15
1 O envelope solar como instrumento de regulamentação do direito de acesso ao Sol: estudo de casos na cidade de Campinas SP, Brasil Denis Pérez, Édison Fávero. Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Campinas, Av. Albert Einstein, 951, Caixa Postal 6021, CEP 13083-852, Campinas, SP, Brasil. [email protected] e [email protected] Autor para correspondência: 55 19 32555522. [email protected] Palavras chave: envelope solar, legislação urbanística, insolação, direito ao Sol. Título Resumido: Envelope solar e acesso ao Sol. RESUMO. Este artigo apresenta um estudo que investiga formas de regulamentação de acesso ao Sol nos processos de planejamento urbano e projeto do edifício, e visa propor subsídios para a reformulação e adequação, ou criação de novas legislações. Os envelopes solares, construídos com o auxílio de ferramentas CAD e de outros comandos de insolação, serviram de base para a obtenção de dados para as análises das relações entre os índices urbanísticos com as características físicas dos terrenos, edifícios, vizinhança, densidades, insolação e sombreamento. Assim, foram escolhidos quatro locais na cidade de Campinas SP, para examinar a influência da legislação nos terrenos, edificações e entorno. Os resultados obtidos indicam que, com a aplicação do envelope solar e a introdução do seu conceito nas legislações urbanísticas é possível permitir às edificações a garantia do direito de acesso ao Sol. ABSTRACT. This paper presents a study that investigates forms of regulation of access to the sun in the processes of urban planning and project of the building, and aims at the proposal of subsidies for the reformularization and adequacy, or creation of new legislations. The

O envelope solar como instrumento de regulamentação do ... · solar envelopes constructed with the aid of CAD tools and other commands of ... O conceito de acesso solar pode ser

  • Upload
    vungoc

  • View
    215

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

1

O envelope solar como instrumento de regulamentação do direito de acesso ao Sol:

estudo de casos na cidade de Campinas SP, Brasil

Denis Pérez, Édison Fávero.

Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de

Campinas, Av. Albert Einstein, 951, Caixa Postal 6021, CEP 13083-852, Campinas, SP,

Brasil. [email protected] e [email protected]

Autor para correspondência: 55 19 32555522. [email protected]

Palavras chave: envelope solar, legislação urbanística, insolação, direito ao Sol.

Título Resumido: Envelope solar e acesso ao Sol.

RESUMO.

Este artigo apresenta um estudo que investiga formas de regulamentação de acesso ao

Sol nos processos de planejamento urbano e projeto do edifício, e visa propor subsídios

para a reformulação e adequação, ou criação de novas legislações. Os envelopes solares,

construídos com o auxílio de ferramentas CAD e de outros comandos de insolação,

serviram de base para a obtenção de dados para as análises das relações entre os índices

urbanísticos com as características físicas dos terrenos, edifícios, vizinhança,

densidades, insolação e sombreamento. Assim, foram escolhidos quatro locais na cidade

de Campinas SP, para examinar a influência da legislação nos terrenos, edificações e

entorno. Os resultados obtidos indicam que, com a aplicação do envelope solar e a

introdução do seu conceito nas legislações urbanísticas é possível permitir às

edificações a garantia do direito de acesso ao Sol.

ABSTRACT.

This paper presents a study that investigates forms of regulation of access to the sun in

the processes of urban planning and project of the building, and aims at the proposal of

subsidies for the reformularization and adequacy, or creation of new legislations. The

2

solar envelopes constructed with the aid of CAD tools and other commands of

insolation, had served as basis for the attainment of data and analyses of the relations

between the urbanistic indexes and the physical characteristics of lands, buildings,

neighborhood, densities, insolation and shadowing. Then, were chosen four sites in

Campinas City SP, to examine the influence of the legislation on the lots, buildings and

environment. The results obtained show that the application of solar envelopes and the

introduction of their concepts in the urbanistic legislation will be able to allow the

buildings the guaranty of solar access right.

1. INTRODUÇÃO.

As cidades têm crescido desordenadamente, causando muitos problemas urbanos e

ambientais - sem planejamento e legislação adequada que disciplinem corretamente esse

desenvolvimento. A Arquitetura Bioclimática, junto ao Direito Urbanístico, constitui

mecanismos à disposição para serem usados como garantia de um desenvolvimento

sustentável e de melhor qualidade de vida. “Assegurar que a insolação e a iluminação

natural estejam presentes nas fachadas das edificações e entre elas, proporcionando boas

condições, tanto internas quanto externas; assegurar insolação e luz natural onde elas

são desejáveis, em partes dos edifícios ou em determinadas áreas do seu entorno, são

objetivos a serem cumpridos no planejamento para insolação e iluminação natural”

(ROBBINS, 1986 descrito por ASSIS, 2000).

Com a aprovação do Estatuto da Cidade - Lei Federal 10257/2001, os municípios com

mais de 20000 habitantes e os pertencentes a Regiões Metropolitanas foram obrigados a

elaborar o seu Plano Diretor, instrumento básico da política de desenvolvimento e

expansão urbana. Porém, dos 5561 municípios no país, 1389 têm mais de 20000

habitantes e a maioria, ou seja, 4172, não tem a obrigação de o fazer (IBAM, 2001). As

grandes cidades apresentam um centro consolidado, muito verticalizado e com altas

3

densidades, tendo ao seu redor bairros de características horizontais, os quais sofrem

pressões para o adensamento e mudanças de uso.

O envelope solar forma um volume imaginário sobre o terreno dentro do qual o edifício

deve ficar inserido para não projetar sombras indesejáveis sobre os vizinhos, e permite

acesso ao sol e à iluminação natural. Além da latitude local, o contexto urbano

influencia o tamanho, a forma e a polaridade do envelope solar, importantes para as

questões de conversão de energia solar por meios passivos e ativos, pois implica a

mudança de orientação das maiores superfícies de fachada e cobertura da edificação.

1.1. Acesso ao sol.

A tendência ao adensamento e à verticalização dos grandes centros urbanos acaba por

comprometer o acesso das edificações ao sol e à luz, com sérias conseqüências quanto a

aspectos sanitários e de habitabilidade dos ambientes interiores (ASSIS, 2000). O baixo

aproveitamento da energia solar, em sistemas passivos e ativos, tem resultado na

freqüente necessidade de usar climatização e iluminação artificiais durante todo o ano.

O conceito de acesso solar pode ser definido pela variação da trajetória diária e sazonal

do sol em sua relação com a terra. “Nada é tão certo e consistente como o movimento

do sol através do céu. O que não é certo é se a futura construção em propriedade vizinha

obstruirá o sol” (LECHNER, 1990). É possível projetar para obter o acesso solar com

muita exatidão, se os vizinhos estiverem suficientemente distantes, ou se houver

limitações ao que pode ser construído, e já que a energia solar é uma fonte eterna e

gratuita, torna-se necessário proteger o seu acesso.

1.2. Antecedentes.

Antigas civilizações, como a grega, a romana, outras no continente asiático, e na

América pré-colombiana, tinham o sol como referencial para as suas atividades

religiosas. Conheciam todos os seus movimentos, os diários e os sazonais, e adaptaram

4

os seus abrigos e costumes, projetando as edificações e os seus traçados urbanos em

função destes movimentos, em busca do conforto térmico. Esses povos, para garantir

este conforto, privativo e comum, por meio de acordos entre seus habitantes,

estabeleceram as primeiras legislações de proteção ao acesso solar. Durante séculos as

cidades cresceram sem contemplar os ganhos térmicos que poderiam ser obtidos com o

sol, sem planejamento coerente e sem traçados urbanos adequados, o que gerou, com a

chegada da Revolução Industrial, cidades caóticas. Com a publicação da Carta de

Atenas, em 1933, o planejamento urbano passa a tratar novamente as questões relativas

à insolação nos edifícios e com a crise do petróleo em 1973, houve a tentativa de

conscientizar as pessoas para a arquitetura “bioclimática”, e agora, a “sustentabilidade”

vem sendo utilizada como suporte para que questões como a insolação, venham a ser

consideradas nas edificações e nos espaços urbanos, para melhor aproveitar a energia

solar e para procurar garantir o direito ao Sol.

A legislação, no Brasil, pouco cuidou da insolação e foi omissa no direito de acesso ao

sol e sempre tratou com descaso o aproveitamento da energia solar no disciplinamento

dos projetos dos edifícios e das cidades. Alguns poucos municípios, e só nos últimos

dois anos, estão aprovando leis para o aproveitamento da energia solar no aquecimento

da água.

1.3. O envelope solar.

O envelope solar é uma alternativa de estratégia para o desenvolvimento de projetos

para edificações que possam receber uma boa insolação e iluminação natural; é definido

como “o maior volume que uma edificação pode ocupar no terreno de forma a permitir

o acesso ao sol e luz natural da vizinhança imediata” (KNOWLES & BERRY, 1980,

apud ASSIS, 2000). O tamanho e a forma dos envelopes solares variam com o tamanho

do local, a orientação e a latitude, o tempo de acesso solar desejado e a quantidade de

5

sombra permitida em ruas e edifícios adjacentes. Knowles (2003) acrescenta que o

envelope solar “é uma forma de assegurar o acesso solar urbano para ambos, a energia e

a qualidade de vida regulando o desenvolvimento dentro de limites imaginários

derivados da trajetória aparente do sol”.

1.4. Geração e aplicações do envelope solar.

O envelope solar pode ser gerado, pelo processo de aplicação dos ângulos de altura

solar nos cantos das divisas do lote ou área, determinando o volume do envelope pelo

cruzamento diagonal dos ângulos sobre o terreno (Knowles e Berry, 1980). Shaviv e

Capeluto (2001) definem o Envelope de Direito Solar - SER – que apresenta as alturas

máximas de edifícios que não violam o direito ao sol de nenhum dos edifícios existentes

durante um período do ano, e o Envelope Solar Coletor - SCE - que apresenta a

superfície mais baixa possível para colocar os coletores solares no edifício em

consideração, de modo que estes não sejam sombreados pelos edifícios vizinhos.

Usando estes envelopes, pode-se determinar a geometria preferida e a orientação das

calçadas, espaços abertos e a configuração dos edifícios, de forma a assegurar sua

exposição ao sol de inverno e conseguir a proteção adequada do sol de verão. No Brasil,

Pereira e Nome Silva (1997) lançam uma “proposta sistemática do uso do envelope

solar em planejamento urbano como forma de controle de ocupação do solo urbano em

função da insolação”. Cruzam informações de um envelope solar com o plano diretor e

outras condicionantes da cidade, para possibilitar a sua aplicação em distintas situações

urbanas. Grazziotin et al. (2002) relacionam o envelope solar e suas aplicações no

planejamento urbano, desenvolvendo técnicas na simulação de ambientes urbanos,

considerando o acesso solar. Foi apresentado o CITYZOOM como um sistema que

integra diversas ferramentas de desempenho, e permite a simulação de diferentes

atributos relacionados a uma cidade existente ou planejada.

6

2. METODOLOGIA:

Este trabalho foi desenvolvido na cidade de Campinas, no estado de São Paulo, com a

finalidade de verificar a influência da legislação de uso e ocupação do solo e legislações

complementares nos terrenos, edificações e entorno. Foi feito um levantamento das leis

e destacadas algumas que ajudaram na consideração de suas relações com as

volumetrias, densidades e outros índices urbanísticos. Foram projetados os envelopes

solares sobre os terrenos escolhidos e suas construções a fim de analisar estas relações.

2.1. Legislação Municipal.

As cidades do Estado de São Paulo, para a insolação e arejamento dos compartimentos

nos edifícios, adotam o Decreto Estadual nº 12342 de 27/09/78 - Código Sanitário do

Estado, outras cidades adotam normas locais para legislar sobre o assunto. Os Códigos

de Obras de São Paulo - Lei 11228/92 e de Campinas - LC 09/03, classificam os

compartimentos em “grupos”, determinando seu dimensionamento, aeração e insolação

por meio de quadros nos quais constam proporções das aberturas. As leis de

parcelamento do solo, federal e municipal, bem como a Lei de Uso e Ocupação do Solo

do Município de Campinas são omissas com relação às determinantes climáticas. As

principais leis em Campinas são: o Plano Diretor de Campinas - LC15/06, Uso e

Ocupação do Solo - Lei 6031/88, Código de Obras - LC 09/03, Parcelamento do Solo

Urbano - Lei 1933/59 e Área de Proteção Ambiental - Lei 10850/01.

2.2. Descrição das áreas.

Foram escolhidas três macrozonas, que acreditamos, ter sido suficiente para alcançar os

objetivos desta pesquisa: a Macrozona 1, Joaquim Egídio, zona 04 APA (figura 1); a

Macrozona 3, Barão Geraldo, zona R-3BG (figura 2) e a Macrozona 4: Taquaral, zona 3

(figura 3) e Cambuí, zona 7 (figura 4). São três regiões distintas, com características

territoriais próprias, diferentes níveis sociais e econômicos, com diferentes zoneamentos

7

e de restrições à ocupação e uso do solo. As intervenções foram realizadas, antes e

depois da lei 6031/88 – LUOS. A implantação dos condomínios, com suas unidades

projetadas e índices urbanísticos serviram de dados para efetuar as análises e

comparações, que junto com os envelopes solares, permitiram avaliar as relações entre

estes, terrenos, construções, ruas, vizinhança e legislações.

Figura 1. J. Egídio. Fonte: Google 2008. Figura 2. Barão Geraldo. Fonte Google 2008.

Figura 3. Taquaral. Fonte: Google 2008. Figura 4. Cambuí. Fonte: Google 2008.

2.4. Construção dos envelopes solares.

A construção dos envelopes solares foi realizada no ambiente do 3ds max8 e comando

de insolação sunlight para verificação da latitude, longitude, dia, mês, hora, azimutes e

ângulo de altura solar. Foram analisadas as posições críticas, nos dias 21 de junho,

solstício de inverno. Nos horários entre 9:00 e 15:00 h para as disposições residenciais

horizontais, Joaquim Egídio e Taquaral; e das 10:00 às 14:00 h para Barão Geraldo,

alternativa em EHIS – Empreendimentos Habitacionais de Interesse Social; e das 11:00

8

às 13:00 h, para as disposições verticais, nos quatro condomínios no Cambuí (Edifício

Águas Marinhas, Edifício Huari, Edifício Carla Cristina e Edifício Marco Polo). O

tempo de insolação foi adotado, pelos critérios de necessidade de insolação e em função

da salubridade. As questões relativas ao aquecimento de água por coletores solares e

transformação de energia por células fotovoltaicas não foram tratados neste trabalho.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO.

A utilização do software Autodesk 3ds max8 permitiu a visão das imagens nas áreas

escolhidas, com as construções e respectivas sombras; possibilitou a averiguação das

condições de insolação nas fachadas das edificações e entre elas; e, ainda, verificar, com

a construção dos envelopes solares, se a legislação está apropriada ou não aos terrenos,

às edificações e à vizinhança. As tabelas abaixo mostram alguns dados:

Empreend. Terreno m² Ocup (1) Aprov. (1) Livre % Constr. m²

01 J. Egídio 42000.00 0.0642 0.102 93.58 4284.68

02 Barão Geraldo 3227.10 0.224 0.427 77.61 1400.94

03 Taquaral 15173.00 0.294 0.477 70.555 7232.70

04 Cambuí

Ág. Marinhas

Huari

Carla Cristina

Marco Polo

1126.00

496.00

696.00

1762.70

0.307

0.3425

0.3995

0.289

3.077

4.23

3.995

3.755

69.23

65.75

60.05

71.111

5277.30

2990.00

2780.59

6619.99

Tabela 1. Parâmetros Urbanísticos. Fonte: os autores.

Empreend. Un Terreno m² habit/ha unid/ha m²/ha Const m²

01 J. Egídio 20 42000.00 28.57 4.76 1020.16 4284.68

02 B. Geraldo 17 3227.10 210 52 4341.17 1400.94

03 Taquaral 35 15173.00 115.33 23.06 4766.82 7232.70

04 Cambuí

Ág. Marinhas

Huari

Carla Cristina

Marco Polo

40

13

40

52

1126.00

496.00

696.00

1762.70

1420.96

1310.48

2298.85

1475.00

355.24

262.096

574.71

295.00

46867.67

60282.26

62479.74

58205.36

5277.30

2990.00

2780.59

6619.99

Tabela 2. Densidades. Fonte: os autores.

9

3.1. Área de estudo I. Joaquim Egídio.

Figura 5. Implantação. Figura 6. Vista em 3D. 21 de junho, 9:00 h.

Figura 7. Corte esquemático.

Os envelopes solares foram construídos sobre cada área privativa de terreno. As faces

das edificações orientadas para o leste estão totalmente insoladas. Os envelopes

apresentam grande volumetria em relação às edificações; há bastante flexibilidade para

posicionar as casas e as árvores. Pode-se, ainda, adensar mais, porém, a legislação não o

permite. Como as casas só podem ter dois pavimentos, e a distância entre as edificações

é de um mínimo de 4.00 m, o acesso ao sol em todas as residências é garantido. A tabela

1 apresenta a implantação das 20 residências com fração ideal de terreno de 2000.00 m²

por unidade e a tabela 2, índices de urbanização muito baixos. A implantação do

condomínio residencial multifamiliar HMH-4 (LUOS), na APA, oferece espaços

generosos, que se assentam amigavelmente no local, com baixas densidades, mantendo

a horizontalidade da cidade em evidência, com a valorização do solo e boa qualidade de

vida. Constata-se de que a legislação intervém diretamente, com o projeto do edifício e

o planejamento do lugar, na ocupação e no uso do solo.

10

3.4.2. Área de estudo II. Barão Geraldo.

Os envelopes solares foram construídos sobre dois terrenos privativos, contendo um

edifício com duas casas geminadas. A base dos envelopes foi levantada 1.0 m acima do

terreno. Os períodos de análise foram feitos em intervalos menores (das 10:00 às 14:00

h), por considerarmos as residências muito próximas e com pequenas dimensões.

Figura 8. Implantação com envelopes. Figura 9. Vista 3D, 21 de junho, 14:00 h.

A orientação das edificações, pela colocação da via interna no meio do terreno,

prejudicou a insolação nas fachadas. Verificou-se pela Tabela 1, que a taxa de ocupação

e o coeficiente de aproveitamento estão dentro das taxas admitidas para a zona 3BG. A

lei de EHIS é omissa nas questões de insolação deixando para o projetista a sua solução.

Verifica-se que as residências implantadas na parte inferior extrapolam os limites do

envelope, e as sombras, invadem o terreno vizinho; a fileira de casas na parte superior

não extrapola os limites do envelope e as sombras não atingem o vizinho ao norte, nem

os vizinhos do condomínio. Pode-se deduzir que, se a fileira de casas da parte inferior

fosse colocada para dentro dos limites do envelope solar, estaria atendendo ao direito de

acesso ao sol do vizinho. Poderia ser aumentado o coeficiente de aproveitamento,

ampliando os pavimentos das casas ao norte e rever os recuos e afastamentos.

3.4.3. Área de estudo III. Parque Taquaral.

Com frações ideais de terreno pequenas e áreas privativas da ordem de 280.00 m² e

12.00 m de frente, as superfícies base dos envelopes solares, foram acrescidas a essas

11

distâncias, 1.50 m em cada lateral e 8.50 m da via interna. Os envelopes solares foram

analisados de duas formas: uma que atende a esta divisão - envelopes por unidade

residencial - e a segunda, que considera o envelope para agrupamento de unidades.

Figura 10. Implantação. Figutra 11. Vista em 3D, 21 de junho, 9:00 h.

Constata-se que, para o primeiro caso, os envelopes solares ficam menores do que as

edificações. Como os ângulos de altura solar são baixos demais, acabam por não admitir

uma altura para a cumeeira do envelope solar, capaz de abrigar as edificações.

Figura 12. Implantação. Figura 13. Vista em 3D, 21 de junho, 9:00 h.

Optando pela construção dos envelopes solares sobre agrupamento de casas contíguas,

separadas por corredores para onde se abrem janelas de ventilação, obtém-se um

resultado melhor, como mostram as figuras 12 e 13. Deduz-se que os envelopes solares

12

mostram-se inadequados para terrenos pequenos, e sendo construídos sobre fileiras de

residências, apresentam-se melhor; as edificações visualizam-se bem colocadas,

havendo folgas nos volumes, o que sugere ser possível uma otimização, aumentando o

índice de aproveitamento. A LUOS permite o coeficiente 1,0 para lotes que possuem

toda infra-estrutura e poderia permitir mais um pavimento, alcançando um

aproveitamento melhor, mantendo a mesma taxa de ocupação e área livre. A densidade

demográfica poderia ser aumentada, ampliando o número de unidades.

3.4.4. Área de estudo IV. Cambuí.

O bairro do Cambuí, contíguo ao Centro de Campinas, era constituído por chácaras e

casarões, até a publicação da Lei 1933/59, quando foi iniciada a verticalização; na

década de 80, esta verticalização foi acentuada, por pressões do mercado imobiliário,

valorizando o solo urbano. A lei 6031/88, na tentativa de controlar esse

desenvolvimento, reduziu o índice de aproveitamento de 4 para 3, assim mesmo, a lei

mostrou imperfeições.

Figura 14. Implantação, 11:00 h. Figura 15. Implantação, 13:00 h.

As análises dos quatro edifícios no bairro Cambuí foram realizadas para um horário de

insolação das 11:00 às 13:00 h. Os resultados obtidos indicam a gravidade do problema,

pelas sombras projetadas como são apresentadas nas figuras 14 e 15. Cada edifício foi

projetado de acordo com a legislação vigente, e para cada um foram resolvidas as suas

13

questões de insolação de forma isolada, sem pensar na vizinhança. No período da

manhã, os edifícios Águas Marinhas e Huari, não são atingidos por sombras de outros

edifícios, mas eles provocam sombras sobre seus confrontantes e vizinhança. O edifício

Huari, por estar localizado frente a uma pequena praça, teve o seu gabarito aumentado.

No período da tarde, os edifícios Carla Cristina e Marco Polo, não são atingidos pelas

sombras dos edifícios do lado oposto da rua, mas, lançam suas sombras sobre o centro

do quarteirão, atingindo também a vizinhança. As figuras 16 e 17 mostram os envelopes

solares construídos sobre cada terreno e suas edificações, se apresentam baixos, com os

edifícios ultrapassando os limites de suas volumetrias. A altura dos edifícios permitida

pela legislação e os coeficientes de aproveitamento de 4 e 3, assim como o gabarito não

está em concordância com os envelopes solares. Fica claro, que as leis não têm sido

adequadas, pois não contemplam a insolação e sombreamento entre edifícios.

Figura 16. Envelopes e edifícios, 11:00 h. Figura 17. Envelopes e edifícios, 13:00 h.

Verifica-se que os empreendimentos horizontais de até dois ou três pavimentos,

aparentam estar bem resolvidos pela legislação e que, com poucos ajustes, poderiam ser

otimizados, aumentando as densidades com aproveitamento da infra-estrutura, sem

provocar maiores custos e grandes impactos urbanísticos e ambientais, com garantia de

insolação, de iluminação natural e ventilação natural, preservando o direito de acesso ao

sol. Já os quatro empreendimentos no Cambuí apresentaram-se incompatíveis com os

14

envelopes solares, pois as suas alturas extrapolam os limites destes e mostraram que,

para os lotes, onde é permitida a verticalização, com coeficientes de aproveitamento

acima de 1, os parâmetros para a construção de edifícios devem ser melhor estudados

pela legislação. As administrações municipais, podem deter, com a construção de

envelopes solares, o controle das densidades, alturas e recuos das edificações e de seus

afastamentos com os edifícios vizinhos, das taxas de ocupação, áreas livres, largura de

ruas, calçadas, espaços públicos etc.

4. CONCLUSÕES.

Conclui-se, pois, que para os empreendimentos horizontais, as leis urbanísticas

correspondem adequadamente, e ainda existem folgas na sua aplicação. Porém, não só

para os edifícios altos no bairro do Cambuí, mas para outras partes da cidade, de

urbanização consolidada, percebe-se que a legislação permite alturas que provocam

sombreamentos, que não garantem os direitos de acesso ao sol. Constatou-se, que a

morfologia urbana atual é resultado da acumulação de edificações que ignoraram as

vantagens da boa orientação, negligenciando totalmente as conseqüências energéticas

do projeto urbano e arquitetural. Se, para a concepção dos loteamentos, forem tomadas

diretrizes climáticas, certamente será iniciado o planejamento para um crescimento

urbano organizado e sustentável. O correto parcelamento do solo, com a adequada

orientação das ruas, e dimensionamento das quadras e lotes garantirá o acesso ao sol a

todas as edificações, e facilitará o projeto para sistemas passivos de energia. As cidades

com menos de 20000 habitantes, excluídas da obrigatoriedade de elaborar o seu Plano

Diretor, sem recursos financeiros, sem um quadro qualificado de funcionários, nem

legislação específica, poderão adotar estes conceitos para resolver de forma simples e

muito clara, as questões com o seu desenvolvimento urbano; e os bairros ao redor dos

centros das grandes cidades também poderão ter o seu desenvolvimento urbano

15

controlado, e serem beneficiados com leis de uso e ocupação do solo adequadas, com

políticas de zoneamento coerentes, justas, e sem segregação social.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

- ASSIS, Eleonora S. Impactos da forma urbana na mudança climática: método

para previsão do comportamento térmico e melhoria de desempenho do ambiente

urbano. São Paulo, 2000. Tese de doutorado – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

da Universidade de São Paulo.

- GRAZZIOTIN, Pablo et al. Visualization Techniques in a Building Potential

Simulator Using Sunlight Access Control. SIACG – Ibero-American Symposium in

Computer Graphics, Guimaraes, Portugal, 2002.

- IBAM – Instituto Brasileiro de Administração Municipal, Estatuto da Cidade, para

compreender.../ Isabel Cristina Eiras de Oliveira, Rio de Janeiro: IBAM/DUMA, 2001.

- KNOWLES, Ralph L. The solar envelope: its meaning for energy and buildings.

Energy and buildings. Los Angeles, v. v 35, n. n1, 2003.

- KNOWLES, Ralph L. Sun Rhythm Form, The Massachusetts Institute of

Technology, Cambridge, Massachusetts, 1981, 198 p.

- LECHNER, Norbert. Heating, Cooling, Lighting – Design Methods for Architects.

John Wiley & Sons, USA, 1990, 523 p.

- PEREIRA, F., NOME, C. Proposta sistemática de uso em planejamento urbano do

envelope solar como forma de controle da ocupação do solo urbano em função da

insolação. ENCAC – ENCONTRO NACIONAL SOBRE CONFORTO NO

AMBIENTE CONSTRUÍDO, Salvador, BA, 1997.

- SHAVIV, E., CAPELUTO, G. Modeling the design of Urban fabric with Solar Rights

considerations, Solar Energy, Israel Institute of Technology, Haifa, Israel, v. 70, Issue

3, p. 275-280, 2001.