67
O DEMÔNIO FAMILIAR PERSONAGENS CARLOTINHA HENRIQUETA EDUARDO PEDRO JORGE ALFREDO AZEVEDO D. MARIA VASCONCELOS ATO PRIMEIRO Em casa de EDUARDO. Gabinete de estudo. CENA PRIMEIRA CARLOTINHA, HENRIQUETA CARLOTINHA - Mano, mano! (Voltando-se para a porta.) Não te disse? Saiu! (Acenando.) Vem, psiu, vem! HENRIQUETA - Não, ele pode zangar-se quando souber. CARLOTINHA - Quem vai contar-lhe? Demais, que tem isso? Os homens não dizem que as moças são curiosas? HENRIQUETA - Mas, Carlotinha, não é bonito uma moça entrar no quarto de um moço solteiro. CARLOTINHA - Sozinha, sim; mas com a irmã não faz mal. HENRIQUETA - Sempre faz. CARLOTINHA - Ora! Estavas morrendo de vontade. HENRIQUETA - Eu não; tu é que me chamaste. CARLOTINIIA - Porque me fazias tantas perguntinhas, que logo percebi o que havia aqui dentro. (No coração.) HENRIQUETA - Carlotinha!... CARLOTINHA - Está bom, não te zangues. HENRIQUETA - Não; mas tens lembranças! CARLOTINHA - Que parecem esquecimentos, não é? Esquecia-me que não gostas que

o Demônio Familiar - José de Alencar

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Peça brasileira de José de Alencar

Citation preview

O DEMNIO FAMILIAR

PERSONAGENS

CARLOTINHAHENRIQUETAEDUARDOPEDROJORGEALFREDOAZEVEDOD. MARIAVASCONCELOS

ATO PRIMEIROEm casa de EDUARDO. Gabinete de estudo.

CENA PRIMEIRACARLOTINHA, HENRIQUETA

CARLOTINHA - Mano, mano! (Voltando-se para a porta.) No te disse? Saiu! (Acenando.) Vem, psiu, vem!HENRIQUETA - No, ele pode zangar-se quando souber.CARLOTINHA - Quem vai contar-lhe? Demais, que tem isso? Os homens no dizem que as moas so curiosas?HENRIQUETA - Mas, Carlotinha, no bonito uma moa entrar no quarto de um moo solteiro.CARLOTINHA - Sozinha, sim; mas com a irm no faz mal.HENRIQUETA - Sempre faz.CARLOTINHA - Ora! Estavas morrendo de vontade.HENRIQUETA - Eu no; tu que me chamaste.CARLOTINIIA - Porque me fazias tantas perguntinhas, que logo percebi o que havia aqui dentro. (No corao.)HENRIQUETA - Carlotinha!...CARLOTINHA - Est bom, no te zangues.HENRIQUETA - No; mas tens lembranas!CARLOTINHA - Que parecem esquecimentos, no ? Esquecia-me que no gostas que adivinhem os teus segredos.HENRIQUETA - No os tenho.CARLOTINHA - Anda l!... Oh! meu Deus! Que desordem! Aquele moleque no arranja o quarto do senhor; depois mano vem e fica maado.HENRIQUETA - Vamos ns arranj-lo?CARLOTINHA - Est dito; ele nunca teve criadas desta ordem.HENRIQUETA (a meia voz) - Porque no quis!CARLOTINHA - Que dizes?... C est uma gravata.HENRIQUETA - Um par de luvas.CARLOTINHA - As botinas em cima da cadeira.HENRIQUETA - Os livros no cho.CARLOTINHA - Ah! Agora pode-se ver!HENRIQUETA - No abrimos a janela?CARLOTINHA - verdade. (Abre.)HENRIQUETA - Daqui v-se a minha casa; olha!CARLOTINHA - Pois agora que sabes? Nunca viste mano Eduardo nesta janela?HENRIQUETA - No; nunca.CARLOTINHA - Fala a verdade, Henriqueta!HENRIQUETA - J te disse que no: se vi, no me lembra. H tanto tempo que esta janela no se abre!CARLOTINHA - Bravo! Depois no digas que so lembranas minhas.HENRIQUETA - O que? O que disse eu?CARLOTINHA - Nada; traste o teu segredo, minha amiguinha. Se tu sabes que esta janela no se abre, porque todos os dias olhas para ela.HENRIQUETA - Pois no...CARLOTINHA - Para que procuras esconder uma coisa que teus olhos esto dizendo? Tu choras!... Por qu? pelo que eu disse? Perdoa, no falo mais em semelhante coisa.HENRIQUETA - Sim; eu te peo, Carlotinha. Se soubesses o que eu sofro...CARLOTINHA - Como! Meu irmo to indigno de ti, Henriqueta, que te ofendes com um simples gracejo a seu respeito?HENRIQUETA - Eu que no sou digna dele; no mereo, nem mesmo por tua causa, uma palavra de amizade!CARLOTINHA - Que dizes! Mano Eduardo te trata mal?HENRIQUETA - Mal, no; mas com indiferena, com uma frieza!... s vezes nem me olha.CARLOTINHA - Mas antes, quando nos visitavas mais a mido, e passavas dia conosco, ele brincava tanto contigo!HENRIQUETA - Sim; porm, um dia, tu no reparaste, talvez; eu me lembro... ainda me di! Um dia vim passar a tarde contigo, e durante todo o tempo que estive aqui ele no me deu uma palavra.CARLOTINHA - Distrao! No foi de propsito.HENRIQUETA - Oh! foi! Desde ento essa janela nunca mais se abriu. Agora posso dizer-te tudo... Eu o via do meu quarto a todas as horas do dia; de manh, apenas acordava, j ele estava; antes de jantar, quando ele chegava, eu o esperava; e tarde, ao escurecer.CARLOTINHA - E nunca me disseste nada!HENRIQUETA - Tinha vergonha. Hoje mesmo se no adivinhasses, se eu no me trasse.CARLOTINHA - Deixa estar que hei de perguntar-lhe a razo disto.HENRIQUETA - Eu te suplico! No lhe digas nada. Para qu? Sofri dois meses, sofri como tu no fazes idia. Uns versos sobretudo que ele me mandou fizeram-me chorar uma noite inteira.CARLOTINHA - Mas por isso mesmo! No quero que ele te faa chorar. Hei de obrig-lo a ser para ti o mesmo que era.HENRIQUETA - Agora... impossvel!CARLOTINHA - Por qu?HENRIQUETA - No tenho coragem de dizer; e, entretanto, vim hoje s para dar-te parte e para... despedir-me desta casa.CARLOTINHA - Vais fazer alguma viagem?HENRIQUETA - No, mas vou... (Ouve-se subir a escada.)CARLOTINHA - ele! mano!HENRIQUETA - Ah! Meu Deus!CARLOTINHA - Depressa! Corre!...CENA IIEDUARDO, CARLOTINHAEDUARDO - Pedro!... Moleque!... O brejeiro anda passeando, naturalmente! Pedro!CARLOTINHA (entrando) - O que quer, mano? Pedro saiu.EDUARDO - Onde foi?CARLOTINHA - No sei.EDUARDO - Por que o deixaste sair?CARLOTINHA - Ora! H quem possa com aquele seu moleque? um azougue; nem mame tem respeito.EDUARDO - Realmente insuportvel; j no o posso aturar.CENA IIIOs mesmos, PEDROPEDRO - Senhor chamou?EDUARDO - Onde andava?PEDRO - Fui ali na loja da esquina.EDUARDO - Fazer o qu? Quem lhe mandou l?CARLOTINHA - Foi vadiar; s o que ele faz.PEDRO - No, nhanh; fui comprar soldadinho de chumbo.EDUARDO - Ah! O senhor ainda brinca com soldados de chumbo... Corra, v chamar-me um tlburi na praa; j, de um pulo.PEDRO - Sim, senhor.CENA IVEDUARDO, CARLOTINHACARLOTINHA - Onde vai, mano?EDUARDO - Vou ao Catete ver um doente; volto j.CARLOTINHA - Eu queria falar-lhe.EDUARDO - Quando voltar, menina.CARLOTINHA - E por que no agora?EDUARDO - Tenho pressa, no posso esperar. Queres ir hoje ao Teatro Lrico?CARLOTINHA - No, no estou disposta.EDUARDO - Pois representa-se uma pera bonita. (Enche a carteira de charutos.) Canta a Charton. H muito tempo que no vamos ao teatro.CARLOTINHA - verdade; mas quem nos acompanha voc, e seus trabalhos, sua vida ocupada... Depois, mano, noto que anda triste.EDUARDO - Triste? No, meu gnio; sou naturalmente. seco; gosto pouco de divertimentos.CARLOTINHA - Mas houve um tempo em que no era assim; brincvamos, passvamos as noites a tocar piano e a conversar; voc, Henriqueta e eu. Lembra-se?EDUARDO - Se me lembro!... Estava formando h pouco, no tinha clnica. Hoje falta-me o tempo para as distraes.CENA VOs mesmos, PEDROPEDRO - Est a o tlburi, sim, senhor; carro novo, cavalinho bom.EDUARDO - Agora veja se se larga outra vez. Quero tudo isto arrumado, no seu lugar; no me toque nos meus livros; escove esta roupa. Respeite-me os charutos. Quem abriu aquela janela?CARLOTINHA - Fui eu, mano. Fiz mal?EDUARDO - No gosto que esteja aberta, o vento leva-me os papis. (A PEDRO.) Fecha!CARLOTINHA - Voc outrora gostava de passar as tardes ali, fumando ou lendo.EDUARDO - At logo, Carlotinha. Moleque, no saia.CARLOTINHA - Oua, mano!... No quer ver Henriqueta?EDUARDO - Ah!... H muito tempo no te visitava!CARLOTINHA - Por isso mesmo, venha falar-lhe.EDUARDO - No; j me demorei mais do que pretendia.CARLOTINHA - Escute!CENA VIPEDRO, CARLOTINHAPEDRO - Sr. moo Eduardo pensa que a gente tem perna de pau e no precisa andar!CARLOTINHA - Fecha aquela porta!PEDRO - Ento, nhanh, V.Mce. no recebe aquele bilhete, no?CARLOTINHA - Moleque! Tu ests muito atrevido!...PEDRO - Pois olhe, nhanh; o moo bonito, petimetre mesmo da moda!... Mais do que o Sr. moo Eduardo. Xi!... Nem tem comparao!CARLOTINHA - No o conheo!PEDRO - Pois ele conhece nhanh; passa aqui todo o dia. Chapu branco de castor, deste de aba revirada; chapu fino; custa caro! Sobrecasaca assim meio recortada, que tem um nome francs; cala justinha na perna; bota do Dias; bengalinha desse bicho, que se chama unicorne. Se nhanh chegar na janela depois do almoo h de ver ele passar, s gingando: Tch, tch, tch... Hum!... Moo bonito mesmo!CARLOTINHA - Melhor para ele; no faltar a quem namore.PEDRO - No falta, no; mas ele s gosta de nhanh. Quando passa, nhanh no v; mas eu, c de baixo, estou s espreitando. Vai olhando para trs, de pescocinho torto! Porm nhanh no faz caso dele!CARLOTINHA - um desfrutvel! Est sempre a torcer o bigode!PEDRO - da moda, nhanh! Aquele bigodinho, assim enroscado, onde nhanh v, um anzol; anda s pescando corao de moa.CARLOTINHA - Moleque, se tu me falares mais em semelhante coisa, conto a teu senhor. Olha l!PEDRO - Est bom, nhanh; no precisa se zangar. Eu digo ao moo que nhanh no gosta dele, que ele tem uma cara de frasquinho de cheiro...CARLOTINHA - Dize o que tu quiseres, contanto que no me contes mais histrias.PEDRO - Mas agora como h de ser!... Ele me deu dez mil-ris.CARLOTINHA - Para qu?PEDRO - Para entregar bilhete a nhanh. (Tira o bilhete.) Bilhetinho cheiroso; papel todo bordado!CARLOTINHA - Ah! se mano soubesse!PEDRO - Ele amigo de Sr. moo Eduardo.CARLOTINHA - Nunca vem aqui!PEDRO - Oh! se vem; ainda ontem; por sinal que me perguntou se j tinha entregado.CARLOTINHA - E tu que respondeste?PEDRO - Que nhanh no queria receber.CARLOTINHA - E por que no restituste a carta?PEDRO - Porque a carta veio com os dez mil-ris... e eu gastei o dinheiro, nhanh.CARLOTINHA - Ah! Pedro, sabes em que te meteste?PEDRO - Mas que tem que nhanh receba! um moo mesmo na ordem!CARLOTINHA - No!... no devo! (Chega-se estante e escolhe um livro.)PEDRO - Nhanh no h de ser freira!... (Mete a carta no bolso sem que ela o perceba.) Entregue est ela!CARLOTINHA - Que dizes?PEDRO - Nada, nhanh! Que V.Mce. uma moa muito bonita e Pedro um moleque muito sabido!CARLOTINHA - melhor que arrumes o quarto de teu senhor, vadio! (CARLOTINHA senta-se e l.)PEDRO - Isto um instante! Mas nhanh precisa casar! Com um moo rico como Sr. Alfredo, que ponha nhanh mesmo no tom, fazendo figurao. Nhanh h de ter uma casa grande, grande, com jardim na frente, moleque de gesso no telhado; quatro carros na cocheira; duas parelhas, e Pedro cocheiro de nhanh.CARLOTINHA - Mas tu no s meu, s de mano Eduardo.PEDRO - No faz mal; nhanh fica rica, compra Pedro; manda fazer para ele sobrecasaca preta inglesa: bota de canho at aqui (marca o joelho); chapu de castor; tope de sinh, tope azul no ombro. E Pedro s, trs, zaz, zaz! E moleque da rua dizendo "Eh! cocheiro de sinh D. Carlotinha!"CARLOTINHA - Cuida no que tens que fazer, Pedro. Teu senhor no tarda.PEDRO - j; no custa! Meio-dia, nhanh vai passear na Rua do Ouvidor, no brao do marido. Chapeuzinho aqui na nuca, peitinho estufado, tund arrastando s! Assim, moa bonita! Quebrando debaixo da seda, e a saia fazendo x, x, x! Moo, rapaz deputado, tudo na casa do Desmarais de luneta no olho: "Oh! Que paixo!..." O outro j: "V.Ex.a passa bem?" E aquele homem que escreve no jornal tomando nota para meter nhanh no folhetim.CARLOTINHA - Oh! meu Deus! Que moleque falador! No te calars? (L.)PEDRO - Quando de tarde, carro na porta; parelha de cavalos brancos, fogosos; Pedro na bolia, direitinho, chapu de lado, s tenteando as rdeas. Nhanh entra; vestido toma o carro todo, corpinho reclinado embalanando: "Botafogo!" Pedro puxou as rdeas; chicote estalou; t, t, t; cavalo, toc, toc, toc; carro trrr!... Gente toda na janela perguntando: "Quem ? Quem ?" - "D. Carlotinha..." Bonito carro! Cocheiro bom!... E Pedro s deitando poeira nos olhos de boleeiro de aluguel.CARLTINHA - Ora, mano no vem! Disse que voltava j!PEDRO - De noite, baile de estrondo, como baile do Sr. Baro de Meriti; linha de carro na porta, at no fim da rua, e torce na outra; ministro, deputado, senador, homem do pao, s de farda bordada, com po-de-rala no peito. Moa como formiga! Mas nhanh pisa tudo; brilhante reluzindo na testa como fasca, leque abanando, vestido cheio de renda. Tudo cado s, com o olho de jacar assim. E nhanh sem fazer caso.CARLOTINHA (rindo) - Onde que tu aprendeste todas essas histrias, moleque? Ests adiantado!PEDRO - Pedro sabe tudo!... Da a pouco, msica vom, vom, vom, tra-ra-l, tra-ra-l-ta; vem ministro, toma nhanh para danar contradana; e nhanh s requebrando o corpo! (Arremeda a contradana.)CARLOTINHA - Ora, senhor! J se viu que capetinha!CENA VIIOs mesmos, JORGEJORGE - Mana Carlotinha, Henriqueta est lhe chamando para dizer-lhe adeus.PEDRO - Sinh Henriqueta est ai?CARLOTINHA - Ela j vai?JORGE - J est deitando o chapu.CARLOTINHA - to cedo ainda!PEDRO - Duas horas j deu h muito tempo em S. Francisco de Paula.CARLOTINHA ( janela) - Mano no voltar para jantar?...PEDRO - No tarda a, nhanh!JORGE (na mesa) - Olha! que pintura bonita, Pedro!PEDRO - Comece, comece a remexer! Depois fica todo derretido. Foi moleque!...CARLOTINHA - Quando Eduardo voltar, vai me chamar, ouviste, Pedro?... Jorge, venha!JORGE - J vou, Carlotinha!CARLOTINHA - No toque nos papis de Eduardo; ele no gosta.CENA VIIIPEDRO, JORGEPEDRO (querendo tomar o livro) - Ande, ande, nhonh; v l para dentro! Deixe o livro.JORGE - Se tu s capaz, vem tomar!PEDRO - Ora! s querer!JORGE - Pois eu to mostrei!PEDRO - Est arrumado! Pedro, moleque capoeira, mesmo da malta, conta l com menino de colgio! Caia! s neste jeito; p no queixo, testa na barriga.JORGE - Espera; vou dizer a mame que tu ests te engraando comigo!PEDRO - s o que sabe fazer; enredo da gente! Nhonh no v que de brincadeira. Olhe este livro; tem pintura tambm; mulher bonita mesmo! (Abre o livro.)JORGE - Deixa ver! Bravo!... Que belo! (Tirando um papel.) Que isto?PEDRO - Um verso!... Oh! Pedro vai levar viva!JORGE - Que viva?PEDRO - Essa que mora aqui adiante!JORGE - Para qu?PEDRO - Nhonh no sabe? Ela tem paixo forte por Sr. moo Eduardo; quando v ele passar, corao faz tuco, tuco, tuco! Quer casar com doutor.JORGE - E mano vai casar com ela?PEDRO - Pois ento! Mas no v agora contar a todo o mundo.JORGE - E ele gosta daquela mulher to feia? Antes fosse com D. Henriqueta.PEDRO - Menino no entende disto! Sinh Henriqueta moa bonita mas pobre! A viva rica, duzentos contos! Sr. moo casa com ela e fica capitalista, com dinheiro grosso! Compra carro e faz Pedro cocheiro!... Leia o verso, nhonh.JORGE - Deixa-me; no estou para isto!PEDRO - Ah! Se Pedro soubesse ler (sentando-se) fazia como doutor, sentado na poltrona, com o livro na mo e puxando s a fumacinha do havana. Por falar em havana. .. (Ergue-se, vai mesa e mete a mo na caixa dos charutos.) Com efeito! Sr. moo Eduardo est fumando muito! Uma caixa aberta ontem; neste jeito acaba-me os charutos.JORGE - Ah! tu ests tirando os charutos de mano!PEDRO - Cale a boca, nhonh Jorge! para fumar quando ns formos passear l na Glria, de tarde.JORGE - Amanh?PEDRO - Sim.JORGE - Eu vou pedir a mame.PEDRO - Espere, deite sobrescrito neste verso, roxo, no; viva no gosta desta cor; verde, cor de esperana!JORGE - Toma!PEDRO - Pronto!... Agora Pedro chega l, deita na banquinha de costura, volta as costas fazendo que no v! Ela, fogo! (Finge que beija.) L. E guarda no seio, tal qual como se o Sr. moo mandasse. O pior se vai perguntar, como outro dia, por que Sr. moo no vai visitar ela; eu respondi que era para no dar que falar; mas viva no quer saber de nada; est morrendo por tomar banho na igreja para deixar vestido preto!JORGE - Ento tu levas versos a ela sem mano mandar?PEDRO - Pedro sabe o que faz! Agora veja se vai contar!JORGE - Eu no!! Que me importa isto!CENA IXPEDRO, ALFREDOALFREDO - O Dr. Eduardo no est?PEDRO - No, senhor; saiu, Sr. Alfredo!ALFREDO - Ento, j entregaste?PEDRO - Hoje mesmo!ALFREDO - A resposta?PEDRO - Logo; preciso dar tempo. V.Mce. cuida que moa escreve a vapor! Pois no; primeiro passa um dia inteiro a ler a carta, depois outro dia a olhar assim para o ar com a mo no queixo, depois tem dor de cabea para dormir acordada; por fim vai escrever e rasga um caderno de papel.ALFREDO - Parece-me que tu me ests enganando; no entregaste a carta a D. Carlotinha, e para te desculpar me contas estas histrias.PEDRO - No sou capaz de enganar a meu senhor.ALFREDO - Pois bem; o que disse ela quando recebeu?PEDRO - Perguntou quem era V.Mce.ALFREDO - E tu, que respondeste?PEDRO - Ora, j se sabe: moo rico bem parecido.ALFREDO - Quem te disse que eu era rico? No quero passar pelo que no sou.PEDRO - No tem nada; riqueza faz crescer amor.ALFREDO - Tambm sabes isto?... Mas depois, que fez ela da carta?PEDRO - Deitou no bolso. Fui eu que deitei; mas o mesmo.ALFREDO - Como? Foste tu que deitaste...PEDRO - No bolso do vestido! Ela estava com vergonha. Sr. Alfredo no sabe moa como , no?ALFREDO - Bem; olha que espero a resposta!PEDRO - D tempo ao tempo, que tudo se arranja.CENA XOs mesmos, CARLOTINHACARLOTINHA (fora) - Pedro!PEDRO (puxando ALFREDO para a porta) - nhanh!ALFREDO - No faz mal!PEDRO - Este negcio assim no est bom, no!ALFREDO - Por qu?CARLOTINHA - Moleque, tu tiveste o atrevimento... (Vendo ALFREDO) Ah!ALFREDO - Perdo, minha senhora; procurava o Dr. Eduardo.CARLOTINHA - Ele saiu... Eu vou chamar mame...ALFREDO - No precisa, minha senhora, eu me retiro j; mas antes desejava ter a honra de...PEDRO (baixo, puxando-lhe pela manga) - No assuste a moa! Seno est tudo perdido.ALFREDO - E no hei de fazer a declarao do meu amor?PEDRO - Qual declarao! J no se usa!ALFREDO - Ento julgas que no devo falar-lhe?PEDRO - Nem uma palavra. Mostre-se arrufado, que para ela responder. Moa como carrapato, quanto mais a gente machuca, mais ela se agarra.ALFREDO - Ah! Ela no quer responder-me! (Cumprimenta friamente.)CARLOTINHA - No espera por mano?ALFREDO - Obrigado; no desejo incomod-la.CARLOTINHA - A mim!CENA XICARLOTINHA, PEDROCARLOTINHA - Nem sequer me olhou! E diz que gosta de mim! A primeira vez que me fala...PEDRO - O moo est queimado, hi!...CARLOTINHA - Ora, que me importa? O que te disse ele?PEDRO - Perguntou por que nhanh no queria responder carta dele.CARLOTINHA - Ah! sobre isto mesmo... Tu sabes o que vim fazer, Pedro?PEDRO (rindo-se) - Veio ver Sr. Alfredo!CARLOTINHA - Eu adivinhava que ele estava aqui?... Vim te chamar porque mame quer te perguntar donde saiu esta carta que deitaste no meu bolso.PEDRO - Nhanh foi dizer?... Pois no!... Esta Pedro no engole.CARLOTINHA - Chego na sala; vou meter a mo no bolso, encontro um papel; abro-o; uma carta de namoro! No sei como mame no percebeu!...PEDRO - Ah! Nhanh abriu!... Ento leu. CARLOTINHA - No li! mentiraPEDRO (com um muxoxo) - Mosca anda voando; tocou no mel, caiu dentro do prato. Nhanh leu!CRLOTINHA - E que tinha que lesse?PEDRO - Se leu, deve responder!CARLOTINHA - Faz-te de engraado! (Dando a carta.) Toma; no quero!PEDRO - Nhanh faz isto a um moo delicado!CARLOTINHA - Saiu; e nem sequer me olhou.PEDRO - No sabe por qu? Porque nhanh no quis responder carta dele.CARLOTINHA - E o que hei de eu responder?PEDRO - Um palavreado, como nhanh diz quando est no baile.CARLOTINHA - Mas ele escreveu em verso.PEDRO - Ah, verso! E V.Mce. no sabe fazer verso?CARLOTINHA - Eu no; nunca aprendi.PEDRO - muito fcil, eu ensino a nhanh; vejo Sr. moo Eduardo fazer. Quando esta coisa que se chama prosa, escreve-se O papel todo; quando verso, s no meio, aquelas carreirinhas. (Vai mesa.) Olhe! olhe, nhanh!CARLOTINHA - Sabes que mais? A resposta que eu tenho de dar esta: dize-lhe que, se deseja casar comigo, fale a mano.PEDRO - Ora, tudo est em receber a primeira; depois carta para l e carta para c; a gente anda como correio de ministro.CARLOTINHA - Eu te mostrarei.CENA XIIPEDRO, EDUARDO e AZEVEDOEDUARDO - Onde vai?PEDRO - Ia abrir a porta a meu senhor!EDUARDO (para a escada) - Entra, Azevedo! Eis aqui o meu aposento de rapaz solteiro; uma sala e uma alcova. pequeno, porm basta-me!AZEVEDO - um excelente appartement! Magnfico para um garon... Este o teu valet de chambre?EDUARDO - verdade; um vadio de conta!PEDRO (a AZEVEDO, em meia voz) - H... Senhor est descompondo Pedro na lngua francesa.EDUARDO - Deste lado o interior da casa; aqui tenho janelas para um pequeno jardim e uma bela vista. Vivo completamente independente da famlia. Tenho esta entrada separada. Por isso podes vir conversar quando quiseres, sem a menor cerimnia; estaremos em perfeita liberdade escolstica.AZEVEDO - Obrigado, hei de aparecer. Ah! tens as tuas paisagens signes Lacroix? Mas no so legtimas; vi-as em Paris chez Goupil; fazem uma diferena enorme.EDUARDO - No h dvida; mas no as comprei pelo nome, achei-as bonitas. Queres fumar?AZEVEDO - Aceito. Esqueci o meu porte-cigarres. So excelentes os teus charutos. Onde os compras? No Desmarais?EDUARDO - Onde os encontro melhores. (PEDRO acende uma vela.)PEDRO (baixo) - Rapaz muito desfrutvel, Sr. moo! Parece cabeleireiro da Rua do Ouvidor!EDUARDO - Cala-te!AZEVEDO (acende o charuto) - Obrigado!... Eis o que se chama em Paris - parfumer la causerie!CENA XIIIEDUARDO, AZEVEDOEDUARDO - Com que ento, vais te casar? Ora quem diria que aquele Azevedo, que eu conheci to volvel, to apologista do celibato...AZEVEDO - E ainda sou, meu amigo; dou-te de conselho que no te cases. O celibato o verdadeiro estado!... Lembra-te que Cristo foi garon!EDUARDO - Sim; mas as tuas teorias no se conformam com esse exemplo de sublime castidade!AZEVEDO - Considera, meu caro, a diferena que vai da divindade ao homem.EDUARDO - Mas enfim, sempre te resolveste a casar?AZEVEDO - Certas razes!EDUARDO - Uma paixo?AZEVEDO - Qual! Sabes que sou incapaz de amar o quer que seja. Algum tempo quis convencer-me que o meu eu amava a minha bte, que era egosta, mas desenganei-me. Fao to pouco caso de mim, como do resto da raa humana.EDUARDO - Assim, no amas a tua noiva?AZEVEDO - No, decerto.EDUARDO - rica, talvez; casas por convenincias?AZEVEDO - Ora, meu amigo, um moo de trinta anos, que tem, como eu, uma fortuna independente, no precisa tentar a chasse au mariage. Com trezentos contos pode-se viver.EDUARDO E viver brilhantemente; porm no compreendo ento o motivo...AZEVEDO - Eu te digo! Estou completamente blas, estou gasto para essa vida de flaneur dos sales; Paris me saciou. Mabille e Chteau des Fleurs embriagaram-me tantas vezes de prazer que me deixaram insensvel. O amor hoje para mim um copo de Cliqcot que espuma no clice, mas j no me tolda o esprito!EDUARDO - E esperaste chegar a este estado para te casares?AZEVEDO - Justamente. Tiro disso duas convenincias: a primeira que um marido como eu est preparado para desempenhar perfeitamente o seu grave papel de carregador do mantelete, do leque ou do binculo, e de apresentador dos apaixonados de sua mulher.EDUARDO - Com efeito! Admiro o sangue frio com que descreves a perspectiva do teu casamento.AZEVEDO - Chacun son tour, Eduardo, nada mais justo. A segunda convenincia, e a principal, que, rico, independente, com alguma inteligncia, quanto basta para esperdiar em uma conversa banal, resolvi entrar na carreira pblica.EDUARDO - Seriamente?AZEVEDO - J dei os primeiros passos; pretendo a diplomacia ou a administrao.EDUARDO - E para isso precisa casar?AZEVEDO - Decerto!... Uma mulher indispensvel, e uma mulher bonita!... o meio pelo qual um homem se distingue no grand monde!... Um crculo de adoradores cerca imediatamente a senhora elegante, espirituosa, que fez a sua apario nos sales de uma maneira deslumbrante! Os elogios, a admirao, a considerao social acompanharo na sua ascenso esse astro luminoso, cuja cauda uma crinolina, e cujo brilho vem da casa do Valais ou da Berat, custa de alguns contos de ris! Ora, como no matrimnio existe a comunho de corpo e de bens, os apaixonados da mulher tornam-se amigos do marido, e vice-versa; o triunfo que tem a beleza de uma, lana um reflexo sobre a posio do outro. E assim consegue-se tudo!EDUARDO - Tu gracejas, Azevedo; no possvel que um homem aceite dignamente esse papel. A mulher no , nem deve ser, um objeto de ostentao que se traga como um alfinete de brilhante ou uma jia qualquer para chamar a ateno!AZEVEDO - Bravo! Fizeste a mais justa das comparaes, meu amigo! Disseste com muito esprito; a mulher uma jia, um traste de luxo... E nada mais!EDUARDO - Ora, no acredito que fales seriamente!AZEVEDO - Podes no acreditar, mas isso no impede que a realidade seja essa. Ests ainda muito poeta, meu Eduardo! Vai a Paris e volta! Eu fui criana no esprito e voltei com a razo de um velho de oitenta anos!EDUARDO - Mas com o corao pervertido!... Ouve, Azevedo. Estou convencido que h um grande erro na maneira de viver atualmente. A sociedade, isto , a vida exterior, tem-se desenvolvido tanto que ameaa destruir a famlia, isto , a vida ntima. A mulher, o marido, os filhos, os irmos, atiram-se nesse turbilho dos prazeres, passam dos bailes aos teatros, dos jantares s partidas; e quando, nas horas de repouso, se renem no interior de suas casas, so como estrangeiros que se encontram um momento sob a tolda do mesmo navio para se separarem logo. No h ali a doce efuso dos sentimentos, nem o bem-estar do homem que respira numa atmosfera pura e suave. O sero da famlia desapareceu; so apenas alguns parentes que se juntam por hbito, e que trazem para a vida domstica, um, o tdio dos prazeres, o outro, as recordaes da noite antecedente, o outro, o aborrecimento das viglias!AZEVEDO - E que concluis desta tirada filosfico-sentimental?EDUARDO - Concluo que por isso que se encontram hoje tantos moos gastos como tu; tantas moas para quem a felicidade consiste em uma quadrilha; tantos maridos que correm atrs de uma sombra chamada considerao; e tantos pais iludidos que se arruinam para satisfazer o capricho de suas filhas julgando que esse o meio de dar-lhes a ventura!AZEVEDO - Realmente ests excntrico. Onde que aprendeste estas teorias?EDUARDO - Na experincia. Tambm fui atrado, tambm fui levado pela imaginao que me dourava esses prazeres efmeros, e conheci que s havia neles de real uma coisa.AZEVEDO - O qu?EDUARDO - Uma lio; uma boa e til lio. Ensinaram-me a estimar aquilo que eu antes no sabia apreciar; fizeram-me voltar ao seio da famlia, vida ntima!AZEVEDO - Hs de mudar. (Toma o chapu e as luvas.)EDUARDO - No creio!... J te vais?AZEVEDO - Tenho que fazer. Algumas maadas de homem que se despede de sua vida de garon. Janto hoje com minha noiva; amanh parto para minha fazenda, onde me demorarei alguns dias, e na volta terei o prazer de te anunciar, com todas as formalidades de estilo, em carton porcelaine sob o competente enveloppe satine et dore sur tranche, o meu casamento com a Sra. D. Henriqueta de Vasconcelos.EDUARDO - Henriqueta!... Ah! com ela que te casas?AZEVEDO - Sim. De que te admiras?EDUARDO - Julguei que escolhesses melhor! to pobre!AZEVEDO - Mas bonita e tem muito esprito. H de fazer furor quando a Gudin ajeit-la parisiense.EDUARDO - Dizem que muito modesta.AZEVEDO - Toda a mulher vaidosa, Eduardo; a modstia mesmo uma espcie de vaidade inventada pela pobreza para seu uso exclusivo.EDUARDO - Assim, ests decidido?AZEVEDO - Mais que decidido! Estou noivo j. Adeus, aparece; andas muito raro.CENA XIVEDUARDO, PEDROPEDRO - O jantar est na mesa.EDUARDO - No me maces! Vai-te embora.PEDRO - Sr. no vem, ento?EDUARDO - Chega aqui. Tu sabias que D. Henriqueta estava para casar?PEDRO - Sabia, sim, senhor; rapariga dela me contou.EDUARDO - E por que no vieste dizer-me?PEDRO - Porque V.Mce. me deu ordem que no falasse mais no nome dela.EDUARDO - verdade.CENA XVOs mesmos, CARLOTINHACARLOTINHA - Demorou-se muito, mano. Eu lhe esperei!... Agora vamos jantar.EDUARDO - No; no tenho vontade, deixa-me.PEDRO - Sr. moo est triste porque sinh Henriqueta vai casar!EDUARDO - Moleque!CARLOTINHA - Voc sabia? Era dela mesmo que eu queria falar-lhe.EDUARDO - Sabia; o seu noivo acaba de sair daqui.CARLOTINHA - Um Azevedo, no ?EDUARDO - Sim, um homem que, alm de no am-la, estima-a tanto como as suas botas envernizadas e os seus cavalos do Cabo!CARLOTINHA - Mas voc no sabe a razo desse casamento?EDUARDO - Sei, Carlotinha. Um amor pobre possui tesouros de sentimentos, mas no moeda com que se comprem veludos e sedas!CARLOTINHA - Oh! mano, no seja injusto! Ela me contou tudo!EDUARDO - Desejava saber o que te disse.CARLOTINHA - Logo depois de jantar, no jardim. Venha, mame est nos esperando.(Cai o pano.)

ATO SEGUNDOEm casa de EDUARDO. Jardim.CENA PRIMEIRAEDUARDO, CARLOTINHA, D. MARIAEDUARDO - Lembras-te do que me prometeste?CARLOTINHA - Falar-lhe de Henriqueta?... Lembro-me.EDUARDO - Que te disse ela?CARLOTINHA - Muita coisa! Mame no nos ouvir?EDUARDO - No; podes falar. Estou impaciente!CARLOTINHA - A vem ela!D. MARIA - Ora, Carlotinha, tu com as tuas flores tens tomado de tal maneira os canteiros que j no posso plantar uma hortalia.CARLOTINHA - Porm, mame... to bonito a gente ter uma flor, uma rosa para oferecer a uma amiga que nos vem visitar!D. MARIA - verdade, minha filha; mas no te lembras que tambm gostas de dar-lhes uma fruta delicada... Assim os meus morangos esto morrendo, porque as tuas violetas no deixam...CARLOTINHA - a flor da minha paixo! As violetas! Que perfume!D. MARIA - E os meus morangos, que sabor! No tenho mais um p de alface ou de chicria...EDUARDO - No se agonie, minha me, eu mandarei fazer uma pequena diviso no quintal. Deste lado Carlotinha ter o seu jardim; do outro V.Mce. mandar preparar a sua horta.D. MARIA - Estimo muito, meu filho! por vocs que eu tomo este trabalho.EDUARDO - E ns no o sabemos? Todo o nosso amor no paga esses pequenos cuidados, essas atenes delicadas de uma me que s vive para seus filhos.D. MARIA - O nico amor que no pede recompensa, Eduardo, o amor de me; mas se eu a. desejasse, que melhor podia ter do que o orgulho de ver-te em uma bonita posio, admirado pelos teus amigos e estimado mesmo pelos que no te conhecem?CARLOTINHA - No o deite a perder, mame; depois fica todo cheio de si!EDUARDO - Por ter uma irm como tu, no ?CARLOTINHA - No se trata de mim.D. MARIA - Vocs ficam? A tarde est bastante fresca!EDUARDO - J vamos, minha me.CENA IIEDUARDO, CARLOTINHACARLOTINHA - Ora, enfim! Podemos conversar, mano!EDUARDO - Sim! Estou ansioso por saber o que ela te disse! Com que fim veio ver-te! Naturalmente foi para dar-me mais uma prova de indiferena, participando-te o seu casamento!CARLOTINHA - Foi para v-lo uma ltima vez! Ah! voc no se lembra, ento, do que se passou! Fala de indiferena? ela que se queixa da sua frieza, do seu desdm!EDUARDO - Ela queixa-se... E de mim!... Estava zombando?CARLOTINHA - Zomba-se com as lgrimas nos olhos e com a voz cortada pelos soluos?EDUARDO - Que dizes? Ela chorava!...CARLOTINHA - Sobre o meu seio; e eu no sabia como a consolasse.EDUARDO - No compreendo!CARLOTINHA - Por qu?EDUARDO - Eu te direi depois. Conta-me o que ela te disse.CARLOTINHA - Foi tanta coisa!... Sim; disse-me que todos os dias lhe via da casa dela, de manh e tarde, na janela do seu quarto.EDUARDO - verdade.CARLOTINHA - Mas que uma tarde, vindo aqui, mano no lhe deu uma palavra.EDUARDO - E a razo disto no declarou? CARLOTINHA - Ela ignora!EDUARDO - Como!CARLOTINHA - Procurou recordar-se das suas menores aes para ver se poderia ter dado causa sua mudana; e no achou nada que devesse servir nem mesmo de pretexto.EDUARDO - Com efeito! o fingimento chega a esse ponto!!CARLOTINHA - injusto, mano; aquele amor no se finge. Quando ela me recitou os versos que voc lhe mandou...EDUARDO - Eu... versos?CARLOTINHA - Sim; uns versos em que a chamava de namoradeira, em que a ridicularizava.EDUARDO - Mas no h tal, nunca lhe mandei versos!CARLOTINHA - Ela os recebeu de Pedro; eu os vi, escritos por sua letra.EDUARDO - No possvel!CARLOTINHA - H nisto algum engano. Deixe-me acabar, depois ver.EDUARDO - Eu te escuto.CARLOTINHA - Os seus versos...EDUARDO - Meus, no.CARLOTINHA - Pois bem, os versos causaram-lhe uma dor mortal; conheceu que o mano escarnecia dela, e desde ento passava as noites a chorar, e o dia a olhar entre as cortinas para ao menos ter o consolo de avist-lo de longe e de relance. Mas voc conservava fechada a nica janela na qual ela podia v-lo.EDUARDO - No sabes por qu? Um dia mandou-me dizer por Pedro que a minha curiosidade a incomodava. Desde ento privei-me do prazer de olh-la...CARLOTINHA - inexplicvel!... Mas como lhe dizia, passaram-se dois meses; ela perdeu a esperana; seu pai tratou de cas-la. Desde que no podia lhe pertencer, pouco lhe importava o homem a quem a destinavam. Consentiu em tudo, mas antes de dar a sua promessa definitiva, quis v-lo pela ltima vez.EDUARDO - Para qu?CARLOTINHA - Para qu?... O noivo foi hoje jantar em sua casa; a s trs horas devia decidir-se tudo... Pois bem, antes de dizer sim, ela veio e jurou-me, por sua me, que se encontrasse mano em casa, se mano a olhasse docemente, sem aquele olhar severo de outrora...EDUARDO - Que faria?CARLOTINHA - No se casaria e viveria com essa nica esperana de que um dia mano compreenderia o seu amor!EDUARDO - Assim, como no me encontrou...CARLOTINHA - Como voc ho quis v-la...EDUARDO - Eu no quis?... verdade!CARLOTINHA - Quando o chamei, ela nos esperava toda trmula.EDUARDO - Podia eu saber? Podia conceber semelhante cousa vista do que se passou! (Refletindo.) No; no acredito.CARLOTINHA - O qu?EDUARDO - Que Pedro tenha maquinado semelhante coisa.CARLOTINHA - E eu acredito.EDUARDO - Vou saber disto! Porm, dize-me! Depois?CARLOTINHA - Voc saiu. Eu esperei muito tempo no seu quarto para ver se voltava. Tardou tanto, que por fim vi-me obrigada a desengan-la.EDUARDO - Ento, ela voltou...CARLOTINHA - Com o corao partido...EDUARDO - E foi dar esse consentimento, que seu pai esperava. A esta hora noiva de um homem que faz dela um objeto de especulao. (Passeia.)CENA IIIOs mesmos, PEDROPEDRO - Sinh velha est chamando nhanh Carlotinha l na sala.CARLOTINHA - Para qu?PEDRO - Para ver moleque de realejo que est passando. (A meia voz) Mentira s!CARLOTINHA - O qu?PEDRO - Boneco de realejo que est danando!CARLOTINHA - Ora, no estou para isso.PEDRO - Umm!... menina est reinando. Nhanh no vai?CARLOTINHA - Que te importa? Chega aqui, quero saber uma cousa.PEDRO - Que , nhanh?CARLOTINHA - Mano, vamos perguntar-lhe?EDUARDO - Deixa estar, eu pergunto! (Afasta-se com ela.) Escuta, queria pedir-te um favor.CARLOTINHA - Fale, mano; precisa pedir?EDUARDO - Desejo falar Henriqueta. Podes fazer com que ela venha passar a noite contigo?CARLOTINHA - Vou escrever-lhe! Estou quase certa de que ela vem!EDUARDO - Obrigado!CENA IVEDUARDO, PEDROEDUARDO - Vem c!PEDRO - Senhor!EDUARDO - Responde-me a verdade.PEDRO - Pedro no mente nunca.EDUARDO - Que versos so uns que entregaste a D. Henriqueta, de minha parte?PEDRO - Foram versos que senhor escreveu...EDUARDO - Que eu escrevi?PEDRO - Sim, senhor.EDUARDO - A Henriqueta?PEDRO - No, senhor.EDUARDO - A quem, ento?PEDRO - viva.EDUARDO - Que viva?PEDRO - Essa que mora aqui adiante; mulher rica, do grande tom.EDUARDO (rindo) - Ah! lembro-me! E tu levaste esses versos Henriqueta?PEDRO - Levei, sim, senhor.EDUARDO - Com que fim, Pedro?PEDRO - Sr. no se zanga, Pedro diz por que fez isso.EDUARDO - Fala logo de uma vez. Que remdio tenho eu seno rir-me do que me sucede?PEDRO - Sinh Henriqueta pobre; pai anda muito por baixo; senhor casando com ela no arranja nada! Moa gasta muito; todoo dia vestido novo, camarote no teatro para ver aquela mulher que morre cantando, carro de aluguel na porta, vai passear na Rua do Ouvidor, quer comprar tudo que v.EDUARDO - Ora, no sabia que tinha um moralista desta fora em casa!PEDRO - Depois modista, costureira, homem da loja, cabeleireiro, cambista, cocheiro, ourives, tudo mandando a conta e senhor vexado: "Diz que no estou em casa", como faz aquele homem que mora defronte!EDUARDO - Ento foi para que eu no casasse pobre que fizeste tudo isto? Que inventaste o recado que me deste em nome de Henriqueta?...PEDRO - Pedro tinha arranjado casamento bom; viva rica, duzentos contos, quatro carros, duas parelhas, sala com tapete. Mas senhor estava enfeitiado por sinh Henriqueta e no queria saber de nada. Precisava trocar; Pedro trocou.EDUARDO - O que que trocaste?PEDRO - Verso feio da viva para sinh Henriqueta; verso bonito de sinh Henriqueta foi para a viva.EDUARDO - De maneira que estou com um casamento arranjado com uma correspondncia amorosa e potica; e tudo isto graas tua habilidade?PEDRO - Negcio est pronto, sim senhor; s querer. Pedro de vez em quando leva uma flor ou um verso que senhor deixa em cima da mesa. J perguntou por que V.Mce. no vai visitar ela!EDUARDO (rindo-se) - Eis um corretor de casamentos, que seria um achado precioso para certos indivduos do meu conhecimento!Vou tratar de vender-te a algum deles para que possas aproveitar o teu gnio industrioso.PEDRO - Oh! No! Pedro quer servir a meu senhor! V.Mce. perdoa; foi para ver senhor rico!EDUARDO - E que lucras tu com isto! Sou to pobre que te falte aquilo de que precisas? No te trato mais como um amigo do que como um escravo?PEDRO - Oh! Trata muito bem, mas Pedro queria que senhor tivesse muito dinheiro e comprasse carro bem bonito para.EDUARDO - Para... Dize!PEDRO - Para Pedro ser cocheiro de senhor!EDUARDO - Ento a razo nica de tudo isto o desejo que tens de ser cocheiro?PEDRO - Sim, senhor!EDUARDO (rindo-se) - Muito bem! Assim, pouco te importava que eu ficasse mal com uma pessoa que estimava; que me casasse com uma velha ridcula, contanto que governasses dois cavalos em um carro! Tens razo!... E eu ainda devo dar-me por muito feliz, que fosse esse o motivo que te obrigasse a trair a minha confiana.CENA VPEDRO, CARLOTINHACARLOTINHA - J escrevi! Ah! Mano no est!... Pedro!...PEDRO - Nhanh!CARLOTINHA - Que fazes tu a?PEDRO - Oh! Pedro no est bom hoje, no; senhor est zangado.CARLOTINHA - Por qu? Por causa de Henriqueta?PEDRO - Sim. Pedro fez histria de negro, enganou senhor. Mas hoje mesmo tudo fica direito.CARLOTINHA - Que vais tu fazer? Melhor que estejas sossegado.PEDRO - Oh! Pedro sabe como h de arranjar este negcio. Nhanh no se lembra, no teatro lrico, uma pea que se representa e que tem homem chamado Sr. Fgaro, que canta assim:Tra-la-la-la-la-la-la-la-tra!!Sono un barbiere di qualit!Fare Ia barba per carit!...CARLOTINHA (rindo-se) - Ah! O Barbeiro de Sevilha!PEDRO - isso mesmo. Esse barbeiro, Sr. Fgaro, homem fino mesmo, faz tanta cousa que arranja casamento de sinh Rosinha com nhonh Lindrio. E velho doutor fica chupando no dedo, com aquele frade D. Baslio!CARLOTINHA - Que queres tu dizer com isto?PEDRO - Pedro tem manha muita, mais que Sr. Fgaro! H de arranjar casamento de Sr. moo Eduardo com sinh Henriqueta. Nhanh no sabe aquela ria que canta sujeito que fala grosso? Cantando.) "La calunnia!..."CARLOTINHA - Deixa-te de prosas!PEDRO - Prosa, no; verso! Verso italiano que se canta!CARLOTINHA (rindo) - Tu tambm sabes italiano?PEDRO - Ora! Quando Sr. moo era estudante e mandava levar ramo de flor danarina do teatro, aquela que tem perna de engono, Pedro falava mesmo como patrcio dela: Un fiore, signorina!CARLOTINHA - Ah! Mano mandava flores a danarinas... (A meia voz) E diz que amava a Henriqueta!PEDRO - Ora, moo pode gostar de trs moas ao mesmo tempo. Esse bicho que se chama amor, est nos olhos, nos ouvidos e no corao: moo gosta de mulher bonita s para ver, de mulher de teatro s para ouvir cantar e de mulher de casamento para pensar nela todo o dia!CARLOTINHA - No sejas tolo! A gente s deve gostar de uma pessoa! Aposto que o tal Sr. Alfredo desses!PEDRO - Qual! Sr. Alfredo s de nhanh; mas preciso responder a ele.CARLOTINHA - J no te disse a resposta? Por que no deste?PEDRO - Homem no gosta dessa resposta de boca, diz que mentira. Gosta de papelinho para guardar na carteira, lembrando-se do anjinho que escreveu.CARLOTINHA - Escrever, nunca; no tenho nimo!...PEDRO - Pois, olhe, nhanh tira duas violetas; pe uma nos cabelos, manda outra a ele! Isto de flor!... Hum!... Faz ccegas no corao.CARLOTINHA - Deste modo... sim... eu podia...PEDRO - Ento v buscar a flor j! Pedro leva!CARLOTINHA - No, no quero!PEDRO - Eu vou ver!CARLOTINHA - No preciso! Eu tenho!...PEDRO - Ah! Nhanh j tem!CARLOTINHA - Esto aqui. (No seio.)PEDRO - Melhor! D c, nhanh.CARLOTINHA - Mas olha!... No!PEDRO (tomando) - Hi!... Sr. Alfredo vai comer esta violeta de beijo s, quando souber que esteve no seio de nhanh!CARLOTINHA - D-me! No quero!CENA VICARLOTINHA, EDUARDOCARLOTINHA - Meu Deus! Ah! Mano!EDUARDO - J soube tudo, uma malignidade de Pedro. a conseqncia de abrigarmos em nosso seio esses reptis venenosos, que quando menos esperamos nos mordem no corao! Mas, enfim, ainda se pode reparar. Escreveste a Henriqueta?CARLOTINHA - Sim; a resposta no deve tardar!EDUARDO - Tu s um anjo, Carlotinha!CARLOTINHA - Como se engana, mano!EDUARDO - Que queres dizer?CARLOTINHA - Nada! Eu devia lhe contar! Mas...EDUARDO - Tens alguma coisa a dizer-me? Por que no falas?CARLOTINHA - Tenho medo!EDUARDO - De teu irmo! No tens razo!CARLOTINHA - Mesmo por ser meu irmo, no gostar...EDUARDO - Mais um motivo. Um irmo, Carlotinha, para sua irm menos do que uma me, porm mais do que um pai; tem menos ternura do que uma, e inspira menos respeito do que o outro. Quando Deus o colocou na famlia a par dessas almas puras e inocentes como a tua, deu-lhe uma misso bem delicada; ordenou-lhe que moderasse para sua irm a excessiva austeridade de seu pai e a ternura muitas vezes exagerada de sua me; ele homem e moo, conhece o mundo, porm tambm compreende o corao de uma menina, que sempre um mito para os velhos j esquecidos de sua mocidade. Portanto, a quem melhor podes contar um segredo do que a mim?CARLOTINHA - verdade, suas palavras me decidem. Voc meu irmo, e o chefe da nossa famlia, desde que perdemos nosso pai. Devo dizer-lhe tudo; tem o direito de repreender-me!EDUARDO - Cometeste alguma falta?CARLOTINHA - Creio que sim. Uma falta bem grave!EDUARDO - Minha irm... Acaso ters esquecido!...CARLOTINHA - Oh! Se toma esse ar severo, no terei nimo de dizer-lhe!EDUARDO (com esforo) - Estou calmo, mana, no vs? Fala!CARLOTINHA - Sim ! Sim! que me custa a dizer!... No faz idia!EDUARDO - Vamos! Coragem!CARLOTINHA - Conhece um moo, que s vezes lhe vem procurar... chama-se Alfredo!...EDUARDO - Que tem!...CARLOTINHA - Pois esse moo... ama-me, e...EDUARDO - E que fizeste?CARLOTINHA (atirando-se ao peito de EDUARDO) - Mandei-lhe uma flor!... Mas uma s!EDUARDO - Ah! Assim esta a falta que cometeste? A primeira e a nica!CARLOTINHA - No!... Devo dizer-lhe tudo! Li esta carta. Tome, ela queima-me o seio.EDUARDO (lendo) - Quem te entregou?CARLOTINHA - Pedro deitou no meu bolso sem que o percebesse.EDUARDO - Oh! Eu adivinhava! E respondeste?CARLOTINHA - Pois a violeta foi a resposta! No queria dar. Mas lembrei-me que assim como Henriqueta lhe amava, tambm eu podia am-lo!...EDUARDO - Tens razo, minha irm. Cometeste uma falta, mas te arrependeste a tempo. No te envergonhes disto; s moa e inexperiente, a culpa foi minha, e minha s.CARLOTINHA - Sua, mano! Como?EDUARDO - Eu te digo: acabas de dar-me uma prova do teu discernimento; o que vou dizer-te ser uma lio. Os moos, ainda os mais tmidos como eu, minha irm, sentem quando entram na vida uma necessidade de gozar desses amores que duram alguns dias e que passam deixando o desgosto n'alma! Eu fui fascinado pela mesma miragem; depois quis esquecer Henriqueta e procurei nos olhares e nos sorrisos das mulheres um blsamo para o que eu sofria. Iluso! O amor vivia, e nas minhas extravagncias o que eu esquecia que tinha uma irm inocente confiada minha guarda. Imprudente eu abrigava no seio de minha famlia, no meu lar domstico, a testemunha e o mensageiro de minhas loucuras: alimentava o verme que podia crestar a flor de tua alma. Sim, minha irm! Tu cometeste uma falta; eu cometi um crime!CARLOTINHA - No se acuse, mano; severo demais para uma coisa que ordinariamente fazem os moos na sua idade!EDUARDO - Porque no refletem!... Se eles conhecessem o fel que encobrem essas rosas do prazer deix-las-iam murchar, sem sentir-lhes o perfume! H certos objetos to sagrados que no se devem manchar nem mesmo com a sombra de um mau exemplo! A reputao de uma moa um deles. O homem que tem uma famlia est obrigado a respeitar em todas as mulheres a inocncia de sua irm, a honra de sua esposa e a virtude de sua me. Ningum deve dar direito a que suas aes justifiquem uma suspeita ou uma calnia.CARLOTINHA - Est bom, no v agora ficar triste e pensativo por isso. J lhe disse tudo, j lhe dei a carta; prometo-lhe no pensar mais nele. Duvida de mim?EDUARDO - No. Agradeo a tua confiana e acredita que saberei usar dela. J volto.CARLOTINHA - Que vai fazer?EDUARDO - Escrever uma carta; ou antes, responder que recebeste.CARLOTINHA - Como, Eduardo!EDUARDO - Logo sabers.CARLOTINHA - Mas no se zangue com ele; sim?EDUARDO - Tranqiliza-te; ele te interessa, um ttulo para que eu o respeite.CENA VIICARLOTINHA, HENRIQUETAHENRIQUETA (fora) - Carlotinha!...CARLOTINHA - Henriqueta! - Ah! Eu te esperava!HENRIQUETA - E tinhas razo... Mas antes de tudo... verdade?... O que me escreveste?CARLOTINHA - Sim; ele te ama e te amou sempre! Um engano, uma fatalidade...HENRIQUETA - Bem cruel!... Eu perdoaria de bom grado sorte todas as minhas lgrimas, mas no lhe perdo o fazer-me mulher de outro!CARLOTINHA - Ento, est decidido!HENRIQUETA - Eu no te disse! Sou sua noiva! Meu pai deu-lhe a sua palavra. Ele me acompanha j com direito de senhor. Por sua causa estive quase no vindo...CARLOTINHA - Como assim? Ele recusaria...HENRIQUETA - No; mas meu pai convidou-o para acompanhar-nos, e eu lembrei-me que Eduardo sofreria tanto vendo-me junto desse homem, que um momento fiquei indecisa!CARLOTINHA - Por qu? Ele sabe que tu no o amas.HENRIQUETA - No importa.CARLOTINHA - Mas enfim vieste. Fizeste bem!HENRIQUETA - No sei se fiz bem. Fui arrastada! Creio que aos ps do altar, se ele me chamasse, eu ainda me voltaria para dizer-lhe, enquanto sou livre, que o amo e que s amarei a ele!CENA VIIIOs mesmos, VASCONCELOS, D. MARIA, AZEVEDOVASCONCELOS - Onde est o nosso Doutor? No h mais quem o veja.CARLOTINHA - Subiu ao seu quarto, j volta. VASCONCELOS - Oh! D. Carlotinha! Como est?!... Apresento-lhe meu genro. O Sr. Azevedo. (A AZEVEDO) a mais ntima amiga de Henriqueta.AZEVEDO - E eu o mais ntimo amigo de seu irmo! H, portanto, dois motivos bastante fortes para o meu respeito e considerao.CARLOTINHA - Muito obrigada! (A HENRIQUETA) Vai-te sentar; ests toda trmula!HENRIQUETA (baixo) - E ele, por que no vem?CARLOTINHA - No tarda! (Afastam-se.)VASCONCELOS (a D. MARIA) - Parece-me um excelente moo, e estou certo que h de fazer a felicidade de minha filha.D. MARIA - o que desejo; tenho muita amizade sua menina e estimo que seu marido rena todas as qualidades.VASCONCELOS - Para mim, se quer que lhe diga a verdade, s lhe noto um pequeno defeito.D. MARIA - Qual? jogador?VASCONCELOS - No; o jogo j no um defeito, segundo dizem; tornou-se um divertimento de bom-tom. O que noto em meu genro, e que desejo corrigir-lhe, o mau costume de falar metade em francs e metade em portugus, de modo que ningum o pode entender!D. MARIA - Ah! No observei ainda!VASCONCELOS - uma mania que eles trazem de Paris e que os torna sofrivelmente ridculos. Mas no se querem convencer!AZEVEDO - Tem um belo jardim, minha senhora, um verdadeiro bosquet. Oh! c'est charmant! No perdo, porm, a meu amigo Eduardo no ter aproveitado para fazer um kiosque. Ficaria magnfico!VASCONCELOS - Ento, entendeu?D. MARIA - No, absolutamente nada!VASCONCELOS - O mesmo me sucede! Tanto que s vezes ainda duvido que realmente ele me tenha pedido a mo de Henriqueta!D. MARIA - Ora! demais! (Sobem.)AZEVEDO (a CARLOTINHA) - Aqui passa V. Ex.a naturalmente as tardes, conversando com as suas flores, em doce e suave rverie!CARLOTINHA - No tenho o costume de sonhar acordada; isso bom para as naturezas poticas.AZEVEDO - Les hommes sont potes; les femmes sont la posie, disse um distinto escritor. Oh! Eis a flor clssica da beleza.CARLOTINHA - A camlia?AZEVEDO - Sim, a camlia hoje, em Paris, mais do que uma simples flor; uma condecorao que a moda, verdadeira soberana, d mulher elegante.CARLOTINHA - Parece-me que uma senhora no precisa de outro distintivo alm de suas maneiras e de sua graa natural. Que dizes, Henriqueta?HENRIQUETA - Tens razo, Carlotinha; no o enfeite que faz a mulher; a mulher que faz o enfeite, que lhe d a expresso e o reflexo de sua beleza.AZEVEDO - Teorias!... Fumes d'esprit... (A CARLOTINHA) Mas, minha senhora, disse h pouco que se podia fazer deste jardim um paraso!CARLOTINHA - Como? Diga-me; quero executar perfeitamente o seu plano.AZEVEDO - Com muito gosto. Vou traar-lhe em miniatura o jardim de minha casa; de nossa casa, D. Henriqueta.CARLOTINHA (a HENRIQUETA) - Deixo-te s! (D o brao a AZEVEDO.)AZEVEDO - Aqui un jet d'eau. noite de um efeito maravilhoso! Alm de que espalha uma frescura! (Afastam-se.)CENA IXOs mesmos, HENRIQUETA, EDUARDO, VASCONCELOS. D. MARIAEDUARDO - D. Henriqueta!HENRIQUETA - Ah!... Sr. Eduardo!VASCONCELOS - Como est? Eu no passo bem das minhas enxaquecas!D. MARIA - do tempo!VASCONCELOS - Qual, D. Maria! Molstia de velho! Onde est ele? (A EDUARDO) Quero apresentar-lhe meu futuro genro.EDUARDO - Conheo-o; um dos meus camaradas de colgio!VASCONCELOS - Ah! Estimo muito. (A D. MARIA) Eu c no tenho camaradas de colgio; mas tenho os de fogo! Na guerra da Independncia...AZEVEDO (voltando) - Acabo de dar um passeio pelos Campos Elseos!CARLOTINHA - Na imaginao... lisonjeiro para mim!EDUARDO - Boa tarde, Azevedo!HENRIQUETA (a CARLOTINHA) - Ah! Nunca esperei!CARLOTINHA - O qu?HENRIQUETA - Tu me iludiste!AZEVEDO - Participo-te, meu caro, que tens uma irm encantadora. Estou realmente fascinado. A sua conversa uma gerbe de graa; uma fuse de ditos espirituosos!EDUARDO - Admira! Pois nunca foi a Paris, nem est habituada a conversar com os moos elegantes!.AZEVEDO - realmente tonnant!VASCONCELOS - Ora, meu genro, se o Sr. continua a falar desta maneira, obriga-me a trazer no bolso daqui em diante um dicionrio de Fonseca.AZEVEDO - Os estrangeiros tm razo! Estamos ainda muito atrasados no Brasil!D. MARIA - Entremos, quase noite!(Cai o pano.)

ATO TERCEIROEm casa de EDUARDO. Sala interior.CENA PRIMEIRAEDUARDO, HENRIQUETA, CARLOTINHA, AZEVEDO, VASCONCELOS,D. MARIA, PEDRO, JORGE(Toma-se ch. Na mesa do centro, CARLOTINHA e AZEVEDO; direita, VASCONCELOS e D. MARIA; esquerda, HENRIQUETA; EDUARDO passeia, JORGE numa banquinha esquerda. PEDRO serve.)CARLOTINHA - Ora, Sr. Azevedo! Pois o senhor esteve em Paris e no aprendeu a fazer ch?...AZEVEDO - Paris, minha senhora, no sabe tomar ch, o privilgio de Londres.D. MARIA (a PEDRO) - Serve ao Sr. Vasconcelos.PEDRO (baixo, a JORGE) - Eh! Nhonh! Hoje no fica po no prato, velho jarreta limpa a bandeja.VASCONCELOS - Excelentes fatias! uma coisa que em sua casa sabem preparar!CARLOTINHA - Mano Eduardo, venha tomar ch.EDUARDO - No; depois.PEDRO (baixo, a CARLOTINHA) - Nhanh est enfeitiando o moo!CARLOTINH& - Henriqueta, no dizes nada! Ests to calada!HENRIQUETA - Tu me deixaste sozinha.CARLOTINHA - Tens razo!... Ora, mano, deixe-se de passear e venha conversar com a gente.AZEVEDO - verdade. Em que pensas, Eduardo? Na homeopatia ou nalguma beleza inconnue?EDUARDO - Penso na teoria do casamento que me expuseste esta manh; estou convertido s tuas idias.AZEVEDO - Ah!... D. Carlotinha, no quer que a sirva?CARLOTINHA (ergue-se; a EDUARDO) - Vai-te sentar junto de Henriqueta.EDUARDO (baixo) - No; se me sento junto dela esqueo tudo. Tu me lembraste h pouco que sou o chefe de uma famlia.CARLOTINHA - No lhe entendo.EDUARDO - Daqui a pouco entenders.D. MARIA - Tens alguma coisa, meu filho?EDUARDO - No, minha me; espero algum que tarda.CARLOTINHA (a HENRIQUETA) - No te zangues!... (Beija-a na face.)HENRIQUETA - No; j estou habituada.PEDRO (servindo HENRIQUETA) - Sr. moo Eduardo gosta muito de sinh Henriqueta.HENRIQUETA - Agora que me dizes isto!PEDRO - Ele h de casar com sinh!AZEVEDO - D. Maria, sabe? Sua filha est zombando desapiedadamente de mim.CARLOTINHA - No creia, mame.D. MARIA - Decerto; no possvel, Sr. Azevedo.VASCONCELOS (a PEDRO) - Deixa ver isto!PEDRO (baixo) - Sr. Vasconcelos come como impingem!VASCONCELOS - Hein!... (D. MARIA senta-se.)PEDRO - Este po est muito gostoso!JORGE - Vem c, Pedro!PEDRO (baixo) - Guarda, nhonh! Sinh velha est s com olho revirado para ver se Pedro mete biscoito no bolso.CARLOTINHA - Ora, Sr. Azevedo, no gosto de cumprimentos. Todo esse tempo, Henriqueta, o teu noivo no fez outra coisa seno dirigir-me finezas. Previno-te para que no acredites nelas!HENRIQUETA - Ests to alegre hoje, Carlotinha.CARLOTINHA (baixo) - Isto quer dizer que ests triste! Tens razo! Fui egosta. Mas ele te ama.HENRIQUETA - Tu o dizes!AZEVEDO (a EDUARDO) - Realmente no pensava encontrar no Rio de Janeiro uma moa to distinta como tua irm. uma verdadeira parisiense.CARLOTINHA - Vamos para a sala! Venha Sr. Azevedo. Mano...CENA IIVASCONCELOS, PEDRO, D. MARIA, JORGEVASCONCELOS - preciso tambm pensar em casar a Carlotinha, D. Maria; j tempo!D. MARIA - Sim, est uma moa, mas, Sr. Vasconcelos, no me preocupo com isto. H certas mes que desejam ver-se logo livres de suas filhas, e que s tratam de cas-las; eu sou o contrrio.VASCONCELOS - Tem razo; tambm eu se no estivesse vivo!... Mas isso de um homem no ter a sua dona de casa, terrvel! Anda tudo s avessas.D. MARIA - Por isso no; Henriqueta uma boa menina! Bem educada!...VASCONCELOS - Sim; uma moa do tom; porm no serve para aquilo que se chama uma dona de casa! Estas meninas de hoje aprendem muita coisa: francs, italiano, desenho e msica, mas no sabem fazer um bom doce de ovos, um biscoito gostoso! Isto era bom para o nosso tempo, D. Maria!D. MARIA - Eram outros tempos, Sr. Vasconcelos; os usos deviam ser diferentes. Hoje as moas so educadas para a sala; antigamente eram para o interior da casa!VASCONCELOS - Que o verdadeiro elemento. Confesso que hoje, que vou ficar s, se ainda encontrasse uma daquelas senhoras do meu tempo, mesmo viva!...D. MARIA - Vamos ouvir as meninas tocarem piano!... C deve estar mais fresco!(Durante as cenas seguintes ouve-se, por momentos, o piano.)CENA IIIPEDRO, JORGEPEDRO - H!... Tbua mesmo na bochecha! Sinh velha no brinca! Ora, senhor. Homem daquela idade, que no serve para mais nada, querendo casar. Para ter mulher que lhe tome pontos nas meias!JORGE - Vou me divertir com ele.PEDRO - No; sinh briga. V sentar-se l junto de nhanh Carlotinha, e oua o que Sr. Azevedo est dizendo a ela.JORGE - Para qu?PEDRO - Para contar a Pedro depois.JORGE - Eu, no.PEDRO - Pois Pedro no leva nhonh para passear na Rua do Ouvidor.

JORGE - Ora, eu j vi!PEDRO - Mas agora que est bonita! Tem homem de pau vestido de casaca, com barba no queixo, em p na porta da loja, e moa rodando como corrupio na vidraa de cabeleireiro.JORGE - Est bom! Eu vou!CENA IV

PEDRO, VASCONCELOS, JORGE

VASCONCELOS - No deixaria por aqui a minha caixa e o meu leno?PEDRO (a JORGE} - Um dia capaz tambm de deixar o nariz!... Vintm que no esquece nunca! Est grudado dentro do bolso!JORGE - L no sof, Sr. Vasconcelos!VASCONCELOS - Ah! C est! Acabou-se-me o rap! Chega aqui, Pedro!

PEDRO (a JORGE) - J vem maada! (Alto.) Sr. quer alguma coisa?VASCONCELOS - Vai num pulo ali em casa, pede a Josefa que me encha esta caixa de rap, e traze depressa.PEDRO - Sim, senhor; Pedro vai correndo.VASCONCELOS - Olha, no te esqueas de dizer-lhe que eu sei a altura em que deixei o pote. s vezes gosta de tomar a sua pitada minha custa.PEDRO - Mas, Sr. Vasconcelos...VASCONCELOS - O que ? (JORGE sai.)PEDRO - Nhonh d uns cobres para comprar... uma jaqueta.VASCONCELOS - Ora que luxo!... Uma jaqueta com este calor?PEDO - para passear num domingo, dia de procisso!VASCONCELOS - Pede a teu senhor!PEDRO - Qual!... Ele no d!VASCONCELOS - Bom costume este! Vocs fazem pagar caro o ch que se toma nestas casas! Mas eu no concorro para semelhante abuso!PEDRO - Ora! dez tostes; moedinha de prata! Ch no hotel custa mais caro!VASCONCELOS - Sim; vai buscar o rap e na volta falaremos. (Batem palmas.)CENA VEDUARDO, ALFREDOALFREDO - Boa noite. Ah! Dr. Eduardo...EDUARDO - Sente-se, Sr. Alfredo; preciso falar-lhe.ALFREDO - Peo-lhe desculpa de me ter demorado; mas quando levaram o seu bilhete no estava em casa; h pouco que recebi e imediatamente.EDUARDO - Obrigado; o que vou dizer-lhe para mim de grande interesse, e por isso espero que me oua com ateno.ALFREDO - Estou s suas ordens.EDUARDO - Sr. Alfredo, minha irm me pediu que lhe entregasse esta carta.ALFREDO - A minha!...EDUARDO - Sim. Quanto resposta, a mim que compete d-la. o direito de um irmo, no o contestar, decerto.ALFREDO - Pode fazer o que entender. (Ergue-se.)EDUARDO - Queira sentar-se, senhor, creio que falo a um homem de honra, que no deve envergonhar-se dos seus atos.ALFREDO - Eu o escuto!EDUARDO - No pense que vou dirigir-lhe exprobraes. Todo o homem tem o direito de amar uma mulher; o amor uni sentimento natural e espontneo, por isso no estranho, ao contrrio, estimo, que minha irm inspirasse uma afeio a uma pessoa cujo carter aprecio.ALFREDO - Ento no sei para que essa espcie de interrogatrio!...EDUARDO - Interrogatrio? Ainda no lhe fiz uma s pergunta, e nem preciso fazer. Tenho unicamente um obsquio a pedir-lhe; e depois nos separaremos amigos ou simples conhecidos.ALFREDO - Pode falar, Dr. Eduardo. Comeo a compreend-lo; e sinto ter a princpio interpretado mal as suas palavras.EDUARDO - Ainda bem! Eu sabia que nos havamos de entender; posso ser franco. Um homem que ama realmente uma moa, Sr. Alfredo, no deve exp-la ao ridculo e aos motejos dos indiferentes; no deve deixar que a sua afeio seja um tema para a malignidade dos vizinhos e dos curiosos.ALFREDO - uma acusao imerecida. No dei ainda motivos...EDUARDO - Estou convencido disso, e justamente para que no os d e no siga o exemplo de tantos outros, que tomei a liberdade de escrever-lhe convidando-o a vir aqui esta noite. Quero apresent-lo minha famlia.ALFREDO - Como? Apesar do que sabe? E do que se passou?EDUARDO - Mesmo pelo que sei e pelo que se passou. Tenho a este respeito certas idias, no sou desses homens que entendem que a reputao de uma mulher deve ir at o ponto de no ser amada. Mas no seio de sua famlia, ao lado de seu irmo, sob o olhar protetor de sua me, que uma moa deve receber o amor puro e casto daquele que ela tiver escolhido.ALFREDO - Assim, me permite...EDUARDO - No permito aquilo que um direito de todos. Somente lhe lembrarei uma coisa, e para isso no e necessrio invocar a amizade. Qualquer alma, ainda a mais indiferente, compreender o alcance do que vou dizer.ALFREDO - No sei o que quer lembrar-me, doutor; se , porm, o respeito que me deve merecer sua irm, escusado.EDUARDO - No; no isso, nesse ponto confio no seu carter, e confio sobretudo em minha irm. O que lhe peo que, antes de aceitar o oferecimento que lhe fiz, reflita. Se a sua afeio um capricho passageiro, no h necessidade de vir buscar, no seio da famlia, a flor modesta que se oculta na sombra e que perfuma com a sua pureza a velhice de uma me, e os ntimos gozos da vida domstica. O senhor um moo distinto; pode ser recebido em todos os sales. A achar os protestos de um amor rapidamente esquecido; a no delrio da valsa, e no abandono do baile, pode embriagar-se de prazer. E quando um dia sentir-se saciado, suas palavras no tero deixado num corao virgem o germe de uma paixo, que aumentar com o desprezo e o indiferentismo.ALFREDO - A minha afeio, Dr. Eduardo, seria e no se parece com esses amores de um dia!EDUARDO - Bem; o que desejava ouvir-lhe. (Vai porta da sala, e faz um aceno.)CENA VIOs mesmos, CARLOTINHAEDUARDO - Vem, mana; quero apresentar-te um dos meus amigos.ALFREDO - Agradeo!... (a EDUARDO, e a meia voz.)CARLOTINHA - Mano!... Que quer dizer isto?EDUARDO - Uma coisa muito simples! Desejo que veJas de perto o homem que te interessa; conhecers se ele digno de ti.CARLOTINHA (com arrufo) - No quero!... No gosto dele!EDUARDO - Dir-lhe-s isto mesmo. Em todo o caso um amigo de teu irmo! (a ALFREDO) Previno-lhe, Sr. Alfredo, que no usamos cerimnias!ALFREDO Obrigado; quando se est entre amigos a intimidade a mais respeitosa e a mais bela das etiquetas.EDUARDO - Muito bem dito! (PEDRO atravessa a cena, entra na sala com a caixa de rap, volta, e vem aparecer na porta do lado oposto.)D. MARIA - Henriqueta te chama, Carlotinha!CARLOTINHA - Sim, mame! (Sai.)EDUARDO (a ALFREDO) -~ minha me! (A D. MARIA) Um dos meus amigos, o Sr. Alfredo, que vem pela primeira vez a nossa casa e que, espero, continuar a freqent-la.ALFREDO - Terei nisto o maior prazer. Eu estimava j, sem conhec-la, a sua famlia.D. MARIA - Pois venha sempre que queira. Os amigos de Eduardo so aqui recebidos como filhos da casa!ALFREDO - No mereo tanto, e a sua bondade, minha senhora, honra-me em extremo.EDUARDO - Vamos, esto aqui na sala algumas pessoas de nossa amizade, a quem desejo apresent-lo.ALFREDO - Com muito gosto.D. MARIA - Eu j volto!CENA VIIPEDRO, CARLOTINHACARLOTINHA - Pedro, traz copos d'gua na sala.PEDRO - Ho! Nhanh!... Rato est dentro do queijo!CARLOTINHA - No te entendo!PEDRO - Sr. Alfredo j sentado junto do piano, s alisando o bigodinho!CARLOTINHA - Que tem isso?PEDRO - Eh!... Casamento est fervendo! Pedro vai mandar lavar camisa de prega para o dia do banquete.CARLOTINHA - No andes dizendo estas coisas!PEDR - Ora no faz mal! E Sr. Azevedo? Nhanh viu! Est cado tambm, s arrastando a asa!CARLOTINHA - Pedro!CENA VIIID. MARIA, EDUARDOD. MARIA - Onde vais?EDUARDO - Vinha mesmo em sua procura, minha me.D MARIA - Precisas falar-me?EDUARDO - Quero dizer-lhe uma coisa que lhe interessa. Este moo, Alfredo...D. MARIA - O teu amigo... que me apresentaste?EDUARDO - Ama Carlotinha!D. MARIA - Ah! E ela sabe?EDUARDO - Sabe e talvez j o ame!D. MARIA - No possvel! Tua irm!...EDUARDO - Sim, minha me; ela o ama, sem compreender ainda o sentimento que comea a revelar-se.D. MARIA - E esse moo abriu-se contigo e pediu-te a mo de tua irm?EDUARDO - No, minha me; eu disse-lhe que sabia a afeio que tinha a Carlotinha, e por isso queria apresent-lo minha famlia.D. MARIA - E exigiste dele a promessa de casar-se com ela?EDUARDO - No; no exigi promessa alguma.D. MARIA - Foi ele ento que a fez espontaneamente?EDUARDO - No podia fazer, porque no tratamos de semelhante coisa.D. MARIA - Mas, meu filho, no te entendo. Tu chamas para o interior da famlia um homem que faz a corte tua irm e nem sequer procuras saber as suas intenes!EDUARDO - As intenes de um homem, ainda o mais honrado, minha me, pertencem ao futuro, que faz delas uma realidade ou uma mentira. Para que obrigar um moo honesto a mentir e faltar sua palavra?...D. MARIA - Assim, tu julgas que intil pedir ou receber uma promessa?EDUARDO - Completamente intil, quando a promessa no constitui uma verdadeira obrigao social e um direito legtimo.D. MARIA - No te percebo!EDUARDO - preciso conhecer o corao humano, minha me, para saber quanto as pequeninas circunstncias influem sobre os grandes sentimentos. O amor, sobretudo, recebe a impresso de qualquer acidente, ainda o mais imperceptvel. O corao que ama de longe, que concentra o seu amor por no poder exprimi-lo, que vive separado pela distncia, irrita-se com os obstculos, e procura venc-los para aproximar-se. Nessa luta da paixo cega todos os meios so bons: o afeto puro muitas vezes degenera em desejo insensato e recorre a esses ardis de que um homem calmo se envergonharia; corrompe os nossos escravos, introduz a imoralidade no seio das famlias, devassa o interior da nossa casa, que deve ser sagrada como um templo, porque realmente o templo da felicidade domstica.D. MARIA - Nisto tens razo, meu filho! essa a causa de tantas desgraas que se do na nossa sociedade e com pessoas bem respeitveis; mas qual o meio de evit-las?EDUARDO - O meio?... simples; aquele que acabo de empregar e que V.Mce. estranhou. Tire ao amor os obstculos que o irritam, a distncia que o fascina, a contrariedade que o cega, e ele se tornar calmo e puro como a essncia de que dimana. No h necessidade de recorrer a meios ocultos, quando se pode ver e falar livremente; no meio de uma sala, no seio da intimidade, troca-se uma palavra de afeto, um sorriso, uma doce confidncia; mas, acredite-me, minha me, no se fazem as promessas e concesses perigosas que s arranca o sentimento da impossibilidade.D. MARIA - Mas supe que esse homem, que parece ter na sociedade uma posio honesta, no digno de tua irm, e que, portanto, com este meio, proteges uma unio desigual?EDUARDO - No tenho esse receio. Ningum conhece melhor o homem que a ama, do que a prpria mulher amada; mas para isso preciso que o veja de perto, sem o falso brilho, sem as cores enganadoras que a imaginao empresta aos objetos desconhecidos e misteriosos. Numa carta apaixonada, numa entrevista alta noite, um desses nossos elegantes do Rio de Janeiro pode parecer-se com um heri de romance aos olhos de uma menina inexperiente; numa sala, conversando, so, quando muito, moos espirituosos ou frvolos. No h heris de casaca e luneta, minha me; nem cenas de drama sobre o eterno tema do calor que est fazendo.D. MARIA (rindo) - Pensa bem, Eduardo!EDUARDO - Continue a educar o esprito da sua filha como tem feito at agora; e fique certa que, se Alfredo tivesse uma alma pequena e um mau carter, Carlotinha descobriria primeiro, com a segunda vista do amor, do que a senhora com toda a sua solicitude e eu com toda a minha experincia.D. MARIA - Desculpa, Eduardo. Sou mulher, sou me, sei adorar meus filhos, viver para eles, mas no conheo o mundo como tu. Assustei-me vendo que um perigo ameaava tua irm; tuas palavras, porm, tranqilizaram-me completamente.CENA IXOs mesmos, CARLOTINHA, AZEVEDOAZEVEDO - Pode-se fumar nesta sala?EDUARDO - Por que no? Vou mandar-lhe dar charutos.CARLOTINHA (baixo) - Por que nos deixou, mano? Henriqueta est to triste!EDUARDO - Tratava da tua felicidade.D. MARIA - Acha a nossa casa muito inspida, no verdade, Sr. Azevedo?AZEVEDO - Ao contrrio, minha senhora, muito agradvel; aqui podo-se estar perfeitamente son aise.EDUARDO (a PEDRO, na porta) - Traz charutos.CENA XAZEVEDO, EDUARDOAZEVEDO - Realmente, Henriqueta perde vista em uma sala; no tem aquele esprito que brilha, aquela graa que seduz, aquela altivez misturada de uma certa nonchalance, que distingue a mulher elegante.EDUARDO (rindo-se) - Como! J ests arrependido?AZEVEDO - No; no digo isto! apenas uma comparao que acabo de fazer. Tua irm Carlotinha o contrrio.EDUARDO - Sabes a razo disto?AZEVEDO - No...EDUARDO - porque j vs Henriqueta com olhos de marido!AZEVEDO - Talvez...CENA XIAZEVEDO, PEDROPEDRO - Charutos, Sr. Azevedo; havanas de primeira qualidade, da casa de Wallerstein!AZEVEDO - Pelo que vejo j os experimentaste!PEDRO - Pedro no fuma, no senhor; isto bom para moo rico, que passeia de tarde, vendo as moas.AZEVEDO - Ento preciso fumar para ver as moas?PEDRO - Oh! Moa no gosta de rapaz que toma rap, no, como esse velho Sr. Vasconcelos, que anda sempre pingando. Velho porco mesmo!...AZEVEDO - Mas tem uma filha bonita!PEDRO - Sinh Henriqueta! Noiva de senhor!...AZEVEDO - Tu j sabes?...PEDRO - Ora, j est tudo cheio. Na Rua do Ouvidor no se fala de outra coisa.AZEVEDO - Ah! Quem espalharia? Apenas participei a alguns amigos...PEDRO - O velho foi logo dizer a todo o mundo. V.Mce. no sabe por qu?AZEVEDO - No; por qu?PEDRO - Porque... Esse velho deve quela gente toda da Rua do Ouvidor; filha dele gasta muito, credor no quer mais ouvir histria e vai embrulhar o homem em papel selado. Ento, para acomodar lojista, foi logo contar que estava para casar a filha com sujeito rico, que h de cair com os cobres!AZEVEDO - Isso verdade, moleque?PEDRO - Caixeiro da loja me contou!AZEVEDO - Mas infame... Um tal procedimento!... Especular com a minha boa f!PEDRO - Sr. Azevedo, no faz idia. Esse velho, hi!... Tem feito coisas...AZEVEDO - Vem c; diz-me o que sabes, e dou-te u a molhadura.PEDRO - Pedro diz, sim senhor; mesmo que V.Mce. no d nada. um homem que ningum pode aturar... Fala mal de todo o mundo. Caloteiro como ele s. Rap que toma de meia cara. Na venda ningum lhe d nem um vintm de manteiga. Quando passa na rua, caixeiro, moleque, tudo zomba dele.AZEVEDO - Um sogro dessa qualidade!... uma vergonha! Vejo-me obrigado a ir viver na Europa!...PEDRO - Pedro j vem!... (Vai porta e volta.) Filha dele, sinh Henriqueta... Mas Sr. Azevedo vai casar com ela!...AZEVEDO - Que tem isso? Gosto de conhecer as pessoas com quem tenho de viver.PEDRO - Pois ento, Pedro fala; mas no diga a ningum.AZEVEDO - Podes ficar descansado!PEDRO - Sr. Azevedo acha ela bonita?AZEVEDO - Acho; por isso que me caso.PEDRO - Moa muda muito vista na sala!AZEVEDO - Que queres dizer?PEDRO - Modista faz milagre!AZEVEDO - Ento ela no bem feita de corpo?PEDRO - Corpo?... No tem! Aquilo tudo que senhor v pano s! Vestido vem acolchoado da casa da Bragaldi; algodo aqui, algodo aqui, algodo aqui! Cinturinha faz suar rapariga dela; uma aperta de l, outra aperta de c...AZEVEDO - No acredito! Ests a a pregar-me mentiras.PEDRO - Mentira! Pedro viu com estes olhos. Um dia de baile ela foi tomar respirao, cordo quebrou; e rapariga, bum: l estirada. Moa ficou desmaiada no sof; preta deitando gua-de-colnia na testa para voltar a si.AZEVEDO - E tu viste isto?PEDRO - Vi, sim senhor; Pedro tinha ido levar bouquet que nhanh Carlotinha mandava. Mas depois viu outra coisa... Um!...AZEVEDO - Que foi? dize; no me ocultes nada.PEDRO - gua-de-colnia caiu no rosto e desmanchou reboque branco!...AZEVEDO - Que diabo de histria esta! Reboque branco?PEDRO - Ora, senhor no sabe; este p que mulher deita na cara com pincel. Sinh Henriqueta tem rosto pintadinho, como ovo de peru; para no aparecer, caia com p de arroz e essa mistura que cabeleireiro vende.AZEVEDO - Que mulher, meu Deus! Como um homem vive iludido neste mundo! Aquela candura...PEDRO - Moa bonita nhanh Carlotinha! Essa sim! No tem c panos, nem ps! Pezinho de menina; cinturinha bem feitinha; no carece apertar! Sapatinho dela parece brinquedo de boneca. Cabelo muito; no precisa de crescente. No como a outra!AZEVEDO - Ento, D. Henriqueta tem o p grande?PEDRO (fazendo o gesto) - Isto s! Palmo e meio!. .. s vezes nhanh Carlotinha e as amigas zombam deveras! Mas no pergunte a ela, no'? Sinh velha fica maada.AZEVEDO - No; no me importo com isto; mas vem c; dize-me, nhanh Carlotinha no gosta de moo nenhum?PEDRO - Qual! Zomba deles todos. Esse rapaz, Sr. Alfredo, anda se engraando, mas perde seu tempo. Homem srio assim, como Sr. Azevedo, que agrada a ela.AZEVEDO - Ento pensas que...PEDRO - Pedro no pensa nada! Viu s quando se tomava ch, risozinho faceiro... segredinho baixo...AZEVEDO (desvanecido) - No quer dizer nada!... Moas!CENA XIIOs mesmos e ALFREDOALFREDO (na porta da sala, a EDUARDO) - No se incomode. Boa noite!...PEDRO (baixo) - Ento, Sr. Alfredo!...ALFREDO - Deixa-me.PEDRO (baixo) - Est todo emproado!... Como no precisa mais...AZEVEDO (dando fogo a ALFREDO) - Pedro, amanh vai minha casa; tenho uns livros para mandar a Eduardo.PEDRO - Sim, senhor. A que horas?AZEVEDO - Depois do almoo.CENA XIIIALFREDO, AZEVEDOALFREDO - raro encontr-lo agora, Sr. Azevedo. J no aparece nos bailes, nos teatros.AZEVEDO - Estou-me habituando existncia montona da famlia.ALFREDO - Montona?AZEVEDO - Sim. Um piano que toca, duas ou trs moas que falam de modas; alguns velhos que dissertam sobre a carestia dos gneros alimentcios e a diminuio do peso do po, eis um verdadeiro tableau de famlia no Rio de Janeiro. Se fosse pintor faria umprimeiro prix au Conservatoire des Arts.ALFREDO - E havia de ser um belo quadro, estou certo; mais belo sem dvida do que uma cena de salo.AZEVEDO - Ora, meu caro, no salo tudo vida; enquanto que aqui, se no fosse essa menina que realmente espirituosa, D. Carlotinha, que faramos, seno dormir e abrir a boca?ALFREDO - verdade; aqui dorme-se, porm sonha-se com a felicidade; no salo vive-se, mas a vida uma bem triste realidade. Ao invs de um piano h uma rabeca, as moas no falam de modas, mas falam de bailes; os velhos no dissertam sobre a carestia, mas ocupam-se com a poltica. Que diz deste quadro, Sr. Azevedo, no acha que tambm vale a pena de ser desenhado por um hbil artista, para a nossa "Academia de Belas-Artes?"AZEVEDO - A nossa "Academia de Belas-Artes?" Pois temos isto aqui no Rio?ALFREDO - Ignorava?AZEVEDO - Uma caricatura, naturalmente... No h arte em nosso pais.ALFREDO - A arte existe, Sr. Azevedo, o que no existe o amor dela.AZEVEDO - Sim, faltam os artistas.ALFREDO - Faltam os homens que os compreendam; e sobram aqueles que s acreditam e estimam o que vem do estrangeiro.AZEVEDO (com desdm) J foi a Paris, Sr. Alfredo?ALFREDO - No, senhor; desejo, e ao mesmo tempo receio ir.AZEVEDO - Por que razo?ALFREDO - Porque tenho medo de, na volta, desprezar o meu pas, ao invs de amar nele o que h de bom e procurar corrigir o que e mau.AZEVEDO - Pois aconselho-lhe que v quanto antes! Vamos ver estas senhoras!ALFREDO - Passe bem.CENA XIVOs mesmos, CARLOTINHA, HENRIQUETACARLOTINHA (a HENRIQUETA) - J to cedo? Que horas so, Sr. Azevedo?ALFREDO - Nove e meia.AZEVEDO - Quase dez. Como passa rapidamente o tempo aqui! (Entra na sala.)CARLOTINHA - Ento! Demora-te mais algum tempo. Sim?HENRIQUETA (baixo) - Para qu?... Ele nem me fala!ALFREDO - Minhas senhoras! Boa noite, D. Carlotinha.CARLOTINHA - Adeus, Sr. Alfredo. Mame j lhe disse que a nossa casa est sempre aberta para receber os amigos.ALFREDO Se eu no temesse abusar...CARLOTINHA (estendendo-lhe a mo) - At amanh!ALFREDO - Boa noite! (Sai.)CENA XVCARLOTINHA, HENRIQUETACARLOTINHA - Olha, Henriqueta! Tu no tens razo! Eduardo te ama, ele j me disse. Se hoje no tem falado contigo, porque teu pai... teu noivo... no sei a razo! Mas deixa-te dessas desconfianas.HENRIQUETA - Entretanto, depois de dois meses, ele devia achar um momento para ao menos dizer-me uma palavra que me desse esperana; porque, Carlotinha, se esse casamento era uma desgraa para mim, agora, que tu dizes que ele me ama, tornou-se um martrio! No sei o que faa... Quero confessar a meu pai!... E tenho medo!... J deu sua palavra!...CARLOTINHA - A tua felicidade vale mais do que todas as palavras do mundo.HENRIQUETA - Tu no sabes!...CARLOTINHA - Ah! Aqui est Eduardo!CENA XVIAs mesmas, EDUARDO.EDUARDO - Enfim, posso falar-lhe, D. Henriqueta?CARLOTINHA - Ela j te acusava!EDUARDO - A mim!HENRIQUETA - Eu no; disse apenas...CARLOTINHA - Disse apenas que tu ainda no tinhas achado um momento para dar-lhe uma palavra... de amor!HENRIQUETA - De amizade! Foi o que eu disse.EDUARDO - E tem razo; mas quando souber o motivo me desculpar.HENRIQUETA - Ainda outro motivo!EDUARDO - Sim; desta vez no um engano, um dever.HENRIQUETA - Ah! uma promessa, talvez...CARLOTINHA - Que lembrana!...EDUARDO - Disse um dever; um dever bem grave, mas que tem um rostinho muito risonho; olhe. (Amimando a face de CARLOTINHA.)HENRIQUETA - Carlotinha?CARLOTINHA - Ah! Quer-se desculpar comigo! Pois vou-me embora!HENRIQUETA (sorrindo) - Vem c!EDUARDO - Deixe; ficaremos ss.CENA XVIIEDUARDO, HENRIQUETAEDUARDO - Henriqueta, me perdoa?HENRIQUET - Perdoar-lhe!... Eu que devia ter adivinhado!EDUARDO - E eu no devia ter compreendido que entre duas almas que se estimam no preciso um intermedirio? O amor que passa pelos estranhos perde a sua pureza... Carlotinha j lhe disse o que aconteceu?...HENRIQUETA - Sim; ela me contou tudo, mas pareceu-me que me tinha enganado. Duvidei...EDUARDO - Como?... Duvidou de mim!...HENRIQUETA - Durante toda esta noite, no a primeira vez que nos falamos e, entretanto, devamos ter tanto que dizer-nos... Um to longo silncio...EDUARDO - No lhe dei j a razo?... Antes do meu amor, a felicidade de minha irm. um pequeno segredo que ela lhe contar, se j no lhe contou. Precisava tranqilizar o meu esprito, porque no desejo misturar uma inquietao, um mau pensamento, s primeiras expanses do nosso amor!HENRIQUETA - Ah! Carlotinha tambm ama! Ainda no me confiou seu segredo!... Ela ao menos tem um irmo que l em sua alma; h de ser feliz!...EDUARDO - E ns, no o seremos?HENRIQUETA - Quem sabe!EDUARDO - Este casamento impossvel!HENRIQUETA - Por qu?EDUARDO - Porque vou confessar tudo a seu pai, e ele no sacrificar sua filha a uma palavra dada.HENRIQUETA - E se recusar?EDUARDO - Ento respeitaremos sua vontade.HENRIQUETA - Sim, ele pai, mas...EDUARDO - Mas o amor soberano; no isso, Henriqueta?HENRIQUETA - E no se... vende!EDUARDO - Que dizes? Compreendo!HENRIQUETA - No, Eduardo, no compreenda, no procure compreender! Foi uma idia louca que me passou pelo esprito; no sei nada!... Uma filha pode acusar seu pai?EDUARDO - No; mas pode confiar a um amigo uma queixa de outro amigo.HENRIQUETA - Pois bem, eu lhe digo. Meu pai deve a esse homem, e julgou que no podia recusar-lhe a minha mo, apesar das minhas instncias. Lutei um ms inteiro, Eduardo, mas lutei s; e uma mulher sempre fraca, sobretudo quando se exige dela um sacrifcio!EDUARDO - Tem razo; se lutssemos juntos, talvez...HENRIQUETA - Oh! Ento eu defenderia a nossa felicidade; mas lutar para conservar apenas uma triste esperana!CENA XVIII

Os mesmos, VASCONCELOS, AZEVEDO, D. MARIA

VASCONCELOS - Vamos, menina! tarde.HENRIQUETA - Sim, meu pai. (A meia voz.) Adeus, Eduardo! At!...EDUARDO - At sempre, Henriqueta!HENRIQUETA - Carlotinha, meu chapu?CARLOTINHA - Toma! Ests mais contentezinha?HENRIQUETA - Maliciosa!... (Sobem.)AZEVEDO - Meu sogro, dispensa-me acompanh-lo? Um homem no deve andar agarrado sua fiance. mauvais genre.HENRIQUETA - No se incomode. D. Maria, boa noite! Doutor... (Sobem.)EDUARDO - Uma palavra, Azevedo.AZEVEDO - s tuas ordena.EDUARDO - Quanto te deve o Sr. Vasconcelos?AZEVEDO - Uma bagatela! Dez contos de ris!EDUARDO - Ah!AZEVEDO - Por que perguntas?EDUARDO - Porque desejava saber quanto custa uma mulher em primeira mo.AZEVEDO (rindo). - Vraiment!(Cai o pano.)ATO QUARTOEm casa de EDUARDO. Sala de visitas.CENA PRIMEIRAEDUARDO, HENRIQUETA, CARLOTINHA, PEDRO(CARLOTINHA na janela; PEDRO sacudindo os tapetes.)CARLOTINHA (baixo, a PEDRO) - No passar ainda hoje?PEDRO - No sei, nhanh.CARLOTINHA - Est doente?... Zangado comigo?... Por qu?PEDRO - No se importe mais com ele! H tanto moo bonito! Sr. Azevedo... (PEDRO vai colocar o tapete e sai.)CENA IIEDUARDO, HENRIQUETA, CARLOTINHAEDUARDO - Quando eu lhe digo que espere, Henriqueta, porque estou convencido de que h um meio de desfazer esse casamento sem a menor humilhao para seu pai.HENRIQUETA - E esse meio qual ?EDUARDO - No lhe posso dizer; meu segredo.HENRIQUETA - Ah! Tem segredos para mim?EDUARDO - injusta fazendo-me essa exprobrao, Henriqueta. Se no lhe falo francamente, porque no desejo que partilhe, ainda mesmo em pensamento, os desgostos, as contrariedades que eu h um ms tenho sofrido para conseguir esse meio de que lhe falei.HENRIQUETA - Mas, Eduardo, uma parte dessas contrariedades me pertence, e por dois ttulos; porque se trata de mim, e porque nos... estimamos!EDUARDO - Porque nos amamos: verdade! Mas nessa partilha igual que fazem duas almas da sua dor e do seu prazer, h a diferena das foras. mulher cabe a parte do consolo, ou da ternura; ao homem, a parte da coragem e do trabalho.HENRIQUETA - Ento eu no tenho o direito de fazer tambm alguma coisa para a nossa felicidade?EDUARDO - No disse isto! Faz muito!HENRIQUETA - Como? Se toma para si tudo e no me quer deixar nem mesmo a metade dos cuidados?EDUARDO - E quem me d fora para prosseguir e a f para trabalhar? No so esses momentos que todos os dias passamos juntos aqui ou em sua casa?HENRIQUETA - Assim, no me quer dizer qual essa esperana?EDUARDO - No desejo afligi-la com idias mesquinhas. Os homens inventaram certas coisas, como os algarismos, o dinheiro e o clculo, que no devem preocupar o esprito das senhoras.HENRIQUETA - Porque somos ns to fracas de inteligncia?...EDUARDO - No por isso; porque tiram-lhes o perfume e a poesia.HENRIQUETA - Isso muito bonito, mas no me diz o que desejo saber.EDUARDO - O qu?HENRIQUETA - O meio por que h de fazer o meu casamento.EDUARDO - Ainda insiste; pois bem, hoje mesmo lhe direi.HENRIQUETA - Sim?EDUARDO - Talvez daqui a uma hora.CARLOTINHA - Mano, a entrou uma pessoa, que julgo procurar por voc.EDUARDO - H de ser naturalmente o negociante que espero.CENA IIIOs mesmos, PEDROPEDRO - Est ai o homem que escreveu aquela carta; quer falar ao senhor.EDUARDO - Manda-o entrar para o meu gabinete.PEDRO (baixo, a CARLOTINHA) - Nhanh Carlotinha est triste!... Hi!...EDUARDO - At logo, Henriqueta. HENRIQUETA - J! Que vai fazer?EDUARDO - Concluir um pequeno negcio; ao mesmo tempo realizar um pensamento que me foi inspirado pelo nosso amor.HENRIQUETA - Como?EDUARDO - Quero solenizar a nossa felicidade, Henriqueta, exercendo um dos mais belos direitos que tem o homem na nossa sociedade.HENRIQUETA - Qual?DUARDO - O direito de dar a liberdade!HENRIQUETA - No entendo.EDUARDO - Dir-lhe-ei tudo logo.HENRIQUETA - Volte, Sim?EDUARDO - Demorar-me-ei apenas o tempo de assinar um papel e escrever algumas linhas.CENA IVHENRIQUETA, CARLOTINHAHENRIQUETA - Sabes, Carlotinha, tenho uma queixa de ti.CARLOTINHA - De mim? Que te fiz eu, m?HENRIQUETA - H um ms espero que tu me contes uma coisa, e ainda no me disseste uma palavra.CARLOTINHA - De qu? No sei.HENRIQUETA - Do teu segredo; no te confiei o meu?CARLOTINHA - Ah! Quem te disse?HENRIQUETA - Eduardo.CARLOTINHA - No acredites, ele estava gracejando.HENRIQUETA - No, tu amas, Carlotinha, e nunca me falas dos teus sonhos, de tuas esperanas. No sou eu mais tua amiga?CARLOTINHA - Pois duvidas?HENRIQUETA - Se fosses, no me ocultarias o que sentes.CARLOTINHA - No te zangues; eu te contarei tudo, mas custa tanto falar dessas coisas!HENRIQUETA - Com aqueles que nos compreendem um prazer bem doce.CARLOTINHA - Olha, o meu segredo... Porm no sei como hei de comear isto!HENRIQUETA - Comea pelo nome. Como ele se chama?ARLOTINHA (confusa) - Alfredo.HENRIQUETA - Este moo que teu mano nos apresentou?CARLOTINHA - Sim. Todas as manhs, faa bom ou mau tempo, passa por aqui ao meio-dia; quase nem olha para esta janela, donde eu o espero escondida entre as cortinas, ningum nos v, mas ns nos vemos.HENRIQUETA - Depois?CARLOTINHA - noite vem visitar-nos, como tu sabes; todo o tempo conversa com mame, ou com mano enquanto tu e eu brincamos no piano. hora do ch sentamo-nos juntos; ele diz que me viu de manh, eu respondo que estava distrada e no o vi. s vezes...HENRIQUETA - Acaba, no tenhas vergonha. Eu tambm amo.CARLOTINHA - Pois sim. s vezes nossas mos se encontram sem querer; ele fica plido, e eu corro toda trmula para junto de ti. Da a pouco so dez horas, todos se retiram: ento chego janela e sigo-o com os olhos, at que desaparece no fim da rua.HENRIQUETA - E este todo o teu segredo?CARLOTINHA - Todo.HENRIQUETA - Parece-se com o meu: ver-se de longe, trocar um olhar, amar em silncio. H s uma diferena.CARLOTINHA - Qual?HENRIQUETA - Tu s feliz, porque s livre, enquanto eu...CARLOTINHA - Tu s correspondida, Henriqueta; Mano Eduardo te ama!HENRIQUETA - E Alfredo, no te ama?CARLOTINHA - No sei, tenho medo; h quatro dias que no o vejo. Levo a contar as horas.HENRIQUETA - Donde procede esta mudana? Fizeste-lhe alguma coisa?CARLOTINHA - Eu?... Se procuro adivinhar os seus pensamentos!HENRIQUETA - Entretanto, deve haver um motivo...CARLOTINHA - Tenho querido me recordar, e s acho este. No domingo veio passar a manh aqui; eu o deixei um momento para te escrever e voltei logo. Quando chamei Pedro para levar-te a carta; ele levantou-se de repente, despediu-se de mame, cumprimentou-me friamente, e desde ento no o tenho visto. Ficou zangado comigo por ter sado um momento de junto dele.HENRIQUETA - No faas caso, isso passa. Hoje mesmo ele vir arrependido pedir-te perdo. Mas, a propsito da carta que me escreveste domingo, eu trouxe-a mesmo para brigar contigo, travessa! (Tira a carta.)CARLQTINHA - Por qu? Pela sobrescrita?HENRIQUETA - Essa uma das razes. Para que escreveste "Madame Azevedo?" No sabes que essa idia me mortifica?CARLOTINHA - Desculpa, foi um gracejo.HENRIQUETA - Alm disso, no tinhas outra pessoa por quem mandar a carta, seno ele?CARLOTINHA - Ele quem? O Azevedo?HENRIQUETA - Sim; foi ele que ma entregou.CARLOTINHA - Mas no possvel; eu a mandei por Pedro; e recomendei-lhe que no a mostrasse a ningum, mesmo por causa da sobrescrita!...HENRIQUETA - No compreendo, ento, como foi parar nas mos desse homem. Tive um desgosto... e um medo!... Tu falavas de Eduardo!CARLOTINHA - Espera, vou perguntar a Pedro que quer dizer isto! (Na porta) Pedro!...HENRIQUETA - Deixa, no vale a pena. CARLOTINHA - No, muito mal feito.CENA VOs mesmos e PEDROPEDRO - Nhanh chamou?CARLOTINHA - Quero saber como que a carta que eu lhe dei para Henriqueta foi parar em mo do Sr. Azevedo.PEDRO - Ele me encontrou na rua, e tomou para entregar.CARLOTINHA - No te disse que no queria que ningum visse a sobrescrita?PEDRO - Ele noivo de sinh Henriqueta: no faz mal.HENRIQUETA - Est bom; no pensemos mais nisto.CARLOTINHA - No quero que outra vez suceda o mesmo. (A PEDRO) Entendeste?PEDRO - Sim, nhanh. Pedro sabe o que faz! (Batem palmas.)CARLOTINHA - Que quer dizer?CENA VIHENRIQUETA, CARLOTINIIA, AZEVEDO, PEDRO, no fundoHENRIQUETA, - H de ser ele.CARLOTINHA - Alfredo! Ah! Se fosse...HENRIQUETA Queres apostar?CARLOTINHA - Ora, o Azevedo. Eu logo vi!AZEVEDO - Como passou, D. Carlotinha? D. Henriqueta?CARLOTINHA - O senhor parece que adivinha, Sr. Azevedo?AZEVEDO - Por qu?! Por encontr-la hoje to bela? Est realmente blouissante!CARLOTINHA - Faa-se de esquerdo! A minha beleza serve de pretexto para elogiar a de Henriqueta!AZEVEDO - A senhora quer dizer o contrrio... CARLOTINHA - Quer dizer que o senhor adivinhou quem estava aqui hoje.AZEVEDO - Quem?... No vejo ningum. CARLOTINHA - Nem a sua noiva? Era esta palavra que o senhor queria ouvir!AZEVEDO - Sim, era esta palavra que eu desejava ouvir dos seus lbios.CARLOTINHA (baixo, a HENRIQUETA) - Que ftuo! (Alto) Vem, Henriqueta; vamos chamar mame para falar ao Sr. Azevedo.AZEVEDO - Ento, deixa-me s?HENRIQUETA - Oh! Um homem como o senhor pode ficar s? Paris inteiro lhe far companhia!CARLOTINHA - Suponha que est no Boulevard dos Italianos.AZEVEDO - No. Mas conversarei com esta flor; ela me dir em perfumes, o que os lbios que a bafejaram recusaram dizer em palavras.CARLOTINHA - Como est potico! Aquilo contigo, Henriqueta.HENRIQUETA - Comigo, no! com quem lhe mandou a violeta! Vamos! Pois, Sr. Azevedo, ns o deixamos no seu colquio amoroso.CENA VIIAZEVEDO, PEDROAZEVEDO - Foge-me!...PEDRO - Como vai paixo por nhanh Carlotinha, Sr. Azevedo? Flor j est na dana!AZEVEDO - Queria mesmo te falar a este respeito! No entendo tua senhora. Tu dizes que ela gosta de mim et pourtant...PEDRO - Parlez-vous franais, monsieur?AZEVEDO - Ela faz que no me compreende! Trata-me com indiferena.PEDRO - Pudera no! O senhor vai se casar.AZEVEDO - Ah! Tu pensas que esta a razo!PEDRO - Nhanh mesmo me disse! Moa solteira no pode receber corte de homem que noivo de outra mulher! feio, e faz ccega dentro de corao; ccega que se chama cime!AZEVEDO - Ento o meu casamento que impede!... E nem me lembrava de semelhante coisa! Com efeito, Henriqueta sua amiga; ela julga talvez que a amo.PEDRO - Mas isto no quer dizer nada. Ela gosta de V.Mce., gosta muito! Ontem, quando mandou essa violeta que o senhor tem na casaca, beijou primeiro.AZEVEDO - E foi ela mesmo quem se lembrou de mandar-me?PEDRO - Ela mesma, sem que eu pedisse nada!AZEVEDO - Bem; eu sei o que me resta a fazer.PEDRO - J vai? No espera por sinh velha?AZEVEDO - No, eu j volto. E, preciso tomar uma resoluo: il le faut!PEDRO - Monsieur est pensando!AZEVEDO - Diz a D. Carlotinha... No, no lhe digas nada! Eu quero ser o primeiro a anunciar-lhe.CENA VIIIPEDRO, JORGEPEDRO - Oh! J voltou do colgio? Agora mesmo deu meio-dia.JORGE - Tive licena para sair mais cedo.PEDRO - Nhonh j sabe novidade?JORGE - Que novidade?PEDRO - Novidade grande! Sr. moo Eduardo vai casar com nhanh Henriqueta!JORGE - Ah!... E o noivo dela?PEDRO - Sr. Azevedo? Casa com nhanh Carlotinha.JORGE - Mana?... E Sr. Alfredo?PEDRO - Fica logrado. Para rematar a festa, velho Vasconcelos casa com sinh velha.JORGE - mentira!PEDRO - H de ver!JORGE - Ento tudo se casa?PEDRO - Tudo, tudo. Nhonh tambm carece ver uma meninazinha bonita... Mas V.Mce. ainda no sabe namorar!...JORGE - Eu no!PEDRO - Pois precisa aprender, que j est franguinho. Pedro ensina.JORGE - E tu sabes?PEDRO (rindo-se) - Ora!... Nhonh pede dinheiro a mame e compra luneta.JORGE - Para qu?PEDRO - Sem isto no se namora. Quando nhonh tiver luneta, prende no canto do olho, e deita para a moa. Ela comea logo a se remexer e a ficar cor de pimentinha malagueta. Ento rapaz fino volta as costas, assim como quem no faz caso; e moa s espiando ele. Dai a pouco, fogo, luneta segunda vez; ela volta a cara para o outro lado, mas est vendo tudo! Nhonh deixa passar um momento, fogo, luneta terceira vez; ai moa no resiste mais, cai por fora, com o olho requebrado s, namoro est ferrado. Rapaz torce o bigodinho... Mas V. Mce. no tem bigode!...JORGE - Olha! No tarda nascer!PEDRO - Qual! Est liso como um frasco!JORGE (ouvindo entrar) - Quem ?PEDRO - Velho tabaquista!JORGE - Que vai casar com mame.PEDRO - Psiu! No diga nada, no!CENA IXPEDRO, VASCONCELOS, JORGEVASCONCELOS - Onde est esta gente! Henriqueta fica para jantar?PEDRO - Sim, senhor; nhanh Carlotinha no quer deixar ela ir.JORGE (saindo) - Eu vou cham-la!VASCONCELOS - No precisa. (A PEDRO) Dize-lhe que tarde virei busc-la.PEDRO - V.Mce. vai para casa?VASCONCELOS - No; por que perguntas?PEDRO - Porque Sr. Azevedo saiu daqui agora mesmo para ir falar a V.Mce.VASCONCELOS - Sobre qu? Alguma coisa de novo?PEDRO - Negcio importante. Pedro no sabe; mas ele parecia zangado.VASCONCELOS - Ora, que me importam as suas zangas.PEDRO - Senhor no deve mesmo se importar; esse Sr. Azevedo tem uma lngua... Sabe o que ele disse?VASCONCELOS - No quero saber.PEDRO - Disse a Sr. moo Eduardo, a casa estava cheia de gente, disse que Sr. Vasconcelos um... nome muito ruim!VASCONCELOS - Um que, moleque?PEDRO - Um pinga!VASCONCELOS - Hein!... No possvel!PEDRO - Ora! Aquele moo no tem respeito a senhor velho. (Faz uma careta.)VASCONCELOS - Pois hei de ensinar-lhe a ter.PEDRO - Precisa mesmo, para no andar enchendo a boca de que comprou filha de senhor com seu dinheiro dele.VASCONCELOS - Comprou minha filha! Ah, miservel! (Batem palmas.)PEDRO - Pode entrar.CENA XOs mesmos e ALFREDOPEDRO (a ALFREDO) - V.Mce. espere, vou chamar Sr. moo Eduardo.ALFREDO - Sim, dize-lhe que desejo falar-lhe com instncia.VASCONCELOS (a PEDRO) - H muito tempo que ele saiu?PEDRO - Sr. Azevedo?... Agora mesmo.VASCONCELOS - Vou sua procura. Preciso de uma explicao.CENA XIPEDRO, ALFREDOPEDRO - O velho vai deitando azeite s canadas! Noivo da filha virou de rumo e agora s quer casar com nhanh Carlotinha.ALFREDO - Oh! Ele pode desejar todas as mulheres, rico!PEDRO - No sei tambm; essas moas... tm cabecinha de vento; um dia gostam de um, outro dia gostam de outro. Nhanh, que esperava todo o dia para ver Sr. Alfredo passar, nem se lembra mais; escreveu aquela carta a Sr. Azevedo!ALFREDO - Se no fosse essa carta, eu ainda duvidava!...PEDRO - V.Mce. bem viu, no domingo, ela me dar sua vista, e eu entregar na rua