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O fator meteorológico na produção agrícola

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  • Agrometeorologia dos CultivosO fator meteorolgico na produo agrcola

  • Repblica Federativa do Brasil

    Luiz Incio Lula da Silva

    Presidente da Repblica

    Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento

    Reinhold Stephannes

    Ministro da Agricultura

    Instituo Nacional de Meteorologia

    Antonio Divino Moura

    Diretor

    Coordenao-Geral de Pesquisa e Desenvolvimento

    Lauro Tadeu Guimares Fortes

    Coordenador-Geral

    Coordenao Geral de Agrometeorologia

    Alaor Moacyr DallAntonia Junior

    Coordenador-Geral

    Coordenao-Geral de Apoio Operacional

    Edil Manke

    Coordenador-Geral

    Coordenao-Geral de Modelagem Numrica

    Francisco Quixaba Filho

    Coordenador-Geral

    Coordenao-Geral de Sistemas de Comunicao

    Jos Mauro de Rezende

    Coordenador-Geral

  • Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento - MAPA

    Agrometeorologia dos CultivosO fator meteorolgico na produo agrcola

    Jos Eduardo B. A. MonteiroOrganizador

    BRASLIA - DF2009

    1 Edio

    Instituto Nacional de Meteorologia - INMET

  • Instituto Nacional de Meteorologia INMET, 2009Eixo monumental, Via S1, SudoesteCEP: 70680-900, Braslia-DF(61) 3344-3333, (61) 2142-4602www.inmet.gov.br

    Todos os direitos reservados. permitida a reproduo parcial ou total desta obra, por qualquer meio, desde que citada a fonte e que no seja para venda ou qualquer fim comercial.

    Equipe editorial:Superviso editorial/Organizao: Jos Eduardo B. A. Monteiro

    Reviso de Linguagem: Rubens Leite Vianello Jos Eduardo B. A. Monteiro Romsio Geraldo Bouhid Andr

    Reviso de Bibliografia: Suelena Costa Braga Coelho Mrcia Cristina Tomaz de Aquino

    Superviso Geral: Lauro Tadeu Guimares Fortes

    Produo:Projeto Grfico, Capa e Diagramao: Marcelo Bernardes Nogueira

    Edio de Fotografia e Ilustraes: Ricardo Coura Melo Andrade

    Fotografias:Composio da Capa: Stock.xchng (www.sxc.hu); John Nyberg, Dani Simmonds,

    Usurio: abcdz2000, Crystal Woroniuk, Tibor Fazakas, Robert Linder

    Abertura dos Captulos: Stock.xchng (www.sxc.hu); Keenan Milligan; Fernando Weberich; Andrey Volodov; Cris DeRaud; Kliverap (usurio do Stock.xchng); Pat Herman; Clix (usurio do Stock.xchng); Johannes Wienke; Andrei Rachov; David Thomson; Nadia Arai; George Popa; Kriss Szkurlatowski; A. Carlos Herrera; Luiz Baltar; Mooncross (usurio do Stock.xchng); Marek Luty; Slavomir Ulicny; Juerg Steiner; Darias Martin; Meliha Gojak; Stephanie Berghaeuser; Alessandro Paiva; Ulrik De Wachter;

    Karolina Przybysz; Constantin Jurcut; Leonardo Breda

    Catalogao na fonte: Biblioteca Nacional de Meteorologia / INMET / MAPA

    Agrometeorologia dos cultivos : o fator meteorolgico na produo agrcola / organizador Jos Eduardo

    B. A Monteiro. - Braslia, DF: INMET, 2009.

    530 p.: il

    ISBN: 978-85-62817-00-7

    1. Agrometeorologia . 2. Fenologia. 3. Agricultura. 4. Meteorologia I . Monteiro, Jos Eduardo B. A. (org.).

    CDU 631:551.51

  • Equipe

    EQUIPE TCNICA

    Organizador:

    Jos Eduardo B. A. Monteiro, Eng. Agrnomo, Dr.

    Colsultor de Desenvolvimento e Pesquisa Coordenao Geral de Desenvolvimento e Pesquisa [CDP] /

    Instituto Nacional de Meteorologia [INMET] / Ministrio da Agricultura Pecuria e Abastecimento [MAPA]

    Autores* Parceiros Institucionais:

    Admir Lopes Mora Norske SkogAlberto Miele EMBRAPA Uva e VinhoAldemir Pasinato EMBRAPA TrigoAlexandre B. Heinemann EMBRAPA Arroz e FeijoAlexandre Hoffmann EMBRAPA Uva e VinhoAlexandre Lima Nepomuceno EMBRAPA SojaAline Santana de Oliveira UFVAna Alexandrina G. da Silva EMBRAPA TCAna Cristina Pinto Juhsz CTNM/EPAMIGAnderson Santi EMBRAPA TrigoAndr Quinto de Almeida UFVAntonio Rioyei Higa UFPRAristides Ribeiro UFVArno Bernardo Heldwein UFSMAugusto Arlindo Simon Tanagro S.A.Brulio Otomar Caron CESN/UFSMCarlos Alberto S. Souza CEPLACCarlos G. Silveira Pedreira ESALQ/USPCsar de Castro EMBRAPA SojaCntia Passos Castro EMBRAPA TCClovis Alberto Volpe UNESP/FCAVDalziza de Oliveira IAPARDaniela Kubiak de Salvatierra ESALQ/USPDenise Schmidt CESN/UFSMDilson Antnio Bisognin UFSMDomingo Haroldo Reinhardt EMBRAPA MFTEderaldo Jos Chiavegato ESALQ/USPEdgar Ricardo Schffel UFPel/FAEMEdson Eduardo Melo Passos EMBRAPA TCEduardo Caiero EMBRAPA TrigoEduardo Delgado Assad EMBRAPA Informtica Elmar Luiz Floss UPF/FAMVElza Jacqueline L. Meireles EMBRAPA CafEugnio Ferreira Coelho EMBRAPA MFTFabio Ricardo Marin EMBRAPA Informtica Felipe Gustavo Pilau CESN/UFSMFelipe Tonato ESALQ/USPFrancisco Mandelli EMBRAPA Uva e VinhoGabriel Ferreira Bartholo CTSM/EPAMIGGenei Antonio Dalmago EMBRAPA TrigoGetlio A. Pinto da Cunha EMBRAPA MFT Giampaolo Queiroz Pellegrino UNICAMP/CEPAGRIGilberto Omar Tomm EMBRAPA Trigo

    Gilberto Rocca da Cunha EMBRAPA TrigoGilmar Ribeiro Nachtigall EMBRAPA Uva e VinhoGiovani Greigh de Brito EMBRAPA AlgodoHeverly Morais IAPARHilton Silveira Pinto UNICAMP/CEPAGRIHomero Bergamaschi UFRGSJoo Caetano Fionavano EMBRAPA Uva e VinhoJoo Leonardo F. Pires EMBRAPA TrigoJoel Irineu Fahl IAC/APTAJorge Tonietto EMBRAPA Uva e VinhoJos Carlos F. de Resende CTNM/EPAMIGJos de Alencar N. Moreira EMBRAPA AlgodoJos Eduardo B. A. Monteiro INMETJos Fideles Filho UEPB/EMEPAJose Renato Boucas Farias EMBRAPA SojaJos Ricardo M. Pezzopane EMBRAPA Pecuria SudesteJurandir Zullo Junior UNICAMP/CEPAGRILeocdio Grodzki IAPARLuis Carlos Nogueira EMBRAPA TCLuis Csar Bonfim Gottardo ESALQ/USPLus Fernando Stone EMBRAPA Arroz e FeijoLuiz Antnio dos Santos Dias UFVLuiz Francisco da Silva Souza EMBRAPA MFTMarcelo B. Paes de Camargo IAC/APTAMrcio Andr Stefanelli Lara ESALQ USPMarco A. F. Conceio EMBRAPA Uva e VinhoMarco Antonio G. Aguilar CEPLACMarcos Silveira Wrege EMBRAPA FlorestasMargarete M. Lordelo Volpato CTSM/EPAMIG Maria Eliane Durigan IAPARMaria Isaura P. de Oliveira EMBRAPA AlgodoMaria Regina G. Ungaro IAC/APTAMariano Pereira Silva UFVNapoleo E. Macedo Beltro EMBRAPA AlgodoNereu Augusto Streck UFSMNdio Antonio Barni FEPAGRONilza Patrcia Ramos EMBRAPA Meio AmbienteNorman Neumaier EMBRAPA SojaNuno Rodrigo Madeira EMBRAPA HortaliasOdilon Reny R. F. da Silva EMBRAPA AlgodoOtvio lvares de Almeida EMBRAPA MFTPaulo Augusto Manfron UFSMPaulo Cesar Sentelhas ESALQ/USP

  • *A qualificao, instituio e contato de cada autor encontram-se nas notas da primeira pgina do respectivo captulo.

    Siglas: APTA Agncia Paulista de Tecnologia dos Agronegcios; CEPAGRI Centro de Pesqui-

    sas Meteorolgicas e Climticas Aplicadas Agricultura; CEPLAC Comisso Executiva do Plano

    da Lavoura Cacaueira; CESN Centro de Educao Superior Norte; CTNM Centro Tecnolgico

    do Norte de Minas; CTSM Centro Tecnolgico do Sul de Minas; EAFAJT Escola Agrotcnica

    Federal Antnio Jos Teixeira; EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria; EME-

    PA Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuria da Paraba; EPAMIG Empresa de Pesquisa

    Agropecuria de Minas Gerais; ESALQ Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz; FAEM

    Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel; FAMV Faculdade de Agronomia e Medicina Veterin-

    ria; FCAV Faculdade de Cincias Agrrias e Veterinrias; FEPAGRO Fundao Estadual de

    Pesquisa Agropecuria; IAC Instituto Agronmico de Campinas; IAPAR Instituto Agronmico

    do Paran; INMET Instituto Nacional de Meteorologia; MFT Mandioca e Fruticultura Tropical;

    UEPB Universidade Estadual da Paraba; UFPel Universidade Federal de Pelotas; UFPR

    Universidade Federal do Paran; UFRB Universidade Federal do Recncavo da Bahia; UFRGS

    Universidade Federal do Rio Grande do Sul; UFSM Universidade Federal de Santa Maria;

    UFSM Universidade Federal de Santa Maria; UFV Universidade Federal de Viosa; UNESP

    Universidade Estadual Paulista; UNICAMP Universidade Estadual de Campinas; UPF Uni-

    versidade de Passo Fundo; USP Universidade de So Paulo.

    EQUIPE DE ELABORAO

    Reviso Tcnica e de Linguagem:

    Rubens Leite Vianello, Meteorologista, Dr.

    Consultor de Desenvolvimento e Pesquisa CDP / INMET / MAPA

    Jos Eduardo B. A. Monteiro, Eng. Agrnomo, Dr.

    Consultor de Desenvolvimento e Pesquisa CDP / INMET / MAPA

    Romisio Geraldo Bouhid Andr, Meteorologista, Dr.

    Consultor de Desenvolvimento e Pesquisa CDP / INMET / MAPA

    Reviso de Bibliografia:Suelena Costa Braga Coelho

    Biblioteca Nacional de Meteorologia / INMET / MAPA

    Mrcia Cristina Tomaz de Aquino

    Biblioteca Nacional de Meteorologia / INMET / MAPA

    Superviso Geral:

    Lauro Tadeu Guimares Fortes, Phd.

    Coordenador Geral de Desenvolvimento e Pesquisa CDP / INMET / MAPA

    Paulo Henrique Caramori IAPARPaulo Jos Hamakawa UFVRafael Vasconcelos Ribeiro IAC/APTARaquel C. E. Baesso UFVRobson Alves de Oliveira UFVRodrigo M. de A. Pimentel CTNM/EPAMIGRonaldo Matzenauer FEPAGRORosana Clara Victoria Higa EMBRAPA FlorestasSrgio Luis Rodrigues Donato EAFAJT

    Silas Mochiutti EMBRAPA AmapSilvando Carlos da Silva EMBRAPA Arroz e FeijoTorquato M. de Andrade Neto UFRBValter Rodrigues Oliveira EMBRAPA HortaliasVnia Aparecida Silva CTNM/EPAMIGVelci Queirz de Souza CESN/UFSMWaldir Aparecido Marouelli EMBRAPA HortaliasWaltemiltom Vieira Carataxo EMBRAPA Algodo

    Yhasmin Gabriel Paiva UFV

  • Prefcio

    O INMET tem exercitado, em anos recentes, uma estratgia de atuao em que alm de aprimorar

    permanentemente sua capacidade de monitoramento, previso de tempo e clima e processamento de

    informaes meteorolgicas nos mais diversos nveis busca engajar, no processo de atendimento comunitrio, o usurio final dessas informaes. O pressuposto que, para maximizao dos benefcios, o usurio deva participar da definio dos produtos que lhe so mais teis.

    Seguindo tal preceito, consolidado em dcadas de atuao no campo da pesquisa e da prestao de

    servios meteorolgicos, o INMET tem buscado produzir aplicaes das informaes meteorolgicas e climticas que atendam s necessidades especificas da comunidade usuria, no mbito governamental e privado. Volta-se, neste intuito, para o setor agropecurio uma prioridade do Instituto, vinculado,

    desde a origem em 1909, ao Ministrio da Agricultura e para outros setores particularmente sensveis

    s condies do tempo e do clima, como Defesa Civil, Sade Pblica, Energia e Recursos Hdricos. Para melhor implementar tal estratgia, o INMET logrou, em 2005, a criao, em sua estrutura

    organizacional, de uma nova Coordenao-Geral de Desenvolvimento e Pesquisa (CDP).

    O impacto do clima na produtividade e na qualidade final dos cultivos amplamente reconhecido, respondendo a incerteza climtica por substancial parcela do risco que afeta a atividade agrcola.

    Tal fato ganha ainda maior evidncia no momento em que a sociedade devota particular ateno ao

    problema do aquecimento global e das mudanas climticas decorrentes.

    A boa gesto do risco climtico na agricultura demanda ferramentas objetivas que combinem as

    informaes sobre o comportamento do tempo e do clima com o conhecimento quantitativo das relaes entre variveis climticas e ambientais e o impacto resultante sobre os diferentes cultivos.

    A idealizao deste livro surgiu da necessidade de informaes que permitam ao INMET desenvolver um Sistema de Anlise de Dados Agrometeorolgicos orientado para os principais cultivos

    do Brasil, com o objetivo de gerar informaes prticas e de interesse agronmico, com abrangncia nacional. Este Sistema exploraria tambm, em benefcio do agricultor e do agronegcio, os dados de

    monitoramento meteorolgico registrados pela rede de estaes do Instituto, bem como o acervo de dados histricos disponveis nesta instituio centenria e as previses de tempo e clima que vm sendo produzidas. A constatao de que tais informaes agrometeorolgicas no estavam acessveis nos nveis de detalhe, de qualidade e de organizao pretendidos para o projeto, ensejou a iniciativa

    de colecion-las e organiz-las de forma sistemtica.

    Incumbido de coordenar essa tarefa, o Dr. Eduardo Monteiro, consultor do INMET, logrou motivar

    e conseguir a adeso de um notvel time de especialistas, composto, ao todo, por 105 autores e co-

    autores de 31 captulos que compem o livro, filiados a 37 organizaes de renome. Cada equipe, responsvel por uma cultura de sua especialidade, produziu sua contribuio segundo uma roteiro

    comum, elaborado pelo coordenador.

    O resultado desse esforo conjunto um livro de referncia, Agrometeorologia dos cultivos: o fator

    meteorolgico na produo agrcola, reunindo conhecimentos que contribuiro para a operao dos servios

    agrometeorolgicos, alm de facilitar o acesso a informaes fundamentais, tanto para o estudo, o ensino e a pesquisa do tema quanto para as atividades de produtores rurais e profissionais do setor agropecurio.

    Temos a convico de que este livro, indito no Brasil, representar uma valiosa contribuio que

    o INMET, no ano de seu centenrio, em parceria com todas as instituies colaboradoras, oferece sociedade brasileira.

    Antonio Divino MouraDiretor do INMET

    Lauro T. G. FortesCoordenador Geral de

    Desenvolvimento e Pesquisa

  • Apresentao

    No sistema produtivo agrcola, as condies meteorolgicas representam fatores exgenos que afetam o crescimento, o desenvolvimento e a produtividade de plantas e animais. Durante seu ciclo,

    a planta responde diretamente s condies meteorolgicas, as quais formam uma combinao de fatores cujos efeitos podem variar desde os mais favorveis at os mais desfavorveis ao crescimento

    e produtividade vegetais.

    A Meteorologia Agrcola, ou Agrometeorologia, tem por objetivo colocar a Cincia Meteorolgica

    a servio da Agricultura, buscando produzir o mximo, com o mnimo de recursos naturais e

    artificiais, com o menor risco econmico e de forma sustentvel. Neste sentido, a Agrometeorologia, cincia multidisciplinar por definio, rene uma srie de conhecimentos necessrios analise e ao entendimento das relaes entre o ambiente fsico e as atividades agrcolas, bem como orientao das aes de manejo. Porm, grande quantidade de informaes importantes para as aplicaes e ferramentas que esta cincia oferece encontra-se dispersa em vrias disciplinas agronmicas.

    Buscando reduzir tal limitao, o principal objetivo deste livro foi reunir uma ampla base de

    informaes sobre alguns dos principais cultivos da agricultura brasileira e suas relaes com as condies meteorolgicas.

    Sem se estender sobre as metodologias e aplicaes prprias da Agrometeorologia, este livro restringe seu foco nas culturas e nas caractersticas que determinam a produtividade em funo do

    ambiente a que so submetidas. Para isso, contamos com a participao de um excelso time de

    colaboradores de diversas especialidades e instituies nacionais de ensino e pesquisa.A reunio e a sitematizao do amplo conhecimento, bem como a promoo do intercmbio

    multidisciplinar so essenciais para o desenvolvimento e a ampliao da capacidade prtica da

    Agrometeorologia.

    Assim, esperamos ainda, colocar em evidncia muitos assuntos ainda carentes de informaes e pesquisas, em diversas culturas. Apesar dos avanos contnuos nas reas de monitoramento

    meteorolgico, de informtica e nos mtodos de modelagem do crescimento e produo vegetal, ainda

    faltam conhecimentos bsicos sobre muitas culturas abordadas, conhecimentos estes indispensveis

    para gerar informaes agrometeorolgicas de qualidade.

    Eng. Agrnomo, Dr.

    Jos Eduardo B. A. Monteiro

  • Sumrio

    Parte I Introduo

    Agrometeorologia dos cultivos .................................................................................................... 3

    Parte II Cultivos temporrios

    Abacaxi ..................................................................................................................................... 15

    Algodo ..................................................................................................................................... 33

    Amendoim ................................................................................................................................. 51

    Arroz ......................................................................................................................................... 63

    Aveia ......................................................................................................................................... 81

    Batata ........................................................................................................................................ 91

    Cana-de-acar ...................................................................................................................... 109

    Canola ..................................................................................................................................... 131

    Cebola ..................................................................................................................................... 151

    Cevada .................................................................................................................................... 167

    Feijo ...................................................................................................................................... 183

    Girassol ................................................................................................................................... 203

    Mamona .................................................................................................................................. 223

    Milho ....................................................................................................................................... 237

    Soja ......................................................................................................................................... 261

    Trigo ........................................................................................................................................ 279

    Triticale .................................................................................................................................... 295

    Parte III Cultivos permanentes

    Accia-negra ........................................................................................................................... 311

    Banana .................................................................................................................................... 321

    Cacau ...................................................................................................................................... 333

    Caf ........................................................................................................................................ 351

    Citros ....................................................................................................................................... 373

    Coqueiro ................................................................................................................................. 393

    Eucalipto ................................................................................................................................. 407

    Forrageiras brachiaria, panicum e cynodon ............................................................................ 425

    Macieira .................................................................................................................................. 449

    Pinho manso ......................................................................................................................... 465

    Pinus ....................................................................................................................................... 477

    Sisal ........................................................................................................................................ 489

    Uva em clima temperado ........................................................................................................ 503

    Uva em clima tropical .............................................................................................................. 517

  • PARTE I

    INTRODUO

  • Agrometeorologia dos CultivosInformaes para uma Agricultura Sustentvel

    Paulo Cesar Sentelhas(1)

    Jos Eduardo Boffino de Almeida Monteiro(2)

    1. INTRODUO

    A agricultura a atividade econmica mais dependente das condies climticas. Os elementos meteorolgicos afetam no s os processos metablicos das plantas, diretamente relacionados produo vegetal, como tambm as mais diversas atividades no campo. De acordo com Petr (1990) e Fageria (1992), citados por Hoogenboom (2000), ao redor de 80% da variabilidade da produo agrcola no mundo devem-se variabilidade das condies meteorolgicas durante o ciclo de cultivo, especialmente para as culturas de sequeiro, j que os agricultores no podem exercer nenhum controle sobre tais fenmenos naturais.

    Alm de influenciar o crescimento, o desenvolvimento e a produtividade das culturas, o clima afeta tambm a relao das plantas com microorganismos, insetos, fungos e bactrias, favorecendo ou no a ocorrncia de pragas e doenas, o que demanda medidas de controle adequadas. Muitas prticas agrcolas de campo, como o preparo do solo, a semeadura, a adubao, a irrigao, as pulverizaes, a colheita, dentre outras, dependem tambm de condies especficas de tempo e de umidade no solo, para que possam ser realizadas de forma eficiente (PEREIRA et al., 2002).

    Dada a grande importncia do clima para a produo agrcola, o uso de informaes meteorolgicas e climticas fundamental para que a agricultura se torne uma atividade sustentvel (SIVAKUMAR et al., 2000). Nesse contexto, a agrometeorologia, cincia interdisciplinar que estuda a influncia do tempo e do clima na produo de alimentos, fibras e energia, assume papel estratgico no entendimento e na soluo dos problemas enfrentados pela agricultura (MAVI E TUPPER, 2004).

    A preocupao crescente com o aumento da populao mundial, com a degradao dos recursos naturais e com a sustentabilidade da agricultura tem exigido esforos no desenvolvimento de estratgias e prticas adequadas de uso do solo, a partir do melhor entendimento das relaes entre a agricultura e o clima. Nesse sentido, o desenvolvimento de ferramentas que auxiliem o planejamento e o processo de tomadas de deciso, que resulte em menores impactos ambientais e no aumento da resilincia da agricultura, tem sido um dos objetivos das instituies governamentais ligadas agricultura, ao ambiente e aos recursos naturais.

    Para que tais ferramentas sejam desenvolvidas e disponibilizadas aos agricultores, necessrio conhecer os impactos do tempo e do clima sobre cada cultura, sendo este o principal objetivo desta obra, denominada Agrometeorologia dos Cultivos.

    2. AGROMETEOROLOGIA DOS CULTIVOS

    O conhecimento das relaes entre as condies fsicas do ambiente, em especial, solo e atmosfera, e as diversas espcies cultivadas permite a obteno de informaes mais precisas acerca da influncia do tempo e do clima no crescimento, no desenvolvimento e na produtividade das culturas. A essa influncia especfica das condies ambientais em uma dada cultura agrcola e suas particularidades denomina-se Agrometeorologia dos Cultivos.

    De modo geral, as principais variveis meteorolgicas que afetam o crescimento, o desenvolvimento e a produtividade das culturas so chuva, temperatura do ar e radiao solar (HOOGENBOOM, 2000), havendo ainda a influncia do fotoperodo, da umidade do ar e do solo, da velocidade e da direo do vento (PEREIRA et al., 2002; MAVI E TUPPER, 2004).

    A radiao solar prov a energia necessria aos processos associados fotossntese, afetando

    1- Eng. Agrnomo, Dr., Prof. Associado do Setor de Agrometeorologia, Departamento de Engenharia Rural, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ) - Universidade de So Paulo (USP), Piracicaba, SP. E-mail: [email protected]

    2- Eng. Agrnomo, Dr., Consultor em Desenvolvimento e Pesquisa, Coordenao Geral de Desenvolvimento e Pesquisa (CDP), Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), Braslia, DF. E-mail: [email protected]; [email protected].

  • Agrometeorologia dos Cultivos / Sentelhas, P. C.; Monteiro, J. E. B. A.

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    assim a produo de carboidratos e, consequentemente, o crescimento da biomassa das plantas. A fotossntese responde tambm temperatura do ar, que afeta a taxa das reaes metablicas das plantas, regulando o crescimento e o desenvolvimento vegetal. Temperaturas crescentes induzem ao aumento da taxa de fotossntese, invertendo-se, porm, a relao, sob temperaturas muito elevadas.

    A temperatura tambm afeta uma srie de outros processos nas plantas, como a respirao de manuteno, a transpirao, o repouso vegetativo, a durao das fases fenolgicas das culturas, a induo ao florescimento, o contedo de leo em gros, a taxa de germinao de sementes, etc. (PEREIRA et al., 2002, MAVI E TUPPER, 2004). Tantas interferncias tornam a temperatura a principal varivel meteorolgica a ser considerada nos zoneamentos agroclimticos, juntamente com a chuva (CAMARGO et al., 1974, 1977).

    Diretamente, a chuva no afeta nenhum dos processos metablicos das plantas. Contudo, ela age indiretamente, afetando tanto o crescimento quanto o desenvolvimento das culturas (HOOGENBOOM, 2000), alm da disponibilidade hdrica dos solos que, por sua vez, influencia a absoro de gua pelas razes e o status hdrico das culturas. Em perodos de poucas chuvas, a seca induz as plantas ao fechamento de seus estmatos, fixando menos CO2, afetando negativamente a fotossntese. Por outro lado, perodos com chuvas excessivas levam reduo da oxigenao dos solos, diminuindo a atividade radicular e a absoro de gua e nutrientes pelas plantas. Tanto as secas quanto o encharcamento dos solos levam reduo da produtividade das culturas.

    O fotoperodo uma varivel do ambiente que interfere tanto no crescimento quanto no desenvolvimento das culturas. No contexto do crescimento, o fotoperodo corresponde ao tempo em que as plantas realizam o processo da fotossntese. Assim, nas maiores latitudes, onde o fotoperodo mais longo durante a estao de cultivo, a produtividade maior, j que a fotossntese ocorre por mais tempo. Alm deste efeito quantitativo, algumas culturas tm seu desenvolvimento afetado pelo fotoperodo, sendo, por isso, consideradas plantas fotossensveis. Um exemplo clssico a soja, que s atinge a fase reprodutiva caso o fotoperodo crtico seja atingido.

    O vento outra varivel que afeta indiretamente as culturas. Sua influncia pode ser positiva ou negativa, dependendo de sua velocidade. De acordo com Pereira et al. (2002), em velocidades baixas a moderadas, o vento contribui para a renovao do suprimento de CO2 e para a manuteno da transpirao das plantas. No entanto, em velocidades excessivas, o vento responsvel pelo aumento demasiado da transpirao das plantas, levando ao fechamento dos estmatos, reduo do nmero de folhas e da rea foliar, resultando em queda brusca da fotossntese. Alm disso, ventos intensos provocam danos mecnicos nas plantas, como acamamento, queda de folhas e quebra de galhos e troncos.

    Finalmente, a umidade do ar outra varivel que atua de diversas formas indiretas sobre as culturas, afetando, inclusive, o poder evaporante do ar e condicionando a transpirao. Ambientes muito secos levam ao aumento excessivo da transpirao, na maioria das plantas. Em outros casos, podem provocar danos indiretos resultantes de desordens fisiolgicas. Alm destes aspectos, a umidade do ar muito importante na interao entre as plantas e os microorganismos, especialmente fungos e bactrias, causadores de doenas. Em condies de alta umidade, onde a durao do perodo de molhamento foliar mais prolongada, h o favorecimento da ocorrncia de doenas que afetam o desempenho das culturas, reduzindo a quantidade e a qualidade dos produtos agrcolas (SENTELHAS, 2004).

    Na realidade, a interao entre os elementos meteorolgicos e a cultura pode ser complexa, resultando em uma variedade de reaes biolgicas e de condies ambientais em constante mudana. Alm disso, a diversidade de espcies cultivadas comercialmente no Brasil muito grande, ultrapassando uma centena. Considerando-se apenas as 30 culturas de maior importncia econmica, ainda assim chega-se a uma lista to diversa que vai da cebola cana-de-acar, dentre os cultivos temporrios, e do sisal ao caf, dentre os perenes. Ademais, as informaes importantes para uma cultura no o so, necessariamente, para outra. Enquanto a temperatura crtica para a definio do comprimento e da espessura das fibras em formao na ma do algodoeiro, a deficincia hdrica particularmente importante para o arroz de sequeiro, durante a formao e a emisso da pancula, enquanto o fotoperodo fator determinante para o incio da

  • 5

    Parte I - Introduo

    fase reprodutiva da soja. Alm destes, existem vrios outros exemplos. Por isso, o entendimento das particularidades de cada cultura e das condies do ambiente fsico fundamental para um sistema de produo mais eficiente e sustentvel (SIVAKUMAR et al. 2000).Esforos nesse sentido vm sendo feitos h alguns anos.

    A Organizao Meteorolgica Mundial (OMM), por meio de sua Diviso de Agrometeorologia, publicou, em 1982, o Guia de Prticas Agrometeorolgicas (GAMP - Guide for Agricultural Meteorological Practices), com captulos referentes influncia dos elementos meteorolgicos em diferentes culturas agrcolas de interesse mundial. Esse guia foi reeditado recentemente, encontrando-se disponvel na internet (WMO, 2009). Outra publicao que rene informaes gerais sobre a agrometeorologia de diferentes culturas o Boletim de Irrigao e Drenagem, n. 33, da FAO, intitulado Efeito da gua no Rendimento das Culturas (DOORENBOS E KASSAM, 1994). Nesse boletim constam informaes gerais sobre os requerimentos trmicos e hdricos de 26 diferentes culturas, sendo uma das principais fontes de informao para o planejamento agrcola e para mtodos de estimativa da produtividade. No Brasil, no existem, at o momento, publicaes que renam informaes agrometeorolgicas sobre as diversas culturas de interesse nacional. Tais conhecimentos, reunidos em um s livro, facilitaro o acesso a informaes fundamentais para o estudo, o ensino e a pesquisa do tema, sendo do interesse de produtores rurais e de profissionais do setor agropecurio, alm de grande utilidade para a operao dos servios agrometeorolgicos, pblicos ou privados.

    3. AGROMETEOROLOGIA, PLANEJAMENTO E TOMADA DE DECISO NA AGRICULTURA

    Informaes agrometeorolgicas so aquelas que consideram os dados meteorolgicos associados aos requerimentos dos cultivos, com o objetivo de estimar os respectivos impactos sobre as culturas e as prticas agrcolas, tanto no mbito do planejamento quanto da tomada de deciso. Por isso, segundo Rijks e Baradas (2000), os Servios Nacionais de Meteorologia tm muito a contribuir com a economia nacional, por meio da divulgao e do uso eficiente de tais informaes.

    As informaes agrometeorolgicas, de acordo com Mavi e Tupper (2004), podem ser empregadas de diferentes maneiras na agricultura. Primeiramente, tais informaes podem ser utilizadas para o planejamento dos cultivos (componente estratgica), tanto na escala macroclimtica quanto topoclimtica. Alm disso, essas informaes podem ser empregadas no processo de tomada de deciso, quanto ao melhor momento para a execuo de diferentes prticas agrcolas (componente ttica). Finalmente, as informaes agrometeorolgicas tambm podem permitir aos sistemas agrcolas adquirir maior capacidade para enfrentar condies meteorolgicas adversas, tornando-os mais resilientes. Nesse contexto, as informaes, quando associadas aos avanos nas reas de agrometeorologia, climatologia, meteorologia, sensoriamento remoto, geoprocessamento e informtica, tm melhorado substancialmente a possibilidade dos agricultores ajustarem suas atividades s variabilidades e mudanas do clima, levando reduo dos riscos na agricultura. No entanto, ainda h muito a ser feito para facilitar a adoo deste conhecimento e difundir sua aplicao prtica na produo agrcola.

    A informao agrometeorolgica pode ser categorizada em trs graus de complexidade. As informaes de primeiro grau, mais simples, so geralmente numricas, a exemplo dos dados meteorolgicos puros ou derivados de clculos simples, como os do balano hdrico climatolgico, que indicam a disponibilidade ou a deficincia hdrica do solo. Informaes de segundo grau so produzidas a partir de dados meteorolgicos e parmetros especficos da cultura. Em geral, expressam o estado ou a resposta da cultura condio meteorolgica observada. O estado da cultura pode ser descrito de diferentes formas como, por exemplo, em relao ao seu desenvolvimento, ou seja, o estdio fenolgico da cultura. Tal estado pode ser caracterizado tambm em funo da satisfao de suas necessidades hdricas e, ou, trmicas, ou mesmo quanto ao desempenho esperado em funo da radiao solar disponvel em dado perodo. Pode ainda informar qual o dano provvel provocado pela ao de ventos intensos, geadas, granizo ou qualquer outro evento meteorolgico adverso. Outros

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    modelos e tcnicas podem considerar um segundo componente biolgico e passam a estimar danos causados por pragas e doenas. A anlise conjunta de todos os fatores que afetam o crescimento da cultura permite reduzi-los a um nico ndice, que se correlaciona diretamente com a produtividade. Por outro lado, a anlise em separado de cada fator permite identificar quais os limitantes do sistema, para cada local, estao de cultivo ou cultura analisada. Por fim, as informaes de terceiro grau so aquelas que indicam qual a ao de manejo mais adequada para o estado no qual a cultura se encontra em dado momento. Devem ser o resultado da adequao das informaes de uma escala nacional ou regional para as particularidades das condies locais. Geralmente, a gerao de tais informaes agrometeorolgicas requer a participao de profissionais experientes e capacitados para interpretar a informao e aplic-la no contexto local.

    A seguir, sero apresentados alguns exemplos de como as informaes agrometeorolgicas podem ser empregadas no planejamento, na tomada de deciso e na obteno de resilincia na agricultura.

    3.1 Planejamento Agrcola

    O planejamento agrcola diz respeito s aes a serem realizadas antes do estabelecimento da cultura, ou seja, quando o empreendimento agrcola comea a ser programado. Em funo disso, o planejamento fundamenta-se, basicamente, nas informaes do clima e de sua variabilidade interanual, no local de interesse. Dentre as informaes agrometeorolgicas empregadas no planejamento agrcola, o zoneamento agroclimtico a mais conhecida.

    O zoneamento agroclimtico a determinao da aptido climtica das regies de um Pas, Estado ou Municpio. Assim, em cada regio, define-se a aptido de cada rea para o cultivo de determinada espcie de interesse agrcola, considerando as exigncias agroclimticas dos cultivos e as informaes macroclimticas. O macroclima ou clima regional condicionado pelos fatores determinantes da macroescala ou escala geogrfica, como latitude, altitude, continentalidade, massas de ar, entre outros. Visto que o macroclima no pode ser alterado pelo homem para se adequar s necessidades dos cultivos, essa informao deve ser a primeira considerada no planejamento de um empreendimento agrcola (PEREIRA et al., 2002).

    O zoneamento agrcola pode ser empregado no somente para a delimitao de reas aptas, marginais ou inaptas s culturas, como realizado por Camargo et al. (1974) para o Estado de So Paulo, mas tambm para o estabelecimento das melhores pocas de semeadura, com base em informaes probabilsticas (ALFONSI et al., 1995), das zonas de maturao de frutos (SENTELHAS et al., 1995), do risco climtico associado aos impactos do dficit hdrico nas culturas (FARIAS et al., 2001), de reas de escape de doenas (ORTOLANI et al., 1986), do potencial produtivo e da qualidade dos produtos (ORTOLANI, 2001). Como se v, h uma variedade de informaes que podem ser organizadas pelo mtodo do zoneamento, que nada mais que a espacializao de uma ou mais informaes combinadas. Dada sua importncia, o zoneamento agrometeorolgico vem sendo empregado por bancos e seguradoras, para subsidiar as aes de financiamento e seguro agrcolas (ROSSETTI, 2001).

    As figuras a seguir apresentam alguns exemplos de mapas de zoneamento agroclimtico. Na Figura 1, observa-se o zoneamento agrometeorolgico da cultura do pssego, no Estado do Paran, realizado pelo IAPAR. Nesse caso, so identificadas trs zonas de cultivo: uma inapta, outra apta para variedades com baixa exigncia em horas de frio e, uma ltima, apta para variedades exigentes em horas de frio. Na Figura 2, para o Estado do Rio Grande do Sul, tem-se o zoneamento agroclimtico realizado pela Embrapa Trigo, para a cultura da cevada cervejeira, com as melhores pocas de semeadura para cada Municpio. Este tipo de zoneamento combina tanto a aptido da regio quanto o perodo mais recomendvel para semeadura. Na Figura 3, encontra-se o zoneamento de risco climtico, produzido pela Embrapa Arroz e Feijo, para a cultura do feijo, no Estado de Gois, considerando-se a semeadura entre 11 e 20 de janeiro. Finalmente, a Figura 4 apresenta o zoneamento agroclimtico para a qualidade da bebida do caf, no Estado de So Paulo (ORTOLANI, 2001), podendo-se observar que as melhores bebidas so produzidas no extremo nordeste do Estado, especificamente na regio.

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    Parte I - Introduo

    Figura 1. Zoneamento agroclimtico para a cultura do pssego, no Estado do Paran. Fonte: http://www.iapar.br/

    modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1087.

    Figura 2. Zonemaneto agroclimtico das melhores pocas de semeadura da cultura da cevada cervejeira,

    no Estado do Rio Grande do Sul. Fonte:http://sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/FontesHTML/Cevada/

    CultivodeCevada_2ed/regionalizacao.htm.

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    Figura 3. Zoneamento agroclimtico de risco para a cultura do feijo, no Estado de Gois, para a semeadura

    entre 11 e 20 de janeiro. Fonte: http://www.cnpaf.embrapa.br/apps/zoneamento/index.htm.

    Figura 4. Zoneamento agroclimtico da qualidade da bebida do caf, no Estado de So Paulo. Fonte: Ortolani (2001).

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    Parte I - Introduo

    Alm do zoneamento agroclimtico, as informaes agrometeorolgicas assumem tambm papel importante no planejamento da agricultura irrigada, sendo o balano hdrico climatolgico a principal informao a ser considerada (PEREIRA et al., 2002). Assim, identifi cando-se os perodos com excedente hdrico e defi cincia hdrica e suas respectivas intensidades (Figura 5), defi ne-se o tipo de sistema de cultivo a ser empregado, sequeiro ou irrigado, e o perodo em que cada um deles deve ser conduzido.

    Quando as necessidades hdricas especfi cas da cultura, representadas pelo coefi ciente de cultivo (Kc), so consideradas, o balano hdrico climatolgico passa a ser denominado de balano hdrico de cultura, sendo neste caso considerado o balano entre a chuva e a evapotranspirao mxima da cultura (ETc). Quando empregado dessa forma, o balano hdrico possibilitar estabelecer, em termos mdios, a lmina de gua a ser aplicada, o turno de rega e o nmero mdio de irrigaes, informaes que auxiliaro no dimensionamento dos equipamentos de irrigao e posterior manejo.

    Apesar de o zoneamento agroclimtico ser uma ferramenta importante no planejamento agrcola, em macroescala, tal recurso no considera as variaes provocadas pelo relevo. Dentro de uma mesma regio ou macroclima, podem existir diferentes condies topoclimticas, estabelecidas em funo do relevo local (PEREIRA et al., 2002 e MAVI e TUPPER, 2004). Em muitos casos, faz-se necessrio que o planejamento agrcola tambm seja realizado de acordo com o topoclima, ou seja, considerando as posies do relevo da propriedade agrcola. Nessa escala, a confi gurao e a exposio do terreno iro induzir a diferenas trmicas e de exposio radiao solar. Um exemplo tpico do efeito do relevo o acmulo de ar frio em certas posies do terreno. Em regies sujeitas s geadas (latitude 20S), deve-se evitar o cultivo de lavouras perenes nas reas de baixada, nos terrenos planos e nas faces voltadas para o sul, com menor exposio aos raios solares, onde as temperaturas so mais baixas.

    Figura 5. Extrato do balano hdrico climatolgico normal, em diversas localidades brasileiras, em que DEF (*-1)

    corresponde defi cincia hdrica, e EXC ao excedente hdrico. Fonte: Sentelhas et al. (1999).

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    3.2 Tomada de Deciso na Agricultura

    Tomada de deciso, segundo Oliveira (2004), a converso das informaes disponveis em ao, ou seja, deciso a ao tomada com base na apreciao de informaes. Decidir recomendar entre os vrios caminhos alternativos que levam a determinado resultado. Na produo agrcola, trata-se das aes a serem realizadas durante o ciclo das culturas, nos momentos mais favorveis, de modo a maximizar a produtividade e, ou, melhorar o aproveitamento de insumos. De acordo com Peche Filho (2009), no h dvidas quanto importncia do processo de tomada de decises na moderna administrao, principalmente naquelas empresas que utilizam a filosofia da qualidade total. Na agricultura no diferente. Sendo assim, tomar decises corretas representa eficincia e competitividade.

    Em termos agrometeorolgicos, a tomada de deciso feita de acordo com as condies do tempo e a disponibilidade de gua no solo. Alm disso, as informaes da previso do tempo podem ser utilizadas para antecipar decises e obter resultados ainda melhores. Para que o resultado de uma deciso seja o melhor, as informaes sobre a resposta das culturas s condies do tempo e clima devem ser precisas e realistas, inclusive sobre sua fenologia e prticas de manejo necessrias. por isso que, de acordo com Mavi e Tupper (2004), a tomada de deciso, com base nas condies meteorolgicas, tem por objetivo criar flexibilidade nos sistemas agrcolas, ou seja, avaliar quais as opes adequadas para cada caso, frente grande variabilidade das condies climticas. Isso se d tanto em termos de produtividade da cultura quanto de eficcia na realizao das prticas agrcolas.

    Existem vrias prticas agrcolas que podem se beneficiar do uso eficiente das informaes agrometeorolgicas, destacando-se: o preparo do solo, a semeadura, a adubao, a irrigao, o controle fitossanitrio, a colheita, etc (RIJKS E BARADAS, 2000). As estimativas da produtividade e da qualidade da produo, assim como da ocorrncia de doenas, tambm assumem papel importantssimo no processo de tomada de deciso.

    Para que os agricultores tomem decises precisas com base no tempo, h necessidade de que os dados meteorolgicos sejam transformados em informaes agrometeorolgicas teis, que possam ser disseminadas de tal forma que os usurios finais possam extrair delas o mximo benefcio possvel, no contexto de suas atividades (WEISS et al., 2000).

    Servios dessa natureza so normalmente prestados por rgos governamentais, constituindo os Sistemas de Informaes Agrometeorolgicas (SISMAs). Atualmente, o Brasil conta com diversos SISMAs em operao, disponibilizando, basicamente, as informaes de primeiro grau e algumas de segundo grau. Os mais conhecidos so o Sistema AGRITEMPO/EMBRAPA, que tem abrangncia nacional, o Centro Integrado de Informaes Agrometeorolgicas, do Instituto Agronmico de Campinas (CIIAGRO/IAC), no Estado de So Paulo, o Sistema de Informaes Agrometeorolgicas do IAPAR, no Estado do Paran, dentre outros. Nestes sistemas, as informaes agrometeorolgicas so divulgadas semanalmente, contemplando os elementos meteorolgicos e o balano hdrico, que auxiliam na previso de safra e na indicao das condies para manejo do solo, bem como para irrigao e controle fitossanitrio. Apesar da importncia destes sistemas, ainda existe uma carncia muito grande de sistemas mais especficos que contemplem as mais diversas culturas e que auxiliem os agricultores mais efetivamente em suas tomadas de deciso. Para que os SISMAs sejam mais efetivos, indispensvel conhecer a influncia de cada varivel meteorolgica na produtividade de cada cultura, considerando os aspectos de importncia para cada espcie, em suas diferentes fases fenolgicas.

    3.3 Resilincia nos Sistemas Agrcolas

    Resilincia um conceito da fsica, utilizado primeiramente pela engenharia, que se refere capacidade de um material sofrer tenso e recuperar seu estado normal, quando suspenso o estado de risco.

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    Parte I - Introduo

    Na agricultura, o conceito foi adaptado, referindo-se capacidade e habilidade dos sistemas agrcolas em enfrentar e superar condies adversas, como clima desfavorvel, epidemias (pragas e doenas), oscilaes de mercados e de custos de produo (MAVI E TUPPER, 2004).

    Em termos agrometeorolgicos, a resilincia depende da adoo de estratgias que reduzam os efeitos adversos do clima nas culturas, como secas, geadas, altas temperaturas, ventos intensos, etc. Sendo assim, as informaes relativas aos efeitos do tempo e do clima nas culturas so cruciais para a definio das melhores estratgias de ao.

    Nesse sentido, as estratgias mais utilizadas e seus respectivos efeitos so as seguintes:a) Diversificao de culturas, cultivares e datas de semeadura reduz a exposio das

    culturas s condies meteorolgicas adversas, em fases fenolgicas crticas, tal como florescimento e enchimento dos gros;

    b) Escolha de cultivares ou variedades variedades e cultivares de uma mesma espcie apresentam diferentes suscetibilidades aos eventos meteorolgicos adversos;

    c) Definio da densidade populacional da cultura em condies de clima adverso, como seca, uma menor densidade populacional resulta em menor competio intraespecfica;

    d) Utilizao do cultivo mnimo ou do plantio direto reduz a evaporao da gua do solo, resultando em melhor uso da gua pelas culturas, dando mais flexibilidade para o escalonamento das semeaduras;

    e) Preparo do solo em profundidade favorece o crescimento do sistema radicular das culturas, permitindo explorar um volume maior do solo, tendo uma maior disponibilidade de gua;

    f) Correo das deficincias nutricionais e controle integrado de pragas e doenas melhoram o vigor das culturas, permitindo maior tolerncia s condies meteorolgicas adversas;

    g) Uso de quebra-ventos reduz a evapotranspirao das plantas, melhorando a eficincia do uso da gua, alm de reduzir o potencial de danos mecnicos cultura;

    h) Uso da irrigao reduz o estresse hdrico e favorece a estabilidade da produo agrcola. Deve ser empregada especialmente nos perodos mais crticos das culturas, como no estabelecimento, florescimento e frutificao;

    i) Uso de telados e coberturas plsticas reduz os danos causados pela ocorrncia de granizo;

    j) Uso de medidas de controle das geadas (arborizao, ventilao, irrigao, aquecimento, nebulizao, etc) minimiza os danos, em anos com geadas mais intensas;

    k) Alocao de culturas e cultivares adequados a diferentes posies do relevo alocar espcies e cultivares mais resistentes ao vento nos locais de maior altitude e, os menos sensveis geada, nas regies de baixada;

    l) Utilizao de reguladores de crescimento vegetal permite inibir, acelerar, retardar ou uniformizar o crescimento vegetativo, o radicular e o florescimento, segundo as necessidades.

    4. CONSIDERAES FINAIS

    Com base no exposto, pode-se concluir que o conhecimento da agrometeorologia dos cultivos essencial para a gerao de informaes meteorolgicas e climatolgicas adequadas s particularidades das diferentes culturas. Tais informaes aplicadas ao planejamento, ao processo de tomada de deciso e ao aumento da resilincia da produo possibilitam uma agricultura mais eficiente, mais produtiva, com menor risco de perdas e maior sustentabilidade.

    Nesse contexto, os Servios Nacionais de Meteorologia so essenciais, no apenas como fornecedores de dados meteorolgicos ou de previses do tempo e do clima, mas tambm como geradores de produtos agrometeorolgicos especficos para cada tipo de cultura, valendo-se, para isso, dos Sistemas de Informaes Agrometeorolgicas.

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    5. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

  • PARTE II

    CULTIVOSTEMPORRIOS

  • 15

    Parte II Cultivos Temporrios

    AB

    AC

    AX

    I

    ABACAXIFoto: Keenan Milligan

  • ABACAXI Getlio Augusto Pinto da Cunha(1)

    Domingo Haroldo Reinhardt(2)

    Otvio lvares de Almeida(3)

    Luiz Francisco da Silva Souza(4)

    1. INTRODUO

    O abacaxizeiro (Ananas comosus var. comosus) uma planta monocotilednea, herbcea, perene, da famlia Bromeliaceae, cujas espcies podem ser divididas em dois grupos distintos, de acordo com os seus hbitos de crescimento: as epfitas, que crescem sobre outras plantas, e as terrestres, que crescem no solo, s expensas de suas prprias razes. O abacaxizeiro pertence ao segundo grupo, mais precisamente ao gnero Ananas, mesmo apresentando algumas caractersticas das epfitas, como a capacidade de armazenar gua em um tecido de suas folhas e, tambm, na axila das mesmas (Collins, 1960). Trata-se de uma planta cultivada em regies tropicais e subtropicais, que apresenta um padro fotossinttico complexo, envolvendo caractersticas das espcies C3 e C4. Apresenta, ainda, de modo alternativo, o metabolismo cido das plantas crassulceas (MAC), das quais o representante mais importante. De acordo com Malzieux et al. (2003), o abacaxizeiro , obrigatoriamente, uma planta MAC.

    A famlia Bromeliaceae consta de cerca de 2.800 espcies, distribudas em trs subfamlias, Tillandsioideae, Pitcairnioideae e Bromelioideae, e 56 gneros. Todas so americanas, com exceo de Pitcairnia feliciana (Aug. Chev.) Harms & Mildbr., nativa da Guin. A maioria encontrada sob condies naturais, em regies tropicais e subtropicais e, apenas algumas poucas, em zonas temperadas (Coppens dEeckenbrugge & Leal, 2003). A espcie Ananas comosus var. comosus a que tem maior importncia econmica, enquanto outras espcies apresentam valor ornamental e, ainda outras, produzem fibras de excelente qualidade para cordoaria e fabricao de tecidos (Collins, 1960).

    A rea de produo de abacaxi segunda fruteira tropical mais cultivada no pas quase dobrou nas ltimas trs dcadas. Hoje, segundo o IBGE (2008), esta rea acha-se em torno de 62 mil hectares, distribudos entre todos os Estados da Federao. Ademais, em termos de valor da produo, o abacaxi a quarta fruta, alcanando, em 2005, R$ 814 milhes, atrs apenas da laranja, banana e uva. O Brasil foi sempre um dos grandes produtores mundiais de abacaxi, atualmente, o segundo maior produtor.

    O consumo domiciliar per capita de abacaxi, de acordo com dados do IBGE (2008), decresceu 17% entre 1996 e 2003. Se, por um lado, houve queda no consumo domstico, por outro, houve um acrscimo de 70% no suprimento per capita de abacaxi, no mesmo perodo. Isso, com certeza, em funo do aumento do consumo de abacaxi sob a forma de sucos, doces e conservas, alm do consumo extra-domiciliar (MAPA/CGPCP/DCAAP, 2007). De acordo com o Instituto Brasileiro de Frutas IBRAF (2007), cerca de 21% do abacaxi produzido no Brasil esto sendo industrializados, e o mercado de abacaxi, minimamente processado, est em plena expanso.

    1.1 Fenologia e Desenvolvimento

    O abacaxizeiro possui um caule ou talo curto e grosso, circundado por folhas estreitas e semi-rgidas, em forma de canalete, ao qual se acham inseridas, tambm, razes axilares. Esta planta produz apenas um fruto em cada ciclo, que se desenvolve a partir de uma inflorescncia terminal.

    O ciclo natural para produzir o primeiro fruto varia, em geral, de 16 a 24 meses, dependendo de a cultivar, das condies climatolgicas (Malzieux et al., 2003) e do manejo da planta. Raramente esse

    1- Eng. Agrnomo, Dr., Pesquisador, EMBRAPA Mandioca e Fruticultura Tropical, Rua Embrapa s/n, C.P. 007, CEP 44380-000, Cruz das Almas - BA. E-mail: [email protected].

    2- Eng. Agrnomo, Ph.D., Pesquisador, EMBRAPA Mandioca e Frut. Tropical. E-mail: [email protected] Eng. Civil, Dr., Pesquisador, EMBRAPA Mandioca e Frut. Tropical. E-mail: [email protected] Eng. Agrnomo, Mestre, Pesquisador, EMBRAPA Mandioca e Frut. Tropical. E-mail: [email protected]

  • Cap. 1 Abacaxi / Cunha, G. A. P.; Reinhardt, D. H.; Almeida, O. A.; Souza, L.F.S.

    18

    AB

    AC

    AX

    I

    ciclo inferior a 12 meses, podendo atingir at 36 meses. Quanto mais fria a regio, mais longo o ciclo.De acordo com Cunha (1998), tal ciclo pode ser dividido em trs etapas:a) fase vegetativa, que pode durar de oito a 12 meses, abrangendo o perodo do plantio

    diferenciao floral;b) fase reprodutiva, podendo durar de quatro a seis meses, envolvendo a florao e a frutificao,

    indo da diferenciao floral colheita do fruto;c) fase propagativa, podendo durar de seis a dez meses, tendo incio ainda na fase reprodutiva,

    mas prolongando-se aps a colheita do fruto, abrangendo o desenvolvimento ou ceva e a colheita das mudas.

    Dessas fases, a que apresenta menor elasticidade a reprodutiva, quer seja desencadeada de modo natural ou artificial. No abacaxizeiro, um nico meristema d origem s folhas durante a fase vegetativa e, s flores, no incio da fase reprodutiva, retomando, posteriormente, o carter vegetativo, formando a coroa do fruto (Clark & Kerns, 1942).

    Durante o estdio de florescimento e, ou, frutificao, o abacaxizeiro produz alguns rebentos ou mudas originadas de gemas axilares, que so usados para multiplicao da planta e para produo de outros frutos, a partir da soca e, ou, de novos plantios. A planta adulta mede de 1,00 a 1,20 m de altura e, de 1,30 a , 50 m de dimetro.

    Razes

    O sistema radicular do abacaxizeiro compacto, fasciculado, fibroso e superficial, com a maioria das razes (80% a 90%) nos primeiros 15 a 25 cm do solo (profundidade efetiva). Esta profundidade pode ser um pouco maior ou menor, em funo da textura (argilosa ou arenosa) e a umidade do solo; algumas delas podem atingir at 40 cm de profundidade, porm, raramente acima de 60 cm (Py, 1969). De acordo com Krauss (1948c), o comprimento das razes pode chegar at dois metros, mas no alcanam mais de 85 cm de profundidade e, assim mesmo, raramente. As razes do abacaxizeiro so sensveis compactao do solo, o que em geral restringe sua distribuio rea arada (Rafaillac et al., 1978 e Ikan, 1990, citados por Malzieux et al., 2003).

    As razes do abacaxizeiro so todas adventcias, o que frequente nas plantas monocotiledneas, podendo ser encontradas em trs zonas do caule: a) na base, a cerca de cinco centmetros, onde as razes penetram no solo; b) na zona mediana, onde as razes so suberizadas e enrolam-se no caule, mas, em geral, no penetram no solo; eventualmente quando isto acontece, so denominadas de secundrias; c) na zona superior, onde as razes so bastante curtas e, tambm, suberizadas, porm no se enrolando no caule.

    Por causa de sua superficialidade, as razes do pouca sustentao s plantas, o que as torna bastante suscetveis ao tombamento (Hayes, 1957), sobretudo durante o desenvolvimento do fruto. Quando se considera o tamanho da parte area da planta (caule, folhas) e do fruto produzido, o pequeno sistema radicular uma peculiaridade notvel do abacaxizeiro.

    Caule

    O caule do abacaxizeiro fibroso e armazena metablitos da fotossntese, contendo reservas de amido. Desenvolve-se a partir do mago semi-elipsoidal da muda usada no plantio e, medida que as novas folhas so formadas pelo seu meristema apical, o caule alonga-se e engrossa. Quando completamente desenvolvido, apresenta-se curto e grosso, com 20 a 50 cm de comprimento, e dimetros de 2,0 a 5,0 cm, na parte basal e, de 5,5 a 8,0 cm, na parte mais larga, logo abaixo do pice (Collins, 1960; Py et al., 1984; Coppens dEeckenbrugge & Leal, 2003), podendo pesar de 400 a 1.000 g. A constituio fibrosa do caule dificulta a destruio mecnica dos restos da cultura.

    Ramos, rebentos laterais ou mudasO abacaxizeiro propagado de forma vegetativa por meio de diferentes tipos de mudas, denominadas

    de filhotes, filhotes-rebentes, rebentes e coroa. Tais estruturas, que se desenvolvem a partir de

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    Igemas axilares, constituem ramos vegetativos com um novo meristema apical. O desenvolvimento das gemas que do origem s mudas comea apenas quando cessa a dominncia do meristema apical, o que ocorre no momento da diferenciao floral. Isso explica a influncia das condies climatolgicas, do nvel de crescimento das plantas e do fitorregulador usado na induo do florescimento sobre o nmero de mudas produzidas por planta.

    Os rebentes so ramos foliceos que se desenvolvem de gemas encontradas, principalmente, na parte basal ou subterrnea do caule. Os filhotes-rebentes so ramos foliceos que surgem de gemas encontradas na zona de transio do caule com o pednculo e, os filhotes, so ramos foliceos que se desenvolvem a partir de gemas axilares de folhas modificadas do pednculo, logo abaixo do fruto (Collins, 1960; Purseglove, 1972).

    Folhas

    As folhas do abacaxizeiro so semirrgidas, em consequncia de seu formato, serosas na face superior, e protegidas por uma camada de pelos (os tricomas), encontrada, sobretudo, na face inferior, que reduz a transpirao. Correspondem a cerca de 90% da massa verde da planta e levam cerca de quatro meses para atingir o pleno desenvolvimento (Malzieux et al., 2003). Este perodo pode se alongar em ecossistemas mais frios.

    A rea foliar total de uma planta, com 3,6 kg de massa verde, pode atingir 2,2 m2 (Py, 1959a). As folhas so arranjadas de tal forma que pouca gua da chuva escorre para o solo e, por serem ligeiramente cncavas, a gua conduzida at sua base, o mesmo acontecendo com o orvalho (Johnson, 1935; Hayes, 1957). Isso aumenta, de modo significativo, a economia de gua da planta e permite, ainda, um melhor aproveitamento da gua de irrigao e das pulverizaes foliares de defensivos e adubos. Sob condies normais, um abacaxizeiro emite de trs a nove folhas por ms, dependendo de sua idade ou estdio de crescimento.

    A epiderme superior formada por uma nica camada de clulas, altamente cutinizadas, caracterizadas pelas paredes laterais onduladas e com maior dimetro perpendicular ao eixo da folha (Krauss, 1948a; Collins, 1960; Py, 1969). Essas paredes onduladas tornam as clulas epidrmicas rgidas, protegendo-as contra estresses hdricos resultantes do colapso do tecido aqufero sub-epidrmico (Nightingale, 1942; Sanford, 1962), sendo uma caracterstica bastante singular do abacaxizeiro. A epiderme da folha, que revestida por uma cutcula lisa e uniforme, possui, internamente, alm do tecido aqufero, o mesfilo, com cloroplastos, onde a fotossntese ativa; alm de feixes vasculares; cordes fibrosos isolados e canais de aerao (Krauss, 1948b; Py, 1969). Logo abaixo da epiderme encontra-se a camada hipodrmica que, juntamente com as clulas de paredes espessas da epiderme, protege a planta contra a perda de gua, a exemplo das demais xerfilas (Krauss, 1948b). Observou-se que as clulas da hipoderme apresentam pigmentos de antocianina (Johnson, 1935), encontrados em muitas variedades de abacaxi, supondo-se que atuem como um sistema de proteo contra a luminosidade excessiva (Bartholomew & Kadzimin, 1977).

    No caso de se desejar estabelecer a massa foliar da planta, sob determinadas condies, isso pode ser feito por meio do clculo da massa foliar terica (MFT). Tal clculo baseia-se na massa da folha D e no ritmo de surgimento de folhas na roseta da planta (Py & Lossois, 1962). A frmula a seguinte: MFT = NF0/2 + (FD4 x NF2/4) + (FD6 x NF4/6) + (FD8 x NF6/8) + (FDn x NFn/n), onde NF0/2 corresponde ao nmero de folhas formadas entre o plantio e dois meses depois; FD4 a massa da folha D quatro meses aps o plantio; NF2/4 o nmero de folhas formadas entre o segundo e o quarto ms aps o plantio e, assim, sucessivamente, at o n-simo ms de induo da florao.

    Estmatos

    A epiderme inferior da folha apresenta, longitudinalmente, uma srie de sulcos pequenos e paralelos, no fundo dos quais se encontram os estmatos (Collins, 1960; Py et al., 1987), arrumados de modo desuniforme e em nmero comparativamente pequeno, isto , em torno de 70 a 85 mm-2 de

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    folha completamente madura (Krauss, 1948b; Py et al., 1987). A abertura ou ostolo dos estmatos fica paralelo ao maior eixo da folha, cujos sulcos so completamente encobertos pelos tricomas. O nmero de estmatos varia de folha para folha, talvez pela influncia do estdio de crescimento da planta (Bartholomew & Kadzimin, 1977). O estmato apresenta uma estrutura pequena, com dimenses mdias de 26,5 m de largura e 24,6 m de comprimento, com uma pequena abertura de 7 a 8 m (Bartholomew, 1975, citado por Bartholomew & Kadzimin, 1977).

    Tricomas

    Os tricomas so projees da epiderme, encontrados em pequenas cavidades, em ambas as faces da folha, sobretudo na inferior, qual confere uma textura macia e cor prateada (Collins, 1960). So numerosos na base da folha e absorvem gua e solues nutritivas e, ainda, protegem a planta contra a perda de gua e excesso de luminosidade, por formarem uma cortina densa sobre a abertura dos estmatos e por alguns deles serem constitudos de clulas mortas (Krauss, 1948b; Collins; 1960; Py et al., 1987; Bartholomew & Kadzimin, 1977).

    Tecido aqufero

    Trata-se de um tecido incolor e translcido, que contrasta com o mesfilo clorofilado da folha (Krauss, 1949), e representa uma das caractersticas anatmico-fisiolgicas mais marcantes do abacaxizeiro. Sua funo mais importante servir como reservatrio de gua, para suprir a planta em ocasies crticas de deficincia hdrica. O tecido aqufero ocupa de 1/4 a 2/3 da seo mediana da folha, o que pode ser visto por meio de um corte transversal e, em geral, no encontrado na extremidade da folha (Bartholomew & Kadzimin, 1977).

    A quantidade de gua armazenada no tecido aqufero pode variar em funo da idade e do sombreamento da planta, da densidade de plantio, da temperatura e da demanda evaporativa da atmosfera (Nightingale, 1942; Krauss, 1949). De acordo com Black (1962), essa diferena na quantidade de gua armazenada pode ser responsvel pela ampla variao na relao gua/matria seca da folha, ao longo do ciclo da cultura.

    Outras funes atribudas ao tecido aqufero so: a) proteger os tecidos assimiladores adjacentes contra excesso de luz, sob condio de alta radiao solar; b) tornar as folhas mais resistentes, em funo da turgidez de suas clulas (Bartholomew & Kadzimin, 1977); e c) avaliar a necessidade de gua pelo abacaxizeiro (Van Lelyveld, citado por Green, 1963; Medcalf, 1982), cujo processo consiste no exame visual do tecido aqufero aps o corte transversal da folha D , a 1/3 de distncia da sua base. A maior ou menor espessura do tecido aqufero indica a necessidade de irrigao. Medcalf (1982) recomenda uma relao de 1:2 entre a espessura desse tecido translcido e a espessura dos tecidos verdes da folha, para plantas em fase de crescimento vegetativo e, uma relao 1:1, para plantas na fase reprodutiva.

    Espinhos

    As folhas do abacaxizeiro so muito fibrosas, tendo um espinho afiado na extremidade, podendo apresentar bordos serrilhados ou espinhosos, o que permite que sejam classificadas em espinhosas, semi-inermes, inermes e com espinhos apenas nas extremidades, a exemplo da cultivar Smooth Cayenne (Johnson, 1935).

    Pednculo

    O pednculo um talo que se desenvolve a partir do meristema apical e que conecta a inflorescncia e, posteriormente, o fruto com o caule, do qual um prolongamento. O pednculo cresce depois da formao da inflorescncia, e seu comprimento varia em funo da cultivar. No pednculo, gemas axilares

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    Ilatentes de algumas folhas modificadas, encontradas logo abaixo da inflorescncia, desenvolvem-se em ramos laterais, denominados de filhotes, que so usados como material propagativo.

    Inflorescncia e flor, Infrutescncia e fruto individual

    Quando a planta atinge a maturidade no seu desenvolvimento, a inflorescncia avermelhada, tipo espiga, emerge no centro da roseta foliar, cerca de cinco a sete semanas aps a diferenciao floral, tornando-se, de forma gradual, cada vez mais proeminente sobre o pednculo (Hayes, 1957; Matos & Sanches, 1989). Na inflorescncia, cada olho representa uma flor individual completa, que se desenvolver em um fruto tipo baga (Johnson, 1935; Hayes, 1957).

    As flores da inflorescncia do abacaxizeiro no se abrem ou amadurecem ao mesmo tempo, e a florao procede de modo espiral para cima, com uma a diversas flores abrindo a cada dia, durante duas a quatro semanas (Sideris & Krauss, 1938; Okimoto, 1948). Em algumas cultivares, porm, a antese ocorre de modo desordenado (Coppens dEeckenbrugge & Leal, 2003).

    A infrutescncia do abacaxizeiro do tipo sorose ou sincarpo, isto , um fruto mltiplo, carnoso, formado pela coalescncia de frutilhos individuais, tipo baga (Johnson, 1935; Sideris & Krauss, 1938; Collins, 1960). Tais frutilhos (olhos), em torno de 100 a 200, se fundem de forma espiralada, em torno de um eixo central, que a continuao do pednculo fibroso, apresentando uma filotaxia 8/21 (Collins, 1960). O fruto individual do abacaxizeiro desenvolve-se, mesmo sem polinizao, por ser partenocrpico, e a infrutescncia pode apresentar vrias formas. O nmero de frutilhos por fruto estabelecido no momento da induo floral (Bartholomew et al., 2003) e, da em diante, o rendimento ser determinado pelo crescimento e expanso do fruto.

    O processo de maturao do fruto do abacaxizeiro praticamente cessa aps a colheita, haja vista que a planta acumula carboidratos nas folhas. Assim, o fruto no dispe de matria prima para produzir slidos solveis totais (acares) nem desenvolver suas caractersticas sensoriais adequadas para consumo, depois de colhido. A casca apenas adquire colorao amarela, dando uma falsa indicao de maturao. Da sua classificao como um fruto no climatrico, possivelmente em funo de ser constitudo por muitos frutilhos individuais, que se encontram em diferentes estdios de desenvolvimento. Da mesma forma como ocorre com a abertura das flores, a maturao dos frutilhos ou frutos verdadeiros acontece de forma progressiva, da base para o topo.

    Coroa

    A coroa a continuao do meristema original do eixo principal ou caule da planta, formando um pequeno ramo, simples ou mltiplo, que pode ter at 150 folhas e pesar de 50 a mais de 500 g. Nas regies tropicais, o tamanho da coroa tende a ser pequeno, em funo do curto intervalo de tempo entre a induo floral e a colheita (Py et al., 1987). A coroa representa um carter que distingue a espcie Ananas comosus var. comosus das outras espcies da famlia Bromeliaceae e, da mesma forma que os demais rebentos, usada como material de plantio. A coroa continua a crescer at que o fruto atinge a maturao, quando, ento, torna-se dormente (Collins, 1960), e apenas retoma seu crescimento quando destacada do fruto, do qual representa de 5% a 40% da massa total (Py, 1969). Prximo da colheita, quando a coroa entra em dormncia, seu comprimento, massa e nmero de folhas atingem os valores mximos (Py et al., 1987).

    2. CONDICIONANTES AGROMETEOROLOGICOS DA PRODUTIVIDADE

    A determinao das relaes de causa e efeito das condies meteorolgicas e a cultura complexa. Em geral, feita por meio de avaliao de dados de crescimento da planta (fotossntese, respirao, abertura estomtica, sanidade e produtividade). Ademais, a dissociao dos efeitos desses fatores na natureza tambm difcil. Verifica-se que a maioria das espcies vegetais possui dezenas de variedades exploradas com fins comerciais, seguramente como decorrncia da busca da melhor

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    interao entre fatores to complexos. Entretanto, isso no ocorre com o abacaxizeiro, pois o que se constata a explorao, quase com exclusividade, de a cultivar Smooth Cayenne em todas as principais regies produtoras de abacaxi do mundo, ao lado de algumas poucas cultivares locais, sem igual abrangncia no mercado internacional.

    As regies localizadas entre os paralelos 25N e 25S so consideradas as mais favorveis ao cultivo econmico do abacaxizeiro (Green, 1963). Estes limites, porm, podem ser estendidos, pois se conhece plantios de abacaxi em regies situadas a 3045N (Assam, na ndia) e 3358S (Port Elizabeth, na frica do Sul), o que demonstra a alta capacidade de adaptao desta planta ao agroecossistema, desde que submetida a um sistema de cultivo adequado. Tanto assim que a maioria dos plantios comerciais de abacaxi, em regies de latitudes mais extremas, encontrada em reas costeiras ou prximas costa e em ilhas, onde os extremos de temperatura e umidade so amenizados pela brisa marinha e, portanto, menos severos que em regies de clima continental, na mesma latitude (Bartholomew & Kadzimin, 1977; Malzieux et al., 2003).

    2.1 Disponibilidade hdrica

    A precipitao um elemento climatolgico de grande importncia para a cultura do abacaxi. A variao na precipitao, nas vrias regies produtoras de abacaxi do mundo, mais marcante que a observada em relao temperatura. O abacaxizeiro tanto cultivado em reas de precipitao em torno de 500 a 600 mm (frica do Sul e Itaberaba/BA, Brasil), quanto em reas onde essa precipitao atinge 3.078 mm (Costa Rica), ou mesmo, at 4.000 mm (Py et al., 1987).

    O abacaxizeiro tido como uma planta com necessidades hdricas relativamente reduzidas, se comparada com outras plantas cultivadas. Como conseqncia de sua baixa transpirao e uso eficiente de gua (UEA), esta planta mantm um alto ndice de rea foliar (> 7) e bons nveis de produtividade durante longos perodos, mesmo sob condies de baixa precipitao (Ekern, 1965; Malzieux, 1991; Zhang et ., 1997). A sua adaptao a condies de deficincia hdrica decorre de uma srie de caractersticas morfolgicas e fisiolgicas, tpicas de plantas xerfilas, tais como: a capacidade de armazenar gua na hipoderme das folhas, de coletar gua com eficincia, inclusive o orvalho, por suas folhas em forma de canalete, e de reduzir, de forma considervel, as perdas de gua (transpirao) por meio de vrios mecanismos. Entre eles, destaca-se a reduo da carga trmica sobre as folhas, em virtude da alta reflexo da superfcie inferior das mesmas, por conta da presena dos tricomas (pelos de cor prateada). Alm disso, a distribuio espacial e o porte ereto das folhas permitem, respectivamente, uma ventilao adequada e uma reduo no ngulo de incidncia dos raios solares. A transpirao minimizada ainda pelo revestimento da epiderme foliar por uma cutcula espessa, pelo fechamento dos estmatos durante grande parte do dia, pela baixa densidade estomtica e pela localizao dos estmatos ao longo de sulcos pequenos e paralelos, protegidos por tricomas, na face inferior das folhas.

    Segundo Green (1963), embora a maior parte do sistema radicular seja superficial, poucas razes mais profundas do abacaxizeiro podem fornecer gua suficiente para a demanda comparativamente pequena da planta. Pesquisas efetuadas no Hava mostraram que foram necessrios de 50 a 60 mL de gua para a produo de um grama de matria seca pelo abacaxizeiro, em comparao com 200 mL de gua demandados pelas plantas mesofticas para produzir a mesma quantidade de matria seca (Sideris & Krauss, 1928; Joshi et al., 1965; Neales et al., 1968). No Hava, foi observado que o consumo de gua de uma planta com 4,2 kg, at a diferenciao floral, foi em torno de 60 L (Py et al., 1987). O abacaxizeiro uma das pouqussimas plantas que pode ser considerada, sob o ponto de vista fisiolgico, como xerfila (Bartholomew & Kadzimin, 1977).

    A taxa de transpirao do abacaxizeiro varia entre 0,12 e 0,5 mg de gua cm-2 de rea foliar h-1, cerca de dez vezes menos que a de plantas mesofticas (Ekern, 1965; Joshi et al., 1965; Neales et al., 1968; Yoder & Bartholomew, 1969; Py et al., 1987). Isso corresponde a uma transpirao de 0,10 a 0,42 mm dia-1 em uma plantao com IAF igual a 7. Esta taxa mais baixa que a da maioria das plantas cultivadas e corresponde a 1/25 a 1/10 da transpirao das plantas mesofticas (Neales et al., 1968),

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    Io que confere ao abacaxizeiro uma alta eficincia no uso de gua. Associe-se a isso o metabolismo cido das crassulceas (MAC), de assimilao de gs carbnico (CO2) predominantemente noturna, caracterstica nica do abacaxizeiro em comparao com as demais plantas cultivadas em grande escala. Apesar de altamente eficiente quanto ao consumo de gua, esse tipo de metabolismo, ao limitar a perda de vapor dgua atravs dos estmatos, tambm limita a entrada de CO2 por eles, resultando numa taxa de assimilao fotossinttica inferior das plantas mesofticas, com metabolismo C3 ou C4. O MAC , portanto, uma adaptao que permite a continuao do crescimento, embora lento, e a sobrevivncia do abacaxizeiro em condies de estresse hdrico severo. Porm, nessas condies, resulta numa baixa produtividade da planta.

    O abacaxizeiro , no entanto, uma planta de MAC obrigatrio e pode mudar para a fixao fotossinttica do tipo C3, quando as condies ecolgicas, sobretudo o suprimento hdrico, so favorveis ao seu desenvolvimento. Assim, para a obteno de produtividade elevada, relevante um suprimento hdrico adequado, via irrigao quando necessrio, de forma que as plantas no sejam impelidas a acionar o seu principal mecanismo de economia de gua, o MAC.

    Outro aspecto importante, quanto ao aproveitamento de gua pelo abacaxizeiro, sua arquitetura e a forma cncava de suas folhas, que permitem captar pequenas quantidades de gua, at mesmo o orvalho. Esta caracterstica, alm de vrias outras j mencionadas, permite a sobrevivncia do abacaxizeiro sob condies de deficincia hdrica prolongada. No entanto, considerando-se a explorao comercial, que visa produo de frutos grandes, o abacaxizeiro requer um total de 1.000 a 1.500 mm de chuva anual, bem distribuda (Collins 1960; Teiwes & Gruneberg 1963; Py & Tisseau, 1965). Py et al. (1987) reportaram-se a uma demanda de gua equivalente a uma precipitao mensal de 60 mm a 100 mm.

    Deve-se considerar, alm disso, a influncia que a chuva exerce sobre a qualidade do fruto e a ocorrncia de pragas. Como se sabe, frutos colhidos em perodos frios e secos so mais coloridos que os colhidos em tempos quentes e midos. Tendo em vista que, na maioria das regies produtoras, as chuvas ocorrem em perodos definidos, apresentando escassez em alguns meses, a irrigao torna-se necessria, apesar de pouco praticada no Brasil. Isso porque, como o abacaxizeiro uma planta de ciclo comparativamente curto, a falta de gua pode limitar seu desenvolvimento e sua produo, sobretudo nos plantios que visam obteno de fruto fora da poca normal de safra e, ou, durante o ano todo. Alguns autores recomendam o uso da irrigao em reas com perodos secos definidos, em especial quando se prolongam por mais de trs meses consecutivos, e em reas de precipitao abaixo de 600 mm. Porm, considera-se importante o uso da irrigao suplementar em todos os plantios comerciais, haja vista a irregularidade das chuvas e a necessidade de se garantir a produo de frutos de boa qualidade.

    Segundo Neild & Boshell (1976), em reas com precipitao anual inferior a 500 mm, o abacaxi s deve ser cultivado com irrigao. Mesmo em reas com precipitao total anual acima deste limite, a irrigao necessria, se ocorrer um perodo de trs meses consecutivos com chuvas inferiores a 15 mm/ms, ou de quatro meses com menos de 25 mm/ms, ou ento, de cinco meses com chuvas inferiores a 40 mm/ms. Souto et al. (1998) e Almeida et al. (1999), em trabalhos realizados, respectivamente, com as cultivares Prola e Smooth Cayenne, em Jaba, Norte de Minas Gerais, verificaram que as parcelas irrigadas com cerca de 780 mm durante o ano, mas que recebiam lminas de gua menores que 15 mm durante seis meses, no produziam frutos, ou, os frutos produzidos no tinham valor comercial algum. Em outras parcelas, que receberam 980 mm de gua, porm com ocorrncia de cinco meses com lminas menores de 40 mm, as produes foram, respectivamente, 133% e 106% menores que as das parcelas que no tiveram problemas de dficit hdrico.

    A necessidade de gua do abacaxizeiro varia ao longo do ciclo da planta e, a depender do seu estdio de desenvolvimento e das condies de umidade do solo, a demanda diria de gua pode ser de 1,3 mm a 5,0 mm (Pinon, 1978; Medcalf, 1982; Combres, 1983; Py et al., 1987). Em geral, a demanda hdrica da planta aumenta com a idade e o grau de desenvolvimento vegetativo atingido. As necessidades hdricas so, portanto, menores durante o incio do ciclo vegetativo. No entanto, o suprimento hdrico crtico durante os primeiros dois meses aps o plantio, fase de emisso de razes (Combres, 1983;

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    Du Pressis, 1989), quando um dfi cit hdrico pode causar desuniformidade no crescimento das plantas, o que prejudicial ao manejo e ao rendimento da cultura. A partir do segundo ms, as necessidades hdricas crescem de modo contnuo, em razo do desenvolvimento da planta, at atingir o sexto ms aps o plantio. A partir da, o consumo de gua mximo e constante, permanecendo neste patamar at a formao total do fruto, mais ou menos 60 dias antes da colheita, quando o consumo volta a decrescer. Neste perodo, a planta, sobretudo, a qualidade organolptica do fruto so bastantes sensveis ao excesso de gua, com um pico de sensibilidade a cerca de um ms da colheita (IRFA, 1984). Nesse caso, aconselha-se a suspenso da irrigao mais ou menos dez dias antes da colheita. Na Figura 1 so apresentados os diferentes estdios de desenvolvimento do abacaxizeiro e seus respectivos valores provveis do coefi ciente de cultivo (Kc), segundo Almeida (2001).

    Figura 1. Estdios de desenvolvimento do abacaxizeiro, com provveis valores do coefi cientes de cultura (kc). (*) A fase de maturao do fruto e colheita completa-se, mais ou menos, seis meses aps o tratamento de induo fl oral.

    Os perodos de diferenciao fl oral e de enchimento do fruto foram considerados por Medcalf (1982) os mais crticos durante o ciclo da planta, em relao aos efeitos negativos do estresse hdrico sobre o rendimento da cultura.

    Uma vez conhecidos os perodos fenolgicos mais importantes para a irrigao, tem que ser defi nida a frequncia desta prtica. Existem diversos parmetros que podem ser utilizados isoladamente ou, de forma mais segura, conjuntamente, para determinar essa prtica. De acordo com Py et al. (1987), deve-se irrigar o abacaxi quando os tensimetros, colocados a 15 cm de profundidade do solo, estiverem marcando 15 kPa.

    A estreita relao observada entre a umidade do solo e a elongao foliar do abacaxizeiro sugere a possibilidade do uso de mensuraes do crescimento da folha, em comprimento, como meio para determinar a necessidade de irrigao (Medcalf, 1982). Outro modo de avaliar a necessidade de gua do abacaxizeiro pelo exame visual do tecido aqufero (Van Lelyveld, citado por Green, 1963; Medcalf, 1982), aps o corte transversal da folha D a 1/3 da altura da sua base, considerando ser esta folha a folha adulta mais jovem que terminou seu crescimento, traduzindo o estdio fenolgico da planta do abacaxi (Py & Tisseau, 1965; Souza et al., 2001). A maior ou menor espessura do tecido aqufero (faixa aquosa translcida) indicar a necessidade de irrigao ou no. Medcalf (1982) recomendou uma relao de 1:2 entre a espessura desse tecido translcido e a espessura dos tecidos verdes da folha, para plantas em fase de crescimento vegetativo e, uma relao 1:1, para plantas na fase reprodutiva.

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    I2.2 Temperatura

    A temperatura o fator que mais limita a expanso da cultura e que afeta o ciclo da planta (Py et al., 1987). O crescimento e o desenvolvimento do abacaxizeiro so bastante influenciados pela temperatura, estando a faixa tima, para o crescimento das razes e das folhas, entre 22C e 32C ou, de modo mais especifico, entre 29 e 32C (Sanford, 1962). Para Bartholomew et al. (2003), as temperaturas timas para o crescimento do abacaxizeiro esto em torno de 30oC, durante o dia, de 20oC noite e, mdia de cerca de 24oC. Por ser uma planta tropical, o abacaxizeiro pode suportar temperaturas mais altas, em torno de 40C, porm, acima dessa faixa ocorrero srios problemas de queima da folha e do fruto, sobretudo se combinadas com alta radiao solar (Bartholomew & Kadzimin, 1977), o que pode, inclusive, causar a morte da planta. Pelo mesmo motivo, essa planta no suporta temperaturas prximas de zero, por muito tempo, apesar de j ter sido observadas temperaturas de 5oC em alguns plantios, sem causar problemas. Embora o abacaxizeiro no apresente perodos de dormncia, seu crescimento bastante reduzido quando as temperaturas baixas prevalecem (Green, 1963). Como se sabe, temperaturas baixas reduzem o tamanho das folhas e a absoro de nutrientes e, via de consequncia, o crescimento e a produtividade. No sul do Brasil, do plantio colheita, decorrem 24 meses, enquanto no norte (prximo ao Equador), esse perodo reduzido para 12 meses.

    Tendo em vista que a localizao de uma rea, em relao ao nvel do mar, influencia a luminosidade, a pluviosidade, a umidade do ar e outros aspectos, a altitude desempenha um papel preponderante na produo do abacaxizeiro. Ademais, considerando-se que esta planta no suporta clima muito frio (Bartholomew & Kadzimin, 1977), sua explorao fica limitada s regies de baixa altitude, onde encontrada a maioria de seus plantios, apesar de existirem alguns em locais acima de 1.000 m (Ceilo: 1.221, Thika: 1.463 m e Guatemala: 1.550 m) (Johnson, 1935; Collins, 1960).

    Observando-se a influncia do termoperodo na elongao da folha central da roseta e na produo de matria seca do abacaxizeiro Smooth Cayenne, notou-se que h uma fraca correspondncia entre o aumento na elongao da folha e a produo de matria seca, e que esta ltima pode ser elevada, mesmo sob temperaturas consideradas subtimas, para o desenvolvimento da raiz e da folha (Bartholomew & Kadzimin, 1977). Alm disso, o pequeno decrscimo na produo de matria seca, correspondente queda de 8C (30/26C - 22/18C), mostra certa capacidade de adaptao de a cultivar Smooth Cayenne a uma ampla faixa de temperaturas, conquanto esses dados tenham sido obtidos com base numa pequena amostra de plantas. Os alongamentos da raiz e da folha so seriamente prejudicados quando a temperatura est abaixo de 21C e acima de 35C (Sanford, 1962). Zhu et al. (1997) observaram que a fixao noturna de CO2, a acidez titulvel, o uso eficiente de gua e o acmulo de biomassa foram mais altos em plantas submetidas a regimes de temperaturas dia/noite de 35/25o e de 30/20oC, em relao ao regime 30/35oC.

    Nas regies quentes e midas, prximas do Equador, a massa foliar exuberante, as folhas so numerosas, largas e flcidas, e a produo de mudas baseia-se quase que exclusivamente nos rebentes (cultivar Smooth Cayenne). J em regies onde a temperatura baixa, o crescimento mais lento, as folhas so retas, rgidas, pequenas e pouco numerosas, e a produo de mudas do tipo filhote abundante (Pinon, 1978).

    A temperatura elevada, juntamente com outros fatores, tambm responsvel pela ocorrncia de fasciao, anomalia que pode atingir a planta no perodo prximo ao florescimento e ao fruto, tornando este ltimo achatado, em forma de leque. A fasciao pode adquirir vrias formas, desde uma coroa dupla at diversos frutos em uma mesma planta, quando o processo desencadeado mais cedo, no ciclo, e atinge o meristema apical (Py, 1949; Jacques-Felix, 1950; Green, 1963; Gonzalez-Tejera & Gandia-Diaz, 1976; Ganapathy et al., 1977). Esta anomalia comum em Singapore Spanish e em alguns clones de Smooth Cayenne, mas no em cultivares do grupo Queen (Collins, 1960). Costuma ocorrer em fase do ciclo em que as plantas apresentam rpido crescimento, quando cultivadas em solos com alta fertilidade, seguindo-se a um longo perodo de seca, e durante a iniciao floral (Collins, 1960; Py et al., 1987). Altas densidades de plantio contribuem para diminuir a incidncia de fasciao, em funo do sombreamento mtuo entre plantas, o que reduz a temperatura em volta do pice

  • Cap. 1 Abacaxi / Cunha, G. A. P.; Reinhardt, D. H.; Almeida, O. A.; Souza, L.F.S.

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    AB

    AC

    AX

    I

    caulinar (Norman, 1977;