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Libia Camargo Ribeiro Leite
O efeito da estimulao top-down e bottom-up no
potencial evocado auditivo de tronco enceflico com
estmulo complexo
Dissertao apresentada Faculdade
de Medicina da Universidade de So
Paulo para obteno do ttulo de Mestre
em Cincias
Programa de Cincias da Reabilitao
Orientador: Profa. Dra. Eliane Schochat
So Paulo
2016
Libia Camargo Ribeiro Leite
O efeito da estimulao top-down e bottom-up no
potencial evocado auditivo de tronco enceflico com
estmulo complexo
Dissertao apresentada Faculdade
de Medicina da Universidade de So
Paulo para obteno do ttulo de Mestre
em Cincias
Programa de Cincias da Reabilitao
Orientador: Profa. Dra. Eliane Schochat
So Paulo
2016
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)
Preparada pela Biblioteca da
Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo
reproduo autorizada pelo autor
Leite, Libia Camargo Ribeiro O efeito da estimulao top-down e bottom-up no potencial evocado auditivo de
tronco enceflico com estmulo complexo / Libia Camargo Ribeiro Leite. -- So
Paulo, 2016.
Dissertao(mestrado)--Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo. Programa de Cincias da Reabilitao.
Orientador: Eliane Schochat.
Descritores: 1.Potenciais evocados auditivos 2.Percepo da fala 3.Transtornos da percepo auditiva 4.Transtornos do desenvolvimento da linguagem 5.Plasticidade
neuronal 6.Estimulao acstica
USP/FM/DBD-103/16
Dedico este trabalho base de tudo o que sou:
A Deus todo poderoso Porque Dele,
por meio Dele e para Ele so todas as coisas,
Ele pois a glria eternamente (Rm 11.36);
minha famlia! Aos meus pais Maira
e Joo Edson, a minha irm Maria Eugenia,
meu irmo Silviano e ao meu Gui. Obrigada
por fazerem de mim quem eu sou, por cada
dia me apoiando e incentivando.
A vocs dedico este trabalho e todo meu amor!
AGRADECIMENTOS
Agradeo a Deus, por dirigir os meus passos e me mostrar os Seus
caminhos, por estar sempre ao meu lado cuidando de mim a todo instante.
Aos meu pais por todo amor que tm por mim, por nunca me deixarem
desistir e sempre me incentivarem a seguir os meus sonhos.
minha irm por estar comigo em todas as situaes, me apoiando e
tornando todo mais colorido e divertido.
Ao Guilherme, meu amor, por todo carinho e cuidado, por tamanha
pacincia e disposio em sempre me ajudar no importa a hora ou motivo, por
estar ao meu lado a cada segundo, por sua imensa capacidade de me ouvir e
me acalmar e me fazer saber que vai dar tudo certo! Eu amo voc!
Hortnsia, por me aguentar por tantos anos! Obrigada por sua amizade
e companhia diria, por tornar os dias mais alegres e leves.
minha orientadora Profa. Dra. Eliane Schochat, por todo carinho e
generosidade com que transmite seu imenso conhecimento em audiologia. Por
seu corao gigante e simples que nos ensina a cada dia lies de humildade e
vida
s meninas do LIF: Camila, Ivone, Renata Filippini e Cristina Murphy, que
mesmo de longe esto sempre presentes, pelo apoio e disponibilidade em
sempre esclarecerem minhas dvidas.
De uma forma muito especial e com muito carinho eu agradeo Carol,
obrigada por toda pacincia, pela disponibilidade em sempre esclarecer minhas
dvidas e por me acompanhar de to perto, obrigada por seu incentivo e por
sua imensurvel colaborao neste trabalho! Muito obrigada!
Taise, Nina e de uma forma muito especial Mayra, por todo incentivo e
motivao, pela amizade e almoos ao longo desses anos que tornaram os dias
de USP mais divertidos.
Agradeo Caroline, Profa. Hayde e Cristina Murphy pela participao
no exame de qualificao e por toda contribuio para o aprimoramento deste
estudo.
fonoaudiloga Joyce Pinheiro por sua disposio em ajudar, dedicao
e pacincia comigo.
minha amiga e sogra Walmira, por toda ajuda e amizade. Voc e sua
famlia so muito especiais para mim.
s crianas que participaram deste estudo e seus responsveis, pela
confiana depositada. Sem vocs a concretizao deste estudo no seria
possvel.
Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo, pelo suporte
financeiro e a concesso da bolsa.
todos vocs, muito obrigada!
Esta dissertao est de acordo com as seguintes normas, em vigor no momento desta
publicao:
Referncias: adaptado de International Committee of Medical Journals Editors (Vancouver).
Universidade de So Paulo. Faculdade de Medicina. Diviso de Biblioteca e Documentao.
Guia de apresentao de dissertaes, teses e monografias. Elaborado por Anneliese Carneiro
da Cunha, Maria Julia de A. L. Freddi, Maria F. Crestana, Marinalva de Souza Arago, Suely
Campos Cardoso, Valria Vilhena. 3a ed. So Paulo: Diviso de Biblioteca e Documentao;
2011.
Abreviaturas dos ttulos dos peridicos de acordo com List of Journals Indexed in Index
Medicus.
SUMRIO
Lista de Figuras
Lista de Tabelas
Lista de Quadros
Lista de Anexos
Lista de Abreviaes, Smbolos e Siglas
Resumo
1- INTRODUO ........................................................................................... 01
2- OBJETIVOS ............................................................................................... 07
3- REVISO DE LITERATURA ...................................................................... 09
4- MTODOS ................................................................................................. 38
5- RESULTADOS ........................................................................................... 61
6- DISCUSSO .............................................................................................. 79
7- CONCLUSO ........................................................................................... 101
8- REFERNCIAS ........................................................................................ 104
9- ANEXOS .................................................................................................. 118
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Similaridades entre o traado do estmulo de fala /da/ e
a resposta neural do tronco enceflico obtida pelo
PEATEc ..................................................................... 13
Figura 2 Comparao das ondas no domnio da latncia pr e
ps estimulao ......................................................... 77
Figura 3 Resultado das mdias pr e ps estimulao dos
grupos B-U e T-D no domnio da frequncia ............. 78
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Estatstica descritiva para idade (meses) nos dois
grupos ......................................................................... 62
Tabela 2 Distribuio dos gneros nos dois grupos ................. 63
Tabela 3 Estatstica descritiva para porcentagem de acertos nos
testes GIN e PF nos dois grupos ............................... 64
Tabela 4 Estatstica descritiva de porcentagem de acerto pr e
ps estimulao no teste de ateno auditiva ........... 65
Tabela 5 Estatstica descritiva de porcentagem de acerto pr e
ps estimulao no teste Span de dgitos .................. 65
Tabela 6 Estatstica descritiva de porcentagem de acerto pr e
ps estimulao no teste Leitura de
Pseudopalavras........................................................... 66
Tabela 7 Estatstica descritiva de porcentagem de acerto pr e
ps estimulao no teste Metalinguagem................... 66
Tabela 8 Estatstica descritiva para os valores do Escore nos dois
grupos ......................................................................... 69
Tabela 9 Estatstica descritiva para os valores das variveis do
Domnio Onset............................................................. 70
Tabela 10 Estatstica descritiva para os valores das variveis do
Domnio Espectro-Temporal........................................ 71
Tabela 11 Estatstica descritiva para os valores das variveis do
Domnio Fronteiras do Envelope................................. 72
Tabela 12 Estatstica descritiva para os valores das variveis do
Domnio Pitch.............................................................. 72
Tabela 13 Estatstica descritiva para os valores das variveis do
Domnio Harmnicos................................................... 73
Tabela 14 Nmero e porcentagem de crianas que melhoraram
aps a estimulao de cada grupo.............................. 73
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Classificao da gravidade do PCC-R ...................... 44
Quadro 2 Valores normativos do PEATE para clique de acordo
com a orelha restada, segundo o manual do
equipamento Navigator Pro........................................ 46
Quadro 3 Anlise do Padro da Resposta do PEATEc.............. 47
Quadro 4 Valores da onda normativa referente a slaba
sintetizada /da/ oferecida pelo equipamento Navigator
Pr ............................................................................. 48
Quadro 5 Valores normativos para o Teste Padro de
Frequncia.................................................................. 49
Quadro 6 Padro de referncia para o teste de
Metafonologia............................................................. 53
Quadro 7 Anlise comparativa entre os grupos B-U e T-D para os
testes comportamentais.............................................. 68
Quadro 8 Anlise comparativa entre os grupos B-U e T-D para os
valores do PEATEc................................................ 75/76
LISTA DE ANEXOS
Anexo 1 Aprovao do Comit de tica em Pesquisa da
Faculdade de Medicina da Universidade de So
Paulo......................................................................... 119
Anexo 2 Termo de consentimento livre e esclarecido............ 120
Anexo 3 Anamnese utilizada para coleta do histrico
clnico........................................................................ 124
Anexo 4 Protocolo de audiometria; PEATE e PEATEc.......... 126
Anexo 5 Protocolo do teste Padro de frequncia................. 127
Anexo 6 Protocolo do teste Gaps in Noise............................. 128
Anexo 7 Protocolo para os testes de Ateno auditiva, Span de
dgitos e Leitura de pseudopalavras......................... 129
Anexo 8 Protocolo do teste Metafologia................................. 130
Anexo 9 Tela do Jogo do Macaco.......................................... 131
Anexo 10 Tela do Jogo do Papagaio........................................ 132
Anexo 11 Tela do Jogo Siga o Piano Software Escuta
Ativa.......................................................................... 133
Anexo 12 Tela do Jogo Qual som ouviu? Software Escuta
Ativa.......................................................................... 134
Anexo 13 Tela do Jogo Quantos sons? Software Escuta
Ativa.......................................................................... 135
Anexo 14 Tela do Jogo Simon Game...................................... 136
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SMBOLOS
V Microvolt
V/ms Microvolt por milissegundo
AF Alarme Falso
ANSI American National Standards Institute
ASHA American Speech-Language-Hearing Association
BioMAP Biological Marker of the Auditory Processing
B-U grupo Bottom-up
CI colculo inferior
dB decibel
dB Na decibel Nvel de Audio
dB nNA decibel Nvel de Audio normal
DP desvio padro
et al. e outros
FAPESP Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo
FFR frequency-following response
FMUSP Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo
GIN Gaps in Noise
Hz hetrz
k quilo ohms
kHz quilohertz
max mximo
min mnimo
ms milissegundos
PCC porcentagem de consoantes corretas
PCC-R porcentagem de consoantes corretas revisada
PCF prova de conscincia fonolgica
PEF programa de estimulao fonoaudiolgica
PF padro de frequncia
PEA potencial evocado auditivo
PEALL potencial evocado auditivo de longa latncia
PEATML potencial evocado auditivo de mdia latncia
PEATE potencial evocado auditivo de tronco enceflico
PEATEc potencial evocado auditivo de tronco enceflico com estmulo
complexo
QI quociente de inteligncia
SNA sistema nervoso auditivo
TA treinamento auditivo
T-D grupo Top-down
TE tronco enceflico
TR tempo de reao
RESUMO
Leite LCR. O efeito da estimulao top-down w bottom-up no potencial evocado auditivo de tronco enceflico com estmulo complexo [dissertao]. So Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de So Paulo; 2016.
Introduo: Crianas com transtorno fonolgico (TF) apresentam dificuldade
na percepo de fala, em processar estmulos acsticos quando apresentados
de forma rpida e em sequncia. A percepo dos sons complexos da fala,
dependem da integridade no processo de codificao analisado pelo Sistema
Nervoso Auditivo. Por meio do Potencial Evocado Auditivo de Tronco Enceflico
com estmulo complexo (PEATEc) possvel investigar a representao neural
dos sons em nveis corticais e obter informaes diretas sobre como a estrutura
do som da slaba falada codificada no sistema auditivo. Porm, acredita-se
que esse potencial sofre interferncias tanto de processos bottom-up quanto
top-down, o que no se sabe quanto e como cada um desses processos
modifica as respostas do PEATEc. Uma das formas de investigar a real
influncia dos aspectos top-down e bottom-up nos resultados do PEATEc
estimulando separadamente esses dois processos por meio do treinamento
auditivo e da terapia fonoaudiolgica. Objetivo: Verificar o impacto da
estimulao sensorial (processamento bottom-up) e cognitiva (processamento
top-down), separadamente, nos diferentes domnios da resposta
eletrofisiolgica do PEATEc. Mtodo: Participaram deste estudo 11 crianas
diagnosticadas com TF, com idades entre 7 e 10:11, submetidas a avaliao
comportamental e eletrofisiolgica e ento dividas nos grupos Bottom-up (B-U)
(N=6) e Top-down T-D (N=5). A estimulao bottom-up foi voltada ao
treinamento das habilidades sensoriais, atravs de softwares de computador. A
estimulao top-down foi realizada por meio de tarefas para estimular as
habilidades cognitiva por meio do Programa de Estimulao Fonoaudiolgica
(PEF). Ambas as estimulaes foram aplicadas uma vez por semana, num
perodo de aproximadamente 45 minutos por 12 semanas. Resultados: O
grupo B-U apresentou melhoras em relao aos domnios onset e harmnicos e
no valor da pontuao do escore aps ser submetido estimulao bottom-up.
Por sua vez, aps serem submetidos estimulao top-down, o grupo T-D
apresentou melhoras em relao aos domnios onset, espectro-temporal,
fronteiras do envelope e harmnicos e para os valores da pontuao do escore.
Concluso: Diante dos resultados obtidos neste estudo, foi possvel observar
que a estimulao sensorial (processamento bottom-up) e a estimulao
cognitiva (processamento top-down) mostraram impactar de forma diferente a
resposta eletrofisiolgica do PEATEc.
Descritores: Potenciais Evocados Auditivos, Percepo da Fala, Transtornos
da Percepo Auditiva, Transtornos do Desenvolvimento da Linguagem,
Plasticidade Neuronal, Estimulao Acstica
Abstract
Leite LCR. The effect of top-down and bottom-up stimulation on auditory
brainstem response to complex sounds [dissertation]. So Paulo. Faculdade de
Medicina, Universidade de So Paulo; 2016.
Introduction: Children with speech sound disorder present difficulties in
speech perception specially regarding the processing of acoustic stimuli when
they occur rapidly and sequentially. The perception of complex sounds of
speech depends on the integrity of the codification process analyzed by the
auditory system. Through the Auditory Brainstem Response to complex sounds
(cABR) it is possible to investigate the neural representation of sounds in cortical
levels to obtain direct information about how the sound structure of the stressed
syllable is codified in the auditory system. However, it is believed that bottom-up
and top-down processes interfere in the cABR, though the level of intensity and
the way through which they can change the response of the cABR is still
unkown. One of the methods for investigating the actual influences of the
bottom-up and top-down processes in cABR responses is by stimulating
separately those two processes by means of auditory training and speech
therapy. Objective: Verify the impact of both sensory stimulation (bottom-up
processing) and cognitive stimulation (top-down processing) separately, in the
different domains of the cABR electrophysiological response. Method: The
participants of the study were 11 children of 7 to 10:11 year-old diagnosed with
speech sound disorder, who underwent behavioral and electrophysiological
assessment and were divided in the following groups: Bottom-up (B-U) (N=6)
and Top-down (T-D) (N-5). The bottom-up stimulation focused on sensorial skills
by using computer softwares. Top-down stimulation was prosecuted by using
tasks to stimulate cognitive skills through the Speech Stimulation Program. Both
stimuli were applied once a week for 45 minutes, in a period of 12 weeks.
Results: The B-U group showed improvement in relation to onset and harmonic
domains, and in relation to the score punctuation values after being subjected to
bottom-up stimulation. On the other hand, the T-D group, after being subjected
to top-down stimulation, showed improvement in relation to the onset, time
domain spectrum, envelope boundaries and harmonics, and to the score
punctuation values. Conclusions: According to the results of this study, it was
possible to conclude that sensorial stimulation (bottom-up processing) and
cognitive stimulation (top-down processing) showed different impacts on the
cABR electrophysiological response.
Descriptor: evoked potentials, auditory; speech perception; auditory
perceptual disorders; language development disorders; neuronal plasticity;
acoustic stimulation.
Introduo
Introduo | 2
1. INTRODUO
O ser humano est inserido em um contexto de diferentes situaes de
escuta em seu dia-a-dia e precisa estar apto para discriminar, reconhecer e
compreender estes estmulos sonoros a sua volta; como por exemplo o sinal de
fala, uma estrutura espectro-temporal complexa e dinmica composta por
elementos harmonicamente ricos cujas caractersticas acsticas mudam
continuamente atravs do tempo (Skoe e Kraus, 2010a; Banai et al.,2007).
A habilidade de percepo dos sons de fala est relacionada capacidade
de perceber e processar mudanas de milissegundos (ms) nas caractersticas
espectrais ao longo da via auditiva, este processo essencial para o
desenvolvimento da linguagem. Uma vez que o processamento encontra-se
alterado, uma instabilidade na representao dos fonemas tambm ocorre no
crebro, o que pode levar a dificuldade na percepo do discurso e limitar a
habilidade para aquisio de elementos fonolgicos, sintticos e semnticos da
linguagem (Tallal, 2000; Benasich and Tallal, 2002).
A percepo de sons complexos depende da integridade no processo de
codificao analisado pelo Sistema Nervoso Auditivo (SNA). O Potencial
Evocado Auditivo de Tronco Enceflico com estmulo complexo (PEATEc)
investiga a representao neural destes sons em nveis corticais e capaz de
gerar informaes diretas sobre como a estrutura do som da slaba falada
Introduo | 3
codificada no sistema auditivo (Kraus e Nicol, 2005; Russo et al.,2004 Johnson
et al.,2005; Chandrasekaran et al.,2014).
Para que a estrutura do som da fala seja precisamente codificada
necessria uma resposta neural sincronizada e coordenada de amplas
populaes de neurnios que se estendem da cclea at o crtex auditivo
(Kraus e Nicol, 2003; Nicol e Kraus, 2004). exatamente deste sincronismo
neural e da decodificao automtica das caractersticas temporais do som que
dependem as respostas do PEATEc. Assim, este potencial constitui-se numa
importante ferramenta no estudo das bases neurais subjacentes percepo
da fala, bem como na investigao da decodificao neural, da sincronia e do
processamento das caractersticas da fala (Kraus e Nicol, 2003).
Aproximadamente 7,5% das crianas entre trs e onze anos apresentam
algum distrbio de desenvolvimento fonolgico, caracterizado pela presena de
substituies, omisses e distores na fala, que podem permanecer at a vida
adulta se no tratado (Shrinberg e Kwiatkowski, 1994).
O Transtorno Fonolgico (TF) a alterao de linguagem mais comum em
crianas. Um estudo realizado nos Estados Unidos afirma que o TF afeta cerca
de 10% da populao pr-escolar (Gierut, 1998) e no Brasil, uma pesquisa
realizada na cidade de So Paulo, mostrou ndices semelhantes (Andrade et al.,
1991).
Introduo | 4
Acredita-se que crianas com TF apresentam alteraes relacionadas
habilidade de processar sons quando so apresentados de forma rpida e em
sequncia e anormalidades na codificao neural de informaes auditivas
(Tallal e Piercy 1973; Tallal 1980; Muniz et al., 2007 e Murphy e Schochat
2009), o que contribui para a alterao na percepo das caractersticas
acsticas contidas nos sinais de fala.
Diferentes abordagens teraputicas so descritas na literatura visando
reorganizao do sistema fonolgico de crianas que apresentam alteraes de
fala. Segundo a ASHA (2005) h duas diferentes intervenes: bottom-up
(sensorial), relacionada ao processamento das caractersticas acsticas de
entrada do som, e a interveno top-down (cognitiva) relacionada ao
reconhecimento e compreenso dos sinais de entrada de acordo com a
experincia e conhecimento de linguagem (Moore 2012; Shuai e Gong 2014;
Bonte 2006; Murphy et al., 2015a).
O PEATEc sofre a influncia de ambos os processos bottom-up e top-
down, uma vez que dependem do sinal de entrada bem como de processos
cognitivos.
Segundo White-Schwoch e Kraus (2015), o PEATEc fornece vrias
medidas pelas quais pode-se analisar suas respostas. Dentre elas, possvel
destacar a latncia, a resposta de F0, relacionada ao pitch, e a estabilidade
neural. A latncia em que as ondas aparecem fornece informaes a respeito
de quo rpido o crebro processou determinado som e mostra a diferena
Introduo | 5
entre as respostas transientes e sustentadas. Vale ressaltar que, o tempo um
detalhe crucial na distino entre os sons da fala, como por exemplo, os
fonemas /b/ e /d/, so milsimos de segundos que fazem diferena. O tempo de
resposta do PEATEc atrasado est associado aos distrbios de linguagem e
escrita e ainda ao envelhecimento. Pode-se estimular esta resposta por meio de
atividades de ateno direcionada e discriminaes de sons com contrastes
bem sutis entre duas consoantes, melhorando assim o tempo de resposta.
As respostas referentes ao pitch refletem a fora com que a frequncia
fundamental F0 da voz codificada. Esta resposta associada a facilidade que
o indivduo apresenta em compreender a fala e direcionar a ateno a um nico
orador, o que essencial para compreender a fala em ambientes ruidosos. O
treinamento por meio de atividades de escutas desafiadoras pode-se melhorar
estas respostas.
A terceira resposta em relao a estabilidade neural, uma medida geral
da integridade do processamento dos sons. Esta medida est associada
forma como os processos cerebrais respondem ao som. A instabilidade pobre
est associada s dificuldades de aprendizagem como dislexia. Para melhorar
os resultados desta medida importante trabalhar a ateno do ouvinte em
situaes de escuta do seu dia-a-dia White-Schwoch e Kraus 2015).
Por meio destas medidas e de como melhorar cada uma delas, possvel
observar que elas dependem tanto dos processos bottom-up (sensorial) quanto
de processos top-down (cognitivos). Uma forma de investigar as diferentes
Introduo | 6
contribuies e a real influncia dos aspectos top-down e bottom-up nesta
populao trabalhar estas duas diferentes abordagens separadamente, por
meio de Treinamento Auditivo das habilidades sensoriais e por meio de Terapia
Fonoaudiolgica, a fim de verificar o resultado nas respostas finais do PEATEc.
A partir deste estudo espera-se acrescentar novas informaes
importantes para otimizar as diferentes intervenes fonoaudiolgicas em
crianas com distrbios de linguagem, como o TF, alm de trazer informaes
relevantes sobre como os processos bottom-up (sensoriais) e top-down
(cognitivos) interferem nas habilidades lingusticas.
Objetivos
Objetivos | 8
2. OBJETIVO GERAL
O presente estudo tem como objetivo geral verificar o impacto da
estimulao sensorial (processamento bottom-up) e cognitiva (processamento
top-down), separadamente, nos diferentes domnios da resposta
eletrofisiolgica do PEATEc.
2.2 Objetivos Especficos
Verificar a contribuio da estimulao sensorial (bottom-up) e cognitiva (top-
down) por meio de:
a. Testes comportamentais do processamento auditivo;
b. Testes de ateno e memria;
c. Testes metalingusticos;
d. PEATEc;
Comparar a resposta final (aps estimulao) entre os grupos B-U e T-D, nas
avaliaes comportamentais e eletrofisiolgica.
Reviso de Literatura
Reviso de Literatura | 10
3. REVISO DE LITERATURA
Neste captulo sero apresentados os estudos que foram utilizados para
embasar a fundamentao terica da presente pesquisa, os textos foram
organizados priorizando o encadeamento de ideias e, sempre que possvel,
mantendo a ordem cronolgica.
Os temas abordados sero apresentados em trs tpicos:
Potencial evocado auditivo de tronco enceflico com estmulo complexo
Transtorno fonolgico
Treinamento auditivo
3.1 Potencial evocado auditivo de tronco enceflico com estmulo
complexo
O Potencial Evocado Auditivo (PEA) uma atividade eltrica que ocorre no
sistema auditivo produzida, ou evocada a partir de um som e pode ser captada
por meio de eletrodos fixados em lugares especficos como o couro cabeludo e
mastoides (Hall, 1990). Os PEAs podem ser classificados de acordo com o
tempo em que suas ondas aparecem em: precoces, (Potencial Evocado
Auditivo de Tronco Enceflico (PEATE)) potencias mdios (Potencial Evocado
Auditivo de Mdia Latncia (PEAML)), e potenciais tardios (Potencial Evocado
Auditivo de Longa Latncia (PEALL)) (Picton et al.,1974).
Reviso de Literatura | 11
O PEATE ocorre nos primeiros 15 ms aps a estimulao acstica e gera
uma srie de sete ondas com diferentes locais de origem, que vo desde a
cclea at o corpo geniculado medial, sendo geralmente, analisados por meio
das latncias absolutas das ondas I, III e V e dos interpicos I-III, III-V e I-V
(Burkard e Eggermont, 2007; Musiek et al.,1999).
Usando o estmulo clique, o PEATE tem sido muito utilizado na prtica
clnica, na identificao de perdas auditivas perifricas e centrais; em triagens
auditivas neonatais; em crianas com risco de perda auditiva; na investigao
da integridade da via auditiva no tronco enceflico (TE); no monitoramento de
cirurgias com hipotermia; no prognstico do coma e ainda no diagnstico de
morte enceflica (Ferraro e Durrant, 1999; Hall, 2007; Rosenblum et al.,1985;
Markand et al.,1987; Sousa et al.,2003; Starr, 1976; Machado et al.,1991;
Souza et al.,1998; Leite et al.,2013).
Alm do clique, vrios estmulos podem ser utilizados para obter as
respostas do PEATE, como tons puros, tons mascarados, tone burst, chirp e
sons de fala (Hall, 1990; Ferraro e Durrant, 1999; Elberling e Don, 2008; Russo
et al.,2004).
A fala um sinal acstico complexo, composto por elementos
harmonicamente ricos, e exige muito do sistema auditivo, o qual precisa ser
sensvel s mudanas rpidas nas frequncias e na recepo de vrios
estmulos em um curto espao de tempo. Para uma precisa codificao, esta
estrutura espectro-temporal complexa, exige uma resposta neural sincronizada
Reviso de Literatura | 12
e coordenada de amplas populaes de neurnios, que se estendem desde a
cclea at o crtex (Kraus e Nicol, 2003; Nicol e Kraus, 2004).
O PEATEc depende exatamente deste sincronismo neural e da codificao
automtica das caractersticas temporais do som, constituindo-se assim, numa
importante ferramenta no estudo das bases neuras subjacentes percepo da
fala, bem como na investigao da decodificao neural, da sincronia e do
processamento das caractersticas da fala (Kraus e Nicol, 2003).
A origem do PEATEc inclui mltiplas regies subcorticais, incluindo o
colculo inferior (CI). Esta estrutura neural considerada metabolicamente a
mais ativa no crebro humano, pois recebe conexes essenciais diretamente do
crtex auditivo e uma estao obrigatria para o aparecimento do sinal
bottom-up. Pelo CI passam inmeras fibras neurais aferentes e eferentes, ou
seja, esta estrutura recebe projees tanto bottom-up quanto top-down. Alm
do mais, o CI conectado ao crtex somatossensorial, outra diviso do
mesencfalo (colculo superior), bem como as redes envolvidas nos processos
de ateno. Sendo assim, em termos de conectividade, o CI influenciado por
sinais de inmeras estruturas cerebrais (Chandrasekaran et al.,2014).
O CI possui uma extensa variedade de tipos de clulas neurais que so
capazes de representar o som com alta fidelidade. A maioria dessas clulas
mostra descargas sustentadas e descargas transientes para o incio do
estmulo acstico. As respostas sustentadas e transientes tm diferentes
propriedades celulares, mas, juntas so capazes de representar um sinal
Reviso de Literatura | 13
auditivo complexo com excepcional preciso temporal (Chandrasekaran et
al.,2014).
Na Figura 1 possvel observar a similaridade entre a resposta neural e o
estmulo da slaba /da/ uma vez que as respostas do PEATEc fornecem
informaes diretas sobre como a estrutura do som da fala codificada no
sistema auditivo, pois reflete as caractersticas acsticas do estmulo com
excepcional preciso, tanto para frequncia, quanto para durao (Kraus e
Nicol, 2005; Johnson et al.,2005; Chandrasekaran et al.,2014).
Figura 1. Similaridades entre o traado do estmulo de fala /da/ e a resposta neural do tronco enceflico obtida pelo PEATEc (Rocha-Muniz et al., 2012).
Reviso de Literatura | 14
O traado resultante do PEATEc com o estmulo sintetizado /da/ dividido,
assim como a slaba, em poro transiente e poro sustentada. A poro
transiente (ocorre at 10 ms), marca o incio do estmulo e reflete mudanas
temporais rpidas inerentes vibrao das pregas vocais durante a emisso da
consoante. Esta resposta constituda por um pico positivo (onda V), anloga a
onda do PEATE-clique, e um pico negativo (onda A). As medidas do complexo
V-A fornecem informaes sobre o sincronismo das respostas neurais (Johnson
et al.,2007 e Chandrasekaran et al.,2014). As ondas C e O tambm so
consideradas respostas transientes, a onda C marca a passagem para o
perodo da resposta sustentada, e a onda O refere-se ao fim da estimulao
sonora (Skoe e Kraus, 2010a).
A poro sustentada composta pela Frequency-following Response
(FFR), correspondente a estrutura harmnica da vogal, fornece informaes
sobre a integridade geral da resposta em relao ao estmulo; esta resposta
ocorre entre 18 e 40 ms e composta pelas ondas D, E e F, com picos
ocorrendo em uma taxa equivalente da frequncia fundamental (F0) da fonte
sonora, e os picos que surgem entre esses picos principais ocorrem a uma taxa
equivalente a do primeiro formante (F1) (Russo et al.,2004; Skoe e Kraus,
2010a).
O traado final obtido no PEATEc analisado por meio dos valores de
latncia e amplitude das ondas V, A, C, D, E, F e O e tambm dos valores de
latncia, amplitude de rea e slope do complexo VA e o valor obtido no Escore,
Reviso de Literatura | 15
medida fornecido pelo prprio equipamento BioMAP, baseada nas latncias das
ondas V, A, slope, frequncia do primeiro formante e altas frequncias. (Skoe e
Kraus, 2010a).
O valor do slope do complexo VA reflete a sincronizao temporal dos
geradores da resposta e as medidas da rea refletem a quantidade de atividade
que contribuiu para a gerao da onda (Russo et al.,2005).
Alm das medidas de latncia, por meio da transformao de Fourier,
possvel analisar as respostas do PEATEc em sua poro sustentada no
domnio da frequncia, capaz de medir a preciso e magnitude da resposta
neural em uma faixa de frequncia ou em uma frequncia especfica (Skoe e
Kraus, 2010a) sendo capaz ainda de extrair da resposta caractersticas
relacionadas ao pitch, ou seja, permite identificar um falante ou entonaes
emocionais presentes na voz, e ao timbre do estmulo, distinguindo os
contrastes dos sons da fala, pois fornecem informaes fonticas (Kraus et
al.,2009).
A anlise das respostas do PEATEc mostra-se importante tanto no
domnio do tempo, quando no domnio da frequncia, uma vez que h
evidncias que o tronco enceflico codifica o sinal de fala de diferentes
maneiras, comprovando que estes componentes so funcionalmente
dissociados um dos outros. Assim, pesquisas enfatizam a importncia dos
estudos dos mecanismos neurais (estrutura do formante, periodicidade,
transio de frequncia, onset acstico e envelope da fala) envolvidos na
Reviso de Literatura | 16
codificao de caractersticas acsticas da fala, pois estes so responsveis
pela percepo normal da fala (Rocha-Muniz, 2011).
Um dos primeiros pesquisadores a utilizar o estmulo complexo para
registar o PEATE foi Greenberg em 1980, aps um trabalho de Younger e
Sanchs (1979) realizado com gatos, mostrando que formantes da fala so
preservados na descarga padro do nervo auditivo. Greenberg observou que as
informaes especficas da fala (vogais e consoantes) foram fielmente
codificadas no PEATE. Galbraith et al., (1995) demostraram que o PEATEc com
palavras pode ser ouvido como uma fala inteligvel quando convertido, por meio
de equipamentos especializados, de um sinal neural para um sinal auditivo e
percebeu ainda, que por acontecer em poucos milissegundos aps o incio do
estmulo, o PEATEc reflete uma resposta neural original e no um microfonismo
coclear (Chandrasekaran e Kraus, 2010).
Desde ento, diversos estudos tm sido realizados a fim de entender como
a fala processada no tronco enceflico, com diferentes estmulos e em
diversas populaes. O estmulo mais utilizado para o registro do PEATEc a
slaba sintetizada /da/ (Cunningham et al.,2001; Russo et al.,2004, 2005; Skoe
e Kraus, 2010), porm pode-se ainda obter as repostas do PEATEc utilizando
de slabas em Mandarim com diferentes contornos de pitch, como por exemplo
tons lexicais (Krishnnan et al.,2005; Song et al.,2008; Krishnan et al.,2009).
As pesquisas com o PEATEc tm sido ainda realizadas para caracterizar
os resultados obtidos em crianas com alteraes de aprendizagem e/ou
Reviso de Literatura | 17
linguagem, dificuldade de leitura ( King et al.,2002; Wible et al.,2004, 2005;
Song et al.,2006; Banai et al.,2009), crianas com transtorno do espectro autista
(Russo et al.,2010), com transtorno do processamento auditivo (Filippini et
al.,2012; Rocha-Muniz et al.,2012) e com transtorno fonolgico (Gonalves et
al.,2011); ainda, para avaliar a influncia do rudo e outras situaes de escuta
adversas nos resultados do PEATEc (Wible et al.,2005; Song et al.,2008, 2011);
na avaliao da plasticidade neural em nvel de tronco enceflico aps
treinamento auditivo (TA) de curta durao (Hayes et al.,2003; Song et al.,2008;
Chandrasekaran et al.,2011; Anderson et al.,2013), e na avaliao da influncia
do treinamento musical nas habilidade auditivas (Wong et al.,2007; Musacchia
et al.,2007; Parbery-Clark et al.,2009; Skoe e Kraus, 2013).
3.2 Transtorno Fonolgico
O desenvolvimento do sistema fonolgico um processo contnuo que
ocorre gradativamente at os 7 anos de idade. Embora seja esperado certa
sequncia e velocidade peculiar no desenvolvimento fonolgico, cada criana
desenvolve sua linguagem de forma particular e com variaes muito
individuais (Bowen, 1998). Com o passar do tempo, a criana aumenta seu
inventrio fontico e adquire as regras fonolgicas prprias do seu sistema
lingustico, aprendendo a utilizar corretamente os fonemas que consegue
produzir.
Reviso de Literatura | 18
No decorrer deste processo de aquisio da linguagem e habilidades
perceptivas a criana realiza vrios processos de simplificao das regras
fonolgicas, envolvendo um grupo ou uma sequncia de sons denominado
processos fonolgicos. esperado que a criana, conforme se desenvolve,
elimine estes processos que no fazem parte da linguagem adulta. Se, porm,
for possvel identificar processos fonolgicos na ausncia de
comprometimentos orgnicos e psicomotores graves, alm da idade esperada,
est criana diagnostica com Transtorno Fonolgico (Wertzner, 2010)
O TF a alterao de fala e linguagem mais comum na populao
infantil (Shriberg e Kwiatkowski, 1994; Gierut, 1998; Bishop, 2010),
aproximadamente de 2 a 3% das crianas entre 6 e 7 anos apresentam
alteraes com intensidade moderada a grave e, em graus mais leves, sua
ocorrncia ainda maior.
Wertzner (2010) definiu o TF como uma dificuldade de fala,
caracterizada pelo uso inadequado dos sons de acordo com a idade e com
variaes regionais, que podem envolver erros na produo e percepo ou
organizao dos sons. Crianas com TF apresentam uma fala com muito mais
substituies e/ou omisses quando comparadas as crianas da mesma faixa
etria. Essas alteraes interferem na capacidade de serem entendidas por
outras pessoas, e isto afeta, no somente no desenvolvimento da linguagem,
mas ainda no desempenho escolar, social e profissional.
Reviso de Literatura | 19
A causa do TF desconhecida, sua gravidade e graus de inteligibilidade
de fala so variados. Os critrios de incluso para TF, segundo Grunwell (1990)
so: apresentar idade acima de 4 anos, audio normal, inexistncia de
anormalidades anatmicas e /ou fisiolgicas no mecanismo da fala; ausncia de
disfunes neurolgicas relevantes; capacidades intelectuais adequadas para o
desenvolvimento da linguagem falada; compreenso da linguagem apropriada
para a idade e linguagem expressiva; vocabulrio e expresso do enunciado
adequado para a idade.
Devido a sua heterogeneidade diversos modelos buscam classificar o TF
nos aspectos psicolingusticos ou na fonologia da lngua. Um dos ndices mais
utilizados em estudos com crianas com TF o modelo de Porcentagem de
Consoantes Corretas (PCC) proposto por Shriberg e Kwiatkowski, (1982),
posteriormente aprimorado em uma verso revisada (Shriberg et al.,1997). Este
ndice quantitativo de Porcentagem de Consoantes Corretas Revisada (PCC-
R), verifica a porcentagem de consoantes corretas numa amostra de fala em
relao ao nmero total de consoantes daquela amostra, considerando como
erro omisses e substituies. Os autores classificaram o ndice de valores do
PCC-R em quatro graus de gravidade sendo: leve, quando os valores so
acima de 85% de consoantes corretas; levemente moderado de 65% a 85%,
moderadamente severo de 50% a 65% e grau severo com valores a baixo de
50% de consoantes corretas.
Reviso de Literatura | 20
Crianas com TF apresentam dificuldades na integrao dos aspectos
lingusticos, motores e auditivos, necessrios para uma produo de fala
efetiva; esses processos so essenciais para que a fonologia da lngua seja
adquirida adequadamente para tornar a fala inteligvel e a comunicao
eficiente (Wertzner e Pagan-Neves, 2014).
Segundo Mendes e Barzaghi (2011) a percepo auditiva e a produo
da fala apresentam uma incontestvel relao entre si, pois, a experincia com
a percepo determina caractersticas da produo e a experincia e a vivncia
com a produo da fala podem, por sua vez, modificar a percepo. Estes so
dois processos complexos que envolvem diferentes habilidades em diferentes
nveis sensrio-motor, fontico-fonolgico, lexical, semntico e cognitivo.
De uma maneira geral a produo dos sons da fala envolve informaes
auditivas, somatosensoriais e motoras, que so representadas nos lobos
temporal, parietal e frontal no crtex cerebral, respectivamente. Essas regies e
suas interconexes com estruturas subcorticais como o cerebelo, gnglio basal
e tronco enceflico, constituem um sistema de controle neural responsvel pela
produo da fala (Guenther 2006).
Segundo Guenther (2006) para que haja a produo de fala a
mensagem verbal precisa ser organizada ao nvel central para que a execuo
neuromotora ocorra. Em seguida as atividades do sistema nervoso central
devem ser combinadas s do sistema perifrico de modo regular e executar
Reviso de Literatura | 21
os programas motores de fala, responsveis pela ativao dos msculos
envolvidos na respirao, fonao, ressonncia e articulao.
Os processos envolvidos na produo da fala esto diretamente
interligados. O processamento cognitivo-lingustico envolve o conhecimento e
armazenamento das regras fonolgicas da lngua e est relacionado
organizao do cdigo lingustico dando sentido semntico, sintxico e
fonolgico. O processamento motor da fala envolve o planejamento da ao
motora de fala e a execuo do gesto articulatrio necessrio para a produo
do som-alvo. E por fim, o processamento perceptivo-auditivo envolve a
percepo de diferentes caractersticas acsticas dos sons da fala, que torna
um fonema, por mais parecido que seja, diferente um do outro (Wertzner e
Pagan-Neves, 2014)
Alm das dificuldades citadas acima, as crianas com TF apresentam
dficits relacionados memria fonolgica e a ateno sustentada (Tkach et
al.,2011 e Murphy et al.,2014). Murphy et al., (2014) realizou um estudo com 55
crianas, sendo 18 com TF e 35 com desenvolvimento tpico, com o objetivo de
verificar a performance destas crianas em testes de ateno auditiva e visual.
Os autores observaram que as crianas com TF apresentaram resultados
piores que crianas com desenvolvimento tpico e concluram que esta
dificuldade est relacionada dificuldade de percepo auditiva e ainda
provavelmente a dficits na memria de trabalho.
Reviso de Literatura | 22
O TF tambm apresenta caractersticas relacionadas dificuldade na
percepo de fala, em processar estmulos sonoros quando apresentados de
forma rpida e em sequncia (Tallal e Piercy 1973; Tallal 1980; Share et
al.,2002; Muniz et al.,2007 e Murphy e Schochat 2009).
Tallal e Piercy (1973) afirmam que a dificuldade em processar elementos
acsticos de curta durao, como as consoantes, que apresentam uma rpida
transio de formantes, e a dificuldade que estas crianas apresentam em
perceber e distinguir corretamente os sons dentro do espectro de fala pode ser
a base para as alteraes de linguagem que apresentam, pois essas crianas
no so capazes de perceber e distinguir corretamente os sons e assim,
consequentemente, o desenvolvimento da representao fonolgica de cada
som para produzi-los corretamente (Murphy 2015a). Porm, esta afirmao
ainda muito questionada pelos pesquisadores, uma vez que estes dois
processos, bottom-up e top-down, esto diretamente interligados e sofrem
mutualmente suas influncias.
Diferentes abordagens teraputicas so descritas na literatura, visando
reorganizao do sistema fonolgico de crianas que apresentam alteraes de
fala. Para escolher a abordagem mais adequada deve-se levar em
considerao a capacidade articulatria, identificao e percepo fonmica,
contrastes fonolgicos, a produo do som, conscincia fonolgica e as
habilidades de linguagem e comunicao efetiva (Crosbie et al.,2005; Kamhi
2006).
Reviso de Literatura | 23
Crosbie et al., (2005) realizaram um estudo comparando duas diferentes
intervenes: terapia fonolgica e Core Vocabulary em dezoito crianas com TF
severo. Os resultados obtidos mostram que todas as crianas aumentaram sua
preciso articulatria durante a interveno. A interveno Core Vocabulary
resultou em maiores mudanas em crianas com alteraes de fala
inconsistentes enquanto a terapia de contraste fonolgico se mostrou melhor
para crianas com alteraes de fala consistentes.
Com o objetivo de verificar e comparar a evoluo do sistema fonolgico
em crianas com TF, Gubiani e Keske-Soares (2014) realizaram um estudo
com seis crianas com idades entre 5 e 7 anos. Os sujeitos foram divididos em
trs grupos de estimulaes, sendo o grupo tratado submetidos a estimulaes
das habilidades prxicas de face e lngua e com exerccios de habilidades
prxicas de lngua; o grupo controle foi submetido apenas a terapia
fonoaudiolgica. Os resultados obtidos neste estudo mostraram que todos os
grupos apresentaram melhoras no inventrio fontico, porm os grupos de
estimulao de habilidades prxicas de face e lngua apresentaram maior
evoluo.
Uma das abordagens mais utilizadas o modelo de ciclos proposto por
Hodson e Paden (1983). Rudolph e Wendt (2014), aplicaram o modelo de ciclos
em trs crianas, com idades entre trs e quatro anos, com TF moderadamente
grave. Os resultados obtidos aps a interveno mostraram que a combinao
de seleo de sons alvos com o modelo de ciclos resultou na generalizao,
Reviso de Literatura | 24
estatisticamente confivel, para sons que no haviam sido estimulados durante
o tratamento. Assim, os autores concluram que a abordagem de ciclos um
mtodo eficiente para o tratamento do TF em crianas em fase escolar.
3.3 Treinamento Auditivo
O sistema nervoso auditivo central possui grande plasticidade, ou seja,
ele tem a capacidade de se reorganizar ao nvel cortical por meio de
experincias e estimulaes (Chermak e Musiek, 2007).
A plasticidade neural vem sendo estudada h tempos e esse fenmeno
est presente quando se refere ao sistema auditivo. Quando exposto a um
ambiente auditivamente enriquecedor ou a uma estimulao auditiva focada,
como treinamentos auditivos em cabine ou por softwares, o crebro capaz
de se reorganizar e desenvolver mudanas associadas percepo auditiva
(Irvine, 2007; Chermark e Musiek, 2002)
De acordo com Musiek e Berger, (1998) a plasticidade uma alterao
nas clulas nervosas que ocorrem como consequncia de influncias
ambientais imediatas acompanhadas de mudanas comportamentais. Esta
reorganizao, influenciada por experincias e estimulaes, subjazem os
processos de memria e aprendizagem.
Segundo Musiek et al. (2002), h, em geral, duas formas de
reorganizao. A primeira pode envolver ativao de neurnios ou conexes
Reviso de Literatura | 25
neurais previamente inativos e, a segunda forma envolve o surgimento de
novas conexes.
Irvine (2007) afirma que plasticidade neural tambm est associada
aprendizagem perceptiva, a qual consiste na melhora da capacidade de
discriminao sensorial aps, por exemplo o treinamento auditivo (TA).
Para Kraus e Hornickel (2013) a plasticidade do sistema auditivo reflete
como o sistema nervoso se adapta a novos ambientes e aumenta as
respostas corretas baseada na relevncia de um som especfico.
Tsodyks e Gilbert (2004) afirmam que o indivduo pode melhorar sua
habilidade perceptiva sem estar consciente de que esta habilidade est sendo
treinada, porm, para que haja o aprendizado, necessrio estar atento ao
estmulo, sofrendo ento a influncia do processo top-down.
Chermark e Musiek (2002) dividiram TA em duas formas: treinamento
auditivo formal e informal. O treinamento auditivo formal est relacionado a
situaes em que o audiologista utiliza estmulos acsticos especficos e
precisamente controlados quanto a sua representao e composio
utilizando computadores, audimetros ou outros equipamentos que permitem
esse controle. O treinamento informal pode ser realizado em casa, escola ou
aplicado durante terapia fonoaudiolgica na clnica, pois esse tipo de
treinamento no utiliza equipamentos de medio e controle de estmulos.
De acordo com ASHA (2005) h duas diferentes abordagens: a
interveno bottom-up e a interveno top-down. A interveno bottom-up
Reviso de Literatura | 26
refere-se a uma estimulao sensorial, ou seja, englobam estratgias que
melhorem a qualidade do sinal. Essas estratgias incluem o treinamento
auditivo, percepo e discriminao auditiva, aumento na melhora do sinal e
mudanas ambientais, a fim de melhorar o ambiente acstico.
J a interveno top-down focada na melhora das tarefas de linguagem,
o ouvinte escuta com ateno, processa a informao, e ento usa processos
em nveis superiores como a cognio, linguagem e funes metacognitivas
para entender a mensagem auditiva.
A percepo auditiva, em geral, composta por estes dois tipos de
processamentos: bottom-up (sensorial) e top-down (cognitivo). Os modelos de
percepo de fala afirmam que o processamento bottom-up, ou seja, o
processamento acstico do sinal de entrada ocorre primeiramente, enquanto o
processamento top-down, relacionado experincia lingustica, (por exemplo, o
reconhecimento com base no conhecimento de fonemas, semntica ou
sintaxe), aparece em um estgio posterior da percepo (Goldstein, 2009;
Moore, 2012; Shuai e Gong, 2014).
O processamento bottom-up pode ser definido como processamento e
extrao das caractersticas dos sinais acsticos de entrada, que se refere
especificamente percepo do pitch e as variaes de frequncia e
intensidade do estmulo acstico; por sua vez, o processamento top-down,
definido como o reconhecimento e compreenso dos sinais de entrada de
acordo com a experincia e conhecimento da linguagem e est associado a
Reviso de Literatura | 27
processos de memria e ateno (Bloch e Hellige, 1989; Spreen et al.,1970;
Tallus et al.,2007; Hugdahl et al.,2008; Shuai e Gong, 2014).
Um nmero crescente de estudos tem sido realizado a fim de investigar
a eficcia do treinamento auditivo e cognitivo em crianas com alteraes de
leitura e linguagem. Porm, ainda no est claro como estes dois processos
influenciam na melhora encontrada aps as estimulaes, uma vez que um
processo interdependente do outro.
O TA proporciona a melhora dos processos de codificao e
decodificao por meio do aprendizado auditivo, e da reorganizao dos
recursos cognitivos da audio, ou seja, esta aprendizagem perceptiva
melhora a discriminao sensorial aps o treinamento auditivo. (Bamford
1981, Irvine, 2007).
Estudos antigos afirmam que a plasticidade neural ocorre apenas ao
nvel cortical, ou seja, eles acreditavam que os neurnios ao nvel do TE no
estavam sujeitos plasticidade uma vez que estes esto relacionados
gerao de sinais eltricos rpidos, consistentes e confiveis. Porm,
Tzounopoulos e Kraus (2009) realizaram uma reviso de estudos e afirmaram
que novas pesquisas tm demostrado que o TE um sistema dinmico e
passvel de plasticidade por diversos mecanismos em seus ncleos auditivos.
Nas ltimas dcadas um progresso significativo tem sido feito no que se
refere plasticidade do sistema auditivo subcortical humano, levando em
Reviso de Literatura | 28
conta os aspectos sensoriais e cognitivos que subjazem a plasticidade
auditiva.
Russo et al., (2005) afirmaram que a plasticidade neural no est restrita
ao crtex. Com objetivo de investigar a plasticidade ao nvel do tronco
enceflico os pesquisadores realizaram um treinamento auditivo de oito
semanas, com o programa comercial Earobics, em crianas de 8-12 anos com
distrbio de aprendizagem. Essas crianas foram submetidas avaliao dos
PEAs em nvel cortical (P2-N2) e do PEATEc no silncio e com rudo, antes e
depois do treinamento auditivo. Os pesquisadores no observaram mudanas
nas respostas do PEATEc no silncio. Porm, as correlaes entre as
respostas no silncio e no rudo melhoraram aps o treinamento auditivo. Esta
resposta mostrou-se significativamente associada ao aumento da amplitude de
P2-N2 do PEA cortical. Os autores concluram que o treinamento auditivo pode
melhorar a codificao de sons complexos, tornando a codificao neural mais
resistente aos efeitos danosos do rudo.
Russo et al., (2010) avaliaram o impacto de um treinamento auditivo
computadorizado (Fast ForWord), em 5 crianas com Transtorno do Espectro
Autista, por meio de avaliaes do PEATEc e do PEA cortical utilizando
estmulo complexo (slaba /da/ sintetizada) apresentados no silncio e no rudo.
Foi observada mudanas na latncia nas respostas ao nvel cortical em todas
as crianas treinadas e em 3 delas ao nvel subcortical (TE).
Reviso de Literatura | 29
Skoe e Kraus (2010b) mediram as respostas do PEATEc, em jovens
adultos normais, para cinco notas musicais sendo que uma nota se repetia mais
frequentemente. As respostas foram monitoradas durante 1 hora e meia, e foi
observado um aumento progressivo da magnitude das ondas em dependncia
do tempo de estimulao. Os autores concluram que esta uma clara
demonstrao da plasticidade ao nvel do sistema subcortical.
Song et al., (2012) realizaram treinamento auditivo computadorizado
(LACE), em jovens adultos normais, com o objetivo de investigar a melhora na
escuta com rudo competitivo e os mecanismos que subjazem esta melhora, por
meio do monitoramento das respostas do PEATEc no silncio e com rudo.
Observou-se uma melhora nas respostas do PEATEc com rudo relacionadas
aos elementos que refletem a transio dos formantes. O estudo mostrou que
os mecanismos subjacentes percepo de fala no rudo so sensveis a
treinamentos de curto-prazo e por meio desses resultados demonstraram a
plasticidade subcortical. Porm, neste estudo, ainda questionado se a
plasticidade subcortical, comprovada pelos resultados, foi impulsionada por um
exerccio de escuta especfica ou por efeitos acumulativos de todos os
exerccios, ou seja, quanto da resposta obtida foi sensorial e o quanto foi
cognitiva. Em relao a este questionamento os pesquisadores afirmam que o
tronco enceflico tem grande capacidade tanto para influenciar quanto para ser
influenciado por processos cognitivos superiores.
Reviso de Literatura | 30
Esses estudos confirmam que o tronco enceflico no simplesmente
uma estao de transmisso passiva e a plasticidade neural no est restrita
ao nvel cortical (Chandrasekaran et al., 2014).
De acordo com Kraus e Hornickel, (2013) o aprendizado auditivo depende
de uma rede recproca de vias aferentes e eferentes que esto diretamente
conectadas e so interdependentes. O sistema auditivo reflete dinamicamente
interaes entre o processamento sensorial e cognitivo. A resposta do sistema
auditivo para o som no depende somente da transmisso neural ascendente,
mas tambm de outros fatores fisiolgicos e cognitivos. A ateno auditiva,
memria de trabalho auditiva, e a atividade do sistema lmbico so os provveis
mecanismos necessrios para que ocorra a plasticidade neural. H um grande
nmero de projees descendentes e ascendentes, o que aumenta ainda mais
a importncia da integrao sensrio-cognitivo para a adaptao do sistema
auditivo aps passar por novas experincias.
Segundo Rouiller (1992), o sistema auditivo central responsvel por
transferir os estmulos acsticos da cclea at o crtex. Durante este caminho,
o estmulo decodificado em vrios locais ao longo da via auditiva e, em cada
ncleo as respostas se modificam no sentido aferente. Em quase todos os
pontos da via auditiva, h tambm projees eferentes, o que sugere que os
ncleos esto interconectados e estas informaes auditivas so processadas
ao longo na via auditiva de uma maneira hierrquica.
Reviso de Literatura | 31
Nos modelos atuais de neurocincia cognitiva as estruturas corticais so
citadas como cruciais para o processamento auditivo e de fala, no entanto,
antes do discurso ser percebido e integrado com representaes lingusticas,
esses sinais acsticos devem ser representados por um cdigo neural e
entregues ao crtex auditivo com preciso temporal e espectral pela estruturas
subcorticais (Hickok & Poeppel, 2007; Rauschecker & Scott, 2009), que por
muitas vezes so consideradas como meras estaes passivas de
retransmisso dos estmulos sensoriais e, essa funo restrita de entrada e
sada do sinal, dada ao tronco enceflico, em relao aos estmulos acsticos,
est totalmente desatualizada (Chandrasekaran et al.,2014).
Apesar de dcadas de pesquisas, a neuroanatomia funcional do
processamento da fala tem sido difcil de caracterizar. Sabe-se que a
codificao neural da fala ocorre mais nas estruturas rostrais do tronco
enceflico, como no lemnisco lateral e no colculo inferior (Johnson et al.,2005)
e que a produo da fala est diretamente relacionada a percepo auditiva
(Mendes e Barzaghi, 2011).
O sistema auditivo subjacente a compreenso da fala submetido a
constantes mudanas dos sons, a partir do qual extrai os significados. O
contexto lingustico e as caractersticas fontico-acsticas do sinal de fala
fornecem pistas top-down e bottom-up que podem ser usadas para prever
informaes de entrada do sinal acstico, permitindo o conhecimento rpido e
Reviso de Literatura | 32
automtico de at 150 palavras por minuto em adultos saudveis (Bowen,
2006).
Crianas at a primeira dcada de vida so mais influenciadas pelos
processos top-down, uma vez que este ainda se encontra em desenvolvimento
e exige maior esforo, ateno e concentrao. Por exemplo, no teste de
Padro de Frequncia a criana deve ser capaz de discriminar e ento nomear
o som que ouviu. Nesta tarefa os processos bottom-up e top-down esto
presentes uma vez que a criana precisa receber e reconhecer o estmulo
acstico (sensorial bottom-up), e ento nome-lo (cognitivo- top-down).
Dficits no mecanismo top-down esto frequentemente associados a uma srie
de dificuldades de linguagem e aprendizagem, e muitas vezes tambm
associados ao Transtorno do Processamento Auditivo (Moore, 2012).
Segundo Chandrasekaran et al., (2014) e Strait et al., (2012) existem duas
teorias sobre as influncias modulares nos ncleos subcorticais: modulao
local, referente a modificaes iniciadas por operaes dentro do circuito
subcortical, ou seja, por uma reorganizao nas clulas nervosas do prprio TE;
e a modulao top-down referente a modulaes iniciadas via tratos
corticofugais, impulsionada pelo aperfeioamento no controle das funes
cognitivas sobre o processamento sensorial bsico.
Estas influncias modulares, em relao aos sinais auditivos, parecem
ocorrer em todos os nveis do sistema auditivo, podendo haver uma complexa
interao entre si. Cada nvel do sistema auditivo recebe um sinal de entrada
Reviso de Literatura | 33
(bottom-up) a partir do nvel inferior, bem como no nvel acima (top-down)
havendo assim, um equilbrio entre esses dois processos (Chandrasekaran et
al.,2014; Strait et al.,2012).
Apesar de estar bem estabelecido o envolvimento dos processos bottom-
up e top-down no processo de aprendizagem, ainda no possvel afirmar qual
a real influncia que cada um destes processos exerce sobre as tarefas
fonolgicas e de leitura-escrita uma vez que um sofre influncia direta do outro.
(Westerhausen et al.,2009; Murphy et al.,2015a)
A partir da hiptese inicialmente proposta por Tallal e Piercy (1973), a qual
afirma que a base das alteraes de linguagem, como de crianas com TF, a
dificuldade que estas apresentam de processar estmulos acsticos quando
apresentados de forma rpida e em sequncia, foram realizados inmeros
estudos com o objetivo de investigar a influncia dos treinamentos auditivos nas
habilidades cognitivas.
Kujala et al., (2001), aplicaram o treinamento audiovisual incluindo
estmulos no-verbais em crianas com dislexia. Os resultados obtidos nesta
pesquisa mostraram que as crianas treinadas apresentaram melhores
resultados nas tarefas de leitura do que as do grupo de no treinados, alm da
melhora das respostas no exame eletrofisiolgico Mismatch Negativity. Neste
estudo os autores puderam observar a influncia do treinamento auditivo no
verbal na habilidade de leitura.
Reviso de Literatura | 34
Lakshminarayanan e Tallal (2007) realizaram treinamento auditivo no
verbal em estudantes com idades entre 18 e 25 anos que no apresentassem
alteraes de linguagem e audio normal, a fim de verificar se o aprendizado
sensorial seria refletido na discriminao de slabas. Durante o treinamento
auditivo, os participantes deveriam discriminar frequncias ascendentes e
descendentes com caractersticas acsticas semelhantes aos sons de fala do
Ingls, por um perodo de 5 dias. Os resultados obtidos mostraram que houve
uma melhora significante na tarefa de discriminao das slabas, do grupo dos
treinados em relao ao grupo controle, confirmando a influncia do
treinamento sensorial nas tarefas cognitivas.
Pesquisadores como Stevens et al., (2008) estudaram a influncia dos
processos top-down nas habilidades auditivas. Em seu estudo, pesquisaram a
influncia do treinamento por meio do programa de computador Fast FarWord
(com estmulo lingustico) em crianas com desenvolvimento tpico e com
distrbio especfico de linguagem, com o objetivo de verificar se o treinamento
top-down pode influenciar na habilidade de ateno auditiva seletiva. O estudo
demostrou que, apesar de ambos os grupos receberem a mesma estimulao,
o grupo das crianas com distrbio especfico de linguagem demostrou melhora
nas habilidades de linguagem receptiva e expressiva bem como na ateno
seletiva quando comparada ao grupo de crianas com desenvolvimento tpico.
Estes resultados indicam que os mecanismos neurais da ateno seletiva,
previamente mostrado para ser deficiente em crianas com alteraes de
Reviso de Literatura | 35
linguagem, pode ser remediada por meio do treinamento e pode acompanhar
melhoras em medidas padronizadas da linguagem.
Em seu estudo, Kraus et al., (2014) realizaram treinamento musical em
crianas com o objetivo de investigar como o treinamento musical pode
influenciar o processamento da fala. Os resultados obtidos mostraram que,
mesmo depois de 2 anos, as crianas que foram mais comprometidas com o
programa musical, apresentaram melhoras nas tarefas de leitura e fala.
Murphy et al., (2015a), frente a este questionamento, realizaram um estudo
com objetivo de comparar o efeito da estimulao auditiva no-lingustica e da
terapia fonoaudiolgica nas tarefas fonolgicas em 17 crianas com transtorno
fonolgico. A interveno incluiu medidas sensoriais auditivas (habilidades de
processamento auditivo temporal) e medidas cognitivas (ateno, memria de
curto prazo, a produo da fala e habilidades de conscincia fonolgica). A
abordagem auditiva foi focada em treinamento auditivo no-lingustico (por
exemplo, rudo de fundo e discriminao de frequncias), enquanto a
abordagem fonolgica foi centrada na formao dos sons da fala (por exemplo,
organizao e conscincia fonolgica). As pesquisadoras observaram que, na
anlise intra-grupos, o grupo da estimulao auditiva apresentou ganhos
significantes em ambas as medidas sensoriais e cognitivas, enquanto nenhum
ganho significante foi observado no grupo de interveno fonolgica. Tambm
no foi observada nenhuma melhora nas habilidades fonolgicas em nenhum
dos grupos. A anlise intra-grupos demonstrou diferenas significantes entre a
Reviso de Literatura | 36
melhora apresentada aps o treino para ambos os grupos, com um ganho mais
acentuado para a interveno auditiva no-lingustica em ambas as medidas de
ateno visual e auditiva. As autoras concluram que ambas as anlises
sugerem que, embora a abordagem de interveno auditiva no-lingustica
parea ser a abordagem de interveno mais eficaz, no foi suficiente para
promover a melhora das habilidades fonolgicas.
Em contrapartida, Halliday et al., (2012) e Murphy et al., (2015b), por
exemplo, no observaram em suas pesquisas a interao do treinamento
auditivo com a melhora das tarefas de linguagem.
Halliday et al., (2012), realizaram o treinamento auditivo em crianas de 8-
10 anos de idade com desenvolvimento tpico. Estas crianas foram submetidas
a 12 sesses de treinamento auditivo, por meio das tarefas de discriminao de
frequncias, discriminao de fonemas ou discriminao visual de frequncias.
Todos os trs grupos apresentaram uma melhora significante aps as 12
sesses apenas na tarefa referente ao treino especfico de seu grupo, ou seja,
o aprendizado seguido do treinamento auditivo foi especfico para uma
determinada tarefa ou estmulo, sugerindo que o treinamento auditivo sensorial
no influencia os processos top-down. Assim os autores concluram que mesmo
aps o treinamento auditivo sensorial no houve a transferncia de
conhecimento aprendido nas tarefas auditivas para as habilidades de
linguagem.
Reviso de Literatura | 37
Murphy et al., (2015b) realizaram um estudo com o objetivo de investigar
generalizao do aprendizado aps o treinamento auditivo nas habilidades
cognitivas como ateno e memria. O estudo foi realizado com crianas que
tinham entre 7 e 12 anos de idade diagnosticadas com TF. Estas crianas
foram divididas em quatro grupos sendo eles: Grupo controle treinado; grupo
controle no-treinado; grupo de estudo treinado e grupo de estudo no-treinado.
Os grupos treinados foram submetidos a 12 sesses de treinamento auditivo
computadorizado no verbal. Aps o treinamento, o grupo controle treinado
demonstrou uma melhora significante para o GIN e o grupo de estudo treinado
exibiu o mesmo para a ateno sustentada, indicando generalizao de
aprendizagem a partir de um treinamento sensorial auditivo para uma
habilidade top-down, em relao s outras medidas, todos os grupos
apresentaram aproximadamente o mesmo nvel de ganhos, indicando a
presena de um efeito de teste e reteste. Os resultados tambm mostram que a
extenso de memria no estava relacionada com o processo de generalizao
de aprendizagem, uma vez que o grupo de estudo treinado exibiu um ganho
mais acentuado em habilidades de ateno aps o treinamento sensorial.
Mtodos
M t o d o s | 39
4. MTODOS
O presente estudo foi aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa da
Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP), em 01 de
outubro de 2014 sob protocolo de pesquisa n 338/14 (Anexo 1).
O estudo foi realizado no Centro de Docncia e Pesquisa em
Fonoaudiologia, Fisioterapia, e Terapia Ocupacional da FMUSP no Laboratrio
de Neuroaudiologia, no perodo junho de 2014 a janeiro de 2015, com o apoio
financeiro da Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo
(FAPESP), sob processo de nmero 2013/07490-3.
Todos os indivduos selecionados, juntamente com seus pais ou
responsveis, foram orientados em relao aos procedimentos referentes
pesquisa, tiveram suas dvidas esclarecidas e foram includos no estudo aps a
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 2).
4.1. CASUSTICA
Foram convocadas 27 crianas, com idade entre seis e 12 anos de idade,
as quais estavam na fila de espera para atendimento fonoaudiolgico no
Laboratrio de Investigao Fonoaudiolgica em Fonologia do Departamento
de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da FMUSP. Das
M t o d o s | 40
crianas convocadas, 11 foram consideradas aptas participarem da pesquisa
de acordo com os critrios de incluso. As demais foram excludas por
diferentes motivos como abandono do tratamento e grande nmero de faltas.
Foram considerados como critrio de incluso para todos os sujeitos
participantes:
Ter o diagnstico de Transtorno Fonolgico;
Idades entre 6 a 12 anos, de ambos os gneros;
Ausncia de comprometimento neurolgico ou psicolgico evidente;
Desempenho lingustico dentro do esperado para a idade e para o
quociente de inteligncia (QI) medido por meio do Teste das Matrizes
Progressivas de Raven (Raven et al., 1986) realizado por psiclogo
especializado;
Triagem auditiva (inspeo do meato acstico externo; audiometria tonal
nas frequncias de 500 a 4 kHz) normal, ou seja, at 20dBNA (ANSI 69);
No ter sido submetido a intervenes fonoaudiolgicas.
Os sujeitos includos no presente estudo foram pareados por idade, gnero
e valor do PCC-R. Aps serem avaliados foram divididos em dois diferentes
grupos de estimulao:
Grupo Bottom-up (B-U): composto por seis sujeitos submetidos a 12
sesses de treino auditivo (interveno sensorial) com durao de
aproximadamente 45 minutos;
M t o d o s | 41
Grupo Top-down (T-D): composto por cinco sujeitos submetidos a 12
sesses de terapia fonoaudiolgica (interveno cognitiva) com durao de
aproximadamente 45 minutos, realizadas pelo Laboratrio de Investigao
Fonoaudiolgica em Fonologia do curso de graduao em Fonoaudiologia
da FMUSP.
4.2. MATERIAL
Os materiais utilizados na presente pesquisa esto descritos a seguir:
1. Otoscpio da marca Heine, para a inspeo do Meato Acstico Externo.
2. Cabina Acstica para realizao da Audiometria Tonal, aferida de acordo
com a norma ANSI S31-1991.
3. Audimetro da marca Grason-Stadler modelo GSI-61, cuja faixa de
frequncia de 125 a 12000 Hz, e que, por via area, o tom puro varia de
10 a 110 dB NA, para as frequncias de 125 e 12000 Hz; de -10 a 115 dB
NA, para as frequncias de 250 e 8000; e de -10 a 120dB NA, para as
frequncias de 500, 750, 1000, 2000, 3000, 4000, 5000 e 6000 Hz. Foi
utilizado o fone supra-aural modelo TDH-50. A calibrao do aparelho
est de acordo com os padres ANSI S3.6 (1989); ANSI S3.43 (1992);
IEC 645-1(1992); IEC 645-2; ISSO 389.
4. Notebook da marca Samsung equipado com os softwares utilizados para
avaliao e interveno.
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5. Softwares: Jogo do Macaco e Jogo do Papagaio (Murphy, 2008);
software comercial Escuta Ativa (CTS Informtica) Teste de Memria
para Dgitos (Span de dgitos) desenvolvido com o uso do Software E-
Prime Professional utilizando o modelo inicial proposto por Baddeley e
Hitch (1974); Teste de Ateno Auditiva (Murphy, 2014), e
Pseudopalavras/ adaptao (Salles JF, 2011).
6. Fone supra-aural modelo HA-RX300 da marca JVC.
7. Compact Disc com gravao do Teste de Padro de Frequncia
(Auditec,1997)
8. Compact Disc com gravao do teste Gap in Noise (Musiek, 2005)
9. Equipamento para realizao dos testes eletrofisiolgicos - modelo
Navigator Pr, da Marca Bio-Logic System Corporation (Bio-logic
Systems Corp., Natus Medical Inc., Mundelin, III., USA)., equipado com
BioMARK (Biological Marker of the Auditory Processing), instalado em um
computador, para a realizao dos potenciais evocados auditivos com
estmulo clique e de fala. Foram utilizados fones de insero da marca
Biologic, modelo 580- SINSER.
10. Pasta abrasiva para a limpeza da pele do indivduo, e pasta eletroltica
para favorecer a captao dos potenciais evocados auditivos.
Esparadrapo microporoso para fixao dos eletrodos na pele.
Para a realizao da estimulao foram utilizados:
M t o d o s | 43
11. Carta padro (9,7 x 6,7cm) contendo uma figura representada com o som
alvo em posio inicial na parte inferior, o smbolo fontico do som alvo e
duas figuras representando os movimentos articulatrios de boca, lngua
e pregas vocais envolvidos na produo do som alvo (sendo uma foto da
boca em viso frontal e a outra um desenho em viso sagital).
12. Carta com figura (7,2 x 6,8 cm) com uma imagem.
13. Cartelas (17,7 x 12,7 cm) com figuras relacionadas aos sons trabalhados,
utilizadas como bingo e caa-figuras.
4.3 PROCEDIMENTOS
Na primeira sesso, os responsveis pelos participantes, receberam e
assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; foram instrudos
quanto aos procedimentos e exames realizados durante a pesquisa, descritos a
seguir:
Anamnese
Foi realizada uma entrevista com o responsvel a fim de verificar a histria
clnica da criana e investigar os critrios de incluso no estudo (Anexo 3).
Diagnstico de Transtorno Fonolgico
O diagnstico de TF foi realizado por uma fonoaudiloga especialista, por
meio do Teste de Linguagem Infantil ABFW Fonologia (Wertzner, 2004;
Andrade et al.,2004). As provas de fonologia so duas: nomeao de figuras
M t o d o s | 44
(sendo 34 palavras correspondentes a 90 consoantes) e imitao de palavras
isoladas (com 39 palavras correspondentes as 107 consoantes). Para a
classificao da gravidade do transtorno fonolgico foi utilizado o ndice de
Porcentagem de Consoantes Corretas Revisada (PCC-R) (Shriberg et
al.,1997). O resultado foi calculado separadamente para as duas tarefas. O
valor do PCC-R foi classificado de acordo com a Quadro 1:
Quadro 1: Classificao da gravidade do PCC-R
Classificao Porcentagem de consoantes corretas
Leve >85%
Levemente-moderado 65% a 85%
Moderadamente-severo 50% a 65%
Severo
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Para a realizao da avaliao eletrofisiolgica a criana foi orientada a
permanecer relaxada e sentada em uma poltrona confortvel. Aps a limpeza
e preparao da pele com a pasta abrasiva, foram fixados os eletrodos, por
meio de pasta eletroltica e esparadrapo microporoso, nas seguintes posies:
eletrodo ativo (Fz), colocado na testa, eletrodos de referncia nas mastoides
esquerda (M1) e direita (M2), de acordo com o sistema 10-20 Internacional
Electrode System (IES) (Jasper, 1958). Em seguida foram verificados os
valores de impedncia, sendo considerado adequado abaixo de 5 K(. Os
estmulos foram apresentados por meio de fone de insero.
O Potencial Evocado Auditivo de Tronco Enceflico com estmulo clique foi
realizado a fim de verificar a integridade da via auditiva. O estmulo foi
apresentado na intensidade de 80dB nNA, a uma velocidade de 19,1 estmulos
por segundo, sendo promediados 2000 estmulos; com uma janela de gravao
de 10,66 ms, filtros passa-alto 100Hz e passa-baixo de 1500Hz. Foram obtidos
dois traados a fim de garantir a reprodutibilidade das ondas, para eliminar a
variabilidade e subjetividade de interpretaes. No traado resultante foram
identificadas e analisadas as latncias absolutas das ondas I, III e V e intervalos
interpicos I-III III-V e I-V. Os padres de normalidade utilizados na anlise das
respostas foram propostos no manual do equipamento Navigator Pro (Quadro
2).
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Quadro 2: Valores normativos do PEATE para clique de acordo com a orelha restada, segundo
o manual do equipamento Navigator Pro.
Ondas OD OE
Mdia DP Mdia DP
I 1,54 0,11 1,54 0,12
III 3,67 0,12 3,69 0,1
V 5,52 0,22 5,54 0,19
I-III 2,13 0,14 2,14 0,23
III-V 1,85 0,17 1,86 0,14
I-V 3,98 0,19 4 0,2
Os estmulos utilizados para a realizao do PEATEc foram os cinco primeiros
formantes da slaba /da/, esta slaba foi escolhida pois consoantes plosivas
fornecem maior informao fontica (Russo et al.,2004). Este estmulo de fala
sintetizado (Klatt,1980) fornecido pelo prprio equipamento. O estmulo, com
durao de 40 ms, foi apresentado monoauralmente, somente na orelha direita
devido a vantagem da orelha direita para processamento de sons da fala
(Hornickel et al.,2009), em polaridade alternada, na intensidade de 80 dB nNA,
a uma velocidade de 10,9 estmulos por segundo. A janela de gravao foi de
74,67 ms, filtros passa-alto de 100Hz e passa baixo de 2000Hz. Foram
realizadas duas varreduras de 3000 estmulos, as duas ondas obtidas foram
somadas e suas mdias calculadas.
No traado resultante obtido foram identificados e analisados:
Domnio Onset: composto pelas medidas de latncia das ondas V, A e do
complexo VA (incluindo latncia, rea e slope).
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Domnio espectro-temporal: composto pelas latncias dos picos D, E e F.
Domnio Fronteira do Envelope (Envelope Boundaires): composto pelas
latncias das ondas C e O, em que C marca o incio da vocalizao da
poro sustentada, e a onda O marca o final da vocalizao.
Domnio Pitch: composto pelas medidas de amplitude F0 .
Domnio de Harmnicos: composto pelas medidas de amplitude de F1 e
HF, sendo que F1 inclui os harmnicos do estmulo, que compe a
maioria das frequncias que fazem parte do primeiro formante e, HF
composto de harmnicos do primeiro e segundo formantes.
Slope: valor da relao entre amplitude e durao do complexo VA.
Pontuao do Escore gerado pelo algoritmo contido no programa
BioMAP, o qual baseado nas medidas de cinco parmetros de
resposta: latncia da onda V, latncia da onda A, slope, frequncia do
primeiro formante e altas frequncias. Foi considerado alterado quando o
valor do Escore encontrava-se entre 7 e 22.
Quadro 3: Anlise do Padro da Resposta do PEATEc
Domnio Medidas
Onset Ondas V, A e complexo VA
Espectro-temporal Ondas D, E e F
Fronteira do envelope Ondas C e O
Picht Amplitude de F0
Harmnicos Amplitude de F1 e HF
Score Onda V, A, slope, frequncia de F1 e HF.
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A marcao das ondas foi feita tendo como base a onda normativa
fornecida pelo equipamento (Quadro 4)
Quadro 4: Valores da onda normativa referente a slaba sintetizada /da/ oferecida pelo equipamento Navigator Pr.
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TESTES COMPORTAMENTAIS
Teste de Padro de Frequncia (PF) (PPS- Pich pattern sequence)/
Auditec, St Louise:
Para a avaliao da habilidade de ordenao temporal e transferncia inter-
hemisfrica foi utilizada a verso infantil do teste Auditec (1997), composto por
30 sequncias de trs diferentes tons, apresentados de forma binaural (Anexo
5). As crianas foram orientadas a nomear os sons na ordem em que foram
apresentados, sendo fino, para os sons agudos e grosso quando ouvissem
os sons graves. Os tons tm durao de 500 ms e podem ser graves (880Hz)
ou agudos (1430Hz), com intervalo inter-estmulo de 300ms. O Quadro
5 apresenta os critrios de normalidade adotados de acordo com a idade.
Quadro 5: Valores normativos para o Teste Padro de Frequncia 7-8 anos 8-9 anos 9-10 anos > 10 anos
76% 91% 91% 90%
Auditec (1997)
Gap in Noise (GIN) (Musiek et al., 2005):
Este teste foi utilizado na avaliao da habilidade de resoluo temporal. A
criana foi orientada a responder sempre que percebesse o intervalo de silncio
que aparecesse no rudo branco. Foram apresentadas 35 sequncias,
monoauralmente (somente na orelha direita), com durao de 6 segundos cada,
podendo ter trs, dois, um ou nenhum intervalo de silncio, os quais tinham
M t o d o s | 50
durao varivel de 2, 3, 4, 5, 6, 8, 10 12, 15 ou 20 ms. Foi considerado como
limiar o tempo de silncio mais curto percebido pela criana em mais de 50%
das vezes em que fora apresentado. O padro de normalidade para este teste
de 5 ms, segundo Marculino et al.,2011 (Anexo 6).
TESTES PSICOFSICOS
Teste de ateno auditiva:
No teste de ateno auditiva, foram apresentados, binauralmente, em uma
intensidade confortvel ao participante, nmeros de um a sete durante dez
minutos, com o objetivo de investigar a ateno sustentada. A criana foi
orientada a apertar a tecla espao sempre que ouvisse apenas os nmeros
um e cinco. Cada estmulo apresenta durao de aproximadamente 500 ms,
independentemente do nmero se slabas que o mesmo apresente. So
totalizadas 144 tentativas e adotado um ponto para cada acerto. As respostas
foram medidas em relao ao nmero de deteces corretas (HIT), o nmero
de alarmes falsos (AF) e a mdia do tempo de resposta (TR) (Anexo 7).
Teste de memria para dgitos (Span de dgitos):
Desenvolvido e aplicado no Software E-Prime Professional, (Murphy et al.,
2013) de acordo com o modelo proposto por Baddeley & Hitch (1974), este
teste possibilita a investigao da memria operacional. A criana foi orientada
a repetir verbalmente a sequncia de nmeros que apareciam na tela do
M t o d o s | 51
computador. O teste inicia-se com uma sequncia de 3 dgitos, e aumenta
gradativamente conforme a criana acerte 50% das 12 sequncias
apresentadas em cada srie. Considera-se como resultado do Span a ltima
srie de dgitos em que houver mais de 50% de acertos (Anexo 7).
Teste de Leitura de Palavras Isoladas/ Adaptao - Pseudopalavras
(Salles, 2001)
As crianas foram orientadas a ler em voz alta uma sequncia de 30
pseudopalavras, as quais apareciam na tela do computador e em segundos era
substituda por outra. Esta tarefa est associada a ateno e a memria. Foi
totalizado o nmero de palavras que a criana leu corretamente (Anexo 7).
Testes de Metafonologia:
Teste de Conscincia Fonolgica adaptado de Prova de Conscincia fonolgica
- PCF (Capovilla, AGS; Capovilla FC, 1998). Antes do incio de cada tarefa o
examinador explicou o que deveria ser feito e apresentava dois exemplos
criana e, se necessrio corrigia-a. Este teste consiste em 10 tarefas
fonolgicas (Anexo 8), com 4 itens cada, descritas a seguir:
- Sntese silbica: A criana foi orientada a unir as slabas faladas pelo
examinador, reconhecer e dizer a palavra formada por essa unio das slabas
apresentadas;
M t o d o s | 52
- Sntese Fonmica: unir os fonemas isolados falados pelo examinador,
reconhecer e dizer a palavra formada;
- Rima: de trs palavras ditas pelo examinador, reconhecer qual a que no rima
com as demais apresentadas;
- Aliterao: de trs palavras ditas pelo examinador, identificar qual a que no
comea como as outras que foram apresentadas;
- Segmentao Silbica: segmentar e dizer as slabas das palavras
apresentadas;
- Segmentao Fonmica: segmentar e emitir os fonemas das palavras ditas
pelo examinador;
- Manipulao Silbica: adicionar ou subtrair slabas no incio ou final das
palavras apresentadas e dizer a palavra formada;
- Manipulao Fonmica: adicionar ou subtrair fonemas no incio ou final das
palavras apresentadas e dizer qual a palavra formada;
- Transposio Silbica: inverter a ordem das slabas contidas nas palavras
apresentadas e dizer a palavra formada;
- Transposio Fonmica: inverter a ordem dos fonemas contidos nas palavras
apresentadas e dizer a palavra formada
Os resultados obtidos foram separados e calculados de acordo com cada
tarefa conforme a Quadro 6:
M t o d o s | 53
Quadro 6: Padro de referncia para o teste de Metafonologia
Tarefas Porcentagem referente a cada item
Silbicas 6,5%
Fonmicas 6,5%
Rima e Aliterao 12,5%
4.4. INTERVENES
Aps os sujeitos serem submetidos a avaliao, foram encaminhados para
um dos dois diferentes grupos de interveno: Grupo Bottom-up (B-U) ou Grupo
Top-down (T-D). As sesses tiveram durao de cerca de 45 minutos,
realizadas uma vez por semana durante o perodo total de 12 semana. A seguir
ser descrita a estimulao realizada em cada grupo separadamente.
TREINAMENTO AUDIT