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O ENTRELAÇAMENTO ENTRE SENTIDO DA ESCOLA, … · Maria Aparecida da Silva (UNIR) Odete Burgeile (UNIR) ... interatividade. Apresentação ... TV, internet, radio entre outros, tornaram-se

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  • Av. Presidente Dutra, 2965 - Centro

    Porto Velho - RO - CEP: 76801-974

    Fone: (69) 2182-2175

    www.edufro.unir.br

    [email protected]

  • Odete Burgeile

    Jos Lucas Pedreira Bueno

    Juracy Machado Pacfico

    (Organizadores)

    Olhares da mdia na Amaznia:

    movimentos e manifestaes

    Porto Velho-RO

    2016

    EDUFRO

  • Ficha Catalogrfica Biblioteca Central da UNIR

    Preparo de originais: Autores

    Reviso Gramatical: Autores

    Reviso de Normas Tcnicas: Autores

    Composio: EDUFRO

    Editor: Jairo Andr Schlindwein

    Fundao Universidade Federal de Rondnia

    Ari Miguel Teixeira Ott

    Reitor

    Marcelo Vergotti

    Vice-Reitor

    Adilson Siqueira de Andrade

    Chefe de Gabinete

    Ivanda Soares da Silva

    Pr-Reitor de Administrao

    Otaclio Moreira de Carvalho Costa

    Pr-Reitor de Planejamento

    Jorge Luiz Coimbra de Oliveira

    Pr-Reitora de Graduao

    Valdir Aparecido de Souza

    Pr-Reitora de Ps-Graduao e Pesquisa

    Rubens Vaz Cavalcante

    Pr-Reitor de Cultura, Extenso e Assuntos

    Estudantis

    Conselho Editorial da EDUFRO

    Jairo Andr Schlindwein (Prof. UNIR), Jos Lucas Pedreira Bueno (Prof. UNIR), Emanuel Fernando Maia de Souza (Prof.

    UNIR), Rubiani de Cssia Pagotto (Profa. UNIR), Osmar Siena (Prof. UNIR), Jlio Csar Barreto Rocha (Prof. UNIR), Marli

    Lucia Tonatto Zibetti (Profa. UNIR), Sirlaine Galhardo Gomes Costa (Bibliotecria UNIR), Clberson de Freitas Fernandes

    (EMBRAPA), Dante Ribeiro da Fonseca (ACLER

    Depsito legal na Biblioteca Nacional conforme Lei no 10.994, 14 de dezembro de 2004.

    Av. Presidente Dutra, 2965 - Centro

    Porto Velho - RO - CEP: 76801-974

    Fone: (69) 2182-2000

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    [email protected]

  • SOBRE A CAPA

    Numa cultura como a nossa, h muito acostumada a dividir e estilhaar todas as coisas como

    meio de control-las, no deixa, s vezes, de ser um tanto chocante lembrar que, para efeitos prticos e

    operacionais, o meio a mensagem, (McLuhan,1964, p.21).

    A imagem utilizada na capa deste livro retrata um momento importante para a formao

    social e histrica da Amaznia. Trata-se do retrato de trs telegrafistas na estao de Pimenta

    Bueno, trabalho realizado por um dos membros da Comisso Rondon, o fotgrafo Jos Louro.

    Contudo, no s o momento histrico importante para ser analisado nesse contexto. O prprio

    meio utilizado para apresentar os acontecimentos indicava o processo de modernizao pelo

    qual, ainda nos primeiros anos do sculo XX passava a Amaznia. A fotografia, assim como o

    cinema foram instrumentos miditicos muito presentes nas aes do Estado a partir da formao

    da Repblica brasileira. atravs das imagens que a propaganda positivista toma fora e

    possibilita a consolidao de uma nova realidade poltica aps a tardia queda do sistema

    monrquico.

    Por outro lado, o momento retratado por Jos Louro destaca a importncia das

    comunicaes no processo de criao de Rondnia e, porque no dizer, de toda Amaznia, uma

    vez que a realidade apresentada no interior do posto telegrfico, isso dito pelo prprio Candido

    Rondon (1915), no era a mesma observada em seu exterior, onde indgenas, seringueiros e

    regates definiam as principais caractersticas da sociedade vigente. A presena mais intensa do

    Estado, a ordem estabelecida pelos grupamentos militares, os smbolos nacionais cada vez mais

    presentes, passaram a dar o mote para a formao de povoaes com caractersticas urbanizadas

    e cada vez mais distantes da natureza.

    A Comisso Rondon e seus postos telegrficos: Vilhena, Pimenta Bueno, Presidente

    Hermes, Presidente Afonso Pena, Jaru, Ariquemes, Caritianas, Jamari e Santo Antnio

    demarcaram o que seria, com o passar dos anos, o interior do estado de Rondnia. Justamente a

    partir dessas estaes telegrficas que geralmente eram instaladas nas sedes de alguns barraces

    de seringa, formaram-se as comunidades embrionrias que demarcaram o interior desse estado.

    A fotografia disponvel na pgina eletrnica do Museu do ndio possui as seguintes

    informaes: Rondnia: Comisso Rondon. 1922. 1 fot., P&B. 15cm x 21cm. Fotografia

    pertencente ao lbum: Comisso Rondon. Linhas Telegrficas estratgicas de Mato Grosso ao

    Amazonas. O endereo eletrnico :

    Washington Heleno Cavalcante

    http://base2.museudoindio.gov.br/cgibin/wxis.exe?IsisScript=phl82.xis&cipar=phl82.cip&lang=porhttp://base2.museudoindio.gov.br/cgibin/wxis.exe?IsisScript=phl82.xis&cipar=phl82.cip&lang=por

  • ~ 6 ~

    SUMRIO APRESENTAO ................................................................................................................... 7

    A ausncia da mulher assentada na mdia rondoniense: um estudo reflexivo em torno das

    publicaes online ................................................................................................................... 10

    Elizabete Matia de Siqueira (UNIR)

    A festa do divino esprito santo em Pimenteiras e a cobertura das novas mdias digitais: o

    caso dos blogs de Rondnia ................................................................................................... 23 Lilian Maria Moser (UNIR)

    Jos Willians Simplicio da Silva(UNIR)

    A influncia das mdias e o poder simblico das redes sociais no facebook na divulgao de

    eventos religiosos pentecostais e das religies de matrizes africanas em Porto Velho ..... 35 Joel Balduino da Silva Junior(UNIR)

    Miguel Nenev (UNIR)

    A utilizao da mdia escrita e da caravana ford como estrtgias do governo de Rondnia

    para concluso da BR-29 ....................................................................................................... 49 Washington Heleno Cavalcante (UNIR)

    air: cultura amaznica reinventada pelo mercado para a mdia .................................. 62 Raimunda Adriana Maia Costa (UFOPA) Tnia Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)

    Rdio e a sade dos moradores s margens rio Purus, em Lbrea/AM ........................... 74 Fbio Teixeira Lima (UNIR/IFAM)

    Jos Lucas Pedreira Bueno (UNIR)

    Amaznia: cultura, mdia e poltica pela tica de um massacre ........................................ 83 Mauro Antnio dos Santos (UNIR)

    A migrao na viso da mdia impressa e seu papel na difuso de Rolim de Moura ...... 95 Maria Aparecida da Silva (UNIR) Odete Burgeile (UNIR)

    O discurso sobre o Brasil na mdia e a identidade do brasileiro ..................................... 105

    Liubov Tarasova (UNIR) Odete Burgeile (UNIR) lcio Aloisio Fragoso (UNIR)

    Notas sobre a esttica autoetnogrfica no documentrio ................................................. 114 Juliano Jos de Arajo (UNIR)

    SOBRE OS AUTORES E AUTORAS ............................................................................... 120

  • Odete Burgeile, Jos Lucas Pedreira Bueno

    ~ 7 ~

    APRESENTAO

    O livro Olhares da mdia na Amaznia: movimentos e manifestaes foi

    produzido pelo Mestrado em Histria e Estudos Culturais, Mestrado Profissional em Educao

    Escolar, Mestrado em Letras, pelo Grupo de Estudos Lingusticos, Literrios e Socioculturais-

    GELLSO, Grupo EDUCA - Grupo Multidisciplinar em Educao e por convidados de outra

    instituio.

    Procuramos organizar uma obra em que pudssemos relacionar trabalhos acerca das

    representaes da cultura, da diversidade e da educao com as discusses cientficas no

    contexto das comunidades da Amaznia, a partir de estudos elaborados por pesquisadores da

    Universidade Federal de Rondnia e da Universidade Federal do Oeste do Par, buscando

    oferecer ao leitor um panorama, nunca exaustivo, de pesquisas e atuaes em campos do saber

    que so construdos em muitas reas do conhecimento.

    uma obra para ser lida e apreciada com as belezas da Amaznia, mas tambm com

    suas contradies: encantos e desencantos; riquezas e vida simples; explorao e preservao,

    dentre tantas outras. obra para se fazer um belo voo pela Amaznia e, especialmente, por

    Rondnia.

    Na virada do Sculo XXI, as mulheres j representam mais da metade da populao

    mundial. Organismos como a Organizao das Naes Unidas, a Organizao Mundial do

    Trabalho e a Organizao Mundial de Sade, espelham a tomada de conscincia e o

    reconhecimento da mulher como elemento chave do desenvolvimento." Com essas palavras

    inicia Siqueira a abertura dos trabalhos desta coletnea, tentando identificar e compreender

    como a mdia online, no perodo de 2011 a 2013, se manifesta com relao ao universo das

    mulheres assentadas em Rondnia, especificamente em Porto Velho, bem como as relaes se

    estabelecem com sociedade hodierna.

    Moser e Silva problematizam algumas nuances da festa do Divino Esprito Santo

    sob o prisma dos Estudos Culturais. Mostram como a sociedade contempornea tem

    possibilitado humanidade acesso s tecnologias sob os signos da praticidade e da

    interatividade.

  • Apresentao

    ~ 8 ~

    Com uma crtica presena da mdia em alguns eventos culturais em detrimento de

    outros, Balduino da Silva Junior e Nenev tratam do avano das mdias atravs do Facebook, na

    divulgao dos eventos religiosos e simblicos das religies Pentecostais e Afrodescendentes

    em Porto Velho. Os autores mostram as diferenas existentes entre excluso social no campo

    das culturas de massa.

    Com as palavras "O incio do governo de Juscelino Kubitschek tendo como mote 'o

    desenvolvimento e a ordem', foi um prenncio de apaziguamento das mazelas ideolgicas entre

    os militares. Por outro lado, o presidente buscou logo no incio de seu governo atender as

    reivindicaes das corporaes militares, tanto na questo salarial quanto na questo tcnica

    com a aquisio de equipamentos [...]", Cavalcante analisa os problemas que envolveram a

    utilizao da mdia escrita e da Caravana Ford no processo de construo da BR-29, atual BR-

    364, o que ocorreu durante o governo de Kubischek. Vale a pena conhecer essa parte da histria

    de Rondnia.

    Costa e Brasileiro desenvolvem os argumentos que sustentam a ideia de que a mdia,

    a indstria cultural e, fatalmente, o mercado exercem influncia decisiva na concepo e

    construo dos eventos histricos da Amaznia.

    Lima e Bueno destacam que, dentre os vrios problemas enfrentados pela populao

    do municpio de Lbrea/AM, a sade pblica talvez a mais preocupante. Isso porque envolve

    vrios fatores nas reas econmicas, sociais e culturais, e destacam o rdio como meio de

    comunicao de massa, responsvel pela divulgao e informao sobre os riscos da hepatite B,

    nos lugares mais longnquos da sede do municpio de Lbrea.

    Santos aponta que "uma das mais constantes contradies na produo literria e

    histrica da Amaznia o adjetivo a ela referido que vai de paraso a inferno. Tais adjetivos

    incorporados pela literatura e popularizado pelos seus exploradores j uma demonstrao da

    sua singularidade cultural." O autor faz uma reflexo atravs dos conceitos de cultura, mdia e

    poltica para tentar mostrar como se deu a construo e desconstruo dos fatos do massacre

    Corumbiara que levaram ao desfecho histrico da luta por terra na Amaznia.

    Silva e Burgeile discorrem sobre as contradies presentes entre a viso

    desenvolvimentista do Estado brasileiro para Rolim de Moura - Rondnia e a dos migrantes

    dessa regio, atravs do dilogo entre as mdias impressas sobre a migrao, a Roda de

    Conversa e os questionrios aplicados com esses migrantes.

    Tarasova, Burgeile e Fragoso tentam identificar as possveis relaes entre o

    discurso da mass mdia sobre o Brasil e a construo da identidade do sujeito. Para os autores,

    "consciente ou inconscientemente, os media, que inclui jornais, TV, internet, radio entre outros,

    tornaram-se parte importante da vida quotidiana dos sujeitos, levando-se em conta tanto a

  • Odete Burgeile, Jos Lucas Pedreira Bueno

    ~ 9 ~

    perspectiva individual como a perspectiva social", supondo-se, com isso, que os mass midia so

    efetivamente um meio de controle e de construo da sociedade.

    Encerrando as sees da coletnea, Juliano Arajo traz questes para se pensar as

    implicaes estticas para o audiovisual de no-fico, a partir da realizao de documentrios

    por comunidades indgenas.

    Agradecemos aos autores e autoras que produziram os textos, o que possibilitou que

    pudssemos agora ter um excelente trabalho e o prazer de entregar aos leitores e leitoras.

    Porto Velho, setembro de 2016.

    Odete Burgeile Jos Lucas Pedreira Bueno

  • Elizabete Matia de Siqueira

    ~ 10 ~

    A ausncia da mulher assentada na mdia rondoniense: um estudo

    reflexivo em torno das publicaes online

    Elizabete Matia de Siqueira (UNIR)

    1. Introduo

    Na virada do Sculo XXI, as mulheres j representam mais da metade da populao

    mundial. Organismos como a Organizao das Naes Unidas, a Organizao Mundial do

    Trabalho e a Organizao Mundial de Sade, espelham a tomada de conscincia e o

    reconhecimento da mulher como elemento chave do desenvolvimento. (PLANO NACIONAL

    DE POLTICAS PARA AS MULHERES, 2013, p. 07).

    E no que se refere a origem dos estudos culturais sobre as mulheres importante

    esclarecer que se trata de um olhar sobre a mulher reassentada, e se pretende dar espao para um

    novo modo de ler as relaes que foram estabelecidas no Reassentamento Santa Rita. Em que

    foram selecionados atravs de pesquisa exploratria jornais on line, para verificar se os mesmos

    apresentam reportagens sobre as mulheres reassentadas.

    Nestes estudos culturais nos quais esto centrados a mulher poder-se- incluir alguns

    conceitos propostos por Vicente (1998) como feminismo que se refere a discusso poltica,

    social ou tica sobre o lugar da mulher na sociedade; feminilidade: discusso referente ao

    carter prprio da mulher; e feminidade: discusso sobre aquilo que constitui o carter de quem

    mulher.

    A partir dessas definies possvel constituir um estudo sobre as mulheres,

    incluindo o estudo das implicaes culturais sobre a posio e o percurso da mulher na

    sociedade e o contributo feminino, muitas vezes silenciado.

    Para compreendermos o cenrio sobre o movimento das mulheres preciso

    descrever os principais movimentos ocorridos neste Sculo. Busca-se nesta pesquisa,

    informaes das notcias publicadas nos jornais online sobre as mulheres, sobre as polticas

    pblicas de atendimento s mesmas, aos movimentos sociais e aquelas de reivindicao, no

    perodo de 2011 a 2013.

    As transformaes so concretas para uma parcela de mulheres, no entanto outras

    continuam desprovidas dos arsenais de que as classes dominantes so possuidoras. Algumas

    prticas, como mudanas culturais no sentido de redimensionar os papis sociais da mulher so

    necessrias. Isto exige tempo e empenho, uma vez que a emancipao da mulher passa pela

    superao da reproduo social dos modelos tradicionais de homem e mulher.

    Tomando como base esses desafios as mulheres colocam-se como prioridades a

    construo de polticas que lhe assegurem mais espaos de poder, equidade no trabalho, incluso

    no desenvolvimento. E isso ocorrer se houver democratizao da mdia que, s vezes, contribui

  • A ausncia da mulher assentada na mdia rondoniense: um estudo reflexivo em torno das publicaes online

    ~ 11 ~

    para a invisibilidade do protagonismo das mulheres, haja vista a ausncia de publicaes sobre

    participao e atuao destas na superao das expresses cotidianas e da opresso, as quais

    continuam submetidas.

    O artigo apresenta um breve relato histrico sobre o movimento das mulheres

    assentadas. E no segundo momento nos mostra como a mdia online retrata a mulher

    reassentada, o movimento de participao e o seu legado para a sustentabilidade e nas

    consideraes finais as questes colocadas sobre a mdia online, encontrou-se poucas

    informaes sobre as mulheres reassentadas, apenas restringe-se a fatos relacionados violncia

    contra a mulher.

    2. Breve relato histrico sobre o movimento das mulheres assentadas no Brasil a partir do

    sculo XXI

    Ao estabelecer a democracia no pas, a Constituio Federal de 1988 um marco

    legal que coloca as mulheres em condies de igualdade aos homens. Mas as conquistas de

    direitos das mulheres esbarram em muitos desafios j que muitos direitos somente so

    assegurados no papel.

    De acordo com os dados do IBGE (2012), 37,3% das famlias brasileiras so

    chefiadas por mulheres; e h muitas mulheres emancipadas, mas outras tantas ainda continuam

    carregando sozinhas o peso dessas mudanas conjunturais como a pobreza, procriao dos

    filhos, afazeres domsticos e ajudam no aumento da renda da famlia e, muitas vezes, so a

    principal geradora de fonte de renda. Para compreender o cenrio sobre o movimento das

    mulheres preciso descrever os principais movimentos ocorridos neste sculo.

    2.1. Movimentos de mulheres no brasil

    As polticas para as mulheres tm avanado significativamente a partir da

    perspectiva do dilogo e a construo coletiva, conforme o Plano Nacional de Polticas para as

    Mulheres (2013). Os movimentos de mulheres feministas e demais movimentos sociais se

    apresentam com cunho de reverter as lgicas desiguais perante a nossa sociedade h sculos.

    Observa-se que desde a criao da Secretaria de Polticas para Mulheres, em maro

    de 2003, buscou-se consolidar o amadurecimento de tais polticas, a partir do dilogo

    permanente entre governo e sociedade civil, com o fito de reforar o princpio de que um estado

    plenamente democrtico s o se for possibilitada a condio da participao social, sobretudo

    das mulheres.

    Tais polticas tm sido fomentadas por meio de Conferncias, segundo o Plano

    Nacional de Polticas para as Mulheres (PNPM, 2013, p.09): a I Conferncia Nacional de

    Polticas para as Mulheres, em julho de 2004, contou com 1.787 delegadas que debateram as

    suas agendas e elaboraram o I Plano Nacional de Polticas para Mulheres. O processo como um

    todo envolveu mais de 120 mil mulheres em todas as regies do pas. J a II Conferncia

    Nacional de Polticas para as Mulheres, que ocorreu em agosto de 2007, contou com a

    participao de 200 mil mulheres. O resultado deste evento foi a elaborao do II Plano

    Nacional de Polticas para Mulheres. E no ano de 2011, em dezembro, aconteceu a III

    Conferncia Nacional de Polticas para Mulheres, cujos resultados inseriram as temticas de

    gnero em diversas frentes e estabeleceu um plano a ser executado no binio 2013 a 2015.

  • Elizabete Matia de Siqueira

    ~ 12 ~

    O documento que referenda o Plano de Polticas para as Mulheres cita na parte

    introdutria a seguinte afirmativa:

    No mandato de Dilma Rousseff, primeira mulher presidenta do Brasil, o Plano Nacional de

    Polticas para as Mulheres torna-se um instrumento ainda mais importante, tendo em vista que,

    em seu governo, a Secretaria de Polticas para as Mulheres assume maior protagonismo e

    liderana - como reafirmado pela presidenta em sua fala durante a 3 Conferncia Nacional de

    Polticas para as Mulheres: Eu tenho o compromisso inabalvel - e reafirmo aqui - de

    aprofundar as polticas de igualdade de gnero no nosso pas (2013, p.09).

    Tal perspectiva mostra o cenrio poltico e histrico do enfrentamento massivo

    violncia e discriminao, bem como demonstra a amplitude das polticas pblicas indicando o

    propsito poltico de efetivar programas com resultados especficos.

    Assim, as polticas para as mulheres permitem que haja articulao de rgos

    competentes para a execuo de incluso sociopoltica das diferenas tanto no espao privado

    quanto no espao pblico, permitindo que o estado como um todo seja a base de polticas para

    as mulheres, na medida em que considera todas as formas de desigualdade e permita o

    enfrentamento do problema por inteiro.

    Ao buscar o direito vida de qualidade das mulheres no meio rural, as polticas

    pblicas tambm respeitam as especificidades das mulheres do campo, e faz-se necessrio

    conhecer o movimento de mulheres assentadas na Regio Amaznica, para conhec-las como

    protagonista na ocupao do territrio.

    2.2. Movimentos de mulheres assentadas na regio amaznica: o olhar da mdia online

    A Amaznia de uma enorme diversidade cultural, formada por quilombolas,

    seringueiros, povos da floresta, ribeirinhos e os migrantes na ocupao do espao, contou com

    participao efetiva, direta e indireta das mulheres que junto aos homens constituram a

    formao dos novos grupos sociais, inclusive dos reassentamentos.

    O reconhecimento da contribuio da mulher para a produo e reproduo dos bens

    da famlia, ainda desalentadora na sociedade, no s pelo fato da ausncia de reconhecimento

    como trabalhadora, mas tambm por poucos estudos acadmicos sobre a histria das mulheres

    assentadas, principalmente na regio amaznica, mais especificamente em Rondnia.

    Cabe observar que Rondnia, estado da Regio Amaznica, em 2008, passa por

    momento marcante no desenvolvimento econmico e social, motivado pela construo das

    usinas do Rio Madeira que provocou uma verdadeira revoluo na vida dos habitantes,

    principalmente em Porto Velho e seus arredores. A hidreltrica Santo Antnio, segundo o site

    oficial da empresa, j investiu R$ 939 milhes em aes de sustentabilidade, como

    reassentamento, resgate de fauna e flora, alm de investimentos em educao, sade e

    segurana, segundo informaes da mdia institucional da Empresa Santo Antnio Energia

    (2011).

    Para remanejar as famlias atingidas pela barragem foram implementados sete

    reassentamentos: Santa Rita, Novo Engenho Velho, So Domingos, Riacho Azul, Vila de

    Teotnio, Morrinhos e Parque dos Buritis. Segundo o Movimento dos Atingidos por Barragens

    (MAB), todos os reassentamentos foram criados sem seguir um mesmo padro, conforme dados

    na pgina online do Movimento dos Atingidos por Barragem MAB, (2011).

  • A ausncia da mulher assentada na mdia rondoniense: um estudo reflexivo em torno das publicaes online

    ~ 13 ~

    O MAB (2011) publicou em suas pginas online:

    A inexistncia de uma poltica nacional que garanta os direitos mnimos as famlias

    atingidas concede total liberdade para que as empresas construtoras adotem uma

    poltica discriminatria, preconceituosa, injusta e autoritria de tratamento com as

    famlias, condicionada apenas a seus interesses lucrativos, a tal ponto que os atingidos

    de Rondnia, formados em grande parte por ribeirinhos, pescadores, agricultores e

    extrativistas esto sendo remanejados para vilas urbanas sem ter terra, gua, acesso ao

    rio, trabalho, renda e escolas adequadas. (2011, p. online).

    Existem contradies sobre os reassentamentos. As famlias so atingidas pela

    mesma barragem, mas, mesmo assim, o tratamento diferenciado, com casas e terras com reas

    diferentes. Segundo o MAB (2011), as famlias no foram consultadas a respeito de como

    deveria ser construda sua nova morada. A empresa Santo Antnio Energia - SAE imps um

    modelo de reassentamento e que est com srios problemas. O movimento informa ainda, que

    somente no reassentamento Santa Rita, o MAB e o Instituto Nacional de Colonizao e Reforma

    Agrria INCRA participaram das negociaes com as famlias reassentadas e a SAE, portanto

    o nico reassentamento em que as casas foram construdas com 100 m.

    Diante de tantos problemas o MAB apresentou uma pauta de reivindicaes para

    garantir direitos bsicos das famlias assentadas pelas usinas:

    1- Prorrogao da Verba de Manuteno: Que o auxilio dado s famlias (verba de

    manuteno) seja prorrogado at que as mesmas tenham capacidade de produzir e

    sobreviver com a renda a partir de sua prpria produo.

    2- Terra Preparada: Que todas as famlias tenham sua rea de produo individual

    totalmente preparada, mecanizada e corrigida corretamente em condies de produzir.

    3- gua para Todos: Que todas as famlias de todos os reassentamentos tenham um

    poo artesiano de qualidade e uma caixa de 5 mil litros para ter o abastecimento de

    gua satisfatrio tanto para consumo quanto para a produo.

    4- Direitos iguais para todos reassentamentos: Que todas as reas de reassentamento

    tenham os mesmos direitos: patrulha de maquinas agrcolas e todos implementos,

    galpo, 50 hectares de terra para todos; estradas; moradias.

    5- Exigimos a soluo imediata das reas de reserva legal de todos os Reassentamento:

    compra imediata dos 40 hectares por famlias em todos os reassentamentos.

    6- Pagamento pela empresa de todas as contas referentes s tarifas de energia eltrica e

    de gua at que as famlias tenham renda de sua produo.

    7- Soluo de todas as demais pendncias existentes em cada reassentamento. (2011, p.

    online.).

    As dificuldades apresentadas diferem do discurso usado pela empresa Santo Antnio

    Energia quando apresenta todo seu plano de investimento em aes de sustentabilidade,

    incluindo os reassentamentos, pois o relatrio da Dhesca Brasil1 confirma a violaes dos

    direitos humanos.

    A relatoria Nacional do Direito Humano ao Meio Ambiente - Plataforma Dhesca

    Brasil (2011), em monitoramento visando investigar as denncias de violaes de direitos

    humanos relacionados s obras das usinas hidreltricas do Complexo do Rio Madeira em Porto

    Velho-RO, concluram, entre vrias violaes:

    No reassentamento de populaes verificou-se reclamao generalizada de piora das

    condies de vida por reduo da receita das populaes removidas, assim como de m

    qualidade na construo das casas e vias pblicas. (2011 p.03).

    1 Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econmicos, Sociais, Culturais e Ambientais DHESCA.

  • Elizabete Matia de Siqueira

    ~ 14 ~

    Continuando, o relatrio Dhesca (2011, p.4) aponta:

    O nmero de homicdios dolosos cresceu 44% em Porto Velho entre 2008 e 2007, e a

    quantidade de crianas e adolescentes vtimas de abuso ou explorao sexual subiu

    18%. O nmero de estupros cresceu 208% em Porto Velho entre 2007 e 2010.

    Percebe-se que diante de to grande movimento, as minorias so as maiores vtimas,

    seja por explorao sexual ou estupro, vitimando principalmente as crianas, adolescentes e

    mulheres, que nas reportagens online, durante esse perodo pesquisado, aparecem apenas como

    vtimas e no como protagonistas de sua histria.

    Pelo fato das mulheres no serem vistas como protagonistas na mdia, reportamo-

    nos a Escosteguy (2001) ao afirmar que a partir da segunda metade da Dcada de 1970, os

    primeiros estudos culturais desenvolveram trabalhos que se concentraram nos meios de

    comunicao de massa que, alm de entreter, eram tambm vistos como aparelhos ideolgicos

    do Estado (grifo nosso).

    Ao que se nota os meios de comunicao online pesquisados podem ser vistos como

    aqueles que no apresentam todos os dados conforme os denunciados pelo MAB e o relatrio da

    Dhesca Brasil. Estabelece portanto a hiptese de que a mdia institucional apenas reproduz o

    discurso dominante e a mdia no institucional no se manifesta.

    obvio que as informaes publicadas pela mdia podem apresentar conceitos,

    valores que nem sempre representam o pensamento de um grupo, ou seja, pode vir distorcido,

    por isso importante investigar e contrapor a notcia, como neste caso, muitos dados publicados

    pela Usina so contrapostos pelo Relatrio Dhesca.

    Em Zoonnen (1996, p. 30) apud MESSA (2006), destaca dois conceitos recorrentes

    nas abordagens sobre mdia: distoro e socializao. Como distoro entende-se o modo

    como a mdia nos faz acreditar em uma realidade que no existe. J como socializao, entende-

    se o processo pelo qual assimilamos os valores simblicos correntes em nossa sociedade, que

    nos permitem posicionarmo-nos nesta com determinado status ou papel.

    E assim, vejam como a mdia rondoniense trata as questes da mulher reassentada.

    3. A mulher reassentada: o que dizem as reportagens online na mdia rondoniense

    Nesta pesquisa, buscou se investigar de que forma a mdia escreve sobre a mulher

    assentada na reforma agrria, em jornais online de Porto Velho. Foram selecionados 05 (cinco)

    jornais online com notcias sobre mulheres assentadas para anlise e discusses.

    Cabe considerar que a mdia, segundo Fischer (2001), um lugar privilegiado de

    criao, reforo e circulao dos sentidos, que operam na formao de identidades individuais e

    sociais, bem como na produo social de incluses, excluses e diferenas - temas fundamentais

    hoje nos mais diversos campos das cincias humanas.

    A pesquisa exploratria deu-se a partir de jornais online, como por exemplo: Tudo

    Rondnia, O Observador, Rondnia ao Vivo, Rondnia Dinmica, Rondonotcias. Realizou-se

    uma pesquisa no Google e constatou-se a existncia de 43 (quarenta e trs)2 Jornais online na

    regio. Destes jornais selecionados encontraram-se notcias sobre mulheres, publicadas no

    perodo de 2012 e 2013, mas no notcias especficas sobre as mulheres assentadas.

    2 Disponvel em: Acesso em: 24 jan. 2014.

  • A ausncia da mulher assentada na mdia rondoniense: um estudo reflexivo em torno das publicaes online

    ~ 15 ~

    As notcias, em sua maioria, tratam sobre os assentamentos ou reassentamentos e

    so reprodues de informaes dos rgos oficiais, que em suas pginas online divulgam

    pautas sobre o tema.

    E no caso especfico de Rondnia uma nica notcia no ano de 2012, no Jornal

    Rondnia Dinmica3, de 07 de maro, afirma que as mulheres rurais so prioridade nos

    assentamentos da reforma agrria em Rondnia. Acrescenta que o INCRA desenvolve aes

    permanentes nos assentamentos como o Programa de Documentao da Mulher Trabalhadora

    Rural, o Crdito Apoio Mulher, assistncia tcnica e sua incluso na titularidade de lotes,

    cadastramentos e contratos.

    Percebe-se que a mdia online reproduz o que est nos sites institucionalizados,

    como o caso dos Programas de Atendimento mulher rural, visto no site do Ministrio de

    Desenvolvimento Agrrio - MDA, cuja matria a mesma no Jornal Rondnia Dinmica.

    O site oficial do Ministrio de Desenvolvimento Agrrio - MDA e do INCRA, ao

    falar das mulheres assentadas, afirma que a partir do movimento dos assentados e outros

    movimentos, o Governo Federal, reconhece as desigualdades de gnero, implanta um conjunto

    de polticas pblicas de apoio s mulheres rurais, possibilita a incluso como beneficirias

    diretas, afirmando o seu protagonismo e promovendo a autonomia econmica, dando acesso

    documentao e a poltica de apoio produo e comercializao, como tambm direito ao

    ttulo da terra. O Ministrio de Desenvolvimento Agrrio - MDA, atravs da Diretoria de

    Polticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas desenvolveu polticas para a reduo das

    desigualdades de gnero no meio rural.

    Entre as polticas implantadas pelo governo federal atravs do Ministrio de

    Desenvolvimento Agrrio, destaca-se o Programa Nacional de Documentao da Trabalhadora

    Rural -PNDTR, que garante s mulheres rurais o acesso a documentos civis e trabalhistas.

    O Programa Nacional de Reforma Agrria, pela Portaria 981/2003, do Instituto

    Nacional de Reforma Agrria INCRA inclui as mulheres na regularizao e titulao do

    Certificado de Cadastro de Imvel Rural, juntamente com o homem, independente do estado

    civil. A Instruo Normativa 38/2007, do INCRA, garante s famlias chefiadas por mulheres a

    prioridade na classificao das mesmas para o beneficio da Reforma Agrria, garantindo o

    acesso e direito das mulheres terra.

    Segundo Mouro (2010), o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar

    (PRONAF) com uma linha de crdito especial, o PRONAF Mulher, com o objetivo de

    reconhecer e estimular o trabalho das mulheres rurais na agricultura familiar e nos

    assentamentos da reforma agrria financia as atividades desenvolvidas pelas mulheres de

    maneira individual ou coletiva. O PRONAF Mulher um instrumento de fortalecimento da

    produo das mulheres rurais e superao da invisibilidade do trabalho feminino.

    Continuando Mouro (2010), afirma que em 2008, foi criado o Programa de

    Organizao Produtiva das Mulheres Rurais - POPMR, pela Portaria Interministerial 02,

    publicada no Dirio Oficial da Unio (DOU), de 24 de setembro de 2008. Programa

    Interministerial do Ministrio do Desenvolvimento Agrrio - MDA, Ministrio de

    Desenvolvimento Social e Combate a Fome (MDS), Ministrio do Trabalho e Emprego -MTE,

    Ministrio da Pesca e Aquicultura - MPA Secretaria de Polticas para Mulheres SPM, Instituto

    Nacional de Reforma Agrria - INCRA, Companhia Nacional de Abastecimento - CONAB,

    com a finalidade de articular as polticas de fortalecimento das organizaes de mulheres rurais,

    3 Disponvel em: Acesso em: 24 jan. 2014.

    http://www.rondoniadinamica.com.br/

  • Elizabete Matia de Siqueira

    ~ 16 ~

    garantindo acesso s polticas de apoio produo e comercializao, promovendo autonomia

    econmica e incentiva troca de informaes, conhecimentos tcnicos, culturais, valorizao da

    economia solidria.

    As polticas impulsionam a organizao das mulheres, mas ainda precisam de

    ampliao e fortalecimento, com maior participao das mesmas e aes de promoo da

    igualdade de gnero, haja vista, que a mdia embora cite tais programas, v-se que essas

    informaes falam de polticas para as mulheres e no das mulheres no contexto, embora elas

    tenham papel preponderante na fixao do homem, dos filhos e filhas na comunidade, mesmo

    com todas as dificuldades, conforme afirma Bechimol apud Fechine (2007, p. 22):

    A Mulher o elemento fixador por excelncia. D o sentido de estabilizao e

    permanncia na terra em uma imigrao bem dirigida. No entanto, sendo quase sempre

    sentimental por ndole, e mais chegada aos hbitos e costumes, quem vai sofrer mais

    a mudana de ambiente [...]. Em todas as mulheres que entrevistei, sentia sempre um

    desgosto, um desnimo quando no revolta incontida. No haver mais sossego para

    mim numa terra em que eu no conheo ningum. A falta de aconchego do lar, da

    paisagem domstica, dos parentes e dos amigos, da convivncia como eles chamam,

    atua poderosamente para isso.

    As transformaes so concretas para uma parcela de mulheres, no entanto outras

    continuam desprovidas dos arsenais de que as classes dominantes so possuidoras. Algumas

    prticas, como mudanas culturais no sentido de redimensionar os papis sociais da mulher so

    necessrias. Isto exige tempo e empenho, uma vez que a emancipao da mulher passa pela

    superao da reproduo social dos modelos tradicionais de homem e mulher.

    Segundo Messa (2006), ser feminista, no Sculo XXI, no significa excluir o

    homem da relao, como se fosse o patriarcado culpado de todos os males que afligem a

    mulher. Tambm no significa que homens e mulheres precisam ser iguais, mas indica que na

    diferena no deve residir nenhum tipo de preconceito.

    A notcia do jornal online Rondnia Dinmica, de 07 de maro de 2012, ainda

    destaca que a assistncia tcnica do Incra est orientada para integrar todos os membros do

    grupo familiar, como homens, mulheres, jovens e idosos. A famlia passou a ser compreendida a

    partir da participao de todos os seus membros, sendo reconhecidos novos arranjos sociais,

    inclusive com as mulheres chefes de famlia.

    Diante de tamanha importncia do papel da mulher, a assentada assume uma dupla

    responsabilidade, a de ser mulher e ser assentada.

    3.1. O legado de sustentabilidade das mulheres assentadas e seu movimento de

    participao

    Segundo Jalil (2009), uma nova ordem econmica e mundial se iniciou no final da

    Dcada de 1970. A poltica neoliberal acirrou as desigualdades sociais e abriu espao para a

    entrada de um novo tipo de capital, fortalecendo o agronegcio, a indstria de sementes,

    insumos e agrotxicos, a tecnologia dos equipamentos, a flexibilizao da legislao trabalhista

    e ambiental, o latifndio e a monocultura. Esta nova ordem refletiu nas populaes rurais,

    principalmente na vida das mulheres, pois, elas so as responsveis pelo cuidado da famlia e

    ainda pela manuteno da diversidade, o cuidado das sementes e a agricultura de subsistncia.

  • A ausncia da mulher assentada na mdia rondoniense: um estudo reflexivo em torno das publicaes online

    ~ 17 ~

    Com a democratizao do pas e a Constituio Federal de 1988, aumentou a

    participao dos atores sociais nas instituies polticas. Este processo prope mudanas

    estruturais, polticas e culturais bem como retomar o significado de uma democracia

    participativa, por meio dos movimentos sociais.

    Segundo Carneiro apud JALIL (2009, p. 6):

    neste ambiente e no bojo das transformaes polticas que, no Brasil os movimentos

    das mulheres ganham fora e significativa expresso nos processos de lutas no campo e

    datam deste perodo as primeiras organizaes formais com o objetivo de reivindicar o

    reconhecimento poltico de um estatuto profissional, bem como de outros direitos

    sociais.

    O movimento incorpora novas demandas e questionamentos, como a diviso sexual

    do trabalho, a violncia sexista, a participao das mulheres nos partidos polticos, sindicatos,

    associaes, levando a uma mudana das aes de luta e como estas vo ocorrer.

    As primeiras organizaes a surgirem segundo Jalil (2009, p. 5) foram:

    Movimento Popular de Mulheres do Paran (MPMP), em 1983; Movimento das

    Mulheres Agricultoras de Santa Catarina (MMA-SC), em 1984; Movimento das

    Mulheres Assentadas de So Paulo (MMA-SP), em 1985; Movimento de Mulheres

    Trabalhadoras Rurais do Rio Grande do Sul (MMTR-RS, em 1985; Comisso Estadual

    de Mulheres da Federao dos Trabalhadores de Rondnia (CEM/FETAGRO, em

    1985; Associao de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Esprito Santo (AMUTRES),

    em 1986; Movimento das Trabalhadoras Rurais do Nordeste (MMTR-NE), e 1986;

    Centro de Associaes de Mulheres Trabalhadoras do Acre (CAMUTRA), em 1987;

    Articulao das Instncias das Mulheres Trabalhadoras Rurais-Sul (1988) e a Comisso

    Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Central nica dos Trabalhadores

    (CNMTR-CUT), em 1990.

    Os questionamentos e lutas enfatizados nos movimentos foram e so indispensveis

    para um processo de democratizao, ampliando o acesso a direitos sociais o que leva a uma

    transformao das relaes de poder.

    Como resultado do envolvimento das mulheres agricultoras em vrias organizaes,

    surge o Movimento das Mulheres Camponesas MMC, em 2003, quando as mesmas organizam

    vrias discusses com sindicatos e movimentos sociais, realizando de 21 a 24 de setembro de

    2003 o I Curso Nacional, com representao de 14 estados e participao de 50 mulheres,

    representando os Movimentos Autnomos. Assim nascia o MMC com princpio poltico e as

    diretrizes:

    Construir um movimento nacional das mulheres camponesas se justifica a partir da

    certeza de que a libertao da mulher obra da prpria mulher, fruto da organizao e

    da luta (MMC).4

    O MMC o nico movimento feminista que compe a Via Campesina5 no Brasil. A

    luta central do MMC contra o modelo capitalista e patriarcal e pela construo de uma

    sociedade com igualdade de direitos. Sua principal bandeira de luta hoje o Projeto de

    4 Nota de apresentao do movimento em sua pgina: Acesso em: 26

    jul. 2013. 5 A Via Campesina um movimento internacional que coordena organizaes camponesas de pequenos e mdios

    agricultores, trabalhadores agrcolas, mulheres camponesas e comunidades indgenas da sia, frica, Amrica e

    Europa. Trata-se de um movimento autnomo e pluralista.

  • Elizabete Matia de Siqueira

    ~ 18 ~

    Agricultura Camponesa Ecolgico, com uma prtica feminista, fundamentado na defesa da vida,

    na mudana das relaes humanas e sociais e na conquista de direitos, tais bandeiras de lutas

    contextualizam a mulher e a sua relao com a sociedade no campo.

    O Projeto Popular de Agricultura Camponesa do Movimento das Mulheres

    Camponesas - MMC busca viabilizar polticas pblicas que o projeto prope para a agricultura

    que garantam a permanncia no campo, a produo de alimentos saudveis, crdito especial para

    mulheres, etc.; a soberania alimentar; cuidado, respeito e preservao do ambiente; e no que se

    refere ao uso sustentvel dos recursos naturais; quanto preservao das nascentes de guas;

    revitalizao do Rio So Francisco; preservao das plantas medicinais e sementes crioulas; j

    para o direito e o acesso terra; produo agroecolgica de alimentos; garantia de gerao de

    renda; valorizao e valorao do trabalho e renda gerada pelas mulheres, garantindo sua

    autonomia; bem como incentivar e fortalecer a concretizao de cooperao solidria; e na

    produo de alimentos prope facilitar a produo de alimentos com o auxilio da cincia,

    voltada aos interesses das camponesas; e aos movimentos coletivos assevera que a:

    organizao coletiva do grupo familiar na construo de novas formas de vivncia e

    convivncia de maneira a superar as relaes da famlia patriarcal e machista; e tal

    construo dar-se- a partir da construo coletiva de espaos de poder partilhado de

    mulheres e homens tanto nos espaos privados quanto nos pblicos; com relao as

    mudanas nas relaes humanas e a diversidade estabelece o respeito a diversidade

    tnico racial, de gnero, econmica, cultural, ecolgica, e de espiritualidade;

    fortalecimento da arte e da cultura camponesa atravs de crenas, rezas, rituais, visitas,

    pratos tpicos, mutires de trabalho, danas, roda de viola, literatura de cordel,

    repentes, festas tpicas e outras; valorizao e reconhecimento do saber popular, fruto

    da herana e do conhecimento da vida camponesa; garantia da autonomia de

    camponesas e camponeses sobre o processo de trabalho (MMC, 2013, p. online)

    Tudo isto reflete sobre o seu corpo e sobre o seu modo prprio de vida.

    A segunda bandeira de luta do MMC pela Ampliao dos Direitos Sociais que

    tem por objetivo a garantia do direito Previdncia Pblica e Universal que assegure e efetive

    os direitos e benefcios j conquistados, bem como a ampliao de direitos sociais; no que

    concerne a garantia do direito Sade Pbica; assim como a garantia de documentao para

    todas as mulheres e seus familiares; direito educao pblica de qualidade, libertadora e

    emancipatria; garantia de acesso aos direitos conquistados na Lei Orgnica da Assistncia

    Social; para a garantia de moradia digna, saneamento, luz e estradas, lazer e atividades

    culturais; investimento pblico na pesquisa, cincia e tecnologias a servio da vida; garantia de

    polticas pblicas de combate violncia e proteo de mulheres e crianas; tambm prev a

    poltica de comercializao e aquisio direta de alimentos e produtos da agricultura

    camponesa.

    Com o Projeto Popular para o Brasil o MMC tem por objetivo central lutar pela

    soberania nacional, proteo, conservao e preservao da biodiversidade, recuperando,

    valorizando a cultura brasileira, fortalecendo as iniciativas de poder popular que reafirmam a

    busca da dignidade e autonomia da mulher e do povo brasileiro.

    A quarta bandeira de luta do MMC pela:

    Participao poltica da mulher na sociedade pela participao, valorizao e

    autonomia da mulher em todos os espaos de deciso sobre a produo, o patrimnio,

    as relaes humanas, polticas e comunitrias, de maneira a garantir a manuteno e o

    avano do campesinato, na construo de um projeto popular para o Brasil; garantia de

  • A ausncia da mulher assentada na mdia rondoniense: um estudo reflexivo em torno das publicaes online

    ~ 19 ~

    autonomia e no mercantilizao do corpo das mulheres com o fim de todas as formas

    de violncia, opresso, discriminao e dominao praticada contra as mulheres e a

    classe trabalhadora. (MMC, 2013, p. online)

    A questo compreender como os movimentos organizados se colocam frente

    problematizao, questionamento e enfrentamento das relaes sociais, polticas, culturais e

    econmicas que so a base das relaes sociais.

    Nas diversas culturas, as relaes sociais e as organizaes se diferenciam de acordo

    com a diviso social do trabalho e na lgica da cultura patriarcal. Recorremos a categoria de

    gnero, para uma melhor compreenso das formas de relaes e de poder. Gnero aqui

    entendido segundo Jalil, (2009, p. 10):

    Como um conjunto de normas, valores, costumes e prticas socialmente construdas e

    que atravs das quais a diferena biolgica entre homens e mulheres culturalmente

    significada, gerando hierarquia e relaes de poder.

    importante entender que, se cultura surge de todo um modo de vida, de esperar

    que a cultura camponesa varie segundo diferenas ecolgicas, alm das sociais; diferenas no

    ambiente fsico implicam diferenas na cultura material e estimulam tambm diferentes atitudes

    como afirma Burke (2010, p.59).

    Percebe-se que os movimentos organizados das mulheres a partir de suas prticas,

    reafirmam a luta de transformao da sociedade como instrumento poltico, reafirmando s

    mulheres o papel de protagonistas do enfrentamento ao modelo capitalista e patriarcal.

    Podemos dizer que o futuro depende do reconhecimento da importncia das

    mulheres e a necessidade de se consolidar o papel das mulheres para o desenvolvimento.

    Prahalad apud Freitas eti alli (2010, p.786) afirma:

    Porque as mulheres podem organizar suas vidas muito mais rpido. As famlias

    permanecem juntas pela mulher. Elas se preocupam com suas crianas, e querem que a

    vida delas seja mudada. Milhares de mulheres na ndia, por exemplo, esto sendo

    motivadas, e esto comeando a poupar e ter algum dinheiro. [...] Atualmente pessoas

    pobres devem ser empreendedoras para sobreviver e mulheres so boas nisso. So suas

    regras de sobrevivncia. Se voc escutar essas pessoas, voc vai aprender que elas no

    so estpidas. Elas so to espertas. Elas pensam a vida em algumas formas profundas.

    [...] E elas no esto pedindo favores. Esto pedindo uma chance. E uma chance tudo

    que podemos dar. D a elas a chance, e elas sero empreendedoras.

    Ao viabilizar para as mulheres igualdade de oportunidades, fortalece-las e ampliar a

    participao na economia, a proposio acima coloca a mulher como empreendedora.

    Segundo Butto apud Mouro (2010, p. 5):

    Os movimentos sociais de mulheres e sua auto organizao foram capazes de

    transformar relaes na famlia, garantir sua participao em organizaes mista e

    impulsionar o Estado a elaborar polticas pblicas voltadas para a promoo da sua

    autonomia econmica.

    A participao das mulheres fica evidenciada no texto acima e sabe-se que as

    organizaes tm proporcionado novas reflexes sobre sua prpria situao e aquilo que se

    passa a sua volta. Confirmando Beauvoir (1949) que afirma: ningum nasce mulher: torna-se

    mulher.

  • Elizabete Matia de Siqueira

    ~ 20 ~

    4. Consideraes finais

    Os estudos culturais em torno das mulheres muitas vezes esto ligados diretamente a

    movimentos e prticas no sentido de redimensionar seu papel no espao em que vive. Nada mais

    do que assegurar espaos de poder.

    Ao se fazer a historicizao de movimento de mulheres assentadas no Brasil a partir

    de Sculo XXI, um dos marcos de dilogo e de construo coletiva para reverter as lgicas

    desiguais o ano de 2003, que, com a criao da Secretaria de Polticas para Mulheres, refora o

    princpio democrtico de possibilitar s mulheres a condio de partcipe em aes que as

    mulheres exeram liderana e protagonismo, aprofundando as polticas de igualdade de gnero.

    Ao se referir sobre o movimento das mulheres assentadas na regio Amaznica sob

    o olhar da mdia, constatou-se que a mulher assentada ainda invisvel no cenrio amaznico.

    Percebeu-se que no movimento resultante dos assentamentos em decorrncia da

    construo das usinas, o discurso miditico imprimiu, de certa maneira, as violaes dos direitos

    humanos relacionados as minorias e em sua maioria mulheres.

    Constatamos nos jornais online algumas notcias sobre mulheres, mas no

    encontrou-se notas especficas sobre as mulheres assentadas. E as notas encontradas nada mais

    eram que reproduo das informaes dos rgos oficiais.

    O legado de sustentabilidade das mulheres assentadas e seu movimento de

    participao so reflexos das mudanas estruturais, polticas e culturais, resultante da

    democratizao do pas, a partir da Constituio Cidad, de 1988.

    A questo colocada sobre a mdia, embora ela ainda no tenha dado a devida

    visibilidade ao papel da mulher assentada, inegvel que a participao das mulheres nas

    organizaes proporcionou novas reflexes sobre a prpria situao e aquilo que passa a sua

    volta.

    Em suma, ao tratar do tema das mulheres assentadas e seus direitos e veicul-lo

    mdia vai incentivar outras mulheres a produzirem escritas que falam e relatam a condio de

    mulher reassentada.

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  • Elizabete Matia de Siqueira

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    RONDONIA Dinmica. Aes do Incra apoiam mulheres do campo em Rondnia.

    Publicada em 07 maro, 2012, 12h32min. Jeanne Machado, Jornalista Responsvel. Disponvel

    em: . Acesso em: 26 jan. 2014.

    SAE. Santo Antnio Energia. Disponvel em: . Acesso em

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    VIA Campesina. A voz do campons internacional. Pagina inicial da organizao. Detalhes

    publicados em quarta feira, 09 fevereiro, 2011 14:08. Disponvel em:

    . Acesso em: 27 dez. 2013.

    VICENTE, Ana. Os Poderes das Mulheres, Os Poderes dos Homens (1998). Disponvel em:

    Acesso em: 28 ago. 2014.

    http://www.rondoniadinamica.com/arquivo/acoes-do-incra-apoiam-mulheres-do-campo-em-rondonia,33260.shtmlhttp://www.rondoniadinamica.com/arquivo/acoes-do-incra-apoiam-mulheres-do-campo-em-rondonia,33260.shtmlhttp://www.santoantonioenergia..com.br/http://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&link_id=1040:estudos-sobre-as-mulheres&task=viewlinkhttp://www.edtl.com.pt/index.php?option=com_mtree&link_id=1040:estudos-sobre-as-mulheres&task=viewlink

  • Lilian Maria Moser, Jos Willians Simplicio da Silva

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    A festa do divino esprito santo em Pimenteiras e a cobertura das

    novas mdias digitais: o caso dos blogs de Rondnia

    Lilian Maria Moser (UNIR)

    Jos Willians Simplicio da Silva (UNIR)

    1. Introduo

    O captulo objetiva problematizar algumas nuances da festa do Divino Esprito

    Santo sob o prisma dos Estudos Culturais. Cabe ponderar, contudo, que se trata aqui duma

    incurso ainda preliminar, na qual buscamos discutir, levantar questes sobre a cobertura/e/ou

    informaes produzidas e veiculadas pelas mdias digitais (blogs). Ao analisar as mdias e esta

    em particular, pelo vis dos estudos culturais, verifica-se um importante entendimento da

    relao entre cultura e cibercultura.

    Segundo consta na bibliografia que versa a respeito da temtica1, a referida festa

    teve incio no Sculo XIX, para atender aos anseios religiosos das populaes locais, com a

    finalidade de manter acesa a chama da f dos integrantes daquelas comunidades que,

    possivelmente, o fizeram para dar vazo aos anseios da espiritualidade. Com passar do tempo, e

    dinamicidade comum s manifestaes culturais populares, essa ocorrncia histrico-religiosa

    transformou-se numa das mais expressivas referncias de manifestao do chamado patrimnio

    imaterial do Estado de Rondnia.

    O intuito da presente discusso mostrar como esse evento tem sido apresentado

    sob a tica miditica, visto que esse bem cultural configura-se em um smbolo sagrado de

    devoo pelos moradores das comunidades quilombolas de Pimenteiras e circunvizinhanas; e

    em concomitncia, investigar a maneira segundo a qual as festividades de cunho espiritual,

    rememoram, constroem e do sentidos outros s sociabilidades vivenciadas no passado e

    ritualizadas no presente.

    Entendemos assim, que a simbologia apresentada e representada quando s pessoas

    realizam cultos religiosos diversos, como celebraes, novenas, romarias, fitas-votivas,

    promessas, dentre outras demonstraes de devoes, no so ricas apenas pelo ritual que

    encerram; mas tambm pela historicidade que expressam, nos motivos de ser que englobam, no

    componente de registro e informaes a respeito do passado que esses atos apresentam, mesmo

    depois de tantas transformaes operadas em seus sentidos e formas de apresentao, cuja

    prpria existncia e continuidade so o exemplo mais notvel de que sua polissemia abarca

    experincias vividas e vivncias contemporneas.

    As manifestaes da simbologia do evento despertam o interesse dos meios

    miditicos em produzir e veicular informaes das pessoas envolvidas no culto religioso ao

    1So poucos os trabalhos at agora publicados concernentes a Festa do Divino Esprito Santo do Guapor, nas

    fronteiras entre Brasil e Bolvia. Para se ter acesso a discusses, sobretudo no que diz respeito a constituio desse

    bem cultural na regio, consultar HARRISON (2008).

  • A festa do divino esprito santo em Pimenteiras e a cobertura das novas mdias digitais: o caso dos blogs de Rondnia

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    Divino Esprito Santo. Isto significa dizer que se pretende com esse trabalho, olhar para a Festa

    do Divino a partir de uma viso sistmica, e no v-la, apenas, como Patrimnio cultural

    imaterial ou, simplesmente, como smbolo de poder poltico administrativo e espiritual da Igreja

    Catlica. Mas, sobretudo, verificar como essas e outras questes so galgadas sob a perspectiva

    das mdias digitais.

    Feitas estas ponderaes, vlido destacar que no se deve descuidar do fato dessas

    serem manifestaes culturais de carter religioso e, como tal, compe parte das expresses da

    cultura popular realizadas pelos habitantes das comunidades ribeirinhas tradicionais de

    Pimenteiras. Reiterar essa questo importante para no se descuidar da importncia e

    necessidade de procurar compreender as representaes do povo sobre o Divino, como um ser

    capaz de curar suas doenas do corpo e do esprito. Qual seja, existem eventos ali de outra

    ordem, que se rementem a dimenses que o pesquisador nem sempre consegue adentrar em sua

    investigao.

    Ainda assim, discusses nesse campo das religiosidades, das crenas so

    fundamentais no sentido de compreender no somente como se estruturam as relaes sociais, as

    negociaes, os conflitos, a construo de identidades dentro da chamada cibercultura.

    Ao adentrar em discusses como essas, polissmicas que so, em todos os sentidos

    possveis, um arsenal de questes relevantes posto em cena, pois oportuniza ao leitor um

    conhecimento histrico sobre as dimenses de poder exercidas pelas mdias, que vo alm do

    mbito religioso, comumente, privilegiado pela histria, descaracterizando outras variveis

    sobre o evento.

    Parte das reflexes aqui desenvolvidas ancorou-se na bibliografia e historiografia

    locais as quais conforme j ponderamos so ainda bastante sucintas, que abordam a histria da

    Festa do Divino, e por referencial terico, tomamos, sobretudo, as discusses desencadeadas

    por: Bruno Nogueira, Por uma funo jornalstica nos blogs de MP3- Download e crtica

    ressinificados na cadeia produtiva da msica (2011); Andr Lemos, Cibercultura: alguns

    pontos para entender a cultura de nossa poca (2011) Mircea Eliade, O sagrado e o profano: A

    essncia das religies (1992); Zygmunt Bauman, Modernidade Lquida (2007); e Pierre

    Bourdieu, Cultura e Poltica (1980).

    O texto encontra-se organizado em trs sees, alm desta. Na prxima seo,

    busca-se conhecer a relao entre a festa do Divino Esprito Santo e a imprensa digital,

    enfatizando tambm o importante papel desencadeado pela internet na cobertura da festa. A

    terceira seo, dedica-se anlise de textos produzidos e as informaes noticiadas pelos blogs

    locais sobre a festa do Divino, demonstrando as lacunas nos textos publicados. Na ltima sesso

    sero discutidas as condies de produes miditicas, despertando o leitor para observar como

    so mediadas as informaes pelas mdias digitais.

    2. A representao da festa do divino pela mdia

    De acordo com as oralidades dos devotos2 do Divino Esprito Santo, devido ao

    grande nmero de pessoas que participam do evento ter aumentado de forma significativa a cada

    ano, esse fato fez a imprensa despertar interesse na festa. Da festa do Divino participam o clero,

    2Relatos dos registros orais extrados do Presidente da Irmandade do Divino Esprito Santo apresentado pela

    pesquisadora Liana Ferraz Bedr Jardim (2011), na sua dissertao de mestrado, cujo tema A fala da mulher:

    identificao dos aspectos lingusticos e o papel da Mulher quilombola do Vale do Guapor atravs de sua fala.

  • Lilian Maria Moser, Jos Willians Simplicio da Silva

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    fiis, romeiros, turistas, mdia, curiosos e polticos3. Ela constitui-se um evento cultural de

    mistura de cores, crenas e ritos. No esquecendo que dentro desse espao sagrado, o profano4

    se mostra cotidianamente em diversos momentos dos festejos.

    Nesse entendimento, a mdia digital tem dado importncia ao evento atuando como

    um dos veculos de comunicao, divulgao e representao da Festa do Divino Esprito Santo,

    uma das festas religiosas locais mais expressivas da cultura local.

    A imprensa digital tem mostrado nas suas produes, o histrico da festa do Divino,

    por meio de textos e imagens fotogrficas, inclusive aes que motivam as pessoas a realizarem

    e fazerem parte do acontecimento. Dessa forma, percebe-se o papel importante que a internet

    tem desempenhado para pulverizao do evento junta sociedade.

    Aqui, buscaremos conhecer a relao entre a Festa do Divino e a imprensa, a fim de

    entender melhor as informaes vulgarizadas pela mdia digital (blog)5 sobre o evento para os

    internautas.

    Conforme alguns blogs pesquisados, usa-se a hiptese de que a mdia tem

    influenciado bastante na festa do Divino Esprito Santo, obviamente no podemos menosprezar

    o relevante papel que tem a divulgao atravs da comunicao oral. Nesse rol de discusso,

    relevante destacar que as informaes passadas em conversas entre pessoas, representa um meio

    importante de veiculao do conhecimento sobre a festa acima mencionada. Principalmente nas

    comunidades onde a informao miditica ainda no construiu espaos.

    A cobertura da Festa do Divino no vale do Guapor tem crescido bastante na

    internet, por isso esta parte do trabalho focou a anlise no blog G1, este que faz parte de um dos

    maiores canais de comunicao do pas. Foi necessrio fazer um recorte temporal, devido s

    diversas matrias publicadas sobre a festa. Optou-se pela matria do dia 03 de junho de 2012,

    cuja edio traz o ttulo: Festa do Divino de Rondnia pode ser registrada como patrimnio da

    Unio

    3 Na coletividade da vida religiosa vive-se a individualidade, quer dizer, as pessoas manifestam culturalmente os

    ritos religiosos e crenas no que acreditam ser divino, mas dentro dessa dinmica tem necessidades especficas.

    Como tambm no so iguais para todos os motivos de estarem presentes no evento. Para aprofundar-se na

    discusso, consultar mile Durkheim (2000), no livro As formas elementares da vida religiosa. 4 De acordo com Mircea Eliade, em o Sagrado e Profano (1992), durante a vida terrena o homem vive ao mesmo

    tempo uma vida sagrada e profana. No caso da festa do Divino Espirito Santo os momentos profanos podem ser

    evidenciados quando nos intervalos das manifestaes religiosas (ritos e crenas), acontecem os festejos sociais

    (bailes, danas e consumo de bebidas alcolicas). Seguindo essa linha de raciocnio, fator importante dessas

    prticas religiosas que acontece no espao sagrado em referncia o Divino, conforme acentua Mircea Eliade (1992), a noo de tempo, pois a cada manifestao religiosa que acontece ao longo das procisses fluviais e nas

    casas dos quilombolas, ao longo das margens do Guapor, significam bem mais que apenas uma manifestao, um

    acontecimento de cunho sagrado. Seus ritos, as sociabilidades ali vivenciadas, constituem-se tambm em momentos

    nos quais o chamado mundo profano e seus anseios marcam presena. 5Baseado em Bruno Nogueira (2011), os Blogs (dirio online), foram criados para produo de informaes

    textuais. Hoje em dia esse tipo de ferramenta da internet abrange outros tipos de categorias, como imagens, msicas

    e vdeos. Ainda de acordo com o pesquisador acima, essa plataforma, facilita o acesso a notcias diversas, e dispe

    de contedo organizado em forma cronolgica atravs de categorias e tags.

  • A festa do divino esprito santo em Pimenteiras e a cobertura das novas mdias digitais: o caso dos blogs de Rondnia

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    Figura 1 - imagens da edio de 03 de junho de 2012 do G1 dando destaque

    festa do Divino Esprito Santo como patrimnio da cultura imaterial da Unio

    Fonte: http://g1.globo.com/ro. Acesso em: 03 Fev. 2014.

    Analisando a ntegra dessa matria veiculada pelo blog do G1, percebe-se que o

    Divino ganhou destaque na mdia digital nacional. Ao longo do texto produzido pelo Blog, com

    o adensamento das discusses, o sentido mercadolgico, ou a perspectiva da comercializao

    da cultura se torna mais evidente, na medida em que a festa sacra do Divino incorpora e

    incorporada aos efeitos da chamada Globalizao, demonstrando, portanto, uma identidade local

    que ao mesmo tempo em que dita fragilizada e ameaada pelos valores materialistas do

    capitalismo, nos quais a noo de patrimnio cultural feita, em larga medida, para atender e

    impulsionar a recente indstria do turismo religioso; esta tambm se utiliza de linguagens e

    estratgias da globalizao para divulgar-se, para ser conhecida, para se dizer e fazer-se

    patrimnio nacional.

    Logo, destaca-se que o blog enquanto mdia digital pode ser considerada como uma

    valiosa fonte histrica de pesquisa para o estudo em discusso. Em consonncia com Bruno

    Nogueira (2011), afirmamos que a produo de um blog ou qualquer outro tipo de mdia, tem

    um sentido de ser criado e um pblico a ser atingido. Assim sendo, a sua sobrevivncia depende

    daqueles que consumirem6 a informao veiculada. Nesse entendimento, salienta Adorno (2002)

    que a tica dos meios de comunicao de massa com dados estatsticos audincia do

    pblico, e no com a qualidade do produto ofertado.

    Dessa forma, so as informaes levadas pelas mdias s massas que tm o poder de

    influenciar a opinio pblica, ou seja, ela tem o poder de seduzir as pessoas para criar verdades

    entendidas ou apresentadas como absolutas e encobrir outras possibilidades. Entretanto, mesmo

    a mdia no sendo na sua ampla acepo terminolgica democrtica, no se pode considerar a

    sociedade como sendo simplria vtima das mdias (existem pessoas que sabem absorver e

    selecionar as informaes divulgadas). No caso da mdia digital (blogs), geralmente existe a

    possibilidade de crtica e interao com a informao veiculada, pois o internauta convidado a

    deixar suas impresses sobre a informao divulgada, ou seja, o leitor visto como ser ativo que

    6A respeito da discusso sobre indstria cultural, um interessante trabalho desencadeado consultar Adorno (2002),

    na obra Indstria Cultural e Sociedade.

    http://g1.globo.com/ro

  • Lilian Maria Moser, Jos Willians Simplicio da Silva

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    recebe, l e produz informao. Todavia, quando considerada a proporo das pessoas que

    acessam essas mdias, ainda so poucos os que se arriscam a fazer ponderaes e comentrios

    relevantes produo veiculada pelos blogs.

    Por isso, faz-se necessrio verificar sistematicamente essas ocorrncias, pois sempre

    existem interesses de quem pulveriza essas matrias para sociedade. importante ressaltar que

    quando as mdias criam e legitimam verdades, elas fazem isso com o aval dos leitores, ou seja,

    as mdias vulgarizam os ditames para sociedade (relaes sociais), porm quem legitima e d

    sentido as verdades o povo. Assim sendo, cabe aos meios miditicos apoderar-se desse leque

    de possibilidades, para conquistar o seu espao nas manifestaes culturais.

    3. Festa do divino na mdia - o caso dos blogs Rondnia

    A festa do Divino Esprito Santo realizada no vale do Guapor pelos povos

    quilombolas mobiliza pessoas de vrias partes de Rondnia, estados circunvizinhos e da Bolvia.

    O evento consiste em uma manifestao cultural de carter religioso, feita pelos populares e

    devotos que fazem do Divino um smbolo de devoo popular.

    Historicamente, a Festa do Divino est associada s tradies religiosas portuguesas

    do Sculo XIV. Nesse prisma, a festa representa uma ocorrncia importante para a histria dos

    povos quilombolas da Amaznia, pois na sua concepo, essas manifestaes culturais so

    feitas para demonstrar atos de sociabilidade religiosa. importante destacar que a festa tem

    atrado tambm os olhares dos rondonienses.

    O fato da mdia vulgarizar a festa do Divino Esprito Santo para sociedade, a partir

    de matrias veiculadas nos blogs locais, dentre outros canais de informao, tm demonstrado o

    quanto a imprensa pode ser uma ferramenta utilizada em tempos de era digital, em favor de

    um evento cultural importantssimo para a representao da cultura religiosa local.

    relevante informar que o culto religioso ao Divino Esprito Santo, no mantm

    nenhum tipo de mdia digital para difundir o evento. Conforme indicam os relatos orais das

    pessoas vinculadas s comunidades que realizam os ritos veem se repetindo de gerao a

    gerao, pois os pais, num esforo de manter as tradies culturais da comunidade, ensinam os

    filhos a crena no Divino e repassam o compromisso de manter as festividades religiosas

    consuetudinrias. Essas atitudes revelam que embora faam parte de um mundo globalizado,

    possivelmente o desejo e luta dessas populaes seja o de manter a tradio dos festejos, sem a

    preocupao de expanso ou comercializao da cultura, ou seja, o interesse de preservar a

    cultura imaterial da tradio local.

    A partir de interesses exgenos, a mdia local passou a dar espao para festa do

    Divino Esprito Santo, produzindo informaes sobre essa manifestao religiosa da cultura

    local. No entanto, sabemos que ao confeccionar uma matria para ser divulgada pela imprensa, a

    mesma vem sempre acompanhada de uma inteno, mesmo assim essas matrias afirmam o

    espao dado festa pela mdia. Por essa tica, salientamos que a informao sempre fomenta

    algum tipo de mobilizao.

    Um dos primeiros blogs a divulgar e festa do Divino Esprito Santo, foi o blog

    Divino do Guapor. As primeiras matrias noticiadas cronologicamente pelo blog so datadas de

    2008. A sua pgina na internet pode ser acessada no seguinte endereo eletrnico:

    http://divinodoguapore.blogspot.com.br/. A importncia deste webblog reside no fato de

    fornecer ao internauta, devoto ou no do Divino Esprito Santo, a oportunidade de estreitar uma

    relao de proximidade. Essa relao encurta-se quando, por exemplo, um fiel do Divino

    http://divinodoguapore.blogspot.com.br/

  • A festa do divino esprito santo em Pimenteiras e a cobertura das novas mdias digitais: o caso dos blogs de Rondnia

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    rememora no ciberespao aquilo que vivenciou durante a festa do Divino Esprito Santo, por

    meio da apresentao de imagens, reportagens, vdeos e produo textual. Tendo em vista que a

    cada ano so arquivadas novas fotos e novas matrias que revelam para o devoto os momentos

    religiosos dos festejos.

    Figura 2 - imagens da edio do dia 30 de maio de 2013 do Divino do

    Guapor destacando os momentos sacros ao Divino Esprito Santo

    Fonte: http://divinodoguapore.blogspot.com.br. Acesso em: 03 Fev. 2014.

    Segundo Peter Burke (1992), a partir dos historiadores dos Annales, a histria trouxe

    em seu arcabouo novos mtodos, novas fontes, novas abordagens e novos temas. Dessa forma,

    ao acessar as produes dos blogs locais, foi importante para aprofundar os conhecimentos

    sobre esse fenmeno religioso. Tendo em vista que o acesso a outros tipos de fontes histricas,

    como por exemplo, materiais impressos so de difcil acesso.

    Entretanto, ao problematizar algumas matrias noticiadas pelos blogs locais com o

    sentido de faz-la falar, constatamos que alguns blogs, como por exemplo, o Portal do Divino,

    enaltecem a figura da Igreja Catlica, quando na verdade historicizando esse fenmeno

    religioso, evidenciamos que a festa do Divino teve incio com os povos quilombolas do

    Guapor.

    Importa tambm fazer um contraponto sobre essa questo dos blogs enaltecerem a

    Igreja Catlica, porque essa instituio religiosa foi durante muito tempo parte combatente do

    Catolicismo Popular. Entende-se por religiosidade popular7, uma mistura cultural entre os

    7 sabido que o processo de romanizao da igreja catlica no Brasil foi bastante moroso, o que acabou por dar

    origem a uma espcie de catolicismo que em larga medida, incorporava elementos da cultura que se desenvolvia

    naquela espacialidade e que eram alheios as orientaes de Roma. Na busca da Igreja Catlica, para diferenciar

    essas manifestaes do catolicismo dito oficial ou legtimo, criou-se a expresso catolicismo popular, a qual,

    no por acaso, revela uma relao de alteridade, uma forma conceber, ver e dizer o outro bastante significativa. Ao

    tratar de religiosidade popular no intencionamos aqui, reproduzir essa bifurcao baseada na dicotomia falso

    versus verdadeiro Alis, esta uma questo que buscaremos problematizar no decorrer da pesquisa, no sentido de

    revelar as relaes de poder que ela incorpora Contudo, por este se constituir numa espcie de artigo sntese do

    tema, utilizaremos as nomenclaturas que geralmente so mais correntes na discusso da temtica.

    http://divinodoguapore.blogspot.com.br/

  • Lilian Maria Moser, Jos Willians Simplicio da Silva

    ~ 29 ~

    ritos da Igreja com as prticas de sentido indgena e as manifestaes afro-brasileiras. Isso

    remete noo de que a religiosidade popular um emaranhado de mltiplas facetas

    expressadas culturalmente de vrias formas.

    importante esclarecer que a Igreja Catlica possui direcionamentos bem definidos,

    inclusive em conclios, no que concerne aos rituais a serem observados na religio, se

    configurando como um dos papis da instituio, zelar pelas premissas do chamado catolicismo

    romano.

    Dessa maneira, foi, e ainda , prtica corrente na instituio buscar obter o controle

    dos seus fiis, ou antes, orient-los, no sentido de observarem e obedecerem s orientaes de

    Roma.

    Notamos ainda que as matrias veiculadas pelo portal do divino tem dado destaque

    s autoridades polticas e religiosas, marginalizando os nomes das pessoas comuns que se

    esforam durante o ano inteiro para organizar o evento. De certo ngulo, essa ocorrncia

    descaracteriza o papel dos atores sociais engajados na construo da festa. Destarte, no

    podemos marginalizar vozes que foram e so importantes para a construo dos festejos ao

    senhor Divino, ou seja, na perspectiva da histria cultural, a cultura das pessoas comuns deve

    ser trazida para o foco do debate no sentido de valorizar essas expresses culturais.

    Verificamos tambm que alguns blogs pesquisados divergem em relao ao tempo

    de durao da festa do Divino Esprito Santo, uns informam que o evento dura quarenta dias, j

    outros falam em cinquenta. Para o internauta, devoto ou no, fica a impreciso do recorte

    temporal da festa.

    Visualizamos ainda que alguns blogs parecem fomentar essas manifestaes como

    objeto de explorao para o turismo, na chamada comercializao da cultura. Atitudes como

    essas acabam por valorizar mais a coisa em detrimento dos sujeitos que a constroem e a do

    sentido. Em palavras outras, valoriza-se o potencial turstico de determinado bem pelo retorno

    econmico que pode trazer, em detrimento do que ele significa efetivamente para os homens e

    mulheres que os ritualizam, e para sua comunidade de referncia. Este certamente efeito da

    Globalizao to lembrada por Stuart Hall, j que muitas pessoas veem a Festa como

    possibilidade de auferir ganhos econmicos, com a venda de produtos que vo de artigos

    religiosos a passeios tursticos.

    Quando a cultura tornada objeto, ressalta Meneses (2006), visando atender

    basicamente as demandas de ordem econmica, o processo de fruio, to necessrio prtica

    do turismo quanto interpretao de culturas, acaba no se efetivando e as manifestaes

    culturais se veem reduzidas nessa lgica de mercado, a condio de mercadoria.

    Assim sendo, compreendemos que estes tipos de informaes veiculadas pela mdia

    digital local, podem ser dissecadas pelo internauta, com a finalidade de contribuir com as

    produes existentes sobre o evento.

    4. A informao mediada pela mdia digital

    Segundo Pierre Bourdieu (1980), o texto miditico seja no jornal, revista ou rdio,

    possui vrias vertentes ideolgicas sobre a melhor forma de influenciar o seu pblico com o

    produto ofertado. Vale salientar tambm que na atual conjuntura miditica a internet tm se

    destacado cada vez mais entre os meios de comunicao. Muitos desses canais de informao

    so empresas e sobrevivem da publicao de notcias, por meio da tcnica de convencimento.

  • A festa do divino esprito santo em Pimenteiras e a cobertura das novas mdias digitais: o caso dos blogs de Rondnia

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    Por isso, interessante identificar a linha de trabalho e os responsveis pela edio da matria

    veiculada pela mdia.

    Ainda de acordo com Bourdieu (1980), e trazendo para a perspectiva da discusso,

    faz-se necessrio entender como so produzidas as matrias sobre a festa do Divino Esprito

    Santo pulverizada na mdia. Este conhecimento importante, pois ajuda a compreender as

    condies da produo e do produto. Para Pierre Bourdieu, a veiculao da informao pela

    imprensa merece anlise profcua, numa expresso do autor preciso entrar na cozinha da

    produo.

    Por meio da simulao ou interao nas mdias digitais, o internauta tem a

    oportunidade online de vivenciar aquilo que no foi possvel fisicamente8. Inclusive interagindo

    as produes atravs de fotos e textos contidos nos blogs, que veiculam notcias sobre a festa do

    Divino Esprito Santo. Dessa maneira, a Globalizao cria novos tipos de sociabilidades a partir

    da cibercultura9. Assim, a cibercultura encurta espaos que antes eram distantes, permitindo a

    ampliao das formas de comunicao e ao do homem sobre o mundo por meio das mdias

    digitais.

    Nessa linha de pensamento, as pessoas que buscam se informar sobre as

    manifestaes expresses culturais locais apoderando-se da cibercultura. Conforme Andr

    Lemos, afirmamos a cibercultura representa a cultura contempornea sendo consequncia

    direta da evoluo da cultura tcnica moderna (LEMOS, 2011, p. 3). Ainda seguindo essa tica

    de discusso, a mdia oportuniza ao leitor internauta conhecimento sobre fatos que ele no

    testemunhou, ou se testemunhou, sente a necessidade de rememorar a ocorrncia.

    Em se tratando da mediao dos meios de comunicao, preciso atentar o que

    noticiado, j que no se pode estar em todo lugar ao mesmo tempo nem ter a exata dimenso da

    diversidade de pontos de vistas dos sujeitos que constroem e conferem sentido a tal

    manifestao. No caso da festa do Divino Esprito Santo, isto quer dizer que no se pode

    testemunhar fielmente o que aconteceu durante os dias de festejos. Com isso, a mdia em muitas

    ocasies, se encarrega de filtrar leituras, pontos de vistas e divulgar aquilo que ela acha

    conveniente ou pertinente, uma vez que a partir do poder da tcnica de convencimento, a

    indstria cultural cria condies favorveis circulao da informao.

    Quando os leitores internautas acessam os webblogs que tratam da festa do Divino

    Esprito Santo, como j mencionado acima, eles podem interagir com a informao divulgada

    atravs da postagem de comentrios. Com esse raciocnio Bruno Nogueira afirma que a partir

    dos blogs, uma parte do pblico que at ento era apenas consumidor passivo, passa a fazer suas

    prprias crticas e resenhas de produtos em dirios pessoais (NOGUEIRA, 2011, p. 141). Isso

    interessante porque no caso dos jornais impressos, a construo de matrias veiculadas no

    possvel. Essa forma de produo Pierre Bourdieu (1980) chama de produto acabado: O

    produto acabado, a opus operatum, esconde o modus operandi (BOURDIEU, 1980, p. 1). Ou

    seja, um produto pronto que no fornece espao para construo ou desconstruo da

    8Vale salientar, que embora seja possvel aproximar-se do Divino atravs das mdias digitais, o contato com o

    Divino materializado em forma de uma pomba no o mesmo. A relao de mentalidades. Para aprofundar-se na

    discusso de formas de produo e recepo, consultar o estudioso Roger Chartier apud Carvalho (2005), no

    trabalho o conceito de representaes coletivas segundo Roger Chartier. 9Baseado no trabalho de Andr Lemos Cibercultura: alguns pontos para entender a cultura de nossa poca (2011),

    cibercultura significa novas tecnologias de informao e comunicao. Ainda de acordo com o autor acima a

    cibercultura formada por novas prticas comunicacionais no ciberespao, como por exemplo, e-mails, weblogs,

    mdias digitais.

  • Lilian Maria Moser, Jos Willians Simplicio da Silva

    ~ 31 ~

    informao mediada. Logo desconsiderando assim a opinio das pessoas, vozes essas, que tm

    relevncia para construir uma matria veiculada pela imprensa. Mesmo que saibamos que, nem

    sempre quem escreve est disposto a ouvir o que as pessoas tm a falar.

    Considerando a importncia de refletir o tema, recorremos aos estudos de Adorno

    (2002), para quem nem todas as pessoas conseguem fazer crtica cultural sobre o que est sendo

    informado pela mdia. Pois, a tcnica usada para noticiar um mecanismo de seduo poderoso

    que nem sempre possvel dissecar o que est escrito. Vale destacar, que esse pblico

    principalmente aquele que a mdia busca atingir, uma vez que os questionamentos so

    insignificantes.

    Nessa conjuntura de discusses, balizados em alguns estudiosos, afirmamos que as

    matrias no significam a totalidade do que se passa dentro e fora da Festa do Divino Esprito

    Santo, muitas informaes possivelmente so marginalizadas, quer dizer, muitas ocorrncias so

    silenciadas em detrimento de outras que a mdia considera importante.

    Recorrendo mais uma vez a Pierre Bourdieu (1980), compreendemos que a anlise

    da mdia deve ser feita com um olhar sistmico, que possibilite ao interessado no assunto

    verificar outras informaes sobre a ocorrncia noticiada. O autor ainda lembra que o alcance

    dos meios de comunicao construir influncia a mdio e longo prazo, visto que o seu

    interesse conquistar um pblico assduo e alienado (ser inativo) ao que perpassa frente.

    Para Bourdieu (1980), as relaes de comunicao so sempre relaes que emanam

    poder. Em dilogo com a perspectiva exposta por Bourdieu, o terico Carvalho apud Roger

    Chartier (2005) nos mostra que os sistemas simblicos tm sempre a funo poltica de criar e

    legitimar dominaes sociais de uma classe sobre as outras. Vale salientar, que existem formas

    de violncia simblica nos mais diversos campos da vida social, inclusive, no que concerne ao

    plano intelectual.

    Mediante as questes elencadas ora no debate, ao povo at certo ponto, cabe

    participar da produo das informaes, visto que o leitor10 tem a oportunidade dentro do

    ciberespao de responder as mdias, por meio da criao de textos nos prprios blogs. Portanto,

    a mdia torna-se um espao militante, onde muitas vezes a opinio pessoal supera a informao

    noticiada/editada pelo blog. Pode-se inclusive criar blogs onde a informao sobre as atividades

    de manifestao cultural feita pela pessoa comum, ou seja, o pblico passa a produzir e

    consumir o seu prprio contedo. Com isso, emprega-se um capital cultural que vem da

    sociedade. Nessa concepo, o leitor virtual no um ser esttico e sim um ser ativo. Entretanto,

    Maria Regina Baracuhy (2010), lembra que a mdia uma das maiores produtoras de

    identidades para os atores sociais.

    Corroborando com o debate sobre a construo de identidades o polons Zymunt

    Bauman (2007) afirma que a identidade na condio de vida contempornea liquida, quer

    dizer, ela vive em constante transformao. Mediante as questes levantadas pelo estudioso

    observamos que a lgica vivida na chamada modernidade tardia a de que a identidade se

    caracteriza por ser mvel e transitria. Nessa direo, consideramos que o efeito da chamada

    Globalizao devastador, alm de banalizar as relaes humanas, constri relaes de

    10 Reforamos ideia de que no somente as vozes sagradas podem se apoderar da cibercultura para deixar suas

    impresses sobre as informaes veiculadas pela mdia. Nessa lacuna aberta as vozes profanas certamente podem

    expressar sua opinio, mesmo em se tratando das ocorrncias de cunho sagradas. Acrescenta Pelisoli (2003, p.4)

    apud Bruno Nogueira (2011) que no hiperespao, ele ganhou ferramentas mouse, teclado, canetas pticas, fones

    de ouvido e microfones, uma srie de extenses dos seus sentidos que permitem responder de vrias formas ao que

    ele ouve, v, l, e mesmo toca por que no?.

  • A festa do divino esprito santo em Pimenteiras e a cobertura das novas mdias digitais: o caso dos blogs de Rondnia

    ~ 32 ~

    identidades cada vez mais artificiais, pois em tempos de modernidade, ela dita as regras da vida

    que o indivduo leva socialmente. Para tanto, cria uma indstria de identidades de correntes

    perenes e nessa correnteza veloz da vida moderna, no existe pausa para solidez,

    parafraseando Bauman (2007), ela constitui-se como modernidade liquida.

    5. Consideraes finais

    A festa do Divino Esprito Santo celebrada do vale do Guapor constitui-se com