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1 Ana Beatriz Rutowitsch Bicalho O DANO MORAL AO CONSUMIDOR E SEU FUNDAMENTO CIVIL-CONSTITUCIONAL Rio de Janeiro 2005

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Ana Beatriz Rutowitsch Bicalho

O DANO MORAL AO CONSUMIDOR E SEU

FUNDAMENTO CIVIL-CONSTITUCIONAL

Rio de Janeiro

2005

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2UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATU SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

O DANO MORAL AO CONSUMIDOR E SEU

FUNDAMENTO CIVIL-CONSTITUCIONAL

OBJETIVOS: Avaliar a influência constitucional e civil sobre o direito do consumidor, especialmente no que se refere às questões de indenização por danos morais.

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Gustavo Tepedino, meu eterno orientador e inspirador na busca de aprimoração. Ao Professor Sergio R. Silva, por sua gentileza, disponibilidade e supervisão. À minha sócia, Maria Fernanda Lemos de Figueiredo, por sua colaboração e revisão. À minha tia, Heloisa Maria Taunay Taques Horta, por sua revisão ortográfica.

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4

...Aos meus 3 amores

por iluminarem todos os dias minha vida...

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RESUMO

O presente trabalho foi motivado pelas pesquisas

realizadas durante a elaboração do artigo “Os contratos

de plano de saúde e sua revisão jurisdicional” publicado

na Revista Trimestral de Direito Civil v. 14 e,

posteriormente, em versão atualizada, na Revista de

Direito do Consumidor v. 49.

O processo de pesquisa doutrinária, legal e

jurisprudencial, supervisionado pelo Procurador da

República, Prof. Gustavo Tepedino, originou o interesse

por uma abordagem mais voltada à questão da pessoa do

consumidor e seus direitos à integridade física e moral.

Outra razão instigante para escolha do tema foi a própria

prática profissional, visto que a responsabilidade civil

e os direitos do consumidor apresentam-se como temas

quase quotidianos.

Dessa forma, a escolha do tema resultou de um processo

natural de interesses acadêmicos e profissionais,

tornando-se, ao fim, uma Monografia gratificante e

prazeirosa de ser realizada.

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METODOLOGIA

Uma vez decidida a matéria objeto da Monografia, iniciou-

se o processo de pesquisa doutrinária, onde foi realizada

a seleção de diversos artigos coerentes com a linha de

entendimento da Autora acerca da matéria.

A seleção jurisprudencial, entretanto, ocorreu de forma

genérica, buscando-se retratar os atuais e diversos

julgados acerca dos Danos Morais ao Consumidor nos

Tribunais brasileiros.

A seleção de normas decorreu do próprio tema escolhido,

optando-se, inclusive, pela transcrição de alguns artigos

para facilitar a compreensão da linha doutrinária adotada

e, também, para possibilitar ao leitor a tomada de suas

próprias conclusões.

A elaboração da parte escrita foi feita gradualmente ao

longo dos últimos 6 (seis) meses, sendo reiteradamente

corrigida e relida, como ocorre naturalmente com todo

processo de criação.

Ao final, foi realizada a releitura jurídica e

ortográfica do texto, pelos respectivos profissionais

citados no item “AGRADECIMENTOS”, buscando, assim, um

aprimoramento integral do presente artigo.

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7SUMÁRIO

Introdução...................................................08/09

Capítulo 1 - A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E OS DIREITOS

DA PERSONALIDADE............................................10/29

Capítulo 2 - O DANO MORAL AO CONSUMIDOR................30/51

Capítulo 3 – CONCLUSÃO.....................................52/54

BIBLIOGRAFIA.................................................54/58

ÍNDICE...........................................................59

FOLHA DE AVALIAÇÃO............................................60

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1. INTRODUÇÃO

A Dignidade da Pessoa Humana foi estatuída pela

Constituição Federal de 1988 como valor supremo

inspirador de todo o ordenamento jurídico e possuidor de

eficácia normativa máxima e imediata.

Nessa mesma linha, a citada Constituição Federal previu

ainda a defesa dos direitos da personalidade,

configurando-os como uma cláusula geral de tutela da

pessoa.

O Código Civil de 2002 também tratou de tais direitos

elencando-os de forma não-taxativa entre seus artigos 11

e 21, enfatizando suas características de

intransmissibilidade, irrenunciabilidade,

imprescitibilidade e natureza erga omnes.

A Constituição Federal de 1988 elevou, ainda, a defesa do

consumidor à esfera constitucional de nosso ordenamento,

estabelecendo não apenas que “o Estado promoverá, na

forma da lei, a defesa do consumidor” (art. 5º, XXXII),

mas também erigindo a defesa do consumidor à categoria de

“princípio geral da atividade econômica” (art. 170, V).

Dessa forma, a proteção ao consumidor possui raízes

constitucionais, tendo o Código de Defesa do Consumidor

sido promulgado justamente para possibilitar a sua

melhor defesa, configurando-se como um microssistema

orientador e aplicável a toda relação de consumo,

conforme previsto nos arts. 150, parágrafo 5o e 175,

parágrafo único, da Carta Magna.

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9O primado da dignidade do indivíduo como ponto central do

sistema jurídico fundamenta a tutela jurídica da pessoa

humana e consequentemente, do consumidor brasileiro,

estabelecendo sua reparação sempre que se constituir um

dano à sua integridade física ou moral.

Dessa forma, os danos morais ao consumidor, como se

demonstrará a seguir, fundamentam-se na Constituição

Federal Brasileira e demais normas do atual ordenamento,

devendo a sua indenização ser ampla, ainda que o valor

estipulado caracterize-se como reparatório pelo prejuízo

sofrido.

A presente Monogradia visa abordar a matéria de forma

ampla, analizando tanto suas raízes legais e

doutrinárias, como a atual interpretação dos Tribunais

brasileiros acerca da questão.

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2. A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E OS

DIREITOS DA PERSONALIDADE

2.1. O Princípio Constitucional da Dignidade da

Pessoa Humana

A Constituição Federal de 19881 foi a primeira na

história do constitucionalismo pátrio a tratar

especificamente dos princípios fundamentais, evidenciando

a sua nova e especial função de norma embasadora e

informativa de todo o ordenamento. Dessa forma, o

lesgislador estabeleceu a dignidade2 da pessoa humana

como fundamento do Estado Democrático de Direito3,

reconheceu sua existência e eminência, e classificou-a

como valor supremo4 tanto para para o sistema jurídico,

quanto para a República Federativa do Brasil. Nesse

sentido, José Afonso da Silva5 ensina:

1. A influência filosófica de Kant sobre a Constituição Federal de 1988, foi tratada por José Afonso da Silva em “A Dignidade da Pessoa Humana como valor supremo da democracia”, in Revista de Direito Administrativo v. 212, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 1998, p. 89 a 93. 2. A evolução do conceito filosófico da dignidade é abordado por Maria Celina Bodin de Moraes, “Danos à Pessoa Humana”, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2003, p. 76 a 81. 3. O Princípio da Dignidade foi reforçado, ainda, em outras inúmeras disposições constitucionais, dentre elas, os arts. 226, parágrafo 7; 227 e 230. 4. Tal princípio não representa tão somente um direito à dignidade, vez que esta dispensa postulação ou reinvindicação por ser inata à natureza humana. Ao se abordar o tema, objetiva-se o seu reconhecimento, proteção, respeito e até mesmo promoção.

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11“Poderíamos até dizer que a eminência da

dignidade da pessoa humana é tal que é

dotada ao mesmo tempo da natureza de

valor supremo, princípio contitucional

fundamental e geral que inspiram a ordem

juridica. Mas a verdade é que a

Constituição lhe dá mais do que isso,

quando a põe como fundamento da República

Federativa do Brasil constituída em

Estado Democrático de Direito. Se é

fundamento é porque se constitui num

valor supremo, num valor fundante da

República da Federação do País, da

Democracia e do Direito. Portanto, não é

apenas um princípio de ordem jurídica,

mas o é também da ordem política social,

econômica e cultural. Daí sua natureza de

valor supremo, porque está na base de

toda a vida nacional.”

Observe-se que a Carta Magna6, no intuito de reforçar a

imperatividade das normas que traduzem tal garantia,

instituiu o princípio da aplicabilidade imediata das leis

que tratam da matéria, conferindo-lhes eficácia máxima e

imediata. Dessa forma, assegurou-se a força dirigente e

vinculante do fundamento da dignidade da pessoa humana,

objetivando-se torná-la prerrogativa diretamente

5. José Afonso da Silva, “A Dignidade da pessoa humana como valor supremo da democracia” in Revista de Direito Administrativo v. 212, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 1998, p. 89 a 93. 6. O art. 5º, § 1.º, da Constituição Federal de 1988 estabelece: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

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12aplicável pelos Poderes Legislativo, Executivo e

Judiciário. Note-se que o valor da dignidade humana7

adquiriu eficácia normativa, podendo ser utilizado como

fonte autônoma de solução jurídica, devendo prevalecer

mesmo na hipótese de conflito entre situações jurídicas

subjetivas amparadas8 por princípios hieraquicamente

equivalentes.

Por fim, deve-se mencionar, que a construção do conceito

jurídico de dignidade9 pressupõe a existência e respeito

dos seguintes princípios: direito à igualdade10, à tutela

da integridade psicofísica11, direito à liberdade12 e

direito-dever de solidariedade social.

2.2. O Princípio da Dignidade Humana e os

Direitos da Personalidade

§ 1.º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.” 7.V. a análise acerca dignidade da pessoa humana e seus fundamentos de André Gustavo de Correa de Andrade, “O Princípio da Dignidade Humana e sua Concretização Judicial” in Revista de Direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro vol. 58, Rio de Janeiro: Ed.RT, p. 49 a 51. 8. RESP 439584 ; RESP 439584 ; RESP 439584 ; HC 33229 ; RESP 536876 / MT e RESP 148781 / SP. 9. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu art. 1o, destaca os dois pilares da dignidade humana, leia-se: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.” 10. A igualdade entre os homens representa obrigação imposta aos poderes públicos, tanto no que concerne à elaboração da regra de direito (igualdade na lei) quanto em relação à sua aplicação (igualdade perante a lei). Necessária, porém, a advertência de que o reclamo de tratamento isonômico não exclui a possibilidade de discriminação, mas sim a de que esta se processe de maneira injustificada e desarrazoada. Tratam do assunto: CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, “O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade” Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 1984, p. 49; e CARMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA, “O princípio constitucional da igualdade”, Belo Horizonte: Ed. Lêr S/A, 1990, p. 39-40. 11. V. Maria Celina Bodin de Moraes, “Danos à Pessoa Humana”, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2003, p. 93 a 102. 12. Outro fundamento da dignidade, como já se mencionou, é a liberdade, que em sua concepção mais ampla, permite ao homem exercer plenamente seus direitos existenciais.

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13Fundamentados na tutela privilegiada e especial

instituída à pessoa humana pela atual Carta Magna13, os

direitos da personalidade14 não apenas configuram uma

cláusula geral de tutela da pessoa, como também

representam valor fundamental, unitário e ilimitado do

atual ordenamento constitucional. Gustavo Tepedino15, ao

tratar da correlação entre os direitos da personalidade e

o princípio da dignidade humana, ensina:

“Com efeito, a escolha da dignidade da

pessoa humana como fundamento da

República, associada ao objetivo

fundamental de erradicação da pobreza e

da marginalização, e de redução das

desigualdades sociais, juntamente com a

previsão do parágrafo 2º do art. 5º, no

sentido da não exclusão de quaisquer

direitos e garantias, mesmo que não

expressos, desde que decorrentes dos

princípios adotados pelo texto maior,

configuram uma verdadeira cláusula geral

de tutela e promoção da pessoa humana,

tomada como valor máximo pelo

ordenamento”.

13. A dignidade atua também como um critério interpretativo do teor do atual ordenamento jurídico, influenciando todas as normas vigentes, e especialmente, aquelas acerca dos direitos fundamentais e dos direitos da personalidade. 14. J.M. Leoni Lopes de Oliveira, “Direito Civil - Teoria Geral do Direito Civil”, Rio de Janeiro: Ed. Lúmen Júris, 2001, p. 175, define-os como: “Direitos da Personalidade são direitos subjetivos absolutos que possibilitam a atuação legal, isto é, uma faculdade ou um conjunto de faculdades, na defesa da própria pessoa, nos seus aspectos físico e espiritual, dentro do autorizado pelas normas e nos limites do exercício fundado na boa-fé.” 15. Gustavo Tepedino, “A Tutela da Personalidade no ordenamento civil-constitucional brasileiro” in Temas de Direito Civil, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2001, Rio de Janeiro, p.48.

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14Como regra geral daí decorrente, pode-se dizer que

qualquer norma que desatenda a preocupação do legislador

constituinte acerca da realização da personalidade e da

dignidade da pessoa humana torna-se inconstituional, vez

que ambos os conceitos traduzem valores fundamentais.

Note-se, assim, que o atual ordenamento jurídico

reconheceu a pessoa humana como seu centro nuclear,

fundamentando-se na promoção e proteção do seu

desenvolvimento. Rafael Garcia Rodrigues16 explica:

“A pessoa portanto vale, não podendo ser

confundida com o sujeito de direito, pois

que partem de premissas e tem funções

diversas. O patrimônio que circula

através dos atos de vontade dos sujeitos

de direito perde neste diapasão a

centralidade do ordenamento civil em

detrimento da pessoa, não mais a

conceitual mas como valor, e este valor é

recebido pelo direito como merecedor do

mais alto grau de proteção.”

O reconhecimento da pessoa humana e seus atributos como

valor unitário e central do atual sistema jurídico

enfraquece a tradicional dicotomia direito

público/privado17, ampliando a sua tutela aos cuidados do

Estado e de toda a sociedade. Logo, a normativa civil –

até então atuante somente no âmbito privado – passou a se

ocupar da matéria, tornando-se a um só tempo protetora da

16. Rafael Garcia Rodrigues, “A pessoa e o ser humano no novo Código Civil” in A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2003, p. 32. 17. Interessante análise é realizada por Michele Giorgianni em “O direito privado e as suas atuais fronteiras” in Revista dos Tribunais vol. 747, Ed. RT, p. 35-55.

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15realização do indivíduo e orientadora da atividade

privada.

2.3. Os Direitos da Personalidade

Como mencionou-se, a Constituição Federal de 1988

representa o início de uma nova era no ordenamento

jurídico brasileiro, marcado pela prioridade à dignidade

da pessoa humana orientando toda a atividade privada,

estatal e legislativa para a consecução da promoção do

indivíduo. Dessa forma, a normativa civil passou a

orientar a atividade privada pela concretização e

efetivação da dignidade humana e, ainda, a se ocupar do

momento patológico dos direitos da personalidade18,

realizando a transformação do dano em indenização.

Nessa linha, o Código Civil de 2002 tratou a matéria

entre seus artigos 11 e 21, enfatizando a diferença

existente entre os direitos da personalidade e os demais

direitos subjetivos, visto que tais direitos devem ser

ressaltados em toda situação em que haja ofensa ao valor

da pessoa humana.

O art. 11 do citado Código caracteriza os direitos da

personalidade nos seguintes termos:

18. Tamanha é a importância destes direitos, que Pietro Perlingieri os caracteriza como um valor fundamental baseado em uma série de situações existenciais, série esta, aberta, uma vez que pode mudar de maneira incessante.

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16“Art. 11. Com exceção dos casos previstos

em lei, os direitos da personalidade são

intransmissíveis e irrenunciáveis, não

podendo o seu exercício sofrer limitação

voluntária.”

Observe-se que as caracterísiticas elencadas acima já

estavam presentes na doutrina nacional, muitas vezes

acompanhadas de outras, como a natureza erga omes e a

imprescritibilidade. Cabe lembrar a lição de Caio Mário

da Silva Pereira19:

“Os direitos da personalidade, como

categoria, são considerados como

inerentes à pessoa humana,

independentemente de seu reconhecimento

pela ordem positiva. São igualmente

inalienáveis, vitalícios,

intransmissíveis, extrapatrimoniais,

irrenunciáveis, imprescritíceis,

impenhoráveis, e como tais oponíveis erga

omnes.”

No que tange à reserva existente no citado artigo20, no

sentido de “(...)com exceção dos casos previstos em lei”,

esta deve ser intepretada à luz dos valores

constitucionais relevantes. Dessa forma, a tutela dos

direitos da personalidade deve ser sempre integral,

garantindo a sua proteção em qualquer situação.

19. Caio Mário da Silva Pereira, “Direito Civil – Alguns Aspectos da sua Evolução”, Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2001, p. 25 e 26. 20. Carlos Alberto Bittar, “Os direitos da personalidade”, Rio de Janeiro, Ed. Forense Universitária, 2004, p. 43, comenta: “A cláusula com exceção dos casos previstos em lei funciona mais como artifício para que se evitem as

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17

O artigo 12 do mesmo Código trata, inclusive, da

necessidade de ampliação da tutela dos direitos da

personalidade através da responsabiliade civil. Leia-se:

“Art. 12. Pode-se exigir que cesse a

ameaça, ou a lesão, a direito da

personalidade, e reclamar perdas e danos,

sem prejuízo de outras sanções previstas

em lei.

Parágrafo único. Em se tratando de morto,

terá legitimação para requerer a medida

prevista neste artigo o cônjuge

sobrevivente, ou qualquer parente em

linha reta, ou colateral até o quarto

grau.”

Note-se que a tutela inibitória21 prevista no supra

artigo e seu parágrafo único, visa minimizar ou evitar

danos à personalidade da pessoa, mesmo após o seu

falecimento22.

Antes de se abordar os direitos da personalidade

individualmente tratados entre os arts. 13 e 21, observe-

se que, uma vez compreendida a personalidade humana como

contradições legais em matérias em que é de grande importância a participação voluntária, a doação, autorizadas pelo agente.” 21. A regulação dos danos morais, consubstanciada na proteção dos direitos da personalidade, foi tratada nos arts. 20,186,948,949,950,951,953 e 954 do Código Civil de 2002. 22. Danilo Doneda, “Os direitos da personalidade no Código Civil” in A Parte Geral do Novo Código Civil, Ed. Renovar, Rio de Janeiro, 2003, p. 48 e 49, esclarece: “A jurisprudência já reconhecia a sucessão dos familiar se no direito a esta ação, sendo agora evidenciado o rol dos possíveis legitimados: o cônjuge, qualquer parente em linha reta sem distinção de grau ou então colaterais até quarto grau. Note-se que, mais adiante, o parágrafo único do artigo 20 estabelece um rol de legitimado diverso, que exclui colaterais, a ser observada somente nos casos de ofensa do direito de imagem.”

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18um valor, deve-se salientar a elasticidade implícita à

sua tutela. Pietro Perlingieri23 ensina:

“Elasticidade da tutela da personalidade

significa que não existe um numerus

clausus de hipóteses tuteladas, mas que e

tutelado o valor da personalidade sem

limites, ressalvados os limites postos no

interesse de outra personalidade, não de

terceiros.(...) Elasticidade das

situações pessoais significa portanto que

a sua tutela deve ser estendida também às

hipóteses (juridicamente relevantes) não

previstas pelas leis ordinárias.”

E acrescenta:

“Nenhuma previsão pode ser exaustiva e

deixaria de fora algumas manifestações e

exigências da pessoa que, mesmo com o

progredir da sociedade, exigem uma

consideração positiva. O fato da

personalidade ser considerada como um

valor unitário, tendencialmente sem

limitações, não impede que o ordenamento

preveja, autonomamente, algumas

expressões mais qualificantes como, por

exemplo, o direito à saúde, ao estudo e

ao trabalho.”

23. Pietro Perlingieri “Perfis do Direito Civil – Introdução ao Direito Civil Constitucional”, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2002, p. 156.

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19A previsão legal estabelecida no atual Código, acerca das

diversas hipóteses particulares dos direitos da

personalidade, não representa a fragmentação à proteção

da pessoa humana ou sequer o reconhecimento somente dos

direitos ali elencados. Assim sendo, o magistrado não

poderá negar tutela a quem peça garantias sobre um

aspecto da sua existência, não previsto legalmente, visto

que tal interesse e proteção tornam-se imediatamente

relevantes para todo ordenamento. Maria Celina Bodin de

Moraes24 ressalta:

“Tutelado é o valor da pessoa, sem

limites, salvo aqueles postos no seu

interesse e no interesse de outras

pessoas humanas. Nenhuma previsão

especial pode ser exaustiva, porque

deixaria de fora, necessariamente, novas

manifestações e exigências da pessoa,

que, com o progredir da sociedade, passam

a exigir uma consideração positiva.”

O novo Código Civil estabelece a proteção dos seguintes

direitos da personalidade: o direito à vida25 (art. 15),

o direito à integridade (art. 13 e 14), direito ao nome

(arts. 16, 18 e 19), direito à honra26 e à imagem (arts.

17 e 20) e o direito à vida privada (art. 21).

24. Maria Celina Bodin de Moraes, “ Danos à Pessoa Humana”, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2003, p. 121. 25. San Tiago Dantas, “Programa de Direito Civil”, Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1979, p.198, ilustra: “O direito protege a vida do homem com um supremo bem. A tutela, porém, é, neste particular, extremamente enérgica, pois, como se sabe, o homicídio ocupa o primeiro posto na escala da reparação quanto à veemência da pena; mas, além da proteção penal, existe e enérgica proteção civil da vida.” 26. RESP 390594 ; RESP 448604 ; RESP 488921 e RESP 438696.

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20O art. 1327 do novo Código, inspirado no art. 5º do

Código Civil Italiano, tratou do direito à integridade

psicofísica28, especificamente dos atos de disposição de

partes renováveis do corpo, sujeitos à regulação

específica (como no caso da doação de sangue). Nesse

caso, a exceção aberta no parágrafo único refere-se aos

casos de doação de órgãos dúplices, tecidos ou partes do

corpo, nos termos do art. 4º, da Lei 10.211/0129. Caio

Mario da Silva Pereira30 observa:

“Não destoando da moderna concepção dos

direitos da personalidade, inclua-se

entre eles o direito sobre o próprio

corpo. Como idéia genérica, é lícito

admitir o direito de disposição, seja em

vida seja para depois da morte, por

inteiro e cada um de suas partes ou

órgãos, seja ainda ao próprio destino,

como a cremação ou enterramento.”

27. O art. 13 do Código Civil adotou a seguinte redação: “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes. Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial.” 28. Pietro Perlingieri “Perfis do Direito Civil – Introdução ao Direito Civil Constitucional”, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2002, p. 160; define: “A integridade psíquica é um aspecto do mais amplo valor que é a pessoa, como autônomo bem, analogamente à integridade física, não é suscetível de válida disposição se não for em razão de uma série e ponderados motivos de saúde.” 29. In verbis: "Art. 4° A retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte." 30. Caio Mário da Silva Pereira, “Direito Civil – Alguns Aspectos da sua Evolução”, Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2001, p. 31.

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21Nessa mesma linha, Luiz Netto Lobo31:

“O direito à integridade física tem por

objeto a preservação da intocabilidade do

corpo físico e mental da pessoa humana.

Não se admite a agressão física e

psicológica, nem se permite a mutilação

do próprio corpo, salvo o que é

renovável, como se dá com o corte dos

cabelos e das unhas e a doação de sangue,

ou de transplante de órgãos duplos ou de

partes de órgãos, sem prejuízo das

funções vitais. A proteção estende-se ao

corpo morto, pois o transplante, ainda

que para fins altruísticos, haverá de ser

consentido.”

O art. 1432 formaliza o entendimento sobre a

possibilidade de disposição gratuita do corpo após a

própria morte, vedando qualquer tipo de exploração

econômica do mesmo.

Por fim, deve-se mencionar que art. 1533 aborda questão

controversa acerca da matéria, possibilitando a recusa,

pelo paciente, a submeter-se ao tratamento médico, mesmo

ocorrendo risco de vida. Tal artigo não apenas institui o

31. Luiz Netto Lobo, “Danos morais e direitos personalidade” in Revista Trimestral de Direito Civil v. 06, Rio de Janeiro: Ed. Padma, p. 88. 32. In verbis: “Art. 14. É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte. Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo.” 33. In verbis: “Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.”

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22direito de escolha do paciente, como ainda ressalta a

importância do direito à vida. 34

Do artigo 16 ao 1935, o novo Código regula o direito ao

nome36. Tal direito é inicialmente reconhecido no art.

34. Acerca da matéria, leia a RESP 662033, cujo relator foi o Ministro JOSÉ DELGADO: “PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CASSAÇÃO DE LIMINAR. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ILEGITIMIDADE ATIVA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO, PELO ESTADO, À CRIANÇA HIPOSSUFICIENTE, PORTADORA DE DOENÇA GRAVE. OBRIGATORIEDADE. AFASTAMENTO DAS DELIMITAÇÕES. PROTEÇÃO A DIREITOS FUNDAMENTAIS. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. DEVER CONSTITUCIONAL. ART. 7º, C/C OS ARTS. 98, I, E 101, V, DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ARTS. 5º, CAPUT, 6º, 196 E 227, DA F/1988. PRECEDENTES DESTA CORTE SUPERIOR E DO COLENDO STF. 1. Recurso especial contra acórdão que extinguiu o processo, sem julgamento do mérito, em face da ilegitimidade ativa do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, o qual ajuizou ação civil pública objetivando a proteção de interesses individuais indisponíveis (direito à vida e à saúde de criança ou adolescente), com pedido liminar para fornecimento de medicação (hormônio do crescimento recombinante TTO) por parte do Estado. 2. O art. 7º, c/c os arts. 98, I, e 101, IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente, dão plena eficácia ao direito consagrado na Carta Magna (arts. 196 e 227), a inibir a omissão do ente público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) em garantir o efetivo tratamento médico a menor necessitado, inclusive com o fornecimento, se necessário, de medicamentos de forma gratuita para o tratamento, cuja medida, no caso dos autos, impõe-se de modo imediato, em face da urgência e conseqüências que ossam acarretar a não-realização. 3. Pela peculiaridade do caso e, em face da sua urgência, há que se afastarem delimitações na efetivação da medida sócio-protetiva pleiteada, não padecendo de qualquer ilegalidade a decisão que ordena que a Administração Pública dê continuidade a tratamento médico, psiquiátrico e/ou psicológico de menor. 4. O poder geral de cautela há que ser entendido com uma amplitude compatível com a sua finalidade primeira, que é a de assegurar a perfeita eficácia da função jurisdicional. Insere-se, aí, sem dúvida, a garantia da efetividade da decisão a ser proferida. A adoção de medidas cautelares (inclusive as liminares inaudita altera pars) é crucial para o próprio exercício da função jurisdicional, não devendo encontrar óbices, salvo no ordenamento jurídico.5. O provimento cautelar tem pressupostos específicos para sua concessão. São eles: o risco de ineficácia do provimento principal e a plausibilidade do direito alegado (periculum in mora e fumus boni iuris), que, presentes, determinam a necessidade da tutela cautelar e a inexorabilidade de sua concessão, para que se protejam aqueles bens ou direitos de modo a se garantir a produção de efeitos concretos do provimento jurisdicional principal. 6. A verossimilhança faz-se presente (as determinações reconizadas no Estatuto da Criança com o do Adolescente – Lei nº 8.069/90, em seus arts. 7º, 98, I, e 101, V, em combinação com atestado médico indicando a necessidade do tratamento postergado). Constatação, também, da presença do periculum in mora (a manutenção do decisum a quo, determinando-se a suspensão do tratamento (fornecimento do medicamento), com risco de dano irreparável à saúde do menor). Se acaso a presente medida não for outorgada, poderá não mais ter sentido a sua concessão, haja vista a possibilidade de danos irreparáveis e irreversíveis ao menor. 7. Prejuízos irá ter o menor beneficiário se não lhe for concedida a liminar, visto que estará sendo usurpado no direito constitucional à saúde, com a cumplicidade do Poder Judiciário. A busca pela entrega da prestação jurisdicional deve ser restigiada pelo juiz, de modo que o cidadão tenha, cada vez mais facilitada, com a contribuição do Poder Judiciário, a sua atuação em sociedade, quer nas relações jurídicas de direito privado, quer nas de

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231637 como universal, vez que todos os nascimentos devem

ser civilmente registrados, nos termos dos arts. 5238 a

5539 da lei 6.015/73. Assim sendo, toda pessoa tem

direito a ter um nome que não pode ser transferido ou

usurpado, sendo cabível, inclusive, ação judicial que lhe

garanta ampla reparação na hipótese de dano moral ou

material.

direito público. 8. Precedentes desta Corte Superior e do colendo STF.9. Recurso provido.” 35. O direito protege a vida do homem como um supremo bem. A tutela, porém, é, neste particular, extremamente enérgica, pois, como se sabe, o homicídio ocupa o primeiro posto na escala da reparação quanto à veemência da pena; mas, além da proteção penal, existe e enérgica proteção civil da vida. 36. Caio Mário da Silva Pereira, “Direito Civil – Alguns Aspectos da sua Evolução”, Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2001, p. 30, esclarece: “Em qualquer hipótese, o indivíduo tem ação que lhe assegure o nome a que tem direito, e lhe garanta reparação por dano material ou moral, contra um eventual causador de dano.” 37. In verbis: “Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.” 38. In verbis: “Art. 52. Os nascimentos ocorridos a bordo, quando não registrados nos termos do artigo 65, deverão ser declarados dentro de cinco (5) dias, a contar da chegada do navio ou aeronave ao local do destino, no respectivo cartório ou consulado.” 39. In verbis: “Art. 55. O assento do nascimento deverá conter: 1° o dia, mês, ano e lugar do nascimento e a hora certa, sendo possível determiná-la, ou aproximada; 2º o sexo e a cor do registrando; 3º o fato de ser gêmeo, quando assim tiver acontecido; 4º o nome e o prenome, que forem postos à criança; 5º a declaração de que nasceu morta, ou morreu no ato ou logo depois do parto; 6º a ordem de filiação de outros irmãos do mesmo prenome que existirem ou tiverem existido; 7º os nomes e prenomes, a naturalidade, a profissão dos pais, o lugar e cartório onde se casaram e a sua residência atual; 8º os nomes e prenomes dos avós paternos e maternos; 9º os nomes e prenomes, a profissão e a residência das duas testemunhas do assento.”.

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24A proteção do nome se estende ainda ao pseudônimo e ao

nome artístico, vez que estes representam também sua

identidade pessoal, nos termos do art. 1940 do novo

Código. Danilo Doneda41 observa:

“Também é relevante o fato de que o

direito à informação e à liberdade de

expressão foi levado em conta pelo

legislador, que não vetou a pura

publicação do nome alheio, porém somente

em casos que exponham a pessoa ao

desprezo público, bem como situações em

que há intenção de lucro.”

Ligado ao direito à intimidade e à vida privada está o

direito à imagem, que se incorpora aos direitos da

personalidade e encontra respaldo no mesmo dispositivo

constitucional (art. 5o, inciso X), representando a

possibilidade cabível à toda pessoa em preservar a

própria imagem e impedir a sua divulgação42. O artigo 20

do atual Código Civil trata do direito à imagem nos

seguintes termos:

40. In verbis: “Art. 19. O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome.” 41. Danilo Doneda, “Os direitos da personalidade no Código Civil" in A Parte Geral do Novo Código Civil, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2003, p. 52. 42. Carlos Alberto Bittar, “Os direitos da personalidade”, Rio de Janeiro: Ed. Forense Universitária, 2004, p.45, ressalta: “o direito à honra, com projeções em vida e post mortem, que visa a tutela das projeções da pessoa humana em sociedade, é passível de ser lesado por qualquer meio, seja ele escrito, verbal ou sonoro, tendo-se o legislador previnido para promover a proteção do mesmo em toda a sua amplitude.”

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25“Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se

necessárias à administração da justiça ou

à manutenção da ordem pública, a

divulgação de escritos, a transmissão da

palavra, ou a publicação, a exposição ou

a utilização da imagem de uma pessoa

poderão ser proibidas, a seu requerimento

e sem prejuízo da indenização que couber,

se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a

respeitabilidade, ou se se destinarem a

fins comerciais.

Parágrafo único. Em se tratando de morto

ou de ausente, são partes legítimas para

requerer essa proteção o cônjuge, os

ascendentes ou os descendentes.”

Note-se a linha permissiva adotada pela legislação supra,

estabelecendo como lícita a publicação de imagem43 quando

esta não implicar em dano à pessoa ou tiver finalidade

lucrativa. No que tange à divulgação de escritos e à

transmissão da palavra, estes devem ser compreendidos no

âmbito da imagem de uma pessoa e não em outros aspectos

da sua personalidade.

Por fim, deve-se tratar do direito à privacidade44 da

pessoa humana, instituído no art. 2145 do Código Civil

43. RESP 595600 ; RESP 58101 / SP 44. Leia-se o RESP 85905 / RJ, cuja relatoria foi do Ministro ARI PARGENDLER, julgando: “CIVIL. USO INDEVIDO DA IMAGEM. INDENIZAÇÃO DE DANOS MORAIS. O uso não autorizado de uma foto que atinge a própria pessoa, quanto ao decoro, honra, privacidade, etc., e, dependendo das circunstâncias, mesmo sem esses efeitos negativos, pode caracterizar o direito à indenização pelo dano moral, independentemente da prova de prejuízo.Hipótese, todavia, em que o autor da ação foi retratado de forma acidental, num contexto em que o objetivo não foi a exploração de sua imagem. Recurso especial não conhecido.”

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26de 2002, que com a explícita intenção de excluir do seu

âmbito de atuação as pessoas jurídicas, considerou

inviolável somente a privacidade da pessoa natural.

Milton Fernandes46 assinala acerca da matéria:

“A vida privada constitui-se de

acontecimento que a pessoa pretende

subtrair à consideração alheia.”

A proteção à privacidade constitui, portanto, um delicado

tema acerca dos direitos da personalidade, não apenas

pelo crescimento do seu potencial de ofensas em virtude

do desenvolvimento tecnológico como também pela

dificuldade encontrada pelos instrumentos tradicionais em

realizarem adequadamente a sua tutela. Note-se, assim,

que o direito à privacidade há muito superou seu conceito

original de right to be alone. José Adércio Sampaio47

alerta:

“A total transparência do indivíduo ante

aos olhos do Estado e das empresas,

dententoras de monopólio de informação,

agudiza a concentração de poder,

fragiliza o controle que deve ser

exercida pela sociedade – e não, sobre a

sociedade – e tende a aprofundar a

desigualdade de suas relações,

45. In verbis: “Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.” 46. Milton Fernandes, “Proteção Civil da Intimidade”, São Paulo: Ed. Saraiva, 1977, p.73. 47. José Adércio Sampaio, “Direito à intimidade e à vida privada”, Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 1998, p. 495.

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27favorecendo as discriminações e o

conformismo especial e politico, assim

como ditadura do simulacro.”

A proteção da privacidade pode ser realizada via ação de

responsabilidade civil, entretanto, o atual Código,

buscando tutela adequada, possibilitou ao magistrado a

tomada das providências necessárias à sua proteção.

Ainda acerca do direito à privacidade, cabe mencionar que

o atual Código Civil não tratou especificamente da sua

proteção no que se refere aos bancos de dados pessoais.

No entanto, o Código de Defesa do Consumidor observou a

questão nos seguintes termos:

“Art. 43. O consumidor, sem prejuízo do

disposto no art. 86, terá acesso às

informações existentes em cadastros,

fichas, registros e dados pessoais e de

consumo arquivados sobre ele, bem como

sobre as suas respectivas fontes.

§ 1° Os cadastros e dados de consumidores

devem ser objetivos, claros, verdadeiros

e em linguagem de fácil compreensão, não

podendo conter informações negativas

referentes a período superior a cinco

anos.

§ 2° A abertura de cadastro, ficha,

registro e dados pessoais e de consumo

deverá ser comunicada por escrito ao

consumidor, quando não solicitada por

ele.

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28§ 3° O consumidor, sempre que encontrar

inexatidão nos seus dados e cadastros,

poderá exigir sua imediata correção,

devendo o arquivista, no prazo de cinco

dias úteis, comunicar a alteração aos

eventuais destinatários das informações

incorretas.

§ 4° Os bancos de dados e cadastros

relativos a consumidores, os serviços de

proteção ao crédito e congêneres são

considerados entidades de caráter

público.

§ 5° Consumada a prescrição relativa à

cobrança de débitos do consumidor, não

serão fornecidas, pelos respectivos

Sistemas de Proteção ao Crédito,

quaisquer informações que possam impedir

ou dificultar novo acesso ao crédito

junto aos fornecedores.”

Embora pioneiras, as medidas do Código de Defesa do

Consumidor48 mostram-se não apenas tímidas para

realização de uma tutela integral adequada, como ainda

estão limitadas às situações onde os dados em questão

pertencem a consumidores. Daí concluir-se que o

ordenamento jurídico brasileiro ainda carece de proteção

no que se refere às informações privadas processadas por

meios informatizados.

48. O art. 44 trata a material nos seguintes termos: “Art 44. Os órgãos públicos de defesa do consumidor manterão cadastros atualizados de reclamações fundamentadas contra fornecedores de produtos e serviços, devendo divulgá-lo pública e anualmente. A divulgação indicará se a reclamação foi atendida ou não pelo fornecedor. § 1° É facultado o acesso às informações lá constantes para orientação e consulta por qualquer interessado.

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29

A abordagem legal adotada pelo atual Código Civil, versou

sobre as principais categorias de direitos da

personalidade e remeteu-as à compreensão da doutrina,

jurisprudência e legislação especial. Dessa forma, a nova

legislação trouxe sensíveis mudanças à matéria, que se

tornou possuidora de guarida expressa na codificação

central do ordenamento civil brasileiro.

§ 2° Aplicam-se a este artigo, no que couber, as mesmas regras enunciadas no artigo anterior e as do parágrafo único do art. 22 deste código.

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30

3. O DANO MORAL AO CONSUMIDOR

3.1. As raízes constitucionais do Código de

Defesa do Consumidor

A Constituição Federal de 1988 elevou a defesa do

consumidor à esfera constitucional de nosso ordenamento,

tendo o legislador incluído tal proteção entre os

direitos e deveres individuais e coletivos, estabelecendo

não apenas que “o Estado promoverá, na forma da lei, a

defesa do consumidor” (art. 5º, XXXII), mas também

erigindo a defesa do consumidor à categoria de “princípio

geral da atividade econômica” (art. 170, V).

Ainda nessa linha, o respeito aos interesses do

consumidor se destaca no art. 150, parágrafo 5, prevendo

que “A lei determinará medidas que os consumidores sejam

esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre as

mercadorias e serviços” e também, no art. 175, parágrafo

único, II, estabelecendo que “Incumbe ao Poder Público,

na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão

ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de

serviços públicos, os direitos dos usuários” (nesse caso,

consumidores).

Note-se, dessa forma, que a proteção ao consumidor possui

raízes constitucionais, tendo o Código de Defesa do

Consumidor sido promulgado justamente para possibilitar a

sua melhor defesa, visto que atua como um microssistema

orientador elaborado pelo legislador ordinário.

Entretanto, como microssistema que é, não pode a

mencionada legislação prescindir de integrar-se aos

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31demais diplomas legais vigentes, visto não ser auto-

suficiente para regular todos os aspectos jurídicos

possíveis de realização na relação de consumo. Nesse

sentido, posiciona-se Claudia Lima Marques tratando da

atual coexistência entre o Código Civil de 2002 e o

Código de Defesa do Consumidor, classificando tal relação

como a convivência de paradigmas, visto que ocorre um

diálogo de complementariedade e subsidiariedade entre

ambas as leis49.

Enquadrando-se o CDC como uma lei de ordem pública50 e

interesse social (art. 5º, XXXII), seus dispositivos

tornam-se inderrogáveis pelos interessados (envolvidos) e

seus preceitos aplicáveis a todas relações de consumo.

Nesse sentido, Gustavo Tepedino51 observa:

“O constituinte, assim procedendo, não

somente inseriu a tutela dos consumidores

entre os direitos e garantias

individuais, mas afirma que sua proteção

deve ser feita do ponto de vista

instrumental, ou seja, com a

instrumentalização dos seus interesses

patrimoniais à tutela de sua dignidade e

aos valores existenciais. Trata-se,

portanto, do ponto de vista normativo, de

49. V. Claudia Lima Marques, “Diálogo entre o CDC e o novo Código Civil: do diálogo das fontes no combate às cláusulas abusivas” in Revista de Direito do Consumidor v.45, São Paulo: Ed. RT, 2003, p. 70-99. 50. Claudia Lima Marques, “O Código de Defesa do Consumidor e o Mercosul” in Revista de Direito do Consumidor v. 8, São Paulo: Ed. RT, 1993, p.45; ensina que o caráter de ordem pública da Lei Consumerista ensina que não se resume à seara contratual, constituindo também um importante limite à autonomia privada na sua face econômica, ou seja, na liberdade de iniciativa no mercado brasileiro. 51. Gustavo Tepedino, “A Responsabilidade Civil por Acidentes de Consumo na Óptica Civil-Constitucional” in Temas de Direito Civil, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2001, p. 250.

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32proteger a pessoa humana nas relações de

consumo, não já o consumidor como uma

categoria per se considerada.”

E completa:

“A proteção jurídica do consumidor, nesta

perspectiva, deve ser estudada como

momento particular e essencial de uma

tutela mais ampla: aquela da

personalidade humana, seja do ponto de

vista de seus interesses individuais

indisponíveis, seja do ponto de vista dos

interesses coletivos e difusos. Entende-

se, então, como a tentativa de construir

um microssistema dos consumidores não se

mostra confortante, tanto em razão do

perigo de novas tendências corporativas,

cuja ameaça se apresenta sempre mais

inquietante, como pela incapacidade de

proteger adequadamente a dignidade do

consumidor, prescindindo das normas

constitucionais.”

Conclui-se, assim, a importância de que o CDC seja

interpretado à luz dos princípios constitucionais acima

referidos, bem como do atual Código Civil, de forma

solidária e residual.

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333.2. O CDC, o novo Código Civil e os Direitos da

Personalidade.

Conforme mencionou-se no item 1.1., os direitos da

personalidade nos termos da atual Constituição Federal de

1988, configuram uma cláusula geral de tutela da pessoa

humana, representando valor fundamental, unitário e

ilimitado do atual ordenamento constitucional. No mesmo

rumo, o Código Civil de 2002, ao tratar da matéria

ressaltou a importância e a supremacia da proteção de

tais direitos, fazendo-os valer em toda situação em que

ocorra ofensa ao valor da pessoa humana.

O Código de Defesa do Consumidor, promulgado em 11.09.90,

também foi cuidadoso em abordar a questão, prevendo a

tutela dos direitos da personalidade do consumidor52 nos

seguintes termos53:

“Art. 6º São direitos básicos do

consumidor:

I - a proteção da vida, saúde e segurança

contra os riscos provocados por práticas

no fornecimento de produtos e serviços

considerados perigosos ou nocivos;

52. O art. 2° do CDC define consumidor nos seguintes termos: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.” 53. Note-se que o artigo 6 da Lei Consumerista não apenas cuida dos direitos da personalidade do consumidor, como ainda estabelece meios para proporcionar a sua melhor defesa em caso de reparação ou prevenção.

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34II - a educação e divulgação sobre o

consumo adequado dos produtos e serviços,

asseguradas a liberdade de escolha e a

igualdade nas contratações;

III - a informação adequada e clara sobre

os diferentes produtos e serviços, com

especificação correta de quantidade,

características, composição, qualidade e

preço, bem como sobre os riscos que

apresentem;

IV - a proteção contra a publicidade

enganosa e abusiva, métodos comerciais

coercitivos ou desleais, bem como contra

práticas e cláusulas abusivas ou impostas

no fornecimento de produtos e serviços;

V - a modificação das cláusulas

contratuais que estabeleçam prestações

desproporcionais ou sua revisão em razão

de fatos supervenientes que as tornem

excessivamente onerosas;

VI - a efetiva prevenção e reparação de

danos patrimoniais e morais, individuais,

coletivos e difusos;

VII - o acesso aos órgãos judiciários e

administrativos com vistas à prevenção ou

reparação de danos patrimoniais e morais,

individuais, coletivos ou difusos,

assegurada a proteção Jurídica,

administrativa e técnica aos

necessitados;

VIII - a facilitação da defesa de seus

direitos, inclusive com a inversão do

ônus da prova, a seu favor, no processo

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35civil, quando, a critério do juiz, for

verossímil a alegação ou quando for ele

hipossuficiente, segundo as regras

ordinárias de experiências;

IX - (Vetado);

X - a adequada e eficaz prestação dos

serviços públicos em geral.”

Note-se assim, que os direitos do consumidor albergam, em

sua textura, direitos da personalidade. Prova disto é a

extensa previsão legal existente acerca dos direitos do

consumidor-pessoa, tendo a atual legislação lhe

garantindo os meios e instrumentos para sua melhor

defesa54 durante a citada relação. Leia-se a observação

de Eduardo C.B. Bittar55 acerca da questão:

“Uma das flagrantes hipóteses de proteção

da personalidade, fragilizada nas

relações de consumo, é a da reparação

civil por danos morais, legalmente

acolhida, no âmbito dos direitos do

consumidor. Efetivamente, a intimidade da

relação existente entre os direitos da

personalidade e a responsabilidade civil

por danos é tamanha que se pode dizer que

a responsabilização contribui como meio

para a efetivação dos referidos direitos,

não obstante nem toda lesão a direito da

personalidade possa acarretar

54. A ação de reparação por danos morais utilizada no âmbito da responsabilidade civil, vem se mostrando um meio extremamente adequado para a proteção dos interesses do consumidor, conforme previsto no art. 6, VI do CDC.

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36necessariamente dano moral. De qualquer

forma, o êxito da temática moral nesta

área se deve exatamente ao fato de que,

uma vez envolvidas as partes em uma

relação de consumo, pode-se facilmente

acarretar uma lesão a direito humano

intrínseco, ou seja, a um dos protegidos

direitos da personalidade. Neste caso,

impõe-se a restitutio in integrum do

lesado.”

A proteção dos direitos da personalidade do consumidor

vem se consagrando jurisprudencialmente56 com base nos

mencionados preceitos constitucionais e, principalmente,

através dos dispositivos do CDC. Nesse sentido, cabe

ressaltar que além das citadas normas, o consumidor conta

ainda com o novo Código Civil57 (arts. 12, 20 e 21) e/ou

com os instrumentos atinentes ao tema existentes no

Código de Processo Civil. Nelson Nery Junior58 observa:

55. Eduardo C.B. Bittar, “Direitos do Consumidor e Direitos da Personalidade: Limites, Intersecções, Relações” in Revista de Direito do Consumidor v. 33, São Paulo: Ed. RT, 2000, p. 185. 56. V. RESP 328182 / RS e RESP 221215 / SP 57. Bruno Miragem, “Os direitos da personalidade e os direitos do consumidor” in Revista de Direito do Consumidor v. 49, São Paulo: ED. RT, 2004, p.71, salienta: “Os direitos da personalidade, neste sentido, se vinculam, exatamente, nesta matéria de caráter geral para o direito civil. As disposições do novo Código civil, em matéria de direitos da personalidade, assim, vão ter o condão de informar, auxiliando na atribuição de significado à tutela jurídica do consumidor estabelecida pelo CDC.” 58. Nelson Nery Junior, Novo Código civil e legislação extravagante anotados”, São Paulo: Ed. RT, 2002, p.7.

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37“Apesar do Código de Defesa do Consumidor

constituir o principal diploma legal para

regular as relações jurídicas de direito

das relações de consumo, nada impede que

o Código Civil, naquilo que não conflite

com o sistema do CDC, regule também as

relações de consumo.”

Essa integração ocorre em razão do legislador do Código

de 2002, ao dispor acerca dos direitos da personalidade,

ter utlizado a técnica legislativa das cláusulas gerais,

que atuam como referência interpretativa de critérios e

limites para a aplicação das demais disposições

normativas vigentes59. Tais disposições não devem ser

observadas isoladamente, promovendo, dessa forma, a

proteção de tais direitos além daqueles já elencados.

No que tange às divergências encontradas entre o Código

Civil de 2002 e o CDC, deve-se lembrar que estas ocorrem

no âmbito das regras da reparação civil do dano. Enquanto

na legislação civil a indenização pode sofrer redução (de

acordo com a intensidade da culpa dos sujeitos envolvidos

na relação jurídica obrigacional), o mesmo não ocorre com

a Lei 8.078/90, onde a efetiva reparação60 faz com que o

seu valor mínimo seja a medida do dano61.

59. Gustavo Tepedino, “Premissas Metodológicas para a Constitucionalização do Direito Civil” in Temas de Direito Civil, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2001, p. 1-22. 60. V. Fernando Noronha, “O âmbito da responsabilidade civil” in Revista Trimestral de Direito Civil v. 12, Rio de Janeiro: Ed. Padma, 2002, p. 39-58. 61. Interessante comparação sobre a questão faz Bruno Miragem em “Os direitos da personalidade e os direitos do consumidor” in Revista de Direito do Consumidor v. 49, São Paulo: ED. RT, 2004, p.73 e74.

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38Por fim, cabe mencionar que tanto a legislação civil

quanto a consumerista ao elencarem os direitos da

personalidade em seus dispositivos o fazem de forma

exemplificativas, vez que tais direitos consubstanciam-se

na proteção à pessoa humana, constitucionalmente

prevista.

3.3. O Dano Material e Moral

O dano62 atua como um pressuposto inafastável da

responsabilidade civil, visto que se não há dano, não há

o que se indenizar63. Nesse sentido, cabe lembrar da

lição de Maria Helena Diniz64:

“dano pode ser definido como a lesão

(diminuição ou destruição) que, devido a

um certo evento, sofre uma pessoa, contra

a sua vontade, em qualquer bem ou

interesse jurídico, patrimonial ou

moral.”

O dano à pessoa pode se concretizar no âmbito moral ou no

material, distinguindo-se com base na lesão e no caráter

da sua repercussão sobre o lesado. No primeiro caso, a

afronta ocorre aos atributos e sentimentos da pessoa,

enquanto no dano material a repercução ocorre sobre o seu

patrimônio. Nessa linha, Pontes de Miranda65 observa:

62. V. acerca da evolução do dano moral na responsabilidade civil, Caio Mário da da Silva Pereira, “Direito Civil – Alguns Aspectos da sua Evolução”, Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2001, p. 107 a a 129. 63. O novo Código Civil prevê a indenização por dano moral nos seus arts. 12, 20, 1948, 949, 950, 951, 953, e 954. 64. Maria Helena Diniz, “Curso de direito civil brasileiro” v. 7, São Paulo: Ed. Saraiva, 1984, p.5. 65. Pontes de Miranda, “Tratado de Direito Privado” v. 26, p. 30.

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39“Dano patrimonial é o dano que atinge o

patrimonio do ofendido, dano não-

patrimonial é o que, só atingindo o

devedor como ser humano, não lhe atinge o

patrimônio.”

A Carta Magna estatuiu a reparação do dano à pessoa

humana, caracterizando-o como princípio de natureza

cogente do ordenamento. Leia-se:

“Art. 5.º Todos são iguais perante a lei,

sem distinção de qualquer natureza,

garantindo-se aos brasileiros e aos

estrangeiros residentes no País a

inviolabilidade do direito à vida, à

liberdade, à igualdade, à segurança e à

propriedade, nos termos seguintes:

(...)

V - é assegurado o direito de resposta,

proporcional ao agravo, além da

indenização por dano material, moral ou à

imagem;

(…)

X - são invioláveis a intimidade, a vida

privada, a honra e a imagem das pessoas,

assegurado o direito a indenização pelo

dano material ou moral decorrente de sua

violação;”

Nessa linha, o Código Civil de 2002 tratou a questão em

seu art. 186, estabelecendo:

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40"Aquele que, por ação ou omissão

voluntária, negligência, ou imprudência,

violar direito, ou causar prejuízo a

outrem, fica obrigado a reparar dano."

A prevenção e reparação de danos à pessoa do consumidor

também foi tratada em legislação especial, tendo o Código

de Defesa do Consumidor objetivado proteger os direitos

da personalidade na esfera de consumo, harmonizando as

relações e beneficiando todos aqueles que se caracterizam

como vítimas66 de fato do produto67 ou do serviço, para

efeitos da responsabilidade68 civil69.

A doutrina distingue o dano moral e o patrimonial através

dos seguintes critérios: (a) identificação, (b) reparação

e (c) formas de liquidação. No que concerne à

identificação (a), vale lembrar que, enquanto o dano

patrimonial exige prova concreta do prejuízo sofrido pela

vítima, no dano moral não se faz necessária a prova para

66. O CDC, em seu art. 12, estabelece: “O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. § 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - sua apresentação; II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi colocado em circulação. § 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado. § 3° O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar: I - que não colocou o produto no mercado; II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 67. V. Resp.279273 e Resp 287849 – SP. 68. Leia-se o Art 17 do CDC: Art. 17 - Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.” 69. V. Resp 181580 – SP.

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41a concretização da responsabilidade70 civil71, bastando a

própria violação72 à personalidade73 do lesado74. Dessa

forma, a vitima de dano moral deve provar75 tão-somente o

dano sofrido e o nexo de casualidade76.

70. O novo Código Civil, em seu art. 927, ao tratar da necessidade de prova acerca do dolo ou culpa do agente causador do dano estabeleceu: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo” 71. O art. 927 do novo Código Civil estabeleceu expressamente ditames para a avaliação de cada caso, tratando das hipóteses onde deve-se aplicar a responsabilidade subjetiva ou a responsabilidade objetiva. Note-se, assim, que o atual Código Civil adotou o sistema misto de responsabilidade civil. 72. Sergio Iglesias, “Responsabilidade civil por danos à personalidade”, São Paulo: Ed. Manole, 2002, p. 27, explica: “A teoria do risco de atividade, portanto adveio definitivamente por meio do art. 927 do novo Código civil com o objetivo de proteger os direitos que potencialmente poderão ser lesados em decorrência de uma atividade normalmente exercida pelo agente causados do dano.” 73. Radindranath Valentino Aleixo Capelo de Souza, “O Direito Geral de Personalidade” em Tese de Doutorado em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Coimbra: Ed. Coimbra, 1995, pg. 48, comenta: “Dado que a personalidade humana do lesado não integra propriamente o seu patrimônio, acontece que a violação da sua personalidade emergem direta e principalmente danos não patrimoniais ou morais, isto é, prejuízos de interesses de ordem biológica, espiritual, ideal e moral, não patrimoniais, que sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, apenas podem ser compensados, que não exatamente indenizados, com a obrigação pecuniária imposta ao agente.” 74. Patrícia Ribeiro Serra Vieira, “A responsabilidade civil nas relações de consumo” in Revista Trimestral de Direito Civil v. 12, Rio de Janeiro: Ed. Padma, 2002, p. 121, observa: “O fundamento da responsabilidade objetiva é o risco, que se apresenta sob diversas roupagens, dependentes das circustâncias afeitas ao caso em concreto: risco profissional, risco proveito, risco do empreendimento, risco criado, risco administrativo e risco integral.” 75. V. Resps n. 17073-MG e 50481-RJ. 76. Nos termos do art. 6º, VIII do CDC, poderá o magistrado determinar a inversão do ônus da prova a favor do consumidor hipossuficiente.

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42No critério da reparação (b), a distinção ocorre pelo

fato do dano moral não se fundamentar na restitutio in

integrum, como ocorre com o dano material. Ou seja, a

indenização do dano moral possui caráter compensatório,

visto que o dinheiro objetiva neutralizar os sentimentos

de mágoa, angústia e tristeza vividos pelo lesado.

Quanto à liquidação (c), deve-se esclarecer que no dano

moral esta se submete ao arbítrio77 do magistrado – ao

contrário do que ocorre no dano material, onde permanece

válida a expressão perdas e danos que abrange tanto os

danos emergentes quanto os lucros cessantes.

Cabe mencionar, ainda, que enquanto o dano material está

limitado aos valores de perdas e danos comprovados, o

dano moral não está submetido a limites pré-

estabelecidos. Assim sendo, caberá ao magistrado da ação

de conhecimento a fundamentação e estipulação do valor da

indenização78, conforme preconiza o art. 458 do Código de

Processo Civil. Nessa linha, Carlos Edison do Rego

Monteiro Filho79 ensina:

77. V. Carlos Roberto Gonçalves, “Responsabilidade Civil”, São Paulo: Ed. Saraiva, 1995, p.413 e segs. 78. A falta de previsão legal para os critérios de arbitramento induziu a doutrina e jurisprudência brasileiras a avaliar, inicialmente, a questão sob a ótica de quatro padrões: a gravidade do dano, o grau de culpa do ofensor, a capacidade econômica da vitima e a capacidade econômica do ofensor. Ocorre que tal conduta mostrou-se equivocada, visto que tal construção concentra-se na projeção econômica da vítima, contradizendo a atual Constituição Federal, que exalta a importância dos valores extra-patrimoniais. Nessa linha, Anderson Schreiber, “Arbitramento do dano moral no novo código civil”, in Revista Trimestral de Direito Civil vol. 12, Rio de Janeiro: Ed. Padma, 2002, ps.10 e 11, comenta: “O novo Código Civil não fez menção expressa a estes critérios, mas neste sentido parece que a omissão foi positiva. Isto porque, dos quatro critérios acima mencionados, apenas a gravidade do dano se justifica como parâmetro para o arbitramento do dano moral.” 79. Carlos Edison do Rego Monteiro Filho, “Elementos de Responsabilidade Civil por Dano Moral”, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2000, ps. 129 e 130.

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43“O valor da reparação do dano moral deve

ser preferencialmente, em virtude de

economia processual, ser arbitrado pelo

órgão julgador de maneira independer de

posterior liquidação de sentença, ou

seja, deve ser certo, líquido. Tal

orientação encontra-se em consonância com

a moderna doutrina processualista, atenta

à efetividade do processo e ao adequado

acesso à justiça. E, de fato, não se

justifica a necessidade de uma nova ação

para se chegar ao valor da indenização,

tendo em vista que o juiz, no processo de

conhecimento, sabedor das vicissitudes do

caso concreto e familiarizado com a prova

dos autos, já possui plenas condições de

fixá-lo.”

O dano à pessoa do consumidor, observado na legislação

consumerista salvaguarda tanto os interesses patrimoniais

(apreciáveis economicamente) quanto os extrapatrimoniais

(aqueles cuja tutela se consigna através dos direitos da

personalidade, ou seja, da integridade moral e física do

consumidor), acompanhando o primado da dignidade do

indivíduo estatuído como ponto central do atual

ordenamento.

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443.4. O Dano Moral ao Consumidor

O primado da dignidade do indivíduo como ponto central do

sistema jurídico – subordinando à atual ordem econômica,

à justiça social e à finalidade de assegurar a todos uma

existência digna – fundamenta a tutela jurídica da pessoa

humana e consequentemente, do consumidor80 brasileiro,

estabelecendo sua reparação sempre que se constituir um

dano à sua integridade física ou moral. Nesse sentido,

cabe resaltar que o dano moral, apesar de intimamente

ligado às caracteristícas da pessoa, não pode ser

reduzido à simples definição de lesão ao direito da

personalidade, visto tratar-se, primordialmente, de uma

violação à cláusula geral de tutela da pessoa humana.

Maria Celina Bodin de Moraes81 comenta:

“A importância de conceituar o dano moral

como lesão à dignidade humana pode ser

medida pelas consequências que gera, a

seguir enunciadas. Assim, em primeiro

lugar, toda e qualquer circunstância que

atinja o ser humano em sua condição

humana, que (mesmo longiquamente)

pretenda tê-lo como objeto, que negue sua

qualidade de pessoa, será automaticamente

considerada violadora de sua

personalidade e, se concretizada,

causadora de dano moral a ser reparado.

Acentue-se que o dano moral, para ser

80. Cláudia Lima Marques, “Contratos no Código de Defesa do Consumidor”, São Paulo: Ed. RT, 2002, p. 311, ensina: “A definição de consumidor do art.2 do CDC deve ser interpretada restritivamente dentro do sistema e da ratio legis de proteção dos vulneráveis.”

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45identificado, não precisa estar vinculado

a lesão de algum “direito subjetivo” da

pessoa da vítima ou causar algum prejuízo

a ela. A simples violação de uma situação

jurídica subjetiva extrapatriomonial (ou

de um “interesse não patrimonial”) em que

esteja envolvida a vítima, desde que

merecedora da tutela, será suficiente

para garantir a reparação.”

Os danos personais referem-se, portanto, à violação de

direitos inerentes à personalidade e dignidade humana,

não sendo suscetíveis de uma exata auferição econômica,

ainda que possa ser atenuado pela estipulação de valor

reparatório pelo prejuízo sofrido. Dessa forma, a

responsabilidade civil visa não somente reparar um bem

juridicamente protegido, mas, principalmente, compensar82

os prejuízos ocorridos em função de uma determinada

conduta83.

81. Maria Celina Bodin de Moraes, “Danos à Pessoa Humana – Uma leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais”, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2003, pg. 187. 82. Maria Helena Diniz, “ Curso de direito civil brasileiro” v. 7 , São Paulo: Ed. Saraiva, 1997, p. 85, salienta: “A reparação pecuniária teria, no dano moral, uma função satisfatória ou compensatória e, concomitantemente, penal, visto ser encargo suportado por quem causou o dano moral.” 83. Maria Celina Bodin de Moraes, “Danos à Pessoa Humana – Uma leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais”, Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2003, pg. 147 e 148, comenta: “Apesar do reconhecido aspecto não-patrimonial dos danos morais, a partir de determinado ponto tornou-se insustentável tolerar que, ao ter um direito personalíssimo seu atingido, ficasse a vítima irressarcida, criando-se um desequilíbrio na ordem juridical, na medida em que estariam presentes o ato ilícito e a lesão a um direito (da personalidade), por um lado, e a impunidade, por outro. Veio a Constituição de 1988 consolidar tal posição, já então majoritária, acerca do pleno ressarcimento do chamado dano moral puro.”(…) “Apesar do reconhecido aspecto não-patrimonial dos danos morais, a partir de determinado ponto tornou-se insustentável tolerar que, ao ter um direito personalíssimo seu atingido, ficasse a vítima irressarcida, criando-se um desequilíbrio na ordem juridical, na medida em que estariam presentes o ato ilícito e a lesão a um direito (da personalidade), por um lado, e a impunidade, por

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46O CDC assegurou a integridade moral do consumidor não

apenas através do seu art. 6º, inciso VII, como também

pelos artigos 37, parágrafo 2º, 39, inciso IV e VII e 42,

que tratam, respectivamente, da ilicitude na publicidade

abusiva84, das práticas comerciais abusivas e da conduta

abusiva na cobrança de dívidas85.

No intuito de instrumentalizar adequadamente a

salvaguarda do direito moral do consumidor em todas as

fases da relação de consumo, a Lei 8.078/90 estatuiu a

obrigatoriedade do respeito aos princípios da boa-fé

objetiva86, transparência87, confiança88 e equidade89.

Assim sendo, a frustração das expectativas do

consumidor90 ocasionadas pela relação de consumo pode,

outro. Veio a Constituição de 1988 consolidar tal posição, já então majoritária, acerca do pleno ressarcimento do chamado dano moral puro.” 84. Ver HC 2553 – MG. 85. Acerca do assunto, leia: Resp 420111 – RS ; Resp 407097 – RS e Resp. 191189 – MG. 86. Ana Beatriz Rutowitsch Bicalho, “Os contratos de plano de saúde e sua revisão jurisdicional” in Revista de Direito do Consumidor v. 49, São Paulo: ED. RT, 2004, p.116, comenta: “Com efeito, o princípio da boa-fé representa o valor da ética, veracidade e correção dos contratantes, operando de diversas formas e em todos os momentos do contrato, desde a sua negociação à fase posterior à sua execução. A abrangência deste é contornada mediante a tripartição das funções da boa-fé, quais sejam: Cânon interpretativo-integrativo, norma de criação de deveres jurídicos e norma de limitação ao exercício de direitos subjetivos. 87. O princípio da transparência está previsto no art. 4° do Código de Defesa do Consumidor e tem como objetivo possibilitar uma aproximação e uma relação contratual mais clara e menos danosa entre fornecedor e consumidor. A transparência constitui-se na clareza nas informações contidas no contrato, possibilitando ao consumidor uma melhor compreensão do seu conteúdo e também sobre as características do serviço ou produto fornecido. 88. O princípio da confiança, estatuído pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 20, parág. 2º, garante a adequação do contrato firmado às legitimas expectativas do consumidor. Ou seja, a “confiança” está na adequação do produto ou serviço aos fins que razoavelmente dele se esperam. 89. O princípio da equidade, previsto no art. 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor, visa alcançar um equilíbrio de direitos e deveres entre as partes. Assim sendo, este princípio busca justamente impedir que o uso de normas abusivas assegure vantagens unilaterais ou exageradas para o prestador de serviços e bens. Cláudia Lima Marques, “Contratos no Código de Defesa do Consumidor”, São Paulo: Ed. RT, 4a. Edição, p. 742, comenta: “A vontade das partes manifestada livremente no contrato não é mais o fator decisivo para o Direito, pois as normas do Código instituem novos valores superiores como o equilíbrio e a boa fé nas relações de consumo.” 90. Ver Resp 575469 – RJ ; Resp 303379 – MA; Resp 595631 –SC e Resp 441932 – RS.

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47ocasionalmente, motivar uma ação de indenização91 por

danos morais, com fundamento nos mencionados princípios92

e legislações93.

A jurisprudência atual ainda não fixou uma orientação

defintiva acerca das hipóteses de dano moral ao

consumidor em razão de descumprimento contratual e

frustração das expectativas do consumidor, existindo

divergentes julgados acerca das situações concretas, como

por exemplo, ocorre nas questões atinentes aos

contratos94 de plano de saúde95.

Igualmente complexa mostra-se a questão da inscrição

injusta ou não autorizada do nome do consumidor em bancos

de dados96 e cadastros97, visto que tais questões98 vem

91. Arts. 11 à 21 do Código Civil de 2002 e o Art. 5, IV, VI, IX, XII, XX e XXIX, da Constituição Federal de 1988. 92. Versaram sobre o tema: Cláudia Lima Marques, “Contratos no Código de Defesa do Consumidor”, São Paulo: Ed. RT, 4a. Edição, p.599; Agathe E. Schmidt da Silva “Cláusula Geral da Boa-Fé nos contratos de consumo” in Revista de Direito do Consumidor v.17, São Paulo: Ed. RT, p. 158-159 e Ruy Rosado Aguiar “A boa-fé na relação de consumo” in Revista de Direito do Consumidor v.14, São Paulo: Ed. RT, p.25. 93. Art. 1, III, da Constituição Federal de 1988. 94. A favor da indenização por dano moral ao consumidor, leia-se as seguintes decisões: APELACAO CIVEL, Processo nº: 2002.001.03090, APELACAO CIVEL, Processo nº: 1998.001.02183, Órgão Julgador: DÉCIMA CAMARA CIVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO; APELACAO CIVEL, Processo n°: 2000.001.05113, Órgão Julgador: SÉTIMA CAMARA CIVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO. 95. Firme também se mostra a corrente que entende não haver dano moral neste tipo de situação. Leia-se: Recurso Especial n° 450.512/DF, Relator Min. Carlos Alberto Menezes de Direito; APELACAO CIVEL, Processo n°: 2001.001.00025, Órgão Julgador: SETIMA CAMARA CIVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO; APELACAO CIVEL, Processo nº: 1999.001.12013, Órgão Julgador: TERCEIRA CAMARA CIVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO DE JANEIRO. 96. Art. 43 e parágrafos do CDC. 97. A matéria foi tratada por Bruno Miragem em “Os direitos da personalidade e os direitos do consumidor” in Revista de Direito do Consumidor v. 49, São Paulo: ED. RT, 2004, p. 63: “A distinção entre bancos de dados e cadastros de fornecedores, entretanto caracterista-se por sua: a) aleatoriedade na coleta das informações que o conformam; b) organização permanente das informações, à espera de utilização futura; c) transmissibilidade extrínsica, na medida em que é direcionada a utilização por terceiros; e d) inexistência de autorização ou conhecimento do consumidor quanto ao registro. 98. Ver AgRg no AG 538145 – RO ; Resp 511921 – MT ; Resp 402958 ; Resp 292045 – RJ e Resp 285401 –SP.

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48originando frequentes ações de reparação99 por danos

morais100, baseados no entendimento de que tal conduta101

fere, constantemente, a honra e a privacidade humana.

Conforme se mencionou, os danos morais por agressão à

integridade psíquica ou física do consumidor por abalos

sofridos durante o fornecimento de serviço ou produto vêm

sendo cuidadosamente analisados pelos tribunais

brasileiros, com base não apenas nos princípios do CDC,

mas principalmente pela exaltada importância da

personalidade e dignidade da pessoa humana.

99. O Ministro Ruy Rosado de Aguiar, relator do RE n. 22.337-8 posicionou-se: "a operação dos bancos de dados, se não exercida dentro de certos limites, se transforma em dano social." 100. Interessa observar que a Lei 8.078/90, em seu art. 43, confere ao consumidor acesso livre a todas às informações existentes em qualquer cadastro ou banco de dados sobre a sua pessoa, bem como sobre sua fonte, face ao princípio da transparência das relações de consumo. 101. O § 2 do artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor assegura, ainda, ao consumidor o direito de ser informado, por escrito, sobre sua inclusão em todo e qualquer banco de dados ou cadastro, "não só de modo a possibilitar-lhe a exigência da imediata correção das inexatidões, mas também de molde a proporcionar-lhe a oportunidade de evitar o abalo de seu crédito, no mercado de consumo, purgando a mora o mais cedo possível". Nesse sentido, o STJ tem entendimento pacífico de que "a pessoa natural ou jurídica que tem seu nome inscrito em cadastro de devedores tem o direito a ser informado do fato. A falta dessa comunicação poderá acarretar a responsabilidade da entidade que administra o banco de dado" (REsp 285401/SP, rel. min. Ruy Rosado de Aguirar) bem como de que "a indevida inscrição ou manutenção no SPC, gera direito à indenização por dano moral, independentemente da prova objetiva do abalo à honra e à reputação sofrida pelo autor". (REsp 442642 / PB, rel. min. Aldir Passarinho Junior)

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49No que tange especificamente aos danos impostos à

integridade física do consumidor (vida e saúde), deve-se

ressaltar que esta se baseia na segurança que deve

existir na prestação do produto ou do serviço, visto que

a falha neste dever pode importar na obrigação do

fornecedor em indenizar o consumidor. Instável se mostra

a jurisprudência acerca da extensão do dever de segurança

do fornecedor, estando tal obrigação intrinsicamente

relacionada à atividade de bens102 e serviços em questão.

Aborde-se, ainda, acerca da prevenção de danos, prevista

pelo CDC através de seus arts. 4, III; 6, VI e 10, que

cuidam das hipóteses onde há incerteza quanto à segurança

do consumidor. Nesse caso, a incerteza científica quanto

à periculosidade do produto milita contra o fornecedor,

que deverá provar a sua segurança frente aos órgãos

competentes para poder introduzi-lo no mercado103. Caso a

inofensividade do produto não seja demonstrada, em razão

do princípio consumerista da prevenção de danos, este não

apenas se enquadrará como inseguro, como ainda serão

tomadas as medidas de segurança necessárias à proteção da

saúde e da vida do consumidor. Em função da diversidade

de situações, cabe trazer à baila a lição de Aurisvaldo

Melo Sampaio104:

102. V. Resp. 286176 – SP e Resp 575469 –RJ. 103. Haveria uma inversão ope legis do ônus da prova, no tocante à segurança dos produtos. 104. Aurisvaldo Melo Sampaio, “As novas tecnologias e o princípio da efetiva prevenção de danos ao consumidor” in Revista de Direito do Consumidor v. 49, São Paulo: ED. RT, 2004, p. 159 e 160.

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50“(…) podemos um esforço para identificar

as circunstâncias em que a incerteza da

segurança pode apresentar-se:

1. A incerteza da insegurança diz

respeito tão-somente a certas formas de

utilização do produto. Nesse caso o

consumidor deve ser informado

adequadamente, a fim de que se abstenha

de utilizá-lo nas condições que

representam potencial perigo.

2. A incerteza restringe-se à segurança

do produto ou serviço quando utilizado

por determinadas pessoas, por serem estas

devido a qualquer razão, particularmente

sucetíveis de sofrer os seus possíveis

efeitos nefastos. Mais uma vez, a

informação adequada ao consumidor é de

rigor.

3. Embora incerta a segurança do

produto, cessará essa incerteza, restando

a plena certeza da segurança, se adotadas

certas cautelas pelo consumidor, como a

limitação da quantidade de uso do produto

ou serviço. Também aqui, o único ônus que

se impõe ao fornecedor é a informação

adequada ao consumidor.

4. Embora incerta a segurança do

produto, cessará essa incerteza, restando

a plena certeza da segurança, se adotadas

certas cautelas pelo fabricante, como a

instalação de aparatos que minimizem os

seus possíveis efeitos nocivos. Na

hipótese, deve o fornecedor atuar

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51preventivamente, adotando as medidas a

seu cargo para conferir ao produto ou

serviço certeza quanto à sua segurança, a

isto podendo ser compelido pelos órgãos

competentes.

5. A incerteza da segurança diz respeito

à utilização do produto ou serviço em

quaisquer circunstâncias, por quaisquer

pessoas e ainda que adotadas todas as

cautelas possíveis. Neste último caso, é

inadmissível o fornecimento, devendo ser

compelido o fornecedor de abster-se de

fazê-lo.”

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52

4. CONCLUSÃO

1. A Constituição Federal de 1988 inovou ao estabelecer a

dignidade da pessoa humana como um valor fundamental do

Estado Democrático de Direito, conferindo-lhe eficácia

maxima através do princípio da capacidade imediata das

leis.

2. Os direitos da personalidade, fundados na dignidade da

pessoa humana representam um valor fundamental, unitário

e ilimitado do atual ordenamento jurídico.

3. Os direitos da personalidade caracterizam-se como

intransmissíveis, irrenunciáveis, imprescritíveis e

oponíveis erga omnes, nos termos nos artigos 11 à 21 do

Código Civil de 2002.

4. Compreendida a personalidade humana com valor atenta-

se para a importância da elasticidade de sua tutela.

Assim sendo, o elenco destes direitos previstos no Código

Civil de 2002 deve ser interpretado como meramente

exemplificativo, não podendo o Magistrado recusar a

proteção de um direito intríseco à pessoa, tão-somente

pela sua ausência do estatuído na mencionada legislação

cível.

5. O atual Código Civil, de forma não taxativa, tratou

dos seguintes direitos da personalidade: direito à vida;

direito à integridade; direito ao nome; direito à honra;

direito à imagem e direito à vida privada.

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536. A proteção ao consumidor possui raízes

constitucionais, visto que a atual Carta Magna

estabeleceu tal defesa como princípio geral da atividade

econômica.

7. O Código de Defesa do Consumidor, como uma lei de

ordem pública e interesse social, atua como um

microssistema orientador das relações de consumo, devendo

ser interpretado sempre à luz dos princípios

constitucionais, bem como de forma solidária e residual

com o Código Civil de 2002.

8. Os direitos do consumidor albergam, em sua textura,

direitos da personalidade, tendo o CDC garantindo os

meios e instrumentos para a melhor defesa dos direitos

personais do consumidor.

9. O dano a pessoa do consumidor pode concretizar-se no

âmbito moral ou no material, distinguindo-se com base na

lesão e no caráter da sua repercussão sobre o lesado. No

primeiro caso, a afronta ocorre aos atributos e

sentimentos da pessoa, enquanto no segundo o prejuízo se

dá sobre o seu patrimônio.

10. O Código de Defesa do Consumidor, objetivado proteger

adequadamente os direitos da personalidade na esfera de

consumo, beneficiou todos aqueles que se caracterizam

como vítimas de fato do produto ou do serviço, para

efeitos da responsabilidade civil.

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5411. O dano moral, apesar de intimamente ligado às

caracteristícas da pessoa, não pode ser reduzido à

simples definição de lesão à direito da personalidade,

visto tratar-se, primordialmente, de uma violação à

cláusula geral de tutela da pessoa humana.

12. A frustração e desrespeito aos princípios

consumeristas da boa-fé objetiva, transparência,

confiança e equidade na relação de consumo, podendo

embasar ação reparatória por danos morais ao consumidor.

13. Os danos morais ao consumidor fundamentam-se nos

direitos da personalidade e no valor da dignidade da

pessoa humana, estatuídos pela Constituição Federal como

orientadores de todo o sistema jurídico. Assim sendo,

qualquer ação de indenização por danos morais ao

consumidor não está unicamente vinculada à Lei

Consumerista, mas também às demais normas que tratam do

obrigatório respeito à pessoa.

14. Os danos personais não são suscetíveis de uma exata

auferição econômica, embora atenuáveis através de

estipulação de valor reparatório pelo prejuízo sofrido.

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ÍNDICE

1.

Introdução........................................8/9.

2. A Dignidade da Pessoa Humana e os Direitos da

Personalidade......................................10.

2.1. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa

Humana...............................................10/1

2.

2.2. O Princípio da Dignidade Humana e os Direitos da

Personalidade......................................12/15.

2.3. Os Direitos da

Personalidade......................................15/29.

3. O Dano Moral ao Consumidor....................30.

3.1. As raízes constitucionais do Código de Defesa do

Consumidor.........................................30/33.

3.2. O CDC, o novo Código Civil e os Direitos da

Personalidade......................................33/38.

3.3. O Dano Material e Moral.......................38/44.

3.4. O Dano Moral ao Consumidor....................44/51.

4.

Conclusão........................................52/54.

Bibliografia.....................................55-58.

Índice...............................................59.

Folha de Avaliação.................................60.

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FOLHA DE AVALIAÇAO

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PROJETO A VEZ DO MESTRE

Pós-Graduação “Lato Sensu”

Título: O Dano Moral ao Consumidor e seu fundamento

civil-constitucional.

Autora: Ana Beatriz Rutowitsch Bicalho.

Orientador: Sergio R. Farias.

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Avaliado por:_____________________________ Grau:_________

Rio de Janeiro, ____ de _______________ de 2005.

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