12
O Criacionismo e a Grande Explos˜ ao Inicial Eduardo L¨ utz Neste artigo, iniciamos uma discuss˜ ao sobre a posi¸ ao criacionista com respeito ` a cria¸ ao do Universo. Esclare- cemos que Gˆ enesis 1 fala sobre cria¸ ao na Terra e ime- dia¸ oes e n˜ao d´ a detalhes ou datas sobre a cria¸ ao do Uni- verso. Trazemos ` a tona o problema de autores, incluindo criacionistas, que divulgam opini˜ oes e argumentos sobre a origem do Universo sem ter um conhecimento de causa apropriado. Destacamos que, de acordo com a B´ ıblia, f´ e e Ciˆ encia devem andar de m˜ aos dadas; jamais devem ser consideradas como opostas entre si. Enfatizamos tamb´ em que n˜ ao se pode ter competˆ encia criacionista sem conhecer teorias cient´ ıficas em primeira m˜ ao e, muito menos, con- fundindo ‘Ciˆ encia’ com ‘Filosofia da Ciˆ encia’. Indicamos ao leitor algumas ´ areas estrat´ egicas nas quais ´ e necess´ ario um aprofundamento antes que seja vi´ avel uma discuss˜ ao mais adequada sobre a origem do Universo. 1 Introdu¸ ao Muitos criacionistas n˜ ao tˆ em d´ uvidas de que ´ e incom- pat´ ıvel com a B´ ıblia a id´ eia de que o Universo teria surgido em uma grande explos˜ ao inicial, conhecida como ‘Big Bang’. Surge ent˜ ao a quest˜ ao: com que argumentos pode-se combater essa id´ eia de “Big Bang”? Talvez, procurando inconsistˆ encias no modelo do “Big Bang”. Os que apren- deram um pouco mais sobre Deus, sabendo o quanto Ele ´ e met´odico e que tudo o que Ele faz´ e coerente, esses podem argumentar que devem tamb´ em existir evidˆ encias f´ ısicas que ap´ oiem a posi¸ c˜aocriacionista. Seguindo esta linha, muitos artigos foram publicados por autores de diversas ´ areas. Um dos grandes problemas fundamentais com esses artigos ´ e o fato de que demons- tram falta de conhecimentos em algumas ´ areas grande- mente estrat´ egicas para esta quest˜ ao. Em suma, combatem o “Big Bang” sem saber do que se trata. Com perd˜ ao da franqueza, aparentemente o que esses autores pensam ser a “teoria do Big Bang” ´ e apenas uma id´ eia simplista baseada essencialmente em boatos so- bre o assunto. Faz-se grande confus˜ ao entre as informa¸ c˜oes divulgadas ao p´ ublico leigo e a informa¸ ao usada pelos ci- entistas. O problema ´ e que linguagens n˜ ao-matem´aticas ao podem expressar de maneira funcional uma s´ erie de coisas fundamentais sobre a Natureza, obrigando os cien- tistas que divulgam essas informa¸ c˜oes a buscar analogias e outros artif´ ıcios na tentativa de tornar os temas de sua pesquisa acess´ ıveis ao p´ ublico leigo. ´ E claro que essa falta de distin¸ ao entre Ciˆ encia e di- vulga¸ ao bem como a falta de preparo t´ ecnico sobre temas vitais ao assunto s´ o tende a gerar embara¸ cos ao Cria- cionismo, tanto no confronto com o Evolucionismo quanto no que se refere ` a harmonia l´ ogica interna da filosofia cria- cionista. Ao ler artigos assim produzidos, v´ arios cientistas cri- acionistas (incluindo o autor destas linhas) tˆ em sentido grande desconforto por causa da argumenta¸ c˜aoequivo- cada e, muitas vezes, suicida adotada t˜ ao amplamente. E, notem: argumenta¸ ao equivocada tanto biblicamente quanto cientificamente. Est˜ ao a defender uma posi¸ ao que ao ´ e b´ ıblica em nome do Criacionismo. Concordamos que algo deveria ser feito para esclarecer essa quest˜ ao. E este autor recebeu a incumbˆ encia de escrever alguns artigos, quando poss´ ıvel, cuja inten¸ c˜ao´ e a de tentar desfazer al- guns mal-entendidos mais graves dentre os que tˆ em surgido nesta longa batalha entre Criacionismo e Evolucionismo. Neste artigo, pretendemos apenas fazer uma introdu¸ c˜ao ao assunto da origem e evolu¸ ao do Universo no contexto dos objetivos j´ a mencionados. Apenas uma introdu¸ ao por tratar-se de um assunto profundo e complexo, cuja com- preens˜ ao exige conhecimentos matem´ aticos avan¸ cados (incluindo An´ alise Tensorial e espa¸cos vetoriais com in- finitas dimens˜ oes). Evidentemente, n˜ ao vamos supor que o leitor possua tais conhecimentos. Mas ´ e muito importante que se saiba que as explica¸ c˜oes que damos ao p´ ublico leigo, incluindo as analogias que fazemos e as figuras de linguagem que usa- mos n˜ ao fazem parte da pesquisa cient´ ıfica, ao contr´ ario do que pensam alguns autores, e nem sequer podem con- ter todas as informa¸ c˜oes relevantes de uma teoria cient´ ıfica autˆ entica. Ao longo destes artigos, fazemos referˆ encias a nomes de ´ areas do conhecimento e de teorias cient´ ıficas associadas a cada um dos principais assuntos para que o leitor interes- sado possa pesquis´ a-los (por exemplo, fazendo buscas por palavras-chave) se tiver interesse. Lembremo-nos de que teorias cient´ ıficas autˆ enticas n˜ ao ao meras conjecturas. ao modelos matem´ aticos, con- forme discutimos no artigo “Considera¸ c˜oessobreCiˆ encia” (Folha Criacionista, n´ umero 66), e a tradu¸ ao para uma das chamadas “linguagens naturais” (como portuguˆ es ou qualquer outra l´ ıngua falada por algum povo da Terra) im- plica em monumentais perdas de informa¸ ao e funcionali- dade. E n˜ ao basta introduzir algumas pequenas f´ ormulas solit´ arias em n´ ıvel de Ensino M´ edio, como fazem muitos autores que combatem o modelo da grande explos˜ ao e como fazem tamb´ em muitos autores evolucionistas. Mesmo tendo em mente que n˜ ao podemos oferecer um tratamento adequado do problema em si sem abordar as- pectos t´ ecnicos inacess´ ıveis aos leigos, precisamos ainda assim esclarecer equ´ ıvocos, trazendo ` a luz alguns pontos importantes e id´ eias com as quais possamos lidar sem ter 1

O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

O Criacionismo e a

Grande Explosao Inicial

Eduardo Lutz

Neste artigo, iniciamos uma discussao sobre a posicaocriacionista com respeito a criacao do Universo. Esclare-cemos que Genesis 1 fala sobre criacao na Terra e ime-diacoes e nao da detalhes ou datas sobre a criacao do Uni-verso. Trazemos a tona o problema de autores, incluindocriacionistas, que divulgam opinioes e argumentos sobrea origem do Universo sem ter um conhecimento de causaapropriado. Destacamos que, de acordo com a Bıblia, fee Ciencia devem andar de maos dadas; jamais devem serconsideradas como opostas entre si. Enfatizamos tambemque nao se pode ter competencia criacionista sem conhecerteorias cientıficas em primeira mao e, muito menos, con-fundindo ‘Ciencia’ com ‘Filosofia da Ciencia’. Indicamosao leitor algumas areas estrategicas nas quais e necessarioum aprofundamento antes que seja viavel uma discussaomais adequada sobre a origem do Universo.

1 Introducao

Muitos criacionistas nao tem duvidas de que e incom-patıvel com a Bıblia a ideia de que o Universo teria surgidoem uma grande explosao inicial, conhecida como ‘BigBang’.

Surge entao a questao: com que argumentos pode-secombater essa ideia de “Big Bang”? Talvez, procurandoinconsistencias no modelo do “Big Bang”. Os que apren-deram um pouco mais sobre Deus, sabendo o quanto Ele emetodico e que tudo o que Ele faz e coerente, esses podemargumentar que devem tambem existir evidencias fısicasque apoiem a posicao criacionista.

Seguindo esta linha, muitos artigos foram publicadospor autores de diversas areas. Um dos grandes problemasfundamentais com esses artigos e o fato de que demons-tram falta de conhecimentos em algumas areas grande-mente estrategicas para esta questao.

Em suma, combatem o “Big Bang” sem saber do quese trata. Com perdao da franqueza, aparentemente o queesses autores pensam ser a “teoria do Big Bang” e apenasuma ideia simplista baseada essencialmente em boatos so-bre o assunto. Faz-se grande confusao entre as informacoesdivulgadas ao publico leigo e a informacao usada pelos ci-entistas. O problema e que linguagens nao-matematicasnao podem expressar de maneira funcional uma serie decoisas fundamentais sobre a Natureza, obrigando os cien-tistas que divulgam essas informacoes a buscar analogiase outros artifıcios na tentativa de tornar os temas de suapesquisa acessıveis ao publico leigo.

E claro que essa falta de distincao entre Ciencia e di-vulgacao bem como a falta de preparo tecnico sobre temasvitais ao assunto so tende a gerar embaracos ao Cria-cionismo, tanto no confronto com o Evolucionismo quantono que se refere a harmonia logica interna da filosofia cria-cionista.

Ao ler artigos assim produzidos, varios cientistas cri-acionistas (incluindo o autor destas linhas) tem sentidogrande desconforto por causa da argumentacao equivo-cada e, muitas vezes, suicida adotada tao amplamente.E, notem: argumentacao equivocada tanto biblicamentequanto cientificamente. Estao a defender uma posicao quenao e bıblica em nome do Criacionismo. Concordamos quealgo deveria ser feito para esclarecer essa questao. E esteautor recebeu a incumbencia de escrever alguns artigos,quando possıvel, cuja intencao e a de tentar desfazer al-guns mal-entendidos mais graves dentre os que tem surgidonesta longa batalha entre Criacionismo e Evolucionismo.

Neste artigo, pretendemos apenas fazer uma introducaoao assunto da origem e evolucao do Universo no contextodos objetivos ja mencionados. Apenas uma introducao portratar-se de um assunto profundo e complexo, cuja com-preensao exige conhecimentos matematicos avancados(incluindo Analise Tensorial e espacos vetoriais com in-finitas dimensoes).

Evidentemente, nao vamos supor que o leitor possuatais conhecimentos. Mas e muito importante que se saibaque as explicacoes que damos ao publico leigo, incluindo asanalogias que fazemos e as figuras de linguagem que usa-mos nao fazem parte da pesquisa cientıfica, ao contrariodo que pensam alguns autores, e nem sequer podem con-ter todas as informacoes relevantes de uma teoria cientıficaautentica.

Ao longo destes artigos, fazemos referencias a nomes deareas do conhecimento e de teorias cientıficas associadas acada um dos principais assuntos para que o leitor interes-sado possa pesquisa-los (por exemplo, fazendo buscas porpalavras-chave) se tiver interesse.

Lembremo-nos de que teorias cientıficas autenticas naosao meras conjecturas. Sao modelos matematicos, con-forme discutimos no artigo “Consideracoes sobre Ciencia”(Folha Criacionista, numero 66), e a traducao para umadas chamadas “linguagens naturais” (como portugues ouqualquer outra lıngua falada por algum povo da Terra) im-plica em monumentais perdas de informacao e funcionali-dade. E nao basta introduzir algumas pequenas formulassolitarias em nıvel de Ensino Medio, como fazem muitosautores que combatem o modelo da grande explosao ecomo fazem tambem muitos autores evolucionistas.

Mesmo tendo em mente que nao podemos oferecer umtratamento adequado do problema em si sem abordar as-pectos tecnicos inacessıveis aos leigos, precisamos aindaassim esclarecer equıvocos, trazendo a luz alguns pontosimportantes e ideias com as quais possamos lidar sem ter

1

Page 2: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

de fazer um curso de oito anos de Matematica (o que,alias, seria quase indispensavel para lidar com algumasquestoes sobre as origens). A Matematica nao e mera-mente uma linguagem, ou uma mera construcao da mentehumana como imaginam alguns. E algo intimamente li-gado ao funcionamento da Natureza, mas transcende aeste, pois provem de Alguem que e infinitamente supe-rior a Natureza. O que o homem faz e tentar sistem-atizar esses padroes naturais e, nessa busca, encontrouuma famılia de linguagens eficientes para representar, rela-cionar e aprofundar-se em tais padroes matematicos. Es-tas linguagens nao sao a Matematica, mas fazem partedela.

Feitas estas consideracoes preliminares, trataremos defazer uma discussao introdutoria a respeito da posicaobıblica sobre a origem do Universo.

Prosseguiremos com uma serie de questoes que devemser consideradas com respeito a possıvel veracidade destagrande explosao inicial e sobre os modelos que tentam des-creve-la.

Comentamos tambem algumas das teorias que sao usa-das em estudos sobre a origem e a evolucao do Universo,discutindo em seguida algo sobre seu grau de confiabili-dade e profundidade.

Para concluir o artigo, discutimos algumas questoes de-licadas com respeito a relacao entre Ciencia e Religiao.

Por fim, apos tecer as consideracoes finais, preparamosum apendice so para os curiosos e para os que se sentemvocacionados para o estudo das revelacoes de Deus pormeio da Natureza e/ou desejam ser campeoes da CausaCriacionista.

2 Origens

Uma ideia comum a muitos criacionistas e a de que Ge-nesis 1 meciona a criacao do Universo (“os ceus e a terra”).O texto hebraico original nao nos permite afirmar isso.

As palavras traduzidas como ‘ceus’ e ‘terra’ em Genesis,capıtulo 1 e verso 1, possuem um significado um tantovago. A palavra traduzida como ‘terra’ indica essencial-mente solo, podendo tambem significar uma regiao. Con-siderando o contexto do capıtulo, contudo, e perfeitamenteaceitavel entender esta palavra como aplicando-se a partesolida ou, possivelmente, as partes solida e lıquida do pla-neta.

A palavra traduzida como ‘ceus’ indica o que esta acimade nossas cabecas, a regiao em que flutuam as nuvens e naqual os passaros atualmente voam. Pelo contexto, pode-mos entender esta palavra como significando a atmosferada Terra, podendo incluir algo mais. A priori, nao hacomo saber quanto alem da atmosfera pode estar incluıdoneste significado. De qualquer forma, nao se pode tercerteza de que este significado abranja o Universo. De fato,esse sentido seria incompatıvel com outros textos bıblicos.

E mesmo que o verso 1 contivesse uma clara referenciaao Universo como um todo, nao haveria como saber quantotempo se passa entre o momento da criacao do Universo e asemana da criacao. Em suma, um exame da Bıblia que naoseja por demais superficial mostra que nao ha qualquerbase bıblica para afirmar-se que o Universo temcerca de seis mil anos de idade ou que Genesis 1 refere-se a criacao do Universo. Muito pelo contrario. Certostextos bıblicos (como Jo 38:4–7) sugerem que, quando oCriador “lancou os fundamentos da Terra”, ja existiam atemesmo seres inteligentes em outras partes do Universo. E,mesmo que nao aceitemos isso por alguma razao obscura,pelo menos precisamos reconhecer que Genesis 1 nao nosda qualquer informacao sobre quando e como o Universofoi criado. Este relato fala da Terra e imediacoes. O restoe especulacao.

Existe uma ideia ainda mais absurda nesta area: o mo-delo do “Big Bang” seria uma grande explosao que deuorigem a vida! Com perdao da franqueza, essa ideia ape-nas demonstra total desconhecimento do assunto.

Por causa deste e de outros equıvocos similares, tantono que diz respeito as evidencias bıblicas quanto no quetange as evidencias fısicas, muitos criacionistas pensamser de sua obrigacao combater a ideia da grande explosaoinicial, a qual, na verdade, significa essencialmente umacriacao rapida. Sem perceber a propria contradicao, asmesmas pessoas que julgam um dever combater o “BigBang” tambem creem que Deus criou o Universo em umasemana. Em Fısica, isso seria chamado de ‘criacao explo-siva’, isto e, rapida; e seria muito grande: afinal, trata-seda criacao do Universo. Em suma, se cremos em umacriacao rapida do Universo, cremos em uma “grande ex-plosao inicial”, ou “Big Bang”.

A estas alturas, alguem poderia questionar: “Um mo-mento: quando falamos em ‘Big Bang’ nos referimos a ummodelo especıfico que tenta descrever os instantes iniciaisda existencia do Universo, o que, de acordo com os as-trofısicos evolucionistas, teria ocorrido ha bilhoes de anosatras. Nao e qualquer tipo de grande explosao inicial.”

Pois esse e um bom ponto de partida para comecarmosa entender o que os fısicos (os que lidam com esta area, na-turalmente) querem dizer com ‘Big Bang’. Trata-se de ummodelo matematico (ou seja, uma descricao em linguagemmatematica) que se encaixa em dados observacionais.

Os modelos matematicos costumam conter mais infor-macoes e possibilidades do que outros tipos de modelos.Um dos motivos disto e que as linguagens matematicassao infinitamente mais poderosas do que as linguagenscomuns. Geralmente, ha uma tremenda perda (usual-mente infinita) de informacao ao tentarmos traduzir algode uma linguagem matematica para uma linguagem colo-quial — como a lıngua portuguesa, ou inglesa, ou alema,ou grega, ..., que sao essencialmente equivalentes entre si enao suportam uma serie de possibilidades das linguagens

2

Page 3: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

matematicas. (Nao confundir linguagem matematica comuma sequencia de calculos aritmeticos.)

As pessoas (leigas) tendem a examinar a traducao ver-bal de um modelo para tirar suas conclusoes, ate porquequase sempre lhes faltam os conhecimentos matematicosnecessarios para entender o modelo em si. O modeloda grande explosao inicial, por exemplo, tem sofrido asmaiores calunias por causa desse procedimento inade-quado.

Se nao conhecemos o modelo, e ainda mais importanteque estudemos alguns itens estrategicos com o fim de po-der formar uma opiniao mais bem fundamentada.

3 Questoes Importantes

As questoes que poderıamos levantar em relacao a estemodelo sao muitas. Podemos citar algumas das mais im-portantes para os criacionistas.

1. Como e o modelo do ‘Big Bang’? (Se nao sou capazde lidar com a expressao matematica deste modelo,nao estou habilitado em primeira mao para apoia-loou nega-lo: seria necessario consultar especialistas emRelatividade Geral e Cosmologia. Mas como saber emquem confiar?)

2. Que evidencias tendem a apoiar este modelo? De queoutras maneiras elas poderiam ser interpretadas?

3. Que evidencias tendem a negar este modelo? Essasevidencias estao bem estruturadas ou sao apenas con-jecturas qualitativas? Se sao evidencias bıblicas, de-correm de metodos rigorosos de estudo da Bıblia ouapenas estao seguindo um modismo teologico de in-terpretacao?

4. E possıvel ser criacionista teısta, crer no relato bıblicoda criacao especial, considerando literal a semana deGenesis 1 e ainda assim aceitar a viabilidade do mo-delo do ‘Big Bang’?

5. Quais sao as implicacoes de considerar-se a semanade Genesis 1 como sendo o perıodo em que o Uni-verso foi criado e estruturado? Essas implicacoes saocompatıveis com as leis de Deus (leis fısicas e moraisja conhecidas)? A proposito, Deus viola Suas leis devez em quando? Sera que nao houve violacao de leisfısicas na semana da criacao?

Poderıamos levantar muitas outras questoes como essas,cujas discussoes e respostas encheriam muitos livros. Nomınimo, pecisarıamos de uma serie de artigos para podertratar destes problemas sem que ficassemos por demaispresos a superficialidade.

Embora estudar tudo isto pareca uma tarefa gigantesca,estas sao questoes importantes que exigem esclarecimen-tos, visto como tantos tem-se aventurado nesta area semconhecimento de causa, divulgando ideias que nao favore-cem o Criacionismo, ainda que, a primeira vista, parecamestar em conformidade com a Bıblia.

Com tudo isto em mente, temos a intencao de prepararalguns artigos nos quais comentaremos argumentos de cri-acionistas que se opoem ferozmente ao modelo da grandeexplosao inicial. Nestas oportunidades, tentaremos es-clarecer os problemas que surgem na argumentacao e oque podemos saber, de fato, sobre o assunto.

Neste artigo, limitar-nos-emos a fazer uma discussaopreliminar sobre alguns topicos indispensaveis ao bom en-tendimento do assunto da criacao e da evolucao do Uni-verso. Os temas abordados aqui deverao servir de apoiopara o entendimento dos artigos que pretendemos publicarsobre a grande explosao inicial.

Ainda nao e o momento de respondermos as questoesque colocamos, mas elas nos serao uteis ao longo dosproximos artigos.

3.1 Ideias Preliminares

O modelo do ‘Big Bang’ (grande explosao inicial) existeno contexto de uma area da Fısica chamada de ‘Relativi-dade Geral’.

Se uma pessoa diz que entende de ‘Big Bang’, mas naosabe lidar com as equacoes diferenciais tensoriais da Re-latividade Geral e nem com os metodos matematicos daFısica Quantica, esta pessoa, no mınimo, esta enganada;fala de algo que nao compreende.

O modelo do ‘Big Bang’ so tem vida com estasequacoes tensoriais, pois ele e feito delas.

Para ter-se uma ideia do assunto, e preciso, no mınimo,ter-se uma nocao, ainda que meramente qualitativa, sobreo que vem a ser a Relatividade Geral. Tambem e impor-tante ter-se uma ideia sobre o que significa a expressao‘Fısica Quantica’. Este nome, que pertence a uma famıliade teorias cientıficas bem fundamentadas, tem sido usadopara defender uma serie de ideias mirabolantes baseadasem supersticoes as quais ha quem deseje atribuir um cunhocientıfico. Isto torna ainda mais importante conhecer o as-sunto um pouco mais de perto para poder evitar a “char-latanice” (ha pessoas cobrando caro por cursos falsamentebaseados em Fısica Quantica; tem acontecido, por exem-plo, com alguns cursos de “Medicina Quantica”.)

Sem pelo menos estas nocoes basicas (ou algo equiva-lente), sequer pode-se pretender fazer uma apreciacao con-fiavel sobre as evidencias disponıveis nesta area. De fato,algumas das evidencias podem ate parecer sem significadoquando nao sao comparadas com alguns detalhes tecnicosdo funcionamento da Natureza.

3

Page 4: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

3.2 Relatividade

A Relatividade e uma area da Fısica que trata essen-cialmente do funcionamento do espaco (existencia dedistancias e formas) e do tempo (existencia de sucessaode eventos, causa e efeito). Para a raca humana, ela re-presenta uma libertacao em relacao a varias das limitacoesimpostas pela intuicao, que usualmente se desenvolve emum ambiente fısico extremamente restrito e altamente con-taminado por filosofias mıopes e autistas, que e o caso davida humana na Terra.

3.2.1 Relatividade Especial

Durante a vida de uma pessoa normal que vive na Terra,ela passa por uma serie de experiencias que, do ponto devista da Fısica, e extremamente restrito. E a intuicao hu-mana desenvolve-se no contexto das experiencias vividas,fazendo algumas generalizacoes rudimentares e, as vezes,equivocadas.

Uma das generalizacoes equivocadas presentes na in-tuicao da maioria das pessoas e a ideia de que o tempoe absoluto, isto e, se o tempo que se passa entre dois even-tos para mim for de dez minutos, o intervalo de tempoentre estes dois eventos e de dez minutos para qualqueroutro observador que testemunhar os mesmos fenomenos.Eventos que sao simultaneos para um observador sao si-multaneos para todos. Mas isso so e verdade se todos osobservadores tiverem velocidades relativas extremamentebaixas (se comparadas a da luz no vacuo) e em camposgravitacionais extremamente fracos. A vida dos humanosna Terra satisfaz a essas condicoes restritivas.

Outra ideia equivocada e a de que o espaco nao podeapresentar curvaturas. Por exemplo, poderia uma casa sermaior por dentro do que por fora? Seria possıvel encontrarduas retas que fossem paralelas em uma regiao pequenamas que deixassem de se-lo a uma certa distancia dali? Asoma dos angulos internos de um triangulo e sempre centoe oitenta graus? Podemos resumir todas estas questoes naseguinte: o geometria do espaco fısico e euclidiana?

Mas o que vem a ser Geometria Euclidiana? E um mo-delo matematico que corresponde aquelas nocoes geome-tricas intuitivas que as criancas estudam nas escolas.

Ate o seculo dezenove, estudavam-se as leis da Naturezasupondo-se que o tempo fosse absoluto e que o espacofosse euclidiano. E uma boa aproximacao para muitospropositos, mas a medida que o conhecimento se aprofun-dava, ficava cada vez mais evidente que algo nao estavacompletamente certo.

Uma das descobertas mais importantes responsaveis portrazer a tona o problema do espaco-tempo foi a das leisdo Eletromagnetismo. Varios pesquisadores haviam co-letado dados experimentais a respeito do magnetismo,da eletricidade e de relacoes entre ambos. Mas estasinformacoes tornaram-se realmente significativas quando

James Maxwell sistematizou-as em uma teoria cientıfica:a Teoria Eletromagnetica. Esta teoria foi resumida emquatro equacoes diferenciais que descrevem os fenomenoseletromagneticos que existem por todo o Universo, in-cluindo os que nos fazem funcionar.

Hoje em dia, podemos resumir esta teoria em apenasduas equacoes (usando a Geometria Diferencial). Pode-mos tambem representa-las por meio de uma unica ex-pressao, chamada de densidade lagrangiana. (A densidadelagrangiana e algo que surge quando utilizamos matema-ticamente o princıpio de que tudo o que Deus faz e muitobom, que e uma das duas leis mais fundamentais da Na-tureza.)

Ate este ponto, tudo bem. O problema e que a Teo-ria Eletromagnetica nao se encaixava bem com algumasideias vigentes, inclusive as do proprio Maxwell (este tipode coisa so ocorre com teorias cientıficas, por terem vidapropria independente de seu autor; nao sao meras criacoesda mente humana: sao maneiras de sistematizar algo ex-terno).

Por exemplo, as equacoes do Eletromagnetismo afirmamque a luz (que e um fenomeno eletromagnetico) no vacuoviaja a uma velocidade de exatamente 299792458 m/s.Mas as equacoes geram sempre este resultado independen-temente da velocidade de deslocamento do aparato usadopara medir a velocidade da luz, o que nao parecia fazersentido.

Maxwell imaginou que essa deveria ser a velocidade daluz em relacao a um meio invisıvel, que permeia tudo, aoqual chamou de “eter luminıfero”. Se isso fosse verdade,seria, por exemplo, possıvel medir a velocidade da Terraao viajar pelo eter por meio de experiencias com luz.

Diversos experimentos deste tipo foram projetados epostos em pratica, dentre os quais destacam-se os efetu-ados com o interferometro de Michelson, o qual conseguedetectar com grande precisao diferencas de velocidade daluz em direcoes diferentes.

Mas todos os experimentos indicaram que nao existeo tal eter luminıfero. Indicaram tambem que qualquerobservador que medir a velocidade da luz no vacuo obterao mesmo resultado, independentemente da velocidade dafonte de luz ou do observador.

Isto parecia absurdo. Se um raio de luz afastar-se demim a 299792458 m/s e outro observador perseguir o raioa uma velocidade de 299792000 m/s em relacao a mim, eleainda medira a velocidade do raio como sendo 299792458m/s em relacao a ele, e nao apenas 458 m/s, como in-dicaria o “bom” senso. Algo devia estar errado.

Voltando as equacoes, percebeu-se que elas indicavam,neste caso, que o tempo sofre dilatacao e o espaco sofrecontracao com velocidades altas em relacao a da luz novacuo. Lorentz foi o cientista responsavel por publicaressas conclusoes, mas pensava-se que fossem apenas pe-culiaridades das equacoes de Maxwell, algo que poderia

4

Page 5: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

ser corrigido no futuro por uma teoria mais avancada.Pensava-se que este efeito afetasse apenas fenomenos ele-tromagneticos.

Apos fazer sua propria investigacao, Albert Einsteinpercebeu que havia algo mais fundamental nestes feno-menos do que uma mera peculiaridade na maneira eficazde fazer os calculos.

Ele resolveu entao verificar o que aconteceria se nao su-pusessemos a priori que o tempo e as distancias sao coisasabsolutas. Ao inves disso, ele tomaria como pontos de par-tida os dois seguintes postulados.

— Todos os observadores inerciais (sem aceleracao) saoequivalentes, isto e, obterao como resultados de seus ex-perimentos as mesmas leis e constantes fısicas universais.

— A velocidade da luz no vacuo e uma constante uni-versal.

O proximo passo consistiu em verificar as consequenciasmatematicas mais imediatas destes axiomas (o que formao corpo de uma teoria cientıfica).

A teoria assim formada chama-se de ‘Teoria Especial daRelatividade’, ou simplesmente ‘Relatividade Especial’.

O problema e que, de acordo com as consequencias ma-tematicas destes postulados, nem o tempo e nem o espacosao absolutos. Dois observadores diferentes podem medirintervalos de tempo diferentes entre dois eventos e nenhumdos dois tera mais razao do que o outro. Essas e outrasideias causaram desconforto a princıpio.

Apos divulgada, esta teoria foi bastante criticada. Ima-ginavam alguns que ela gerava contradicoes. Entre outros,foi proposto o famoso “paradoxo dos gemeos”. Vejamosdo que se trata.

Suponhamos que dois irmaos gemeos, Joao e Jose, te-nham 20 anos de idade. Joao embarca em uma nave espa-cial e viaja a 99,98% da velocidade da luz ate um sistemaestelar que fica a 10 anos-luz de distancia da Terra. Poucodepois de chegar la, o astronauta inverte o curso da navee inicia sua viagem de retorno a Terra.

Agora Joao esta de volta a Terra. Do ponto de vista deJose, Joao fez uma viagem que durou aproximadamente20 anos. Jose esta agora com 40 anos de idade.

Mas o problema fica interessante quando usamos a Re-latividade Especial para calcular o tempo de duracao daviagem do ponto de vista de Joao: menos de 5 meses. Joaoainda esta com 20 anos de idade. Seu irmao gemeo estaquase 20 anos mais velho do que ele.

E uma previsao curiosa da teoria, mas onde esta a con-tradicao? Um dos postulados da Relatividade Especialnao afirma que todos os observadores sao equivalentes?Podemos imaginar entao que, do ponto de vista de Joao,ele permaneceu parado dentro da nave enquanto via aTerra se afastando ate chegar a 10 anos-luz de distancia,comecando a voltar em seguida ate que ambos se encon-trassem. Joao ve a Terra fazendo uma viagem de 20 anos,ida e volta. Mas Joao calcula o tempo que teria se passado

para seu irmao: menos de 5 meses. Entao e Joao quemenvelhece mais do que Jose!

O que acontece entao na pratica? Ambos encontram-secom a mesma idade? Um deles esta mais velho no final?Qual? Pode-se levar a serio uma teoria dessas?

Bem, este argumento nao passa de uma falacia. E umfalso paradoxo que so existe se misturarmos a Relativi-dade Especial com um raciocınio descuidado, como muitosfazem com o “Big Bang”.

Mas onde esta o descuido? Em primeiro lugar, os obser-vadores nao sao todos equivalentes: so os inerciais. Joaonao foi um observador inercial na viagem, pois ele sofreuaceleracao ao sair da Terra (ganhou velocidade em direcaoao seu destino) e sofreu aceleracao ao iniciar sua viagemde volta a Terra. Segundo a Relatividade, Joao envelhe-ceu menos de 5 meses e realmente voltou para a casa compouco mais do que a metade da idade de Jose.

Mas permanece a pergunta: como ficam as coisas doponto de vista de Joao durante sua viagem? De acordocom a Relatividade Especial, enquanto Joao acelera suanave, percebe a distancia entre a Terra e o seu destinocomo ficando cada vez menor, ate chegar a ser pequenao suficiente para ser percorrida em dois meses e pouco.Quando chega ao seu destino e desacelera, o espaco pareceesticar-se novamente. O mesmo acontece em sua viagemde volta.

(a) • 10 anos−luz // •

(b) •2 meses−luz// •Distancia entre a Terra e o destino de Joao do ponto devista (a) de Jose e (b) de Joao.

Outros paradoxos foram propostos, mas todos eram fal-sos. De la para ca, literalmente milhoes de experimentosforam feitos, todos confirmando a Relatividade Especial.Ate mesmo muitos aparelhos nao funcionam quando pro-jetados de acordo com o senso comum: so funcionam se osprojetarmos segundo as especificacoes da Relatividade Es-pecial. O senso comum so funciona na pratica quando suasprevisoes estao suficientente proximas as da RelatividadeEspecial.

E interessante ressaltar o fato de que, embora a Relati-vidade tenha mostrado que o espaco e relativo e o tempotambem, ela nos apresenta algo absoluto que substituiesses conceitos relativos: o espaco-tempo. Distancias en-tre eventos (pontos que tem uma localizacao no espaco eno tempo, como um ‘flash’ de uma maquina fotograficaque ocorre em certo instante em certo local), calculadasde uma certa maneira especial sao absolutas: todos os ob-servadores obterao o mesmo resultado.

Fica aqui um aviso importante: alguns filosofos afirmamque a Teoria da Relatividade invalidou a Teoria de New-

5

Page 6: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

ton (Mecanica Newtoniana). Essa concepcao e falsa. AMecanica Newtoniana foi confirmada experimentalmentee nao pode mais ser invalidada dentro de seus limites deeficacia, assim como a Relatividade Especial. Se a Relati-vidade discordasse da teoria Newtoniana nessa regiao devalidade, a Relatividade deveria ser descartada, uma vezque a teoria de Newton fornece resultados experimental-mente corretos (e este e o criterio final de validade). O queocorre e que a Mecanica Newtoniana e uma excelente apro-ximacao para descrever certos aspectos do mundo fısico,mas a Relatividade Especial e uma aproximacao ainda me-lhor. Em alguns tipos de situacoes extremas (que escapamaos limites de validade da teoria newtoniana), a Mecanicade Newton precisaria de ajustes, mas a Relatividade Espe-cial ainda funciona bem. O que ocorre e que um conceitoequivocado de ‘teoria cientıfica’ tende a gerar toda umaserie de postulados inadequados que povoam livros de Fi-losofia da Ciencia, o que ja chegou a confundir ate fısicosfamosos que, inicialmente, nao perceberam que estavamconcordando com um argumento filosofico coerente masbaseado em falsas premissas. Mas essa e uma outra longahistoria.

Existem situacoes em que nao basta a Relatividade Es-pecial para descrever a mecanica (comportamento) dos sis-temas fısicos. E o caso de ambientes onde existe gravidade.O que e, afinal ‘gravidade’? Bem, materia atrai materia.Essa atracao chama-se gravidade. Mas como funciona essaatracao? O que faz com que a Terra nos atraia, por exem-plo? E aı que entra em cena a Relatividade Geral.

3.2.2 Relatividade Geral

Anos depois de publicar seu estudo sobre a RelatividadeEspecial, Einstein publicou a ‘Teoria Geral da Relativida-de’ (que apelidamos de ‘Relatividade Geral’), que final-mente desvendou o misterio da gravidade: o que e e comofunciona (pelo menos em nıvel macroscopico).

Cada teoria cientıfica utiliza alguma estrutura matema-tica para representar algo. Einstein utilizou uma estruturachamada de espaco pseudo-riemanniano, baseado em estu-dos de um matematico do seculo XIX chamado Riemann.

Basicamente, o que Riemann conseguiu foi, a partir deconhecimentos de Topologia e Geometria, ampliar infinita-mente as possibilidades de espacos geometricos acessıveisa pesquisa. Com isso, os cientistas passaram a ter a pos-sibilidade de ir alem da Geometria Euclidiana e conhecerintimamente novas fascinantes possibilidades.

Com estes instrumentos matematicos (a geometria deRiemann e o calculo tensorial de Ricci), deixou de ser tec-nicamente necessario supor que o espaco seja euclidiano.E a nova teoria de Einstein fez uso dessa liberdade.

Ao inves de tentar obrigar o espaco a ser euclidiano e otempo a ser absoluto, como fazem a Mecanica de Newtone o senso comum, a Relatividade Geral nao impoe essasrestricoes ao espaco-tempo.

Usando-se uma especie de generalizacao do princıpioda conservacao de energia (que provem do fato de queas leis fısicas sao as mesmas enquanto durar o tempo) eum teorema da Geometria Diferencial que diz que a me-dida da fronteira de uma fronteira e zero, pode-se obteruma equacao tensorial capaz de nos dizer como funcionao espaco-tempo, a gravidade e, de quebra, nos fornecerinformacoes valiosas sobre a evolucao do Universo desdepouco depois de sua criacao.

A equacao assim obtida e a chamada ‘equacao de Ein-stein’. (Nao confundir com energia igual a massa vezesvelocidade da luz ao quadrado — aquilo e apenas um dosresultados da teoria. Ver apendice.)

De acordo com essa equacao (que pode ser identificadacom a Relatividade Geral quando as coisas sao colocadasno devido contexto), a gravidade e um efeito causado pelacurvatura do espaco-tempo, principalmente do tempo.

Para termos uma ideia do que se trata, primeiro, pre-cisamos desenvolver uma nocao intuitiva sobre curvaturade um espaco. Imaginemos uma cama elastica bem esti-cada, daquelas que se usam em apresentacoes de circo.

Quando bem esticada, ela e aproximadamente umaparte de um plano, que e um tipo de espaco euclidiano.Quando colocamos um objeto pesado sobre a cama elasti-ca, o objeto causa um afundamento na cama. A superfıcieda cama elastica passara a ter uma curvatura. Na pratica,a cama elastica apresenta alguma curvatura por causa doproprio peso, mesmo sem objetos sobre ela.

Uma cama elastica e um exemplo de superfıcie curva,mesmo quando nada ha sobre ela.

Outro exemplo de superfıcie curva e a de uma esfera,uma bola. Na Geometria Euclidiana, por exemplo, se so-marmos os angulos internos de um triangulo, o resultadosera 180. Mas se desenharmos um triangulo sobre umasuperfıcie esferica, a soma desses angulos sera maior do queisso. Ainda a tıtulo de exemplo, tracemos uma linha queuna o polo norte de uma esfera ate seu equador (seguindo

6

Page 7: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

sempre a trajetoria mais reta possıvel sobre a superfıcieesferica). Ao chegar ao equador, tracemos outra linha quepercorra um quarto do equador. Unimos entao esta ultimaextremidade com o polo norte, conforme a ilustracao. To-das estas tres interseccoes formam angulos retos entre si.A soma dos angulos internos deste triangulo e 270.

A soma dos angulos internos de um triangulo desenhadosobre uma superfıcie esferica e maior do que 180.

Gauss, um dos maiores matematicos de todos os tempos,orientador de Riemann, ja suspeitava, no seculo XIX, queo espaco no qual vivemos nao e exatamente euclidiano.Chegou a fazer experimentos para testar sua ideia, masas tecnicas experimentais da epoca nao apresentavam aresolucao suficiente para detectar esse tipo de diferenca.Hoje em dia, ja e possıvel medir isso e comprovar queGauss e Einstein estavam certos.

Quando me perguntam como funciona a gravidade,gosto de fazer a seguinte comparacao. Imagine que voceesteja dirigindo um veıculo a 80 km/h em uma rodoviareta, sem curvas ou declives. De repente, um dos pneuscomeca a esvaziar-se. Voce sente que o veıculo comeca adesviar-se para o lado do pneu que se esvazia. Quandomais o pneu se esvazia, maior e a tendencia do veıculo dese desviar para aquele lado e voce precisa compensar cadavez mais fazendo forca com o volante no sentido contrario.Por que acontece isso? E porque o pneu vazio tende aandar mais devagar do que os demais. Se uma roda tendea parar e a outra, ao seu lado, tende a continuar, a quecontinua leva aquele lado do veıculo mais para a frente doque o lado da roda que esta mais lenta. O resultado e umgiro do veıculo no sentido da roda que esta mais lenta.

O fenomeno gravitacional e semelhante. A gravidadee essencialmente uma distorcao do tempo. Quanto maisnos aproximamos de uma alta concentracao de energia,mais devagar flui o tempo no local em que estamos. As-sim, quando estamos em pe, por exemplo, o tempo passaligeiramente mais rapido em nossas cabecas do que em nos-

sos pes. Nossos pes tendem a viajar para o futuro mais de-vagar do que nossas cabecas. E uma diferenca ınfima mas,como viajamos para o futuro a uma velocidade altıssima,ela e suficiente para exercer uma forca consideravel emdirecao a Terra.

Um exemplo de aplicacao pratica da Relatividade Ge-ral e o sistema GPS (Geo-Position System). Um pequenoaparelho recebe sinais de satelites e os utiliza para deter-minar sua posicao na superfıcie da Terra. Para funcionarcorretamente, o sistema precisa levar em conta o fato deque o tempo passa de maneira diferente para os satelites epara o aparelho em Terra, e ainda o fato de que o espaco-tempo e curvo nas vizinhancas da Terra. Mas existem mi-lhares de outras aplicacoes menos populares reafirmando acada dia a excelente aproximacao com que a RelatividadeGeral descreve o espaco-tempo.

A equacao de Einstein nao afirma que o espaco sejanao-euclidiano, mas permite-nos calcular sua curvatura emcada ponto e em cada situacao. Entao podemos saber emque casos podemos considera-lo como aproximadamenteeuclidiano e em que casos tal aproximacao e inaceitavel.Alem disso, mesmo nos casos nao-euclidianos temos os ins-trumentos matematicos para lidar com o espaco-tempo demaneira relativamente confortavel.

Por exemplo, se quisermos estudar o Universo como umtodo, como se faz na Cosmologia, e se quisermos fazerum estudo serio, somos, no mınimo, obrigados a usar aequacao de Einstein ou algo mais avancado que venha aser descoberto.

Nao se pode falar em “Big Bang” com conhecimentode causa quando nao se tem fluencia no uso da equacaode Einstein ou equivalente, pois a historia do Universoe regida pelo comportamento de sua curvatura, a qual edescrita por um tensor (uma entidade matematica) regidopela equacao de Einstein.

Um dos erros cometidos por muitos autores criacionistase o de imaginar a grande explosao inicial ocorrendo emum espaco euclidiano. Isso em si ja e desastroso, masmuitos ainda fazem uma salada de frutas dizendo que aconcentracao inicial da materia do Universo formaria umburaco negro antes que pudesse expandir-se, e falam issoem um contexto em que supunham implicitamente que oespaco fosse euclidiano.

Nao existem buracos negros em espacos euclidianos.Alem disso, quando se leva em conta a estrutura do es-paco-tempo, esses argumentos demonstram-se totalmentedescabidos.

O que ocorre normalmente e que tais autores parecemnem saber o que seria uma geometria nao-euclidiana. Eperda de tempo tentar argumentar sobre o “Big Bang”sem sequer conhecimentos elementares de geometrias rie-mannianas e Calculo Tensorial, os quais, em termos deCosmologia, correspondem a alfabetizacao mınima de queum pesquisador serio necessita.

7

Page 8: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

3.3 Cosmologia

Conforme vimos, se desejamos estudar Cosmologia, pre-cisamos primeiro estudar, no mınimo, Relatividade Ge-ral. Conhecimentos de Geometria Diferencial sao extrema-mente bem-vindos (ja que servem de base para a Relativi-dade Geral e tendem a esclarecer, aprofundar e simplificarmuitos assuntos, mesmo em areas como Termodinamica,Mecanica ou Eletromagnetismo).

Um dos criterios mais importantes que podemos utilizarpara saber se um modelo cosmologico e viavel do pontode vista fısico e verificar se ele nao viola a equacao deEinstein. Se violar, deve ser descartado. Caso contrario,deve ser submetido a outros testes de coerencia. Assimcomo as leis de Newton, a Relatividade Geral foi testada eaprovada experimentalmente (como sendo uma excelenteaproximacao), e nao pode ser negada. Quaisquer teoriasou modelos que discordem da Relatividade Geral em suaarea de validade sao incompatıveis com os dados observa-cionais e nao devem ser levados a serio.

Se desejamos estudar os primeiros instantes da historiado Universo, sera indispensavel tambem, no mınimo, umconhecimento razoavel da Teoria Quantica de Campos,que nos permite estudar aspectos extremamente impor-tantes nao abrangidos pela Relatividade Geral. O mesmoque dissemos sobre a validade da Relatividade Geral,aplica-se tambem a Teoria Quantica de Campos.

4 Fısica e Teologia

Alguns tendem a pensar que as coisas que Deus faz naotem explicacao. Parecem pensar, por exemplo, que, se ex-plicarmos um milagre por meio de leis naturais estaremosdescartando a Deus da explicacao. Neste ponto, muitosevolucionistas e criacionistas concordam.

Que ateus pensem assim e compreensıvel. Mas criacio-nistas nao podem pensar dessa maneira coerentemente. Omaior milagre que existe e o Universo e suas leis. A e-xistencia de leis fısicas e um milagre. Deus fez e faz isso.Como podemos entao definir milagre como sendo uma vi-olacao de leis fısicas?!

Algumas pessoas parecem pensar que, de alguma forma,fe e razao sao coisas opostas. Uns falam como se o prin-cıpio de testar tudo antes de aceitar fosse apenas uma mainfluencia do racionalismo (“ponde tudo a prova; retendeo que e bom”, I Tessalonicenses 5:21; ver tambem Atos17:11). Outra perversao e imaginar que ter fe e acreditarem algo com pouca ou nenhuma evidencia. Este conceitoperverso de fe (que alguns pensam basear-se em Hebreus11:1) pode levar as pessoas a rejeitar a Bıblia ou a re-jeitar a Ciencia. Em qualquer desses casos, a pessoa estaradesqualificada para entender a relacao entre a revelacao deDeus por meio da Natureza (em linguagem Matematica,isto e, de regularidades) e a revelacao de Deus por meio de

Sua Palavra escrita em linguagem humana. E sem enten-der essa relacao, nao somos capazes de apreciar devida-mente o significado da mensagem criacionista apresentadaem Apocalipse 14, muito menos poderemos cumprir nossamissao de levar essa mensagem ao mundo.

A verdadeira Ciencia nunca entra em contradicao coma Bıblia. Esta afirmacao e valida se definirmos ‘Cienciaverdadeira’ como sendo a aplicacao rigorosa do metodocientıfico e se, da mesma forma, utilizarmos uma rigorosametodologia de exegese bıblica para entender a Bıblia, semjamais esquecer de pedir a orientacao do Espırito Santo,tanto para entender a Ciencia quanto para entender aBıblia.

Tudo o que Deus faz tem uma explicacao, mesmo quenao seja acessıvel aos mortais. Esta explicacao envolve umobjetivo (“por que?” e “para que?”) e uma maneira defazer (“como?”).

Ao estudarmos a Bıblia, entendemos mais e mais os ob-jetivos de Deus. Ao estudarmos as leis da Natureza, enten-demos mais e mais como Deus age, os metodos de trabalhoque Ele escolhe. E verdade que a Natureza tambem nos dapistas sobre os objetivos de Deus, assim como a Bıblia nosda pistas sobre como Deus faz as coisas. Mas a diferencaesta na enfase e na quantidade de informacoes uteis paraessas abordagens.

E por isso que a Bıblia lanca luz sobre a Natureza ea Natureza lanca luz sobre a Bıblia. Nao podemos sercriacionistas competentes se nos ativermos somente a umadessas fontes. Ambas sao a Palavra de Deus e devem serestudadas.

Preciso estudar a Natureza para me salvar? Certamenteque nao! Preciso estudar a Natureza para cumprir minhamissao como criacionista? Certamente que sim!

Mas como estudar a Natureza? Sair para um passeiono parque e ouvir os passarinhos cantando, sentir o per-fume das flores, a brisa no rosto, a grama debaixo dospes...? Isso e excelente, inspirador, relaxante, otima opor-tunidade para estar em contato com o Criador, mas issonao e estudar a Natureza.

Seria preciso conhecer teorias cientıficas para entendera Natureza? No Ceu entenderemos todas essas coisas semprecisar de nada disso, sem mesmo precisar estudar, certo?Errado! De onde saiu uma ideia dessas?! Da Bıblia cer-tamente nao foi, pois isso nem de perto se parece com oque a Bıblia descreve como sendo a vida que Deus tempreparado para Seus filhos.

Alguns dizem: “Essas teorias sao substituıdas por coisasmelhores de vez em quando. Portanto, nao sao perfeitas elogo nao serao mais consideradas validas. Vou ficar entaocom meu bom senso que e melhor.” Essas pessoas de-monstram nao conhecer o significado e o grau de profun-didade das teorias fısicas e o quanto a intuicao e a filo-sofia humanas sao menos capazes de lidar com a reali-dade fısica do que as teorias cientıficas. Mesmo as teorias

8

Page 9: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

cientıficas mais primitivas e inadequadas costumam permi-tir aprofundamento e exatidao tremendamente superioresao “bom senso” e a abordagens puramente filosoficas. Eclaro que isso nao faz sentido se confundirmos ‘Ciencia’com ‘Filosofia da Ciencia’, engano esse cometido implici-tamente por diversos autores famosos nessa area.

Podemos comparar essa situacao a de uma pessoa quenao quer viajar de aviao porque alguem pode inventar ummeio de transporte mais rapido no futuro. Ela prefereentao viajar a pe. Tudo bem se for para visitar uma lo-calidade proxima, mas para fazer uma viagem interconti-nental, ela tera problemas.

Assim sao as teorias em Fısica. As novas nao desmentemas antigas, como pensam alguns, mas as aperfeicoam e noslevam mais e mais longe cada vez mais rapido, muitıssimoalem do que a intuicao ou a filosofia humanas podem so-nhar sem auxılio externo.

Quanto a evolucao das teorias, usamos as antigas comodegraus para as novas. Antes de ensinarmos RelatividadeGeral aos estudantes, tratamos de ensinar a Mecanica deNewton.

..........

...........................................

................................

...........................................................................................................................................................................................................................................................................................................................

................................................................Newton .........

.........

........................................................................

........................

.............................

..........................................

........................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................

...............................................................................................................................................................

Relatividade..........................................................................................

........................

.............................

..........................................

........................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................

...............................................................................................................................................................

FısicaQuantica

Diagrama representando esquematicamente as informa-coes que podemos obter da teoria de Newton, da Re-latividade e do que se conhece atualmente sobre FısicaQuantica. A Mecanica de Newton ocupa uma parte dainterseccao entre a Mecanica Quantica e a Mecanica Re-lativista.

A diferenca entre a profundidade de conhecimento queessas teorias cientıficas (mesmo a de Newton) nos podemproporcionar em comparacao com o pensamento comum(ou ate filosofico) e comparavel a diferenca entre a profun-didade de pensamento de um adulto em relacao a de umacrianca que aprendeu a falar ha pouco tempo. Aprendendoa estudar a Natureza por meio destes metodos, aprende-mos muito sobre o amor e a sabedoria de Deus. De fato, asleis de Deus, que se fundamentam no amor, estao impres-sas de maneira indelevel por toda a Natureza. E essas leissao a base de funcionamento do metodo cientıfico. Por-tanto, o amor de Deus e a base da verdadeira Ciencia. (ICorıntios 13:10 a 13. A palavra traduzida como ‘ciencia’na Bıblia significa apenas ‘entendimento’.)

E importante frisar bem isto: mesmo que aconteca deuma teoria fısica tornar-se obsoleta, ainda assim ela serve

como uma introducao para teorias mais avancadas. E as-sim que vamos crescendo. E um processo contınuo, sejaaqui, seja na Nova Terra. Ou sera que vamos desistirde aprender qualquer coisa que nao seja a onisciencia?Seres finitos nunca serao oniscientes, nem aqui e nem naNova Terra. Se alguem preferir esperar pelo conhecimentodefinitivo, boa sorte e ate depois de a eternidade terminar.O que essa pessoa conseguira sera apenas a morte intelec-tual eterna.

O conhecimento humano nas areas que mencionamosainda precisa de aprofundamento, pois os proprios me-todos matematicos que compoe a Relatividade Geral e aTeoria Quantica de Campos parecem indicar que estas saoapenas aproximacoes do que seria uma teoria ideal, queprecisam de ajustes importantes para funcionar bem emconjunto (embora sejam aproximacoes muito boas para amaioria dos casos). E algo semelhante ao que ocorria nofinal do seculo XIX com as teorias conhecidas.

Ainda assim, elas fornecem informacoes valiosas e sao amelhor coisa de que dispomos no momento para conhecerdetalhes tecnicos sobre a maneira com que Deus faz ascoisas, conforme Ele mesmo nos aconselha a estudar emdiversas partes da Bıblia, tais como em Jo 38 e Proverbios.

Ha os que imaginam que basta estudar Teologia (semdeixar a Bıblia de lado, e claro) para entender o Universo.Afinal, a Bıblia ja nao nos informa sobre como Deus fazas coisas?

Isso e um terrıvel engano. A posicao bıblica e diametral-mente oposta a essa. A Bıblia, mesmo sendo a unica re-gra de fe e pratica, contem as informacoes indispensaveis,mais urgentes a salvacao, mas nem todas as mensagens deDeus para nos estao la. A Bıblia concentra-se mais emseres humanos. Mas Deus nao e humano (embora umadas Pessoas da Divindade tenha assumido a natureza hu-mana, mas sem perder a Sua) e nao Se limita a coisas hu-manas. Ha todo um universo de coisas que nao dependemdos humanos mas afetam profundamente a vida humana.Vejamos algo do que a Bıblia nos diz sobre isto.

No livro de Jo, encontramos uma longa discussao teo-logica antropocentrica (parece uma conradicao, mas issoe comum). Jo e seus amigos discutem sobre a justica deDeus, a justica humana, o pecado, a culpa, tecendo con-sideracoes e mais consideracoes sobre o trato de Deus coma humanidade.

Em Jo 38, Deus intervem dizendo que eles estavam fa-lando sobre o que nao entendiam. Para que tipo de assuntoo Senhor desvia-lhes entao a atencao? Fısica, em primeirolugar. Passa tambem pela Biologia. Em suma, chama aatencao deles para o estudo da Natureza.

Notem, eles discutiam questoes que pareciam ser pura-mente humanas, e Deus aparece dizendo que eles falavamsem entendimento e comeca a lhes falar sobre a Natureza.Pessoalmente, entendo a mensagem de Jo 38 da maneiraque se segue.

9

Page 10: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

– Voces nao sabem sequer de onde vem a luz e paraonde ela vai, ou como funciona a gravidade [Ele men-ciona o que mantem as estrelas em suas orbitas] ou atecnologia avancada com que projetei e construı os seresvivos! Voces nao estudam nem essas coisas basicas e aindaousam especular sobre questoes teologicas? Tratem de es-tudar primeiro o que Eu faco no mundo fısico se quiserementender melhor Minha justica.

5 Consideracoes Finais

Uma das principais circunstancias que abrem as portaspara tantos mal-entendidos e a de que diversos autores es-crevem artigos e livros fora da sua area de conhecimento.Nao que isso em si seja um problema, mas a falta de em-basamento tem causado estragos apreciaveis na construcaode argumentos tanto criacionistas quanto evolucionistas.

Esse tambem e um problema extremamente comum emartigos e livros que falam sobre Ciencia e Religiao bemcomo na area da Filosofia da Ciencia. De fato, frequente-mente os autores que falam sobre Ciencia e Religiao pare-cem ter sido educados pelos equıvocos (muitas vezes ateelementares) tao amplamente divulgados ate oficialmentena area da Filosofia da Ciencia. Quando falamos nestesequıvocos, parece que estamos assumindo uma postura dedonos da verdade. Mas tratam-se simplesmente de aspec-tos do nossa vivencia como cientistas que geralmente saomal-interpretados por pessoas de outras areas, pois pos-suem uma formacao que tende a nao levar em conta essesaspectos de maneira funcional. Estao essencialmente con-templando uma tecnologia que para eles e alienıgena e fazpouco sentido e tendem a interpreta-la a luz de algunspreconceitos.

Fica entao, o alerta: se voce deseja aprofundar-se emCiencia ou em modelos cientıficos como o “Big Bang” ouse quer estudar questoes de Ciencia e Religiao ou Cria-cionismo, estude a Bıblia, estude Matematica (especial-mente equacoes diferenciais), leia os livros tecnicos da areae nao busque essas fontes de desinformacao.

Um dos livros que poderıamos recomendar para uma in-troducao a Relatividade Especial, Geral e Cosmologia tempor tıtulo “Essential Relativity” (Relatividade Essencial),de Wolfgang Rindler, editora Springer-Verlag. Nesta obra,o autor apresenta, alem de aspectos historicos e filosoficos,tambem os principais aspectos tecnicos responsaveis pelafuncionalidade dessas teorias. Na ultima parte do livro,e feito um estudo sobre restricoes impostas pela Relativi-dade Geral a teorias cosmologicas possıveis.

Nosso objetivo com estes artigos e o de estimular a co-munidade criacionista a buscar um preparo tecnico a al-tura de sua missao, e os aspectos tecnicos nao serao obti-dos de fontes teologicas, nem filosoficas (exceto em algu-mas circunstancias) e nem de divulgacao para o grandepublico.

6 Apendice

Esta secao e dedicada aqueles que sabem ou desejamsaber mais do que o basico. E uma pequena amostra de al-gumas das coisas que se aprendem durante a alfabetizacaonecessaria a um estudo menos superficial da Natureza.

Ja que as linguagens matematicas sao as unicas conhe-cidas que se demonstram eficientes para nos levar a cer-tos nıveis de profundidade (em qualquer assunto), nao po-derıamos deixar de mostrar, pelo menos, algumas formulasmais diretamente ligadas a alguns dos temas abordadosneste artigo.

6.1 Os Tempos de Jose e Joao

No exemplo dos irmaos gemeos que apresentamos, aformula que regula a relacao entre o tempo que se passapara Joao e o tempo que se passa para Jose e

t′ = t

√1− v2

c2,

sendo v a velocidade de Joao em relacao a Jose, c a veloci-dade da luz no vacuo, t o tempo que se passa para Jose et′ o tempo que se passa para Joao.

A relacao entre as distancias, conforme medidas porcada um, tambem e regulada por uma formula parecida.

D′ = D

√1− v2

c2,

sendo D a distancia medida por Jose e D′ a distanciamedida por Joao.

Estas equacoes nao compoem a Relatividade Especial,mas sao consequencias dela.

6.2 As Equacoes de Maxwell

A maior parte da tecnologia humana baseia-se, de umaforma ou de outra, no Eletromagnetismo.

A propria tecnologia empregada por Deus no projetodos seres vivos baseia-se no Eletromagnetismo.

Ate a existencia de atomos, moleculas e reacoes quı-micas baseia-se nas leis do Eletromagnetismo (trata-se deuma area chamada de Eletrodinamica Quantica). Mas queleis sao essas?

Essas leis podem ser resumidas na forma de quatroequacoes diferenciais vetoriais, chamadas de ‘equacoes deMaxwell’, as quais podem ser expressas da maneira quese segue, sendo que E representa o vetor intensidade docampo eletrico, H representa o vetor intensidade do campomagnetico, ρ representa a densidade de carga eletrica, Jrepresenta a densidade da corrente eletrica e c e a veloci-dade da luz no vacuo.

∇×E = −1c

∂H∂t

, ∇ ·H = 0 ,

10

Page 11: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

∇ ·E = 4πρ , ∇×H =1c

∂E∂t

+4πc

J .

A partir destas equacoes, podemos descobrir que oscampos eletricos e magneticos tridimensionais sao mani-festacoes de uma entidade vetorial de quatro dimensoesque chamamos de ‘vetor do campo eletromagnetico’, repre-sentada pelo sımbolo A. Os campos magnetico e eletricopodem entao ser obtidos de A por meio das equacoes se-guintes.

H = ∇×A , E = −1c

∂A∂t−∇ϕ ,

sendo A o vetor tridimensional formado pelas compo-nentes espaciais de A e sendo ϕ a componente temporalde A (ϕ e o potencial eletrico).

As equacoes do Eletromagnetismo ficam ainda maiscompactas se definirmos o ‘tensor do campo eletromag-netico’, cujas componentes sao dadas por

Fαβ =∂Aβ∂xα

− ∂Aα∂xβ

,

ou, na linguagem da Geometria Diferencial,

F = dA .

Nesta mesma linguagem, as quatro equacoes de Maxwelltransformam-se em duas:

dF = 0 , δF + J = 0 .

Para fazer uma conexao entre as componentes do tensordo campo eletromagnetico e as componentes do campoeletrico e do campo magnetico, notemos que

Fαβ =

0 Ex Ey Ez

−Ex 0 −Hz Hy

−Ey Hz 0 −Hx

−Ez −Hy Hx 0

.

Este e um dos aspectos da evolucao das teorias cientı-ficas: a medida que aprendemos mais sobre Matematica,elas se tornam mais robustas e mais simples de representar.

6.3 O que E Densidade Langrangiana?

Uma das leis mais fundamentais do Universo e a de quetudo o que Deus faz e muito bom (ou otimo, em umalinguagem mais atual). Matematicamente, esta lei podeser expressa da seguinte maneira:

δS = 0 .

Esta e uma equacao de otimizacao. Historicamente, estalei tem sido chamada de ‘princıpio de Hamilton’ e tambemde ‘lei da acao mınima’.

A grandeza S que aparece nesta formula chama-se‘acao’. Ao aplicarmos esta formula para estudar sistemasfısicos compostos por uma infinidade de partes, e util re-presentar a acao da seguinte maneira:

S =∫dΩ L ,

sendo dΩ um elemento de hipervolume (volume em umespaco com um numero arbitrario de dimensoes) no espacorelevante ao sistema que estamos estudando. A grandezaL chama-se ‘densidade lagrangiana’ (em homenagem aofamoso matematico Joseph Luis Lagrange, 1736–1831, quedesenvolveu metodos matematicos para lidar com esteassunto, entre outros) e, se corretamente determinada,contem todas as informacoes relevantes sobre o sistemaem estudo.

Isto pode ser aplicado ao Eletromagnetismo, por exem-plo. Leva-se a densidade lagrangiana a lei de otimizacao eobtem-se como resultado as equacoes que regem o Eletro-magnetismo.

6.4 O que E Fısica Quantica?

Assim como descobriu-se que a Mecanica Newtoniananao era uma boa aproximacao da realidade quando eramrelevantes fenomenos envolvendo altas velocidades emrelacao a da luz, tambem descobriu-se que ela nao euma boa aproximacao quando lidamos com fenomenos domundo das moleculas, atomos e partıculas subatomicas.

Reunindo os estudos experimentais e teoricos de muitoscientistas, foi possıvel descobrir quais tipos de princıpiosmatematicos podem ser usados no estudo dos fenomenosmicroscopicos bizarros que estavam sendo descobertos.

Descobriu-se que, se utilizarmos cuidadosamente umaarea da Matematica que pode ser chamada de ‘Teoriados Espacos Vetoriais’, era possıvel descrever com grandesucesso e exatidao os fenomenos que estavam sendo des-cobertos. E mais ainda: descobriram-se teoricamente(usando os modelos matematicos associados aos espacosvetoriais estudados) outros fenomenos e entidades fısicasate entao desconhecidos. A confirmacao experimental veiomais tarde.

Uma destas entidades e a anti-materia, prevista peloscalculos de Dirac.

Diversos problemas foram resolvidos com esta abor-dagem. Por exemplo: por que existe spin? a luz e feitade ondas ou partıculas? O que e energia? Por que existeo princıpio da incerteza (nao e possıvel medir com infinitaexatidao simultaneamente certos pares de grandezas)? Eo princıpio da exclusao de Pauli (duas partıculas identicasde spin semi-inteiro nao podem ocupar o mesmo estadoquantico ao mesmo tempo: como no ditado popular quediz que dois corpos nao podem ocupar o mesmo espaco aomesmo tempo)?

11

Page 12: O Criacionismo e a Grande Explos~ao Inicial · ... com que argumentos pode-se combater essa id eia de \Big Bang"? ... analogias que fazemos e as guras de linguagem ... cerca de seis

Tudo isto e muito mais foi esclarecido por uma aplicacaoda Teoria dos Espacos Vetoriais chamada de Teoria Quan-tica de Campos. Por exemplo, o princıpio da incerteza deHeisenberg nao mais precisa ser considerado um princıpio,mas pode ser deduzido das propriedades dos espacos ve-toriais. O mesmo se aplica ao princıpio da exclusao dePauli.

Nesta abordagem, todos os estados fısicos sao descritoscomo vetores em um espaco de infinitas dimensoes e to-das as grandezas fısicas sao representados por operadores(operacoes que transformam um vetor em outro vetor, ouseja, sao capazes de alterar estados fısicos). Varias teoriasquanticas adotam esta abordagem, com grande sucesso,mas a Teoria Quantica de Campos o faz de uma maneirabastante mais eficiente do que as anteriores.

Para que se possa estudar o que acontecia nos primeirosinstantes do Universo, enquanto partıculas eram formadase destruıdas, e imprescindıvel um conhecimento razoavelde Fısica Quantica, seja por meio das teorias atuais ou dealgo melhor que venha a ser formulado. Tentar entenderesses fenomenos so filosoficamente ou pela intuicao e perdade tempo. Mas estuda-los pela Fısica Quantica e pelaRelatividade costuma ser util, esclarecedor e ampliadorda capacidade mental mesmo quando nao se conseguem,por meio destes metodos, resolver algumas das questoespropostas.

6.5 A Equacao de Einstein

Para aqueles que ficaram curiosos para ver o formatoda equacao de Einstein e para os que possuem nocoes deCalculo Tensorial, mostramos aqui uma das formas em quepodemos escrever a equacao de Einstein:

Rαβ + gαβ

(Λ− 1

2R

)= κTαβ .

Nesta equacao, Rαβ e o tensor de Ricci, que descrevea curvatura do espaco-tempo (neste contexto, o tensorde Ricci e representado por uma matriz 4 × 4); R e umnumero calculado a partir do tensor de Ricci; gαβ e otensor metrico (descreve as propriedades geometricas doespaco-tempo); Tαβ e o tensor de energia-momentum (des-creve a distribuicao de energia, momentum, e outros itensassociados); κ e uma constante universal (constante de in-tegracao); Λ e a chamada ‘constante cosmologica’ (e umaconstante de integracao tambem e nao pode ser simples-mente descartada por parecer desnecessaria, como queremalguns); α e β sao os ındices das dimensoes do espaco-tempo.

Na pratica, geralmente o uso desta equacao e acom-panhado por algumas hipoteses adicionais. Uma destashipoteses e a de que

gαβ = gβα ,

sejam quais forem os valores dos ındices.Outra hipotese restritiva que pode precisar ser elimi-

nada no futuro e a de que uma certa grandeza geometricachamada ‘torcao’ e nula (nao confundir com curvatura).

7 Para Saber Mais

Se voce ainda nao estudou Calculo Diferencial e Inte-gral, e importante faze-lo se quiser estudar a Natureza.Caso contrario, quase tudo o que diz respeito a maneiracomo Deus faz as coisas sera incompreensıvel para voce.

Mas, se essa barreira ja foi transposta, segue-se umalista de livros uteis para aprofundar e colocar em praticaos conhecimentos de Calculo para entender a Natureza.

1. W. E. Boyce, R. C. DiPrima; Ecuaciones Diferen-ciales y Problemas con Valores en la Frontera; Edi-tora Limusa-Wiley S. A., 1971.

2. M. R. Spiegel; Analise Vetorial (Colecao Schaum); AoLivro Tecnico S. A. (Rio de Janeiro), 1961. (Este livroapresenta, em seu ultimo capıtulo, uma introducao aoCalculo Tensorial.)

3. W. Rindler; Essential Relativity: Special, General andCosmological ; Springer-Verlag, 1977.

4. L. Landau, E. Lifshitz; Teoria do Campo; EditoraMir, 1980. (Este livro, alem de tratar de camposeletromagneticos, apresenta uma introducao a Rela-tividade Especial e a Relatividade Geral, chegando afazer aplicacoes a alguns modelos cosmologicos.)

5. V. A. Fock; Princıpios de Mecanica Quantica; Edi-tora Mir, 1986.

6. T. D. Lee; Particle Physics and Introduction to FieldTheory ; Harwood Academic Publishers, 1981.

7. F. Gross; Relativistic Quantum Mechanics and FieldTheory ; John Wiley & Sons, Inc., 1993.

8. N. D. Birrell, P. C. W. Davies; Quantum Fields inCurved Space; Cambridge University Press, 1992.

12