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Universidade Federal do Rio de Janeiro O FENÔMENO DA CONCORDÂNCIA NOMINAL EM REDAÇÕES ESCOLARES Mara Pereira Mariano 2013

O FENÔMENO DA CONCORDÂNCIA NOMINAL EM REDAÇÕES

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Universidade Federal do Rio de Janeiro

O FENÔMENO DA CONCORDÂNCIA NOMINAL EM REDAÇÕES

ESCOLARES

Mara Pereira Mariano

2013

O FENÔMENO DA CONCORDÂNCIA NOMINAL EM REDAÇÕES ESCOLARES

Mara Pereira Mariano

Dissertação de Mestrado apresentada ao

programa de Pós- graduação em Letras

Vernáculas da Universidade Federal do

Rio de Janeiro como forma de avaliação

para a obtenção do título de Mestre em

Letras Vernáculas – Língua Portuguesa.

Orientadora: Profª. Doutora Eliete

Figueira Batista da Silveira

Rio de Janeiro

Agosto de 2013

O FENÔMENO DA CONCORDÂNCIA NOMINAL EM REDAÇÕES ESCOLARES

Mara Pereira Mariano

Orientadora: Profª. Doutora Eliete Figueira Batista da Silveira

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós- graduação em Letras

Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte das

exigências necessárias à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas – Língua

Portuguesa.

Examinada por:

______________________________________________________________________

Presidente, Professora Doutora Eliete Figueira Batista da Silveira – UFRJ (orientadora)

______________________________________________________________________

Professora Doutora Silvia Rodrigues Vieira – UFRJ

______________________________________________________________________

Professora Doutora Danielle Kely Gomes - UFF

______________________________________________________________________

Professora Doutora Silvia Figueiredo Brandão – UFRJ, Suplente

______________________________________________________________________

Professora Doutora Christina Abreu Gomes – UFRJ, Suplente

Rio de Janeiro

Agosto de 2013

MARIANO, Mara Pereira.

O fenômeno da concordância nominal em redações escolares.

/Mara Pereira Mariano. - - Rio de Janeiro: UFRJ/ FL, 2013.

XV, 92 f.: il. ; 31 cm.

Orientadora: Eliete Figueira Batista da Silveira

Dissertação (mestrado) – UFRJ/ Faculdade de Letras/ Programa de

Pós - graduação em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa), 2013.

Bibliografia: f. 103-107.

1. Concordância nominal 2. Sociolinguística - Dissertação. I.

Batista da Silveira, Eliete Figueira. II. Universidade Federal do Rio

de Janeiro, Faculdade de Letras, Programa de Pós-Graduação em

Letras Vernáculas. II. O fenômeno da concordância nominal em

redações. Escolares.

Ao meu pai, Jorge,

À minha mãe, Maria de Lourdes,

À minha orientadora, Eliete,

que tornaram possível a concretização

de mais um objetivo profissional.

AGRADECIMENTO

Ao meu amigo Deus, por me conceder saúde e sabedoria, permitindo, assim, que

eu conquiste mais uma realização pessoal. Agradeço por sua fidelidade, seu amor e sua

proteção.

À minha família. Aos meus pais que mesmo não conhecendo o mundo

acadêmico souberam reconhecer minha dedicação e valorizaram o meu esforço.

Também suportaram e abriram mão de muitas coisas para que eu concretizasse os meus

sonhos. Aos meus irmãos e irmãs que me ajudaram, não só financeiramente, mas

também com palavras de encorajamento quando tudo parecia difícil. Aos meus

cunhados e cunhadas que, assim como meus irmãos, me apoiaram antes mesmo de eu

entrar na universidade.

À minha excelente orientadora, Eliete, que além de me orientar, soube me

acalmar, me ouvir e me aconselhar. Agradeço por sua ajuda e dedicação acima do

possível. Com certeza, sem você eu não conseguiria, pois foi o seu empenho que me

deu forças.

Às minhas amigas, Monique, Nathalia, Carol, Cyntia e Cristina que me

incentivaram, mostrando que era possível e que eu conseguiria. Obrigada por fazerem

parte da minha vida e por acreditarem em mim. Também não posso deixar de agradecer

as broncas recebidas quando me viam desesperada sem nem mesmo ter motivos. Não

posso me esquecer também do Bruno que juntamente com a Nathalia fizeram o mapa

que foi utilizado nessa pesquisa.

Ao meu companheiro, meu protetor e grande amigo, Danilo, que ouviu todas as

minhas queixas e aflições e, com palavras precisas, conseguiu me tranquilizar.

Agradeço por admirar todo o meu trabalho e por torcer pelo meu sucesso.

Às instituições de ensino Colégio e curso Esplendor, Colégio Zero Hum, Escola

Municipal Oswaldo Teixeira e Escola Municipal Fernando de Azevedo que, de maneira

solicita, me cederam redações para a construção do meu corpus de estudo. Em especial,

agradeço à Eliaine que com muita boa vontade e persistência me ajudou a

complementar esse corpus.

A todos os professores da UFRJ que contribuíram positivamente para o meu

crescimento intelectual, ministrando aulas de excelente qualidade e sanando minhas

dúvidas. Obrigada pela dedicação, graças a vocês me apaixonei ainda mais pela Língua

Portuguesa.

Finalmente, agradeço à instituição CNPq pelo apoio financeiro que permitiu a

ampliação do meu conhecimento através da aquisição de livros, participação em

congressos e da compra de materiais essenciais à minha formação.

Essa pesquisa recebeu o apoio do CNPq

(maio/ 2012 a agosto/ 2013)

SINOPSE

Estudo do fenômeno da concordância de número

no SN a partir do aporte teórico-metodológico da

Sociolinguística Variacionista. Observação do

fenômeno em textos escritos produzidos por

alunos do ensino Fundamental II de quatro

diferentes instâncias educacionais. Relação entre

as variantes ausência e presença da marca formal

de número e fatores de ordem linguística e social.

Descrição do comportamento desse fenômeno

com base nesses fatores condicionantes.

RESUMO

O FENÔMENO DA CONCORDÂNCIA NOMINAL EM REDAÇÕES ESCOLARES

Mara Pereira Mariano

Orientadora: Profª. Doutora Eliete Figueira Batista da Silveira

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação

em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte

das exigências necessárias à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas –

Língua Portuguesa.

Esta dissertação tem como tema a concordância nominal em redações escolares

do Ensino Fundamental II (6º, 7º, 8º e 9º anos). Verifica-se i) o possível aumento da

marca de concordância em direção às regras previstas na norma padrão, ii) se o aumento

dessa marca de concordância pode estar relacionado à modalidade escrita ou à natureza

da escola (pública x privada) assim como a sua localização, iii) a relação entre maior ou

menor presença da marca e anos de escolarização e iv) os fatores sociais e linguísticos

condicionadores atuantes para o cancelamento da marca. O corpus constitui-se de

redações de alunos do ensino público e privado das localidades Ilha do Governador,

Vila da Penha, Quintino e Santa Cruz. Utiliza-se o escopo teórico-metodológico da

Sociolinguística laboviana. Submeteram-se os dados ao programa variacionista

GoldVarbX. Encontraram-se 2.659 ocorrências e apenas 150 não apresentaram a marca

formal de número (5,5%). A variante prestigiada foi a mais utilizada na produção

textual dos alunos (94,5%). Os resultados evidenciaram que princípios funcionalistas

como o da Economia Linguística, da Distintividade e o Paralelismo Formal atuam no

fenômeno da concordância. Os contextos ausência de marca no elemento precedente e

o numeral favorecem a concordância, e os contextos termo semanticamente plural,

ausência de marca no elemento precedente e presença de marca morfológica no

elemento precedente a desfavorecem. O traço [+ humano] é o mais importante para que

a marca morfológica de plural seja concretizada. As escolas localizadas em Quintino e

Santa Cruz, bem como as séries iniciais (6º e 7º anos) desfavorecem a regra. Por fim, a

Posição linear e relativa do constituinte no SN mostrou que os termos localizados mais

à esquerda do SN favorecem a presença da variante prestigiada -s e os termos mais à

direita do SN desfavorecem a regra padrão.

Palavras-chave: concordância nominal; Sociolinguística; modalidade escrita.

Rio de Janeiro

Agosto de 2013

ABSTRACT

Mara Pereira Mariano

Orientadora: Profª. Doutora Eliete Figueira Batista da Silveira

Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós- graduação

em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte

das exigências necessárias à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas –

Língua Portuguesa.

This dissertation is addressing the nominal agreement in essays of Elementary

School II (6th, 7th, 8th and 9th grades) in order to verify i) the possible increase of the

match mark toward the rules laid down in the standard pattern, ii) the increase in this

match mark may be related to the written or the nature of school (public x private) as

well as its location iii) the relationship between greater or lesser brand presence and

years of schooling and iv) social factors and linguistic conditioners working for the

cancellation of the mark. The corpus consists of essays of students from public and

private schools in different localities as Ilha do Governador, Vila da Penha, Quintino

and Santa Cruz, with the scope of theoretical and methodological assumptions of

Sociolinguistics Labovian. 2659 events were found and only 150 showed no formal

number mark (5.5%). Therefore, the prestigious variant was the most used in the textual

production of the students (94.5%). The results showed that as the functionalist

principles of Economics Linguistics, the distinctiveness and Formal Parallelism act the

phenomenon of agreement. Contexts: absence of preceding element mark and the

numeral, favoring the agreement, and contexts semantically plural term, no mark on the

preceding element and the presence of morphological marks in the preceding element

disfavor. The feature [+ human] is the most important for the brand morphological

plural is realized. Schools located in Quintino and Santa Cruz, as well as the initial

series (6th and 7th grades) disfavor the rule. Finally, the linear and relative position of

the constituent in the SN showed that the terms left-most of SN favor the presence of

the variant prestigious -s and the terms rightmost of SN disfavor the default rule.

Keywords: nominal agreement; Sociolinguistics; writing modality.

Rio de Janeiro

Agosto de 2013

SUMÁRIO

LISTA DE TABELAS..................................................................................................... 14

LISTA DE FIGURAS ..................................................................................................... 15

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 16

2. REVISÃO DA LITERATURA ................................................................................... 21

2.1. Origens do PB ........................................................................................................... 21

2.2. Concordância nominal nas gramáticas normativas .................................................. 24

2.3. Concordância nominal nas pesquisas linguísticas .................................................... 30

2.4. Concordância nominal e o ensino de gramática ....................................................... 39

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................................. 43

3.1. Sociolinguística ........................................................................................................ 43

3.2. Redação como um gênero textual ............................................................................. 48

4. ASPECTOS METODOLÓGICOS ............................................................................. 53

4.1. Constituição do corpus ............................................................................................. 53

4.1.1. Redações ................................................................................................................ 53

4.1.2. Localização das escolas pesquisadas ..................................................................... 54

4.1.2.1. Particulares ......................................................................................................... 55

4.1.2.1.1. Jardim Guanabara – Ilha do Governador ......................................................... 55

4.1.2.1.2. Vila da Penha ................................................................................................... 55

4.1.2.2. Públicas Municipais ............................................................................................ 56

4.1.2.2.1. Quintino Bocaiuva ........................................................................................... 56

4.1.2.2.2 Santa Cruz......................................................................................................... 56

4.1.3. Dados excluídos ..................................................................................................... 59

4.2. Variáveis .................................................................................................................. 60

4.2.1. Variáveis linguísticas ............................................................................................. 60

4.2.1.1. Saliência Fônica .................................................................................................. 60

4.2.1.2. Tonicidade .......................................................................................................... 61

4.2.1.3. Número de sílabas .............................................................................................. 62

4.2.1.4. Posição linear e relativa do constituinte no SN .................................................. 62

4.2.1.5. Marcas no elemento precedente ......................................................................... 63

4.2.1.6. Animacidade ....................................................................................................... 64

4.2.1.7. Tipologia textual ................................................................................................. 64

4.2.2. Variáveis sociais .................................................................................................... 65

4.2.2.1. Ano de escolaridade............................................................................................ 65

4.2.2.2. Gênero/ Sexo ...................................................................................................... 65

4.2.2.3. Localidade .......................................................................................................... 66

4.2.2.4. Natureza da instituição ....................................................................................... 66

4.2.2.5. Faixa etária ......................................................................................................... 67

5. ANÁLISE DOS DADOS ............................................................................................ 68

5.1. Resultados gerais ...................................................................................................... 68

5.2. Análise das variáveis selecionadas ........................................................................... 69

5.2.1. Marcas no elemento precedente ............................................................................ 70

5.2.2. Animacidade .......................................................................................................... 78

5.2.3. Localidade ............................................................................................................. 80

5.2.4. Ano de escolaridade............................................................................................... 84

5.2.5. Posição linear e relativa do constituinte no SN ..................................................... 87

5.3. Considerações finais: comparação de resultados relativos às modalidades escrita e

falada. .............................................................................................................................. 96

6. CONCLUSÃO ........................................................................................................... 100

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 103

ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 1: Gêneros textuais versus tipologia textual ........................................................ 50

Tabela 2: Quantidade de redações por ano de escolaridade, gênero e instituição ........... 53

Tabela 3: Dados estatísticos sobre os bairros estudados ................................................. 58

Tabela 4: Constituição da variável Saliência Fônica ...................................................... 61

Tabela 5: Constituição da variável Tonicidade ............................................................... 62

Tabela 6: Constituição da variável Número de sílabas ................................................... 62

Tabela 7: Constituição da variável Posição linear e relativa do constituinte no SN ...... 63

Tabela 8: Constituição da variável Marcas no elemento precedente .............................. 63

Tabela 9: Constituição da variável Animacidade ............................................................ 64

Tabela 10: Constituição da variável Tipologia Textual ................................................... 64

Tabela 11: Constituição da variável Ano de Escolaridade .............................................. 65

Tabela 12: Constituição da variável Localidade ............................................................. 66

Tabela 13: Atuação da variável Marcas no elemento precedente ................................... 71

Tabela 14: Atuação da variável Marcas no elemento precedente sem os SNs partitivos e

com termo invariável ....................................................................................................... 76

Tabela 15: Atuação da variável Animacidade ................................................................. 79

Tabela 16: Atuação da variável Localidade .................................................................... 80

Tabela 17: Atuação da variável Localidade sem os SNs partitivos e com termos

invariáveis ........................................................................................................................ 82

Tabela 18: Atuação da variável Posição linear e relativa do constituinte no SN ............ 84

Tabela 19: Hierarquia dos contextos de aplicação da regra de concordância em

Camacho (2013) .............................................................................................................. 87

Tabela 20: Hierarquia dos contextos mais favorecedores a regra padrão aos contextos

desfavorecedores ............................................................................................................. 88

Tabela 21: Atuação da variável Ano de escolaridade ..................................................... 95

Tabela 22: Atuação da variável ano de escolaridade sem os SNs partitivos e os termos

invariáveis – concordância padrão .................................................................................. 95

ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1: Mapa sobre as localidades das escolas estudadas ............................................ 59

Figura 2: Gráfico com o percentual de concordância padrão de acordo com a posição

que os termos ocupam no SN .......................................................................................... 96

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema a variação da concordância nominal

(CN) entre os constituintes do sintagma nominal (os docinhos/ todas as bolinha/

porção de pedregulho grosso) na escrita de alunos do ensino fundamental,

observando não só o núcleo, mas também os elementos periféricos às margens

direita e esquerda desse núcleo.

Para a análise, conta-se com corpus coletado em redações escolares

produzidas por alunos do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental II, estratificados

segundo gênero e série, bem como perfil sócio-econômico. Para tanto, as redações

foram aplicadas em quatro escolas: duas públicas e duas particulares. Uma das

escolas públicas localiza-se em Quintino e a outra em Santa Cruz. Já as escolas

privadas, em Vila da Penha e a outra na Ilha do Governador, mais especificamente

no Jardim Guanabara. A seção 3.1.2. traz mais detalhes sobre essas escolas e suas

localizações, apresentando características sociais que são relevantes para o

fenômeno estudado.

O corpus foi constituído de redações produzidas nas instituições de ensino,

observando-se não só a influência da escola para a aplicação da marca de

concordância de número dentro do SN mas também se discutiram considerações

sobre este fenômeno nos compêndios gramaticais, nas pesquisas linguísticas e no

ensino escolar. Além disso, a pesquisa visa a observar a ação normativa da escola e

as possíveis diferenças entre as instituições públicas e privadas, assim como aquelas

advindas da localização de maior ou menor afastamento dessas escolas em relação

ao centro cultural da cidade do Rio de Janeiro.

Desse modo, para este estudo, adota-se a linha teórica e metodológica da

Sociolinguística Variacionista (WEINREICH, LABOV, HERZOG, [1968] 2006),

por se entender que a ausência versus presença da marca de número constitui regra

variável motivada por fatores linguísticos e sociais (extralinguísticos), ou seja, que a

variação é altamente estruturada e regular, quebrando-se a dicotomia “certo” versus

“errado” e instaurando a máxima de que as diferentes concretizações linguísticas são

legítimas e legitimadas pelo sistema da língua; sobretudo, destaca-se a relevante e

estreita correlação entre língua e sociedade. Desse modo, as representações

superficiais da língua estão sujeitadas também ao seu uso no contexto social e

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podem constituir evidências da origem social do falante. Segundo Marta Scherre

(1994, p.2):

(...) a variação na concordância de número no português falado do Brasil,

longe de ser restrito a uma região ou classe social específica, é

característico de toda a comunidade de fala brasileira, apresentando

diferenças mais de grau do que de princípio, ou seja, as diferenças são mais

relativas à quantidade de marcas de plural e não aos contextos linguísticos

nos quais a variação ocorre.

Assim, a concordância nominal é um fenômeno variável de realização versus

não realização da regra e, ainda de acordo com a autora, é uma variação inerente ao

sistema linguístico do falante, já que ocorre em contextos linguísticos e sociais

semelhantes.

Apesar de ser um processo natural, nem toda variante é bem aceita por todos

os membros de uma comunidade de fala, arraigados a uma visão distorcida da língua

e de sua própria norma de uso, uma vez que acreditam deter e usar apenas uma

variedade (a prestigiosa) e esta ser regular e sistemática. Assim, a realização da

variante plural [s] é considerada de prestígio, enquanto a variante zero [0] é

estigmatizada e julgada como “erro” e sinal de não saber falar e escrever o

português. Outra justificativa para a utilização de uma variante em detrimento de

outra é a ideia de pertencimento a um grupo. Sabe-se que os falantes de uma mesma

comunidade compartilham do mesmo juízo de valor sobre determinados traços

linguísticos. Por isso, é comum muitos indivíduos manterem, principalmente na fala,

a variante típica de seu grupo social para não serem “excluídos” e preservarem sua

identificação com este grupo, mesmo que esta variante seja aquela considerada não

padrão.

A despeito de se considerar a existência da variação, sabe-se que todas as

variantes possuem igual valor e não há variante inferior a outra. São os falantes das

camadas mais altas, aqueles que detêm o poder econômico e político, que escolhem e

classificam uma das normas como a padrão, a “correta”. Obviamente que essa escolha

se encontra mais de acordo com a norma utilizada por estes. Dessa forma, foi o grande

preconceito e o estigma pelo uso da variante zero que provocaram o interesse por tal

tema. E devido a esse interesse, buscaram-se estudos recentes sobre o fenômeno da

concordância que apontaram maior uso da marca morfológica de plural entre os

18

falantes, como o trabalho de Scherre e Naro (2006). Os autores comparam três amostras

Censo: 1980 C – amostra aleatória de 64 falantes da comunidade do Rio de Janeiro

gravados no início da década de 80; Amostra 2000-C (amostra aleatória de 32 falantes

da comunidade do Rio de Janeiro gravados no final da década de 2000, e Amostra

2000-I (grupo não aleatório de 16 falantes da amostra de 1980, recontactados no final de

1999 e início de 2000. Há, ainda, o trabalho de Vieira e Brandão (2012) sobre a

concordância nominal e verbal em três variedades do português (PB, PE E PST),

revelando também uma preferência pela concordância. Contudo, ao contrário dos

trabalhos citados, esta pesquisa tratou de averiguar o comportamento do mesmo

fenômeno – concordância nominal –, mas na modalidade escrita da língua e não na

modalidade oral.

Assim, esta pesquisa tentou responder a alguns questionamentos, tais como:

i) a análise da modalidade escrita da língua, mesmo em usuários de pouca

escolaridade, indica que o fenômeno caminha em direção à aplicação da marca de

concordância? ii) que fatores linguísticos e extralinguísticos motivam o

cancelamento da marca de plural? São os mesmos condicionadores da ausência da

marca na fala? E em que medida é possível estabelecer um contínuo que revele a

relação entre a posição dos elementos no sintagma nominal e a maior ou menor

marcação da concordância? iii) qual é o papel da escola quanto ao uso ou ao

cancelamento da marca formal de número? iv) há influência da natureza da escola

(pública ou particular) ou mesmo de sua localização geográfica (Ilha do Governador,

Vila da Penha, Quintino e Santa Cruz) v) é possível estabelecer uma relação entre

presença de marca e comunidades a que as escolas servem?

Diante dessas perguntas, foram criadas algumas hipóteses que ao longo da

pesquisa foram confirmadas ou negadas. Portanto, estão listadas a seguir as hipóteses

iniciais.

Primeiramente, parte-se da hipótese de que a presença da marca de concordância

será majoritária, tendo em vista tratar-se de modalidade escrita da língua e, ainda, que

maior será a concordância quanto maior o ano escolar em que se encontra o aluno. O

aumento do índice de concordância pode estar relacionado à ação normativa da escola,

que é a grande mantenedora da norma padrão.

No que tange aos fatores condicionadores da concordância, cabe discutir e

descrever se são os mesmos que atuam na modalidade falada da língua, apresentando

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diferenças quantitativas relativas aos diferentes anos de escolarização considerados.

Assim sendo, a concordância nas redações escolares ratificaria a hipótese de que se

trata de fenômeno em variação inerente.

Outro pressuposto a ser investigado relaciona-se ao fato de que a coleta de

dados considerar escolas localizadas em diferentes regiões dos municípios do Rio de

Janeiro, que apresentam características sociais distintas, bem como se trata de

instituições públicas e particulares. Acredita-se que haverá comportamento

diferenciado tanto no que se refere à produtividade de construções de SNs quanto no

que se refere à concretização da marca morfológica.

Por fim, intenta-se comprovar que a marcação da concordância no sintagma

nominal se concretiza nos elementos mais à esquerda do núcleo, hipótese já

confirmada em diferentes estudos em que se considera a modalidade falada da língua.

Para conseguir todos esses objetivos e responder a todas as questões aqui

colocadas, a pesquisa teve o suporte teórico-metodológico da Sociolinguística

Laboviana, que conta com o programa estatístico-probabilístico Goldvarb- X, cuja

função é calcular os pesos relativos e, consequentemente, as probabilidades, referentes

a cada variável elencada e, assim, estabelecer aquelas que se mostram mais influentes

para o fenômeno em questão. Os dados analisados foram coletados de redações

produzidas por alunos, do 6º ao 9º ano, da Escola Municipal Oswaldo Teixeira

(Quintino Bocaiuva), da Escola Municipal Fernando de Azevedo (Santa Cruz), dos

colégios Esplendor (Vila da Penha) e Zero Hum (Jardim Guanabara/Ilha do

Governador).

O trabalho se organiza da seguinte maneira, a partir da introdução: no capítulo

dois, há uma revisão da literatura sobre as origens do português do Brasil (PB), sobre

o fenômeno da concordância nominal nas gramáticas normativas e nas pesquisas

linguísticas e, a seguir, uma breve discussão sobre a concordância nominal no ensino

de gramática.

No terceiro capítulo é apresentada, sucintamente, a fundamentação teórica da

Sociolinguistica Variacionista e também a defesa da redação como um gênero híbrido.

No quarto capítulo, descreve-se a constituição do corpus, mostrando a

quantidade de redações coletadas, as características sociais das localidades das escolas

em estudo e os dados que foram excluídos do trabalho, assim como as variáveis

estruturais e sociais que foram utilizadas.

20

Já no quinto capítulo, há a análise dos dados, exibindo os resultados gerais e os

resultados de cada variável selecionada como significativa para o fenômeno em pauta.

Há, ainda, uma consideração final sobre o continuum fala e escrita.

O último capítulo traz as considerações finais da pesquisa, recapitulando, de

maneira sucinta, os resultados encontrados e respondendo, quando possível, aos

objetivos e hipóteses iniciais.

Por fim, cabe destacar as contribuições desta pesquisa, uma vez que focaliza a

concordância nominal em dados da modalidade escrita produzidos por alunos de

séries iniciais em diferentes realidades sociais. Além disso, os resultados podem

indicar caminhos para uma produção textual mais adequada aos padrões de escrita

culta.

21

2. REVISÃO DA LITERATURA

2.1. Origens do PB

Muito se discute sobre as origens do Português Brasileiro (PB), defendendo-se

ora que este tem origens em uma língua geral de base portuguesa (Baxter e Lucchesi,

1997; Lucchesi, 2003; Baxter, Lucchesi, Ribeiro, 2009), num processo de transmissão

linguística irregular, ora que o PB tem suas origens num processo de deriva natural da

língua (NARO, SCHERRE, 1993; 2006; 2007), tendo o suposto pidgin contribuído

muito pouco para o fenômeno variável em questão. Dessa forma, ainda persiste a

discussão sobre o fato de que a ausência de marca flexional de número é uma influência

crioula, devido ao contato do PB com línguas africanas, ou essa ausência consiste em

um fenômeno natural da língua, influenciado por diferentes fatores como a

escolarização, pois não há como provar a existência de uma língua pidgin de base

portuguesa em nenhum documento antigo (NARO E SCHERRE, 2003).

Dante Lucchesi (2003) é o grande defensor da primeira hipótese: Transmissão

Linguística Irregular. Segundo ele, a língua portuguesa aqui no Brasil passou por muitas

mudanças devido ao contato com línguas africanas. Em decorrência desse contato,

surgiu uma língua pidgin, ou seja, uma língua de intercurso que tem como resultado

uma simplificação das estruturas, facilitando a comunicação entre falantes de línguas

diferentes, tanto em uma relação de sujeição quanto para fins comerciais. Porém, a

transmissão dessa língua ocorre de maneira irregular, como acontece no aprendizado de

uma L2; por isso, é comum a redução ou simplificação das estruturas gramaticais dessa

segunda língua adquirida forçadamente, a língua alvo. Entretanto, na aprendizagem de

uma L2, há uma norma alvo consciente, diferente do que ocorre no processo de

pidginização.

Ainda de acordo com Lucchesi (2003), a Transmissão Linguística Irregular

apresenta níveis diferenciados de intensidade. Desse modo, quanto menor for o contato

com a língua alvo, maior é a chance de se formar uma língua tipicamente crioula.

Há algumas características fundamentais que ocorrem no processo de

transmissão linguística irregular como:

I. a perda da morfologia flexional das palavras;

22

II. alteração dos valores dos parâmetros sintáticos em função de valores não

marcados;

III. gramaticalização de itens lexicais para preencher as lacunas na estrutura

linguística.

Todas essas características têm como resultado simplificar a comunicação que

pode ser necessária em diferentes contextos. De acordo com Baxter e Lucchesi (2006),

as variedades populares do português do Brasil sofreram um processo de Transmissão

Linguística Irregular mais fraco, mas, ainda segundo os autores, o PB conserva alguns

traços comuns a uma língua pidgin nos dialetos rurais e populares do país. Alguns

desses traços são i) a ausência de morfologia flexional, ii) a tendência para a ordem

SVO, iii) a redução do sistema pronominal e do uso de preposições, entre outros.

Assim, os autores afirmam que, num processo de transmissão linguística

irregular decorrente do contato entre línguas, sempre ocorre perda da morfologia

flexional. Por isso, acredita-se que a ausência de concordância presente no PB é de

influência crioula.

Contudo, Baxter e Lucchesi (1993; 1997; 2009) afirmam que a variante zero no

fenômeno da concordância aparece tanto em comunidades afro-brasileiras isoladas

quanto pode ser encontrada em regiões rurais do Brasil, mesmo que elas não tenham

recebido contingente significativo de escravos. Essa afirmação dos autores parece

contradizer a hipótese da Transmissão Linguística Irregular, já que, até mesmo em

regiões sem contato com línguas africanas, a variante zero está presente nos falares dos

indivíduos.

Os gerativistas também explicam a hipótese da transmissão linguística irregular.

De acordo com o gerativismo, as crianças aprendem com seus pais uma fala

degenerada. Esse aprendizado corrompido seria suprimido pelas crianças através de

estruturas linguísticas universais presentes na faculdade da linguagem delas. Dessa

maneira, as novas gerações teriam gramáticas diferentes das gerações anteriores, o que

resulta numa mudança linguística entre as duas gerações (NARO e SCHERRE, 2003).

Todavia, estudos comprovam que a fala dos pais pode ser irrelevante para a

aquisição da linguagem pelas crianças. Estas aprendem com outras crianças num

processo de socialização. Ademais, a fala do dia-a-dia não é caótica; estudos mostram

que a taxa de desvio de gramaticalidade na fala não ultrapassa 10% a 15%.

23

Já para Naro e Scherre (2003), a nativização – termo usado no lugar de

transmissão linguística irregular – não é um fator decisivo para a evolução na língua.

Segundo eles, há um jogo de forças que atuam sobre o sistema, fazendo com que haja

variação, e o meio social favorece ou não o surgimento de novas estruturas na língua

transmitida.

Além disso, os autores acham improvável a existência de uma língua pidgin de

base lexical portuguesa, pois já existia no Brasil uma língua geral de base lexical tupi.

Essa língua geral é atestada em documentos históricos diferente da hipótese de língua

pidgin de base portuguesa em que não há nenhum documento que comprove sua

existência.

Porém, Scherre e Naro julgam provável ter ocorrido uma simplificação do

português aqui no Brasil devido ao contato com africanos e árabes. Isso porque até o

século XVI a norma codificada não estava estabelecida plenamente em Portugal.

Também a partir das variações linguísticas atuais dá para se entender o que ocorria no

passado, já que, conforme Labov (1994), os mesmos condicionadores que influenciaram

a mudança no passado continuam atuando até os dias de hoje.

Outros argumentos foram considerados pelos linguistas para mostrar que a

nativização não é suficiente para explicar o enfraquecimento flexional no PB. De acordo

com Naro e Scherre, todas as estruturas consideradas tipicamente brasileiras foram

encontradas em falares rurais e não-padrão do PE. Isso mostraria que a nativização não

provocou variação e mudança, apenas ampliou fenômenos já existentes. Dessa forma,

foi a falta de uma norma estabelecida e aceita que desencadeou uma variação em larga

escala. Portanto, a história sociolinguística do Brasil explica a propagação de

fenômenos variáveis, mas não explica sua origem.

Por todos esses argumentos, os autores acreditam que a variação no PB é um

processo natural da língua. Para eles, o PB é uma continuação do português arcaico com

algumas variações, visto que não há nenhuma característica do PB que não tenha um

registro no português de Portugal.

Apesar de todos os argumentos apresentados anteriormente, Naro e Scherre

(2007) assumem que há uma confluência de motivos que explicam a origem do PB.

Assim, há um conjunto de forças de diversas origens que influencia na ausência de

marca flexional de número no português do Brasil. Segundo Naro, são três motivos que

contribuem para a falta de concordância no PB:

24

I. desenvolvimento interno natural da língua;

II. comportamento pidginizante da parte do europeu;

III. aprendizagem imperfeita pelos falantes de diversas bagagens linguísticas.

Logo, os autores acreditam em uma língua pidginizante, mas por parte do

europeu. Desse modo, a confluência de motivos reafirma a teoria da deriva natural da

língua no PB.

2.2. Concordância nominal nas gramáticas normativas

As gramáticas tradicionais (GT) costumam apresentar um capítulo referente à

concordância nominal e verbal. Nessas gramáticas, também já é possível notar a

variação presente no fenômeno da concordância, apesar de não utilizarem o termo

variação.

Na gramática de Celso Cunha e Lindley Cintra (2007), não há um capítulo à

parte para o tema da concordância nominal. Apesar disso, a concordância de nome

aparece em duas seções da gramática: uma destinada aos adjetivos e outra aos pronomes

possessivos (pp. 284 e 333, respectivamente).

Na seção referente aos adjetivos, os autores mostram a regra geral de

concordância nominal “o adjetivo, dissemos, varia em gênero e número de acordo com

o gênero e o número do substantivo ao qual se refere” (pp.284). A partir desta

definição, Cunha e Cintra apresentam alguns exemplos que comprovam a relação de

concordância existente entre o substantivo e o adjetivo, mesmo que estejam distantes na

oração.

Após os exemplos, os autores descrevem o comportamento do adjetivo a partir

da quantidade de substantivo presente no SN ao qual ele se refere. Desse modo, quando

só há um substantivo, a gramática prevê que o adjetivo concorde em gênero e número

com o único substantivo a que ele se refere (regra geral). Entretanto, quando o adjetivo

se refere a mais de um substantivo, os autores afirmam ser necessário observar (i) o

gênero do substantivo, (ii) a função do adjetivo e (ii) a posição do adjetivo.

Primeiramente, Cunha e Cintra (op. cit.) apresentam o adjetivo na função de

adjunto adnominal anteposto ao substantivo. Nessa posição, segundo os autores, o

adjetivo concorda em gênero e número com o substantivo mais próximo (ex.: Vivia em

tranquilos bosques e montanhas/ Vivia em tranquilas montanhas e bosques). Porém,

25

quando os substantivos forem nomes próprios ou de parentesco, o adjetivo vai para o

plural (ex.: Conheci ontem as gentis irmã e cunhada de Laura.)

Por outro lado, há os adjetivos com função de adjunto adnominal que vêm

pospostos ao substantivo. Nessa parte, os autores mostram que a concordância vai

ocorrer a depender do gênero e do número dos substantivos. Além disso, há em todos os

exemplos, casos mais comuns e casos mais raros de concordância, como se pode ver nas

orações a seguir retiradas do item 1 (pp. 285):

1. Se os substantivos são do mesmo gênero e do singular, o adjetivo toma o

gênero (masculino ou feminino) dos substantivos e, quanto ao número, vai:

a) Para o singular (concordância mais comum):

Ex.: A professora estava com um vestido e um chapéu escuro.

b) Para o plural (concordância mais rara):

Ex.: A professora estava com um vestido e um chapéu escuros.

Nos itens subsequentes, os autores continuam sua análise, observando, no item

2, os substantivos de gêneros diferentes e do singular (Ex.: A professora estava com

uma saia e um chapéu escuro.). No item 3, os substantivos são do mesmo gênero, mas

de números diversos (Ex.: Ela comprou dois vestidos e um chapéu escuro). Já no item

4, os gêneros são diferentes e estão no plural (Ex.: Ela comprou saias e chapéus

escuros); e, por último, há o item 5, que apresenta gêneros e números diferentes (Ex.:

Ela comprou saias e chapéu escuros).

Observe-se que, para um melhor entendimento, foi apresentado, aqui, apenas um

exemplo dos casos mais comuns. Contudo, em cada item, havia dois exemplos

referentes à concordância mais comum e exemplos referentes à concordância mais rara.

Logo, pode-se inferir que os autores têm conhecimento da variação que existe no

fenômeno da concordância, pois apresentaram os casos mais ou menos usuais,

evidenciando a variabilidade da regra formal de número.

Por fim, os autores mostram a regra de concordância quando o adjetivo exerce a

função de predicativo do sujeito composto. Conforme Cunha e Cintra (op. cit.), a regra

para o adjetivo com função predicativa não é muito diferente da regra que funciona para

o adjetivo como adjunto adnominal. Desse modo, os autores só apresentam casos

preferenciais, mas mostram também outras possibilidades existentes. Este fato

26

comprova mais uma vez a variação no fenômeno em pauta e a consciência dessa

variação pelos autores.

Já na seção voltada para os pronomes, os autores apenas afirmam que “o

pronome possessivo concorda em gênero e número com o substantivo que designa o

objeto possuído; e, em pessoa, com o possuidor do objeto em causa (pp. 333).” Além

disso, os possessivos podem concordar com o elemento mais próximo quando se

referirem a mais de um substantivo (ex.: “E o meu corpo, minh’alma e coração/Tudo

em risos poisei em tua mão...” (F. ESPANCA, S, 177.) – pp. 334).

Em outra gramática normativa, a de Rocha Lima (1999) - Gramática Normativa

da Língua Portuguesa -, também não há um capítulo destinado à concordância nominal.

É nos capítulos referentes às funções do substantivo e no do emprego do adjetivo que se

pode encontrar uma sessão destinada à concordância dentro do SN.

No capítulo Funções do substantivo, há uma sessão denominada singular e

plural em que se pode observar o fenômeno da concordância nominal. O autor afirma,

nessa sessão, que o substantivo, quando acompanha certos pronomes indefinidos, com

sentido de quantidade ou algumas expressões, costuma vir no singular. Por exemplo,

(“... quanta vez, rodando aos ventos maus, / O primeiro pegão, como a baixeis,

quebrava!” - Olavo Bilac (pp.291).

É interessante destacar que o autor utiliza a palavra costuma, pois ele não nega a

possibilidade de se flexionar tanto o pronome indefinido como o substantivo. Esta

afirmação pode ser constatada na própria gramática, em que o autor diz ser facultativa a

concordância citada anteriormente e mostra que o próprio Olavo Bilac em outro poema

aplicou a outra regra de concordância:

“Quantas vezes Fernão, do cabeço de um monte,

Via lenta a subir do fundo do horizonte

A clara procissão dessas bandeiras de ouro!” (pp. 292)

Além desse tipo de concordância, o autor mostra que, ao se referir a uma coisa

que pertence singularmente a cada um de vários indivíduos, o substantivo

obrigatoriamente vem no singular (ex.: Eles puseram o chapéu na cabeça e não os

chapéus nas cabeças. pp. 292)

No item 3 e 4, o autor mostra casos em que o substantivo deve ficar no plural. O

primeiro caso refere-se aos substantivos que indicam horas, datas e páginas de livros.

27

Segundo Rocha Lima, tais construções têm origem no uso dos cardinais em vez dos

ordinais (ex.: a ou aos 10 dias de setembro = no décimo dia de setembro).

No item 4, o substantivo vai para o plural, pois está modificando vários adjetivos

que expressam diversas espécies contidas no gênero geral indicado pelo substantivo

(ex.: As línguas portuguesa, espanhola e francesa.). Sobre este item, o autor apresenta

uma nota de rodapé mostrando que também é aceitável usar um artigo antes do

substantivo que se refere a diversos adjetivos. Dessa forma, o substantivo pode ser

omitido e o artigo aparecerá também antes dos outros adjetivos. Veja como fica a

mesma frase agora com este outro tipo de concordância: A língua portuguesa, a

espanhola e a francesa.

Como já foi dito antes, há outra sessão da gramática de Rocha Lima que também

trata do tema concordância nominal. É no capítulo sobre o emprego do adjetivo que se

pode encontrar uma sessão chamada Concordância do adjetivo com o substantivo.

Nessa sessão, o autor mostra que o adjetivo concorda com o substantivo de

acordo com três preceitos gerais. Primeiro, o adjetivo que concorda com apenas um

substantivo deve tomar o gênero e o número desse substantivo: homem alto, mulher

alta, homens altos, mulheres altas (pp.305).

O segundo preceito refere-se à concordância do adjetivo com vários substantivos

de gêneros diferentes e do singular. Neste caso, o adjetivo pode ficar no masculino

plural ou concordar com o substantivo mais próximo: O pai e a mãe extremosos ou

extremosa. (pp.305). Ainda de acordo com o autor, a escolha de uma ou outra

concordância fica sujeita a eufonia e a clareza, conforme a intenção do escritor. Em

outras palavras, pode-se constatar uma variação no que concerne à concordância do

adjetivo com vários substantivos. Contudo, quando o adjetivo está precedendo os

substantivos, obrigatoriamente deve concordar com o primeiro substantivo: Boa hora e

local escolheste! (pp.305).

O último preceito refere-se à concordância do adjetivo com mais de um

substantivo que possuem gêneros e números variados. Segundo o autor, as mesmas

condições do item anterior serão seguidas. Desse modo, há mais de uma possibilidade

de concordância. Veja os exemplos abaixo listados por Rocha Lima (pp.306).

Agastamentos e ameaças fingidos ou fingidas

Prantos, lamentações e magoas dolorosos ou dolorosas

Propósitos e tentativas malogradas

28

Após os exemplos acima, o autor faz uma observação na qual afirma que a regra

lógica é a concordância do adjetivo com todos os substantivos, tendo o masculino plural

a preferência. Entretanto, a eufonia e a clareza podem impor a concordância com o

elemento mais próximo. Mais uma vez, fica claro que o fenômeno da concordância é

variável e está sujeito a influências externas.

Na gramática de cunho pedagógico analisada, a Gramática ilustrada (1982), de

Hildebrando André, há um capítulo referente à concordância nominal. Entretanto, não

há uma definição sobre o que é concordância, e o capítulo já se inicia mostrando a regra

geral em que o adjetivo deve concordar com o substantivo.

Logo após, o autor apresenta os casos especiais. Nessa parte, é apresentada,

primeiramente, a concordância do adjetivo em função de adjunto adnominal, que pode

vir posposto ou anteposto a dois ou mais substantivos. O autor mostra que o adjetivo

posposto pode concordar com o elemento mais próximo ou ir para o masculino plural,

concordando com todos os substantivos. André (1982) apresenta inúmeros exemplos e

faz uma observação mostrando usos mais frequentes em que o adjetivo concorda com o

elemento mais próximo.

Para os adjetivos antepostos aos substantivos, afirma que a concordância é

geralmente feita com o elemento mais próximo e apresenta uma observação de um uso

em que o adjetivo deve ir para o masculino plural mesmo antecedendo um substantivo.

É o caso de adjetivos que se referem a nomes próprios de pessoas ou títulos (ex.: “Como

nos ensinam os grandes Machado de Assis e José de Alencar” – pp.274).

Ainda sobre os adjetivos na função de adjunto adnominal, o autor mostra que é

possível que dois ou mais adjetivos fiquem no singular quando um substantivo está no

plural. Porém, admite construções paralelas (ex.: “os poderes temporal e espiritual”, “o

poder temporal e o espiritual”, “o poder temporal e espiritual” – pp. 274).

A mesma linha de apresentação ocorre com os adjetivos com função de

predicativo. Primeiramente, o autor mostra a regra geral, em que o predicativo concorda

em gênero e número com o substantivo a que se refere, mas se este se referir a dois ou

mais substantivos do mesmo gênero deve ir para o plural, mantendo o gênero dos

substantivos ou indo para o masculino no caso de substantivos de gêneros diferentes

(ex.: “Sócrates e Zico voltaram cabisbaixos da sala do diretor.” / “O namorado e a

namorada passeavam enciumados.” – pp. 274). Contudo, a seguir, ele faz algumas

observações em que o predicativo pode concordar com o elemento mais próximo (ex.:

29

“Estava deserta a vila, a casa, o templo” – pp. 275). Após essas observações, o autor

lista uma sequência de palavras e expressões que podem ser variáveis ou invariáveis no

português, como só, salvo, meio, anexo, etc.

Como se pôde notar mais uma vez, mesmo não mencionando a palavra variação,

o autor não deixou de apresentar exemplos em que é possível perceber a variação

presente no fenômeno da concordância de número. Em todos os casos, há sempre uma

regra, mas que vem seguida de construções que também são aceitas, construções que

diferem daquelas que a regra geral prescreve.

Também Celso Pedro Luft (1989), em sua Gramática Resumida, apresenta uma

sessão sobre o tema concordância, que compõe a terceira parte de sua gramática,

destinando-se especificamente ao estudo da sintaxe do português.

Apesar de uma sessão à parte para o estudo da concordância, essa sessão é bem

resumida e trata tanto do fenômeno da concordância nominal como também da

concordância verbal. Primeiramente, o autor define o que é concordância, afirmando ser

um princípio em que termos determinantes se adaptam às categorias gramaticais dos

termos determinados. A seguir, Luft (op. cit.) mostra que há dois tipos de concordância

no português: (i) a do adjetivo, artigo, numeral e particípio com o substantivo a que se

referem e (ii) a do verbo com o seu sujeito. Após esta explicação, o autor apresenta

alguns exemplos, mostrando como os elementos concordam um com os outros dentro de

um SN ou de uma oração (ex.: “flores belas”, “estas mãos”, “as plantas”, etc. – pp.

126).

Para finalizar este capítulo sobre concordância, o autor traz um comentário sobre

a NGB, afirmando que esta não se refere às concordâncias anômalas e estilísticas, mas

diz que o professor pode abordar esses casos especiais em suas aulas e encaminha o

leitor para a sessão sobre Figuras de sintaxe, mais adiante em sua gramática. Nessa

parte destinada às figuras de sintaxe, o que se pode observar são os casos de silepse em

que, segundo o autor, a concordância se faz pelo sentido e não pela forma, ou seja, a

concordância é feita com um elemento que está implícito e expõe exemplos de silepse

de gênero, número, pessoa e gênero e número (ex.: “Vossa senhoria é generoso.” / “Se

essa gente que busca ouro Hemisfério/Não queres que padeçam vitupério” (Os Lus., I,

38, 3 e 5) / “Os brasileiros somos bons improvisadores.” / “O Amazonas é caudaloso.”

– pp. 162).

30

Ainda sobre a gramática resumida de Luft, há outras sessões que fazem

referência ao termo concordância, especificamente a nominal. No capítulo sobre

adjetivo e artigo, o autor, na parte da flexão desses elementos, afirma que essas classes

manifestam ou recebem as categorias gramaticais de gênero e número do substantivo a

que se relacionam. Já no capítulo sobre numeral, o autor só apresenta aqueles numerais

que são variáveis e os que são invariáveis. Semelhantemente, ocorre com os pronomes.

Já sobre o particípio, o autor comenta que, quando este funciona como um adjetivo,

concorda com o substantivo (ex. “pessoas estimadas” – pp. 99). Desse modo, Luft (op.

cit.) não mostra como o fenômeno da concordância é variável e nem apresenta aqueles

exemplos clássicos da gramática tradicional em que se percebe nitidamente a variação

de número existente no português.

Luft (1996) elabora uma nova gramática, que, segundo ele, seria uma nova

edição da sua última Gramática Resumida, mas, em função dos avanços da linguística

moderna, alterou bastante o texto anterior, transformando-o em outro livro e, por isso,

não seria mais uma reedição daquela gramática precedente.

Apesar da afirmação de Luft sobre a influência de novas teorias gramaticais

sobre seu trabalho, em relação ao fenômeno da concordância, não há nenhuma

novidade. As mesmas informações trazidas pela Gramática Resumida (1989)

permanecem. Assim, para o tema da concordância, o autor não trouxe nada relevante

que pudesse interessar àqueles que estudam o fenômeno em questão.

2.3. Concordância nominal nas pesquisas linguísticas

Diferente das gramáticas citadas no item anterior, a gramática descritiva de

Ataliba de Castilho apresenta uma visão diferente sobre o fenômeno da concordância.

Nessa gramática, é possível notar o conhecimento do linguista sobre os fenômenos

variáveis da língua e não traz uma lista de classificações, mas sim apresenta resultados

de pesquisas sobre variados fenômenos do PB, mostrando o que há por trás destas

classificações presentes em muitas gramáticas normativas. Essa gramática é a Nova

gramática do português brasileiro (2010), de Ataliba T. de Castilho.

Sobre o fenômeno da concordância, pode-se afirmar que há duas sessões

destinadas ao tema. No capítulo seis de sua gramática, o autor apresenta algumas

propriedades e princípios referentes à sentença. Na sessão que trata do Princípio de

31

Projeção e a Concordância (pp. 272), Ataliba apresenta uma definição de Trask (2004)

sobre o que é concordância e as três maneiras de fazê-la: (i) um termo pode concordar

com outro (concordância gramatical – ex.: “A totalidade dos entrevistados deixou de

comparecer.”), (ii) um termo pode concordar com o sentido do outro (concordância

semântica – ex.: “A multidão, depois do cerco da polícia, foram saindo de fininho.”) e

(iii) um termo do enunciado pode concordar com um participante da enunciação

(concordância discursiva – ex.: “Eu fiquei encantada com tudo aquilo.”). Após esta

explicação, o linguista apresenta uma definição sobre o que é concordância nominal,

mostrando os contextos em que ela pode ocorrer.

O adjetivo em posição predicativa concorda com o sujeito em gênero e

número; o adjetivo em posição atributiva, bem como os determinantes e

quantificadores, concordam em gênero com o núcleo nominal da construção

que pertencem” (Xavier; Mira Mateus, (orgs.), 1990–1992 apud CASTILHO,

2010: pp. 273).

Já o décimo primeiro capítulo trata do sintagma nominal, apresentando sua

estrutura e colocação, além de expor a concordância entre seus constituintes. Nessa

sessão, o autor cita os trabalhos de Scherre (1988, 1996), exibindo resultados, que

afirmam serem sofisticadas as regras de concordância na modalidade popular do PB.

Ainda apresenta alguns resultados de Scherre (1988, 1996), que concluiu que, no

português do Brasil, as classes morfológicas se distinguem em sua marcação de plural,

pois aquelas que funcionam como especificadores são mais marcadas assim como as

palavras em que a distinção entre a forma singular e plural é mais acentuada. Por outro

lado, os substantivos e adjetivos no diminutivo são menos marcados, exceto se

estiverem na segunda posição.

Ainda sobre Scherre (1988, 1996), o elemento pré-nuclear é aquele mais

marcado, destacando Castilho (2010) que a descoberta mais interessante é a de que

“marcas levam a marcas e zeros levam a zeros”. Os estudos sobre a concordância de

Scherre contrariam outros resultados que mostravam que a concordância do português

do Brasil tendia a uma simplificação ou até a um desaparecimento, pois o que se pode

ver é uma variação condicionada a contextos que ora favorecem a marca formal de

número, ora a desfavorecem.

Castilho (op. cit.), assim como Scherre (op. cit.), questiona o Princípio da

Economia, já que parece que os falantes não estão economizando nada. Scherre diz que

32

as marcas de número são distribuídas de acordo com um mecanismo de gatilho, em que

a presença de um {-s} no primeiro elemento leva a presença de outros {-s}, e sua

ausência influencia na ausência de {-s} nos termos seguintes (ex.: “Milhares de coisas”

/ “Porçãoᴓ de coisaᴓ”. – pp. 461).

Como foi possível perceber, essa gramática difere das demais por seu caráter

descritivo, pois não mostra listas de exemplos comuns e raros do português e muito

menos traz regras de concordância. Aqui é possível perceber a variação do fenômeno

estudado e também que elementos influenciam a concordância nominal.

Há também muitos trabalhos sobre o fenômeno da concordância e, a partir dos

resultados alcançados, pôde-se perceber o quanto esse fenômeno no português do Brasil

é complexo, mostrando-se ora como um sistema que caminha em direção à perda da

marca morfológica de número e ora como um sistema que representa uma variação

estável. Essa diferença é perceptível, principalmente, quando se observam falantes de

diferentes níveis de escolaridade.

Em estudo mais recente, Naro e Scherre (2004) afirmam que o fenômeno da

concordância pode ser interpretado como uma “mudança sem mudança”, já que a

mudança que ocorre é quantitativa e não qualitativa:

no sentido de que é uma variação que não reflete mudança clara para todos os

falantes nem reflete apenas uma linha de mudança, embora estejamos

capturando aumento de concordância em função de maior exposição ao

ambiente escolar, seja em termos de grupo ou de indivíduo, e também

aumento de concordância em faixas etárias mais jovens, com um vislumbre

de mudança geracional (NARO e SCHERRE, 2006).

Desse modo, percebe-se que a variação que existe no fenômeno em pauta não se

manifesta igualmente entre todos os falantes. Além disso, não há uma única linha de

mudança, pois, apesar de muitas amostras revelarem um aumento dos índices da

variante padrão -s, sem as fortes amarras sociais de prestígios, poderia haver uma

reversão nesse fenômeno em direção à diminuição da marca morfológica de número.

Entretanto, na amostra analisada, os autores mostraram um aumento de concordância

devido à influência da escola. (pp. 120).

Por isso, Naro e Scherre (2004) afirmam que o melhor modelo para explicar o

fenômeno da concordância de número no PB é o modelo do fluxo e contrafluxos, que

representa uma mudança superficial, em que falantes ou grupos de falantes apresentam

maior ou menor índice de concordância em termos de percentuais globais, devido ao

33

movimento desses indivíduos por diferentes ambientes sociais. Isso revela que os

falantes brasileiros, independentes do nível de escolaridade, podem fazer mais ou menos

concordância, a depender do seu interlocutor e da formalidade de uma conversa, de

maneira inconsciente.

Scherre (1988), em sua tese de doutorado, já mostrou como há no PB duas

situações distintas em relação à concordância nominal. Segundo a autora, nos falantes

de concordância alta, percebe-se uma variação estável com uma gradação etária; já nos

falantes com baixa concordância, o que se nota é uma mudança em direção a um

sistema de perda da concordância (pp. 509). Além disso, Scherre (1988) afirma que as

diferenças entre os falantes do PB são mais quantitativas do que qualitativas, já que os

mesmos condicionadores influenciam tanto os falantes mais escolarizados quanto os

menos escolarizados. A autora também mostrou que a variação é inerente ao falante,

pois grupos de indivíduos apresentaram comportamento uniforme em relação às

variáveis linguísticas importantes como saliência fônica e posição linear. Scherre

(1988) também negou a influência de processos descrioulizantes1, mas confirmou o

forte papel da escola como responsável pela manutenção da variante de prestígio.

Outro trabalho interessante sobre concordância, tanto nominal quanto verbal, é o

trabalho de Scherre e Naro (1998), que mostrou como a variação de número no PB

apresenta um sistema perfeito em que é possível prever em quais contextos os falantes

são mais propensos a não realizar ou a realizar a regra de número, já que a variação não

é aleatória. Nesse trabalho, os autores concluíram que a variação da concordância está

internalizada na mente do falante do português do Brasil. Além disso, é um fenômeno

altamente estruturado tanto por fatores linguísticos quanto por fatores sociais.

Além de Naro e Scherre, há outros linguistas que também estudaram o fenômeno

da concordância. Brandão (2011) observou a concordância nominal em duas variedades

do português: a brasileira e a de São Tomé e Príncipe (PST). Comparando essas duas

variedades, a autora notou que a variante padrão e a estigmatizada (ausência de

concordância) estão presentes tanto no PB quanto no PST e que, em ambas as

1 O processo descrioulizante é um ato de descrioulizar, de reestruturar uma língua crioula, conforme as

regras e influências de uma língua padrão. Isso ocorre devido à falta de prestígio que é atribuída à língua

crioula. Desse modo, essa língua desprestigiada sofre interferências de uma língua de prestígio e aos

poucos vai desaparecendo.

34

variedades, há condicionamentos de ordem estrutural e social que influenciam no

cancelamento ou não da marca de plural.

Os resultados provaram também que houve pouco cancelamento da marca

formal de número nas duas variedades estudadas e que em ambas há uma tendência dos

elementos pré-nucleares receberem mais marcas de número. Além disso, a variável

posição linear e relativa dos constituintes do SN apresentou o mesmo padrão estrutural

nas duas amostras.

Contudo, a autora apresenta algumas diferenças entre o PB e o PST. Uma delas é

que a variável nível de escolaridade se mostrou mais relevante no PST, em que há uma

ordem gradativa de cancelamento da marca desde o indivíduo de nível fundamental até

o de nível superior. Já no PB, há uma oposição entre os indivíduos de nível superior e os

de nível fundamental e médio. Outra diferença foi percebida na variável processo

morfofonológico de formação de plural, que se tornou importante apenas no português

do Brasil, enquanto as variáveis gênero e contexto fonológico foram significativas

somente no português de São Tomé e Príncipe. Diante desses resultados, a autora chega

à conclusão de que as duas modalidades apresentam divergências, mas também

convergem em diversos pontos.

Em outro trabalho, Brandão e Vieira (2012) compararam o comportamento da

concordância nominal e verbal no PB, PE e PST e concluíram que, nas três variedades

do português, há preferência pela variante padrão, embora no PE, este fenômeno seja

considerado como uma regra categórica, enquanto no PB e no PST é uma regra variável.

Ademais, as autoras mostraram que a preferência pela concordância decorre do acesso à

escola por parte dos indivíduos e que há variáveis estruturais nos níveis sintáticos e

semânticos que atuam igualmente no PB e no PE.

Mais um trabalho importante sobre concordância é o de Monguilhott (2011)

sobre a concordância verbal de 3ª pessoa do plural em redes sociais2, no intuito de

investigar as diferentes práticas sociais em que os informantes estavam envolvidos. Para

2 Entende-se por rede social do indivíduo o total de relacionamentos em que este se envolve, nas ligações

sociais estabelecidas por ele (familiar, de vizinhança, numa entidade representativa). Nessas redes, há

laços sociais em comum a que estariam vinculados laços linguísticos, o que implicaria que “as pessoas

envolvidas em redes sociais mais fortes poderiam afetar o comportamento e as atitudes umas das outras,

incluindo as normas linguísticas”, tendendo a manter o uso de dialetos locais. Já os indivíduos envolvidos

em redes sociais mais fracas resistiriam menos às influências externas e, consequentemente, seriam mais

susceptíveis a variações e mudanças tanto linguísticas quanto comportamentais (VALIN, 2009).

35

isso, considerou duas variedades do português: PB e PE, contrapondo zona rural e

urbana.

Nesse artigo, tanto no PB quanto no PE, as comunidades não urbanas

apresentaram-se como mais densas, ou seja, as comunidades se relacionavam mais

intensamente, eram mais solidárias entre si. Por isso, em ambas as variedades do

português, essas comunidades rurais apresentaram mais a variante não padrão, enquanto

as zonas urbanas, menos densas e com relações menos estreitas, usaram mais a variante

de prestígio.

É interessante notar que, nesse artigo, a autora mostrou resultados que revelam

uma diferença entre rural e urbano. Tal diferença permite considerar a concordância do

PE, observando-se apenas as frequências, como uma regra variável, pois alguns grupos

de falantes, aqueles menos integrados com sua comunidade, chegaram a apresentar 88%

da variante padrão. Além disso, indivíduos com pouca mobilidade também marcaram

menos (90%). Assim, nota-se que o fenômeno operou com frequência entre 5 – 95%,

podendo ser classificado com um fenômeno de regra variável3, conforme aponta Labov

(2003). No português do Brasil, os percentuais foram ainda menores e, como já se sabe,

esse fenômeno no PB apresenta uma regra variável.

Outro trabalho que observa a procedência geográfica – rural e urbano – dos

informantes é o artigo feito por Lemos (2010). Nesse trabalho, cujo título é A

concordância nominal na fala dos estudantes da rede pública de ensino de Santo

Antônio de Jesus – BA, a autora analisa a fala de dez alunos da rede pública,

provenientes da antiga 5ª série (atualmente, 6º ano).

Os resultados dessa pesquisa mostraram uma tendência à não marcação de

número (60%), e a autora afirma que esses falantes ainda se encontram em processo de

variação em curso, pois não apresentaram “altos níveis de ausência da marca de plural

em algum dos itens flexionáveis” (pp. 13). Porém, a própria autora mostra as limitações

do projeto, que só analisou estudantes de uma série. Sobre a variável procedência

geográfica, a autora não encontrou nenhuma diferença significativa, já que o peso

relativo para a não aplicação da regra nos falantes da zona rural estava bem próximo do

peso relativo dos falantes urbanos (.50 e .49, respectivamente). Já a variável gênero

revelou que os estudantes do sexo feminino marcaram mais que os do sexo masculino.

3 Sobre isso, ver item 3.1.

36

A autora também ratifica a afirmação de Scherre (1994) sobre a inerência do fenômeno

da concordância nominal no português falado do Brasil, visto que os contextos

linguísticos e sociais, no que concerne ao fenômeno da variação de número, são os

mesmos.

Há, ainda, um trabalho de Silva (2008), que faz um estudo comparativo das

décadas de 70 e 90. Nesse trabalho, o autor desejava (i) verificar se havia uma tendência

em direção a não marcação de número no PB e (ii) comparar o fenômeno da

concordância nos anos de 70 e 90, atestando ou não se houve uma mudança de

parâmetro na concordância do português do Brasil.

Esse trabalho observou entrevistas do tipo DID (documentador – informante –

documentador) do projeto VARPORT. Eram seis entrevistas dos anos 70 e sete dos

anos 90 e foram analisados 401 dados: 184, na década de 70 e 217, na década de 90. Os

resultados desse trabalho confirmam resultados de Scherre (1988), que afirma não ser a

primeira posição do SN que determina o índice de marcas plurais, mas sim a relação da

classe não-nuclear com o núcleo. Desse modo, a classe anteposta ao núcleo é mais

marcada do que a classe nuclear e a não nuclear posposta ao núcleo.

Além da variável posição do elemento no SN, a variável tonicidade também se

mostrou condicionadora do fenômeno da concordância. Dessa forma, os monossílabos

tônicos e os proparoxítonos foram categoricamente marcados. Entretanto, vale ressaltar

que os monossílabos são os elementos que aparecem em posição pré-nuclear e, por isso,

foram tão marcados.

Sobre a variável década, foi possível notar que, na década de 70, a concordância

se mostrava levemente mais marcada, visto que apresentou apenas 2% de não

concordância, ao passo que a década de 90 apresentou 15% de não concordância do

total de ocorrências. Apesar dos resultados, tal fato deve se justificar pela natureza dos

dados que precisariam ser melhores analisados.

Vale citar, ainda, o trabalho de Capellari e Zilles (2002), intitulado A marcação

de plural na linguagem infantil – estudo longitudinal. Nesse trabalho, as autoras

observam a fala de uma criança de classe média de 4 a 8 anos de um projeto

denominado DELICRI (Desenvolvimento da Linguagem da Criança em Fase de

Letramento) do Rio Grande do Sul, durante os anos de 1992 a 1996, em uma escola

particular de Porto Alegre. O corpus foi constituído de dezoito entrevistas, de duração

em torno de dez minutos.

37

Nesse trabalho, não estava sendo observada a emergência da marcação de plural

na fala da criança, mas sim em que medida a fala da criança é compatível com a fala de

um adulto. Além disso, as autoras também se interessam pela fase de alfabetização, pois

é o momento em que a criança é exposta a língua padrão.

O primeiro ponto destacado pelas autoras é o baixo número de SNs plurais por

cada faixa etária. No total, havia 126 SNs e, dentre esses, 50 eram de SNs padrão e 76

não padrão. Esses dados foram divididos em relato pessoal e contando historinha, pois

as autoras estavam observando a influência do texto escrito na fala da criança. Com

isso, elas perceberam que havia mais SNs do tipo padrão, quando as crianças contavam

alguma historinha, influência do texto escrito que pode ter sido memorizado por ela.

Outro dado interessante apresentado pelas autoras é o fato de a marcação de

plural aparecer somente no possessivo em SNs como a minhas prima. Segundo elas,

isso ocorre devido a um processo assimilatório entre o artigo e o possessivo em que a

marca de número continuaria no primeiro elemento do SN “aminhas prima”.

As autoras concluem em seu trabalho que há algumas semelhanças entre a fala

infantil e a fala adulta, como o desfavorecimento da regra de marcação de número nos

itens diminutivos, assim como em SNs que apresentam uma preposição entre

constituintes sintáticos (Milhares de borracha). Elas também questionaram a variável

posição nuclear e não-nuclear, porque perceberam que alguns elementos não fazem

parte da estrutura do SN como o operador todos. Com base em outros estudos, as

autoras mostram que esse quantificador tem algumas peculiaridades que o deixam fora

de um SN. Assim, o operador todos é o único que pode preceder pronomes e, além

disso, pode se movimentar para depois do SN, depois do verbo e até para o fim da

oração (apud PONTES 1996). Já Perini (1998 apud CAPELLARI e ZILLES, 2002)

considera esse operador como um predeterminante devido ao seu movimento (Todos os

meninos saíram ou Os meninos todos saíram).

Por fim, as autoras afirmam que a influência da escola não pôde ser vista

claramente nesse trabalho, mas foi possível ver que a criança põe em prática duas

gramáticas, a depender do contexto discursivo em que esteja inserida. Assim,

comprovou-se a influência de textos escritos, estimulando o uso dos plurais do tipo

padrão na fala da criança, quando estas contavam historinhas. As autoras concluem

dizendo que cabe à escola incentivar a leitura desde a infância, pois assim os alunos

38

terão mais chance de assimilar as regras formais de marcação de número do que ensinar

exercícios mecânicos de não “comer” os -s.

Cabe, enfim, apresentar algumas considerações acerca da variação de número na

modalidade escrita. Christino e Silva (2012), em texto intitulado Concordância verbal e

nominal na escrita em Português-Kaingang, apresentam interessantes observações

sobre a escrita do português por falantes bilíngues indígenas. Sobre a concordância no

sintagma nominal, os resultados revelaram que cerca de 40% das ocorrências

apresentam marca de número somente no elemento mais à esquerda (“eu sempre ficava

com dúvida nas aulaᴓ de Antropologia”; “e as apresentaçãoᴓ dos trabalhoᴓ na frente”),

fato considerado natural, visto que essa é a estratégia também empregada pelo

português popular com que os indígenas têm contato. Houve, ainda, um pequeno índice

(9%) de marcação nos primeiros elementos do SN (“eu vi, e ouvi muitas coisas

interessante”). No entanto, chama a atenção a ausência de marcação de número no

determinante mais à esquerda do núcleo do SN (“limpar o cemitérios”; “e que cada

aluno valorize este cursos, para sua vida profissional e trabalhar em sua

comunidades”; a funções dos pein era de cuidar do bem estar do rezadores e marcar

as sepulturas do mortos recentes”), estratégia recorrente em 41,3% dos produtores de

texto (57 autores). As autoras sugerem que tal fato se deve à influência da língua

materna dos professores indígenas (Kaingang), cuja prevalência é ser uma língua de

cabeça à direita, ou seja, a marcação das categorias morfossintáticas se dá na porção

direita do SN, diferentemente do que ocorre com o português popular. No corpus

analisado, encontraram-se algumas estruturas semelhantes às dos indígenas:

<a> olimpíadas é um evento que deixa todos esperançosos, ansiosos e confiantes (aluna do 8º ano – do colégio ZeroHum – Ilha do Governador)

Chapeuzinho pegotou para que <esse > olhos tão grande (aluna do 6º ano – da Escola

Municipal Oswaldo Teixeira - Quintino)

As características psicológicas dele era normal, não tinha nenhum problema mental e

<a> características físicas de e, pequeno e magro (aluno do 9º ano – da Escola Municipal Oswaldo Teixeira - Quintino)

Que e muito extrovertida, brincalhona e adora fazer muitas, muitas perguntas <do >

adultos (aluna do 9º ano – da Escola Municipal Fernando Azevedo – Santa Cruz)

39

tenque aprender <a > varias matéria tipo: química, ciência, mais com formula, outras

matérias etc... (aluno do 6º ano – do colégio particular Esplendor – Vila da Penha)

O melhor, é comer <bastante > frutas, de preferência no horário do lanche (aluna do 7º ano – do colégio particular ZeroHum – Ilha do Governador).

2.4. Concordância nominal e o ensino de gramática

É comum o tema de a concordância nominal aparecer nos livros didáticos apenas

como conteúdo programático, no ensino fundamental II, para o 9º ano. Entretanto, nos

anos anteriores, já se apresenta a concordância quando se ensina substantivo e adjetivo e

as funções sintáticas, como sujeito, predicativo, adjuntos etc. Contudo, sabe-se que esse

assunto é abordado de maneira tradicional, ensinando as regras para uma concordância

conforme a prescrição normativa. E esse tem sido um dos principais problemas do

ensino de gramática no Brasil: ensinam-se regras, sem considerar e respeitar o falar, a

norma linguística do aluno.

De acordo com Bortoni-Ricardo (2005), o comportamento linguístico de um

falante está relacionado à sua estratificação social. Desse modo, é possível diferenciar

grupos sociais a partir da língua que usam. Porém, mesmo sabendo que o Brasil é um

país de muitas diferenças sociais e, consequentemente, muitas diferenças linguísticas,

essas diferenças não são respeitadas e levadas a sério, pois o ensino de língua continua

valorizando a cultura dominante.

Ainda para a autora, há dois grandes problemas no ensino de língua padrão no

Brasil para os falantes que têm como língua materna as variedades populares. O

primeiro é que não se respeitam os antecedentes linguísticos do educando e, o segundo

problema é que não se ensina de forma eficiente a norma padrão4. Para Bortoni-Ricardo,

o saber do aluno deve ser respeitado na escola, e aprender a norma culta deve ser uma

possibilidade de ampliação de sua competência linguística e comunicativa. O aluno

também deve ficar ciente de quando se deve usar cada variedade e cabe ao professor

ensinar isso, mostrando que há formas alternativas para se dizer a mesma coisa, mas que

4 Bortoni (2005) utiliza o termo norma-padrão como sinônimo de norma culta, ou seja, sinônimo para os

falares efetivamente produzidos por indivíduos com ensino superior, que representam, muitas das vezes, a

classe dominante.

40

essas formas cumprem papéis comunicativos distintos e são avaliadas também de

maneira diferente pela sociedade. É fundamental que o aluno saiba que há formas

avaliadas negativamente e outras positivamente e que entenda que ter acesso às

variantes prestigiadas é importante para a sua ascensão social.

No caso do fenômeno da concordância nominal, é visível o estigma que a

variante zero recebe por parte dos falantes. Até os falantes que a utilizam, avaliam-na

negativamente. Segundo Bortoni-Ricardo (2005), isso ocorre devido à ação prescritiva

da escola e a valorização da norma culta. Sendo assim, é papel do educador mostrar ao

aluno que há uma variante de prestígio [s] e outra estigmatizada [0] e que o uso da

primeira em detrimento da segunda, em determinados contextos, pode lhe permitir

ascensão social.

Para Mattos e Silva (2001), o acesso à norma idealizada tem sido uma “violência

simbólica” para muitos falantes. Uma violência que vem sendo praticada há séculos,

desde que o latim era a língua da escola e já existia o latim vulgar. Na atualidade, essa

violência ainda é praticada no ensino quando as classes menos favorecidas se defrontam

como uma língua desconhecida e acabam fracassando na escola por não conseguirem

dominá-la. De acordo com a autora, mesmo com o surgimento da linguística moderna, a

escola continua reproduzindo a norma da sociedade dominante, não respeitando as

diferenças linguísticas que existem. Para ela, o papel da escola é mais político do que

puramente linguístico, quando o assunto é a norma.

Portanto, Mattos e Silva (2001) mostra que, no Brasil, houve uma falsa

democratização do ensino, porque aumentou o número de estudantes em sala de aula,

mas não houve uma preocupação com a qualidade desse ensino. Assim, a autora afirma

que a escola que era para o povo tornou-se contra o povo, já que o fracasso escolar está

relacionado à classe social.

Com o objetivo de mostrar alguns fenômenos variáveis do português, Mattos e

Silva (2001) comenta o trabalho de Naro e Scherre (1991) sobre a concordância

nominal. Nesse trabalho, os autores afirmam que existem duas realidades distintas no

PB: (i) alguns falantes caminham em direção a um sistema sem regra de concordância e

(ii) outros caminham em direção à aquisição da regra da concordância padrão. Dessa

maneira, Naro e Scherre (1991 apud MATTOS e SILVA, 2001) enfatizam o papel da

escola como a mantenedora da norma padrão, conseguindo até mesmo trazer para a fala,

variantes restritas à escrita formal.

41

Outro trabalho que questiona o papel da escola em relação ao ensino de

gramática é o de Moura Neves (2009). Nesse livro, a autora discute o conceito de

gramática, mostrando que não há apenas uma, mas diversos tipos de gramática. Além

disso, a autora sugere que a escola parta do uso da linguagem para o padrão, ou seja,

parta do uso para a norma e não o contrário. Cabe à escola, segundo a autora, observar a

produção linguística em operação. Para isso, a escola não pode desconsiderar a

gramática que todo aluno chega à sala de aula e deve entender que, a depender do grupo

socioeconomicocultural do aluno, sua gramática pode estar mais ou menos próxima do

padrão culto da língua.

Ainda nesse trabalho, a autora mostra que a escrita era considerada uma

modalidade em que o “bom uso” estava presente, enquanto a fala abrigava

“transgressões” e “erros”. Desse modo, a escola acabou criando um abismo entre fala e

escrita.

Nessa pesquisa, é a escrita que será observada, entendendo que ela não é

estanque, mas varia assim como a fala. Sabe-se que a força da escola tenta colocar a

escrita numa moldura, numa forma, porém sem muito sucesso, pois se verificou, em

trabalhos sobre a escrita, como a variação também está presente nela.

Por fim, vale citar outro trabalho de Bortoni-Ricardo (2004) sobre o ensino de

língua materna em que a autora mostra três contínuos para se entender a variação do PB.

O primeiro continuum é o de urbanização, como se vê a seguir:

Continuum de urbanização

Variedades rurais área rurbana variedades urbanas

isoladas padronizadas

Segunda a autora, esse continuum não apresenta pólos rígidos, mas pode haver

sobreposição entre esses tipos de falares. Ainda conforme Bortoni-Ricardo (2004), há

alguns traços dos falares rurais que não aparecem nos falares urbanos. Quando isso

ocorre, tem-se uma distribuição descontínua. Já outros traços são comuns às áreas rurais

e urbanas, são os chamados traços graduais. Assim, pode-se dizer que o fenômeno da

concordância nominal é um traço gradual, pois está presente tanto nas áreas rurais como

nas áreas urbanas. De acordo com a autora, o professor deve ficar atento a esse

fenômeno, já que muitos alunos usam a variante zero [0], mas precisam conhecer a

variante prestigiada [s] para a utilizarem em contextos mais monitorados.

42

O segundo continuum mostrado pela autora é o continuum de oralidade e letramento,

como se vê adiante:

Continuum de oralidade e letramento

eventos de eventos de

oralidade letramento

Assim como o primeiro continuum, esse também não apresenta barreiras rígidas,

é possível a sobreposição de falares. Vale lembrar que o evento de letramento, conforme

a autora, tem como base um texto escrito que pode estar presente no momento de

interação ou ter sido estudado previamente.

O último continuum é o de monitoração estilística, que pode ser observado

abaixo:

Continuum de monitoração estilística

- monitoração + monitoração

De acordo com Bortoni-Ricardo, três fatores levam à monitoração do estilo: o

ambiente, o interlocutor e o tópico da conversa.

Portanto, esses três contínuos permitem entender a variação do PB que está tão

presente no ensino de língua materna, pois até na fala do professor é possível notar ora

um alto grau de monitoramento, ora usos mais coloquiais. O que é fundamental no

ensino de gramática é o respeito às variedades linguísticas, entendendo que a variação é

inerente a qualquer comunidade linguística, em menor ou maior grau. Segundo Moura

Neves (2009), valorizar a língua padrão não é um problema, mas negar o acesso a essa

língua é um ato discriminatório. E a escola, como um lugar democrático, deve

apresentar a língua de prestígio porque é essa língua que poderá permitir ascensão

social; contudo, não pode desvalorizar a língua trazida pelo aluno.

43

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.1. Sociolinguística

A presente pesquisa será embasada pela teoria Sociolinguística Variacionista

que observa a língua no contexto social. Nessa teoria, a relação entre língua e

sociedade é indispensável. Assim, a Sociolinguística correlaciona variações

linguísticas às diferenças sociais, entendendo que a diversidade é uma característica

funcional e inerente aos sistemas linguísticos, e o papel da Sociolinguística é observar

esta diversidade em suas determinações linguísticas e não-linguísticas.

De acordo com Labov (1994), a linguagem é um instrumento de comunicação

que une forma e conteúdo (significante e significado). Por ser um instrumento

comunicativo, é natural que as línguas não sejam homogêneas; pelo contrário, elas são

heterogêneas e variam constantemente. Toda comunidade de fala possui

heterogeneidade e essa heterogeneidade está na competência do falante.

Todavia, a variação não ocorre por acaso ou pelo livre arbítrio do falante. Há

motivações do sistema linguístico que o falante segue, sem escolha. Essas motivações

podem ser de natureza extralinguística e linguística. Os condicionamentos do primeiro

tipo podem ser exemplificados com as variáveis classe social, idade, gênero e origem

do falante; já os do segundo tipo dizem respeito a fatores internos à língua, como no

caso da CN, a presença ou ausência de segmento formal de número, níveis de

saliência fônica dos nomes passíveis de marcação de plural, tonicidade da sílaba em

que figura a marca de número, entre outros.

Dessa forma, o axioma da heterogeneidade ordenada postulada por Weinreich,

Labov e Herzog (1968) considera a língua como um elemento inerentemente variável

e ordenado. Logo, a variação não é aleatória, mas é resultado de um uso sistemático e

regular. Por isso, é possível o estudo de dados linguísticos variáveis. Afinal, existem

regras que podem ser sistematizadas para descrever e explicar determinados

fenômenos do português do Brasil.

Labov (1994), citando Meillet, concorda que há uma relação entre estrutura

linguística e estrutura social, como se pode notar no fragmento abaixo:

44

A única variável a que podemos recorrer para explicar a mudança linguística

é a mudança social, da qual as variações linguísticas são apenas

consequências. Temos que determinar que estrutura social corresponde a uma

estrutura linguística dada e como, de modo geral, as mudanças na estrutura

social se traduzem em mudanças na estrutura linguística5.

A partir dessa relação entre língua e sociedade, é possível notar a existência de

um valor social sobre uma variante. Esse valor está associado ao grupo que a

introduziu e com as relações econômicas e culturais que este grupo detém. Desse

modo, o falante reconhece a força da norma de prestígio através da mídia, da escola e

de pessoas amplamente conhecidas, sendo as variantes estigmatizadas relacionadas à

origem social de menor prestígio, enquanto as variantes não-estigmatizadas estão

relacionadas às classes dominantes, que traçam uma avaliação impressionista acerca

das variedades de fogem ao padrão, desconhecendo a variação decorrente das

situações de uso, bem como a legitimidade das diferentes variedades como sistemas

comunicativos e de expressão do pensamento.

Essa noção de prestígio ou desprestígio sobre uma variante remete a um dos

problemas da mudança proposto por Labov (2006). Esse problema seria o da

avaliação, em que é possível verificar em que medida a avaliação subjetiva de um

indivíduo frente às variantes pode interferir no processo de mudança.

Talvez, no caso da concordância nominal no português do Brasil, o problema

da avaliação esteja interferindo no processo de mudança em direção a um sistema de

perda das marcas morfológicas de número e, obviamente, influenciando a presença da

marca formal, já que a ausência da marca [s] de plural é associada a não saber falar

“certo”, sendo, pois, a variante zero considerada desprestigiosa. Já a marcação

morfológica da concordância de número está relacionada ao “bem falar” e é a norma

de prestígio social.

É interessante notar que algumas variantes podem ser representativas de

determinados grupos sociais. É o que ocorre com a variante zero usada por muitos

falantes como um meio de inserção na sua comunidade. Às vezes, esses falantes até

conhecem a variante padrão; entretanto, seu uso não é comum em sua comunidade e

5 la única variable a la que podemos acudir para explicar el cambio linguístico es el cambio social, del

cual las variaciones linguísticas son sólo consecuencias. Tenemos que determinar qué estructura social

corresponde a uma estructura linguística dada y cómo, de modo general, los câmbios em la estructura

social se traducen em câmbios em la estructura linguística. (1994, pág. 65)

45

usá-la pode ser interpretado como pedantismo; por isso, eles acabam

inconscientemente preferindo usar a variante estigmatizada para não se sentirem

excluídos socialmente.

Há ainda outros quatro problemas sugeridos por Labov para o estudo da

mudança. Um deles é a questão das restrições ou condicionamentos que tenta

responder quais são as condições que favorecem ou restringem as mudanças. Neste

trabalho, será possível verificar em quais ambientes (contextos) há maior ou menor

chance de aparecer a marca morfológica de número.

Outro problema é o da transição, que deseja observar o percurso através do

qual cada mudança se realiza. É comum em trabalhos de caráter histórico olhar e

descrever esse percurso, mostrando como uma mudança foi implementada no sistema.

Assim, há também o problema da implementação, que, de certa maneira, se

relaciona com o problema da transição, já que analisa os motivos pelos quais uma

mudança ocorre em um determinado momento e lugar e não em outro.

Por último, há o problema do encaixamento que tenta responder como uma

mudança pode estar encaixada na estrutura linguística e social de outros fenômenos.

Essa questão é bem interessante, pois alguns fenômenos da língua estão intimamente

ligados a outros, como, por exemplo, o caso das construções de tópico marcado,

especialmente os casos de deslocamento à esquerda de sujeito e topicalização de

objeto que têm relação com a tendência do PB em preencher o sujeito e apagar o

objeto, respectivamente.

Além dos problemas propostos por Labov, é interessante notar que o mesmo

autor (LABOV, 2003) também propõe três tipos de regras linguísticas. As regras do

tipo III incluem os fenômenos em variação. Tais regras fazem parte da competência

linguística do falante, ou seja, não são ensinadas, normalmente não são percebidas

pelo falante e são condicionadas por fatores estruturais e não estruturais e, portanto,

não ocorrem a partir de uma variação livre. Nesse tipo de regra, há a coexistência de

formas alternativas (variantes) de um fenômeno que podem se concretizar com

frequência entre 5% a 95%.

O fenômeno da concordância nominal no PB tem sido considerado um

fenômeno variável, ou seja, apresenta a regra linguística do tipo III. Apesar de

inúmeros trabalhos mostrarem uma preferência do português brasileiro pela variante

padrão (s), há ainda na variedade brasileira formas em variação (s e ᴓ) e que atuam

46

entre 5% a 95% de aplicação. Esse percentual varia de acordo com determinados

condicionamentos linguísticos e extralinguísticos, sendo a escolaridade um dos

principais motivadores para a ausência/presença da concordância padrão.

O segundo tipo de regra linguística é do tipo II; são as regras semi-categóricas.

Nesse caso, uma das variantes apresenta frequência elevada de uso (95% a 99% de

aplicação). A utilização da variante de menor frequência pode causar, inclusive,

estranheza entre os falantes da língua. Esse tipo de regra representa, normalmente, o

início ou o final de um processo da mudança em progresso.

A última regra é do tipo I; são regras categóricas. Estas regras fazem parte da

gramática internalizada do falante. Elas não são reconhecidas conscientemente e

também não são violadas, por isso sua regra apresenta 100% de aplicação. Um

exemplo desta regra é o uso obrigatório do artigo antes do substantivo (O menino, e

não *Menino O), em que a infração a esta ordem implicaria violação do sistema.

Como se sabe, toda mudança implica variação, mas nem toda variação acarreta

uma mudança linguística (WEINREICH, LABOV, HERZOG, 2006: 126). Enquanto

uma língua está em processo de mudança, uma variante pode ser adotada por um

grupo social e gradualmente se espalhar para os outros grupos. A concordância

nominal de número é um fenômeno que varia, mas não parece que conduzirá a uma

mudança, pois as variantes [s] e zero coexistem e não há a supressão de uma variante

pela outra. Ambas são realizadas por falantes de maior ou menor escolarização,

dependendo de diferentes motivações.

Ainda no campo da Sociolinguística, há um estudo mais recente de Freitag,

Martins e Tavares (2012) que apresenta uma nova concepção para se pensar os

estudos linguísticos de acordo com Eckert (2012). Os autores discutem as três ondas

dos estudos sociolinguísticos que, segundo ela, são maneiras de pensar a variação

como uma prática e uma metodologia.

A primeira onda estabelece uma relação entre as variáveis linguísticas e as

categorias sociais como sexo, idade e escolaridade. Essa onda é bem conhecida entre

os linguistas brasileiros, pois é o tipo de pesquisa mais comum dentro da

Sociolinguística Variacionista, uma vez que estabelece correlações entre variáveis

linguísticas e sociais (classe social, gênero, idade, escolaridade etc.).

Já a segunda onda apresenta uma abordagem etnográfica e seu objetivo é

mostrar como o vernáculo recebe uma identificação com determinada comunidade de

47

fala. Nesses estudos, é possível notar o valor social que as variantes em estudo

recebem por parte dos falantes de um determinado local, sendo o foco os conceitos de

comunidades de fala e de identidade de grupo. Em relação à concordância no sintagma

nominal, é preciso ressaltar que a ausência da marca morfológica é estigmatizada

socialmente e sua aquisição coloca o falante em posição de prestígio, ainda que a

abordagem se baseie em categorias sociais amplas como gênero, faixa etária e

escolaridade.

Por último, a autora descreve a terceira onda para os estudos linguísticos. Essa

terceira onda combina os postulados das duas primeiras; entretanto seu foco não está

na comunidade de fala e sim na comunidade de prática. Entende-se por comunidade

de prática o conjunto de indivíduos que possuem perspectivas, valores e conhecimento

em comum e esses indivíduos interagem entre si. Dessa forma, nessa terceira onda, o

foco está na variação como uma maneira de identificação social. Conforme Eckert

(2012), toda variação pode receber um valor social independentemente de essa

avaliação ser conscientemente controlada ou socialmente significativa. Esse

agrupamento de indivíduos (comunidade) domina perspectivas, valores e

conhecimento, interagindo entre si para, na prática, aperfeiçoar esses valores e

conhecimentos.

Essa terceira onda surge com o objetivo de criar análises mais confiáveis e que

represente melhor um determinado grupo social, uma região ou até mesmo a

variedade do português brasileiro. Para os autores, as pesquisas que observam a

comunidade de prática podem construir um corpus que realmente seja representativo

para uma comunidade.

Ainda nesse estudo, os autores apresentam alguns corpora que estão sendo

formados a partir dos postulados dessa terceira onda (Banco de fala culta de

Itabaiana/SE, Banco de falares sergipanos e Banco de dados FALA-Natal). Portanto,

para a constituição desse material, os pesquisadores precisam conhecer mais

detalhadamente o perfil de seus informantes, conhecendo algumas particularidades da

sua vida pessoal, como o que gostam de fazer nas horas livres, se pertencem a algum

grupo (igreja, clube, esporte) e até sua rotina diária. Somente dessa forma, de acordo

com os autores, é possível formar um corpus que seja realmente representativo de

certa comunidade.

48

Este trabalho se preocupará em descrever o processo da concordância de

número no português do Brasil e analisar as motivações para a presença ou ausência

da marca [s] de plural, com a finalidade de comprovar se há, realmente, um aumento

na realização da regra da concordância, relacionando este aumento ao fator nível de

escolaridade. Não será uma pesquisa tipicamente nos moldes da terceira onda, pois

não será possível o conhecimento detalhado de cada informante – no caso, de cada

aluno. Mas o perfil das localidades em que as escolas se encontram já contribui para o

conhecimento do perfil socioeconômico dos alunos pertencentes a essas instituições

de ensino que compõem o nosso corpus.

3.2. Redação como gênero textual

Esta pesquisa tem como corpus redações escolares; por isso, faz-se necessária

uma breve explicação sobre esse gênero, pois há uma discussão sobre esse tipo de

produção, já que se tem dúvida sobre a redação ser ou não um gênero textual. Há muitos

trabalhos que discutem esse tema, como Pilar (2002), Zanutto e Oliveira (2004), ambos

voltados para a redação de vestibular. Nesses trabalhos, a redação é considerada um

gênero textual, um gênero que é tipologicamente heterogêneo.

Entretanto, também tem sido comum a confusão entre gêneros e tipologia

textual. Muitos professores acreditam que tais palavras são sinônimas, acreditam que

gênero e tipo de texto são iguais, mas, de acordo com muitos linguistas, há uma

diferença nítida entre eles.

Sabe-se que a palavra gênero não é nova entre nós. Desde a época dos gregos já

se ouvia falar em gêneros, relacionados, em sua maioria, ao ambiente literário, como o

gênero lírico, narrativo, dramático. Porém, agora essa palavra tem sido usada com um

sentido mais amplo, referindo-se a diversas manifestações textuais, como a carta, a

reportagem e a crônica.

Foi Bakhtin (1992) o primeiro a levar a discussão sobre gêneros para além da

literatura. Segundo ele, os textos que se produzem em diferentes situações de

comunicação possuem particularidades e são essas particularidades que os definem e os

distinguem um do outro.

De acordo com Bakhtin (op.cit.), os gêneros do discurso são repertórios que as

pessoas utilizam para interagirem umas com as outras e, por isso, são tipos

49

relativamente estáveis. Isso não quer dizer que os gêneros textuais são estáticos; pelo

contrário, eles podem sofrer alterações de acordo com as mudanças sociais de um povo.

Nessa visão, a noção de gênero textual está relacionada ao funcionamento da linguagem

na sociedade e, além disso, os gêneros são estáveis, podendo permanecer nessa e em

outras gerações futuras, assim como podem ser bases para o surgimento de novos

gêneros. Ainda segundo o autor, os gêneros são caracterizados por três elementos

essenciais: tema, organização estrutural e estilo. Esses três elementos se fundem para

formar um enunciado.

Para Bronckart (1999), os gêneros também são estáveis e servem como

instrumento para a realização de determinadas funções da linguagem. Assim, os gêneros

são moldados de acordo com a situação em que os interlocutores estejam inseridos.

Como os gêneros estão ligados às atividades humanas, eles são numerosos.

Já para Swales (1990), os gêneros são mais de que um conjunto fechado de

objetos textuais parecidos, semelhantes, eles constituem eventos codificados dentro de

processos comunicativos. Além disso, os gêneros podem exibir tendências universais ou

específicas de uma cultura, podem variar conforme a sociedade e, por isso, cada

comunidade desenvolve seus próprios gêneros.

Tanto para Marcuschi (2002) como para Bazerman (2009 apud VIGNOLI,

2011), o gênero surge a partir das relações sociais. Assim, os gêneros estão relacionados

com a maneira como as pessoas caracterizam suas atividades sociais e,

consequentemente, estabelecem fatos sociais que devem ser considerados verdadeiros

para que existam.

Marcuschi (2002) afirma que o gênero não apresenta apenas um papel

linguístico, mas também cumpre um papel cultural e social em uma comunidade. Dessa

forma, é a situação comunicativa e a sua funcionalidade que o definem. Para o autor, os

gêneros são maleáveis, dinâmicos e tipologicamente heterogêneos, pois podem conter

diferentes tipologias. Surgem a partir da necessidade sociocultural de um lugar assim

como também a partir das tecnologias. Logo, os gêneros podem surgir e desaparecer de

uma sociedade já que são situados no tempo. Conforme Marcuschi, os gêneros são mais

caracterizados pelas suas funções cognitivas, comunicativas e sociais do que por

aspectos puramente linguísticos e estruturais. Mas, é claro que a forma não é algo

descartável para a identificação de um gênero, só não é um fator que pode particularizá-

lo.

50

Apesar de definições diferentes, é possível notar que os autores citados

relacionam a definição de gênero com aspectos sociais. Para eles, o gênero está ligado a

uma sociedade, cumprindo papel cultural dentro dela e sendo um elemento essencial

para a interação entre as pessoas. Os gêneros podem servir como meios para atingir fins,

como, por exemplo, conhecer a cultura de uma comunidade. Dessa forma, os gêneros

textuais são heterogêneos, múltiplos e marcam situações sociais específicas.

Já a tipologia textual é uma construção teórica definida por aspectos linguísticos

como tempos verbais, aspectos lexicais e sintáticos. Essa definição de Marcuschi para

tipo de texto é defendida por diversos estudiosos como J. Michel Adam (1990) e Jean

Paul Bronckart (1999). Segundo Adam (1992), as tipologias são mais homogêneas e sua

estabilidade permite sua determinação mais facilmente, diferentemente dos gêneros, que

são inúmeros. Assim, os gêneros são componentes da interação social, enquanto as

tipologias são elementos linguísticos que se organizam formando um gênero. Portanto,

as tipologias se realizam dentro de um gênero.

No quadro abaixo, há uma síntese sobre as diferenças entre gênero e tipologia.

Esse quadro foi extraído de Marcuschi (2002):

Gêneros Textuais Tipos Textuais

1. realizações linguísticas concretas definidas por

propriedades sócio-comunicativas;

1. constructos teóricos definidos por

propriedades linguísticas intrínsecas;

2. constituem textos empiricamente realizados

cumprindo funções em situações comunicativas;

2. constituem sequências linguísticas ou

sequências de enunciados no interior dos

gêneros e não são textos empíricos;

3. sua nomeação abrange um conjunto aberto e

praticamente ilimitado de designações concretas

determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e

função;

3. sua nomeação abrange um conjunto

limitado de categorias teóricas determinadas

por aspectos lexicais, sintáticos, relações

lógicas, tempo verbal;

4. exemplos de gêneros: telefonema, sermão, carta

comercial, carta pessoal, aula expositiva, romance,

reunião de condomínio, lista de compras, conversa

espontânea, cardápio, receita culinária, inquérito

policial.

4. designações teóricas dos tipos: narração,

argumentação, descrição, injunção e

exposição;

Tabela 1: Gêneros textuais x Tipologias textuais (Marcuschi, 2002).

Desse modo, é possível perceber novamente a noção de interação social para a

definição de gênero, além de seu aspecto funcional. Já as tipologias são caracterizadas

por seu aspecto puramente linguístico e, sozinhas, não constituem um texto, formam

apenas sequências através de um conjunto de traços. Ademais, os tipos textuais fazem

parte de um conjunto fechado e limitado, diferente do gênero; por isso, as tipologias

51

podem ser determinadas e são apenas cinco, conforme Marcuschi (2002): narração,

descrição, argumentação, exposição e injunção.

Essa classificação usada por Marcuschi (2002) não é compartilhada por todos os

autores, mas é a mais conhecida entre estudantes e professores. Em livros didáticos, são

essas categorizações que aparecem como conteúdo para a disciplina redação.

Mesmo com a diferença entre gênero e tipologia, as redações apresentam

dúvidas quanto a sua classificação. Alguns autores defendem que a redação é um gênero

textual, um gênero que apresenta vários tipos (heterogeneidade tipológica). Outros

acreditam que ela seja apenas um tipo de texto que, dependendo do comando proposto

ao aluno, pode ser uma tipologia dissertativa, narrativa ou descritiva.

Como foi visto anteriormente, os gêneros são considerados fatos sociais e

apresentam uma funcionalidade. A redação também é um fato realizado que apresenta

uma função bem específica; por isso, acredita-se que ela é um gênero textual. Assim,

segundo Pilar (2002 apud PAVANI, KÖCHE e BOFF, 2006), as redações de vestibular,

por exemplo, possuem uma função bem determinada: servem como um método para o

ingresso numa faculdade pública. Logo, é um fato social, pois, a partir da redação, o

vestibulando é avaliado e pode ser ou não classificado para concorrer a uma vaga na

Universidade. Flores (2003 apud PAVANI, KÖCHE e BOFF, 2006) também considera

a redação como um gênero. Seria um gênero híbrido, pois há nele diferentes sequências

que formam uma unidade significativa. Ainda conforme Pilar (2002), a redação é um

gênero porque cumpre uma função específica, tem uma organização típica e ocorre em

situações exclusivas de produção.

Pilar apresenta três variáveis que, segundo ela, podem identificar uma redação

num contexto escolar. Essas variáveis são perguntas acerca do texto e, segundo Gouveia

(2012), são padrões linguísticos presentes no próprio texto. Assim, qualquer produção

escrita poderia ser feita, partindo-se desses aspectos. Observe:

1. Campo => responde a questão “que?” e seria a abordagem do tema, o

conhecimento assumido.

2. Teor => responde a pergunta “quem?” e se refere aos envolvidos no

processo de produção.

3. Modo => responde a pergunta “como?” e está associado à estrutura do

texto e aos traços contextuais.

52

Outro fato que comprova que a redação é, sim, um gênero textual é a sua função

interativa. De certa forma, ao escrever uma redação, o aluno ou vestibulando interage

com o professor (banca), pois ele escreve um texto para ser avaliado. Sendo assim, com

bases em todos esses argumentos, é possível classificar a redação como um gênero

textual. Um gênero que pode abarcar vários tipos de textos e pode também possuir

subgêneros como, por exemplo, uma redação de vestibular que exija do candidato uma

carta argumentativa. Nesse caso, a carta é um gênero e está dentro de outro gênero

maior que seria a redação; entretanto, a tipologia a ser usada é a argumentação.

De acordo com Bakhtin (2003), há três pontos que definem um gênero: conteúdo

temático, organização estrutural e estilo. Pensando na redação como um gênero e

fazendo uma relação com esse “tripé” bakhtiniano, pode-se dizer que as redações não

possuem um tema específico; elas podem abordar diferentes assuntos, desde moda,

esporte até política. O tema depende da proposta da redação.

Sobre a forma, a redação apresentará uma organização estrutural, a depender

também da proposta sugerida. É comum, em um processo de vestibular, se pedir textos

argumentativos; mas, em algumas faculdades, há possibilidade de escolha, podendo o

vestibulando optar por um texto argumentativo, narrativo ou fazer uma carta

argumentativa. No entanto, no ensino escolar, é possível que o aluno se depare com

mais tipos e gêneros textuais. Nas séries iniciais, é comum a narrativa, encontrada em

contos, crônicas, por exemplo. Com o passar dos anos, os alunos vão se deparar com

outros tipos de textos encontrados em outros gêneros, como a notícia, o anúncio

publicitário, o poema, a receita, entre muitos, em que diferentes tipologias aparecerão.

Assim, considerar a redação como um gênero, segundo Pilar (2002), é uma forte

ferramenta para o professor, pois permitirá que mostre aos alunos como o gênero pode

ser um instrumento de ação social e um meio de interação entre as pessoas, além de

ampliar a visão do aluno limitado às tipologias tão consagradas no ensino, como a

narração, descrição e dissertação.

Nessa pesquisa, a redação é considerada um gênero que pode apresentar

diferentes tipologias textuais. Desse modo, o trabalho apresenta uma variável que

codifica a tipologia em que se encontram os dados analisados e não o gênero, já que a

redação escolar é o gênero que serviu de corpus para o estudo do fenômeno da

concordância nominal.

53

4. ASPECTOS METODOLÓGICOS

4.1. Constituição do corpus

4.1.1. Redações

Como já foi mencionado na introdução, o corpus do trabalho é composto por

redações escolares de alunos do ensino Fundamental II, de quatro escolas diferentes.

Duas dessas escolas são públicas e duas são particulares e se encontram em localidades

distintas uma das outras.

Para a constituição desse corpus, desejava-se conseguir vinte redações por ano

de escolaridade, divididas em gênero – dez femininas e dez masculinas – em todas as

instituições escolares. Contudo, isso não foi possível, pois em algumas séries/anos não

havia essa quantidade de alunos ou não havia a quantidade de meninos ou meninas que

se desejava. Assim, o quadro abaixo mostra detalhadamente como esse corpus foi

constituído, a partir das limitações encontradas, sabendo que isso não atrapalharia o

resultado da pesquisa, já que o programa estatístico utilizado – GoldVarb-X – pondera

essas assimetrias.

Ano de escolaridade / Gênero

Instituição

6º ano 7º ano 8º ano 9º ano

F M F M F M F M

Colégio e curso Esplendor 10 10 7 8 10 10 10 7

Colégio ZeroHum 6 4 10 10 10 10 10 8

E. M. Oswaldo Teixeira 10 10 10 10 10 10 10 10

E. M. Fernando Azevedo 7 10 10 10 10 10 10 10 Tabela 2: quantidade de redações por ano de escolaridade, gênero e instituição.

Dessa forma, foram analisadas, ao total, 297 redações. Do Colégio e Curso

Esplendor havia 72 redações, já do colégio ZeroHum havia 68. Nas escolas municipais,

foi mais fácil conseguir o número de redações desejáveis, devido ao maior número de

turmas. Assim, da Escola Municipal Oswaldo Teixeira, foram coletadas 80 redações; já

da Escola Municipal Fernando Azevedo, foram coletadas 77 redações.

Em relação ao ano de escolaridade, no 6º ano coletaram-se 67 redações, no 7º

ano 75, no 8º ano analisaram-se 80 redações e no 9º ano foram também 75 redações. O

54

número de redações foi menor no 6º ano, pois algumas turmas eram pequenas, com

poucos alunos.

4.1.2. Localização das escolas pesquisadas

As informações abaixo foram coletadas com base no Censo de 2000 (Cavallieri;

Lopes, 2008), realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Trata-se de

indicadores que expressam o Índice de Desenvolvimento Social (IDS), bem como o

ranqueamento das localidades analisadas quanto ao seu Índice de Desenvolvimento

Humano (IDH).

O IDS é uma avaliação do atendimento às necessidades básicas do cidadão e é

calculado a partir da observação dos quesitos i) acesso ao saneamento básico, ii)

qualidade habitacional, iii) grau de escolaridade e iv) disponibilidade de renda, cujos

resultados são comparados aos de outras cidades em diferentes situações econômicas.

Trata-se, pois, de um medidor da qualidade de vida dos habitantes das localidades

consideradas.

Já o IDH teve por objetivo “desviar o foco do desenvolvimento da economia e

da contabilidade de renda nacional para políticas centradas em pessoas” (HAQ, 1995

apud CAVALLIERI; LOPES, 2008), medindo o bem estar humano a partir do nível de

educação da população. A taxa de analfabetismo se mede pelo número de pessoas com

quinze anos ou mais que não concluiu o primeiro ciclo de estudos (Ensino

Fundamental). Outro indicador é a taxa de escolarização, que se relaciona à soma das

pessoas matriculadas no ensino fundamental, médio, superior, supletivo e pós-

graduação, dividida pelo total de pessoas entre 7 e 22 anos da localidade. Considera-se

ainda a longevidade, a expectativa de vida ao nascer e a quantidade de anos que uma

pessoa pode viver. Tal medida reflete as condições de saúde e de salubridade da

localidade, considerando o número de mortes precoces. Além desses fatores, a renda per

capita da população – outro comparativo – é calculada a partir do poder de compra. O

IDH mede, enfim, o desenvolvimento das localidades, estando ambos os índices (IDH e

IDS) intimamente relacionados.

55

4.1.2.1. Particulares

4.1.2.1.1. Jardim Guanabara – Ilha do Governador

Das quatro localidades pesquisadas, Jardim Guanabara, pertencente à 20ª.

Região Administrativa (R.A. Ilha do Governador), é a que apresenta melhor Índice de

Desenvolvimento Social e Índice de Desenvolvimento Humano. Embora não figure na

Zona Sul do Rio de Janeiro, seu Índice de Desenvolvimento Social é de 0,0745,

ocupando a 15ª posição entre os bairros da cidade do Rio de Janeiro, de acordo com

dados de 2008 (CAVALLIERI; LOPES, 2008), e apresenta o 3º. melhor IDH do

município (.963).

Jardim Guanabara é um bairro valorizado na Zona Norte da cidade do Rio de

Janeiro e surgiu do loteamento do terreno da Fábrica de Produtos Cerâmicos Santa

Cruz. Tem como caracterísitca ser bastante residencial e, no entorno, cercado de

restaurantes, bares, áreas de lazer e praias (da Bica e do Engenho Velho) que, apesar de

não ser banhável por encontrar-se nos fundos da Baía de Guanabara, é ponto de

encontro de moradores pertencentes à classe alta e média-alta. Outra característica é que

não está próximo a comunidades carentes, e a existência de um clube (Iate Clube Jardim

Guanabara – 1953) e do Parque Municipal Marcello de Ipanema (1995), com uma

preservada área verde.

4.1.2.1.2. Vila da Penha

O bairro de Vila da Penha, pertencente à 14ª. Região Administrativa (R.A. -

Irajá), ocupa o 21º. lugar, no que diz respeito ao Índice de Desenvolvimento Humano

(0,909), e o 36º. lugar em relação ao índice de Desenvolvimento Social, em comparação

às demais cidades, e o 6º. lugar, em relação aos demais bairros da Zona Norte

(CAVALLIERI; LOPES, 2008). Trata-se de um bairro residencial de classe média e tem

sido alvo da expansão imobiliária nos últimos anos. Suas origens remontam a época dos

engenhos de açúcar e aguardente da região, que, com a falência, foram desmembrados

por seus proprietários em vários terrenos.

A Vila da Penha faz limites com os bairros de Vista Alegre, Brás de Pina e Vila

Kosmos, apresentando variadas opções de lazer, tais como: espaço para caminhada e

56

prática de esportes (Largo do Bicão), bares, restaurantes e redes de fast foods, casas de

espetáculo (Olimpo), clube (Mello Tênis Clube e casa do Viseu), além de um grande

shopping e da lona cultural João Bosco, uma espécie de anfiteatro herdado da ECO-92,

em que são oferecidos desde shows a diversos cursos gratuitos ou de baixo custo. O

bairro conta, ainda, com infraestrutura de comércio e uma biblioteca em construção

(Biblioteca Comunitária Tobias Barreto de Meneses), cujo projeto arquitetônico é de

Oscar Niemeyer.

4.1.2. 2. Públicas Municipais

4.1.2.2.1. Quintino Bocaiúva

O bairro de Quintino, pentencente à 15ª Região Administrativa (Méier), localiza-se

na Zona Norte da cidade e apresenta Índice de Desenvolvimento Humano de 0, 850,

equivalendo ao 55º lugar. Seu Índice de Desenvolvimento Social é 0,603, o 63º lugar, entre as

cidades do Rio de Janeiro. Trata-se de um bairro residencial, com uma população de cerca de

40.000 habitantes.

Em Quintino, funciona o complexo Centro de Educação Técnica e Profissionalizante,

onde estão a Escola Técnica Estadual República, o Instituto Superior de Tecnologia em Ciências

da Computação do Rio de Janeiro, além de instituições que oferecem cursos de idiomas,

técnicos e profissionalizantes, contando com as escolas municipais Osvaldo Teixeira, Quintino

Bocaiúva e Haiti, e particulares João Lyra Filho e Guarany.

Nos anos 1960 e 1970, Quintino apresentava vida social movimentada,

com associações sociais e recreativas com torneios de futebol, ranchos carnavalescos

(Decididos de Quintino, Aliados de Quintino e Aliança), que atraíam visitantes de

vários lugares. Mas, a partir de 1980, a decadência dos ranchos, que tentaram

transformar-se em escolas de samba, desencadeou também a decadência da vida social

do bairro e consequente aumento da violência. Isso distanciou os vizinhos dos bairros

limítrofes Cascadura, Cavalcante, Piedade, Freguesia, Tanque e Praça Seca.

4.1.2.2.2. Santa Cruz

Santa Cruz, pertencente à 19ª. região administrativa, é um extenso bairro

populoso de classe média, média-baixa e baixa, também da Zona Oeste da cidade,

57

cortado pela malha ferroviária urbana e localizando-se bastante distante do centro do

Rio de Janeiro. Possui paisagem diversificada, com áreas comerciais, residenciais e

industriais, sendo sede da XIX Região Administrativa. Seu Índice de Desenvolvimento

Humano é de 0, 742, sendo o 119º colocado na cidade do Rio de Janeiro, e Índice de

Desenvolvimento Social 0,476, 147º lugar, o mais baixo dentre as localidades

pesquisadas. Faz limites com os municípios de Itaguaí a oeste e Seropédica a norte, e os

bairros de Sepetiba ao sul, Paciência e Cosmos a leste e Guaratiba a sudoeste.

É região em franco desenvolvimento, em função da instalação do Porto de

Itaguaí; no entanto, por ser uma região muito ampla, apresenta contrastes como o fato

de ser um dos bairros mais populosos e, ao mesmo tempo, conter grandes áreas

despovoadas e inexploradas.

Santa Cruz foi área em que se localizava a Fazenda de Santa Cruz, grande

engenho de açúcar que, com a chegada da família Real, foi transformada em local de

veraneio, sendo o antigo convento adaptado às funções de paço real - Palácio Real de

Santa Cruz. A fazenda chegou a produzir excelente chá, cuja produção era totalmente

comercialidada, além de ter sido palco de grandes eventos históricos, como a assinatura

da lei de alforria dos escravos do governo imperial pela princesa Isabel; foi uma das

primeiras localidades a se beneficiar com o sistema de entrega em domicílio de cartas

pelo correio, tendo sede ali a primeira agência dos Correios (1842), bem como teve

instalado o primeiro telefone, comunicando-se com o Paço de São Cristóvão e a estação

de trem (1878). Em função de sua importância, Santa Cruz deu sede a vários palacetes,

como o Palacete Princesa Isabel, o Marco Onze, a Fonte Wallace, e teve até o Hangar

do Zeppelin. No entanto, depois da Proclamação da República, Santa Cruz perdeu seu

prestígio, embora muitos imigrantes estrangeiros tenham desenvolvido o comércio

(árabes) e a agricultura local (japoneses), na década de 1930, e transformado o bairro

em grande produtora de alimentos para todo o Rio de Janeiro.

Já na década de 1970, o bairro passou a importante distrito industrial, sediando

grandes indústrias, e hoje se encontra em crescimento, com comércio desenvolvido e

um sistema educacional público e privado que supre adequadamente a demanda por

educação básica. No entanto, há carência no ensino médio tanto de rede pública quanto

privada. Para atender a demanda por mão-de-obra qualificada, há o CETEP e o o

SESI/SENAI, que oferecem vários cursos profissionalizantes. O bairro ainda sedia o

Batalhão Escola de Engenharia e a Base Aérea de Santa Cruz. Apesar disso, a

58

localidade enfrenta diversos problemas relacionados ao sistema de transporte,

saneamento básico, meio ambiente, tráfico de drogas, além da ação de milícias nas

comunidades carentes.

Quanto à saúde pública, Santa Cruz é servido pelo Hospital Municipal D. Pedro

II e postos de saúde, com destaque ao Hospital Dom Pedro II, além da Policlínica

Lincoln de Freitas e vários hospitais privados. Porém, a maior parte dos moradores

(70%) depende do sistema público de saúde e sofre com a falta de médicos e leitos da

rede de hospitais.

Segue abaixo uma tabela comparativa dos quatro municípios considerados:

Bairro Esp. de vida ao nascer (em

anos)

Freq. Alfab.

de adultos

(%)

Freq. escolar

(%)

Renda per

capita (2000)

IDH longevidad

e

IDH educação

ÍDH renda

IDH ÍDS (2008)

3º Jd.

Guanabara

80,47 98,92 111,15 1316,86

0,924 0,993 0,972 0,963 0.745 (15º.)

21º. Vila da

Penha

77,64 98,79 103,71 669,34 0,877 0,992 0,859 0,909 0,663 (36º.)

55º. Quintino

Bocaiúva

73,91 96,80 91,97 424,67 0,815 0,952 0,783 0,850 0,605 (63º.)

119º. Santa Cruz 65,52 93,19 79,82 206,23 0,675 0,887 0,662 0,742 0,476 (147º.)

Tabela 3: dados estatísticos sobre os bairros estudados.

Como se vê, é possível construir um continuum referente a todas as informações

do quadro, mostrando que o bairro de Jardim Guanabara apresenta os melhores índices

no que tange à qualidade de vida, tendo o 3º melhor IDH do município, e o bairro de

Santa Cruz, na outra ponta do continuum, apresenta os índices mais baixos em todos os

quesitos do quadro. Já os bairros de Vila da Penha e Quintino ficam no meio do

continuum, pois apresentam resultados superiores ao de Santa Cruz, mas inferiores ao

bairro do Jardim Guanabara. Dessa forma, pode-se dizer que há uma gradação, de

acordo com suas características socioeconômicas.

Continuum referentes às condições de vida.

+ -

Jd. Guanabara Vila da Penha Quintino Bocaiúva Santa Cruz

59

Segue abaixo o mapa do Estado do Rio de Janeiro, com destaque à localização

dos bairros considerados na pesquisa, com fins à visualização da distribuição espacial

de cada um deles em relação ao centro sócio-cultural (Centro).

4.1.3. Dados excluídos

A amostra foi constituída por qualquer tipo de SN que apresentasse pelo menos

uma marca formal de número em um de seus elementos. Entretanto, alguns desses SNs

tiveram que ser excluídos por diferentes motivações que serão explicitados nessa seção.

Os nomes próprios de estados ou países foram excluídos (Estados Unidos, Minas

Gerais, Buenos Aires), pois são SNs cristalizados e, assim, merecem um estudo à parte.

Do mesmo modo, foram excluídos, também, os casos de pluralia tantum – são aqueles

plurais que expressam amplitude e apresentam um correspondente no singular muito

60

pouco usual ou cuja marca de número perdeu sua funcionalidade. Assim, SNs que

possuíam vocábulos como férias, óculos e costas foram retirados da análise.

Há, ainda, SNs do tipo “um mundo cheio de fantasias” ou “um enredo cheio de

peripécias” em que não há uma obrigatoriedade da marca formal de número no núcleo

do SN, até porque a presença do artigo um indetermina esse núcleo. Por isso, esses

casos foram eliminados da análise.

Por fim, houve um caso de inversão na ordem do sujeito em uma sentença e, por

isso, o predicativo e o sujeito ficaram juntos, mas não formavam um SN. Desse modo,

esse dado foi excluído, já que a concordância entre sujeito e predicado não constitui

objeto de estudo nessa pesquisa (“Ficaram todos felizes.”).

4.2. Variáveis

Sabe-se que há alguns fatores de caráter linguístico e social que atuam no

fenômeno da concordância nominal, ora favorecendo a marca formal de número <s> ora

desfavorecendo-a.

Assim, para esse fenômeno, existem duas variantes dependentes: a presença de

marca morfológica de concordância e a ausência dessa marca (“seus irmãos” / “os

inseto ᴓ”). Essas variantes são consideradas dependentes, pois a presença de uma ou

outra variante depende de fatores de ordem estrutural e social que influenciam na sua

ocorrência.

4.2.1. Variáveis linguísticas

4.2.1.1. Saliência fônica

A variável saliência fônica observa o processo morfofonológico de formação do

plural de cada item que compõe o SN analisado. Essa variável apresenta seis variantes

que podem representar um continuum de mais concordância a menos concordância,

partindo do plural mais saliente para o menos saliente, respectivamente, conforme a

tabela abaixo.

61

1ª vocábulos com plural duplo ou metafônico olho - olhos

2ª vocábulos terminados em –l animal - animais

3ª vocábulos terminados em –ão e no grau aumentativo situação - situações

casarão - casarões

4ª vocábulos terminados em -r flor - flores

5ª vocábulos terminados em –s freguês - fregueses

6ª vocábulos terminados em vogal ou vogal + nasal ou no

diminutivo (plural regular)

feia - feias

personagem -

personagens

menininho -

menininhos Tabela 4: constituição da variável saliência fônica.

Vale dizer que essa escala não é invariável. Scherre (1988) mostrou que os

falantes do primeiro e do antigo ginasial apresentaram resultados diferentes para as

variantes -ão e -l. Já o trabalho de Silva (2008), que fez um estudo comparativo das

décadas de 70 e 90, mostrou outro continuum para a escala saliência como se pode ver a

seguir:

Plural duplo > singular em ão > singular em /R/ > singular em /S/ > singular em /l/ > regular

Além disso, é interessante notar que essa variável tem se mostrado relevante

para o fenômeno da concordância, pois em muitos trabalhos tem sido selecionada como

muito significante para a presença ou ausência da marca formal de número. A hipótese

inicial para essa variável é a de que os elementos mais salientes, como o plural duplo e

os vocábulos terminados em -l e –ão, favorecerão a variante <s>, enquanto os plurais

menos salientes favorecerão a variante estigmatizada <0>.

4.2.1.2. Tonicidade

Essa variável analisa a tonicidade dos elementos que constituem o SN estudado,

com o objetivo de verificar se os monossílabos e os oxítonos favorecem a regra, ao

passo que os vocábulos proparoxítonos a desfavorecem, como já foi atestado em outros

trabalhos (SCHERRE, 1988).

Desse modo, nessa variável, há três variantes:

62

1ª monossílabos tônicos e palavras oxítonas pés/alguns

2ª monossílabos átonos e palavras paroxítonas as/ cabelos

3ª palavras proparoxítonas fotógrafos

Tabela 5: constituição da variável tonicidade.

4.2.1.3. Número de sílabas

A variável número de sílabas averigua se os termos com maior número de

sílabas tendem a ser mais marcados, enquanto aqueles com menor número de sílabas

tendem a ser menos marcados, já que apresentam pouco material fônico e, assim, seriam

menos perceptíveis.

Essa variável também apresenta quatro variantes, de acordo com a quantidade de

sílabas de cada palavra presente no SN analisado.

1ª vocábulos monossílabos os

2ª vocábulos dissílabos for - tes

3ª vocábulos trissílabos co - mi - das

4ª vocábulos polissílabos per- so - na - gens Tabela 6: constituição da variável número de sílabas.

4.2.1.4. Posição linear e relativa do constituinte no SN

Essa variável também tem sido bastante relevante para o fenômeno da

concordância nominal e, em alguns trabalhos, chega a ser a variável com maior

relevância, como no trabalho de Silva (2008) e de Brandão e Vieira (2012) para a

variedade do português do Brasil.

A hipótese é a de que os elementos pré-nucleares sejam mais marcados e os

elementos pós-nucleares receberiam menos marca de número. Além disso, nessa

variável também se observa o comportamento do núcleo do SN, dependendo da posição

que ele ocupe no sintagma.

Assim, essa variável apresenta dez variantes. São elas:

63

1ª Núcleo na 1ª posição listras marrons

2ª Núcleo na 2ª posição alguns parentes

3ª Núcleo na 3ª posição muitos outros lugares

4ª Núcleo na 4ª posição em diante as nossas típicas comidas

5ª Pré-nuclear na 1ª posição algumas instruções

6ª Pré-nuclear na 2ª posição todos os dias

7ª Pré-nuclear na 3ª posição em diante com os meus pais

8ª Pós-nuclear na 1ª posição exercícios anaeróbicos

9ª Pós-nuclear na 2ª posição as sobrinha mais velha

10ª Pós-nuclear na 3ª posição em diante jogos olímpicos muito importantes

Tabela7: constituição da variável Posição linear e relativa do constituinte no SN.

4.2.1.5. Marcas no elemento precedente

A variável marcas no elemento precedente observa os elementos que antecedem

os termos a serem analisados dentro do SN. Desse modo, averigua-se a influência dos

elementos precedentes para a realização ou não da regra formal de número. Essa

variável deseja comprovar se “marcas levam a marcas e zeros levam a zeros”

(SCHERRE, 1988). Assim, as variáveis posição linear e relativa do constituinte no SN

e marcas no elemento precedente não são antagônicas e nem se sobrepõem, pois

enquanto a primeira variável verifica se há relevância para o fenômeno da concordância

a posição em que um termo se encontra dentro de um sintagma, a segunda analisa a

possível interferência do elemento antecedente para a presença ou ausência da marca -s

de plural no termo subsequente.

Portanto, essa variável apresenta nove variantes, como se pode ver na tabela a

seguir. O termo em negrito é o termo que se analisa.

1ª ausência de elemento precedente ᴓ nas cidades

2ª ausência de marca morfológica no

elemento precedente

aᴓ olimpíadas

os olhoᴓ preto

porção de pedregulhoᴓ grosso

3ª presença da marca morfológica [s] no

elemento ou elementos precedentes

todos esperançosos

dos seus familiares

4ª termo semanticamente plural com presença

de marca de número

porções de pedregulho grosso

5ª termo semanticamente plural sem presença

de marca de números

farda [farta] de alimentos

6ª elemento imediatamente precedente é um

numeral

dois bancários

duas agências bancárias

7ª presença de um elemento precedente

invariável

exercícios muito pesados

Tabela 8: constituição da variável Marcas no elemento precedente.

64

4.2.1.6. Animacidade

A variável animacidade deseja observar o traço +/- humano, +/- animado e +/-

coletivo dos termos que constituem o SN, verificando se algum desses traços é relevante

para o fenômeno da concordância de número no português.

Segundo Scherre (1988), o traço + humano é significativo para a presença da

marca formal de plural, pois os termos com esse traço são mais salientes. Dessa forma,

tem-se como hipótese para esta pesquisa, que os termos + humanos favoreceriam a

variante prestigiada [s], enquanto os - humanos favoreceriam a variante zero.

Sendo assim, essa variável apresenta quatro variantes:

1ª [- humano] e [- animado] os ovos de ouro

2ª [- humano] e [+ animado] os seus amigos ratos

3ª [+ humano] e [- coletivo] dos garotos

4ª [+ humano] e [+ coletivo] as equipes

Tabela 9: Constituição da variável animacidade.

4.2.1.7. Tipologia textual

Essa primeira variável social analisa o tipo de texto em que se encontra o SN em

estudo, com o objetivo de verificar se a tipologia textual influencia na presença ou

ausência do morfema flexional de número. Desse modo, seguindo Marcuschi (2002), há

cinco tipologias textuais e estas cinco são as variantes presentes na pesquisa.

1ª Narração “Nunca sexta-feira, os garotos jogavam bolinhas de gude, num conto

da rua.”

2ª Descrição “Ele tem pintas embaixo dois olhos...”

3ª Argumentação “Eu acho esses jogos muito importantes porque mostra que pessoas

sem braços e sem pernas têm força de vontade e força para vencer, que

não é só as pessoas que não são deficientes podem participar.”

4ª Injunção “Comece a fazer exercícios físicos muitos de preferência natação...”

5ª Exposição “O Brasil nas olimpíada conseguiu 3 medalhas de ouro e nas

paraolimpíadas sabe quantas medalhas de ouro o Brasil teve?” Tabela 10: constituição da variável tipologia textual.

65

4.2.2. Variáveis sociais

4.2.2.1. Ano de escolaridade

A variável ano de escolaridade verifica a ação da escola para aquisição da

regra de concordância. Dessa maneira, coletaram-se dados de informantes do 6º ao 9º

ano, a partir de suas produções textuais, observando se há um crescimento no índice

da variante padrão sobre a variante estigmatizada, já que se sabe o quão grande é a

força normativa da escola no que tange ao fenômeno da concordância.

A hipótese inicial é de que haja um continuum crescente de marcação da

concordância, que vai dos alunos do 6º ano até os do 9º - passando pelos alunos do 7º e

8º anos, respectivamente. Isso se deve ao forte estigma social que tal variante recebe e à

ação normativa da escola, pois o conteúdo concordância nominal é, normalmente,

ensinado nas séries finais do ensino fundamental II (8º ou 9º ano). Portanto, essa

variável apresenta quatro variantes:

6º ano

7º ano

8º ano

9º ano

Tabela 11: constituição da variável

ano de escolaridade.

4.2.2.2. Gênero/ Sexo

Nessa variável, verifica-se se a regra de cancelamento ou realização da marca

morfológica de número é maior entre falantes do gênero/sexo masculino ou feminino.

Conforme Scherre (1996), o gênero/sexo feminino possui uma tendência maior à

realização das regras de prestígios. Essa constatação de Scherre é comum na literatura

variacionista, pois se acredita que as mulheres são mais sensíveis que os homens para

perceber qual variante recebe maior prestígio social e, desse modo, elas utilizam em

menor percentual a variante estigmatizada.

66

Assim, nessa variável haverá apenas duas variantes: gêneros masculino e

feminino.

4.2.2.3. Localidade

A partir dessa variável, pretende-se estabelecer uma relação entre localização

da escola e classe social, pesquisando em que medida uma regra será mais ou menos

aplicada em uma comunidade linguística. Como já foi exposta na seção referente à

constituição do corpus, a pesquisa coletou redações de quatro lugares distintos,

tentando estabelecer um continuum que parte de um lugar que atende a um público

menos favorecido (Santa Cruz e Quintino Bocaiuva), perpassa por um bairro mais

ascendente com um público misto (Vila da Penha) e finaliza em um bairro de classe

média alta (Ilha do Governador – Jardim Guanabara).

Desse modo, acredita-se que os estudantes da escola que se encontra em Santa

Cruz e Quintino apresentarão maior tendência ao uso da variante <0> do que os

falantes do Jardim Guanabara, devido ao contato linguístico que tais estudantes

recebem do meio social em que se encontram, além dos contrastes relativos ao nível

socioeconômico revelados pelos IDH e IDS de cada bairro.

Há quatro variantes para a variável localidade. São elas:

Quintino Bocaiúva

Santa Cruz

Vila da Penha

Jardim Guanabara

Tabela 12: constituição da

variável localidade.

4.2.2.4. Natureza da instituição

A penúltima variável social está relacionada à instituição às quais as escolas são

vinculadas. Muito se tem discutido sobre a educação formal no país, apontando

inúmeras vezes para a supremacia do ensino privado sobre o ensino público. Dessa

maneira, a partir dessa variável, será possível uma discussão sobre as diferenças e

67

semelhanças entre o ensino particular e público, já que a presente pesquisa coletou

dados de duas escolas da rede privada de ensino e duas da rede pública.

4.2.2.5. Faixa etária

Essa última variável extralinguística desejava verificar a aquisição da marca

morfológica de número, considerando que os informantes mais jovens são menos

pressionados pela norma escolar do que os de maior idade, além de partir do

pressuposto de que a estabilidade linguística se dá em torno de quinze anos. Essa

análise, então, leva em conta a possibilidade de que informantes mais jovens tendam a

marcar menos a concordância.

Uma observação a ser feita acerca dessa variável é que se verificou não haver

uma correspondência entre ano escolar e idade, havendo, assim, uma mistura de faixa

etária em cada ano de escolaridade. Logo, apesar de se controlar a idade, esse corpus é

constituído por informantes que ainda estão adquirindo estabilidade linguística.

Portanto, essa variável é composta por sete variantes que abrangem alunos de

dez a dezessete anos.

68

5. ANÁLISE DOS DADOS

5.1. Resultados gerais

Com as 297 redações analisadas, foram coletados 2.659 elementos que

constituíam os SNs plurais observados. Dentre esses elementos, 2.507 apresentaram a

marca morfológica de número e apenas 150 exibiram a variante ᴓ. Esse resultado

corresponde a 94,5% de concordância contra 5,5% de não concordância entre os termos

do SN.

Portanto, pelo resultado obtido, é coerente dizer que o fenômeno da

concordância nominal se enquadra na regra laboviana do tipo III – regra variável –, já

que apresenta percentuais entre 5% a 95%, porém esse percentual está bem próximo de

uma regra semi-categórica (95% a 99%). Dessa maneira, vale ressaltar que se trata de

escrita em que há a influência da escola, pois todas as produções textuais foram feitas

no ambiente escolar.

Outro fator relevante é que as redações foram produzidas como forma de

avaliação e, por isso, havia, ainda, uma pressão maior sobre a escrita desses alunos. Nas

escolas municipais, a prova de produção textual era uma avaliação da Secretaria

Municipal de Educação, que observa, a partir de uma série de provas, o desempenho dos

alunos do ensino público, assim como o desempenho dessas escolas e dos professores

que ali trabalham.

Assim, a partir desse resultado, pode-se afirmar que a hipótese sobre o aumento

da concordância no PB foi comprovada, pois nesse corpus houve um número bem

maior de concordância padrão na escrita. Na fala, Scherre (1988) e Vieira e Brandão

(2012) já mostravam que havia uma preferência pela concordância padrão tanto no

português do Brasil como em outras variedades do português. Com isso, percebe-se que

a escola vem cumprindo seu papel de manter a norma padrão, principalmente na escrita,

mas também tem trazido para a fala, variantes até então restritas à escrita formal.

Na seção seguinte, apresentam-se, minuciosamente, os resultados dessa

pesquisa, mostrando os fatores que condicionaram a presença da marca formal de

número nesses 2.659 dados. Os elementos em análise estão em negrito, para uma

melhor visualização.

69

5.2. Análise das variáveis selecionadas

Antes de mostrar os resultados das variáveis selecionadas, é importante dizer

que a variável natureza da instituição – pública ou privada – foi excluída da análise,

pois estava se sobrepondo a variável localidade, já que cada escola pertence a um dos

bairros analisados. Ainda assim, na seção 4.2.3 haverá comentários sobre a influência da

natureza da instituição, que está intimamente ligada à localidade onde essas escolas se

encontram.

Para a pesquisa, foi usada como fator de aplicação a variante prestigiada [s],

ainda que também tenham sido analisados os fatores que cancelam a marca de

concordância padrão na escrita. O input geral foi de 0.944, e o input da melhor rodada

selecionada foi de 0.962 e o nível de significância, 0.013.6

Cabe esclarecer os resultados dos percentuais e pesos relativos das tabelas.

Nestas, embora os percentuais de concordância sejam elevados, os pesos relativos

mostram-se desfavoráveis à aplicação da marca morfológica de concordância, em

alguns contextos. Como esclarecem Guy e Zilles (2007: p. 211-213), o GoldvarbX

fornece “uma representação abstrata dos efeitos de contexto independentemente dos

níveis gerais de uso de um processo”. Os pesos são relativos a um ponto neutro (.50).

Assim, os resultados abaixo deste ponto neutro indicam que esses contextos são

desfavoráveis à concordância nominal, ainda que os percentuais não revelem isso. A

análise multivariada faz essa ponderação, sendo confiável a análise do peso relativo: “os

valores dos pesos darão uma indicação superior dos efeitos do contexto” (p. 213).

Dessa forma, o programa selecionou seis variáveis, na seguinte ordem de

significância: marcas no elemento precedente, animacidade, localidade, ano de

escolaridade e posição linear relativa do constituinte no SN. Observa-se, pois, a co-

atuação de variáveis linguísticas e sociais.

Na variável posição linear e relativa do constituinte no SN, houve um fator que

apresentou comportamento categórico, ou seja, não houve variação nesse contexto.

6 O input consiste no ponto de referência para aplicação da regra, “o nível geral de uso de determinado

valor da variável dependente” (GUY, ZILLES, 2007: 238). O nível de significância corresponde à medida

que define o grau de confiança dos resultados obtidos; são estatisticamente significativos os índices iguais

ou inferiores a .005, e o peso relativo é o resultado da análise probabilística da correlação entre as

variáveis em estudo, “indica o efeito deste fator sobre o uso da variante investigada neste conjunto (...) o

peso é „relativo‟ ao nível geral de ocorrência da variante, indicada pelo input”: quanto mais próximo de 1

(um), mais o fator favorece a aplicação da regra (op. cit., p. 239).

70

Assim, na variável posição linear e relativa do constituinte no SN, a variante pré-

nuclear na 3ª posição (“... e depois ele fez todos os seus trabalho.”) apresentou 100%

de concordância padrão e foi amalgamada à variante pré-nuclear de 2ª posição para

manter uma coerência metodológica, já que as variantes núcleo na 3ª e na 4ª posições e

pós-núcleo na 2ª e na 3ª posições também foram unificadas

Os resultados detalhados de cada variável selecionada serão explicitados nas

seções a seguir.

5.2.1. Marcas no elemento precedente

A primeira variável selecionada é marcas no elemento precedente que observou

a influência do elemento anterior para a ausência ou presença de concordância no

elemento imediatamente posposto, com o objetivo de verificar se “marcas levam a

marcas e zeros levam a zeros”, como já foi atestado em outros trabalhos (SCHERRE,

1988).

Assim, nessa variável, foram feitas algumas junções de acordo com o

comportamento semelhante das variantes. Dessa forma, amalgamaram-se as variantes

ausência de marca morfológica no elemento precedente (“ᴓ muitos apelidos”) e

presença de um elemento precedente invariável (“essas orelhas tão grande”), pois em

ambas as variáveis há a ausência de uma marca morfológica de número. Uniram-se,

ainda, as variantes em que o elemento precedente era um termo semanticamente plural

com presença de marca de nº (“as porções de pedregulho groso”), termo

semanticamente plural sem presença de marca de nº (“a maioria dos jovens”) e

numeral (“dois litros”). Essa junção foi feita, já que todos esses elementos precedentes

possuíam uma carga semântica de plural. A tabela 5 adiante mostra o resultado dessa

variável para o fenômeno da concordância nominal.

71

Marcas no elemento precedente Concordância padrão

(variante -s)

APL/T 2509/2659 = 94,5%

Input inicial 0.944

de seleção 0.962

Significância 0.013

Aplic./total % PR

Ausência de elemento precedente 1.081/ 1.113 97% .58

Termo preced. semantica// plural (numeral) 144/158 94% .46

Presença de marca no elemento precedente 1.229/1.302 94% .46

Aus. de marca no elem. precedente (+ pal.

invariáveis)

55/ 86 64% .13

Tabela 13: atuação da variável marcas no elemento precedente – concordância padrão.

Pela tabela, é possível notar que apenas a variante ausência de elemento

precedente favoreceu a concordância de número, com peso relativo de .58 e 97%

(1.046/1.063) de concordância padrão. Esse resultado é coerente, já que essa variante

corresponde à primeira posição do SN. Logo, se não há nenhum elemento

imediatamente anterior, este, obrigatoriamente, precisa apresentar a marca de número

para que a noção de plural seja estabelecida.

- ausência de elemento precedente:

“ela ganhou ᴓ [muitos apelidos]” (aluna do 6º ano – Escola Municipal Oswaldo

Teixeira)

“e o mais importante lavar ᴓ [as mão]...” (aluno do 7º ano – Colégio ZeroHum)

“Mas, qual será a melhor? a tecnologia ou ᴓ [as brincadeira antigas]?” (aluno do 6º

ano – Colégio Esplendor)

“ela ficou ᴓ [alguns dia] sem falar com sua amiga” (aluna do 8º ano – Escola

Municipal Fernando Azevedo)

Em Scherre (1988), também se obteve o mesmo resultado: ausência de elemento

precedente favorece a marca no elemento da 1ª posição. Esse resultado, segundo a

autora, pode ser explicado pela teoria funcionalista kiparskiana: Condições de

distintividade (KIPARSKY, 1972 apud SCHERRE, 1988). Segundo essa teoria, há uma

tendência de se preservar na estrutura superficial de uma palavra aquelas informações

72

que são semanticamente relevantes. Dessa forma, quando o -s é fundamental para dar

ideia de plural, ele, necessariamente, aparece.

Camacho (2013) também considerou essa variável para a análise da

concordância nominal e também encontrou um percentual alto (98%) de concordância

padrão quando não havia nenhum elemento precedente, ou seja, quando o termo

ocupava a 1ª posição do SN sem nenhum elemento anteposto a ele. Entretanto, nesse

trabalho, essa variável apresentou um peso relativo de .51, revelando um

comportamento de neutralidade para a ausência ou presença da marca [s] de número,

diferentemente do resultado aqui encontrado.

Sobre a variante termo precedente semanticamente plural/ numeral, nota-se que

há um desfavorecimento para a regra de número, pois apresentou peso relativo de .46,

apesar de apresentar 94% (144/158) de marca morfológica de concordância.

- termo precedente semanticamente plural/ numeral:

“um monte de coisas” (aluna do 9ª ano – Colégio Esplendor)

“uma porção de pedregulho grosso” (aluno do 9º ano – Colégio ZeroHum)

“milhares de carros” (aluna do 8ª ano – Colégio Esplendor)

“dois relógio” (aluna do 8ª ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“Três histórias e três mulheres de diferentes gerações” (aluna do 8º ano – Escola

Municipal Fernando Azevedo)

Tanto em Camacho (2013) quanto em Scherre (1988), constatou-se que o termo

semanticamente plural com marca de número favorece a regra (“milhões de coisas”) e o

termo semanticamente plural no singular (“uma porção de carro”) a desfavorece. O

numeral, nos dois trabalhos, também favorece a regra de número, porém apresentou um

peso relativo próximo à neutralidade (.53 em Camacho, 2013). Já no estudo de Scherre

(1988), o peso relativo se mostra desfavorecedor, no que tange à fala de crianças (.49), à

semelhança do que ocorre nesta pesquisa, que considera a fala infanto-juvenil. No

entanto, na fala de adultos, essa variante mostrou-se favorecedora da concordância

(.59), revelando que possivelmente tal resultado pode estar correlacionado com o fator

escolaridade.

73

Todavia, Scherre (1988) também juntou, em sua análise, os termos

semanticamente plurais com e sem marca de número (porções de/porção de) e também

chegou a um resultado de desfavorecimento da marca de número com peso relativo de

.16 – na fala de crianças – e .45 – na fala adulta.

A conclusão a que se chega é que os SNs partitivos desfavorecem a morfologia

de número (Princípio Funcionalista da Economia Linguística), pois, como já carregam

em si a noção de plural, a presença da marca formal –s seria uma redundância. Além

disso, sabe-se que a preposição bloqueia a ocorrência de variante -s nos substantivos

subsequentes, como ocorre nos casos de plural de palavras e locuções como pés-de-

moleque, doces de leite, maçãs do amor, mesmo nas locuções verbais (Ele andou a

falar/Eles andaram a falar).

Outra variante que também desfavoreceu a regra de concordância é presença de

marca morfológica no elemento precedente que exibiu um peso relativo de .46 com

94% (1.229/1.302) da variante prestigiada -s. Parece que, nesse contexto, o Princípio da

Economia Linguística influencia o fenômeno da concordância, já que o -s na 2ª posição

se torna irrelevante e, por isso, pode ser apagado, uma vez que a marca de número

apareceu no elemento anterior. Assim, há uma tendência a eliminar redundâncias.

- presença de marca morfológica no elemento precedente:

“todas as bolinha” (aluna do 6º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“as criança” (aluna do 7º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“as sobrinha mais velha” (aluna do 7º ano – Escola Municipal Fernando

Azevedo)

“Esses preconceito” (aluno do 9º ano – Colégio Espendor)

Entretanto, em Scherre (1988), a marca na 1ª posição favorece a marca na 2ª

posição. De acordo com a autora, esse resultado contraria a hipótese funcionalista da

economia, em que a marca -s só apareceria quando necessária/distintiva. Portanto, nesse

contexto, há outro princípio atuando, um princípio formal em que “marcas levariam a

marcas e zeros levariam a zeros” (paralelismo formal). Além disso, para Scherre (1988),

quanto mais marcas formais aparecerem nos elementos precedentes, maior é o

favorecimento da regra (“as maiores privações” / “as partidas todas iguais”).

74

Camacho (2013) também confirma a hipótese de paralelismo formal nesse contexto e

também diz que quanto mais marcas formais precedentes, maior é o favorecimento para

a inserção de marca de plural no elemento seguinte – .50 (“os meus companheiros”),

porém quando há mistura de marca, a chance de marcação de número diminui – .20

(“pro meus filho”). Todavia, vale dizer que .50 representa um comportamento neutro e

não um favorecimento, como afirmou Camacho (2013, p. 187).

Desse modo, em relação à variável presença de marca no elemento precedente,

os dados da escrita de alunos do Ensino Fundamental II revelam comportamento

diferenciado, atuando o Princípio da Economia Linguística pela marcação dos

elementos mais à esquerda do SN.

A última variante a ser analisada é ausência de marca morfológica no elemento

precedente/termo precedente invariável, em que se considera também a presença de um

termo invariável como elemento precedente (preposições – “plantaram pés de cocos” -

e advérbios – “seres menos dignos”/”os cara mais rápido”). Esse foi o contexto que

apresentou o menor peso relativo (.13) e o menor percentual de presença da marca

morfológica de número (64% - 55/86). Dessa forma, esse contexto parece ser o mais

desfavorecedor da regra de número.

- ausência de marca morfológica no elemento precedente/ termo precedente invariável:

“porções de areia ᴓ fina” (aluno do 9º ano – Colégio ZeroHum)

“os cara mais rápido” (aluno do 8ª ano – Colégio ZeroHum)

“esses olhos tão grande” (aluno do 6º ano – Escola Municipal Oswaldo

Teixeira)

“esse ᴓ olhos tão grande” (aluna do 6º ano - Escola Municipal Oswaldo

Teixeira)

Para Scherre (1988) e Camacho (2013), quando não há marca morfológica de

número no primeiro elemento precedente do SN, categoricamente aparece um -s na

posição seguinte (dOᴓ meus pais). Mais uma vez, Scherre defende a teoria kiparskiana

de distintividade, em que a marca morfológica de número se concretiza apenas quando

há necessidade, isto é, quando ela é fundamental para atribuir noção de número. À

semelhança dos resultados de Scherre (1988), foram encontradas ocorrências dessa

75

natureza (“E também as crianças não pode jogar aᴓ suas vida fora...”) que também

apresentaram comportamento categórico. No entanto, nesta pesquisa, tais dados foram

codificados juntamente com aqueles, cujo SN apresentava elemento precedente sem

marca morfológica, não figurando na primeira posição (“os olhoᴓ preto”; “porções de

areiaᴓ fina”).

Vale dizer que dentre os 86 dados presentes nessa variante – ausência de marca

morfológica no elemento precedente/termo precedente invariável –, 39 apresentam um

termo invariável (advérbios e preposição). Desses, apenas 8 casos não continham a

marcação de número no termo seguinte:

- SNs com termo precedente invariável:

“Chapeuzinho pegotou para que [esse olhos tão grande]” (aluna do 6º ano – Escola

Municipal Oswaldo Teixeira)

“Quando ela bateu na porta ele perguntou, para que [esses olhos tão grande].” (aluno

do 6º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“ela falou que [olhos tão grede] você tem vovozinha” (aluna do 6º ano – Escola

Municipal Fernando de Azevedo)

“vovó pra que [essas orelhas tão grande]?” (aluna do 6º ano – Escola Municipal

Fernando de Azevedo)

“vovó pra que [esses olhos tão grande]?” (aluna do 6º ano – Escola Municipal

Fernando de Azevedo)

“ao redor dela, havia parentes, amigos,[as sobrinha mais velha]” (aluna do 7º ano –

Escola Municipal Fernando de Azevedo)

“eu tenho que fazer [mais muito deveres], provas etc..”. (aluno do 6º ano – Colégio

Esplendor)

“um exemplo disso foi um corredor paraolímpico que com as pernas “mecanicas”

correu nas olimpíadas e chegou entre os primeiros correndo com Bolt e [os cara mais

rápido do mundo]...” (aluno do 8º ano – Colégio ZeroHum)

Com o objetivo de conferir se ocorre a atuação do Princípio do Paralelismo

Formal ou da Economia Linguística na variável marcas no elemento precedente, fez-se

76

uma rodada, retirando-se os SNs partitivos7 e aqueles que apresentavam um termo

invariável (preposição e advérbios), ficando apenas os numerais (“dois dias”) e as

ocorrências de ausência de marca no elemento precedente do tipo “nas coisa sujas”.

Ficaram, portanto, apenas os SNs simples. Os resultados seguem na tabela abaixo:

Marcas no elemento precedente Concordância padrão

(variante -s)

APL/T 2401/2498 = 96,1%

Input inicial 0.961

de seleção 0.976

Significância 0.038

Aplic./total % PR

Ausência de elemento precedente 1.046/ 1.063 98% .65

Numeral 125/130 96% .54

Presença de marca no elemento precedente 1.207/1.278 94% .36

Ausência de marca no elemento precedente 23/ 27 85% .20 Tabela 14: atuação da variável marcas no elemento precedente sem os SNs partitivos e com

termo invariável – concordância padrão.

Como se pode observar, a variante ausência de elemento precedente continua

favorecendo a concordância padrão no elemento seguinte com peso relativo de .65 e

98% (1.046/1.063) de presença da variante -s (“ os dentes com a ponta fina”).

Outra variante que favoreceu a regra de concordância é numeral que exibe um

peso relativo de .54 e 96% (125/130) de frequência (“três histórias” “dois relógio”). A

hipótese é de que há uma tendência de marcas semelhantes se agruparem, mesmo que

essa marca seja apenas semântica, mesma conclusão a que chega Scherre (1988).

Há, ainda, a variante presença de marca no elemento precedente que continuou

desfavorecendo a regra de número com peso relativo de .36 e 94% (1.207/1.278) de

concordância nominal padrão. Nesse contexto, pode-se dizer que o Princípio da

Economia Linguística continua atuando, pela tendência em eliminar informações

redundantes.

7 Nesta pesquisa, procedeu-se a uma análise somente sem os termos partitivos com o objetivo de

averiguar um possível enviesamento dos resultados. Entretanto, essa nova rodada selecionou as mesmas

variáveis, na mesma ordem de relevância, eliminando, apenas, a variável Posição linear e relativa do

constituinte no SN. Portanto, conclui-se que esse tipo de SN não “prejudicou” a análise como um todo,

mas somente algumas variáveis, já que esses SNs se encontravam, majoritariamente, em um corpus

especifico – 9º ano do Colégio ZeroHum, Ilha do Governador. Além disso, decidiu-se permanecer com os

partitivos na análise em consonância com outros trabalhos, como Scherre (1988) e Camacho (2012).

77

Por fim, há a variante ausência de marca no elemento precedente, considerando

apenas casos de SNs simples do tipo “os docinhos” “as criança”, excluindo-se as

ocorrências de SNs partitivos (“porções de pedregulho fino”) e os SNs com termo

invariável (“os demais personagens”), com o intuito de averiguar qual princípio rege o

fenômeno da concordância nesse contexto. Assim, como se vê pela tabela, o peso

relativo dessa variante é de .20 e o percentual é de 85% (23/27). Logo, é possível

afirmar que esse contexto continua sendo o mais desfavorecedor para a aplicação da

regra de número. Ao que tudo indica, a ausência de marca no termo precedente leva à

não-marcação no termo seguinte; em outras palavras, é o Princípio do Paralelismo

Formal que está presente, mostrando que “zeros levam a zeros”.

De outro lado, é possível considerar, numa análise refinada dos pesos relativos,

que atua o Princípio do Paralelismo Formal. Observando novamente a tabela 14,

Marcas no elemento precedente Concordância

padrão

PR

Ausência de elemento precedente .65

Numeral .54

Presença de marca no elemento precedente .36

Ausência de marca no elemento precedente .20 Tabela 14: atuação da variável marcas no elemento precedente sem os SNs

partitivos e os termos invariáveis – concordância padrão

nota-se que se não há nenhuma elemento antecedendo o termo sob análise, a marca

morfológica obrigatoriamente tem de aparecer para garantir a noção de plural (.65) Atua

aí o Princípio da Distintividade Funcional, ou seja, retém-se a informação

semanticamente relevante.

“muitas coisas” (aluno do 9º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“uns biscoitos” (aluna do 6º ano – Escola Municipal Fernando de Azevedo)

No caso de o elemento em análise ser antecedido por um numeral, já se nota a

atuação do Princípio do Paralelismo Formal, tendo em vista que a noção semântica de

plural implica a marca morfológica –s no termo subsequente, ainda que indique

neutralidade (.54).

78

“um dos livros” (aluno do 7º ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

“dez mil crianças” (aluno do 8º ano – Colégio Esplendor)

O mesmo se pode dizer a respeito da variável presença de marca morfológica no

elemento precedente. Ainda que o peso relativo indique ser um contexto desfavorecedor

(.36), verifica-se uma maior tendência à presença da variante -s do que naquele contexto

em que o elemento precedente se apresenta sem marca morfológica (.20). Nesse sentido,

“marcas levam a marcas e zeros levam a zeros” (SCHERRE, 1988).

“nossas florestas” (aluna do 8º ano – Colégio Esplendor)

“vários seres humanos” (aluno do 9º ano – Colégio ZeroHum)

Portanto, parece que, nos dados da modalidade escrita dessa pesquisa, há dois

princípios regendo o fenômeno da concordância: o Princípio da Distintividade

Funcional, nos contextos em que a marca -s é fundamental para estabelecer a ideia de

plural (ausência de elemento precedente), e o Princípio do Paralelismo Formal, nos

contextos em que há a tendência de formas semelhantes aparecerem juntas: numeral

(semanticamente plural) e presença de marca no elemento precedente levam à marca no

elemento subsequente, e ausência de marca no elemento precedente leva a ausência de

marca no elemento subsequente.

5.2.2. Animacidade

A segunda variável selecionada é animacidade. Esta variável observa o traço +/-

humano, +/- animado e +/- coletivo dos elementos do sintagma analisado. A tabela

abaixo mostra o resultado para essa variável. Vale informar que não houve dados do

tipo [+ humano] e [+ coletivo] no corpus.

79

Animacidade Concordância padrão

(variante -s)

APL/T 2509/2659 = 94,5%

Input inicial 0.944

de seleção 0.962

Significância 0.013

Aplic./total % PR

[+ humano] e [- coletivo] 365/375 97% .72

[- humano] e [- animado] 2.117/ 2.248 94% .46

[- humano] e [+ animado] 27/36 75% .22 Tabela 15: atuação da variável animacidade – concordância padrão.

Uma análise global permite afirmar que há uma oposição entre núcleos [+

humanos] e [- humanos], já que a variante [+humano] e [- coletivo] apresenta peso

relativo .72 (97% dos dados), ao passo que tanto os de traço [- humano - animado]

quanto os de traço [- humano + animado], ou seja, objetos e animais, apresentam pesos

relativos desfavorecedores da marca formal de concordância (.46, 94% dos dados; .22,

75% dos dados, respectivamente).

- [+ humano] e [- coletivo]:

“os jogadores” (aluna do 8º ano – Colégio ZeroHum)

“os professores” (aluna do 7ª ano – Colégio Esplendor)

“os turistas” (aluna do 8º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

- [- humano] e [- animado]:

“os outros capítulo” (aluna do 8ª ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“as cores do guarda-chuva” (aluna do 8º ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

- [- humano] e [+ animado]:

“as formiga” (aluno do 7º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“os seus amigos rato” (aluna do 6º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

Também Scherre (1988) afirma que o traço humano é o mais significativo para o

fenômeno, por ser mais saliente. A autora mostrou que as variantes [+ humano] e [-

80

coletivo] e [+ humano] e [+ coletivo] favoreceram a concordância de número (.59, 61%;

.65, 66%, respectivamente). Já as variantes [-humano] e [- animado] e [- humano] e [+

animado] desfavoreceram a marca explícita de plural (peso relativo de .44, 52% e .33,

36%, respectivamente).

Também no trabalho de Vieira e Brandão (2012), as autoras confrontaram o

português do Brasil e o português de São Tomé e Príncipe e, em ambas as variedades do

português, a variável animacidade foi selecionada como um fator relevante, mostrando

que os núcleos [+ humanos] exibem mais marcas de plural que os núcleos [- humanos].

Com os resultados encontrados nesta pesquisa, pode-se inferir que o traço [+

humano] é uma motivação importante para o não cancelamento da marca morfológica

de número, fato comprovado também em outras pesquisas.

5.2.3. Localidade

A terceira variável relevante para o fenômeno da concordância nominal é a

localidade. Essa variável observa o lugar em que se encontram as escolas, verificando a

importância do contexto social para o fenômeno em estudo. Assim, a próxima tabela

mostra esse resultado:

Localidade Concordância padrão

(variante -s)

APL/T 2509/2659 = 94,5%

Input inicial 0.944

de seleção 0.962

Significância 0.013

Aplic./total % PR

Vila da Penha 826/856 96% .61

Santa Cruz 513/543 95% .51

Ilha do Governador 723/766 94% .48

Quintino 446/494 90% .32 Tabela 16: atuação da variável localidade – concordância padrão.

Como se nota, os informantes da escola Municipal localizada em Quintino

apresentaram maior tendência ao cancelamento da marca -s de plural (.32, 90% -

446/494), enquanto os do colégio na Vila da Penha favorecem a variante prestigiada

(.61, 96% - 826/856). Já aqueles da Escola Municipal em Santa Cruz e na Ilha do

81

Governador apresentaram um peso relativo que revela neutralidade (.51, 95% - 513/543;

.48, 94% - 723/766, respectivamente), no que tange ao uso da variante de prestígio, com

um leve favorecimento para a escola em Santa Cruz e desfavorecimento para a escola

que fica no Jardim Guanabara – Ilha do Governador. Desse modo, os resultados da

variável localidade podem ser representados por este continuum:

- concordância + concordância

Quintino Ilha do Governador Santa cruz Vila da Penha

Esse resultado não confirma as hipóteses iniciais desta pesquisa. Acreditava-se

que o colégio na Ilha do Governador fosse aquele que apresentaria maior tendência à

concordância, devido a fatores sócio-econômicos já comentados na seção 4.1.2.1, como

o maior índice de educação (0,993), a maior taxa de frequência escolar e de

alfabetização de adultos (111,15 e 98,92, respectivamente), além de ser o lugar que

ocupa a 3ª posição no ranking de melhor IDH do município (.963).

Também se postulava que a Escola Municipal em Santa Cruz fosse aquela com a

menor tendência à concordância, em função dos baixos índices socioeconômicos, como

o menor percentual de alfabetização de adultos (93,19) em relação às demais

localidades, o menor índice de frequência escolar (79,82) e o menor índice de

desenvolvimento social em 2008 (0,476), este muito abaixo dos outros bairros

considerados.

Talvez o resultado de quase neutralidade para o colégio da Ilha do Governador

tenha alguma relação com o tipo de dado presente no corpus produzido pelos falantes

dessa instituição, já que a maior parte são do tipo uma porção de, um monte de, uma

camada de (partitivos) estava nas redações desses alunos. Como foi mencionado, tanto

o pré-núcleo como o núcleo desses elementos partitivos apareceram, em sua maioria,

sem marca de número. Em alguns casos, até os termos posteriores não recebem a marca

de -s plural:

“uma porção de pedregulho fino” (aluno do 9º ano – Colégio ZeroHum – Ilha

do Governador)

“um monte de doentes” (aluna do 8º ano – Colégio ZeroHum – Ilha do

Governador)

82

“pela camada de pedregulhos finos” (aluna do 9º ano – Colégio ZeroHum – Ilha

do Governador)

Ao se proceder à análise retirando os SNs do tipo uma porção de, a maioria de,

um monte de e os SNs que apresentavam termo precedente invariável, a hipótese inicial

pôde ser comprovada: Santa Cruz e Quintino (onde se localizam as escolas municipais)

desfavorecem a aplicação da regra de número (.38 e .24, respectivamente). Já os bairros

Vila da Penha e Jardim Guanabara/Ilha de Governador (onde se localizam as escolas

particulares) a favorecem (.64 e .60, respectivamente), confirmando-se agora o

favorecimento da concordância na Ilha e não mais a neutralidade. Observe a tabela e o

novo continuum para a variável localidade:

Localidade Concordância padrão

(variante -s)

APL/T 2401/2498 = 96,1%

Input inicial 0.961

de seleção 0.976

Significância 0.038

Aplic./total % PR

Ilha do Governador 715/734 98% .64

Vila da Penha 698/708 97% .60

Santa Cruz 492/512 96% .38

Quintino 436/479 91% .24 Tabela 17: atuação da variável localidade sem os SNs partitivos e os

termos invariáveis – concordância padrão.

- concordância + concordância

Quintino Santa cruz Vila da Penha Ilha do Governador

Com base nesta variável e no fato de que cada localidade corresponde à natureza

da instituição pesquisada (pública ou privada), podem-se comparar os seus

desempenhos. Assim, as escolas privadas (Vila da Penha e Ilha) tenderam ao

favorecimento da regra padrão, ao passo que as públicas (Santa Cruz e Quintino)

tenderam a um desfavorecimento. Tal resultado pode refletir a qualidade do ensino, o

que corrobora os índices apresentados na tabela 17, do item 5.2.3, no que se refere aos

adultos alfabetizados (93,19 e 96,80, respectivamente), frequência escolar (79,82 e

83

91,97, respectivamente) e educação (0,887 e 0,783, respectivamente), todos mais baixos

do que os encontrados para Vila da Penha e Jardim Guanabara/Ilha do Governador.

É relevante, ainda, mostrar algumas observações sobre essas instituições, para

que se possa ver a diferença entre elas. Primeiramente, é importante saber que as escolas

municipais – Quintino e Santa Cruz – foram aquelas que apresentaram um corpus mais

completo, com maior número de redações, porém apresentaram menor número de dados

(498 e 542, respectivamente). Isso porque, apesar de haver número maior de produções

textuais, essas redações eram bem pequenas, muitas não passavam de dois parágrafos.

Além disso, essas redações apresentavam um modelo de construção, ou seja, a

maioria delas seguia um padrão de escrita, talvez ensinado durante as aulas, para que os

alunos conseguissem produzir bom texto na prova da Secretaria Municipal de Educação.

Por isso, algumas redações começavam da mesma maneira, como uma receita (“Dos

livros que li nesse bimestre” ou “Dos livros lidos esse bimestre” – muitos alunos do 7ª

ano da Escola Municipal Fernando Azevedo).

Esse fato é relevante, já que os professores e as escolas não querem ser avaliadas

negativamente, pois, em função disso, podem perder benefícios que o município

distribui àquelas escolas que tiverem um desempenho satisfatório. Desse modo, talvez o

percentual de concordância padrão (90% - Quintino e 95% Santa Cruz) não reflita

exatamente o que é produzido por essas comunidades, como demonstra o valor dos

pesos relativos (.32 e .51, respectivamente).

Uma observação importante a se fazer se refere à produtividade de cada

instituição. As escolas particulares exibiram redações maiores e, por isso, obtiveram-se

mais dados. Foram mais de 200 dados de diferença entre as escolas públicas e as

privadas. Aparentemente, esse é um fato irrelevante, já que o programa faz essa

ponderação. No entanto, essa diferença mostra uma realidade diferente entre essas

instituições, pois foi possível inferir que os alunos das escolas particulares escrevem

mais, estão mais acostumados com a prática da escrita e, talvez, tenham até mais

facilidade, ainda que não se tenha encontrado redação considerada como um modelo de

escrita. Os alunos dos colégios da Ilha e da Vila da Penha produziram redações menos

presas a receitas, mais criativas e de diferentes tipologias, a depender do ano escolar do

aluno, enquanto as escolas municipais produziram em massa a narração, em todos os

anos de escolaridade.

84

Contudo, não se pode afirmar, categoricamente, que essas diferenças advenham

da natureza da instituição (pública x privada), já que não foi possível controlar a ação

dessa variável. Dessa maneira, o resultado aqui encontrado é uma questão relacionada

aos bairros estudados, com suas especificidades sociais, econômicas e culturais.

5.2.4. Ano de escolaridade

A última variável selecionada pelo programa é ano de escolaridade. Essa

variável observou a influência da série/ano escolar sobre o fenômeno da concordância.

Seguem os resultados expostos na tabela a seguir:

Ano de escolaridade Concordância padrão

(variante -s)

APL/T 2509/2659 = 94,5%

Input inicial 0.944

de seleção 0.962

Significância 0.013

Aplic./total % PR

6º ano 440/468 94% .46

7º ano 508/545 93% .42

8º ano 896/928 97% .61

9º ano 665/718 93% .42 Tabela 18: atuação da variável ano de escolaridade – concordância padrão.

Pela tabela, percebe-se que a única variante que favorece a concordância é 8º

ano que apresenta um peso relativo de .61 e um percentual de 97% (896/928) para a

variante -s. A fim de averiguar o comportamento dessa variante, fizeram-se alguns

cruzamentos com o objetivo de analisar fatores que pudessem favorecer a concordância

no 8º ano. Assim, o cruzamento entre ano de escolaridade e tipologia textual mostrou

um resultado interessante, pois foi possível notar que nesse ano escolar havia o maior

número de textos argumentativos. Dos 507 trechos argumentativos presentes no corpus

como um todo, 377 (74%) estavam nas produções do 8º ano e apenas 9 deles (2%) não

exibiram a variante padrão. Já os outros anos de escolaridade apresentavam, em grande

número, fragmentos narrativos, enquanto o 8º ano apresentava apenas 23% de narração.

Nas narrações presentes nos textos dos alunos, havia o uso de diálogos entre os

personagens, escrita em 1ª pessoa, de modo subjetivo e, por isso, pode apresentar traços

85

mais informais. Tal informalidade pode estar se revelando na menor preocupação com a

escrita.

“Chapeuzinho pegotou para que esse olhos tão grande” (aluna do 6º ano – Escola

Municipal Oswaldo Teixeira)

“Mais uma crianças não gostava e então o velho falo – o que vocês quer e as criança

falou...” (aluna do 7º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“Veno a historia as joaninha aseto a oferta e derrotarão os gavanhoto e as

formiga agradesero muito as juaninha e assim que terminão a historia.” (aluno do 7º

ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

Por outro lado, a argumentação é um tipo de texto em que se exige a

impessoalidade, a objetividade, não há diálogo, mas sim uma tese que deve ser

defendida com argumentos. Desse modo, na escola, o uso dessa tipologia exige mais

formalidade, pois requer maior monitoramento por parte daquele que o produz.

“Por exemplo tsunames causados pelo aumento do nível do mar, pois as calotas

polares estão se derretendo porque o calor esta aumentando.” (aluna do 8ª ano –

Colégio Esplendor)

“As paralimpiadas são tão importantes quanto as olimpíadas porque todos têm

direito de ser um atleta mesmo tendo uma deficiência.” (aluna do 8º ano – Colégio

ZeroHum)

“Para mim, as Parolimpiadas são tão importante quanto as olimpiedas porque

são pessoas com problemas físicos mostrando que um problema físico não é motivo de

você deichar de ir atraz do seu sonho.” (aluno do 8º ano – Colégio ZeroHum)

Portanto, acredita-se que a argumentação, por exigir maior formalidade, tenha

favorecido a presença da variante prestigiada -s na produção do 8º ano, assim como a

narração desfavoreceu a regra padrão por apresentar um menor monitoramento e uma

maior liberdade expressiva.

Já a variante 6º ano exibiu um peso relativo de .46 e 94% (440/468) de

concordância padrão. Pelo peso relativo, pode-se dizer que essa variante revelou um

86

comportamento quase neutro para o fenômeno em questão, com um pequeno

desfavorecimento da regra.

Por outro lado, as variantes 7º ano e 9º ano apresentaram um comportamento

desfavorecedor para a regra de número. Tanto a variante 7º ano como a variante 9º ano

apresentaram peso relativo de .42 e 93% (508/545; 665/718, respectivamente) de

variante prestigiada -s.

O resultado da variante 9º ano pode ser justificado pelos dados presentes no

corpus referentes a esse ano, já que nela se encontra a maior parte dos SNs partitivos.

Como já foi mencionado anteriormente, esses SNs apresentam, em grande parte, o pré-

núcleo e o núcleo sem marca de número. Em alguns casos, até mesmo o SN todo não

apresentava marca formal de plural.

“uma porção de turistais” (aluno do 9º ano – Escola Municipal Oswaldo

Teixeira)

“uma porção de areia fina” (aluno do 9º ano – Colégio ZeroHum)

“uma porção de pedregulho grosso” (aluno do 9º ano – Colégio ZeroHum)

“um monte de coisas” (aluna do 9º ano – Colégio Esplendor)

“a maioria dos negros” (aluna do 9º ano – Colégio Esplendor)

“pela camada de pedregulhos finos” (aluno do 9º ano – Colégio ZeroHum)

A fim de comprovar a interferência desses dados no resultado, procedeu-se a

uma rodada sem os SNs partitivos e os SNs com termo invariável. Durante a análise

multivariada, a variável ano de escolaridade não foi selecionada e, por isso, foi

necessário buscar os resultados no nível 1 da interação computacional, nível em que se

considera cada variável singularmente:

87

Ano de escolaridade Concordância padrão

(variante -s)

APL/T 2509/2659 = 94,5%

Input inicial 0.944

de seleção 0.962

Significância 0.118

Aplic./total % PR

6º ano 420/439 96% .46

7º ano 498/527 94% .40

8º ano 855/881 97% .56

9º ano 628/651 96% .51 Tabela 19: atuação da variável ano de escolaridade sem os SNs partitivos

e os termos invariáveis – concordância padrão – nível 1 da interação.

A tabela mostra que, mais uma vez, essas ocorrências influenciaram os

resultados das análises das variáveis selecionadas, desta vez na variável ano de

escolaridade.

Dessa forma, nessa nova análise, a variante 9º ano exibiu um peso relativo de

.51 e um percentual de concordância padrão de 96% (628/651). Esse resultado

comprova que os SNs partitivos estavam interferindo no resultado desse ano escolar e,

ainda, confirma, em parte, a hipótese de que há influência da escolaridade na aquisição

da regra de concordância, ainda que o peso relativo não indique um franco

favorecimento da presença da marca morfológica -s, mas um comportamento neutro

(.51).

Portanto, as séries iniciais (6º e 7º anos) apresentaram pesos relativos

desfavorecedores para a regra padrão de número, enquanto o 8º e o 9º anos

favoreceram, discretamente, a presença da variante -s. Todavia, mostrou-se a influência

de outra variável sobre esse resultado, como a tipologia textual argumentação e também

o efeito dos SNs complexos nos dados do 9º ano.

5.2.5. Posição linear e relativa do constituinte no SN

A Posição linear e relativa do constituinte no SN foi a quarta variável

selecionada pelo programa e observou se a posição em que um termo se encontra no SN

influencia na presença ou ausência da marca de número. Além disso, deseja-se

confirmar a hipótese de que os elementos mais à esquerda do SN tendem a favorecer a

88

regra de número, enquanto os termos mais à direita desfavorecem a regra padrão de

concordância.

Fizeram-se algumas junções, de acordo com o percentual e o peso relativo (PR)

que as variantes possuíam. Essas junções foram feitas devido à pequena quantidade de

dados que as variantes apresentavam e pelo comportamento aproximado que revelaram.

Portanto, juntaram-se os elementos pré-nucleares de 2ª e 3ª posição (“pelos

outros animais” / “todos os seus trabalho”) assim como os elementos pós-nucleares de

2ª e 3ª posição (“brincadeiras mais curtas” / “Os aumentos dos filtros solares”) e

também os núcleos de 3ª e 4ª posição (“muitas outras coisas” / “um dos dois filhos”).

Feitas essas observações, o resultado dessa variável pode ser visto na tabela a

seguir:

Ano de escolaridade Concordância padrão

(variante -s)

APL/T 2509/2659 = 94,5%

Input inicial 0.944

de seleção 0.962

Significância 0.013

Aplic./total % PR

Pré-nuclear na 1ª posição 999/ 1.029 97% .58

Pré-nuclear na 2ª/3ª posição em diante 114/ 120 95% .55

Pós-nuclear na 1ª posição 200/ 211 95% .55

Núcleo na 1ª posição 98/ 101 97% .52

Núcleo na 2ª posição 916/ 977 94% .45

Núcleo na 3ª/4ª posição em diante 128/ 143 89% .37

Pós-nuclear na 2ª/3ª posição em diante 54/ 78 69% .20 Tabela 20: atuação da variável Posição linear e relativa do constituinte no SN – concordância

padrão.

A variante pré-nuclear na 1ª posição é a que apresentou o maior peso relativo

(.58) e um percentual de concordância padrão de 97% (999/1.029). Esse resultado

comprova a hipótese de que o termo mais à esquerda do SN favorece a presença da

variante padrão. Além disso, esse contexto equivale a 1ª posição do SN que, como já foi

exposto anteriormente, é um ambiente favorecedor para a concordância de número.

- Pré-nuclear na 1ª posição:

“os acontecimentos de antigamente” (aluno do 7º ano – Colégio Esplendor)

“seus cabelos loiros” (aluna do 6ª ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

“do adultos” (aluna do 9ª ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

89

Em muitos trabalhos sobre o tema, essa posição tem se mostrado favorecedora

da concordância. Em Scherre (1988), por exemplo, a autora afirma que se marca

preferivelmente a 1ª posição, independente da classe gramatical do termo, e as outras

posições se tornam desnecessárias.

Camacho (2013), em sua discussão sobre a concordância na fala de indivíduos

de Iboruna, região noroeste do interior de São Paulo, tem por resultado que os

elementos pré-nucleares favorecem a marca explícita (.75, 98%, na 1ª posição e .76,

96%, na 2ª posição do SN).

É interessante notar que o corpus apresentou 30 casos de não concordância nessa

posição (pré-nuclear 1ª. posição). Ao observar esses dados, notou-se que havia SNs do

tipo uma porção de, um punhado, um monte de, em que nem o determinante e nem o

núcleo apresentavam a marca formal de plural (12/30 dados, 40 %), e casos em que o

SN não apresentava marca no pré-núcleo, mas o núcleo recebia marcação: “esse olhos”

(18/30 dados, 60%).

Nesses partitivos, entende-se que a ausência de marca formal no pré-núcleo se

deva ao fato de que o núcleo (a maioria, a maior parte de, uma porção de) carrega o

traço semântico plural, mas não é morfologicamente marcado.

“um grupo de garotas” (aluna do 8ª ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

“um punhado de medos” (aluna do 9ª ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

“uma porção de pedregulho grosso” (aluno do 9º ano – Colégio ZeroHum)

Ainda entre as ocorrências de pré-núcleo na 1ª posição, há interessantes casos de

não marcação morfológica, conforme se observa nos dezoito exemplos listados abaixo:

“Chapeuzinho pegotou para que <esse ᴓ> olhos tão grande” (aluna do 6º ano – Escola

Municipal Oswaldo Teixeira)

“tenque aprender <a ᴓ > varias matéria tipo: química, ciência, mais com formula,

outras matérias etc...” (aluno do 6º ano – do colégio particular Esplendor)

“mais <muito ᴓ> deveres, provas etc...” (aluno do 6º ano – Colégio Esplendor)

“existe <muito ᴓ> tipos de esporte exemplo: futebol, volei...” (aluna do 7º ano –

Colégio Esplendor)

90

“muitas pessoas começam muito cedo no esporte, sonho de <muita ᴓ> dessas pessoas

é participar da Olimpíada.” (aluno do 7º ano – Colégio Esplendor)

“O melhor, é comer <bastante ᴓ> frutas, de preferência no horário do lanche” (aluna

do 7º ano – do colégio particular ZeroHum).

“Faça <bastante ᴓ> exercícios físicos.” (aluna do 7ª ano – Colégio ZerroHum)

“Mais <uma ᴓ > crianças não gostava de então o velho falo – o que vocês quer e as

criança falou...” (aluna do 7º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“<a ᴓ> olimpíadas é um evento que deixa todos esperançosos, ansiosos e

confiantes” (aluna do 8º ano – do colégio ZeroHum)

“Com isso <a ᴓ> paralimpiedas também ajudou a reduzir o preconceito pois

ganharam muito mais medalhas quanto os atletas das olimpiedas.” (aluno do 8º ano –

Colégio ZeroHum)

“E tambem as crianças não pode jogar <a ᴓ> suas vida fora por causa de um dinheiro

que não vale apenas curti a suas vida e não ficar com sede de dinheiro.” (aluna do 8ª

ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“Quando chegaram perto viram dois grandes e <ferois ᴓ> leões que estava jaula e

ficou desafiando os leões que não saíram de dentro da jaula.” (aluna do 8ª ano – Escola

Municipal Oswaldo Teixeira)

“porque muitas vezes a pessoa que esta desputando <a ᴓ> paralompiadas treinou

tanto quanto a pessoa que vai desputar a olimpíadas.” (aluno do 8º ano – Colégio

ZeroHum)

“já os participantes deficientes precisam mostrar que conseguem fazer esse esporte,

eles necessitam pois <a ᴓ> pessoas que são deficientes não fazem nada.” (aluno do 8º

ano – Colégio ZeroHum)

“Viajar para os outros países como Paris, Roma, Dubais, Disney e <outro ᴓ> países.”

(aluno do 8º ano – Colégio Esplendor)

“As características psicológicas dele era normal, não tinha nenhum problema mental e

<a ᴓ> características físicas de e, pequeno e magro” (aluno do 9º ano – da Escola

Municipal Oswaldo Teixeira)

“ela era dona do Batacra, mundi Falção e <um ᴓ> homens.” (aluno do 9º ano

– Escola Municipal Fernando Azevedo)

“Que e muito extrovertida, brincalhona e adora fazer muitas, muitas perguntas <do ᴓ>

adultos” (aluna do 9º ano – da Escola Municipal Fernando Azevedo)

91

Nota-se que, mesmo em se tratando de determinantes do tipo artigo definido ou

indefinido (um, uma) demonstrativos (esse) e possessivos (meu, minha), a marca

morfológica de número se concretiza, às vezes, apenas no núcleo do SN.

Scherre (1988) também encontrou dados dessa natureza; entretanto, em seu

trabalho, os dados eram da mesma estrutura sintagmática: artigo ou demonstrativo mais

possessivo e um substantivo (no teus filhos / o meus colega). Segundo ela, os falantes

podem estar considerando a contração de no como uma categoria que não se flexiona e,

por isso, não recebem marca formal de plural. Essa interpretação poderia estar se

estendendo também aos artigos diante de possessivos.

Outro trabalho que apresenta dados desse tipo é o de Christino e Silva (2012),

sobre a escrita em Português-Kaingang, em que o primeiro elemento do SN não

apresenta marca formal de número, mas o segundo elemento sim (“a funções” / “o

costumes”). Segundo as autoras, esses casos ocorrem devido a um processo de

Transmissão Linguística Irregular, pois os falantes adultos que produziram esses dados

têm o português como L2 e a língua indígena como L1. Dessa forma, teria havido a

mistura de gramáticas por parte desses falantes decorrente do contato entre o português

e a língua indígena. Além disso, de acordo com Baxter e Lucchesi (2006), é comum

num processo de Transmissão Linguística Irregular a perda da morfologia flexional,

nesse caso, ocorrendo no elemento nuclear, em função de a língua materna dos

indígenas (Kaingang) ser uma língua predominantemente de cabeça à direita, ou seja, a

marcação das categorias morfossintáticas se dá na porção direita do SN.

Entretanto, como esses dados também foram encontrados no corpus da presente

pesquisa na escrita de crianças não indígenas, não é possível ser categórico quanto à

hipótese de Transmissão Linguística Irregular. Parece indicar tratar-se de um processo

natural do sistema linguístico do português, já que está presente em diferentes lugares

em que se fala a língua portuguesa como L1 ou não.

Outro argumento contra a hipótese de Transmissão Linguística Irregular é o

trabalho de Capellari e Zilles (2002), no qual estudaram a marcação de plural na fala

infantil de crianças de uma escola particular de Porto Alegre. Nesse estudo, as autoras

encontraram dados do tipo a minhas prima, em que a marca de número não está

presente no primeiro elemento do SN. Conforme as autoras, nesses casos há um

processo de assimilação entre o artigo e o possessivo e, deste modo, a marcação de

número continuaria no primeiro elemento “aminhas prima”.

92

Apesar de muitas justificativas para o apagamento da marca de número no

elemento pré-nuclear de 1ª posição, um fato não se pode negar: esses dados estão

presentes no português como um todo, em falantes de várias idades e localidades

distintas, com ou sem contato com uma L2.

Outra variante que favoreceu a regra formal de número é a pré-nuclear na 2ª/ 3ª

posição em diante. O peso relativo para esse ambiente foi de .55, com um percentual de

95% (114/120) de concordância padrão. Esse resultado, assim como o da variante pré-

nuclear na 1ª posição, confirma a hipótese de que os elementos pré-nucleares

favorecem a presença da variante -s.

- Pré-nuclear na 2ª/ 3ª posição:

“todas as pessoas” (aluna do 6º ano – Colégio Esplendor)

“Um dos maiores problemas das pessoas” (aluno do 7º ano – Colégio ZeroHum)

“as piores roupas” (aluna do 8º ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

“Dos meus primeiros dias de aula” (aluna do 9º ano – Colégio Esplendor)

Há, ainda, o fator pós-núcleo na 1ª posição que também apresentou um resultado

ligeiramente favorecedor da regra de número, com peso relativo .55 e 95% (200/211) de

concordância padrão (“os seres humanos”). De acordo com outros trabalhos, os

elementos pós-nucleares desfavorecem a regra de concordância por estarem mais à

direita do SN. A hipótese para tal resultado é a de que possivelmente o pós-núcleo em 1ª

posição estivesse mais marcado morfologicamente pela influência de marca no

elemento precedente (núcleo). Para tanto, procedeu-se a um cruzamento das variáveis

posição linear e relativa do constituinte no SN e marcas no elemento precedente, que

resultou na confirmação da hipótese, já que, das 203 ocorrências de pós-núcleo na

primeira posição, 193 (95%) estão precedidas de núcleo morfologicamente marcado.

- Pós-nuclear na 1ª posição:

“as madrugadas frias” (aluno do 6º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“nuvens baixas” (aluna do 8º ano – Colégio Esplendor)

93

Já o núcleo de 1ª posição apresentou um comportamento próximo da

neutralidade, com um leve favorecimento da regra de número, exibindo um peso

relativo .52 e 97% (98/101) de concordância padrão (“raios ultravioletas”). Em

Camacho (2013), o núcleo de 1ª posição também favoreceu a concordância (peso

relativo de .62 e percentual de 73%). Em Scherre (1988), a autora afirma que a 1ª

posição do SN é a mais marcada independente da classe gramatical. Esse resultado é

esperado, pois se não existe nenhum elemento precedente ao núcleo, este

obrigatoriamente necessita receber a marca de número para que a ideia de plural seja

estabelecida (Princípio da Distintividade Funcional).

- Núcleo na 1ª posição:

“pessoas mais altas” (aluno do 7ºano – Colégio Esplendor)

“substâncias benéficas” (aluno do 7º ano – Colégio ZeroHum)

“cabelos molhados” (aluna do 8º ano- Escola Municipal Fernando Azevedo)

Resta comentar que apenas três dados de núcleo de 1ª posição aparecem não

marcados, em uma enumeração com antecedentes que apresentavam determinantes

(uma garrafa plástica, uma rolha furada, um tubo de vidro ou de borracha):

“para fazer essa experiencia é necessário uma garrafa plástica de dois litros,

uma rolha furada, um tubo de vidro ou de borracha, porção de pedregulho grosso,

porção de pedregulho fino, porção de areia fina...” (aluno do 9º ano – Colégio

ZeroHum)

Assim, a retirada desses dados implicaria um comportamento categórico de

núcleo de 1ª posição.

O núcleo na 2ª posição, contudo, mostrou-se desfavorecedor da marca

morfológica -s de plural, com um peso relativo de .45 e 94% (916/977) para a variante

prestigiada -s. Camacho (2013) também encontrou esse mesmo resultado. Conforme o

autor relata, o núcleo na 2ª posição apresentou um peso relativo de .28 e a frequência da

variante padrão foi de 73%. A hipótese de quanto mais à direita do SN, menor é a

94

chance de concordância parece se concretizar, pois se nota uma gradação entre as

posições mais à esquerda até aquelas mais à direita.

- Núcleo na 2ª posição:

“os personagens” (aluno do 6º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“as criança” (aluna do 7º ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

“as olimpíadas” (aluna do 8º ano – Colégio ZeroHum)

Outra variante que também desfavoreceu a presença da marca morfológica de

número foi núcleo na 3ª/ 4ª posição, que apresenta 89% (128/143) de concordância e

peso relativo .37, ou seja, não importa se o termo é núcleo, mas sim sua distribuição no

sintagma: quanto mais à direita, menor é a probabilidade de ser marcado

morfologicamente, como revela o peso relativo.

Segundo o trabalho de Camacho (2013), há uma hierarquia de desfavorecimento

entre o núcleo de 1ª posição e as demais posições (.62, 73% núcleo na 1ª posição; .28,

71% núcleo na 2ª posição e .37, 83% nos núcleos nas demais posições do SN). Essa

pesquisa obteve o mesmo resultado, houve um favorecimento da marca de número

quando o núcleo estava na 1ª posição e um desfavorecimento quando o núcleo se

encontrava nas demais posições.

- Núcleo na 3ª/ 4ª posição:

“as piores noticias de catastrofe” (aluno do 8º ano – Colégio Esplendor)

“dos seus direito” (aluna do 9º ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

“um dos dois filhos” (aluna do 9º ano – Escola Municipal Fernando Azevedo)

Por último, há a variante pós-nuclear na 2ª/3ª posição que apresentou o menor

peso relativo (.20) e também o menor percentual de concordância padrão (69% - 54/78).

Dessa forma, esse parece ser o contexto de maior desfavorecimento da regra.

95

- Pós-nuclear na 2ª/ 3ª posição:

“esse olhos tão grande” (aluna do 6º ano – Escola Municipal Oswaldo Teixeira)

“dois adolescentes não populares” (aluna do 8º ano – Escola Municipal Fernando

Azevedo)

“porções de pedregulho grosso” (aluna do 9º ano Colégio ZeroHum)

Ainda em Camacho (2013), o autor afirma que os elementos pós-nucleares

tendem a desfavorecer a marca explícita de número (.47, 80%). Os resultados dessa

pesquisa mostraram que o elemento pós-nuclear na 1ª posição favorece a marca de

número, mas os pós-nucleares de 2ª/3ª posição foram os que mais desfavoreceram a

concordância padrão.

Na presente pesquisa, os resultados encontrados para essas duas últimas

variantes (núcleo na 3ª/ 4ª posição e pós-núcleo na 2ª/ 3ª posição) analisadas

comprovam a hipótese de que, quanto mais à direita do sintagma, menor a chance de

receber a marca formal de plural. Como se vê, os elementos mais à esquerda

favoreceram a regra e os mais à direita desfavoreceram-na.

Cumpre destacar que Camacho (2013) apresenta em seu trabalho uma

hierarquia, mostrando um continuum de + concordância à – concordância. Veja:

determinantes antepostos na 1ª posição > determinantes antepostos na 2ª posição >

núcleo na 1ª posição > determinantes pospostos > núcleos na 2ª e na 3ª posição.

Tabela 21: hierarquia dos contextos de aplicação da regra de concordância. (Cf. CAMACHO, 2013,

p.189.)

Contudo, nesta pesquisa, pode-se encontrar a seguinte hierarquia:

Tabela 22: hierarquia dos contextos de aplicação da regra de concordância.

Ainda, para uma melhor visualização, observa-se no gráfico a seguir a

distribuição dos dados em relação ao maior ou menor favorecimento da regra padrão de

acordo com a posição que ocupam no SN.

pré-núcleo na 1ª posição > pré-núcleo na 2ª/ 3ª posição > pós-núcleo na 1ª posição >

núcleo na 1ª posição > núcleo na 2ª posição > núcleo na 3ª/4ª posição > pós-núcleo na

2ª/3ª posição

96

Gráfico 1: percentual de concordância padrão de acordo com a posição que os termos ocupam no

SN. (SNs simples e complexos)

Nota-se que os elementos mais à esquerda favorecem a regra enquanto os mais à

direita a desfavorecem. A variante pós-nuclear na 1ª posição foi retirada do gráfico, já

que seu comportamento estava sendo influenciado pela variante presença de marca no

elemento precedente, como já foi explicado anteriormente a partir do cruzamento entre

as variáveis marcas no elemento precedente e posição linear e relativa do constituinte

no SN.

5.3. Considerações finais: comparação de resultados relativos às modalidades

escrita e falada

O fenômeno da concordância nominal é um tema bastante estudado nas

pesquisas linguísticas. Entretanto, a maior parte desses trabalhos observa a modalidade

oral da língua e não a escrita. Parece, contudo, que há algumas semelhanças e diferenças

entre essas modalidades no que concerne à concordância de número do PB. Dessa

forma, essa seção mostrará, de maneira sucinta, uma comparação entre os resultados de

pesquisas sobre o fenômeno na concordância na oralidade, com os resultados aqui

encontrados na escrita.

97

Primeiramente, deve-se destacar que trabalhos como Scherre (1988), Camacho

(2013) e Brandão e Viera (2012) sobre a fala mostram que a concordância nominal é um

fenômeno que se enquadra na regra laboviana do tipo III – regra variável – pois opera

com frequência entre 5 a 95%. Além disso, nessas pesquisas, os autores mostram que a

concordância nominal no PB tem apresentado percentuais altos para a variante

prestigiada [s] (72% na fala adulta e 66% na fala infantil, em Scherre8; 83% em

Camacho; e 91,1%, em Brandão e Vieira).

Nessa pesquisa sobre a escrita de alunos do Ensino Fundamental II (6º ao 9º

ano), também se encontrou um resultado que mostra a preferência pela variante padrão,

exibindo um percentual de 94,5% de marca formal de número, podendo, assim, ser

caracterizado como um fenômeno variável. Todavia, vale ressaltar que esse resultado se

aproxima de uma regra do tipo II – semi-categórica (95-99%).

Ainda sobre esses trabalhos que tratam da oralidade no PB, foi possível notar

que há algumas variáveis selecionadas em comum nessas pesquisas. Logo, acredita-se

que esses contextos sejam importantes para a presença ou ausência da marcação de

plural nos elementos que constituem um sintagma nominal.

Desse modo, tanto em Scherre (1988), Camacho (2013) e Brandão e Vieira

(2012), as variáveis linguísticas posição linear e relativa do constituinte no SN e

saliência fônica foram consideradas como relevantes para o fenômeno da concordância.

Isso revela que tais fatores são importantes para que um falante produza ou não a

variante -s. Ainda em Camacho (2013) e Scherre (1988), outra variável em comum

também foi selecionada: marcas no elemento precedente.

Sobre a variável posição linear e relativa do constituinte no SN, as pesquisas

sobre a fala mostram que os elementos que ocupam a 1ª posição (núcleo ou pré-núcleo)

tendem a ser mais marcados e que há um desfavorecimento da regra quando esses

elementos se afastam da posição mais à esquerda do SN. Essa variável também foi

selecionada neste trabalho, que observa a modalidade escrita. Esse mesmo resultado foi

encontrado: os elementos mais à esquerda tendem a receber mais marcas que os

8 Esse resultado de Scherre (1988) é sobre sua análise atomística – análise que observa o comportamento

de cada elemento do SN separadamente, e não o SN como um todo. Essa pesquisa também fez uma

análise atomística, já que estudou individualmente cada elemento que compõem um SN.

98

elementos mais à direita do SN. Sendo assim, ao que tudo indica, esse contexto é

relevante para o fenômeno da concordância nas duas modalidades da língua.

Outra variável comum a trabalhos linguísticos sobre a modalidade oral é marcas

no elemento precedente. Em Camacho (2013); foi selecionada em primeiro lugar; em

Scherre, foi a terceira. Esse contexto observa a influência do elemento anterior para a

ausência ou presença da variante -s no termo subsequente. Nesta pesquisa, essa variável

foi selecionada também em primeiro lugar. Com isso, pode-se dizer que esse é mais um

contexto que influencia tanto a fala como a escrita do PB.

Já a variável saliência fônica9, que observa o processo morfofonológico de

formação do plural, tem se mostrado relevante para as pesquisas sobre a fala, revelando

que os elementos mais salientes, como o plural duplo (olho – olhos), favorecem a

aplicação da regra padrão mais que os elementos menos salientes (plural regular / mesa

– mesas). Porém, essa variável não foi selecionada nesta pesquisa. Portanto, parece que

a diferença morfofonológica entre o singular e o plural não é tão relevante quando se

trata de escrita. Isso porque na modalidade oral a sonoridade pode influenciar bastante

na escolha de determinadas variantes, enquanto que a escrita é mais visual e, por isso,

essa variável tão sonora não foi selecionada neste trabalho.

Uma outra variável não presente em todos os trabalhos sobre a fala, mas que

também merece um destaque é a animacidade. Apesar de não selecionada em Camacho

(2013), ela mostrou-se importante em Scherre (1988) e Brandão e Vieira (2012).

Segundo Scherre, o traço [+ humano] é mais saliente e, por isso, favorece mais a regra

de número. Já Brandão e Vieira mostraram que o traço [+ animado] recebe mais marcas

que o [- animado]. Neste trabalho, a animacidade também foi selecionada e mostrou,

assim como em Scherre, que o traço [+ humano] é o mais importante para a presença da

variante -s.

Além dessas variáveis linguísticas, há uma variável social que também tem sido

fundamental para o estudo da concordância no PB: escolaridade. Nas pesquisas sobre a

modalidade oral, os autores mostram que há um continuum de - concordância à +

concordância, proporcional ao aumento do nível de escolaridade.

9 Nessa variável foi possível notar que a variante plural regular apareceu majoritariamente no corpus. Dos

2.659 dados, 2.410 eram de plural regular e apenas 134 não apresentaram a marca formal de número. Os

outros termos com plural saliente (termos terminados em -s, -l, -r, -ao e plural duplo) representam 249

dados, com somente 16 dados sem a marca -s de plural.

99

Contudo, nesta pesquisa não foi possível mostrar uma gradação entre os níveis

de escolaridade (fundamental – médio – superior), pois o corpus é constituído apenas

por alunos do Fundamental II, mas foi possível ver o comportamento desfavorecedor

das séries iniciais (6º e 7º ano) e o comportamento favorecedor à regra nas séries finais

8º e 9º ano). De qualquer forma, o importante é que a variável ano de escolaridade

tenha sido selecionada, mostrando mais uma vez o quanto é relevante a escolaridade

para o fenômeno da concordância. Por isso, pode-se afirmar que a aquisição da regra

padrão está relacionada com ao acréscimo da educação formal.

Assim, parece que há alguns contextos que influenciam tanto a modalidade oral

como a escrita; já outros contextos são mais específicos de uma das duas modalidades,

como é o caso da saliência.

100

6. CONCLUSÃO

Esta pesquisa sobre o fenômeno da concordância nominal em SNs simples e

complexos conseguiu responder aos questionamentos aqui levantados e comprovou,

também, algumas hipóteses já consagradas na literatura sobre a concordância no

português.

Primeiramente, pôde-se verificar que houve um aumento em direção à aplicação

da marca de concordância na escrita de alunos do 6º ao 9º anos de diferentes instituições

e localidades em relação a trabalhos antigos sobre o mesmo fenômeno, já que a variante

prestigiada -s se manifestou em 94,5% dos dados analisados. Esse resultado confirma a

hipótese do aumento da concordância padrão no português brasileiro. Além disso, a

presença majoritária da variante de prestígio parece estar relacionada à modalidade

escrita, que é mais monitorada, assim como ao tipo de texto produzido, como mostrou a

variável ano de escolaridade. Também não se pode esquecer da influência da escola

como a grande mantenedora da variante padrão, pois as redações analisadas foram

produzidas no ambiente escolar.

Foi possível, também, observar que atuam sobre o fenômeno da concordância

nominal fatores linguísticos e sociais. Assim, as variáveis linguísticas consideradas

condicionadoras para a concordância foram: marcas no elemento precedente,

animacidade, e posição linear e relativa do constituinte no SN. Já as variáveis sociais

relevantes para o fenômeno da concordância foram localidade e ano de escolaridade.

A primeira variável selecionada – marcas no elemento precedente – mostrou que

princípios funcionalistas atuam no fenômeno da concordância nominal. Assim, quando

um termo ocupa a 1ª posição do SN sem nenhum termo precedente, este, quase

obrigatoriamente, deve receber a marca de número para que a noção de plural seja

estabelecida (Princípio da Distintividade). Por outro lado, quando o termo analisado

apresenta um termo semanticamente plural do tipo porção de, há um desfavorecimento

da regra de concordância padrão. Esse resultado revela um Princípio da Economia

Linguística, já que a marca -s é mais produtiva quando necessária. Portanto, SNs

semanticamente plurais já carregam a noção de número, não sendo, assim, fundamental

a presença da marca morfológica -s. Outro contexto em que esse princípio atua é na

variável presença de marca no elemento precedente. Esse contexto mostrou-se

desfavorecedor à regra, revelando, mais uma vez, o Princípio da Economia Linguística,

101

em que a marca -s só aparece quando é fundamental. Como esse contexto já apresenta

um -s, não é obrigatória a presença de mais marca para que a ideia de plural seja

estabelecida. Já os numerais apresentaram um comportamento favorecedor à regra

padrão. Assim, outro princípio parece atuar nesse contexto, o Princípio do Paralelismo

Formal em que “marcas levam a marcas e zeros levam a zeros”, mesmo que essa marca

seja semântica, como é o caso dos numerais. O mesmo princípio atua quando há um

elemento sem marca no elemento precedente. Esse contexto desfavorece a presença da

variante -s, mostrando que “zeros levam a zeros”.

A segunda variável relevante nesta pesquisa foi animacidade, em que foi

possível constatar, conforme Scherre (1988), que o traço [+ humano] é o mais

favorecedor da presença da variante padrão.

Já a terceira variável selecionada é de caráter social: localidade. Essa variável

mostrou que as escolas públicas que ficam em Quintino e Santa Cruz desfavoreceram a

regra padrão, enquanto as particulares da Vila da Penha e do Jardim Guanabara – Ilha

do Governador – favoreceram a variante de prestígio. Além disso, foi possível discutir

nessa seção, as peculiaridades entre as escolas públicas e as privadas, mostrando que

estas apresentaram maior produtividade de concordância.

A última variável linguística é posição linear e relativa do constituinte no SN.

Essa variável apresentou um continuum que revela maior concordância nos termos que

se encontram mais à esquerda do núcleo e menor concordância nos elementos mais à

direita. O mesmo ocorreu com os núcleos: quando estes estão mais à esquerda, tendem a

receber marcas e quando estão mais à direita do sintagma, menor é a chance da marca

de número se concretizar.

Por último, há a variável ano de escolaridade que mostrou o comportamento das

séries escolares para o fenômeno. Dessa maneira, foi possível perceber que o 6º e o 7º

anos desfavorecem a regra, enquanto o 8º ano favorece, acredita-se, por apresentar

redações mais argumentativas e, consequentemente, mais formais, como já foi dito. Já o

9º ano apresentou um comportamento neutro, com um discreto desfavorecimento da

regra de concordância padrão.

Outro ponto importante que se pôde constatar é o fato de que as variáveis

selecionadas não são necessariamente as mesmas que influenciam a fala. A variável

saliência fônica tem se mostrado relevante em muitos trabalhos, como Scherre (1988) e

Brandão e Vieira (2012) sobre a oralidade do PB, porém não foi selecionada nesta

102

pesquisa. Ao que tudo indica, a diferença fônica entre o singular e o plural é importante

na fala em que essa diferença é bem mais perceptível, pois a escrita é mais visual e não

auditiva.

Por outro lado, as variáveis marcas no elemento precedente e posição linear e

relativa do constituinte no SN são comuns às duas modalidades do português brasileiro

(oral e escrita), mudando-se apenas a ordem de relevância. Isso revela que, para a

realização da marca formal de plural, é importante o termo antecedente e a posição que

cada elemento ocupa no SN.

Assim, pelos resultados obtidos, pode-se afirmar que a escola tem cumprido seu

papel na disseminação da norma de prestígio, já que o corpus foi constituído por

redações produzidas em sala de aula. Logo, a ação da escola também parece ser um dos

fatores que contribui para o aumento da variante -s em detrimento da variante

estigmatizada zero. Além disso, pode-se notar que a variação da concordância é

realmente um fenômeno inerente aos falantes, já que está presente em indivíduos de

diferentes localidades, gênero e ano escolar.

Portanto, acredita-se que esta pesquisa pôde contribuir com uma descrição e

explicação do fenômeno da concordância nominal na modalidade escrita, mostrando em

que contextos há uma tendência à produção da variante zero e, assim, traz informações

importantes para o ensino do português. Com isso, o professor de língua poderá prever

em que ambientes há uma tendência de seus alunos não realizarem a variante -s, na

escrita, e esses contextos poderão servir como ponto de partida para o ensino da variante

padrão, permitindo a eles o acesso à “norma culta”.

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