa de que estávamos enter-rando um morto, ficou preocupada e chamou a polícia. Esta, quando chegou armada e mandou todo mundo ficar de mãos ao alto, perguntou pelo morto. Depois soube que se tratava dos mastros e não de uma pessoa. Foi muito engraçado. Mas dizem que isto já ocor-reu com vários circos e não apenas conosco.

ESPAÇO DE ATUAÇÃO As cidades não têm um lugar para os

circos. Têm lugar para o esporte e o teatro. Para o circo, não. Assim, os espaços que a gente ocupa são sempre particulares. A gente loca e paga para montar o circo porque as prefeituras não oferecem um espaço para nós. E isso não é só no Ceará. É em todo o Brasil. Tem uma cidade em Goiás, porém, Quirinópolis, que possui um espaço chamado,

justamente, a Praça do Circo destinado aos espetáculos circenses. Petrolina também tem uma área muito grande com o mesmo objeti-vo. Mas são poucos os lugares assim. Noventa por cento são áreas particulares. Nada para os circos. E não deveria ser assim porque o circo é a primeira cultura do mundo. O circo é a única cultura que reúne várias outras. No circo você tem o teatro, por exemplo, a dança, a música, etc. E tudo isso ao vivo. Mas não tem apoio. Infelizmente não temos. O Tiririca está tentando mudar muitas coisas. Uma andori-nha só, porém, não faz verão. Existem proje-tos de lei que datam de 2006 para isenção de ISS. A gente paga muito imposto. O imposto que o circo paga, além de ocupar uma área particular, é um absurdo. Eu tenho certeza de que o maior supermercado de Fortaleza não paga tanto imposto como nós: ISS, taxa de alvará e tributação por espaço fora outras despesas. E a gente tem que pagar porque, afinal, o circo, como diz certa música, não pode parar e são várias famílias que depen-dem disso aqui.

CRIANÇASEstas são um universo à parte. Diferente

das outras, que moram em casas fixas, as crianças que nos acompanham se divertem imitando os pais no picadeiro ou no trapézio. Assim, elas mesmas montam seu próprio circo próximo do principal e ali se divertem. Quando crescem são elas, muitas vezes, que tomam nosso lugar no espetáculo. Andreza Alvarado

Foto: Divulgação

‘‘O circo é a única cultura que reúne várias outras. No circo você tem o teatro, por exemplo, a dança, a música, etc. E tudo isso ao vivo. Mas não tem apoio. O Tiririca está tentando mudar muitas coisas. Uma andorinha só, porém, não faz verão. Existem projetos de lei que datam de 2006 para isenção de ISS. A gente paga muito imposto. Isso é um absurdo. ’’

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Publicação do Instituto Episteme em comemoração ao Ano do Centenário de Itapipoca - ANO 1 - Nº7 - Setembro de 201512Publicação do Instituto Episteme em Comeração ao Ano do Centenário de Itapipoca

Itapipoca é uma cidade cheia de personagens originais. Macaco Caiu, Joana Calixta e Teresa Broa são

alguns deles. Macaco Caiu tinha este apelido porque, como trabalhava como bagageiro em uma empresa de ônibus, a sua função era a de subir e descer a bagagem dos passagei-ros que, neste tempo, ficava em cima e não em baixo dos coletivos. Joana Calixta parecia uma árabe com seu vestido longo e turbante brancos em baixo de um pé de cajá nas proximidades do Açude da Nação. Teresa Broa tinha esta denominação porque costu-mava se empoar, excessivamente, toda vez que saía de casa. Ficava muito branca.

Havia um personagem, no entanto, que

A arte de mentir

destoava de todos eles. Chamava-se João Faz Tudo e tinha este nome, segundo aque-les que o conheceram, porque costumava resolver qualquer problema. Pelo menos na imaginação. Pai do Cafita, João Faz Tudo, na verdade, chamava-se João Ferreira Lima e nasceu em Caridade, perto de Canindé, no tempo em que a Pedra Lascada era dominada por Anásticio Braga. De altura mediana, chapéu de palha e barba sempre por fazer, a mania do João Faz Tudo era a de mentir. Contador de histórias nato, inventava seus causos tal como Alexandre, do livro Alexandre e outros heróis de Graciliano Ramos (que depois se transfor-mou no Pantaleão do Chico Anísio) inventa-va os seus.

Alexandre de Graciliano Ramos tinha uma mulher que se chamava Cesária e sempre que o marido terminava de falar perguntava

JOÃ

O F

AZ

TUD

O Nascido em Caridade, perto de Canindé, João Faz Tudo, pai do Cafita, era considerado um mentiroso sofisticado em Itapipoca. As histórias que contava se assemelham às de Alexandre e outros heróis de Graciliano Ramos e às do Barão de Munchhausen na Alemanha do século 18

Por Natalício Barroso

Da Redação

Ilustração: Glauco Bezerra

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O que vale mais, portanto, a verdade ou a mentira? A verdade, naturalmente. A mentira, no entanto, desde que bem contada e não tenha, como objetivo, prejudicar ninguém, é algo tão excepcional quanto um livro bem escrito. João Faz Tudo está neste universo. Era um contador de histórias. As histórias que contava, no entanto, não eram semelhantes às que Machado de Assis narrava em seus romances ou José de Alencar. Mas tinham encanto.

a ela se era mentira ou se era verdade o que estava dizendo e a mulher sempre respondia que era verdade tal como a Terta do Pantaleão do Chico Anísio. João Faz Tudo não tinha ninguém para atestar as suas invencionices, mas nem por isso deixava de contá-las como se fossem verdadeiras e não saídas de sua própria imaginação. E mais um detalhe. A maioria delas se passa em Itapipoca e não em lugares estranhos como as que eram contadas pelo Barão de Munchhausen, por exemplo, que nasceu no século 18, na Alemanha, e tinha o hábito de narrar histórias fantásticas para seus admi-radores como aquela da qual saiu de um pântano, onde se atolara, puxando os cabe-los com as próprias mãos.

O Barão de Munchhausen, por sinal, é um bom exemplo de mentiroso que não agride ninguém. Pelo contrário. Tudo o que faz é dar maior sabor à vida com suas fantasias mirabolantes. Contam, inclusive, que havia um mentiroso, em Recife que, quando estava relatando uma de suas inúmeras façanhas, foi interrompido por um desconhecido e chamado, acintosamente, de "mentiroso". A assistência, diante disso, que estava sorrin-do, ficou séria e o mentiroso, em seguida, retrucou: "Está vendo? Todo mundo ria do que eu falava. Agora, com a sua interferên-cia, ninguém ri mais".

Verdade versus MentiraO que vale mais, portanto, a verdade ou a

mentira? A verdade, naturalmente. A menti-ra, no entanto, desde que bem contada e não tenha, como objetivo, prejudicar nin-guém, é algo tão excepcional quanto um livro bem escrito. João Faz Tudo está neste universo. Era um contador de histórias. As histórias que contava, no entanto, não eram semelhantes às que Machado de Assis narra-va em seus romances ou José de Alencar. Mas tinham encanto. Fossem transformadas em livro, como as do Barão de Munchhausen, talvez se tornassem tão famo-sas quanto as dele. Em uma delas diz João Faz Tudo que caçava patos selvagens para os lados do Poço Verde, em Itapipoca, quando percebeu que só tinha uma bala na espingar-da. Preocupado com aquilo, não sabia o que fazer para matar aqueles bichos empluma-dos todos quando teve uma ideia. Escondeu-se por trás de umas moitas e, quando os patos foram se aglomerando, apareceu dian-te deles com a espingarda engatilhada. "Mãos ao alto", disse ele para as aves que, imediatamente, levantaram as asas. Satisfeito com aquilo, Seu João foi pegando os patos, um por um e pondo em um saco. Terminada esta operação, percebeu que estava anoitecendo e era preciso voltar para casa imediatamente. Teve outra ideia. Tirou alguns patos, ainda vivos, de dentro de um dos sacos, meteu a cabeça deles por baixo do cinto da calça e, em breve, estava voan-do. Seu João não revela qual foi a sensação que sentiu assim que os parentes mais pró-ximos das aves do paraíso, os cisnes, voa-ram e ele viu o município de Itapipoca do alto. Afirma somente que quando chegou no bairro da Fazendinha e viu que o centro da cidade estava próximo, ficou preocupado.

Sentiu que era preciso descer e não adianta-va nada dizer isso para os parentes dos cisnes. Mas como teve a ideia de dar mãos ao alto para eles quando estava com apenas uma bala na agulha e colocá-los no cinturão para voar, da mesma forma pensou em uma saída. E encontrou. Matar os bichos. Era a única forma de aterrissar. E assim aconteceu. Seu João foi matando os patos, um por um e, quando matou o último, aterrissou, suave-mente, na Praça da Matriz, atual Perilo Teixeira, diante da Catedral. São histórias assim, mais itapipoquenses do que qualquer outra, que Seu João contava.

Uma outra diz que Seu João andava pelas ruas de Itapipoca atrás de um passarinho que havia voado com gaiola e tudo. Curiosos com aquela história, os itapipoquenses qui-seram saber o que havia acontecido, de fato, e Seu João contou. Disse que dava de comer a um canário, em casa e, quando se afastou para buscar água e voltou não viu mais nem o canário nem a gaiola. Resultado. Chegou à conclusão de que o canário havia fugido com gaiola e tudo.

Em outra oportunidade estava sentado na Praça Perilo Teixeira quando chegou um desconhecido e perguntou ao Seu João se via uma formiga em uma das torres da Catedral. Seu João, segundo dizem, tirou o chapéu da cabeça, olhou para a torre apontada e per-guntou: "Qual delas, meu filho, a que vem ou a que vai?"

São muitas as histórias deste homem que nasceu em Caridade, mas foi em Itapipoca que vive.

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Romeu e Julieta de Shakespeare poderia servir de referencial para a história que segue. Nela se encontra a cena do balcão na qual os personagem se cruzam. Ocorrida em Itapipoca, Capitão Juvêncio mostra que a Terra do Dilúvio possui muitos romances que ainda não foram escritos

Existia em Pedrinhas, um lugarejo que fica na fronteira de Itapipoca com Acaraú, um homem chamado Capitão

Juvêncio. Fazendeiro, Capitão Juvêncio pos-suía, em sua propriedade, um armazém no qual guardava e vendia produtos como açú-car, querosene, sabão, carrinhos de mão, enxada, foice e pá. Quem abastecia o capitão com tudo isso era um caixeiro viajante que de vez em quando aparecia na fazenda e, para agradar ao capitão, levava sempre um presente para ele. Normalmente era um charuto que, depois do jantar, o capitão saboreava no alpendre da casa grande ao lado do amigo.

Terrminada a conversa que, muitas vezes, varava a noite, o caixeiro viajante, muito novo ainda, subia para o quarto de hóspede, no alto da casa, e ali ficava com a janela aberta por algum tempo. Houve uma noite, no entanto, em que não conseguiu dormir. Estava debruçado sobre o parapeito da janela quando viu um vulto passando, sorrateira-mente, por baixo de um pé de benjamim que, por sua vez, dava com seus galhos no alto de outra janela que ficava defronte da sua. Curioso com aquilo, o caixeiro viajante ficou atento e viu quando o vulto subiu na árvore e pulou para dentro da janela. Em

Capitão Juvêncio

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seguida, alguém apagou a luz do quarto que, até então, se mantivera acesa.

Intrigado, o caixeiro, no dia seguinte, perguntou ao capitão quem morava no quarto defronte ao seu. O capitão disse que era sua filha. O filho que possuía morava em outro, mais distante. O caixeiro viajante ficou mais intrigado ainda, mas, nem por isso disse nada para o fazendeiro. Foi embora. De volta à fazenda tempos depois, viu tudo acontecer novamente e, no dia seguinte, não sabia o que fazer. Era amigo do capitão. Sempre que chegava à casa dele era bem tratado. Almoçava, jantava e permanecia nela o tempo que queria sem ser importunado ou sequer indagado se ia ou não embora. Assim, não era justo manter aquele segredo. E disse tudo.

Irritado com aquilo, mas sem perder o prumo, o capitão fez um pedido ao caixeiro viajante. Sabia que ele estava de viagem. Mas queria que permanecesse por mais um ou dois dias com ele. Na tarde seguinte ia reunir o pessoal, no final da colheita, e queria saber, de fato, quem era a criatura que estava bur-lando a sua vigilância e tinha receio de incri-minar o homem errado.

O caixeiro viajante concordou e, no dia seguinte, final da tarde, o capitão reuniu seus trabalhadores para tratar da colheita. Quando chegou perto do cavalariano, o caixeiro via-jante balançou a cabeça, afirmativamente. Era o sinal convencionado. O capitão apertou a mão do homem, tranquilamente, e continu-ou seu trabalho. Na manhã seguinte, chamou o caixeiro viajante e o cavalariano e pediu a este para selar três cavalos. Queria mostrar a fazenda para seu amigo e queria, ao mesmo tempo, que o cavalariano fosse com eles. O cavalariano selou os três cavalos e acompa-nhou o capitão e o caixeiro viajante.

A certa altura, embaixo de uma árvore alta e frondosa, o Capitão Juvêncio parou o cavalo e chamou o cavalariano para abrir um buraco na terra no qual coubesse dois homens. O cavalariano do capitão obedeceu. Desceu do cavalo e abriu a cova com uma pá. Terminado o serviço, o capitão tirou um revólver da cintura e um rifle que levava suspenso sobre a sela do cavalo. Ficou com o revólver e deu o rifle para o caixeiro viajante. Este, impressio-nado com aquilo, não sabia o que fazer. O capitão explicou: “Mate o homem”, disse ele. O caixeiro viajante disse que não. O capitão insistiu: “Ou você mata o homem ou eu mato os dois. Para mim, acrescentou, não adianta nada matar um e deixar o outro vivo para envergonhar minha família com um segredo como este”.

O caixeiro viajante não teve alternativa. Matou o cavalariano, enterrou o corpo depois, ajudado pelo capitão e, em seguida, foi embo-ra com o fazendeiro. No caminho, ouviu deste que a festa de casamento já estava pronta. “Que festa, capitão?” indagou o caixeiro via-jante, aturdido, e o outro respondeu: “A sua, homem”, disse ele, com minha filha”.

E assim aconteceu.

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Osegundo Festival de Circo do CEARÁ esteve presente na terra dos três climas trazendo

espetáculos, números e oficinas de grupos da Argentina, Chile, Peru, São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Santa Quitéria e claro, de Itapipoca.

De 07 a 08 de agosto de 2015 o público da terra dos três climas lotou o Circo Escola Lona da Maria e a praça do Hotel (Praça José Pontes Filho) para prestigiar um evento de grande porte no Estado do Ceará que pela primeira vez foi realizado em nossa cidade. Além da diversidade artística e cultural a programação do festival contou com uma grade de oficinas e cursos ligados a arte circense no Circo Escola Lona da Maria.

O festival teve início no dia 28 de julho em Fortaleza (Dragão do Mar), veio a Itapipoca (07 e 08/08) de onde seguiu para o assentamento Várzea do Mundaú no Trairi (09/08), passando ainda por Jaguaribe (11 e 12/08) e finalizando na praia da Taíba em São Gonçalo do Amarante (15/08).

Ao todo foram realizadas mais de 50 horas de programação cultural gratuita, 35 grupos/artistas do Brasil e do mundo, 60 números/espetáculos, 05 cidades e um público de 20.000 pessoas em toda a programação. O festival é uma realização da Iluminura Produtora Cultural e nesta edição teve o apoio cultural do Governo do Estado do Ceará e da Prefeitura Municipal de Itapipoca, apoio da Coelce, a parceria da Casa de Teatro Dona Zefinha, Circo Escola Lona da Maria, Cetra e a colaboração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e Sindesp.

Em entrevista ao Jornal O Centenário, o realizador do Festival e integrante do grupo Dona Zefinha, Ângelo Márcio falou um pouco sobre o projeto: “a ideia de trazer a edição do Festival de Circo do

O circo passou por aquiFE

STIV

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Ceará para Itapipoca foi um desafio que assumi por três motivos básicos: primeiro realizar um evento deste porte em minha cidade, segundo reafirmar a importância cultural de Itapipoca no cenário cearense e terceiro presentear a cidade e as famílias de Itapipoca com um entretenimento saudável e de qualidade neste momento tão singular que é o Centenário de nossa cidade.

Devo muito a Itapipoca e principalmente aos Circos que por aqui passaram. Na minha infância vi muitos espetáculos e artistas que nos influenciaram. Dona Zefinha é muito inspirada nos artistas mambembes que vimos aqui. Trazer artistas, espetáculos e momentos como estes para nossa cidade é uma iniciativa que a Casa de Teatro Dona Zefinha e os artistas de nossa cidade vêm conseguindo articular.

Em sua história, a cidade dos três climas sempre foi uma “boa praça” para os Circos de Lona do Ceará e do Brasil. Quem não lembra na década de 80 e 90 dos bordões dos palhaços que ficavam por semanas na boca de todos, dos voos dos trapezistas, dos desafios lançados aos invocados da cidade, o casamento do palhaço, os animais exóticos e o globo da morte?

Circos de pequeno, médio e grande porte passaram por Itapipoca e geralmente ocupavam terrenos como o campo da estação, o terreno próximo ao Crede que foi construído o Restaurante Popular e o terreno vizinho à AABB onde hoje funciona o posto de combustível em frente à praça dos Três Climas.

A cidade está crescendo e esses espaços que comportam receber os grandes circos estão desaparecendo.... O circo é sem dúvida o equipamento cultural mais acessível e plural, chegando onde as políticas públicas culturais não conseguem.”

Publicação do Instituto Episteme em Comeração ao Ano do Centenário de Itapipoca

Foto:Marina Cavalcante